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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE” A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA INGLESA NO COMÉRCIO E NA LÍNGUA PORTUGUESA MARCO ANTONIO MARTINHO SECCO Orientador: Profª. Maria Ester de Araújo Rio de Janeiro, Jun./2003

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA INGLESA NO COMÉRCIO E NA LÍNGUA

PORTUGUESA

MARCO ANTONIO MARTINHO SECCO

Orientador:

Profª. Maria Ester de Araújo

Rio de Janeiro, Jun./2003

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA INGLESA NO COMÉRCIO E NA LÍNGUA

PORTUGUESA

MARCO ANTONIO MARTINHO SECCO

Apresentação de monografia ao Conjunto Universitário

Cândido Mendes como condição prévia para a

conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”

em Docência do Ensino Superior

Rio de Janeiro, Jun./2003

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Dedico esta monografia á minha esposa e as

minhas filhas que me incentivaram a fazer o

Projeto “A Vez do Mestre” na Universidade

Candido Mendes.

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Agradeço a Deus, a minha mãe e também aos

colegas e professores da turma 805, do ano de

2003 por ter chegado ao fim de mais uma

etapa da minha vida.

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RESUMO

Toda língua se modifica incessantemente pela sua própria natureza e pelo contato

com as demais. Os empréstimos lingüísticos são tão antigos quanto as próprias línguas e

caracterizam as influências que determinada língua sofreu através dos tempos, pelos

elementos lingüísticos que perfilhou, representação dos elementos culturais diversos que

também importou. O presente estudo tem como objetivo discutir o processo de globalização e

seus efeitos na língua portuguesa, com a entrada de palavras estrangeiras de origem inglesa,

língua considerada de prestígio, tendo em vista a dominação americana nas áreas econômica e

Tecnológica.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................ 07 CAPÍTULO I. LINGUAGEM E VOCABULÁRIO.................................................... 09 1.1 Os eixos da linguagem............................................................................................ 10 1.2 Vocabulário: linguagem e situação......................................................................... 11 1.3 A criação dos vocábulos próprios........................................................................... 12 1.3.1 Linguagens técnicas............................................................................................. 12 1.3.2 Linguagem popular.............................................................................................. 18 CAPÍTULO 2 – DICOTOMIA EMPRÉSTIMO/ESTRANGEIRISMO...................... 20 2.1 O estrangeirismo como recurso estilístico.............................................................. 20 2.2 Estrangeirismo, xenismo e peregrinismo................................................................ 22 2.3 De estrangeirismo a empréstimo............................................................................ 23 CAPÍTULO 3 – A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA INGLESA NO PORTUGUÊS....... 25 3.1 Empréstimos da língua inglesa no vocabulário português..................................... 27 3.2 A americanização da Língua Portuguesa................................................................ 30 CONCLUSÃO.............................................................................................................. 33 BIBLIOGRAFIA.......................................................................................................... 35 GLOSSÁRIO................................................................................................................ 37 ANEXOS...................................................................................................................... 38

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INTRODUÇÃO

Se pudéssemos ser realmente justos para com os povos que aqui viviam antes da

chegada dos portugueses, a língua verdadeiramente brasileira seria a dos indígenas,

especialmente o tupi-guarani, que foi sendo substituída gradativamente pelo português. A

possibilidade de reconhecimento nesse sentido, inclusive, já foi fruto de acaloradas discussões

por parte de alguns teóricos.

Mas o fato é que, desde que se iniciou a colonização do Brasil pelos portugueses, a

língua portuguesa foi recebendo importantes influências concomitantes ao processo histórico

vivido desde então. De início, o colonizador esteve em contato com os primeiros habitantes de

nossas terras: os indígenas. Depois, por conta da utilização da mão-de-obra escrava, a língua

portuguesa sofreu a influência direta das línguas africanas. Em seguida, no (final do século

XIX e início do século XX), vieram os imigrantes europeus para trabalhar principalmente na

lavoura de café. Por fim, na atualidade, devido ao processo de dominação econômico-cultural

americana, percebemos a introdução de muitas palavras da língua inglesa

Posteriormente, através da intensa atividade de comércio com países do exterior, o

Brasil tem sido fortemente influenciado pela língua inglesa, que, atualmente, pode ser

considerada uma língua universal.

Atualmente, em decorrência e paralelamente ao domínio comercial, a cultura americana

chega até nós através do cinema, da música e de programas de televisão, por exemplo. Isso

tem acrescentado um grande número de palavras ao nosso vocabulário, especialmente no que

se refere a áreas como lazer, esportes e alimentação.

Além disso, o fato de os americanos dominarem uma boa parte do mercado ligado à

tecnologia faz com que sejam introduzidas em nossa língua muitas palavras dessa área,

especialmente aquelas usadas em computação.

Muitas palavras de origem inglesa já sofreram modificações e adquiriram forma

própria dentro de nossa língua. Outras ainda conservam sua forma original e não estão

disponíveis em dicionário, havendo certa controvérsia a respeito de sua inclusão no nosso

vocabulário oficial.

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Dessa forma, a abordagem ao tema será realizada a partir de uma pesquisa

bibliográfica sobre o assunto, tendo por objetivo: (a) demonstrar que o conjunto de vocábulos

de uma língua constitui o reflexo da cultura de seu povo e é fruto de interação com outros

povos; (b) caracterizar o estrangeirismo como integrante do vocabulário de uso genérico e do

vocabulário de uso específico; e, (c) identificar os principais vocábulos da língua inglesa

utilizados na língua portuguesa.

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CAPÍTULO I

LINGUAGEM E VOCABULÁRIO

O homem é um ser da espécie animal que se diferencia dos outros por muitos aspectos.

Entre eles, há um que o faz ser muito diferente: sua extraordinária capacidade de representar e

nomear simbolicamente a realidade que o rodeia. Dos muitos conceitos de homo sacer que

têm surgido na terminologia científica para referir-se ao homem, como por exemplo, homo

sapiens ("o homem que sabe ou pensa"), homo faber ("o homem que faz"), homo ludens ("o

homem que brinca"), etc., são o homo loquens ("o homem que fala") e o homo symbolicus ("o

homem que cria signos ou símbolos") os conceitos que melhor caracterizam o homem como

um ser-de-linguagem.

A linguagem representa um instrumento, estrutura ou faculdade excepcional que o

homem desenvolveu para escrutar e apropriar-se do mundo sensível, físico e ininteligível. A

linguagem permitiu que o homem se transformasse num ser simbólico.

A linguagem permitiu ao homem comunicar seus pensamentos, emoções e

sentimentos. Através da linguagem o homem organismo vivo que possui atividade

anímica, psíquica e sensitiva nomeou as coisas e objetos do mundo atribuindo-lhes

organização e sentido. Manipulando a linguagem o homem desenvolveu o conhecimento, a

expressão e estabeleceu múltiplas relações inteligentes, sociais e afetivas. Segundo Citelli

(1988:15), a linguagem é

uma inesgotável riqueza de múltiplos valores. É inseparável do

homem e segue-o em todos seus atos (...) É o instrumento graças ao

qual ele influencia e é influenciado, a base última e mais profunda da

sociedade humana. Mas é também o recurso último e indispensável

do homem, seu refúgio nas horas solitárias em que o espírito luta com

a existência, e quando o conflito se resolve no monólogo do poeta e

na meditação do pensador. Antes mesmo do primeiro despertar de

nossa consciência, as palavras já ressoavam à nossa volta, prontas

para envolver os primeiros germes frágeis de nosso pensamento e a

nos acompanhar inseparavelmente através da vida quotidiana aos

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momentos mais sublimes e mais íntimos dos quais a vida de todos os

dias retira, graças às lembranças encarnadas pela linguagem, força e

calor. A linguagem não é um simples acompanhante, mas sim um fio

profundamente tecido na trama do pensamento; para o indivíduo, ela

é o tesouro da memória e a consciência vigilante transmitida de pai

para filho.

A linguagem fez o homem expressar-se através de palavras. O homem é um ser que se

comunica com as palavras. A palavra é um termo latino que vem de parábola cujo significado

encerra o sentido de comparação, aproximação, alegoria: representação dos pensamentos sob

forma figurada ou representação de uma coisa para dar a idéia de outra. Na palavra está

contido o sentido de transposição e de mediação onde se estabelecem relações e planos de

significação.

Pode-se afirmar que toda atividade simbólica humana é mediada pela linguagem,

cabendo à palavra uma função chave no processo de codificação/decodificação de mensagens

e da estruturação da significação.

1.1 Os Eixos da Linguagem

Na sua dinâmica e configuração, a linguagem estabelece uma série de relações,

combinações e associações que são vitais para o desenvolvimento da atividade mental,

comunicação e funcionamento do aparelho cognitivo humano. São dois processos de

associação ou organização das coisas, ou seja, os chamados eixos da linguagem: contigüidade

(proximidade) e similaridade (semelhança).

Segundo Décio Pignatari "esses dois processos formam dois eixos: um é o eixo de

seleção (por similaridade), chamado paradigma ou eixo paradigmático; outro é o eixo de

combinação (por contigüidade), chamado sintagma ou eixo sintagmático". De maneira mais

específica para referir-se aos eixos da linguagem, Teixeira Coelho Netto (1983:20) diz que:

de um lado, o que se tem são as relações estabelecidas entre as

palavras de um discurso, que se combinam umas com as outras e

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umas após as outras em virtude do caráter linear da língua a impedir

a possibilidade de dois signos serem pronunciados ao mesmo tempo.

Este primeiro eixo é o sintagma: uma seqüência de signos, linear e

irreversível. Assim, a mensagem / O sistema de eleição será

aperfeiçoado./ constitui um sistema que se define por uma extensão

no espaço, formado por signos cuja presença, no ato de enunciar a

mensagem, exclui outros signos. Nessa "cadeia falada", ao dizer

"sistema" não posso dizer simultaneamente "processo", ao emitir

"eleição" não posso transmitir "competição". Este eixo não existe

isoladamente: vem relacionado e é validado por outro, o eixo das

relações associativas ou paradigmático (de paradigma = modelo).

Em outras palavras, ao preparar-me para formular uma dada

mensagem escolho previamente um signo dentre um repertório de

outros a ele associados. Por exemplo, devo referir-me a uma "bola de

futebol". Na gíria desse esporte, além de "bola" há uma série de

outros signos que podem ser utilizados, não importa se notativa ou

conotativamente: "balão de couro", "esfera", "redonda", "menina",

"pelota" e outros. O conjunto destes signos constitui um paradigma

do qual me servirei para a construção do sintagma.

Os eixos sintagmático e paradigmático são imprescindíveis na configuração de uma

linguagem assim como o significante e o significado o são para o signo lingüístico. Os eixos

da linguagem representam suportes ou vetores chaves que ao interagirem na procura de

sentido estabelecem complexas relações e associações que se interligam por sua vez à idéia do

conhecimento como rede.

1.2 Vocabulário: linguagem e situação

Sem falar no vocabulário familiar ou informal, próprio de determinado nível de

linguagem e relativamente raro na escrita (salvo quando se quer causar um efeito especial), é

preciso chamar a atenção para outra diferença na freqüência de emprego de certas palavras na

linguagem escrita e na oral. Essa diferença deve-se essencialmente às situações nas quais se

desenvolvem as mensagens escritas e faladas.

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No decorrer de uma comunicação oral, os interlocutores estão em presença, num lugar

e num tempo conhecidos por eles (considera-se aqui o caso mais comum da conversação e

deixa-se à parte por ora o caso da comunicação oral à distância e indireta); trocam

observações a respeito de determinado assunto. Essa situação reflete-se na forma e no

conteúdo da mensagem; à medida que os elementos constitutivos da situação (identidade dos

personagens, lugar, data, hora, assunto) são conhecidos, o vocabulário empregado refere-se a

eles apenas nas alusões (você designa o receptor; eu, o emissor; aqui, o lugar; agora, o tempo;

isto é, o assunto da comunicação).

A comunicação escrita é menos "econômica" e força o emissor a fazer referências mais

precisas sobre a situação. Por exemplo, num romance o leitor está fora da situação e o autor se

vê forçado a dar-lhe com precisão seus elementos (lugar, nome dos personagens, datas, etc);

trata-se, então, apenas da situação dos personagens e raramente se fará alusão à situação do

romancista no ato de escrever, ou do leitor no ato de ler, uma vez que estas duas operações

estão distanciadas no tempo e no espaço.

A língua escrita é, então, geralmente mais precisa, menos alusiva que a língua falada

(Citelli, 1988).

1.3 A criação dos vocábulos próprios

1.3.1 Linguagens técnicas

Há situações de uso da língua em que os vocábulos devem ser entendidos com um

significado único. Quando isto não acontece, a eficácia da comunicação fica comprometida,

podendo resultar daí ambigüidades, incompreensões, erros de interpretação. É o caso das

linguagens técnicas, em que, para haver compreensão, é necessário o domínio de um

vocabulário mais restrito a determinado grupo profissional.

As linguagens técnicas são linguagens especiais de grupos envolvidos em alguma

atividade ou que têm em comum alguma especialização. Os profissionais, de forma geral,

apresentam um vocabulário que retrata as suas atividades. A linguagem dos advogados, dos

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locutores de futebol, dos policiais etc, têm um papel de identificação, pois é através dela que

os diferentes grupos se identificam. Por exemplo,

Texto 1 - Boletim médico

PACIENTE: José Joaquim Silva

Atendido no Hospital dos Servidores do Estado, por junta médica, o

paciente apresentava dor torácica e lipotimia, tendo sido submetido à

avaliação clínica, cardiovascular, neurológica e ortopédica

completas. Foram realizados diversos exames, como

eletrocardiograma, tele rx e doppler.

Até o momento, nenhuma patologia foi constatada e o paciente

permanece em observação médica no Hospital dos Servidores do

Estado, em boas condições clínicas.

O texto acima descrito é um relatório objetivo sobre o estado de saúde de um paciente

e tem como função apresentar fatos. Apresenta numerosos termos específicos da linguagem

médica, que só podem ser entendidos com a ajuda do dicionário. O autor não tece

considerações sobre a vida pessoal do paciente e não expressa simpatia nem antipatia por ele.

Assim, o texto cumpre sua função principal: relatar uma situação.

Para caracterizar este texto como um texto técnico, é necessário demonstrar a

contribuição do vocabulário. Identificam-se, assim, os vocábulos do texto responsáveis por

seu conteúdo:

substantivos adjetivos

paciente

dor torácica

atípica

lipotimia

avaliação clínica

cardiovascular

neurológica

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ortopédica

exames

eletrocardiograma

Tele rx

doppler

patologia

observação médica

hospital

condições clínicas

Segundo Travaglia (1996), citado por Azeredo (2000:45)

A tecnicidade é a variação que ocorre em função do volume de

informações ou conhecimentos que o falante supõe ter o ouvinte sobre

o assunto. Assim, por exemplo, um professor de língua usará numa

conferência profissional para colegas certos termos e noções de sua

área profissional que não usará, digamos, ao falar sobre o mesmo

assunto com os pais de seus alunos. Esse tipo de variação poderá

também ser observado, por exemplo, entre revistas científicas cujos

artigos são escritos na suposição de que serão lidos por especialistas

da área e revistas de divulgação científica (como Super Interessante,

Globo Ciência, Revista Geográfica Universal) cujos artigos são

destinados ao grande público, na sua maioria, leigo nos assuntos,

embora interessados neles.

O vocabulário muito específico pode ser utilizado como meio de manipulação e poder

sobre o interlocutor. Miranda (1995), citado por Galves (1998: 52) afirma que “a apropriação

da palavra por parte de determinados grupos é ato de prepotência, totalitarismo, visando a

corromper ou desviar o sentido, processo que pode ser bem observado no caso dos slogans,

da propaganda alienatória e compulsiva."

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Na área da informática, por exemplo, existe uma espécie de "clube dos iniciados" - um

texto corriqueiro para os entendidos pode parecer hermético para o usuário comum do

português que não domina os termos técnicos da área. Em recente publicação, Informática e

sociedade, Youssef & Fernandez (1988), citados por Azeredo (2000), afirmam que o termo

informática foi criado pela união de informação + automática. Após a abordagem de aspectos

interessantes a respeito do que é o computador, a popularização da Informática e os impactos

sociais, os autores apresentam um "vocabulário crítico" que pode servir de entrada para este

mundo fascinante da informática. Esses são alguns termos:

"Bit: unidade elementar de informação que pode adotar dois valores

ou estados distintos, 1 ou 0 ."

"CPU (Unidade Central de Processamento): unidade de um sistema

de computação onde se alojam os circuitos que regulam a

interpretação e execução das instruções."

"Hardware: conjunto formado pelas máquinas de processamento de

dados ou pelos elementos constitutivos das mesmas."

"Memória: todo e qualquer componente ou dispositivo capaz de

armazenar informações em curto ou longo período."

"Microcomputador: processador de informações construído com a

utilização de microprocessadores."

"Modem (Modulador/Demodulador): dispositivo que converte os

dados de uma forma compatível com o equipamento de

processamento de dados para outra forma compatível com o

equipamento de transmissão e vice-versa."

"Software: conjunto de programas, métodos, procedimentos e regras

de documentação relacionados com o funcionamento de um sistema

de dados.

Esses e outros termos técnicos estrangeiros vão fornecendo termos derivados como:

micreiros, deletar, linkar... que vão povoando nossa língua e recebendo "cor local", isto é, vão

se adaptando ao nosso sistema lingüístico e fazendo parte da nossa língua usual.

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Texto 2

MIGRANDO PARA ESPOSA 1.0

Ano passado um amigo meu migrou de Namorada 4.0 para Esposa

1.0 e concluiu que é um sistema comedor de memória que deixa

poucos recursos de sistema para outras aplicações. Ele também notou

que Esposa 1.0 está criando processos-filhos que estão consumindo

ainda mais recursos valiosos. Nenhuma menção deste fenômeno

particular foi incluída na documentação do produto, embora outros

usuários informaram-me que isto era previsível devido à natureza da

aplicação.

Mas não é só isso. Esposa 1.0 instala-se de modo que sempre começa

a rodar assim que o sistema é iniciado, onde pode controlar todas as

atividades executadas pelo sistema. Algumas aplicações, como

PokerNite 10.3, Bachelor Party 2.5 e Pubnite 7.0 não rodam mais de

jeito nenhum, causando travamento do sistema quando executadas

(mesmo que essas aplicações tenham sempre funcionado sem nenhum

problema antes da instalação de Esposa 1.0).

Esposa 1.0 não oferece nenhuma opção de instalação parcial. Assim,

a instalação de plug-ins indesejados (tais como Sogra 55.8 e

Cunhado Beta) é inevitável. O desempenho do sistema parece

diminuir a cada dia que passa. Algumas características que meu

amigo gostaria de ver na versão 2.0 de Esposa, que já deve estar

chegando:

[*] Um botão "não me lembre novamente".

[*] botão Minimize.

[*] Possibilidade de deletar o arquivo "dor de cabeça"

[*] a opção de desinstalação da versão 2.0 sem perda de outros

recursos de sistema.

[*] Uma opção de rodar o driver de rede em "promiscuous mode",

permitindo que o teste de hardware seja muito mais útil/eficiente.

Eu mesmo havia decidido evitar todas as dores de cabeça associadas

com Esposa 1.0 mantendo Namorada 3.0 instalado. Mesmo assim,

entretanto, eu encontrei muitos problemas. Aparentemente você não

pode instalar Namorada 4.0 em cima de Namorada 3.0. Você tem que

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desinstalar Namorada 3.0 primeiro, caso contrário as duas versões

de Namorada terão conflitos por compartilhar o mesmo carnal do

I/O. Outros usuários disseram-me que isto era um problema de

solução demorada e que eu deveria estar ciente dele. Suponho que

isso explica os problemas que eu tive com as versões 1.0 e 2.0.

Para dificultar ainda mais as coisas, o programa de desinstalação de

Namorada 3.0 não funciona muito bem, deixando vestígios

indesejáveis da aplicação no sistema. Outro problema identificado é

que todas as versões de Namorada emitem irritantes mensagens sobre

as vantagens de migrar para Esposa 1.0!

ALERTA SOBRE BUG: Todos os usuários deveriam ser notificados

que Esposa 1.0 tem um bug não documentado. Se você tentar instalar

Amante 1.1 antes de desinstalar Esposa 1.0, Esposa 1.0 irá deletar

todos os arquivos de MS-Money antes de fazer a sua própria

desinstalação.

Uma vez que isso acontece, Amante 1.1 não será instalado e dará

uma mensagem de erro "recursos insuficientes". Evite o bug

mencionado, tentando instalar Amante 1.1 num sistema diferente e

nunca rodar qualquer aplicação de transferência de arquivo (tal

como Laplink) entre os dois sistemas.

PARA SUA INFORMAÇÃO: nem pense em usar um diretório

compartilhado!

O texto mostra uma visão crítica, apresentando desde o título MIGRANDO PARA

ESPOSA 1.0 grande número de vocábulos e expressões ligados à área da Informática.

O tom irônico é dado tanto pelo acúmulo de termos como pela combinação desses

vocábulos e expressões:

- sistema comedor de memória

- transferência de arquivo,

- mensagem de erro,

- tentar instalar Amante 1.1 antes de desinstalar Esposa 1.0

- Esposa 1.0 irá deletar todos os arquivos de MS-Money

- antes de fazer a sua própria desinstalação.

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Cabe ressaltar que as frases acima são apenas um texto alegórico e, que os termos

sublinhados são de uma determinada área, porém podem ser utilizados em outros ambientes.

1.3.2 Linguagem popular

São freqüentes na linguagem do dia-a-dia as criações populares de novos vocábulos e

de metáforas. A linguagem popular apresenta exemplos destas criações, como em frescão,

dedo-duro, orelhão. A inovação vocabular de base popular constitui "o esforço do povo para

compreender a formação das palavras que usa" (Pisani, 1960 citado por Benveniste, 1989),

como ocorre nos casos de etimologia popular.

Os trechos seguintes, retirados de revista e jornais, mostram essas criações populares.

A atriz L. L. e o empresário E. C. foram assaltados por um pivete.

Leila ficou possuída de raiva e queria ir à delegacia, o marido adotou

o "deixa pra lá, querida". Por incompatibilidade de atitude crimino-

conjugal, o casal discutiu. O barraco chamou a atenção de policiais

que passavam pelo local." (Revista Veja, 01/10/97)

Dez dos maiores empresários do planeta almoçarão com o presidente

FHC no próximo dia 8. (...) Quem fez os convites para o rega-bofe foi

o ex-secretário americano Henry Kissinger, lobista profissional.

(Revista Veja, 01/10/97)

Sinal de alarme na maior livraria do país: a Ática Shopping Cultural

de São Paulo, onde se registra um prejuízo de mais 40 milhões de

reais. Preocupadas com o buraco, as editoras Ática e Scipione, que

bancam o negócio, puseram na geladeira o diretor A.N. Youssef.

(Revista Veja, 01/10/97)

Bolha era a palavra à espera de uma boa oportunidade de entrar em

cena, depois que adotou significados complementares que a

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habilitaram a funções oficiais. No governo passado, bolha era o que

sempre foi, como substantivo ou como adjetivo. (...) Qualificar de

bolha um governante faz pouco mas não ofende. O substantivo é

muito pior. (...) Bolha, com a vênia do dicionário, é vesícula que se

forma à superfície da pele por efeito de queimadura. (JB, 10/06/90)

Wilson Figueiredo.

A idéia é legal. O Planetário da Gávea, a partir deste mês, promove

debates sobre temas da atualidade acoplados a pequenas encenações

teatrais. O público alvo são os estudantes do 2o grau e a promoção-

cabeça recebeu um título duvidoso: Chega mais - Talk-teen. Chega

mais até que passa. É uma expressão antiga, tem pouco a ver com

estudantes de 2o grau de hoje, mas é simpática. Agora, - Talk-teen? O

que é isso? Papo jovem? Por que não Papo jovem, então? Os leitores

menos preocupados com os males da descaracterização do nosso

idioma podem achar que o colunista está exagerando. Bem, a

promoção é da Fundação Planetário, da Rioarte/Secretaria

Municipal de Cultura e, em última instância, da Prefeitura do Rio de

Janeiro. Se uma Secretaria de Cultura não se preocupar com a

preservação da língua portuguesa, quem é que vai se preocupar?

(JB, 05/10/97 - coluna de Artur Xexéo)

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CAPÍTULO II

A DICOTOMIA EMPRÉSTIMO/ESTRANGEIRISMO

Segundo o neogramático Hermann Paul (1983:412), “a palavra de origem estrangeira

só gradualmente se torna habitual”. Essa idéia, já antiga, ainda hoje é bastante difundida,

razão pela qual grande parte dos autores dedicados ao estudo do empréstimo lingüístico

propõem uma diferenciação entre empréstimo propriamente dito e estrangeirismo. (As

designações xenismo e peregrinismo também são usadas.)

Em linhas gerais, o primeiro conceito refere-se às unidades lexicais, de alguma forma,

já integradas ao novo ambiente, enquanto o segundo diz respeito àquelas francamente

alienígenas, ainda não incorporadas ao léxico da língua recebedora. Na prática, tal divisão

revela-se problemática em algumas situações, pois variados e subjetivos são os critérios

passíveis de utilização no seu estabelecimento.

Como se sabe, durante muito tempo, a tradição filológico-gramatical luso-brasileira

identificou o termo estrangeirismo com um vício de linguagem. Tratava-se de fator de

empobrecimento lingüístico. Essa noção, de certa maneira, resiste até hoje, como o trecho

abaixo é capaz de comprovar. Nele, estrangeirismo é assim definido: “Palavra ou expressão

de origem estrangeira cujo uso é um dos erros contra a vernaculidade da nossa língua, e só

poderá ser aceite se não existir na língua portuguesa um vocábulo que traduza essa mesma

idéia” - Rocha (1997: estrangeirismo). O desenvolvimento dos estudos lingüísticos, no

entanto, colocou o estrangeirismo em outro patamar, freqüentemente em confronto com o

empréstimo.

Nesse sentido, discutir aspectos relevantes da dicotomia empréstimo / estrangeirismo,

especialmente no que se relaciona ao Português do Brasil, é o objetivo central desta

monografia, realizado a partir da comparação de autores relevantes ligados ao tema.

2.1 O Estrangeirismo como Recurso Estilístico

A busca de exotismo, de “cor local”, de originalidade ou de expressividade pode,

algumas vezes, ensejar a utilização de material léxico estrangeiro, configurando, segundo

Guilbert (1985:92), um caso de xenismo, “sinônimo erudito de estrangeirismo” - Assumpção

Jr. (1986:106).

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Por xenismo deve-se entender, além dos nomes próprios de pessoas, de lugares, de rios

e de cidades, todos os itens lexicais de cunho marcadamente estrangeiro ou, de algum modo,

citados, designativos de algo próprio e característico de outra cultura ou ainda aqueles

utilizados em sua forma alógena intencionalmente pelo falante.

Não raro, nesse emprego de elementos estranhos existe um desejo consciente de

remissão a outra realidade, motivo pelo qual os xenismos costumam conservar a grafia do

idioma de origem, o que pode deixar de ocorrer quando as línguas em questão apresentam

estruturas muito diferentes.

Crystal (1997:350) salienta ainda a questão do prestígio como fator motivador para o

uso de palavras estrangeiras, característica presente em várias sociedades ao redor do planeta .

O emprego de unidades lexicais alienígenas de maneira apelativa constitui recurso

utilizado tanto pela literatura quanto pela imprensa, “a fim de que o leitor tenha uma idéia não

somente das coisas evocadas, mas também das palavras que as designam” - Guilbert

(1975:92-3) -, sendo comum também na língua geral. Essa propriedade do estrangeirismo é

igualmente assinalada por outros autores, como Alves (1990:72-3) e Martins (1997:81), que

justifica o uso desses elementos também nos casos em que “a palavra estrangeira, pela sua

constituição sonora, parece mais motivada que a vernácula”.

A imprensa brasileira é pródiga em empregos estilísticos de estrangeirismos. Seguem-

se alguns exemplos ilustrativos, extraídos da imprensa escrita: “winter sale - até 50% de

desconto” (O Globo, 17/07/99, p.17), campanha publicitária de loja de roupas; “O ‘enfant

terrible’ chamado Alain Delon” (Jornal do Brasil, Caderno B, 09/07/99, p.2), título de artigo

acerca de mostra cinematográfica com os principais filmes do ator francês; “O padre contou

detalhes da love story dos noivos e explicou o ritual do sacramento” (O Globo, Segundo

Caderno, 06/07/99, p.3), trecho de coluna social assinada pela jornalista Hildegard Angel;

“Sabor da Paixão traz no elenco a espanhola Penélope Cruz e o brasileiro Murilo Benício,

ambos estreantes em Hollywood. Mostra lindas paisagens de Salvador e tem enredo caliente”

(Revista Época, 23/10/00, p.110) e “A TV estatal alemã ZDF divulgou fotos inéditas de um

álbum da amante de Hitler, Eva Braun. (...) Em algumas cenas, Eva é vista ao lado do Führer,

mas, na maioria das fotos, está sozinha - cozinhando ou descansando perto de um lago”

(Época, 11/12/00, p.32).

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2.2 Estrangeirismo, Xenismo e Peregrinismo

Se, por um lado, existem autores que aproximam os conceitos de estrangeirismo,

xenismo e peregrinismo - cf., nesse sentido, Deroy (1986:224) -, por outro, há estudiosos que

apontam diferenças entre os termos.

Carvalho (2000:196) define peregrinismo como a “primeira fase de aceitação” da

unidade lexical alógena e xenismo como “o termo importado [que] permanece na grafia

original (mesmo muito usado)”.

Em outra ocasião, a mesma autora (1989:43-4), lembrando a dicotomia saussureana

langue/parole afirma ser o estrangeirismo um elemento pertencente à parole, isto é, de

emprego individualizado, ainda não socializado. Já os xenismos seriam aquelas “palavras que

permanecem na forma original, apesar da grande freqüência de uso”. Inclui nesse grupo os

nomes próprios de pessoas, países etc, além daqueles designativos de “realidades locais sem

correspondência nas demais culturas”.

Bechara (1999:599), embora também faça menção às duas categorias, afirma que de

modo geral, os estrangeirismos léxicos se repartem em dois grupos: os que se assimilam de tal

maneira à língua que os recebe, que só são identificados como empréstimos pelas pessoas que

lhes conhecem a história (...); mas há os que facilmente mostram não ser prata da casa, e se

apresentam na vestimenta estrangeira (...) ou se mascaram de vernáculos (...). O termo

empréstimo abarca essas duas noções.

Em Azeredo (2000:72-3), aparecem os termos estrangeirismo, empréstimo e xenismo.

Pelas palavras do autor, intui-se que o fato de estes últimos conservarem a grafia original é o

que os diferencia dos dois primeiros: “muitos estrangeirismos foram aportuguesados,

mediante adaptações mórficas, fonéticas e claro ortográficas (...); outros, no entanto,

empregam-se na ortografia original, os xenismos”.

O conjunto das palavras do português isto é, seu léxico consiste, portanto, na

união de três grandes grupos de formas: a) as palavras herdadas do latim, b) as palavras

provenientes de outras línguas antigas e modernas os empréstimos, entre os quais se

incluem os xenismos , e c) as palavras formadas com os recursos morfológicos produtivos

da língua em cada fase de sua existência.

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2.3 De Estrangeirismo a Empréstimo

O fato de se poder incluir as palavras estrangeiras adotadas por um idioma em dois

grupos distintos (grosso modo, empréstimos e estrangeirismos) é, de certa forma, consenso

entre os estudiosos. As divergências começam, como se viu anteriormente, no momento em

que se tenta distribuir os itens lexicais externos nas duas categorias.

Tal dificuldade foi salientada por Deroy (1986:224), ao explicitar que “a rigor e

teoricamente, os peregrinismos poderiam ser excluídos de um estudo dos empréstimos. Na

prática, isso seria irrealizável, pois não é possível traçar um limite entre as duas categorias”.

Guilbert (1985:96-8) apresenta alguns critérios capazes de comprovar a instalação de

itens lexicais estrangeiros no sistema lingüístico receptor, procurando oferecer parâmetros

para a definição de quando um lexema externo deixa de ser estrangeirismo e passa a ser

empréstimo. Os principais situam-se nos níveis morfossintático e semântico, uma vez que

palavras já naturalizadas também podem, em algumas circunstâncias, ser proferidas de acordo

com a pronúncia da língua de origem, invalidando, assim, o critério fonológico.

Basear-se simplesmente na ortografia igualmente não é muito seguro. Muitos itens

lexicais, cujo caráter alógeno não é mais atestado nem mesmo pelos dicionários da língua

receptora, são escritos, vez por outra, com a grafia do idioma de onde provêm, inclusive em

função de fatores estilísticos.

No que respeita à morfossintaxe, boa evidência de integração encontra-se nos casos

em que a palavra estranha funciona como matéria-prima para novas formações vocabulares,

realizadas por meio de processos como a derivação, a composição e a palavra-valise. Isso

pode ocorrer ainda que a adaptação ortográfica não se tenha dado (cf. funkeiro, jazzístico,

voyerismo, bluesista, skatista, kartista e showmício). Às vezes, a adaptação incipiente ou

mesmo ausente na forma que serve de base aparece nas unidades lexicais forjadas a partir dela

(cf. lobista < lobby, estandardização < standard e roqueiro < rock) .

Do ponto de vista semântico, sinal de incorporação ao novo ambiente pode ser

percebido quando a expressão estrangeira perde o caráter monossêmico e referencial do

momento de entrada e adquire novas possibilidades de emprego. Assim, o termo round,

inicialmente ligado ao universo do boxe, já aparece em construções como estas: “Indústria do

fumo perde o 1o round” (Jornal do Brasil, Ciência, 09/07/99, p.10) e “Marítima vence novo

‘round’ contra Petrobras” (O Globo, Economia, 19/02/00, p.33). Do mesmo modo, show

expandiu seu sentido original, isto é, “espetáculo”, “apresentação artística” e hoje já é usado

como sinônimo de “escândalo”, por exemplo, na frase, “ela deu o maior show diante de

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todos”. Upgrade, expressão da área da informática, também já alcançou outros domínios,

como em: “Os amigos de Nelsinho Motta a-do-ram ouvir do próprio a seguinte história:

Quando chove em Nova Iorque, ele compra um guarda-chuva bem baratinho, entra num

restaurante e, na hora de ir embora, faz um upgrade: escolhe o mais charmoso e leva para

casa” (Jornal do Brasil, Caderno B, 07/07/99, p.3). Mencione-se ainda o caso de pitbull,

palavra designativa de feroz raça canina, a qual já pode ser vista em construções como a

seguinte: “A nova desordem metálica de uma banda ‘pitbull’ ” (tít.) (O Globo, Segundo

Caderno, 06/07/99, p.2) .

Alves (1990:79) lembra ainda o fato de que “o emprego freqüente de um

estrangeirismo constitui também um critério para que essa forma estrangeira seja

considerada parte componente do acervo lexical português”. A esse respeito, cita o

substantivo jeans, “unidade lexical tão usada contemporaneamente, parece-nos já adaptada à

língua portuguesa e manifesta-se, por isso, como um empréstimo ao nosso

idioma”.

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CAPÍTULO III

A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA INGLESA NO PORTUGUÊS

Atualmente, discute-se muito o fenômeno da globalização e sua influência na vida das

pessoas. Com o aumento das relações comerciais entre os países e da facilidade de

comunicação entre eles, através da televisão a cabo, das ligações internacionais e da Internet,

ficamos cada vez mais expostos a novos termos e expressões de origem estrangeira.

No passado, o uso de palavras estrangeiras costumava ocorrer quando não existia um

equivalente em português que definisse o que se queria dizer ou quando se desejava

demonstrar cultura ou superioridade em relação àqueles que usavam termos apenas em

português.

Hoje, o emprego de palavras inglesas ("anglicismo") misturadas ao português tem-se

tornado cada vez mais comum e parece ter virado moda. Devido à grande influência

econômica e cultural norte-americana, diariamente ficamos em contato com a língua inglesa.

Como conseqüência, nos acostumamos a usar várias palavras que não são traduzidas, mas

que, pelo seu uso constante, acabam sendo compreendidas até por quem não fala inglês.

O inglês já vem sendo normalmente usado nos mais variados meios: na informática,

nas finanças, no comércio, nas telecomunicações e principalmente nos negócios.

Na área da computação, por exemplo, várias palavras já foram traduzidas para o português,

como "salvar" ou "formatar". Algumas permaneceram inalteradas, como "off-line",

"software" e "hardware", enquanto outras foram adaptadas e até criadas, como "deletar"

(apagar), "printar" (imprimir), "estartar" (iniciar) e "atachar" (anexar)... Apesar de não

constarem dos dicionários, são empregadas normalmente, de maneira correta ou não, pelos

usuários de computadores, que acabam se entendendo perfeitamente.

Em negócios, várias palavras são comumente empregadas em sua forma original, sem

tradução, tais como:

- Benchmark = indicador importante que pode ser usado como referência para a comparação

de valores

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- Breakeven = ponto de equilíbrio, onde não há lucro ou prejuízo, pois custos se igualam às

receitas

- Budget = orçamento

- Cash flow = fluxo de caixa

- Commodities = mercadorias padronizadas, comercializadas em grandes volumes

- Deadline = prazo final, data limite

- Feedback = informações enviadas de volta em resposta a uma solicitação

- Follow-up = acompanhamento

- Funding = provisão de recursos para despesas

- Headhunter = pessoa de recursos humanos que recruta executivos para companhias

- Headquarter = sede, matriz

- Overhead = despesas gerais de fabricação, DGF

- Player = participante envolvido ativamente em um ramo competitivo de mercado

- Staff = equipe, grupo de funcionários ou assessores

- Target = alvo, objetivo

- Warehouse = depósito, armazém

Também no meio financeiro, o uso de termos em inglês, sem tradução, é amplo:

- Blue chips = ações de primeira linha, de grande liquidez e baixo risco

- Bonds = notas promissórias emitidas por governos, bancos ou empresas

- Commercial papers = títulos negociáveis emitidos por bancos ou empresas no exterior

- Float = ganho bancário com a aplicação do dinheiro que os clientes deixam em conta

- Hedge = proteção contra riscos de oscilações do mercado

- Holding = empresa que detém o controle acionário de outras companhias ou de

investimentos

- Rating = classificação do risco de crédito

- Small caps = ações de segunda linha, de baixa liquidez e maior risco

- Spread = diferença entre o custo da captação e dos empréstimos

- Swap = troca de ativos (bens, moedas, taxas de juros, etc.)

As línguas modernas não podem permanecer estáticas e fechadas, elas precisam se

atualizar continuamente. Incorporar termos estrangeiros faz parte deste processo de evolução

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natural. Ao se adequar às necessidades e mudanças do momento, elas se tornam mais claras e

objetivas.

Porém, abusar do uso de estrangeirismos sem necessidade real, por considerar que

com isto se está sendo chique ou demonstrando saber, acaba, ao contrário, sendo um sinal de

ignorância, pedantismo e desprezo pelas origens. Quando existirem termos equivalentes

igualmente simples e elegantes no português (o que ocorre na maioria das situações),

podemos usá-los sem medo de perda de status, eficiência ou charme.

Traduzir todos os termos do inglês para a língua nativa também parece não ser um

bom negócio. Os franceses, por exemplo, são historicamente reconhecidos por sua aversão à

língua inglesa e pela defesa voraz da cultura gaulesa. Esta atitude nacionalista pode provocar

situações curiosas.

3.1 Empréstimos da língua inglesa no vocabulário português

É ainda no século XIX que a língua inglesa começa, aos poucos, a introduzir-se. São

inglesas as primeiras grandes empresas que vão instalar os serviços públicos brasileiros, tais

como o transporte urbano e interurbano e comunicações. É dessa fase a introdução de algumas

palavras inglesas que, aportuguesadas, têm hoje uso corrente na língua, como é o caso de

chulipa, que outra coisa não é senão o nosso prosaico dormente. A palavra em inglês —

sleeper —, ouvida pelos operários brasileiros, soava simplesmente chulipa e assim passou a

ser repetida.

É a partir da Segunda Guerra Mundial, no entanto, que a língua inglesa vai começar a

influenciar diretamente o português. Só que essa predominância, agora, se dá sob a

hegemonia dos Estados Unidos pela ação das multinacionais cuja expansão tecnológica,

econômica e lingüística se processa de modo acentuado. A esse dado, some-se a circunstância

de a economia brasileira ser de base essencialmente agrícola, já que a industrialização no

Brasil se deu somente após o ano de 1930.

Fica extremamente fácil perceber as razões pelas quais, após 1950, vai-se acentuar a

preponderância da língua inglesa na vida brasileira. Não só a tecnologia que traz o avanço de

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que o Brasil carece, mas, sobretudo, uma linguagem peculiar que acompanha um

conhecimento teórico ou prático.

Os empréstimos lingüísticos, com o sentido moderno da expressão, passam a ser uma

realidade na língua portuguesa, a ponto de serem integrados ao léxico. Se na primeira metade

do século XX a luta contra os galicismos era uma questão de suma importância para a

conservação do purismo lingüístico português, a partir do final do século será a informática a

ciência que irá contribuir com o maior número de palavras inglesas para a língua portuguesa,

gerando, como se sabe, toda a sorte de manifestações.

‘’A dominação da língua por modelo estrangeiro abre a mente e até

mesmo a alma do cidadão a todas as outras formas de

dominação. Pela língua domina-se o pensamento do homem, pois à

força de tanto se repetirem palavras de idioma estrangeiro acaba-se

por assimilar os costumes deste outro povo, seus modos de vida, suas

preferências.’’ (Rocha, 2000, p. 11).

- O aportuguesamento de palavra estrangeira

É tão comum a influência entre as línguas que, mesmo num corpus sumamente restrito

quanto o apresentado, as palavras turista, do inglês tourist (através do francês touriste),

magazine, do inglês magazine (através do francês magasin ou do italiano magazzino), e

repórter, do inglês reporter, (através do francês reporter) evidenciam esse processo natural

entre os idiomas que é a ação de uma língua sobre a outra.

Vejam que estamos usando estrangeirismos. A diferença é essas palavras já estão

aportuguesas e entraram no processo da língua naturalmente. Em relação à língua inglesa,

pode-se fazer uma relativa sistematização fonética, apenas como amostragem, comparando-se

palavras já aportuguesadas (e dicionarizadas) com outras de uso corrente na língua visando a

um possível aportuguesamento:

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Grafia

Inglês

Repres.

Do som

Grafia

Português

Palavra

Inglesa

Palavra

aportug.

Palavra nova

inglês português

/a/ /a/ /a/ Staff Estafe parking párquin

/a/ /é/ /e/ Back Beque playback pleibeque

/a/ /ei/ /e/ Raid Reide baby-dol beibidol

/ee/ /i/ /i/ Jeep Jipe cofee-

break

cofibreique

/i/ /i/ /i/ Ring Ringue bit bite

/o/ /a/ /a/ lockout Locaute body-

board

badiborde

/oo/ /u/ /u/ shampoo Xampu book-

maker

buquemêiquer

/oy/ /ói/ /ói/ cowboy Caubói bad-boy bedibói

/u/ /a/ /a/ pickup Picape blow up blouape

O que se quer mostrar é a possibilidade de encontrar palavras semelhantes e fazer o

aportuguesamento pelo processo de aproximação. Os empréstimos lingüísticos, se, por um

lado, obedecem ao sistema fonográfico da língua, por outro, recebem o tratamento adequado

ao modo como se pronunciam, no Brasil, certos fonemas, especialmente da língua inglesa,

para os quais não há uma exata correspondência em português.

As eventuais reações a esse procedimento esbarram em certas palavras já

aportuguesadas para as quais a aproximação fonética é discutível. Elas têm transliterações

diferentes.

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3.2 A americanização da Língua Portuguesa

Um exemplo que confirma a hegemonia do inglês, é citado por Magalhães:

‘’A ONU adota seis línguas para suas traduções oficiais

(inglês, francês, espanhol, russo, árabe e chinês).

O inglês e o francês são considerados idiomas de trabalho!

Na prática, porém, 90% dos documentos preparados pela

Secretaria Geral da entidade são redigidos apenas em inglês.’’

( Magalhães, 1999, p. 4 )

Observando esses dados, podemos nos perguntar: existe mesmo o processo de

americanização das línguas? Esse fenômeno pode levar a extinção das línguas dos países

economicamente mais dependentes?

A presença no português do Brasil dos chamados estrangeirismos, principalmente os

de origem inglesa (anglicismos), reflete a condição de país economicamente dependente de

capital estrangeiro, principalmente americano. Essa dependência econômica é-nos mostrada

por Gonçalves (1999):

‘’...a economia brasileira apresenta um dos mais elevados graus

de internacionalização da produção por meio da presença de

empresa de capital estrangeiro no aparelho produtivo do país.

( ...) Em período de três anos (1996 - 98), o Brasil experimentou a

penetração do capital estrangeiro como nunca antes de toda

a sua história.’’( Gonçalves, 1999, p. 14 )

O mesmo autor mostra que no período entre as duas guerras mundiais já se podia

notar uma presença significativa do capital externo:

‘’Empresas norte-americanas tinham investimento nas indústrias

de alimentos, equipamento ferroviário, lâmpadas...’’

(Gonçalves, 1999, p. 55).

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Portanto o inglês tem grande influência no português falado no Brasil, desde o início

do processo de industrialização, década de 30. Hoje, com a globalização, a entrada de

palavras e expressões inglesas tem sido exagerada. Basta ler placas de lojas, bares, folhetos de

bancos, cursos etc. Daí o tema ser debatido em jornais, emissoras de TV, revistas.

O que se observa no caso do português do Brasil é que muitas vezes, as palavras

estrangeiras que vêm, em sua maioria, dos Estados Unidos não têm sido aportuguesadas.

Como já foi dito neste artigo, isso vem ocorrendo desde a segunda metade do século XX, com

a entrada do Brasil e dos demais países do Terceiro Mundo na era industrial. Com a vinda das

multinacionais, determinando a dependência política, econômica e tecnológica, o modo de

vida brasileiro e, em conseqüência, a língua materna foram assimilando elementos ' Made in

USA'.

‘’No relacionamento entre o Brasil e Estados Unidos

(país pobre X país rico) os termos e formas lingüísticas

são adotados tomando como modelo a língua do segundo.

Ao usar leasing, royalty, management, o falante parece

sentir-se transitar na esfera do poder político e econômico.’’

(Carvalho, 1989, p. 55)

É na economia e na informática que se sente a presença do domínio inglês no

português no Brasil. Nessas áreas - é importante que se ressalte -, a influência americana é

visível, visto que, como já foi dito, a economia brasileira depende da americana. É de lá que

vem o dinheiro/capital e é de lá também que vêm as palavras sob a mesma forma: 'overnight',

'holding', 'lobbies', 'megabytes', 'on-line' , 'site', 'mouse' etc.

É claro que, ao se utilizar de uma terminologia técnico-científica de uma outra

língua, não se pode negar o caráter ideológico, isto é

‘’A criação do termo é elaborada por uma classe privilegiada

que detém não apenas o poder econômico, mas também o

saber e o direito de nomear o objeto (...), o produto se torna

veículo de propaganda em favor da língua do país produtor

não somente por sua denominação, mas ainda pelo discurso

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que o acompanha, isto é, por ser um modo de emprego, pelo

conjunto de serviços de que necessita(...). Assim se criam,

através do fator econômico, os instrumentos de prestígio e

dominação de uma língua sobre outra, dando condições de

penetração a termos estrangeiros.’’ (Carvalho, 1989, p. 60)

É esse caráter ideológico e a fascinação de grande número de brasileiros pelos

Estados Unidos, e, conseqüentemente, por sua cultura, incluindo-se aí a língua, que podem

gerar o fim da língua portuguesa. Essa possibilidade não pode ser desconsiderada, visto que

muitas línguas desapareceram ao longo da história:

‘’... a afirmação da neutralidade da tecnologia e da ciência

por si mesma é uma afirmação profundamente política e

absolutamente ideológica. Para ele, a propalada neutralidade

é inexistente, pois quem comanda o progresso são os países

dominantes. A todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia,

na acepção ampla do termo. A neutralidade é apenas um mito.

O discurso que se pretende neutro tem sua própria ideologia:

a objetividade'. (Carvalho, 1989, p. 59)

Assim, através do poder econômico, se criam os instrumentos de prestígio e

dominação de uma língua sobre a outra.

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CONCLUSÃO

Acompanhando a história de nossa língua, pode-se perceber que já recebemos palavras

de muitas outras línguas. Isso aconteceu porque o português (desde a época do império

romano até o descobrimento do Brasil) e o brasileiro (desde o descobrimento até os nossos

dias) entraram em contacto com outros povos.

Isso acontece quando a cultura de um povo é muito valorizada. Os outros povos com

quem eles entram em contacto passam a valorizar os hábitos, a língua, as artes, a literatura,

tudo que é produzido naquela cultura.

Sabemos, também, que há diferentes maneiras de estabelecer esse contacto: a

dominação militar, a dominação econômica, a dominação religiosa, a dominação cultural, a

vizinhança, a convivência no mesmo espaço são algumas delas.

No caso do português europeu, a influência das línguas árabes foi por dominação

militar, mas a influência do grego foi causada pelo reconhecimento de sua produção cultural.

No caso do português brasileiro, a influência das línguas africanas e indígenas foi por

convivência, mas a influência do inglês vem sendo cada vez mais forte por causa da

dominação econômica americana.

O caminho estrangeirismo a empréstimo, nem sempre, é percorrido de maneira

previsível. Não se pode exigir que um item lexical estrangeiro apague, de um momento para o

outro, todo e qualquer vestígio de sua proveniência alógena. Em muitos casos, bem antes

disso, esse elemento já esta interagindo com o restante do léxico, colocando-se à disposição

dos falantes para novas criações vocabulares ou semânticas. Na verdade, em certas situações,

a naturalização completa poderá nem vir a ocorrer.

O termo estrangeirismo, também foi observado, ainda apresenta identificação com

vício de linguagem e, na fase atual dos estudos lingüísticos, seria mais bem empregado se

fizesse referência aos itens léxicos usados expressivamente ou àqueles designativos de

elementos característicos de outras realidades lingüístico-culturais, que, na maior parte das

vezes, não têm a pretensão de alojar-se no léxico da língua receptora.

As palavras estrangeiras que são muito usadas por nós passam por tantas mudanças

que, algum tempo depois, começamos a considerá-las como palavras portuguesas, esquecendo

que elas vieram de outras línguas. Mudamos a maneira de pronunciá-las, mudamos a maneira

de escrevê-las, colocamos desinências de plural ou de feminino (quando são substantivos ou

adjetivos), de passado ou de futuro (quando são verbos), por exemplo.

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Deve-se combater o uso dos estrangeirismo semânticos e sintáticos, que denunciam

atitudes esnobes ou subservientes do seu usuário, porque não existe nenhuma idéia ou

construção em outra língua que não tenha seu equivalente em língua portuguesa, mas é

importante que não se tenha uma visão radical contra o estrangeirismo lexical. O adstrato

existe porque existe o intercâmbio cultural entre países de línguas diferentes. Até mesmo o

número de estrangeirismo que havia em excesso no século passado e que motivaram reações

iradas de nacionalistas estudiosos como Cândido de Figueiredo, Castro Lopes ou Carlos Góis,

já diminuiu sensivelmente, seja pela sua total adaptação à língua, seja pela introdução de

neologismos que os substituíram.

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GLOSSÁRIO

Body: já foi collant, nos anos 70. É uma blusa-maiô

Brand: marca

Mainstream: corrente principal

Press: imprensa

Sponsor: patrocinador

Street (de streetwear ): estilo usado nas ruas

Target: alvo, faixa de consumo

Trend: tendência, palavra que caiu em desgraça entre os modernos

Sale: liquidação

Beach soccer: futebol de areia

Hype: objeto ou tendência que está sendo muito comentado

Standing: convite em pé, ou sem lugar marcado

Doorwoman: mulher que fica na entrada da casa noturna recebendo/selecionando o

público; porteira

Stretch: elástico

Tattoo: tatuagem

Piercing: furo na orelha, no nariz, no mamilo, ou em outra parte do corpo

Bike: bicicleta

Styling: Produção de peças para desfile ou fotos feita pelo stylist

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ANEXOS

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HAVE A SALE? GOOD FOR YOU!

Marcelo Rubens Paiva

Wonderful, mammy. São Paulo é show. Estou com meus brothers num shopping que é o

must. Assim de teen com sex appeal. Assim de sales: 15% off, em média.

Dizem que é por causa do crash do stock market de Hong Kong. Sabe como é: os

comunistas não tem know-how para free market...

Avise ao daddy que usei o Mastercard dele. Entrei numa loja no lobby com layout bem

cool - todo de neon. Comprei jeans, um coat com zíper, um tennis shoes e uma T-shirt de

náilon do Chicago Bulls. Os office boys andam the skates e rollers pela loja. Ah, meu

pager quebrou, droga!

Fiz um haircut e, later, comprei uns compact discs: Viper, aquele que era underground,

Carlinhos Brown, daquele clipe bem doido, Chico Science, do mangue beat, e Planet

Hemp, do hit ''Free... Cannabis free...''.

Tem tudo na loja. Tem punk, tecno, hiphop, rap, dance, jazz, funk e muito rock. Sei bem

que o meu CD player está out. Mas posso usar o auto reverse com surround do Júnior.

Ele ia adorar uma store que sells hard and softwares. Tem chips, hard discs, mouses,

pads, keyboards, wires, tudo plug and play para o Windows 95, bem em conta.

Tá na hora de ele fazer um upgrade no laptop, passar um scan, formatar para acessar a

Internet e conectar um monitor de 17 inches, tipo energy pollution preventers, não é?

No playground, tem um outdoor lindo; um nocaute. Vamos fazer um piquenique nele e

jogar vôlei. Antes que eu me esqueça, vocês fixed minha colored printer?

Tem uma drugstore que vende stress tabs. Comprei um bandeide, pois tinha machucado o

dedo, quando tropecei num estande meio new age que vende no breaks.

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Tinha um junky free-lancer cheio de piercings que ficou me flertando seria barrado num

antidoping. Ficou me perguntando sobre meus hobbies. Queria me levar pro flat dúplex

dele. Deve ser aquela coisa bem kitsch, com hall e living espelhados. Mas, happy end, tive

um feeling e dispensei o cara com class.

Na bookstore, cheia de best-sellers, comprei uma revista de design e um livro de

marketing pro daddy. Fiquei folheando uns cartuns. Teve um blecaute na cidade. Então

fui fazer um lunch que vai me deixar bem fat. Rosbife com potatos, muito ketchup e uma

salad bowl. Dessert: short cake. Mas meus brothers diziam: ''Relax, coma à vontade...''

Então, relaxei e pedi um frost iogurte. Mas só tomei Coca light. Ainda fomos para um

happy hour, tomar um drinque num pub. Foi um happening.

A agenda está cheia the meetings. After, we played snooker. I won. Yes, I am the best

among my friends. Depois, on the road! We took a bus to a beach where we have surfed

for hours and hours.

É show. I'm missing you. Não se preocupe que passei Sundown. Na volta, levamos uma

blitz dos homens, que nos levaram para uma espécie de bunker no meio da jungle porque

acharam um pôster do Planet. Pediam dolars.

Kiss. I love you...

PS: Não se esqueça de pagar minha aula de português do Berlitz, o que eu acho uma

bobagem, mas vocês insistem tanto...

Folha de São Paulo, COTIDIANO Página: 3-2 , 23/11/97