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Um discurso sobre as ciências Boaventura de Sousa Santos Ângelo Rezende Luís Cruz

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Page 1: Um discurso sobre as ciências Boaventura de Sousa Santos Ângelo Rezende Luís Cruz

Um discurso sobre as ciênciasBoaventura de Sousa Santos

Ângelo RezendeLuís Cruz

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1. Autor e Obra

• Nasceu em Coimbra-Portugal, em 15 de Novembro de 1940.

• Doutor em Sociologia do Direito pela Universidade de Yale (1973), Professor

Catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra,

Distinguished Legal Scholar da Universidade de Wisconsin-Madison e Global

Legal Scholar da Universidade de Warwick.

•Autor de mais de 0 livros em português, inglês, francês, espanhol e italiano.

•Temática: Epistemologia, sociologia do direito, teoria pós-colonial,

democracia, interculturalidade, globalização, movimentos sociais, direitos

humanos. www.boaventuradesousasantos.pt

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2. Panorama sobre a modernidade

2.1 Modernidade: Projeção utópica da humanidade baseada no equilíbrio

dinâmico dos pilares da regulação e emancipação entre conhecimento,

poder e direito. O direito como “mudança social normal”.

2.2. Transição paradigmática e Pós-Modernidade: Hipertrofia do pilar

regulatório (tecnologia, capitalismo global e mudança social normal).

Reinventar a utopia, transformando-a em heterotopia (a transformação do

nosso mundo pelo resgate dos conhecimentos marginais). Primazia do

conhecimento-emancipação.

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3. OBJETIVOS DE “UM DISCURSO SOBRE AS CIÊNCIAS”

3.1 Reflexão crítica sobre as características fundamentais do paradigma

teórico dominante da ciência:

1) Teoria representacional da verdade;

2) Privilégio das explicações causais da realidade (leis científicas);

3) Dissociação rígida entre ciências naturais e ciências humanas;

4) Limites do rigor científico;

5) Objetividade X Neutralidade.

3.2 Análise da crise da ciência produzida sob o paradigma dominante.

3.3 Esboço dos contornos do paradigma científico que nasce da transição

paradigmática.

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 3. OBJETIVOS DE “UM DISCURSO SOBRE AS CIÊNCIAS”

3.4. Contexto de Transição Paradigmática – aprofundamento da ciência leva

ao questionamento e à transformação científica.

3.5. Incerteza e perplexidade levam ao retorno das questões simples:

Russeau – o progresso da ciência e das artes contribuirá para purificar ou

corromper os nossos costumes?

• Do Século XVIII ao Século XX - Qual o progresso científico que

queremos?

• O filtro das ciências enriquece ou empobrece as nossas vidas?

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4. CARACTERÍSTICAS DO PARADIGMA DOMINANTE

 4.1. Pretensão totalitária – Nova visão de vida e do mundo empunhada por

Copérnico, Kepler, Galileu, Newton, Descartes e Bacon.

• Critérios epistemológicos para traçar segregações (o epistemicídio):

A) Ciência X Senso Comum;

B) Homem X Natureza;

C) Sujeito X Objeto.

• Matemática: lógica perfeita do conhecer (Descartes). Conhecer é

quantificar e reduzir a complexidade.

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4. CARACTERÍSTICAS DO PARADIGMA DOMINANTE

4.2. Primado da Causalidade – A legislação sobre o mundo.

• Irrelevância do tempo absoluto e do espaço absoluto. O resultado será

repetido independentemente dessas condições.

• Causa formal – como funciona? Desprestígio da causa material, causa

eficiente e causa final.

• Ordem e estabilidade do mundo. Mundo-máquina previsível, regido por

leis físicas e matemáticas.

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  4. CARACTERÍSTICAS DO PARADIGMA DOMINANTE

• Mecanicismo social:

A) Primeira Variante: 1º) Explicar a realidade social como uso dos

métodos e princípios epistemológicos das ciências naturais (p. ex.

positivismo naturalista de Comte; física social e fato social de Durkheim).

2º) Os obstáculos das ciências sociais seriam removidos com tempo e

dinheiro suficientes.

B) Segunda Variante: 1º) Compreender a realidade social por meio de

métodos próprios das ciências sociais, com enfoque

qualitativo/compreensivo (p. ex. Max Weber); 2º) Ainda opera no âmbito

da distinção homem X natureza, mas busca métodos diferenciados.

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5. A CRISE DO PARADIGMA DOMINANTE. O COLAPSO DAS DISTINÇÕES BÁSICAS

PARADIGMA DOMINANTE

CONDIÇÕES TEÓRICAS DA CRISE

FUNDAMENTO DA SUPERAÇÃO PARADIGMÁTICA

Tempo e espaço absolutos.

Relatividade da simultaneidade

(Eistein)

A simultaneidade de acontecimentos distantes não pode ser verificada, mas apenas definida, arbitrariamente.

Representação Causal da Verdade

Interferência estrutural do sujeito no objeto

(Heisenberg e Bohr)

O objeto que sai do processo de medição não é o mesmo que entrou. Não há rigor absoluto na formulação das leis físicas (probabilísticas).

Perfeição epistemológica da

matemática.

Teorema da incompletude(Gödel)

Nos sistemas formais matemáticos é possível formular proposições indecidíveis (indemonstráveis e irrefutáveis).

Estabilidade e previsibilidade do

mundo

Teoria das estruturas dissipativas. Ordem através de flutuações. (Prigogine)

As características do estado macroscópico dependem da história não linear das reações do sistema microscópico.

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5. A CRISE DO PARADIGMA DOMINANTE. O COLAPSO DAS DISTINÇÕES BÁSICAS

• “Em vez da eternidade, a história; em vez do determinismo, a

imprevisibilidade; em vez do mecanicismo, a interpenetração, a

espontaneidade a auto-organização; em vez da reversibilidade, a

irreversibilidade e a evolução; em vez da ordem, a desordem; em vez da

necessidade, a criatividade e o acidente” (p. 48)

• Fenômeno plural e espontâneo da comunidade científica. Ascensão de

cientistas filósofos em diversas áreas do conhecimento. Prestígio das

preocupações sociológicas.

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5. A CRISE DO PARADIGMA DOMINANTE. O COLAPSO DAS DISTINÇÕES BÁSICAS

• Resultados:

A)relativização do paradigma causal. Leis científicas probabilísticas,

provisórias e argumentativas. Podem ser falseadas (Popper).

B) limitações do rigor científico. A construção rigorosa de leis pressupõe

seletividade e simplificação. Perde-se a complexidade e a capacidade de

compreensão da natureza, pelo afã em dominá-la.

5.2 Condições sociais da crise.

• Industrialização da ciência. Quem patrocina o progresso das ciências?

Autonomia científica na pesquisa X livre iniciativa.

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6 - O PARADIGMA EMERGENTE

• É um paradigma científico e social que visa “um conhecimento prudente para uma vida decente”;

• Advertência do Autor: dadas as condições de espaço e tempo em que identificado (fase de transição), possível apenas a especulação acerca de seu perfil, e de modo inacabado;

• A especulação empreendida parte dos sinais da crise do paradigma atual, mas não se determina por tais sinais;

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Hipóteses de trabalho para a formulação das especulações acerca do paradigma científico emergente:

• 1ª. Perda do sentido da distinção entre ciências naturais e ciências sociais; • 2ª. A síntese que há que operar essas ciências tem como pólo catalisador

as ciências sociais;

• 3ª. Para isso, as ciências sociais terão de recusar todas as formas de positivismo lógico ou empírico ou de mecanicismo materialista ou idealista com a conseqüente revalorização do que se convencionou chamar humanidades ou estudos humanísticos;

• 4ª. Esta síntese não visa uma ciência unificada nem sequer uma teoria geral, mas tão-só um conjunto de galerias temáticas onde convergem linhas de água que até agora foram concebidos como objetos teóricos estanques;

• 5ª. À medida que se der esta síntese, a distinção hierárquica entre conhecimento científico e conhecimento vulgar tenderá a desaparecer e a prática será o fazer e o dizer da filosofia da prática.

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Com base nessas hipóteses, BOAVENTURA formula sua proposta do paradigma científico emergente, e revela as suas finalidades. E pretende provar essas hipóteses de trabalho por meio de 04 TESES DO PARADIGMA CIENTÍFICO EMERGENTE:

• todo o conhecimento científico-natural é científico-social;

• todo o conhecimento é local e total;

• todo o conhecimento é autoconhecimento;

• todo o conhecimento científico visa constituir-se em senso comum;

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1ª TESE: todo o conhecimento científico-natural é científico-social

• tendência do paradigma emergente de superar as dualidades;

• perda de sentido e utilidade das distinções dicotômicas;

• assunção da concepção de uma mente imanente ao sistema social global e à ecologia planetária, da qual a mente humana é apenas uma parte;

• postulação da existência de consciência na natureza (teoria da matéria e o estudo da consciência humana);

• noção de “inconsciente colectivo”;

• consciência e matéria como elementos interdependentes (rejeição ao nexo de causalidade);

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• busca da superação distintiva entre ciências sociais e naturais, e reconhecimento da indefinição de um parâmetro de ordem entre elas (ex.: sociobiologia, de um lado, e as teorias físico-naturais aplicadas à sociedade, de outro), a revelar o conteúdo dessa superação;

• a superação da dicotomia sob a égide das ciências sociais (Boaventura), e a tendência do modelo de conhecimento volvido às humanidades;

“É como se o dito de Durkheim se tivesse invertido e em vez de serem os fenômenos sociais a ser estudados como se fossem fenômenos naturais, serem os fenômenos naturais estudados como se fossem fenômenos sociais. (67-68)”

• A concepção humanística como agente catalisador da progressiva fusão das ciências, tendo a pessoa no centro do conhecimento e a natureza no centro da pessoa, como nota distintiva (“Não há natureza humana porque toda a natureza é humana”);

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2ª TESE: todo o conhecimento é local e total

• Falência da tendência moderna de especialização e parcelização do conhecimento (a proposta de solução do problema acaba por reproduzi-lo sob outra forma – o exemplo do médico);

• Substituição da perspectiva reducionista e disciplinar por uma fragmentação temática do objeto - o conhecimento avança à medida que o seu objeto se amplia;

“o direito, que reduziu a complexidade da vida jurídica à secura da dogmática, redescobre o mundo filosófico e sociológico em busca da prudência perdida” .

• assunção do caráter analógico da ciência do paradigma emergente - concepção e generalização do conhecimento através da qualidade e da exemplificação, formando um pensamento total ilustrado;

• conhecimento pós-moderno como um conhecimento sobre as condições de possibilidade - sendo total, não é determinístico; sendo local, não é descritivista. Não é, enfim, reducionista.

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• Caráter imetódico (em razão da pluralidade metodológica) e de tolerância discursiva (fusão de estilos, composição transdisciplinar e maior personalização do trabalho científico);

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3ª TESE: todo o conhecimento é autoconhecimento

• Emergência da crise dicotômica nas ciências naturais - desenvolvimento e exploração da natureza pelo homem a revelar a interferência deste naquela;

• Sujeito e objeto - consagração do homem como sujeito epistêmico (ciência moderna) e também como sujeito empírico;

• Possibilidade de exame espistemológico e empírico de Deus;“O sujeito regressava a veste do objeto. Aliás, os conceitos de “mente imanente”, “mente mais ampla” e “mente coletiva” de Batesen e outros constituem notícias dispersas de que o outro foragido da ciência moderna, Deus, pode estar em vias de regressar. Regressará transfigurado, sem nada de divino senão o nosso desejo de harmonia e comunhão com tudo o que nos rodeia e que, vemos agora, é o mais íntimo de nós. Uma nova gnose está em gestação.”

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• Reconhecimento da natureza criadora e inovadora da ciência, em contraposição à sua concepção desveladora (“A ciência não descobre, cria”);

“o objecto é a continuação do sujeito por outros meios. Por isso, todo conhecimento científico é autoconhecimento”

• A ciência como autobiografia, e como atuação mais contemplativa do que ativa;

“hoje não se trata tanto de sobreviver como de saber viver”

• Pretensão de que a dimensão ativa da ciência, pela transformação do real, seja subordinada à contemplação do resultado (como na criação literária ou artística);

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4ª TESE: todo o conhecimento científico visa constituir-se em senso comum

• Fundamento: nenhuma forma de conhecimento é, em si mesma, racional. Deve-se, por isso, admitir-se o dialogo com outras formas de conhecimento, dentre as quais o senso comum;

• utilidade do conhecimento: o conhecimento científico ensina a viver e deve traduzir-se num saber prático;

• reconhecimento das virtudes do senso comum pela ciência pós-moderna;

• a virtude antecipatória do senso comum: caracterização da origem de uma nova racionalidade;

• inversão da ruptura epistemologica: ao contrário da ciência moderna, a relevância está em seguir do conhecimento científico para o do senso comum;

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“a ciência pós-moderna, ao sensocomunizar-se, não despreza o conhecimento que produz tecnologia, mas entende que, tal como o conhecimento se deve traduzir em autoconhecimento, o desenvolvimento tecnológico deve traduzir-se em sabedoria de vida. É essa que assinala os marcos da prudência à nossa aventura científica. A prudência é a insegurança assumida e controlada. Tal como Descartes, no limiar da ciência moderna, exerceu a dúvida em vez de a sofrer, nós, no liminar da ciência pós-moderna,

devemos exercer a insegurança em vez de a sofrer.