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FACULDADE FORTIUM CURSO DE DIREITO TRABALHO DE PESQUISA DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO DISCIPLINA: DIREITO CIVIL I PROFESSORA: xxx ALUNOS: xxx

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FACULDADE FORTIUMCURSO DE DIREITO

TRABALHO DE PESQUISA

DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

DISCIPLINA: DIREITO CIVIL I

PROFESSORA: xxx

ALUNOS: xxx

BRASÍLIA – DF2014

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FACULDADE FORTIUMCURSO DE DIREITO

TRABALHO DE PESQUISA

DOS DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

Trabalho de Pesquisa apresentado à Disciplina

de Direito Civil I, ministrada pelo Professor

xxx, para obtenção parcial de nota no Curso de

Graduação em Direito da Faculdade Fortium.

BRASÍLIA – DF2014

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................4

2. DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO............................................................................6

2.1. Defeitos do Consentimento.........................................................................................7

2.1.1. Erro....................................................................................................................7

2.1.2. Lesão..................................................................................................................9

2.2.3. Dolo..................................................................................................................11

2.1.4. Coação..............................................................................................................13

2.1.5. Estado de Perigo.............................................................................................15

2.2. Defeito Social.............................................................................................................16

2.2.1. Fraude Contra Credores................................................................................16

2.2.2. Simulação.........................................................................................................18

3. RESUMO CLASSIFICATÓRIO DOS VÍCIOS DO NEGÓCIO JURÍDICO..............21

4. CONCLUSÃO.....................................................................................................................22

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................23

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1. INTRODUÇÃO

Segundo Coelho (2012), o Código Civil (CC) brasileiro de 1916 inspirou-se,

estruturalmente, no Código Civil alemão do fim do século XIX, deixando, porém, de aproveitar de

uma das mais importantes inovações da cultura jurídica alemã, refletida naquela lei, que é a

concepção do negócio jurídico. O nosso anterior Código Civil manteve-se fiel à noção de ato

jurídico, originada na doutrina francesa, definindo-o como todo ato lícito destinado à aquisição,

resguardo, transferência, modificação ou extinção de direitos. Os juristas brasileiros, contudo,

desde cedo se entusiasmaram com as reflexões sobre o negócio jurídico, mesmo com a vigência do

diploma legal anterior, deixaram de estudar e propagar este instituto.

Ainda analisando os aspectos importantes sobre este instituto, observa-se que as

diferenças entre a teoria francesa dos atos jurídicos e a teoria alemã dos negócios jurídicos são tão

sutis que, ao se observar que a sistemática alemã distinguia atos jurídicos de declarações de

vontade, deu-se por encerrado o assunto, anotando que geralmente as duas expressões se

consideram equivalentes. Aproveitou-se, então, das lições referentes ao negócio jurídico para

discorrer sobre atos jurídicos. A sutileza das diferenças possibilitou, também, a alguns

doutrinadores brasileiros sustentarem que a proximidade entre o nosso conceito legal de ato

jurídico e as lições da doutrina alemã sobre negócio jurídico era tão expressiva que cabia dar-se

preferência a esta no desenvolvimento das lições de Direito Civil no Brasil (COELHO, 2012).

A especificidade que distingue o negócio jurídico do ato jurídico é a intencionalidade

do sujeito. O negócio jurídico é o ato jurídico em que o sujeito quer produzir a consequência

prevista na norma. Em outras palavras, o ato jurídico é sempre voluntário, ou seja, algo que o

sujeito de direito faz por sua vontade, sempre produzindo os efeitos previstos em lei, já que a ação

voluntária irrelevante para o direito não se a considera sequer fato jurídico. Pois bem, se o efeito

predisposto na norma jurídica é querido pelo sujeito, denomina-se negócio jurídico o ato. Nesse

caso, o resultado jurídico previsto na norma só se operou porque o sujeito de direito o quis,

enquanto nos atos não negociais os efeitos são simples consequências que a norma jurídica liga a

determinados fatos, independentemente da intenção dos sujeitos envolvidos (COELHO, 2012).

A teoria dos negócios jurídicos é a perfeita manifestação do modo de raciocínio dos

juristas alemães. Distinções de extrema sutileza criam sutis diferenças que exigem a maximização

dos esforços teóricos na compreensão do raciocínio, sem que delas resultem, muitas vezes,

implicações relevantes, sejam sob o prisma teórico ou na condução de assuntos práticos. O Código

Civil brasileiro de 2002 incorporou a teoria do negócio jurídico. Nele, a expressão “ato jurídico”

aparece apenas uma vez e esse dispositivo, formalizado pelo Artigo 185 do Código Civil,

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estabelece que aos atos jurídicos lícitos que não sejam negócios jurídicos aplicam-se as normas

estabelecidas para os negócios jurídicos. Em razão dessa disposição, se houver dúvidas sobre a

exata classificação de determinado ato voluntário de um sujeito de direito, a solução deste conflito

relacionado ao ato em questão será norteada pelas mesmas normas jurídicas, qualquer que seja a

sua exata classificação (COELHO, 2012).

“Art. 185. Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior.”

Complementando o assunto em pauta, verifica-se que os atributos do negócio jurídico

são a existência, a validade e a eficácia. Assim, o negócio existe se houver a junção dos seus

elementos essenciais, quais sejam: sujeito de direito, declaração de vontade com intenção de

produzir certos efeitos e objeto fisicamente possível de existir, e houver também a juridicidade, na

medida em que a lei o descreva como fato jurídico. Uma vez existente tais aspectos, será válido o

negócio jurídico, ainda se atendidos os requisitos de validade e desde que inexistente vício de

formação (COELHO, 2012).

Postos alguns aspectos atinentes ao contexto histórico e conceitual do negócio jurídico

na legislação civil brasileira e delimitando nosso tema ao vício de formação, pretende-se no

presente trabalho de pesquisa, realizar um estudo sumário acerca dos defeitos do negócio jurídico.

Ressalta-se a grande relevância deste assunto no Direito pátrio, tanto por sua ampla aplicabilidade,

quanto por sua essência, uma vez que se trata dos vícios que maculam o negócio jurídico

celebrado, atingindo a sua vontade ou gerando repercussão social, tornando o negócio passível de

ação anulatória pelo prejudicado ou de nulidade absoluta no caso de simulação.

Este trabalho de pesquisa é um mero estudo sistemático que seguirá a linha de

raciocínio apresentada por Coelho (2012) para o desenvolvimento do tema e receberá ideias

complementares de Tartuce (2014), Gonçalves (2011) e demais autores constantes das referências

bibliográficas, de forma que se tenha também a visão adicional destes outros autores no que tange

aos assuntos estudados. A seguir, serão apresentados alguns aspectos relevantes sobre os defeitos

do negócio jurídico.

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2. DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

Os defeitos dos negócios jurídicos, também conhecidos como vícios dos negócios

jurídicos, comprometem a validade deste tipo de negócio porque os tornam passíveis de anulação,

conforme preconiza o Inciso II do Artigo 171 do Código Civil, abaixo apresentado.

“Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:I - por incapacidade relativa do agente;II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.”

Os defeitos dos negócios jurídicos podem ser divididos em duas espécies: o defeito de

consentimento e o defeito social.

Quando é identificado um defeito de consentimento no negócio jurídico, este se torna

inválido porque a vontade das partes ou de pelo menos uma delas não teve oportunidade de se

expressar de forma livre e consciente. Como os negócios jurídicos resultam da vontade das partes

com a finalidade de produzir de determinados efeitos, é claro visualizar que, para ser válido, o

negócio deve ser produto da perfeita manifestação da vontade dos sujeitos. Quando esta é viciada

pelos defeitos do negócio jurídico, caracterizados pelo erro, dolo, coação, estado de perigo ou

lesão, deve-se promover a anulação do negócio jurídico, com a finalidade de evitar a projeção de

efeitos não desejados. Ao invalidar negócios jurídicos por defeito de consentimento, a lei tem o

objetivo de tutelar o sujeito de direito cuja vontade não se expressou de modo consciente e livre

(COELHO, 2012).

O defeito social, por outro lado, compromete a validade do negócio jurídico não

porque a vontade da parte tenha sido impedida de se expressar consciente e livremente; ou seja,

não porque se incompatibilizem declaração e objetivos pretendidos. Nos negócios jurídicos que

exibem esse tipo de defeito, as partes não manifestam vontade que não possuem. Ao contrário, o

defeito social se caracteriza apesar da declaração da parte ser compatível com os objetivos

pretendidos. Ocorre que, além da intenção, real ou aparente, própria ao negócio jurídico praticado,

há a intenção subsidiária, de pelo menos uma das partes, de diminuir o patrimônio para impedir

que seus bens sejam objeto de constrição judicial na satisfação dos direitos de credores. Ao

invalidar negócios jurídicos por defeito social, a lei visa tutelar os interesses dos credores

estranhos à relação de negócio inválida (COELHO, 2012).

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2.1. Defeitos do Consentimento

As imperfeições decorrentes de anomalias na formação da vontade, ou seja, o

comportamento do agente, sob influências atuantes de modo anormal sobre seu psiquismo, difere

daquele a que sua vontade livre e consciente o conduziria são caracterizadas como vícios do

consentimento. São representados por figuras típicas como o erro e ignorância, dolo, coação ou

violência, estado de perigo e lesão (ROHN, 2004).

Ainda acerca deste tópico, observa-se que Coelho (2012), diferentemente dos demais

autores estudados, subdivide os defeitos do consentimento em duas categorias: Internos e

Externos. Segundo o referido autor, podem-se distinguir estas duas situações da seguinte forma:

“de um lado, os defeitos de consentimento, denominados internos, em que a vontade não se

constrange por ato imputável à outra parte ou ao beneficiado pelo negócio jurídico, como os casos

do erro e da lesão, e de outro lado, as demais hipóteses de defeitos, considerados externos, em que

o constrangimento à vontade da parte declarante é provocado pelo próprio sujeito destinatário da

declaração defeituosa, ou por terceiro que quer favorecê-lo, como o dolo e a coação, ou é

extorsivamente aproveitado pelo declaratário, como o estado de perigo. Esta distinção parece

importante para o autor porque, na anulação do negócio jurídico em razão de defeito interno do

consentimento, não se pode desconsiderar o interesse da outra parte (do negócio jurídico bilateral

ou plurilateral) ou mesmo do beneficiário (do negócio jurídico unilateral), que não concorreu para

o constrangimento da vontade que vicia o negócio. De fato, para dar maior segurança jurídica às

relações negociais e proteger a boa-fé, nem sempre se deve anular o negócio em razão dos vícios

internos do consentimento”.

Antes de descrevermos os defeitos de consentimento propriamente ditos, é importante

citar que o termo “declaratário” refere-se ao sujeito a quem a declaração de vontade se destina.

Nos negócios unilaterais, declaratário é o agente envolvido pela declaração, nos negócios

bilaterais, o declaratário é a outra parte e nos negócios plurilaterais, declaratários são as demais

partes do negócio. Quando a parte declarante é vítima de erro ou lesão, atendidos os pressupostos

delineados para cada figura, o negócio jurídico é inválido. A invalidade visa proteger o declarante,

cuja vontade não pôde exprimir-se de forma consciente e livre (COELHO, 2012).

2.1.1. ErroSegundo Gonçalves (2011), o erro consiste em uma falsa representação da realidade.

Nessa modalidade de vício do consentimento, o agente engana-se sozinho. Quando é induzido em

erro pelo outro contratante ou por terceiro, caracteriza-se o dolo. O Código Civil equiparou os

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efeitos do erro à ignorância. Erro é a ideia falsa da realidade, enquanto que a ignorância é o

completo desconhecimento da realidade. Na ignorância, a mente está in albis, ou seja, em branco,

e no erro, o que está registrado na mente é falso. Tanto em um quanto no outro caso, o agente é

levado a praticar o ato ou a realizar o negócio que não celebraria por certo ou que praticaria em

circunstâncias diversas, se estivesse devidamente esclarecido.

Concordando com o autor supracitado, Coelho (2012) entende que o conceito de erro

remonta na decisão tomada em função de falsa representação da realidade. Quando o

desconhecimento da verdade é total, costuma-se chamar o erro de ignorância. Ressalta o autor que

não há interesse nesta distinção, já que as duas situações estão sujeitas à mesma disciplina jurídica.

Observa-se também, que nem todo erro compromete a validade do negócio jurídico. Há erros sem

importância, referentes a aspectos acidentais do negócio ou de seu objeto, que não são fatos

jurídicos. Quando um indivíduo incorre num erro desta natureza, nada aconteceu para o direito.

Há, também, erros indesculpáveis, que decorrem da culpa do sujeito que errou. Nesses casos,

anular o negócio jurídico seria estimular negligências e subtrair das pessoas a responsabilidade por

seus atos.

Para configurar-se como defeito de consentimento, o erro deve ser substancial e

escusável. Considera-se substancial o erro se a pessoa não teria praticado o negócio jurídico em

questão caso o tivesse percebido a tempo. Paralelamente, entende-se que o erro imperceptível às

pessoas com diligência normal é denominado escusável. Tanto uma como outra característica do

erro causador da invalidade do negócio jurídico estão referidas pela lei. No Código Civil, o Artigo

139 elenca as hipóteses de erro substancial, e no Artigo 138, descreve-se, ainda que de forma

imprecisa, o critério para considerar-se desculpável um erro (COELHO, 2012).

“Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.”

“Art. 139. O erro é substancial quando:I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.”

O erro é substancial quando interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da

declaração ou a alguma das qualidades essenciais ao negócio jurídico. Além de substancial, o erro

deve ser escusável. Isso quer dizer que a falsa representação da realidade não pode ser produto de

falta de empenho da pessoa em se informar adequadamente antes de praticar o negócio jurídico. O

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erro é escusável quando não poderia ser percebido por pessoa de diligência normal (COELHO,

2012).

Uma pequena divergência de nomenclatura é apresentada por Gonçalves (2011) que

entende como acidental o erro escusável, definindo-o como o erro que se opõe ao substancial,

porque se refere a circunstâncias de menos importância e que não acarretam efetivo prejuízo. Se

conhecida a realidade, mesmo assim o negócio seria realizado. O Artigo 143 do Código Civil é

expresso no sentido de que “o erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de

vontade”. Não há, nesse caso, propriamente um vício na manifestação da vontade, mas uma

distorção em sua transmissão, que pode ser corrigida.

O erro substancial e escusável pode ser suprido, para fins de garantir a validade do

negócio jurídico e, segundo Coelho (2012), pode esta supressão pode se dar por meio de duas

hipóteses. Na primeira, a indicação errada de pessoa e coisa não é defeito do negócio jurídico se,

pelo contexto da declaração emitida ou pelas circunstâncias em que se emitiu, puder-se corrigir

adequadamente, conforme prescreve o Artigo 142 do Código Civil, transcrito abaixo.

“Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.”

Na segunda hipótese, se a pessoa a quem a declaração se dirige, ou seja, a outra parte

do negócio bilateral ou as demais partes do negócio plurilateral, se oferecer para executá-la na

conformidade da vontade real do declarante, conforme prescreve o Artigo 144 do Código Civil,

transcrito abaixo.

“Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante.”

2.1.2. LesãoO Código Civil de 2002 reintroduz no ordenamento jurídico brasileiro, de forma

expressa, o instituto da lesão como modalidade de defeito do negócio jurídico caracterizado pelo

vício do consentimento. Dispõe o Artigo 157 do novo diploma:

“Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.§ 1º Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.§ 2º Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.”

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Assim, segundo Gonçalves (2011), lesão é o prejuízo resultante da enorme

desproporção existente entre as prestações de um contrato no momento de sua celebração,

determinada pela premente necessidade ou inexperiência de uma das partes. Não se contenta o

dispositivo com qualquer desproporção: há de ser manifesta.

Sob outro prisma, Coelho (2012) entende que lesão é o defeito de consentimento em

que a vontade de uma parte é constrangida por necessidade premente, não se manifesta livremente,

ou pela inexperiência, não se manifesta conscientemente, resultando negócio jurídico em que

contrai obrigação manifestamente desproporcional à prestação da outra parte. A lesão caracteriza-

se pela conjugação de dois elementos. O primeiro, de natureza subjetiva, isto é, relativa ao sujeito,

é o constrangimento à vontade da parte declarante derivada de premente necessidade ou

inexperiência. O segundo, de natureza objetiva, relativa ao objeto do negócio, é a desproporção

manifesta entre a obrigação assumida pela parte declarante e a prestação oposta.

Assim, para que se caracterize a lesão, o elemento objetivo deve ser observado no

momento da realização do negócio jurídico. Como a lesão causa a invalidade do negócio jurídico,

esta deve ser contemporânea ao surgimento da relação negocial. Fatos jurídicos posteriores à

constituição do vínculo negocial podem eventualmente desconstituí-lo ou alterar-lhe o conteúdo,

segundo uma revisão judicial, mas nunca invalidá-lo, porque as causas de nulidade ou

anulabilidade são sempre concomitantes ao aparecimento do negócio (COELHO, 2012). Por essa

razão, preceitua a lei que se aprecia “a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao

tempo em que foi celebrado o negócio jurídico”, conforme se observa no Parágrafo 1º do Artigo

157 do Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico....”

Não é o caso de lesão em situações de obrigações contraídas. Estes casos são atinentes

à onerosidade excessiva. A diferença é bastante relevante, já que a lesão é causa de anulação do

negócio jurídico, enquanto a onerosidade excessiva autoriza apenas a revisão das cláusulas

pactuadas, com o objetivo de restabelecer o equilíbrio entre as prestações (COELHO, 2012).

Para Coelho (2012), a lesão é defeito de consentimento porque o constrangimento da

vontade não depende de ato imputável à parte declaratária. Esta se limita a bem administrar os seus

interesses, manifestando a vontade de participar de negócio vantajoso. Quando desconhece a

necessidade premente constrangedora da vontade livre ou a inexperiência constrangedora da

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vontade consciente da parte declarante, age de boa-fé e terá os seus interesses protegidos. Em

qualquer caso, porém, se partir dela uma proposta de reforma das prestações negociais, importando

esta no reequilíbrio do negócio jurídico, será preservada sua validade, conforme preconiza o

Parágrafo 2º do Artigo 157 do Código Civil, abaixo descrito.

“Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta....§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.”

2.2.3. DoloSegundo Gonçalves (2011), dolo é o artifício ou expediente astucioso empregado para

induzir alguém à prática de um ato que o prejudique e aproveite ao autor do dolo ou a terceiro.

Consiste em sugestões ou manobras maliciosamente levadas a efeito por uma das partes a fim de

conseguir da outra uma emissão de vontade que lhe traga proveito ou a terceiro. O dolo difere do

erro porque este é espontâneo, no sentido de que a vítima se engana sozinha, enquanto o dolo é

provocado intencionalmente pela outra parte ou por terceiro, fazendo com que aquela também se

equivoque.

Ainda segundo o autor supracitado, “o dolo civil não se confunde com o dolo criminal,

que é a intenção de praticar um ato que se sabe contrário à lei. No direito penal, diz-se doloso o

crime quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo. Dolo civil, em sentido

amplo, é todo artifício empregado para enganar alguém. Distingue-se, também, do dolo processual,

que decorre de conduta processual reprovável, contrária à boa-fé e que sujeita, tanto o autor como

o réu que assim procedem, a sanções várias, como ao pagamento de perdas e danos, custas e

honorários advocatícios”.

Para Coelho (2011), dolo é a indução em erro de uma parte do negócio jurídico.

Verifica-se esse tipo de defeito de consentimento quando o sujeito declarante é enganado em razão

de medidas astuciosas usadas pela outra parte, ou por agente constrangedor estranho à relação

negocial. O dolo pode, ainda, ser principal ou acidental. No primeiro caso, a parte somente realiza

o negócio jurídico porque foi enganada. Se não fosse a distorção da verdade provocada pela

conduta dolosa que a vitimou, ela não teria manifestado a vontade de fazer o negócio jurídico.

Assim, o dolo principal é a causa do negócio jurídico e, portanto, o invalida, conforme prescreve o

Artigo 145 do Código Civil.

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“Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.”

O dolo acidental é aquele que não induziu a parte a praticar o negócio jurídico, mas o

tornou menos vantajoso. Nesse caso, o sujeito é enganado não sobre os aspectos essenciais da

relação negocial em vias de ser concretizada, mas acerca de elementos acidentais. Em outras

palavras, algumas circunstâncias importantes do negócio são intencionalmente distorcidas, mas

não o suficiente para fazer alguém desistir do referido negócio. O dolo acidental não implica na

invalidade do negócio jurídico, mas gera o direito à indenização por perdas e danos, conforme

prescreve o Artigo 146 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO, 2012).

“Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.”

Quando o dolo não é da parte a quem se destina a declaração de vontade, mas de

terceiro estranho à relação negocial, a invalidade do negócio jurídico depende da má-fé. Dessa

forma, caso o individuo a quem se destina a declaração de vontade tenha conhecimento do artifício

ardiloso do agente constrangedor destinado a induzir o declarante a praticar o negócio jurídico, ou

não tinha como ignorá-lo, o negócio jurídico será inválido. No caso contrário, se essa pessoa não

tivesse nenhuma condição de saber do artifício ardiloso realizado pelo terceiro, a lei não considera

inválido o negócio praticado, mesmo na hipótese de dolo principal. Então, o agente constrangedor

da vontade do declarante responderá pela indenização das perdas e danos sofridos pela pessoa

vitimada por seu dolo, conforme prescreve o Artigo 148 do Código Civil, abaixo transcrito

(COELHO, 2012).

“Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.”

Quando o dolo provém do representante da parte beneficiada pelo negócio defeituoso,

distingue a lei os efeitos suportados pelo representado, quanto à responsabilidade por perdas e

danos, em função da natureza da representação. Sendo esta legal, o representado não poderá ser

responsabilizado civilmente além do proveito que tiver aferido. Responderá, entretanto,

solidariamente com o representante no caso da representação convencional (mandato). Em se

tratando, assim, de negócio jurídico marcado por dolo acidental imputável a representante de uma

das partes, esta poderá vir a responder pelas perdas e danos decorrentes limitada ou

ilimitadamente, dependendo da natureza da representação: enquanto o absolutamente incapaz

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responde no limite do proveito que lhe trouxe o negócio, o mandante responde ilimitadamente.

Sendo o dolo de ambas as partes, nenhuma delas pode requerer a anulação do negócio jurídico ou

a indenização por perdas e danos, conforme prescreve o Artigo 150 do Código Civil, abaixo

transcrito (COELHO, 2012).

Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.

2.1.4. CoaçãoSegundo Gonçalves (2011), coação é toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre

um indivíduo para forçá-lo, contra a sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio. O que

a caracteriza é o emprego da violência psicológica para viciar a vontade. Não é a coação, em si,

um vício da vontade, mas sim o temor que direciona a vontade, tornando defeituosa a manifestação

de querer do agente. Corretamente, os romanos empregavam o termo metus (medo), e não vis

(violência), porque é o temor infundido na vítima que constitui o vício do consentimento, e não os

atos externos utilizados no sentido de desencadear o medo. Nosso direito positivo, entretanto,

referindo-se a esse defeito, o chama de coação, conforme prescreve o Inciso II do Artigo 171 do

Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:I - por incapacidade relativa do agente;II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.”

A coação é o vício mais grave e profundo que pode afetar o negócio jurídico, mais

grave que o próprio dolo, a coação este impede a livre manifestação da vontade, enquanto que o

dolo incide sobre a inteligência da vítima.

Concorda Coelho (2012) acerca da definição apresentada. Segundo este autor, coação é

o constrangimento da vontade da parte declarante, por meio da ameaça de violência física ou

moral, feita pelo próprio destinatário da declaração ou por terceiro. A coação vicia a declaração de

vontade quando desperta no paciente o receio fundado de dano iminente e relevante à pessoa dele,

sua família ou seu patrimônio, conforme preconiza o Artigo 151 do Código Civil, abaixo

transcrito.

“Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.”

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Ainda considerando o que apresenta o autor supracitado, quando a ameaça recai sobre

pessoa que não faz parte da família, seja este um amigo ou empregado, por exemplo, será objeto

de decisão judicial se a coação foi relevante de tal forma que influenciou o negócio jurídico e o

tornou defeituoso. Desse modo, para comprometer a validade do negócio jurídico, a coação deve

apresentar quatro marcas, conforme se segue:

• Primeira, “ela deve ser determinante da declaração de vontade. Se o sujeito

expressaria a mesma declaração, ainda que não tivesse sido ameaçado, não se qualifica a coação

como defeito do negócio jurídico”.

• Segunda, “deve ser grave, isto é, deve incutir na vítima o fundado temor de dano

considerável à sua pessoa, família ou bens e, eventualmente, amigos, empregados, etc . Não há

coação que invalide o negócio jurídico se houver ameaça leve. Caso a alternativa à realização do

negócio jurídico seja ver difundidas mentiras desonrosas sobre a própria vítima, não se reputa a

coação suficientemente irresistível a ponto de invalidá-lo. A apreciação da gravidade da coação

deve ser feita pelo juiz com atenção ao sexo, idade, condição, saúde, temperamento do paciente e

todas as demais circunstâncias que possam nela influir”, conforme descreve o Artigo 152 do

Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição,

a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que

possam influir na gravidade dela.”

• Terceira, “o dano objeto de ameaça deve ser iminente. Se o constrangimento da

vontade é tentado por ameaça de dano futuro, se houver condições materiais (inclusive de tempo)

para evitá-la eficazmente, não há invalidade”.

• Quarta, “a ameaça deve ser injusta. Se a alternativa imposta à concordância em

realizar o negócio jurídico for o exercício regular de um direito, não há defeito que o torne

inválido, conforme preconiza a primeira parte do Artigo 153 do Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial.”

A coação praticada por pessoa estranha à relação negocial é defeituosa nas mesmas

condições que o dolo. Isto é, depende da má-fé do declaratário. Assim, se o sujeito a quem a

declaração beneficia tinha conhecimento ou não podia ignorar a ameaça feita por terceiro, o

negócio jurídico é anulável. Caso contrário, não tendo como saber dessa ameaça, não será inválido

o negócio jurídico. Na coação, porém, o destinatário sempre responde solidariamente com o

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agressor pelas perdas e danos decorrentes, conforme preconiza os Artigos 154 e 155 do Código

Civil. Abaixo transcrito.

“Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.”

“Art. 155. Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos que houver causado ao coacto.”

2.1.5. Estado de PerigoSegundo Gonçalves (2011), o Código Civil de 2002 apresenta este instituto, no

capítulo concernente aos defeitos do negócio jurídico, que não constava do Código Civil de 1916.

Conforme preconiza o Artigo 156 do novo diploma, configura-se o estado de perigo quando

alguém, pressionado pela necessidade de salvar-se, ou salvar pessoa de sua família, de grave dano

conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Preconiza o parágrafo

único do referido artigo, que em se tratando de pessoa não pertencente à família do declarante,

como amigos e funcionários, por exemplo, o juiz decidirá segundo as circunstâncias. Constitui o

estado de perigo, portanto, a situação de extrema necessidade que conduz uma pessoa a celebrar

negócio jurídico em que assume obrigação desproporcional e excessiva, ou ainda, constitui o fato

necessário que compele à conclusão de negócio jurídico, mediante prestação exorbitante.

Em outras palavras, Coelho (2011) entende que o estado de perigo é o defeito de

consentimento em que o sujeito declara assumir obrigação excessivamente onerosa, por estar sua

vontade constrangida por necessidade premente de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave

dano conhecido do declaratário, conforme preconiza o Artigo 156 do Código Civil, abaixo

transcrito.

“Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.”

Para configurar-se o defeito do consentimento por estado de perigo, o declaratário deve

ter conhecimento do grave dano a que se expõe o declarante ou pessoa de sua família. No estado

de perigo, o constrangimento também pode ser provocado por fato da natureza,

independentemente da atuação de qualquer ser humano, como o terremoto, inundação, braveza do

mar, avalanches, erupção de vulcão etc. E pode decorrer de ato humano (COELHO, 2012).

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2.2. Defeito SocialOs defeitos sociais são aqueles em que a vontade manifestada não tem, na realidade, a

intenção pura e de boa-fé que enuncia. Este tipo de defeito é caracterizado pela fraude contra

credores e pela simulação. Estes vícios serão descritos a seguir.

2.2.1. Fraude Contra Credores Segundo Gonçalves (2011), o novo Código Civil coloca no rol dos defeitos do negócio

jurídico a fraude conta credores, não como vício de consentimento, mas como vício social, uma

vez que não conduz a um descompasso entre o íntimo querer do agente e sua declaração. A

vontade manifestada corresponde exatamente ao seu desejo, mas é exteriorizada com a intenção de

prejudicar terceiros, ou seja, os credores. Fraude contra credores é, portanto, todo ato suscetível de

diminuir ou onerar seu patrimônio, reduzindo ou eliminando a garantia que este representa para

pagamento de suas dívidas, praticado por devedor insolvente ou por ele reduzido à insolvência.

Para Coelho (2012), a fraude contra credores é o defeito do negócio jurídico de

alienação de bens do patrimônio do devedor insolvente. A pessoa em insolvência, ou em estado de

pré-insolvência, não pode dispor dos bens que titulariza porque estes representam a garantia dos

credores. Nas circunstâncias que se detalham a seguir, os negócios jurídicos de disposição desses

bens, pelo devedor insolvente, são inválidos.

Inicialmente, a lei estabelece a invalidade dos negócios jurídicos gratuitos do

insolvente. Sempre que o devedor tiver, no patrimônio, ativo inferior ao passivo, e praticar negócio

jurídico gratuito, o credor quirografário pode pleitear a anulação da liberalidade. Caberá também a

anulação se a insolvência resultar do negócio gratuito, ainda que desconhecida do devedor. Além

do quirografário, tem legitimidade para pedir a anulação do negócio gratuito o credor cuja garantia

se tornar insuficiente, conforme preconiza o Parágrafo 1º do Artigo 158 do Código Civil, abaixo

transcrito (COELHO, 2012).

“Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.§ 1o Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente....”

Só os credores existentes ao tempo em que a liberalidade foi cometida, porém, podem

pleitear a invalidação do negócio, conforme consta no Parágrafo 2º do Artigo 158 do Código Civil.

Os credores posteriores à alienação graciosa não podem reclamar porque, ao concederem crédito

ao devedor, ele já não dispunha daquele bem em seu patrimônio (COELHO, 2012)..

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“Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos....§ 2o Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles.”

A lei estabelece, também, a anulabilidade dos negócios jurídicos onerosos do devedor

insolvente, quando notória a insolvência ou se não poderia ser ela ignorada pelo outro contratante,

conforme preconiza o Artigo 159 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO, 2012).

“Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.”

Em atenção aos direitos do adquirente dos bens, a lei faculta-lhe, caso ainda não tenha

pago o insolvente, que deposite o preço em juízo. Se for o valor depositado aproximadamente o de

mercado do bem alienado, por negócio oneroso, do patrimônio do insolvente, não se decreta a

anulação do negócio. Os credores poderão, nesse caso, satisfazer seus créditos mais facilmente

com a repartição da importância depositada. Se o preço contratado com o insolvente era inferior ao

de mercado, o adquirente pode preservar a validade do negócio complementando o depósito com a

diferença, conforme preconiza o Artigo 160 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO, 2012).

“Art. 160. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados.Parágrafo único. Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real.”

A ação judicial destinada a invalidar o negócio perpetrado com fraude contra os

credores e possibilitar que o bem alienado, onerosa ou gratuitamente, retorne ao patrimônio do

devedor chama-se revocatória. A ação revocatória pode ser movida contra o devedor insolvente, a

pessoa que com ele contratou e os terceiros adquirentes que tenham procedido de má-fé, conforme

preconiza o Artigo 161 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO, 2012).

“Art. 161. A ação, nos casos dos arts. 158 e 159, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.”

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Anulados os negócios jurídicos objeto da ação revocatória, a vantagem resultante

reverte não em favor do devedor insolvente, mas do acervo sobre o qual se realiza o concurso dos

credores, conforme preconiza o Artigo 165 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO, 2012)..

“Art. 165. Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.Parágrafo único. Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência ajustada.”

Consideram-se fraudulentos também dois outros negócios jurídicos praticados pelo

insolvente. Primeiro, se ele pagou uma dívida antes do vencimento, quem recebeu o pagamento

antecipado é obrigado a repor ao acervo sobre o qual concorrerão os credores a quantia

correspondente, conforme preconiza o Artigo 162 do Código Civil, abaixo transcrito (COELHO,

2012).

“Art. 162. O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu.”

De fato, se a dívida não estava vencida no dia em que se realizou o pagamento, não era

ainda exigível. A antecipação do cumprimento da obrigação pelo insolvente, ademais, importa

desrespeito ao tratamento paritário a que têm direito seus credores. Segundo, o insolvente não

pode conferir a qualquer dos credores quirografários uma garantia real, conforme preconiza o

Artigo 163 do Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 163. Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor.”

Se o fizer, o antigo credor quirografário, ao ser beneficiado com a garantia, passará a

fazer parte de categoria com maior chance de realizar integralmente o seu crédito na execução

concursal. Uma vez mais está se desrespeitando o tratamento paritário dos credores. A invalidade,

nesse caso, importará somente na anulação da garantia, continuando o credor a exercer os mesmos

direitos de quirografário que anteriormente titularizava (COELHO, 2012).

2.2.2. SimulaçãoSegundo Gonçalves (2011), simulação é uma declaração falsa da vontade, visando

aparentar negócio diverso do efetivamente desejado. Ou, na definição de Beviláqua (1927), “é uma

declaração enganosa da vontade, visando produzir efeito diverso do ostensivamente indicado”.

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Simular significa, então, fingir ou enganar. Negócio simulado, portanto, é o que tem aparência

contrária à realidade. A simulação é produto de um conluio entre os contratantes, visando obter

efeito diverso daquele que o negócio aparenta conferir. Não é vício do consentimento, pois não

atinge a vontade em sua formação. É uma desconformidade consciente da declaração, realizada de

comum acordo com a pessoa a quem se destina, com o objetivo de enganar terceiros ou fraudar a

lei.

Ainda segundo a visão de Gonçalves (2011), trata o defeito ora apresentado, em

realidade, de um vício social. A causa simulandi tem as mais diversas procedências e finalidades.

Ora visa burlar a lei, especialmente a de ordem pública, ora fraudar o fisco, ora prejudicar os

credores, ora até guardar em reserva determinado negócio. A multifária gama de situações que

pode abranger e os seus nefastos efeitos levaram o legislador a deslocar a simulação do capítulo

concernente aos defeitos do negócio jurídico para o da invalidade, como causa de nulidade.

Conforme a visão de Tartuce (2014), na simulação, as duas partes contratantes estão

combinadas e objetivam iludir terceiros. Como se percebe, sem dúvida, há um vício de repercussão

social, equiparável à fraude contra credores, mas que gera a nulidade e não anulabilidade do

negócio celebrado, conforme a inovação constante do Artigo 167 do Código Civil, abaixo

transcrito.

“Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.§ 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.§ 2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.”

Coelho (2012) concorda acerca do conceito deste vício, entendendo que a simulação

consiste na prática de negócio jurídico aparente, isto é, que não corresponde à intenção da parte ou

das partes, com o objetivo de prejudicar terceiros. Ressalta este autor que, em geral, tem lugar em

negócios bilaterais ou plurilaterais, mas não é impossível uma só parte declarar certa intenção para

alcançar resultados diferentes em prejuízo alheio. Considerando a classificação da simulação,

diverge Coelho (2012) no sentido de não considerar este defeito como vício social. Na obra

estudada neste trabalho de pesquisa, Coelho (2012) apresenta a simulação em um capítulo a parte.

Tal ponto de vista nos parece ter fundamento no fato de que os negócios jurídicos simulados são

nulos e não anuláveis, como todos os outros supracitados.

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|Ainda segundo Coelho (2012), há simulação nos negócios jurídicos, dispõe a lei,

quando:

a) aparentam conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais

realmente se conferem, ou transmitem (exemplo da doação do adúltero em favor do amante);

b) contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira (a simulação

do divórcio para fugir a eventual responsabilidade por débitos futuros) ;

c) os respectivos instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados

(adúltero e amante formalizam contrato de doação com data anterior à do casamento daquele).

Na simulação, há sempre prejuízo a terceiros. Não existe simulação sem que a parte ou

as partes do negócio jurídico tenham a intenção de prejudicar direito de não participante do

negócio e este reste realmente prejudicado. A simulação pode ser de duas espécies: absoluta ou

relativa. Na simulação absoluta, além do negócio jurídico simulado não existe nenhum outro que

se procurou dissimular. Na simulação relativa, o negócio nulo foi praticado com o objetivo de

dissimular outro negócio. Na simulação relativa, subsiste o que se dissimulou, se válido for na

substância e na forma (COELHO, 2012).

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3. RESUMO CLASSIFICATÓRIO DOS VÍCIOS DO NEGÓCIO JURÍDICO

Como resumo, podemos reforçar o entendimento de que os defeitos dos negócios

jurídicos podem ser classificados da seguinte forma:

a) Vícios do Consentimento: São aqueles em que a vontade não é expressa de maneira

absolutamente livre. Este tipo de defeito engloba as seguintes espécies: Erro, Dolo, Coação, Lesão

e Estado de Perigo.

b) Vícios Sociais: São aqueles em que a vontade manifestada não tem, na realidade, a

intenção pura e de boa-fé que enuncia. Este tipo de defeito engloba as seguintes espécies: Fraude

Contra Credores e Simulação.

Esta forma bastante simplificada de classificação dos defeitos do negócio jurídico está

ordenada sumariamente na Tabela 01, apresentada a seguir, onde se pode, também, observar o

amparo legal de cada um deles.

Tabela 01: Classificação dos Defeitos do Negócio Jurídico

DEFEITO VÍCIO EFEITO AMPARO LEGAL

Erro Consentimento Anulável Art. 138 - 144, CCDolo Consentimento Anulável Art. 145 - 150, CCCoação Consentimento Anulável Art. 151 - 155, CCEstado de Perigo Consentimento Anulável Art. 156, CCLesão Consentimento Anulável Art. 157, CCFraude Contra Credores Social Anulável Art. 158-165, CCSimulação Social Nulo Art. 167, CC

Desta forma resumida, a tabela acima reafirma que os defeitos que desvirtuam o

negócio jurídico acarretam de ação anulatória pelo indivíduo que foi prejudicado ou de nulidade

absoluta no caso de simulação, conforme consta no Artigo 166 do Código Civil, abaixo transcrito.

“Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;IV - não revestir a forma prescrita em lei;V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.”

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A despeito de esta seção ter apresentado um resumo dos principais aspectos estudados, a próxima seção apresentará uma conclusão sobre este tema, caracterizado pelos defeitos do negócio jurídico.

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4. CONCLUSÃO

As disposições sobre os institutos na legislação civil vigente, que compõem os defeitos

dos negócios jurídicos, alcançam fundamental importância na formação dos operadores do direito,

uma vez que proporcionam a possibilidade de reconhecimento dos vícios sociais e vícios do

consentimento, que maculam as relações de natureza jurídico-patrimoniais.

Foi observado que o primeiro tratamento legal ao negócio jurídico deu-se no Código

Civil alemão, quando se lhe conferiu um regime jurídico específico. O referido diploma permitiu,

segundo Larenz (1978), que se formulasse o seguinte conceito: “Negócio jurídico é um ato, ou

uma pluralidade de atos, entre si relacionados, quer sejam de uma ou de várias pessoas, que tem

por fim produzir efeitos jurídicos, modificações nas relações jurídicas no âmbito do direito

privado”.

Quanto aos defeitos do negócio jurídico, objeto deste trabalho de pesquisa, se observou

que as hipóteses em que a vontade se manifesta com algum vício torna o negócio nulo ou anulável,

sendo que, para este último, o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico

é de quatro anos contado, no caso de coação, do dia em que ela cessar ou, no caso de erro, dolo,

fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico,

conforme se observa no Artigo 178 do Código Civil.

Especificamente quanto aos vícios de consentimento foram estudados aspectos

relativos aos cinco tipos de vícios desta natureza, previstos no Código Civil brasileiro, que são o

erro ou ignorância, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão. Quanto aos vícios sociais, foram

estudados aspectos relativos aos dois tipos de vícios desta natureza, também previstos no Código

Civil brasileiro, que são a fraude contra credores e a simulação.

Assim, ao realizar este estudo sumário acerca dos defeitos do negócio jurídico,

conclui-se reassaltando a grande relevância deste assunto no Direito brasileiro, tanto por sua ampla

aplicabilidade, quanto por sua essência, uma vez que se trata dos vícios que maculam o negócio

jurídico realizado, atingindo a sua vontade ou gerando repercussão social, tornando o negócio

passível de ação anulatória pelo prejudicado ou de nulidade absoluta no caso de simulação.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves, 1927.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil: Parte Geral, Volume 1, 5ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Esquematizado. Volume 1. 1ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

LARENZ, Karl. Derecho Civil: Parte General. Tradução Especial. Caracas: Editora Edersa, 1978.

ROHN, Heleno da Costa; et all. Vícios do Consentimento e Vícios Sociais. Trabalho de Conclusão de Curso. Graduação em Direito, Faculdades Integradas de Curitiba. Curitiba, 2004.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: Volume Único. 4ª edição. São Paulo: Editora Método, 2014.