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ISSN da publicação: ISSN 2175-6880 (Online)

Anais do Evento 2010

Volume 8

Trabalhos apresentados no Grupo de Trabalho 08 - Cultura, Juventude e

Educação

Coordenadores:

Profª Drª Ana Luisa Fayet Sallas (UFPR)

Prof. Dr. Angelo José da Silva (UFPR)

Rodrigo Wolf Apolloni

Maurício Presses

Ementa: Este GT pretende aprofundar as reflexões sobre as questões relativas as

relações entre cultura e juventude, partindo de uma indagação sobre a existência e o

significado das chamadas "culturas juvenis". Procurará compreender como elas se estruturam,

a partir de que elementos e em que medida expressam os sentidos de pertencimento e

identidade juvenil. Por outro lado, pretendemos também articular de modo mais sistemático as

relações possíveis entre cultura, juventude e educação - não restritas a uma compreensão do

âmbito escolar, mas expressa por outras formas de organização, em que as sociabilidades

juvenis se manifestem, se estruturem e ganhem novos contornos e novos espaços sociais,

apresentando e se representando nos espaços públicos e virtuais do mundo contemporâneo.

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O MOVIMENTO HIP-HOP E A CRIAÇÃO DE NOVAS IDENTIDADES.

Thayroni Araújo Arruda

RESUMO

O presente artigo faz parte de um processo inicial de pesquisa para dissertação de mestrado –

encontrando-se desta forma, inconcluso – onde o mesmo apenas levanta questões para

reflexão, apontando possíveis caminhos teóricos a serem trilhados para se chegar a respostas

conclusivas. Pretende-se através do mesmo, analisar as relações entre interesses, práticas e

estratégias individuais e a dinâmica de conformação do movimento hip-hop na cidade de

Campina Grande – PB, problematizando a tensão entre fatores de diferenciação social

(religião, classe social, gênero, idade, escolaridade, raça) e os elementos que proporcionam

identificação e coesão grupal. Nesse sentido, vamos ver a importância do processo de

globalização na desconstrução da identidade nacional em favor de uma nova roupagem

identitaria. Partiremos também, do conceito de Anderson, para pensar o movimento hip-hop

como sendo uma comunidade imaginada com símbolos que ao mesmo tempo em que

garantem certa identidade à comunidade, alertam-na também sobre as diferenças existentes no

interior da mesma. Para tanto, estabelecemos como fio analítico condutor as seguintes

questões: Sendo o movimento hip-hop uma comunidade imaginada que através de seus

símbolos homogeneíza e evidencia o caráter heterogêneo dos sujeitos que a compõem, como

saber se as ações individuais contribuem para o desenvolvimento do grupo? E as ações dos

sujeitos, são ou não são, fruto de uma consciência linear de aperfeiçoamento do movimento?

Questões como essas até então não respondidas por trabalhos anteriores, foram o que motivou

a escolha do movimento hip-hop como objeto de estudo, representando assim uma ruptura do

paradigma sociocultural, uma vez que se intenciona invadir um “território” cultural que até

então só tinha sido contemplado na pesquisa social numa versão homogenia.

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O MOVIMENTO HIP-HOP E A CRIAÇÃO DE NOVAS IDENTIDADES.

Thayroni Araújo Arruda1

INTRODUÇÃO

Vários estudos abordam o movimento hip-hop como tema central de suas análises.

Estudos que tentaram entender como indivíduos pertencentes a esse grupo interagem

socialmente no espaço, modificando-o fisicamente e estruturalmente através de seus

elementos simbólicos e suas práticas espaciais. Souza (2002) trabalha com o consumo e estilo

cultural no movimento hip-hop como sendo práticas necessárias para uma auto-afirmação dos

indivíduos diante da cultura externa. Esse consumo não se apresenta apenas na compra

desenfreada e irracional de bens, e sim, como integrante de um processo que redimensiona a

posição dos sujeitos na sociedade, cuja identidade se afirma mais claramente em torno do

consumo de bens simbólicos do que mediante o exercício da cidadania. Surgiram também,

trabalhos que problematizam a legitimidade do grafite enquanto arte (Duarte, 2005).

Mendonça (2002), em seu trabalho intitulado “Adolescentes como autores de si próprios:

cotidiano, educação e o hip-hop”,vai analisar a diversidade de culturas juvenis ressaltando o

movimento hip-hop como uma cultura capaz de transformar os seus participantes em

protagonistas de seu próprio processo educacional. Gomes (2007), em “As cidades da

juventude em Fortaleza” fez uma análise de como os jovens pertencentes a movimentos

juvenis – entre eles o hip-hop, vai dando significados e delineando espaços na cidade de

Fortaleza, apropriando-a de forma itinerante, não fixa, em deslocamentos pelos bares e clubes

da cidade. Perosa (2006), discute a relação entre educação e estratificação social, mostrando

de que forma movimentos sociais podem estar na base da aprendizagem de diferenças de

classe.

Todas essas contribuições foram válidas para entender as dinâmicas desses grupos que

interagem com a sociedade a sua volta, oferecendo oportunidade de criar infinitas

interpretações ao seu respeito. Todos os trabalhos pesquisados falam do movimento hip-hop

como um todo - um corpo que interage com outros corpos sociais. A produção de bens, sejam

1 Graduado em sociologia pela Universidade Federal de Campina Grande e mestrando em Ciências

Sociais pela mesma instituição.

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eles culturais ou não, e as práticas dos sujeitos como força motriz do movimento ficam em

segundo plano.

Já há alguns anos, elementos da cultura hip-hop (Dj, B boy, Mc, e grafiteiro) são

visíveis na cidade de Campina Grande. Só no inicio de 2007, com a consolidação do “Núcleo

Hip-Hop Campina” - que tem como o seu maior objetivo realizar ações de cunho artístico-

cultural em comunidades marginalizadas da cidade - é que as ações realizadas ganham

visibilidade e despertam olhares para uma cultura hip-hop até então invisível na cidade de

Campina Grande.

A ênfase incide muito mais sobre o que une os indivíduos – símbolos, signos – do que

o que separa. Não se trata mais da história que construo contratualmente associado a outros

indivíduos racionais, mas de um mito do qual participo. Podem existir Dj, B boys, Mcs e

Grafiteiros, mas, eles são, de certa maneira, idealizados – tipos, formas vazias, matrizes que

permitem a qualquer um reconhecer-se e comungar com os outros. A atitude “contemplativa”

que prevalece sobre a pulsão política, própria às gerações precedentes; o fato de a intuição nas

relações sociais predominar sobre as associações reflexivas (partidos, sindicatos); a

constatação de se privilegiarem todas as ocasiões de “exaltação” (exaltação festiva,

efervescências diversas), tudo isso cria uma atmosfera específica em que o sujeito substancial,

que, na tradição ocidental, era-nos familiar, não tem mais muita importância. O subjetivo

tende a ceder lugar ao conhecimento direto do íntimo laço entre todas as coisas (Maffesoli,

2006a).

Em contraposição a Maffesoli (2006a, 2006b, 2006c), Castells, com sua teoria da

sociedade de rede, afirma que indivíduos com base em seus interesses, valores e projetos,

montam sua rede social. Assim, fica claro, que, para Castells, a ação individual é fator

principal e, sobretudo definidor de posições e grupos. Partindo dessa idéia de Castells, pode-

se afirmar que antes do surgimento do “Núcleo Hip – Hop Campina”, a cultura hip-hop estava

presente nesta cidade na forma de ações individuais dos sujeitos associados em rede. A rede

tem sido especialmente focalizada no que diz respeito às identidades. Ela converteu-se num

laboratório para realização de experiências com a construção e reconstruções do “eu” na vida

pós-moderna (Garbin, 2003).

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Viver em uma cidade não implica dissolver-se na massa e no anonimato. A violência e

a insegurança pública, a impossibilidade de abranger a cidade leva a procurar na intimidade

doméstica, em encontros confiáveis, formas seletivas de sociabilidade. Os grupos populares

saem pouco de seus espaços, periféricos ou centrais; os setores médios e altos multiplicam as

grades nas janelas, fecham e privatizam ruas do bairro. Segundo Canclini (2006), a

urbanização predominante nas sociedades contemporâneas se entrelaça com a serialização e o

anonimato na produção, com reestruturações da comunicação imaterial (Castells e sua teoria

de sociedade de redes) que modificam os vínculos entre o privado e o público. Essas misturas

de indivíduos oriundos de culturas diversas vão gerar uma nova cultura, uma cultura híbrida.

Apesar de num nível mais estrutural e global, os integrantes do movimento hip-hop

podem, aparentemente, estar frente a conjunturas históricas, sociais e econômicas comuns -

conseqüências da modernidade e do processo de globalização a vários níveis - a verdade é que

não podemos considerar os sujeitos deste movimento como uma unidade globalmente

homogênea. As condições estruturais de existência, os quadros de interação em que se movem

assim como os contextos sociais de produção de sentido, são variáveis que se relacionam com

a formação de padrões de valores, representações, comportamentos e práticas.

Assim, este artigo busca refletir acerca do que leva indivíduos diferenciados em vários

aspectos – religiosos, socioeconômico, gênero, faixa etária, escolaridade, raça – a aderirem

um sentimento comum de pertencimento a um grupo que se mostra coeso e homogêneo. E

verificar em que medida os interesses individuais dos integrantes do movimento hip-hop

interagem com as dinâmicas da coesão social na construção de uma identidade. O estudo está

sendo realizado na cidade de Campina Grande, que, como outros centros urbanos, apresenta

graves problemas sociais e elevados índices de pobreza. Espaço onde várias expressões da

cultura exercitam sua expressividade, dialogando umas com as outras e gerando assim

ambiente propício para a consolidação do movimento hip-hop.

A HOMOGENEIDADE DOS DIFERENTES.

O fenômeno da globalização, responsável por alterar as relações anteriormente

estabelecidas entre os estados nacionais, a sociedade e os indivíduos, se configura nos dias

atuais pela capacidade de criar uma relação de interdependência entre as várias visões de

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mundo – que surgem em detrimento da globalização – estabelecidas pelos indivíduos em

jogo. Como conseqüência, observamos uma transnacionalidade das instâncias decisórias no

âmbito político e econômico, deslegitimando a idéia de estado nacional. Esse novo modelo

global do rompimento de barreiras físicas e políticas, suscitam articulações no plano da

cultura. As culturas que antes eram associadas às nações, agora se fragmentam em, cultura

negra, cultura islâmica, cultura pop, cultura jovem, ou seja, mobiliza-se um conjunto de

identificações que passam pela etnia, religião, gênero, faixa etária, etc., para sanar o espaço

deixado pelo ideal de unidade antes oferecido pela idéia de cultura nacional.

O processo de globalização, ao contrario do que muitos falam, não homogeneíza as

culturas, o que há na verdade, é uma dinâmica de transformação onde, embora a cultura possa

mesclasse com traços aparentemente globais, a sua gênese vital ainda permanece marcada

profundamente por traços locais. Embora, sabendo que esse processo age com intensidades

diferentes, o fenômeno que assistimos é muito mais o da transformação do que o da

uniformização, sendo que a dinâmica por que passam essas culturas é a da recriação. Como

afirma Renato Ortiz (1994, p.31), “Uma cultura mundializada corresponde a uma civilização

cuja territorialidade se globalizou. Isto não significa, porém, que o traço comum seja

sinônimo de homogeneidade”.

Tais transformações que as sociedades vêm passando decorrentes dos fenômenos da

globalização implicam diretamente em mudanças nas relações sociais, o que se refletirá

diretamente nas identidades culturais antes consolidadas. As identificações não têm mais o

limite imposto pelo geográfico, ou seja a proximidade não se consolida mais como parâmetro

definidor de homogeneidade cultural. Podemos nos identificar com milhares de outras pessoas

com preferências, hábitos, desejos e tantas outras questões possíveis de serem postas ao

contato de todos pela globalização. Desta forma, vamos vendo a formação de identidades a

partir das múltiplas possibilidades de se pensar o mundo, de refletir, ou seja, pela forma como

os indivíduos criam os seus estilos de vida e, a partir destes, suas identidades. Segundo

Giddens, a construção da identidade:

“[...] consiste no fato de que as práticas sociais são constantemente

examinadas e reformadas à luz de informações renovadas sobre essas

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próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter [...]”

(GIDDENS, 1991, p.45).

Sendo assim, a construção da identidade passa, necessariamente, pela forma como os

indivíduos criam os seus estilos de vida e, a partir destes, suas identidades. Para Giddens

(2002, p.79), “estilo de vida é um conjunto mais ou menos integrado de práticas que um

indivíduo abraça, não só porque essas práticas preenchem necessidades utilitárias, mas porque

dão forma material a uma narrativa particular de auto-identidade”. A construção da identidade

se dá como uma narrativa de nós mesmo e como narrativa do outro. Ou seja, a identidade é

inseparável de uma narrativa. O movimento hip-hop pode ser considerado exemplo desse

processo de globalização das culturas que tem como fórmula a idéia de desterritorialização e a

reunião daquilo que está territorialmente separado através da comunicação2. Nesse sentido, o

movimento hip-hop se configura como sendo uma forma de construção da identidade juvenil.

Na década de 1970, surge na periferia dos Estados Unidos da América o que hoje

chamamos de movimento hip-hop. Atualmente, podemos observar que tal movimento migrou

para as periferias de diversos países do mundo. Trata-se de um movimento que se consolidou

em espaços urbanos construídos nas mesmas bases: localidades habitadas por uma maioria de

sujeitos afrodescendentes, que vivem em condições de violência, pobreza e discriminação.

“Periferia é periferia em qualquer lugar” é o título de uma canção do grupo de rap brasileiro,

Racionais MC’s e resume a idéia de que em qualquer periferia, qualquer jovem negro e/ou

excluído está submetido às mesmas e precárias condições de vida.

Este lugar é um pesadelo periférico

Fica no pico numérico da população

Aqui a visão já não é tão bela

Existe um outro lugar

Periferia é periferia em qualquer lugar

Lei do cão, lei da selva

2 Meios de comunicação como: internet, televisão, revistas especializadas e outros.

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Muita pobreza, estoura a violência

Nossa raça está morrendo

Não me diga que está tudo bem

(RACIONAIS MC’S, 1998, faixa 8).

O hip-hop tem como objetivo realizar uma transformação simbólica da sociedade. Em

outras palavras, a principal finalidade desse movimento é alterar algumas representações que

definem a realidade social e os sujeitos que dela fazem parte. Por meio de manifestações

artísticas (grafite, rap, break, etc), o hip hop busca oferecer aos jovens excluídos novas

possibilidades de interpretação do mundo e das identidades (Reguillo, 2003). Nesse sentido, o

movimento hip-hop pode ser relacionado também aos novos movimentos sociais urbanos que

não concentram suas reivindicações apenas na transformação da exploração da força de

trabalho que, por sua vez, não é a idéia central do movimento, já que seus sujeitos sequer

fazem parte do mercado formal de trabalho. Tais movimentos reivindicam primeiramente uma

transformação simbólica da sociedade na qual o corpo entra em cena como um símbolo

identitário a ser (res) significado (Carvalho, 2002).

Para Anderson (1989), as nações modernas caracterizam-se, antes de tudo, por serem

comunidades imaginadas, ou seja, a identidade nacional é inteiramente dependente da idéia

que fazemos dela. Uma vez que não seria possível conhecer todas aquelas pessoas que

partilham de nossa identidade nacional, devemos ter uma idéia partilhada sobre aquilo que a

constitui. Tal idéia é formada à medida que diversos sujeitos imaginam compartilhar os

mesmos símbolos e mitos de origem, os quais fundamentam as representações das fronteiras

do que é o nós e o outro da comunidade. A diferença entre as diversas identidades nacionais

reside, portanto, nas diferentes formas pelas quais são imaginadas e delimitadas. No mundo

contemporâneo, diversas comunidades imaginadas, que ultrapassam as fronteiras nacionais –

por exemplo, comunidades étnicas, religiosas, sociedade de rede, e outras, – estão sendo

contestadas e reconstituídas. Nesse sentido, podemos pensar o movimento hip-hop como

sendo uma dessas comunidades imaginadas com símbolos que ao mesmo tempo em que

garantem certa identidade, homogeneizando os indivíduos que congregam a comunidade,

alertam-na também sobre as diferenças existentes no interior da comunidade.

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Compreendendo o movimento hip-hop como sendo uma comunidade imaginada que

através de seus símbolos homogeneíza e evidencia o caráter heterogêneo dos sujeitos que a

compõem, como saber se as ações individuais contribuem para o desenvolvimento do grupo e

a construção de uma identidade? E as ações dos sujeitos, são ou não são, fruto de uma

consciência linear de aperfeiçoamento do movimento? Questões como essas até então não

respondidas por trabalhos anteriores, foram o que motivou a escolha do movimento hip-hop

como objeto de estudo, representando assim uma ruptura do paradigma sociocultural, uma vez

que se intenciona invadir um “território” cultural que até então só tinha sido contemplado na

pesquisa social numa versão homogenia. Essa ruptura reforça a pertinência do estudo aqui

proposto, uma vez que há carência de trabalhos que discutam as estruturas internas do

movimento hip-hop e os diversos mecanismos e estratégias individuais que forma o todo.

Outro aspecto relevante é, sobretudo, o caráter de ineditismo que envolve esta pesquisa, uma

vez que não temos registros de estudos sociológicos acerca da estrutura e funcionamento dos

grupos que formam o movimento hip-hop, provavelmente em virtude da inacessibilidade dos

pesquisadores a eles, pelo caráter “marginal 3” que envolve tais grupos.

A pesquisa está sendo realizada no município de Campina Grande, localizado no

Planalto da Borborema, que possui uma área territorial de 621 km², englobando, além de sua

sede, os Distritos de Galante, são José da Mata e Catolé de Boa vista. De acordo com dados

do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no ano 2005, sua população era de

cerca de 400.000 habitantes, sendo a segunda cidade mais populosa do Estado da Paraíba. Seu

IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), em 2000, era de 0,721, segundo o PNUD.

Embora situada num Estado pobre do Nordeste do Brasil, é considerada um dos principais

pólos industrial e tecnológico dessa região, merecendo destaque nas áreas de informática,

serviços (saúde e educação), comércio e indústria, particularmente, na indústria de calçados e

têxtil, suas principais atividades econômicas, cuja produção é exportada para diversos países.

Sua produção agrícola e agropecuária, também exerce grande influência na economia do

Estado. A maior parte de seu PIB hoje é arrecadada com os serviços (64,1% do total) e com as

atividades industriais (30,1%).

3 No sentido de vândalo, transgressor. Infelizmente muitas pessoas ainda carregam certos tipos de

preconceitos acerca de determinados grupos juvenis.

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Campina Grande, como outros centros urbanos contemporâneos, convive com

assimetrias, apresentando graves problemas sociais e elevados índices de pobreza, além de um

grande número de desempregados e de trabalhadores no setor informal. Segundo dados da

Secretaria de Planejamento do Município, estão cadastrados 38 favelas ou assemelhados. É

este, pois, o perfil de Campina Grande, em cujo espaço, várias expressões da cultura

exercitam sua expressividade. Nesse convívio, cada um, a seu modo, dialoga com o outro,

resultando desse diálogo, um ambiente propicio para a consolidação do movimento hip-hop.

Não há bibliografia que trate do surgimento do movimento hip-hop na cidade de

Campina Grande. Há indícios de elementos da cultura hip-hop como Djs, Bboys, Mcs e

Grafiteiros, que atuam desde meados da década de 1990 sem serem reconhecidos – por parte

dos grupos externos – como membros da cultura hip-hop. Essa falta de reconhecimento se deu

pela pouca repercussão e visibilidade que as ações dos indivíduos tiveram na cidade. Embora

essas ações fossem significativas para o grupo que a praticam, para os outros de fora essas

ações não passavam de práticas isoladas, algumas com maior visibilidade, outras com menos.

Podemos citar o grafite como sendo o elemento que mais se apresentou - por representar as

artes plásticas do movimento hip-hop e por aparecer diretamente nos muros da cidade - aos

olhos dos “outros” que habitam a cidade. E mesmo assim, o grafite passou por grande

preconceito e discriminação.

As práticas dos indivíduos passam a ser vistas, reconhecidas e associadas ao

movimento hip-hop quando os seus integrantes decidem formar o “Núcleo Hip-Hop

Campina”. A instituição foi formada no início de 2007 e os cargos que compõem a sua

estrutura são criados mediante uma assembléia que define quais as posições que os indivíduos

irão ocupar dentro do “Núcleo Hip-Hop Campina”. Após a sua formação, as práticas dos

indivíduos continuam a serem realizadas, shows de Djs continuam acontecendo, muros

continuam sendo grafitados, porém, agora não são só, os símbolos e o sentimento de

pertencimento ao movimento que irá dar visibilidade a cultura hip-hop na cidade de Campina

Grande, mas, uma instituição concreta e objetiva.

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CONCLUSÃO

Neste texto, procuramos trazer a luz do debate questões que estão servindo de

inquietações reflexivas para o desenvolvimento da dissertação de mestrado. Questões como,

entender o que leva indivíduos diferenciados a aderirem um sentimento comum de

pertencimento a um grupo que se mostra coeso e homogêneo e verificar se os interesses

individuais dos integrantes do movimento contribuem para a coesão do grupo.

Face ao objeto de estudo e à problemática, é imprescindível entender o que leva

indivíduos diferenciados a aderirem um sentimento comum de pertencimento a um grupo que

se mostra coeso e homogêneo e verificar se os interesses individuais dos integrantes do

movimento contribuem para a coesão do grupo. Assim sendo, a metodologia mais adequada

para a recolha de informação é uma abordagem qualitativa e quantitativa do objeto de estudo,

numa pesquisa de caráter exploratório, descritivo e explicativo acerca da formação, da

estrutura e do funcionamento das relações que se desenvolvem dentro do movimento hip-hop.

Assim buscaremos responder questões referentes à subjetividade desses sujeitos, como

também outras que dizem respeito a quantidade e aos lugares que os mesmos ocupam na

cidade de Campina Grande; objetivando identificar desta forma as relações entre eles e a

realidade social, pois como enfatiza Minayo (2001), “a realidade social é o próprio

dinamismo da vida individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela

transbordante.” E é nessa perspectiva que buscamos aprofundar a complexidade desse

fenômeno.

Recorreremos à pesquisa no terreno, por um lado, para facilitar a aproximação e o

estabelecimento de uma relação de confiança, e por outro lado, por permitir uma melhor

compreensão dos comportamentos dos integrantes do “Núcleo Hip-Hop Campina”. Para fins

de coleta de dados, será utilizado o estudo de caso, através de entrevistas em profundidade

com membros desse grupo - onde serão aplicados questionários - além de depoimentos. Para

análise dos dados da pesquisa utilizaremos o método da análise de conteúdo, explícitos ou

latentes, das entrevistas e dos depoimentos, subsidiando o percurso analítico pelas teorias

antropológicas. Sendo assim, A etnografia, observação e grupos focais também serão técnicas

adotadas para a coleta de dados, possibilitando apreender formas de sociabilidade e

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compreender o funcionamento dos espaços de socialização e de expressão do movimento hip-

hop.

Durante esse caminho metodológico de recolha de dados, não podemos nos esquecer

de que o familiar e o exótico, no que se refere ao conhecimento do outro, deve levar em

consideração que o outro surpreende, não podemos ser onipotentes achando que sabemos tudo

sobre o outro, assim é preciso vê-lo primeiro e não esquecer que conhecer depende da

interação. Velho lembra que GEERTZ (2005) enfatiza a interpretação, o conhecimento da

vida social depende da subjetividade e esta tem caráter aproximado e não definitivo. A

realidade – familiar ou exótica – é filtrada sempre pelo ponto de vista do observador e

percebida de maneira diferente, de modo que a objetividade é relativa, ideológica e

interpretativa.

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