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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL I – TAN TÓPICOS DE CORRECÇÃO DA PROVA ESCRITA DE COINCIDÊNCIA – 2013.14 1. O desaparecimento de Bernardo configura uma situação de ausência e não a do art. 68/3 do CC. A mera ida à praia, sem mais factos que permitam demonstrar que tenha entrado na água, não é suficiente para preencher os pressupostos do 68.º/3 CC. Só com a declaração de morte presumida pode o cônjuge do ausente voltar a casar (art. 116º CC), não obstante aquela não dissolver o casamento (art. 115º CC). Os requisitos para a declaração de morte presumida não se encontram preenchidos (art. 114/1 CC) A interpretação do art. 116º CC no sentido de o aplicar também ao cônjuge do ausente casado catolicamente. 2. Os contratos de compra e venda celebrados por Celeste são, no caso, actos de disposição de bens que não lhe pertencem. Cf. art. 1678/2/g CC que não impede que se requeira a curadoria provisória. Só após a ausência presumida, ou seja, uma vez decretada a curadoria provisória, poderia ela, enquanto curadora, praticar os actos previstos no artigo 94º CC. Seria necessário demonstrar além da situação de ausência, a inexistência de procurador bastante e a existência de património que seria necessário administrar. Os poderes do curador são apenas de administração ordinária, não dispondo, portanto, de poderes de disposição, pelo que os negócios em causa seriam inválidos. 3. A universalidade de facto: art. 206º CC. 4. Nestas situações é preciso determinar se foi o pai que sobreviveu ao filho ou vice- versa. As circunstâncias que rodearam o desaparecimento de António podem justificar a aplicação do art. 68/3 CC. Já quanto ao pai, trata-se de uma situação de ausência. Uma vez declarada a morte presumida do pai, esta reporta-se ao fim do dia das últimas notícias que dele houve (114/3 CC); se for de admitir que o filho tenha morrido no momento em que praticava surf, terá morrido antes do pai, sendo este seu herdeiro. Em caso de dúvida, deve aplicar-se a presunção de comoriência prevista no artº 68/2 CC, o que significa que, tendo morrido ambos ao mesmo tempo, nem o pai herda do filho, nem este daquele. 5. O direito subjectivo à imagem (79/1 CC) enquanto direito de personalidade (características); os limites deste direito – 79/2 CC (particularmente no que se refere ao enquadramento da imagem na de um lugar público); tutela deste direito: 79/2/2ª parte CC. 6. À data do contrato que Daniel celebrou com a Fundação Osório, Daniel ainda não tinha completado 18 anos de idade, no entanto casara com 17 anos e com autorização da mãe. Daniel é menor à data do casamento, mas tem idade núbil (1601/a CC), pelo que pode casar. Não tendo capacidade de exercício, por ser menor, carece da autorização para casar (art. 1604/a e 1612, ambos do CC).

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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL I – TAN TÓPICOS DE CORRECÇÃO DA PROVA ESCRITA DE COINCIDÊNCIA – 2013.14

1. O desaparecimento de Bernardo configura uma situação de ausência e não a do art.

68/3 do CC. A mera ida à praia, sem mais factos que permitam demonstrar que tenha

entrado na água, não é suficiente para preencher os pressupostos do 68.º/3 CC.

Só com a declaração de morte presumida pode o cônjuge do ausente voltar a casar

(art. 116º CC), não obstante aquela não dissolver o casamento (art. 115º CC).

Os requisitos para a declaração de morte presumida não se encontram preenchidos

(art. 114/1 CC)

A interpretação do art. 116º CC no sentido de o aplicar também ao cônjuge do ausente

casado catolicamente.

2. Os contratos de compra e venda celebrados por Celeste são, no caso, actos de

disposição de bens que não lhe pertencem. Cf. art. 1678/2/g CC que não impede que

se requeira a curadoria provisória.

Só após a ausência presumida, ou seja, uma vez decretada a curadoria provisória,

poderia ela, enquanto curadora, praticar os actos previstos no artigo 94º CC.

Seria necessário demonstrar além da situação de ausência, a inexistência de

procurador bastante e a existência de património que seria necessário administrar.

Os poderes do curador são apenas de administração ordinária, não dispondo,

portanto, de poderes de disposição, pelo que os negócios em causa seriam inválidos.

3. A universalidade de facto: art. 206º CC.

4. Nestas situações é preciso determinar se foi o pai que sobreviveu ao filho ou vice-

versa. As circunstâncias que rodearam o desaparecimento de António podem justificar

a aplicação do art. 68/3 CC. Já quanto ao pai, trata-se de uma situação de ausência.

Uma vez declarada a morte presumida do pai, esta reporta-se ao fim do dia das

últimas notícias que dele houve (114/3 CC); se for de admitir que o filho tenha morrido

no momento em que praticava surf, terá morrido antes do pai, sendo este seu

herdeiro.

Em caso de dúvida, deve aplicar-se a presunção de comoriência prevista no artº 68/2

CC, o que significa que, tendo morrido ambos ao mesmo tempo, nem o pai herda do

filho, nem este daquele.

5. O direito subjectivo à imagem (79/1 CC) enquanto direito de personalidade

(características); os limites deste direito – 79/2 CC (particularmente no que se refere

ao enquadramento da imagem na de um lugar público); tutela deste direito: 79/2/2ª

parte CC.

6. À data do contrato que Daniel celebrou com a Fundação Osório, Daniel ainda não tinha

completado 18 anos de idade, no entanto casara com 17 anos e com autorização da

mãe.

Daniel é menor à data do casamento, mas tem idade núbil (1601/a CC), pelo que pode

casar. Não tendo capacidade de exercício, por ser menor, carece da autorização para

casar (art. 1604/a e 1612, ambos do CC).

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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL I – TAN TÓPICOS DE CORRECÇÃO DA PROVA ESCRITA DE COINCIDÊNCIA – 2013.14

O menor emancipa-se pelo casamento, adquirindo capacidade genérica de exercício

(arts. 132 e 133, ambos do CC).

À data da emancipação estava pendente uma acção de inabilitação de Daniel: arts.

152º, 138/2/2ªparte e 141/2 aqui aplicados por força do art. 156º, todos do CC.

A surdez não é fundamento indicado no artº 152 CC, cujo carácter taxativo deve ser

equacionado.

A interdição foi decretada antes de Daniel atingir a maioridade mas após a sua

emancipação: art. 131º CC, aqui aplicado por analogia.

Assim, o negócio que Daniel celebrou, é anulável porquanto:

- não obstante se ter emancipado, e por força dos arts. 131º CC e 125º CC, mantém-se

a sua incapacidade de exercício enquanto menor, até ao trânsito em julgado da

sentença (sendo necessário demonstrar que não é aplicável o artº 127/1 CC, em

particular a sua alínea a)).

- estava pendente uma acção de inabilitação (arts. 149/1 e 156º, ambos do CC), o

negócio causou prejuízo ao inabilitando (preço simbólico) e a inabilitação foi

efectivamente decretada (o inabilitado não tem capacidade de exercício para praticar

actos de disposição de bens em vida -153º CC)

Apenas Celeste poderia invocar a incapacidade de exercício de Daniel resultante da

aplicação dos arts 131.º e 125/1/a, ambos do CC. Contudo a sua legitimidade cessa

com o trânsito em julgado da sentença proferida na acção de inabilitação (cf. parte

final do art. 125/1/a CC).

Apenas Eduarda, enquanto curadora (artº 125/1/a CC aplicável por forças dos arts

156º e 139º do CC ), poderia requerer a anulação do negócio por se encontrarem

preenchidos os requisitos dos arts 149/1+156º CC e por estar a tempo de o fazer (

149/2+156ºCC), o que não sucedeu.

A Fundação tem capacidade de gozo genérica podendo não ter legitimidade para

celebrar este negócio em concreto: art. 160/1 CC. Nesse caso, seria o negócio anulável

por aplicação analógica dos artºs 177 a 179 do CC, ou por aplicação analógica do

regime previsto no CSC.

Em qualquer caso, não tem Celeste legitimidade para invocar tal fundamento de

anulação nos termos gerais: art. 287 CC.

7. A limitação voluntária ao exercício do direito à integridade física: art. 81º CC.

O consentimento de Daniel é anulável nos termos referidos na resposta anterior.

A contrariedade à ordem pública torna nula a limitação voluntária deste direito. A

intervenção cirúrgica é, assim, uma violação ilícita do direito de Daniel à sua

integridade física, cuja tutela abrange um pedido indemnizatório (art. 70/2/1ª parte e

art. 483º, ambos do CC).

A pessoa colectiva responde civilmente pelos actos dos seus agentes (arts 165ºCC, sem

prejuízo de, no caso, se aplicarem disposições do CSC).