texto 3- grandezas e medidas

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Ministério da Educação Secretaria de Educação Básica Diretoria de Apoio à Gestão Educacional Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa GRANDEZAS E MEDIDAS Brasília 2014 Caderno 06 PNAIC_MAT_Caderno 6_pg001-080.indd 1 24/3/2014 14:11:05

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Texto 3- Grandezas e Medidas

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  • Ministrio da EducaoSecretaria de Educao Bsica

    Diretoria de Apoio Gesto Educacional

    Pacto Nacional pela Alfabetizao

    na Idade CertaGRANDEZAS E MEDIDAS

    Braslia 2014

    Caderno 06

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  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Centro de Informao e Biblioteca em Educao (CIBEC)

    Brasil. Secretaria de Educao Bsica. Diretoria de Apoio Gesto Educacional. Pacto Nacional pela Alfabetizao na Idade Certa: Grandezas e Medidas / Ministrio da Educao, Secretaria de Educao Bsica, Dire-toria de Apoio Gesto Educacional. Braslia: MEC, SEB, 2014. 80 p.

    ISBN 978-85-7783-141-8

    1. Alfabetizao. 2. Alfabetizao Matemtica. 3. Grandezas. 4. Medidas

    MINISTRIO DA EDUCAOSecretaria de Educao Bsica SEBDiretoria de Apoio Gesto Educacional DAGE

    Tiragem 362.388 exemplares

    MINISTRIO DA EDUCAOSECRETARIA DE EDUCAO BSICA Esplanada dos Ministrios, Bloco L, Sala 500CEP: 70.047-900Tel: (61) 2022-8318 / 2022-8320

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  • Sumrio

    GRANDEZAS E MEDIDAS

    05 Iniciando a Conversa

    07 Aprofundando o Tema

    07 Grandezas e Medidas a partir do universo infantil

    13 A medida em nossas vidas

    18 A importncia de ensinar Grandezas e Medidas

    24 O olhar do observador

    28 Afinal, o que medir?

    36 A feira e as cuias

    41 matapi, paneiro!

    48 Valor monetrio

    53 Tempo cabea, tempo mo

    63 Compartilhando

    75 Para Saber Mais

    75 Sugestes de Leituras

    76 Sugesto de Vdeo

    76 Sugesto de Site

    77 Sugestes de Atividades para os Encontros em Grupos

    79 Atividades para Casa e Escola

    80 Referncias

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  • CADERNO 6 | GRANDEZAS E MEDIDAS

    Organizadores:Carlos Roberto Vianna, Emerson Rolkouski

    Autores:Carlos Roberto Vianna, Danilo Pereira Munhoz, Eliane Costa Santos, Emerson Rolkouski, Keli Mota Bezerra, Jlio Csar do Valle, Mabi Katien Batista de Paula, Mara Sueli Simo Moraes, Maria do Carmo Santos Domite, Rgis Luz Lima de Souza, Rodrigo Abreu, Valdirene Rosa de Souza, Vanisio Luiz Silva

    Autores dos Relatos de Experincia:Cibelle Lima, Clcia Damasceno de Lima, Flavia Gomes Silva do Nascimento, Maria das Dores de Morais, Maria Gracineide Codeiro Mergulho Teti, Marlene Brunnquell, Thais Izabelle Lins da Silva

    Comit Gestor:Adilson Oliveira do Esprito Santo, Liane Teresinha Wendling Roos, Mara Sueli Simo Moraes

    Consultores: Alexandrina Monteiro, Alina Galvo Spinillo, Antonio Jos Lopes, Celi Espasandin Lopes, Cristiano Alberto Muniz, Gilda Lisba Guimares, Maria da Conceio Ferreira Reis Fonseca, Maria Tereza Carneiro Soares, Rosinalda Aurora de Melo Teles

    Pareceristas ad hoc:Adail Silva Pereira dos Santos, Adriana Eufrasio Braga Sobral, Ana Marcia Luna Monteiro, Carlos Eduardo Monteiro, Cecilia Fukiko Kamei Kimura, Clarissa Arajo, Gladys Denise Wielewski, Iole de Freitas Druck, Lilian Nasser, Maria Jos Costa dos Santos, Paula Moreira Baltar Bellemain, Paulo Meireles Barguil, Rute Elizabete de Souza Rosa Borba

    Leitores Crticos: Camille Bordin Botke, Enderson Lopes Guimares, Flavia Dias Ribeiro, Helena Noronha Cury, Laza Erler Janegitz, Larissa Kovalski, Leonora Pilon Quintas, Luciane Ferreira Mocrosky, Luciane Mulazani dos Santos, Marcos Aurelio Zanlorenzi, Maria do Carmo Santos Domite, Michelle Tas Faria Feliciano, Nelem Orlovski

    Apoio Pedaggico:Laza Erler Janegitz, Nelem Orlovski

    Reviso:Clia Maria Zen Franco Gonalves

    Projeto grfico e diagramao:Labores Graphici

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    C A D E R N O 6G R A N D E Z A S E M E D I D A S

    Iniciando a Conversa

    Este caderno apresenta uma configurao com abordagens, sequncias didticas e encaminhamentos tericos que, no conjunto, tm como objetivo oferecer aos professores possibilidades de trabalhar de modo adequado o eixo Grandezas e Medidas, considerando os diferentes contextos.

    A palavra configurao, usada acima, tem um significado que pode ser buscado na analogia com uma sucesso de observaes que uma pessoa faz ao observar um caleidoscpio. A cada olhar, as pecinhas ali dentro assumem uma configurao diferente. Na analogia, isso significa que os textos deste caderno podem ser lidos numa ordem aleatria, que o professor pode procurar ler primeiro o texto sobre unidade de tempo, ou o texto sobre capacidade, ou ainda o texto sobre o significado da medida. A sequncia de textos aqui apresentada uma das possveis, e a julgamos proveitosa no sentido de partir das prticas de sala de aula, chegando a uma teorizao. Entretanto, outras pessoas podero julgar mais interessante comear pelo final. De modo geral, os Direitos de Aprendizagem das crianas de 6 a 8 anos prevem que elas sejam capazes de experimentar situaes cotidianas ou ldicas, envolvendo diversos tipos de grandezas, tais como: comprimento, massa, capacidade, temperatura e tempo.

    Desta forma, o objetivo deste caderno oferecer subsdios aos professores para que planejem modos de levar o aluno a:

    construir estratgias para medir comprimento, massa, capacidade e tempo, utilizando unidades no padronizadas e seus registros; compreender o processo de medio, validando e aprimorando suas estratgias;

    reconhecer, selecionar e utilizar instrumentos de medida apropriados grandeza (tempo, comprimento, massa, capacidade), com compreenso do processo de medio e das caractersticas do instrumento escolhido;

    produzir registros para comunicar o resultado de uma medio, explicando, quando necessrio, o modo como ela foi obtida;

    comparar comprimento de dois ou mais objetos para identificar: maior, menor, igual, mais alto, mais baixo, etc.;

    identificar a ordem de eventos em programaes dirias, usando palavras como: antes, depois, etc.;

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    G R A N D E Z A S E M E D I D A S

    reconhecer a noo de intervalo e perodo de tempo para o uso adequado na realizao de atividades diversas;

    construir a noo de ciclos atravs de perodos de tempo definidos por meio de diferentes unidades: horas, semanas, meses e ano;

    identificar unidades de tempo dia, semana, ms, bimestre, semestre, ano - e utilizar calendrios e agenda; alm de estabelecer relaes entre as variadas unidades de tempo;

    leitura de horas, comparando relgios digitais e analgicos;

    reconhecer cdulas e moedas que circulam no Brasil e de possveis trocas entre cdulas e moedas em funo de seus valores em experincias com dinheiro em brincadeiras ou em situaes de interesse das crianas.

    No trabalho com estes objetivos fundamental manter a referncia ao uso de partes do corpo no processo de medio, ao uso e a criao de jogos, bem como discusso sobre textos de literatura que trazem elementos do mundo das medidas. As medidas no devem ser vistas apenas como um contedo escolar de matemtica que se deve obrigatoriamente conhecer, ao contrrio, a escola dever nos ajudar a perceber o quanto usamos de medidas no dia a dia, abrindo possibilidades de tornarmos esse uso o mais amplo possvel.

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    C A D E R N O 6G R A N D E Z A S E M E D I D A S

    Aprofundando o Tema

    GRANDEZAS E MEDIDAS A PARTIRDO uNIVERSO INfANTILCarlos Roberto Vianna

    Emerson Rolkouski

    UMA EXPERINCIA COM MEDIDAS NOCICLO DE ALFABETIZAO

    Relato de experincia da professora Maria das Dores de Morais (Professora Dora), da rede municipal de educao de Jaboato dos Guararapes

    Pernambuco.

    importante situar que o trabalho foi realizado com alunos de um terceiro ano, de uma turma formada por 20 alunos com idade entre 9 e 11 anos. Ao longo de 2013, essa turma manteve uma rotina diria de trabalho, tendo a leitura como elemento norteador das demais atividades. Na sequncia didtica a seguir, mostraremos uma parte do trabalho relacionado s medidas.

    A aula tem incio com questionamentos do tipo: vocs sabem o que medir? J realizaram alguma medio? O que eu posso medir? Quais instrumentos podemos utilizar para medir?

    Com estas perguntas, busca-se antecipar alguns aspectos do tema a ser trabalhado (nesse caso, a comparao e medio de comprimentos) e situar o professor em relao aos conhecimentos que os alunos tm sobre o assunto.

    Em seguida, os alunos foram convidados a sentar em crculo para ouvir a leitura do livro Quem vai ficar com o pssego?

    O livro escolhido apresenta fatos relativos comparao de algumas grandezas, propiciando uma familiarizao dos alunos com o contedo a ser trabalhado durante a aula.

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    No trabalho de sala de aula, antes de iniciar a leitura da histria, foram feitas algumas questes: qual o ttulo? Quem o autor? Quem o ilustrador? Qual a funo dessas pessoas? Como vocs acham que ser a histria? Essa discusso teve por objetivo o levantamento de hipteses, o desenvolvimento da oralidade e da argumentao dos alunos, habilidades que tambm foram estimuladas durante a leitura, por meio de questionamentos acerca dos prximos acontecimentos da histria.

    Aps a leitura, os alunos foram solicitados a estimar o comprimento da altura da figura de uma girafa, construda previamente em classe, um dos personagens da histria. As respostas foram escritas num quadro para que, posteriormente, pudssemos identificar o aluno que, com sua estimativa, chegou mais prximo de acertar a medida real.

    Em seguida, a turma foi dividida em cinco grupos de quatro alunos e cada grupo recebeu um barbante com o mesmo comprimento da altura da girafa para que fizessem uma medio utilizando unidades no padronizadas (palito de churrasco, canudos, canetas, etc.). Nesse momento, foi necessria a interveno da professora para demonstrar como os alunos deveriam executar essa medio corretamente. Esse trabalho prvio foi necessrio para que percebessem que ao medir o barbante obteriam a mesma medida que a altura da girafa, isso porque no poderiam medir diretamente a altura da girafa, seja por ela ser alta demais, seja por ela ser pouco resistente ao contato com muitas pessoas.

    Ao trmino das medies, cada grupo foi solicitado a apresentar o resultado obtido e a resgistr-lo em um painel desenhado no quadro.

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    Com a consolidao dos dados, os alunos puderam observar que foram encontradas medidas diferentes e questionaram como isso era possvel se a girafa tinha a mesma altura. Aps longo debate, chegaram concluso de que era necessrio ter uma mesma coisa (unidade) para se chegar mesma medida. Ou seja, eles concluram que, utilizando unidades de medida no padronizadas, encontram resultados diferentes na medio de um mesmo objeto.

    Aps essa concluso, cada grupo recebeu um canudo plstico de mesmo comprimento para fazer nova medio, agora com um padro. Dessa vez, como esperado, os resultados obtidos foram os mesmos. Ainda assim, esses resultados no poderiam ser utilizados para avaliar a estimativa feita inicialmente, pois a mesma estava expressa em metros.

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    Questionados se conheciam a fita mtrica e em quais situaes ela era utilizada, os alunos citaram a utilizao, por pedreiros, na construo de paredes, por costureiras, na confeco de roupas, e pelo mdico quando vo a uma consulta. Salientando o uso da fita mtrica como instrumento de medida utilizado no dia a dia, uma nova medio do comprimento da girafa foi realizada e pode-se identificar, ento, o aluno cuja estimativa mais se aproximou do resultado obtido.

    Na continuidade da sequncia didtica, uma nova atividade de medio foi proposta: cada aluno deveria fazer uma estimativa da sua prpria altura. Em seguida, receberam fitas mtricas e organizaram-se para medir o comprimento de cada um, cortando um barbante com a mesma medida. Com esses barbantes, construram um grfico com as medidas ordenadas crescentemente e foram solicitados a responder, por meio de uma ficha, qual o aluno mais alto, o mais baixo, e quantos eram maiores e menores que ele.

    Para concluir, os alunos foram apresentados ao jogo Batalha das Grandezas, que consiste da utilizao de um baralho de 12 cartas, cada uma contendo dados sobre um animal (comprimento, peso*, tempo de gestao e tempo de vida), com o objetivo de comparar essas caractersticas.

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    * Nota dos Organizadores: No cotidiano, costumamos utilizar a palavra peso referindo-nos a massa do objeto. Este o uso da palavra que ser feito neste caderno e ele no est em desacordo, por exemplo, com o uso feito pelo Instituto Brasileiro de Pesos e Medidas. Mais tarde, na escolarizao, alunos e professores iro se deparar com situaes nas quais haja necessidade de fazer a diferenciao entre massa e peso, este no o momento para isso.

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    Este caderno comea com um relato para evidenciar algo fundamental para o tratamento didtico, com os primeiros anos, do tema Grandezas e Medidas: a necessidade absoluta de trabalhos nos quais as crianas se ponham mobilizadas em prticas efetivas de medies. Pouco adianta o professor construir materiais para as crianas apenas olharem, e pouco adianta o professor falar sobre o contedo que as crianas devem aprender sem que elas faam medies e adquiram o hbito de conversar entre elas sobre os resultados obtidos. Na sequncia didtica acima deve-se observar vrios detalhes que sero retomados em outros textos, mais adiante:

    Em seguida, foram repassadas as seguintes instrues:

    as cartas devem ser distribudas igualmente entre os jogadores e colocadas sobre a mesa;

    o primeiro jogador (determinado por mtodo definido pelos alunos) retira a primeira carta do seu monte e escolhe a caracterstica (grandeza) mais forte do animal desenhado na sua carta. Por exemplo, se a carta retirada for a da girafa, pela lgica o jogador dever escolher a grandeza comprimento - referindo-se a altura da girafa;

    os demais jogadores mostram, um por vez, a carta de cima do seu monte, fazendo a comparao para ver qual apresenta a maior medida da grandeza escolhida. O jogador que tiver a carta com a maior grandeza recolhe todas as cartas;

    em caso de empate entre dois ou mais jogadores, aqueles que empataram, retiram mais uma carta do monte, repetindo o processo, at que haja um vencedor que fica com todas as cartas disputadas na rodada;

    vence o jogo o jogo quem conseguir o maior nmero de cartas.

    Aps as explicaes, a turma se dividiu em grupos de quatro alunos, cada um recebeu um baralho e iniciou a brincadeira, dando continuidade ao estudo das grandezas e medidas.

    A professora Dora avaliou que o trabalho desenvolvido propiciou conexo com diferentes reas do conhecimento. Em Lngua Portuguesa, os alunos construram hipteses e fizeram leituras diversas, exercitando a oralidade e a argumentao das ideias apresentadas. Em Matemtica, foram feitas medies, estimativas, construdas unidades de medida no padronizadas e chegou-se a percepo da necessidade de uma unidade padro. Ainda em Matemtica houve a conexo com a Educao Estatstica (construo de grfico), nmeros e operaes (contagem, ordenao). Em Cincias, os alunos trabalharam com caractersticas (peso, altura, tempo de gestao, tempo de vida) de alguns animais.

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    a) Essa uma sequncia para alunos de terceiro ano, muitos aspectos relacionados ao ensino e aprendizagem das grandezas e medidas antecedem este trabalho, dentre eles a percepo de grandezas que podem ser medidas, a percepo da necessidade da contagem para que se possa expressar quantas vezes cabe uma coisa (como dizem as crianas) dentro da outra. Passa-se por dificuldades que algumas vezes colocam os professores em situao difcil, por exemplo: a ideia que algumas crianas de primeiro e segundo ano tm de que a grandeza varia conforme a posio (ou formato, ou outra propriedade) do objeto. Estas so questes de base, associadas com a relao entre a ideia de nmero (e o aprendizado da correspondncia e da contagem) e a ideia da medio; pela relao entre as classificaes, ordenaes, seriaes e as primeiras noes sobre grandezas. Estes aspectos, embora amplamente discutidos na literatura, so complexos e sutis, e devem receber ateno adequada, tanto do ponto de vista cognitivo, quanto do ponto de vista didtico.

    b) Superadas as barreiras iniciais, as sequncias didticas de trabalho so estruturadas dentro de um padro que deve ser testado, questionado e modificado com muitas atividades prticas: a medio com padres no convencionais (palmos, ps, cuias, ...); a percepo da diversidade de resultados e impossibilidade de comparaes entre eles (duas coisas que mediram 5 palmos so iguais? Isso depende se foram medidas pela mesma pessoa, mas e se voc no tiver essa informao, souber apenas que mediram 5 palmos?...); a medio com um padro consensual (palmos do professor, ou canudos de refrigerante so padres comumente adotados nas classes para a medida de comprimento); e a medio adotando-se o padro usual (metro, no caso das medidas de comprimento).

    No percurso desse desenvolvimento, deve-se passar pela percepo da necessidade de unidades de medida e do seu fracionamento (em qualquer dos usos de padres de medida chega-se com facilidade a algo do tipo: um palmo e um pouquinho, ou um palmo e dois dedos, sendo essa parte que sobra ou que falta, o fator prtico do uso das medidas, que impe a necessidade de criar as fraes da unidade de medida).

    Como se v, um longo trabalho, que exige pacincia e dedicao dos professores, e que se mostra fundamental como eixo articulador entre a Geometria (que fornece objetos e figuras que podem ser medidos) e Nmeros (que fornece elementos que expressam em valores numricos os resultados das medies). Mas no s isso! A sequncia apresentada, como bem mostrou a Prof.a Dora, evidencia o potencial de relaes, atravs das medidas, da Matemtica com outras reas do conhecimento.

    Nos prximos textos, veremos algumas observaes feitas por pesquisadores e professores que chamam a nossa ateno para aspectos conceituais que no devemos deixar de lado quando planejarmos nosso trabalho com as crianas.

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    C A D E R N O 6G R A N D E Z A S E M E D I D A S

    A MEDIDA EM NOSSAS VIDAS*Eliane Costa Santos

    Jlio Csar do Valle

    Keli Mota Bezerra

    Maria do Carmo Santos Domite

    Rgis Luz Lima de Souza

    Rodrigo Abreu

    Valdirene Rosa de Souza

    Vanisio Luiz Silva

    O ato de medir, muito comum em nosso dia a dia, leva, em geral, necessidade do uso de nmeros: estamos sempre falando do nmero de quilmetros em uma viagem, quantos dias faltam para o Natal ou para nosso aniversrio, quantos quilogramas engordamos depois das festas de final de ano, etc. Os nmeros nos informam como est a temperatura e o ndice de umidade do ar, ou poderiam dizer quanto a gua est dura expressando a concentrao de clcio ou, ainda, poderiam expressar uma unidade quase desconhecida como o albedo, que nos diz sobre o quanto um objeto reflete a luz. O ato de medir est to presente no nosso dia a dia como o ato de contar e as medies so sempre expressas por nmeros, mesmo que sejam medidas de grandezas das quais nunca ouvimos falar.

    No entanto, o ensino e a aprendizagem das medidas na Educao fundamental tem sido uma das mais frustrantes experincias para alunos e professores. H dificuldades em falar sobre medida de tempo, de temperatura, de capacidade, dificuldades em converter uma unidade em outra e dificuldades com frmulas. Embora aspectos como a converso de unidades e o uso de frmulas no sejam alvo do Ciclo de Alfabetizao que deve privilegiar a construo da noo de grandeza e de medida , uma abordagem adequada do ponto de vista conceitual e didtico neste ciclo poder ajudar a minimizar estas dificuldades nos ciclos posteriores.

    De um modo geral, as crianas entram na escola com conhecimentos diferentes, grande diversidade cultural no s de experincias entre elas, mas tambm famililiares. Alm disso, muitas vezes, a mobilidade das populaes aumenta essas diferenas por exemplo, no caso das crianas das escolas indgenas. Assim, uma das principais tarefas colocadas, hoje, ao professor procurar trabalhar a partir de experincias comuns entre os alunos, de modo que a educao escolar possa acontecer valorizando os conhecimentos que eles j possuem. Nesta unidade examinaremos algumas evidncias sobre os conhecimentos das crianas no que diz respeito s medidas, apresentando sugestes aos professores de como desenvolv-los e, sempre que possvel, alertando-os sobre como evitar possveis equvocos. Refletiremos sobre como as crianas pensam as medidas, esperando contribuir para que os leitores/professores possam planejar atividades adequadas para suas turmas.

    * Nota dos Organizadores: Todos os artigos escritos por este grupo de autores foram elaborados a partir de pesquisas que proporcionaram uma base de dados e experincias que tornaram possvel elaborar coletivamente os relatos ficcionais. Todos os textos inseridos neste caderno so parte de um trabalho mais amplo, ainda em produo.

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    Comecemos com uma constatao que praticamente um senso comum: frequentemente observamos, seja como professores, seja nas relaes com a famlia, que algumas ideias das crianas sobre medidas provocam estranhamento nos adultos. Por exemplo: um professor de primeiro ano mostra a uma criana dois rolos iguais de massa de modelar e, na frente dela, transforma um dos rolos numa bola e o outro rolo em uma minhoca. Em seguida, pergunta criana: Onde h mais massa, na bola ou na minhoca? Alguns professores se espantam quando presenciam a criana expressando uma preferncia. Algumas dizem que h mais massa na bola e outras que h mais massa na minhoca. Se pararmos para pensar, parece claro que mais massa no significa para as crianas o mesmo que significa para os adultos. Na verdade, fica vago para os adultos se as crianas realmente acreditam que a quantidade de massa, misteriosamente, muda com a mudana de formato, ou se elas no entenderam a questo formulada. O que claro que existe algum mal-entendido, e o que estamos chamando a ateno que esse mal-entendido pode causar dificuldades no estudo sobre medidas.

    Os comprimentos, massas, capacidades, entre outras grandezas, so experimentadas, desde cedo, pelas crianas pequenas, sendo anunciadas a partir das caractersticas dos objetos, comparando-os. Se perguntarmos a uma criana de 6 anos: A mesa da professora passa pela porta da sala?, possivelmente assistiremos a criana arrastar a mesa at a porta para conferir se, de fato, a mesa pode passar pela porta. Tudo indica que o ato de comparar permite-lhes pensar, num primeiro momento, sobre caractersticas contrrias dos objetos, como grande/pequeno, comprido/curto, longe/perto, muito/pouco. Entretanto, essas reaes vo se modificando e as comparaes feitas pelas crianas (como, por exemplo, o caderno azul maior que o cinza; minha bola mais leve e maior do que a sua, entre outros) passam a ser substitudas pela pergunta quanto ou quantas vezes maior?, levando o professor a oferecer uma unidade de medida de acordo com as grandezas. No que se refere a esse comportamento da criana, podemos considerar que as habilidades comparativas no garantem a compreenso de todos os aspectos implicados na noo de medida. De todo modo, no incio da vida escolar vlido afirmar que as crianas aprendem sobre medidas, medindo.

    Vamos ver, a seguir, um enredo construdo a partir de pesquisas com vrios depoimentos: uma fico situada e que mostra como acontece no dia a dia, que as crianas podem aprender sobre medidas, e como isso pode ser trazido para a escola.

    Histrias de alunos:

    A professora Lusa resolveu levar adiante a experincia de ouvir os relatos sobre o dia a dia dos alunos fora da escola para constituir os temas de Matemtica a partir das vivncias deles. Ela gravou o relato de vida de cada um dos alunos para depois ouvir com cuidado. fez isso na sala de aula, assumindo a prtica de sempre perguntar quem queria contar como era a vida fora da escola. As crianas sempre ficavam na disputa, pois a maioria tinha muito interesse em falar.

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    No comeo, ela achava que relato de criana era tudo igual, mas aos poucos foi se impressionando com a riqueza dos fatos e dos detalhes daquilo que ouvia. Ela decidiu compartilhar conosco parte do que lhe foi contado por Kayod, da comunidade do Quilombo do Riacho Grande.

    Histrias assim existem muitas. No contexto do seu trabalho com o letramento, em meio a contao de histrias, no deixe de registrar para uso posterior em aula algumas das menes que as crianas fazem a tamanhos, relaes e medidas em geral. Isso est sempre presente na linguagem e de modo curioso: mais maior de grande, ou mais maior a maneira que seus alunos encontram para expressar comparaes que extrapolam o vocabulrio disponvel, exatamente por no terem ainda um trabalho com medidas que possibilite um modo de expresso mais preciso.

    TRABALHANDO COM VOLUME E CAPACIDADENO CICLO DE ALFABETIZAO

    Relato de experincia da professora flavia Gomes Silva do Nascimento no Laboratrio de Matemtica de Moreno1 (LEMAM), localizado na cidade de

    Moreno Pernambuco.

    No dia 31 de outubro, recebemos a visita de 26 educandos do 3.o ano, da professora Maria Aparecida, da escola Municipal Baltazar Moreno. A atividade foi realizada

    Esta semana eu estava pensando que muitas coisas tinham mudado no Riacho Grande. Primeiro foi a escola, que eu tenho que vir todo dia e no posso mais brincar vontade como fazia antes. Outra coisa que mudou foi eu ter que ficar com meninos da cidade e uma professora que no da comunidade. E o pior era ter que passar horas fazendo continhas e tabuada. Eu no sei direito o que pior, fazer as continhas na escola ou tirar lenha na mata. Essa uma coisa que eu nunca entendi, professora!

    A bisa Moura tem um fogo a gs novinho, mas teima em fazer certas comidas no fogo de lenha. Ela diz que d um sabor especial na comida e tambm que a comida das festas tradicionais tem que ser feita na lenha... Sabe professora, a bisa Moura parece saber sempre a quantidade de tudo que precisa. Semana passada, ela pediu que tirasse duas braas de lenha para cozinhar os quitutes da festa de So Joo, mas no s ela que sabida no! L no Riacho Grande, todo mundo que mais velho sabe calcular tudo que precisa, at mesmo quem nunca foi para a escola, como o caso do tio Cosme. Eu aprendi com ele que duas braas de lenha d para cozinhar a semana inteirinha. O chato que a minha braa nunca d para cozinhar todos os dias da semana, sempre falta...

    1 O LEMAM um espao que tem como objetivo trabalhar a matemtica de maneira ldica. Por meio de prvio agendamendo, escolas pblicas municipais, estaduais e privadas, podem participar de oficinas com jogos matemticos.

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    a partir de uma contao de histria, pois consideramos importante o contato da criana, desde cedo, com livros, com diferentes gneros textuais. Acreditamos que a criana aprende com jogos, brincadeiras e com a contao de histrias e que essas ajudam a despertar o desejo de escrever e ler.

    O livro escolhido foi: Irmos Gmeos, obra dos Acervos Complementares, que relata a vida de dois irmos gmeos que disputam quem tem mais e, por causa disso, brigam muito.

    No decorrer da obra so feitas vrias comparaes entre grandezas sem instrumentos convencionais de medio , usando a variao de formatos de objetos e dos recipientes.

    Os objetivos da interveno foram: 1) refletir sobre a resoluo de conflitos, relaes familiares, respeito, solidariedade e amizade, 2) comparar grandezas sem medir, apenas diante da alterao de formato dos objetos e de recipientes e 3) refletir sobre a conservao de volumes.

    Para a realizao da atividade, os educandos ficaram sentados em um tapete e formaram um crculo para ouvirem a histria.

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    Depois, com massa de modelar, tentaram descobrir quem pegou a maior quantidade de massa. Sempre intervindo com questionamentos: quem tem mais? Onde tem mais? Eles vivenciaram a experincia de comparar volume e depois escutaram o que aconteceu na histria.

    No decorrer da histria provocou-se a reflexo sobre as atitudes dos irmos: correto ficar brigando? No seria melhor se os irmos fossem unidos e compartilhassem? Ser que brigar por tudo a melhor alternativa?

    Para finalizar, dois alunos fizeram uma experincia com duas garrafas de refrigerantes de 250ml, uma com gua e a outra vazia: verificar se em ambas cabe a mesma quantidade de liquido. Uns respondiam que sim e outros que no, mas acabaram chegando a concluso que embora o formato das garrafas seja diferente, a capacidade a mesma para ambas.

    Os alunos puderam perceber que muitas vezes as aparncias enganam. s vezes garrafinhas de formato diferente podem conter a mesma quantidade de lquido.

    A aula foi muito proveitosa, os alunos contriburam e participaram das atividades e no decorrer da histria ficaram atentos e curiosos para saber os resultados das experincias.

    Ao longo da contao da histria, os alunos repre-sentaram os personagens e, utilizando materiais mani-pulveis, realizaram algumas experincias. Utilizando co-pinhos descartveis tiveram que decidir qual dos dois irmos possua mais farinha, fazendo medies.

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    A IMPORTNCIA DE ENSINARGRANDEZAS E MEDIDASDanilo Pereira Munhoz

    Mabi Katien Batista de Paula

    Mara Sueli Simo Moraes

    A relevncia do estudo deste bloco de contedos apontada pela sua presena nas prticas sociais, a articulao com outros temas estudados na Matemtica e em outras reas do conhecimento e na prtica de diversas profisses. Na verdade, medir e contar so atividades feitas todos os dias por quase todas as pessoas, independente do grau de escolarizao. Este caderno objetiva discutir elementos que favoream a compreenso do conceito de medida, partindo das unidades de medidas no convencionais, levando necessidade da padronizao das unidades de medidas, com compreenso do processo de medio e das caractersticas do instrumento escolhido.

    As Grandezas e Medidas esto presentes em nosso cotidiano, mas, contradito-riamente, parece que no nos damos conta disso. Se perguntarmos a algum o que j mediu hoje, poderamos ouvir como resposta que mediu o comprimento de um corte de tecido na loja, a temperatura de uma pessoa, marcou o horrio em que passar o nibus ou que conferiu se estava correto o preo cobrado pelo produto que comprou na padaria.

    Como os exemplos citados retratam prticas comuns de cidados em qualquer lugar do pas, possvel afirmar que ao auxiliar na compreenso destes contedos pelos alunos estaremos contribuindo tambm para o exerccio da cidadania.

    Podemos citar como exemplo a importncia dos conhecimentos de Grandezas e Medidas em situaes que envolvam compra, reconhecimento do valor monetrio e peso dos produtos. Em uma compra, no supermercado, frequente observarmos a seguinte situao: ao comparar os preos de um produto, as pessoas analisam o preo final que se apresenta na etiqueta e escolhem aquele que apresenta o menor valor. Assim, pode ocorrer que, no verificando qual o preo por quilo, a pessoa se d por satisfeita com o que pagou, sem perceber que est levando menos mercadoria.

    O ato de medir est presente em diversas atividades do nosso cotidiano e, desde muito cedo, as crianas vivenciam situaes em que necessrio medir. Ao dizer que um objeto maior que outro, que um copo est cheio de suco, que faltam cinco dias para uma festa de aniversrio ou que o cachorro de estimao pesa 6 quilos, a criana est estabelecendo relaes entre as grandezas envolvidas e fazendo o uso de expresses que informam as suas medidas. Na interao com diversos objetos e rtulos de produtos, a criana, mesmo que ainda no saiba ler, tambm tem contato com informaes relacionadas a medidas.

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    Ao chegar escola, as crianas j trazem conhecimentos de situaes que envolvem a comparao de grandezas em jogos e brincadeiras, como construir uma pipa; marcar distncias em jogos de bolinha de gude, marcar distncias para delimitar o campinho de futebol ou quadras de basquete e vlei, efetuar medidas para confeco de roupinhas para bonecas, entre outras.

    Sobre a vivncia que as crianas possuem sobre o que medir, acompanhe um dilogo relatado pela pesquisadora Moura (1995, p. 79-80), da professora conversando com as crianas:

    P: Hoje, a gente vai t conversando um pouco sobre o que medir, algum sabe o que ?

    Vrias crianas levantam a mo.

    P: fale, Mel.

    Mel: Medir quando a gente come alguma coisa, a gente vai medir, vai ver quanto pesa.

    Raf: , tem que pesar o frango.

    P: Ento, o peso medida?

    Onde mais a gente usa medida? Algumas crianas levantam a mo.

    fale, Jul.

    Jul: , o beb no vai medir? pra saber o tamanho. Quando a gente quer saber assim se ele pesa 5 quilos, ento ele vai medir quanto t l.

    P: Mas para a gente saber o quilo a gente tem que medir, como?

    Jul: Isso da eu no sei, no.

    P: Mas para saber o tamanho?

    Jul: preciso medir, medir... (e faz um gesto como quem est pensando), e depois acrescenta com uma rgua.

    P: A rgua a gente usa para que ento?

    Raf: Pra cortar papel.

    P: Pra qu?

    Raf: Tambm pra medir o papel.

    Ae: uma vez, n, eu ganhei um chinelo que ficou muito grande. Ento minha me deu pra minha prima, que calava o nmero 27.

    P: , o nmero que a gente cala pra saber o tamanho do sapato.

    Neste momento, as crianas, tiram ou olham por baixo de seus calados, para saber que nmero calam.

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    Com o estudo de Grandezas e Medidas, pretende-se estimular reflexes e discusses sobre a Matemtica e o cotidiano, entre diferentes temas matemticos e ainda em relao Matemtica e as outras reas do conhecimento, pois possvel estabelecer relaes entre conceitos de geometria, nmeros, propores e outros campos da Matemtica. Ao trabalhar com atividades de geometria, por exemplo, podemos envolver as medidas dos lados de um quadriltero que as crianas tenham que construir. Propor situaes que envolvem valor monetrio traz a possibilidade de trabalhar tanto com as operaes aritmticas quanto com as medidas.

    O tempo, por exemplo, um dos contedos de Grandezas e Medidas que permite a integrao, a partir do trabalho com a histria de vida da criana, com o estudo dos temas de Histria. Em relao ao tema meio ambiente, o trabalho com Grandezas e Medidas possibilita uma melhor compreenso da atividade de ocupao dos espaos pelo homem e sua relao com a natureza. Pode-se propor aos alunos o trabalho com a troca de cdulas e moedas em uma atividade de compras na feira e, a partir da discusso sobre os alimentos vendidos na feira, trabalhar aspectos relacionados alimentao saudvel, o que possibilitaria relacionar os contedos de Matemtica com os de Cincias (uma modalidade deste tipo de relao pode ser vista no relato que sucede este texto).

    Deste modo, percebe-se que a integrao da abordagem de Grandezas e Medidas com outros contedos da Matemtica e outras reas do conhecimento fornece abertura para uma discusso ampliada com temas que so urgentes para nossa sociedade favorecendo mudanas de atitudes e procedimentos. Dessa forma, cada aluno poder aprender a participar da construo de alternativas para melhorias da comunidade em que vive, desenvolvendo caractersticas de autonomia que podero refletir na sua atuao como cidado.

    O trabalho com Grandezas e Medidas possibilita um tratamento ampliado de problemas presentes em prticas sociais. Por exemplo, ao trabalhar com a medio da altura das crianas, pode-se discutir aspectos da diversidade humana, refletindo sobre como ocorrem algumas das diferenas fsicas entre as pessoas e destacar que estas diferenas fsicas no impedem a formao plena dos indivduos. Isso pode ser feito com a ajuda de exemplos de pessoas que se destacaram nas artes, nos esportes, nas cincias e na poltica.

    Outro exemplo de ampliao do contexto da atividade escolar: ao trabalhar com o calendrio, identificar as medidas de tempo e marcar as datas comemorativas do ano, o professor pode encaminhar uma discusso sobre incentivo ao consumo desnecessrio, promovido pelo comrcio nas ocasies de festas comemorativas, ou, ao pedir que as crianas registrem as atividades que realizam ao longo do dia em cada horrio. O professor pode discutir as diferenas entre as atividades realizadas pelos meninos e pelas meninas, refletindo se existem, ou no, atividades especficas para cada gnero.

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    FEIRA DE DEMONSTRAO DE PRODUTOS

    Relato de experincia da professora Cibelle Lima, da rede municipal de educao de Paulista Pernambuco.

    Trabalhou-se, especificamente, as unidades de medida de massa: grama, quilograma (g, kg) e unidades de medida de capacidade: litro e mililitro (l, ml), numa turma de 3.o ano do Ensino Fundamental. Os alunos foram estimulados a estabelecer relaes e comparaes entre as diferentes unidades de medida e a refletir sobre o uso das grandezas e suas medidas em prticas e relaes sociais, como compra e venda.

    O primeiro passo para realizao desta experincia de ensino foi realizar a seleo de embalagens de produtos que os alunos consomem em suas residncias. No dia marcado, eles trouxeram para sala de aula algumas embalagens de iogurtes em potes e em garrafinhas, salgadinhos, refrigerantes em garrafas de vrias formatos e diferentes capacidades (250 ml, 300 ml, 500 ml, 600 ml, 1 l, 1,5 l e 2 l), caixas e latas de leite em p, caixinhas de achocolatados, entre outros. A etapa seguinte foi a criao de um nome para a marca dos produtos fictcios que seriam demonstrados em sala. Organizamos tabelas de nomes e os alunos votaram nos nomes propostos; os votos foram contados e a marca eleita: QUERO QUERO.

    Num dia posterior, aps preparados os produtos com novos rtulos, foi realizada a Feira de Demonstrao dos Produtos. Entre outros objetivos, a atividade visava a identificar, a partir da leitura dos rtulos, informaes sobre medidas de capacidade e de massa mais utilizadas em nosso cotidiano, bem como estabelecer relaes entre diferentes unidades de medida, comparar e representar resultados de medies, utilizando a terminologia convencional para as unidades usuais (g, kg, l, ml). Tambm foram propostas situaes problemas envolvendo relaes entre preos e quantidades dos produtos.

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    Os grupos foram orientados a fazerem um rodzio em torno da mesa (simulao da feira) em que as embalagens estavam expostas. Cada grupo refletia sobre as informaes contidas nas embalagens e respondia s questes orais preestabelecidas pela professora para serem feitas pelos colegas aos seus pares: qual desses produtos compramos por litro? Quais compramos por quilograma? Qual a quantidade de produto contida nessa embalagem? Qual a data de validade?

    No caso do leite em p, era proposta uma reflexo sobre a relao entre a quantidade de colheres necessrias para dissolver os copos de leite e a quantidade de

    A leitura dos rtulos tambm envolveu a identificao das datas de validade dos produtos, bem como das informaes nutricionais, instigando assim, o cuidado para no consumir produtos fora de validade e escolher aqueles menos calricos para no prejudicar a sade.

    Outro aspecto importante foi a reflexo sobre a necessidade da unidade de medida acompanhando o nmero que indica a quantidade de produto contido no recipiente, pois somente o nmero no suficiente para expressar a grandeza. Alm de reconhecer as unidades de medidas expressas nessas embalagens, os alunos foram instigados a pensarem por que, por exemplo, a despeito do nmero 2 ser menor que 200, a medida 2 litros representa um volume maior que 200 mililitros, ou seja, a unidade de medida imprescindvel para definir a quantidade. Tambm foi explorada a relao entre as unidades de medidas e entre mltiplos e submltiplos de uma mesma unidade.

    Para a Feira de Demonstrao de Produtos, os alunos foram organizados em grupos de quatro componentes.

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    copos produzidos e tambm entre a quantidade de litros de leite possveis de serem feitos com aquelas quantidades de leite em p. Foi proposta ainda, uma atividade escrita, ou seja, um grupo ficava atrs do balco de demonstrao dos produtos, apresentando os produtos que iriam ser comercializados e esclarecendo as dvidas sobre as atividades propostas, enquanto outros ficavam circulando em torno das apresentaes. Depois, os papis se invertiam. Houve bastante interao entre os grupos e necessrias intervenes da professora.

    Em certo momento, a professora lanou desafios, como, por exemplo, comparar duas embalagens de iorgute, uma com 1 l(litro) e outra de 900 g. Neste desafio, havia vrios aspectos conceituais envolvidos, entre eles, um mesmo produto lquido com duas grandezas associadas: volume/capacidade e massa.

    Para finalizar a aula, foi produzido um cartaz coletivo com os produtos, contendo informaes referentes s suas correspondentes medidas de massa e de capacidade. A atividade vivenciada possibilitou uma reflexo importante sobre Grandezas e Medidas. Alm de fazer uma articulao com as prticas sociais, incluindo nutrio e consumo, tambm instigou a oralidade e a argumentao.

    Embora tenhamos dito que os textos desse caderno podem ser lidos em uma sequncia aleatria, cabe salientar que, at o momento, eles situaram as Grandezas e Medidas no universo infantil, nas nossas vidas e em seguida vimos a importncia desse eixo para a escola. O prximo texto nos leva a refletir sobre algo que no universo escolar deve anteceder e acompanhar o ensino das medidas: o reconhecimento daquilo que desejamos medir.

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    O OLHAR DO OBSERVADOREliane Costa Santos

    Jlio Csar do Valle

    Keli Mota Bezerra

    Maria do Carmo Santos Domite

    Rgis Luz Lima de Souza

    Rodrigo Abreu

    Valdirene Rosa de Souza

    Vanisio Luiz Silva

    Podemos dizer que medir um processo pelo qual associamos nmeros a objetos, mais especificamente a certos atributos dos objetos. A definio de atributo no simples, mas o uso da ideia fcil. Por exemplo: a tabela abaixo expressa algumas medidas que foram feitas com dois alunos do 5.o ano B. Ns medimos deles os seguintes atributos: o peso, a altura e a idade.

    X Y Z

    Pedro 1,46 46 11

    Jlio 1,48 44 10

    Sabendo que estes foram os atributos medidos, qual deles est representado em cada uma das colunas? Seria possvel dizer que Pedro pesa 1,46 e tem a idade de 46 anos?

    um adulto pode aceitar prontamente o fato de que os trs nmeros atribudos a Pedro e Jlio informam sobre atributos diferentes de cada um deles. Mas, uma criana pode entender que um nico objeto (no caso, uma pessoa) pode ter mais de um atributo?

    Podemos deduzir que sendo 1,46 menor que 1,48, Pedro tem menos um determinado atributo que Jlio. Tambm poderia deduzir que 1,46 menor que 44, mas isso no teria significado algum em relao a ideia de comparar Pedro com Jlio.

    O processo de medida fornece, ento, informaes quantitativas e, em nossa sociedade, aceitamos tais informaes pelo uso de nmeros porm, de um modo muito especial, pois nem todos os atributos de um objeto so quantificados.

    Ao atributo cor, por exemplo, no atribuda uma medida, a no ser em um sentido altamente tcnico. Alis, somente alguns atributos pelos quais os objetos so perceptivamente identificados so quantificados. E esses atributos so, em geral, os mais familiares s crianas. Alm disso, muitos deles so difceis

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    Se pode existir um contraste entre as crianas sobre suas percepes frente aos itens dessa lista, em geral, originrio de suas experincias de mundo, percebemos entre elas e as percepes de um adulto, uma diferena ainda maior.

    uma criana pequena, das escolas do campo ou das zonas urbanas, identifica, em geral, os objetos em termos de sua utilizao: uma bola para brincar, uma laranja para comer. Nas fases iniciais, elas podem no reconhecer de que modo uma bola e uma laranja so similares, embora alguns mais cedo ou mais tarde digam que os dois so redondos, ou seja, as crianas tendem mais e mais a pensar em atributos comuns com base em:

    uso (todos so para brincar, voc pode com-los);

    gnero (crianas, vovs, animais, flores);

    cor (todos os verdes);

    formatos (eles so redondos ou eles so planos).

    de descrever em palavras, ou seja, dizer que um objeto mais comprido...no diz muito sobre ele.

    Assim, uma primeira grande tarefa junto s crianas do campo ou da zona urbana, pode ser a de aprender a reconhecer os atributos que podem ser medidos. uma lista parcial desses atributos, em ordem alfabtica, est apresentada a seguir. Muitos deles, se no todos, estudados no ensino fundamental: rea, capacidade, comprimento, densidade, distncia, massa, temperatura, volume, entre outros. Tais aspectos so explorados em certas atividades que aparecem em livros didticos onde, por exemplo, apresentada uma lista de produtos e os alunos so solicitados a indicar os quais so comprados em funo de uma determinada grandeza, de algo que pode ser medido.

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    De modo geral, esses no so atributos aos quais um adulto confere uma medida (exceto no sentido mais tcnico, o que no nos diz respeito aqui), assim como somente uma ou outra criana afirmaria que uma bola e uma laranja so parecidas tanto porque tem peso ou volume iguais ou qualquer outro dos atributos mencionados como rea, capacidade, comprimento, densidade, peso, temperatura, volume.

    Assim, a tarefa didtica consiste em preparar um ambiente escolar para a percepo destes atributos (que so as grandezas), no to fceis de serem observados.

    Vale aqui destacar que, ao ler a nossa lista de grandezas (ou atributos) a serem medidas, alguns de vocs podem questionar a separao entre distncia e comprimento e entre capacidade e volume. Ambas as distines foram feitas pelo fato de que, embora os adultos tendam a se referir a distncia e comprimento como mesmas grandezas, a distino se d, por vezes, no caso das crianas. Por exemplo, na frase, samos de casa e andamos 200 metros em linha reta, parece que, quando nos referirmos distncia, mais difcil para elas compreenderem, do que quando nos referimos a comprimento. Assim, vale aqui chamar ateno dos professores para levar em conta este aspecto ao falarem com os alunos, bem como ao planejarem situaes de aprendizagem.

    um exemplo importante de confuso conceitual pode ser destacado a partir do relato da Professora Dora, quando no jogo da Batalha das Grandezas ela se refere, corretamente, grandeza comprimento e apresenta as figuras dos animais. Na linguagem usual o comprimento se refere maior das trs dimenses de um objeto. um objeto com trs dimenses: comprimento, largura e altura, ter cada uma dessas dimenses expressa por uma medida de comprimento, ou dito de outro modo o tamanho de cada dimenso mensurado pela mesma grandeza. Essa confuso pode ser provocada deliberadamente pelo professor com a figura que ser mostrada mais adiante, comparando a altura de uma garrafa e de um caderno.

    No que diz respeito a capacidade e volume, a distino aqui a seguinte: capacidade ser considerada como um atributo de recipientes como baldes, vasilhas, cestos. Tal interpretao tem como base a ideia de que ser mais fcil para as crianas comparar onde cabe mais entre dois baldes de tamanhos diferentes do que entre dois blocos de madeira. Capacidade est relacionada a ideia de conter, enquanto que quantidade de madeira est relacionada a volume. Vocs tambm podem ter se perguntado: por que no destacamos medida de tempo em nossa lista? Nossa resposta neste momento que tempo no um atributo dos objetos e ser discutido em um artigo separado. Por isso, atualmente no se fala mais em medida de tempo e sim em durao do intervalo de tempo, pois esse o atributo que medimos: a durao de um intervalo de tempo.

    Os professores podem organizar uma tabela junto com seus alunos, que faa uma sntese de diversos objetos e grandezas associadas, por exemplo:

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    ObjetoGrandezas que po-dem ser associadas a este objeto

    unidades de medidaconvencionais

    Noconvencionais

    Instrumentode medida

    Sala de aula

    Comprimento do comprimento, com-primento da largura e comprimento da altura

    Metro,centmetro

    Ps, palmosMetro, trena, rgua

    rea do piso Metro quadrado Quadriculados

    Medida docontorno da sala

    Metro,centmetro

    Ps, palmos Metro, trena

    Temperatura Graus Termomtro

    Professor

    Tempo de vida (idade)

    Anos, meses, dias

    Luas,primaveras,etc.

    Relgio (calend-rio somente para registrar a passa-gem do tempo)

    Massa (peso) QuilogramaPesos decomparao

    Balana

    Comprimento de algumas partes do corpo

    Metro,centmetro

    Metro, fitamtrica, rgua

    Temperatura GrausTermmetromdico ou de parede

    A ideia deste texto, e da tabela ao final dele, a de provocar uma continuao: encontrar novos elementos que possam ser colocados na tabela, encontrar novos atributos que sejam observveis nos objetos, discutir sobre formas de quantificar as medies, formas de organizar objetos de mesma natureza segundo a ordem da grandeza mensurada. Com isso tem-se boas condies de, no prximo texto, compreender, afinal, o que medir.

    Alm disso, este texto cumpre a funo de catalisar informaes histricas. Ele no conta nem se prope a contar uma histria das medidas, mas sugere direes que podem ser percorridas. Na verdade, nesta unidade, optou-se por no apresentar a histria padro, frequentemente repetida em inmeros textos e que mostra, quase sempre, as mesmas ilustraes do nariz do rei, dos ps e das jardas; e que propaga quase que uma verso oficial de um encadeamento linear de fatos que fazem crer que a humanidade foi progredindo de uma etapa de medidas corporais e arbitrrias, com padres sucessivos, at chegar ao Sistema Mtrico Decimal e o Sistema Internacional de Medidas. Essa histria tanto no verdadeira quanto se pode perceber que, ainda hoje, subsistem sistemas de medida que no esto dentro do padro, e talvez a unidade mais conhecida dentre estas seja a polegada. Estas so medidas que esto dentro de outro padro, um padro no decimal. Para aqueles que sentirem a necessidade de acesso a informaes histricas, nas referncias, daremos uma indicao de como consegui-las a partir de consulta na internet.

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    AfINAL, O QuE MEDIR?Carlos Roberto Vianna

    Comecemos com outro relato de experincia em sala de aula e reflitamos sobre o modo como encaminhar nossas prprias prticas.

    SALTO EM DISTNCIA

    Relato de experincia da professora Clcia Damasceno de Lima, da rede municipal de educao de Paulista Pernambuco.

    A referida escola considerada escola do campo e atende os estudantes residentes nos stios e seu entorno. Funciona em dois turnos e oferta aulas, desde a Educao Infantil, at o quinto ano do Ensino Fundamental. A turma que participou dessa experincia composta por 22 alunos, perodo da manh. So crianas muito participativas e colaboradoras, apresentam carinho pela figura do professor, executam as atividades propostas com interesse de aprender.

    O trabalho comeou com uma conversa informal para permitir professora se situar em relao ao conhecimento prvio dos estudantes. Foram propostas algumas atividades diretas de comparao de comprimento, exemplo: um lpis e um livro (Qual o maior? Qual o menor?).

    Os estudantes perceberam que j faziam este tipo de comparao e que so capazes de observar o que do mesmo tamanho, o que menor, o que maior, mas no possvel comparar grandezas diferentes, como, por exemplo, o peso com a altura de uma pessoa.

    Nesse momento, a professora introduziu a leitura do livro Quem vai ficar com o pssego, que conta a histria de uma disputa na qual cada animal utiliza um critrio de comparao para ficar com o pssego. A leitura abre possibilidades de trabalho para a construo da ideia de comparao entre grandezas de mesma natureza. Assim, os alunos prontamente se mobilizavam para verificar quem, dentre eles, era o mais alto, o mais baixo ou, ainda, os que tinham a mesma altura.

    Identificaram rapidamente, que a professora era a mais alta do grupo, que o Lucas era o mais baixinho e que o Edlomax era o mais alto entre os estudantes. A professora aproveitou essa situao para introduzir a comparao das alturas sem utilizao de instrumentos convencionais de medida, utilizando a estratgia de marcar a altura de cada um em uma cartolina fixada na parede com um lpis e o prprio estudante

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    escrevia o seu nome. Como se v na foto abaixo, a criana escrevendo na cartolina enquanto as outras observam atentamente.

    A partir dessa atividade construiu-se, com as fotos dos estudantes, um painel organizado por ordem de tamanho, do menor para o maior. Depois disso, em outra aula, professora e alunos saram para o terreno em volta para observar as rvores, escolhendo um arbusto como referncia para comparar as outras rvores com ele. Foram feitas perguntas do tipo: qual rvore maior que o arbusto? Tem rvore do mesmo tamanho do arbusto? Isso ajudou as crianas a perceberem que para comparar animais ou plantas, por exemplo, necessrio um referencial.

    Durante o processo, foram feitas atividades de estimativas utilizando lpis, tesoura, caderno pequeno, caderno grande, entre outros. No incio, quando se

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    perguntava aos estudantes quantos lpis cabem na lateral da mesa, eles estimavam sempre para mais (ou melhor, muito mais: 100, 200, 500...). Com a continuidade das atividades, as estimativas se aproximaram do real, e, em alguns momentos at mesmo acertavam o valor.

    Em seguida, passou-se a uma atividade ldica com saltos em distncia. Antes de comear a saltar, as crianas foram solicitadas a estimar o tamanho dos saltos que seriam realizados, fazendo posteriormente uma comparao entre as estimativas feitas e o resultado, definindo se as estimativas eram maiores, menores ou iguais ao salto. Essa atividade foi desenvolvida em grupos, com regras de trabalho estabelecidas pelos prprios alunos:

    quem seria o saltador?

    quem estimaria?

    quem marcaria o p do saltador para sabermos aonde ele saltou?

    quem cortaria o cordo verde para marcar a distncia do salto?

    quem cortaria o cordo azul para marcar a estimativa do tamanho do salto?

    Quando a equipe escolhia o saltador, justificava a escolha. Muitas respostas surgiram, como por exemplo, porque o mais alto, porque o mais esperto, etc.

    Na sua vez, o saltador escolhia a estratgia de saltar (com os dois ps, dar uma distncia para pegar impulso, etc.) e um membro da equipe marcava o p do saltador com uma almofada para carimbos. Assim, quando o saltador pulava deixava registrado no cho a sua marca. Em seguida os estudantes marcavam o salto realizado utilizando um cordo verde. Logo aps o salto a equipe tenta estimar a distncia saltada, para isso utilizam outro cordo na cor azul. Aps a estimativa, comparam os dois cordes (o real e o estimado), percebendo se a estimativa foi maior, menor ou igual ao real. A equipe vencedora aquela que estimou o mais prximo do real. Veja a sequncia nas fotos a seguir:

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    At o momento, os textos deste caderno nos revelam a importncia de medir e de discutir os critrios de comparao utilizados. De maneiras distintas, chamam a ateno para a questo dos atributos e da arbitrariedade com que so escolhidos, embora deixem claro que os critrios de classificao so determinados, objetivamente, em funo de necessidades que so associadas a atributos escolhidos.

    Pode-se perceber que esse um conhecimento importante de ser trabalhado de modo sistemtico na escola, caso contrrio ele no encontrar elaborao terica na prtica, a no ser em casos especiais, quando as crianas inserirem-se no mundo do trabalho e passarem a agir dentro de especializaes determinadas por suas escolhas profissionais. Importante pontuar que todo o vocabulrio associado s prticas de medio (maior, menor, mais grande, mais pequeno, mais isso, menos aquilo) vai sendo refinado medida que o aluno se v imerso em situaes nas quais o vocabulrio vai sendo utilizado, cada vez mais com naturalidade e dentro de contextos.

    A falta de um trabalho sistemtico com as medidas pode levar a problemas graves de compreenso mais adiante no processo de escolarizao. Como exemplo, vamos mencionar dois fatos ocorridos em nossa prtica como professores de matemtica em sries mais avanadas.

    Em Curitiba, lecionando para uma oitava srie na Escola Municipal Julia Amaral di Lena, certa vez pedi aos alunos que elaborassem uma planta de casa (olhando exemplos de jornais) que tivesse um total de 200 m2 de rea. O conceito de rea trabalhado, regularmente, desde muito cedo, mas infelizmente sem qualquer apelo prtico: aprende-se que a rea do quadrado lado ao quadrado, e que a rea de um retngulo um lado vezes o outro. O resultado dessa falta de experincia foi que todos os alunos da turma fizeram plantas de casas com 4 ou 5 peas, no tinham a mnima noo de que uma casa com 200 m2 seria uma manso para o tamanho dos cmodos aos quais estavam acostumados, podendo resultar numa casa com 10 cmodos ou mais. Repetindo o objetivo destes causos: mostrar que a falta de trabalho com as Grandezas e Medidas pode levar a resultados desastrosos para os alunos em sries mais avanadas.

    O segundo caso, ainda em Curitiba, ocorreu com um aluno do Colgio Estadual Algacyr Munhoz Maeder na mesma poca. Por no ter feito uma tarefa, um dos alunos recebeu a misso de medir com a rgua escolar a largura do ptio onde acontecia o recreio. Em pleno processo de diverso, fomos, professor e toda a turma, para o ptio, observar a misso ser cumprida. Para meu espanto, o aluno adulto, trabalhador, no sabia usar a rgua e nem tinha ideia de como proceder a essa medio (coisa que a professora Dora, em relato anterior, j mostrou aos seus estudantes quando solicitou que medissem a altura da girafa medindo o comprimento de um barbante). O que ele fez? Agachando-se no cho, encosta

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    a rgua em um canto da parede e vai colocando a rgua, lado a lado (como as crianas fizeram com os canudos), s que sem traar uma linha reta! Assim, a figura abaixo mostra o que seria a medio da largura do ptio retangular, ao lado do que obteria o aluno se eu no o interrompesse. Se adotasse o mesmo procedimento que os alunos da professora Dora, o meu aluno tentaria esticar uma corda de um lado a outro do ptio para, em seguida, medir o comprimento da corda.

    Trao da medida correta Trao da medida feita pelo aluno

    Estes dois exemplos mostram como possvel que estudantes saiam da escola sem ter noo (ou tendo noes equivocadas) de aspectos importantes das medidas que so utilizadas no dia a dia. De modo que cabe indagar: como isso possvel? E a resposta, infelizmente, simples: na maioria das vezes, estas pessoas nunca foram expostas ao contedo (e prticas) de medidas nas escolas que cursaram.

    Algumas vezes, entrevistamos professores que nos disseram que no trabalhavam o contedo medidas, seja por no saber (em geral se referiam ao trabalho com mltiplos e submltiplos de unidades e a utilizao de nmeros decimais), seja por no dar tempo, pois tinham que focar no ensino das continhas. Como j vimos no caderno de operaes, as famosas continhas somente ganham em consistncia se trabalhadas em contexto de resoluo de problemas. De modo que, um grande contexto, um contexto at natural, para a formulao de problemas, o desenvolvimento de prticas que envolvam medidas.

    finalmente, vamos falar de uma prtica diagnstica muito simples que pode ser feita nos encontros de formao. formadores podem fazer nos encontros com os Orientadores de Estudo e estes com os Alfabetizadores: medir um lpis. Vocs descobriro que, devido falta de experincia escolar com prticas de medio, grande o nmero de professores que utiliza a rgua para medir a partir do cantinho, sem olhar para o zero da escala, o qual determina o comeo da medida.

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    fazem assim:

    Em lugar de fazerem assim:

    comum, tambm, que as fitas mtricas das costureiras estejam cortadas no 1 cm, pois acreditam que devem iniciar a contagem a partir desse nmero e no do zero.

    Em sntese, para responder a questo: O que medir?, podemos dizer, de modo direto que: medir comparar.

    Mas, tendo conscincia disso, essa pergunta leva a outra: O que que se compara?

    E, por outro lado: se to simples assim medir, por que que adultos, como vimos em alguns poucos exemplos, cometem tantos erros de medida?

    H uma msica2 em que a cantora nos indaga:

    O que mais macho: uma lmpada ou um nibus? um abacaxi ou uma faca?

    As pessoas estranham a pergunta pois sabem que estas comparaes de gnero no fazem sentido em relao a objetos to diferentes. Do mesmo modo no faz sentido uma pergunta do tipo:

    O que maior: a sua idade ou a sua altura? O comprimento desta sala ou o volume desta bola?

    2 Trata-se da msica Smoke Rings, interpretada por Laurie Anderson num contexto de experimentaes com a linguagem.

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    Mesmo quando nos referimos a coisas que parecem mais razoveis pode haver confuso. A figura mostra uma comparao feita entre dois comprimentos, o de uma garrafa e o de um caderno. Se vencermos uma dificuldade, que a de estabelecer um padro de medida que nos permita dizer que determinada parte da garrafa mede tanto de comprimento, a outra dificuldade consistir em podermos definir modos de usar a linguagem e posicionar os objetos, de tal maneira que nos comuniquemos com menor ambiguidade. Note que aqui superamos a crena de que o objeto pode variar o comprimento, e passamos a lidar com uma questo de linguagem: a qu que nos referimos quando usamos a palavra comprimento?

    De modo que: medir comparar. E comparamos certos atributos dos objetos. Comparamos atributos, ou grandezas que devem ter a mesma natureza. Ns medimos grandezas. Podemos estabelecer um atributo como a cor: vermelho, verde, azul, amarelo, laranja... E chegarmos a impasses: este objeto verde? Verde-azulado? Azul-esverdeado? Ou azul? (Vocs podem dar exemplos de situaes nas quais aconteceu uma discusso por causa da definio de uma cor?).

    Os cientistas passaram a se preocupar com uma definio de cor que no gerasse tantas controvrsias, e usaram como padro comprimentos de onda e frequncia, mas ento obtiveram uma definio muito tcnica, que no usada no dia a dia, de modo que parece que no ter uma soluo simples uma controvrsia sobre as variaes de tom do azul e do verde, e quando que algo deixa de ser verde para se tornar azul, e vice-versa.

    E, alm destes atributos que geram controvrsias, h coisas que no temos como medir; por exemplo: a tristeza ou a saudade. Quando duas pessoas esto tristes, qual delas est mais triste? E como avaliamos algo assim? Difcil, no ?

    Resumindo: fazemos nossas medies e obtemos nmeros como resultados delas. Podemos comparar esses nmeros. O que ns medimos? Ns medimos grandezas, e estas grandezas so como rtulos que atribumos aos objetos, so os atributos que podem ser medidos.

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    A fEIRA E AS CuIASEliane Costa Santos

    Jlio Csar do Valle

    Keli Mota Bezerra

    Maria do Carmo Santos Domite

    Rgis Luz Lima de Souza

    Rodrigo Abreu

    Valdirene Rosa de Souza

    Vanisio Luiz Silva

    No de hoje que tenho pensado em como ensinar algumas noes importantes de medidas para meus alunos. Sempre achei que comear um estudo de Matemtica, ou de qualquer outra disciplina, a partir de ideias e objetos com os quais meus alunos tm familiaridade, tornaria o ensino mais proveitoso. Pensando nisso, comecei a planejar o desenvolvimento de uma aula a partir de situaes do dia a dia dos meus alunos. Mas, de imediato, surgiram algumas dvidas: como seria essa aula? Qual contedo eu poderia trabalhar? Pensei que o contedo no deveria fugir do meu planejamento, que para esta semana seria sobre medidas.

    Vrios dos meus alunos so filhos de camponeses que tm uma horta ou lavoura da famlia, cujo plantio serve basicamente para subsistncia e, s vezes, para o comrcio. Decidi, ento, comear uma aula introduzindo o tema medidas a partir de uma discusso coletiva. fiz um breve roteiro para no me esquecer de nada e fui para sala. Iniciei a aula comentando com os alunos que iramos estudar diferentes formas de medir. Para que os alunos se sentissem vontade, perguntei quais instrumentos ou objetos eles utilizavam para medir.

    No comeo, os alunos ficaram um pouco tmidos. Ento, resolvi mudar minha estratgia: contei para a turma um pouquinho da minha histria que, na verdade, poderia ser a histria de qualquer um deles, pois vivemos todos muito prximos, na mesma regio.

    Assim como muitos de vocs, eu tambm ajudo meus pais no plantio, no cuidado e na colheita de nossa pequena plantao, usamos alguns recipientes, que so muito comuns para quem trabalha na roa, como os instrumentos de medida. Esse o caso da cuia, por exemplo.

    Nesse momento, alguns alunos se manifestaram dizendo que tambm conheciam a cuia e que j tinham visto seus pais as utilizando em suas lavouras. Continuei relatando que lembrava do meu av dizendo que cuia uma palavra indgena usada por alguns ndios que moravam por perto e significava recipiente onde cabem

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    muitas unidades. fiz este registro na lousa. Prossegui a histria relatando que segundo o que conta meu pai, meu av, assim como o pai de meu av e os demais homens de sua poca, as pessoas utilizavam a cuia e outros recipientes para pesar os gros que colhiam, seja para consumo prprio ou para o comrcio. Outro dia conversando com meu pai, ele me disse que isso acontecia porque as balanas eram caras, ento as pessoas desenvolveram outras maneiras de calcular o que colhiam.

    Comentei, ento, que iriamos estudar algumas noes de medidas a partir desses recipientes que, como pude observar, quase todos os meus alunos j conheciam; alguns afirmaram, inclusive, ter uma ou mais cuias em casa. No entanto, percebi que havia alguns alunos que no conheciam a cuia e, por isso, no seria possvel prosseguir a aula tendo s este objeto como referncia. Para minha sorte, momentos antes do final da aula, um aluno me contou que sua famlia, assim como as famlias de outros alunos, participavam de uma feira livre na regio, organizada pelos prprios moradores do meio rural e que, nessa feira, era muito comum a utilizao da cuia para medio da quantidade ou peso dos gros para a venda. Combinamos ento que a turma iria at a feira.

    Os dias se passavam e os alunos mal podiam aguentar a ansiedade de irem juntos a feira. Seria uma oportunidade muito rica, mas confesso que eu estava preocupado, seria um desafio para mim tambm. Eu estava acostumado s aulas desenvolvidas na sala, passava o contedo, explicava, dava alguns exemplos e depois colocava os alunos para fazerem alguns exerccios. Mas esta forma de trabalhar com meus alunos era algo novo para mim, e no havia como prever os resultados. Isso me deixava inseguro.

    Marcamos a visita feira para o domingo. Alguns alunos mal dormiram na vspera. Maria, por exemplo, ajudou seu pai at tarde a separar o feijo que seria vendido no dia seguinte. Paulo fez questo de colocar, na carroa da familia, as trs cuias que seu pai utilizava para vender gros de caf na feira.

    Na hora marcada, todos estavam no local combinado, em frente barraca do Juca, logo no comecinho da feira.

    E foi na prpria barraca do Juca que comeamos a aprender sobre medidas, quando Clarinha disse: Olha professor, o seu Juca tem uma cuia igual do meu pai! Aproveitei este momento para apresentar a todos a cuia, j que alguns no conheciam este objeto.

    Ao segurar a cuia, Joo perguntou: Professor, como o seu Juca sabe a quantidade de feijo que cabe nessa cuia? foi ento que o prprio Juca disse: Essa cuia bem antiga, uma estimao que ganhei do meu pai, que era dono desta barraca. Na verdade, eu vendo o feijo por cuia. Cada cuia cheia de feijo custa 4

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    reais. Outro dia esteve por aqui um doutor l da cidade que me disse que nesta cuia cabe, aproximadamente, 1 quilo de feijo.

    Aps a explicao do Juca, seguimos andando pela feira. Mostrei aos alunos as diversas cuias presentes nas barracas que vendiam os mais variados tipos de gros, alm de outros produtos. No demorou muito para Josu fazer uma observao interessante quanto ao tamanho e o formato das cuias: Professor, na barraca do pai do Paulo, cada cuia tem um tamanho e o jeito delas tambm bem diferente uma das outras. Expliquei que isso acontece porque a cuia a metade da cabaa, um fruto que tambm chamado de porongo em outras regies e, como os alunos j sabem, nem todos os frutos do mesmo tipo so do mesmo tamanho. Alguns chegam a ter tamanhos bem diferentes!

    Lore

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    Cabaas.

    No momento em que passvamos pela barraca da dona Isaura, Andr notou que o instrumento utilizado por ela para vender o feijo no era a cuia, e sim uma lata de leo de cozinha. Os alunos acharam interessante o objeto que tinha uma ala na lateral e que, segundo a prpria dona Isaura, foi improvisada pelo seu marido para facilitar o manuseio.

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    Todos pararam diante dessa barraca e no foram poucos os questionamentos dos alunos dona Isaura.

    Andr: Por que a senhora usa uma lata e no uma cuia como nas outras barracas?

    D. Isaura: Eu uso essa lata h mais de 20 anos. Alis, essa no, antes era outra, depois meu marido me arrumou essa, com ala. Tem gente que usa a cuia. No me importo, eu sempre utilizei a lata. Meu pai dizia que comeou a utilizar a lata por que na nossa chcara no tinha cabaa. Hoje mais fcil, mas eu continuo usando a minha via latinha. Eu vendo uma lata cheia de feijo por 4 reais como o seu Juca, e sempre coloco mais um punhadinho.

    Maria: E que tanto que tem esse punhadinho?

    D. Isaura: Eu no sei, coloco mais um pouquinho e pronto!

    J quase no final da feira nos deparamos com a barraca do seu Joaquim. filho de imigrantes portugueses, seu Joaquim, assim como dona Isaura, tambm utilizava uma lata de leo para vender seus produtos - feijo e farinha.

    Os alunos pararam na barraca do seu Joaquim que gentilmente nos mostrou a lata que utilizava para vender tanto o feijo quanto a farinha observando com mais detalhes notamos que era uma lata do mesmo tamanho que a usada pela D. Isaura.

    foi a que surgiu outra pergunta que, de algum modo, eu j esperava:

    Jlia: Professor qual mais pesado? uma cuia de feijo ou uma lata de feijo?

    Paulo: Professor vou pegar a cuia grande na barraca do meu pai pra gente ver qual mais pesado.

    Antes que eu pudesse responder, Paulo saiu correndo pela feira e logo voltou com a cuia de seu pai. Entregou-a a seu Joaquim que prontamente a encheu com feijo. Por sua vez, a lata tambm j estava cheia de feijo.

    Vendo a cena pensei que aquele momento poderia ser interessante para que os alunos comeassem a estabelecer algumas comparaes de medidas e tirassem suas prprias concluses.

    Jlia: Olha professor, tanto na cuia quanto na lata tem a mesma quantidade de feijo! Ento, acho que os dois tm o mesmo peso.

    Aproveitei o momento para fazer novos questionamentos.

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    Professor: E agora, e se no lugar do feijo na lata, ns colocssemos farinha. Qual seria o mais pesado? uma cuia de feijo ou uma lata de farinha?

    Todos ficaram quietos por um instante, mas logo, comearam a opinar.

    Paulo pegou a cuia com feijo em uma mo, estendeu o brao e fez o mesmo processo com a lata cheia de farinha. Pensou por alguns instantes e disse: A cuia com feijo mais pesada professor.

    Outros alunos fizeram a mesma experincia e, logo, concluram que, de fato, a cuia com feijo era mais pesada do que a lata com farinha, embora ambas coubessem uma mesma quantidade quando cheias com o mesmo tipo de gro.

    Aps esta rica situao prtica, Jlia indaga: Professor, d pra perceber que tudo funciona muito bem por aqui, mesmo com as latas e cuias de tamanho diferente, mas todo mundo usa as cuias para venda?

    Professor: No, Jlia, nem todo mundo usa.

    Retornando sala de aula

    Depois da visita feira, fiquei bastante pensativo sobre como trabalhar com meus alunos durante as prximas aulas. Minha vontade era de que todos conhecessem a importncia no s da cuia, mas de todos os instrumentos de medida, utilizados por gente como a gente. Por outro lado, meu dever ensin-los assuntos em matemtica que permitam que eles possam, por exemplo, negociar com pessoas de fora. Decidi, ento, que reforaria os motivos pelos quais usamos aqueles instrumentos de medida em nossas casas e nas feiras e explicaria depois o sistema de medidas universalizado, para que eles tambm pudessem entender que existem outros modos de pensar alm do nosso.

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    MATAPI, PANEIRO!Eliane Costa Santos

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    Keli Mota Bezerra

    Maria do Carmo Santos Domite

    Rgis Luz Lima de Souza

    Rodrigo Abreu

    Valdirene Rosa de Souza

    Vanisio Luiz Silva

    Quando entrei na sala de aula observei que as crianas estavam conversando sobre a pescaria dos seus pais. Lucas contava que seu pai havia pescado dez matapis de camares. Marcos dizia que seu pai, depois de tirar os camares dos matapis, tinha conseguido encher seis paneiros at a boca. foi a que o Pedro pediu minha opinio: Professor, quem voc acha que pescou mais, o pai do Lucas ou o pai do Marcos?

    Respondi que no saberia dizer porque precisava ter mais detalhes da situao. Perguntei ao Lucas e Marcos se eles sabiam quem tinha pescado mais. Disseram que tambm no sabiam. Pedi, ento, que contassem novamente a histria da pesca dos pais e que todos prestassem bastante ateno. Ambos repetiram o que j haviam dito, s que agora com a ateno de toda a turma. A partir dessa situao que mobilizou o interesse das crianas pensei em iniciar o trabalho com a medida de capacidade, ainda que esse assunto estivesse previsto s para o prximo bimestre. Pedi a todos que escrevessem uma historinha sobre o que aconteceu com o Lucas e o Marcos e que desenhassem o resultado da pescaria, colocando no mural:

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    E agora? Voc sabe o que um matapi? E um paneiro?

    Como vai desenhar coisas que no conhece?

    Certa vez, dando curso, contei uma histria semelhante e um professor de matemtica engraadinho disse: ... tem a matajunta, e tem o matapi. A matajunta uma espcie de tampa para as juntas, j o matapi algum tipo de coisa que acaba com o nmero pi.

    Na mesma toada, uma professora respondeu: , se tem o sapateiro para colocar sapato, ento tem o paneiro, para colocar pano.

    Mas, tudo isso porque no faziam a mnima ideia sobre o que so estas coisas. Essa uma das distncias entre o povo da cidade e do campo, ou no caso de algumas populaes ribeirinhas.

    A ideia aqui no que voc saiba uma definio para paneiro e outra para matapi, isso s resolveria o problema imediato deste texto. A questo estar atento para o que sabem seus alunos, para prticas sociais de comunidades diferentes da sua, e para o fato de que essas prticas sociais esto cheias de relaes matemticas que frequentemente so menosprezadas, quando deveriam ser utilizadas como ponto de partida para os trabalhos com os contedos escolares.

    Para tentar resolver a situao para a qual as crianas estavam mobilizadas e, com isso, tentar desenvolver noes importantes sobre medidas de capacidade, elaborei o seguinte plano:

    1.o Propor situaes nas quais as crianas experimentassem encher e esvaziar diferentes utenslios, tentando responder quanto de um cabe em outro.

    2.o Convidar um pescador poderia ser o pai de um aluno para conversar com a turma na sala de aula sobre a pesca e o manejo de camares.

    3.o Levar um matapi e um paneiro para a aula e investigar, com o grupo de alunos, quantos matapis cabem em um paneiro.

    4.o Verificar como as crianas se posicionam quando a mesma quantidade de algo colocada em dois recipientes de formatos diferentes.

    5.o Verificar se as crianas conhecem algumas medidas convencionais para capacidade. Se no as conhecem, apresentar o litro, por exemplo.

    E assim este plano foi desenvolvido em sala de aula.

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    Primeira atividade

    Quase chegando escola, parei na quitanda da Dona Maria e providenciei dois quilos de farinha. Passei na cozinha da escola e peguei diferentes potes coloridos, canecas, copos e colheres grandes e pequenas. Comecei a aula lendo com os alunos os cartazes que deixamos no mural da sala, assim relembramos a situao da pescaria. Disse a eles que, para descobrir quem tinha pescado mais, iramos estudar maneiras de medir o que est dentro de recipientes como cestos, potes, garrafas, etc.

    Coloquei sobre a mesa os recipientes de diferentes tamanhos e formas para que as crianas manuseassem livremente.

    Mostrei-lhes um dos recipientes e fui enchendo com a farinha at a boca. Em seguida perguntei:

    Quanto de farinha tem neste pote?

    Algumas das respostas que elas deram:

    um tanto assim... (indicando com as mos)

    Tem muita farinha, porque s sobrou um pouquinho no saco!

    No sei no.

    Acho que tem pouca, porque l na quitanda da Dona Maria tem um saco assim (apontando para o prprio corpo) e aqui s esse potinho.

    Desafiei-os:

    O que podemos fazer para descobrir quanto de farinha tem nesse pote?

    Por um instante ficaram em silncio... De repente comearam a falar ao mesmo tempo. Pedi que falassem um de cada vez para que todos pudessem entender.

    Antes que comeassem, Pedro perguntou se podia pegar o pote. Disse que sim. Ento ele derramou toda a farinha sobre a mesa e, usando as mos como conchinha, comeou a devolv-la no pote. Sobrou um pouquinho sobre a mesa, mas finalizou dizendo que tinha muita farinha, porque ele precisou pegar muitas vezes com as mos para devolver tudo no pote.

    fernanda sugeriu que a farinha fosse colocada em potinhos para no cair na mesa e comearam a colocar os potinhos sobre a mesa e ench-los com farinha do pote maior. Deu para encher 10 potinhos.

    Indaguei:

    E se cada um de vocs tiver que receber uma cuia de farinha? Ser que essa quantidade de farinha do pote ser suficiente?

    Perguntaram qual cuia, apontei para a pequena, a menor de todas. Como s havia uma cuia das pequenas fiquei intrigado em como iriam resolver a questo...

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    Os palpites comearam:

    Mas s tem uma...

    No d pra fazer com uma s!

    Precisa arrumar mais cuias para todos

    E tem que ser iguais!

    Afirmei que isso no seria possvel e teriam que resolver a situao usando apenas aquela que estava sobre a mesa. O debate continuou at que resolveram colocar na mesa um potinho para cada criana e nele a farinha tomada do pote maior com a cuia pequena. E, assim que terminaram, concluram que a farinha daria para todos, pois tiraram 15 cuias e ainda sobrou no pote maior, porm as reclamaes comearam:

    Professor, eu ganhei menos... veja como meu potinho tem pouca farinha. Reclamou Alice.

    Isso no t certo, eu tambm ganhei menos, disse Miguel. Olha, o meu tem menos que o do Lucas. O dele est cheinho, professor!

    Notei nesse momento que as crianas estavam comparando as quantidades de farinha considerando as formas dos potinhos que distriburam entre si. Naturalmente, os potinhos no eram todos iguais, uns mais altos e estreitos, outros mais baixos e arredondados...

    Pedi que Alice, Lucas e Miguel ficassem prximos um do outro e despejassem a farinha do potinho sobre a mesa formando cada um seu montinho. Todos observaram e alguns diziam que agora no parecia que a Alice tinha menos e nem o Miguel. Resolveram os demais despejar tambm sua farinha sobre a mesa e fazer os montinhos. formou-se uma fileira de montinhos. Muitos acharam que a quantidade de farinha era a mesma. Alguns ainda duvidavam porque diziam ter montinhos mais altos.

    Problematizei a situao:

    Por que dentro dos potinhos uns pareciam ter mais ou menos farinha que outros? Depois, quando formamos os montinhos, por que eles pareciam ter a mesma quantidade de farinha?

    Alice logo respondeu que seu potinho era muito alto ento tinha muito espao l dentro, comparando o seu com o potinho do Lucas que era mais baixo.

    Apresentei um pote bem maior, tambm com farinha e mudei a pergunta:

    E se a gente quiser saber quantas canecas dessas de farinha cabem neste pote? Ser que d para descobrir?

    um aluno disse que no, que s daria para saber da cuia. Outro disse que sim, que era s fazer o mesmo que tinham feito com a cuia. E pegou o pote, despejou na mesa e comeou a encher a caneca e devolver a farinha ao pote. Contaram 5 canecas de farinha e ainda sobrou um pouco na mesa.

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    Em cada etapa da atividade, fazamos uma pausa para registrar as descobertas do grupo.

    E agora pessoal? Qual pote que vocs encheram tem mais farinha?, perguntei ao notar que todos haviam completado seus potes.

    Diante dessa pergunta, passamos a discutir a capacidade de cada recipiente.

    Tem mais farinha nesse pote que naquele outro dizia Pedro.

    porque ele tem mais espao dentro. Por isso que cabe mais farinha argumentava Lucas.

    Ento passei a perguntar em qual dos potes cabia mais farinha: os mais fundos e compridos, os mais largos e achatados; foram algumas das respostas, ao passo que outros alunos diziam que deveramos verificar para saber realmente.

    Perguntei: Como verificar em qual dos potes poderia caber mais farinha ou quanto de farinha cabe nos potes?

    Responderam: Para saber qual dos potes realmente cabe mais farinha que o outro, deveria colocar toda a farinha em um nico pote, depois passar esta mesma quantidade de farinha para o outro pote. Se ao fazer isso, um dos potes ficar totalmente cheio e no outro sobrar espao isso mostra que no que sobrou espao cabe mais.

    Ao fazer a experimentao, as crianas discutiam a capacidade de cada pote. Surgiram afirmaes do tipo: cabe mais farinha nesse pote que no outro, esse maior que aquele, nesse eu coloco duas vezes a farinha daquele outro.

    Aps fazerem os testes, um grupo concluiu dizendo: professor, nestes dois potes, mesmo sendo diferentes, coube a mesma quantidade de farinha. As outras crianas observavam e isso foi importante, pois o trabalho de um grupo permitiu que todas as crianas percebessem que os dois potes possuam a mesma capacidade, apesar do formato diferente.

    Para distribuirmos toda a farinha em potes menores, sem ocuparmos vrios deles, como deveramos fazer? As crianas disseram que deveramos usar os mais profundos, que eram redondos e gordinhos.

    Neles cabe bastante farinha disse Marcos.

    E como o formato parecido, ter o mesmo tanto de farinha falou Luis.

    E usaremos menos potes professor disse outro aluno.

    Propus uma nova questo: E agora pessoal qual dos grupos tem mais farinha?

    Todos voltaram a comparar os potes. O aluno Pedro, apontando para o grupo de Marcos, disse:

    Eles tem mais farinha professor, porque os potes so maiores do que o dos outros grupos.

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    Marcos respondeu que seus potes eram largos, mas tambm eram baixos. E continuou dizendo que no dava para saber com certeza se nos seus potes tinha mais farinha que nos potes dos outros grupos. Era preciso verificar.

    Maria fernanda mostrava os potes do seu grupo, que estavam sobre a mesa, e dizia:

    T vendo professor, acho que aqui tem mais que os dos outros, po