terra livre 59 julho de 2013
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Boletim do Coletivo Açoriano de Ecologia SocialTRANSCRIPT
TERRA LIVREPARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL
BOLETIM Nº 59 JULHO DE 2013
LAGOAS ABANDONADAS TOUradas não beneficiam a economia
A tourada vista por um médico veterinário
LIBERDADE NÃO RIMA COM TOURADA
Visito as lagoas do Congro e dos Nenúfares,
regularmente, desde o início da década de setenta
do século passado.
Na altura, toda a zona envolvente era ajardinada e
os trilhos apresentavam uma limpeza idêntica à
que hoje encontramos no Parque Terra Nostra, nas
Furnas, ou no Pinhal da Paz, na Fajã de Cima. A
manutenção do espaço era assegurada pelos seus
proprietários, através de um caseiro que era
natural da Ponta Garça e que residiu durante
muitos anos na rua Nova, na Ribeira Seca de Vila
Franca do Campo.
Mais tarde, depois de ter tomado consciência de
que para vivermos bem, para além de
assegurarmos um conjunto de bens materiais, era
fundamental não destruir o património natural,
bem como conservar e valorizar o património
cultural que nos foi legado pelos nossos
antepassados, preocupei-me com o abandono a
que foram votadas as lagoas do Congro e dos
Nenúfares.
Considerando que ninguém protege o que não
conhece e como forma de chamar a atenção para a
situação, ao longo dos anos fui organizando, no
âmbito das atividades dos Amigos dos Açores,
passeios pedestres com passagem pelas duas
lagoas mencionadas, bem como pela lagoa do
Areeiro, implantada no Pico da Dona Guiomar.
Como forma de promover o pedestrianismo, o
desporto dos que andam a pé, elaborei um texto de
um roteiro pedestre, que em 1996, foi editado
pelos Amigos dos Açores como título “Percurso
Pedestre das Três Lagoas”.
Em 1997, os Amigos dos Açores publicaram o
livro Lagoas e Lagoeiros da Ilha de São Miguel
que, para além do seu “propósito de divulgação
numa perspetiva de conservação”, reuniu
informações que não só permitiam “ajudar a
conhecer e interpretar uma realidade natural” e a
“servir de ponto de partida para ações concretas
de proteção e recuperação”.
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LAGOAS ABANDONADAS
No mencionado livro, da autoria de João Paulo
Constância, Teófilo Braga, João Carlos Nunes,
Emanuel Machado e Luís Silva, para além da
descrição das lagoas do Congro, Nenúfares e
Areeiro, também foram mencionados os seguintes
lagoeiros existentes no concelho de Vila Franca
do Campo: Espraiados, localizado a Norte do Pico
d’El Rei, lagoa do Pico d’El Rei, lagoeiro do Pico
do Frescão e três pequenas “lagoas” implantadas
no pico do Hortelão (ou Pico da Três Lagoas).
No mês de Fevereiro do ano 2000, os Amigos dos
Açores apresentaram ao Governo Regional dos
Açores uma “Proposta de Classificação das
Lagoas do Congro e dos Nenúfares como Área
Protegida”.
Na mencionada proposta, depois de uma
caraterização sob diversos aspetos,
designadamente históricos, geográficos,
geológicos, biofísicos, paisagísticos e
socioeconómicos, são sugeridas, como primeiras
medidas de recuperação, a limpeza dos dois
trilhos que levam às duas lagoas, a limpeza e
identificação do trilho que liga as duas lagoas, o
corte de algumas invasoras e a identificação das
espécies vegetais existentes, tendo em vista o
aproveitamento pedagógico da área.
Sete anos depois da proposta apresentada pelos
Amigos dos Açores, em 2007, a cratera das lagoas
do Congro e dos Nenúfares foi, finalmente,
classificada como “área protegida para a gestão de
habitats ou espécies (Decreto Legislativo nº
15/06/2007) e no ano seguinte, em 2008, parte da
bacia hidrográfica foi adquirida pela Secretaria
Regional do Ambiente e do Mar.
Em 2010, os Amigos dos Açores editaram a
brochura “Lagoas do Congro e dos Nenúfares-
Proposta de recuperação e gestão da cratera”, cujo
texto resultou de um trabalho de estágio (Estagiar
L) que foi entregue, em Julho de 2008, à
Secretaria Regional do Ambiente e que pretendia
ser uma “ideia base a desenvolver em plano de
pormenor” com o objetivo de “recuperar o
património “perdido” e restituir ao local parte do
seu antigo esplendor”.
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A autora dessa proposta, Malgorzata Pietrak,
considera, do meu ponto de vista muito bem, que
para a garantia da sustentabilidade ecológica terá
de ser pensada a sustentabilidade económica e esta
só se atingirá se não for descurada a integração do
espaço na oferta turística. Também partilho a sua
opinião quando afirma que “a recuperação e a
futura gestão da cratera deverão ser exemplares,
envolvendo tanto a comunidade local, que chegou
a celebrar o feriado municipal à volta destas
lagoas, como diversas entidades públicas e
privadas, através de sinergias que ajudem a
“ressuscitar” o carácter que esta zona teve
outrora”.
Os vilafranqueses não podem deixar que o espaço,
que é propriedade da região, fique, tal como está,
ao abandono.
Teófilo Braga
Correio dos Açores, nº 2824, 19 de Junho de
2013, p.16
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Que Ecologismo?
Embora plural no que diz respeito à forma de pensar e viver o ecologismo, consideramos que não se pode separar os ecossistemas naturais da vida do
Comunicado
MCATA manifesta que as touradas não trazem
nenhum benefício económico
Muitas vezes é afirmado que as touradas são uma
mais-valia económica para a ilha Terceira, por
movimentar um importante volume de negócio no
sector da venda de comidas e bebidas. Mas a
verdade é que estes benefícios, que favorecem um
sector económico certamente bastante reduzido,
não dependem realmente da realização de
touradas e sim da realização de qualquer tipo de
festividade, como fica demonstrado pela idêntica
vitalidade que este sector experimenta nos eventos
e festividades sem nenhuma relação com a
tauromaquia ou
também nas numerosas festas, sem touradas, que
acontecem nas outras ilhas.
E se olhamos para o produto mais consumido
durante as touradas, a cerveja, vemos que, sendo
este um produto importado, produzido fora da
região, o seu consumo não traz nem produz
nenhuma riqueza. Antes pelo contrário, é dinheiro
que sai da região.
Falando propriamente das touradas, estas
apresentam muitos aspetos económicos puramente
negativos. Para começar, como acontece com
qualquer tipo de espetáculos, as touradas não são
uma atividade produtiva. Economicamente não
produzem nenhuma riqueza nem recursos,
unicamente os consomem.
Consomem, por exemplo, o dinheiro que durante
as festas do Espírito Santo deveria ser destinado à
solidariedade, à partilha, à oferta aos mais
carenciados da sociedade, e que no entanto acaba
por ser gasto maioritariamente nos touros. É
portanto um dinheiro que, longe de respeitar o
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Que Ecologismo?
Embora plural no que diz respeito à forma de pensar e viver o ecologismo, consideramos que não se pode separar os ecossistemas naturais da vida do
TOURADAS NÃO BENEFICIAM A ECONOMIA
significado tradicional das festas, longe de ajudar
as pessoas necessitadas da freguesia, cada vez
mais abundantes nas atuais circunstâncias, é gasto
no efémero espetáculo dos touros, sem proveitos,
e que ainda acaba por levar algumas pessoas
feridas para o hospital.
Consomem também o dinheiro das autarquias,
como a de Angra do Heroísmo, que oferece cada
ano 150 mil euros só para a realização de touradas
de praça. E também consome muito dinheiro que
o governo regional deveria destinar a políticas
sociais muito mais necessárias mas que acaba, no
entanto, por ir parar a futilidades como os 75 mil
euros gastos num fórum tauromáquico ou os 150
mil euros gastos num monumento ao touro. Todo
somado, o dinheiro público mal gasto no
espetáculos das touradas dá uma elevadíssima
quantia anual que a ilha, no atual contexto
económico, não pode permitir-se desperdiçar por
mais tempo.
E ainda podemos falar dos efeitos negativos para a
economia que a contínua realização de touradas,
mais de uma por dia, acaba por ter na
produtividade dos terceirenses. Ou também das
pastagens, públicas e privadas, destinadas
atualmente para a cria de gado bravo e que não
são aproveitadas para a produção de riqueza. Ou
também do efeito negativo que as touradas têm
sobre o turismo, quando os turistas estrangeiros
procuram principalmente um turismo de natureza,
oposto ao maltrato animal que é repudiado e
considerado ilegal nos seus países.
Assim, para o MCATA fica claro que as touradas
são na realidade um enorme buraco negro para a
economia da Terceira e que a ilha só ganhava
reduzindo o seu número ou mesmo acabando, no
futuro, definitivamente com elas.
Açores, 17 de Junho de 2013
A Equipa do MCATA
Vasco Reis, estudou em Hannover,
Alemanha, trabalhou como médico
veterinário 7 anos na Suíça e 10 anos na
Alemanha. Acompanhou de perto o
mundo das touradas à portuguesa
quando foi médico veterinário municipal
n Praia da Vitória, Ilha Terceira, Terra Livre nº 59 Julho de 2013 ◊
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A TOURADA VISTA POR UM MÉDICO VETERINÁRIO
Açores, entre 1986 a 1989. Atualmente
vive uma reforma ativa em Aljezur.
Tem 14 gatos e 3 cães, é membro
fundador de uma associação de proteção
animal cujos esforços abolicionistas
ajudaram a tornar este concelho
algarvio livre de touradas.
Recentemente esteve em Bogotá, numa
cimeira onde se deu conta de grandes
progressos na abolição das touradas na
América Latina.
A tourada vista por um médico veterinário
Os animais humanos e não humanos são seres
dotados de sistema nervoso, mais ou menos
desenvolvido, que lhes permitem sentir e tomar
consciência do que se passa em seu redor e do que
é agradável, perigoso e agressivo e doloroso.
Estes seres experimentam sensações, emoções e
sentimentos muito semelhantes. Este facto leva-os
a utilizar mecanismos de defesa e de fuga, sem as
quais, não poderiam sobreviver. Portanto, medo e
dor são condições essenciais de sobrevivência.
Afirmar-se que nalguma situação não medicada,
algum animal possa não sentir medo e dor se for
ameaçado ou ferido, é testemunho da maior
ignorância, ou intenção de negar uma verdade
vital.
A ciência revela que o esquema anatómico, a
fisiologia e a neurologia do touro, do cavalo e do
homem e de outros mamíferos são extremamente
semelhantes.
As reacções destas espécies são análogas perante a
ameaça, o susto, o ferimento. O senso comum
apreende e a ciência confirma-o.
Depois desta explicação, imaginem o sofrimento
horrível que uma pessoa teria se fosse posta no
lugar de um touro capturado e conduzido ao
“calvário” de uma tourada.
Conclusão comportamental ética?
Seres humanos (tauromáquicos) não devem
infligir a outros seres de sensibilidade semelhante
(touros e cavalos), sofrimentos a que os próprios
infligidores (tauromáquicos) não aceitariam ser
submetidos.
Na tourada à portuguesa importa mencionar o
terrível sentimento de claustrofobia e pânico que o
touro sofre desde que é retirado violentamente da
campina e transportado em aperto até à arena.
Depois, há o maltrato com a finalidade de o
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enfraquecer física e animicamente antes de ser
toureado.
Na arena, o touro enfrenta a provocação e a
tortura durante a lide e no fim desta, com a
retirada sempre violenta e muito dolorosa das
bandarilhas, rasgando ou cortando mais o couro
sem qualquer anestesia.
No final de tudo, o animal é metido no transporte,
esgotado, ferido e febril, em acidose metabólica
horrível que o maldispõe e intoxica, até que a
morte o liberte de tanto sofrimento.
O cavalo sofre um esgotamento e terrível tensão
psicológica ao ser usado como veículo, sendo
dominado, incitado e lançado pelo cavaleiro e
obrigado a enfrentar o touro, quando a sua atitude
natural seria a de fuga e de pôr-se a uma distância
segura.
À força de treino, de esporas que o magoam e
ferem, de ferros na boca e corrente à volta da
mandíbula, que o magoam e o subjugam, o cavalo
arrisca morte por síncope/paragem cardíaca,
ferimentos mais ou menos graves, até a morte na
arena.
É difícil, senão impossível, acreditar que toureiros
e aficionados amem touros e cavalos, quando os
submetem a violência, risco, sofrimento.
Questiono-me porque se continua a permitir uma
actividade que assenta na violência e no
sofrimento público de animais, legalizado e
autorizado por lei e até apreciado, aplaudido e
glorificado por alguns?
E uma verdadeira democracia não permite nem
legaliza a tortura. E você?
Vasco Reis,13.6.13
"Publicado no Algarve Jornal 123, Portimão,
Algarve, Portugal!
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