teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 pi.pdfteoria dos jogos e estratégia competitiva...

36
Teoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486 13.3 Equilíbrio de Nash retomado 488 13.4 Jogos repetitivos 494 13.5 Jogos sequenciais 498 13.6 Ameaças, compromissos e credibilidade 500 13.7 Desencorajamento à entrada 506 *13.8 Leilões 512 LISTA DE EXEMPLOS 13.1 A aquisição de uma empresa 486 13.2 Cooperação oligopolista na indústria de medidores de água 497 13.3 Concorrência e coalizão no setor aeroviário 497 13.4 Estratégia de investimento preemptivo da Wal-Mart 505 13.5 A DuPont desencoraja a entrada na indústria de dióxido de titânio 510 13.6 Batalhas das fraldas descartáveis 511 13.7 Leilão de serviços jurídicos 517 13.8 Leilões pela Internet 517 N o Capítulo 12, começamos a explorar algumas das decisões estra- tégicas que as empresas frequentemente precisam tomar relativas a preços e produção. Observamos como uma empresa pode levar em conta as prováveis reações dos concorrentes quando toma essas deci- sões. Entretanto, há muitas questões referentes à estrutura de mercado e ao comportamento empresarial que ainda não abordamos. Por exemplo, por que as empresas tendem a fazer coalizões em alguns mercados en- quanto competem agressivamente em outros? Quais as formas utilizadas por algumas delas para desencorajar a entrada no mercado de potenciais concorrentes? De que modo as empresas devem tomar as decisões de preço quando as condições de demanda ou de custo se alteram ou novos concorrentes entram no mercado? Para responder a essas questões e expandir nossa análise do processo de tomada de decisões estratégicas pelas empresas, utilizaremos a teo- ria dos jogos. A aplicação da teoria dos jogos tem sido uma área im- portante de desenvolvimento na microeconomia. Este capítulo explica alguns aspectos-chave dessa teoria e mostra como ela pode ser usada na compreensão de como os mercados evoluem e operam e de como os ad- ministradores deveriam pensar sobre as decisões estratégicas com que continuamente se defrontam. Por exemplo, veremos o que ocorre quando empresas oligopolistas têm estrategicamente de determinar e ajustar pre- ços ao longo do tempo, de tal maneira que o dilema dos prisioneiros, já discutido no Capítulo 12, é repetido de modo incessante. Mostraremos a maneira pela qual as empresas fazem movimentos estratégicos que lhes dão vantagem sobre os concorrentes ou a melhor posição durante situa- ções de negociação e como elas podem fazer uso de ameaças, promessas ou atos mais concretos para impedir a entrada de potenciais concorrentes no mercado. Por fim, veremos como a teoria dos jogos pode ser aplicada na hora de planejar leilões e elaborar estratégias de lances. 13.1 Jogos e decisões estratégicas Primeiro, esclareceremos a finalidade dos jogos e do processo de decisões estratégicas. Jogo é qualquer situação na qual jogadores (os par- ticipantes) tomam decisões estratégicas, ou seja, decisões que levam em ESTE CAPÍTULO DESTACA

Upload: others

Post on 05-Apr-2020

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

Teoria dos jogos e estratégia competitiva

CAPÍTULO 13

13.1 Jogos e decisões estratégicas 483

13.2 Estratégias dominantes 486

13.3 Equilíbrio de Nash retomado 488

13.4 Jogos repetitivos 494

13.5 Jogos sequenciais 498

13.6 Ameaças, compromissos e credibilidade 500

13.7 Desencorajamento à entrada 506

*13.8 Leilões 512

LISTA DE EXEMPLOS13.1 A aquisição de

uma empresa 486

13.2 Cooperação oligopolista na indústria de medidores de água 497

13.3 Concorrência e coalizão no setor aeroviário 497

13.4 Estratégia de investimento preemptivo da Wal-Mart 505

13.5 A DuPont desencoraja a entrada na indústria de dióxido de titânio 510

13.6 Batalhas das fraldas descartáveis 511

13.7 Leilão de serviços jurídicos 517

13.8 Leilões pela Internet 517

No Capítulo 12, começamos a explorar algumas das decisões estra-tégicas que as empresas frequentemente precisam tomar relativas a preços e produção. Observamos como uma empresa pode levar

em conta as prováveis reações dos concorrentes quando toma essas deci-sões. Entretanto, há muitas questões referentes à estrutura de mercado e ao comportamento empresarial que ainda não abordamos. Por exemplo, por que as empresas tendem a fazer coalizões em alguns mercados en-quanto competem agressivamente em outros? Quais as formas utilizadas por algumas delas para desencorajar a entrada no mercado de potenciais concorrentes? De que modo as empresas devem tomar as decisões de preço quando as condições de demanda ou de custo se alteram ou novos concorrentes entram no mercado?

Para responder a essas questões e expandir nossa análise do processo de tomada de decisões estratégicas pelas empresas, utilizaremos a teo-ria dos jogos. A aplicação da teoria dos jogos tem sido uma área im-portante de desenvolvimento na microeconomia. Este capítulo explica alguns aspectos-chave dessa teoria e mostra como ela pode ser usada na compreensão de como os mercados evoluem e operam e de como os ad-ministradores deveriam pensar sobre as decisões estratégicas com que continuamente se defrontam. Por exemplo, veremos o que ocorre quando empresas oligopolistas têm estrategicamente de determinar e ajustar pre-ços ao longo do tempo, de tal maneira que o dilema dos prisioneiros, já discutido no Capítulo 12, é repetido de modo incessante. Mostraremos a maneira pela qual as empresas fazem movimentos estratégicos que lhes dão vantagem sobre os concorrentes ou a melhor posição durante situa-ções de negociação e como elas podem fazer uso de ameaças, promessas ou atos mais concretos para impedir a entrada de potenciais concorrentes no mercado. Por fim, veremos como a teoria dos jogos pode ser aplicada na hora de planejar leilões e elaborar estratégias de lances.

13.1 Jogos e decisões estratégicasPrimeiro, esclareceremos a finalidade dos jogos e do processo de

decisões estratégicas. Jogo é qualquer situação na qual jogadores (os par-ticipantes) tomam decisões estratégicas, ou seja, decisões que levam em

ESTE CAPÍTULO DESTACA

00 Pindyck.indb 483 28/11/13 20:13

Page 2: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA484

conta as atitudes e respostas dos outros. Exemplos de jogos incluem empresas que compe-tem ao estabelecer preços ou um grupo de consumidores competindo no oferecimento de lances para arrematar uma obra de arte em um leilão. Decisões estratégicas resultam em payoffs para os jogadores: resultados que acarretam recompensas ou benefícios. Para as empresas que estabelecem preços, os payoffs são os lucros; para aqueles que oferecem lan-ces em um leilão, consistem no excedente do consumidor, isto é, no valor que eles atribuem à obra de arte menos o valor a ser pago.

Um objetivo crucial da teoria dos jogos é determinar a estratégia ótima para cada jogador. Estratégia é uma regra ou plano de ação para o jogo. Para nossas empresas que estabelecem preços, um exemplo de estratégia seria: “Manter o preço alto enquanto os concorrentes fizerem o mesmo, mas, caso um deles reduza o preço, baixar o nosso ainda mais”. Para um apostador em um leilão, uma estratégia seria: oferecer um lance inicial de US$ 2.000 para convencer os outros de que existe a séria intenção de vencer, mas desistir caso os lances ultrapassem US$ 5.000. A estratégia ótima para um jogador é aquela que maximiza o payoff esperado.

Vamos nos concentrar nos jogos que envolvem jogadores racionais, ou seja, jogadores que ponderam as consequências de suas ações. Na essência, trataremos da seguinte ques-tão: se cremos que nossos concorrentes são racionais e atuam visando à maximização de seus payoffs, de que modo devemos levar o comportamento deles em consideração ao tomar nossas próprias decisões? Na vida real, obviamente é possível encontrar compe-tidores irracionais ou com menos capacidade de avaliar as consequências de suas ações. No entanto, a melhor forma de começarmos é partindo do princípio de que todos os com-petidores são tão racionais e inteligentes quanto nós.1 Como poderemos ver, levar em conta o comportamento dos competidores não é tão simples quanto parece. Determinar a estratégia ótima pode ser difícil mesmo em condições de perfeita simetria e de perfeita informação (isto é, quando todos os concorrentes têm a mesma estrutura de custos e estão plenamente informados sobre os custos uns dos outros, sobre a demanda etc.). Além disso, estaremos preocupados com situações mais complexas, nas quais as empresas tenham diferentes custos, diferentes tipos de informações e vários graus e formas de “vantagem” e “desvantagem” competitiva.

Jogos não cooperativos versus jogos cooperativosOs jogos econômicos praticados pelas empresas podem ser cooperativos ou não coo-

perativos. Um jogo cooperativo ocorre quando os participantes podem negociar contratos vinculativos de cumprimento obrigatório entre si, o que lhes permite planejar estratégias em conjunto. Um jogo não cooperativo ocorre quando não é possível a negociação e não há mecanismos para obrigar o cumprimento de contratos entre os participantes.

Um exemplo de jogo cooperativo é a negociação entre um comprador e um vendedor em torno do preço de um tapete. Se o tapete custa US$ 100 para ser produzido e o comprador lhe atribui o valor de US$ 200, torna-se possível uma solução cooperativa para o jogo, pois um acordo de venda por qualquer preço entre US$ 101 e US$ 199 maximizará a soma do excedente do consumidor com o lucro do vendedor e será benéfica para ambas as partes. Outro jogo cooperativo pode envolver duas empresas de determinado setor que estejam negociando um investimento em conjunto para desenvolver uma nova tecnologia (conside-rando-se que nenhuma das duas teria know-how suficiente para obter sucesso sozinha). Se elas podem assinar um contrato entre si, dividindo os lucros decorrentes do investimento conjunto, torna-se possível um resultado cooperativo que beneficiará ambas as partes.2

1 Quando entrevistados, 80% de nossos alunos afirmaram ser mais inteligentes e capazes do que a maioria dos colegas. Imaginamos, pois, que não seja difícil se imaginar competindo com pessoas tão inteligentes e capazes quanto você.

2 A negociação do tapete é chamada de jogo de soma constante, pois, independentemente do preço de venda, a soma do excedente do consumidor e do lucro do vendedor será a mesma. Negociar um empreendimento em conjunto é um jogo de soma não constante: o lucro total decorrente do empreendimento dependerá do resultado das negociações (por exemplo, dos recursos que cada empresa investir no empreendimento).

jogo

Situação na qual jogadores (participantes) tomam deci-sões estratégicas que levam em conta as atitudes e res-postas uns dos outros.

payoffs

Valores associados a um resultado possível.

estratégia ótima

Estratégia que maximiza o payoff esperado do jogador.

estratégia

Plano de ação ou regra para participar de um jogo.

jogo cooperativo

Aquele no qual os parti-cipantes podem negociar contratos vinculativos de cumprimento obrigatório que lhes permitam planejar estratégias em conjunto.

jogo não cooperativo

Jogo no qual a negociação e a existência de mecanismos que obriguem o cumpri-mento de contratos não são possíveis.

00 Pindyck.indb 484 28/11/13 20:13

Page 3: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

485CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Um exemplo de jogo não cooperativo é a situação na qual duas empresas concorrentes levam em conta os prováveis comportamentos uma da outra e determinam independente-mente uma estratégia de preço. Ambas sabem que, estabelecendo preços menores que a ou-tra, podem obter uma fatia maior do mercado. Mas também sabem que, ao fazê-lo, correm o risco de iniciar uma guerra de preços. Outro jogo não cooperativo é o leilão mencionado antes: cada licitante deve considerar o comportamento dos outros ao determinar uma estra-tégia ótima para oferecer lances.

Observe que a diferença fundamental entre os jogos cooperativos e os não cooperativos está na possibilidade de negociar e implementar contratos. Nos jogos cooperativos, os con-tratos vinculativos são possíveis; nos jogos não cooperativos, não.

Consideraremos aqui principalmente os jogos não cooperativos. Em qualquer jogo, entretanto, tenha em mente o seguinte ponto-chave acerca do planejamento da estratégia de tomada de decisões:

É essencial compreender o ponto de vista do oponente e deduzir as prováveis respostas dele às suas ações.

Isso pode parecer óbvio, pois é claro que cada um deve compreender o ponto de vista de seu oponente. Entretanto, mesmo em situações simples de jogos, as pessoas com fre-quência ignoram ou interpretam mal as posições dos oponentes, assim como as respostas racionais que delas decorrem.COMO COMPRAR UMA nOTA DE UM DÓLAR Considere o seguinte jogo, criado por Martin Shubik.3 Uma nota de um dólar é leiloada, mas de forma pouco comum. O res-ponsável pelo lance mais alto recebe o dólar em troca do valor do lance. Entretanto, o responsável pelo segundo lance mais alto também deverá pagar o valor de seu lance e nada receber em troca. Se você estivesse participando desse jogo, qual seria seu lance?

Experiências em salas de aula mostraram que os estudantes quase sempre acabam fa-zendo lances superiores a um dólar pela nota. Em um cenário típico, um participante faz um lance de US$ 0,20 e o próximo, um lance de US$ 0,30. Dessa forma, aquele que fez o lance menor deverá agora perder US$ 0,20, mas ele imagina que poderia ganhar o dólar e assim faz um novo lance, desta vez no valor de US$ 0,40. A escalada de lances con-tinua até que os dois jogadores chegam ao lance de US$ 0,90 pelo dólar. Agora, aquele que fez o lance de US$ 0,90 deverá decidir entre fazer um lance de US$ 1,10 pelo dólar ou pagar US$ 0,90 para nada receber em troca. Em geral, ele eleva seu lance e a escalada continua. Em alguns dos experimentos, o “vencedor” acabou pagando mais de $ 3 pela nota de um dólar!

Por que estudantes inteligentes se comportam dessa maneira? Por não terem pensado na provável reação dos demais jogadores e na sequência de eventos que ela acarreta.

No restante deste capítulo, examinaremos jogos simples que envolvem determi-nação de preços, propaganda e decisões de investimento. Os jogos são simples no sentido de que, dadas algumas suposições comportamentais, poderemos determinar a melhor estratégia para cada empresa. No entanto, mesmo nesses jogos simples, des-cobriremos que as suposições comportamentais nem sempre são fáceis de se fazer; muitas vezes elas dependerão de como transcorre o jogo (por exemplo, o tempo que as empresas permanecem em atividade, sua reputação etc.). Portanto, ao avançar por este capítulo, você deve procurar compreender as questões básicas envolvidas no processo de tomada de decisões. Você deve ter sempre em mente a importância da avaliação do posicionamento de seu oponente e da reação racional dele relativamente a suas ações, como ilustra o Exemplo 13.1.

3 Martin Shubik. Game Theory in the Social Sciences. Cambridge, MA: MIT Press, 1982.

00 Pindyck.indb 485 28/11/13 20:13

Page 4: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA486

13.2 Estratégias dominantes 4De que forma podemos decidir qual a melhor estratégia para participar de um jogo? De

que maneira podemos determinar o resultado mais provável de um jogo? Necessitamos de algo que nos ajude a definir de que modo o comportamento racional de cada jogador levará a uma solução de equilíbrio. Algumas estratégias podem ser bem-sucedidas se os concor-rentes fizerem determinadas opções, mas serão malsucedidas se eles fizerem escolhas di-ferentes. Outras estratégias, entretanto, poderão ser bem-sucedidas quaisquer que sejam as atitudes dos participantes. Iniciaremos apresentando o conceito de estratégia dominante — aquela que é ótima independentemente do que o oponente venha a fazer.

O seguinte exemplo ilustra tal fato em um cenário duopolista. Suponhamos que as empresas A e B vendam produtos concorrentes e estejam decidindo se empreenderão ou não campanhas de propaganda. Cada empresa, contudo, será afetada pela decisão do con-corrente. Os possíveis resultados encontram-se ilustrados pela matriz de payoff apresen-tada na Tabela 13.1. (Lembre-se de que a matriz de payoff resume os possíveis resultados do jogo; o primeiro número em cada célula é o payoff da Empresa A e o segundo número é o payoff da Empresa B.) Observe que, se ambas as empresas decidirem fazer propaganda, a Empresa A terá um lucro de 10 e a Empresa B terá um lucro de 5. Se a Empresa A fizer propaganda e a Empresa B, não, a Empresa A lucrará 15 e a Empresa B terá lucro zero. A tabela mostra também os resultados das outras duas possibilidades.

4 Esta é uma versão revisada de um exemplo elaborado por Max Bazerman para um curso no MIT.

estratégia dominante

Estratégia que é ótima, não importando o que o oponente faça.

Na Seção 12.4, explicamos que uma matriz de payoff é uma tabela que mostra os payoffs de cada par-ticipante para cada uma de suas decisões, dada cada uma das decisões do concorrente.

EXEMPLO 13.1 A AQUISIÇÃO DE UMA EMPRESA

Você representa a Empresa A (que faz a aquisição), a qual está considerando a possibilidade de adquirir a Empresa T (a empresa-alvo).4 Você planeja pagar em dinheiro por todas as ações da Empresa T, mas não tem certeza do preço que deverá oferecer. A dificuldade é a seguinte: o valor da Empresa T — na verdade, sua viabilidade — depende do resultado obtido por um importante projeto de exploração de petróleo. Se o projeto não obtiver sucesso, a Empresa T sob a atual admi-nistração nada valerá. Mas, caso seja bem-sucedido, poderá valer até US$ 100/ação. Todos os valores de ação entre US$ 0 e US$ 100 são considerados igualmente prováveis.

Entretanto, é de conhecimento geral o fato de que a Empresa T poderia ter um valor consideravelmente maior sob a administração progressista da Empresa A do que sob a atual administração. Na verdade, qualquer que seja seu valor sob a atual administração, a Empresa T teria um valor 50% mais alto sob a administração da Empresa A. Se seu projeto fracassar, a Empresa T valerá US$ 0/ação sob qualquer uma das duas administrações. Se o projeto fizer com que seu valor se torne US$ 50/ação sob a atual administração, seu valor sob a administração da Empresa A será de US$ 75/ação. De igual modo, um valor de US$ 100/ação sob a administração da Empresa T implicaria um valor de US$ 150/ação sob a administração da Empresa A, e assim por diante.

Você precisa determinar qual preço a Empresa A deve oferecer pelas ações da Empresa T. Essa oferta deve ser feita agora — antes que seja conhecido o resultado do projeto de exploração. Tudo indica que a Empresa T estaria disposta a ser adquirida pela Empresa A por um preço correto. Você acredita que a Empresa T adiará sua decisão sobre a proposta que você fará até que ela conheça os resultados da exploração, e, então, ela aceitará ou rejeitará sua oferta antes que a notícia referente aos resultados da perfuração chegue à imprensa.

Portanto, você (Empresa A) não conhecerá os resultados do projeto de exploração quando estiver fazendo a proposta, mas a Empresa T já conhecerá os resultados quando estiver decidindo se aceita ou não a oferta. A Empresa T também aceitará qualquer oferta feita pela Empresa A que seja maior do que o valor (por ação) da empresa sob a atual administração. Na qua-lidade de representante da Empresa A, você está considerando a possibilidade de fazer propostas na faixa de US$ 0/ação (isto é, não fazer proposta alguma) a US$ 150/ação. Qual preço por ação você deveria oferecer pelas ações da Empresa T?

Observação: a resposta típica — isto é, oferecer entre US$ 50 e US$ 75 por ação — está errada. A resposta correta para o problema encontra-se no final deste capítulo, porém recomendamos que você tente encontrá-la sozinho.

NOTA ESCONDIDA>

00 Pindyck.indb 486 28/11/13 20:13

Page 5: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

487CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

TAbELA 13.1 Matriz de payoff para o jogo da propaganda

Empresa B

Faz propaganda Não faz propaganda

Empresa A

Faz propaganda 10, 5 15, 0

Não faz propaganda 6, 8 10, 2

Qual estratégia cada empresa deve escolher? Primeiro, consideremos a Empresa A. Decerto ela deve investir em propaganda, porque, independentemente do que possa fazer a Empresa B, a Empresa A realizará um melhor negócio ao investir em propaganda. Se a Empresa B fizer propaganda, a Empresa A lucrará 10 se fizer propaganda, mas lucrará ape-nas 6 caso não faça. Se a Empresa B não investir em propaganda, a Empresa A lucrará 15 caso faça propaganda, mas lucrará apenas 10 se não fizer. Portanto, investir em propaganda é uma estratégia dominante para a Empresa A. O mesmo é verdadeiro para a Empresa B; isto é, pouco importa o que faça a Empresa A, a Empresa B realizará um melhor negócio se investir em propaganda. Portanto, supondo que ambas sejam racionais, sabemos que o resultado do jogo será ambas as empresas investirão em propaganda. Esse resultado é fácil de ser determinado, porque as duas possuem estratégias dominantes.

Quando cada jogador tem uma estratégia dominante, chamamos o resultado do jogo de equilíbrio em estratégias dominantes. Esses jogos podem ser analisados objetivamente, pois a estratégia ótima para cada jogador pode ser determinada sem a preocupação com as ações dos outros.

Infelizmente, nem todos os jogos apresentam estratégias dominantes para cada um dos jogadores. Para entendermos esse processo, vamos alterar de leve nosso exemplo de propa-ganda. A matriz de payoff da Tabela 13.2 é a mesma da Tabela 13.1, exceto o canto inferior direito, pois, se nenhuma das empresas investir em propaganda, a Empresa B novamente lucrará 2, mas a Empresa A lucrará 20. (Talvez os anúncios da Empresa A sejam altamente defensivos, visando a desmentir as afirmações da Empresa B, e dispendiosos; portanto, ao não fazer propaganda, a Empresa A consegue reduzir de modo considerável as despesas.)

TAbELA 13.2 Jogo da propaganda modificado

Empresa B

Faz propaganda Não faz propaganda

Empresa A

Faz propaganda 10, 5 15, 0

Não faz propaganda 6, 8 20, 2

Agora a Empresa A não possui uma estratégia dominante. Sua decisão ótima dependerá da ação da Empresa B. Se esta fizer propaganda, a Empresa A realizará um melhor negó-cio se também investir em propaganda; entretanto, se a Empresa B não fizer propaganda, a Empresa A também realizará um melhor negócio se não investir em propaganda. Agora suponhamos que as duas empresas devam tomar suas decisões simultaneamente. O que a Empresa A deve fazer?

Para poder responder à pergunta, a Empresa A terá de se colocar na posição da Empresa B. Qual seria a melhor decisão do ponto de vista da Empresa B e qual seria

equilíbrio em estraté-gias dominantes

Resultado de um jogo em que cada empresa faz o melhor que pode indepen-dentemente do que fazem os concorrentes.

00 Pindyck.indb 487 28/11/13 20:13

Page 6: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA488

sua provável reação? A resposta é clara: a Empresa B tem uma estratégia dominante que consiste em fazer propaganda, não importando o que a Empresa A possa vir a fazer. (Se a Empresa A investir em propaganda, a Empresa B lucrará 5 se também fizer propa-ganda e lucrará zero se não fizer. Se a Empresa A não fizer propaganda, a Empresa B lu-crará 8 caso faça propaganda e lucrará 2 se não fizer.) Portanto, a Empresa A pode concluir que a Empresa B investirá em propaganda. Isso significa que a Empresa A deveria fazer o mesmo (podendo assim obter lucro de 10 em vez de 6). O equilíbrio será alcançado quando ambas as empresas investirem em propaganda. Esse é o resultado lógico do jogo, porque a Empresa A faz o melhor que pode em função da decisão da Empresa B; e a Empresa B também faz o melhor que pode em função da decisão da Empresa A.

13.3 Equilíbrio de Nash retomadoPara determinar o provável resultado de um jogo, procuramos estratégias “autoimple-

mentáveis” ou “estáveis”. As estratégias dominantes são estáveis, mas em muitos jogos um ou mais jogadores não possuem uma estratégia dominante. Por essa razão, precisamos de um conceito mais geral de equilíbrio. No Capítulo 12, introduzimos o conceito do equilí-brio de Nash; vimos que ele tem ampla aplicação e é intuitivamente atraente.5

Lembre-se de que o equilíbrio de Nash é um conjunto de estratégias (ou ações) no qual cada jogador faz o melhor que pode em função das ações de seus oponentes. Uma vez que cada jogador não possui estímulos para se desviar de seu equilíbrio de Nash, as estratégias são estáveis. No exemplo apresentado na Tabela 13.2, o equilíbrio de Nash consiste em ambas as empresas investirem em propaganda; trata-se de um equilíbrio de Nash porque, em função da decisão do concorrente, cada empresa estará satisfeita por ter tomado a melhor decisão possível e não terá estímulo para alterá-la.

No Capítulo 12, utilizamos o equilíbrio de Nash para estudar a determinação de níveis de produção e preços por empresas oligopolistas. No modelo de Cournot, por exemplo, cada empresa determina o próprio nível de produção, considerando fixas as quantidades produzidas pelos concorrentes. Vimos que, no equilíbrio de Cournot, nenhuma empresa possui estímulo para alterar unilateralmente o nível de produção, pois cada uma delas faz o melhor que pode em função das decisões dos concorrentes. Portanto, o equilíbrio de Cournot é um equilíbrio de Nash.6 Também examinamos modelos nos quais as empresas definem o preço considerando fixos os preços dos concorrentes. De novo, em um equilí-brio de Nash, cada empresa obtém o maior lucro possível em função dos preços praticados pelos concorrentes e, portanto, não tem nenhum incentivo para alterar o próprio preço.

Será útil compararmos o conceito de um equilíbrio de Nash com o do equilíbrio em estratégias dominantes:

Estratégias dominantes: Eu estou fazendo o melhor que posso, não importa o que você esteja fazendo. Você está fazendo o melhor que pode, não importa o que eu esteja fazendo.

Equilíbrio de Nash: Eu estou fazendo o melhor que posso, em função daquilo que você está fazendo. Você está fazendo o melhor que pode, em função daquilo que eu estou fazendo.

5 Nossa discussão sobre o equilíbrio de Nash e sobre a teoria dos jogos em geral está em nível introdu-tório. Para discussões mais profundas sobre a teoria e suas aplicações veja James W. Friedman, Game Theory with Applications to Economics. Nova York: Oxford University Press, 1990; Drew Fudenberg e Jean Tirole, Game Theory. Cambridge, MA: MIT Press, 1991; e Avinash Dixit, David Reiley, Jr. e Susan Skeath, Games of Strategy, 3. ed. Nova York: Norton, 1999.

6 Um equilíbrio de Stackelberg é também um equilíbrio de Nash. Mas no modelo de Stackelberg as regras são diferentes: uma empresa toma sua decisão sobre o nível de produção antes dos concorrentes. Seguindo essas regras, cada empresa faz o melhor que pode em função da decisão tomada pelo concorrente.

Explicamos na Seção 12.2 que o equilíbrio de Cournot é um equilíbrio de Nash em que cada empresa estima corretamente quanto os concorrentes vão produzir.

00 Pindyck.indb 488 28/11/13 20:13

Page 7: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

489CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Observe que o equilíbrio em estratégia dominante é um caso especial do equilíbrio de Nash.

No jogo da propaganda, apresentado na Tabela 13.2, há apenas um equilíbrio de Nash — ambas as empresas investem em propaganda. Em geral, um jogo não precisa ter apenas um único equilíbrio de Nash. Algumas vezes não há equilíbrio de Nash e, em outras, há di-versos (isto é, há diversos conjuntos de estratégias que são estáveis e autoimplementáveis). Outros exemplos poderão ajudar a esclarecer esse fato.O PRObLEMA DA ESCOLhA DE PRODUTO Consideremos o seguinte problema de “escolha de produto”. Duas empresas produtoras de cereais matinais defrontam-se com um mer-cado no qual duas novas variedades de cereais poderão ser lançadas com sucesso, desde que cada variedade seja introduzida apenas por uma empresa. Há mercado para um novo cereal “crocante” e para um novo cereal “açucarado”, mas cada uma das empresas dispõe de recursos para lançar apenas um produto novo. Portanto, a matriz de payoff para as duas empresas pode ser semelhante à da Tabela 13.3.

TAbELA 13.3 Problema da escolha do produto

Empresa 2Crocante Açucarado

Empresa 1Crocante –5, –5 10, 10

Açucarado 10, 10 –5, –5

Nesse jogo, desde que não lance o mesmo produto que o concorrente, nenhuma das empresas tem preferência quanto a qual item fabricar. Se fosse possível fazer uma coorde-nação, as empresas provavelmente concordariam em dividir o mercado. Mas o que pode ocorrer se precisarem se comportar não cooperativamente? Suponhamos que, de alguma forma, talvez por intermédio de notícias ou outro meio de comunicação, a Empresa 1 revele estar prestes a lançar o novo cereal açucarado e a Empresa 2 (após saber disso) anuncie planos de lançar o cereal crocante. Em função da ação que acredita estar sendo praticada por sua concorrente, nenhuma das empresas terá estímulo para se desviar da ação proposta. Se a empresa realizar a ação proposta, o lucro será de 10, mas, se ela se desviar e a ação do concorrente permanecer inalterada, o lucro será de –5. Portanto, o conjunto de estratégias contido no canto inferior esquerdo da matriz de payoff é estável e se constitui em um equi-líbrio de Nash: em função da estratégia do oponente, cada empresa está fazendo o melhor que pode e não possui estímulo para se desviar desse equilíbrio.

Observe que o canto superior direito da matriz de payoff também contém um equilí-brio de Nash, que poderia ocorrer se a Empresa 1 revelasse que iniciaria a produção do cereal crocante. Cada um dos equilíbrios de Nash é estável porque, uma vez escolhidas as estratégias, nenhum dos jogadores se desviará unilateralmente delas. Entretanto, sem in-formações adicionais, não teremos meios de saber qual equilíbrio (crocante/açucarado ver-sus açucarado/crocante) provavelmente resultará — ou se algum deles vai de fato ocorrer. Decerto, ambas as empresas terão fortes estímulos para alcançar um dos dois equilíbrios de Nash — caso ambas venham a produzir o mesmo tipo de cereal, as duas sofrerão prejuízos. O fato de as duas empresas não estarem autorizadas a entrar em acordo não significa que elas não possam alcançar um equilíbrio de Nash. À medida que um setor se desenvolve, em geral se desenvolvem formas de entendimento, quando as empresas sinalizam umas para as outras a respeito dos caminhos que o setor deverá trilhar.O JOGO DE LOCALIZAÇÃO nA PRAIA Como outro exemplo de equilíbrio de Nash, supo-nhamos que você (V) e um concorrente (C) estejam planejando vender refrigerantes em uma praia neste verão. A praia tem 200 metros de comprimento e os banhistas estão espa-lhados igualmente ao longo dela. Você e seu concorrente vendem os mesmos refrigerantes

00 Pindyck.indb 489 28/11/13 20:13

Page 8: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA490

ao mesmo preço, de modo que os clientes vão optar pelo vendedor que estiver mais perto. Onde você se posicionará na praia e onde você supõe que seu concorrente se posicionará?

Se você refletir por um instante, vai ver que o único equilíbrio de Nash é aquele em que você e seu concorrente se localizam no mesmo ponto no centro da praia (veja a Figura 13.1). Para entender por que, suponha que seu concorrente se localize em algum outro ponto (A), que na figura está a 3/4 do caminho para o fim da praia. Nesse caso, você não desejaria mais ficar posicionado no centro da praia; você se colocaria ao lado de seu concorrente, apenas um pouco para a esquerda. Desse modo, você capturaria 3/4 do total das vendas, en-quanto seu concorrente ficaria com o 1/4 restante. Esse resultado não é um equilíbrio, por-que seu concorrente então desejaria se mover para o centro da praia e você faria o mesmo.

VC

A 200 0

Praia

Oceano

metros

JOGO DE LOCALIZAÇÃO nA PRAIAFIGURA 13.1

Você (V ) e um concorrente (C ) planejam vender refrigerantes na praia. Se os banhistas estão igualmente espalhados ao longo da praia e andarem até o vendedor que estiver mais perto, vocês dois se localizarão no centro da praia. Esse é o único equilíbrio de Nash. Se o concorrente se posicionasse no ponto A, você desejaria se mover para um ponto logo à esquerda dele, onde poderia capturar 3/4 das vendas. Mas o concorrente se moveria de volta para o centro e você faria o mesmo.

O “jogo de localização na praia” pode nos ajudar a entender diversos fenômenos. Alguma vez você já notou, ao longo de um trecho de três ou quatro quilômetros, como dois ou três postos de gasolina ou várias agências de automóveis estão próximos um do outro? De modo semelhante, quando a eleição presidencial dos Estados Unidos se aproxima, os candidatos democratas e republicanos costumam se mover para perto do centro ao definir suas posições políticas.

Estratégias maximinO conceito de equilíbrio de Nash apoia-se muito na racionalidade individual. Cada

estratégia escolhida pelo jogador dependerá não só da própria racionalidade como tam-bém da racionalidade do oponente. Isso pode se tornar uma limitação, como mostra o exemplo da Tabela 13.4.

TAbELA 13.4 Estratégia maximin

Empresa 2Não investe Investe

Empresa 1Não investe 0, 0 –10, 10

Investe –100, 0 20, 10

Nesse jogo, duas empresas competem pelas vendas de software de criptografia de arquivos. Como ambas utilizam o mesmo padrão de criptografia, os arquivos de uma podem ser lidos pelos da outra — uma vantagem para o consumidor. No entanto, a Empresa 1 possui uma fatia muito maior do mercado (ingressou antes e seu software

00 Pindyck.indb 490 28/11/13 20:13

Page 9: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

491CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

possui uma interface melhor). As duas consideram agora a possibilidade de investir em um novo padrão de criptografia.

Note que o investimento é a estratégia dominante para a Empresa 2, porque por meio dele ela obterá o melhor resultado, independentemente do que a Empresa 1 fizer. Portanto, a Empresa 1 deve esperar que a Empresa 2 invista. Nesse caso, a Empresa 1 fará melhor negócio se investir (lucrando US$ 20 milhões) do que não investir (perdendo US$ 10 mi-lhões). O resultado (investir, investir) é nitidamente um equilíbrio de Nash para esse jogo, e você poderá verificar que se trata do único equilíbrio de Nash. Observe, porém, que os administradores da Empresa 1 devem se assegurar de que os administradores da Empresa 2 tenham compreendido o jogo e sejam racionais. Caso a Empresa 2 cometesse um erro e deixasse de investir, isso seria extremamente prejudicial para a Empresa 1. (O consumidor ficaria confuso a respeito da incompatibilidade dos padrões e a Empresa 1, com sua fatia dominante, perderia US$ 100 milhões.)

O que você faria se fosse a Empresa 1? Se você tende a agir com cautela — e está preo-cupado com o fato de que os administradores da Empresa 2 possam não estar plenamente in-formados ou não sejam racionais —, pode optar por não investir. Nesse caso, a pior hipótese seria perder US$ 10 milhões; não há mais a chance de você perder US$ 100 milhões. Tal es-tratégia é denominada estratégia maximin porque maximiza o ganho mínimo que pode ser obtido. Se ambas as empresas utilizarem estratégias maximin, o resultado será que a Empresa 1 não investirá e a Empresa 2, sim. Uma estratégia maximin é sempre conservadora, porém não é maximizadora de lucros (considerando que a Empresa 1, por exemplo, perde US$ 10 milhões em vez de ganhar US$ 20 milhões). Observe que, se a Empresa 1 tivesse certeza de que a Empresa 2 estava utilizando uma estratégia maximin, preferiria investir (e lucrar US$ 20 milhões) em vez de dar continuidade à estratégia maximin de não investir.MAXIMIZAÇÃO DO PAYOFF ESPERADO Se a Empresa 1 não tem certeza do que a Empresa 2 fará, mas é capaz de associar probabilidades a cada uma das possíveis ações dela, pode utilizar uma estratégia que maximize o payoff esperado. Por exemplo, suponhamos que a Empresa 1 imagine que há 10% de chance de a Empresa 2 não investir. Nesse caso, o payoff esperado da Empresa 1 no investimento será (0,1)(–100) + (0,9)(20) = US$ 8 milhões. O payoff esperado, caso não invista, será (0,1)(0) + (0,9)(–10) = –US$ 9 milhões. Nesse caso, a Empresa 1 deve investir.

Por outro lado, suponhamos que a Empresa 1 pense que a probabilidade de a Empresa 2 não investir seja de 30%. Então, o payoff esperado do investimento será (0,3)(–100) + (0,7) (20) = –US$ 16 milhões, e o do não investimento, (0,3)(0) + (0,7)(–10) = –US$ 7 milhões. Nesse caso, a Empresa 1 escolherá não investir.

Pode-se perceber que a estratégia da Empresa 1 depende muito de sua avaliação das probabilidades das diferentes atitudes da Empresa 2. Determinar tais probabilidades pode ser bastante difícil. No entanto, as empresas geralmente enfrentam incerteza (so-bre as condições do mercado, os custos futuros e o comportamento dos concorrentes) e têm de tomar as melhores decisões possíveis com base em avaliações de probabilidades e valores esperados.O DILEMA DOS PRISIOnEIROS Qual é o equilíbrio de Nash para o dilema dos prisioneiros discutido no Capítulo 12? A Tabela 13.5 mostra a matriz de payoff para o dilema dos prisio-neiros. Lembre-se de que o resultado ótimo é aquele no qual nenhum dos dois confesse, de tal forma que ambos sejam condenados a dois anos de prisão. Confessar, entretanto, é uma estratégia dominante para cada um dos prisioneiros — é a que resulta no maior payoff, independentemente da que é utilizada pelo outro prisioneiro. As estratégias dominantes também são estratégias maximin. Portanto, o resultado em que ambos os prisioneiros con-fessam constitui, ao mesmo tempo, um equilíbrio de Nash e uma solução maximin. Então, no sentido mais estrito do termo, o mais racional é que cada prisioneiro confesse.

estratégia maximin

Estratégia que maximiza a obtenção de um determinado nível mínimo de ganho.

Para rever o cálculo do valor esperado, consulte a Seção 5.1, onde este é definido como uma média ponderada dos payoffs associados a todos os resultados possíveis, utilizando-se como pesos as probabilidades de cada resultado.

00 Pindyck.indb 491 28/11/13 20:13

Page 10: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA492

TAbELA 13.5 Dilema dos prisioneiros

Prisioneiro BConfessa Não confessa

Prisioneiro AConfessa –5, –5 –1, –10

Não confessa –10, –1 –2, –2

*Estratégias mistasEm todos os jogos que examinamos até aqui, consideramos estratégias nas quais os

jogadores fazem uma escolha específica ou decidem agir de determinada forma: fazer ou não fazer propaganda, determinar um preço de US$ 4 ou de US$ 6, e assim por diante. Estratégias dessa natureza são denominadas estratégias puras. Entretanto, há jogos nos quais as estratégias puras não são a melhor forma de jogar.O JOGO DAS MOEDAS Um exemplo de estratégia mista é encontrado no “jogo das moedas”. Nesse jogo, cada participante escolhe se mostrará cara ou coroa e ambos exibem as moedas simultaneamente. Se as moedas estiverem com lados iguais (isto é, ambos os jogadores mostrarem cara ou ambos mostrarem coroa), o Jogador A ganhará e receberá um dólar do Jogador B. Se as moedas estiverem com lados diferentes, o Jogador B receberá um dólar do Jogador A. A matriz de payoff para esse jogo é apresentada na Tabela 13.6.

TAbELA 13.6 Jogo das moedas

Jogador BCara Coroa

Jogador ACara 1, –1 –1, 1

Coroa –1, 1 1, –1

Observe que não há equilíbrio de Nash em estratégias puras para esse jogo. Por exemplo, suponhamos que o Jogador A escolha a estratégia de mostrar cara. Então, o Jogador B mos-trará coroa. Mas, se o Jogador B mostrasse coroa, o Jogador A também estaria disposto a mostrar coroa. Não haveria combinação de cara ou coroa que pudesse satisfazer a ambos os participantes — um dos dois estaria sempre disposto a alterar a estratégia.

Embora não ocorra equilíbrio de Nash nas estratégias puras, ele ocorre nas estratégias mistas: estratégias nas quais os jogadores fazem escolhas aleatórias entre duas ou mais ações possíveis, com base em um conjunto de probabilidades escolhidas. No jogo das moe-das, por exemplo, o Jogador A simplesmente lança a moeda ao ar e assim joga cara com pro-babilidade 1/2 e coroa com probabilidade 1/2. De fato, se o Jogador A seguir essa estratégia e o Jogador B fizer o mesmo, teremos um equilíbrio de Nash; ambos os participantes estarão fazendo o melhor que podem em função daquilo que o oponente está fazendo. Observe que, embora o resultado do jogo seja aleatório, o payoff esperado de cada jogador é zero.

Pode parecer estranho participar de um jogo escolhendo as ações aleatoriamente. Mas coloque-se na posição do Jogador A e imagine o que poderia ocorrer caso optasse por uma estratégia diferente de simplesmente lançar a moeda ao ar. Suponha, por exemplo, que você decidisse mostrar cara. Se o Jogador B soubesse disso, ele poderia mostrar coroa, e você decerto perderia. Mesmo que o Jogador B não conhecesse sua estratégia, se o jogo fosse feito repetidas vezes, ele poderia talvez descobri-la, escolhendo, então, uma estratégia capaz de se contrapor à sua. Nesse caso, você certamente alteraria sua estratégia, e é por essa razão que ela não seria capaz de produzir um equilíbrio de Nash. Apenas quando você e seu oponente escolhessem cara ou coroa de forma aleatória, com probabilidade 1/2, é que nenhum dos dois teria estímulo algum para alterar as estratégias

estratégia pura

Estratégia em que um jogador faz uma escolha específica ou toma uma ação específica.

estratégias mistas

Estratégias nas quais os jogadores fazem escolhas aleatórias entre duas ou mais ações possíveis, com base em um conjunto de probabilidades escolhidas.

00 Pindyck.indb 492 28/11/13 20:13

Page 11: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

493CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

adotadas. (Você pode verificar que o uso de diferentes probabilidades, como 3/4 para cara e 1/4 para coroa, não gera um equilíbrio de Nash.)

Uma razão para considerar a utilização de estratégias mistas é que em alguns jogos (por exemplo, o jogo das moedas) não ocorre nenhum equilíbrio de Nash em estratégias puras. Pode ser mostrado, entretanto, que, desde que seja permitido o uso de estratégias mistas, todo jogo tem pelo menos um equilíbrio de Nash.7 Portanto, as estratégias mistas possibili-tam soluções para jogos mesmo quando as puras falham. Claro que as soluções envolvendo estratégias mistas serão consideradas razoáveis dependendo do jogo específico ou dos jo-gadores. Elas têm probabilidade de se tornar muito razoáveis para o jogo das moedas, para o de pôquer e para outros jogos do gênero. Uma empresa, por outro lado, talvez não ache razoável acreditar que o concorrente venha a determinar os preços de modo aleatório.A GUERRA DOS SEXOS Alguns jogos apresentam equilíbrios de Nash tanto com estratégias puras como com as mistas. Um exemplo disso é “a guerra dos sexos”, um jogo que talvez lhe pareça familiar. Ele transcorre da seguinte maneira: Jim e Joan gostariam de passar o sábado à noite juntos, mas têm gostos diferentes para entretenimentos. Jim gostaria de ir à ópera, mas Joan prefere assistir a uma luta livre na lama. Como nos mostra a matriz de payoff da Tabela 13.7, o que Jim mais gostaria de fazer seria ir à ópera com Joan, porém pre-fere assistir a uma luta livre na lama com ela a ir sozinho à ópera, e o inverso vale para Joan.

TAbELA 13.7 A guerra dos sexos

JimLuta Ópera

JoanLuta 2, 1 0, 0

Ópera 0, 0 1, 2

Primeiro, observe que há dois equilíbrios de Nash em estratégias puras para esse jogo — aquele no qual Jim e Joan preferem assistir a uma luta livre na lama e aquele no qual ambos preferem ir à ópera. É claro que Joan preferiria o primeiro desses dois resultados, e Jim, o segundo, mas ambos os resultados são de equilíbrio, pois nem Jim nem Joan esta-riam dispostos a alterar suas respectivas opções em função da decisão tomada pelo outro.

Esse jogo também possui um equilíbrio em estratégias mistas: Joan escolhe a luta livre com 2/3 de probabilidade e a ópera com 1/3 de probabilidade, e Jim escolhe a luta livre com 1/3 de probabilidade e a ópera com 2/3 de probabilidade. Você pode verificar que, se Jim empregar essa estratégia, Joan não estará fazendo melhor com nenhuma outra estratégia, e vice-versa.8 O resultado será aleatório, e Jim e Joan terão cada um o payoff esperado de 2/3.

Será que deveríamos esperar que Jim e Joan empregassem essas estratégias mistas? Provavelmente não, a menos que apreciassem muito correr riscos ou fossem um casal um tanto diferente. Ao concordar com qualquer um dos tipos de entretenimento, cada um teria um resultado de pelo menos 1, o que ultrapassaria o payoff esperado de 2/3 para o resultado aleatório. Nesse jogo, da mesma forma que em muitos outros, as estratégias mistas possibi-litam outra solução, embora não muito realista. Portanto, durante o restante deste capítulo, trataremos apenas de estratégias puras.

7 Mais precisamente, jogos com um número finito de jogadores e um número finito de ações têm pelo menos um equilíbrio de Nash. Para uma demonstração disso, veja David M. Kreps, A Course in Microeconomic Theory. Princeton, NJ: Princeton University Press, 1990, p. 409.

8 Suponha que Joan aja aleatoriamente, sendo p a probabilidade de assistir à luta e (1 – p) a de ir à ópera. Como Jim utiliza probabilidades de 1/3 para a luta e 2/3 para a ópera, a probabilidade de que ambos esco-lham a luta é de (1/3)p e de que ambos escolham a ópera é de (2/3)(l – p). Portanto, o payoff esperado de Joan é 2(1/3)p + 1(2/3)(1 – p) = (2/3)p + 2/3 – (2/3)p = 2/3. Isso independe de p, e, portanto, Joan não tem melhor escolha em termos de payoff esperado não importa o que ela decida.

00 Pindyck.indb 493 28/11/13 20:13

Page 12: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA494

13.4 Jogos repetitivosVimos no Capítulo 12 que, nos mercados oligopolistas, as empresas com frequência

se encontram no dilema dos prisioneiros durante o processo de tomada de decisão sobre níveis de produção ou preços. Será que elas poderiam encontrar uma maneira de sair desse dilema, de tal forma que a coordenação e a cooperação oligopolistas (explícita ou implícita) pudessem prevalecer?

Para respondermos a essa pergunta, devemos reconhecer que o dilema dos prisioneiros, da forma já descrita, é limitado: embora alguns prisioneiros possam ter apenas uma oportunidade na vida de confessar ou não, para a maioria das empresas as determinações de quantidade e preço se repetem continuamente. Na vida real, as empresas praticam jogos repetitivos: ações são realizadas e os payoffs recebidos várias vezes. Em jogos repetitivos, as estratégias podem se tornar mais complexas. Por exemplo, a cada repetição do dilema, cada organização poderá de-senvolver uma reputação a respeito de seu próprio comportamento e estudar o dos concorrentes.

De que forma a repetição modifica o provável resultado do jogo? Suponhamos que você seja a Empresa 1 no dilema dos prisioneiros ilustrado pela matriz de payoff da Tabela 13.8. Se você e seu concorrente cobrarem um preço alto, ambos poderão obter lucros mais ele-vados do que se os dois cobrassem um preço mais baixo. Entretanto, você teme cobrar um preço mais alto, pois, se seu concorrente vender por menos, você poderá perder muito di-nheiro e, para piorar as coisas, o concorrente poderá ficar rico. Mas suponhamos que esse jogo seja repetido muitas e muitas vezes — você e seu concorrente, por exemplo, anunciam simultaneamente os respectivos preços no primeiro dia de cada mês. Será que você deveria modificar sua forma de atuação nesse jogo, talvez alterando seu preço ao longo do tempo, em reação ao comportamento de seu concorrente?

TAbELA 13.8 Problema da determinação de preços

Empresa 2Preço baixo Preço alto

Empresa 1Preço baixo 10, 10 100, –50

Preço alto –50, 100 50, 50

Em um interessante estudo, Robert Axelrod solicitou a especialistas em teoria dos jogos que elaborassem a melhor estratégia possível para poder praticar esse jogo de uma forma repetitiva.9 (Uma possível estratégia poderia ser: “Começarei com um preço alto para de-pois reduzi-lo. Mas, se meu concorrente reduzir o preço, aumentarei o meu durante algum tempo, antes de começar a baixá-lo novamente etc.”) Então, em uma simulação feita em computador, Axelrod colocou tais estratégias para competir umas contra as outras, para ver qual delas funcionava melhor.ESTRATÉGIA “OLhO POR OLhO, DEnTE POR DEnTE” Como esperado, verificou-se que qualquer estratégia específica funciona melhor contra algumas estratégias do que contra outras. O objetivo, entretanto, era encontrar a mais forte, isto é, aquela que em média fun-cionasse melhor contra todas, ou quase todas, as demais. O resultado foi surpreendente. A que melhor funcionou foi uma simplíssima, denominada estratégia “olho por olho, dente por dente”: começarei com um preço alto, que manterei enquanto você continuar a coope-rar, cobrando também um preço elevado. Entretanto, assim que você reduzir seu preço, eu o acompanharei e também baixarei o meu. Caso mais tarde você decida colaborar, aumen-tando seu preço de novo, imediatamente aumentarei o meu.

9 Veja Robert Axelrod, The Evolution of Cooperation. Nova York: Basic Books, 1984.

jogos repetitivos

Jogos nos quais as ações são tomadas e os decorren-tes payoffs são recebidos várias vezes, de modo consecutivo.

estratégia “olho por olho, dente por dente”

Estratégia de repetição na qual o jogador responde de forma igual às jogadas do oponente, cooperando com os oponentes que coo-peram e retaliando os que não o fazem.

00 Pindyck.indb 494 28/11/13 20:13

Page 13: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

495CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Por que razão a estratégia “olho por olho, dente por dente” funciona melhor? Em parti-cular, será que poderíamos esperar que, utilizando essa estratégia, conseguiríamos induzir nosso concorrente a se comportar cooperativamente (e a cobrar um preço alto)?JOGO REPETIDO InFInITAS VEZES Suponhamos que o jogo seja repetido infinitas vezes. Em outras palavras, meu concorrente e eu repetiremos a determinação de preços mês após mês, para sempre. O comportamento cooperativo (ou seja, a cobrança de um preço alto) torna-se então a resposta racional à estratégia “olho por olho, dente por dente”. (Isso pres-supõe que meu concorrente saiba, ou possa deduzir, que estou utilizando uma estratégia desse tipo.) Para compreendermos o motivo dessa afirmação, suponhamos que em um mês meu concorrente pratique um preço mais baixo do que o meu. Durante esse período, ele com certeza conseguirá obter lucros maiores. Mas ele sabe que, no próximo mês, redu-zirei o preço, de maneira que seus lucros cairão e permanecerão baixos enquanto ambos estivermos cobrando preços baixos. Como esse jogo será repetido infinitas vezes, a perda acumulada de lucros que ocorrerá será necessariamente maior do que qualquer lucro de curto prazo que possa ser acumulado durante o primeiro mês de vendas a preços baixos. Portanto, não seria racional reduzir os preços.

Na verdade, no caso de um jogo repetido infinitas vezes, meu concorrente não terá nem mesmo que se assegurar de que eu esteja escolhendo a estratégia “olho por olho, dente por dente” para compreender que a cooperação é a estratégia racional a ser seguida. Mesmo que ele acredite haver apenas uma pequena probabilidade de que eu esteja empregando a estratégia, ainda julgará ser racional começar a cobrar um preço alto e mantê-lo enquanto eu o faça. Por quê? Com a repetição infinita do jogo, o ganho esperado decorrente da coopera-ção ultrapassa em muito o ganho que poderia ser obtido por meio de uma guerra de preços. Isso será verdadeiro mesmo que a probabilidade de eu estar empregando a estratégia “olho por olho, dente por dente” (e, portanto, de eu continuar a cooperar) seja pequena.nÚMERO FInITO DE REPETIÇÕES Agora, suponhamos que o jogo seja repetido um nú-mero finito de vezes — digamos, por N meses. (N poderá ser grande, desde que seja finito.) Se meu concorrente (Empresa 2) for racional e acreditar que eu sou racional, ele raciocinará da seguinte maneira: “Como a Empresa 1 estará praticando a estratégia ‘olho por olho, dente por dente’, eu (Empresa 2) não poderei vender por menos, no mínimo até o último mês. Eu devo vender por menos no último mês, porque então poderei obter altos lucros nesse período; nesse momento, o jogo já terá terminado e a Empresa 1 não poderá fazer retaliações. Portanto, cobrarei o preço alto até a chegada do último mês e então passarei a vender por menos”.

Entretanto, considerando que também já terei (Empresa 1) pensado o mesmo, também baixarei o preço no último mês. Claro, a Empresa 2 pode já imaginar isso e, portanto, sabe que cobrarei menos no último mês. Então, como ficaria o penúltimo mês? Como, de qualquer forma, não haverá cooperação no último mês, a Empresa 2 julga que deve vender por menos no penúltimo. Mas é claro que eu já pensei nisso, portanto, também planejo cobrar menos no penúltimo mês. Como o mesmo raciocínio se aplica a cada mês prece-dente, a única saída racional seria ambos cobrarmos um preço baixo todo mês.A ESTRATÉGIA “OLhO POR OLhO, DEnTE POR DEnTE” nA PRÁTICA Considerando que a maioria das pessoas não espera viver para sempre, o argumento solucionador da estratégia “olho por olho, dente por dente” parece então ser de pouco valor; mais uma vez estamos empacados no dilema dos prisioneiros. Na prática, entretanto, tal estratégia pode às vezes funcionar e a cooperação pode acabar prevalecendo. Existem duas razões principais.

Primeiro, a maioria dos administradores não sabe por quanto tempo estará concorrendo com seus rivais, e isso também serve para tornar o comportamento cooperativo uma boa estratégia. Se não se conhece o final do jogo repetitivo, o argumento antes mencionado que se inicia com uma clara expectativa de reduções de preços no último mês já não é mais aplicável. Pois, no caso de um jogo repetido infinitas vezes, a utilização da estratégia “olho por olho, dente por dente” é mais racional.

00 Pindyck.indb 495 28/11/13 20:13

Page 14: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA496

Segundo, o meu concorrente pode ter dúvidas sobre o grau da minha racionalidade. Suponhamos que meu concorrente imagine (e ele não precisaria ter certeza) que eu es-teja jogando “olho por olho, dente por dente”. Ele também pensa que talvez eu esteja praticando “cegamente” essa estratégia, ou com racionalidade limitada, no sentido de que eu poderia não ter pensado nas implicações lógicas de um período finito, como já discutido antes. Por exemplo, meu concorrente poderia achar que talvez eu não tenha imaginado que ele fosse vender por menos no último mês e que eu também não vende-ria por menos no último mês e que, dessa forma, ele deveria cobrar um preço baixo no último mês e assim por diante. “Talvez”, poderia pensar meu concorrente, “a Empresa 1 empregue cegamente a estratégia ‘olho por olho, dente por dente’, cobrando então um preço alto enquanto eu assim o fizer”. Então (se o período for longo o suficiente), será racional que ele mantenha o preço alto até o último mês (quando então venderá por menos do que eu).

Observe que demos ênfase à palavra talvez. Meu concorrente não precisaria ter cer-teza de que eu estou jogando “olho por olho, dente por dente” cegamente, ou até mesmo que eu esteja empregando tal estratégia. Apenas a possibilidade já tornaria o com-portamento cooperativo uma boa estratégia (até a proximidade do fim) se o período fosse suficientemente longo. Embora meu concorrente possa fazer conjecturas de que a forma pela qual estou jogando pode estar errada, o comportamento cooperativo será lucrativo em termos de valor esperado. Com um período suficientemente longo, a soma dos lucros atuais e futuros, ponderada segundo a probabilidade de que tais conjecturas estejam corretas, poderá ultrapassar a soma dos lucros decorrentes de uma guerra de preços, mesmo que o concorrente seja o primeiro a vender por menos. Afinal, se eu estiver errado e meu concorrente cobrar um preço baixo, posso alterar minha estratégia ao custo do lucro de um único período — um custo mínimo se comparado ao lucro substancial que posso obter caso ambos optemos por definir um preço alto.

Portanto, nos jogos repetitivos, o dilema dos prisioneiros poderá ter um resultado cooperativo. Na realidade, na maioria dos mercados, o jogo é repetido no decorrer de um longo e indefinido período e os administradores alimentam certas dúvidas sobre quão “perfeitamente racional” seria a forma de operação deles próprios e dos concor-rentes. Em consequência, em alguns setores, particularmente naqueles em que apenas algumas empresas se encontram competindo entre si durante longos períodos e em condições estáveis de demanda e custo, a cooperação prevalecerá, mesmo que não sejam realizados arranjos contratuais entre os participantes. (A indústria de medido-res de água, tema discutido a seguir, é um exemplo disso.) Em muitos outros setores, porém, o comportamento cooperativo é pouco significativo ou até mesmo inexistente.

Às vezes, a cooperação cessa ou jamais tem início, porque há muitas empresas no setor. Mais comum, a não existência de cooperação resulta da rapidez das variações das condições de demanda e custos. Incertezas a respeito de demanda e custos dificul-tam para as empresas de um setor o entendimento implícito do que uma cooperação pode representar. (Lembre-se de que um entendimento explícito, alcançado por meio de reuniões e discussões, poderia resultar em uma violação dos termos da legislação antitruste.) Por exemplo, suponhamos que diferenças de custo ou diferenças de conhe-cimento da demanda levem uma empresa a concluir que cooperação significa cobrar US$ 50, enquanto uma segunda empresa acredita que signifiquem cobrar US$ 40. Se a segunda empresa cobrar US$ 40, a primeira pode encarar tal fato como uma tentativa de aumento de fatia de mercado e pode reagir conforme a estratégia “olho por olho, dente por dente”, cobrando US$ 35. Assim, poderia ocorrer uma guerra de preços.

00 Pindyck.indb 496 28/11/13 20:13

Page 15: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

497CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

10

10 Este exemplo baseia-se em parte em Nancy Taubenslag, “Rockwell International”, Harvard Business School Case No. 9-383-019, jul. 1983. No fim da década de 1980, a Rockwell foi dividida e vendeu sua divisão de medidores de água para a British Tyre & Rubber, que mais tarde fez parte da Invensys, uma companhia multinacional que comercializa medidores de água nos Estados Unidos sob a marca Foxboro. A Hersey tornou-se uma subsidiária da Mueller Products em 1999, mas ainda vende medidores sob o nome Hersey. A Badger e a Neptune continuam a operar como empresas independentes.

EXEMPLO 13.3 CONCORRÊNCIA E COALIZÃO NO SETOR AEROVIÁRIO

Em março de 1983, a American Airlines propôs que todas as empresas aéreas adotassem uma tabela uniforme de tarifas baseada em milhagem. A taxa por milha dependeria da distância da viagem: a mais baixa seria de US$ 0,15 (por milha) para voos com percursos acima de 2.500 milhas; haveria taxas maiores para os trajetos mais curtos; e a taxa mais alta seria de US$ 0,53 (por milha) para viagens com percursos inferiores a 250 milhas. Por exemplo, uma passagem só de ida em classe econômica de Boston para Chicago, cujo percurso é de 932 milhas, custaria US$ 233 (com base em uma taxa de US$ 0,25 por milha para viagens com percursos entre 751 e 1.000 milhas).

Essa proposta eliminaria a diferenciação entre as tarifas cobradas (algumas com grandes descontos) disponíveis naquela época. O custo de uma passagem de uma cidade para outra passaria a depender apenas da quantidade de milhas entre essas cidades. Como expressou um vice-presidente sênior da American Airlines: “A nova e mais apropriada estrutura de tarifas poderá ajudar a diminuir a confusão entre elas”. A maioria das outras grandes empresas aéreas reagiu de modo favorável ao

EXEMPLO 13.2 COOPERAÇÃO OLIGOPOLISTA NA INDÚSTRIA DE MEDIDORES DE ÁGUA

Há cerca de quatro décadas, quase todos os medidores de água vendidos nos Estados Unidos são produzidos por quatro empresas norte-americanas: Rockwell International, Badger Meter, Neptune Water Meter Company e Hersey Products.10 A maioria dos compradores de medidores de água é constituída por empresas municipais fornecedoras de água, as quais instalam elas próprias os equipamentos nas residências e estabelecimentos comerciais para medir o consumo de água e cobrar devidamente dos consumidores. Uma vez que o custo dos medidores representa uma pequena parte do custo total do fornecimento de água, as empresas municipais preocupam-se principalmente com a precisão e a confiabilidade do produto. O preço dos medidores não é um assunto fundamental e sua demanda é muito inelástica. Além disso, sua demanda é muito estável; como cada moradia ou estabelecimento comercial precisa ter um medidor de água, a demanda cresce lentamente, acompanhando o crescimento da população.

Além disso, as empresas de utilidade pública tendem a ter relacionamentos duradouros com os fornecedores e relutam em mudar de um para outro. Como novas empresas teriam dificuldade em tomar os clientes das já estabelecidas no mercado, é criada uma barreira à entrada. A existência de substanciais economias de escala torna-se uma segunda barreira à entrada de novas empresas: para obter uma fatia significativa do mercado, a nova empresa terá de investir em uma fábrica grande. Tais exigências praticamente eliminam a possibilidade de entrada de novas empresas.

Havendo uma demanda inelástica e estável e uma ameaça pequena de entrada de novos concorrentes, as quatro empre-sas existentes podem obter substanciais lucros de monopólio se determinarem os preços cooperativamente. Por outro lado, se competirem agressivamente entre si, com cada uma delas reduzindo os preços para aumentar as respectivas fatias de mercado, os lucros podem cair até os níveis competitivos. As empresas encontram-se, então, em um dilema dos prisioneiros. Será que a cooperação poderá prevalecer?

Ela pode e tem prevalecido. Lembre-se de que as mesmas quatro empresas participam de um jogo repetitivo há décadas. A demanda tem sido estável e previsível e, ao longo dos anos, as empresas vêm conseguindo avaliar tanto os próprios custos como os de cada uma das outras. Em uma situação como essa, a estratégia “olho por olho, dente por dente” funciona bem: vale a pena para cada uma delas atuar cooperativamente, desde que os concorrentes estejam cooperando.

Como resultado, as quatro empresas operam como se fossem membros de um clube de campo. Raramente ocorre uma tentativa de redução de preços, e cada uma delas parece estar satisfeita com a respectiva fatia de mercado. Embora possa parecer monótono, esse negócio é certamente lucrativo. Assim, as quatro empresas têm obtido lucros sobre os investimen-tos que ultrapassam, em muito, aqueles de setores competitivos.

< NOTA ESCONDIDA

00 Pindyck.indb 497 28/11/13 20:13

Page 16: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA498

13.5 Jogos sequenciais11

Na maioria dos jogos que discutimos até aqui, ambos os participantes fazem os movi-mentos ao mesmo tempo. No modelo de Cournot de duopólio, por exemplo, as duas em-presas determinam os níveis de produção ao mesmo tempo. Já nos jogos sequenciais, os jogadores fazem os movimentos um após o outro. O modelo de Stackelberg, discutido no Capítulo 12, é um exemplo de jogo sequencial; uma empresa determina o nível de produção antes que a outra o faça. Há muitos outros exemplos: a decisão de uma empresa de investir em propaganda e a consequente reação do concorrente; o investimento de uma empresa já estabelecida para desestimular a entrada de novos concorrentes e a decisão sobre entrar ou não em tal mercado por parte de um potencial concorrente; ou então uma nova política de regulamentação governamental e a reação das empresas regulamentadas em termos de investimento e quantidade produzida.

Examinaremos diversos jogos sequenciais no restante deste capítulo. Como poderemos ver, com frequência eles são mais fáceis de analisar do que aqueles nos quais os partici-pantes fazem movimentos ao mesmo tempo. Em um jogo sequencial, a solução é ponderar sobre as possíveis ações e reações racionais de cada jogador.

11 “American to Base Fares on Mileage”, New York Times, 15 mar. 1983; “Most Big Airlines Back American’s Fare Plan, New York Times, 17 mar. 1983.

jogos sequenciais

Aqueles em que os jogado-res se movem (um após o outro) em resposta a ações e reações do oponente.

plano e começou a implementá-lo. Um vice-presidente da TWA afirmou: “Trata-se de uma boa medida. É bastante sistemá-tica”. A United Airlines logo anunciou que adotaria esse plano nas rotas em que concorria com a American, o que incluía a maior parte de suas rotas, e a TWA e a Continental disseram que iriam adotá-lo para todas suas rotas.11

Por que será que a American Airlines propôs essa estrutura de tarifas e o que a tornava tão atraente às demais empresas aéreas? Será que seu objetivo era realmente “ajudar a diminuir a confusão entre as tarifas”? Não. O intuito era reduzir a con-corrência de preços e alcançar um arranjo de preços entre as empresas. Estes haviam sido derrubados em virtude de guerras de preços ocorridas enquanto as empresas aéreas competiam para aumentar suas fatias de mercado. Como Robert Crandall já havia aprendido pouco menos de um ano antes, acertar preços por telefone é ilegal. Em vez disso, as empresas implici-tamente acertariam os preços por meio de um acordo em torno da utilização da mesma fórmula para determinar as tarifas.

O plano não obteve sucesso, vítima do dilema dos prisioneiros. Apenas duas semanas depois de ele ter sido anunciado e adotado pela maioria das empresas, a Pan Am baixou os preços, por estar insatisfeita com sua pequena participação no mercado norte-americano. As empresas American, United e TWA logo baixaram também os preços para equipará-los aos da Pan Am, temendo uma diminuição de suas respectivas fatias de mercado. A guerra de preços teve continuidade e, felizmente para os consumidores, o plano acabou rápido.

Em abril de 1992, a American Airlines introduziu outra estrutura simplificada de tarifas para fileiras com quatro assen-tos, a qual foi rapidamente adotada pela maioria das grandes companhias aéreas. Mas essa também logo foi derrubada pelos descontos competitivos. Em maio de 1992, a Northwest Airlines anunciou o programa “crianças voam de graça” e a American respondeu com descontos de 50% durante o verão, que outras companhias acompanharam. Como resultado, o setor aéreo perdeu bilhões de dólares.

Por que o preço das tarifas aéreas é tão competitivo? As empresas planejam a capacidade de suas rotas com dois ou mais anos de antecedência, mas as decisões sobre preços são tomadas em prazos mais curtos, mensal ou mesmo sema-nalmente. Da mesma forma, o custo marginal da adição de passageiros em um voo é bastante baixo, restrito basicamente a um refrigerante e a um saquinho de amendoins. Portanto, cada empresa é incentivada a baixar os preços das tarifas para tirar passageiros dos concorrentes. Além disso, a demanda por viagens aéreas flutua de maneira imprevisível. Tais fatores interferem na cooperação implícita de preços.

Assim, a competição agressiva continua a ser a regra no setor aéreo. Na verdade, a política de preços tem se tornado ainda mais competitiva nos últimos anos. Primeiro, as companhias mais baratas — como a Southwest e a JetBlue — têm atraído milhões de consumidores preocupados com o fator preço e, ao mesmo tempo, forçado as empresas maiores a baixar as tarifas. Segundo, durante os períodos de pouca demanda, as empresas aéreas são compelidas a reduzir preços para atrair clientes. Por fim, os serviços de Internet, como o Expedia, o Orbitz e o Travelocity, têm promovido a “compra justa” por parte de clientes on-line e incentivado o estabelecimento de preços mais competitivos. Todos esses fatos vêm levando várias das principais companhias aéreas à falência e resultando em perdas recordes no setor.

NOTA ESCONDIDA >

00 Pindyck.indb 498 28/11/13 20:13

Page 17: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

499CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Para usarmos um exemplo simples, vamos voltar ao problema da escolha do produto que discutimos na Seção 13.3. Esse problema envolve duas empresas que se defrontam com um mercado no qual podem ser lançadas com sucesso duas variedades de cereais matinais, desde que cada uma delas opte por apenas uma variedade. Contudo, vamos fazer uma ligeira modificação na matriz de payoff. Como é mostrado na Tabela 13.9, o novo cereal açucarado será inevitavelmente um produto mais vendido do que o novo cereal crocante e vai gerar um lucro de 20 em vez de 10 (talvez pelo fato de os consumi-dores preferirem alimentos açucarados a alimentos crocantes). Entretanto, os dois novos cereais continuam sendo lucrativos desde que cada um seja introduzido por apenas uma empresa. (Compare a Tabela 13.9 com a Tabela 13.3.)

TAbELA 13.9 Problema modificado da escolha de produtos

Empresa 2Crocante Açucarado

Empresa 1Crocante –5, –5 10, 20Açucarado 20, 10 –5, –5

Suponha que ambas as empresas, ignorando as intenções do concorrente, devam anun-ciar suas decisões independente e simultaneamente. Nesse caso, as duas provavelmente anunciarão o lançamento do cereal açucarado — e ambas terão prejuízos.

Agora imagine que a Empresa 1 possa iniciar mais rapidamente a produção e lançar pri-meiro seu cereal. Em consequência disso, teremos um jogo sequencial: a Empresa 1 faz o lançamento de um novo cereal e, posteriormente, a Empresa 2 fará o seu. Qual deverá ser o resultado desse jogo? Durante o processo de tomada de decisão, a Empresa 1 deverá consi-derar a reação racional do concorrente. Ela sabe que, qualquer que seja o cereal que venha a introduzir no mercado, a Empresa 2 introduzirá a outra variedade. Portanto, ela introduzirá o cereal açucarado, sabendo que a Empresa 2 reagirá lançando o crocante.

Forma extensiva de um jogoEmbora esse resultado possa ser deduzido com base na matriz de payoff da Tabela 13.9,

os jogos sequenciais se tornam mais fáceis de serem visualizados se os movimentos possíveis forem representados em forma de uma árvore de tomada de decisão. Essa representação é denominada forma extensiva de um jogo e é mostrada na Figura 13.2. A figura mostra as possíveis opções da Empresa 1 (introduzir o cereal crocante ou o cereal açucarado) e as pos-síveis reações da Empresa 2 para cada uma das opções. Os payoffs resultantes encontram-se apresentados ao final de cada ramo da árvore. Por exemplo, se a Empresa 1 produzir o cereal crocante e a Empresa 2 reagir produzindo o mesmo cereal, cada uma terá um lucro de –5.

Para descobrir a solução do jogo com base na forma extensiva, trabalhe a partir do fim. Para a Empresa 1, a melhor sequência de movimentos é aquela em que ela lucra 20 e a Empresa 2 lucra 10. Portanto, a Empresa 1 pode deduzir que deveria produzir o cereal açucarado, pois a melhor reação da Empresa 2 seria a produção do cereal crocante.

Empresa 1

Empresa 2

Empresa 2

Crocante

Açucarado

Crocante

Açucarado

Crocante

Açucarado

–5, –5

10, 20

20, 10

–5, –5

FORMA EXTEnSIVA DO JOGO DA ESCOLhA DO PRODUTOFIGURA 13.2

forma extensiva de um jogo

Representação de possí-veis movimentos de um jogo no formato de uma árvore de decisões.

00 Pindyck.indb 499 28/11/13 20:13

Page 18: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA500

Vantagem em ser o primeiroNesse jogo de escolha do produto há uma clara vantagem em ser o primeiro a tomar a

decisão: ao introduzir o cereal açucarado, a Empresa 1 cria um fato consumado que deixa a Empresa 2 com praticamente nenhuma escolha, a não ser o lançamento do cereal cro-cante. Essa vantagem se assemelha muito àquela que já vimos no modelo de Stackelberg no Capítulo 12. Nele, a empresa que toma a decisão primeiro pode optar por um nível alto de produção, deixando, portanto, o concorrente com quase nenhuma escolha a não ser optar por um nível mais baixo.

Para esclarecer a natureza dessa vantagem de ser o primeiro, seria útil revisar o modelo de Stackelberg e compará-lo ao de Cournot, no qual ambas as empresas fazem simultaneamente suas escolhas de nível de produção. Como no Capítulo 12, utilizaremos o exemplo no qual duas empresas duopolistas se defrontam com a seguinte curva de demanda de mercado:

P = 30 – Q

sendo Q a produção total, isto é, Q = Q1 + Q2. Como antes, estaremos também supondo que as duas empresas possuam um custo marginal igual a zero. Lembre-se de que o equilíbrio de Cournot é representado por Q1 = Q2 = 10, de tal modo que P = 10 e cada empresa lucra 100. Lembre-se também de que, se as duas empresas fizessem um acordo, elas produziriam Q1 = Q2 = 7,5, de tal forma que P = 15 e cada uma delas obteria lucros de 112,50. Por fim, lembre-se de que, conforme dissemos na Seção 12.3, no modelo de Stackelberg, no qual a Empresa 1 faz o primeiro movimento, as quantidades resultantes serão Q1 = 15 e Q2 = 7,5, de modo que P = 7,50, e os lucros das empresas serão, respectivamente, 112,50 e 56,25.

Esses e alguns outros possíveis resultados encontram-se resumidos na matriz de payoff da Tabela 13.10. Se ambas as empresas fizerem movimentos simultaneamente, a única solução para o jogo será elas produzirem 10 e gerarem lucros de 100. Nesse equilíbrio de Cournot, cada empresa estaria fazendo o melhor possível em função daquilo que o concorrente realiza. Entretanto, se a Empresa 1 fizer o primeiro movimento, saberá que sua decisão estará limi-tando as opções da Empresa 2. Observe na matriz de payoff que, se a Empresa 1 determinar que Q1 = 7,5, a melhor opção para a Empresa 2 será determinar que Q2 = 10. Isso resultaria em um lucro de 93,75 para a Empresa 1 e em um lucro de 125 para a Empresa 2. Se a Empresa 1 determinar que Q1 = 10, a Empresa 2 determinará que Q2 = 10 e ambas as empresas obterão lucros de 100. Mas, se a Empresa 1 determinar que Q1 = 15, a Empresa 2 determinará que Q2 = 7,5 e, dessa forma, a Empresa 1 lucrará 112,50 e a Empresa 2, 56,25. Portanto, o má-ximo que a Empresa 1 poderá lucrar é 112,50, e ela obterá isso determinando que Q1 = 15. Comparando essa situação com o resultado de Cournot, ao efetuar o primeiro movimento a Empresa 1 realizará um melhor negócio e a Empresa 2 fará um negócio muito pior.

TAbELA 13.10 Escolhendo a produção

Empresa 27,5 10 15

Empresa 17,5 112,50, 112,50 93,75, 125 56,25, 112,50

10 125, 93,75 100, 100 50, 75

15 112,50, 56,25 75, 50 0, 0

13.6 Ameaças, compromissos e credibilidadeA questão da escolha do produto e o modelo de Stackelberg são dois exemplos de

como uma empresa que faz o primeiro movimento pode criar um fato consumado que lhe dá uma vantagem sobre o concorrente. Nesta seção, examinaremos de forma mais ampla a vantagem que uma empresa pode ter ao se mover primeiro, considerando também o fator

Na Seção 12.2, expli-camos que o modelo de Stackelberg é um modelo de oligopólio no qual uma empresa estabelece o nível de produção antes das outras.

Na Seção 12.2, explica-mos que, no modelo de Cournot, cada empresa trata a produção do con-corrente como fixa e todas as empresas decidem simultaneamente quanto produzirão.

00 Pindyck.indb 500 28/11/13 20:13

Page 19: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

501CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

que determina qual empresa o fará. Daremos enfoque à seguinte pergunta: quais ações poderiam ser tomadas por uma empresa para que consiga estar em posição vantajosa no mercado? Por exemplo, de que forma uma empresa poderia desencorajar a entrada de potenciais concorrentes no mercado ou então de que maneira poderia induzir os concor-rentes a elevar os preços, reduzir a produção ou abandonar totalmente o mercado?

Lembre-se de que no modelo de Stackelberg, a primeira empresa a se movimentar ga-nhou vantagem porque se comprometeu com um nível de produção elevado. O comprome-timento é crucial, pois restringirá seu comportamento futuro. Para compreender melhor esse fato, imagine que a primeira empresa a se movimentar (Empresa 1) resolve mudar sua postura em reação a um comportamento da Empresa 2. O que aconteceria? A Empresa 2 decerto produziria muito. Por quê? Porque sabe que a Empresa 1 responderá com a dimi-nuição da produção previamente anunciada. A única maneira de a Empresa 1 ganhar com o movimento inicial é por meio do comprometimento. Na verdade, a Empresa 1 limita o comportamento da Empresa 2 quando restringe seu próprio comportamento.

A ideia de limitar o próprio comportamento para ganhar vantagem competitiva pode parecer paradoxal; no entanto, mais adiante, veremos que não é assim. Examinemos alguns exemplos que poderão esclarecer isso.

Primeiro, voltemos mais uma vez à questão da escolha do produto, mostrada na Tabela 13.9. A empresa que lançar primeiro o novo cereal matinal estará mais bem posicionada. Mas qual delas o lançará primeiro? Mesmo que ambas as empresas necessitem dispor de tempos iguais para engrenar as respectivas produções, cada uma delas terá estímulo para assumir o compromisso consigo própria de lançar o cereal açucarado primeiro. A palavra--chave é compromisso. Se a Empresa 1 apenas anunciar que produzirá o cereal açucarado, a Empresa 2 terá pouco motivo para acreditar em tal aviso. Afinal, a Empresa 2, conhecendo as vantagens de produzir o cereal açucarado, poderá fazer o mesmo anúncio em tom mais alto e mais convincente. A Empresa 1 terá de restringir seu próprio comportamento de um modo que convença a Empresa 2 de que a Empresa 1 não tem outra escolha a não ser produ-zir o cereal açucarado. A Empresa 1 poderia lançar uma dispendiosa campanha publicitária, promovendo o novo cereal açucarado bem antes de seu lançamento, portanto colocando em jogo sua reputação. Ela poderia também providenciar a encomenda de uma grande quanti-dade de açúcar (tornando pública tal encomenda ou pelo menos enviando uma cópia dela para a Empresa 2). A ideia é que a Empresa 1 se comprometa a produzir o cereal açucarado. Comprometimento é um movimento estratégico que induzirá a Empresa 2 a tomar a decisão que a Empresa 1 quer que ela tome, isto é, produzir o cereal crocante.

Por que a Empresa 1 não poderia apenas ameaçar a Empresa 2, prometendo que produ-zirá o cereal açucarado mesmo que a Empresa 2 decida fazer o mesmo? Porque a Empresa 2 tem poucos motivos para crer em ameaças e ela própria poderia fazer o mesmo. Uma ameaça é útil apenas quando se pode acreditar nela. O exemplo apresentado a seguir deverá ajudar a esclarecer esse ponto.

Ameaças vaziasSuponhamos que a Empresa 1 esteja produzindo computadores pessoais que possam

ser utilizados tanto para processamento de textos como para outras tarefas. A Empresa 2 produz apenas computadores dedicados ao processamento de textos. Como podemos ver na matriz de payoff da Tabela 13.11, enquanto a Empresa 1 estiver cobrando um preço alto pelos computadores, as duas empresas poderão obter bons lucros. Mesmo que a Empresa 2 cobre um preço mais baixo pelos processadores de textos, muitas pessoas ainda comprarão os computadores da Empresa 1 (porque eles podem também execu-tar uma grande diversidade de outras tarefas), embora alguns consumidores possam ser induzidos, em virtude da diferença entre os preços, a adquirir o computador dedicado apenas ao processamento de textos. Entretanto, se a Empresa 1 passar a cobrar um preço baixo por seu computador, a Empresa 2 também terá de fazê-lo (ou então terá lucro zero) e os lucros de ambas serão reduzidos significativamente.

00 Pindyck.indb 501 28/11/13 20:13

Page 20: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA502

TAbELA 13.11 Determinação do preço de computadores e processadores de textos

Empresa 2Preço alto Preço baixo

Empresa 1Preço alto 100, 80 80, 100

Preço baixo 20, 0 10, 20

A Empresa 1 preferiria o resultado apresentado no canto superior esquerdo da matriz. Entretanto, para a Empresa 2, a cobrança do preço mais baixo é nitidamente uma estratégia dominante. Portanto, o resultado contido no canto superior direito prevalecerá (pouco im-porta qual seja a empresa a determinar o preço primeiro).

A Empresa 1 provavelmente seria vista como a dominante, pois as determinações de preço teriam impacto maior sobre os lucros de todo o setor. Será que a Empresa 1 seria capaz de induzir a Empresa 2 a cobrar um alto preço por meio de uma ameaça de que ela própria cobraria um preço baixo caso a Empresa 2 fizesse isso? Não, como podemos ver claramente na matriz de payoff da Tabela 13.11: qualquer que seja a atuação da Empresa 2, a Empresa 1 teria muito mais a perder se cobrasse um preço baixo. Em consequência, sua ameaça não teria credibilidade.

Compromisso e credibilidadeAlgumas vezes, as empresas podem tornar suas ameaças dignas de crédito. Para enten-

dermos de que modo isso ocorre, consideremos o exemplo apresentado a seguir. A empresa Race Car Motors, Inc. fabrica automóveis e a empresa Far Out Engines, Ltd. fabrica mo-tores especiais de automóveis. A Far Out Engines vende a maior parte dos motores para a Race Car Motors, e alguns deles para um limitado mercado. Portanto, ela depende muito da Race Car Motors e toma, por isso, as decisões de produção em função dos planos de produção dessa empresa.

Portanto, temos aqui um jogo sequencial no qual a Race Car é a “líder”. Ela decidirá que tipos de automóvel fabricar e só então a Far Out Engines poderá determinar que tipos de motor produzir. A matriz de payoff da Tabela 13.12(a) apresenta os possíveis resultados desse jogo. (Os lucros estão expressos em milhões de dólares.) Observe que a Race Car fará melhor negócio se decidir fabricar automóveis pequenos. Ela sabe que, em função disso, a Far Out Engines fabricará também motores pequenos, a maior parte dos quais será adqui-rida por ela para os novos automóveis. Em consequência, a Far Out lucrará US$ 3 milhões e a Race Car US$ 6 milhões.

TAbELA 13.12(a) Problema de escolha da produção

Race Car MotorsCarros pequenos Carros grandes

Far Out EnginesMotores pequenos 3, 6 3, 0

Motores grandes 1, 1 8, 3

Entretanto, a Far Out preferiria o resultado contido no canto inferior direito da ma-triz de payoff. Se ela pudesse fabricar motores grandes e se a Race Car fabricasse auto-móveis grandes e comprasse esses motores, os lucros gerados atingiriam US$ 8 milhões. (Entretanto, a Race Car teria lucros de apenas US$ 3 milhões.) Será que a Far Out poderia induzir a Race Car a fabricar automóveis grandes em vez de pequenos?

Suponhamos que a Far Out ameace fabricar motores grandes, pouco importa o que a Race Car faça; suponhamos também que nenhum outro fabricante de motores consiga sa-tisfazer facilmente as necessidades da Race Car. Se a Race Car acreditasse na ameaça da

00 Pindyck.indb 502 28/11/13 20:13

Page 21: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

503CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Far Out, ela estaria disposta a fabricar automóveis grandes. Do contrário, teria problemas em encontrar motores para os automóveis pequenos e estaria lucrando apenas US$ 1 mi-lhão em vez de US$ 3 milhões. Todavia, a ameaça não merece crédito: uma vez que a Race Car responda anunciando que fabricará automóveis pequenos, a Far Out não terá estímulo para levar adiante sua ameaça.

A Far Out poderia tornar sua ameaça digna de crédito, reduzindo de modo visível e irreversível alguns dos próprios payoffs na matriz e, assim, limitando suas escolhas. Em particular, a Far Out deveria reduzir os lucros com os motores pequenos (os lucros contidos na linha de cima da matriz). Ela poderia fazer isso encerrando ou inutilizando uma parte de sua capacidade produtiva para motores pequenos. Isso resultaria na matriz de payoff mostrada na Tabela 13.12(b). Agora, a Race Car sabe que, independentemente do tipo de automóvel que venha a fabricar, a Far Out fabricará motores grandes. Se a Race Car deci-disse fabricar automóveis pequenos, a Far Out venderia motores grandes da melhor forma possível aos demais fabricantes de automóveis, obtendo o lucro de apenas US$ 1 milhão. Mas isso é melhor do que não ter lucro algum fabricando motores pequenos. Como a Race Car tem de procurar motores em outro fornecedor, seus lucros também sofrerão redução (US$ 1 milhão). Assim, a fabricação de automóveis grandes torna-se nitidamente de inte-resse da Race Car. Dessa forma, fazendo um movimento estratégico que aparentemente a coloca em posição desvantajosa, a Far Out consegue melhorar o resultado do jogo.

TAbELA 13.12 (b) Problema de escolha da produção modificado

Race Car MotorsCarros pequenos Carros grandes

Far Out EnginesMotores pequenos 0, 6 0, 0Motores grandes 1, 1 8, 3

Embora compromissos estratégicos dessa natureza possam ser eficazes, são arrisca-dos e dependerão muito da exatidão do conhecimento da matriz de payoff e do setor. Por exemplo, suponhamos que a Far Out assuma um compromisso consigo de fabricar motores grandes, mas seja surpreendida ao descobrir que outra empresa consegue fabricar motores pequenos com custos baixos. O compromisso poderá então levar a Far Out à falência, em vez de permitir que ela continue obtendo altos lucros.O PAPEL DA REPUTAÇÃO O desenvolvimento do tipo certo de reputação poderá tam-bém proporcionar uma vantagem estratégica. De novo, vamos considerar o desejo da Far Out Engines de fabricar motores grandes para os automóveis grandes da Race Car Motors. Suponha que os administradores da Far Out Engines tenham adquirido a fama de serem irracionais — talvez até malucos. Eles então ameaçam produzir motores gran-des, independentemente do que faça a Race Car Motors (veja a Tabela 13.12(a)). Agora a ameaça pode ser digna de crédito sem que seja necessária qualquer outra ação; afinal, não se pode ter certeza de que um administrador irracional esteja sempre disposto a to-mar decisões que maximizem os lucros. Nas situações de jogo, a parte que é vista como (ou que se supõe que seja) meio maluca pode possuir uma vantagem significativa.

Desenvolver certa reputação pode ser uma estratégia especialmente importante em um jogo repetitivo. Uma empresa pode considerar vantajoso atuar de forma irracional durante várias rodadas do jogo. Isso poderia lhe dar uma reputação que lhe permitiria aumentar substancialmente seus lucros no longo prazo.

Estratégia de negociaçãoO que dissemos sobre compromisso e credibilidade também se aplica aos problemas de

negociação. O resultado poderá depender da habilidade de cada lado em fazer um movi-mento estratégico que seja capaz de alterar sua posição relativa à negociação.

00 Pindyck.indb 503 28/11/13 20:13

Page 22: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA504

Por exemplo, consideremos duas empresas que estejam planejando lançar um dentre dois produtos que sejam bens complementares entre si. Como mostra a matriz de payoff da Tabela 13.13, a Empresa 1 possui uma vantagem de custo sobre a Empresa 2 na produ-ção de A. Portanto, se as duas vierem a produzir A, a Empresa 1 poderá manter um preço baixo e obter lucros mais altos. Da mesma forma, a Empresa 2 possui uma vantagem de custo sobre a Empresa 1 na produção de B. Se as duas pudessem fazer um acordo sobre qual delas produziria qual produto, o resultado racional poderia ser aquele representado no canto superior direito: a Empresa 1 produz A, a Empresa 2 produz B e ambas auferem lucros de 50. De fato, mesmo que não haja cooperação, esse resultado ocorrerá, quer uma das duas empresas faça o movimento primeiro, quer ambas o façam simultanea-mente. Por quê? Porque a produção de B é uma estratégia dominante para a Empresa 2 e, portanto, (A, B) é o único equilíbrio de Nash.

A Empresa 1, claro, preferiria o resultado no canto inferior esquerdo da matriz de payoff. Mas, no contexto desse limitado conjunto de decisões, ela não poderá alcançá-lo. Suponhamos, entretanto, que as empresas 1 e 2 estejam também negociando em relação a um segundo assunto — aderirem ou não a um consórcio de pesquisa que uma terceira empresa está procurando formar. A Tabela 13.14 apresenta a matriz de payoff para esse pro-blema de decisão. Para ambas as empresas, a participação nesse consórcio é nitidamente uma estratégia dominante, porque permitirá que elevem seus lucros para 40.

Agora, suponhamos que a Empresa 1 faça uma interligação dos dois problemas de negociação e anuncie que participará do consórcio somente se a Empresa 2 concordar em produzir o produto A. Nesse caso, será realmente interessante para a Empresa 2 concordar em produzir o produto A (com a Empresa 1 produzindo o produto B) em troca de uma par-ticipação da Empresa 1 no consórcio. Esse exemplo ilustra de que forma um movimento estratégico pode ser utilizado na negociação e a razão pela qual a combinação dos temas em uma mesma negociação pode, às vezes, beneficiar um lado à custa de outro.

Outro exemplo pode ser a negociação do preço de uma casa. Vamos supor que eu, como potencial comprador, não esteja disposto a pagar mais do que US$ 200.000 por uma casa que na realidade tenha para mim um valor de US$ 250.000. O vendedor, em última análise, estará disposto a abrir mão da casa por qualquer quantia acima de US$ 180.000, porém gostaria de receber o mais alto valor possível. Se eu for o único interessado na casa, de que forma poderei fazer o vendedor pensar que abandonarei as negociações se tiver de pagar qualquer valor acima de US$ 200.000?

Posso declarar que jamais pagarei valor superior a US$ 200.000 pela casa. Mas tal pro-messa é digna de crédito? Pode ser, caso o vendedor conheça minha fama de durão e saiba que jamais quebrei uma promessa desse gênero. Mas suponhamos que eu não tenha tal reputação. Então, o vendedor saberá que tenho total estímulo para fazer a promessa (não custa nada prometer), mas pouco estímulo em mantê-la (provavelmente, esse será o único negócio que faremos um com o outro). Assim, essa promessa, por si só, dificilmente melho-rará minha posição na negociação.

TAbELA 13.13 Decisão de produção

Empresa 2Produz A Produz B

Empresa 1Produz A 40, 5 50, 50

Produz B 60, 40 5, 45

00 Pindyck.indb 504 28/11/13 20:13

Page 23: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

505CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

TAbELA 13.14 Decisão de participar do consórcio

Empresa 2Operar sozinha Participar do consórcio

Empresa 1Operar sozinha 10, 10 10, 20

Participar do consórcio 20, 10 40, 40

Entretanto, ela poderá funcionar se estiver associada a um movimento estratégico que lhe dê credibilidade. Tal movimento terá de reduzir minha flexibilidade, ou seja, limitar minhas opções, de tal forma que eu não tenha outra saída a não ser manter minha palavra. Um possí-vel movimento estratégico poderia ser uma aposta para valer feita com uma terceira pessoa, nos seguintes termos, por exemplo: “Se eu pagar mais do que US$ 200.000 por essa casa, darei US$ 60.000 a você”. Outra ideia: se eu estiver adquirindo a casa em nome de minha empresa, esta pode exigir aprovação da diretoria para qualquer valor acima de US$ 200.000 e informar que a próxima reunião da diretoria somente ocorrerá daqui a alguns meses. Nos dois casos, minha promessa se tornaria digna de crédito, pois eu teria eliminado a possibili-dade de quebrá-la. O resultado final seria menor flexibilidade e maior poder de negociação.12

12 Este exemplo baseia-se em parte nas informações de Pankaj Ghemawat, “Wal-Mart Store̕s Discount Operations”, Harvard Business School, 1986.

EXEMPLO 13.4 ESTRATÉGIA DE INVESTIMENTO PREEMPTIVO DA WAL-MART

A Wal-Mart Stores, Inc. é uma muitíssimo bem-sucedida cadeia de lojas de varejo e descontos fundada por Sam Walton em 1969.12 Seu sucesso não era nada comum nesse setor. Durante as décadas de 1960 e 1970, a rápida expansão das empre-sas já estabelecidas no setor, bem como a entrada de novas empresas, havia tornado o setor de varejo e descontos cada vez mais competitivo. Nas décadas de 1970 e 1980, os lucros do setor caíram e grandes cadeias de lojas — inclusive empresas gigantescas como King’s, Korvette’s, Mammoth Mart, W. T. Grant e Woolco — foram à falência. Entretanto, a Wal-Mart Stores manteve seu crescimento e se tornou ainda mais lucrativa. Ao final de 1985, Sam Walton já era considerado uma das pessoas mais ricas dos Estados Unidos.

Como será que a Wal-Mart se saiu bem no que outras empresas falharam? A resposta encontra-se na estratégia de ex-pansão da rede. Para poder cobrar menos do que as lojas de departamento comuns e do que os pequenos estabelecimentos de varejo, as grandes lojas de descontos fazem uma opção por tamanho, ausência de supérfluos e alto giro dos estoques. Durante a década de 1960, a sabedoria convencional informava que uma loja de descontos poderia obter sucesso apenas se estivesse localizada em cidades com população igual ou maior do que cem mil habitantes. Sam Walton discordou e decidiu abrir lojas de descontos em pequenas cidades do sudoeste dos Estados Unidos; em 1970, já havia 30 lojas Wal-Mart em pe-quenas cidades dos estados de Arkansas, Missouri e Oklahoma. As lojas tiveram sucesso porque a Wal-Mart conseguiu criar 30 “monopólios locais”. As lojas de descontos que tinham sido abertas nas cidades maiores competiam com outras lojas de descontos, o que resultou na redução dos preços e das margens de lucro. Entretanto, nas pequenas cidades só havia espaço para a operação de uma única loja. Nelas, a Wal-Mart podia vender por menos do que as lojas que não eram de descontos, mas não precisava se preocupar que outro estabelecimento pudesse ser aberto, passando a ser seu concorrente.

Em meados da década de 1970, outras lojas de descontos perceberam que a Wal-Mart possuía uma estratégia lucrativa: abrir o estabelecimento em uma pequena cidade que pudesse comportar apenas uma loja de descontos e desfrutar de um monopólio local. Há muitas pequenas cidades nos Estados Unidos e, portanto, a questão passou a ser quem conseguiria che-gar primeiro a cada cidade. A Wal-Mart então se encontrava em meio a uma rodada de jogo preemptivo do tipo ilustrado pela matriz de payoff da Tabela 13.15. Como pode ser visto na matriz, se a Wal-Mart se estabelecer em uma cidade e a Empresa X, não, a Wal-Mart lucrará 20 e a Empresa X, 0. De modo semelhante, se a Wal-Mart não se estabelecer na cidade e a Empresa X, sim, a Wal-Mart terá lucro 0 e a Empresa X, 20. Contudo, se ambas entrarem na cidade, cada uma estará perdendo 10.

Esse jogo possui dois equilíbrios de Nash: o canto inferior esquerdo e o canto superior direito. O equilíbrio resultante dependerá de quem faz o primeiro movimento. Se a Wal-Mart se mover primeiro, poderá entrar na cidade sabendo que a reação lógica da Empresa X será não entrar, de tal modo que poderá certamente lucrar 20. O truque está, portanto, em atuar

< NOTA ESCONDIDA

00 Pindyck.indb 505 28/11/13 20:13

Page 24: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA506

13.7 Desencorajamento à entradaAs barreiras à entrada, que constituem uma importante fonte de poder de monopólio

e de lucros, podem surgir naturalmente em alguns casos. Por exemplo, economias de es-cala, patentes e licenças ou o acesso a insumos essenciais podem criar barreiras à entrada. Entretanto, as próprias empresas podem, às vezes, desencorajar a entrada de potenciais concorrentes.

Para desencorajar a entrada de um concorrente, a empresa estabelecida deve ser ca-paz de convencer qualquer potencial concorrente de que sua entrada não será lucrativa. Para entender como isso acontece, coloque-se na posição de um monopolista estabelecido que se defronta com a provável entrada da Empresa X. Suponha que, para entrar no setor, a Empresa X tenha de investir US$ 80 milhões (de custos irreversíveis) na construção de uma fábrica. Você, é claro, gostaria de induzi-la a permanecer fora do setor. Se a Empresa X permanecer fora, você pode continuar a cobrar um preço alto e a desfrutar dos benefícios do monopólio. Como mostra o canto superior direito da matriz de payoff da Tabela 13.16(a), você obteria lucros de US$ 200 milhões.

TAbELA 13.16 (a) Possibilidades de entrada

Entrante potencialEntra Não entra

Empresa estabelecida

Preço alto (acomodação) 100, 20 200, 0

Preço baixo (guerra) 70, –10 130, 0

Se a Empresa X entrar no mercado, você terá de tomar uma decisão. Ou seja, pode “se acomodar”, mantendo um preço alto e esperando que a Empresa X faça o mesmo. Desse modo, obterá lucros de apenas US$ 100 milhões, porque terá de dividir o mercado. A nova Empresa X obterá um lucro líquido de US$ 20 milhões: US$ 100 milhões menos o custo de US$ 80 milhões da construção de uma fábrica. (Esse resultado encontra-se no canto superior esquerdo da matriz de payoff.) Como alternativa, você pode aumentar a capacidade produtiva, produzir mais e baixar os preços. Preços mais baixos lhe darão uma fatia maior

Na Seção 7.1 explicamos que um custo irreversível é um gasto que foi reali-zado e que não pode ser recuperado.

preemptivamente, isto é, abrir rapidamente lojas em outras pequenas cidades antes que a Empresa X (ou a Empresa Y ou a Z ) possa fazê-lo. Isso é exatamente o que a Wal-Mart fez. Em 1986, a rede já possuía 1.009 lojas em operação e obtinha lucros anuais de US$ 450 milhões. Enquanto as demais lojas de descontos afundavam, a Wal-Mart continuava a crescer. Em 1999, a Wal-Mart tornou-se a maior varejista do mundo, com 2.454 lojas nos Estados Unidos e outras 729 no resto do mundo, com um faturamento anual de US$ 138 bilhões.

Nos últimos anos, a Wal-Mart tem continuado a se antecipar a outros varejistas abrindo, no mundo todo, novas lojas de descontos, clubes de compras (tais como o Sam’s Club) e lojas que combinam o perfil de descontos com supermercado (os Supercentros Wal-Mart). A empresa é especialmente agressiva na aplicação de sua estratégia preemptiva em outros países. Em 2010, a Wal-Mart tinha cerca de 4.413 lojas nos Estados Unidos e outras 4.557 espalhadas pela Europa, América Latina e Ásia. A rede também se tornou o maior empregador privado do mundo, com cerca de 2,1 milhões de funcionários ao redor do mundo.

TAbELA 13.15 O jogo preemptivo das lojas de desconto

Empresa XEntra na cidade Não entra na cidade

Wal-MartEntra na cidade –10, –10 20, 0

Não entra na cidade 0, 20 0, 0

00 Pindyck.indb 506 28/11/13 20:13

Page 25: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

507CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

do mercado e um aumento de receita de US$ 20 milhões. Entretanto, o aumento da capaci-dade de produção custará US$ 50 milhões, reduzindo seus lucros líquidos para US$ 70 mi-lhões. Como a guerra de preços vai também reduzir a receita da empresa entrante em US$ 30 milhões, ela terá uma perda 1íquida de US$ 10 milhões. (Esse resultado é mostrado no canto inferior esquerdo da matriz de payoff.) Por fim, se a Empresa X ficar de fora, mas você expandir a capacidade e baixar os preços, o lucro 1íquido cairá em US$ 70 milhões (de US$ 200 para US$ 130 milhões): o custo de US$ 50 milhões da capacidade extra e a redução de US$ 20 milhões na receita em razão do preço mais baixo sem aumento da fatia de mercado. Obviamente, tal escolha, mostrada no canto inferior direito da matriz, não faria sentido.

Se a Empresa X acreditar que você está propenso a uma acomodação, mantendo o preço alto após sua entrada, concluirá que a entrada pode ser lucrativa e entrará. Suponhamos que você ameace expandir a produção e esteja disposto a iniciar uma guerra de preços para manter a Empresa X afastada. Se ela acreditar em sua ameaça, não entrará no mercado, porque esperaria ter um prejuízo de US$ 10 milhões. Tal ameaça, entretanto, não é crível. Como podemos ver na Tabela 13.16(a) (e como também é do conhecimento do potencial concorrente), uma vez que a entrada já tenha ocorrido, você estará propenso a uma aco-modação, mantendo o preço alto. A Empresa X sabe disso e seu movimento racional será entrar no mercado; esse resultado aparece no canto superior esquerdo da matriz de payoff.

Mas e se você puder assumir um compromisso irrevogável que modificará seu compor-tamento caso a entrada ocorra — um compromisso que não lhe dará outra escolha a não ser cobrar o preço baixo após a entrada? Em particular, suponhamos que você investisse US$ 50 milhões agora, e não mais tarde, em capacidade produtiva extra necessária para iniciar uma competição agressiva caso ocorra a entrada do concorrente. Certamente, mesmo que você, depois, mantivesse um preço alto (com ou sem a entrada da Empresa X), esse custo adicional reduziria seus lucros.

Sendo assim, teremos uma nova matriz de payoff, como mostra a Tabela 13.16(b). Como resultado de sua decisão de investir em capacidade adicional, sua ameaça de se engajar em uma guerra de preços passa a ser totalmente digna de crédito. Pelo fato de você já possuir capacidade adicional, estará mais bem posicionado para isso do que estaria se mantivesse um preço alto. Como o concorrente em potencial agora sabe que sua entrada resultará em guerra, é racional que ele permaneça fora do mercado. Portanto, ao desencorajar a entrada, você poderá manter o preço alto e estará auferindo lucros de US$ 150 milhões.

TAbELA 13.16 (b) Desencorajamento à entrada

Entrante potencialEntra Não entra

Empresa estabelecida

Preço alto (acomodação) 50, 20 150, 0

Preço baixo (guerra) 70, –10 130, 0

Um monopolista estabelecido conseguiria desencorajar a entrada sem ter de fazer o dispendioso movimento estratégico de instalar capacidade produtiva adicional? Dissemos antes que a reputação de irracionalidade poderia proporcionar uma vantagem estratégica. Suponhamos que a empresa estabelecida tenha tal tipo de reputação. Suponhamos também que, no passado, por meio da prática de sucessivas reduções de preço, essa empresa tenha conseguido desencorajar todas as novas empresas em potencial, mesmo tendo sofrido pre-juízos em decorrência de tais ações. Então, sua ameaça poderia ser crível. Nesse caso, a irracionalidade da empresa estabelecida no mercado sugere ao potencial concorrente que talvez seja melhor ficar de fora.

É claro que se o jogo descrito tivesse de ser indefinidamente repetido, a empresa esta-belecida poderia ter um estímulo racional para travar uma guerra de preços sempre que uma entrada realmente ocorresse. Por quê? Porque as perdas no curto prazo decorrentes de

00 Pindyck.indb 507 28/11/13 20:13

Page 26: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA508

uma guerra de preços poderiam ser contrabalançadas pelos ganhos de longo prazo gerados pelo fato de a entrada ter sido impedida. Compreendendo isso, o potencial concorrente, ao examinar as possibilidades, poderá chegar à conclusão de que a ameaça da empresa estabe-lecida merece crédito e, dessa forma, decidirá permanecer de fora. Agora, a empresa esta-belecida conta com a reputação de ser empresa racional — e de ter visão de longo prazo —, o que lhe dá a credibilidade necessária para desencorajar as tentativas de entrada. O su-cesso da estratégia depende da perspectiva de tempo e dos ganhos e perdas relativos, que estarão, respectivamente, associados à acomodação e à guerra.

Já vimos que a atratividade da entrada dependerá muito da forma pela qual se espera que as empresas estabelecidas reajam. Em geral, uma vez que a entrada tenha ocorrido, não se pode esperar que as empresas estabelecidas mantenham a produção no nível pré-entrada. Elas poderão recuar e reduzir os níveis de produção, elevando assim o preço até um novo nível capaz de maximizar o lucro conjunto. Como os potenciais concorrentes sabem disso, as empresas estabelecidas deverão criar uma ameaça digna de crédito; uma reputação de irracionalidade poderia ajudar. De fato, isso parece constituir a base de grande parte do comportamento para desencorajar a entrada que tem ocorrido nos mercados atuais. A nova empresa em potencial deverá considerar que a disciplina racional do setor pode ser inter-rompida após sua entrada. Ao promover uma imagem de irracionalidade e agressividade, uma empresa estabelecida em um mercado pode convencer os potenciais concorrentes de que o risco de guerra é muito alto.13

Política de comércio estratégico e concorrência internacionalJá vimos de que forma um investimento preemptivo pode dar vantagem a uma empresa

ao possibilitar que seja feita uma ameaça digna de crédito a potenciais concorrentes. Em al-gumas situações, um investimento preemptivo — subsidiado ou estimulado de outra forma pelo governo — pode dar a um país uma vantagem nos mercados internacionais e pode se tornar então um importante instrumento de política comercial.

Esse conceito seria conflitante com aquilo que você aprendeu sobre os benefícios do livre comércio? Por exemplo, no Capítulo 9 vimos de que forma as restrições de comércio, tais como tarifas, geravam peso morto. No Capítulo 16, iremos mais adiante e mostraremos de que forma, em geral, o livre comércio entre as pessoas (ou entre as nações) pode ser mutuamente benéfico. Considerando-se as vantagens do livre comércio, de que maneira uma intervenção do governo pode ser justificada no comércio internacional? Uma nova literatura sobre teoria de comércio internacional sugere que, em determinadas situações, uma nação poderá ser beneficiada ao adotar políticas que dão a seus setores domésticos vantagens competitivas.

Para compreendermos como isso poderia ocorrer, consideremos um setor caracteri-zado por substanciais economias de escala — um setor em que poucas empresas de grande porte consigam produzir muito mais eficientemente do que várias pequenas empresas. Suponhamos que, ao conceder subsídios ou isenções fiscais, o governo consiga estimu-lar empresas nacionais a se expandir mais rapidamente. Essa medida poderia evitar que empresas de outros países entrassem no mercado mundial, de tal forma que a indústria nacional desfrutaria de preços mais altos e vendas mais elevadas. Tal política funciona

13 Há aqui uma analogia com a dissuasão nuclear. Consideremos o emprego da ameaça nuclear como forma de impedir a antiga União Soviética de invadir a Europa Ocidental durante a Guerra Fria. Se ela invadisse, será que os Estados Unidos reagiriam mesmo de imediato com armas nucleares, sabendo que os soviéticos respon-deriam da mesma forma? Não seria racional que os Estados Unidos reagissem desse modo e, em consequência, a ameaça nuclear poderia não merecer crédito. No entanto, isso denota que todos são racionais; haveria, en-tretanto, uma razão para temer uma resposta irracional dos Estados Unidos. Uma resposta irracional, mesmo que vista como altamente improvável, poderia desencorajar um ataque em face do alto preço de um eventual erro. Os Estados Unidos poderiam ser beneficiados ao promover a ideia de que haveria a possibilidade de uma reação irracional ou de que as coisas poderiam fugir ao controle caso uma invasão ocorresse. Essa é a “raciona-lidade da irracionalidade”. Veja Thomas Schelling, The Strategy of Conflict. Harvard University Press, 1980.

00 Pindyck.indb 508 28/11/13 20:13

Page 27: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

509CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

ao possibilitar que sejam criadas ameaças críveis para os potenciais ingressantes. As em-presas nacionais de grande porte, beneficiando-se de suas economias de escala, poderiam estar aptas a satisfazer a demanda mundial a um baixo preço, de tal maneira que, se outras empresas entrassem, seu preço poderia ser reduzido a um nível inferior àquele que seria necessário para que tais empresas conseguissem gerar lucros.O MERCADO DE AEROnAVES COMERCIAIS Como um exemplo, consideremos o mercado internacional de aeronaves comerciais. O desenvolvimento e a produção de uma nova linha de aeronaves estão sujeitos a substanciais economias de escala; não valeria a pena construir um novo avião a menos que se estivesse esperando vender muitos deles. Suponhamos que a Boeing e a Airbus (um consórcio europeu que inclui a França, a Alemanha, a Inglaterra e a Espanha) estejam, cada uma, dispostas a desenvolver uma nova aeronave. O lucro final de cada empresa depende em parte do que fizer a outra empresa. Suponhamos que seja econô-mico apenas uma empresa produzir a nova aeronave. Então, os lucros podem se assemelhar aos apresentados na Tabela 13.17(a).14

TAbELA 13.17 (a) O desenvolvimento de uma nova aeronave

AirbusProduz Não produz

BoeingProduz –10, –10 100, 0

Não produz 0, 100 0, 0

Se a Boeing iniciar antes o desenvolvimento, o jogo terá o resultado contido no canto superior direito da matriz de payoff. A Boeing produzirá uma nova aeronave e a Airbus, ao descobrir que perderá dinheiro caso faça o mesmo, não o fará. A Boeing então pode auferir um lucro de 100.

Decerto, os governos europeus prefeririam que a Airbus produzisse a nova aeronave. Será que eles poderiam alterar o resultado desse jogo? Suponhamos que assumam o compro-misso de subsidiar a Airbus antes que a Boeing se comprometa a produzir a nova aeronave. Se os governos europeus se comprometerem a destinar um subsídio de 20 para a Airbus caso ela venha a produzir a aeronave independentemente do que a Boeing faça, a matriz de payoff será modificada e passará a ser aquela apresentada na Tabela 13.17(b).

TAbELA 13.17 (b) O desenvolvimento da nova aeronave após o subsídio

AirbusProduz Não produz

BoeingProduz –10, 10 100, 0

Não produz 0, 120 0, 0

Agora a Airbus pode ter lucros com a nova aeronave independentemente da decisão de produção tomada pela Boeing. Esta está consciente de que, mesmo assumindo o compro-misso de produzir o novo avião, a Airbus também vai produzi-lo, e ela, a Boeing, perderá dinheiro. Então, a Boeing optará por não produzir, e o resultado será aquele do canto infe-rior esquerdo da Tabela 13.17(b). Um subsídio de 20, então, modifica o resultado em que a Airbus não produz e lucra zero para um resultado no qual ela produz e lucra 120. Desses lucros, 100 correspondem a uma transferência de lucros dos Estados Unidos para a Europa. Do ponto de vista europeu, o subsídio à Airbus traz um alto retorno.

14 Exemplo extraído de Paul R. Krugman, “Is Free Trade Passé?”, Journal of Economic Perspectives 1, 1987, p. 131-144.

00 Pindyck.indb 509 28/11/13 20:13

Page 28: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA510

Os governos europeus assumiram de fato o compromisso de subsidiar a Airbus e, durante a década de 1980, a empresa teve sucesso no lançamento de diversas aeronaves. Entretanto, o resultado não foi exatamente aquele apresentado em nosso exemplo estilizado. A Boeing também lançou novos aviões (os modelos 757 e 767), todos bastante lucrativos. À medida que o tráfego aéreo comercial cresceu, tornou-se claro que ambas as empresas poderiam ter lucros no desenvolvimento e na venda de novas aeronaves. Todavia, a fatia de mercado da Boeing teria sido muito maior sem os subsídios europeus concedidos à Airbus. Um estudo apresentou uma estimativa de que tais subsídios totalizaram US$ 25,9 bilhões durante a dé-cada de 1980 e revelou que a Airbus não poderia ter entrado no mercado sem eles.15

Esse exemplo mostra de que forma a política de comércio estratégico pode transferir lu-cros de um país para outro. Mas é preciso ter em mente que um país que utiliza tal política pode provocar retaliação por parte de seus parceiros comerciais. Se uma guerra comercial acontecer, todos os países envolvidos poderão terminar piores ainda. A possibilidade de que tal resultado ocorra deverá ser considerada antes que uma nação tome uma decisão relativa à política de comércio estratégico.16

15 “Aid to Airbus Called Unfair in U.S. Study”, New York Times, 8 set. 1990.16 Este exemplo é baseado em Pankaj Ghemawat, “Capacity Expansion in the Titanium Dioxide Industry”,

Journal of Industrial Economics 33, dez. 1984, p. 145-163; e P. Ghemawat, “DuPont in Titanium Dioxide”, Harvard Business School, Case No. 9-385-140, jun. 1986.

EXEMPLO 13.5 A DUPONT DESENCORAJA A ENTRADA NA INDÚSTRIA DE DIÓXIDO DE TITÂNIO

O dióxido de titânio é um pigmento branco utilizado em tintas, papel e outros produtos. No início da década de 1970, a DuPont e a National Lead possuíam, cada uma, cerca de um terço das vendas de dióxido de titânio nos Estados Unidos, e outras sete empresas produziam o restante. Em 1972, a DuPont considerava a possibilidade de expandir sua capacidade. O setor estava sofrendo modificações e, por meio de uma estratégia correta, tais modificações poderiam tornar a DuPont capaz de obter uma fatia adicional do mercado e passar a dominar esse setor industrial.16

Três fatores tinham de ser levados em conta. Primeiro, embora a demanda futura para o dióxido de titânio fosse incerta, era esperado que viesse a apresentar um crescimento substancial. Segundo, o governo havia anunciado que novas regula-mentações ambientais seriam implementadas. Por último, os preços das matérias-primas utilizadas na produção do dióxido de titânio estavam aumentando. As novas regulamentações e os preços mais elevados teriam um significativo impacto sobre os custos de produção e possibilitariam que a DuPont passasse a ter uma vantagem de custo, tanto pelo fato de sua tecno-logia de produção ser menos sensível às variações nos preços das matérias-primas como pelo fato de suas fábricas estarem instaladas em locais que tornavam o despejo dos efluentes corrosivos muito menos problemático do que para as concorren-tes. Devido às alterações nos custos, a DuPont previu que a National Lead e alguns dos outros produtores teriam que deixar de utilizar parte de suas capacidades produtivas. As empresas concorrentes da DuPont, na realidade, teriam de “reentrar” no mercado por meio da construção de novas fábricas. Será que a DuPont conseguiria desencorajá-las a fazer isso?

A DuPont considerou a possibilidade de empregar a seguinte estratégia: investir cerca de US$ 400 milhões em aumento da capacidade produtiva para tentar obter 64% do mercado até 1985. A nova capacidade produtiva seria muito maior do que a realmente necessária. A ideia era desencorajar os investimentos das concorrentes. As economias de escala e o movimento ao longo da curva de aprendizagem possibilitariam que a DuPont tivesse uma vantagem de custos. Isso não só tornaria mais difícil a concorrência para as demais empresas, como tornaria merecedora de crédito a ameaça implícita de que no futuro a DuPont poderia iniciar uma guerra de preços, em vez de se acomodar.

Essa estratégia fazia sentido e pareceu funcionar por alguns anos. Entretanto, em 1975, as coisas começaram a ficar difíceis. Primeiro, porque a demanda aumentou muito menos do que o esperado; havia excesso de capacidade por todo o setor. Segundo, pelo fato de as regulamentações ambientais terem sido impostas suavemente, os concorrentes da DuPont não precisaram fechar suas instalações produtivas, conforme se esperava. Por fim, a estratégia da empresa resultou em um processo movido pelo Federal Trade Commission, em 1978, contra a DuPont com base na legislação antitruste. O FTC alegou que a DuPont estava tentando monopolizar o mercado. A DuPont ganhou a causa, mas o declínio da demanda tornou a vitória discutível.

NOTA ESCONDIDA >

00 Pindyck.indb 510 28/11/13 20:13

Page 29: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

511CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

1718

17 A Procter & Gamble produz as fraldas Pampers, Ultra Pampers e Luvs. A Kimberly-Clark produz somente uma grande marca, a Huggies.

18 O Exemplo 15.4 do Capítulo 15 examina com mais detalhes a lucratividade do investimento de capital por uma empresa entrante no mercado de fraldas descartáveis.

EXEMPLO 13.6 BATALHAS DAS FRALDAS DESCARTÁVEIS

Há mais de uma década, o setor de fraldas descartáveis nos Estados Unidos é dominado por duas empresas: a Procter & Gamble, com cerca de 50% de participação no mercado, e a Kimberly-Clark, com 30% a 40%.17 De que forma essas duas empresas concorrem? Por que outras empresas não têm conseguido entrar e obter uma fatia significativa desse mercado de US$ 5 bilhões por ano?

Embora haja apenas duas grandes empresas no mercado, a concorrência tem sido intensa. Essa concorrência é feita prin-cipalmente em termos de inovações redutoras de custos. A chave para o sucesso é aperfeiçoar o processo de produção, de tal forma que a empresa possa fabricar grandes quantidades de fraldas com baixo custo. Isso não é tão simples como pode parecer. Para forrar a felpa de celulose, acrescentar um material elástico para o ajuste e fechar, dobrar e embalar as fraldas — ao ritmo de mais ou menos 3.000 fraldas por minuto e ao custo de cerca de US$ 0,10 por unidade — é necessário um processo inovador, cuidadosamente planejado e ajustado com precisão. Além disso, pequenos avanços tecnológicos no processo produtivo podem resultar em significativa vantagem competitiva. Se uma empresa puder minimizar os custos de produção, mesmo que apenas ligeiramente, ela conseguirá reduzir o preço e obter uma fatia maior do mercado. Em consequência, ambas as empresas se veem forçadas a despender muito com pesquisa e desenvolvimento (P&D) em uma corrida para reduzir custos.

A matriz de payoff da Tabela 13.18 ilustra tal fato. Se as duas empresas investirem agressivamente em P&D, elas podem esperar manter suas atuais fatias de mercado. A P&G então lucrará 40 e a Kimberly-Clark (com uma fatia menor do mercado) lucrará 20. Se nenhuma delas investir em P&D, os custos e preços permanecerão constantes e o dinheiro gasto em P&D se tornará parte dos lucros. Os lucros da P&G aumentarão para 60 e os da Kimberly, para 40. Entretanto, se uma das duas continuar investindo em P&D e a outra não, a empresa inovadora acabará obtendo a maior parte da fatia do concorrente. Por exemplo, se a Kimberly investir em P&D, mas a P&G não, a P&G terá prejuízos de 20, enquanto o lucro da Kimberly aumentará para 60. Portanto, as duas empresas estão em um dilema dos prisioneiros: o investimento em P&D é uma estratégia dominante para ambas.

TAbELA 13.18 Concorrendo por meio de pesquisa e desenvolvimento (P&D)

Kimberly-ClarkCom P&D Sem P&D

P&GCom P&D 40, 20 80, –20Sem P&D –20, 60 60, 40

Por que não se desenvolveu um comportamento cooperativo entre as duas empresas? Afinal, elas concorrem nesse mercado há anos e a demanda por fraldas é relativamente estável. Por diversos motivos, o dilema dos prisioneiros que envolve P&D é particularmente difícil de ser resolvido. Primeiro, é complicado para uma empresa monitorar as atividades de P&D do concor-rente, da mesma forma que monitorar os preços. Segundo, podem ser necessários vários anos para que seja completado um programa de P&D capaz de resultar em significativos melhoramentos no produto. Em consequência, torna-se menos provável que funcionem as estratégias “olho por olho, dente por dente”, nas quais ambas as empresas colaboram até que uma delas “trapaceie”. Uma empresa pode descobrir que o concorrente está investindo secretamente em P&D apenas quando ela anuncia o lançamento de um produto novo e melhor. Então, pode ser muito tarde para implementar um programa próprio de P&D.

Os investimentos em P&D feitos pela P&G e pela Kimberly-Clark também servem para desencorajar a entrada de novos concorrentes. Além do reconhecimento das marcas, as duas empresas puderam acumular tanto know-how tecnológico e competência no processo produtivo que elas teriam substancial vantagem de custo sobre qualquer empresa que estivesse entrando nesse mercado. Além de ter de construir novas fábricas, uma empresa nova precisaria investir uma considerável soma em P&D, mesmo que fosse para obter uma pequena fatia desse mercado. Depois de ter iniciado a produção, a nova empresa teria de continuar investindo pesadamente em P&D para reduzir os custos ao longo do tempo. Uma entrada poderia ser lucrativa apenas se a P&G e a Kimberly-Clark parassem de investir em P&D, de tal modo que a nova empresa tivesse a possibilidade de alcançar e, um dia, conseguir uma vantagem de custo. Mas, como pudemos ver, nenhuma empresa racional esperaria que isso viesse a ocorrer.18

< NOTA ESCONDIDA

00 Pindyck.indb 511 28/11/13 20:13

Page 30: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA512

*13.8 LeilõesNesta seção, examinaremos os mercados de leilões, ou seja, mercados em que os produ-

tos são vendidos e comprados por meio de processos formais de lances.19 Há leilões de todos os tamanhos e formas. Eles costumam ser utilizados para produtos diferenciados, especial-mente relativos a arte, antiguidades e direitos de extração de petróleo em uma região. Nos úl-timos anos, por exemplo, o Tesouro norte-americano promoveu leilões para vender Títulos do Tesouro, a Comissão Federal de Comunicações (Federal Communications Commission) dos EUA utilizou-os para a venda de faixas do espectro eletromagnético para serviços de telefo-nia celular, o Comitê Olímpico Internacional leiloou direitos televisivos e o Departamento de Defesa dos Estados Unidos também os empregou para adquirir equipamento militar. Esses leilões apresentam importantes vantagens: consomem menos tempo que a negociação indivi-dual e incentivam a competição entre os compradores, aumentando a receita de quem vende.

Por que os leilões se tornaram tão populares e bem-sucedidos? O baixo custo da transa-ção é apenas parte da resposta. Ao contrário das vendas em lojas de varejo, os leilões são inerentemente interativos, com muitos compradores competindo para obter um artigo de interesse. Essa interação pode ser de especial valia para a venda de artigos tais como obras de arte e itens esportivos de colecionador que sejam peças únicas e, assim, não tenham valor de mercado estabelecido. Também pode ser útil para vender artigos que não sejam únicos, mas cujo valor flutue ao longo do tempo.

Um exemplo é o leilão diário de atum fresco no mercado de peixes de Tóquio.20 Cada animal é único em termos de tamanho, forma, qualidade e, em consequência, valor. Se a cada transação fossem necessárias várias rodadas de pechincha e negociação com os compradores potenciais, o processo levaria muito tempo. Em vez disso, as vendas ocorrem toda manhã por meio de um leilão, no qual cada atum é vendido a quem oferece o maior lance. Essa prática propicia grandes economias em custos de transação e, assim, aumenta a eficiência do mercado.

O formato de um leilão, que envolve a escolha das regras sob as quais ele opera, afeta consideravelmente seu resultado. O vendedor em geral deseja um tipo de leilão que maximize a receita da venda do produto. Por outro lado, o comprador, pesquisando ofertas de um grupo de potenciais vendedores, prefere um leilão que minimize os custos esperados do produto.

Tipos de leilãoVeremos que a escolha do tipo de leilão pode afetar a receita do vendedor. Há diversos

tipos normalmente utilizados:

1. Leilão inglês (ou oral): o vendedor solicita ativamente lances mais altos de um grupo de potenciais compradores. Em cada etapa, todos os participantes sabem qual é o lance mais alto. O leilão termina quando ninguém oferece um valor maior. Então, o item é vendido ao participante que ofereceu o lance mais alto.

2. Leilão holandês: o vendedor começa oferecendo o item a um preço relativamente alto. Caso nenhum comprador potencial concorde com o valor, o vendedor o re-duz em montantes fixos. O primeiro participante que aceitar o preço oferecido pode comprar o item por essa quantia.

3. Leilão de lances fechados: todos os lances são feitos simultaneamente em enve-lopes lacrados e o vencedor é aquele que oferece o maior valor de lance. No en-tanto, o preço pago pelo vencedor pode variar dependendo das regras do leilão. Em um leilão de primeiro preço, o valor de venda é equivalente ao lance mais alto. Em um leilão de segundo preço, o valor de venda equivale ao segundo lance mais alto.

19 Há uma vasta literatura a respeito de leilões. Veja, por exemplo, Paul Milgrom, “Auctions and Bidding: A Primer”, Journal of Economic Perspectives, 1989, p. 3-22; Avinash Dixit e Susan Skeath, Games of Strategy, 2. ed. Nova York: Norton, 2004; e Preston McAfee, Competitive Solutions: The Strategist’s Toolkit. Princeton University Press, 2002, Capítulo 12.

20 John McMillian, Reinventing the Bazaar: A Natural History of Markets. Nova York: Norton, 2002.

mercados de leilões

Mercados em que os produ-tos são comprados e vendi-dos por meio de processos formais de lances.

leilão inglês (ou oral)

Leilão em que o vendedor solicita ativamente lances mais altos de um grupo de potenciais compradores.

leilão holandês

Leilão em que um vendedor inicia oferecendo o item a um preço relativamente alto que depois é reduzido em montantes fixos até que ocorra a venda.

leilão de lances fechados

Leilão em que todos os lances são feitos simultane-amente em envelopes lacra-dos e o vencedor é aquele que oferece maior valor.

leilão de primeiro preço

Leilão em que o preço de venda é igual ao lance mais alto.

leilão de segundo preço

Leilão em que o preço de venda é igual ao segundo lance mais alto.

00 Pindyck.indb 512 28/11/13 20:13

Page 31: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

513CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

Avaliação e informaçãoImagine que você deseja vender um produto valioso e distinto como uma pintura ou uma

moeda rara. Que tipo de leilão é melhor para você? A resposta depende das preferências dos possíveis compradores e das informações disponíveis para eles. Consideremos dois casos:

1. Em leilões de valor privado, cada comprador sabe qual é sua avaliação individual ou preço de reserva e as avaliações variam de um comprador para outro. Além disso, um não sabe qual valor foi estabelecido pelo outro. Por exemplo: posso ofere-cer um preço alto por uma bola de beisebol autografada por um jogador famoso sem saber que você ofereceu um valor bem menor por ela.

2. Em leilões de valor comum, todos os compradores atribuem aproximadamente o mesmo valor ao item a ser leiloado. No entanto, eles não sabem com precisão qual é esse valor — podem fazer no máximo estimativas, as quais variarão entre si. Por exemplo, em um leilão de uma reserva marítima de petróleo, o valor da reserva é o preço do petróleo menos o custo da extração vezes a quantidade de petróleo na reserva. Por conseguinte, o valor deveria ser o mesmo para todos os potenciais compradores. No entanto, estes não sabem qual a quantidade real de petróleo ou o custo de extração exato; terão de fazer estimativas. Como estas devem variar, eles oferecerão diferentes valores para obter a reserva.

Na prática, os leilões podem ter elementos tanto de valor privado quanto de valor co-mum. Em um leilão de reservas petrolíferas, por exemplo, pode haver elementos de valor privado porque reservas diferentes podem implicar diferentes custos de extração. No en-tanto, para simplificar o assunto, vamos distinguir os dois tipos. Iniciaremos nossa discus-são com leilões de valor privado e passaremos depois aos de valor comum.

Leilões de valor privadoEm leilões de valor privado, os compradores têm preços de reserva diferentes para

o item oferecido. Suponhamos, por exemplo, que no leilão de uma bola de beisebol autografada por um famoso jogador os preços de reserva individual variem de US$ 1 (alguém que não goste de beisebol, mas que esteja fazendo lances por diversão) a US$ 600 (um fã incondicional). É claro que, se você estiver fazendo lances pela bola, você não saberá com quantas pessoas está competindo e quais são os lances delas.

Qualquer que seja o tipo do leilão, cada comprador deve ter uma estratégia. Em um leilão inglês, a estratégia é a escolha do valor em que se deixará de oferecer lances. Em um leilão holandês, a estratégia é esperar o preço alcançar o nível que os indiví-duos consideram adequado para fazer o único lance. Em um leilão de lances fechados, a estratégia é a escolha do lance a ser colocado no envelope.

Quais são os payoffs nesse jogo de lances? O payoff do vencedor é a diferença entre o preço de reserva e o preço pago; o de perda é zero. Dados esses payoffs, examinemos as estratégias e os resultados para diferentes tipos de leilões.

Começaremos mostrando que os leilões orais ingleses e os de segundo maior preço por envelope fechado geram resultados aproximadamente iguais. Analisemos o leilão de segundo maior preço por envelopes fechados. Nesse caso, oferecer lances honestos é uma estratégia dominante — não há vantagem em dar um lance abaixo do preço de reserva. Por qual razão? Porque o preço que se paga baseia-se na avaliação do segundo maior lance, e não em sua própria avaliação. Suponhamos que seu preço de reserva seja US$ 100. Se você fizer um lance abaixo de seu preço de reserva (digamos, US$ 80), você se arrisca a perder para o segundo maior arrematador, que oferece US$ 85, e se você vencer (a, digamos, US$ 87), teria um payoff positivo. Caso ofereça um lance acima de seu preço de reserva (digamos que de US$ 105), você se arrisca a vencer, mas recebendo um payoff negativo.

leilões de valor privado

Leilões em que cada poten-cial comprador sabe qual é sua avaliação individual do objeto leiloado e as avaliações diferem de um comprador para outro.

leilões de valor comum

Leilões em que o item a ser leiloado tem o mesmo valor para todos os potenciais compradores, mas estes não sabem exatamente qual é o valor e, por isso, suas estimativas variam.

Lembrando o que foi mencionado na Seção 11.2, o preço de reserva é o valor máximo em dinheiro que alguém estaria disposto a pagar por um produto.

00 Pindyck.indb 513 28/11/13 20:13

Page 32: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA514

De maneira semelhante, em um leilão inglês a estratégia dominante é continuar ofe-recendo lances até que a segunda pessoa não esteja mais disposta a fazer um lance. Nesse momento, o lance vencedor será mais ou menos igual ao preço de reserva dessa segunda pessoa. Em qualquer caso, você deve parar de dar lances quando eles atingirem o seu preço de reserva. Por quê? Caso deixe de oferecer lances em um ponto abaixo de seu preço de reserva, você se arriscará a perder um payoff positivo. Se continuar além de seu preço de reserva, estará garantindo um payoff negativo. Qual valor os lances atingirão? Continuarão até que o lance vencedor seja mais ou menos igual ao preço de re-serva do comprador com o segundo lance mais alto. Da mesma forma, no leilão de lance fechado, o lance vencedor será igual ao preço de reserva do comprador com o segundo maior lance. Nesse caso, ambos os tipos de leilão geram resultados aproximadamente idênticos (variam, em teoria, em um ou dois dólares). A título de ilustração, suponha-mos que haja três compradores potenciais, os quais atribuem ao bem o valor de US$ 50, US$ 40 e US$ 30, respectivamente, e que tanto o vendedor quanto os três compradores tenham informações completas sobre essa valoração. Em um leilão inglês, se sua avalia-ção do bem fosse US$ 50, você ofereceria um lance vencedor de US$ 40,01 para ganhar na disputa contra a pessoa cujo preço de reserva era de US$ 40,00. Você poderia dar um lance idêntico em um leilão de lances fechados.

Mesmo em um universo de informações incompletas, podemos esperar resultados se-melhantes. Na verdade, o vendedor sabe que não há diferença entre um leilão oral inglês e um leilão de lances fechados de segundo preço, pois os compradores têm valores priva-dos em ambos os casos. Suponhamos que você esteja planejando vender um item em um leilão fechado. O que escolheria: o de primeiro ou de segundo preço? Pode-se imaginar que o leilão de primeiro preço seja melhor porque o preço é definido pelo lance mais alto, e não pelo segundo preço. No entanto, os compradores sabem disso e consequentemente alterarão suas estratégias: oferecerão menos em antecipação ao pagamento do lance ven-cedor caso obtenham sucesso.

O leilão de segundo preço gera receita igual à do segundo maior preço de reserva. No entanto, as implicações relativas à receita de um leilão fechado de primeiro preço para o vendedor são mais complicadas pelo fato de a estratégia ótima dos compradores ser mais complexa. A melhor estratégia é escolher um lance que deverá ser igual ou estar um pouco acima do preço de reserva do indivíduo com o segundo maior preço de reserva.21 Por quê? O vencedor terá de pagar seu lance, e não compensa pagar mais do que o segundo maior preço de reserva. Vemos, então, que os leilões de primeiro preço e de segundo maior preço por envelope fechado geram a mesma receita esperada.

Leilões de valor comumSuponhamos que você e outras quatro pessoas estejam participando de um leilão oral

para comprar um pote de moedas, que irá para o vencedor a um preço igual ao lance mais alto. Cada potencial comprador pode examinar o pote, mas não pode abri-lo para contar as moedas. Depois de estimar o número de moedas no pote, qual será sua decisão de lances mais favorável? Trata-se de um clássico leilão de valor comum, pois o pote tem o mesmo valor para todos os potenciais compradores. O problema para você e para os demais com-pradores é o fato desse valor ser desconhecido.

Você pode ficar tentado a fazer como muitos novatos nesse caso: oferecer um lance até o valor de sua estimativa de número de moedas, não mais. Mas essa não seria a melhor es-tratégia. Lembre-se de que nem você nem os outros compradores sabem o número exato de moedas. Todos fizeram estimativas independentes que estão sujeitas a erro — algumas serão muito altas e outras muito baixas. Quem, então, terá o lance vencedor? Se cada comprador

21 Para ser mais exato, a melhor estratégia é escolher um lance que você acredita que será igual ou li-geiramente superior ao segundo preço de reserva esperado mais alto considerando que seu valor de reserva é o mais alto.

00 Pindyck.indb 514 28/11/13 20:13

Page 33: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

515CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

oferecer um lance no limite de sua estimativa, o lance vencedor provavelmente será o da pes-soa com o maior erro positivo, ou seja, aquela que mais superestimou o número de moedas.A MALDIÇÃO DO VEnCEDOR Para verificarmos essa possibilidade, suponhamos que haja 620 moedas (de US$ 0,01) dentro do pote e que os arrematadores tenham estimado 540, 590, 615, 650 e 690. Suponhamos também que sua estimativa tenha sido de 690 e que você tenha sido o vencedor com um lance de US$ 6,80. Você deveria ficar feliz com a conquista? Não, pois terá pago US$ 6,80 por um pote de moedas no valor de US$ 6,20. Você foi vítima da maldição do vencedor. O vencedor de um leilão de valor comum normalmente obtém um resultado pior que os outros, pois foi otimista demais e, em consequência, ofereceu um lance maior do que o valor real do item.

A maldição do vencedor pode ocorrer em qualquer leilão de valor comum e os poten-ciais compradores em geral não levam isso em conta. Suponhamos que sua casa precise ser pintada. Você pede orçamento a cinco empresas, esclarecendo que aceitará o menor. Quem será o vencedor? Provavelmente o pintor que estimar o menor valor do trabalho envolvido. No início, ele ficará satisfeito em ganhar a concorrência, só percebendo mais tarde que ha-via muito mais trabalho do que imaginava. O mesmo problema pode ocorrer com empresas exploradoras de petróleo ao fazer lances para reservas quando o tamanho delas e o custo da extração não estão definidos (nem o valor da reserva). A menos que levem em conta a maldição do vencedor, as empresas podem vencer ao superestimar o valor da reserva e, em consequência, pagar mais do que ela vale.

Como é possível levar em conta a maldição do vencedor ao fazer lances para um item em um leilão de valor comum? Deve-se não somente estimar o valor do item, mas também considerar que sua estimativa, assim como a dos outros compradores, está sujeita a erro. Para evitar a maldição, deve-se reduzir o lance máximo abaixo do valor estimado, em um montante igual ao erro esperado do lance vencedor. Quanto mais precisa a estimativa, menor a necessidade de redução do lance. Caso não se possa calcular o valor da estimativa diretamente, deve-se estimar a variação das estimativas dos outros compradores. Se houver uma grande disparidade entre os lances, é provável que sua estimativa também seja impre-cisa. Para medir a variação dos lances, pode-se utilizar o desvio padrão das estimativas, que pode ser calculado por meio de métodos estatísticos.

As empresas de exploração de petróleo têm larga experiência em arrematar reservas e, por isso, calculam com facilidade o desvio padrão. Portanto, elas levam em conta a maldi-ção, reduzindo os lances máximos abaixo das estimativas de valor, em uma quantia igual à do erro esperado para o lance vencedor. Como resultado, raramente cometem erros ao ven-cer um leilão. Já os pintores de paredes são menos sofisticados em suas decisões e acabam enfrentando a maldição do vencedor.

É mais provável que a maldição do vencedor represente um problema em um leilão de lances fechados do que em um leilão inglês tradicional. Neste, se você é o único comprador que é otimista demais, ainda pode vencer o leilão oferecendo um lance apenas ligeira-mente superior à segunda maior oferta. Logo, para que a maldição do vencedor se torne um problema, pelo menos dois compradores potenciais precisam ser otimistas demais. Em contrapartida, em um leilão de lances fechados, o seu otimismo pode levá-lo a ultrapassar qualquer outro lance por uma margem considerável.

Maximização da receita do leilãoVamos voltar à questão do tipo de leilão do ponto de vista do vendedor. Eis algumas

dicas úteis para a escolha do melhor tipo:

1. Em um leilão de valor privado, incentive o maior número possível de compradores a participar. Um número maior deles aumenta o lance esperado do vencedor e também da avaliação esperada do participante com a segunda maior oferta.

maldição do vencedor

Situação em que o vence-dor de um leilão de valor comum obtém um resultado ruim por haver superesti-mado o valor do item e ofe-recido um lance maior.

00 Pindyck.indb 515 28/11/13 20:14

Page 34: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA516

2. Em um leilão de valor comum, (a) utilize um leilão aberto em vez de um de lances fechados, pois, como regra geral, um leilão inglês (aberto) de valor comum gera maior receita esperada do que um de lances fechados; e (b) revele informações sobre o valor real do objeto em leilão para reduzir a preocupação com a maldição do ven-cedor e, em consequência, incentivar mais lances.

3. Em um leilão de valor privado, estabeleça um lance mínimo igual, ou até mesmo um pouco superior, ao valor que o faria guardar o bem para uma venda futura. Isso vai protegê-lo contra perdas se os compradores potenciais forem relativamente poucos e não atribuírem grande valor ao bem. Além disso, poderia aumentar o tamanho dos lances, ao sinalizar aos compradores que o objeto é valioso. Claro que ter a oportuni-dade de tentar outra vez vender o bem se não houver um lance mínimo é uma vanta-gem; no entanto, também pode ser uma desvantagem se os compradores encararem o fato de o bem não ter sido vendido da primeira vez como sinal de baixa qualidade.

Por que utilizar um leilão aberto? Lembremos que, para evitar a maldição do ven-cedor, cada comprador de um leilão de valor comum oferecerá lances abaixo de sua avaliação individual. Quanto maior a incerteza a respeito do valor real do objeto, maior a chance de haver um lance alto demais e, portanto, maior o incentivo para que o com-prador reduza o lance. (Se o comprador é avesso ao risco, esse efeito será ampliado.) No entanto, o comprador se defronta com menos incertezas em um leilão inglês do que no de lances fechados, pois pode observar os preços que causam a saída de outros comprado-res — uma vantagem que fornece informações sobre suas avaliações. Em suma, quando se oferecem mais informações aos compradores, aqueles que são avessos a riscos serão encorajados a fazer mais lances, pois estarão mais confiantes de que podem prever a pos-sibilidade da maldição do vencedor.

Lances e coalizõesAcabamos de ver que, nos leilões, os vendedores podem conquistar uma parcela

significativa de ganhos se incentivarem a competição entre os compradores. Logo, os compradores também podem aumentar o poder de barganha ao reduzirem o número de participantes no leilão ou a frequência de lances. Em alguns casos, isso pode ser con-seguido legalmente por meio da formação de grupos de compradores; mas a manobra também pode ser feita ilegalmente, graças a acordos de coalizão que violam a legisla-ção antitruste. A coalizão entre compradores não é fácil, pois, mesmo que se chegue a um “acordo”, cada comprador ficará tentado a trapacear, aumentando os lances no último minuto para obter o item desejado. No caso de leilões frequentes, porém, os participantes podem penalizar quem quebra o acordo, superando o lance do “trapa-ceiro” repetidas vezes. A coalizão de compradores é mais problemática nos leilões de lance aberto do que nos de lance fechado, pois nos abertos os compradores podem detectar e punir os trapaceiros mais facilmente.

Um caso bem conhecido de coalizão de compradores foi o acordo que, no meio da década de 1980, os times de beisebol fizeram para limitar a procura pelos jogadores com passe livre. Como tal procura era repetida e aberta, os dirigentes podiam retaliar aqueles que dessem lances muito frequentes ou agressivos. A coalizão não é, porém, exclusividade dos compradores. Em 2001, duas das mais bem-sucedidas casas de leilão do mundo, a Sotheby’s e a Christie’s, foram acusadas de entrar em acordo para fixar o preço das comissões oferecidas aos vendedores de artigos leiloados. Um ex-presidente da Sotheby’s, Alfred Taubman, foi sentenciado a um ano de prisão pelo envolvimento no esquema.

00 Pindyck.indb 516 28/11/13 20:14

Page 35: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

517CAPÍTULO 13 TEORIA DOS JOGOS E ESTRATÉGIA COMPETITIVA

22

22 Para obter mais informações sobre leilões pela Internet, veja Patrick Bajari e Ali Hortaçsu, “Economic Insights from Internet Auctions”, Journal of Economic Literature 42, jun. 2004, p. 457-486.

EXEMPLO 13.7 LEILÃO DE SERVIÇOS JURÍDICOS

Nos Estados Unidos, alguns advogados costumam aceitar casos em que eles representam classes de indivíduos que supostamente foram prejudicados pelas ações dos réus que afetaram negativamente a saúde humana ou seu bem-estar. Os advogados são pagos em geral com base em uma taxa de contingência, que significa que não recebem nada se perderem o caso, porém, se vencerem, eles recebem uma porcentagem do valor recuperado, normalmente em torno de 30%.

Em diversas ocasiões, casos de ação de uma classe de pessoas se seguiram a investigações e processos bem-sucedidos por órgãos do governo. Por exemplo, depois que o governo dos Estados Unidos conseguiu processar a Microsoft e descobriu que ela tinha monopolizado o mercado de sistemas operacionais para PC, os advogados representando os consumidores que haviam comprado PCs moveram processos para reparação dos danos causados por pagamentos em excesso. Por causa do processo do governo, os advogados dos pleiteadores da ação da classe já tinham um ponto de partida que simplificou bastante seu trabalho. Muitos dos documentos fundamentais já haviam sido descobertos e eles não tiveram que provar que a Microsoft detinha um monopólio no mercado de sistemas operacionais para PC.

Como resultado de casos como esse, o percentual cobrado como prêmio no caso de sucesso começou a ser visto como grande demais em relação aos esforços feitos pelos advogados. O que poderia ser feito sobre isso? Diversos juízes federais encontraram uma solução: realizar leilões em que os advogados faziam lances pelo direito de representar a classe de potenciais pleiteadores. Em um desses leilões típicos, os advogados ofereciam uma taxa percentual como parte do processo de lance fe-chado. Em um leilão incomum após um veredicto criminal contra as casas de leilão Sotheby’s e Christie’s, o juiz Lewis Kaplan do Distrito do Sul de Nova York permitiu que os escritórios de advocacia oferecessem como lances do leilão uma variedade maior de formas de pagamento no caso de sucesso. O resultado foi que o lance vencedor foi a firma Boies, Schiller & Flexner, que fez o lance de um pagamento de 25% do prêmio sobre o valor recuperado que excedesse US$ 425 milhões. Meses após assumir o caso, David Boies fez um acordo com a defesa por US$ 512 milhões, rendendo aos advogados um valor de US$ 26,75 milhões (25% do excedente de US$ 107 milhões sobre o mínimo de US$ 425 milhões) e proporcionando um ganho de pouco mais de US$ 475 milhões para os membros da classe.

EXEMPLO 13.8 LEILÕES PELA INTERNET

A popularidade dos leilões aumentou muito nos últimos anos com o crescimento da Internet. De fato, a rede mundial vem diminuindo tanto os custos de transação que, agora, pessoas em qualquer lugar do mundo podem negociar artigos de valor relativamente baixo sem deixar o conforto do lar. Muitos sites estão voltados para leilões em que os participantes podem comprar e vender uma grande variedade de itens. Vejamos como esse tipo de site funciona.22

O mais popular leilão da Internet é o www.ebay.com, que oferece vários leilões por dia, nos quais os objetos variam de an-tiguidades e automóveis a bonecas e moedas raras. Fundado em 1995 por Pierre Omidyar em uma tentativa de vender um laser pointer quebrado, o eBay domina o setor de leilões on-line entre pessoas físicas. Recentemente, ele registrava milhões de pro-dutos à venda, inclusive artigos tão inusitados quanto uma ilha no Caribe, 154 acres em uma estância turística norte-americana e uma cidade fantasma em Nevada. Em 2011, o eBay respondeu por 85% de todas as vendas por leilão on-line, totalizando mais de US$ 60 bilhões de mercadorias vendidas. Em média, mais de 14 milhões de artigos estão à venda a qualquer momento.

Como o eBay conseguiu dominar o mercado de leilões pela Internet? Por que outros sites de leilão (como o do Yahoo ou o da Amazon) não conseguiram avançar sobre a fatia de mercado do eBay? A resposta é que os leilões pela Internet estão sujeitos a externalidades de rede muito fortes. Se você quisesse leiloar algumas moedas ou selos raros, qual site escolheria? Aquele que tivesse o maior número de compradores potenciais. Da mesma maneira, se estivesse atrás de moedas ou selos raros, você escolheria o site com o maior número de vendedores. Assim, tanto vendedores quanto compradores são atraídos para o site de leilão com a maior fatia de mercado. Como foi o primeiro grande site de leilão na Internet, o eBay já começou com a maior fatia de mercado, e ela cresceu graças à externalidade de rede.

Na Seção 4.5, explicamos como as externalidades de rede afetam as vendas de um produto.

< NOTA ESCONDIDA

00 Pindyck.indb 517 28/11/13 20:14

Page 36: Teoria dos jogos e estratégia competitiva. 13 PI.pdfTeoria dos jogos e estratégia competitiva CAPÍTULO 13 13.1 Jogos e decisões estratégicas 483 13.2 Estratégias dominantes 486

PARTE 3 ESTRUTURA DE MERCADO E ESTRATÉGIA COMPETITIVA518

23

23 De acordo com a Forbes, 3 maio 2011.

Para entender o papel crítico dos efeitos da rede, veja o que aconteceu quando o eBay tentou se expandir internacional-mente. Na China, ele teve de competir com o Taobao, cujos administradores sabiam como era importante ganhar desde cedo a vantagem de ter a maior fatia de mercado. Assim, o Taobao decidiu não cobrar dos vendedores qualquer comissão, de modo que a maioria de suas receitas vinha da propaganda. Embora sua receita fosse limitada por essa estratégia, o Taobao logo se tornou o site de leilão dominante na China, com uma fatia de mercado superior a 80% em 2010.23 E o eBay, da mesma forma, perdeu no Japão, dessa vez para o Yahoo! Japan Auctions, que obteve agressivamente uma liderança inicial em fatia de mercado. O forte efeito de rede, então, quase impossibilitou que o eBay (ou qualquer outro) desafiasse o domínio do Yahoo! no Japão.

Voltando aos Estados Unidos, vejamos como operam os leilões do eBay. Para itens isolados, o eBay usa um leilão de lances crescentes que funciona da seguinte forma: os lances devem ser aumentados com incrementos mínimos. O comprador de lance mais alto no fechamento vence e paga ao vendedor um preço igual ao do segundo maior lance mais o incremento mínimo pelo qual os lances são feitos (digamos, US$ 0,25). Assim, se você oferecer US$ 20 por determinado DVD e estiver tentando vencer, pagará o segundo lance mais alto — digamos, US$ 19 —, mais o incremento mínimo de US$ 0,29). O leilão de preços crescentes do eBay não corresponde exatamente aos formatos de leilão descritos, pois há um horário de término fixo e conhecido, o que pode levar os compradores a fazerem apostas estrategicamente ao final do leilão.

Muitos leilões pela Internet têm, na maioria das vezes, itens de valor privado. (Entretanto, como qualquer pessoa pode colocar itens à venda, há questões de valor comum: o vendedor é confiável? Será possível revender a mercadoria?) A ênfase desses leilões no valor privado é especialmente verdadeira quando se trata de antiguidades que podem ter valor considerável para compradores particulares. Com leilões de valor privado, não há tanta preocupação com o histórico do lance. Os lances dos outros compradores demonstram suas preferências, mas o valor dado a um objeto é pessoal. Apesar de haver o desejo de vencer pagando o preço mais abaixo da avaliação possível, a maldição do vencedor não é necessariamente um problema: não se pode ficar desapontado se o valor que se atribui ao objeto é maior do que o valor que se pagou.

Nos Estados Unidos, o vendedor paga ao comprador quando um item é comprado. O lucro do eBay obtido com a maioria dos leilões vem das taxas pagas pelo vendedor. Na maioria dos leilões, o vendedor paga uma taxa quando o item é colocado à venda e uma taxa adicional quando e se o item for vendido. Naturalmente, a questão de quem de fato paga essas taxas é complexa. Para ilustrar, suponha que o produto à venda na Internet seja um item de valor comum, disponível com facilidade em outros lugares (por exemplo, um CD de música, um DVD ou um livro). Então, a taxa é como um imposto (mas coletado pelo eBay, e não pelo governo). Assim como um imposto, o peso das taxas será repartido por compradores e vendedores e, como explicamos na Seção 9.6, dependerá das elasticidades relativas da oferta e da demanda.

Na Seção 9.6, explicamos que o peso de um imposto recai parcialmente sobre os compradores e parte sobre os vendedo-res, dependendo das elasticidades relativas da demanda e da oferta.

Para finalizar, algumas advertências devem ser feitas sobre a compra de objetos em leilões via Internet. Ao contrário das tradicionais casas de leilões, sites como o eBay oferecem somente um fórum para compradores e vendedores intera-girem. Não há controle de qualidade. Apesar de muitos sites, incluindo o eBay, deixarem informações sobre os vendedores disponíveis para os compradores, essa é em geral a única evidência que se pode obter de quão confiável um vendedor é. Nos últimos anos, o eBay estabeleceu um programa de proteção ao comprador, mas o processo de reclamação pode ser muito longo. Além disso, a possibilidade de manipulação de lances também parece grande nesses leilões. Dada a relativa facilidade para obter um endereço de e-mail, os vendedores podem utilizar lances falsos a fim de manipular o processo. Assim, caveat emptor (cuidado de comprador) é uma boa filosofia quando se compra itens na Internet.

NOTA ESCONDIDA >

00 Pindyck.indb 518 28/11/13 20:14