simulação de propriedades estruturais e eletrônicas de...

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Universidade de São Paulo Instituto de Física Simulação de Propriedades Estruturais e Eletrônicas de Agregados, Líquidos Regulares e Supercríticos. Rafael Carvalho Barreto Orientador: Prof. Dr. Sylvio R A Canuto Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Física para a obtenção do título de doutor em ciências. São Paulo 2010

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Universidade de São Paulo Instituto de Física

Simulação de Propriedades Estruturais e Eletrônicas de Agregados, Líquidos Regulares e

Supercríticos.

Rafael Carvalho Barreto

Orientador: Prof. Dr. Sylvio R A Canuto

Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Física para a obtenção do título de doutor em ciências.

São Paulo

2010

(contra capa)

(espaço reservado para o registro da biblioteca)

(vazio)

A ciência é o que nós compreendemos suficientemente bem para explicar a um

computador. A arte é tudo mais.

Donald Knuth

Ciência da computação tem tanto a ver com o computador como a Astronomia com o

telescópio, a Biologia com o microscópio, ou a Química com os tubos de ensaio. A

Ciência não estuda ferramentas, mas o que fazemos e o que descobrimos com elas.

Edsger Dijkstra

Não existe física computacional sem computador.

Rafael Barreto

(vazio)

Sumário

Agradecimentos ................................................................................................................ 8

Resumo ............................................................................................................................. 9

Abstract........................................................................................................................... 10

Capítulo 1 : Introdução ................................................................................................... 11

Capítulo 2 : Métodos de modelagem molecular em líquidos ......................................... 14

Capítulo 3 : Solvatocromismo do fenol .......................................................................... 16

3.1 Agregados de fenol e água.............................................................................. 19

3.2 Agregados de fenol e etanol ........................................................................... 24

3.3 Fase líquida: Simulação do fenol em água ..................................................... 41

3.4 Fase líquida: Simulação do fenol em etanol ................................................... 50

Capítulo 4 : Água supercrítica ........................................................................................ 57

4.1 Determinação do Ponto Crítico da Água usando o Modelo AMOEBA......... 62

Capítulo 5 : Retrospectiva, Conclusões e Perspectivas .................................................. 70

Apêndice A: Realizações no Doutorado......................................................................... 73

Apêndice B: Mecânica Molecular - Líquidos................................................................. 75

Apêndice C: Mecânica Quântica - Métodos Aproximativos.......................................... 83

Apêndice D: Campos de Força ....................................................................................... 89

Apêndice E: Aspectos Técnicos da Física Computacional............................................. 95

Referências ................................................................................................................... 101

8

Agradecimentos

Agradeço a todos, sem exceção. Agradeço especialmente a FAPESP pelo

apoio financeiro.

9

Resumo

Esta tese de doutorado investiga as propriedades espectroscópicas e

termodinâmicas de líquidos moleculares. Para este fim utilizam-se técnicas de

química quântica e modelagem na simulação computacional. Para simular as

propriedades termodinâmicas e flexibilidade molecular foi utilizada Simulação

Clássica (Monte Carlo e Dinâmica Molecular). Já para reproduzir as propriedades

eletrônicas, valeu-se de métodos de Química Quântica (post-HF e DFT). O efeito de

polarização foi introduzido pelo Método Seqüencial Monte Carlo/Mecânica Quântica

(S-MC/QM) e também via campo de força polarizáveis. Apresenta-se uma visão geral

destas técnicas no apêndice.

Este trabalho se divide em três partes. Na primeira parte são obtidas as

propriedades estruturais e espectroscópicas de agregados de fenol e água (1+1 e 1+2)

e fenol e etanol (1+1). Os modos vibracionais (inter e intramoleculares) e a energia de

ligação são calculados. Os resultados estruturais e o desvio solvatocrômico são

coerentes com dados experimentais e expectativas teóricas (para os diferentes

agregados). Na segunda parte é realizada a simulação do fenol em água utilizando o

protocolo S-MC/QM, com o respectivo cálculo do espectro eletrônico. É apresentado

o estudo das pontes de hidrogênio e as diferentes contribuições que determinam o

desvio solvatocrômico em solução. Em seguida é feita a simulação do fenol em etanol

utilizando dinâmica molecular e o campo de força flexível e polarizável AMOEBA.

As propriedades termodinâmicas da simulação estão em excelente concordância com

as expectativas teóricas e experimentais. Isso é surpreendente dado o fato que o

modelo não é parametrizado empiricamente. Por fim, é detalhado o trabalho realizado

com a água supercrítica. Foram executadas centenas de simulações a fim de se obter o

ponto crítico do modelo AMOEBA. São apresentadas as isotermas e os parâmetros da

equação de estado que determinam o comportamento do modelo nessa região.

Este documento amostra o conhecimento adquirido pelo aluno em diferentes

aspectos da física computacional, desde a parte técnica, os diversos modelos e

aproximações teóricas utilizadas em simulação e a capacidade de aplicação deste

conhecimento em problemas de interesse físico, os quais resultaram em dois artigos

publicados [12,22] e mais dois trabalhos em preparação.

10

Abstract

This thesis investigates the spectroscopic and thermodynamic properties of

molecular liquids. To this end, we use techniques of quantum chemistry and modeling

to do computational simulation. To simulate the thermodynamic properties and

molecular flexibility it was used Classical Simulation (Monte Carlo and Molecular

Dynamics). To reproduce the electronic properties it was used Quantum Chemistry

methods (post-HF and DFT). The polarization effect was introduced through the

Sequential Monte Carlo / Quantum Mechanics Method and polarizable force fields. It

is presented an overview of these techniques in the appendix.

This work is divided into three parts. In the first part is obtained spectroscopic

and structural properties of phenol and water (1+1 and 1+2) and phenol and ethanol

(1+1) clusters. The vibrational modes (intra and intermolecular) and binding energies

are calculated. The structural results and the solvatochromic deviations are consistent

with experimental data and theoretical expectations (for different clusters). In the

second part is performed the simulation of phenol in water using the S-MC/QM

protocol, followed by the calculation of the electronic spectrum. It is presented the

study of hydrogen bonding and the different contributions which determine the

solvatochromic deviation in solution. So, it is made the simulation of phenol in

ethanol using molecular dynamics and the polarizable and flexible force field

AMOEBA. The thermodynamic properties of the simulation are in excellent

agreement with theoretical expectations and experimental data. This is surprising

given the fact that the model is not parameterized empirically. Finally, it is detailed

the work on supercritical water. It has been performed hundreds of simulations in

order to obtain the critical point of the model AMOEBA. Isotherms are presented as

well as the parameters of the equation of state which determine the behavior of the

model in that region.

This document samples the acquired knowledge of the student in different

aspects of computational physics, from the technical side, the various models and

theoretical approaches used in simulation and the ability to apply this knowledge to

problems of physical interest, which resulted in two published articles [12,22] and

other two are in preparation.

11

Capítulo 1: Introdução

O estudo teórico das propriedades moleculares em líquidos não é simples. O

líquido tem densidade similar ao sólido, mas suas partículas fluem sem ter posição

definida. As forças de atração e repulsão impõem restrições de como suas partículas

podem se movimentar. Dado o grande número de possíveis conformações é necessária

cautela quando se tenta construir modelos teóricos. O problema é ainda mais

complexo já que não existe uma equação simples para descrever as forças

intermoleculares.

O surgimento da mecânica quântica estabeleceu um novo paradigma para o

estudo teórico das propriedades microscópicas dos líquidos [1]. Expressões analíticas

para as forças intermoleculares puderam ser obtidas para sistemas simples, como

gases nobres. Mas foi apenas com o surgimento do computador que se pode avançar

sobre sistemas mais complexos. Técnicas numéricas foram aplicadas a problemas cuja

abordagem analítica era impossível devido à grande quantidade de vínculos e

restrições. Mesmo com o avanço contínuo e acelerado guiado pelo desenvolvimento

computacional, a maioria dos problemas em meio solvente ainda é complicada o

suficiente para desafiar as soluções numéricas do tipo "força bruta". Inevitavelmente,

foram desenvolvidos modelos simplificados para descrever as forças intermoleculares

(chamados de campos de força), já que os cálculos quânticos (ainda) são inaplicáveis

para a maioria dos sistemas de interesse devido ao seu alto custo computacional.

Quando se trata de líquidos polares [2], uma boa descrição dos momentos de

multipolo é crucial. Tais interações são fundamentais para a conformação de

complexos moleculares, membranas e micelas, determinação do número médio de

pontes de hidrogênio, cálculo da constante dielétrica e típicas propriedades anômalas.

Moléculas apolares, como sistemas aromáticos e solventes utilizados em processos

químicos, ou moléculas complexas com regiões apolares, tais como lipídios e

proteínas, necessitam de tratamento diferenciado. Em tais moléculas é necessário

utilizar campos de força que descrevam bem os efeitos de indução, dispersão e termos

superiores da expansão multipolar. Para líquidos homogêneos, quando se utiliza

modelos simplificados para descrever as interações moleculares, a qualidade do

campo de força pode facilmente ser verificada pelas propriedades termodinâmicas

calculadas. Mas não existe a mesma facilidade quando se deseja estudar moléculas em

meio heterogêneo. Compreender o efeito do solvente sobre o soluto é a chave para

12

explicar resultados experimentais, desvendar interações específicas, entender

mudanças conformacionais e solvatocromismo. Potenciais que descrevem bem as

propriedades termodinâmicas do sistema podem não descrever corretamente a

interação específica soluto-solvete, e assim são necessários métodos mais avançados e

maior cuidado para avançar nesta área.

Ao fim do capítulo 2, são apresentadas algumas das técnicas utilizadas para

melhorar os campos de força tradicionais e incluir parte dos efeitos de polarização do

soluto causado pelo solvente.

Este trabalho dá atenção especial ao fenol. Fenóis são compostos orgânicos em

que um grupo álcool está diretamente ligado a um grupo aromático de

hidrocarbonetos. É um importante grupo funcional, encontrado em diversas reações

químicas e biológicas. Sua forma mais simples é o C6H5OH (Figura 1), conhecido

como fenol, benzenol, ácido carbólico, hidroxibenzeno, entre outros nomes. É mais

ácido que os alcoóis, podendo ser convertido quando em solução aquosa em fenolato

ou fenóxido. Estudar a interação dos fenóis com o meio solvente possui imensa

importância, tal como a compreensão de mecanismos de reação química e

interpretação do espectro de compostos complexos, interação de moléculas de

interesse biológico com o solvente, dentre outras aplicações tanto na indústria quanto

em laboratório. No capítulo 3 é apresentado parte do estudo feito com o fenol. Nesta

parte, destacam-se a influência das diferentes contribuições (bulk e pontes de

hidrogênio) para o desvio solvatocrômico do fenol em meio.

Figura 1: Molécula de fenol.

13

Na segunda parte deste trabalho, é apresentado o estudo da água em condições

supercríticas. O objetivo desta parte foi desenvolver o conhecimento e as ferramentas

necessárias para futuros estudos de solvatação molecular nessas condições. Fluidos

supercríticos (SCF), por definição, são todas as substâncias cuja temperatura e pressão

estão além do ponto crítico. Ao contrário do que se pode pensar, simular em

condições supercríticas não é tão simples quanto se simular em condições normais.

No ponto crítico, a descontinuidade nas propriedades físicas, a qual diferencia a fase

líquida da gasosa, desaparece. Na região supercrítica, o fluido exibe propriedades

completamente novas, as quais vêm despertando crescente interesse na última década

[3]. Dentre as mais intrigantes, se encontra a mudança drástica nas propriedades de

solvatação de fluidos comuns [4]. Nessa nova condição, algumas dessas substâncias

são chamadas de solventes verdes, pois são capazes de substituir solventes orgânicos

pesados prejudiciais ao ambiente. A água, em especial, com pressão crítica de 217

atm e temperatura crítica de 647 K, na região supercrítica apresenta baixa polaridade e

alta acidez [5]. A correta descrição e compreensão das propriedades físicas de

moléculas solvatadas a condições normais é um desafio por si só. Repetir esse estudo

em altas temperaturas e pressões, caso da água supercrítica, é um desafio ainda maior.

No capítulo 4 apresenta-se o estudo feito com simulação de água em condições

supercríticas. O resultado mais importante deste trabalho é a determinação do ponto

crítico da água utilizando o modelo polarizável AMOEBA.

*************************

Todas as variáveis (escalares, vetores ou tensores) utilizadas nas equações e

tabelas deste trabalho foram colocadas em itálico (q0, x…). Os vetores foram escritos

em negrito (µ, r…). Os tensores de segunda ordem, mesmo sendo variáveis, estão

apenas em negrito (Θ). Os operadores têm circunflexos (Â, Ĥ…). Em alguns

momentos do texto, alguns termos-chave foram destacados em negrito a primeira vez

que apareceram. Alguns termos utilizados na literatura, nomes de métodos, ou de

constantes foram colocados em itálico. Foi utilizado ponto (.) como separador

decimal, contrariando o padrão nacional. Todas as equações serão chamadas no meio

do texto pelo seu número entre parênteses, ou seja, (53) deve ser lido como "equação

53". Os usos do hífen e do trema estão de acordo com a gramática antiga, antes da

reforma ortográfica que uniu a gramática dos países de língua portuguesa.

14

Capítulo 2: Métodos de modelagem molecular em líquidos

Estudar as propriedades físicas de sistemas líquidos requer conhecimento

abrangente. Um líquido é um condensado de moléculas, as quais se guiam pela força

de interação de cada uma com todas as outras. Condensado implica que a força é em

média atrativa, e que a velocidade de seus constituintes não é em média suficiente

para que estes se dispersem. Porém, esta força não é grande o bastante para confinar

os movimentos das moléculas em torno de alguma posição de equilíbrio. E por mais

relevante que seja sua descrição microscópica, o estudo dos líquidos inicia-se

realmente por suas propriedades macroscópicas (termodinâmica). Seu formalismo

torna possível reconhecer as equações de estado de um sistema em equilíbrio,

independente de sua constituição microscópica. A partir de um pequeno conjunto de

princípios, como a conservação da energia e a maximização da entropia, é possível

relacionar quantidades extensivas (entropia e volume) com intensivas (temperatura e

pressão), e encontrar características inerentes da matéria tais como o calor específico

e a compressibilidade. A conexão entre as propriedades termodinâmicas e sua origem

microscópica é feita através da mecânica estatística. Como não há interesse em saber

a localização exata de cada molécula no espaço a cada instante, procura-se obter o

efeito médio desta multidão em cada propriedade observada. O efeito conjunto dessa

multidão de possíveis configurações é chamado de ensemble1.

Encontrar uma equação de estado de um líquido em equilíbrio através da

mecânica estatística enfrenta dois problemas fundamentais. Como calcular a energia

de uma determinada configuração e como ponderar sobre um número aparentemente

infinito de configurações. Isto poderia ser feito por meios analíticos, integrando-se

sobre o "espaço de configurações" acessíveis ao sistema. Infelizmente, mesmo

conhecendo a forma analítica da energia, o número de variáveis e vínculos dos

sistemas físicos de interesse torna tal procedimento quase sempre inviável. Portanto

são utilizados métodos numéricos (simulação computacional). E para se obter a

energia de uma configuração é necessário compreender a natureza das forças

moleculares. Estas possuem suas origens no eletromagnetismo. Classicamente, caso

fosse possível saber a exata distribuição de cargas, posições e velocidades de cada um

dos constituintes do sistema, saber-se-ia também a energia total de cada configuração.

1 Ensemble: Unidade ou grupo de partes complementares que contribuem para um efeito único. [Francês, do Francês Antigo, do Latim Tardio īnsimul, "ao mesmo tempo".]

15

Entretanto a distribuição de cargas e a própria conformação molecular só pode ser

conhecida através da mecânica quântica, elevando o problema a um novo grau de

complexidade. O estado do sistema pode ser representado por uma função de onda, e

os observáveis físicos por operadores que atuam nesta função. Entende-se por

observável aquilo que é passível de medição, como energia, posição, e momento, por

exemplo. Problemas simples como o oscilador harmônico e o átomo de hidrogênio

são resolvidos analiticamente com o uso da álgebra destes operadores. Problemas

mais elaborados, como o problema de três corpos, requerem métodos aproximativos,

pois recaem em equações diferenciais das quais não se conhece a solução. Assim o

cálculo da energia demanda uma série de aproximações e o extensivo uso de cálculo

numérico.

Os métodos de simulação computacional de líquidos, cálculo da energia de

cada configuração, os métodos quânticos utilizados e seus respectivos graus de

aproximação, assim como os campos de força derivados deste conhecimento estão nos

apêndices. No apêndice B são apresentados os métodos de Monte Carlo e o de

Dinâmica Molecular, utilizados neste trabalho para gerar configurações de líquidos.

No apêndice C são apresentados alguns métodos quânticos utilizados para obter as

propriedades eletrônicas dessas configurações. No apêndice D são apresentadas

algumas características dos campos de força utilizados nas simulações

computacionais. No apêndice E são apresentados alguns aspectos importantes da

tecnicalidade necessária para a realização da simulação computacional.

16

Capítulo 3: Solvatocromismo do fenol

Neste capítulo é apresentado o estudo do deslocamento espectral do fenol em

solvente. O solvente de principal interesse neste trabalho é a água. Entretanto,

resultados experimentais [6] para o deslocamento espectral do fenol em etanol

mostram que seu valor é contrário àquele obtido para água. É interessante notar que

ambos os solventes são polares, e ambos são capazes de fazer pontes de hidrogênio.

Este resultado levanta a questão sobre a origem do solvatocromismo do fenol em

função das pontes de hidrogênio formadas em solução. Desta maneira, foi realizada

simulação tanto de fenol em água quanto de fenol em etanol.

Inicialmente realizou-se a otimização de geometria da molécula de fenol

isolada, com o método perturbativo MP2 [96] e a base aug-cc-pVDZ [7]. A Tabela 1

mostra os resultados desta otimização. A posição de mínimo é garantida pelo fato de

todas as freqüências vibracionais serem reais. Nota-se que as distâncias CO e HO são

um pouco superestimadas (1%) em relação aos valores obtidos com espectroscopia de

microondas [53]. O valor para o momento de dipolo, que é função da distribuição de

cargas e da geometria, também é superestimado (4.5%). Os valores obtidos para as

constantes rotacionais, que são função inversa da geometria, são levemente

subestimados (2%).

Tabela 1: Resultados do cálculo da otimização da molécula de fenol isolada. A energia foi obtida com o método MP2/aug-cc-pVDZ. A energia de ponto zero (ZPE) é calculada dentro da

aproximação harmônica. As freqüências vibracionais são típicas para torção e estiramento OH.

Teórico Experimental [53] RCO (Å) 1.382 1.364 RHO (Å) 0.968 0.956 ΘHOC (º) 108.6 109.0 ΘHOCC (º) 0.0 0.0 µ (Debye) 1.28 1.224 ± 0.008

A 5.560 5.650 [8] B 2.577 2.619 I (GHz) C 1.761 1.789

E(hartree) -306.61069 — ZPE(kcal/mol) 65.09 — τHOCC (cm-1) 330 310 [18] νHO (cm-1) 3808 3656

17

A energia total é dada pela energia eletrônica E (incluindo a repulsão nuclear)

mais a energia de ponto zero (ZPE) associada com o movimento vibracional dos

núcleos (que por conveniência foi escrita separadamente). Na tabela se destacam os

dois modos vibracionais que são mais afetados pelas pontes de hidrogênio que o fenol

é capaz de realizar. O movimento de torção (HOCC) e o movimento de estiramento

(OH) da hidroxila desviam respectivamente 7% e 5% do valor obtido

experimentalmente por Bist et al.[18]. Nota-se que estas freqüências foram calculadas

na aproximação harmônica, e incluir correções anarmônicas fariam com que estas

freqüências diminuíssem em direção ao resultado experimental.

Obtida a geometria, calculou-se o espectro de absorção em fase gasosa. Os

métodos utilizados foram TDDFT [9] com o funcional B3LYP (TDB3LYP) [10],

TDHF [9], e CIS(D) [97]. Como o CISD não é um método extensivo, ele não deve ser

usado para estudar efeitos de solvente onde o número de moléculas explicitamente

consideradas muda [95]. Assim optou-se pelo método CIS (que é extensivo) e as

excitações duplas são incluídas de forma perturbativa com o cuidado de se preservar a

extensividade (veja apêndice C). Os cálculos para o espectro eletrônico foram

realizados utilizando-se a base aug-cc-pVDZ, a mesma das otimizações de geometria.

Os resultados são apresentados na Tabela 2. Os resultados obtidos são típicos. O

método CIS produz valores muito altos para a transição, o mesmo ocorrendo para

TDHF. Os métodos TDB3LYP e CIS(D) fornecem resultados melhores, entretanto

ainda superiores ao resultado experimental obtido por Baba e Suzuki [11].

Tabela 2: Resultados do cálculo da transição eletrônica para a molécula de fenol isolada.

π → π* 1º exc (cm-1) 2º exc (cm-1) CIS 46350 48770 CIS(D) 39810 51030 TDHF 44530 46290 TDDFT 39800 — Experimental [11] 36070 45400

Os métodos CIS, CIS(D) e TDHF resultaram em transição de natureza π → π*

para a primeira e segunda excitação (Figura 2). O método TDDFT possui resultado

equivalente ao método CIS(D) para o valor da primeira transição, entretanto nas

quatro excitações subseqüentes não houve mais nenhuma transição π → π*.

18

Figura 2: Caráter dos orbitais moleculares dominantes da primeira transição π → π* do fenol. O orbital da esquerda é associado ao estado fundamental, e o da direita ao estado excitado.

Adicionalmente estudou-se a variação do momento de dipolo no nível

CIS/aug-cc-pVDZ. Isto foi feito para inferir qual estado eletrônico do fenol

(fundamental ou excitado) interage mais com o solvente polar. Nota-se aqui que o

primeiro termo não nulo da expansão multipolar para moléculas polares neutras é o

momento de dipolo. Observou-se um decréscimo de 0.1 D do estado fundamental para

o estado excitado, o que sugeriria um sutil desvio para o azul em solvente polar. Este

raciocínio desconsidera completamente o efeito das pontes de hidrogênio, situação a

qual a proximidade entre os centros de carga impossibilita que se trunque a expansão

multipolar em seus primeiros termos.

19

3.1 Agregados de fenol e água

Antes de simular o fenol em água para obter seu solvatocromismo, faz-se

necessário estudar os possíveis agregados em fase gasosa [12]. De antemão, é crucial

compreender como esse desvio se comporta em relação à formação de pontes de

hidrogênio entre fenol e água. Portanto, estudou-se o complexo de fenol com uma

molécula de água em duas possíveis conformações para ponte de hidrogênio: água

doadora (W:Ph) e água aceitadora (Ph:W), como pode ser visto na Figura 3. As

geometrias foram otimizadas no nível de cálculo MP2/aug-cc-pVDZ, o mesmo nível

utilizado para o monômero.

Figura 3: Complexos otimizados de fenol com uma água em nível MP2/aug-cc-pVDZ.

Tabela 3: Resultados para a energia total eletrônica mais repulsão nuclear (hartrees), e as energias de ligação (kcal/mol), para os complexos com uma água em nível MP2/aug-cc-pVDZ.

Energia de Ligação (kcal/mol) Energia (hartrees) ∆E ∆E+ZPEa ∆E+ZPE

+BSSEb Água -76.26091 — — — Fenol -306.61069 — — — W:Ph -382.88005 5.30 3.82 2.63 Ph:W -382.88385 7.68 5.91 4.50 a ZPE: Inclusão da energia de ponto zero devido ao movimento nuclear. b BSSE: Correção do erro de superposição de base [13].

Os resultados obtidos para a energia total e de ligação são mostrados na

Tabela 3, em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Nota-se que a energia de ligação é dada por

20

∆E = EA + EB - EAB. As três últimas colunas apresentam esta energia, considerando-se

primeiro apenas ∆E, depois ∆E corrigido em relação à energia de ponto zero (ZPE), e

finalmente corrigindo também o erro de superposição de base (BSSE). Esta última

coluna é a melhor estimativa da energia de ligação. Em concordância com a literatura,

a configuração de água aceitadora é mais estável e mais abundante [14,15]. Nota-se

que os experimentos de jet cooling reportados na literatura para obtenção de espectro

e geometria são realizados em temperaturas abaixo de 50K (kT ~ 0.1kcal/mol).

Considerando-se que o fator de Boltzmann, exp(-U/kT), determina as populações de

cada uma das possíveis conformações (onde U = EAB - (EA + EB) = -∆E). Estima-se

que os complexos de água aceitadora são oito ordens de grandeza2 mais prováveis que

os complexos de água doadora de ponte de hidrogênio, nas condições em que o

experimento foi realizado (~50K).

Todos os resultados obtidos para as geometrias foram submetidos ao cálculo

de freqüências para conferir se eram mesmo conformações de mínima energia (Tabela

4). Os valores de 161 para Ph:W e 137 para W:Ph correspondem ao modo de

estiramento intermolecular na ponte de hidrogênio, cujo resultado experimental

reportado para Ph:W é de 156 cm-1 [16]. Nota-se que há uma fortuita concordância, já

que este cálculo é feito dentro da aproximação harmônica, e portanto esperava-se um

valor superestimado.

Tabela 4: Resultado do cálculo das freqüências intermoleculares dos complexos de fenol e água, no nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, o valor experimental obtidos da ref. [16].

νINTER (cm-1) Ph:W W:Ph

38 18 62 46 108 100

161 (156) 137 217 222 236 271

Os resultados para os modos de vibração intramoleculares do grupo OH do

fenol são apresentados na Tabela 5. Tais resultados para a fase gasosa são

equivalentes aos obtidos em nível CASSCF por Schumm et al.[17]. Ambos os

resultados para os complexos estão de acordo com o esperado. A freqüência do modo

2 p(Ph:W)/p(W:Ph) = exp((4.50-2.63)/0.1) ≈ exp(19) ≈ 108

21

de torção do grupo OH aumenta e o modo de estiramento diminui para o fenol doando

a ponte (Ph:W).

Tabela 5: Resultado do cálculo das freqüências intramoleculares do fenol (estiramento e torção do OH). Primeira linha para fase gasosa e depois para os complexos de fenol e água, no nível

MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, os valores experimentais obtidos da ref [18].

Torção (cm-1)

Estiramento (cm-1)

Fenol 328 (310) 3808 (3656) W:Ph 290 3808 Ph:W 761 3628

Figura 4: Complexos do fenol com duas águas. Ambas apresentam energias equivalentes (ver Tabela 6).

Em seguida, motivados pelo trabalho experimental de Fuke e Kaya [21],

adicionou-se mais uma água a essas geometrias. Encontraram-se duas conformações

mostradas na Figura 4. Ambas as conformações estão de acordo com a literatura

[19,20]. Dado os erros dos métodos e nível de cálculo utilizados, as conformações

Ph:W:W1 e Ph:W:W2 apresentam a mesma energia de ligação (com diferença de

0.2kcal/mol em favor de Ph:W:W2), como visto na Tabela 6. Fato interessante é que a

segunda água na conformação Ph:W:W2 aparenta fazer um ponte do tipo H-pi, com

uma distância de 2.29Å do C1 (veja Figura 1 no Capítulo 1). Adicionalmente

procurou-se orientar esta ponte de hidrogênio (desta segunda água) sobre o C2 (o qual

22

faz ligação com o oxigênio do fenol). Entretanto esta conformação se mostrou

instável, recaindo a otimização nas conformações Ph:W:W1 ou Ph:W:W2,

dependendo das condições iniciais.

Tabela 6: Resultados para a energia total eletrônica (hartrees), e as energias de ligação (kcal/mol), para os complexos com duas águas no nível MP2/aug-cc-pVDZ. Tabela 3 apresenta

estes mesmos resultados para apenas uma molécula de água.

Energia de Ligação (kcal/mol) Energia (hartrees) ∆E ∆E+ZPE ∆E+ZPE

+BSSE Ph:W:W1 -459.16257 18.86 14.30 10.84 Ph:W:W2 -459.16291 19.08 14.75 11.31

Estas estruturas, com uma e duas águas, foram então submetidas ao cálculo do

espectro eletrônico, nos mesmos níveis de cálculo utilizados para o monômero. Tais

resultados são apresentados na Tabela 7. O resultado do TDB3LYP para o Ph:W se

refere à segunda transição calculada, sendo que na primeira há transferência de carga

para a água. Nota-se a boa concordância entre o resultado experimental e os métodos

post-HF, para uma molécula de água. Para duas águas, a discordância dos valores

calculados com o experimental é explicado por Schemmel [20] como havendo uma

intersecção cônica próxima às geometrias obtidas, fazendo com que a banda se

alargue e a meia vida do estado excitado seja curto. O método mais confiável aqui é o

CIS(D), entretanto os métodos post-HF fornecem resultados similares. Há um

sistemático desvio para o vermelho na conformação Ph:W, e o desvio contrário na

conformação W:Ph. A conformação Ph:W:W1 sugere um efeito cooperativo (e mútuo

cancelamento) dos desvios. Tal cancelamento não é observado para Ph:W:W2, o qual

apresenta desvio similar a Ph:W.

Tabela 7: Resultado para o desvio no espectro eletrônico dos complexos de fenol e água em relação à fase gasosa em cm-1.

Ph:W:W Ph:W W:Ph 1 2

CIS -390 340 10 -310 CIS(D) -390 370 20 -380

TDB3LYP -540 520 -50 -790 TDHF -400 380 20 -350 Exp. -350 [21] — -140 – -90

23

Conclusões parciais

Foram analisadas as conformações de fenol e água (1+1 e 1+2) que realizavam

pontes de hidrogênio, a fim de compreender suas características estruturais,

energéticas e espectroscópicas. A conformação em que o fenol doa a ponte de

hidrogênio (Ph:W) mostrou-se ser a mais estável em 2.0 kcal/mol que a conformação

em que a água doa a ponte (W:Ph). Os modos vibracionais na aproximação harmônica

apresentam-se em excelente concordância com os resultados experimentais (diferença

da ordem de 5%). A primeira excitação eletrônica destas configurações (caráter

π→π*) apresenta desvio para o azul de 370m-1 quando a água é doadora de ponte

(W:Ph) e desvio para o vermelho de 390cm-1 quando o fenol é doador (Ph:W). Este

último está em excelente concordância com o resultado experimental de 350cm-1 para

o vermelho. Adicionalmente obtiveram-se conformações com duas águas, em que ao

mesmo tempo o fenol é doador e aceitador de ponte de hidrogênio. Observou-se que

neste caso existe um cancelamento parcial das duas contribuições, fornecendo um

desvio total de 20cm-1 para o azul.

24

3.2 Agregados de fenol e etanol

Nesta seção é apresentado o estudo dos agregados de fenol e etanol, sua

energia de ligação, e seu espectro vibracional e eletrônico [22]. A motivação principal

desta parte do trabalho é a comparação direta com o trabalho feito para os clusters de

fenol e água. Entretanto o trabalho com o etanol é muito menos simples que com a

água, e por isso se tornou muito mais extenso e detalhado. Há duas conformações

possíveis para o etanol: anticlinal e synclinal (Figura 5). Nota-se que a conformação

synclinal é quiral [23], e apresenta duas possibilidades equivalentes de posição do H1.

Figura 5: Conformações possíveis do etanol. À esquerda o synclinal (ou gauche) e à direita anticlinal (ou trans). A conformação synclinal é quiral.

Tabela 8: Resultados da otimização de geometria do etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ e comparação com resultados experimentais.

Synclinal Anticlinal Experimental [53] RCC (Å) 1.525 1.519 1.512 RCO (Å) 1.438 1.440 1.431 RHO (Å) 0.967 0.966 0.971 ΘOCC (º) 112.6 107.2 107.8 ΘHOC (º) 107.6 108.2 105 ΘHOCC (º) ±60.8 180.0 — µ (Debye) 1.76 1.62 1.68 / 1.44

A 33.920 34.413 34.194 / 34.891 [24] B 9.095 9.327 9.189 / 9.350

I (GHz)

C 8.032 8.096 8.099 / 8.135 E(hartree) -154.61341 -154.61381 — ZPE(kcal/mol) 50.39 50.42 — τHOCC (cm-1) 285 305 * νHO (cm-1) 3820 3830 3689 [25] * As conformações synclinal e anticlinal são acopladas nesse modo [26].

25

Inicialmente foram otimizadas as geometrias de ambos os monômeros de

etanol, com o mesmo nível de cálculo utilizado para o fenol (MP2/aug-cc-pVDZ). Na

Tabela 8, apresenta-se os resultados obtidos dessa otimização. Os resultados

experimentais para o momento de dipolo, reportados no Handbook of Chemistry and

Physics [53], são 1.68 ± 0.03 D (synclinal) e 1.44 ± 0.03 D (anticlinal). Estes valores

diferem respectivamente 5% e 12% do resultado calculado. Os desvios quadráticos

médios de cada geometria calculada em relação aos resultados advindos de

espectroscopia de microondas em fase gasosa [53] sugerem que a conformação mais

estável é a anticlinal. Este resultado é corroborado por outros trabalhos teóricos e

experimentais [23,27,28,24,26]. A diferença de energia calculada das duas

conformações em nível MP2/aug-cc-pVDZ (~0.25kcal/mol) é 100% maior que a

obtida via espectro rotacional de microondas (~0.12kcal/mol) [26,29]. Embora ambos

sejam muito pequenos, este valor deve ser usado com critério, notando-se que kbT

para 300K é aproximadamente 0.6kcal/mol. Dada esta pequena diferença de energia

entre as duas conformações (em relação à kbT), e do fato da conformação synclinal ser

duplamente degenerada, a abundância relativa em temperatura ambiente é de 6:4 em

favor da synclinal [23,28]. Ainda na Tabela 8, a distância calculada da ligação OH no

etanol é subestimada em relação ao resultado reportado experimentalmente, enquanto

que para o fenol esse valor é superestimado (veja Tabela 1). As geometrias de

equilíbrio reportadas neste trabalho são garantidas pelo cálculo das freqüências

vibracionais (em torno dos pontos de mínimo da superfície de energia potencial).

Verifica-se que o modo de torção τHOCC acopla as conformações synclinal e anticlinal,

e também a torção do metil em C2 [26], não sendo trivial sua análise. O modo de

estiramento νHO é aproximadamente 10cm-1 superior para a conformação anticlinal,

fato conhecido na literatura e relacionado com a interação dos lonepairs do oxigênio

com o hidrogênio do grupo metil [30].

Com o objetivo de se estudar o espectro eletrônico dos heterodímeros fenol-

etanol, procurou-se inicialmente quais conformações poderiam ser de mais baixa

energia. Para o caso do fenol doando a ponte de hidrogênio (Ph:Et), intuiu-se que os

lonepairs do oxigênio do etanol deveriam estar na direção do hidrogênio do fenol.

Dessa forma foram propostas seis conformações possíveis como esquematizado na

Figura 6. Nesse esquema, a bola vermelha representa o oxigênio, a cinza claro o

hidrogênio e a cinza escura os carbonos (esses representados apenas no fenol). A linha

saindo do oxigênio representa a cadeia carbônica do etanol. A nomenclatura de cada

26

uma delas segue o esquema Ph:Et(X-N-P), onde X é a conformação do etanol (S

synclinal e A anticlinal), N a direção relativa entre OH do etanol e o CO do fenol (1

paralela e 2 perpendicular), e P a posição da cadeia carbônica do etanol em relação ao

fenol (in para perto, out para longe ou nada para a conformação anticlinal).

Figura 6: Conformações esperadas para o dímero Ph:Et.

Cada uma das seis conformações do heterodímero Ph:Et foi submetida à

otimização de geometria no mesmo nível que foi usado nos monômeros. Realizou-se

diversas tentativas com condições iniciais diferentes para se testar a estabilidade da

posição de mínimo de cada uma dessas seis propostas. Observou-se que a

conformação S-2-out não é estável, colapsando na conformação S-1-in para todas as

condições iniciais testadas nesse trabalho. Obteve-se ainda quatro conformações em

que o etanol doa a ponte de hidrogênio (Et:Ph), entretanto com energia de ligação

bem menor.

Alguns trabalhos experimentais de jet cooling com agregados de fenol e etanol

já foram realizados, trazendo certa controvérsia sobre a existência ou não de mais de

um isômero rotacional. Abe et al. [15,31], através do espectro de fluorescência do

complexo fenol-etanol, pela primeira vez sugeriram haver isômeros rotacionais

intramoleculares e/ou intermoleculares em torno da ponte de hidrogênio. Lipert e

Coulson [32], através da técnica de spectral hole burning UV-UV, contradisseram a

hipótese de Abe et al., e afirmaram que o estado fundamental das transições

27

observadas era devido a apenas um isômero. Cordes et al. [33], estudando o espectro

de ionização, apoiaram a interpretação de Lipert e Coulson. Eles procuraram explicar

o complexo espectro vibracional como uma combinação de modos intermoleculares

de um único confórmero. Spangenberg et al. [34], através de spectral hole burning

IR-UV e cálculos ab initio, contestaram as interpretações anteriores. Em apoio a Abe

et al., afirmaram que espectro era produzido por pelo menos dois isômeros rotacionais

com energias de excitação quase degeneradas. Spangenberg et al. apresenta 3

isômeros, os quais ele denomina anti, gauche(1) e gauche(2), que na notação deste

trabalho equivaleriam respectivamente à Ph:Et(A-1), Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-1-in).

As três geometrias apresentadas por Spangenberg et al., quando submetidas à

otimização em nível MP2/aug-cc-pVDZ, recaem nas mesmas geometrias apresentadas

neste trabalho. Tais otimizações de geometria podem ser encontradas na referência

42.

Figura 7: Conformações encontradas para Ph:Et(A-1) (esquerda) e Ph:Et(A-2) (direita).

A Figura 7 apresenta duas conformações encontradas para Ph:Et(A). O

heterodímero Ph:Et(A-1) possui energia de ligação (BE) de 6.36kcal/mol, enquanto

que Ph:Et(A-2) possui 6.14kcal/mol. Tais cálculos corrigem a energia de ponto zero

(ZPE), BSSE [13] e também o efeito de distorção na geometria dos monômeros. Em

cálculo similar, mas em nível HF/6-31G(d,p), Spangenberg et al. [34] reporta

4.49kcal/mol para o complexo Ph:Et(A-1). Está razoavelmente estabelecido na

literatura que MP2 fornece resultados equivalentes a CCSD(T) para a energia de

ligação em sistemas com pontes de hidrogênio [35], enquanto que HF fornece valores

subestimados [36]. Também é sabido que MP2 superestima a energia de ligação em

sistemas aromáticos onde os termos de dispersão são dominantes [37]. Por isso

espera-se que as energias e freqüências vibracionais calculadas neste trabalho estejam

28

levemente superestimadas em relação aos resultados experimentais, mas ainda

comparáveis a CCSD(T).

Tabela 9: Principais resultados da otimização para Ph:Et(A-1) e Ph:Et(A-2) em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação da geometria em relação ao monômero

calculado (veja Tabela 1 e Tabela 8).

Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) RCC (Å) 1.519 (0.000) 1.519 (0.000) RCO (Å) 1.456 (0.016) 1.452 (0.012) RHO (Å) 0.968 (0.002) 0.967 (0.001) ΘOCC (º) 107.6 (0.4) 107.8 (0.6) ΘHOC (º) 108.2 (0.0) 108.8 (0.6)

Eta

nol

ΘHOCC (º) 173.5 (-6.5) 177.8 (-2.2) RCO (Å) 1.374 (-0.008) 1.371 (-0.011) RHO (Å) 0.982 (0.014) 0.980 (0.012) ΘHOC (º) 108.6 (0.0) 108.8 (0.2) Fe

nol

ΘHOCC (º) 7.8 (7.8) 13.7 (13.7) RH…O (Å) 1.803 1.821 ΘOH…O (º) 166.6 168.6 µ (Debye) 3.33 3.59 BE(kcal/mol) 6.36 6.14

Ainda no agregado Ph:Et(A-1), pela Tabela 9, nota-se que há maior mudança

no diedro ΘHOCC do etanol (-6.5º) em relação ao monômero. Já a conformação

Ph:Et(A-2) apresenta maior mudança no diedro ΘHOCC do fenol (13.7º). A distância da

ponte de hidrogênio RH…O no complexo Ph:Et(A-1) é 0.018Å mais próxima do que

em Ph:Et(A-2). Além da distância da ponte de hidrogênio, é relevante também notar a

distância do grupo metil do etanol ao oxigênio do fenol. O complexo Ph:Et(A-1), em

relação ao Ph:Et(A-2), apresenta o hidrogênio do metil mais próximo 0.016Å do

oxigênio fenólico. Isto reforça o resultado do complexo Ph:Et(A-1) ser mais estável

(maior energia de ligação) em relação ao Ph:Et(A-2). Entretanto a diferença de

energia é muito pequena, e deve-se ter cautela ao se utilizar esse resultado. O

complexo Ph:Et(A-2) possui momento de dipolo maior (em 8%) que Ph:Et(A-1), e

portanto espera-se que se estabilize mais em um ambiente polar.

A Figura 8 apresenta as conformações com etanol synclinal aceitando a ponte

de hidrogênio do fenol. Dentre elas, a conformação mais estável é a Ph:Et(S-1-in)

com 6.49kcal/mol de energia de ligação (Tabela 10). Ph:Et(S-1-in) é a conformação

com a maior energia de ligação de todos os complexos estudados (veja Tabela 9 e

Tabela 12), e é a que possui o metil do etanol mais próximo do oxigênio do fenol

29

(2.70Å). O complexo Ph:Et(S-2-in) possui a distância da ponte de hidrogênio menor

0.008Å em relação a Ph:Et(S-1-in). Entretanto seu metil é 0.179Å mais distante do

oxigênio fenólico e sua energia de ligação aproximadamente 0.5kcal/mol menor que a

conformação Ph:Et(S-1-in). As conformações Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-2-in)

deformam-se de maneira equivalente em relação aos monômeros, sendo maior a

deformação no fenol e menor no etanol.

Figura 8: Conformações encontradas para Ph:Et(S-1-in) (esquerda), Ph:Et(S-1-out) (direita) e Ph:Et(S-2-in) (acima). A conformação Ph:Et(S-2-out) não é estável e colapsa em Ph:Et(S-1-in).

A conformação Ph:Et(S-1-out) é a única com a cadeia carbônica do etanol

longe do anel fenólico. Em comparação com as outras duas conformações, ela

apresenta maior deformação no etanol e menor no fenol (veja Tabela 10). Esta

conformação também possui o maior momento de dipolo (3.62D). Spangenberg et al.

[34] encontra um isômero equivalente a este como o mais estável, com 4.85kcal/mol

de energia de ligação em nível HF/6-31G(d,p). Com o nível de cálculo MP2/aug-cc-

pVDZ, a conformação Ph:Et(S-1-out) tem energia de ligação intermediária dentre as

três synclinais aceitadoras. Esta conformação possui um hidrogênio do carbono C1

0.073Å mais próximo em comparação com a distância metil etanólico e oxigênio

fenólico do complexo Ph:Et(S-2-in) (veja Figura 5 e Figura 8). Note que Ph:Et(S-2-

in) tem energia de ligação menor que Ph:Et(S-1-out) (Tabela 10).

30

Tabela 10: Principais resultados da otimização para Ph:Et(S-1-in), Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-2-in) em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação da geometria em relação

ao monômero calculado (veja Tabela 1 e Tabela 8).

Ph:Et(S-1-in) Ph:Et(S-1-out) Ph:Et(S-2-in) RCC (Å) 1.523 (-0.002) 1.522 (-0.003) 1.523 (-0.002) RCO (Å) 1.454 (0.016) 1.452 (0.014) 1.452 (0.014) RHO (Å) 0.968 (0.001) 0.967 (0.000) 0.968 (0.001) ΘOCC (º) 112.3 (-0.3) 111.7 (-0.9) 112.3 (-0.3) ΘHOC (º) 107.8 (0.2) 108.4 (0.8) 107.8 (0.2)

Eta

nol

ΘHOCC (º) 59.3 (-1.5) 70.5 (9.7) 58.8 (-2.0) RCO (Å) 1.374 (-0.008) 1.374 (-0.008) 1.372 (-0.010) RHO (Å) 0.981 (0.013) 0.979 (0.011) 0.981 (0.013) ΘHOC (º) 108.3 (-0.3) 108.7 (0.1) 108.7 (0.1) Fe

nol

ΘHOCC (º) 16.2 (16.2) 12.2 (12.2) 16.2 (16.2) RH…O (Å) 1.831 1.836 1.823 ΘOH…O (º) 160.2 159.6 157.8 µ (Debye) 3.24 3.62 3.23 BE(kcal/mol) 6.49 6.25 6.02

Tabela 11: Correlação entre as distâncias das pontes de hidrogênio RH…O, hidrogênio da cadeia carbônica do etanol mais próximo do oxigênio do fenol XH…O, e energia de ligação para os

complexos Ph:Et em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, os valores equivalentes da referência 34 em nível HF/6-31G(d,p), veja o texto.

Ph:Et RH…O (Å) XH…O (Å) BE(kcal/mol)

A-1 1.803 (1.948)

2.753 (3.030)

6.36 (4.49)

A-2 1.821 2.769 6.14

S-1-in 1.831 (1.938)

2.705 (3.107)

6.49 (4.82)

S-1-out 1.836 (1.942)

2.811 (3.518)

6.25 (4.85)

S-2-in 1.823 2.884 6.02

A correlação entre as distâncias fenol-etanol e a energia de ligação dos

complexos é traçada na Tabela 11. Dado que o valor de kbT para condições normais é

aproximadamente 0.6kcal/mol, qualquer um desses cinco complexos é acessível. A

energia de ligação tende a ser maior para valores menores de XH…O (distância entre a

cadeia carbônica do etanol e oxigênio do fenol). Entre parênteses é apresentado os

resultados das geometrias equivalentes reportadas por Spangenberg et al. [34], em

nível HF/6-31G(d,p). Nessas geometrias, a distância da ponte de hidrogênio (RH…O) é

em média 7% maior em relação às geometrias obtidas neste trabalho em nível

MP2/aug-cc-pVDZ. A diferença das distâncias da cadeia carbônica ao oxigênio

31

fenólico (XH…O) é maior ainda: 10% para Ph:Et(A-1), 15% para Ph:Et(S-1-in) e 25%

para Ph:Et(S-1-out). Isto indica que a correlação eletrônica (origem da interação de

dispersão) é importante para descrever a interação entre a cadeia carbônica do etanol e

a anel fenólico, e conseqüentemente na determinação da geometria do complexo.

Para o caso do etanol doando a ponte de hidrogênio (Et:Ph) encontrou-se

apenas quatro conformações. Duas delas são pontes H-O, em que o etanol doa o

próton para o oxigênio do fenol. As outras duas são pontes do tipo H-π, ou seja, o

hidrogênio do etanol faz ponte com a nuvem π fenol. Estas conformações, com o

etanol doador (Figura 9), diferenciam-se pela maior distância da ponte de hidrogênio

em relação às configurações com etanol aceitador (diferença superior a 0.3Å). Ainda

em relação ao etanol aceitador, estas conformações com etanol doador apresentam

aproximadamente metade da energia de ligação (Tabela 12). Isto corrobora o caráter

ácido do fenol (pKa = 9.99) em relação ao etanol (pKa = 15.5) [53], i.e., o fenol doa o

próton mais facilmente (energeticamente favorável) do que o etanol.

Figura 9: Conformações encontradas para Et(S):Ph (superior-esquerda), Et(A):Ph (superior-direita), Et(S):π-Ph (inferior-esquerda) e Et(S):π-Ph (inferior-direita). As linhas tracejadas sobre

os átomos do anel foram colocadas apenas para facilitar a visualização.

32

Comparando a Tabela 12 com as anteriores, observa-se que o comprimento da

ligação RCO da molécula doadora se encurta em relação ao monômero. A mesma

ligação RCO da molécula aceitadora se alonga. Nota-se também que a ligação ROH se

alonga tanto na molécula doadora quanto na aceitadora. Esta regra é quebrada para as

configurações que formam ponte H-π. Como a interação da ponte não está sobre o

oxigênio do fenol, a ligação CO do fenol é pouco afetada. Os momentos dipolares das

conformações Et:Ph são em média menores que os das conformações Ph:Et. Isto

sugere que as estruturas Ph:Et irão se estabilizar melhor em solvente polar. A energia

de ligação das conformações Et:Ph também é expressivamente menor, sendo

aproximadamente metade daquela encontrada para Ph:Et. Tal resultado é coerente

com as energias de ligação obtidas para os cluster de fenol e água (seção anterior).

Tabela 12: Principais resultados da otimização para Et(S):Ph e Et(A):Ph em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação em relação ao monômero calculado (veja Tabela 1

e Tabela 8).

Et(S):Ph Et(A):Ph Et(S):π-Ph Et(A):π-Ph RCC (Å) 1.526 (0.001) 1.520 (0.001) 1.526 (0.001) 1.520 (0.001) RCO (Å) 1.436 (-0.002) 1.438 (-0.002) 1.435 (-0.003) 1.435 (-0.005) RHO (Å) 0.970 (0.003) 0.969 (0.003) 0.970 (0.003) 0.970 (0.004) ΘOCC (º) 113.0 (0.4) 107.4 (0.2) 112.4 (-0.2) 107.5 (0.3) ΘHOC (º) 108.5 (0.9) 108.1 (-0.1) 107.6 (0.0) 107.9 (-0.3)

Eta

nol

ΘHOCC (º) 70.1 (9.3) 179.6 (-0.4) 74.0 (10.2) 178.4 (-1.6) RCO (Å) 1.387 (0.005) 1.388 (0.006) 1.379 (-0.003) 1.379 (-0.003) RHO (Å) 0.969 (0.001) 0.969 (0.001) 0.969 (0.001) 0.968 (0.000) ΘHOC (º) 108.9 (0.3) 108.8 (0.2) 108.8 (0.2) 108.7 (0.1) Fe

nol

ΘHOCC (º) 2.4 (2.4) 6.9 (6.9) 0.3 (0.3) 1.2 (1.2) RH…O (Å) 2.117 2.182 — — ΘOH…O (º) 172.9 166.1 — — µ (Debye) 2.87 3.27 2.42 2.33 BE(kcal/mol) 3.66 3.01 3.64 3.36

A Tabela 13 apresenta as constantes rotacionais e a projeção do momento de

dipolo nos eixos principais dos complexos estudados. As constantes rotacionais dos

complexos em que o etanol doa a ponte são distintas daquelas em que o etanol aceita a

ponte. A constante rotacional do eixo principal (A) varia entre 2.2 a 2.5GHz com o

etanol aceitador (Ph:Et), enquanto que para o etanol doador (Et:Ph) não passa de

1.7GHz. Mesmo tendo constantes rotacionais próximas, os complexos em que o

etanol é doador (Et:Ph) apresentam diferentes componentes e valor total do momento

de dipolo. A mesma observação pode ser tomada sobre os complexos em que o etanol

33

recebe a ponte (Ph:Et). Destes complexos destacam-se Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-2-in),

os quais possuem constantes rotacionais e momento de dipolo total muito similares,

mas componentes µA, µB, e µC completamente diferentes. Entre parênteses, para as

conformações Ph:Et(A-1), Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-1-out) são apresentados os valores

das geometrias equivalentes obtidas em nível HF/6-31G(d,p) por Spangenberg et al.

[34]. O fato da constante rotacional no eixo principal (A) ser maior acusa que o etanol

está mais afastado do fenol, isto é, os monômeros estão menos empacotados (como

destacado pelo valor de XH…O na Tabela 11). Não é possível traçar uma comparação

direta dos momentos de dipolo entre esse trabalho e o de Spangenberg et al. pelo fato

de serem diferentes tanto as geometrias e quanto o nível de cálculo. Entretanto,

preserva-se a relação de que Ph:Et(S-1-out) tem o maior momento de dipolo, seguido

de Ph:Et(A-1) e depois Ph:Et(S-1-in).

Tabela 13: Resultados para as constantes rotacionais e as respectivas componentes do momento de dipolo para os complexos fenol e etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ.

Constantes Rotacionais (GHz)

Momento de dipolo (Debye)

A B C µA µB µC µ

Ph:Et(A-1) 2.501 (2.899)

0.654 (0.533)

0.602 (0.499)

3.25 (3.41)

0.75 (1.25)

0.14 (0.76)

3.33 (3.71)

Ph:Et(A-2) 2.305 0.701 0.636 2.56 2.50 0.38 3.59

Ph:Et(S-1-in) 2.313 (3.003)

0.683 (0.528)

0.636 (0.480)

2.82 (3.33)

0.99 (1.22)

1.26 (0.19)

3.24 (3.55)

Ph:Et(S-1-out) 2.205 (3.113)

0.682 (0.479)

0.580 (0.429)

3.36 (3.86)

1.23 (1.02)

0.54 (0.45)

3.62 (4.01)

Ph:Et(S-2-in) 2.328 0.683 0.642 1.86 2.54 0.71 3.23

Et(S):Ph 1.664 0.961 0.793 1.51 1.60 1.84 2.87

Et(A):Ph 1.583 0.909 0.745 2.85 0.30 1.59 3.27

Et(S):π-Ph 1.496 1.065 0.853 0.51 1.59 1.76 2.46

Et(A):π-Ph 1.620 0.902 0.739 0.28 0.13 2.31 2.33

A Tabela 14 apresenta o resultado calculado para as seis freqüências

intermoleculares, dentro da aproximação harmônica, para cada um dos complexos

obtidos para fenol e etanol. Embora os modos intermoleculares tenham uma

34

componente anarmônica mais pronunciada que os modos intramoleculares, é

interessante analisá-los para obter algumas informações ainda que qualitativas.

Normalmente estes valores calculados encontram-se superestimados em relação aos

valores experimentais, já que a contribuição anarmônica diminui a diferença de

energia entre os auto-estados vibracionais. Desta forma é comum multiplicar tais

freqüências por um fator de escala empírico pouco menor que 1.0, a fim de corrigi-las

em direção ao resultado experimental [38,39,40]. Entretanto, é conhecido que para

modos de baixa freqüência (menores que 1000 cm-1) o MP2 contrariamente produz

resultados subestimados [41], de tal forma que se recomenda o fator de escala de 1.10,

quando utilizado com a base aug-cc-pVDZ.

Tabela 14: Resultados das freqüências intermoleculares (cm-1) para os complexos fenol e etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, as freqüências equivalentes advindas das

geometrias da referência 34 em nível HF/6-31G(d,p).

ρ2 β2 τ β1 ρ1 σ

Ph:Et(A-1) 34 (33)

50 (37)

53 (20)

89 (77)

111 (72)

182 (150)

Ph:Et(A-2) 24 72 52 90 119 168

Ph:Et(S-1-in) 41 (32)

72 (38)

13 (14)

93 (66)

130 (89)

178 (161)

Ph:Et(S-1-out) 34 (14)

16 (21)

61 (27)

98 (77)

122 (67)

165 (136)

Ph:Et(S-2-in) 23 65 39 98 114 174

Dadas as incertezas geradas pelos métodos utilizados no cálculo dessas

freqüências intermoleculares, optou-se por não escaloná-las. Acredita-se que o erro

em tais valores é de 10% [38,41]. Tais modos normais intermoleculares podem ser

visualizados na referência 42. A nomenclatura utilizada é a mesma da referência 34.

Para cada complexo, há dois modos de rocking, ρ (etanol saindo do plano do anel

fenólico); dois modos de wag, β (etanol circundando o eixo perpendicular ao anel

fenólico); um modo de torção em torno da ponte de hidrogênio, τ; e um modo de

estiramento da ponte de hidrogênio, σ. Os sub-índices 1 e 2 estão associados

respectivamente a movimentos translação e rotação em relação aos monômeros.

Ressalta-se que σ é um modo de translação e τ é um modo de rotação. Ainda na

Tabela 14, entre parênteses encontram-se as respectivas freqüências intermoleculares

da referência 34, e são colocadas apenas para comparação (já que o nível de cálculo e

35

as geometrias produzidas são diferentes). As caracterizações dos modos calculados τ,

ρ2 e β2 apresentados na tabela 3 da referência 34 são interpretadas de maneira distinta

neste trabalho, e podem ser conferidos na referência 43. Não foi possível também

caracterizar univocamente modo por modo com os resultados experimentais como

feito na referência 34. A princípio os confórmeros Ph:Et(A-1) e Ph:Et(A-2) poderiam

se intercambiar através dos modos de wag (β1 e β2), mas a barreira correspondente

não foi calculada. O mesmo vale para os confórmeros Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-2-in).

Os modos dos complexos em que o etanol doa a ponte de hidrogênio não foram

analisados. Estes se diferenciam substancialmente daquelas em que o etanol aceita,

dado o posicionamento do etanol sobre o anel fenólico. Nesses complexos (Et:Ph), o

etanol não interage apenas via ponte de hidrogênio, mas também com a nuvem π do

fenol e a cadeia carbônica do etanol. Uma complicação adicional é o fato da energia

de ligação ser menor, ou seja, o sistema é menos ligado. Isso implica que os erros nos

modos vibracionais são ainda maiores. Desta maneira, é muito difícil determinar e

caracterizar tais modos vibracionais.

Tabela 15: Importantes freqüências intramoleculares (cm-1) de torção τHOCC, estiramentos simétricos νCH2 e νCH3, e estiramento νHO do etanol dentro dos complexos estudados em nível

MP2/aug-cc-pVDZ. Respectivos desvios em relação aos monômeros, entre parênteses.

Etanol τHOCC νCH2 νCH3 νHO

Ph:Et(A-1) 376 (72)

3064 (21)

3073 (-1)

3811 (-19)

Ph:Et(A-2) 319 (15)

3057 (14)

3073 (-1)

3820 (-10)

Ph:Et(S-1-in) 348 (63)

3079 (22)

3059 (-2)

3803 (-17)

Ph:Et(S-1-out) 297 (12)

3080 (23)

3062 (1)

3817 (-3)

Ph:Et(S-2-in) 319 (34)

3079 (22)

3058 (-3)

3808 (-12)

Et(S):Ph 494 (209)

3046 (-11)

3059 (-2)

3794 (-26)

Et(A):Ph 508 (204)

3032 (-11)

3068 (-6)

3779 (-51)

Et(S):π-Ph 305 (20)

3052 (-5)

3058 (-3)

3773 (-47)

Et(A):π-Ph 348 (44)

3027 (-16)

3069 (-5)

3776 (-54)

36

Tabela 16: Importantes freqüências intramoleculares (cm-1) de torção τHOCC, estiramento simétrico ν(CH)5, e estiramento νHO do fenol dentro dos complexos estudados em nível MP2/aug-cc-

pVDZ. Respectivos desvios em relação aos monômeros, entre parênteses.

Fenol τHOCC ν(CH)5 νHO

Ph:Et(A-1) 785 (456)

3232 (-4)

3521 (-287)

Ph:Et(A-2) 732 (402)

3233 (-3)

3561 (-247)

Ph:Et(S-1-in) 710 (381)

3232 (-4)

3546 (-262)

Ph:Et(S-1-out) 704 (375)

3232 (-4)

3580 (-228)

Ph:Et(S-2-in) 733 (404)

3233 (-3)

3549 (-259)

Et(S):Ph 338 (8)

3237 (1)

3794 (-14)

Et(A):Ph 337 (7)

3237 (1)

3795 (-13)

Et(S):π-Ph 328 (-1)

3239 (3)

3800 (-8)

Et(A):π-Ph 335 (6)

3239 (3)

3802 (-6)

A Tabela 15 apresenta os resultados calculados para algumas freqüências

vibracionais intramoleculares do etanol para os complexos estudados, e sua variação

em relação aos monômeros isolados (veja Tabela 8). A Tabela 16 faz o mesmo para o

fenol (veja Tabela 1). Em relação à ponte de hidrogênio, como esperado, os modos de

torção (τHOCC) desviam para o azul (valores positivos), enquanto que os modos de

estiramento (νHO) desviam para o vermelho (valores negativos). Para os complexos

em que o fenol doa a ponte de hidrogênio, Ph:Et(A-1) fornece o estiramento e a torção

de maior desvio, tanto para o fenol quanto para o etanol. Os complexos em que o

etanol doa a ponte de hidrogênio possuem desvios menores em relação àquelas em

que o etanol aceita. O desvio para o vermelho dos modos de estiramento (νHO) pode

ser correlacionado com a variação do comprimento OH da ligação [44] (veja Tabela 9

e Tabela 10). O maior alargamento de ligação ocorre para o Ph:Et(A-1) (0.014Å) em

concordância com o maior desvio para a freqüência (-287cm-1). A boa concordância

desta correlação é apresentada na Tabela 17. A Figura 10 ilustra esta boa

concordância para todos os pontos.

37

Figura 10: Ilustração da correlação entre os módulos dos desvios nos modos de estiramento OH (νHO) e a variação no estiramento da distância OH, referente ao doador da ponte de hidrogênio [44]. O ajuste foi feito apenas com os dados relativos aos confórmeros Ph:Et (veja Tabela 17).

Tabela 17: Correlação entre os desvios nos modos de estiramento OH (νHO) e a variação no estiramento da distância OH, referente ao doador da ponte de hidrogênio [44].

∆νHO (cm-1)

∆RHO (Å)

Ph:Et(A-1) -287 0.014 Ph:Et(A-2) -247 0.012 Ph:Et(S-1-in) -262 0.013 Ph:Et(S-1-out) -228 0.011 Ph:Et(S-2-in) -259 0.013 Et(S):Ph -26 0.003 Et(A):Ph -51 0.003 Et(S):π-Ph -47 0.003 Et(A):π-Ph -54 0.004

Ainda na Tabela 15, as variações nas freqüências dos modos de estiramento

simétricos νCH2 são maiores que νCH3, indicando a proximidade da ponte de

hidrogênio. Quando o etanol doa a ponte de hidrogênio, o desvio em νCH2 inverte seu

sinal. A pequena variação nas freqüências do modo ν(CH)5 indicam que a presença do

etanol afeta pouco o anel fenólico (Tabela 16). Os resultados para os modos

associados diretamente com as pontes de hidrogênio são diferentes daqueles

reportados na referência 34 para caracterização do espectro experimental. O valor

experimental do estiramento OH do fenol é reportado com o mesmo valor (3432cm-1)

38

para os complexos em que o etanol recebe a ponte (Ph:Et). Os valores calculados com

MP2/aug-cc-pVDZ variam de 3521cm-1 para o Ph:Et(A-1) até 3580cm-1 para Ph:Et(S-

1-out). Os respectivos valores calculados por Spangenberg et al. [34] diferem apenas

4cm-1. A freqüência de estiramento OH do etanol anticlinal é em média maior do que

a do etanol synclinal, nos complexos estudados (veja na Tabela 15). Tal resultado era

esperado por Spangenberg et al. [34], e junto com as freqüências νCH2 e νCH2 do

etanol, foi utilizado na interpretação do espectro experimental. Entretanto não é

possível associar de maneira única cada um dos complexos com os espectros

experimentais apresentados, como feitos na referência 34.

Tabela 18: Desvio padrão das freqüências vibracionais (cm-1) utilizando o fator de escala empírico de 0.95, em relação às freqüências experimentais associadas com o etanol anticlinal (A)

e synclinal (S) reportados por Spangenberg et al. [34].

Ph:Et A S A-1 34 31 A-2 23 20 S-1-in 32 26 S-1-out 26 18 S-2-in 31 25

Utilizando metodologia similar a de Sinha et al. [41], procurou-se um fator de

escala empírico para multiplicar as freqüências intermoleculares calculadas a fim de

fornecer o menor desvio padrão em relação às freqüências experimentais

intramoleculares apresentadas na referência 34. As freqüências calculadas podem ser

visualizadas na referência 42. Utilizando os modos de estiramento νOH, e os modos

simétricos νCH2 e νCH3 do etanol e ν(CH)5 do fenol, obteve-se um fator de 0.95 (com

apenas duas casas de precisão como sugerido por Irikura et al. [38]). Este resultado é

coerente com o valor de 0.96, recomendado por Sinha et al. [41] para freqüências

acima de 1000cm-1, com o nível de cálculo MP2/aug-cc-pVDZ. A Tabela 18

apresenta os desvios padrão obtidos com o fator de escala de 0.95 (ver referência

[41]).

A conformação Ph:Et(A-1), cuja conformação equivalente é utilizada no

trabalho de Spangenberg et al. [34], é a que menos combina (maior desvio padrão)

com as freqüências experimentais associadas ao complexo com etanol anticlinal. O

mesmo vale para a conformação Ph:Et(S-1-in). Com a informação apenas do desvio

39

padrão, poder-se-ia dizer que as conformações que melhor se ajustam às freqüências

experimentais são Ph:Et(A-2) e Ph:Et(S-1-out).

Finalmente, com o intuito de se comparar os resultados do espectro eletrônico

obtidos para os agregados de fenol e água, submeteram-se ao cálculo quântico os nove

complexos de fenol e etanol. Os resultados para o desvio em relação ao fenol isolado

são apresentados na Tabela 19. Como esperado [20,21,31,32,33,34] quando o fenol

doa a ponte de hidrogênio, a excitação eletrônica (de caráter π → π*) desvia para

menores freqüências, apresentando-se o contrário para o caso do fenol aceitando a

ponte de hidrogênio. Resultado similar, mas de menor desvio, é obtido para os

agregados que formam ponte H-π. Os resultados obtidos com TDHF, CIS e CIS(D)

apresentam valores similares quando o fenol doa a ponte de hidrogênio (Ph:Et).

TDB3LYP tem reciprocidade com os valores obtidos para fenol e água (Tabela 7). Ele

apresenta desvios maiores que os outros métodos, tanto para etanol doador quanto

aceitador. Para o caso das configurações H-π, TDB3LYP fornece um resultado

contrário ao esperado. É interessante notar que, para alguns agregados, a primeira

excitação com TDB3LYP possui caráter de transferência de carga intermolecular,

sendo que a transição π → π* aparece apenas na segunda excitação eletrônica. Os

valores experimentais reportados são -405cm-1 e -395cm-1 [31] e são associados

respectivamente com etanol anticlinal e synclinal por Spangenberg et al. [34]. Os

confórmeros que mais combinam com estes valores são respectivamente Ph:Et(A-1) e

Ph:Et(S-1-out). Não há resultado experimental para o etanol doador de ponte de

hidrogênio (Et:Ph). Mas para todos os métodos e clusters (com exceção do

TDB3LYP), as transições calculadas apresentam desvio para o azul.

Tabela 19: Resultados dos desvios do espectro eletrônico (cm-1) da transição π → π* do fenol para os complexos fenol e etanol em relação ao monômero. Diferentes métodos utilizando a mesma

base aug-cc-pVDZ. Os valores experimentais provêm das referências 31 e 34.

TDB3LYP TDHF CIS CIS(D) Exp. Ph:Et(A-1) -510 -377 -388 -377 Ph:Et(A-2) -708 -495 -497 -508

-405

Ph:Et(S-1-in) -456 -315 -320 -345 Ph:Et(S-1-out) -548 -360 -365 -359 Ph:Et(S-2-in) -761 -425 -423 -444

-395

Et(S):Ph 260 313 296 129 Et(A):Ph 230 337 310 172

Et(S):π-Ph -40 251 247 40 Et(A):π-Ph -16 203 202 25

40

Conclusões parciais

Foram obtidos nove diferentes agregados fenol-etanol (1+1), dos quais seis

nunca foram antes reportados. As geometrias foram otimizadas em nível MP2/aug-cc-

pVDZ, e sua estabilidade foi garantida através do cálculo dos modos vibracionais. As

energias de ligação foram calculadas considerando-se a energia de ponto zero,

correções de counterpoise da base e efeitos de deformação de geometria. A

configuração mais estável encontrada foi Ph:Et(S-1-in) (veja Figura 8) com energia de

ligação de 6.5 kcal/mol, condizente com as expectativas teóricas e experimentais (veja

o texto). Todas as configurações em que o fenol doa a ponte de hidrogênio possuem

energia de ligação calculada variando entre 6.0 e 6.5 kcal/mol. Por outro lado, quando

o fenol é aceitador, a energia de ligação é menor, variando entre 3.0 e 3.7 kcal/mol.

As freqüências inter e intramoleculares foram analisadas, e considerações sobre seus

valores, fatores de escala e correlação com as mudanças geométricas foram feitas. Em

especial foi caracterizada a transição π → π* do fenol. Observou-se que esta transição

apresenta um desvio sistemático para o vermelho quando o etanol é aceitador de ponte

de hidrogênio (Ph:Et), assim como um desvio para o azul quando este é doador

(Et:Ph). Este resultado está em plena concordância com as expectativas experimentais

e com os resultados obtidos para a água (veja a seção anterior).

41

3.3 Fase líquida: Simulação do fenol em água

Concluído o estudo dos agregados, fez-se a simulação computacional do fenol

em água [12]. Com o mesmo nível de cálculo usado para a otimização de geometria

da molécula isolada (MP2/aug-cc-pVDZ), utilizou-se o método CHELPG [45] para

ajustar cargas clássicas sobre os sítios atômicos que melhor descrevessem os

momentos de multipolo quânticos (de fase gasosa). Com a geometria da molécula

isolada, as cargas CHELPG e parâmetros Lennard-Jones estabelecidos na literatura

para o cálculo de fenol em água [46], construiu-se um modelo não polarizado para se

realizar a simulação clássica. Este modelo foi submetido à simulação em condições

normais no ensemble NpT (298K, 1atm), com 500 moléculas de água. Os parâmetros

utilizados para a água são os do modelo SPC de Berendsen [47]. Este modelo de fenol

foi polarizado através do processo iterativo utilizado em trabalhos anteriores pelo

grupo. Nesta metodologia, realiza-se uma simulação clássica, da qual é retirado um

número reduzido de configurações estatisticamente descorrelacionadas. Tais

configurações são submetidas ao cálculo quântico, sendo o fenol colocado

explicitamente e as camadas de solvatação descritas por cargas pontuais. Os

resultados deste método carregam toda a informação estatística do ensemble, e é

capaz de polarizar eficientemente o soluto. A novidade deste procedimento

introduzida por Coutinho et al. [48] e adaptada dos trabalhos de Aguilar e

colaboradores [49], é que ao invés de se fazer N cálculos quânticos para se fazer a

média, realiza-se apenas um único cálculo quântico com a média das configurações.

Isto só é possível porque o solvente é descrito por cargas pontuais e o soluto não é

flexível (ou seja, rígido) durante a simulação. Após a primeira iteração, novamente as

cargas no fenol são re-obtidas via CHELPG, mas que agora contempla polarização.

Para que o efeito desta polarização do soluto afete a estrutura do solvente a sua volta,

o processo de simulação é repetido iterativamente até que a variação do momento de

dipolo da molécula de referência flutue em torno de uma média (dentro de um desvio

aceitável). Neste ponto, considera-se que o soluto e o solvente estão em equilíbrio

eletrostático.

42

0 1 2 3 41.2

1.4

1.6

1.8

2.0

2.2

2.4

2.6

Dip

ole

mom

ent (

D)

Iteration number

Figura 11: Convergência do momento de dipolo do fenol utilizando processo iterativo e o ASEC [48] Cada ponto é resultado de uma simulação de MC, seguido de um único cálculo quântico

utilizando a "configuração média".

Na Figura 11 apresenta-se a convergência do momento de dipolo para as duas

condições termodinâmicas. A curva de convergência dos gráficos é um ajuste

exponencial, µi = µ[1 – A.exp(–Bi)], sobre o valor calculado do momento de dipolo. O

momento de dipolo calculado do fenol em água (último ponto) é dado por 2.25 D. Tal

valor é 75% maior que o valor calculado de fase gasosa (1.28 D). Nota-se que a

tendência do ajuste exponencial (i → ∞) é de 2.26 ± 0.02 D, atestando a convergência

do cálculo com quatro iterações. Na Tabela 20, os valores obtidos para as cargas

utilizadas na simulação são apresentados (fase gasosa e valor convergido para quarta

iteração).

Para a simulação com o modelo polarizado de fenol foram utilizados 50000

passos para o processo de termalização e mais 300000 de passos de trabalho. Separou-

se 100 configurações com uma correlação estatística menor que 10%. Para o cálculo

do espectro em meio líquido, primeiramente definiu-se as camadas de solvatação para

selecionar quantas moléculas de água são necessárias para a submissão aos cálculos

quânticos. Na Figura 12, a função de distribuição radial de centro de massa é

apresentada. Nota-se que a primeira camada possui um "ombro" em 4.0Å, referente às

43

pontes de hidrogênio. Com esta função de distribuição definiu-se que a primeira

camada possui de 25 a 35 moléculas de água.

Tabela 20: Valores obtidos para as cargas nos sítios atômicos do fenol, via CHELPG.

Átomo Carga (e) Fase gasosa Convergido C1 -0.2661 -0.2794 C2 0.3629 0.4222 C3 -0.1690 -0.2031 C4 -0.0774 -0.0832 C5 -0.1573 -0.1685 C6 -0.0248 -0.0406 O -0.5820 -0.7711 H1 0.1174 0.1484 H2 0.0803 0.1001 H3 0.1005 0.1064 H4 0.0870 0.1017 H5 0.1353 0.1432 H6 0.3933 0.5239 µ (D) 1.28 2.25

2 4 6 8 10 120.0

0.2

0.4

0.6

0.8

1.0

1.2

1.4

1º camada30 moleculas

g cm(r

)

r (Å)

Figura 12: RDF dos centros de massa soluto-solvente da simulação com fenol polarizado iterativamente. Apenas a primeira camada é bem definida.

44

O cálculo quântico do espectro é bastante custoso devido à necessidade do uso

de moléculas explícitas de solvente (com o conseqüente aumento de elétrons e

funções base). Tendo em mente que este custo tem um fator maior que N4, optou-se

por se fazer o cálculo das 100 configurações descorrelacionadas com diferentes

quantidades de moléculas de água explícitas, iniciando-se em zero e aumentado de

cinco em cinco até se obter a convergência. Optou-se também por se utilizar uma base

menor (6-31G) do que a utilizada no soluto (aug-cc-pVDZ). Isto pode ser feito apenas

porque a excitação é localizada no fenol. O método quântico utilizado foi o TDHF,

que forneceu resultados para o desvio equivalentes ao CIS(D). Outro fator que pesou

pela escolha desse método foi que seu custo é quase igual ao CIS, mas com resultado

um pouco melhor para o valor absoluto (veja seções anteriores).

0 5 10 15 20 25300

400

500

600

700

800 Águas explícitas + cargas pontuais ASEC

Des

vio

solv

atoc

rôm

ico

(cm

-1)

Número de moléculas de água explícitas

Figura 13: Convergência do espectro calculado com aug-cc-pVDZ no fenol e 6-31G no solvente, aumentando-se o número de moléculas de água explícitas sistematicamente.

A Figura 13 mostra a convergência do cálculo do espectro aumentando-se o

número de moléculas explícitas. O número total de moléculas de água (considerando

implícitas e explícitas) utilizadas para esses cálculos foram 200 (representando 11.5Å

de solvente). As moléculas não colocadas explicitamente foram descritas por cargas

pontuais. Assim, o resultado do desvio solvatocrômico com 25 moléculas de água

explícitas mais 175 descritas por cargas pontuais foi igual a 580 ± 35 cm-1. Tal valor é

quase o mesmo que o obtido com 20 moléculas de água explícitas mais 180 descritas

45

por cargas pontuais, 570 ± 34 cm-1, e que é coincidentemente similar ao resultado do

ASEC (565 cm-1). Destaca-se aqui que o ASEC deveria corresponder ao resultado da

média de cargas pontuais (485 ± 27 cm-1). Entretanto, Aguilar e colaboradores [49]

mostram que o método de carga média tende a fornecer maiores energias do que a

média dos cálculos de cada configuração descrita por cargas pontuais. Este argumento

é calcado na polarizabilidade (já que a configuração média suprime a polarização para

diferentes direções). Quanto maior a polarizabilidade, maior o erro na energia. É de se

esperar, portanto que o estado excitado resulte em energia maior ainda, aumentando-

se o desvio para o azul. Esta diferença é destacada na Figura 14. Nota-se que a

diferença é 80 cm-1, ou seja, 0.01 eV.

0 20 40 60 80 100200

300

400

500

600

700

ASEC (565 cm-1) Cargas pontuais (485 ± 25 cm-1)

Des

vio

solv

atoc

rôm

ico

(cm

-1)

Número de configurações

Figura 14: Diferença entre o ASEC (configuração média) e a média sobre o cálculo de cada

configuração descrita por cargas pontais.

46

0 5 10 15 20 250

2

4

6

8

Hor

as d

e C

PU p

or c

onfi

gura

ção

Número de moléculas de água explícitas

Figura 15: Custo computacional do cálculo do espectro do fenol com base aug-cc-pVDZ em água

descrita por 6-31G (mais cargas pontuais), com o método TDHF.

Na Figura 15 é apresentada o custo computacional dos cálculos do espectro do

fenol em água. Destaca-se a grande diferença dos tempos de CPU em se utilizar 20 e

25 águas explícitas (55% maior para 25 águas). Entretanto, dada a pequena diferença

no resultado de seus desvios solvatocrômicos (menor que 2%), decidiu-se por

continuar este trabalho com a análise das configurações de 20 moléculas explícitas de

água mais 180 descritas por cargas pontuais. Prosseguiu-se assim com a análise das

pontes de hidrogênio, a fim de identificar a contribuição destas para o desvio

solvatocrômico do fenol em água. Na Figura 16 é feito o histograma da energia de

pares, a fim de se identificar a energia característica das pontes de hidrogênio

utilizando-se o campo de força clássico. Nota-se que a energia é majorada em relação

ao valor obtido quanticamente para a energia de ligação dos complexos otimizados

(Tabela 3). Destas distribuições define-se uma energia de corte de -3.5kcal/mol para

as pontes de hidrogênio.

47

Figura 16: Histograma da energia de pares fenol-água. À esquerda, varredura em torno do fenol doado a ponte para a água (sítios H do fenol e O da água). À direita, varredura em torno do fenol

aceitando a ponte para a água (sítios O do fenol e H da água).

Em seguida é analisada a função de distribuição radial OO. Esta define uma

distância OO de 3.25Å para as pontes. Utilizando-se ainda o critério de 40º para o

ângulo O-OH, obteve-se uma média de 1.4 pontes para a água doadora de ponte e 1.0

pontes para água aceitadora. A Figura 18 ilustra, via sobreposição de configurações,

as pontes de hidrogênio formadas em solução.

Figura 17: Função de distribuição radial OO (fenol-água) para a definição das pontes de

hidrogênio.

48

Figura 18: Sobreposição das configurações de líquido contemplando apenas as pontes de

hidrogênio. À esquerda, pontes com água aceitadora (média de 1.0 pontes por configuração). À direita, pontes com água doadora (média de 1.4 pontes por configuração).

Assim, foi submetido ao cálculo quântico apenas as águas formadoras de

ponte de hidrogênio, excluindo-se das configurações do líquido todas as outras

moléculas de água. O desvio calculado apenas com as águas aceitadoras de pontes de

hidrogênio resultou em uma média de -435 ± 15 cm-1. O desvio com as águas

doadoras, 480 ± 20 cm-1. Assim como obtido para os complexos otimizados, seus

valores absolutos efetivamente se anulam. Dado o fato que o desvio do fenol em água

vai para o azul da mesma forma que a configuração otimizada W-Ph (Tabela 7), cria-

se a expectativa que em solução as água doadoras de ponte de hidrogênio dêem a

maior contribuição para o desvio total. Entretanto, ao se realizar o cálculo com ambos

os tipos de água (doadora e aceitadora), obtém-se somente 135 ± 25 cm-1 (25% do

valor obtido para o líquido, isto é com 20 moléculas de água explícitas e mais 180

descritas por cargas pontuais). De fato, ao se fazer o cálculo das configurações do

líquido, mas agora excluindo as moléculas de água que fazem as pontes, obtém-se 415

± 35 cm-1 (73% do valor obtido para o líquido). Conclui-se deste resultado que a

contribuição majoritária para o para o desvio do espectro do fenol em água não é dado

pelas pontes de hidrogênio, mas sim pelo efeito do bulk.

Tabela 21: Resultados para o espectro do fenol em água, analisando as diferentes contribuições.

Pontes Ph-W

Pontes W-Ph

Pontes Ph-W+ W-Ph

Líquido sem pontes

Líquido Exp. [6]

TD-HF -435 ± 15 480 ± 20 135 ± 25 415 ± 35 570 ± 35 460

49

Conclusões parciais

Realizou-se simulação de fenol em água (1+500) no ensemble NpT (1 atm,

298K) a fim de verificar a origem do desvio solvatocrômico do fenol. A água foi

descrita por um campo de força simples (SPC/E) e o fenol foi polarizado de acordo

com o protocolo Iterativo S-MC/MQ, utilizando o ASEC. Verificou-se que o ASEC é

um método eficiente e econômico para produzir a polarização no soluto, e que

também fornece uma boa estimativa para o desvio solvatocrômico. A função de

distribuição radial apontou que a primeira camada de solvatação do fenol é composta

por 30 moléculas de água. Verificou-se que utilizar todas as moléculas de água da

primeira camada para realização do cálculo de excitação eletrônica teria um alto custo

computacional. Foi então feita uma abordagem alternativa, onde se aumentou

sistematicamente o número de moléculas explícitas consideradas no cálculo, até se

obter a convergência. O valor calculado (570±35cm-1) está em bom acordo com o

resultado experimental (460cm-1). Adicionalmente foram identificadas as

contribuições para este desvio solvatocrômico. Verificou-se que o desvio do espectro

do fenol para o azul quando solvatado em água é causado basicamente pelo efeito do

bulk em torno do fenol, e não pelas pontes de hidrogênio como se pensava

inicialmente.

50

3.4 Fase líquida: Simulação do fenol em etanol

Nesta parte do trabalho são apresentados os resultados da simulação de fenol

em etanol, com o intuito de se comparar com o trabalho realizado do fenol em água.

Dada a flexibilidade da torção HOOC em líquido, optou-se primeiramente por

investigar a superfície de energia potencial ligada a esta coordenada, para verificar se

as energias de excitação dos modos de torção são menores que kbT. O cálculo da

superfície foi feito em nível MP2/aug-cc-pVDZ, variando-se o ângulo de torção em

intervalos de 10º, deixando o resto da molécula se adaptar. Desta forma foi possível

obter a barreira de transição entre as três conformações (Figura 19). Nota-se em um

giro completo há três mínimos, um em torno de 60º (synclinal), outro em torno de

180º (anticlinal) e outro em torno de 300º (synclinal). A energia de todos os pontos foi

subtraída da energia calculada para a conformação anticlinal (Tabela 8), de tal forma

que em 180º a energia é zero. Considerando-se o diedro independente dos outros

graus de liberdade do sistema, é factível resolver numericamente a equação de

Schrödinger para este potencial e encontrar a energia do estado fundamental para esta

coordenada.

Figura 19: Energia potencial e estado fundamental da torção HOCC do etanol.

Os valores das energias dos três primeiros estados são apresentados na Figura

19, cujas duas primeiras energias de excitação são 171cm-1 e 186cm-1. Dado que kbT

= 210cm-1 para 300K, qualquer um desses estados é acessível à temperatura ambiente.

Portanto se faz necessário considerar a flexibilidade da torção HOOC na simulação do

fenol em etanol.

51

Este trabalho foi realizado como o programa TINKER [50], e com o campo de

força flexível e polarizável AMOEBA [51]. Foi realizada dinâmica molecular no

ensemble NpT, em condições normais de pressão e temperatura (1 atm, 300K). O

algoritmo de integração utilizado foi o de Verlet, em conjunto com o termostato e

barostato de Berendsen. O passo de integração utilizado foi de 0.5ps, suficiente para

simulação com modelo flexível em condições normais. Foi utilizado o protocolo

padrão do AMOEBA, o qual não restringe os graus de liberdade internos das

moléculas. Também foi utilizado a correção de Ewald cujo efeito principal é corrigir a

interação coulombiana de longa distância. Foram utilizadas duas etapas de

termalização: uma de 100ns, e outra de 50ns. Na Figura 20 são apresentados os

valores da energia potencial intermolecular por molécula em cada passo. Espera-se

que tal valor seja coerente com a energia potencial do etanol puro. Vale lembrar que o

AMOEBA utiliza um potencial polarizável que depende da vizinhança, e não é

possível escrever esse potencial como uma soma de interação de pares. Portanto não

há como saber exatamente a contribuição do fenol para esta energia.

Figura 20: Energia potencial das configurações geradas durante o processo de termalização (últimos 50ns). A flutuação em torno de -9.6 kcal/mol indica que o sistema está próximo do

equilíbrio térmico.

52

Figura 21: Densidade durante o processo de termalização (últimos 50ns). A flutuação (sobe e desce) característica do uso do barostato indica que o sistema está próximo do equilíbrio térmico.

Na Figura 21 são apresentados os valores da densidade durante a segunda

parte do processo de termalização. Nota-se que a densidade inicialmente próxima a

0.785 g/cm3, diminui gradualmente até 0.775 g/cm3, para então subir novamente. Esta

flutuação (em torno de 0.78 g/cm3) serve de indicativo de que o sistema está

termalizado.

Garantida a termalização, efetuou-se a simulação. O passo de integração

utilizado foi o mesmo da termalização (0.5fs), entretanto efetuou-se 150ns de

simulação (300 mil passos). Na Figura 22 é apresentada a convergência do valor

médio da energia potencial por partícula. O erro apresentado é o erro estatístico

(desvio padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas).

Observa-se que o valor médio está muito bem convergido ao final da simulação. O

número total de configurações descorrelacionadas é obtido com o auxílio da função de

autocorrelação da energia (Figura 23). O número total de configurações

descorrelacionadas é 30 (tomando o 15% de correção entre as configurações, em um

intervalo de tempo de 5000ps). Desta forma, será necessário realizar pelo menos outra

simulação do mesmo tamanho, antes de realizar cálculos quânticos sobre essas

configurações. É conhecido que as propriedades quânticas calculadas convergem a

partir de 60 configurações descorrelacionadas. No trabalho realizado com a água,

procurou-se produzir 100 configurações descorrelacionadas.

53

Figura 22: Convergência do valor médio da energia potencial durante a simulação (150ns). O erro apresentado é o erro estatístico. Destaca-se o valor convergido (-9.548 kcal/mol).

Figura 23: Autocorrelação da energia potencial intermolecular. Com um intervalo de aproximadamente 5ns obtém-se menos de 15% de correlação.

A Figura 24 apresenta o histograma da energia potencial da simulação.

Observa-se que a distribuição é simétrica e se ajusta bem a curva teórica (gaussiana).

Este é um bom indicativo (mas não garante) que as configurações produzidas estão de

acordo com uma distribuição de Boltzmann (coerente com o ensemble NpT).

Ressalta-se que o termostato de Berendsen (utilizado na dinâmica molecular) não

garante a mesma distribuição do ensemble.

54

Figura 24: Distribuição da energia potencial intermolecular por partícula. A ocorrência é normalizada por um fator de 1000. A curva gaussiana foi feita utilizando-se o valor médio e o

desvio padrão da distribuição.

A Figura 25 apresenta a convergência da média da densidade durante a

simulação. A média acumulada flutuou em torno do valor médio total durante todo o

processo. Isso garante que a simulação foi iniciada de uma configuração termalizada.

O valor convergido 0.779 g/cm3 está em bom acordo com o resultado experimental

(0.789g/cm3). Esse é um bom indicativo da qualidade do campo de força (que não é

ajustado empiricamente). Já a Figura 26 apresenta a convergência da média da

pressão durante a simulação. Nos primeiros 50ns é clara a forte flutuação (algumas

configurações apresentam valores extremos de pressão, de -1000atm até 1000atm). É

conhecido que a pressão é uma propriedade de difícil convergência e que é necessário

um longo tempo de simulação para obter seu valor propriamente convergido. O uso

do termostato+barostato de Berendsen torna o cálculo da pressão muito instável. A

cada passo de integração é feita uma pequena mudança na energia cinética do sistema,

a fim manter a temperatura flutuando em torno do valor pré-fixado. Essa mudança

artificial na temperatura indiretamente muda o valor da pressão (veja Apêndice B).

Considerando-se essas dificuldades, o valor obtido (6 ± 8 atm) está condizente com as

expectativas. Nota-se aqui que a qualidade deste valor não depende do campo de

força, mas apenas do termostato/barostato utilizado, do tamanho do sistema, e do

tempo de simulação.

55

Figura 25: Convergência da média da densidade durante a simulação (150ns). O valor convergido é destacado pela linha verde (0.779 g/cm3). A convergência é obtida a partir de 100ns.

A escala do gráfico é a mesma da Figura 21. O erro estatístico é utilizado.

Figura 26: Convergência da pressão durante a simulação (150ns). Verifica-se que a convergência (dentro do erro estatístico) é obtida a partir de 60ns. Nota-se entretanto que as flutuações são

muito grandes.

56

Conclusões parciais

Realizou-se a simulação do fenol em etanol com o modelo flexível e

polarizável AMOEBA, utilizando o ensemble NpT. As propriedades termodinâmicas

calculadas são coerentes com os resultados esperados para esse sistema. A energia

potencial por molécula é -9.548 ± 0.016 kcal/mol, e está em excelente acordo com

simulações realizas com o potencial empírico OPLS (-9.69 kcal/mol) [52]. A

densidade calculada aqui 0.779 g/cm3 também se compara muito bem com o valor

experimental (0.789g/cm3) e com o resultado do OPLS (0.787 g/cm3) [52]. É

interessante notar que o AMOEBA não é parametrizado para reproduzir os resultados

experimentais, e portanto essa boa concordância é um forte indicativo de que este

modelo produz estruturas confiáveis.

57

Capítulo 4: Água supercrítica

Neste capítulo será apresentado o trabalho relacionado com a simulação da

água em torno de seu ponto crítico. O objetivo fundamental é compreender as

propriedades microscópicas e termodinâmicas da água nessas condições, e

determinação do ponto crítico do campo de força AMOEBA.

O ponto crítico é definido como o valor de pressão e temperatura para os quais

as diferenças entre os estados líquido e gasoso desaparecem. Na Figura 27, o

diagrama de fase de uma substância típica é apresentado. Nesta, observa-se que a fase

gasosa se encontra na região de menor pressão e maior temperatura, oposta à fase

sólida. A fase líquida surge no entremeio, a partir do ponto triplo. Do ponto triplo ao

ponto crítico, para a maioria das substâncias, as propriedades físicas da fase gasosa e

líquida diferem por ordens de grandeza e de maneira descontinua (linha azul). Esta

descontinuidade diminui gradativamente à medida que se aproxima do ponto crítico.

A partir deste ponto, conhecida como região supercrítica, a transição entre as fases

líquida e gasosa não é mais perceptível. Nesta região as propriedades passam a variar

continuamente, entretanto nas proximidades do ponto crítico esta variação ainda é

brusca.

Figura 27: Diagrama de fase de uma substância típica.

58

Ordenados pela massa, nas figuras abaixo é apresentada a pressão e a

temperatura crítica de uma série de substâncias [53].

0 50 100 150 200 2501

10

100

CH 4

C 2H 6

C 3H 8

C 4H 10

C 5H 12

C 6H 14

C 7H 16

C 8H 18

C 9H 20

C 10H 22

C 11H 24

C 12H 26

C 13H 28

C 14H 30

C 15H 32

C 16H 34

C 17H 36

C 18H 38

CH 4O

C 2H 6

O

C 3H 8

O

C 4H 10

O

C 5H 12

O

C 6H 14

O

C 7H 16

O

C 8H 18

O

C 9H 20

O

C 10H 22

O

C 11H 24

O

He

Ne

ArKr Xe

H2O

Alcanos Alcenos Ciclo-alcanos Álcoois Gases nobres

p c(atm

)

m(g/mol)

0 50 100 150 200 250

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

CH4

C2 H

6

C3 H

8

C4 H

10

C5 H

12

C6 H

14

C7 H

16

C8 H

18

C9 H

20

C10 H

22

C11 H

24

C12 H

26

C13 H

28

C14 H

30

C15 H

32

C16 H

34

C17 H

36

C18 H

38

CH

4 O

C2 H

6 O

C3 H

8 O

C4 H

10 O

C5 H

12 O

C6 H

14 O

C7 H

16 O

C8 H

18 O

C9 H

20 O

C10 H

22 OC

11 H24 O

He

Ne

Ar

Kr

Xe

H2O

Alcanos Alcenos Ciclo-alcanos Álcoois Gases nobres

Tc(K

)

m(g/mol)

Figura 28: Pressão (acima) e temperatura crítica (abaixo) de algumas substâncias.

59

O ponto crítico é ao mesmo tempo um ponto de mínimo e inflexão, ou seja,

∂p

∂υ T =

∂2p

∂υ2 T = 0. Desta forma é possível associar a pressão e a temperatura crítica (1)

aos coeficientes a e b da equação de van der Waals [66]. Portanto os valores de

pressão e temperatura crítica são sensíveis ao volume médio e à força de coesão

molecular. Este fato ajuda a compreender porque os alcoóis possuem valores de

pressão e temperatura crítica superiores aos dos alcanos e inferiores aos da água.

Tc = 8a

27bkb

pc = a

27b2

(1)

A água em especial possui pressão e temperaturas críticas elevadas (216 atm e

647 K). A Figura 29 mostra o ponto crítico da água (em rosa) ao fim da linha de

coexistência líquido-gás. Qualitativamente é possível associar a “fase líquida” com a

região laranja da figura, e a “fase gasosa” com a região azul. Observa-se que

∂2ρ

∂T2 p < 0

e

∂2ρ

∂p2 T < 0 para a fase líquida,

∂2ρ

∂T2 p > 0 e

∂2ρ

∂p2 T > 0 para a fase gasosa. O ponto crítico

marca a região de inflexão, a qual se entende dentro da região supercrítica.

Figura 29: Diagrama de fase da água. Densidade em função da pressão e temperatura.

60

Ainda na Figura 29 observa-se que a densidade em torno do ponto crítico

dobra em uma ou duas unidades de pressão e temperatura. Da mesma forma, outras

propriedades físicas como a energia e o calor específico também sofrem imensas

flutuações nesta região. Realizar simulações computacionais em tais condições é um

grande desafio teórico que vem sendo realizado desde o final dos anos 80 [54].

Experimentalmente sabe-se que a rede de pontes de hidrogênio característica da água

em condições normais é parcialmente desfeita. Em seu lugar formam-se agregados de

diferentes tamanhos, formando regiões descontínuas [55]. Isto implica um maior

tempo de simulação (ou quantidade de partículas) para se obter as mesmas

propriedades termodinâmicas calculadas em condições normais. Os métodos de

cálculo de primeiros princípios ainda são demasiadamente caros e pouco eficientes

para serem utilizados nessas condições. É sabido que as propriedades termodinâmicas,

como densidade e pressão, não são bem descritas por cálculos DFT [56]. Isso se deve

ao fato de que tais propriedades são muito sensíveis a pequenas imprecisões na

energia de troca e correlação, mesmo em condições normais [56]. Desta forma tais

simulações, quando realizadas, são feitas com densidade constante, ignorando-se

completamente algumas propriedades como pressão e entalpia de vaporização [57].

Mesmo com o grande avanço computacional dado pelo processamento distribuído nos

últimos anos, as simulações ab initio ainda utilizam um número muito reduzido de

moléculas [58]. Por outro lado, os modelos clássicos rígidos podem não descrever

corretamente as grandes flutuações que surgem no ambiente supercrítico. É sabido

que os modelos polarizáveis costumam não propiciar resultados melhores para a

pressão e temperatura crítica do que os modelos não-polarizáveis [56]. A explicação

desta aparente falha reside no fato de que tais modelos costumam ser parametrizados

para descrever as propriedades termodinâmicas em condições normais. Outro aspecto

importante é que a polarizabilidade usada em tais modelos normalmente é a de fase

gasosa [56]. Desta maneira costuma-se fazer um balanço entre o custo computacional,

capacidade de reproduzir bem o ambiente complexo e descontínuo da região

supercrítica, e as propriedades termodinâmicas em torno de dessa região.

Surpreendentemente um dos modelos de água mais utilizado é o SPC/E [47, 59].

Estabelecido para este tipo de simulação em um importante trabalho de Guissani e

Guillot [60], o SPC/E subestima um pouco a pressão crítica (186atm calculado contra

217atm experimental) e concorda muito bem com a densidade crítica (0.326g/cm3

61

calculado contra 0.322g/cm3 experimental) e a temperatura crítica (651.7K calculado

contra 647.1K experimental). Não se deve esquecer, entretanto, que nesta região as

moléculas de água estão sujeitas a um ambiente extremamente inomogêneo, e que o

SPC/E é um modelo rígido e não polarizável. Isto implica que mesmo fornecendo boa

concordância para algumas propriedades termodinâmicas, este modelo deve perder

detalhes importantes da interação na vizinhança molecular. Após investigar a

literatura, decidiu-se investigar a estrutura microscópica e as propriedades

termodinâmicas da água em torno da região supercrítica utilizando um modelo

flexível e polarizável. O modelo escolhido foi o AMOEBA [51], proposto por Ren e

Ponder em 2002. Desde então, tal modelo se mostrou eficiente para reproduzir

propriedades termodinâmicas e estruturais de diversos sistemas, tanto para sistemas

moleculares [61, 62] quanto iônicos [63].

62

4.1 Determinação do Ponto Crítico da Água usando o Modelo AMOEBA

Obter informações termodinâmicas de uma simulação em condições

supercríticas não é uma tarefa trivial. Dadas as imensas flutuações e esperada

inomogeneidade desse sistema, é necessário fazer alguns testes para verificar se os

resultados das simulações serão aceitáveis. Primeiramente investigou-se o efeito do

número de moléculas de água na densidade. Para esse fim, um modelo mais simples

foi usado: o SPC/E [47]. O ensemble utilizado foi o NpT (217atm, 647K). Foram

feitas simulações de dinâmica molecular com respectivamente 128, 256, 512, 1024,

2048, e 4096 moléculas de água. Foi utilizado o algoritmo de Verlet para a integração

das equações de movimento e o termostato/barostato de Berendsen para fixar a

pressão e temperatura [75]. Estas simulações foram feitas com intervalo de femto-

segundo com 100 mil passos, totalizando uma dinâmica de 100 nano-segundos.

Adicionalmente investigou-se a influência da soma de Ewald nas simulações,

notando aqui que o SPC/E não foi parametrizado com esta correção. O objetivo

principal desta etapa foi descobrir a viabilidade de se produzir estruturas em

condições supercríticas com uma caixa pequena (128 ou 256 moléculas de água).

Figura 30: Estudo da variação da densidade utilizando o modelo SPC/E (com e sem correção de Ewald) em função do número de partículas, no ensemble NpT, utilizando pressão e temperatura

do ponto crítico experimental. O erro apresentado é o erro estatístico (desvio padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas).

63

Figura 31: À esquerda: Configuração aleatória com 256 moléculas de água (SPC/E, NpT, utilizando o ponto crítico experimental). As moléculas são representadas pelo método de

"superfície" (união das superfícies de van der Waals de cada molécula). É visível regiões sem nenhuma molécula de água, criando buracos na estrutura que atravessam a caixa de simulação.

À direita: Configuração aleatória com 500 moléculas de água (SPC/E, NpT, utilizando as condições normais de pressão e temperatura, proveniente da simulação de fenol em água). Não

há descontinuidades visíveis na estrutura.

A Figura 30 apresenta o valor da densidade para o SPC/E, com e sem a

correção de Ewald, para os diferentes tamanhos de caixa (número de moléculas).

Originalmente o TINKER (programa utilizado para fazer as simulações com o

AMOEBA) não possibilitava que se definisse a fronteira da caixa como raio de corte

(isso é necessário no ensemble NpT, já que o tamanho da caixa muda durante a

simulação). Desta forma o TINKER foi modificado para que o raio de corte das

interações fosse sempre igual à metade do tamanho da caixa. Com menos de 256

moléculas de água a utilização ou não da soma de Ewald muda consideravelmente o

resultado da simulação. Portanto o uso desta correção é relevante nestas condições se

o número de partículas é reduzido. A densidade obtida para valores superiores a 512

moléculas de água (aproximadamente 0.45g/cm3) é razoavelmente boa comparada

com a experimental (0.3g/cm3), e corrobora o fato do SPC/E ser amplamente utilizado

em simulações na região supercrítica. A Figura 31 apresenta uma das configurações

com 256 moléculas de água. Sua estrutura é formada de agregados e "vacâncias", de

tal forma que em cada direção é possível contar um ou dois agregados, cada um com

poucas moléculas de água. Desta forma, deve-se imaginar que a simulação não é

realizada com moléculas de água, mas sim com agregados formados por estas

moléculas. Tais agregados interagem e trocam partículas entre si. Isso implica que as

64

condições periódicas de contorno criam um vínculo artificial quando há poucas

moléculas de água no sistema. Este é um bom indicativo do porque há tanta variação

na densidade quando se simula com um número reduzido de partículas (Figura 30). A

única maneira de contornar este problema é utilizar o máximo número possível de

partículas nas simulações. Entretanto o custo computacional escalona no mínimo com

N2 (dado que o raio de corte utilizado aqui é sempre metade da caixa). Há também o

fato que o campo de força AMOEBA [51] utiliza um processo autoconsistente para

gerar os multipolos induzidos em cada sítio atômico, fazendo dele pelo menos 40

vezes mais dispendioso computacionalmente que o SPC/E. Uma simulação com 100

nano-segundos leva cinco dias com 256 moléculas de água3, e são necessárias

algumas centenas de simulações para se determinar o ponto crítico com alguma

precisão.

Após compreender o que seria enfrentado, foi realizada a busca pelo ponto

crítico da água utilizando o modelo AMOEBA (aparentemente não reportado na

literatura). Sabendo-se que 128 moléculas de água não descreveriam adequadamente a

estrutura da água supercrítica, e devido aos limitantes custos computacionais, optou-

se por utilizar 256 moléculas de água. Esta é a mesma quantidade de moléculas

utilizadas nas simulações de Guissani e Guillot para a determinação do ponto crítico

do SPC/E em 1993 [60]. Realizou-se uma primeira simulação em torno do ponto

crítico experimental, no ensemble NpT, e se percebeu que o resultado para a

densidade era surpreendentemente subestimado (em torno de 0.13 g/cm3). Foi

utilizada a correção de Ewald (dado o protocolo do AMOEBA), com ewald-fraction

igual a 0.25 (utilizando 7 vetores k, o que produziu uma diminuição do tempo de

cálculo sem afetar a precisão do potencial). Da mesma forma que nos testes iniciais

com o SPC/E, foi utilizado o algoritmo de integração de Verlet e o

termostato/barostato de Berendsen [75]. A geometria da água foi mantida fixa através

do algoritmo rattle [64].

Em seguida, foram feitas aproximadamente 200 simulações a partir deste

ponto, diminuindo-se a temperatura e aumentando-se a pressão, em busca da transição

de fase líquido/gás (Figura 32).

3 Valor aproximado considerando-se o cálculo serial em processador 64bits com 2.4GHz e 4MB de cache, sem a utilização de instruções específicas.

65

Figura 32: Varredura da superfície (T,p,ρ). Destacado (fora da superfície) em roxo, o ponto crítico experimental.

Quanto mais perto da transição líquido-gás (região avermelhada na Figura 32),

maiores se tornam as flutuações na densidade. Este resultado era obviamente

esperado. Tais simulações serviram como um indicativo de que o ponto crítico do

AMOEBA estava entre de 570-600K, 180-220atm e 0.25-0.35g/cm3. Entretanto

verificou-se que a utilização do ensemble NpT, mesmo sendo uma boa alternativa

para indicar a pressão e temperatura críticas do modelo, é ineficaz para sua correta

determinação. Desta forma decidiu-se realizar uma extensa série de simulações no

ensemble NVT em torno da região indicada pelas simulações anteriores. Foram 130

simulações, variando de 530 até 620K, e 0.194 até 0.760g/cm3. A fim de obter o valor

do ponto crítico, utilizou-se a mesma equação de estado (2) utilizada por Guissani e

Guillot no estudo do ponto crítico do SPC/E [60]. Nesta equação, x = (ρ*/T*1/4), onde

ρ* é a densidade reduzida (ρ/ρc) e T* é a temperatura reduzida (T/Tc), sendo o ponto

crítico dado por (ρc, Tc, pc).

p

ρkbT = F(x) – (1/T*)1/2 G(x)

F(x) = 1 + B1 x + B2 x2 + B3 x

3 + B4 x4 + B10 x

10 G(x) = C1 x + 2C2 x

2 + 3C3 x3 + 4C4 x

4 + 5C5 x5

(2)

66

Cada uma das simulações NVT consistiu de 100 nano-segundos de

termalização (procurando-se partir de simulações realizadas em pontos próximos) e

100 nano-segundos de simulação (passos de integração de 0.5 femto-segundo com

200 mil passos). A Figura 33 ilustra a convergência estatística de uma dessas

simulações. O trabalho intensivo para assegurar que todas as simulações partiram de

configurações adequadamente termalizadas levou meses, e utilizou algumas

ferramentas de software desenvolvidas durante esse doutorado.

Figura 33: Convergência da energia total (esquerda) e da pressão (direita) da simulação em temperatura de 620K e densidade de 0.30g/cm3. O erro apresentado é o erro estatístico (desvio

padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas). Em ambas as figuras é clara a convergência a simulação em 60ns.

Figura 34: Reprodução da figura 2 da referência 60.

67

Executar as simulações e conferir seus resultados é uma tarefa hercúlea.

Porém encontrar os coeficientes B e C (e também o ponto crítico) é uma tarefa ainda

mais complexa. A equação de estado utilizada para ajustar os pontos possui 12

parâmetros livres. Para encontrar estes parâmetros utilizou-se o método de mínimos

quadrados implementado no programa gnuplot [65]. Os valores iniciais para estes

coeficientes foram os mesmos reportados na referência 60 para os coeficientes da

água real. Aparentemente os coeficientes encontrados para a água com modelo

AMOEBA produzem isotermas que se ajustam melhor aos dados da simulação do que

às curvas e dados apresentados na referência 60 para a água com o modelo SPC/E

(reproduzido aqui na Figura 34). Na Tabela 22 é apresentado o resultado desse ajuste.

Com exceção dos coeficientes B10 e C5 (que determinam o comportamento da equação

nas condições subcríticas e normais) os parâmetros obtidos para o AMOEBA são

mais próximos daqueles ajustados para os dados experimentais do que os obtidos para

o SPC/E. Isso implica que em torno do ponto crítico, o AMOEBA apresenta uma

variação nas propriedades termodinâmicas que é mais próxima da água real do que o

modelo SPC/E. O ponto crítico para o AMOEBA (575K, 0.33g/cm3, 205atm)

apresenta a pressão crítica mais próxima do valor experimental (217.7atm). Por outro

lado, o ponto crítico do SPC/E (651.7K, 0.326g/cm3, 186.5atm) possui uma melhor

temperatura crítica quando comparada com o valor experimental (647.1K). Ambos os

campos de força fornecem uma excelente densidade crítica considerando-se a

imprecisão do ajuste.

Tabela 22: Parâmetros ajustados para a equação de estado (2). Os valores para SPC/E e Experimental foram retirados da referência 60. Nota-se que o ponto crítico experimental é

647.1K, 0.322g/cm3 e 217.7atm, e que os valores para "Experimental" apresentados na tabela mostram que a equação de estado não é exata.

SPC/E AMOEBA Experimental Tc(K) 651.7 575 652.3 ρ(g/cm3) 0.326 0.33 0.299 p(atm) 186.5 205 229.5

B1 8.480 6.414 6.630 B2 -13.45 -6.120 -5.849 B3 8.795 2.395 2.099 B4 -1.810 -0.2227 -0.1672 B10 2.297(10-4) 10-5 2.87(10-17) C1 11.32 8.004 8.151 C2 -9.127 -3.652 -3.492 C3 4.440 0.936 0.835 C4 -0.9888 -0.06623 -0.0514 C5 7.831(10-2) -2.2(10-3) 2.178(10-3)

68

Figura 35: Isotermas obtidas para o campo de força AMOEBA. Cada ponto representa uma simulação. O erro apresentado é o erro estatístico.

A Figura 35 apresenta as isotermas calculadas com a equação (2) e os

parâmetros da Tabela 22. Os pontos são aqueles obtidos das 130 simulações. A Figura

36 apresenta os mesmos pontos, mas agora representados por uma superfície (gerado

pelo programa gnuplot). Tal superfície é basicamente a mesma produzida pelos dados

experimentais, porém deslocada na temperatura (em 70K).

Figura 36: Diagrama de fase da pressão pela densidade e temperatura (NVT). Determinação do ponto crítico do AMOEBA.

69

Conclusões parciais

Foram realizadas centenas de simulações da água em torno do ponto crítico

experimental, utilizando diferentes modelos e diferentes números de partículas.

Observou-se que as propriedades termodinâmicas (e por conseqüência as estruturais)

são sensíveis ao número de moléculas na simulação quando esta é menor que 256.

Portanto conclui-se que este número é o mínimo aceitável para reproduzir com

alguma fidelidade as propriedades da água em torno do ponto crítico e na região

supercrítica. Adicionalmente foi determinado o ponto crítico do campo de força

polarizável AMOEBA. Seu ponto crítico (575K, 0.33g/cm3, 205atm) se compara

surpreendentemente bem com o resultado experimental (647K, 0.322g/cm3, 217.7atm)

dado o fato que ele não foi parametrizado para isso. Dado que este campo de força

apresenta polarização e flexibilidade, ele se torna uma alternativa mais confiável para

realização de simulações nesta região do que os modelos não flexíveis e não

polarizáveis comumente utilizados.

70

Capítulo 5: Retrospectiva, Conclusões e Perspectivas

Este projeto de doutorado foi iniciado no início de 2007 com o objetivo de

estudar as propriedades espectroscópicas do fenol em agregados, soluções e em

condições supercríticas. A simulação do fenol em condições normais, utilizando

diferentes solventes, campos de força e métodos de química quântica, foi realizada

com sucesso. O aluno desenvolveu os conhecimentos necessários para simular e

analisar não apenas propriedades termodinâmicas e eletrônicas em solução, mas

também interpretar mudanças conformacionais e desvios no espectro vibracional,

estimativas de energia de ligação, efeitos de polarização e deconvoluir suas diferentes

contribuições. Devido a limitações computacionais, não foi possível completar o

estudo da solvatação do fenol em água supercrítica (e não há perspectiva realista para

a realização dessa parte). Entretanto, foi realizado um estudo sistemático das

propriedades termodinâmicas e estruturais em condições supercríticas, incluindo a

determinação do ponto crítico do modelo polarizável AMOEBA. Conclusões parciais

de cada parte do trabalho apresentado nesta tese estão presentes no final de cada

seção.

Durante o último ano e meio, foi investido um enorme esforço para adquirir

conhecimentos relativos à programação em C/C++ (em especial otimização de código

e programação eficiente orientada a objeto), programação em paralelo (com o uso de

threads de processamento e comunicação inter-processual via sockets), e manutenção

de grandes projetos colaborativos com o uso de software do tipo subversion. Este

estágio se iniciou com a necessidade de desenvolver um programa para separar as

configurações da simulação de dinâmica molecular (principalmente relativo às

simulações em condições supercríticas) e fazer uma análise adequada sobre eles.

Partindo de scripts básicos em shell para uma implementação amadora em C, o

programa começou a ser escrito na virada de 2008 para 2009 como uma ampla

ferramenta de separação de configurações de acordo com as mais diversas opções

possíveis (distância, energia, ângulo de ligação, vetor definido pelo usuário, multi-

seleção, lista reversa, negativa, produção de distribuição radial, angular, vetorial,

energética...). Batizado de magno, logo se tornou um enorme bloco de difícil

manutenção, e se percebeu a necessidade de melhorar a técnica de programação e a

abordagem sobre ele. Após adquirir o conhecimento necessário para executar esta

71

tarefa, iniciou-se o processo de reescrita, executando isso de maneira modular e

organizada. Utilizando programação orientada a objeto, foram criadas classes de uso

universal para operar de maneira simples e eficiente sobre arquivos, buffers de texto,

listas, e variáveis dinâmicas. Ao mesmo tempo, foram criadas classes específicas para

operar sobre átomos, moléculas, campos de força, vetores e matrizes. Tais

ferramentas (classes) são otimizadas e eficientes, e obviamente não são restritas

"separação de configurações". Toda a dificuldade da otimização de algoritmos

básicos, operações de input/output e programação em paralelo são incluídas nessas

classes, facilitando e aumentando a flexibilidade do programador. Tais ferramentas

podem ser utilizadas em qualquer programa que execute operações sobre átomos e

moléculas. Isto implica que elas não estão restritas ao magno, mas podem se

manifestar em um projeto maior. Desta maneira foi iniciado o projeto OpenQMMM,

onde estas ferramentas de software podem ser desenvolvidas em alto nível de código

e organização, em colaboração aberta. A maior vantagem da "colaboração aberta" é a

minimização do tempo de programação e detecção de falhas (bugs), já que diferentes

programadores têm acesso ao mesmo código e desfrutam do trabalho em conjunto. O

exemplo mais simples do sucesso desse tipo de abordagem é o sistema operacional

linux. Há outras dezenas de projetos nesse mesmo princípio, entretanto não há

nenhum projeto nacional nesta área (mecânica molecular e mecânica quântica). A

pretensão principal após o término do doutorado é investir em tempo integral neste

projeto, aprimorando os programas existentes e desenvolvendo novos programas.

Na parte condizente à solvatação do fenol em etanol, simulações com modelo

flexível e polarizável foram realizadas, e aprimoramentos no programa magno estão

sendo feitas para a separação das configurações e sucessiva submissão destas ao

cálculo quântico. Este trabalho será fundamental para explicar a origem do desvio

solvatocrômico para o vermelho do fenol em etanol.

A próxima etapa da simulação da água supercrítica é produzir a contagem das

pontes de hidrogênio e tamanho dos agregados. Este resultado é fundamental na

comparação com o modelo rígido SPC/E, largamente utilizado na literatura.

Adicionalmente pretende-se realizar o cálculo da constante dielétrica e do espectro

eletrônico para comparação de tais propriedades com resultados experimentais.

72

Pretende-se executar a simulação do fenol em água supercrítica com pelo

menos 256 moléculas de água. Inicialmente pretendia-se realizar simulação clássica

com modelo polarizável e flexível. Entretanto, dada a provável desprotonação do

fenol (levando-o a fenoxi) em tais condições, é necessário realizar dinâmica ab initio.

O programa escolhido para este fim é o CP2K, com DFT, funcional PBE e base m-

DZVP. Infelizmente, dado o alto custo computacional e a falta de máquinas, não há

perspectiva para o início dessas simulações. Para se ter uma comparação realista do

custo dos métodos utilizados neste trabalho, a simulação ab initio com 64 moléculas é

aproximadamente 30 vezes mais lenta do que a realizada com o AMOEBA com 256

moléculas, e 600 vezes mais lenta que com o SPC/E, também com 256 moléculas.

73

Apêndice A: Realizações no Doutorado

• Disciplinas obrigatórias

o Mecânica Quântica II;

o Teoria de Grupos e Simetrias em Física do Estado Sólido e Física

Molecular.

• Artigos publicados:

o R.C. Barreto, K. Coutinho, H.C. Georg, S. Canuto, "Combined Monte

Carlo and quantum mechanics study of the solvatochromism of phenol

in water. The origin of the blue shift of the lowest pi-pi* transition",

Phys. Chem. Chem. Phys. 11 (2009) 1388.

o R.C. Barreto, S. Canuto, "Characterization and spectroscopy analysis

of phenol-ethanol hydrogen bonded clusters", Chem. Phys. Lett. 496

(2010) 236

• Participação em eventos:

o XIV Simpósio Brasileiro de Química Teórica (Poços de Caldas/MG

2007) com apresentação de pôster: "Espectro do Fenol em Água em

Condições Normais e Supercríticas, incluindo polarização do soluto";

o II Escola de Computação de Alto Desempenho (São Carlos/SP 2007)

com apresentação de pôster: "Montando um Sistema Integrado de

Desktops";

o II Encontro Anual da Rede Theo-Nano (São Paulo/SP 2007) com

apresentação oral: "Espectro do Fenol em Água";

o II Simpósio de Estrutura Eletrônica e Dinâmica Molecular (Brasília/DF

2008) com apresentação do pôster: "Análise do espectro eletrônico do

fenol em água, separação de diferentes contribuições".

• Estágio:

o Estada de 4 meses (setembro a dezembro de 2008) dentro do programa

CAPES/GRICES-FCT de cooperação com o grupo do Prof. Benedito

José Costa Cabral na Universidade de Lisboa, Portugal, desenvolvendo

conhecimentos de dinâmica molecular.

• Conhecimentos acadêmicos extraordinários:

74

o Montagem, instalação, configuração e manutenção do cluster do Grupo

Física Molecular e Modelagem. Parte deste trabalho pode ser

encontrada em http://ac.if.usp.br/~barreto/cluster.htm

o Criação e manutenção do projeto de software livre OpenQMMM, cujo

objetivo primário é desenvolver e aprimorar ferramentas de software

utilizadas nos trabalhos relacionados com simulação molecular e

cálculo quântico. O objetivo secundário é criar um projeto sólido de

colaboração open source entre desenvolvedores no país (algo

inexistente até o momento). A página do projeto e informações podem

ser encontradas em https://sourceforge.net/projects/openqmm.

75

Apêndice B: Mecânica Molecular - Líquidos

Cada propriedade termodinâmica é obtida através da média desta sobre todas

as configurações acessíveis ao sistema. Como as coordenadas moleculares variam

continuamente, a soma torna-se uma integral, a qual deve ser efetuada sobre uma

determinada região desse espaço de configurações. Cada ponto deste espaço

representa uma diferente configuração de posição e velocidade de cada partícula. Isto

implica em 6 coordenadas por partícula (x, y, z, vx, vy, vz) e portanto qualquer função

relacionada a este espaço possui 6N variáveis (onde N é o número de partículas). O

método numérico mais simples de integração consiste em dividir certo intervalo x em

n porções de tamanho dx, e somar a função n vezes. Desta forma a integração

numérica de uma função com 6N variáveis necessita, a princípio, da ordem de n6N

operações para ser realizada. Considerando-se que um processador moderno realiza

da ordem de 1010 operações por segundo, a integração numérica de um sistema com

algumas dezenas de partículas é completamente impraticável.

Uma das soluções mais inteligentes para se evitar a integração numérica sobre

todo o espaço consiste em avaliar apenas uma ínfima, mas representativa, parte do

ensemble. Mais precisamente, isso significa fazer uma amostragem. Pressupondo-se

que se conheça a distribuição das configurações, poder-se-ia sorteá-las em quantidade

suficiente para se obter o valor convergido da propriedade física que se tem interesse

em calcular. Desta forma é utilizada a simulação computacional para gerar

configurações segundo as condições de contorno e os vínculos que determinam o

ensemble. Há duas maneiras de se realizar esta tarefa: determinista e estocástico. O

determinista consiste em gerar uma configuração a partir de outra de maneira

dinâmica; utilizando-se das forças de interação para atualizar as coordenadas do

sistema, através de incrementos da variável temporal. Este método é conhecido por

dinâmica molecular. O método estocástico consiste em produzir configurações por

meios aleatórios, sorteando-as segundo a distribuição característica do ensemble. Este

método de amostragem estocástica é conhecido como Monte Carlo.

Monte Carlo

O método de Monte Carlo (MC) consiste em sortear pontos do espaço das

configurações. Cada ponto é representado por Γk = Γ{R,P}, onde k numera a

configuração, R se refere ao conjunto de coordenadas de posição e P de momento, de

76

todas as partículas. O valor médio de uma função ƒ(R,P) é definido pela (3). Nesta,

w(Γk) é a probabilidade de o sistema ser encontrado na configuração Γk, e M é o

número total de pontos utilizados no cálculo da média [66].

⟨ƒ(R,P)⟩ = ∑

M

k=1 ƒ(R,P) w(Γk)

∑ M

k=1 w(Γk)

(3)

Se todas as configurações sorteadas forem equiprováveis, w(Γk) = 1. Esse é o

caso do ensemble microcanônico (NVE). Como a energia potencial é dependente das

distâncias intermoleculares e a cinética pode assumir apenas valores positivos, apenas

uma complicada e descontínua superfície do espaço das configurações é acessível

neste ensemble. A alternativa direta é o uso do ensemble canônico, cujas condições de

contorno são NVT. Desta forma o número de configurações acessíveis aumenta, já que

a energia flutua em torno de um valor médio. O ensemble canônico é caracterizado

pela distribuição de probabilidades w(Γk) = exp(–βEk), onde Ek é a energia da

configuração Γk e β = 1/kbT (onde kb é a constante de Boltzmann e T é a temperatura).

Com isto, utiliza-se o teorema da eqüipartição da energia, no qual cada coordenada

quadrática na equação da energia (x2, y2, z2, px2, py

2, pz2) produz uma contribuição de

½kbT para a energia interna do sistema. A energia cinética total é dada por (3/2)NkbT.

Portanto para obter a energia total do sistema utilizando o método de MC no ensemble

canônico basta sortear configurações de posição R e utilizá-las na (4), generalizando-

se este procedimento a qualquer propriedade estrutural.

⟨E⟩ = 32 NkbT +

∑ M

k=1 Uk(R) exp( )– β Uk(R)

∑ M

k=1 exp( )– β Uk(R)

(4)

Método de Metropolis

O uso do ensemble canônico reduz a dificuldade de se sortear as

configurações. Porém uma análise atenta da função energia potencial em um

condensado mostra que esta pode aumentar algumas ordens de grandeza com

pequenas diminuições das distâncias intermoleculares [67]. Tal constatação implica

77

que a maior parte do espaço das configurações possui peso estatístico quase nulo,

como se as partículas tendessem a se localizar centradas em pequenas células

individuais definidas pelo seu volume livre, υf* = ∫dυ exp(– β U(R)) [1]. Portanto

sortear com a mesma probabilidade qualquer configuração Γ{R} ainda é um método

muito ineficiente. Metropolis et al., em 1953, apresentou uma forma de contornar esta

ineficiência [68]. Ao invés de escolher configurações aleatoriamente e depois

executar uma média ponderada, faz-se um MC modificado, em que se escolhem as

configurações Γ{R} segundo seu peso estatístico para então realizar uma média

simples. Isto é feito com a ajuda de uma cadeia de Markov [69,70]. Nesta, uma

configuração Γj é obtida a partir de outra Γk fazendo-se {xj = xk + αξk}, onde x

contempla todas as 3N coordenadas de posição, α é o deslocamento máximo

(arbitrário) na direção x, e ξ é um número aleatório entre –1 e 1. Feito isto, calcula-se

a energia da nova configuração. Se ∆U = Uj – Uk ≤ 0, o movimento é aceito e a nova

configuração é registrada. Se ∆U > 0, o movimento é aceito com probabilidade w(Γk

→ Γj) = exp(– β ∆U); ou seja, sorteia-se um número ξ entre 0 e 1; se ξ ≤ w(Γk → Γj), o

movimento é aceito e a configuração Γj é registrada; se ξ > w(Γk → Γj), o movimento

é rejeitado, registrando-se novamente a configuração Γk. As configurações obtidas

com tal procedimento reproduzem a distribuição canônica, e qualquer propriedade

⟨ƒ(R)⟩ pode ser calculada através de uma média simples sobre o valor ƒk(R) referente

a cada ponto Γk selecionado (5).

⟨ƒ(R)⟩ = 1M

∑ M

k=1 ƒk(R) (5)

Para a utilização deste método no ensemble isotérmico-isobárico (NpT), deve-

se incluir o termo relacionado ao trabalho mecânico (pV) associado à variação do

volume. Como a soma sobre as coordenadas de posição R é vinculada ao volume V do

sistema, o número de pontos acessíveis à variável R é proporcional ao hiper-volume

VN do espaço das configurações. Para eliminar este vínculo, faz-se a transformação {xi

= L qi}; onde L é proporcional à raiz cúbica do volume, de forma que dR = VN dQ,

onde Q é a nova coordenada de posição adimensional, independente do volume do

sistema. Como conseqüência o teste de Metropolis se modifica: se [∆U + p∆V –

(N/β)ln(Vj/Vk)] ≤ 0, o movimento é aceito e a nova configuração é registrada; caso

contrário, ele é aceito com probabilidade w(Γk → Γj) = exp[– β(∆U + p∆V) + N ln(Vj/Vk)].

78

Dinâmica Molecular

Outra forma de se amostrar o espaço das configurações de um líquido é

através da evolução temporal do sistema. Isto é feito partindo-se de um conjunto

inicial de posições e velocidades (Γ(t) = Γ{R,P}) e tendo em mãos uma expressão

para a energia potencial do sistema (U(R)). Com isto é possível calcular as forças

entre as partículas (F(r) = -∇∇∇∇rU(R)), e finalmente utilizar as leis de Newton para

atualizar suas posições e velocidades, (Γ(t+δt)). Isso foi realizado pela primeira vez

em 1956 por Alder e Wainwright [71], para estudar a transição de fase em um sistema

de esferas rígidas. Em 1964, Rahman foi o primeiro a simular um líquido real

(argônio) [72]. Os métodos de integração mais utilizados para resolver as equações de

movimento e obter Γ(t+δt) a partir de Γ(t) são aqueles conhecidos por diferenças

finitas [75]. Há dezenas de possíveis algoritmos que utilizam diferentes aproximações.

A escolha do algoritmo depende de certos requisitos básicos. É desejável que o passo

de integração (δt) seja o maior possível, de tal forma que se economize tempo de

computação e que se produza o maior número possível de configurações

descorrelacionadas (como será explicado nas próximas seções). É também desejável

que o algoritmo seja o mais rápido (simples) possível ao mesmo tempo em que

reproduza fielmente a trajetória clássica e satisfaça as leis de conservação. Desta

forma, o algoritmo de integração pode variar com o sistema a ser simulado e o

ensemble (as propriedades que se deseje manter constante). Em especial, os graus de

liberdade moleculares afetam a escolha do método de integração. O passo de

integração utilizado para atualizar os movimentos intermoleculares pode não ser (e

comumente não é) adequado para os intramoleculares.

Algoritmo de Integração

Provavelmente o algoritmo de integração mais utilizado em dinâmica

molecular seja o de Verlet [73]. Isto se deve apenas a sua simplicidade, rapidez e

eficiência. Tal método parte da expansão de Taylor da posição em torno de t,

avançado e atrasado por δt, r(t+δt) e r(t–δt) (6).

r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 +… r(t–δt) = r(t) – r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 –…

(6)

79

Somando as expressões (6) e desprezando os termos de quarta ordem e

superiores, é possível obter a posição r(t+δt) utilizando apenas a posição atual e a

anterior, e a aceleração atual (7). Ao se subtrair as expressões (6) e desprezando os

termos superiores a segunda ordem, obtém-se a velocidade r'(t) (8).

r(t+δt) = 2 r(t) – r(t–δt) + r''(t) δt2 (7)

r'(t) = r(t+δt) – r(t–δt)

2 δt (8)

Desta forma, a integração da trajetória utilizando o algoritmo de Verlet produz

um erro da ordem de δt4 para as posições e δt2 para as velocidades. Deve-se ressaltar

que apenas o erro nas posições é cumulativo durante o processo de integração, e

apenas esse erro afeta a qualidade da trajetória obtida em relação ao resultado exato.

Considerando-se aqui como "resultado exato" aquele que seria obtido utilizando-se

δt→0, e precisão computacional infinita. Outra característica notável do algoritmo de

Verlet é que ele é centrado, isto é, r(t+δt) e r(t–δt) participam de maneira igual nas

equações e podem ser invertidos. Isto faz do algoritmo reversível no tempo. Isto

implica que ao utilizar forças conservativas, é garantida a conservação do momento

linear [75].

Há dois algoritmos algebricamente equivalentes ao algoritmo de Verlet: leap-

frog e Verlet velocidade. O algoritmo conhecido por leap-frog utiliza passos

intermediários da velocidade, r'(t+δt/2) [75]. Ele pode ser compreendido a partir das

expansões da posição em torno de t e t+δt (9).

r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 +… r(t) = r(t+δt) – r'(t+δt) δt + ½ r''(t+δt) δt2 –…

(9)

Subtraindo as expressões (9), obtém-se a posição r(t+δt) (10). A velocidade no

passo intermediário é dada pela aproximação r'(t+½δt) = ½ [ r'(t+δt) + r'(t) ], e o

termo de segunda ordem é na verdade de terceira ordem, já que em primeira

aproximação r'''(t+½δt) δt = [ r''(t+δt) – r''(t) ].

r(t+δt) = r(t) + ½ [ r'(t+δt) + r'(t) ] δt + – ¼ [ r''(t+δt) – r''(t) ] δt2 +…

(10)

Desprezando os termos superiores à segunda ordem da equação (10), e

tomando sua derivada temporal (atrasado em meio passo de integração), obtêm-se as

80

expressões para o algoritmo leap-frog (11). O uso dessas expressões elimina parte do

erro de truncamento presente em (7).

r(t+δt) = r(t) + r'(t+½δt) δt r'(t+½δt) = r'(t–½δt) + r''(t) δt

(11)

O algoritmo mais moderno, chamado de Verlet velocidade, melhora a precisão

da velocidade em relação aos algoritmos anteriores [75]. Dado por (12), a velocidade

em t+δt é deduzida da mesma forma que a posição é obtida para o leap-frog, isto é, a

velocidade é obtida com a derivada da expressão (10).

r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 r'(t+δt) = r'(t) + ½ [ r''(t+δt) + r''(t) ] δt

(12)

Termostato e Barostato

Uma vez que a técnica de dinâmica molecular evolui no tempo as posições das

partículas em um dado volume, conservando assim o momento e a energia total do

sistema, o ensemble natural deste tipo de simulação é NVE. Desta forma, para se

simular em outros ensembles é necessária a utilização de termostatos e barostatos,

para fixar a temperatura e a pressão. Isto é feito imaginando-se que o sistema está

conectado a um reservatório. É possível também fixar o potencial químico, mas isso

foge do escopo deste trabalho. Há muitas propostas de como acoplar o reservatório à

caixa de simulação. Nenhuma delas é exata, e cada uma parte de conjuntos diferentes

de princípios para justificar o acoplamento. Antes de apresentar as utilizadas neste

trabalho, é necessário compreender como se calcula temperatura e pressão. Como

ilustração, para um sistema atômico, a temperatura e pressão instantâneas são dadas

respectivamente por (13) e (14), onde T = ⟨T(t)⟩, p = ⟨P(t)⟩ e V = ⟨V(t)⟩ [75]. O termo

de virial W(t) é dado por (15), onde rij(t) é a distância interatômica, e u(rij) o

respectivo potencial de interação.

T(t) = 1

3N ∑ N

i mi |r'i(t)|

2 (13)

P(t) = [ NkbT(t) + W(t) ] / V(t) (14)

W(t) = – ⅓ ∑ N

i ∑ N

j>i rij(t) · ∇∇∇∇u(rij) (15)

81

A idéia mais simples de termostato é multiplicar as velocidades por (T0/T(t))½

a cada passo da simulação, onde T0 é a temperatura do reservatório. A mesma idéia

poderia ser aplicada para a pressão, mas para isso seria necessário um processo

iterativo já que a variação do volume afeta o resultado do virial (15). De qualquer

forma, tal mudança abrupta nas coordenadas a cada passo de simulação para manter

fixa a temperatura e/ou pressão não é desejável. Isto perturbaria de forma artificial e

imprevisível a dinâmica do sistema. A proposta mais simples para evitar essa abrupta

descontinuidade é dada pelo termostato/barostato de Berendsen [74]. Para o

termostato, considera-se que a cada passo de simulação o sistema esteja sujeito a um

fluxo de temperatura instantânea dado por T'(t) = [ T0 - T(t) ] / τT, onde τT é uma

constante de acoplamento maior que o passo de integração (τT > δt). Desta forma, a

variação da temperatura pode ser realizada de maneira arbitrariamente suave. O efeito

deste fluxo é transformar as velocidades: r'(t) → λ(t) r'(t), onde λ(t) é dado por (16).

λ(t) = 2

1 + δt T'(t)T(t) (16)

Para o barostato de Berendsen, o fluxo de pressão instantânea tem a mesma

forma, P'(t) = [ p0 - P(t) ] / τp. Entretanto, como não se sabe a priori como o termo de

virial muda com o volume do sistema, utiliza-se uma aproximação relacionada com a

compressibilidade isotérmica (17). Nesta, βT é um parâmetro característico do campo

de força que está sendo utilizado. Com o auxílio de (17), o efeito da pressão externa

sobre o sistema se manifesta na transformação das posições: r(t) → µ(t) r(t), sendo

que µ(t) é dado por (18).

P'(t) = – V'(t)βT V(t)

(17)

µ(t) = [ 1 – δt βT P'(t) ]⅓ (18)

Não há garantia de que o termostato/barostato de Berendsen reproduza

corretamente o ensemble canônico ou o das pressões [75]. Os valores de τT e τp devem

ser os maiores possíveis para perturbar o mínimo possível a dinâmica do sistema. Em

especial, o barostato de Berendsen produz resultados equivocados à medida que o

valor de βT diferencia da verdadeira compressibilidade isotérmica do sistema em

estudo. Entretanto, tomando as devidas precauções, o termostato/barostato de

82

Berendsen é bastante eficiente, e dada a sua simplicidade, justifica-se o fato de ser

amplamente utilizado.

Correlação Estatística

O método de Monte Carlo Metropolis (MCM) e o de Dinâmica Molecular

possuem o inconveniente de produzir configurações correlacionadas. Configurações

correlacionadas fornecem pouca, quando nenhuma, informação sobre o ensemble. Isto

se deve ao fato que tais configurações estão muito próximas no espaço das

configurações acessíveis ao sistema, o qual se quer amostrar. A correlação entre duas

configurações separadas por um grande número de passos é pequena, e diminui cada

vez mais à medida que o número de passos aumenta. O intervalo de passos necessário

para obter a descorrelação estatística é conhecido através da função de autocorrelação

[75]. A função de correlação entre dois conjuntos ordenados, {xj} e {yj}, é definida

pela (19). Nesta, ∆x = xj – ⟨x⟩ é o desvio da média, enquanto que σx = ⟨∆x2⟩½ é o

desvio padrão. Se ∆x = ∆y, para todo j, então C(x,y) = 1; caso contrário -1 < C(x,y) <

1. Quanto mais próximo de zero, é dito que mais descorrelacionados são os conjuntos

x e y.

C(x,y) = ⟨∆x∆y⟩σxσy

(19)

A função de autocorrelação da energia é obtida se fazendo xj = Uj e yj = Uj+k,

de forma que C(x,y) = C(k); onde k é um determinado número de passos. Portanto

C(k) fornece a correlação da energia entre configurações separadas por k passos. Nos

sistemas utilizados neste trabalho, o intervalo típico de descorrelação (definido como

C(k) < 15%) para um líquido a pressão e temperatura normais é da ordem de 103

passos. Tomando K como o número de configurações descorrelacionadas obtidas, o

erro estatístico associado à média de uma propriedade ƒ(R) é igual a σƒ/K½, onde σƒ é

o desvio padrão da distribuição da propriedade. O erro estatístico, também chamado

de erro padrão, está associado com o tamanho da amostragem (distribuição) e fornece

a incerteza sobre uma medida.

83

Apêndice C: Mecânica Quântica - Métodos Aproximativos

Em 1926, Erwin Schrödinger demonstrou que a quantização poderia ser

compreendida como um problema de autovalores, e forneceu a solução analítica (não

relativística) para o espectro do átomo de hidrogênio utilizando o formalismo

hamiltoniano [76], reconhecendo-o como um problema de autovalores Hψ(r) = Eψ(r).

A equação de Schrödinger para uma partícula é dada por (20); onde ψ(r) é a função de

onda associada a uma partícula de massa m sujeita a um potencial U(r), com energia

E. Esta é convenientemente escrita como.

– ħ2

2m ∇2ψ(r) + U(r) ψ(r) = E ψ(r) (20)

⌡⌠dr ψ*(r)ψ(r) = 1 (21)

No mesmo ano, Max Born postulou que a probabilidade de encontrar a

partícula entre r e r + dr descrita pela função de onda ψ(r), é w(r) = ψ*(r)ψ(r) [77],

onde ψ*(r) é o conjugado complexo de ψ(r), em analogia à chance de encontrar o

fóton em uma onda eletromagnética. Portanto, o valor médio de qualquer observável

A representado pelo operador  pode ser obtida segundo a (22), notando que ^r = r e ^p

= – iħ∇∇∇∇. A integral da (22) convenientemente escrita como ⟨A⟩ = ⟨ψ|Â|ψ⟩.

⟨A⟩ = ⌡⌠dr ψ*(r)Âψ(r) (22)

"As leis fundamentais necessárias para o tratamento matemático de grande

parte da física e de toda a química estão plenamente conhecidas, e a dificuldade

reside apenas no fato de que a aplicação dessas leis leva a equações que são muito

complexas para serem resolvidas" [78]. Os problemas envolvendo muitos corpos

costumam recair em um conjunto de equações acopladas cuja solução analítica não se

conhece. A solução do problema de vários corpos interagentes, tanto em mecânica

clássica quanto em mecânica quântica, pode ser obtida com métodos de integração

numérica [79]. Dado que o custo destes métodos cresce muito rapidamente com o

número de partículas, tal procedimento é impraticável. Uma alternativa viável para a

solução do problema de vários corpos se encontra nos métodos aproximativos. Isto é

feito alterando-se a forma da interação, U(r) → U'(r), ou equivalentemente, o tipo de

solução Ψ(r) → Ψ'(r). Sendo que estas alterações podem ter origem empírica

84

(utilizando ajustes experimentais), teórica (desprezando termos pouco influentes) ou

híbrida. As aproximações são aplicadas de acordo com o sistema, as propriedades que

se queira estudar, e o erro que elas acarretam.

Aproximação de Born-Oppenheimer

Uma aproximação comumente utilizada é a de Born-Oppenheimer [80], em

que é feita a separação das funções de onda nuclear e eletrônica. Parte-se do princípio

de que a energia cinética nuclear pode ser tratada como uma pequena perturbação

sobre o movimento eletrônico. Toma-se a partição: H = H0(Re,Rn,Pe) + V(Pn), onde n

e e se referem respectivamente aos núcleos e elétrons, R e P aos operadores de

posição e momento. O sistema não perturbado H0 ψσ(Re;Rn) = εσ(Rn) ψσ(Re;Rn) é a

solução da parte eletrônica e depende parametricamente das posições nucleares (Rn).

Expande-se então a solução exata em termos dessas autofunções (23).

Ψ(Re,Rn) = ∑ σ

χσ(Rn) ψσ(Re;Rn) (23)

Integrando-se H Ψ(Re,Rn) = E Ψ(Re,Rn) apenas nas coordenadas eletrônicas,

obtém-se um conjunto de equações acopladas que pode ser escrito na forma matricial:

[ Hn(Rn) + He(Rn) ] χ(Rn) = E χ(Rn). Sendo (Hn(Rn))νσ = ⟨ψν|V(Pn)|ψσ⟩ e (He)νσ =

εσ(Rn)δνσ. A aproximação toma apenas os termos diagonais de Hn(Rn), e portanto

também implica na aproximação adiabática, ou seja, o movimento nuclear não altera o

estado eletrônico. Os termos não diagonais de Hn(Rn) são chamados de acoplamento

vibrônico e estão além da aproximação de Born-Oppenheimer.

Hartree e Hartree-Fock

Uma das primeiras abordagens para encontrar a função de onda eletrônica foi

desenvolvida em 1928 por Douglas Hartree [81,82]. Nesta aproximação imagina-se

que cada elétron se move no campo médio de todos os outros. Isto implica que o

potencial inter-eletrônico pode ser escrito como uma soma de potenciais de um

elétron, U'e(Re) = ∑ u(i). A função multi-eletrônica ψσ(Re;Rn) é então escrita como um

único produto de funções de um elétron (produto de Hartree), ψ'σ(Re;Rn) = ∏ φi(i). O

índice subscrito i caracteriza o orbital de cada elétron i (na posição ri).

Em 1929, John Clark Slater reconheceu a necessidade de escrever o produto

de Hartree ψ'σ(Re;Rn) como um determinante |[φn(i)]|. Ele propôs também que a função

85

de spin deveria ser incluída no orbital φn(i), obtendo notável sucesso em prever o

espectro de diversos átomos [83]. A fundamentação teórica das equações foi obtida de

maneira independente por Vladimir Fock, em 1930 [84], e historicamente o método

passou a ser chamado de Hartree-Fock (HF). O operador de Fock F(i) é a soma da

energia cinética e do potencial médio sobre o elétron i. Ao atuar sobre o orbital φn(i)

fornece o autovalor εn: F(i) φn(i) = εn φn(i).

Combinação Linear de Orbitais Atômicos (LCAO) e as funções base

A maneira comumente usada para escrever os orbitais moleculares φn(i) em é

através de uma combinação de orbitais localizados nos átomos {αk}. A idéia de

combinar orbitais atômicos para descrever orbitais moleculares é anterior ao seu uso

em HF [85,86,87]. De um modo geral, o método LCAO escreve φ'n(i) = ∑ cknαk com

uma base fixa de orbitais atômicos αk. Em 1932, Slater propôs uma forma analítica

simples para descrever o spin-orbital de sistemas atômicos, φ'n(i) = ∑ crbexp(-ar),

onde c, b e a variam em cada termo [88]. Em 1950, Samuel Boys demonstrou que se

fosse escolhida uma base de gaussianas, as integrais poderiam ser analiticamente

resolvidas [89].

Em 1951, independentemente, Clemens Roothaan [90] e George Hall [91]

formalizaram o método HF via LCAO para obtenção de orbitais moleculares. Estas

equações são escritas em forma matricial (F – ε'nS)cn = 0; nesta, F é a matriz de Fock

(Fmn = ⟨φm(i)|F(i)|φn(i)⟩), S é a matriz de sobreposição (Smn = ⟨φm(i)|φn(i)⟩), cn é o vetor

dos coeficientes das funções base, e ε'n são as raízes, cujo número é igual ao número

de funções base utilizadas. O uso de funções base para descrever os orbitais

moleculares introduz o erro de base finita, já que é impossível tratar um conjunto

infinito de funções base computacionalmente. Portanto, de acordo com o princípio

variacional, a energia do orbital LCAO é maior ou igual à energia exata do orbital de

Fock, εn ≤ ε'n.

Teoria do Funcional da Densidade (DFT)

Em 1964, Pierre Hohenberg e Walter Kohn [92] propuseram dois teoremas

que estabeleceram a idéia de que a energia do sistema quântico está conectada

biunivocamente com a densidade eletrônica (24). O primeiro teorema: "O potencial

externo V(Re) é um funcional único de ρ(r)" estabelece que a energia do estado

86

fundamental também seja um funcional único da densidade. O segundo teorema é

uma extensão do método variacional para a densidade. Portanto, basta conhecer a

forma funcional exata da energia E[ρ] para encontrar a energia do estado fundamental

de um sistema quântico. Desta forma: E[ρ] = T[ρ] + U[ρ] + V[ρ], onde T[ρ] é a energia

cinética eletrônica, U[ρ] é o potencial inter-eletrônico e V[ρ] é o potencial dos elétrons

com os núcleos. Apenas este último termo possui expressão analítica: V[ρ] = ∫dr V(r)

ρ(r). A principal vantagem deste modelo é que substitui uma complicada função de

3N coordenadas ψ(Re;Rn), pela densidade eletrônica que depende apenas de 3.

ρ(r1) = N

∏ N

k=2 ⌡⌠

V

d3rk |ψ(Re;Rn)|2 (24)

Em 1965, Walter Kohn e Lu Jeu Sham [93] propuseram uma maneira

autoconsistente de calcular E[ρ]. É utilizado um sistema fictício de "elétrons não

interagentes" sujeitos a um potencial externo Vs[ρ], cuja densidade eletrônica é por

definição a mesma densidade do sistema real. A energia do sistema de Kohn-Sham

(KS) é obtida via uma função de onda auxiliar ψs(Re) e recai em equações de uma

partícula análogas ao método de HF. Desta forma: Es[ρ] = Ts[ρ] + Vs[ρ], onde Ts[ρ] é a

energia cinética do sistema fictício. O potencial Vs[ρ] é escrito como a soma de 3

termos: Vs[ρ] = V[ρ] + VH[ρ] + VXC[ρ], onde VH[ρ] é o potencial de Hartree (auto-

interação coulombiana da densidade eletrônica) e VXC[ρ] é o potencial de troca e

correlação, e carrega todos os efeitos quânticos do sistema de muitas partículas.

O método mais utilizado para VXC[ρ] é conhecido por "Aproximação de

Densidade Local" (LDA). Nesta, VXC[ρ] depende apenas da densidade no ponto em

que é calculada: VXC-LDA[ρ] = ∫dr εXC(ρ) ρ(r). Outra abordagem utilizada, que também

é local, é a "Aproximação do Gradiente Generalizado" (GGA). Nesta considera-se o

gradiente da densidade: VXC-GGA[ρ] = ∫dr εXC(ρ,∇∇∇∇ρ) ρ(r). Por fim, é muito utilizado em

sistemas moleculares potenciais híbridos que incluem parte da energia de troca exata

obtida da teoria de HF.

Post-HF e a correlação eletrônica

A aproximação de HF transforma um problema de N elétrons em N problemas

de um elétron, ao custo de perder a correlação do movimento eletrônico; cada elétron

está sujeito apenas ao campo médio produzido por todos os outros. Por esse motivo, a

87

diferença entre a energia eletrônica exata e a energia obtida com o método de Hartree-

Fock é chamada de correlação eletrônica [94]. O método DFT-KS inclui parte da

energia de correlação de maneira ad hoc. Há dezenas de propostas para o funcional de

troca e correlação. Entretanto nenhum deles é exato ou pode ser sistematicamente

melhorado em direção ao resultado exato. Felizmente é possível utilizar a função de

onda HF como base para métodos que fornecem a solução exata. Tais métodos são

conhecidos por post-HF.

Método de interação de configurações (CI)

O CI possui a mesma metodologia do método variacional utilizado para

resolver as equações de Roothaan. Escreve-se a função de N elétrons como uma

expansão de produtos anti-simétricos (25). O primeiro termo é a solução de HF, com

os orbitais de mais baixa energia ocupados; o segundo termo conta sobre todas as

excitações simples (isto é, um orbital ocupado n é trocado por um orbital virtual ν); o

terceiro termo conta sobre todas as excitações duplas (dois orbitais n e m são trocados

por orbitais virtuais ν e µ); e assim sucessivamente. Quando apenas o primeiro termo

da série é computado, o método é chamado de CIS; quando o primeiro e o segundo

são contados, CISD; e assim sucessivamente; quando todos os termos possíveis são

incluídos, o método é chamado de Full-CI. O método CI é comumente utilizado para

obter os estados excitados da função eletrônica molecular ψσ(Re;Rn).

ψσ(Re;Rn) = A0,σ|[φ]|0 + ∑ Aνn,σ|[φ]|

νn + ∑ A

νµnm,σ|[φ]|

νµnm … (25)

Truncar (25) no segundo termo (CIS) não melhora o resultado para o estado

fundamental. Este resultado é conhecido por teorema de Brillouin, ⟨|[φ]|νn|Ĥ||[φ]|0⟩ = 0

[95].

Møller-Plesset de ordem 2 (MP2)

Em 1934, Christian Møller e Milton Plesset aplicaram a teoria de perturbação

de Rayleigh-Schrödinger utilizando uma soma de operadores de Fock como

hamiltoniano não-perturbado [96], Ĥ(0) = ∑ F(i). A perturbação é a diferença entre o

potencial exato e o potencial de uma partícula, V = Ue – ∑ û(i). As funções de onda

do problema não perturbado são os determinantes construídos com os orbitais de

Fock, ψ(0)σ (Re;Rn) = |[φ]|

ν…n…, cuja energia é a soma dos autovalores, E

(0)σ = ∑ εn. A

88

correção de primeira ordem para a energia (E(1)σ = ⟨ψ

(0)σ |V|ψ

(0)σ ⟩) do estado fundamental

recupera a energia de HF, ou seja, EHF = E(0)σ + E

(1)σ (σ = 0). Conseqüentemente a

correlação eletrônica é obtida a partir da correção de segunda ordem chamada de

MP2: E(2)0 = ⟨ψ

(0)0 |V|ψ

(1)0 ⟩. Nestas equações ψ

(0)0 é a função de onda de HF, ou seja,

|[φ]|0. A correção de primeira ordem para a função de onda (26) é então escrita

utilizando-se configurações ψ(0)τ , que nada mais são do que substituições simples,

duplas, triplas, etc., em relação à solução de HF: ψ(0)τ = |[φ]|

ν…n…. Desta forma, apenas as

substituições duplas sobrevivem em MP2, de tal forma que a correção de segunda

ordem é dada em termos de orbitais de uma partícula por (27).

|ψ(1)0 ⟩ = ∑

∞ τ≠0

|ψ(0)τ ⟩ ⟨ψ

(0)τ |V|ψ

(0)0 ⟩

(E(0)0 – E

(0)τ )

(26)

E(2)0 = ∑ ∞

n<m,ν<µ |⟨nm|V|νµ⟩ – ⟨nm|V|µν⟩|2

(εn + εm – εν – εµ) (27)

CIS(D)

MP2 é um método eficiente para incluir correlação eletrônica sobre o estado

fundamental. CIS por usa vez não altera o estado fundamental, mas é o método mais

simples de se obter os estados excitados. Existem técnicas híbridas capazes de incluir

as correções perturbativas de MP2 sobre os estados de referência CIS [97,98]. Neste

trabalho foi utilizado o CIS(D) por ser um método extensivo [95] e por ter um custo

computacional igual a N5 (similar a MP2). CIS(D) é a segunda ordem da expansão

perturbativa do método de coupled-cluster para estados excitados (não apresentado

aqui), restrito a substituições simples e duplas, onde o termo de ordem zero é a função

CIS e o termo de primeira ordem se anula [98]. Formalmente a correção CIS(D) é

escrita como: ECIS(D) = ⟨ψ

(0)σ |V|U2ψ

(0)σ ⟩ + ⟨ψ

(0)σ |V|T2U1ψ

(0)σ ⟩, onde U1 e U2 produzem

substituições simples e duplas de acordo com CI (isto é, coeficientes determinados

pelo método variacional), enquanto que T2 produz substituições duplas de acordo com

MP2 (isto é, coeficientes determinados pelo método perturbativo). Sendo que nesta

representação, a correção MP2 é E(2)0 = ⟨ψ

(0)0 |V|T2ψ

(0)0 ⟩ enquanto que a função de onda

CIS é dada por |ψCIS⟩ = |U1ψ(0)0 ⟩.

89

Apêndice D: Campos de Força

Mesmo conhecendo a natureza quântica da matéria e os principais métodos de

solução do problema de muitos corpos, não é um processo trivial descrever um

sistema com centenas de moléculas (milhares de elétrons). O custo para se calcular a

energia de um sistema com muitas moléculas através de métodos quânticos é

excessivamente elevado. É necessário simplificar as interações moleculares o máximo

possível sem entretanto obscurecer sua conexão com a formulação quântica original.

Expansão multipolar

A princípio, uma molécula pode ser descrita como uma distribuição de cargas.

O potencial de interação de duas distribuições (a e b) de cargas pontuais fixas é dado

pela (28); onde qi é o valor de cada carga em a e qj em b; rij = |(ri + ra) – (rj + rb)| é a

distância entre as cargas i e j; ra é a posição do centro das cargas i, e rb das cargas j.

Escrevendo rab = rb – ra, tomando rab > ri e rab > rj é possível utilizar (29) e expandir

(28) na forma (30). Tal expansão é conhecida como expansão multipolar [99].

U(r) = ∑ i ∑ j qiqj

rij (28)

1rij

= ∑ ∞

n = 0 ∑ ∞

m = 0

∇∇∇∇

n

i ∇∇∇∇m

j 1rij

ri = rj = 0

(· ri)n(· rj)

m

n!m! (29)

U(r) = qaqb

rab +

µbqa – µaqb

r3ab

· rab + µb · µa

r3ab

+

+

Θbqa – 3µaµb + Θaqb

r5ab

(· rab)2 + …

(30)

qa = ∑ i qi

µa = ∑ i qiri

Θa = ∑ i qi

32 riri –

12 1

(31)

Termo de Coulomb

Um método aproximado de representar a distribuição de cargas em uma

molécula é utilizar um termo na forma (32), em que se escolhe um número reduzido

de sítios de carga. Esse potencial é definido como a soma de todas as interações

coulombianas entre os sítios de carga qi de uma molécula A e os sítios de carga qj de

90

uma molécula B. Os valores das cargas e a posição desses sítios são ajustados a fim de

reproduzir o efeito médio da expansão multipolar (30).

(UC)ij = qiqj

rij (32)

Os efeitos de polarização instantânea devido às mudanças dinâmicas da

vizinhança molecular podem ser incluídos de forma média ou como cargas flutuantes.

O termo de Coulomb não contempla os efeitos quânticos de troca e correlação, de tal

forma que estes são incluídos através de termos ligados às interações de van der

Waals.

Equação de van der Waals

Em 1873, Johannes van der Waals deduziu uma equação de estado que

descreve de maneira continua o estado líquido e o gasoso [100]. A equação de van der

Waals (33) é uma modificação da equação de estado do gás ideal (pV = NkbT),

incluindo-se o volume das moléculas (υ → υ – b) e a força de coesão (p → p + a/υ2).

Os parâmetros a e b são conhecidos como constantes de van der Waals e seus valores

são obtidos experimentalmente para cada substância, dentro de determinados

intervalos de temperatura e pressão.

p +

a

υ2 (υ – b) = kbT (33)

Em 1902, Kamerlingh Onnes [101] expressou os resultados de suas

observações sobre diversos gases na forma da equação de estado empírica (34). Os

coeficientes A … F foram chamados por Onnes de coeficientes de virial, sendo função

da temperatura, e podendo ser relacionados às constantes de van der Waals: A = kbT e

B = bkbT – a.

pυ = A + B

υ + C

υ2 + D

υ4 + E

υ6 + F

υ8 (34)

É possível calcular o segundo virial (B) teoricamente, em sistemas cujas

moléculas possam ser descritas por um potencial de pares esfericamente simétrico do

tipo u(rij) [101]. Nesta expressão, (35), β = 1/kbT.

91

B = 2πβ ⌡⌠

0

dr r2 {1 – exp[-β u(r)]} (35)

Termo de Lennard-Jones

Em 1924, Lennard-Jones procurou ajustar o potencial u(r) segundo o potencial

empírico intermolecular (36), partindo de resultados experimentais para B. Ele

estudou quais expoentes (n e m) poderiam ser utilizados para descrever sistemas reais,

ao mesmo tempo procurando os melhores parâmetros que se ajustassem ao argônio

[101]. Nesta equação, o termo com λn é repulsivo e o termo com λm é atrativo.

Lennard-Jones não obteve resultados conclusivos, a não ser a constatação teórica que

n > m ≥ 4.

u(r) = λn

rn – λm

rm (36)

Em 1927, S. C. Wang utilizando teoria de perturbação de segunda ordem

mostrou que a interação entre dois átomos de hidrogênio contém um termo atrativo

proporcional a 1/r6 [102,103]. No mesmo ano, Heitler e London utilizando teoria de

perturbação de primeira ordem mostraram que a força repulsiva entre átomos com

camadas fechadas aumenta rapidamente na medida em que a distância diminui [85].

Em 1928, Slater interpretou esta força repulsiva como um efeito de interferência,

tornando-se apreciável com a interpolação das funções de onda atômicas; e portanto,

caindo exponencialmente com a distância [102]. Partindo do método de Heitler e

London, e dos resultados de Wang para o hidrogênio, Slater obteve uma forma

analítica (em primeira aproximação) para a interação entre dois átomos de hélio (37).

Nesta equação, r é dado em unidades de raio de Bohr (a0) e a energia em 10-15 J. O

segundo coeficiente virial (35) calculado com o potencial (37) está em excelente

acordo com a experiência [104].

u(r) = 7.7 exp(-2.43 r) – 0.67

r6 (37)

Em 1930, London obteve a correlação entre as polarizabilidades e o potencial

atrativo entre duas moléculas [105,106], confirmando a forma obtida por Wang para

dois átomos de hidrogênio.

92

De um modo geral, a parte atrativa da interação de van der Waals pode ser

escrita como a soma de três termos. Considerando duas moléculas, A e B, o termo

orientacional de Keeson, (2µ2Aµ

2B/3kbT)/r6, é obtido via uma média orientacional do

potencial dipolar, u(r) = - µA·µB/r3. A interação de Debye relaciona o momento de

dipolo permanente de uma molécula com a polarizabilidade da outra, ~ (µ2AαB + µ

2B

αA)/r6. O termo de dispersão de London pode ser escrito (aproximadamente) como o

produto das polarizabilidades. Ambos são derivados da correção de segunda ordem da

teoria da perturbação.

Em 1931, Lennard-Jones corrigiu sua equação empírica (36), assumindo a

origem quântica para o termo atrativo de van der Waals 1/r6 [67]. Estudou alguns

expoentes da parte repulsiva, chegando na elegante forma (38). Nesta, (ULJ)ij é o

potencial entre os sítios i e j da molécula; onde εij e σij são computados na forma εij =

(εiεj)½ e σij = (σiσj)

½.

(ULJ)ij = 4εij

σij

rij

12

σij

rij

6

(38)

0.8σ 1.0σ 1.2σ 1.4σ 1.6σ 1.8σ 2.0σ 2.2σ 2.4σ

-2ε

10ε

σ

ε

Po

ten

cia

l

Distância

Potencial Lennard-Jones

ULJ

(r) = 4ε [(σ/r )12

- (σ/r )6]

Potencial utilizado por Slater para o Hélio

USlt

(r) = 3.7ε [1.7*105 exp(-12.0*r /σ) - (σ/r )

6]

Figura 37: Representação do potencial de Lennard-Jones.

O parâmetro σ representa o ponto em que o potencial é zero, ULJ(σ) = 0,

enquanto que o parâmetro ε fornece a profundidade do poço, como visto na Figura 37.

93

O potencial utilizado por Slater para o Hélio (37) obtido via teoria de perturbação,

possui εi = 1.77 (kcal/mol) e σi = 2.62 (Å), e se ajusta muito bem à curva fornecida

por ULJ na região do mínimo.

Para átomos, o potencial de Lennard-Jones é o termo mais importante do

potencial. Para moléculas que a núvem eletrônica não possui simetria esférica, os

termos eletrostáticos devem ser considerados. Isto é feito através do potencial de

Coulomb (32). Os termos da expansão multipolar (30) podem ser atrativos ou

repulsivos, dependendo da orientação relativa do par de moléculas, e portanto

definem a orientação relativa das moléculas em um líquido. Enquanto que o potencial

Lennard-Jones é sempre repulsivo para rij < 21/6σij e atrativo rij > 21/6σij, e definem

como e o quanto estas moléculas se empacotam.

Método Seqüencial Monte Carlo/Mecânica Quântica (S-MC/MQ)

A idéia do método S-MC/MQ é bastante simples [107]. Utiliza-se potenciais

do tipo Coulomb e Lennard-Jones para realizar a simulação do líquido e gerar as

estruturas. Usualmente são realizadas simulações da ordem de 100 mil passos de

MCM ou Dinâmica Molecular (com intervalo de tempo de 1fs), para temperatura

ambiente. Através da função de autocorrelação da energia, separa-se um número

reduzido de configurações estatisticamente descorrelacionadas. Através da função de

distribuição radial [75], determina-se a quantidade de moléculas em cada uma das

camadas de solvatação em torno da molécula referência. Sobre essas configurações

selecionadas, são realizados cálculos quânticos. As propriedades calculadas levam em

consideração a convergência tanto com o número de partículas quanto com o número

de configurações. Este protocolo tem sido usado com sucesso nos últimos anos para o

estudo de diversos sistemas [108].

O potencial de pares utilizado nas simulações clássicas é normalmente

ajustado para reproduzir as propriedades experimentais de fluido. Como não se

conhece previamente o momento de dipolo da molécula em fase líquida, os efeitos de

polarização induzida normalmente são incluídos implicitamente. Assim o momento de

dipolo é majorado de 10% a 20% em relação ao seu valor em fase gasosa [109], e em

seguida são ajustados os parâmetros Lennard-Jones. Porém moléculas em diferentes

ambientes sofrem polarizações distintas. Estudar moléculas solvatadas em diferentes

solventes, utilizando-se o mesmo conjunto de cargas pode resultar em resultados

errôneos. O método S-MC/MQ pode ser utilizado iterativamente a fim de se evitar

94

esse problema e polarizar adequadamente a molécula de interesse de acordo com o

solvente utilizado na simulação [110]. A polarização do soluto é feita partindo-se de

cargas iniciais não polarizadas (fase gasosa) ou pré-polarizadas, e executando-se

normalmente a simulação. As estruturas selecionadas (com solvente descrito por

cargas pontuais) são utilizadas para recalcular as cargas nos sítios atômicos do soluto.

Então este soluto é novamente levado a simulação e o processo é repetido até que as

propriedades ligadas à polarização (como o momento de dipolo) convirjam. Este

método foi utilizado no estudo de fenol em água apresentado neste trabalho [12].

Modelos polarizáveis

Em 1981, Thole propôs uma maneira eficiente de se calcular a polarização

molecular na vizinhança de cargas [111]. O método consiste em tratar cada átomo

como um dipolo difuso (i.e., não pontual). Uma vez conhecida a polarizabilidade em

cada átomo, seria possível calcular a polarização em um desses centros sujeito à

distribuição de cargas externas. Tal procedimento é autoconsistente, e leva em

consideração o efeito mutuo que as moléculas polarizadas causam umas sobre as

outras. Em seguida, Stone propôs um protocolo para obter a distribuição as cargas e

polarizabilidades sobre os sítios atômicos, a partir de cálculos de primeiros princípios

[112]. Uma vez conhecidas as distribuições de carga e polarizabilidades as quais

reproduzissem com precisão os momentos de multipólo quânticos, restaria apenas

incluir as interações de van der Waals no cálculo da energia total. Existem alguns

modelos que se utilizam dessa idéia de polarização de Thole [113,114]. O modelo

utilizado neste trabalho é o AMOEBA [51], através do programa TINKER [50].

95

Apêndice E: Aspectos Técnicos da Física Computacional

O computador é uma máquina idealizada por matemáticos e realizada por

físicos em meados da década de 1940 [115,116]. Desde então, se tornou uma

ferramenta essencial para aplicação e teste de teorias cuja abordagem analítica é

inviável. No princípio os físicos dominavam-na completamente, e eram capazes de

criar programas específicos escritos diretamente em linguagem de máquina.

Entretanto o computador evoluiu, tornou-se um produto e se popularizou. Ele deixou

de ser uma ferramenta exclusiva de uso científico, para se tornar um equipamento

eletrônico de múltiplas funcionalidades (tais como multimídia e internet). E à medida

que a complexidade dos computadores aumentava, os físicos deixavam de lado os

detalhes de seu funcionamento. O conhecimento do hardware foi delegado a

engenheiros da computação, de software a cientistas da computação, e a operação em

si foi delegada aos técnicos de informática e analistas de sistemas. Essa partição de

funções era inevitável dada a abrangência de conhecimentos e técnicas que surgiram à

medida que o computador se desenvolveu. Entretanto ignorar completamente o

funcionamento desta ferramenta implica em seu uso ineficiente. Saber como

aperfeiçoar um programa, e operar eficientemente e saber os limites da máquina

implica em mais resultados, mais hipóteses, mais verificações, e conseqüentemente

maior produção científica.

Este apêndice propõe uma mudança de paradigma. O objetivo deste apêndice

não é transformar a ferramenta em objeto de estudo, mas mostrar que o conhecimento

desta é vital para o físico que a utiliza. E também chamar a atenção que a ignorância

sobre ela pode trazer prejuízos e atrasos.

Física computacional e o Computador

Formalmente física computacional é uma área de pesquisa multidisciplinar

que investiga problemas que fazem parte, ao mesmo tempo, da física e da ciência da

computação. A ciência da computação estuda os algoritmos (seqüência de instruções),

suas aplicações, formalizações matemáticas e suas implementações. Os fundamentos

da ciência da computação e as "ferramentas de computação" surgiram muito antes do

computador moderno, e pode-se dizer que nasceram juntamente com a matemática.

Entretanto a definição formal de algoritmo e computador foi estabelecida apenas no

começo do século XX [115]. Mas foi apenas com a segunda guerra mundial e a

96

necessidade de quebrar códigos de guerra que o desenvolvimento do computador se

acelerou [116]. John Von Neumann e colaboradores desenvolveram as bases do

computador moderno. Publicado em um trabalho de 1945 [117], tal design passou a

ser conhecido por "arquitetura de von Neumann". Ele se caracteriza primariamente

por guardar o programa a ser executado junto com os dados na memória física do

computador. Pode-se afirmar que o uso da simulação computacional para resolver

problemas físicos também se estabeleceu neste período. A solução do problema da

fissão nuclear por amostragem estatística via simulação computacional foi sugerida

em 1946 pelo matemático Stanislaw Ulam, que era do grupo de pesquisa de von

Neumann [118]. (Nascia assim o método de Monte Carlo.)

Hardware

Por mais de uma década a computação científica ficou restrita a grandes

instituições de pesquisa capazes de comprar ou produzir, e manter seus computadores.

Eles eram caros, gigantes e consumiam muita energia. O surgimento dos

semicondutores na década de 1950 possibilitou a substituição das válvulas pelos

transistores. Na década de 1960, os computadores já eram menores, mais rápidos,

mais confiáveis, com menor necessidade de consumo e mais baratos de se produzir.

Em 1965, Gordon Moore (co-fundador da Intel) publicou um trabalho mostrando que

o número de transistores dobrara a cada ano desde o surgimento dos circuitos

integrados em 1958 [119]. Posteriormente a projeção foi corrigida para dois anos, e se

manteve desde então. Na década de 1970, eram comuns circuitos integrados e

microprocessadores, diminuindo ainda mais os custos de produção de computadores.

Na década de 1980, surgiram os computadores pessoais, popularizando seu uso em

casa (desktops). Os computadores pessoais se desenvolveram rapidamente, mas fazer

computação científica ainda era restrito aos mainframes dos grandes centros de

pesquisa até a década de 1990. Em 1994, surgiu o Beowulf, o primeiro cluster

computacional formado de desktops configurado para fazer computação científica

através de processamento distribuído [120]. A partir de 2000, com a popularização

dos processadores de múltiplos núcleos, o conceito de processamento distribuído

passou a ser dominante. Em diversos centros de pesquisa, clusters de baixo custo

rapidamente substituíram caríssimos mainframes que se tornavam obsoletos.

Entretanto, desde 2007 um novo paradigma vem se estabelecendo com o uso das

unidades de processamento gráfico (GPU) para execução massiva de cálculos em

97

paralelo. As GPUs não se comportam como a arquitetura de von Neumann, sendo

capazes de fazer centenas de operações simultâneas (enquanto que a CPU faz apenas

uma operação por vez).

Hoje é comum encontrar clusters híbridos, que utilizam ao mesmo tempo

servidores de alta capacidade e desktops de baixo custo, ambos equipados com placas

gráficas prontas para serem utilizadas por programas de investigação científica.

Entretanto montar tais clusters não é uma tarefa trivial, já que isto demanda

conhecimentos técnicos (de hardware e software) e noções mercadológicas (isto é,

saber o valor real do hardware que se está negociando). Considerando a lei de Moore

como válida, a cada dois anos os computadores dobram de capacidade. Isso implica

que um computador comprado há dois anos vale agora metade do que foi pago. Com

um ano de idade o computador cai a 70% do seu valor. Desta forma é vital que ao

efetuar uma compra, o grupo de pesquisa coloque a máquina em funcionamento o

mais rápido possível. É comum ver grupos de pesquisa gastando mais dinheiro que o

necessário, e por fim obtendo menos recursos computacionais. O atraso causado pela

burocracia ou pela ineficiência das pessoas encarregadas de realizar a instalação e

configuração normalmente são as causas desse prejuízo. Outra consideração crucial

relaciona qualidade/quantidade/preço. Existem diferentes configurações de hardware

no mercado em um largo espectro de capacidades e custos para diferentes aplicações.

É comum encontrar vendedores tentando fornecer configurações inadequadas, ou por

má fé, ou por não compreender como a máquina será utilizada. Este problema só pode

ser contornado através do conhecimento das técnicas numéricas utilizadas nos

programas de simulação e das capacidades dos hardwares oferecidos.

Para ilustrar estes aspectos, é apresentado abaixo o resultado obtido para o

cálculo dos modos vibracionais (absorbância) da vitamina B12, utilizando 2 diferentes

métodos (HF e B3LYP), onde B3LYP foi executado com pseudo potencial

(LANL2DZ para o cobre) e sem pseudo potencial (6-31G* para o cobre). A base dos

outros átomos foi 6-31G, com exceção do nitrogênio que teve 6-31G*.

98

Figura 38: Vitamina B12. Na parte central da molécula é visível o átomo de cobre cercado por cinco átomos de nitrogênio e um de carbono.

Figura 39: Espectro de absorção (modos vibracionais) da vitamina B12, sem escala. Acima (em azul) é apresentado o resultado da geometria obtida com HF. Abaixo (em amarelo e vermelho) é

apresentado o resultado para B3LYP (com e sem pseudo potencial no cobre).

A molécula tem 181 átomos e levou 2 dias (por método) para ser calculada em

um servidor Intel Xeon X5550 com 24GB de memória que custou 13000 reais em

outubro de 2009. O mesmo cálculo levou mais de 40 dias em um desktop Core2Quad

Q6600 com 8GB de memória que custou 3500 reais em janeiro de 2009. Para esse

problema específico, considerando a desvalorização das máquinas, o servidor Xeon é

pelo menos três vezes mais barato que o desktop Core2Quad.

99

Linguagens de programação e Compiladores

Durante a década de 1940, os programas de computador eram escritos em

linguagem de máquina, que são executados diretamente pela CPU. No início dos anos

50, surgiu a linguagem assembly. Esta utiliza uma representação simbólica

(expressões mnemônicas) para representar endereços de memória e operações. Um

utilitário chamado assembler traduz as expressões da linguagem assembly para a

linguagem de máquina. Em 1954, surgiu na IBM o FORTRAN (FORmula

TRANslator), a primeira linguagem abstrata e portável, e por isso chamada de "alto

nível" [121]. Para transformar a linguagem de alto nível em linguagem de máquina, é

necessário utilizar um compilador. O compilador diferencia-se do assembler pela

capacidade de interpretar as instruções em sua forma abstrata (de alto nível),

aperfeiçoá-la, e então traduzir para linguagem de máquina. O FORTRAN e os

compiladores se desenvolveram junto com o computador. Ao mesmo tempo surgiram

dezenas de outras linguagens de programação. Entre as décadas de 1960 e 1970

surgiram paradigmas que são utilizados até hoje (programação matricial, funcional,

orientada a objeto, de sistema, lógica, estruturada...) [122]. Em especial, em 1968,

Edsger Dijkstra publicou um artigo condenando o uso da operação GOTO em

qualquer linguagem de alto nível [123]. Durante os anos 80, a programação orientada

a objeto, de sistema e o uso extensivo de módulos consolidaram C (e depois C++)

como a linguagem mais utilizada de todos os tempos. A linguagem C surgiu em 1972

para ser usada em conjunto com o sistema operacional Unix [124]. Ela é utilizada no

kernel do Linux e é a base para linguagens de "altíssimo nível" como Java e

linguagens interpretadas como Perl e Python. O C++ é "C com classes" (orientação a

objeto), e possui também outros aprimoramentos. O C++ é projetado para produzir

códigos mais curtos e organizados que C. O custo disso é que se a classe que

comporta um objeto for muito complexa, o programa em C++ tende a ser menos

eficiente. Evidentemente isso depende da habilidade do programador, já que um

código em C é compilado normalmente pelo compilador de C++. O C ainda oferece

recursos de baixo nível, como operações em bits e uso de código assembly. Isso faz

do C uma linguagem extremamente eficiente e versátil. Entretanto, durante muitos

anos, a linguagem C mostrou-se inferior ao FORTRAN para uso em computação

científica. Isso se devia primariamente à escassez de boas bibliotecas matemáticas

para C. Essa deficiência foi rapidamente eliminada com popularização do Linux e o

uso de softwares livres baseados em C. Hoje, não há diferença no desempenho se um

100

programa é escrito em FORTRAN ou C. E isso é natural, já que ambos serão

compilados (aperfeiçoados e transformados em linguagem de máquina). Existem

inclusive programas que convertem um código em FORTRAN para C (mas não o

contrário, já que FORTRAN não possui recursos de baixo nível e de sistema).

Aparentemente, o compilador atual mais eficiente para códigos de computação

científica na arquitetura x86(-64) é o da Intel. Há outros conhecidos no mercado como

o da Portland (PGI) e o da GNU. Mas o compilador Intel se destaca mesmo em

processadores AMD (a concorrente em fabricação de processadores). Obviamente os

desenvolvedores do compilador conhecem muito bem a estrutura e as instruções da

arquitetura, e são capazes de produzir códigos de máquina altamente eficientes. Em

alguns casos, o compilador Intel produz programas duas vezes mais rápidos que os

outros compiladores.

101

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