silva, luciano inácio da. segurança pública

41
LUCIANO INÁCIO DA SILVA SEGURANÇA PÚBLICA: um novo modelo de polícia estadual Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Prof. Dr. Antônio Carlos Alonso Del Negro Rio de Janeiro 2013

Upload: duongminh

Post on 08-Jan-2017

215 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

LUCIANO INÁCIO DA SILVA

SEGURANÇA PÚBLICA:

um novo modelo de polícia estadual

Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Prof. Dr. Antônio Carlos Alonso Del

Negro

Rio de Janeiro

2013

C2013 ESG Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitida a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG

_________________________________ Assinatura do autor

Biblioteca General Cordeiro de Farias

Silva, Luciano Inácio da.

Segurança pública: um novo modelo de polícia estadual / Delegado de Polícia Civil Luciano Inácio da Silva. - Rio de Janeiro : ESG, 2013.

39 f. Orientador: Prof. Dr. Antônio Carlos Alonso Del Negro. Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao

Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2013.

1. Unificação das polícias. 2. Ingresso na base. 3. Progressão na

carreira. I. Título.

Deixo grafada a minha gratidão a todos

da minha família pela tolerância e

incentivos ofertados em todos os estágios

da minha vida acadêmica. Em especial

aos meus pais, já idosos, pela

compreensão face aos dias de ausências

e omissões decorrentes do tempo

dedicado às atividades da ESG.

AGRADECIMENTOS

Aos meus professores e colegas policiais de todas

as épocas, por terem sido responsáveis por parte considerável

da minha formação e aprendizado.

Aos estagiários da inigualável Turma Força Brasil,

do CAEPE, pelo convívio harmonioso, fundamental para suprir

um pouco a ansiedade decorrente do distanciamento familiar.

Ao Corpo Permanente da ESG pelos ensinamentos

e orientações, sempre no sentido de se conhecer o Brasil, com

vistas a produzir uma arquitetura ideal para atender os

interesses desta bela nação.

Pouco conhecimento faz com que as pessoas se sintam orgulhosas. Muito conhecimento, que se

sintam humildes. É assim que as espigas de milho sem grãos erguem desdenhosamente a

cabeça para o Céu, enquanto que as cheias as baixam para a terra, sua mãe.

LEONARDO DA VINCI

RESUMO

Um novo modelo de polícia para o Brasil é o que vamos discutir neste trabalho, com

apresentação e análise da atual estrutura funcional das Polícias Civil e Militar, que

formam o modelo policial nos estados brasileiros. Trata-se de um tema que desperta

interesse, por ser muito criticado na mídia e na sociedade. Pouco se divulga sobre o

valor do ser humano que escolheu a carreira policial, colocando em risco a própria

vida em busca da paz social. Historicamente, foram construídas forças de trabalho

para cuidar do bem estar da comunidade. Mas, neste trabalho, vamos nos ater ao

estudo das forças divididas, distintamente, entre Polícia Civil (que diz respeito às

relações dos cidadãos entre si) e Polícia Militar (carreira das armas; ter força,

prevalecer; combater). Mas, podemos identificar que, em ambas, o foco é o mesmo:

promover a segurança da sociedade. Na visão dessa sociedade, a Polícia,

representada pelo homem investido da lei, tem o dever de garantir a ordem e a

segurança pública, proporcionando um sentimento coletivo de responsabilidade

sobre pessoas e patrimônios. A responsabilidade, segundo o Dicionário Brasileiro da

Língua Portuguesa, é “[...] obrigação de responder pelos próprios atos ou de outrem

[...]”. No caso especifico, há reflexos na própria sociedade, impondo um dever

comum de zelar pela segurança de todos. Propõe-se implantar uma nova estratégia

organizacional, que proporcione um melhor desempenho do policial em sua

atividade fim. Mas, mudar o atual modelo policial, sem levar em conta o profissional

da área, não resolve o problema. É preciso motivá-lo a aceitar uma nova filosofia de

trabalho. Em toda profissão, a motivação está intimamente ligada ao desempenho

do seu profissional, e sempre aflora frente à possibilidade de progressão na carreira

para cargos de nível superior. Defendemos que o cargo mais elevado da instituição

deve ser possível. Mas para viabilizar essa proposta, se faz necessário analisar as

atuais estruturas das Policias Militar e Civil, as quais servirão de base para o novo

modelo. Lembrando que o ordenamento legal que esculpe o modelo das policiais

brasileiras é praticamente igual em todo o território nacional; por isso, o suporte

deste trabalho será extraído da legislação que disciplina as atividades e a

organização funcional das polícias do Estado de Mato Grosso.

Palavras chave: Unificação das Polícias. Ingresso na base. Progressão na Carreira.

ABSTRACT

This paper will discuss a new police model for Brazil. We will analyze the current

functional structure of the civil and military police, both of which form the police

apparatus of the states. Why do we have to discuss a new hierarchical structure and

functioning of these two institutions? Because, historically, were built workforces that

are responsible for the welfare of the community. This force was distinctly split

between civilian police (... with regard to the relations of citizens among themselves

...) and military police (... military career, have the strength to prevail; combat ...). But

in both cases, the focus is the same, namely to promote the safety of society. In view

of this society, the police, represented by the person invested by law, has a duty to

ensure public order and safety, providing a collective sense of responsibility, for

people and property. The responsibility, according to the Brazilian Portuguese

Language Dictionary, sums this up as "... the obligation to answer for his actions or

others ...". In this specific case, there is a reflection for a society itself, imposing an

ordinary care of duty for the safety of all. The core of this proposal is to establish a

new philosophy and an organizational strategy, in order to provide better

performance of the police in their core task. However, changing the current model

without input from the professional police officer will not solve the problem. It will be

necessary to motivate the police in this new structure. Recalling that, in any

profession, motivation is closely linked to the performance of professionals and

always affects career advancement and occupation of upper level positions.

Therefore, reaching the highest position within the institution should be possible. To

accomplish this, I propose that it is necessary to analyze and reorganize the structure

of the military and civilian police, presenting a new hierarchical model for operational

efficiency. The legal system that sculpts the structures of the brazilian police is

practically the same throughout the country, so the basis of this work will be the laws

that define the activities and functional organization of the military and civil police in

the State of Mato Grosso.

Keywords: Unification of Police. Admission on the basis. Progression on Carrier.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 7

2 BREVE HISTÓRICO DA POLÍCIA NO BRASIL ............................................... 10

2.1 HISTÓRIA DA FORMAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR NO ESTADO DE MATO GROSSO ...........................................................................................................

11

2.2 HISTÓRIA E FORMAÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL NO ESTADO DE MATO GROSSO ................................................................................................

13

3 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL ................................................................... 16

3.1 COMENTÁRIOS ACERCA DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA POLÍCIA MILITAR DE MATO GROSSO ...........................................................

17

3.2 COMENTÁRIOS ACERCA DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MATO ...........................................................

19

3.3 ANÁLISE DAS ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS DAS POLÍCIAS DE MATO GROSSO ................................................................................................

22

4 UM NOVO MODELO DE POLÍCIA ................................................................... 27

5 SINAIS DE FADIGA DO ATUAL MODELO POLICIAL .................................... 32

6 CONCLUSÃO .................................................................................................... 35

REFERÊNCIAS ................................................................................................. 38

7

1 INTRODUÇÃO

Para propor um novo modelo de polícia, faz-se necessário conhecer o

modelo atual e em que condições este se apresenta. Na Constituição Federal estão

expressas as diferenciadas funções das Polícias Militar e Civil, quando suas

responsabilidades são, respectivamente, a preservação da ordem pública e

apuração de infrações penais. Para Schein (1982), compreender como as

organizações funcionam, far-se-á necessário, em primeiro lugar, compreender como

funcionam as pessoas nessas organizações.

Mas as atividades de cada um desses segmentos policiais estão voltadas

para o mesmo tema, ou seja: a Segurança Pública, com o afastamento de todo o

perigo, garantindo direitos à população de usufruir um espaço de cidadania. O

questionamento é se essa divisão de atribuições, ligadas a um mesmo fim, pode

promover com eficácia a segurança dos cidadãos. O nosso entendimento é que não.

Pois tratam de estruturas que não motivam o seu próprio profissional, notadamente

àqueles dos cargos da base dessas instituições.

É preciso melhorar o sistema de segurança do Estado, adotando um novo

modelo de polícia que atenda a sociedade e que, ao mesmo tempo motive os seus

profissionais. A situação atual já apresenta um desconforto entre a base

(investigadores, praças etc) e a cúpula (delegados, oficiais etc). Em ambos os

casos, conforme discorreremos adiante, há um entrave de ordem legal que impede a

ascensão funcional na carreira. E, em nosso entendimento, esse bloqueio na linha

de ascensão funcional é a causa principal das frustrações vivenciadas pelos policias

da base, ao longo da carreira. É necessário lembrar que estamos lidando com

pessoas que trabalham com atritos sociais e devem garantir, também, a sua própria

segurança. Por isso, uma nova filosofia de trabalho, embasada em um adequado

plano de cargos e salários, deve nortear essa carreira. As regras que seguram bons

policiais no meio do caminho devem ser mudadas, permitindo o acesso dos mesmos

aos cargos superiores, pois a Instituição deve abrigar uma única categoria de

policiais.

Nessa proposta, busca-se resgatar a motivação como ingrediente essencial

ao profissional da segurança. Pois a motivação é, de fato, o combustível que move o

policial a destacar-se no enfrentamento ao crime. Não se combate a violência

retirando oportunidades desses combatentes.

8

Noticiários e periódicos oferecem uma visão geral das mudanças

necessárias às estruturas das polícias que hoje sobrevivem, precariamente, às

condições sociais, financeiras e psicológicas de sua atuação.

Em nosso país, a violência atinge todos os segmentos sociais, dos mais

ricos aos mais pobres, tornando a insegurança uma experiência amplamente

compartilhada. Esse quadro foi produzido por uma sucessão de desastres e vem

concorrendo para a geração de impunidade, irracionalidade, ineficiência e a

barbárie.

É certo que o crime se tornou meio de vida de uma expressiva parcela da

sociedade, com o criminoso dividindo o mesmo espaço com as pessoas de bem,

com filhos matriculados nas mesmas escolas, possui contas bancárias e paga

regularmente as suas contas. Também exerce o direito de voto e, não raro,

apresenta-se como candidato para ocupar algum cargo eletivo em alguma esfera do

Poder Público, numa clara evidência que se tornou um ser tolerado e, em alguns

casos, admirado na sociedade.

Na linha de frente, enfrentando o problema, temos policiais sob dois

comandos, da Polícia Civil e da Polícia Militar. O resultado, além do conflito de

competência, é uma disputa nociva ao interesse público, pois informações

importantes, em razão da vaidade corporativa, deixam de ser compartilhadas,

comprometendo os objetivos da atividade policial, que é prevenir e reprimir o crime.

Um caminho a ser trilhado consiste na reforma das polícias, para torná-las

instituições voltadas para a construção da paz, eficientes e defensoras dos direitos

humanos.

Com base nestes conceitos, propõe-se uma nova polícia, a ser montada a

partir da análise da estrutura organizacional que rege a Polícia Militar e a Polícia

Civil, extraindo, de cada instituição, dados comparativos entre as suas respectivas

atividades, visando uma otimização dos trabalhos, desde o planejamento até a sua

execução.

Durante este estudo, vamos também analisar a Proposta da Emenda

Constitucional 102/2011, de autoria do Senador Blairo Maggi (PR/MT), que sugere

alterar dispositivos da Constituição Federal para permitir à União e aos Estados a

criação de polícia única. O autor dessa proposta governou o Estado de Mato Grosso

por dois mandatos (2002/2010) e, certamente, constatou a incoerência na

9

manutenção de duas forças policiais para se promover a Segurança Pública. A

unificação, dentre outras vantagens, significa aperfeiçoar a utilização de recursos.

Desta forma, podemos pensar que discutir a situação das polícias significa

discutir políticas públicas que discorrem sobre o bem estar da população,

garantindo, também, a inclusão social do policial que, muitas vezes, é discriminado

pela função que exerce.

No passado, a semente do processo discriminatório era semeada no

universo infantil. Era comum às mães ameaçarem os filhos pequenos dizendo que

iriam chamar a polícia, caso saíssem da linha. É provável que isso ainda ocorra.

O fato é que associar o policial a instrumento de repressão e não de

segurança criou, em muitos de nós, a impressão de que este profissional não passa

de um monstro de nossas estórias infantis. Nós, seres humanos, aprendemos por

repetição e, aquilo que nos foi repetido, em nossa formação infantil, torna-se parcela

importante daquilo que passaremos a acreditar ao tornarmos adultos.

Com isso, podemos prever o que o imaginário coletivo dos cidadãos, que

compõem a sociedade, deve pensar e repetir a seus filhos. A imagem é resultado de

uma associação negativa do policial com a violência, corrupção e impunidade que a

mídia tem mostrado.

O trabalho policial tem limites; isoladamente, ele não dará conta dos

problemas de segurança, que são complexos, móveis e dependentes de fatores

sociais, culturais e pessoais, que transcendem as práticas das corporações de

Segurança Pública.

Então, para o desenvolvimento dessa proposta, tornou-se importante

analisar, a título de comparação, as estruturas funcionais das Polícias Militar e Civil,

tendo como base de estudo, a legislação que disciplina essas duas instituições no

Estado de Mato Grosso. A ideia é estabelecer um modelo diferente do atual. O novo

modelo deve ser contemplado com incentivo à formação social e ética da força de

trabalho, reestruturando as bases na parte operacional, de forma a desburocratizar o

sistema, propondo qualidade, modernidade e, consequentemente, o reconhecimento

das pessoas que prestam este serviço.

10

2 BREVE HISTÓRICO DA POLÍCIA NO BRASIL

As polícias brasileiras foram estruturadas no período imperial sendo que, no

Brasil Colônia, a característica de polícia judiciária e investigativa já estava presente.

Em 1808, com a vinda da família real para o Brasil, foi criada, por meio de Alvará, a

Intendência de Polícia da Corte.

De acordo com pesquisas de Costa (2004), apenas durante o período

monárquico (1822/1889) é que o poder de polícia passou a ser bem definido pelo

Código Criminal Brasileiro (1830) e pelo Código de Processo Criminal (1832).

Nesses códigos, ficou estipulado e definido o cargo de Chefe de Polícia, cujas

funções seriam: pronunciar, processar, julgar e aplicar as penas previstas.

Normalmente, quem exercia a função de Chefe de Polícia era o Juiz de Direito, no

caso das cidades mais populosas, ou um Juiz de Paz, nas cidades menores. Havia,

ainda, nessa época, os Corpos de Guardas Municipais Permanentes, criados em

1831, pelo regente Padre Diogo Antônio Feijó, cuja missão era manter a ordem

pública e auxiliar a Justiça. Nesta mesma época, foi instituída a Guarda Nacional,

com a missão de manter a obediência às leis nacionais, conservar ordem e a

tranquilidade pública e auxiliar o Exército na defesa da soberania, das fronteiras e

das costas brasileiras.

Somente em 1871, com a promulgação da lei nº 2033, de 20 de setembro de

1871, ocorreu à separação das funções da polícia das funções do Poder Judiciário,

no que se refere à prevenção e à repressão ao crime. Até então, os policiamentos

repressivos e investigativos se confundiam ou até se anulavam. Por um longo

período histórico, a missão das polícias, nas diversas esferas, consistia em dar

garantias aos governantes, promover a repressão aos criminosos e aos movimentos

sociais que lutavam por autonomia. Portanto, nossa polícia foi construída nos

moldes da polícia francesa: uma polícia que era os olhos, ouvidos e braços dos

governantes.1

1 NALDSON, Ramos da Costa. Violência policial, segurança pública e práticas civilizatórias no Mato

Grosso. 2008. 360 f. Trabalho de Conclusão de Curso de (Doutorado em Sociologia). Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

11

Após a Proclamação da República (1889),

[...] as Polícias estaduais foram reestruturadas em cada Estado da Federação. No entanto, o sistema de segurança pública estruturada no Império engendrou características presentes até hoje; como a dualidade na atividade policial. Diferentemente de outros países em que instituições policiais já nasceram exercendo o ciclo completo da atividade policial, ou seja, uma parte da polícia investiga e outra parte, majoritária, realiza o policiamento ostensivo, o sistema de segurança pública brasileiro institucionalizou duas “meias” polícias. Uma só para investigação (que surgiu como intendência de polícia e depois veio a se denominar polícia civil) e outra “meia” polícia para o policiamento ostensivo responsável pela ordem pública. (MARIANO, 2004)

2.1 HISTÓRIA DA FORMAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR NO ESTADO DE MATO

GROSSO

A Polícia Militar foi criada, no Estado de Mato Grosso, através da Lei

provincial datada de 5 de setembro de 1835, com a denominação de Corpo Policial

Homens do Mato; o corpo Policial era composto de 1 comandante (Capitão), 3 cabos

e 24 soldados.

Já por ocasião da Guerra do Paraguai, o Corpo Policial Homens do Mato, devido à reorganização recebida, teve a sua nova denominação de Companhia de Pedestres e, mais tarde, com o advento da República, passou a denominar-se Força Pública, conservando essa denominação até 1934, quando passou a denominar-se Força Policial Militar. Pelo Decreto nº 337, de 25 de julho de 1947, passou a Instituição a denominar-se Polícia Militar.

2

Hoje, a polícia mato-grossense possui em seus quadros cerca de 5.000

(cinco mil) policiais.

Segundo Costa (2004), a influência da ideologia militar na Segurança

Pública é, portanto, histórica. Além de submeter-se “às ordens emanadas dos

superiores”, havia a indicação de oficiais do Exército para integrar os quadros da

Polícia Militar de Mato Grosso. Essa migração do Exército para a Polícia Militar, em

grande parte, é responsável pelas práticas de controle social, com base na ideia de

2 DIÁRIO DE CUIABÁ. José Maria Morais assume Comando Regional da PM em VG. 2003.

Disponível em: <http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=154745>. Acesso em: 05 maio 2013.

12

que existe um inimigo potencial da sociedade por trás de cada movimento social de

contestação o que, de alguma forma, afronta e questiona a legitimidade das leis.

De acordo com Decreto Lei nº 26, de 13 de janeiro de 1993, a Polícia Militar

do Estado de Mato Grosso, força auxiliar e reserva do Exército, é uma instituição

permanente, organizada, com base na hierarquia e na disciplina, competindo-lhe a

polícia ostensiva, a preservação da ordem pública e a Polícia Judiciária Militar

Estadual, além de outras atribuições que a lei estabelece.

Atualmente, a Polícia Militar do Estado de Mato Grosso é subordinada,

hierárquica e administrativamente, ao Governador do Estado, sendo comandada por

um oficial da ativa, do último posto da carreira, do Quadro de Oficiais da Polícia

Militar previsto na Corporação.

A ação policial, organizada de forma sistêmica, realiza-se sob direção

unificada e subordinada, operacionalmente, à Secretaria de Estado de Justiça e

Segurança Pública.

O Estatuto da Polícia Militar determina que a mesma tenha autonomia

administrativa, funcional e financeira, dispondo de dotação orçamentária própria,

conforme dispuser a Lei Orçamentária do Estado, e que suas competências são:

executar, com exclusividade, ressalvada a competência das Forças

Armadas, a polícia ostensiva, planejada pela autoridade policial militar competente, a

fim de assegurar o cumprimento da lei, a preservação da ordem pública e o

exercício dos poderes constituídos;

atuar preventivamente, como força de dissuasão, em locais ou áreas

específicas, onde se presuma ser possível à perturbação da ordem pública;

atuar repressivamente, em caso de perturbação da ordem pública e no

gerenciamento técnico de situações de risco;

exercer atividades de investigação criminal militar;

atuar na fiscalização e controle dos serviços de vigilância particular no

Estado;

realizar os serviços de busca e resgate aéreo, aquático e terrestre no

Estado;

auxiliar nas atividades de defesa civil no Estado;

realizar o policiamento na área externa dos estabelecimentos penais;

auxiliar na escolta de preso, realizada pela Polícia Judiciária Civil; e

13

desempenhar outras atribuições previstas em lei.

2.2 HISTÓRIA E FORMAÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL NO ESTADO DE

MATO GROSSO

Com o Golpe de Estado, em 1964, e o Ato Institucional de 1969, as polícias

estaduais passaram a ser subordinadas e fiscalizadas pelo Exército Brasileiro, por

determinação do General-Presidente Emílio Garrastazu Médici.

Em 1969, por força do Decreto Lei Federal de nº 667, foram extintas todas

as Guardas Civis até então existentes e se atribuiu, exclusivamente, às instituições

militares estaduais a execução do policiamento ostensivo e a manutenção da ordem

pública. Já a Polícia Judiciária Civil ficou incumbida da tarefa de fazer a instauração

de inquéritos, apuração dos fatos, investigação e conclusão do inquérito policial para

ser encaminhado ao Poder Judiciário. (COSTA, 2004)

Em 1979, em Lei nº 4163, de 20 de dezembro de 1979, o então Governador

do Estado, Sr. Frederico Campos, cria a estrutura e dispõe sobre o funcionamento

dos órgãos estaduais e, em especialmente, no seu art. 33, cria a Secretaria de

Segurança Pública do Estado e, ainda, em seu anexo II, dispõe sobre a criação de

72 Delegacias Regionais de Polícia de 1ª, 2ª e 3ª categorias, em todo o Estado de

Mato Grosso. Posteriormente, a Lei Estadual nº 4721, de 12 de julho de 1984, cria o

1º Estatuto da Polícia Civil que, em seu art. 46, prevê a realização de concurso

público para a carreira da Policia Civil. Ao que se sabe, em relação à formação,

somente em 1985 é que foi realizado o primeiro concurso para a Polícia Judiciária

Civil em Mato Grosso. Até então, o que vigorava eram as indicações feitas por

políticos e pessoas de prestígio na sociedade.

Em 1988, a Constituição Federal, em seu art. 144, dispõe sobre a segurança

pública e determina em seu item IV, parágrafo 4º, a função da Polícia Judiciária Civil.

E, regulamentada pela Lei complementar nº 155, de 14 de janeiro de 2004 - D.O.

14.01.04, a Polícia Judiciária Civil é considerada instituição permanente do Poder

Público, essencial à defesa da sociedade e à preservação da ordem pública, fica

sujeita à vinculação e orientação de políticas públicas e planejamento estratégico da

Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, sem prejuízo da subordinação

administrativa superior ao Governador do Estado.

14

A Polícia Judiciária Civil, incumbida das funções de Polícia Judiciária e da

apuração das infrações penais, exceto das matérias de exclusiva competência da

Justiça Militar e, ressalvadas as de competência da União, é dirigida por Delegado

de Polícia da ativa, de última classe, de livre escolha, de nomeação e exoneração

pelo Governador do Estado. A mesma tem autonomia administrativa, dispondo de

dotação orçamentária própria, conforme previsão na Lei Orçamentária Estadual.

No atual Estatuto da Polícia Judiciária Civil, encontram-se expressos os seus

princípios institucionais: a unidade, a indivisibilidade, a uniformidade de doutrina e de

procedimento, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade, a

eficiência, a probidade administrativa, a ética, a hierarquia e a disciplina.

Também no mesmo Estatuto, consta que é de sua competência apurar, com

exclusividade, as infrações penais e combater, com eficácia, a criminalidade, além

de:

cumprir e fazer cumprir, no âmbito das suas funções, os direitos e as

garantias constitucionais, estabelecendo o respeito à dignidade da pessoa humana e

sua convivência harmônica com a comunidade;

praticar, com exclusividade, todos os atos necessários à apuração das

infrações penais no inquérito policial e termo circunstanciado;

adotar as providências preliminares destinadas a preservar os vestígios e

as provas das infrações penais;

requisitar perícias em geral, para comprovação da infração penal e de sua

autoria;

guardar, nos atos investigatórios, o sigilo necessário à elucidação do fato;

manter estreito e constante intercâmbio de caráter investigatório e judicial

entre os órgãos congêneres de polícia interestadual, para centralização,

coordenação e difusão das informações referentes à criminalidade, em intercâmbio

com as demais Unidades da Federação;

prestar informação, quando fundamentadamente requisitada pela

autoridade competente, referente aos procedimentos policiais;

organizar e manter cadastro de pessoas indiciadas pela prática de

infrações penais;

15

organizar, fiscalizar e manter o cadastro e registro de armas, munições,

explosivos e demais produtos controlados, bem como expedir licença para as

respectivas aquisições;

manter o serviço de estatística, de maneira a fornecer informações

precisas e atualizadas sobre os índices de criminalidade; e

exercer policiamento repressivo e especializado, mantendo, para isso,

equipes de policiais treinados, armamentos e meios de transporte adequados para

realizar o rastreamento investigatório aéreo, terrestre e em águas fluviais.

16

3 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL

Uma organização, instituição ou empresa prepara suas estratégias de

atuação dentro de uma estrutura organizacional, respeitando, assim, as hierarquias

e subordinações.

Para Chiavenatto (1993), uma organização empresarial consiste em um

conjunto de encargos funcionais e hierárquicos, orientados para o objetivo

econômico de produzir bens ou serviços. As organizações são concebidas como

“unidades sociais (ou agrupamentos humanos) intencionalmente construídas e

reconstruídas, a fim de atingir objetivos específicos”.

As organizações são compostas por pessoas e, dessa forma, orientadas por

uma diferenciação de poder, desenvolvendo, desta forma, a cultura da hierarquia,

determinando como será a concentração de autoridade em cada pessoa que a

compõe. Esta distribuição de poder foi criada para repartir a resolução de

problemas, delegando responsabilidades, de acordo com o poder instituído a cada

componente desta instituição.

Especialmente nas instituições públicas, como é o caso de nosso estudo,

existe uma estrutura hierárquica severa, que divide as organizações em camadas,

escalas ou níveis de autoridade, aonde os supervisores possuem uma autoridade

hierárquica funcional sobre os subordinados; à medida que se sobe na escala

hierárquica, aumenta o volume de autoridade do ocupante do cargo.

Tratando-se especialmente do caso das Polícias Militar e Civil, mesmo

considerando como instituições públicas subordinadas a uma força política (Governo

do Estado), a escala hierárquica fica um pouco mais burocrática. É necessário

lembrar que estamos falando de dois grupos de trabalho, com forças operacionais

com diferentes subordinações e que têm como função promover a ordem, a

segurança e a justiça perante a comunidade.

Segundo Mariano (2004), algumas características trazidas do tempo do

império acarretaram conflitos de competência, distanciando a direção das

instituições policiais, criando duplicidade de equipamentos e de gerenciamento das

operações que, somados, constituem uma das principais causas estruturais da

ineficiência do setor.

17

No subcapítulo a seguir, com o intuito de criar uma imagem mais próxima,

explorar-se-á com alguns detalhes, como funciona na prática a estrutura

organizacional da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso.

3.1 COMENTÁRIOS ACERCA DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA POLÍCIA

MILITAR DE MATO GROSSO

A Polícia Militar tem sua estrutura organizacional própria, distribuída em seis

níveis: Direção Superior, Decisão Colegiada, Gerência Superior, Assessoramento

Superior, Administração Sistêmica e Execução Programática.

O nível de Direção Superior é representado pelo Comandante Geral que

recebe orientação direta do mais alto escalão do Governo, é responsável pelo

comando direto da Corporação.

No nível de Decisão Colegiada se define as políticas e objetivos estratégicos

para determinado assunto ou área da Corporação. É constituído por um Conselho

formando por Coronéis.

Os ocupantes do nível de Gerência Superior recebem orientação direta do

Comandante Geral para implantação, controle e avaliação de programas e projetos

de interesse da Corporação. É constituído pelo Comando Geral Adjunto e Diretoria

de Saúde.

O nível de Assessoramento Superior também recebe orientação direta do

Comandante Geral e tem a função de prestar apoio especializado. É constituído por

uma Assessoria e Comissões.

O nível de Administração Sistêmica é responsável pela administração da

Instituição; incumbe-lhe o planejamento e administração em geral, visando atender

às necessidades de pessoal e material necessários ao emprego da Corporação para

o cumprimento de suas missões. É constituído por Diretorias, Departamentos,

Centro de Capacitação, Desenvolvimento e Pesquisa e Escolas.

Por último, o nível de Execução Programática que o responsável pela

atividade-fim da Corporação, cumprindo as missões e as ordens emanadas do nível

de direção superior. É constituído por Comandos de Áreas e Núcleos de Serviços

Especializados (Corregedoria/Ouvidoria, Comandos Especializados e Setores de

Inteligência).

18

A hierarquia e a disciplina são bases institucionais da Polícia Militar. A

autoridade e a responsabilidade crescem com o grau hierárquico; caracterizam-se

pela ordenação de autoridade em níveis diferentes na estrutura da Corporação. A

ordenação se faz por posto ou graduação. Dentro de um mesmo posto ou de uma

mesma graduação, a ordenação se faz pela antiguidade no posto ou na graduação.

A disciplina consiste na rigorosa observância e o acatamento integral das

leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam a Organização Militar

Estadual e coordenam seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo

perfeito cumprimento do dever, por parte de todos os componentes da Corporação.

A carreira de policial militar é dividida em níveis.

A carreira dos militares estaduais de nível superior é estruturada pelos

oficiais da Polícia Militar, sendo composta pelos postos de Segundo Tenente,

Primeiro Tenente, Capitão, Major, Tenente-Coronel e Coronel.

O ingresso na carreira dos militares estaduais de nível superior dar-se-á

como Aluno Oficial da Polícia Militar. Lembrando que se trata de uma carreira

estruturada em dois níveis de cargos, o médio (praças) e superior (oficiais).

A carreira das praças é composta das graduações de Soldado, Cabo, 3º

Sargento, 2º Sargento, 1º Sargento e Subtenente. O ingresso na carreira de nível

médio dar-se-á como Aluno Soldado da Polícia Militar.

No tocante à promoção dos policiais militares, são considerados critérios

objetivos e subjetivos (antiguidade, merecimento, bravura, post-mortem e

recompensa).

Promoção por antiguidade é aquela que se baseia na precedência

hierárquica de um militar estadual sobre os demais, de igual posto ou graduação,

dentro de um mesmo quadro.

Promoção por merecimento é aquela que se baseia no conjunto de atributos

e qualidades que distinguem e realçam o valor do militar estadual, entre seus pares,

avaliados no decurso da carreira e no desempenho de cargos e comissões

exercidos, em particular no posto ou graduação que ocupa, ao ser cogitado para

promoção.

A promoção por bravura é aquela que resulta de ato ou atos não comuns de

coragem e audácia que, ultrapassando os limites normais do cumprimento do dever,

representem feitos indispensáveis ou úteis às operações policiais militares, pelos

resultados alcançados ou pelo exemplo positivo deles emanado.

19

A promoção post-mortem é aquela que visa expressar o reconhecimento do

Estado ao militar estadual falecido no cumprimento do dever ou em consequência

disto, ou a reconhecer o direito do militar a quem cabia à promoção, não efetivada

por motivo do óbito.

O ato de promoção dos oficiais é consubstanciado por Decreto do

Governador do Estado, enquanto que o ato de promoção das praças até a

graduação de Aspirante a Oficial é de competência do Comandante Geral da

Corporação.

O cargo de entrada na carreira de militares estaduais de nível médio

(praças) é o de Soldado PM e, no nível superior (oficiais), o cargo de entrada é o de

Aspirante a Oficial, declarado após o término do curso de formação na Academia da

Corporação.

No subcapítulo seguinte, a fim de criar uma ideia mais próxima ao real,

explorar-se-á com alguns detalhes de como funciona, na prática, a estrutura

organizacional da Polícia Civil do Estado de Mato Grosso.

3.2 COMENTÁRIOS ACERCA DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA POLÍCIA

CIVIL DO ESTADO DE MATO

A Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso tem em sua estrutura básica os

seguintes órgãos: Direção Superior, Conselho Superior de Polícia, Assessoramento

Superior, Controle Interno e Orientação, Administração Sistêmica e Órgãos de

Execução Programática.

Na Direção Superior, encontram-se a Diretoria Geral e Diretoria Geral

Adjunta da Instituição.

O Órgão de Decisão Colegiada é o Conselho Superior de Polícia Judiciária

Civil. O Conselho é composto pelos diretores da Instituição sendo presidido pelo seu

Diretor Geral.

O Órgão de Assessoramento Superior é composto pelo Gabinete de

Direção, Assessoria Jurídica, Assessoria de Comunicação Social, Coordenadoria de

Planejamento e Modernização, Gerência de acompanhamento da Execução

Orçamentária e Gerência de Estatística e Informações.

20

O Órgão de Controle Interno e Orientação é representado pela Corregedoria

Geral de Polícia Judiciária Civil. Esse órgão, dentre outras atribuições, é responsável

pela instauração de Processos Administrativos com a finalidade de apurar eventuais

desvios de conduta por parte de servidores da Instituição.

O Órgão de Administração Sistêmica é responsável pela Coordenadoria

Administrativa e Financeira, Gerência Contábil, Gerência de Material e Patrimônio e

Gerência de Transporte e Serviços Gerais. E ainda pela Coordenadoria de Gestão

de Pessoas (Gerência de Folha de Pagamento, Saúde e Benefícios, Coordenadoria

de Tecnologia da Informação e Comunicação).

Os Órgãos de Execução Programática são representados por diretorias que

abrigam as unidades policiais que desempenham atividades fins da Instituição. E

dentre as quais cito a Diretoria de Atividades Especiais, Academia de Polícia

Judiciária Civil, Diretoria Metropolitana e Diretoria do Interior.

Subordinado a Diretoria de Atividades Especiais, encontram-se a Gerência

de Repressão a Sequestro e Investigações Especiais, Gerência de Operações

Especiais, Gerência de Operações Aéreas, Gerência de Inteligência Policial,

Polinter, Gerência de Armas, Explosivos e Munições, dentre outras.

A Academia de Polícia Judiciária Civil é responsável pela política de ensino

e formação profissional dos policiais civis. É a porta de entrada da carreira do policial

civil. E a exemplo do que ocorre na Polícia Militar, todo candidato a um cargo na

Polícia Civil, aprovado em Concurso Público, antes de exercer sua atividade fim, é

submetido a um curso de formação profissional na escola da Instituição.

A função da Academia de Polícia é idealizar e manter, de forma constante,

politicas de ensino com a finalidade de formar, atualizar e especializar o policial civil

para que o interesse da Instituição e sociedade seja atendido por um profissional

qualificado.

A Diretoria de Polícia Judiciária Civil Metropolitana é responsável pela

gestão de todas as unidades policiais sediadas na região metropolitana da Capital.

Trata-se de delegacias de atendimento geral, plantões policiais e delegacias

especializadas (Delegacia de Homicídios, Delegacia de Defesa da Mulher,

Delegacia de Defesa da Criança e Adolescente, dentre outras).

A Diretoria do Interior é responsável pelas unidades policiais sediadas em

cidades do interior do Estado. A gestão é realizada por meio de Delegacias

21

Regionais (Gerências de Investigações Gerais, Delegacias Seccionais, Delegacias

Especializadas e Delegacias de Polícia).

A Polícia Judiciária Civil é organizada em série de classes, com níveis

crescentes de atribuições e responsabilidades funcionais.

A carreira policial é escalonada em cargos de natureza policial civil, de

provimento efetivo e exercício privativo de seus titulares, constituídas em uma série

de quatro classes (A, B, C e E). É estruturada com os cargos de Autoridade Policial

(Delegado) e Agentes da Autoridade (Escrivão e Investigador).

A Autoridade Policial é o Delegado de Polícia que, investido por lei, tem a

seu cargo a direção das atividades da Instituição.

O Agente da Autoridade é o policial encarregado da prática de atos

investigatórios ou na formação de inquéritos policiais e procedimentos

administrativos, para prevenir ou reprimir infrações penais sob a direção mediata e

imediata da Autoridade Policial.

A função policial se fundamenta na hierarquia e na disciplina, sendo

incompatível com qualquer outra, exceto nos casos previstos em lei. Está sujeita à

prestação de serviços em condições adversas de segurança, com risco de morte,

plantões noturnos e chamadas a qualquer hora, desde que justificada a

necessidade, inclusive com a realização de diligências policiais, em todo Estado de

Mato Grosso ou fora dele.

O ingresso na Polícia Judiciária Civil far-se-á, nas classes iniciais da carreira

policial, mediante concurso público de provas ou de provas e títulos, realizado pela

Academia de Polícia Judiciária Civil, em que se apurem qualificações e aptidões

específicas para o desempenho das atribuições do cargo.

O Delegado de Polícia será lotado, inicialmente, em Delegacia do Interior do

Estado, observada a classificação da unidade policial definida em regimento interno.

Os cargos de Delegado de Polícia são privativos de Bacharéis em Direito,

assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil na realização do

concurso para este cargo.

A promoção é a elevação do policial civil à classe imediatamente superior. O

processo de promoção na carreira da Polícia Judiciária Civil se instaura mediante

portaria do Diretor-Geral de Polícia Judiciária Civil, trinta dias após a verificação da

primeira vaga, abrangendo as ocorridas até a data da publicação da portaria e as

decorrentes das promoções a serem efetuadas.

22

A promoção dar-se-á por antiguidade e merecimento, ressaltando-se que,

após a elaboração das duas listas respectivas, serão promovidos um terço por

antiguidade e dois terços por merecimento.

Para concorrer à promoção o policial deverá ter curso de no mínimo 200

(duzentas) horas, específico na área de atuação. E para ser promovido à classe “E”,

o curso exigido é aquele que conta com uma carga mínima de mais 250 (duzentas e

cinquenta) horas. E, exclusivamente para o Delegado de Polícia, Curso Superior de

Polícia, todos devidamente autorizados pelo Diretor-Geral da Instituição.

Para efeito de promoção, observar-se-á o interstício de, no mínimo, três

anos em cada classe. E de uma para outra classe dos cargos exercidos em caráter

efetivo, serão obedecidos o interstício e a titulação exigida, observado o percentual

de 15% (quinze por cento) para a classe “Especial”; 20% (vinte por cento) para a

classe “C”; 25% (vinte e cinco por cento) para a classe “B” e 40% (quarenta por

cento) para classe “A”.

As promoções por merecimento serão processadas por comissão

designada, observados, além da avaliação de desempenho, os requisitos do

cumprimento da carga horária exigida para cada classe, nos cursos já citados.

3.3 ANÁLISE DAS ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS DAS POLÍCIAS DE

MATO GROSSO

Ao verificarmos a legislação que estrutura a Polícia Militar e a Polícia Civil do

Estado de Mato Grosso, constatamos algumas semelhanças estruturais,

especialmente no que tange à discriminação dos níveis hierárquicos. Nas duas

estruturas apresentadas, é possível verificar que os níveis de Direção Superior,

Decisão Colegiada, Gerência Superior (PM), Assessoramento Superior, Controle

Interno e Orientação (PJC), Administração Sistêmica e Execução Programática se

assemelham, principalmente nas estratégias de distribuição de poder entre as

instituições.

Como já explanamos, a função da polícia é prevenir o crime e zelar pela

ordem social, mas o que temos assistido em nosso dia a dia é o avanço da

criminalidade e o uso da força por policiais na realização de suas atividades. Não

nos compete discutir a violência ou mesmo o crime; nosso estudo está

23

fundamentado em analisar a organização do trabalho policial. No entanto, o trabalho

policial é providenciar este controle do crime e sua expansão social, inibindo-o,

frente à sociedade.

Uma vez que citamos o cidadão, é preciso lembrar que a estrutura

organizacional, citada anteriormente, é composta por cidadãos que têm como função

tomar conta de outros, mesmo que este outro não tenha vínculo algum com este

policial.

Mas, o que isso tem em comum com a análise da estrutura organizacional

das polícias? Argumento que a estrutura que queremos mostrar é uma estrutura de

distribuição do poder, ou hierarquia, que também usa de sua força para coibir

atitudes que possam não ser esperadas por seus subordinados. Assim como

acontece com a população atendida pela nossa polícia.

A construção histórica e a força da cultura organizacional das polícias

delineia a tendência do controle no convívio com a autoridade, seja ela funcional, ou

na aplicação da força policial como mantenedora da autoridade perante a sociedade.

Nos estudos de Hirayama (2005), sobre a cultura organizacional, ela

defende que

[...] é o produto das diversas formas de relacionamento como os participantes interagem no ambiente de trabalho. A cultura de uma organização é definida pelo entendimento que seus integrantes fazem do sistema social a que pertencem. Um campo simbólico constituído por processos de interpretação que fornecem um contexto para dar significado tanto à organização quanto à realidade que ela ocupa.

Os policiais, invariavelmente, desenvolvem uma compreensão equivocada

dos direitos humanos, principalmente porque não experimentam em suas vidas o

exercício dessas prerrogativas, dado que exercem seu trabalho no interior de

instituições verticalizadas, escalonadas e discriminadoras de direitos.

Quanto à organização atual, fica bastante claro que se trata de administrar,

em duplicidade, instituições que possuem cargos com nomes modificados, mas que

estão planejando e executando o mesmo trabalho, o de polícia. Um bom exemplo

disto é verificarmos que existem duas academias, que são organismos de formação

dos profissionais e que também são importantes na progressão de carreira destes

trabalhadores, assim como os cursos extras; no caso ainda de promoção, as duas

24

polícias valorizam o tempo em que o policial presta serviço, fazendo, assim, da

experiência profissional um caminho para alcançar um novo posto.

Segundo Cano (2003), existe um problema que reside na divisão da

atividade de polícia em duas Corporações – Civil e Militar -, o autor descreve uma

situação de discriminação entre os policiais dentro da própria corporação, ao afirmar

que:

[...] há um profundo fosso entre a cúpula e a base dentro de cada polícia – oficiais e praças na polícia militar; delegados e “tiragem” na polícia civil -, que mina a coesão interna, anula a possibilidade de ascensão funcional dos níveis inferiores até o topo da hierarquia, e faz com que, na prática, existam duas corporações, com culturas próprias, dentro da cada uma. (CANO, 2003, p. 37)

Ainda, na verificação das atividades estruturais da Polícia Militar,

conseguimos entender que há um grande distanciamento entre a administração e a

operação distribuídas em níveis. Na Polícia Judiciária Civil também se observa um

aumento de cargos, um certo distanciamento entre o planejamento (Diretorias) e a

atividade-fim (Delegacias).

As polícias convivem com o grave problema traduzido pela hipertrofia de

suas atividades-meio, em detrimento de suas atividades-fim. Uma lenta estrutura

burocrática atrai quadros das corporações que deveriam estar alocados nas pontas

dos serviços de segurança. O mesmo pode ser dito dos servidores deslocados para

funções burocrático-protocolares em órgãos e repartições dos três poderes, em

troca de gratificações para complementar os magros vencimentos.

Dessa forma, buscamos, no entendimento da necessidade em manter o

modelo atual de dupla atribuição, perceber que há uma formação especialista de

cada policial; o Soldado da PM, para galgar ao posto de Coronel, precisa investir

muito na especialidade do cargo e contar com a sorte, para ser aprovado no

concurso para oficiais; igualmente, o investigador de polícia deverá buscar em

concurso público a aprovação para o cargo de Delegado de Polícia. O fato de já

estar na carreira policial não confere nenhuma vantagem ao candidato policial. O

que faz prevalecer um processo desmotivacional, quanto ao investimento

profissional.

Como nos mostra Mariano (2004, p. 70-71), em seu estudo sobre um novo

modelo de polícia para o Brasil,

25

[...] não são raros os casos em que delegados de polícia recém-formados assumem delegacias de polícia e acabam reféns de investigadores e escrivães antigos, que conhecem as rotinas e o dia-a-dia da atividade policial. As carreiras de níveis base da polícia civil são horizontais, os policiais se aposentam no último grau de investigadores ou escrivães e são raros os casos em que policiais da base tornam-se por concurso público delegados de polícia. Nas polícias militares não é diferente. Há concurso para praças (soldados) e para oficiais (aspirantes) e são raros os casos em que soldados chegam a coronéis, nas polícias militares. Na carreira interna da polícia militar, na maioria das vezes, um praça chega até a última graduação, que é primeiro sargento ou subtenente.

Para Bayley (2001, p. 236), pensar num profissional especialista oferece

outras desvantagens que não somente as motivacionais. Para ele

[...] a especialização no combate ao crime pode torná-lo ainda pior por ignorar não apenas a prevenção eficaz de crimes como também a cooperação da população. E, como as pesquisas demonstram, a cooperação da população, especialmente na forma de testemunhos voluntários, é a chave para se prender criminosos.

Ao que parece, não há um interesse político, a nível estadual, em rever

estas estruturas; o que importa, politicamente, é ver o policial nas ruas, mantendo a

imagem da polícia ostensiva que, virtualmente, não resolve os problemas sociais,

mas faz com que a população acredite ser esse o modelo de proteção e segurança.

No caso do Estado de Mato Grosso, no que tange à questão de

remuneração e benefícios, cabe ressaltar que houve melhora no planejamento e

distribuição dos mesmos. Conforme o Estatuto da Polícia Militar e da Polícia Civil,

que prevê encargos salariais, atualizados de acordo com a necessidade de cada

função. Porém, há de considerar que a remuneração não é isoladamente um fator

motivador de desempenho profissional.

Segundo Bergamini (1997), o incentivo verdadeiramente eficaz é aquele que

o trabalhador incorpora a sí mesmo e a atitude que assume com relação ao trabalho.

Um incentivo é uma meta objetiva capaz de satisfazer alguma necessidade do

trabalhador ou algum de seus impulsos e desejos.

Mas, quanto à disciplina e controle hierárquico, há eficiência dentro das

Corporações Civil e Militar, notadamente na Polícia Militar, que herdou o controle e a

rigidez disciplinar do Exército Brasileiro; cometem até exageros na disciplina,

fiscalizando até mesmo fardas e coturnos, além de punir com prisão determinados

casos de indisciplina. Na Polícia Civil, no caso de indisciplina, não cabe prisão

26

administrativa, mas existe um órgão investigador, chamado Corregedoria, que

investiga os fatos, podendo criar uma comissão de sindicância para aprofundar a

investigação para depois punir, seja qual for o caso. Como conhecemos a

importância da história de cada instituição, entende-se porque estes parâmetros são

utilizados de forma tão diferenciadas, em cada polícia.

Desta forma, podemos visualizar polícias incompletas, policiamento

ostensivo marcado pelo caráter repressivo, deficiências na investigação, estruturas

anacrônicas, centralização do sistema nos Estados e pouca participação política,

são características de um modelo de polícia já esgotado.

Sabemos que não existe um modelo ideal de polícia, pois, mesmo que este

fosse criado, em pouco tempo já necessitaria de alterações e revisões de suas

atividades e, também, que, para propor um modelo ideal, é necessária a realização

de pesquisas aprofundadas no assunto, o que não temos tempo hábil para fazer e

nem é o nosso objetivo, neste trabalho.

O que apresentamos, até aqui, foi o modelo atual e suas falhas, no que diz

respeito à duplicidade de atividades realizadas e pelo planejamento de ações

voltadas para o mesmo fim. Como já fora exposto, é importante aperfeiçoar o atual

modelo de polícia, para que se possa promover um maior aproveitamento técnico e

científico, com implementos de um novo método para a progressão na carreira.

Como citado anteriormente, hoje não é possível um policial chegar ao último

cargo na pirâmide organizacional, por meio de ascensão natural na carreira. A falta

de um plano de cargos e carreira única nas polícias que compõem o sistema de

segurança pública brasileiro cria, na atividade policial, um distanciamento entre os

que entram para exercer funções de comando intermediário e aqueles que entram

na base da instituição.

A ascensão daqueles que estão na base, se dá apenas por meio de um

novo concurso público. O problema é que, invariavelmente, o policial que se dedica

com afinco à sua atividade não tem tempo de preparar-se o suficiente para

enfrentar, num certame, candidatos recém-saídos das faculdades e cursinhos

preparatórios. Então, o preenchimento dos cargos de comandos por pessoas sem

qualquer vocação para a carreira policial é uma realidade em nossas polícias,

notadamente na Polícia Civil.

27

Diante de todo o referencial teórico aqui explorado, aliando realidade e

aspirações profissionais dos profissionais em questão, pretende-se, no próximo

capítulo, explorar e propor um novo modelo de Polícia.

4 UM NOVO MODELO DE POLÍCIA

Propor um novo modelo de polícia não é tarefa fácil. O ideal é remodelar ou

reaproveitar o modelo atual. O que se propõe, nesse trabalho, é apenas discutir a

possibilidade de implantar uma nova estrutura policial nos Estados brasileiros. O

objetivo é estabelecer um novo modelo de gestão e aproveitar melhor os recursos

demandados no exercício dessa atividade.

Depois de conhecer o Estatuto das Polícias Militar e Civil de Mato Grosso,

praticamente igual aos de outros estados, o nosso entendimento é de que há uma

necessidade premente de fundir essas forças, criando uma só instituição. A intenção

é diminuir custos e evitar o retrabalho. Nesta proposta, vamos apresentar uma nova

concepção da Polícia.

A intenção de criar uma nova polícia vem a contrapor à Constituição Federal,

no artigo144, que dispõe sobre as atribuições das instituições alvos deste trabalho.

Em 1988, os deputados constituintes perderam uma oportunidade de corrigir um

modelo policial injusto a seus profissionais de base, além de oneroso aos cofres

públicos.

Alguns autores e pesquisadores já explanaram sobre o alto custo

demandado com a manutenção de duas polícias, expuseram também a respeito da

ineficiência da atuação em duplicidade, portanto, o assunto não é novidade. Mas é

preciso que a unificação dessas forças policiais ocorra com uma visão mais humana

da atividade policial, e venha com um plano de cargos, salários e carreira única para

os policiais. O ingresso seria no primeiro nível de cargo e progressão na carreira até

o mais elevado posto da hierarquia da organização.

Este é o nosso foco: trabalhar com um grupo de profissionais voltados ao

resgate da cidadania, proporcionando aos profissionais da carreira policial um

aproveitamento pleno dos direitos de exercer a função, sem decompor a imagem do

ser humano que a executa. Não pretendemos criar uma terceira, ou quarta polícia; a

28

intenção é unificar as atividades policiais no âmbito estadual, melhorando a

qualidade e eficiência do serviço público prestado à sociedade.

Nessa proposta, estamos pensando em um funcionário público eficiente,

voltado diretamente à atividade que lhe satisfaça e promova motivos para que se

realize profissionalmente.

Faz-se importante citar que, em alguns Estados, há programas de atuação

social. Modelos como uma polícia comunitária e conselhos comunitários são ações

recentes, mas de execução, ainda, na concepção da dualidade policial. Os

defensores deste sistema pregam uma integração que nunca ocorre plenamente,

pois sempre esbarra na duplicidade de comandos, que tende a “minar” qualquer

projeto alicerçado nessa filosofia de trabalho.

No âmbito da Segurança Pública, a integração funciona por ações de

governo em casos pontuais; mas, em políticas de estado, já se mostrou ineficiente.

Motivo pelo qual defendemos que compor os profissionais da Polícia Militar e da

Polícia Civil, numa única instituição, é a melhor estratégia na luta contra o crime.

Para que seja possível viabilizar esta proposta, será preciso apresentar um

plano de cargos e carreiras que se revele interessante aos profissionais das duas

instituições em questão. Reconhece-se que muitos são os contratempos registrados

na história das carreiras dessas duas instituições, em razão do desempenho de

funções congruentes.

Criando uma careira única, após a unificação, podemos pensar num estado

motivacional bem diferente do encontrado atualmente. Hoje, a herança militar do

Exército na atuação da Polícia Militar causa um desgaste profissional àquele que

optou pela carreira sem vislumbrar condições favoráveis as suas aptidões. O mesmo

ocorre aos policiais civis que, muitas vezes, lidam com questões de adaptação de

novos critérios no trabalho.

Mariano (2004, p. 71) descreve, em sua pesquisa, o início e as

consequências da duplicidade, ora comentada. Segundo ele

[...] A falta de um plano de cargos, salários e carreiras única nas polícias que compõem o sistema de segurança pública brasileiro, cria, na prática da atividade policial, distanciamento entre os que entram para exercer funções de comando intermediário e aqueles que entram na base da instituição com poucas possibilidades de ascensão.

29

Este modelo parece descrever a falta de planejamento estratégico, pois

planos de ação em conjunto viabilizariam muito mais as atividades policiais, em

amplo desenvolvimento de aptidões pessoais e profissionais que podem ser

alocados, no caso da unificação policial.

A compreensão de que a sociedade estaria mais bem servida com uma

única polícia, não é novidade. Pois a duplicidade de forças policiais, atuando na

mesma atividade, é questionada através de projetos de Emenda à Constituição no

Congresso Nacional.

As atribuições da Polícia Civil e da Polícia Militar foram definidas no artigo

144 da Constituição Federal de 1988. À primeira incumbe à função de polícia

judiciária e investigação criminal e, à segunda, de forma ostensiva, cabe à

preservação da ordem pública.

Mas, desde a promulgação da Constituição, em 1988, alguns políticos

tentam alterar o artigo que disciplina a atividade policial, de modo a possibilitar a

implantação de um novo modelo policial para os Estados. Exemplo disso são as

Propostas de Emenda Constitucional de números 613/1998 e 102/2011. A primeira

de autoria da ex-Deputada Federal, por São Paulo, Zulaiê Cobra; a segunda pelo

Senador de Mato Grosso, Blairo Borges Maggi.

Pela proposta da Deputada, apresentada em 17/06/1998, nos Estados

haveria uma só Polícia que seria responsável desde a apuração de infrações penais

até a preservação e restauração da ordem pública, estruturada em, no mínimo, dois

Departamentos: o de Polícia Judiciária e de Investigação, e o de Polícia Ostensiva.

Já a proposta apresentada pelo Senador possibilita a unificação das polícias Militar e

Civil pelos Estados, que passaria a atuar em ciclo completo da atividade policial

(ostensiva e repressiva). O autor desta proposta, Senador Blairo Maggi, ex-

governador do Estado de Mato Grosso, por dois mandatos consecutivos, como

ninguém, conhece os problemas decorrentes da duplicidade de comandos numa

mesma área de atuação.

O Senador é oriundo da inciativa privada e, como empresário de sucesso,

deve ter constatado que a manutenção de duas policias na Segurança Pública custa

caro ao tesouro estadual. A causa principal reside na dificuldade de otimizar os

recursos disponíveis a cada Instituição. Não por falta de gestão, mas por ser uma

característica do modelo. Pois cada instituição maneja os seus recursos sem levar

30

em conta a necessidade da outra. O resultado é uma forma inadequada de eleger

prioridades.

O certo é que, nas duas PEC`s, observa-se características comuns e

interessantes ao nosso estudo e, em ambas, foi possível identificar questionamentos

e justificativas que convencem no sentido de promover alterações no artigo 144 da

Constituição Federal, dando nova redação a esse dispositivo constitucional para

incluir a possibilidade de unificação das polícias no Brasil.

Pela PEC 102/2011, o critério de unificação é deixado aos Estados e Distrito

Federal:

[...] a adoção de polícia única, no seu respectivo âmbito, cujas atribuições congregam as funções de polícia judiciária, a apuração de infrações penais, de polícia ostensiva, administrativa e a preservação da ordem pública.” No caso de adoção do novo modelo, a questão relativa a cargos, remunerações e realocações para cargos compatíveis com os da graduação atual de cada policial, será disciplinada por lei federal. (MAGGI, 2011)

A Proposta de Emenda Constitucional do Senador Blairo Maggi também

inova, ao demonstrar uma preocupação em estabelecer um tipo de remuneração por

subsídio, bem como o estabelecimento de um piso nacional e um fundo federal para

auxiliar os estados que não podem pagá-lo. Cria cargos como os de Delegado de

Polícia, carreira jurídica, com a exigência de bacharelado em direito; o quadro de

Analista de Polícia e o de Perito de Polícia. Pretende, ainda, propor o direito de

ascensão funcional do cargo de Analista de Polícia para o cargo de Delegado e

Perito, com percentual a ser definido em lei.

Algumas entidades de classe, tanto da Polícia Civil quanto da Polícia Militar,

têm questionado publicamente a proposta, na atual forma de unificação,

considerando a inconstitucionalidade na criação de um Conselho Nacional de

Polícia, justificando que, por tempos, as polícias alcançaram uma autonomia e que,

segundo esses grupos, seria um retrocesso ao espaço conquistado historicamente.

No que diz respeito à história, os questionamentos ocorrem acerca da

subordinação e/ou a possível insubordinação. A história e a cultura do ambiente da

Polícia Militar são sólidos em relação à manutenção da hierarquia e disciplina;

alguns questionamentos consideram que haverá dificuldade de adaptação do policial

civil aos costumes e a cultura militar, no que diz respeito à fusão entre as polícias.

31

Para o presente estudo, podemos considerar que a proposta é adequada à

nossa visão de trabalho. A unificação das polícias está sendo proposta com a

intenção de melhorar o desempenho, as progressões horizontal e vertical, dentro

deste novo modelo. O objetivo é valorizar o profissional da Segurança Pública

proporcionando uma nova estrutura institucional, ágil “e senhora” de oportunidades

para o exercício da função policial.

32

5 SINAIS DE FADIGA DO ATUAL MODELO POLICIAL

Historicamente, a Polícia Civil sempre abrigou em sua estrutura os cargos de

Agente (Investigador), Escrivão, Perito e Delegado de Polícia. Esse formato ainda é

preservado em várias instituições policiais dos estados, inclusive na Polícia Federal.

Mas a convivência dos ocupantes de tais cargos, nem sempre é harmônica. Senão

vejamos:

Em alguns estados, a Perícia Técnica, antes subordinada à Polícia Civil, foi

transformada em instituição autônoma. A carreira solo dos peritos é resultado de um

“lobby” dessa categoria, que luta pela separação institucional, sob o pretexto de

retirar a pericia criminal do âmbito de influência da autoridade policial (Delegado);

Mas há quem defenda que a autonomia administrativa, embutida no discurso

dos peritos, seria uma questão menor, pois o cerne do descontentamento estaria

cravado em questões salarial e hierárquica. Lembrando que, num passado recente,

a gestão dos Institutos de Criminalística era feita por Delegados de Polícia que,

inclusive, eram melhor remunerados.

Nesse mesmo contexto, mas noutra ponta da Instituição, há ocupantes de

outros cargos em crescente insatisfação. Trata-se dos Agentes (Investigadores) e

Escrivães de Polícia, categorias que compõem a base da Policial Civil. Prova disso

foi vista durante recente mobilização realizada por Policiais Federais em todo o País,

quando empunharam bandeiras pelo fim do inquérito policial e pela não-aprovação

da PEC 37 no Congresso Nacional.

Lembrando que a mencionada PEC reforçava o dispositivo constitucional

contido no artigo 144, § 4º, da CF, cuja redação afirma que "às polícias civis,

dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência

da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto

as militares.”

Em um primeiro momento, o comportamento dos federais se mostra

incoerente, por fugir a uma compreensão lógica, pois cerram fileiras contra o seu

próprio produto: a investigação e o inquérito policial.

Mas, em que pese o posicionamento demonstrado em público, insisto que o

cerne da questão reside na impossibilidade desses servidores progredirem

verticalmente na carreira policial. Ressaltando que a descrença em qualquer

33

profissão se instala, não por iniciá-la com baixos salários, mas pela certeza de que,

ao longo da carreira, a situação não mudará.

Em toda carreira profissional, o principal atrativo é a possibilidade de

ascensão a melhores cargos e, consequentemente, a uma melhor remuneração. Por

não oferecer essa possibilidade, em razão da legislação vigente, a carreira na

Polícia Militar, Civil e Federal se revela desinteressante àqueles que ingressaram

nos cargos base dessas instituições, onde ficam confinados, sem possibilidade de

acesso aos cargos de nível superior. Esse fato tem tensionado a relação funcional

entre a base e o comando.

A falta de perspectiva na carreira policial, fomentada por promoções

insipientes e baixos salários, tem transformado o trabalho na Polícia Militar e Polícia

Civil em uma atividade secundária para uma parcela considerável de seus

servidores. São pessoas que mantêm atividades paralelas à que exerce na Polícia e,

logo, mesmo de forma inconsciente, perdem o zelo pelo serviço público.

Nos quadros das instituições policiais, além daqueles que fazem delas

“bicos”, há outro tipo de servidor público, aquele desprovido de qualquer vocação

para a função policial. Este se torna policial por acaso, objetivando carreira

temporária, mas geralmente permanece até aposentar-se no cargo. É cada vez mais

frequente a presença desse tipo de servidor nas repartições policiais.

Por não ajustar-se a horários preestabelecidos e, ainda, impor, dentre outros

percalços, um real risco de morte, o trabalho policial requer de seus profissionais

dedicação exclusiva e vocação para a função. A falta desses ingredientes se revela

nociva ao exercício dessa atividade.

Outro claro sinal de fadiga do atual modelo de polícia é a chegada de novos

atores para atuarem na área repressiva da atividade policial. São membros do

Ministério Público que se estruturaram nos estados em unidades denominadas

GAECO - Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado e se valem de

policiais militares, cedidos pelas respectivas corporações, para realizarem a

investigação criminal.

Os Promotores e Procuradores de Justiça, que atuam nessas unidades,

produzem uma versão do inquérito policial, com o nome de Procedimento

Investigatório Criminal, aonde sua legalidade é questionada no Poder Judiciário por

Delegados e Advogados, por entenderem que falta legitimidade constitucional aos

34

membros do Ministério Público e Polícia Militar para realizarem investigação criminal

de forma direta.

Artigos e pareceres de juristas do porte de MARTINS (2013); SILVA (2013)

mostram, de forma esclarecedora, que o Ministério Público não pode presidir

investigação criminal pois, na Constituição de 1988, essa tarefa foi atribuída à

Polícia Civil.

Entretanto, em que pesem todos os questionamentos, o certo é que o

Ministério Público segue levando adiante seus Procedimentos Investigatórios

Criminais e, com a derrubada da PEC 37 no Congresso Nacional, somente o Poder

Judiciário poderá frear essa prática. Essa questão é outro componente que

desestabiliza e desmotiva os integrantes da Polícia Civil.

Também a própria coexistência cria um ambiente de estresse entre as duas

instituições. Pois, em vez de cooperação, muitas vezes, o que se estabelece é uma

inadequada concorrência entre as duas forças, com reflexos na qualidade do serviço

prestado à sociedade.

35

6 CONCLUSÃO

Diante de tudo que foi explorado no corpo teórico do presente trabalho, não

faz sentido manter duas forças policiais para promover a segurança da sociedade.

Não é coerente permitir que cada uma delas continue abrigando duas categorias de

policiais. Não é justo seguir penalizando a sociedade com um modelo policial que,

além de oneroso ao Estado, não atende o interesse da maioria de seus próprios

integrantes.

Por isso, neste trabalho, defendemos a existência de uma única instituição

policial capacitada para atuar na prevenção e repressão ao crime. Seria uma polícia

de ciclo completo, a exemplo das melhores do mundo.

Pesquisando sobre o assunto, constatamos que a unificação das policias

não é assunto novo no Brasil, conforme mencionado anteriormente à página 29,

essa ideia veio à baila com a Proposta de Emenda à Constituição de número

613/1998, da ex-deputada federal Zulaiê Cobra e, atualmente, o assunto é debatido

em razão da Proposta 102/2011, do Senador Blairo Borges Maggi.

Tais propostas não foram as únicas. Cito também uma do ex-governador de

São Paulo, Mário Covas e outra do ex-Ministro da Justiça, Iris Rezende Machado.

Todas as propostas vão ao encontro de uma polícia única e de natureza civil.

A proposta da deputada Zulaiê Cobra era um pouco mais abrangente que a

do Senador Blairo Maggi, por considerar também a União, com a unificação da

Polícia Rodoviária Federal com a Polícia Federal e, nos estados, a Polícia Militar

com a Polícia Civil.

Já a proposta do Senador, se aprovada, permitirá aos estados unificarem

suas polícias em uma única Instituição. Mas os entes federados não ficarão

obrigados a isso, apenas terão a possibilidade de fazê-lo. É uma faculdade, não uma

obrigação. É uma característica que pode facilitar a aprovação dessa Proposta no

Congresso Nacional.

O ponto mais sensível de todo esse processo é a necessária migração de

policiais para os cargos da nova carreira. É preciso evitar dissabores nessa

transição. Por isso, a nova estrutura deverá ser um campo de oportunidades, aonde

a motivação deve existir como um componente de bordo, disponível a todos os

tripulantes. O objetivo é formatar uma polícia moderna, que atenda as expectativas

da sociedade, sem sacrificar os sonhos de seus próprios servidores.

36

Obedecendo a critérios objetivos e, sob um projeto bem elaborado, a

unificação das polícias tende a proporcionar uma carreira bem mais atrativa do que

o modelo atual. Julgo coerente aproveitar a estrutura da Polícia Civil, por conter

dispositivos já previstos na legislação processual penal vigente que, para

recepcionar os integrantes da Polícia Militar, seria necessário apenas promover

pequenos ajustes.

A carreira, nessa nova Polícia Estadual, seria escalonada em cargos de

natureza policial civil, de provimento efetivo e exercício privativo de seus titulares,

estruturadas em cargos de Autoridade Policial e Agentes da Autoridade.

A Autoridade Policial é o Delegado de Polícia que, investido por lei, tem a

seu cargo a direção das atividades policiais e administrativas.

O Agente da Autoridade é o policial encarregado da prática de atos de

cartorários e investigatórios no interesse de inquéritos policiais e procedimentos

administrativos, com a finalidade de prevenir ou reprimir infrações penais sob a

direção mediata e imediata da Autoridade Policial.

O Perito Criminal terá a missão de encontrar ou proporcionar a chamada

prova técnica ou prova pericial, mediante a análise científica de vestígios produzidos

e deixados na prática de crimes.

O ingresso na nova Instituição far-se-á nas classes iniciais dos cargos de

Agente de Polícia e Perito Criminal, mediante concurso público de provas ou de

provas e títulos.

O cargo de Escrivão de Polícia será extinto. A sua tarefa, nessa nova

Instituição, passaria a ser mais uma atribuição do Agente de Polícia. E caberia ao

Delegado Titular da unidade designar um agente para exercer trabalhos cartorários,

de acordo com o perfil do policial. Isso já ocorre, de forma irregular, em delegacias

do país.

É comum encontrar Agente de Polícia desempenhando tarefas em Cartórios

de Delegacias e, também, o contrário, Escrivão fazendo o papel do Agente.

Portanto, a manutenção do cargo de Escrivão de Polícia não se justifica. A

realização de trabalhos de campo e, também, de cartório, aperfeiçoaria o trabalho do

policial, que passaria a ter uma melhor compreensão daquilo que é levado aos autos

de inquérito, no curso de uma investigação.

A grosso modo, na transição, os oficiais de nível superior, bacharéis em

direito, migrariam para o cargo de delegado, enquanto os da base, até o nível de

37

suboficiais, seriam realocados nos cargos de Agente de Polícia e Perito Criminal.

Isto levando em consideração que todos são detentores de curso de nível superior.

As vagas iniciais de cada cargo do servidor policial civil serão providas

mediante ascensão funcional dos ocupantes da classe final da carreira de hierarquia

imediatamente inferior.

Dessa forma, os cargos de Delegado de Polícia, por tratar-se de carreira

jurídica, são privativos de bacharéis em direito. Mas, igualmente, providos por

ocupantes da última classe (Classe “C”) dos cargos de Agente de Polícia e Perito

Criminal, mediante aprovação em concurso interno da Instituição.

Por essa proposta, o cargo de Delegado de Polícia somente poderá ser

ocupado por policiais que contariam com cerca de dez anos na atividade policial, ou

seja, com maturidade suficiente para ocupar um cargo dessa relevância. O processo

seletivo, também seria facilitado, pois os candidatos já seriam policiais e, portanto,

com históricos na Instituição.

Em ato concluso, a unificação das policias teria como consequência o

esvaziamento da Justiça Militar, pois, considerando que a natureza da atividade

policial é civil, bem como a desmilitarização da Polícia Militar, todos os casos

envolvendo policiais passariam para a competência da Justiça Comum, fato que

implicaria numa reavaliação da Justiça Militar.

38

REFERÊNCIAS

BAYLEY, David H. Padrões de policiamento: uma análise internacional comparativa. Tradução de Renê Alexandre Belmonte. São Paulo: EDUSP, 2001.

BERGAMINI, Cecília Whitaker. Psicologia aplicada à administração de empresas: psicologia do comportamento organizacional. 3. ed. São Paulo: Atlas,1997.

BRASIL. Senado Federal. PEC 102/2011. Brasília, 2011. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=102919>. Acesso em: 07 out. 2013.

CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à teoria geral da administração. 4. ed. São Paulo: Makron Books, 1993.

COSTA, Naldson Ramos da. Violência policial, segurança pública e práticas civilizatórias no Mato Grosso. Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/14691/000666994.pdf?sequence=1>. Acesso em: 27 set. 2013. FERREIRA, Aurélio Buarque de Hollanda. Pequeno dicionário brasileiro da língua portuguesa. 11. ed. Rio de Janeiro: Ed. Gamma, 1993.

HIRAYAMA, Cristina Miyuki. Cultura organizacional e identidade organizacional: uma questão de perspectiva. ENCONTRO LATINO-AMERICANO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E V ENCONTRO LATINO-AMERICANO DE PÓS-GRADUAÇÃO. 9;5 2005, São José dos Campos. Anais eletrônicos... São José dos Campos: Universidade do Vale do Paraíba, 2005. v. 1. p. 1754-1757.

CANO, Ignácio; LEMGRUBER, Julita; MUSUMECI, Leonarda; Quem vigia os vigias?: um estudo sobre o controle externo da polícia no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 2003.

MARIANO, Benedito Domingos. Por um novo modelo de polícia no Brasil: a inclusão dos municípios no sistema de segurança pública. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2004.

MARTINS, Ives Gandra. A inútil derrubada da PEC 37: a derrubada da PEC 37 por oportunismo político terá efeitos desastrosos. Estadão. São Paulo, 2013. Disponível em: < http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,a-inutil-derrubada--da-pec-37-,1049610,0.htm >. Acesso em: 07 set. 2013.

SCHEIN, Edgar. Religare: quando a organização deixou de ser natural, e sobrenatural. São Paulo, 2013. Disponível em: <http://www.aberje.com.br/acervo_colunas_ver.asp?ID_COLUNA=725&ID_COLUNISTA=72.>. Acesso em: 02 out. 2013

39

SILVA, José Afonso da. Juristas dizem que MP não pode fazer investigação: In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL IBCCRIM, 2013. Local: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Disponível em: <http://www.sindelpo.com.br/delpoli/index.php?option=com_content&view=article&id=231:parecer-do-constitucionalista-jose-afonso-da-silva-pec-37&catid=23:noticias>. Acesso em: 08 out. 2013.