história de santo inácio

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AS REDUES JESUTICAS E A FUNDAO DE SANTO INCIOPopulao de Santo Incio, Censo IBGE 2002: 5.191 habitantes. Altitude: 410 metros. OS NOMES DO LUGAR Inicialmente, Santo Incio recebeu de seu fundador, Manoel Firmino de Almeida, o nome de Colnia de Ges. Foi logo aps ele demarcar as terras das quais se tornou concessionrio, em 1924, e coloc-las venda, projeto que inclua a edificao de um povoado urbano. Com a promoo da colnia a distrito, em 1948, a denominao mudou para Distrito da Reduo de Santo Incio. Este novo batismo, Manoel Firmino de Almeida extraiu da primeira aldeia de ndios doutrinados, instituda pelos padres jesutas, da Companhia de Jesus, em 1610. Santo Incio, o nome definitivo, veio em 1952, imediatamente aps a criao do municpio, por decreto estadual assinado dia 14 de novembro daquele ano. INFORMAES GERAIS Topnimo Provm da Reduo de Santo Incio Mini (Menor) e do fundador da Companhia de Jesus e criador da Ordem Jesutica, Incio de Loyola. Etimologicamente, o termo Incio assenta-se no latim Egmatiu, que deriva de Ignis...Fogo. Genealogia Santo Incio obteve sua autonomia em 14 de novembro de 1951, desvinculandose do territrio de Jaguapit, que em 10 de outubro de 1947 separou-se de Sertanpolis, que em 6 de junho de 1934 desmembrou-se de Jata, que em 14 de maro de 1929 originou-se de So Jernimo, que em 23 de fevereiro de 1920 desligou-se de Tibagi, que em 18 de maro de 1872 nasceu de Castro, que em 24 de setembro de 1788 separou-se de Curitiba, que em 29 de maro de 1693 desligou-se de Paranagu, que foi criado em 29 de julho de 1648. Distrito - Sede Comarca Colorado Coordenadas 23 43latitude sul, 51 45 longitude W-GR. Clima Subtropical mido mesotrmico, com veres quentes e geadas pouco freqentes, com tendncia de concentrao das chuvas nos meses de vero, sem estao seca definida. Nos meses mais quentes apresenta temperaturas superiores a 22 C. e nos meses mais frios, inferior a 18. Padroeiro Santo Incio, comemorado dia 31 de julho. LOCALIZAO GEOGRFICA: Microrregio 7 do Mdio Paranapanema, noroeste do estado do Paran. Limites: 1 Ao norte, o rio Paranapanema, e o estado de So Paulo. Noroeste, municpio de Lupionpolis. Sul, municpios de Colorado e Nossa Senhora das Graas. A oeste, municpio de Santa Ins.

Extenso territorial: 259,784 quilmetros quadrados, a 446 quilmetros de Curitiba, a capital do estado. O municpio servido por uma malha rodoviria que permite acesso fcil ao restante do Paran, outros estados e pases como Argentina, Paraguai e Uruguai, formadores do pacto econmico Mercosul. Une-se ao vizinho territrio de So Paulo por uma moderna ponte no rio Paranapanema, de construo recente, acompanhando o projeto da Usina Hidreltrica de Taquaruu. Santo Incio fica na regio sul do Brasil, regio que possui pouco mais de um milho de quilmetros quadrados, a menor regio do pas, compreendendo os estados do Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Com uma expanso relativamente uniforme em todos os segmentos, apresenta os mais elevados ndices de alfabetizao registrados no Brasil, o que evidencia o desenvolvimento cultural e social da regio. A regio sul tem algumas caractersticas marcantes. Exemplos: Pequena extenso territorial. A regio ocupa cerca de 7% do territrio nacional, mas bastante populosa. Seus 20 milhes de habitantes Isto significa que 15 em cada 100 brasileiros moram na regio sul conferem-lhe densidade demogrfica de mais de 35 habitantes por quilmetro quadrado. Sua localizao ao sul do Trpico de Capricrnio. nica regio brasileira quase inteiramente situada em clima subtropical, o sul o trecho mais frio do pas, sujeito a geadas, e at em alguns pontos, a queda de neve. As estaes do ano so bem definidas e as chuvas, em geral, distribuem-se uniformemente ao longo do ano, ainda que excepcionalmente possam causar grandes cheias. Paisagens geoeconmicas bem diferenciadas. No sul, originalmente, duas reas se diferenciam bastante: a de florestas e a de campos. A primeira, colonizada por imigrantes alemes, italianos e eslavos, assumiu uma feio europia, com pequenas e mdias propriedades voltadas para a policultura. A regio de campos, ao contrrio, ocupada desde a poca colonial por latifundirios escravocratas, foi utilizada inicialmente para a pecuria extensiva e, mais tarde, o cultivo de trigo e soja, e para atividades industriais diversificadas. Embora distintas essas reas esto integradas, o que permite caracterizar a regio como a mais uniforme do pas em ndice de desenvolvimento. Florestas e campos Quando se refere ao sul do Brasil, comum nos lembrarmos da Mata das Auracrias ou dos pinhais, que so formaes vegetais dominantes na regio, embora no sejam as nicas. A Mata das Auracrias aparece nas partes mais elevadas dos planaltos do Paran e Santa Catarina. A Araucria angustiflia (pinheiro-do-paran) adapta-se mais facilmente s baixas temperaturas, comuns nas partes mais altas do relevo, e ao solo de rocha mista, arenito e basalto, que se concentra no planalto arenito basltico, no interior da regio. a, portanto, que se encontra com maior facilidade essa espcie vegetal. Assim se explica a conhecida frase: O pinheiro no gosta de mar. Dessa mata so extrados os pinheiro-do-paran e a imbuia, utilizados em marcenaria, e a erva-mate, cujas folhas so muito empregadas no preparo do chimarro. Alm dessa mata, a Serra do Mar, muito mida devido a proximidade com o Oceano Atlntico, favorece o desenvolvimento da Mata Tropical de Encosta ou Atlntica, muito densa e com muitas 2 espcies, a qual se inicia no Nordeste e continua pelo Sudeste e chega ao Sul.

SMBOLOS E HINO DO MUNICPIO Bandeira Seu verde indica abundncia e riqueza; o branco, a paz; a estrela, a pecuria, hoje fonte maior da economia local. Braso O Blau representa o clima saudvel, a serenidade, a calma do povo santoinaciense. Smbolo encarnado visvel no Blau, marca dos jesutas. Palas, as riquezas. Cumieiras e chamins, as indstrias. Caduceu doura- do, o comrcio. Os Ramos de caf e algodo, a lavoura. A Torre no pice, a autonomia municipal. A Faixa na parte superior, com a locuo latina Patriam locupleto, significa Enriquea a Ptria. Hino Minha terra Santo Incio, Onde todos so iguais. Teus filhos que te adoram, No te esquecero jamais.

(Bis)

Santo Incio, nestes versos, Teus filhos cantam teu progresso. (Estribilho) Teus modernos Bandeirantes, Falam teu nome toda hora. Teus filhos, to audazes, Representam tua vitria. (Bis) Estribilho Santo Incio, tua produo, Orgulha o Paran. Na pecuria e no algodo, No Estado, no se pode comparar. Estribilho. PREFEITOS DO MUNICPIO Ilto Ferreira Coutinho 1952 a 1955. Erasmo Corra Lima 1956 a 1959. Gensio Borges Teixeira 1960 a 1963. Brulio Ribeiro Sobrinho 1964 a 1968. Gensio Borges Teixeira 1969 a 1972. Brulio Ribeiro Sobrinho 1973 a 1976. Volnei Bega 1977 a 1982. Edis Turcato 1983 a 1988. Pedro Faveri 1989 a 1992. Antnio Tavares da Mota 1993 a 1996.

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Edis Turcato 1997 a 2000. Genivaldo Carvalho da Mota 2001 a 2004. Joo Batista dos Santos 2005 a 2008. Joo Batista dos Santos 2009 a 2012. Prefeito de Santo Incio, em 2003, ano da confeco deste livro, Genivaldo Carvalho da Mota nasceu nesta cidade. filho de Antnio Tavares e Creuza Carvalho da Mota. Casado com Arcione Aldriana da Mota, natural do Estado de So Paulo, ambos tiveram os filhos Poline, Antnio, Genivaldo Jnior e Noellen, os todos eles, santo- inacienses. VEREADORES DO MUNICPIO 1952 a 1955 Olpio Vieira da Silva, Gensio Borges Tei-xeira, Jos do Livramento Filho, Oswaldo Rocha Freitas Neiva, Eduardo Alves de Alcntara, Ame-rico Vitorino, Jos Gregrio de Oliveira, Virglio Gonalves de Arajo, Francisco de Assis Arajo. Suplentes: Santiago Pereira Moura, Jos Siqueira Sobrinho, Adelino Santos Pinaff, Lindo-nor Almeida Barros, Joaquim Alves Corra. 1956 a 1959 Araldo Cordeiro, Francisco Muchiutti, nge-lo Gazingu, Oswaldo Rocha Freitas Neiva, Ilto Ferreira Coutinho, Newton de Souza, Cyro Ma-theus, Agnelo Jos de Almeida, Jos Siqueira Sobrinho. Suplentes: Miguel Dias, Antnio dos Santos, Paulo Teixeira, Abel Martini, Santiago Sagrado Moura. 1960 a 1963 Sebastio Amrico Seleguim, Omar de Godoy, Eurpedes Rosa, Francisco ngelo Agostinho, Osvaldo Pereira Galindo, Mrio Batista Soares, Nelson Moreira, Benedito Dias Soares, Newton de Souza. Suplentes: Manuel Aimar dos Santos, Moiss Pereira da Silva, Lindolfo Baise. 1964 a 1968 Benedito Dias Soares, Manuel Aimar dos Santos, Newton de Souza, Moiss Pereira da Silva, Lindolfo Baise, Mrio Batista Soares, Sebastio Amrico Seleguim, Joo Rodolpho Gnann, Nicator Pereira Lopes. 1969 a 1972 Sebastio Amrico Seleguim, Orlando Bertipalha, ngelo Martins, Benedito Andrade da Silva, Edis Turcato, Brulio Ribeiro Sobrinho, Moiss Pereira da Silva, Antnio Alves de Carvalho, Sebastio Gonalves Carvalho. Suplente: Fernando Alves Chalegra. 1973 a 1976 Antnio Alves de Carvalho, Edis Turcato, Jos Rosa, Sebastio Amrico Seleguim, Benedito Marinho de Souza, Orlando Bertipalha, Fernando Alves Chalegra, Jos Maria Vieira, Valtenor Ma4 lacrida. Suplentes: Osvaldo Dias Barros, ngelo Martins. 1977 a 1982

Edis Turcato, Adair Bega, Antnio Alves de Carvalho, Ademar Marthos Moreno Prieto, ngelo Martins, Pedro Faveri, Jos Rosa, Geraldo Tertuliano dos Santos, Said Kalif Nage. Suplente: Florindo Marrafon. 1983 a 1988 Antnio Tavares da Mota, Adair Bega, Dante Malacrida Neto, Ademar Lazarin, Ilenir de Assis, Jos Rosa, Jos Rodrigues Gonalves, Joaquim Agostinho, Joo Gomes Pereira. Suplente: Florindo Marrafon. 1989 a 1992 Dante Malacrida Neto, Genivaldo Carvalho da Mota, Valter Marrafon, Sebastio Pereira Rocha, Antnio Xavier da Silva Primo, Joo Batista dos Santos, Jos Pereira, Wilson Souza de Oliveira. Suplente: Joaquim Agustinho. 1993 a 1996 Joo Batista dos Santos, Jos Ferreira, Erivaldo de Oliveira, Paulo Reginaldo Gonalves, Edis Turcato, Csar Andrade da Silva, Antnio Evaristo dos Santos, Wilson Souza de Oliveira, Valter Marrafon. 1997 a 2000 Joo Batista dos Santos, Adair Bega, Expedi-to Pereira Vales Filho, Gizelda Aparecido Rebolho Turcato, Jos Ulisses de Brito, Oranice Aparecida Bega, Sebastio Pereira Rocha, Wagner Jos Slemer, Valter Marrafon. 2001 a 2004 Joo Batista dos Santos, Rose Miriann Oli-veira da Silva, Wagner Jos Slemer, Jurandi Teixeira Machado, Jos Ulisses de Brito, Ilenir de Assis, Antnio Evaristo dos Santos, Estevam Calvo Grgoli, Gizelda Aparecida Rebolho Turcato. A publicao Santo Incio, Paran 50 anos de histria, lutas e conquistas, relaciona famlias que chegaram a esta cidade na dcada de 50, e participaram decisivamente de sua expanso:: Abelardo Batista de Oliveira, Adelaide Ro-drigues Gonalves, Altair Machado e sua esposa Geralda M. Machado, ngelo, Antnio, Aurlio, Avelino e Florindo Marrafon, Antnio Burghetti Galego, Antnio Jacob, Antnio Marcos Siolari, Francelino Jos da Silva, Hemorgenes Valrio, Ivo Rizzi, Joo Antnio, Francisco de Paula, Vir-tudes, Santa, Maria, Manoela Moreno Prieto, Joo, Orlando e Antnio Bertipaglia, Laurindo Benedito da Silva, Laurindo Marcos Turcato, Joo Rodolpho Gnann, Otaclio Alves Ribeiro, Sebas-tio Martos, Sinsio Messias, Shinit Nakahara, Ishiyama, Rosaneis, Oscar e Manoel Bega, Valte-nor, Iraci Malacrida. Para o homem imaginativo, h qualquer coisa de irresistvel na contemplao de mapas onde aparecem grandes reas de terras desabitadas, mas com grandes potencialidades. Seu pensamento vem ao encontro de meios e maneiras de acesso, colonizao e desenvolvimento, e seus sonhos logo descortinam um futuro no qual o deserto se cobre de flores e da terra brotam imensas riquezas. Arthur Thomas 5 Diretor da Companhia de Terras Norte do Paran.

PREFCIO Santo Incio um nome forte na Histria e no h exagero em dizer que esta notoriedade transpe as fronteiras do Brasil. Motivo: descende de grande epopia, a dos padres jesutas, que no sculo XVI, iniciaram a jornada de Cristianizao dos ndios nativos. O territrio da hoje cidade e municpio do Noroeste do Paran, foi sede do aldeamento de Santo Incio Mini, da lis- ta de 13 ncleos construdos por aque- les missionrios, a servio da Compa- nhia de Jesus, fundada em 1534, por Santo Incio de Loyola. A principal avenida local simboliza um pouco desse passado remoto: o no- me de Raposo Tavares, considerado o maior entre os bandeirantes que embre-nharam nos sertes, para identific-los, enquanto procuravam outro, pedra pre-ciosa e aprisionavam ndios para vende-los s capitanias do Norte brasileiro. Eram tambm nativos em fase de doutrinao nos aldeamentos, que mais tarde as tropas comandadas por Raposo (Antnio Raposo Tavares) e Manuel Preto dizimaram, sob a alegao de estarem em terras que no lhes pertenciam. Antnio Raposo Tavares nasceu em Beja de So Miguel, no Alentejo, Portu-gal, em 1498. Morreu em So Paulo, Bra-sil, em 1508. Foi capito-mr da Capita-nia de So Vicente. Bandeirante, dedicou-se captura de ndios e combate s misses jesuti-cas. Suas bandeiras so classificadas no grupo das despovoadoras, destinando-se ao aprisionamento de indgenas. Tam- bm so consideradas importantes pela demarcao de fronteiras, garantindo a posse de terras ao governo de Portugal. pequena distncia do permetro urbano de Santo Incio, ficaram as runas de Santo Incio Mini, stio arqueolgico de enorme interesse para a Histria, agora coberto pelo lago da Usina Hidreltrica de Taquaruu, que a Companhia Energtica de So Paulo construriu no rio Paranapanema, inundando rea de 105,5 quilmetros quadrados. Nascido a partir da concesso, em 1924, de 50 mil alqueires de terras, ao engenheiro civil Manoel Firmino de Al-meida, o povoado de Santo Incio virou cidade, hoje tambm na beira de uma rodovia de acesso ao restante da malha oficial, e de outros pases, os mais prximos Argentina, Paraguai e Uruguai, formadores, junto com o Brasil, do pacto econmico Mercado Comum do Sul Mercosul. A rea concedida quele colonizador abrange a antiga reduo jesutica, transformada em runas, que jazem sob as guas da hidreltrica, porm sua histria ningum destri. Histria que se eleva e se completa com a passagem, por este territrio, de celebridades religiosas, como os padres Jos de Anchieta, Manuel da Nbrega, Simo Mazzeta, Justo Mansilla van Surck, Lus Ernot, o navegador espanhol lvar Nuez Cabeza de Vacca, e o mercenrio da infantaria alem, Ulrich Schmidel, como est em captulo adiante, deste livro. A importncia histrica de Santo Incio tem ainda como personagens clebres o capito-mr da Capitania de So Vicente e bandeirante Antnio Raposo Tavares, e Manuel Preto, apresentado por alguns historiadores como o mais completo sertanista do seu tempo. O pioneiro local, Benedito Alves de Almeida pesquisou as runas da Reduo de Santo Incio Mini, recolheu muitas peas e sonhava construir um museu, onde elas seriam expostas e preservadas, numa contribuio ao resgate da histria do aldeamento. Morreu recentemente, levando com ele esta aspirao. Mas houve o cuidado de se guardar os objetos numa repartio da Secretaria Municipal de Educao. Encaixotadas, esperam o momento de ocuparem os espaos de um templo. O nome de Santo Incio foi extrado por seu fundador, Manoel Firmino de Almeida, das runas 6 de Santo Incio Mini (Maior). Antes se chamou Colnia Zaca-rias de Ges, homenagem do precursor, ao primeiro presidente da Provncia do Paran, no tempo do Imprio, Zacarias de Ges e Vasconcelos, nomeado em 19 de dezembro de 1853, substitudo em 10 de maro de 1856, por Vicente Pires da Mota.

As Redues Jesuticas e a Fundao de Santo Incio um livro que ao projet-lo, o autor o fez, disposto a produzir uma obra completa sobre o tema. Assim, ela no se limita criao e prosperidade do ncleo que deu ori- gem cidade. Antecede a 1541,quando se deu a primeira travessia do territrio, proeza do capito lvar Nuez Cabeza de Vacca, que durou 141 dias, aps ser nomeado governador do Paraguai, pela Coroa de Espanha. Disseca outra faanha clebre, a de Ulrich Shmidel, em 1443, que no seu percurso ia esta- belecendo fatores de povoamento Da mesma forma, os aldeamentos jesuticos e a saga dos bandeirantes, foram analisados minuciosamente, e es-critos com riqueza de informaes. So fatos em que, igualmente, as razes de Santo Incio esto fincadas. O editor, maio de 2003. A MARCHA PIONEIRA Desde que tomou p nos planaltos oci-dentais, prosseguiu a vaga pioneira em sua marcha infatigvel, sacudida pelas crises eco-nmicas, acelerada s vezes pelo jogo das circunstncias polticas mundiais. Incessante-mente engrossada por elementos novos, a multido dos plantadores no cessou de pro-gredir, mais ou menos depressa, mas sem fatigar-se. Testemunham avanos sucessivos as cidades, que se sucedem como contas de um rosrio. Por toda parte, traz a paisagem a marca dessa ofensiva contnua, nos restos de flores-tas que subsistem, sobre os solos talados por culturas devastadoras. Cada fase acarretou algo de novo, que no desapareceu com a progresso. Histria que cumpre conhecer, seguindo os episdios da marcha pioneira, para compreender como se elaborou o seu mundo, tal como hoje se nos apresenta. Pierre Monbeig. Um cruzeiro erguido num canto, era, no incio de tudo, o smbolo da f catlica, antecedendo a construo da primeira igreja, erguida no cho natural, com madeira bruta e coberta de tbuas, e como no havia padre, um ou outro morador dirigia os cultos. Em visitas raras, os padres de Ser- tanpolis e Jaguapit rezavam missa no povoado, fazendo o trajeto em lombo de cavalo, atravs de picadas abertas na mata. Quando eles chegavam, em rego- zijo, algum tocava o sino da capela, doado pela pioneira Vitalina Teixeira dos Santos. A necessidade da edificao de um templo maior surgiu com o aumento do nmero de famlias. A igrejinha j no possua espaos para todos. Durante os cultos, muitos ficavam do lado de fora, de p, ou ajoelhados no cho rstico. A mobilizao da comunidade permitiu a Santo Incio erigir nova igreja, que foi inaugurada em 1943. Separada do territrio de Sertan- polis, em 1948, a Colnia Zacarias de Ges ganhou nova denominao, Santo Incio, e j em 1951, recebia autonomia poltica-administrativa, com a criao do municpio, pela Lei 790.

7 FUNDAO DE SANTO INCIO ANTES DESTE NOME, O DEFINITIVO, A CIDADE CHAMOU-SE COLNIA DE GES E

DISTRITO DA REDUO DE SANTO INCIO Colonizado pelos bandeirantes paulistas, o territrio do Paran pertencia Capitania de Santo Amaro. Em 1529, foi incorporado Capitania de So Vicente. Embora Curitiba tenha sido fundada em 1654, a vinculao continuou at 1853, quando registrou-se o desmembramen-to, com o nome Provncia do Paran. Era o tempo do Imprio. Para admi-nistrar a nova provncia, em 19 de de- zembro de 1853, foi nomeado Zacarias de Ges e Vasconcelos, substitudo em 10 de maro de 1856, por Vicente Pires da Rocha, que permaneceu no cargo at 11 de novembro de 1857. Na sua ordem natural, prosseguiu a sucesso de presidentes. O ltimo da fase da provncia foi Jesuno Marcondes de Oliveira e S. Proclamada a Repbli-ca, e com ela, a fase dos governadores, o primeiro eleito para dirigir o agora Es-tado do Paran, foi o General Francisco Cardoso Jnior, que governou no curto perodo de 1889 a 1890. J na dcada de 1880, visualizavam mudanas expressivas. Por exemplo, na maneira de beneficiamento da erva-ma-te, extrao de madeira bruta de suas florestas e a transformao em nvel in-dustrial. Outras alteraes eram nota-das no sistema de transporte, com a chegada tambm da ferrovia, o que exigia novas foras de trabalho. Dava-se, assim, o golpe definitivo no ciclo do tropeirismo, e reduzia-se a necessidade da mo-de-obra escrava. Encerrada a escravido e iniciada a Repblica, o mundo rural do Paran co-meou a ser dominado pela explorao da erva-mate, extrao e industrializa-o da madeira, a lavoura de caf no Norte Velho, e de forma geral, os ali-mentos. A esta ltima atividade se juntavam caboclos dispersos nas matas, pequenos sitiantes, agregados das fazendas, par-ceiros e colonos de caf. Pombo (1929), destaca: para caboclos e agregados, as culturas de subsistncia quase perma-neciam. Para parceiros e colonos de caf, mas principalmente para os sitian- tes, parte delas se destinava venda nos mercadores prximos. De forma intermitente, caboclos, si-tiantes e agregados se assalariavam na explorao da ervamate e das madei-ras. Podiam at no receberem salrio em dinheiro, mas certo que trocavam congonha (erva-mate) e horas de traba-lho na derrubada das rvores por pro-dutos que lhes faltavam. Autores informam que nas ltimas dcadas do sculo XIX, as terras nas quais eram exploradas a erva-mate e a madeira no eram mais necessariamen-te de ningum. Com as empresas con-tratadas para a construo de ferrovias, comeavam a ser dadas terras em con-cesso pelo Governo Imperial e mais tarde, pelo Governo do Paran. Medida decorrente de a Constituio Republica-na de 1891 ter transferido as terras devolutas para os Estados. Singer (1975) escreve que as con-cesses significavam a forma mais im-portante de penetrao dos capitais dos pases industrializados nas economias coloniais, onde a expanso das ativida-des de mercado exigia o aumento cor-respondente da rede de transporte. No mesmo passo, a colonizao das terras devolutas era desenvolvida quase sempre por companhias de capital es-trangeiro, que obtinham concesses do governo. Eram-lhes assegurado exclusi-vidade na execuo dos servios, e por vezes, remunerao mnima do capital empregado por elas. No Paran, as con-cesses que a princpio s podiam ser obtidas por empresas estrangeiras, passaram a ser dadas tambm a brasi-leiros, no se restringindo a linhas de transporte ou de colonizao. Esses favorecidos podiam realizar todas as atividades promissoras a seus investimentos. Em 1890, um tero do Estado tinha sido povoado. As popula-es se fixavam, em sua maioria, no Paran Tradicional e Norte Velho, distri-buiam-se pelos sertes do Rio Negro e de Guarapuava, existindo em pequeno nmero nas demais zonas. O servio de localizao de imigran-tes foi8entregue Secretaria de Viao, Obras Pblicas e Colonizao. O Estado abriu duas hospedarias de triagem e as-sistncia aos que chegavam e eram recolhidos ali. Uma em Curitiba, outra em Paranagu, alm de duas comisses, em Rio Negro e Iguassu.

Decidiu-se por impulsionar a imigrao, com o que se-riam fixados colonos pequenos proprie-trios, com nfase aps 1906, quando foi criado o Ministrio da Agricultura. De acordo com Balhana (1968), nas duas primeiras dcadas do sculo XX, os estrangeiros representavam cerca de 10% da populao do Paran. Os re-cm-abertos ncleos coloniais se localizavam na margem direita do rio Iguau, navegado de forma regular de Porto Amazonas a Unio da Vitria. O mesmo autor explica que na margem esquerda viviam ndios hostis, pressionados pela reduo de seus espaos primitivos. Nas levas de imigrantes, chegavam tambm estrangeiros, conferindo-se aos russos, poloneses e ucranianos, a intro-duo de instrumentos logo incorpora-dos s atividades agrcolas do Paran. So Mencionados a grade, gadanha, pi-cador de palha, mangoal, moinho ma-nual, radnik, alfange, carroa. Conforme Wachewicz (1976), a grade servia para aplainar a terra ara-da; o mangoal, para malhar as espigas de cereais; a gadanha, para cortar o tri-go ou centeio; o radnik, para fazer sul-cos na terra antes de semear. O alfange consistia numa lmina de ferro semi-circular, utilizada no corte dos cereais. Foi nesse clima de efervescncia das concesses de terras, pelo governo, que entre os interessados em adquiri-las, chegou o baiano Manoel Firmino de Almeida, compondo uma das correntes migratrias rumo ao Paran. O Estado outorgou-lhe permisso de uso de 50 mil alqueires de rea devoluta. Dispu-nha-se a explor-la com agricultura. Outra esperana sua, consistia de fun-dar um ncleo urbano, idia, contudo, sem maior nfase. Firmino de Almeida comeou a mis-so, instituindo uma colnia de traba-lhadores que efetuou a derrubada da mata, deixando o solo em condies de receber as semeaduras. S que, parale-lamente, chegavam regio mais levas de imigrantes, uns, simples caboclos, outros, pessoas de viso forte, em bus-ca de se tornarem donos de glebas. As terras devolutas do Estado do Pa-ran estavam classificadas em trs cate- gorias de 1, de 2, e de 3 ordens conforme sua situao relativa a centros urbanos e portos martimos, fertilidade e fins a que se destinavam.Todavia, opera- cionalmente, os critrios determinantes eram a distncia dos centros de abaste- cimento e a possibilidade de escoamento dos produtos (Padis, 1981). A ocupao decisiva das terras do Paran foi atravs de Itarar, no Estado de So Paulo. A imigrao seguiu na di-reo do Paranapanema, margeando os rios das Antas, Cinzas e Laranjinhas. Itarar, que servia de entrada, era, h tempo, conhecido dos paranaenses, por ter sido o caminho paulista dos tro-peiros do Sul, de onde alcanavam a Feira de Sorocaba, local de comrcio de muares, outros animais e produtos. Conforme Wachowicz, desde o s-culo XVIII, aquele caminho, via Itarar, rumo ao interior, era chamado tambm de Caminho Real ou Sorocaba-Viamo, ou ainda de Estrada da Mata, no Para-n. Agora vinham, em sentido contra-rio, mineiros e paulistas instalar fazen-das e montar povoaes. Nesse percurso surgiram Siqueira Campos (antiga Colnia Mineira), em 1862; Tomazina, em 1865; Santo Ant-nio da Platina, em 1866; Venceslau Brs e So Jos da Boa Vista, em 1867. Geralmente o que no foi o caso de Santo Incio -, os povoados nasciam por meio da obra de um chefe poltico, dono da maioria das propriedades rurais ao redor. Recebiam o nome de um san-to qualquer. Amador Nogueira Cobra (1923), escreve: O doador, por esse modo, imitava o gesto de todos os po- voadores de sertes brasileiros e o fez com duplo fim: atrair para a nova terra, que dizia ser sua, as bnos do cu, em uma espcie de aliana com o pa-droeiro, e congregar gente em um ponto determinado, onde pudesse surgir povoao, servindo de apoio aquele pu-nhado de homens, perdidos na solido imensa. 9 Seguindo o exemplo das frentes an-tecessoras, Manoel Firmino de Almeida preferiu colonizar terras, a elaborar pro-jetos de engenharia civil, na prancheta de um escritrio. Soube das concesses do Estado do Paran e saiu em busca de uma. O governador Caetano Munhoz da Rocha cedeu-lhe 50 mil

alqueires, e com o solo preparado, iniciou o cultivo de ca-f, lavoura que se estendia, aumentan-do as derrubadas da mata, abrindo es-tradas, fixando povoaes e criando riquezas. Com a explorao do solo virgem, rico em nutrientes, comeava oficial-mente o ciclo dos cafezais, aps o do ouro e o da cana. Para ajud-lo na sua empreitada, Manoel Firmino de Almeida trouxe com ele, para a gleba, diversas pessoas, individuais e em famlias. Na lista desses precursores esto Joo Fer-reira Pinto de Andrade, Karl Hermann, Max Hermann, Ovdio Pereira da Silva, Coronel Marcelino Alcntara, Custdio Alcntara, Pedro Pinto de Andrade, Jos Fernandes, Oswaldo Rocha Freitas Nei-va, Leodegrio Leite, Miguel Teixeira Nunes, Haroldo Rocha Freitas Neiva, os Godoy, Messias, Juquinha, Mrio, Dona Ursulina, que ganhou o apelido de Sula. Afora esse grupo de pioneiros natos chegaram outros trabalhadores, igual-mente bem-recebidos por Firmino de Almeida. Ele e seus seguidores alcana-ram o xito esperado com a lavoura de caf, escoado via So Paulo, de onde chegava ao Porto de Santos, e dali, ao exterior. Findara-se definitivamente o ciclo do transporte das safras em tropas de muares, que se dava por Itarar, Pi-raju e Santa Cruz do Rio Pardo. Como informa Cancian (1981), os animais transpunham o rio a nado e as cargas eram atravessadas em canoas. Com a construo de uma balsa, ligando Ourinhos ao Paran o comrcio passou a ser feito com outras localidades pau-listas, entre elas a Estao de Cerqueira Csar, da Estrada de Ferro Sorocabana. Quando Manoel Firmino de Almeida veio explorar sua vasta gleba de terras roxas, estas ficavam no territrio de Sertanpolis, de quem separou-se ainda em 1948, filiando-se nova Comarca de Jaguapit. Nessa ocasio o patrimnio de Santo Incio foi elevado condio de distrito. E o caf que transps fron-teiras comeou a perder espaos, mais tarde entrando em decadncia, como explicado em artigo deste autor, escrito em 1991, com o ttulo Perda de um bi-lho de ps. Transcrio abaixo. A colonizao do Norte do Paran deve muito ao caf, que desbravou no-vas fronteiras agrcolas, rompendo as matas de solos frteis. Depois, abriu os cerrados e as terras de chapadas esquecidas pela agricultura brasileira. Atual-mente enfrenta a sua pior crise, pela falta de estmulos governamentais, de-palperamento dos solos e a presena de pragas e doenas. Para complicar mais, o governo mandou exterminar o IBC Instituto Brasileiro do Caf, a quem coube um papel relevante na adoo de medidas tcnicas e econmicas que evitaram o desmantelamento total da cafeicultura iniciado na dcada de 60, por meio de uma poltica de erradicao sem o devi-do acompanhamento especializado. De 1965 at agora, o Estado perdeu 1 bilho de ps, passando de primeiro para quarto maior produtor do Pas, ficando atrs de Minas Gerais, So Paulo e Esp-rito Santo. J em 1962, o Norte era a nica re-gio paranaense a produzir caf, assis-tindo da em diante o crescimento da decadncia, o desaparecimento de col-nias e a migrao de antigos plantado-res. Em todo o Estado, a lavoura ocupa menos de 400 mil hectares, com cerca de 420 milhes de ps, registrando ain-da expressiva queda de produo. Outros nmeros, porm, reafirmam a importncia da lavoura. Apesar da quase falncia, ainda responde por 22% do ICMS agrcola arrecadado no Paran. Calcula-se que 1 milho de trabalhado-res continuam morando nas terras j bastante esgotadas, principalmente na regio do arenito, a partir de Maring, at a barranca do rio Paranapanema, na fronteira com o Estado de So Paulo. Velhos lavradores se transformam em bias-frias para sobreviver. No fosse o empenho de produtores tradicionais e do extinto IBC, certamen-te a nossa cafeicultura j teria ido bancarrota total. Na dcada de 60, o governo mandou arrancar os cafezais em 10 todo o Pas, o que resultou na dizi-mao de 1,4 bilho de hectares, dos quais 40% a 50% se transformaram em pastagens. Comeava ali um intenso xodo ru-ral e a inquietao dos produtores, j que a lavoura reduziuse a 2,2 bilhes de cafeeiros, com potencial de 18 a 20 milhes de sacas. Um nmero, portan-to,

insuficiente para o consumo e expor-tao, na poca fixados em 25 milhes de sacas. A este golpe juntou-se, em 1970, a doena Hemileia Vastratrix, que antes tinha arrasado enormes regies cafeeiras da frica. Paralelamente ocor-reu a evoluo de outras pragas. O ataque de misericrdia contra o caf no Norte do Paran veio em junho de 1975, quando as geadas afetaram toda a zona produtora. No entanto, tei- mosos e valentes, os plantadores deci- diram recomear tudo. Muitos se recapi-talizaram.Outros no e agora frustrados por ela abandonaram a lavoura. O abalo causado por essa queda, no fez a regio esmorecer. Em 1951, pela Lei 790, de 14 de novembro, Santo Incio foi elevado a municpio, instalado em 14 de dezembro de 1952. Vieram outros ciclos de uso das terras, onde no passado remoto estiveram personagens da maior expresso, ligados s Coroas de Espanha e Portugal, ao Papa e Companhia de Jesus, fundada em 1534, por Santo Incio de Loyola. O FUNDADOR DE SANTO INCIO Desde o incio do seu trajeto, a es-trada que Manoel Firmino de Almeida iria percorrer, j insinuava um modelo empreendedor. Nascido em 10 de outu-bro de 1883, filho do casal de lavrado-res Jos Firmino e Henedina Augusta de Almeida, trilhou seus primeiros passos numa fazenda, a Bom Jardim,na locali-dade de Sururu, hoje com territrio vin-culado ao municpio de Castro Alves, no Estado da Bahia. Em 1890, com sete anos de idade, Manoel foi matriculado numa escola ru-ral, dirigida pelo professor Francisco Flix Santos S. Completados trs anos do curso primrio, e agora com 10 anos, seus pais morreram e, rfo, foi morar na casa do tio e padrinho, Aprgio Alves de Almeida, que o inscreveu no Colgio So Salvador, na Capital do Estado. Ali terminou os estudos prelimina-res, transferindo-se, logo aps, para o Ginsio Arquiepiscopal de So Vicente de Paula, onde realizou o curso Prepara-trio. Esta ascenso permitiulhe ingres-sar, em 1905, na Escola Politcnica da Bahia, formando-se engenheiro civil, di-plomado em 5 de abril de 1911. Estava, na poca, com 28 anos de idade. Anterior a isto, para sobreviver e custear os estudos, empregou-se como professor de matemtica e auxiliar de diretoria num colgio da capital bahia-na. Exerceu as duas funes, no perodo de 1904 a 1909 e, afastando-se, em 1910 desenvolveu a atividade de enge-nharia na construo de variantes e nos projetos das estradas de ferro de Naza-r e Santo Amaro, e na elaborao dos estudos do complexo Leste Brasileiro, tambm no Estado da Bahia. O trabalho de Manoel Firmino de Almeida foi ininterrupto. Aps quatro anos no segmento ferrovirio, em 1914 foi contratado como Delegado de Terras e Minas, ainda na Bahia. Na funo, instalou o 7 Distrito daquele rgo, em Camamu. Junto com vrios outros enge-nheiros chefiados por ele, efetuou a discriminao de posses de terras numa grande zona produtora de cacau. Nessa misso, Firmino de Almeida se defrontou com graves conflitos agr-rios, na disputa de glebas entre possei-ros, supostos proprietrios legais das reas, e o governo estadual. Sua inter-ferncia levou pacificao dos litgios, o que aumentou sua projeo tambm nas instituies oficiais. Permaneceu frente da Delegacia de Terras e Minas at 1922, mudando-se para o sul. Residindo agora no muni-cpio paranaense de Tibagi, tornou-se concessionrio de terras do Estado, na parte norte, abrangendo as zonas ainda despovoadas beirando o rio Paranapa-nema e a foz do Santo Incio. Tratava-se de um territrio isolado, sem comunicaes com outras regies, situao que Manoel 11 Firmino de Almeida amenizaria, atravs da abertura de um caminho de 52 quilmetros, em rea paulista, de acesso ao Paranapanema, na frente da foz do Santo Incio. Homem de confiana do Governo do Estado do Paran, Almeida encerrou a medio das terras em 1923. Traado desenhado nas mos, levou-o ao gover-no, que o aprovou, atravs de despacho de

setembro daquele ano. Era justa-tamente a gleba devoluta de 50 mil alqueires, de concesso lhe outorgada e onde fundaria a Colnia Zacarias de Ges, futura cidade de Santo Incio. A demarcao oficializada em 1924, foi suficiente para o incio da coloniza-o, inaugurada pelo primeiro compra-dor de lote, Ovdio Pereira da Silva. As fortes relaes entre ambos levaram Firmino de Almeida a contratar Ovdio para administrador do imvel. O Paran confrontava-se com srios problemas de grilagens de terras, qua-dro estendido propriedade concedida ao engenheiro civil bahiano, que se deslocara para investir no Sul do Brasil. Ele deparou-se ainda com a crise nacio-nal de 1929, que prosseguiu at o ano seguinte, deixando seqelas duradou-ras. Nada, porm, bloqueava o trajeto do intrpido empreendedor, que para ativar a ocupao da gleba, chegou a doar, nos anos de 1931 e 1932, parce-las de at dez alqueires, condicionando a medida moradia dos beneficiados no local, por, no mnimo dez anos. Alm de Santo Incio, Manoel Fir-mino de Almeida projetou e conseguiu edificar o povoado de Guairac, que atualmente a cidade e municpio de Cafeara. Ele no esperava o desenvolvi-mento solidificar-se s pela iniciativa dos habitantes precursores. Cuidava da infra-estrutura, no caso de Santo In-cio, construindo a primeira escola pbli-ca, na Avenida Raposo Tavares, esco-lhendo para sua diretora, a professora Celina Mota de Souza. Dirigiu a campa-nha do povo que resultou na construo da primeira igreja, doando ao templo o altar-mor e a imagem de Santo Incio de Loyola, indicado patrono local. Outra medida imediata ao princpio da expanso do lugarejo foi conferir segurana populao, com a nomea-o de um subdelegado de polcia e criao da guarda noturna. Mais um cui-dado consistiu da abertura de estradas de ligao com a vizinha Jaguapit, e a cidade paulista de Presidente Prudente. Em seguida construo das vias necessrias, mesmo que precariamente, Almeida ativou o sistema de transporte coletivo de passageiros, acertando esta funo com Vitrio Colnago, depois Domingos Jorge, Antnio Alves & Cia., e de maneira mais slida, com Manoel Car-reira e Filhos, donos da Viao Carreira. Foram cerca de 30 anos de traba-lho contnuo. Manoel Firmino de Almeida s comeou a parar em 1952, quando os antigos povoados, transformados em Santo Incio e Cafeara, j reuniam condies suficientes para serem promovi-dos a municpio. Ento, optou por morar na cidade, buscando tambm ali, trata- mento mdico, para uma impertinente molstia, da qual conseguiu livrar-se. Jornada terminada com louvores ao empreendedor bahiano, que rfo aos dez anos, estudou o trajeto a percorrer, se fazendo engenheiro civil, colocando-se logo, frente de grandes projetos ferro-virios e outros. Manoel Firmino de Al-meida morreu em 16 de dezembro de 1965, com 82 anos, em So Paulo.

FUNDAO DA REDUO DE SANTO INCIO

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Chamamos de redues aos povos de ndios que vivendo sua antiga usana nos montes, foram reduzidos pelas diligncias dos padres a povoaes grandes e vida poltica e humana. (Montoya Conquista Espiritual), Os jesutas comearam a entrar na regio de Guair, nos primeiros anos do sculo XVII. Era, o territrio, de dom-nio legal e de fato do governo do Para-guai e da sua provncia eclesistica. Os padres tinham como misso bsica, a mudana do sistema de dominao dos ndios, sempre avessos presena da civilizao nas suas reas primitivas. As medidas que deveriam ocorrer vieram do governador do Paraguai, Hernando Arias Saavedra. Eleito pela primeira vez em 1591 e se tendo demi-tido do cargo em 1593, foi um pacifica-dor das tribos, porm, usando mtodos violentos, j utilizados por seus ante-cessores. Mais tarde, vencedor, tornou-se generoso com os nativos, como se arrependido das chacinas a que foram submetidos para serem aprisionados os sobreviventes. No entanto, reocupando o governo em 1601, logo cuidava de aumentar o efetivo domnio sobre as reas de- fendidas a qualquer custo pelas tribos. Com seu exrcito marchou rumo ao estreito de Magalhes, na captura de mais ndios num raio de 200 lguas. Deu-se mal. Num dos combates foi preso e fugiu, protegendo-se em Buenos Aires, disposto a continuar suas aes. Organizou novo exrcito, e no con-fronto seguinte subjugou os nativos. A vitria o impulsionou a preparar nova incurso, agora contra as aldeias do Gran Charco, fazendo prisioneiros gran-de nmero de guaicurus. A prxima investida foi em Guair, onde os ndios tinham se rebelado, para livrar-se da escravido. Saavedra imps suas armas sobre eles e foi sucessiva-mente batido, perdendo muitos soldados. As derrotas o levaram a mudar de ttica e, dirigindo-se ao Rei Felipe III, props-lhe entregar a tarefa de pacifi-cao das tribos aos padres jesutas. Atravs de Carta Rgia, de 1608, a idia foi aprovada, e em seguida, a Pro-vncia de Guair passou ao domnio da Companhia de Jesus. Em 1610, os pri-meiros missionrios j se enfiavam nos sertes. Os padres Simo Mazzeta e Jos Cataldino receberam o comando dos trabalhos no territrio do rio Pirap, e Lorenzana e Francisco de So Marti-nho foram enviados s margens do rio Paran, hospedados pelo cacique Arapi-zandu, na sua tenda. Iniciava-se a conquista que deveria ser pacfica, do chamado pas de Guai-rac, o que iria ser uma das grandes obras dos guerreiros de Cristo. A mis-so dos padres desenvolvia-se nas pr-prias aldeias, ou nas matas, pregando a doutrina aos silvcolas durante a prtica da caa, pesca e outras atividades. O processo era lento. Veio ento, a idia de substituir as peregrinaes dos jesutas, por mtodo diferente, capaz de apressar a converso dos primitivos ao cristianismo.Enviado da Europa re-gio, como inspetor dos trabalhos da Companhia de Jesus, o padre Esteban Paes ouviu dos missionrios a proposta de unir as expedies errantes. Tinha-se como certo, obter-ser os fundamentos dalguma causa durvel, pois que como a boa semente era a palavra, no bastando lan-la terra e seguir avante deixando-a abandonada ao acaso, mas era mister vigia-la at dar frutos. Aquiescendo idia, o sacerdote visitante sugeriu, ento, que todo o pas a leste do Paraguai e ao norte do Prata se deixasse aos jesutas do Brasil, pela plausvel razo de ficar no alcance deles, que j eram senhores da lngua falada nestas provncias e o Tucuman e Chaco recebessem do Peru seus missionrios. Se, contudo, essa medida causou regozijo em Tucuman, em Assuno, foi mal recebida, pois ali 13 j se registrava certa animosidade contra os jesutas. O argumento, para isto, sustentava-se na suposta deciso do Conselho das In-dias de no permitir que missionrios portu- gueses formassem estabelecimentos nu-ma provncia castelhana.

Os jesutas continuaram como fazi-zam antes, peregrinando pelos sertes, at 1608, defendendo, batizando e con-vertendo silvcolas. A idia de proteo, no era aceita por autoridades do go-verno paraguaio, por enxergar nela, um obstculo escravizao dos nativos. Nesse ano, a Corte de Madrid enviou ao governador e ao bispo de Assuno, o seguinte recado: ...Que os ndios do Paraguai s pe-la espada do esprito fossem subjuga-dos, salvo se fizessem guerra aos espa-nhis, justificando, assim, o emprego de medidas ofensivas. Doutra forma no se haviam de empregar seno missionrios na sua reduo pois no queria Sua Ma-gestade sbditos fora, nem buscava privar de sua liberdade os povos desses pases seno para arranc-los vida selvagem e dissoluta e faz-los conhe-cer e adorar a Deus tornando-se felizes neste mundo e no outro. Chamado a Assuno, padre Diogo Torres foi consultado a respeito da for-ma de executar os altos propsitos da Corte de Madri. Venceu a idia de os ndios em converso serem aldeados e governados independentemente da juris-dio de qualquer cidade ou fortaleza de Sua Magestade, a quem quer que, sob qualquer pretexto que fosse, quizesse sujeitar esses novos cristos ao encargo de servios pessoais. Foi dada aos padres Simo Mazzeta e Jos Cataldino, ambos italianos, a ta-refa de realizar as ordens rgias, auto-rizados pelo governador e pelo bispo de Assuno. O campo de ensaio do siste-ma foi Guara, informa Romrio Martins, explicando que nessa extensa provncia existiam apenas dois sacerdotes, um em Ciudad Real e outro em Villa Ricca Del Spritu Santu, descritos assim: Um era frade vagabundo que, tendo perdido o hbito de sua ordem, desonra-va as vestes clricas que em lugar dele vestira, e o outro to ignorante que en-trava em dvida se possuiria os conhe-cimentos necessrios para tornar vli-dos os sacramentos que administrava. Mazzeta e Cataldino seguiram por terra at o Paranapanema, atravessan-do o serto bravio de Apucarana. Por aquele rio, chegaram margem esquer-da, na foz do Pirap. Nesse local conta-ram 200 famlias guaranis batizadas pelos padres Orteza e Filds. Ali, funda-ram a primeira reduo com o novo sis-tema,denominando-a Nossa Senhora do Loreto, sobre quem os padres Techo e Charlevoix escreveram: A Loreto, grandemente povoada por ndios arrebanhados e convertidos no vasto pas, logo se ajuntou, a seis milhas distantes, a Reduo de Santo Incio Mini, tambm em pouco tempo engrandecida. A destemerosa e insigne falange missionria por sua vez aumentou e as redues pontearam o pas de Guairac nas regies do Iguau, do Piquiri, do Pa-ranapanema e do Tibagi e os soldados de Cristo conheceram ento a idia de uma repblica modelada pelo ideal que eles mesmos formavam da perfeio crist. Em Histria do Paran Romrio Martins relata. -O sistema adotado pelos jesutas para a converso do gentio de Guara, assentou na vantagem da fundao de aldeias onde fosse constante a assistn-cia dos religiosos, de preferncia as visi-tas peridicas s suas tabas, como ocor-rera at ento. A essas aldeias para onde removi-am os conversos, chamaram reduo. Ao tempo da conquista do serto, re-duzir ndios e prepar-los, como faziam os bandeirantes, para vend-los ou escraviz-los s suas fazendas. Mas pa-rece que ao denominarem reduo s aldeias que fundaram, pretenderam os jesutas significar que as constituam redutos, isto , defesas intromisso dos perseguidores dos ndios, pois que ao tempo, nas terras da Coroa de Cas-tela, qual Guair pertencia, o gentio era repartido pelos senhores brancos, sob o odioso regime da Janacona e da Mitaya, para que os servissem como escravos, ou simplesmente caados como o faziam os paulistas. Diz mais o autor que da idia de reduo sobreveio o alto pensamento de se constituir, com o conjunto das redues, uma repblica guarani, 14 se-gundo o ideal de perfeio crist, da qual foi Guair a construo fundamen-tal, prosseguida depois nas misses orientais entre os rios Uruguai e Paran.

Acompanhando o sistema introduzi-do pelos jesutas no Brasil, Nossa Se-nhora do Loreto (Santo Incio Maior), ao ocidente do rio Paran, foi a primeira reduo fundada. Em seguida, nasceu Santo Incio Mini, ao sul do Paranapa-nema. Logo, a partir de 1910, os dois aldeamentos assumiram a mxima pre-ponderncia na obra civilizadora desen-volvida no serto sul-americano. Como sugere Martins, tal grandiosi-dade chegou ao ponto de, por ocasio de seu forado abandono, rivalizarem com as melhores povoaes do Para-guai. Loreto era habitada por 900 fam-lias e Santo Incio por 800 famlias. Os ndios cristianizados possuam grandes rebanhos de gado, plantaes, usando suas safras tambm para socor-rer os novos aldeamentos. A princpio os jesutas davam-lhes sementes e dois bois para o trabalho de arao da terra. Segundo Martins, viram, porm, em breve, que este sistema no se acomo-dava com a ndole prdiga do gentio, e estabeleceram o regime das lavouras coletivas, armazenando os produtos a distribuir pela comunidade na proporo de suas necessidades. Agiu-se da mesma maneira com o gado, reunindo-se os que haviam sido levados pelos primeiros fundadores de redues, em 1610, de forma a se espe-cializar sua criao, multiplicando-se satisfatoriamente. Tanto em Santo In-cio como nos demais aldeamentos, os trabalhos de interesse e progresso lo-cais foram sistematizados. Os padres os drigiriam e tambm os realizavam, co-mo estmulo e ensinamento. Estavam presentes, entre outros servios, no cor-te da madeira, trato dos animais, ola-rias, eram carreteiros e lavradores. Na administrao da reduo impe-rava a autoridade do cura, havia um alcaide e um corregedor que em regra eram caciques dos mais prestigiosos, cargos meramente honorficos, destina-dos a estabelecer a ordem na povoao, nesse caso confiada aos prprios ndios. O alcaide se encarregava de execu-tar os programas dos trabalhos e das festas e mantinha a ligao necessria com os demais caciques. Cada grupo de cem famlias possua o seu chefe, po-rem com autoridade reduzida. A educa-o e alimentao das crianas se tra-tava de encargo de todos, mesmo com elas morando nas casas dos pais. Diariamente 150 meninos compare-ciam igreja, assistiam a missa, que se seguia de lies de catecismo, leitura, escrita e msica, e os rapazes almoa-vam com o reitor, alimento recebido do celeiro da comunidade. Em grupos di-ferenciados, em sexo e idade, e aos cuidados de censores escolhidos por eles prprios, iam tratar de suas ocupa-es: os rapazes nas lavouras e na lim-preza das ruas e caminhos da reduo e as moas (raparigas) na colheita ou na fiao do algodo e outros misteres menos exigentes de fora. Existia uma ordem estabelecida e rigorosa para tudo isso. As oraes se repetiam tarde, na igreja do ncleo. Os rapazes jantavam com o reitor e as raparigas ocupavam-se dos trabalhos domsticos, nas suas respectivas casas. Recebiam folga durante os jogos que os padres lhes ensinavam ou naqueles de prtica tradicional dos ndios, tolerados com reservas pelos missionrios. Cnticos realizados por todos acom-panhavam a entrada e sada da igreja, e o ensino se efetuava em guarani, lngua adotada pela comunidade. Os sinos, os pfanos e as campainhas alegravam e estimulavam os atos dos quais os cris-tianizados participavam, no templo e na praa da reduo. Consistia obrigao de toda a comunidade comparecer s festas religiosas, sendo a mais significa-tiva e pomposa delas, a do padroeiro. Nessas ocasies os ndios erguiam numerosos arcos de folhagem ao longo das ruas onde passavam as procisses. A esses arcos eles prendiam os produ-tos das ltimas colheitas e caadas, numa exibio geral de suas atividades. Mas, a esses atos, juntavam-se as festas profanas, em que se adicionavam sexo e bebida, com trechos de barbrie, o que durava toda a noite. Padre Gue-vara aponta a Reduo de Santo Incio Mini, 15 como a mais bela povoao do seu gnero, incessantemente aumentava. J o padre Roque traou um mode-lo para as casas e o seu arruamento, obras executadas com sucesso, sendo depois copiada em todos os demais al-deamentos jesuticos fundados.

A nova povoao era dividida em nove quadras, uma para a praa, as ou-tras cada qual com seus edifcios de cem ps de frente, contando cinco habitaes para as famlias. So caractersticas da Reduo de Santo Incio Mini, como informou padre Guevara, a mais bela povoao do seu gnero. Ainda sobre ela, em carta ao seu Pronvincial, padre Roque Gonzalez narra uma festa do padroeiro no ncleo. Para a festa preparavam-se muitos dias, levantando arcos na praa por on-de havia de passar a procisso. Saam na vspera a cavalo e noite faziam grande iluminao e estrepitoso alarido com flautas, campainhas, tambores e trombetas; - e todos a uma s voz cla-mavam por Santo Incio, parecendo es- tarem fora de si de contentes. Mas o que levou o regozijo ao auge foi verem subir uns foguetes, cousa inteiramente nova para eles. Desta forma passavam toda a noite em claro, ultimando os preparativos. No dia da festa apinhou-se a igreja de gente, de sorte que muitos tiveram que ficar fora. Depois da missa cantada comearam as danas apropriadas. Mui-to agradaram uns rapazes pintados e adereados com gosto, que vieram em nome dos tuxauas principais do povo com seus presentes de papagaios, perdizes, porcos, tatus e outros animais para ofert-los ao Santo. Depois seguiram-se outros meninos com presentes cada um dizendo o nome do tuxaua ofertante. Finda esta cerimnia saiu a procis-so, indo o andor ricamente enfeitado e nele a preciosa relquia com que Vossa Reverendssima (o Provincial) os mimo-seou, e ao p da relquia uma bela imaagem de Nosso Santo Padre, proprieda-de da reduo. O prestito passou por baixo dos arcos muito bem adornados e vistosos pela variedade de frutos e animais de caa que os rodeavam, tendo-se esme-rado os ndios em levar vantagem uns aos outros. Romrio Martins escreve que por ocasio da festa do padroeiro havia a bno das sementes que deveriam ser plantadas, ato ao qual se dava toda a solenidade merecida, pois da terra por eles prprios lavrada que haviam de obter os recursos para se poderem manter em estado de civilizao, isola-dos como se achavam, por dezenas de lguas, de outra sociedade crist. Por estarem no extremo norte da Provncia de Guair, distante das zonas de maior concentrao desses aldea-mentos,e dos caminhos seguidos pelos bandeirantes, as redues de Santo Incio Mini e Nossa Senhora do Loreto ficaram a salvo dos ataques dos paulis-tas. Mas, esses algozes dos ndios, pois os aprisionavam, os escravizavam ou os vendiam, levaram o temor aos dois al-deamentos, onde chegavam as notcias de assaltos por eles a outros ncleos. Antes que Antnio Raposo Tavares e Manuel Preto estendessem seus assal-tos a Santo Incio e Loreto, os jesutas decidiram abandon-los. Foi em 1928. Atendendo a recomendao de seu Provincial, padre Francisco Vasques Trujil-lo, reuniram-se em conselho, para a fuga dos que se achavam nas duas re-dues, ao todo, 12 mil ndios conver-tidos, alm deles, religiosos. Para dirigir o xodo, foram escolhi-dos os padres Montoya, Simo Mazzeta e Dias Tanho, auxiliados por quatro as-sessores. Seria uma misso sobre-hu-mana, a de por a salvo 12 mil pessoas, acossadas por todo tipo de perigos, co-mo diz Martins, atravs da imensido das distncias, da inclemncia dos ini-migos, das precrias condies da fuga. Trecho de relato de Montoya, resume o que foi essa correria, que exigiu a travessia do rio Paranapanema abaixo, e frente, ingressando no rio Paran. Parecia um dia de juzo, aquele em que fizemos a mudana. Em menos de um dia 700 jangadas e numerosas canoas estavam prontas na margem do Paranapanema, da foz do Pirap do Santo Incio. E foram lanadas ao grande rio ponteado de ca16 choeiras, e 12.000 ndios, guiados por sete padres se confiaram quelas guas em rpido declive para o mar. Milhares dessas pessoas em fuga, morreram no trajeto, umas afogados, outras devorados por animais selva- gens. Estes ltimos s conseguiram escapar de morrer nas mos dos ban- deirantes de

So Paulo, comandados por Antnio Raposo Tavares e Manuel Preto. No demorou para eles chegarem ao Paranapanema e ingressar em Santo Incio e Loreto, irritando-se por encon-trar os dois aldeamentos abandonados. Eles depredaram as igrejas e ocu-param os aposentos dos missionrios, que conforme escreveu Montoya, foram pousadas de vida santa, manchando-se com muitas mulheres que tinham apanhado, fazendo ver a essas paredes entre as quais se passavam vida sem mcula, procedimentos imundos e hediondos. Com parte dos fugitivos j extermi-nada, veio o socorro, atravs de canoas dos padres do baixo Paran, que os le-varam outra margem do rio, onde acamparam, quase inteiramente aniqui- lados. Porm, o martrio no terminava ali. Os alimentos trazidos pelo auxlio, sob comando dos padres e o mestre de campo Manoel Cabral, foram suficientes apenas para os primeiros dias. Ainda que tambm os recursos naturais da regio tenham sido todos consumidos, a fome atingiu os ndios e os jesutas. Sobreveio a fome, com todos os seus horrores, assinala Romrio Mar-tins. Padre Montoya escreveu nas suas anotaes: Nada chegava bastante. Por esse motivo couro de vaca seco, e at cobras, sapos e mais quanta cousa se via, agarravam para comer. Na seqncia das agruras, uma epi-demia devastou os doutrinados de Lore-to e Santo Incio Mini. Montoya relata: Dois mil morreram depois de terem to-mado o sacramento. Assim, nasceu e virou runas, a Re- duo de Santo Incio Mini, a quem a cidade de Santo Incio homenageou, extraindo dela o seu nome. AS 13 REDUES SEGUNDO MOUSSY O autor V. Martin de Moussy rela-ciona assim as 13 redues jesuticas: 1- Nossa Senhora do Loreto, capi-tal da Misso, fundada em 1610, junto foz do Pirap no Paranapanema. A, Montoya escreveu em 1613: a Arte y Vocabulrio de la Lngua Guarany, que serviu aos missionrios para se entenderem com os ndios e que foi um dos primeiros livros impressos na Am- rica, na reduo de Santa Maria Maior. A segunda edio desse livro foi impressa em Madrid, em 1640. A situa-o da Reduo de Santa Maria Maior ficou bem assinalada pelo padre Gay, em sua Histria da Repblica Jesu- tica do Paraguai. Ele escreve: Pouco ao N. da foz do Iguassu no Paran, o destrudo povo de Santa Ma- ria Maior, desgua, pelo lado direito, no Paran, o rio Acara formado de v- rios rios. 2- Santo Incio Mini, esquerda do rio Santo Antnio, afluente do Para- napanema. 3- So Francisco Xavier, esquer-da do rio Tibagi. 4- So Jos, esquerda do rio Ti-bagi. 5- Anunciacin, esquerda do rio Tibagi. 6- So Manuel, esquerda do rio Tibagi. 7- Santo Antnio, direita do rio Iva. 8- So Pedro, direita do Parana-panena. 9- So Tom, esquerda do rio dos Faxinais, afluente do Iva. 10- Los Angeles, direita do rio dos Faxinais. 11- Concepcin ou Santa Maria, direita do Iguau. 12- So Paulo, direita do Iva. 13- Jesus Maria, direita do Iva. 17 O mapa de Olmedilla, elaborado em 1775, refere-se a outras redues, as de Copacabana, no rio Piquiri; Em-carnacin, no rio Tibagi; Los Archange-les, no rio Piquiri; Tombo, no rio Piqui-ri. E

segundo Romrio Martins, outros autores acrescentam mais as seguin-tes: Santa Ana, Assiento de La Iglesia, So Joo Evangelista e So Roque. Ainda Martins informa que eram as seguintes as determinaes de diversas aldeias indgenas transformadas em re- dues pelos jesutas: Ipaucumbuco, Santo Incio. Ibiti-rembet, So Francisco Xavier. Ipitura-pina, Concepcin. Inia, So Paulo. Tu-cuti, So Jos. Taioba, Los Angeles. Natingui, Encarnacin. Ibituruna, So Miguel. Estas explicaes levam a outra origem da cidade de Santo Incio: a aldeia indgena de Ipaumbuco, que deu origem Reduo de Santo Incio Mini. Os jesutas reuniram nesses nu-cleos mais de cem mil ndios, nmero registrado em 1629, quando ocorreu o ataque pela bandeira de Antnio Rapo-so Tavares e Manuel Preto. Calcula-se que as tropas de ambos mataram 15 mil daqueles nativos aldeados, e 60 mil foram escravizados e vendidos em So Paulo e nas capitanias do Norte. Foi to grande a quantidade de in-dios aprisionados, que o preo deles no mercado de escravos, ento fixado em 100$000 (cifra da poca), foi reduzido para 20$000 por pea. Este era o no-me como se qualificava o selvagem nas ofertas aos compradores. A maioria dos ndios levados para doutrinao na Reduo de Santo In-cio Mini, era da famlia Guarani. J as primeiras exploraes do serto avaliou serem eles um grupo enorme, vivendo em liberdade plena, entre os rios Para- napanema, Paran, Tibagi e Iguau. Martins fez esta observao: Em 1541, lvar Nuez Cabeza de Vacca, mandado pelo rei de Espanha para o Paraguai, como adelantado, tomou posse em nome do soberano, de Cana-nia e da Ilha de Santa Catarina e se internou no territrio do serto corres-pondente a esses dois pontos extremos da costa, seguido de numerosa comiti-va militar, e fez o longo trajeto do lito-ral ao rio Iguau, Campos de Curitiba, Campos Gerais, rios Tibagi e Piquiri e novamente ao Iguau, e em todo esse imenso percurso encontrou numerosas aldeias de ndios guaranis e nenhuma outra nao de silvcolas. Em 1555 e 1557 o governo do Pa-raguai, apossando-se desse territrio, fundou as povoaes de Ontiveros, Vil-la Rica e Ciudad Real Del Guayra, res-pectivamente junto ao rio Paran, pr-ximo foz do Piquiri e do Corumb-ta, com soldados e civis castelhanos e a estes submeteu os ndios guaranis dos quais precisassem para os seus trabalhos e para defesa da terra. De 1610 a 1629, autorizados pelo soberano espanhol, os padres da Com-panhia de Jesus mantiveram 13 redu-es do gentio guarani nos vales dos rios Pirap, Tibagi, Iva e Piquiri. So-mente depois da destruio, pelas bandeiras paulistas, das povoaes castelhanas e jesuticas, foi que ndios de outras etnias invadiram esse exten-so territrio compreendido na provncia espanhola de Guair, sujeita ao gover-do Paraguai. O principal rio que banha o muni-cpio de Santo Incio o Paranapane-ma, cuja bacia possui como afluentes principais, o Cinzas, Itarar, Tibagi e Pirap. So tributrios deles, os rios Jaguaricatu e Jaguariava (do Itarar); o Laranjinha e o Jacarezinho (do Cin-zas); o Iap e o Pitangui (do Tibagi). O rio Paranapanema comea a se formar na divisa Norte do Paran com So Paulo, correndo no rumo geral Leste-Oeste. No relatrio da explorao que fez neste rio, em 1865, os irmos Keller, engenheiros, escreveram: Em qualquer estao do ano livre a navegao deste rio desde a sua barra at a Serra do Diabo, por no lhe opo- rem embara-os as quatro corredeiras da pequena corren-teza de 1:600, que se 18 encontram nesta extenso de 13,4 lguas; mas que no tempo das guas altas pode estender-se Colnia de Santo Incio, a 20,90 do Paran. A colnia qual os Keller se refe-rem era a Reduo de Santo Incio Mi-ni. As caractersticas naturais desse rio, apontavam a largura de 123 metros na barra do Itarar, 220 metros abaixo do Santo

Grande, de 820 metros entre o Tibagi e a altura da extinta aldeia ndio-crist de Santo Incio, 607 metros da Serra do Diabo e de 374 metros da ao rio Paran. Com profundidade mdia de dois metros, e na foz, mais de quatro metros, nas guas baixas. Mas, o Paranapanema perdeu seus recursos primitivos. Foi duramente afe-tado por grandes usinas hidreltricas, construdas pela Companhia Energtica de So Paulo (Cesp). Um dos efeitos imediatos foi o desaparecimento de su-as corredeiras, j que todo o seu leito foi transformado num enorme lago. MADEIRA, PRIMEIRO CICLO ECONMICO LOCAL A madeira foi um ciclo econmico muito influente e precursor na regio polarizada de Santo Incio. O Coronel Marcelino Alves de Alcntara, um dos que logo chegaram para investir nas terras entregues pelo governo a Manoel Firmino de Almeida, abriu a primeira serraria, inaugurando aquele ciclo que no durou muito, j que, abatida indis-criminadamente, a floresta foi extinta. Alcntara vendeu sua indstria a Jos Paulo Soares, que aumentou a ca-pacidade de produo, chegando a ex-port-la atravs do Porto de Santos, no Litoral de So Paulo. O pice da ativida-de estendeu-se de 1950 a 1960, entran-do em queda, por causa da falta de toras para beneficiar. Das diversas ser-rarias, restaram somente duas, as de Jos da Silva e Leonor Jos Rodrigues. Ambas permaneceram em operao durante 15 anos, superando a crise da matria-prima, por meio da busca em regies distantes, embora isto encare-cesse o produto final. Mas, Silva e Ro- drigues tambm se viram obrigados a fechar seus estabelecimentos. Na relao de rvores nobres, so-bressaam-se as espcies pau-dalho, peroba, cabreva, guarit,angico, jato- b, amoreira, guaiara, cedro, corao-de-negro, gurucaia,marfim, goivira, ip, timburi e canjarana. As duas ltimas espcies eram as mais utilizadas no pre-paro de tabuinhas para cobrir as casas erguidas pela frente pioneira. Era um tempo de grande eferves-cncia no Patrimnio da Reduo de Santo Incio. Os madeireiros, maquinis-tas de algodo e caf, donos de peque-nas glebas, aventureiros chegados no se sabe de onde, operrios colocando tbua ao lado de tbua, tijolo sobre tijo-lo, caixeiros-viajantes que a cada visita encontravam mais gente, mais negcio, estrangeiros dispostos a eleger a terra recmdescoberta sua nova ptria. Trecho da publicao Santo Incio, Paran, 50 anos de emancipao polti- ca, diz: No incio, cada famlia cuidava de plantar sua roa para o seu prprio sustento: arroz, feijo, milho, mandioca e batata. Providenciavam a criao de porcos, galinha, cabrito, conseguiram algumas vacas para a produo de leite e tinham tambm os animais para trao. Em outro item, l-se: Na misso de desbravar e povoar a regio, teve o Sr. Manoel Firmino de Almeida a ajuda de pioneiros empreendedores que com muita determinao souberam enfrentar as dificuldades que o serto oferecia. A derrubada da mata, a falta de proteo (habitavam em pequenos ranchos), o perigo de ataque das feras, dos mosqui-tos, do servio pesado, da falta de mei-os de comunicao, as estradas, picadas no meio da selva, onde apenas passa-vam carroas puxadas por cavalos ou tropas. A travessia do rio Paranapanema era feita por canoas, botes e depois por uma rstica balsa que logo afundou. Conforme escrito oficial, logo aps a demarcao da gleba pelo fundador Manoel Firmino de Almeida, vieram os primeiros colonos. A fonte cita os nomes de Ovdio Pereira da Silva, Joo Ferreira Pinto, Pedro Pinto de Andrade, Oswaldo Rocha Freitas Neiva, Max Hermann e Haroldo Rochas Freitas 19 Neiva. E, mais adiante: A primeira denominao deste po-voado foi Zacharias de Ges, porm, em 1948, foi elevado categoria de distrito, e passou a denominar-se Distrito da Re-duo de Santo Incio.

A partir de 1960, comeou o ciclo do algodo, com altos rendimentos, su-ficientes para atrair tambm regio, grande nmero de nordestinos. Note-se como o assunto descrito em Santo Incio, 50 anos de emancipao polti-ca: O Municpio todo se engalanava para a festa da colheita que fornecia vasta mo-de-obra para a famlia toda. Formavam-se verdadeiras colmias hu-manas. Todos participavam. As ruas da cidade transformavam-se em celeiros. Daqui saram milhares de toneladas de algodo para as indstrias. So apontados como maiores com-pradores, os pioneiros Massaru Uchida, Benedito Andrade, Lus Benedito e Cae-tano Lupion. Eles e outras pessoas de menor expresso no ramo, revendiam o algodo para os grandes complexos de agroindustrializao Sanbra, Brascotoni, Casul,e Braswei.

Razes de Santo Incio DE VACCA E SCHMIDEL - GRANDES PRECURSORES DESSA HISTRIA A frente pioneira que desbravou a regio do hoje municpio de Santo Incio foi muito mais que uma empreitada, da era dos silvcolas aos dias de hoje. Ela rompeu os prprios limites, com seus elementos atuando como se fossem um exrcito que parte para o ataque, e as derrubadas so os campos de batalha. Os indgenas nativos, os bichos que com eles disputavam os espaos da selva, as molstias epidmicas, a mata hermtica no conseguiram fatigar os passos daqueles homens e suas mulheres, enfiados no serto. Corajosos e audazes prosseguiam sempre. Mas, ainda que dotados de tais qualidades nobres, nem todos puderam chegar ao fim da jornada. Muitos ficaram no caminho, sepultados na floresta, vencidos pelos obstculos indomveis. Chegaram ali, annimos, e desaparece- ram annimos, enquanto outros continuaram avanando rumo ao desconhecido. s vezes uma rpida interrupo para tomar flego e l ia a audaz marcha engrossada por indivduos novos, chegados de qualquer ponto do mapa brasileiro. E nos seus passos vinham tambm estrangeiros dispostos a eleger o solo rstico sua outra e definitiva ptria, retornando, mais tarde, aos pases de origem para buscar os parentes que ficaram. Como resultado da grande jornada, no futuro nasceriam os povoados, em trechos diversos do serto em desbravamento para, na fase contempornea, virarem cidades. Uma delas, Santo Incio, na direo do rio Paranapanema, que o tempo e o progresso, da mesma forma, iriam transformar, se erguendo nas suas guas piscosas, as gigan- tescas hidreltricas. Mais que uma simples histria, foi uma epopia colossal, agora contada em livro. Obra assinaladora das vrias etapas dos avanos das frentes desbravadoras, que nem as crises econmicas, s vezes aceleradas pelo jogo das circunstncias polticas mundi-ais conseguiram segurar ou ao menos intimi- d-las. Essa histria tem seu comeo anota- do na bandeira da expedio de lvar Nuez Cabeza de Vacca, que o mundo batizou de Andarilho das Amricas feita aos sertes do atual Paran, em 1541 e 1542. Aquela foi a primeira investida neste territrio, favorecida pela presena do clebre Caminho do Peabir, aberto pelos ndios, em data desconhecida. Depois de Cabeza de Vacca chegaram mais exploradores, casos de Ulrich Schmidel, Hans Staden, Brs Cubas e Ruy Diz de Melgarejo, entre 20 outros. De Vacca e Schmidel aparecem na Hist- ria como os mais ousados da ingente marcha primitiva aos sertes. De Vacca pertencia a uma nobre e influente pliade de explora- dores e

conquistadores espanhis do Mundo Novo. Schmidel foi um lansquenete alemo, que s encerrou sua tarefa continente afora, aps 19 anos de peregrinaes. Trecho de um documento da Universi- dade de So Paulo (USP) sugere que Cabeza de Vacca sozinho j seria suficiente para mostrar a coragem daqueles precursores remotos. E sobre ele o historiador Henry Mil- ler escreve: Foi um momento glorioso na legenda sangrenta criada pelos conquista- dores. Na avaliao de Miller, ele deixa de ser um personagem apenas histrico para se transformar num smbolo. Sua expedi- o pisou o cho do Paran, em 1541, quando se dirigia ao rio da Prata, com a misso de salvar uma comitiva espanhola sitiada pelos ndios primitivos. O prprio de Vacca anotou: Nosso barco avanava entre ondas imensas. amos nus e tnhamos muito frio. E ento, de repente, um golpe violento de gua fez a embarcao nau-fragar. Como aquela costa era muito brava, o mar nos lanou aos trambolhes de volta para a praia. E, no meio s ondas, perdemos trs de nossos homens. Os demais se salvaram. Mas, agora, tremamos de frio e de medo e no tnhamos o que comer. Podamos con- tar todos os nossos ossos, sendo as prprias figuras da morte. H meses comamos apenas milho cru, nada mais. Com o vento norte soprando forte, sentamos mais perto da morte do que da vida. Conforme suas anotaes os ndios, en- to inimigos, se comoveram diante da situa- o do grupo perdido na beira do oceano. Ao invs de atac-los, levou-lhes alimento. De Vacca acrescenta: Se espantaram ao verem nosso estado e nosso comportamento. Perce- bendo o desastre que nos acometera, eles se compadeceram de nossa desventura e misria e chegaram junto de ns. Ulrich Schmidel, cujo mapa de sua tra-jetria mostra que tambm pisou no atual-mente territrio de Colorado, ganhou obras de estudiosos notveis. Um deles, Reinhard Maack, do Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnolgicas e da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da Universidade de So Paulo (USP) diz a seu respeito: Sobre a misso de Schmidel, suas viagens e aventuras, existe uma literatura to extensa, que torna-se desnecessrio ingressar nos pormenores da personalidade deste alemo e sua obra total. De acordo com Maack, a marcha de Schmidel representa, na literatura histrica e geogrfica,a primeira tentati-va conhecida de alcanar a costa leste, muito mais ao norte da base utilizada pelos espanhis da Ilha de Santa Cataraina, a partir do interior do continente sul-americano. Sabe-se que Ulrich Schmidel e lvar Nuez Cabeza de Vacca penetraram nos sertes, o primeiro em 1552, atravs de caminhos que os ndios teriam aberto antes de Colombo descobrir a Amrica. Um deles era o legendrio Caminho de Peabir, que ligava So Vicente, Litoral de So Paulo, no Oceano Atlntico, ao Peru, na costa do Pacfi- co. O Peabir tinha um ramal que cortava a hoje regio de Colorado, ento desconhecida e sem nome, uma terra de ningum. Reinhard Maack confirma estas explora-es, na sua Pesquisa histrica-geogrfica que chamou de O Itinerrio de Ulrich Sch- midel, atravs do Sul do Brasil. Ele escreve: Os ndios denominaram de Peabir o caminho transcontinental mais importante da poca anterior ao descobrimento da Amrica. Mapeia o caminho, esclarecendo que este dirigia-se do litoral paulista, em So Vicente, sobre Itu, Piratininga-Sorocaba para o sul, rumo ao rio Paranapanema, e de l uma das principais nascentes do rio Ribeira. Na seqncia, a partir dos campos de Castro, no Estado do Paran, atingia uma aldeia indgena da tribo Abapany, por meio de uma trilha secundria.Conforme Maack, Cabe- za de Vacca usou o atalho na sua marcha terra adentro, para encontrar o Peabir, e, utilizando-o, chegou ao rio da Prata. ainda de Maack esta explicao: A partir de Abapany-Castro, o caminho principal dirigia-se sobre o rio Tibagi ao rio Iva, do qual foi cruzado acima do salto de Ub, para vencer a serra da Boa Esperana, ao longo do vale do rio Cant. Dali o Peabir como rota principal, estendia-se ao sul do rio 21 Piqueri, encontrando-se a oeste com o alto rio Paran, acima das Sete Quedas. Na sua continuidade, o Caminho do Pea- bir cortava o Chaco argentino, alcanando o planalto do Peru e o Oceano Pacfico. Outro atalho dirigia-se desde as nascentes do rio Cant rumo ao sul, chegando ao rio Iguau, depois a embocadura de um rio chamado Cotegipe e, guas acima, por meio de

sua parte oeste, levava ao Estado de Santa Cata-rina, ao rio Uruguai, e regio de Morpion, segundo mapas da Idade Mdia. Como se observa, a rea geogrfica de Colorado tem igualmente a marca notvel do Peabir, mais uma razo para se cultuar sua histria. Morpion, palavra citada acima, era uma designao dada nos mapas da poca dos descobrimentos, de 1593 a 1648, a um extenso espao entre o rio Paran e o litoral de Santa Catarina, at o Uruguai. Abrangia ao sul enormes regies de Paraguaria e Guair, que cobriam as terras entre os rios Paraguai, Paran, Paranapanema e Iguau, de acordo com a descrio de Reinhard Maack. Como se percebe, Santo Incio um dos filhos dessa grande epopia, que no futuro levaria a um nmero expressivo de novas expedies, uma delas, a de Estevo Ribeiro Bayo, descobridor dos Campos de Mouro, em 1799. Mais um personagem de alta influncia que no passado longnquo circulou pelo territrio, foi o navegador portugus, Brs Cubas, tema que j foi obrigatrio nas escolas de primeiro e segundo graus. Cubas veio ao Brasil para tomar conta das terras que a esposa de Martin Afonso de Souza, D. Antonieta Pimentel lhe concedeu, na localidade de Giribatipa, antiga Capitania de So Vicente. Mas o nobre portugus no foi feliz, em seu projeto de povoar e explorar a propriedade, porque se deparou com ndios ferozes que no permitiram a operao. Atacado constantemente Brs Cubas de- sistiu do plano, porm adquiriu as terras do genovs Pascoal Fernandes e as de Domingos Pires. Nela, fundou, em 1540, a primeira Casa de Misericrdia do Brasil, se originando o ento povoado de Santos, hoje a bela cidade da margem do Atlntico. Em 1560, se tornou provedor da Fazenda Real, ocupando o cargo por pouco tempo, e ao deix-lo, ingressou pelos sertes. Testemunhos indicam que nessa Iincur- so usou o Caminho do Peabir, que confor- me documentos encontrados na Universidade Federal do Paran, sua rota inclua o territrio regional de Santo Incio. AINDA A TRILHA DO PEABIR Como se l em parte frente, deste livro, Santo Incio nasceu a partir da ex-plorao de uma gleba de 50 mil alqueires, obtida em concesso, por Manoel Firmino de Almeida, em 1924. Porm, j antes do deso-brimento da Amrica, por Cristvo Colombo, em 1492, o seu territrio, na poca, inteira- mente inspito, foi marcado pela trilha do Peabir. Cumpre assim, para ampliar o saber a respeito desta histria, incursionar mais por aquele caminho. Acompanhe. Trata-se de obra primitiva deveras fascinante, criada pe- los ndios e mencionada com nfase por notveis historiadores. Histrico Desde antes do descobri-mento da Amrica, os povos indgenas conhe- ciam um caminho que se estendia por mais de 1.200 quilmetros, da costa de So Vicente ao Rio Paran, atravessando os rios Tibagi, Iva e Piquiri, pelo qual se comunicava com o Oceano Atlntico e com as regies mais distantes do ocidente. A oeste do Paran o caminho pros-seguia at atingir o Peru e a costa do Oceano pacfico. Esse caminho histrico, pr-colom--biano, era denominado Caminho do Peabir. Pela descrio de viajantes e exploradores e pelos mapas e cartas existentes, verifica-se que esse caminho atravessava, em sentido leste-oeste, a regio onde hoje se situa o municpio de Santo Incio, no Noroeste do Estado do Paran. A propsito, um estudo de Romrio Martins assinala: 22 Os bandeirantes utilizaram-se do Cami-nho do Peabir em todas as direes da linha tronco e dos seus ramais. Se vinham pela linha tronco, o itinerrio era So Vicente-Piratininga (So Paulo), Sorocaba, Botucatu, Tibagi, Iva, Piquiri. Se vinham pelo Tiet, atravessavam o Paranapanema

prximo foz do rio Pirap, subiam pela margem deste em direo ao Iva, atravessavam pouco acima do seu afluente ento denominado rio da Guia, margeando a esquerda o rio principal. A igual distncia do Iva e do Piquiri, o caminho se bifurcava para o sul e ia ter ao Iguau no ponto em que este rio, na sua margem esquerda, recebe o Santo Antnio. Alm de sua antiguidade histrica, o Caminho do Peabir reveste-se de particular importncia, porque por ele transitaram, no sculo XVI, numerosas personalidades influ- entes e diversas expedies memorveis. Em 1541 passou por ele D. lvar Nuez Cabeza de Vacca e sua expedio militar, Joahann Ferdinando, em 1549; Hans Staden, em 1551; Ulrich Schmidel, padre Leonardo Nunes, os irmos Pedro Corra e Joo de Souza, Juan de Salazar de Espinosa, Cipriano de Ges e Ruy Diaz Melgarejo, em 1556; Diogo Nunes, Brs Cubas e Luiz Martins, em pocas posteriores. Cabeza de Vacca, enviado pelo Rei da Espanha como adelantado do Paraguai, ao desembarcar na Amrica, tomou posse, em nome da Coroa Espanhola, de Canania e da Ilha de Santa Catarina. Para que lhe fosse possvel chegar ao Paraguai, se internou pelo serto correspondente a dois pontos extre- mos, seguido de numerosa comitiva militar, realizando o longo trajeto do litoral ao rio Iguau, passando pelos Campos de Curitiba, Campos Gerais, rios Tibagi e Piquiri e, nova- mente, ao Iguau, nas proximidades dos saltos de Santa Maria, encontrando, em todo esse longo percurso, numerosas aldeias de ndios da nao dos guaranis. No itinerrio que seguiu, o alemo Ulrich Schmidel regressou do Paraguai em 1553, onde, como militar, serviu aos governos de Fernando Mendonza, Irala e Cabeza de Vacca seguindo a trilha do Caminho do Peabir. Encontramos esta descrio sobre o trajeto feito por ele: Partindo de Assuno, desceu o Paraguai e subiu o Paran at a Barra do Iguau, da seguiu pela margem direita at a altura do rio Cotegipe, em seguida atravessou os rios Piquiri, Cant e outros afluentes desses rios; transps a serra da Esperana; passou pelas cabeceiras do Co-rumbata e foi cruzar o Iva nas proximidades de Teresina. Depois, em rumo de sudoeste, foi passar nas cabeceiras do Tibagi, onde deixou o caminho para Santa Catarina, pelo qual subiu Cabeza de Vacca. A, tomando a esquerda, pendeu para as matas do Vale do Augui, passou pela aldeia dos Bilreiros e de Carisieba, onde, logo adiante, encontrou a encruzilhada do caminho que descia para Canania. Prosseguindo, porm, sempre esquer-da, deixou o Vale do Augui e foi sair nos Campos de Faxina, Capo Bonito e Itapetinin- ga, pelos quais seguiu at as proximidades de So Miguel Arcanjo, deixando outra encruzi- lhada que servia para ligar Canania regio de Piratininga. Desse ponto, pelos campos de Sarapiti e de Sorocaba, foi sair em Biesaie, mais tarde Manioba, ou Japiva, atualmente cidade de Itu, de onde pro-curou o rio Tiet, por cujas margens seguiu at as proximida- des do rio Jurubatuba. Descansou trs dias na aldeia desse nome, at que, finalmente, Che-gou a Santo Andr da Borda do Campo. O grande missionrio espanhol, padre Leonardo Nunes tambm fez a mesma traves- sia, quando pretendeu reunir em aldeias (redues) crianas indgenas, com finalidade de as educar e instruir. Igualmente, os irmos Pedro Corra e Joo de Souza, pacificadores dos ndios Carijs, do ocidente, e que foram beneficiados por sua abnegao apostlica, realizaram aquele trajeto. Ruy Diz Melgarejo, fundador e governa-dor de Vila Rica do Esprito Santo (hoje cidade paranaense de Fnix), que em companhia de Cipriano de Ges e Johann de Salazar de Espinosa, penetraram o serto de Gaura, aps haverem as autoridades de So Vicente lhes negado permisso para isso, motivo que os levaram a fazer a travessia por terra. Em decorrncia dessas penetraes e em virtude de disposies do Tratado de Tordesi- lhas, que dividia as terras descobertas no Novo Mundo entre portugueses e espanhis, estes ltimos 23 fundaram nas bacias do Para-napanema, Tibagi, iva, Pirap, Corumbata e Paran, a sua Provncia de Guair, que fica- va sob a administrao do Governo do Para- guai.

Surgiram assim, no corao do serto guairenho as primeiras povoaes destinadas a promover o aldeamento, a catequese e a civilizao dos indgenas, neste lado do Atlntico. Eram as cidades de Ontiveros, Vila Rica do Esprito Santo e Cidad Real Del Guair, fundadas em 1554. Mais tarde apareceram as redues fundadas pelos padres da Companhia de Jesus. Inicialmente foram 13 as redues de Guair. Eram esses aldea-mentos, segundo Montoya, os povos ndios que, vivendo sua antiga presena nos montes, foram reduzidos pelas diligncias dos padres a grandes povoacoes e vida poltica e humana. Numerosas dessas redues se localiza-vam nas margens dos rios Iva, Tibagi, Piquiri e Iguau, tambm chamadas de Repblica Jesutica do Paraguai, que foi totalmente des-truda pelos bandeirantes paulistas no sculo XVII. Foi a primeira tentativa de povoa-mento e civilizao do serto do Paran, tarefa que, aps 70 anos de atuao, malogrou definiti- vamente. As faanhas dos bandeirantes fizeram com que o Meridiano de Tordesilhas recuasse, passando a antiga Provncia de Guair a integrar o territrio brasileiro, aps a destruio das redues jesuticas. Ao mesmo tempo, os portugueses, a partir de 1531, tentaram dominar e colonizar as terras do Brasil, o que se deu aps a diviso em donatrias, ficando o territrio hoje formador do Estado do Paran, perten- cendo s duas donatrias mais meridionais, isto , aquelas concedidas a Martin Afonso de Souza e a Pero Lopes de Souza. Essas donatrias foram posterior-mente conhecidas como capitanias de So Vicente e Santo Amaro e, em 1624, simplesmente So Vicente, do que resultou a instituio da Capitania de So Paulo. As terras doadas por D. Joo III a Martin Afonso e Pero Lopes formaram a regio austral do Brasil portu- gus, divididos em dois quinhes a cada um dos favorecidos. De So Vicente partiam as bandeiras que estenderam os domnios portugueses ao Brasil, at o extremo sul, na antiga Provncia de So Pedro do Rio Grande do Sul. Mas a situao dos limites das colnias luso-castelhanas cada vez mais se agravava, de maneira que j em 1635 no mais era possvel a Espanha pretender restaurar a fronteira do Tratado de Tordesilhas, que, alis, nunca foi respeitada pelos bandeirantes de So Paulo. Celebrou-se ento o Tratado de Madrid, que modificou profundamente as linhas demarcatrias dos limites das terras das duas naes ibricas, no Novo Mundo, disso resultando a atual configurao geogr- fica do Brasil. A linha demarcatria da fronteira do Brasil com o Paraguai, pelos rios Paran e Iguau, somente veio a ser assinalada defini- tivamente em virtude do disposto no Tratado de Santo Ildefonso e por outro assinado em 1873. At 1617, o territrio de Guair que definitivamente, se estendia do Paranapane- ma ao Iguau e do Paran ao Tibagi, compre- endia toda a rea que hoje constitui a grande srie de cidades entre as quais se inclui a de Santo Incio. Foi nesse trajeto que os castelhanos fundaram os pueblos, reunindo s em Vila Rica do Esprito Santo, mais de 20 mil ndios guaranis. Em 1620, esses estabelecimentos dos jesutas, com exceo de Loreto e Santo Incio, ento situados fora da regio mais povoada, foram completamente destrudos pelos bandeirantes paulistas. Romrio Martins escreve que, em 1632, Vila Rica, nico reduto espanhol capaz de oferecer resistncia, estava cercado por Antnio Raposo Tavares, que punha em grave risco a situao de 4.500 brancos e ndios. Dirigia a resistncia espanhola o mes-tre-de-campo Francisco Benitez, lugar-tenen-te do governador e justia maior de Vila Rica, o mestre-de-campo Ruy Ortiz Melgarejo; capites Estevam Martim, Diogo de Vargas, alcaides ordinrios; Loureno Del Villar, alfe- res real, capito-de-guerra Francisco Fernan- des, e sargento-mor Agostinho Sanches e alguns moradores de maior importncia, como Lucas de Vilalva, Joo lvares Marti- nes, Francisco Vasques e Gonalo Portilho y Frias, 24 membros do cabildo vilariquenho. Esta mesma descrio feita por Afonso E. Tau- nay, em sua Histria das Bandeiras Paulis- tas.

O prprio bispo do Paraguai, D. Fray Cristobal de Aresti, vencendo as maiores dificuldades e perigos, visitou Vila Rica, onde, empunhando um crucifixo, animou a defesa do aldeamento, exortando os combatentes nos pontos mais visados pelos bandeirantes. Mas, em breve, o bispo viu ser intil a resistncia, propondo a retirada para alm do rio Paran. Por ocasio do ataque chefiado por Antnio Raposo Tavares e Manoel Preto, em 1629, os ndios aldeados eram mais de cem mil. Morreram 15 mil e 60 mil foram escravisados e vendidos em So Paulo e nas capitanias do norte. Terminaram assim, tragicamente, o sistema de catequese dos ndios e o domnio espanhol na regio. Os guaranis, escravizados ou emigrados, dos seus agrupamentos, e, vencidos os espanhis nos seus ltimos redutos, o territrio foi invadido pelos ndios Gs de alm-Paran. Passaram os anos, sculos, e o territrio voltou a ser objeto do maior interesse por brasileiros de toda parte.

AS TRS REGIES O processo de ocupao das terras do Paran, e conseqentemente de Santo Incio, tem razes fincadas nas epopias descritas. A cidade compe uma das trs zonas do Estado, o Noroeste, se conferindo quelas reas esta descrio: A regio chamada Norte/Noroeste do Paran pode ser definida como a soma territorial dos vales muito frteis formados pelos afluentes da margem esquerda dos rios Paran e Paranapanema, no arco que esses dois cursos dgua traam entre as cidades de Cambar e Guair. suave o relevo e muito regular a distribuio dos rios. As altitudes variam de 400 a 700 metros. Colinas mansas, vales no muito profundos, espiges abaulados e de fcil acesso. A orientao predominante dos afluentes do Paranapanema Sudeste-Noroeste, e todos eles integram a rede hidrogrfica caracterstica do planalto definido pela Serra do Mar, cujos rios se afastam do litoral no rumo da extensa depresso existente no centro do continente sul-americano: a Bacia Paran-Uruguai. Essa regio definida pelos rios Itarar, Paranapanema, Paran, Iva e Piquiri abrange uma superfcie de aproximadamente cem mil quilmetros quadrados, dividida em trs reas, segundo a poca e a origem da respectiva colonizao: o Norte Velho, que se estende do rio Itarar at a margem direita do rio Tibagi; o Norte Novo, que vai at as barrancas do rio Iva e tem como limite, a Oeste, a linha traada entre as cidades de Terra Rica e Terra Boa; e o Norte Novssimo, que se desdobra dessa linha at o curso do rio Paran, ultrapassa o rio Iva25abarca toda a margem direita do Piquiri. e

So regies de colonizao de certa for- ma, recente. Tanto que, no seu livro Pionei- ros e Fazendeiros de So Paulo, o gegrafo Pierre Monbeig escreve em 1953, referindo-se cobertura vegetal do territrio estudado: Para encontrar a floresta, cumpre avan- ar mais. Aps uma longa noite de viagem, que ela verdadeiramente se tornava um elemento da paisagem. Apresenta-se entre- meada de grandes plantaes ou de pequenas culturas de algodo, de arroz e de milho. Ao mesmo tempo, muda o aspecto da cidade: percebem-se casas de madeira, cidades de tbuas. E pouco a pouco vo surgindo as derrubadas, com as rvores que juncam do solo, elevando ainda alguns de seus troncos calcinados, acima dos novos cultivos. J voltando a um tempo mais ditante, o mesmo autor observa: Assim, em 1870, os planaltos e as florestas do oeste de So Paulo e norte do Paran constituam um vasto serto, regio mal conhecida, habitada sobretudo por ndios, na qual se perdiam alguns sertanistas audazes. O serto ocidental escapava comple- tamente economia da Provncia. No entanto, os fazendeiros no o ignoravam inteira-mente. Comeavam eles a ter contato com esses domnios um pouco misteriosos, que envolviam as narrativas legendrias dos bandeirantes. A respeito do desbravamento contempo-rneo, justamente aquele em que Santo In-cio aparece, Monbeig ressalta: As paisagens vegetais da franja pionei- ra traduzem no s as diferenas de solos, como as de clima. Antes das derrubadas florestais, o conjunto dos planaltos era o domnio da floresta tropical; o que restou da vegetao natural ainda suficiente para que possam ser distinguidos aspectos diferentes. Foi a floresta ou mata da terra roxa que mais atraiu o povoamento e a cafeicultura. Nela os pioneiros encontraram rvores teste- munhando um solo frtil, recobertas por cips e epfitas, algumas ultrapassando 30 metros de altura. O gegrafo fala da vegetao ento ocupante do territrio, destacando sua homo-geneidade e informa que sua densidade varia- va em funo do maior ou menor distancia- mento dos rios. Os derrubadores da mata sabiam que as mais belas rvores eram numerosas junto aos cursos dgua, onde formavam os capes no interior da vege- tao. Escreve textualmente: No norte do Paran essa floresta da terra roxa apresenta uma estratificao que foi posta em prtica por Rawitscher (Flix Rawitscher): um horizonte de rvores dominantes, com 30 metros ou mais, entre as quais a araucria, a figueira-branca (Fcus pohliana Mig.), o pau dalho com seu odor caracterstico (Gallesia goraze- ma Vl. Mig.), a timbava ou tamboril (Enterolobium ellipticum Bem-th); um segun- do andar que talvez no seja formado seno por rvores tambm capazes de atingir o porte das do horizonte superior, como canje-rana ou canjarana (Cabralea canjerana Sald.) cedro-branco (Cedrela fissilis Voll.); um andar das grandes samambaias ou samambaia-au e das palmeiras, entre as quais aparece a Enterpe edulis, cujo porte varia de 5 a 15 metros e, finalmente, um horizonte herb- ceo. Como se percebe, no ainda muito longnquo o tempo em que a floresta desta regio do Paran continuava rica em padres de terra boa, e conforme Monbeig, em palmi-tos, sendo visvel o predomnio das arauc- rias. Grupamentos de pinheiros apareciam, sendo de 850 metros de altura, no trecho de Apucarana a Arapongas. Outras vezes, s apareciam rvores isoladas em um ponto elevado. Outras vezes, tratava-se de verda-deiras colnias que ocupavam um vale estreito, escavado no basalto. O autor pergunta: Ser a presena da araucria explicvel somente por temperatu- ras mais baixas? E analisa: Preferimos ver no fato uma competio, com desigualdade de armas, entre os exemplares de uma flora mais meridional e a floresta tropical; as araucrias instalando-se, ao que parece, em solos arenticos superpostos ao diabsio. 26 Ao mesmo tempo em que a floresta ia sendo derrubada, o solo era ocupado com lavouras. Como foi explicado, no incio, o povoamento da regio esteve ligado a inte- resses de garantir o domnios das terras, ora para os espanhis, ora para os portugueses.

Em 1845, embora atravessado diversas vezes pelos bandeirantes, e os mineradores da serra de Apucarana, o prprio rio Itarar permanecia desconhecido. Em 1855, s margens do rio Tibagi, fundouse a Colnia Militar do Jata, servindo de posto avanado da ligao de Curitiba a Mato Grosso. Num trabalho a respeito, Lysia Bernar-des assinala que ataques dos ndios, aliados a outros fatores, como insalubridade do lugar, precariedade das estradas, grandes distncias dos mercados, tolheram o desenvolvimento da colnia. Mas, ainda assim, surgiram ou-tras duas, as de Pedro de Alcntara, no mes-mo ano, e So Jernimo da Serra, em 1859. Isoladas, as trs colnias permanece-ram brasileiras, assim como as terras ao seu redor. Os poucos habitantes limitaram-se subsistncia. E a floresta e nela os ndios Co- roados, Botucudos, Kaingangues e Caius, voltaram a ficar sem contato por algum tem- po. A despeito de tudo isso, desde os anos de 1860, senhores de vastas posses de terra vinham se instalando na regio do Norte Velho, vales dos rios Paranapanema, Cinzas e ribeiro Jata. O movimento continuou at 1900. Os fazendeiros chegavam a procura de solo frtil, de preferncia ainda tomado pela floresta nativa, que derrubariam. A partir de 1862 foram criados v-rios ncleos urbanos, casos da Colnia Mineira, atualmente Siqueira Campos; Venceslau Brs, Santo Antnio da Platina, So Joo da Boa Vista e Nova Alcntara, hoje Jacarezinho. Os responsveis pela fundao da maio-ria dos povoados, eram empresas de coloni- zao, muitas delas constitudas nos passos da Companhia de Terras Norte do Paran, criada em 1925, e que em 1951, teve seu nome substitudo por Companhia Melhora- mentos Norte do Paran. O gr