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1 Sequências de atividades Subsídios para o Professor de Língua Portuguesa 8ª série/9º ano do Ensino Fundamental São Paulo 2018

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Sequências de atividades

Subsídios para o Professor de Língua Portuguesa

8ª série/9º ano do Ensino Fundamental

São Paulo – 2018

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Sequência de Atividades Didáticas

Língua Portuguesa

9º ano EF

Elaboração: Rozeli Frasca Bueno Alves

Leitura crítica: Clarícia Akemi Eguti

Objetivo: oferecer condições para que os alunos desenvolvam ou aprimorem

habilidades de leitura, esperadas para essa fase da escolaridade.

Sequência de Atividades: Um conto, muitas histórias

AS CEREJAS Artur Azevedo

- Que fazes tu aí parado? Estás a comer com os olhos aquelas magníficas cerejas? - Estou simplesmente a namorá-las, ou antes, a resolver-me... Os cobres são tão curtos! - Gostas realmente de cerejas? - Eu? Nem por isso! Prefiro qualquer outra fruta do nosso país! Mas minha mulher dá o cavaquinho por elas, e não se me dava de lhe levar aquelas, que têm boa cara. - Pois compra-as, que diabo! Não são as cerejas que nos arruínam. - Tens razão. Esse ligeiro diálogo foi travado em frente ao mostrador de uma loja de frutas, na Avenida, entre o Antunes e o seu velho amigo Martiniano. O Antunes comprou as cerejas. O Martiniano despediu-se e foi tomar o bonde. Aquele dispunha-se a fazer o mesmo, e já estava num ponto de parada, esperando o elétrico de Vila Isabel, quando passou a Pintinha, um diabo de uma mulher que ele não podia ver sem sentir imediatamente o imperioso desejo de acompanhá-la, para reatar o fio de uma conversação agradável que se interrompia de meses a meses. Acompanhou-a. Ela, quando o viu, disse-lhe com toda a franqueza: - Que fortuna encontrar-te! Estava com muitas saudades tuas. Jantas hoje comigo. - Não admito desculpas, tanto mais que leio nos teus olhos que estás morto por isso. Vou esperar-te em casa. Meia hora depois, o Antunes subia as escadas da Pintinha. Esta, a primeira coisa que fez foi tirar-lhe das mãos o embrulho que ele trouxera da loja de frutas e desamarrá-lo. - Que é isso? Cerejas? Como és amável! Não te esqueceste da minha sobremesa predileta! O Antunes pensou consigo: - guardado está o bocado para quem o come - e pediu mentalmente perdão a dona Leopoldina, sua legítima esposa. Isto passava-se à tardinha, e era noite fechada quando as cerejas foram alegremente comidas.

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A hora em que o Antunes entrou no lar doméstico, já D. Leopoldina estava deitada, mas não dormia ainda. - Com efeito, Antunes! Já lhe tenho pedido um milhão de vezes que não jante fora sem me prevenir! Esperei-o até às 7 horas! - Perdoa, benzinho, fui desencaminhado por um amigo que me levou ao Pão de Açúcar. - Ao Pão de Açúcar? - Sim, o Pão de Açúcar é um restaurante da Exposição. Come-se ali muito bem, e o lugar é aprazível. - Demais, eu estava doida por que você chegasse; nunca o esperei com tanta impaciência! - Por quê? - Por causa das cerejas. - Que cerejas? - As tais que você comprou na Avenida para me trazer; você bem podia tê-las mandado pelo "rápido" com o aviso de que não vinha jantar. Onde estão elas? - As cerejas? - Sim, as cerejas! - Mas como soubeste que eu...? - Muito simplesmente. Saí para ir ao dentista, e quando voltava para casa encontrei no bonde aquele teu amigo Martiniano, que me disse: "A senhora vai ter hoje magníficas cerejas ao jantar; vi seu marido comprá-las na Avenida. Ele disse-me que a senhora dá o cavaquinho por elas." Onde as puseste? Na sala de jantar? Já o Antunes tinha arranjado a mentira: - Oh! diabo! E se não me falas não me lembrava! Deixei no bonde o embrulho das cerejas! - Eu logo vi!... D. Leopoldina voltou-se para o outro lado e não disse mais palavra.

No dia seguinte esteve amuada todo o dia, e só voltou às boas quando o Antunes, entrando em casa às horas de jantar, lhe entregou um embrulho de cerejas, dizendo: - Estavam na estação. Pobre D. Leopoldina! Se soubesse que a Pintinha...

Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/ DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=7444>. Acesso em: 10 de janeiro de 2018.

Objetivos: ler e compreender para refletir e fruir.

Expectativa: desenvolvimento ou aprimoramento da competência leitora, com as

seguintes habilidades:

Localizar informação explícita em um texto.

Inferir informações em um texto.

Estabelecer relações de causa e consequência entre partes e/ou

elementos de um texto.

Distinguir fato de opinião em um texto.

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Identificar os elementos da narrativa (personagem, espaço, enredo,

foco narrativo, tempo) em um texto.

Reconhecer o efeito de sentido produzido pela exploração de

recursos gráficos (pontuação e outras notações) em um texto.

Um conto: As cerejas, de Artur Azevedo.

Muitas histórias: Inferências, relações de intertextualidade e apreciações.

Nº de aulas: 5.

Aula 1

Ao se preparar para essa primeira aula, o professor deve ler o conto e todas

as atividades propostas, previamente. É recomendável, também, que leve para a

sala, o conto escrito em papel pardo, mas em partes destacadas: o título, nome do

autor e cada parte, em pedaços do papel, conforme indicado na sequência, para

facilitar o desenvolvimento do trabalho. Se for possível trabalhar com projeção, a

aula pode ficar mais dinâmica, com imagens da época, músicas etc.

Ao iniciar, a primeira coisa que o professor deve fazer é projetar, ou colocar

na lousa o pedaço do papel que contém o título do conto: As cerejas.

Os alunos ainda não estão com o texto em mãos. É o momento específico

para levantamento de hipóteses, a princípio, a partir do título. O professor diz aos

alunos que as atividades serão baseadas na leitura de um conto curto, com esse

título. Se possível, levar ou projetar uma foto ou gravura com cerejas1, para ilustrar.

Em diálogo com a turma, propor algumas questões que vão sendo respondidas

oralmente:

Dá para imaginar o que pode acontecer numa história que se chama

“as cerejas”? Alguém arrisca um palpite? De que modo essas

frutinhas vão fazer parte da trama, ou intriga?

1 Ver: <https://www.infoescola.com/frutas/cereja/>. Acesso em: 10 de janeiro de 2018.

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A seguir colocar o nome do autor e fazer algumas breves considerações

sobre sua biografia2, para situar os alunos em relação à linguagem e certas

expressões de época (século XIX) que vão encontrar no texto. Essa apresentação

do autor pode vir acompanhada de uma foto e dados sintetizados sobre a vida

desse contemporâneo de Aluísio Azevedo (seu irmão) e de Machado de Assis, a

partir do que segue:

Artur Azevedo (Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo), jornalista e teatrólogo, nasceu em São Luís, MA, em 7 de julho de 1855, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 22 de outubro de 1908. Figurou, ao lado do irmão Aluísio Azevedo, no grupo fundador da Academia Brasileira de Letras, onde criou a cadeira nº 29, que tem como patrono Martins Pena.

Foram seus pais David Gonçalves de Azevedo, vice-cônsul de Portugal em São Luís, e Emília Amália Pinto de Magalhães, corajosa mulher que, separada de um comerciante com quem casara a contragosto, já vivia maritalmente com o funcionário consular português à época do nascimento dos filhos: três meninos e duas meninas. Casaram-se posteriormente, após a morte na Corte, de febre amarela, do primeiro marido. Aos oito anos Artur já demonstrava pendor para o teatro, brincando com adaptações de textos de autores como Joaquim Manuel de Macedo, e pouco depois passou a escrever as peças que representava. Muito cedo, começou a trabalhar no comércio. Depois foi empregado na administração provincial, de onde foi demitido por ter publicado sátiras contra autoridades do governo. Ao mesmo tempo lançava as primeiras comédias nos teatros de São Luís. Aos quinze anos escreveu a peça Amor por anexins, que teve grande êxito, com mais de mil representações no século passado. Ao incompatibilizar-se com a administração provincial, concorreu a um concurso aberto, em São Luís, para o preenchimento de vagas de amanuense da Fazenda. Obtida a classificação, transferiu-se para o Rio de Janeiro, no ano de 1873 e obteve emprego no Ministério da Agricultura.

A princípio, dedicou-se também ao magistério, ensinando Português no Colégio Pinheiro. Mas foi no jornalismo que ele pôde desenvolver atividades que o projetaram como um dos maiores contistas e teatrólogos brasileiros. Fundou publicações literárias, como A Gazetinha, Vida Moderna e O Álbum. Colaborou em A Estação, ao lado de Machado de Assis, e no jornal Novidades, onde seus companheiros eram Alcindo Guanabara, Moreira Sampaio, Olavo Bilac e Coelho Neto. Foi um dos grandes defensores da abolição da escravatura, em seus ardorosos artigos de jornal, em cenas de revistas dramáticas e em peças dramáticas, como O Liberato e A família Salazar, esta escrita em colaboração com Urbano Duarte, proibida pela censura imperial e publicada mais tarde em volume, com o título de O escravocrata. Escreveu mais de quatro mil artigos sobre eventos artísticos, principalmente sobre teatro, nas seções que manteve, sucessivamente, em O País (“A Palestra”), no Diário de Notícias (“De Palanque”), em A Notícia (o folhetim “O Teatro”). Multiplicava-se em pseudônimos: Elói o herói, Gavroche, Petrônio, Cosimo, Juvenal, Dorante, Frivolino, Batista o trocista e outros. A partir de 1879 dirigiu, com Lopes Cardoso, a Revista do Teatro. Por cerca de três décadas sustentou a campanha vitoriosa para a construção do Teatro Municipal, a cuja inauguração não pôde assistir.

Embora escrevendo contos desde 1871, só em 1889 animou-se a reunir alguns deles no volume Contos possíveis, dedicado a Machado de Assis, seu companheiro na Secretaria da

2 Ver: <http://www.academia.org.br/academicos/artur-azevedo/biografia>. Acesso em: 10 de janeiro de 2018.

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Viação e um de seus mais severos críticos. Em 1894, publicou o segundo livro de histórias curtas, Contos fora de moda, e mais dois volumes, Contos cariocas e Vida alheia, constituídos de histórias escritas por Artur Azevedo para os vários jornais em que colaborara.

No conto e no teatro, Artur Azevedo foi um descobridor do cotidiano da vida carioca e observador dos hábitos da capital. Os namoros, as infidelidades conjugais, as relações de família ou de amizade, as cerimônias festivas ou fúnebres, tudo o que se passava nas ruas ou nas casas forneceu assunto para as histórias. No teatro foi o continuador de Martins Pena e de França Júnior. Nelas teremos sempre um documentário sobre a evolução da então capital brasileira. Teve, em vida, cerca de uma centena de peças de vários gêneros e mais trinta traduções e adaptações livres de peças francesas encenadas em palcos nacionais e portugueses. Ainda hoje continua vivo como a mais permanente e expressiva vocação teatral brasileira de todos os tempos, através de peças como A joia, A Capital Federal, A almanjarra, O Mambembe, e outras.

Outra atividade a que se dedicou foi a poesia. Foi um dos representantes do Parnasianismo, e isso meramente por uma questão de cronologia, porque pertenceu à geração de Alberto de Oliveira, Raimundo Correia e Olavo Bilac, todos sofrendo a influência de poetas franceses como Leconte de Lisle, Banville, Coppée, Heredia. Mas Artur Azevedo, pelo temperamento alegre e expansivo, não tinha nada que o filiasse àquela escola. É um poeta lírico, sentimental e mesmo cômico, e seus sonetos estão perfeitamente dentro da tradição amorosa dos sonetos brasileiros.

Esclarecido o contexto de produção do conto, o professor pode levar à lousa

uma parte do conto, conforme sugestão a seguir, ou se tiver acesso à projeção,

projetá-la para que a classe leia.

AS CEREJAS Artur Azevedo

- Que fazes tu aí parado? Estás a comer com os olhos aquelas magníficas cerejas? - Estou simplesmente a namorá-las, ou antes, a resolver-me... Os cobres são tão curtos! - Gostas realmente de cerejas? - Eu? Nem por isso! Prefiro qualquer outra fruta do nosso país! Mas minha mulher dá o cavaquinho por elas, e não se me dava de lhe levar aquelas, que têm boa cara. - Pois compra-as, que diabo! Não são as cerejas que nos arruínam. - Tens razão. Esse ligeiro diálogo foi travado em frente ao mostrador de uma loja de frutas, na Avenida, entre o Antunes e o seu velho amigo Martiniano. O Antunes comprou as cerejas. O Martiniano despediu-se e foi tomar o bonde.

A leitura expressiva e em voz alta pelo professor é uma forma interessante

de levar os alunos ao início da história, que já começa com um diálogo.

Nesse trecho, é possível perceber a maneira de falar diferente da forma

como se fala atualmente, pois o texto foi escrito na segunda metade do século XIX.

Há expressões que não se usa mais como: “os cobres estão tão curtos”; “minha

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mulher dá o cavaquinho por elas”; “foi tomar o bonde”. É hora, portanto, de

exercitar o que chamamos de inferência lexical, ou seja, pedir aos alunos que

deduzam os significados dessas expressões. Isso é de grande valia a eles para

perceber que o contexto é sempre fundamental no esclarecimento do vocabulário.

Com a finalidade de os alunos começarem a construir os sentidos do texto,

mais algumas perguntas:

Quem está conversando?

Nesses parágrafos iniciais já sabemos da existência de Martiniano e

Antunes. Quem são eles?

Quem gosta muito de cerejas?

Por que Antunes demora para decidir se compra ou não?

Nesse trecho, o leitor já sabe que Antunes é casado, mas já conhece

a mulher dele? O que se sabe dela?

As questões devem ser respondidas pelos alunos, sempre apontando os

trechos do texto nos quais encontraram as respostas ou explicando como

chegaram a elas. Antes do final da aula, o professor pede-lhes que copiem o trecho

do conto já estudado e que o tragam na próxima aula.

Aula 2

Logo de início, o professor já coloca o primeiro trecho e mais um pedaço do

conto na lousa, ou trata de projetá-lo para a turma.

Aquele dispunha-se a fazer o mesmo, e já estava num ponto de parada, esperando o elétrico de Vila Isabel, quando passou a Pintinha, um diabo de uma mulher que ele não podia ver sem sentir imediatamente o imperioso desejo de acompanhá-la, para reatar o fio de uma conversação agradável que se interrompia de meses a meses. Acompanhou-a. Ela, quando o viu, disse-lhe com toda a franqueza: - Que fortuna encontrar-te! Estava com muitas saudades tuas. Jantas hoje comigo. - Não admito desculpas, tanto mais que leio nos teus olhos que estás morto por isso. Vou esperar-te em casa. Meia hora depois, o Antunes subia as escadas da Pintinha. Esta, a primeira coisa que fez foi tirar-lhe das mãos o embrulho que ele trouxera da loja de frutas e desamarrá-lo. - Que é isso? Cerejas? Como és amável! Não te esqueceste da minha sobremesa predileta! O Antunes pensou consigo: - guardado está o bocado para quem o come - e pediu mentalmente perdão a dona Leopoldina, sua legítima esposa.

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Isto passava-se à tardinha, e era noite fechada quando as cerejas foram alegremente comidas.

O professor faz a leitura expressiva, em voz alta, desde o início do conto.

Mais uma vez, retoma o texto para explicar que o conto foi escrito no século XIX,

por isso a maneira de falar é diferente da usada em nossos dias, portanto, há

expressões que se referem ao contexto sociocultural da época.

Se estiver ao alcance do professor, levar imagens que ilustrem a época, as

vestimentas, as ruas, o transporte, tudo isso ajuda a situar os alunos no tempo em

que ocorrem os fatos narrados. Conversar sobre os costumes, os papeis da

mulher, do homem, enfim, sobre a cidade de Rio de Janeiro nos anos de 1800 e

provocar reflexões sobre as mudanças ocorridas de lá para cá. Isso permite a

ampliação do repertório sobre a história do nosso povo e, sem dúvida, ajuda a

compreender o conto.

Voltando ao texto do conto, o leitor observa que algo acontece e tira Antunes

de seu caminho para casa. Mais questões a fim de ajudar a localizar unidades de

sentido:

O que houve? Quem provocou a mudança? Uma personagem

feminina entra no enredo e qual foi a consequência? Por que ele a

acompanhou? E as cerejas que eram para D. Leopoldina, sua

esposa, o que houve com elas?

Nesse trecho do conto há, em alguns momentos, relações de causa e

consequência entre os fatos narrados. Com algumas questões específicas

propostas acima, o professor oferece à turma oportunidade de desenvolver ou

aprimorar a habilidade de “estabelecer relações entre causa e consequência”.

Até aqui, temos o enredo em pleno desenvolvimento e três personagens já

entraram em ação. Antunes, Martiniano e Pintinha. O leitor já está apto a

reconhecer características desses elementos que compõem a narrativa e dão

pistas do desenrolar dos fatos para o auge da complicação que pode vir a

acontecer. O que os alunos já podem prever sobre o que poderá acontecer no

decorrer do conto? O levantamento dessas hipóteses pode ser feito oralmente.

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Em seguida, o professor pode pedir aos alunos que copiem o trecho do conto em

seus cadernos, para trazer na próxima aula. Se houver tempo, pedir à turma que

leia em voz alta todo o trecho do conto já conhecido até o momento. É relevante,

também, que o professor oriente a leitura dramatizada e expressiva, reforçando a

modulação da voz e a entonação, conforme necessário.

Aula 3

Agora, é chegada a hora de conhecer como a história prossegue. Na lousa,

o trecho conhecido e mais a continuação. De início, nova leitura do professor,

expressiva e em voz alta.

A hora em que o Antunes entrou no lar doméstico, já D. Leopoldina estava deitada, mas não dormia ainda. - Com efeito, Antunes! Já lhe tenho pedido um milhão de vezes que não jante fora sem me prevenir! Esperei-o até às 7 horas! - Perdoa, benzinho, fui desencaminhado por um amigo que me levou ao Pão de Açúcar. - Ao Pão de Açúcar? - Sim, o Pão de Açúcar é um restaurante da Exposição. Come-se ali muito bem, e o lugar é aprazível. -Demais, eu estava doida por que você chegasse; nunca o esperei com tanta impaciência! - Por quê? - Por causa das cerejas. - Que cerejas? - As tais que você comprou na Avenida para me trazer; você bem podia tê-las mandado pelo "rápido" com o aviso de que não vinha jantar. Onde estão elas? - As cerejas? - Sim, as cerejas!

Nesse trecho, o leitor conhece mais uma personagem feminina: D.

Leopoldina, a esposa de Antunes. Algumas questões podem ajudar a compreender

a situação, nesse ponto do enredo:

O que os alunos têm a dizer sobre a mulher de Antunes?

Qual foi a desculpa de Antunes por ter chegado tarde?

Por que razão a mulher esperou o marido tão ansiosamente?

O que houve com as tais cerejas?

Ele vai contar tudo o que aconteceu para D. Leopoldina? Por quê?

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Ao responderem essas questões, os alunos além de localizarem algumas

respostas, no próprio texto, também estão sendo estimulados a desvendarem

características específicas do comportamento de Antunes. Esse personagem vai

ser o mote da próxima atividade.

O professor pede aos alunos que, em trios, imaginem e escrevam o que

Antunes respondeu para a mulher sobre o destino das cerejas. É importante

lembrá-los que vão acrescentar, ao trecho lido, a fala de Antunes, respondendo à

pergunta de D. Leopoldina: “Onde estão elas?”

É o momento ideal para recordar o uso de travessão para introduzir

diretamente a fala do personagem, durante a narrativa. Dessa forma, os alunos

estarão desenvolvendo ou aprimorando mais uma habilidade fundamental:

“reconhecer o efeito de sentido produzido pela exploração de recursos gráficos

(pontuação e outras notações) em um texto”. Vale fazê-los observar que vão utilizar

o discurso direto, trazendo a fala de Antunes e por isso devem iniciar o parágrafo

com travessão. Precisam imaginar que estão no lugar do personagem, com suas

características, para redigirem a desculpa que inventou desta vez. É hora de

exercitar a criatividade, mas com base no contexto.

Cronometrar cinco minutos para esse exercício é recomendável. A seguir,

pedir que leiam as respostas que escreveram para D. Leopoldina. Será que alguém

vai dizer exatamente o que Artur Azevedo criou para o desenvolvimento da trama?

O professor pode pedir que três alunos venham ao quadro e escrevam suas

respostas, conferindo suas adequações.

Antes do final da aula, os alunos devem copiar o trecho conhecido nessa

aula e assim o conto já estará quase completo em seus cadernos.

Aula 4

Nesse momento, a turma vai conhecer (aqueles que não tiveram a

curiosidade de pesquisar) o final do conto. Mas, antes o professor disponibiliza todo

o trecho do conto já estudado, faz uma leitura expressiva e pede que, em trios, os

alunos escrevam, em um parágrafo, como imaginam o final dessa história. Para

essa tarefa destinar dez minutos.

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A seguir, com os trechos já conhecidos na lousa, o professor lê em voz alta

mais uma vez e pede que alguns trios leiam seus finais para a história. Faz

comentários e pede comentários dos alunos.

Chegou a hora de mostrar a última parte de “As cerejas”. Agora, o professor

afixa na lousa, ou projeta o conto inteiro, incluindo a fonte. Pode, também, dizer

que em “domínio público” está a obra completa de Artur Azevedo. Aliás, nesse

momento, vale explicar o que é esse portal e quando a obra de um autor ser

transforma em domínio público.

- Mas como soubeste que eu...? - Muito simplesmente. Saí para ir ao dentista, e quando voltava para casa encontrei no bonde aquele teu amigo Martiniano, que me disse: "A senhora vai ter hoje magníficas cerejas ao jantar; vi seu marido comprá-las na Avenida. Ele disse-me que a senhora dá o cavaquinho por elas." Onde as puseste? Na sala de jantar? Já o Antunes tinha arranjado a mentira: - Oh! diabo! E se não me falas não me lembrava! Deixei no bonde o embrulho das cerejas! - Eu logo vi!... D. Leopoldina voltou-se para o outro lado e não disse mais palavra.

No dia seguinte esteve amuada todo o dia, e só voltou às boas quando o Antunes, entrando em casa às horas de jantar, lhe entregou um embrulho de cerejas, dizendo: - Estavam na estação. Pobre D. Leopoldina! Se soubesse que a Pintinha...

Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=7444>. Acesso em: 10 de janeiro de 2018.

O professor lê a última parte do conto, expressivamente e, em seguida, faz

comentários sobre as hipóteses de desfecho construídas pelos alunos.

Depois, retoma o vocabulário já visto antes. Nesse trecho final, aparecem

duas expressões que já foram vistas no início do conto. O professor pode perguntar

aos alunos que expressões são essas e o que significam nesse contexto.

Mais algumas questões para que o leitor demonstre o que compreendeu do

trecho:

Como a esposa soube que Antunes havia comprado as cerejas? De

que maneira D. Leopoldina traz essa informação ao marido?

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O professor deve pedir aos alunos observarem, nesse parágrafo, que a fala

de Martiniano está reproduzida aí, em discurso direto, dessa vez com o uso de dois

pontos (:) e entre aspas (“...”), pois D. Leopoldina usa exatamente as palavras de

Martiniano, para contar o fato ao marido. Mais uma vez, trata-se de observar o

efeito de sentido produzido pelo uso de pontuação adequada para o registro escrito

do discurso direto.

Há, ainda nesse parágrafo, o uso dos pontos de interrogação (?) e de

exclamação (!). Convém chamar a atenção da turma para os efeitos de sentido,

nesses casos, também.

Em outros dois momentos, o autor emprega reticências (...), é interessante

perguntar aos alunos, que efeito de sentido percebem com o uso dessa

pontuação? “Eu logo vi!... / Pobre D. Leopoldina! Se soubesse que a Pintinha...”

O que Pintinha fez? Será que o problema com a Pintinha foi apenas

ter comido as cerejas?

A essa altura, o professor pode comentar com os alunos, se alguém acertou

qual foi a desculpa de Antunes sobre o paradeiro das cerejas.

Em seguida, pode solicitar à classe que explique o que o autor quis dizer

com: “Pobre D. Leopoldina! Se soubesse que a Pintinha...”. Cada trio vai refletir

sobre isso em cinco minutos e, em seguida, o professor chama alguns alunos para

verificar se entenderam o que está subtendido no texto, o efeito produzido pelo uso

das reticências.

Antes do término da aula, os alunos devem copiar o final do conto em seus

cadernos. O professor deve avisá-los de que na próxima aula farão a leitura em voz

alta de todo o conto. Os alunos assumirão os papeis dos personagens e do

narrador.

Aula 5

No início da aula, o professor deve destacar o papel do narrador-observador

nesse conto, com o foco narrativo em terceira pessoa. Sobre os elementos da

narrativa, convém destacar, ainda, um momento para analisar o tempo e o espaço,

com algumas questões: Quanto tempo dura a história? Em que época se passa?

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Em relação ao espaço em que os fatos ocorrem, é conveniente retomar trechos em

que há informações explícitas sobre isso, para que os alunos possam observar os

diferentes cenários em que se passam as ações.

Nessa aula, dedicada em sua maior parte à leitura dramatizada, os alunos

deverão ser incentivados a gravarem o conto, para uma apresentação de

radioteatro. O professor deve enfatizar a produção de uma leitura com entonação

adequada em todos os momentos de diálogo, a fim de que os ouvintes possam

acompanhar toda a ação, imaginando a atuação de cada personagem. Se

quiserem, podem colocar trilha sonora, o que tornará o radioteatro mais

interessante; aliás a sonoplastia pode marcar os ambientes, o clima, a passagem

do tempo etc.

Desenvolver o projeto radioteatro3 e depois publicá-lo no YouTube, para

mostrar a outras turmas e à comunidade, pode ser um desdobramento

interessante, mobilizando outras linguagens. Assim, pessoas com deficiência visual

também poderão apreciar o conto “As cerejas”.

Conclusão

Com as atividades propostas nesta sequência, buscou-se mobilizar as

seguintes capacidades de leitura4:

Ativação de conhecimentos de mundo; antecipação ou predição;

checagem de hipóteses.

Localização de informações; comparação de informações;

generalizações.

Produção de inferências locais; produção de inferências globais.

Recuperação do contexto de produção; definição de finalidades e

metas da atividade da leitura.

3 Para desenvolver a radionovela e o radioteatro com os alunos, o professor pode assistir às videoconferências,

sobre o tema, produzidas pela equipe de Língua Portuguesa da SEE pelo site da Rede do Saber:

http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/Default.aspx?tabid=179 , também no canal do YouTube, indicando:

Mediação e Linguagem no link: https://www.youtube.com/channel/UCAMXzvjLOadc8x4HHj-DIdw

4 Ver: ROJO, Roxane. Letramento e capacidades de leitura. Disponível em:

<http://www.academia.edu/1387699/Letramento_e_capacidades_de_leitura_para_a_cidadania> Acesso em: 26 de dezembro de 2017.

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Percepção das relações de intertextualidade; percepção das relações

de interdiscursividade.

Percepção de outras linguagens; elaboração de apreciações estéticas

e/ou afetivas; elaboração de apreciações relativas a valores éticos

e/ou políticos.

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Referências Bibliográficas

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. ver. ampl. e atual.

Conforme o Novo Acordo Ortográfico. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

Também disponível em: <https://www.scribd.com/document/358518189/evanildo-

bechara-gramatica-pdf>. Acesso em: 09 de janeiro de 2018.

GANCHO, Cândida Vilares. Elementos da narrativa. Disponível em:

<https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/9582/9582_6.PDF>. Acesso em: 09 de janeiro

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No canal do YouTube:

<https://www.youtube.com/channel/UCAMXzvjLOadc8x4HHj-DIdw>.