seca e desperdício - senac · quando eu conto a minha vida ninguém quer acreditar. trabalho não...

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Ano 22 • N° 6 julho/dezembro 2014 ISSN 2238-6807 Antártica: expedição estuda aves ameaçadas Mobilidade: metrópoles buscam solução para o trânsito Seca e desperdício comprometem Plano Nacional de Segurança Hídrica Senac Ambiental Ano 22 N. 6 • 2014

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Ano 22 • N° 6

julho/dezembro 2014 ISSN 2238-6807

Antártica: expedição estuda aves ameaçadas

Mobilidade: metrópoles buscam solução para o trânsito

Seca e desperdíciocomprometem Plano Nacional

de Segurança Hídrica

Senac Ambiental

Ano 22 N. 6 • 2014

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Senac – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

Departamento NacionalAv. Ayrton Senna, 5.555, Barra da TijucaRio de Janeiro - RJ - Brasil - 22775-004

www.senac.br

Conselho NacionalAntonio Oliveira Santos

Presidente

Departamento NacionalSidney Cunha

Diretor-geral

A revista Senac Ambiental é uma publicação semestral produzida pelo Gerência de Marketing e Comunicação do Senac Nacional. Os artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores. Sua reprodução em

qualquer outro veículo de comunicação só deve ser feita após consulta aos editores.

Contato: [email protected]

ExpEdiEntE

EditorFausto Rêgo

Colaboraram nesta ediçãoAna Cristina Bittencourt, Cecília Marigo,

Elias Fajardo, Francisco Luiz Noel, Katia Costa, Mário Moreira, Valéria Fernandes e Vitor Marigo

EditoraçãoGerência de Marketing e Comunicação

Projeto gráfico e diagramaçãoCynthia Carvalho

Produção gráficaSandra Amaral

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Senac ambiental / Senac, Departamento Nacional. – n. 1 (1992)- . – Rio de Janeiro : Senac/Departamento Nacional/Gerência de Marketing e Comunicação, 1992- . v. : il. color ; 26 cm.

Semestral. Absorveu: Senac e educação ambiental. ISSN 2238-6807.

1. Educação ambiental – Periódicos. 2. Ecologia – Periódicos. 3. Meio ambiente – Periódicos. I. Senac. Departamento Nacional.

CDD 574.505

Ficha elaborada pela Gerência de Documentação Técnica do Senac/DN.

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Colapsos

Editorial

Continua atual a velha marchinha que pedia para

chover três dias sem parar. A crise hídrica já afeta cidades

como São Paulo e Rio de Janeiro, que convivem com a escassez de chuvas. Por isso resolvemos discutir o Plano

Nacional de Segurança Hídrica, lançado em agosto justamente com o propósito de reduzir o risco de desabastecimento.

Outro tipo de ameaça foi o que levou um grupo de

pesquisadores ao continente antártico. Nossa reportagem mostra como foi o dia a dia

da expedição que investigou a influência de agentes poluentes

sobre as aves marinhas da região.

Tratamos também de um colapso iminente: o do trânsito

das nossas metrópoles. Conversamos com o urbanista

dinamarquês Jan Gehl, que busca soluções para humanizar

a vida nas grandes cidades.

Confira! Tem isto e muito mais nas próximas páginas.

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Sumário

14Mobilidade

Devagar, quase parandoTrânsito é cada vez pior

nas grandes cidades, que buscam soluções para

evitar o caos

6Capa

Fazendo águaPlano Nacional de Segurança

Hídrica enfrenta desafios: seca, falta de saneamento e mau

uso da água

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20Pesquisa

Ave, Antártica!Expedição enfrenta

rigor do clima para estudar espécies antárticas ameaçadas

38Desenvolvimento Local

Vida MantiqueiraComunidades que ainda

conservam tradições, tranquilidade e bem-estar

52Preservação

Minha terra tem palmeirasCrescem iniciativas de

conservação da juçara, espécie tipica da Mata Atlântica

60Ecoturismo

Grande e lindaVegetação exuberante, trilhas,

praias e cachoeiras atraem ecoturistas à Ilha Grande, no litoral

sul do Rio de Janeiro

48Perfil

Plantador de sementesDo Jardim Gramacho ao cinema: Tião Santos luta por uma nova

consciência ambiental

46Notas

66Estante Ambiental

Sumário

30Legislação

Cadastro AmbientalInstrumento é fundamental

para a regularização das áreas de agropecuária

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Capa

Plano Nacional de Segurança Hídrica busca reduzir o risco de falta d’água, mas país já enfrenta seca incomum em

alguns municípios

Ana Bittencourt“Tomara que chova três dias sem parar.

A minha grande mágoa é lá em casa não ter água

e eu preciso me lavar.

De promessa eu ando cheio, quando eu conto a minha vida

ninguém quer acreditar.

Trabalho não me cansa,o que cansa é pensar

que lá em casa não tem águanem pra cozinhar”

Esta marchinha de Carnaval, eter-nizada na voz de Emilinha Borba em 1950, continua incomodamente apropriada para a realidade brasi-leira depois de quase sete déca-das. O retrato da seca nordestina, e todo seu histórico de sofrimento e privações de um povo, em vez de ganhar uma solução, ironicamente, parece estar se expandindo para outras regiões do país. O estado de São Paulo é um exemplo emblemá-tico dessa situação. Ao lado disso, o Brasil desponta como nação rica em recursos hídricos e exemplo de inovação e pioneirismo por seus instrumentos legais para garantir o acesso à água. O que falta para essa engrenagem funcionar a contento?

Fazendo água

Farto em recursos hídricos, Brasil

vive crise de abastecimento sem

precedentes

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São Paulo apresenta indicadores geográficos e socioeconômicos in-vejáveis: abriga a população mais numerosa do Brasil, com cerca de 41 milhões de habitantes distribuídos em 645 municípios, espalhados por uma área de quase 250 mil quilôme-tros quadrados (maior que o Reino Unido, equivalente ao Equador).

É também uma das três unidades administrativas mais populosas da América do Sul; detém o maior nú-mero de imigrantes (cerca de 3 mi-lhões de pessoas de 70 diferentes nacionalidades); é a terceira melhor em Índice de Desenvolvimento Hu-mano (IDH), atrás de Santa Catarina e Distrito Federal; ostenta o status de “motor econômico do Brasil”, pelo maior parque industrial, e a melhor produção econômica, sen-

do responsável por mais de 30% do Produto Interno Bruto nacional.

E, a partir de 2014, passou a figurar, ao lado dos estados do Nordeste, como região marcada pela seca. Chão rachado, crise no abasteci-mento, represas vazias e plantações perdidas pelo ressecamento, cená-rio desolador e inaceitável que se torna ainda mais absurdo em um estado considerado a estrela da Fe-deração*.

A Rota da Seca foi registrada por jor-nalistas da Rede Globo em série de reportagens divulgada em novem-bro, que teve o mérito de mostrar que, se o problema está sendo alar-deado com gritas na capital, agrava-se muito, e sem a devida divulgação, quanto mais se chega ao interior.

* Em janeiro de 2015, o Governo do Estado de São Paulo começou a multar os usuários com aumento de consumo de água nas cidades atendidas pela Companhia de Saneamento Básico do Estado (Sabesp). Aumentos em até 20% acima da média têm impacto de 20% na conta; acima disso, o acréscimo é de 50%. A meta é obter uma redução de consumo de 2,5 metros cúbicos de água por segundo. (Fonte: Agência Brasil, 23/12/2014

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Conceito de segurança hídrica envolve a garantia de acesso a água de qualidade em volume suficiente para assegurar bem-estar

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Lá, aonde os holofotes da mídia geralmente não chegam, foram re-tratados municípios castigados em setores os mais diversos, em um efeito-cascata devastador.

Para citar alguns exemplos, em São Joaquim da Barra, correr para acu-mular água já faz parte do cotidiano dos moradores, que ficam até três dias seguidos sem uma gota nas torneiras, e o corte de abasteci-mento ocorre sem aviso. No distrito de Cachoeira de Emas, em Pirassu-nunga, agora se caminha nas mar-gens do rio Mogi Guaçu, onde antes se exercitava a pesca. Em Cristais Paulistas, alunos da rede municipal ficaram dez dias sem aula naquele mês por causa da seca. Em Bebe-douro, que enfrenta nove horas diárias de corte no abastecimento, a rádio local fez um concurso entre os ouvintes cujo prêmio foram ga-lões de água (saiba mais em bit.ly/rotadaseca).

Abundância de recursos e proteção

legal O Brasil detém quase 15% de toda a água doce do planeta, conta com as bacias dos rios São Francisco e Paraná e ainda cerca de 60% da Ba-cia Amazônica. Mas como esse ele-mento vital não é inesgotável, têm sido desenvolvidos e implementa-dos ao longo das últimas décadas instrumentos reguladores que, por sua inovação, vêm servindo de exemplo para outros países.

Essa boa imagem tem rendido triun-fos internacionais. Recentemente, um brasileiro, o professor Léo Hel-ler, da Universidade Federal de Mi-nas Gerais, foi escolhido – dentre 20 candidatos de outras nações – relator especial sobre Direito à Água Potável e ao Saneamento da Orga-nização das Nações Unidas. Sua missão é avaliar mundo afora como

Paulo Canedo, coordenador do Laboratório de Hidrologia da

Universidade Federal do Rio de Janeiro

os governos estão atuan-do na garantia do acesso à água e ao saneamento de suas populações. Mas e quanto ao dever de casa?

Por ser indispensável à vida e ao meio ambiente, a água é protegida juridi-camente. O direito à água está expresso na Consti-tuição Federal, no Código Civil brasileiro. Em 1997, o Brasil foi pioneiro na Amé-rica Latina e no Caribe ao sancionar a Lei de Ges-tão dos Recursos Hídricos (Lei nº 9.433/1997), considerada uma das mais completas do mundo.

“Nosso problema não está na falta d´água, mas na possibilidade finita de água limpa e economicamente viável, já que os proces-sos para retirar o sal da água são muito caros”, explica o professor Paulo Canedo, coordenador do Laboratório de Hidrologia do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-gradua-ção e Pesquisa de Enge-nharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) e um dos relatores da chamada Lei das Águas. Ele enfatiza que o país pode ser con-siderado privilegiado não apenas pela abundância, mas pela qualidade da água de que dispõe.

Como resultado dessa legislação, o Governo Federal desenvolveu, em um processo colaborativo com a sociedade civil organizada, o Pla-no Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hí-dricos (Singreh). E criou a Agência Nacional de Águas (ANA), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, para executar esses me-gaprojetos a partir do ano 2000.

Gisela Forattini, responsável pela área de Planejamento de Recursos Hídricos

da Agência Nacional de Águas

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Em agosto deste ano, a ANA lan-çou o Plano Nacional de Segurança Hídrica (PNSH), visando reduzir ris-cos associados a situações críticas como a que está vivenciando agora a Região Sudeste.

Segurança hídrica em pauta

Segundo informações da ANA, o conceito de segurança hídrica é abrangente. Envolve assegurar o acesso sustentável à água de qua-lidade em quantidades adequadas para a manutenção dos meios de vida, do bem-estar humano e do desenvolvimento socioeconômico, a garantia de proteção contra polui-ção hídrica e desastres à água e a preservação dos ecossistemas.

“O conceito de segurança hídrica está no topo das agendas interna-cionais quando se trata de geren-ciamento integrado de recursos hídricos. O Brasil vem vivenciando esta agenda diariamente e o PNSH traz a tradução da segurança hídri-ca para a realidade brasileira, com a discussão do que é estratégico para o país, exigindo de todos nós uma abordagem moderna”, esclarece a diretora da ANA, Gisela Forattini, responsável pela área de Planeja-mento de Recursos Hídricos e Ges-tão da Informação.

O PNSH tem foco em áreas críticas definidas, mas seu caráter é nacional

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Abastecimento e saneamento são os maiores desafios

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Ranking do SaneamentoEstudo realizado pelo Instituto Trata Brasil, divulgado em agosto de 2014, aponta que a média de perda de água nas 100 maiores cidades brasileiras foi superior à média brasileira – 39,43% e 36,9%, respectivamente.

Segundo as análises do Instituto, essas perdas são provenientes, principalmente, de vazamentos, roubos, ligações clandestinas, erros de medição ou falta dela, entre outras irregularidades.

O Ranking do Saneamento 2014 apresenta diagnósticos dos princi-pais indicadores de saneamento básico (abastecimento de água; co-leta e tratamento de esgotos; perdas; investimentos/arrecadação). A base de dados consultada foi extraída do Sistema Nacional de Infor-mações sobre Saneamento (SNIS/2012), do Ministério das Cidades.

Nesta edição, o Ranking traz como novidade o desenvolvimento dos serviços de água e esgoto dos 20 melhores e dez piores municípios, onde é possível detectar quais cidades alcançaram a meta de univer-salização do saneamento básico para 20 anos.

O Instituto Trata Brasil é uma organização sem fins lucrativos que atua, desde 2007, por meio da informação, buscando preparar o cida-dão para reivindicar a universalização do saneamento básico.

Mais informações em bit.ly/rankingsaneamento (documento em formato pdf).

por extrapolar os limites estaduais e focar nas bacias hidrográficas. “É na escala da bacia que a regulari-zação de vazões faz-se importante para o enfrentamento de secas e inundações. Em um primeiro mo-mento, as áreas a serem objeto de análise são o Nordeste setentrio-nal, o leste da Bahia, o norte de Minas Gerais, além de São Paulo e Rio de Janeiro”, explica ela, que há mais de 30 anos atua na área e já representou o Brasil na Asso-ciação Sul-Americana pela Água (GWP, na sigla em inglês).

O Plano, que vem sendo elabora-do desde 2012, será executado em etapas de médio e longo prazo. Segundo informações da Agência Brasil, daqui a dois anos deve-rão ser divulgados os resultados parciais do estudo que, até 2020, pretende identificar os principais problemas de oferta de água e de controle de cheias em áreas vul-neráveis, cujas obras e ações pro-postas – tais como intervenções em barragens, sistemas adutores, canais e eixos de integração – de-verão ser executadas até 2035.

“Não sem razão, as áreas críticas aqui são coincidentes onde se concentra a maior parte da po-pulação urbana brasileira e onde vivenciamos secas e cheias recor-rentes”, aponta a diretora.

O PNSH é resultado de parceria entre ANA, Ministério da Inte-gração Nacional e Banco Mun-dial, no escopo do Programa de Desenvolvimento do Setor Água. As obras identificadas pelo Plano devem ser executadas principal-mente pelo Ministério em parce-ria com os estados onde forem realizadas.

Gisela Forattini acredita que o Plano pode contribuir para a harmonização de interesses inte-restaduais, reforçando uma visão mais regional da situação hídrica:

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“Pretende-se que o PNSH extrapole interesses locais e aprimore a to-mada de decisões na minimização dos conflitos e na consolidação de diretrizes e critérios para a escolha de intervenções hídricas”.

Mais consenso e boas práticas

As manchetes sobre a seca no prin-cipal estado brasileiro ganham cada vez mais espaço na mídia, com ên-

Elaborar projetos para assegurar água de qualidade, em quantidade suficiente para a população brasileira, com foco nas próximas gerações rendeu a sete pesquisadores a oportunidade de apresentar seus trabalhos no Fórum Mun-dial da Água – que será realizado na Coreia do Sul em abril de 2015. O Fórum é considerado o principal evento mundial sobre o tema.

Esse é o resultado do Prêmio ANA, que é realizado anual-mente e vem, desde 2006, reconhecendo e prestigiando projetos que apontem boas práticas relacionadas ao uso da água. A iniciativa tem o patrocínio da Caixa Econômica Federal e o apoio da Rede Brasil de Organismos de Bacias Hidrográficas. Neste ano, mais de 450 projetos disputa-ram em sete categorias: Empresas; Ensino; Governo; Im-prensa; ONG; Organismos de Bacia; Pesquisa e Inovação Tecnológica.

Os estados vencedores foram: Rio de Janeiro (nas catego-rias Imprensa e Organismos de Bacia); Ceará (Governo); Minas Gerais (ONG); Pará (Ensino); Paraná (Empresas) e Pernambuco (Pesquisa e Inovação Tecnológica).

Conheça os projetos premiados em http://premio.ana.gov.br/Edicao/2014/projetos.aspx.

Boas práticas premiadas

fase nos índices pluviométricos, seja para justificar a situação, seja considerando-os medida prioritária para reverter um quadro que deve se agravar nos próximos meses, com a chegada do verão.

Para o professor Paulo Canedo, causa estranhamento pensar que um elemento tão vital e abundante no Brasil dependa dos “humores” do clima para que o acesso a ele seja garantido à população.

“Não dá para definir a quantidade de chuvas de um período, temos de ser mais precavidos. O Brasil é mui-to privilegiado, tem abundância de águas fáceis de usar, tem leis boas, mas nossas práticas são péssimas. Dessa forma, ficamos mais suscetí-veis a crises”, enfatiza.

Ele defende que todo o processo seja revisto: “Primeiro, é preciso avisar às autoridades sobre as difi-culdades em curto e médio prazo para apresentar cenários para que sejam elaboradas estratégias de proteção e medidas de mitigação, se for o caso”.

Canedo lembra a importância de buscar consensos nos diagnósti-cos e produzir mais prognósticos para que a população não tenha de fazer sacrifícios e as autorida-des não sejam pegas de surpresa: “Israel não tem água e ninguém lá sofre com o desabastecimento; os Estados Unidos têm de lidar com amplas regiões desérticas e, ainda assim, lá não falta água”.

Tomando a situação de São Paulo como exemplo, o especialista ex-plica que, pelos diagnósticos apre-sentados em 2013, daria para dedu-zir que o ano seguinte seria difícil. “Avisar que há o risco não aumenta a probabilidade de ter; avisar não significa torcer contra, é o oposto”.

Em sua análise, o desperdício mais grave não vem do cidadão, mas das companhias distribuidoras: “O

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brasileiro não desperdiça água; o país, sim. Temos 48% de desperdí-cio por falta de boas práticas dos órgãos oficiais. As empresas de sa-neamento não investem em obras de infraestrutura para conter os vazamentos, o somatório dessas perdas é praticamente a metade do que se produz” (leia sobre o Ran-king do Saneamento na pág. 11).

O resultado dessa falta de inves-timento em infraestrutura recai sobre a população sob vários as-pectos que acompanham a falta d´água, como aumento nas tarifas de energia e em mais áreas despro-vidas de saneamento, aumentando a incidência de doenças.

Dados da Organização Mundial de Saúde apontam que mais de um bi-lhão de pessoas no mundo não têm acesso a banheiro e que a ingestão de água insalubre mata sete pes-soas por minuto. No Brasil, seis mi-lhões de pessoas não contam com banheiro em casa e mais da meta-de da população não tem acesso a esgoto, segundo dados do Siste-ma Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS/2012).

O Brasil ocupa o 112º lugar em sa-neamento em um ranking de 200 países elaborado pelo BID. Segun-do cálculos da OMS, cada R$ 1 in-vestido em saneamento significa R$ 4 em economia na área de saúde.

“No caso do Rio de Janeiro, a pro-babilidade de falta d´água é baixa até o início de 2015. Mas estamos parando de produzir energia, e esse impacto voltará para nós na forma de tarifas indiretas. A ques-tão é que não estamos criando condições para aumentar nossa resiliência, só dependemos de São Pedro, não pode ser assim”, diz o professor.

Canedo lembrou o caso da cidade de Niterói, no estado do Rio de Janeiro, que acumulou um históri-co de décadas de constante falta

d´água. A questão foi solucionada com a privatização da distribuidora de água, que, para diminuir as per-das, fez obras em suas tubulações. Com essa mudança, Niterói saiu de uma perda de água tratada de 47% para 20% – ainda longe do ideal, mas a economia fez muita diferen-ça para quem vive na cidade.

“Tenho dúvida sobre a eficácia da privatização, mas é certo que faltam boas práticas para melho-rar a gestão. A sociedade precisa se indignar e pressionar por essa mudança.“

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mobilidadE

Trânsito nas grandes cidades beira o colapso. Urbanista dinamarquês defende um

relacionamento mais amigável entre os cidadãos e as cidades

onde vivem

Fausto Rêgo

Sem investimento em transporte pú-blico de qualidade e uma nova lógica de organização dos espaços urba-nos, as grandes metrópoles tendem ao colapso em um futuro não muito distante. No Brasil, projeções feitas pelo Ministério das Minas e Energia revelam que o número de automó-veis nas ruas tende a quadruplicar até 2050. Se hoje temos, em média, um carro para cada cinco habitantes, essa proporção deve chegar a um carro para cada duas pessoas, com a frota de veículos leves aumentando de 36 para 130 milhões.

Iniciativas como o incentivo ao uso de bicicletas e a lenta expansão da malha metroviária em centros urba-nos como Rio e São Paulo estão ain-da longe de solucionar o problema da mobilidade urbana. Para isso, é preciso repensar o modelo de cida-de ao qual nos acostumamos. E um bom exemplo disso é a cidade de Copenhague. A capital dinamarque-sa tornou-se um exemplo de plane-jamento urbano a partir das ideias de um arquiteto e urbanista chamado

Devagar, quase

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Jan Gehl. De início, a prefeitura ado-tou uma medida polêmica: impedir a circulação de automóveis em uma das principais avenidas da cidade. Houve muita resistência, mas a ideia acabou posta em prática. E o resul-tado foi incrível: o espaço passou a ser ocupado por um grande número de pessoas a pé e de bicicleta – e o comércio não teve do que recla-mar. Com o tempo e a construção de vias amigáveis para os ciclistas, os carros foram passando para o segundo plano. Em Copenhague, um terço da população prefere ir ao trabalho sobre duas rodas e outro terço opta pelo transporte público.

O sucesso dessa experiência mo-tivou cidades como Perth e Mel-bourne (Austrália), Estocolmo (Suécia) e Lyon (França) a busca-rem a consultoria de Gehl na hora de repensar seus modelos urba-nos. E o dinamarquês também foi inspiração para o projeto Cidades para Pessoas, que apresentamos em nossa edição de janeiro/junho de 2013 [mais informação no box]. A proposta é que os urbanistas priorizem os espaços de convivên-cia, as necessidades e o bem-estar dos cidadãos, em vez dos automó-veis. O ideário de Gehl segue al-

guns preceitos, como a segurança nos espaços públicos, a proteção contra experiências sensoriais de-sagradáveis, a criação ou preserva-ção de espaços de permanência e caminhada, a possibilidade de ob-servar, conversar e se exercitar.

Em meio à sua complicada agenda de consultorias e palestras ao redor do mundo, o urbanista dinamar-quês encontrou tempo para respon-der, por e-mail, algumas perguntas. Confira!

Senac Ambiental – O conceito de “cidades para pessoas” é recen-te. Cidades modernas (e o senhor certa vez mencionou Brasília como exemplo) foram projetadas a partir de uma perspectiva diferente. As cidades precisam ser reinventadas?

Jan Gehl – No meu livro “Cidades para Pessoas” [Editora Perspec-tiva, 2013], é possível encontrar uma descrição mais aprofundada dos paradigmas que dominaram o planejamento urbano ao longo de aproximadamente 50 anos. E ne-nhum desses paradigmas envolve seriamente os cidadãos que vivem nesses centros urbanos. O que está ocorrendo agora em todo o

O urbanista dinamarquês Jan Gehl (em destaque) privilegia espaços para as pessoas em seus projetos. Como o que desenvolveu para a cidade inglesa de Brighton, na foto acima

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mundo é que a preocupação com as pessoas está sendo reintrodu-zida na questão do planejamento urbano. Não se trata de uma rein-venção, mas de uma compreensão daquelas qualidades que todas as cidades conheciam bem antes da década de 1960.

Senac Ambiental – Como foi feita a discussão do seu projeto com a população, as autoridades e a clas-se política em Copenhague?

Jan Gehl – Na verdade, eu não fiz um projeto para Copenhague. A transformação teve início bem an-tes, em 1962. A partir de 1966, eu estudei sistematicamente como as pessoas costumavam usar os espa-ços públicos da cidade. Esse estudo acabou tendo uma grande influên-cia no desenvolvimento que a cida-de apresentou nos anos seguintes. Ter conhecimento sobre como as pessoas se relacionam com a ci-dade onde moram é essencial para qualquer iniciativa de planejamento ou desenvolvimento urbano.

Senac Ambiental – Helsinque, na Finlândia, tem um ambicioso pro-jeto de tornar o uso do automóvel desnecessário num prazo de dez

anos, estimulando fortemente o transporte público e alternativas não poluentes. O senhor acredita que essa possa ser replicada em cidades semelhantes e em centros urbanos de países em desenvolvi-mento?

Jan Gehl – Ainda não tinha conhe-cimento desse plano de Helsinque. Mas acho que, nos próximos anos, com o desenvolvimento urbano, a redução de espaços e a preocupa-ção cada vez maior com as mudan-ças climáticas, as cidades terão de se adaptar a novas políticas de mo-bilidade, muito mais voltadas para o transporte público, o uso de bi-cicletas e as caminhadas. Esse tipo de estratégia de mobilidade é ideal para cidades em franca expansão em países em desenvolvimento.

Senac Ambiental – Estudos mos-tram que 95% da população brasi-leira provavelmente estará vivendo em grandes centros urbanos por volta do ano 2050. Outros países estão enfrentando esse mesmo di-lema: gente demais, automóveis de-mais e cidades cada vez mais hostis à mobilidade urbana. Estamos per-to de um colapso?

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Ciclovias em São Paulo (ao centro) e em Nova York: incentivo ao

transporte não poluente

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Jan Gehl – Eu diria que muitas ci-dades já vivem essa situação de co-lapso, com trânsito congestionado de uma maneira inaceitável. E cons-truir mais estradas só vai tornar as coisas ainda piores.

Senac Ambiental – Cerca de três milhões de automóveis chegam às ruas brasileiras a cada ano, o que não é sustentável a longo prazo. O senhor acredita que, na medida em que a consciência sobre meio ambiente e mobilidade vem aumen-tando, estejamos próximos de uma mudança radical na indústria auto-mobilística?

Jan Gehl – Temos grande neces-sidade de transporte público de muito mais qualidade, e claro que alguns automóveis serão sempre necessários para uma variedade de

serviços, como combate a incên-dios, transporte de pessoas com dificuldades de locomoção e outros mais. Mas o carro, como solução in-dividual e universal de mobilidade, não tem futuro. Nesse caso, uma mudança de paradigma se faz ur-gente. Hoje em dia, o planejamento urbano e as políticas voltadas para as cidades são cada vez mais in-fluenciados por demandas crescen-tes relacionadas à busca por mais qualidade de vida, à necessidade de enfrentar as mudanças climáticas e encontrar modelos que nos esti-mulem a adotar estilos de vida mais saudáveis, caminhando ou andando de bicicleta. Dessa forma, as pes-soas viverão mais, com uma quali-dade de vida melhor, e a sociedade fará uma economia extraordinária em despesas com saúde.

Segundo Gehl, busca por mais qualidade de vida deve influenciar planejamento urbano

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Criar cidades para pessoas não significa aniquilar os car-ros, mas desestimular seu uso obrigatório no dia a dia, incentivar o transporte coletivo ou solidário, adotar alter-nativas de locomoção menos poluentes, valorizar o convívio entre as pessoas e as experiências sensoriais.

Além de Copenhague, outras cidades vêm despertando para a necessidade de repensar seus modelos urbanos. Na França, a prefeitura de Paris anunciou planos para banir o diesel dos seus veículos até 2020 e impedir o acesso de automóveis a alguns bairros da região central. Ela aposta em carros elétricos, metrô e veículos leves sobre trilhos. Em Nova York, por sua vez, Bill de Blasio, atual prefeito, pretende reduzir significativamente as emissões poluentes e reordenar o espaço urbano até 2050. Uma grande ciclovia em torno de Manhattan, a região mais densamente povoada da cidade, já está pronta.

A capital da Finlândia, Helsinque, é outra a se voltar recentemente para essa filosofia e tem uma meta ambiciosa: em um prazo de dez anos, pretende tornar o uso de automóveis sem sentido diante da efi-ciência e da qualidade do seu transporte público. E aposta na tecnologia para comandar essa revolução.

A ideia é que a mobilidade esteja ao alcance do telefone celular, de onde o cidadão pode acionar um sis-tema integrado que envolve bicicletas de uso compartilhado, táxis, balsas, vans e ônibus. Um aplicativo ajuda a pessoa a planejar sua viagem. E o pagamento é feito on-line.

O pontapé inicial desse projeto foi o lançamento do Kutsuplus (www.kutsuplus.fi), serviço que funciona em caráter experimental desde 2012. Usando um aplicativo para smartphone, um computador ou mes-mo enviando uma mensagem de texto, o passageiro informa sua localização e o lugar aonde deseja ir, escolhendo o horário de sua preferência. Em poucos minutos chega um micro-ônibus para buscá-lo.

O veículo adapta seu itinerário conforme a demanda. O sistema estabelece uma rota, informa o tra-jeto a quem solicitou o transporte e determina o valor a ser cobrado. Se a pessoa concordar, o valor da viagem é debitado automaticamente e o passageiro recebe uma senha que deve ser apresentada ao motorista no momento do embarque. A tarifa é superior à do ônibus comum, mas fica bem mais em conta do que uma corrida de táxi. A expectativa é que a demanda por esse serviço seja amplia-da gradualmente até chegar a algo entre 5 mil e 8 mil veículos lá pela metade da próxima década.

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Pinguim-papua: uma das espécies estudadas pela expedição

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pESquiSa

Expedição de jovens pesquisadores enfrenta os rigores do continente

gelado para estudar espécies ameaçadas

Elias Fajardo

Fotos: Fabio Torres

De novembro de 2013 a março de 2014, jovens pesquisadores brasilei-ros estiveram acampados em bar-racas, durante 112 dias, na Ilha Rei George, na Antártica. Foram estu-dar pinguins e skuas, pesquisando principalmente concentrações de poluentes nessas aves. Em tempera-turas de menos cinco até dez graus positivos, passaram o Natal e o Ano Novo em módulos emergenciais da base brasileira destruída por um in-cêndio. Os resultados dos estudos estão sendo analisados pelo Labora-tório de Radioisótopos do Instituto de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A expedição Operantar XXXII foi rea-lizada pelo Proantar, um programa da Secretaria da Comissão Intermi-nisterial para Recursos do Mar, que congrega, entre outros, os ministé-rios da Defesa, das Relações Exterio-res e da Ciência e Tecnologia, sob o comando da Marinha do Brasil, que se responsabilizou pela logística, in-cluindo treinamento, transporte de navio e avião da Força Aérea Brasi-leira (ida e volta), bem como material de acampamento, barracas espe-ciais, roupas adequadas e comida.

Ave, Antártica!

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Hábitos curiososA Operantar faz pesquisas sobre biodiversidade e ecossistemas, oceano -grafia, glaciologia e geo-logia, além de investigações sobre mudanças climáticas. O Projeto Pinguins e Skuas estuda as três es-pécies de pinguins e duas de skuas – também chamadas de mandriões ou gaivotas rapineiras – que se re-produzem na Baía do Almirantado. São do gênero Pygoscelis, a saber: pinguim-de-adélia (Pygoscelis ade-liae), pinguim antártico (Pygoscelis antarctica) e pinguim-papua (Pygos-celis papua). E as outras duas aves são a skua-polar-do-sul (Catharacta maccormicki) e a skua marrom (Ca-tharacta lonnbergi).

Skuas diferentes podem cruzar en-tre si. Quando se reproduzem, seus filhotes terão filhotes, ao contrário do que costuma acontecer com os híbridos, que não são férteis. Esta curiosidade causa muitas discus-sões no mundo científico: como classificar estas skuas: são de espé-

cies diferentes ou subespécies de uma mesma espécie? Muito pouco se sabe sobre aves da Antártica. E quanto mais são estudadas, mais surgem novos enigmas e desafios.

As skuas são migratórias e vivem no Ártico e na Antártica. Fazem seus ninhos no chão e se alimentam de peixe, carniça, ovos e filhotes de outras aves. Muito agressivas, cos-tumam perseguir gaivotas para rou-bar as presas que elas capturam, e são capazes de matar aves maiores do que elas próprias. Dependendo das condições locais, podem até comer seus próprios ovos. Na Baía do Almirantado, deslocam-se para perto dos ninhais dos pinguins para predá-los.

Os pinguins são característicos do Hemisfério Sul, especialmente da Antártica. Alimentam-se de peque-nos peixes e de krill (minúsculos crustáceos invertebrados pareci-dos com o camarão) e são caçados por baleias orca, focas-leopardo e lobos marinhos. Sua coloração os

Luar antártico: pesquisadores enfrentaram condições duras de trabalho, mas também foram recompensados por momentos de rara beleza

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ajuda a confundir seus predadores. Vistos de frente, o branco do pei-to se confunde com os reflexos da água; vistos de costas, sua pluma-gem escura os torna menos visíveis dentro d’água. Suas asas não são desenvolvidas para voar, mas sim para nadar, o que podem fazer a uma velocidade de 45 quilômetros por hora. Passam a maior parte do tempo no mar. Em terra, usam a cauda e as asas para manter a postura ereta. Possuem uma cama-da isolante que ajuda a conservar o calor de seus corpos. Também são capazes de controlar o fluxo de sangue para as extremidades, redu-zindo a quantidade do sangue que esfria e impedindo que congelem. Podem engolir água salgada porque têm glândulas que filtram o excesso de sal na corrente sanguínea.

Os pinguins, apesar de serem pegos com mais facilidade, são complexos de manipular. Como não voam, os pesquisadores corriam atrás deles com puçás para capturá-los. Então sentavam-se com as aves no colo, mediam os tamanhos, o bico, as asas e faziam coletas de sangue. As skuas eram mais difíceis de ser cap-turadas, mas mostraram-se mais fá-ceis de lidar. Elas voam e foram apa-nhadas em laços feitos de barbante onde eram colocadas iscas de sal-sicha e restos de peixe. Pinguins e skuas capturados eram anilhados. Foram capturadas 240 aves das cin-co espécies estudadas, um número acima da expectativa da expedição.

No início, os animais ficavam ner-vosos quando apanhados. Com o tempo, porém, os pesquisadores foram aprendendo a acalmá-los.

Segundo o professor João Torres, “o pesquisador tem de estar prepara-do e aproveitar para tentar obter o máximo de amostras possível, mas, evidentemente, tem de ser autori-zado a fazer isso, para minimizar o impacto sobre a flora e a fauna

Captura de pinguins-de-adélia

A expedição após uma noite de tempestade

Skuas em voo

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Papuas na praia

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Continente geladoA Antártica é o mais meridional dos continentes e um dos menores, com uma superfície de 14 milhões de quilômetros quadrados. Fica em torno do Polo Sul e tem aproximadamente 98% da sua área coberta por um manto de gelo com uma média de dois quilômetros de espes-sura. Esta cobertura tem um volume estimado em 25,4 milhões de quilômetros cúbicos e contém 70% de toda a água doce do planeta.

Esta terra envolta em mistérios e lendas, que tem despertado a curio-sidade de toda a humanidade, se formou a partir da separação do antigo supercontinente Gondwana, há cerca de cem milhões de anos, e o seu resfriamento ocorreu nos últimos 35 milhões de anos.

É o continente mais frio, mais seco, com a maior média de altitude e o maior indíce de ventos fortes. Nele foi registrada a temperatura mais baixa da Terra (-89,2°C) e é lá que a temperatura média na costa pode chegar a -10°C durante o verão e a -40°C no interior. Alguns autores a consideram um grande deserto polar, porque chove muito pouco no interior do continente. A altitude média é de aproximadamente 2.000 metros. São comuns as ventanias com 100 quilômetros por hora, que podem durar vários dias.

Juridicamente, a região está sujeita ao Tratado Internacional da Antár-tica, por meio do qual as nações que reivindicavam territórios no con-tinente (Argentina, Austrália, Chile, França, Noruega, Nova Zelândia e Reino Unido) concordaram em suspender suas pretensões, abrindo es-paço para a exploração científica. A dureza do clima impediu o estabe-lecimento de uma população permanente, mas o continente conta com uma população provisória de cientistas e pessoal de apoio nas bases polares que varia entre mil, no inverno, e quatro mil pessoas, no verão.

Há mais de 30 anos, o Brasil faz pesquisas na Antártica. Em 1982, quando foi criado o Proantar, realizou-se a nossa primeira expedição ao Continente Gelado. A partir dela, o país foi reconhecido como parte consultiva do Tratado. A presença brasileira no continente se efetivava com a Estação Antártica Comandante Ferraz, instalada em fevereiro de 1984 na Baía do Almirantado, na ilha Rei George. A partir do in-cêndio da estação, em fevereiro de 2012, pesquisas continuam sendo realizadas em módulos emergenciais no mesmo local. Em setembro de 2014, a obra de reconstrução da Estação Antártica Comandante Ferraz estava na etapa de licitação.

locais. Coletas indevidas de material podem ter consequências negativas sobre a relação do nosso país com a política do Tratado Internacional da Antártica”.

Os acampadosA equipe que acampou na Antártica foi composta por João Paulo Ma-chado Torres, professor associado do Instituto de Biofísica da UFRJ; pela bióloga Juliana Silva Souza, aluna do Mestrado em Educação, Gestão e Difusão de Biociências da UFRJ, que coordenou as atividades científicas no acampamento; pelos biólogos Adriana Rodrigues e Re-nan Longo, alunos de mestrado em Biofísica da UFRJ; Ana Olívia Reis, aluna de doutorado em Ecologia e Evolução da Universidade do Esta-do do Rio de Janeiro; Flavia Vascon-celos Melo, aluna de mestrado em ecologia da UFRJ, pela oceanógrafa Juliana Ivar do Sul, do doutorado em Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco, e pelos es-tudantes de biologia da UFRJ Fabio Torres e Janeide Padilha. Também participaram os alpinistas Beatriz Boucinhas e Marcelo Campos, do Clube Alpino Paulista, responsáveis pela segurança do acampamento.

Os pesquisadores reconhecem as condições radicais em que a expe-dição se deu, mas não escondem seu entusiasmo. Nas entrevistas, evitaram se queixar e preferiram

Baía Almirantado e navio Ary Rongel

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realçar tudo quanto viveram e aprenderam por lá.

A bióloga Juliana pode ser conside-rada uma veterana, pois esteve na Antártica em três verões consecu-tivos. Ela destaca em primeiro lu-gar a beleza do Continente Gelado, também chamado de Continente Branco: “Abríamos a barraca e, a cada manhã, tinha um cenário di-ferente e deslumbrante. Acordáva-mos com o barulho das baleias e corríamos pra ir vê-las. Estávamos acampados ao lado de uma colô-nia de reprodução dos pinguins. É fascinante a proximidade com os animais”.

O que mais impressionou Fabio Torres foram as geleiras: “A gente olhava para o horizonte e via as montanhas. Ao fundo, mais alto do que elas, estavam as geleiras. Para mim, o mais fascinante foi desco-brir que é possível viver num am-biente inóspito por um tempo lon-go e com um mínimo de conforto”.

Dia a dia no acampamento

Os pesquisadores estavam sob a responsabilidade do navio Ary Ron-gel, da Marinha, que ficou na ilha Rei George durante boa parte do tempo da expedição. A base brasileira, a cinco quilômetros do acampamen-to, ajudou bastante. O pessoal da base levou os pesquisadores para passar lá o Natal e o Ano Novo e complementou a comida deles.

A solidariedade viaja junto com quem vai para a Antártica. Os pes-quisadores poloneses também apoiaram seus colegas brasileiros. Se o tempo estava bom, nos fins de semana, eles levavam os brasileiros para tomar banho na sua base, do outro lado da Baía do Almirantado. E, sempre que podiam, mandavam verduras e visitavam os colegas, além de terem ajudado a desmontar o acampamento. Segundo Juliana, “os poloneses não nos conheciam,

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nunca tinham visto a gente antes e foram ótimos conosco. Tivemos solidariedade de todas as partes, e isto ajudou bastante no trabalho e no dia a dia”.

A maior dificuldade era a umida-de. Quando molhavam os pés, por exemplo, eles permaneciam molha-dos por vários dias. O aquecedor a gás secava as roupas, mas não os sapatos e as meias.

Os pesquisadores se alimentavam de comida semipronta fornecida pela Marinha e mantinham um fo-gão numa barraca grande, que dis-punha também de laboratório, cozi-nha e banheiro.

“Viver naquele ambiente isolado foi muito enriquecedor pra mim”, afir-ma Janeide. “Passamos meses sem mexer com dinheiro, sem internet e aprendemos a dar valor a outras coisas. Ficamos mais próximos da natureza e pudemos conhecê-la melhor. Foi uma experiência que me fez mudar bastante. Às vezes

sentia muita saudade, mas nossos companheiros viraram nossa famí-lia. Estivemos juntos em momen-tos difíceis, e isso nos uniu muito. Aumentaram os laços de confiança entre nós. Viramos irmãos.”

Rindo no frioTodos usavam uma roupa especial laranja que cobre quase todo o corpo, deixando apenas as mãos e o rosto de fora. Dispunham de um saco de dormir que suporta 40 graus negativos. Mas, com vento forte, a lateral da barraca dobrava e tocava em quem dormia. Em algu-mas ocasiões, as barracas ficaram quase encobertas pela neve. Quem puder imaginar o que deve ser me-dir aves com vento e chuva, passar o dia com meias geladas ou tomar banho de lenço úmido (as barracas não têm chuveiro), que costumava congelar durante as tempestades, algumas com ventos de 200 quilô-metros por hora, vai ter uma ideia melhor do cotidiano da expedição.

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Banho de água, só quando os po-loneses vinham buscar seus cole-gas e os levavam para a sua base. Ou então no Natal e no Ano Novo, quando os acampados foram para a base provisória brasileira. Com mau tempo, no entanto, os barcos não conseguiam atravessar a baía. Uma das moças chegou a ficar 17 dias sem se banhar.

Fábio Torres destaca a importância dos alpinistas, que não trabalha-vam com os animais, mas cuidavam da segurança: “Eles avisavam com antecedência se a tempestade que se aproximava seria fraca ou forte, instruíam a gente para amarrar me-lhor a barraca e dar uma revisada nos nós. O medo varia de pessoa pra pessoa. De modo geral, eu me sentia tranquilo, confiava nos alpi-nistas e seguia as instruções deles. A gente sentia a força do vento que dobrava a barraca e nos acordava no meio da noite. Algumas vezes, a barraca ficava quase coberta; para sair, tinha de remover a neve.” As barracas foram montadas ao lado

de um refúgio mantido no local por pesquisadores do governo equatoriano.

Por sua vez, Janeide confessa: “A primeira tempestade a gente nunca esquece. Os ferros que seguram a barraca balançavam como se fos-sem quebrar. Pensei: isso vai sair voando com a gente. Mas foram tantas as tempestades que fomos nos acostumando. A maior alegria foi compartilhar as experiências e os momentos bons com os amigos. No dia a dia, a gente acordava, to-mava café e, quando o tempo esta-va ruim, não podia sair pra trabalhar com as aves. Então conversávamos muito. As relações com os colegas foram muito boas, nos divertimos muito. Nunca ri tanto na minha vida como na Antártica.”

Um dos maiores sustos foi quando duas moças da expedição apresen-taram sintomas de intoxicação pelo gás que aquecia e iluminava as bar-racas. Elas foram levadas para um lugar aberto, para poderem respirar melhor sem o monóxido de carbo-

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no. Logo ficaram bem e o trabalho prosseguiu.

O professor João Torres comen-ta: “Acidentes acontecem. E onde existe uma enorme dificuldade de evacuação jamais haverá situação isenta de risco, devendo os pesqui-sadores ter em mente o real impac-to que qualquer atitude deles pode gerar sobre seu próprio destino e o dos outros. Em determinadas oca-siões, por conta da segurança, o deslocamento para longe dos refú-gios deve ser evitado, sendo a atitu-de da Marinha, especialmente com relação ao mergulho de forma autô-noma, mais restritiva do que a dos outros grupos de diversos países.”

As pesquisasO estudo do ecossistema antárti-co associado à pesquisa da conta-minação de aves em toda a cadeia alimentar foi o grande foco das pes-quisas da Operantar XXXII. Um dos principais objetivos é saber como a contaminação interfere no compor-tamento das aves. O ambiente frio favorece que os organoclorados e os

metais pesados se condensem en-tre o céu e a terra. A dinâmica da atmosfera une todos os continentes, e isto favo-rece o estudo num local onde a maior ou me-nor presença dessas substâncias permite conhecer melhor o planeta. Por exemplo, para chegar ao Acre, uma frente fria conta com a atuação de ventos vindos da Antártica.

Nas áreas estudadas pela ex-pedição há retração de geleiras em maior ou menor intensidade, causa-da pelo aquecimento global. Quan-do uma geleira derrete, as substân-cias poluentes que se acumularam nela durante centenas de anos são liberadas na água do mar.

Estudos desse tipo são um esfor-ço pelo progresso da ciência e da educação, pois ajudam a formar pesquisadores em nível de pós-gra-dução – e sua trajetória ampliará o conhecimento sobre o funciona-mento global do planeta.

Janeide Padilha,

Juliana Souza e João Paulo Torres

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lEgiSlação

Criado com o Código Florestal, o Cadastro Ambiental

Rural é fundamental para a regularização das áreas de

agropecuária

Francisco Luiz Noel

O desafio de mapear o impacto da agropecuária brasileira sobre o meio ambiente está lançado. Desde maio, proprietários e posseiros de norte a sul se veem às voltas com croquis, imagens de satélite, escrituras, licen-ças e outros documentos na tentati-va de ficar em dia com o Cadastro Ambiental Rural (CAR), criado pela Lei 12.651, de 2012, que instituiu o novo Código Florestal. Eles estão batendo às portas de sindicatos e prefeituras em busca de orientações e ajuda técnica, fomentadas pelos governos estaduais e por institui-ções como o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). O prazo de cadastramento termina, a princí-pio, em maio de 2015.

A inovação vai permitir ao Ministé-rio do Meio Ambiente integrar num banco de dados todas as informa-ções ambientais das estimadas 5,6 milhões de propriedades e posses rurais do país. O CAR, previsto no artigo 29 da lei, foi regulamentado no mesmo ano pelo Decreto 7.830, que oficializou a base eletrônica

Um mapa ambiental do campo

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para o registro e gerenciamento dos dados – o Sistema de Cadas-tro Ambiental Rural (Sicar). No dia 6 de maio de 2014, em instrução normativa com as regras de inscri-ção, preenchimento e validação, o ministério fixou prazo de 12 meses – prorrogável por um ano, no máximo – para o cadastramento obrigatório dos imóveis.

Na condição de registro público, feito via internet, da realidade am-biental do campo brasileiro, o CAR vai proporcionar subsídios a ações de combate ao desmatamento e de controle e planejamento ecoló-gico nos seis biomas brasileiros – Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa. Para os produtores, o cadastro abre ca-minho para o ajuste da situação dos imóveis rurais à legislação do meio ambiente, com a subsequente recu-peração de áreas verdes. Essas ini-ciativas deverão ser empreendidas por meio de adesão aos programas de Regularização Ambiental (PRAs)

dos estados, com execução ao longo de até 20 anos.

Até o início de outubro, o número de imóveis inscritos no CAR girava em torno de 460 mil – pouco mais de 8% dos 5,6 milhões espalhados pelo país. Metade dos cadastrados era de pequeno porte, com áreas de até 50 hectares, de acordo com informação prestada à articulação não governa-mental Observatório do Código Flo-restal pelo coordenador do cadastro, Raimundo Deusdará Filho, diretor de Fomento e Inclusão Florestal do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), do Ministério do Meio Ambiente. O SFB ainda estava às voltas com a finali-zação do módulo do programa que vai permitir aos estados a análise e a validação dos cadastramentos.

Socorro técnicoNa falta de familiaridade dos peque-nos agricultores e pecuaristas com a informática, a maioria depende de apoio para o preenchimento do CAR. O socorro vem sendo prestado

Cadastro vai permitir a integração de informações sobre as propriedades rurais do país

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por técnicos e funcionários dos sin-dicatos rurais, prefeituras e escritó-rios de assistência técnica e exten-são rural. Para lidar com o cadastro, esses profissionais têm sido capa-citados pelas agências ambientais dos estados, pelo Senar e por outras organizações, com estímulo do Mi-nistério do Meio Ambiente. Proprie-tários com mais recursos contratam o auxílio particular de engenheiros ambientais, agrônomos e outros téc-nicos, pagando de R$ 500 a mais de R$ 2 mil pelo serviço.

Embora poucos produtores de pe-queno porte conheçam as minúcias da lei e disponham de traquejo para manejar mapas no computador, a legislação federal não impõe a par-ticipação de profissional das áreas agronômica ou ambiental no CAR. A natureza declaratória das infor-mações e a dispensa de chancela técnica vêm gerando reservas entre entidades ligadas de forma direta ou indireta ao mutirão nacional de preenchimento do CAR. Exemplo é o Instituto Socioambiental (ISA), uma das 14 organizações que in-tegram o Observatório do Código Florestal, formado em maio de 2013 para acompanhar a implementação da Lei 12.651.

“O governo deu mais importância ao cumprimento do prazo do que à qualidade. Por isso facilitou ao máximo para que o cadastro seja feito com a maior celeridade pos-sível, embora o próprio governo tenha demorado dois anos para re-gulamentar o CAR”, afirma no ISA a assessora do Programa de Polí-tica e Direito Socioambiental, Flá-via Camargo. “Seria bom que pelo menos houvesse a exigência de um técnico para se responsabilizar. Os produtores estão recorrendo a profissionais, mas eles nem sem-pre terão o comprometimento que teriam se fosse preciso assinar. Vamos ter um quadro nacional de muita heterogeneidade.”

A responsabilidade de um técnico é exigida em alguns estados que, para atender a legislações locais de pro-teção do meio ambiente, dispõem de aplicativos próprios de cadastra-mento – sistemas que terão as bases de dados integradas ao Sicar. É o caso do Pará, que lançou seu cadas-tro ambiental em 2008, com o impe-rativo de que as informações tenham a chancela de profissional registrado no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea). A exigência não tem sido, porém, sinônimo de ônus para os pequenos produtores, por conta da intensa atuação da Empre-sa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) do Pará.

Estados que estiveram na linha de frente do desmatamento até a década passada, o Pará e o Mato Grosso foram pioneiros na adoção obrigatória do cadastro ambien-tal como instrumento de controle e monitoramento do impacto da agropecuária sobre os recursos na-turais. As experiências paraense e mato-grossense serviram de base para a modelagem do CAR pelo Mi-nistério do Meio Ambiente. No Pará, o chefe do Núcleo de Geotecnolo-gia da Emater, geógrafo Jamerson Viana, afirma que já estão cadastra-das mais de 100 mil das estimadas 450 mil propriedades rurais – 80% pequenas, muitas delas em assen-tamentos da reforma agrária.

Desafios a vencerA maior dificuldade dos proprietá-rios e posseiros no preenchimento do CAR é o trato com as imagens georreferenciadas. Feitas de 2008 a 2012 por uma rede de cinco satéli-tes da operadora alemã RapidEye e adquiridas pelo Ministério do Meio Ambiente por R$ 28,9 milhões, as fotografias aparecem no Sicar se-paradas por municípios. O primeiro desafio é localizar a propriedade ou posse, para aplicar sobre a ima-gem um croqui do imóvel e de suas

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partes – a área rural consolidada, as áreas de Reserva Legal e de Preser-vação Permanente (APP), os rema-nescentes de vegetação nativa e as eventuais áreas de interesse social e utilidade pública.

A Reserva Legal é a parte que deve ser preservada na propriedade ou posse, variando percentualmente de acordo com as características de cada região. Pelo Código Florestal, a reserva deve corresponder a 80% em áreas florestais na Amazônia Legal; a 35% no Cerrado; e a 20% nos ou-tros biomas. A APP tem a função de proteger corpos d’água, encostas e topos de morros. No caso dos rios, dependendo da largura, as faixas mínimas de mata que precisam ser conservadas vão de 30 a 500 me-tros. As nascentes requerem APPs de pelo menos 50 metros de raio, ao passo que os manguezais devem ser preservador integralmente.

“O cadastramento deixou os pro-dutores rurais um pouco inseguros. O programa é uma ferramenta fácil, mas não para eles, pois é preciso in-

terpretar a imagem de satélite. Nem sempre o produtor está acostumado a ver sua propriedade do alto, além de ter dificuldade para fazer os dese-nhos”, testemunha a diretora de Mo-nitoramento e Restauração da Bio-diversidade do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), engenheira florestal Mariese Muchailh. Desde 2013, o IAP já capacitou mais de mil técnicos de prefeituras e entidades rurais para dar apoio gratuito ao preenchimen-to do CAR. Treinamentos do gênero vêm sendo dados por agências am-bientais de vários estados.

O tamanho do desafio que os pe-quenos proprietários e posseiros estão tentando vencer é testemu-nhado também pela coordenadora da Assessoria de Meio Ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), a engenheira ambiental Ana Pau-la Mello. “Achar a propriedade no mapa, traçar os limites e desenhar as funções ambientais necessárias, usando as ferramentas do programa da forma correta, de acordo com a

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lei, é um trabalho que pode repre-sentar um risco se o cadastro am-biental for feito por pessoas que não entendem do Código Florestal e, no nosso caso, também da legislação mineira”, alerta.

Como exemplo, a assessora da Faemg aponta o uso da ferramenta do programa para o desenho de fai-xas de passagem de linhas de trans-missão de energia e de estradas de domínio público por uma proprieda-de. Estas áreas podem ser deduzidas da área total do imóvel, para efeito de cálculo do percentual obrigatório da Reserva Legal – uma inovação da Lei 12.651 em relação ao antigo Có-digo Florestal. O desconhecimento de pormenores legais como esses, aliado a dificuldades no uso das fer-ramentas gráficas do sistema com-putacional, pode gerar imprecisões e até mesmo a declaração de passivos ambientais que não existem de fato.

Ritmo lento Minas foi um dos estados que de-senvolveram bases de dados pró-prias para atender simultaneamente à lei estadual e às exigências nacio-nais. Mas, em outubro, o sistema mi-neiro apresentava vulnerabilidades técnicas e era alvo de queixas de produtores e profissionais envolvi-dos no cadastramento. Uma fonte de problemas, aponta Ana Paula Mello, é o fato de o programa só permitir o preenchimento on-line – inconve-niente que, a um simples corte de energia, leva à perda de tudo o que foi feito antes. O Sicar e outros siste-mas estaduais têm módulos off-line, que só exigem conexão à internet na hora do envio das informações.

O CAR é pré-requisito para vários benefícios previstos no Código Florestal, aí incluído o perdão por agressões à natureza anteriores a 22 de julho de 2008. Na data, o Decreto 6.514 regulamentou as punições da Lei 9.605, dos crimes ambientais, sancionada em 1998. Nas pequenas

propriedades, o cadastro vai dar como fato consumado a supressão irregular, antes de 2008, de partes de reservas legais e APPs, com o cancelamento de autuações e mul-tas. Mas, nos casos de degradação de áreas naturais após a edição do decreto, os produtores cadastrados só obterão a anistia depois de apre-sentarem projetos de recuperação e iniciarem sua execução para zerar os passivos ambientais.

A inclusão dos projetos no PRA e o compromisso formal de executá-los são condicionantes para o acesso a crédito governamental, com juros menores, a partir de 2017. A lista de vantagens do código abre portas a outras facilidades no terreno finan-ceiro, como a contratação do seguro em condições especiais e a dedução das áreas preservadas do cálculo do Imposto sobre a Propriedade Ter-ritorial Rural (ITR). Permite também o acesso a financiamentos para ini-ciativas de preservação e manejo sustentável e a isenção de impostos para insumos e equipamentos uti-lizados nas ações de recuperação ambiental.

Minas e Paraná ainda têm muito a cadastrar, a exemplo das demais 25 unidades da federação. O Pará des-ponta como um dos mais adianta-

O cadastro é feito via internet. Técnicos de prefeituras e entidades

rurais têm sido capacitados para ajudar os produtores

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dos, tendo cadastrado mais de 20% de seu universo de propriedades. Os mineiros, com cerca de 550 mil imóveis rurais, haviam cadastrado aproximadamente 30 mil (5,1%) até outubro, enquanto os paranaenses somavam cerca de 4 mil (0,8%) de suas 532 mil propriedades. “Nosso trabalho de divulgação vai muito bem, mas é difícil fazer chegar a in-formação a todos os lugares do meio rural”, observa Ana Paula Mello, da Faemg, que ministra cursos, seminá-rios e videoconferências para técni-cos de sindicatos rurais.

As dificuldades na Amazônia são, porém, um capítulo a parte na di-fusão do CAR. Com 350 técnicos dando apoio gratuito aos pequenos produtores, a Emater local encara longas distâncias, dificuldades de acesso e inexistência de demarca-ções fundiárias em locais onde vi-gora o chamado “limite de respeito”, consensual na comunidade. Outro desafio: ilhas que mudam de contor-no com o passar dos anos. “Nosso grande desafio está no Marajó”, diz Jamerson Viana. Exemplo: para al-cançar o município de Chaves, no extremo norte da grande ilha, é pre-ciso ir de avião ao Amapá e navegar até o local – percurso mais fácil do que a travessia terrestre do Marajó.

No Paraná, o IAP está lançando curso a distância para multiplicar a capacitação de técnicos no interior, junto com o Crea. Apesar do ritmo lento do cadastramento, a enge-nheira florestal Mariese Muchailh atesta o interesse dos produtores pelo CAR. “A lei estabeleceu o PRA justamente para dar uma chance ao produtor rural de vir ao governo, di-zer a situação da sua propriedade e, se for o caso, ter 20 anos pra fazer a restauração”, explica a diretora do instituto. Para apoiar as ações de reflorestamento, o IAC dispõe de vi-veiros com capacidade para ofertar

até 10 milhões de mudas anuais aos proprietários e posseiros rurais.

Impasse no PampaNo Rio Grande do Sul, o CAR esbar-rou em controvérsias jurídico-am-bientais associadas ao Pampa. Rico em biodiversidade, o bioma espraia suas planícies e serras em 176,5 qui-lômetros quadrados da Metade Sul do estado, em área correspondente a 63% do Rio Grande. O Pampa alterna campos nativos com matas e banha-dos, possuindo três mil espécies de plantas, 500 de aves e 100 de mamí-feros. Entre suas árvores destacam-se o algarrobo e o nhandavaí; entre os animais, o veado campeiro e o pica-pauzinho chorão – todos amea-çados de extinção. Outra singularida-de está no subsolo, que conserva a maior parte do Aquífero Guarani.

Desde a colonização, a pecuária extensiva avançou sobre os cam-pos nativos e tornou-se a principal atividade econômica da região, per-sonificada pela figura do gaúcho. A presença do gado contribuiu para conservar grande parte da vegeta-ção original até o fim do século pas-sado, quando os campos começa-ram a ser convertidos em lavouras de soja e milho. Na falta de legislação ambiental que disciplinasse o uso dessas áreas, a nova fronteira agrí-cola expandiu-se, favorecida pelo entendimento generalizado de que os campos com gado eram áreas descaracterizadas e dadas como perdidas para a preservação.

A compreensão moderna do bioma derrubou por terra, entretanto, a ideia de que a pecuária é sinônimo de devastação das peculiaridades dos campos nativos. Para a Secreta-ria do Meio Ambiente do Estado e a Fundação Estadual de Proteção Am-biental (Fecam), assim como para o Ministério do Meio Ambiente e o Iba-ma, essas áreas são remanescentes

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do Pampa e objeto de proteção le-gal. Mas, com base na visão ante-rior, grandes extensões de campos nativos por onde passou a pecuá-ria foram destruídas para o plantio, sobretudo de soja – e uma parte, depois de 2008, sem licenciamento ambiental.

O problema aflorou na pauta am-biental do Rio Grande por conta do CAR. Se declarar que a área consoli-dada para a agricultura avançou so-bre campos nativos depois de 2008, sem licença, o proprietário será réu confesso de crime ambiental. “Ele responderá a processo, terá de re-cuperar a área e provavelmente pa-gará alguma pecúnia como forma de compensação”, resume o assessor de Política Agrícola e Meio Ambien-te da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), o engenheiro ambien-tal Alexandre Scheifler. A entidade orientou os agricultores a não preen-cher o cadastro enquanto o impasse não for solucionado.

Como o uso agrícola dos campos nativos é comum entre os mais de 60 mil pecuaristas familiares da Metade Sul, a Secretaria de Meio Ambiente está empenhada em dotar de regras claras a atividade rural no Pampa e o preenchimento do cadastro ambien-tal. A edição de uma normativa so-bre o tema está sendo precedida de consulta às mais de 20 entidades in-tegrantes do Grupo de Acompanha-mento do CAR, que incluiu desde o Movimento Nacional dos Trabalha-dores Rurais Sem Terra (MST) até a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), pas-sando por Ministério Público e uni-versidades.

Afora as supressões irregulares de vegetação desde 2008, preocupa os pecuaristas familiares a exigência cadastral de delimitar as áreas de uso rural consolidado e de preserva-

ção em cada propriedade. No caso do campo nativo utilizado como pastagem, declará-lo como reserva legal, para cumprir a legislação, sig-nifica impossibilitar sua conversão futura em lavoura de soja. “A Reser-va Legal no Pampa vai ter uso, com gado. Pretendemos que o produtor continue fazendo isso. É uma for-ma de preservar o bioma”, afirma na Secretaria de Meio Ambiente a dire-tora do Departamento de Florestas e Áreas Protegidas (Defap), bióloga Márcia Eliana Correa.

Para ajudar os pequenos agriculto-res e pecuaristas a preencher o CAR, mais de 1,2 mil técnicos de prefei-turas, sindicatos e outras organiza-ções foram capacitados pelo Senar, vinculado à Farsul. O Defap também vem promovendo cursos e palestras em municípios da Metade Sul e da Norte, onde o bioma é o de Mata Atlântica. O cadastramento seguia, porém, em compasso de espera no início de outubro. “O produtor do Rio Grande é cabreiro, desconfiado, mas busca essa regularização há muito tempo”, diz Márcia Eliana. “No momento em que estiver seguro, tendo as normas claras, ele vai fazer o cadastro.”

Os proprietários e posseiros do Rio Grande e demais estados estarão cadastrados até maio de 2015? Entre os técnicos das organizações gover-namentais e não governamentais, não há quem se arrisque a fazer essa afirmação. “No ritmo em que esta-mos, se não conseguirmos intensi-ficar, não cadastraremos todos nem em maio de 2016”, alerta, na Faemg, Ana Paula Mello. No Pará, Jamerson Viana prevê que o trabalho chegará a termo no prazo de dois anos, com a esperada prorrogação até 2016. “No Brasil todo, é uma incógnita”, diz ele. Mas aposta: “Quando todo o país abraçar a causa do CAR, estaremos revolucionando a atividade rural.”

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Povoados escondidos e protegidos por estradas

difíceis conservam tradições, conquistam tranquilidade e

bem-estar

Valéria Fernandes

No sul de Minas Gerais, divisa com os estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, as montanhas da Man-tiqueira parecem um mar. Picos, montes e pedras formam as ondas e escondem, bem escondidas, comu-nidades tão pequenas que a popu-lação toda não enche um auditório com capacidade para 500 pessoas. Trilhas difíceis e estradas esburaca-das ajudam a manter o isolamento, preservar atividades econômicas e garantir uma convivência íntima com a natureza.

Até o final do século passado, es-sas comunidades viviam, como acreditavam, “em harmonia com a natureza”. Queimavam o mato an-tes de iniciar uma nova plantação, cortavam lenha para cozinhar, der-rubavam árvores para fazer pasto, e assim por diante. Quando a cons-ciência ambiental chegou, levando aos grandes centros a preocupação com a qualidade de vida, e técnicos, especialistas, cientistas e aman-tes da natureza voltaram-se para o campo, a vida nessas vilas rurais começou a mudar.

As unidades de conservação (UCs)

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surgiram com regras preservacio-nistas, para proteger fauna, flora e nascentes das ações humanas. Nes-sa região, entre os estados do Rio, São Paulo e Minas, foi criada a Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra da Mantiqueira, que inclui o Parque Nacional de Itatiaia e o Par-que Estadual da Serra do Papagaio.

O coração das montanhas mineiras está nesta APA, mais precisamen-te no entorno e dentro do Parque Estadual da Serra do Papagaio, que abriga as maiores e mais importan-tes bacias hidrográficas do Sudeste. Só na área do parque são, aproxi-

madamente, 1.200 nascentes de água, 240 cachoeiras e 28 cânions.

A criação do parque, em 1998, pro-duziu mudanças que estão ajudan-do a inibir ações que podem agredir o ambiente também no entorno. Um exemplo é o calçamento da es-trada que liga Itamonte a Aiuruoca, passando por Alagoa, a cerca de 70 quilômetros cortando a serra. Para minimizar o impacto ambiental, a estrada está toda sendo calçada com bloquetes (blocos sextavados de concreto), que, ao contrário do asfalto, mantêm a permeabilização do solo.

Educação e conscientização

Organizações não governamentais como a Fundação Matutu, a Alto Gamarra e a Amanhágua participam de iniciativas de educação ambien-tal para orientar as populações so-bre o uso sustentável dos recursos naturais. Um desses projetos, reali-zado de 2007 a 2011 pela Fundação Matutu, mobilizou moradores de dez comunidades. O objetivo foi fazer um reconhecimento do terri-tório para que depois os próprios moradores definissem escolhas que garantissem um futuro sustentável.

Nas dez comunidades espalha-das pelos municípios mineiros de Aiuruoca (Campina, Cangalha, Furnas de Cima e Matutu), Alagoa (Engenho), Baependi (Piracicaba e Vargem), Itamonte (Campo Redon-do e Morro Grande) e Pouso Alto (Ribeirão) foram feitos reuniões e levantamentos que caracteriza-ram as condições socioambientais de cada localidade. As mudanças concretas ficaram por conta das comunidades. O processo é difícil, porque assim como as atividades dessas populações impactam o meio ambiente, a preservação do meio ambiente também impacta a forma de vida delas. Os morado-

Cachoeira de Campo Redondo, em Itamonte (MG)

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res dizem não acreditar nos proje-tos em que “é tudo teoria”, feitos “por técnicos que chegam de fora”, “gente que não conhece nossa rea-lidade”. Mas, na verdade, depois de algum tempo, o resultado dessas ações de educação e conscientiza-ção mostra-se positivo.

A analista ambiental Priscila Bar-bosa Pereira cresceu no bairro de Piracicaba, área rural de Baependi. Ela lembra as dificuldades no início do projeto. “Os moradores eram contra ambientalistas, pois diziam que [por causa deles] não podiam mexer com gado, não podiam cor-tar árvore... Mas, com o tempo, essa visão foi mudando”, explica.

Os técnicos, segundo Priscila, mostraram alternativas que foram sendo aceitas pela comunidade. “Para garantir mais área de preser-vação, eles ensinaram os produ-tores a criar o gado em piquetes”, conta. O lixo que era queimado ou enterrado é agora jogado em um ponto de coleta de onde é recolhi-do pela prefeitura.

O povoado, hoje com cerca de 600 pessoas, tem muitos morado-res que vieram de fora. De acordo

com Priscila, mesmo com a chega-da de tecnologias como o telefone e a internet, muitos jovens ainda buscam alternativas fora do Pira-cicaba. O que faz aumentar a po-pulação são os novos moradores, com mais idade, vindos dos gran-des centros, como Rio e São Paulo, e os alternativos. A vila tem uma comunidade Hare Krishna e outra do Santo Daime. Ali, as diferenças convivem sem conflitos. O dia a dia ainda é tipicamente rural, com a fabricação de queijos, embutidos artesanais, rapadura e confecção de objetos em bambu e palha.

A zona rural de Baependi inclui ain-da outros povoados parecidos com Piracicaba, como Juju e Gamarra. É uma região distante da sede do município e pontilhada por ca-choeiras e rios próprios para ba-nho, prática de rapel e canoagem. O levantamento feito pelo projeto da Fundação Matutu mapeou to-dos os atrativos naturais e abriu uma nova janela para a economia. O bairro rural virou uma das atra-ções turísticas do município e da região e é um dos roteiros mais utilizados por guias que trabalham com turismo de aventura.

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A comunidade fica a 12 quilômetros do centro do

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Tradição e preservação

Em Campo Redondo, distante 32 quilômetros do centro de Itamonte, 12 deles por estrada de terra, o pro-cesso de mudança começou antes, no início dos anos 80. Foi quando o casal Hélène e Pedro Delmonte chegou à vila (bairro rural do muni-cípio), em busca de uma vida alter-nativa junto à natureza. Tinham 22 anos e muitas ideias para implantar com os moradores locais, algo em torno de 300 pessoas.

Naquela época, a comunidade vi-via da agropecuária. O queijo par-mesão, curado na salmoura, era o carro chefe da economia em Campo Redondo e nas oito vilas próximas que sobem a serra em direção ao município de Alagoa. A produção era transportada por tropeiros, cor-tando a Mantiqueira até o Vale do Paraíba, no estado do Rio. As tri-lhas cor de barro que riscam o ver-de das montanhas somam 40 qui-lômetros e são utilizadas até hoje pelos tropeiros. É o caminho mais curto entre os dois estados: Minas Gerais e Rio de janeiro.

A pedagoga Hélène deu aula por quase 30 anos na escola municipal do bairro. Foi ali, com as crianças,

que o trabalho de conscientização começou. “Foi uma atividade de dar e receber, também fui muito edu-cada por eles”, conta. Ela foi uma das idealizadoras de um projeto que contou com o apoio da Funda-ção Matutu e do Ministério do Meio Ambiente. A partir de pesquisas feitas por jovens das comunidades, o projeto resultou na produção da Cartilha Nossa APA, que traça um perfil da região e de sua gente.

Para fazer os moradores entende-rem que o que eles tinham naque-le lugar valia muito mais do que dinheiro, a pedagoga se valeu do teatro. “Montávamos peças e fazía-mos apresentações em cima de car-rocerias de caminhão, no campo de futebol, onde fosse possível”, diz. As apresentações passaram a fazer parte da vida da comunidade, que acabou construindo, na praça da igreja, um anfiteatro.

A professora também incentivou os primeiros alunos a fazerem o ensi-no médio em Itamonte. Atualmente, a Escola Municipal Bruno Fonseca Pinto, em Campo Redondo, oferece o ensino médio e atende estudan-tes das outras comunidades do mu-nicípio. Os ex-alunos de Hélène são agora os líderes da comunidade,

Diretoria do Centro Comunitário de Campo Redondo, que desenvolve projetos de sustentabilidade com os moradores

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administram o Centro Comunitário e desenvolvem com os moradores projetos de sustentabilidade como o de reciclagem do lixo, feito pelos alunos da escola municipal.

Gestão participativaNascidas e criadas em Campo Re-dondo, a presidente do Centro, Edwirges Fernanda Maria da Fon-seca, e a tesoureira, Rosemeire Paiva Fonseca, reconhecem o tra-balho da pedagoga e dos projetos desenvolvidos em parceria com a direção da APA e das organi-zações não governamentais. “As pessoas passaram a enxergar me-lhor as coisas”, admite Edwirges.

Os resultados práticos, porém, são obtidos pelo trabalho dos próprios moradores. A gestão participativa foi outra importante herança deixada pelos projetos. O Centro Comunitário está sendo

ampliado e reformado, respeitan-do a arquitetura local, com o di-nheiro da comunidade. “Organi-zamos almoços e cobramos para arrecadar dinheiro”, diz a presi-dente do Centro.

Os produtores e agricultores se adaptaram às novas regras. “Aqui todos respeitam e temem a polí-cia, a fiscalização. Se é proibido queimar, não queimam; se não pode cortar árvores, não cortam”, diz Rosemeire. A resposta da na-tureza às agressões pode ser mui-to perigosa para os moradores do campo. Em 2011, as chuvas de verão provocaram deslizamentos e transbordamentos de rios. Este ano, por causa da seca, um incên-dio destruiu, em outubro, mais de 2.500 hectares de mata na região da Serra do Papagaio. Segundo Rosemeire, “a população já en-tendeu que depende do meio am-biente preservado para viver bem”.

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Dia de missa na pequena igreja de São Sebastião, onde boa parte

da comunidade se reúne

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Um lugar especialAssim, Campo Redondo é um lugar especial. Em meio às araucárias, avistado do alto da estrada, o bair-ro rural é um conjunto de casas – a maioria branca, de janelas e portas azuis, com quintais gramados, árvo-res floridas, galinhas soltas e cachor-ros dormindo. A pequenina igreja de São Sebastião, também branca e azul, se destaca na paisagem, com-posta ainda pela fumaça dos fogões a lenha. Em torno da igreja fica a praça, com bancos de concreto, can-teiros de flores, árvores frutíferas, o anfiteatro, o Centro Comunitário e o que chamam de “shopping center”: o Bar Barbosa, que serve a comida ca-seira da dona Neiva, oferece a mesa de sinuca e o espaço do forró, pro-grama de todo domingo à noite.

Lixo na rua não se vê. “Ninguém joga”, diz Rosemeire. Ela e Edwirges destacam a qualidade de vida do lo-cal. A escola foi considerada a me-lhor entre todas as dos municípios que integram o circuito das Terras Altas da Mantiqueira. “Lá (na escola) se ensinam valores”, diz Edwirges. Com cerca de 500 moradores, a co-munidade tem um posto de saúde com médico três vezes por semana e dentista (uma vez). Praticamente to-das as casas têm fossa. A água che-ga encanada, mas é de mina, pura e

cristalina. Cinco vendinhas garantem o abastecimento local, com produ-tos de higiene e alimentação, mate-rial de construção e ração.

Campo Redondo não tem nem bom-ba de gasolina. A comunicação é feita por um orelhão, mas, recente-mente, os moradores se cotizaram para instalar internet via rádio, junto à torre de TV. Celular, independente-mente da operadora, não funciona. Os produtores resolveram diversifi-car e estão apostando na criação de cogumelos, trutas e na produção de mel, que fornecem para as cidades turísticas próximas, como São Lou-renço, Caxambu e Itamonte.

Durante a semana, a vida corre tranquila. Mas nos fins de semana, principalmente aos domingos, o bairro recebe muitos visitantes. São moradores das comunidades vizi-nhas que chegam para o futebol, o banho na cachoeira, o bate-papo no Barbosa e para o forró. Junto com eles chegam também os turis-tas. Esses são, na maioria, morado-res que vivem nos centros dos mu-nicípios da Mantiqueira e buscam a diversão no campo.

Foco no turismoFoi passando um fim de semana em Campo Redondo que o uru-guaio Jorge Tupamaro conheceu

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3.0Campo Redondo recebe muitos visitantes aos domingos

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sua mulher, a Rosemeire do Centro Comunitário, e acabou se mudando para o lugar. Ele chegou ao Brasil em 1978, vindo de carona para um Congresso da União Nacional dos Estudantes em Salvador. “No meio do caminho, um argentino me con-vidou a ir com ele até São Lourenço, onde acabei arrumando trabalho e morando”, conta Jorge, que trabalha como fotógrafo e cinegrafista, acu-mulando ainda a vice-presidência do Centro Comunitário.

Como o fotógrafo, cada vez mais pessoas são atraídas pela zona rural. Ninguém chega a esses lugares indi-cado por agências de viagens nem se hospeda em hotéis ou pousadas. A indicação é feita boca a boca, por convite de quem conhece ou mora no local. Começa com um passeio de um dia e, depois, aluga-se a casa de um morador para passar o feria-do ou o fim de semana. “As famílias moram em terrenos grandes e os filhos acabam construindo nesses terrenos. Quando chega alguém, eles alugam uma das casas e ficam todos numa só”, explica Jorge. Desse jeito, é possível desfrutar da vida no campo como ela realmente é.

Teoricamente, o turismo é um forte aliado do desenvolvimento susten-tável nessa região, mas também pode ser uma ameaça tanto à na-

tureza quanto ao estilo de vida das pequenas comunidades “enfiadas” nas montanhas.

Os municípios da Serra da Manti-queira têm como atrativo principal o turismo, agregado à fabricação de laticínios, doces e à confecção de artesanato em palha e bambu. Ali estão os Circuitos das Águas e das Terras Altas da Mantiqueira. O primeiro é formado pelos municí-pios de São Lourenço, Caxambu, Cambuquira e Lambari, integrando também Baependi. O outro reúne, entre outras, as cidades de Alagoa, Aiuruoca, Itamonte e Pouso Alto.

Hotéis e pousadas, principalmente as que ficam no Circuito das Águas, onde a área urbana é predominan-te, apostam nessas áreas rurais para oferecer um turismo alternati-vo e mais ecológico.

Para algumas pessoas, a falta de infraestrutura, como pavimentação de estradas e construção de pou-sadas, atrasa o desenvolvimento do turismo nessas localidades. Para outras, porém, o que faz a di-ferença é justamente a preservação do estilo de vida em que o tempo anda sem pressa, a exemplo dos tropeiros que preferem os burros aos veículos com tração – só para terem mais tempo de contemplar a natureza.

O uruguaio Jorge Tupamaro: atraído pelo encanto da região,

no Parque Estadual da Serra do Papagaio (foto do meio)

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Espécies ameaçadasEm dezembro, foram divulgadas as listas vermelhas de espécies amea-çadas da fauna e da flora brasileiras. Este levantamento, ao contrário dos anteriores, que era feito por amos-tragem, conseguiu investigar a quase totalidade das espécies observadas em nosso território. Com isso, o nú-mero de espécies avaliadas passou de 816 (em 2003) para 6.840. Duzen-tas e cinquenta e nove espécies que figuravam na relação anterior já não aparecem na nova, pois deixaram de ter o status de ameaçadas. Por ou-tro lado, 720 foram incluídas na lista, que agora conta com um total de 3.286 espécies.

As novas listas vermelhas podem ser acessadas em bit.ly/listavermelha.

Calor históricoSentiu muito calor em 2014? Pois saiba que este foi o ano mais quente desde que a meteorologia começou a registrar as temperaturas na superfície e nos oceanos, o que começou a ocorrer em 1880. A informação foi confirmada tan-to pela agência espacial norte-americana, a Nasa, quanto pela Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (Noaa). Anteriormente, a agência

meteorológica japonesa também havia chegado à mesma conclusão.

A média aferida em todo o planeta foi de 14,6 graus Celsius. Dentre os dez anos mais quentes da história, nove são do século 21, o que, de acor-do com os cientistas, pode ser atribuído às mu-danças climáticas provocadas pelas emissões de gases do efeito estufa.

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Ano dos SolosA Organização das Nações Unidas (ONU) decidiu: 2015 é o Ano Internacional dos Solos. A entidade procura, com essa decisão, chamar atenção para a importância de um bem natural tão frágil e frequentemente degradado – de acordo com a Organização para Alimentação e Agricultura (FAO), um terço da superfície terrestre já está afetado por fatores físicos, químicos ou biológicos, necessitando de recuperação ou descontaminação.

Para este ano estão programadas diversas atividades, com destaque para a realização da primeira Conferência Global sobre Biodiversidade dos Solos, na França. A ONU promete para logo em seguida o lançamento do primeiro relatório Estado dos Recursos do Solo Mundiais.

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Transporte sustentável

Em vez de cinco pessoas fazendo o mesmo trajeto em seus próprios au-tomóveis, que tal juntar todas num mesmo carro, com direito a bate-pa-po animado e despesas divididas, reduzindo também a poluição e o engarrafamento? Esta é a proposta da Tripda, uma plataforma online gratuita criada na cidade de São Paulo que procura incentivar o trans-porte solidário.

Mais do que apenas promover o en-contro entre quem procura e oferece carona, a iniciativa valoriza aspectos como afinidade e segurança. Assim, é possível determinar se você acei-ta transportar animais, se gosta de música e qual seu estilo preferido ou se é permitido comer e fumar dentro do veículo. O passageiro também pode verificar antecipadamente o modelo do carro, se há espaço para bagagem ou se tem ar condiciona-do. A própria plataforma sugere um preço para o rateio das despesas, de acordo com o trajeto percorrido, considerando o preço do combustí-vel, o consumo médio do automóvel e, se for o caso, possíveis pedágios ao longo do caminho.

Após a viagem, é possível fazer mo-toristas e passageiros podem se ava-liar, o que ajuda a construir um ban-co de dados sobre a confiabilidade dos usuários do serviço. Para quem quiser experimentar, o endereço é www.tripda.com.br.

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Mobilidade premiadaO Brasil tem ainda um longo caminho a percorrer na questão da mobilidade urbana, mas três capitais ganharam um incentivo a mais para continuarem em busca de soluções. Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo conquis-taram o Sustainable Transport Award (“Prêmio de Transporte Sustentável”), oferecido há dez anos pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvi-mento (ITDP) e, até então, jamais vencido por uma cidade brasileira.

A cerimônia de premiação foi realizada em Washington, nos Estados Unidos, no dia 13 de janeiro. Rio de Janeiro e Belo Horizonte foram contemplados pela implantação dos chamados BRTs, ônibus articulados que trafegam em vias exclusivas. São Paulo, por sua vez, teve premiadas as iniciativas de criar corredores para ônibus e vias para ciclistas.

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Consumo: 35 anos decisivos

A permanecer o padrão de con-sumo atual, o mundo caminha para uma situação de colapso. Em 2050, a população estima-

da do planeta será de nove mi-lhões de habitantes, que precisarão

de mais alimentos (em torno de 60%), água (40%) e energia (50%).

Segundo o diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o brasileiro José Graziano, é preciso transformar o modelo agrícola que tem sido utilizado nas últimas décadas, do contrário não será possível atender as necessidades das gerações futuras.

Para Graziano, não se trata mais de fazer uma dicotomia entre alimentos e combustíveis, mas de discutir seriamente o aproveitamento do solo para a produção de biocombustíveis e a redução do desperdício de alimentos.

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pErfil

Tião Santos, catador que ganhou fama com o

premiado documentário Lixo Extraordinário, se dedica a

semear uma nova consciência ambiental

Katia Costa

A vida de Sebastião Santos, 35 anos, virou de cabeça para baixo após sua participação no filme Lixo Ex-traordinário, indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2011. Ele passou a infância ajudando a mãe, que trabalhava como catadora no maior lixão da América Latina, o de Gramacho, no município de Duque de Caxias (RJ). Mas Tião, como é co-nhecido, acabou ganhando o mun-do por conta de um projeto social realizado pelo artista plástico Vik Muniz naquela comunidade. Inspi-rado no quadro “A Morte de Marat”, pintado por Jacques-Louis David em 1793, Muniz fotografou Tião em uma banheira esculpida com materiais reciclados, transformando a imagem em uma valiosa obra de arte leiloada por R$ 100 mil em Londres, na In-glaterra. “Foi um divisor de águas em minha vida”, admite.

Assim como um dos mártires da Revolução Francesa, o “Marat brasi-leiro” exerce papel de liderança nas camadas mais populares e mostra ao país e ao mundo o valor dos ca-tadores de material reciclável – seja por meio de palestras ou em seu tra-balho diário na implementação de um polo de reciclagem de resíduos sólidos no atual Aterro Metropolita-

Um plantador de sementes

Tião Santos, retratado pelo artista plástico Vik Muniz com inspiração no quadro “A Morte de Marat”

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no do Jardim Gramacho. Tião tam-bém coordena a logística nacional do Movimento Limpa Brasil Let́ s Do It, que busca a conscientização da população sobre o descarte correto nas principais cidades brasileiras.

“A escassez de recursos naturais impõe uma nova atitude por parte das pessoas, pois a ordem é pre-servar e recuperar recursos. Como cerca de 90% de todo o material para reciclagem passa pela mão do catador, sem ele não há cadeia pro-dutiva sustentável”, analisa.

Experiências em várias partes do mundo comprovam que a recicla-gem ajuda a diminuir e prevenir os impactos ambientais, além de criar mecanismos que auxiliam a lidar com os resíduos orgânicos e recicláveis. Na contramão, o Brasil deixa de ganhar R$ 8 bilhões por não reciclar e produz uma média de 240 mil toneladas de lixo por dia, ou seja, 1,5 kg por habitante. “Desse montante, somente 40% são reci-cláveis; dos 60% restantes, 45% são resíduos orgânicos e 15% podem ser utilizados como energia. Afinal, o que é lixo?”, pondera Tião.

Ele ressalta que a percepção equi-vocada sobre o que nos acostu-

mamos a chamar de lixo incentiva ainda mais o preconceito contra os catadores e sua função, dificultan-do o trabalho de coleta seletiva, es-sencial para o êxito da Política Na-cional de Resíduos Sólidos (PNRS). Instituída em 2010, a lei determinou a erradicação dos lixões em todo o país – o prazo se encerrou em agos-to de 2014. A PNRS estabelece ainda o caminho que os resíduos devem percorrer e as responsabilidades de cada setor da cadeia produtiva.

Segundo Tião, os planos de ges-tão de resíduos sólidos ainda não decolaram nas administrações mu-nicipais. Somente em Gramacho, onde havia 600 catadores cadas-trados após o fechamento do lixão, em agosto passado, apenas cerca de 10% trabalham no local, que já não recebe os resíduos provenien-tes do sistema público de limpeza urbana. “Como o material continua sendo despejado em lixões a céu aberto de forma incorreta, 60% dos catadores permanecem neles, 30% estão nas ruas e somente 10% trabalham em cooperativas, sendo que apenas metade utiliza maqui-nário apropriado e equipamentos de segurança como exige a lei”, denuncia.

Jardim Gramacho: onde Tião Santos surgiu, como líder dos catadores de material reciclável

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ExtraordinárioIdealizado pelo produtor inglês Angus Aynsley e lançado em 2010, Lixo Extraordinário é um documentário filmado ao longo de dois anos, de agosto de 2007 a maio de 2009, dirigido por Lucy Walker e codirigido por João Jardim e Karen Harley. O foco foi o trabalho desenvolvido pelo artista plástico brasileiro Vik Muniz no aterro sanitário de Jardim Grama-cho, na Baixada Fluminense. Vik estimulava alguns catadores daquela comunidade a produzir obras de arte a partir de material que era jogado no lixo. Entre os sete catadores envolvidos no projeto, um deles se des-tacava: era Tião Santos, presidente da associação local de catadores. O documentário mostra como aqueles personagens tiveram suas vidas e suas percepções de mundo modificadas por meio da arte.

O filme foi exibido e premiado internacionalmente. Ganhou o prêmio do público para Melhor Documentário Internacional no Festival de Sundance, 2010; os prêmios da Anistia Internacional e do público na mostra Panorama do Festival de Berlim, também em 2010; e foi indica-do para concorrer ao Oscar de Melhor Documentário, em 2011.

Para ele, a solução reside nas cam-panhas de conscientização sobre a importância do descarte correto e na punição para quem não cumprir seu papel como cidadão. “É preciso conscientizar, mobilizar e sensibi-lizar a população para o descarte seletivo. A educação ambiental deve ser tema permanente nas escolas”, afirma, ”pois a mudança cultural de um país somente acontece por meio da educação”.

Sem perder a esperança, Tião sente-se “um grande saco de sementes”, disseminando seu discurso sobre reciclagem e sustentabilidade, eco-nomia de recursos e geração de renda entre catadores, acadêmicos, políticos e empresários, entre outros grupos da sociedade civil no país e no exterior – incluindo centros de estudos internacionais de excelência como Harvard e Yale.

“Aqui, o trabalho com resíduos sóli-dos ainda está associado ao comba-te à pobreza e à inclusão social, ao passo que nos países desenvolvidos se relaciona ao avanço da cidadania e à consciência ambiental”, conclui.

Em outubro, sua vida virou livro, lançado pela editora portuguesa Leya. Tião: do lixão ao Oscar retra-ta a história do líder catador desde a infância até o reconhecimento in-ternacional. Escrito em parceria com a jornalista Carolina Drago, está dis-ponível nas livrarias do país e reve-la um sonho de Tião: entrar para a universidade.

Catadores são 15 milhõesEm todo o mundo, de acordo com o Banco Mundial, chega a 15 mi-lhões o contingente de pessoas que vivem da coleta de material reci-clável, das quais quatro milhões estão na América Latina – e três quar-tos delas submetidas a condições de trabalho insalubres. A simples separação, em casa ou na empresa, do que é reciclável já seria uma atitude capaz de fazer a diferença. Segregar adequadamente os resí-duos permite um maior aproveitamento do que é descartado e pode favorecer uma cadeia de negócios que gera renda, inclusão social, au-toestima e sustentabilidade.

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prESErvação

Crescem iniciativas de conservação da Mata

Atlântica, com atenção especial à juçara, uma das espécies de palmeira mais

típicas da região

Cecília Banhara Marigo

Antes da chegada dos portugueses à costa brasileira, os índios davam à terra que habitavam o nome de Pin-dorama, que em tupi-guarani signifi-ca Terra das Palmeiras. Em algumas regiões da floresta, uma em cada quatro árvores era de uma mesma espécie: a juçara, exclusiva da Mata Atlântica e predominante entre as palmeiras nativas desse ecossistema.

A Mata Atlântica é um dos biomas mais ricos em biodiversidade e mais ameaçados do planeta. Original-mente, cobria cerca de um milhão e trezentos mil quilômetros qua-drados. A partir da colonização eu-ropeia, porém, foi sendo devastada durante os sucessivos ciclos de ex-ploração – do pau-brasil, do garim-po, da cana-de-açúcar, do café. Mas foi no século 20 que se tornou víti-ma de um desmatamento nunca vis-to. Hoje restam apenas cerca de 8% de sua área original, a maior parte em regiões de difícil acesso, nas ser-ras do Mar e da Mantiqueira. Esse intenso desmatamento foi devido ao aumento da população (concen-

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trada no litoral), à crescente urbani-zação e industrialização do país, ao consumo dos recursos florestais e à expansão das fronteiras agrícolas.

A novidade, felizmente, é o surgi-mento de uma mentalidade conser-vacionista, que teve início princi-palmente na comunidade científica. Embora muitos brasileiros ainda encarem as coberturas vegetais dos nossos ecossistemas como “matas inúteis”, essa visão está mudando e uma parcela da população já está consciente da importância e neces-sidade da conservação dos ambien-tes naturais para a própria sobrevi-vência humana.

A juçara e o palmitoDe nome científico Euterpe edulis, é uma palmeira típica das florestas pluviais das regiões litorâneas, ocor-rendo espontaneamente por todo o sul e sudeste do Brasil. Sua maior incidência se dá na região que vai do sul da Bahia ao Rio Grande do Sul. É encontrada também na bacia do rio Paraná, nas formações vegetais úmidas, principalmente nas matas ciliares.

A juçara é também conhecida como jiçara, içara ou ripeira, por causa do uso tradicional de seu caule na cons-trução em forma de ripas e caibros. Chamam-na ainda de palmiteiro, palmito-juçara, palmito-doce ou simplesmente palmito, devido à ex-tração do palmito comestível de seu caule.

A maior parte das palmeiras que produzem palmito comestível é na-tiva do Brasil. As mais utilizadas são o açaí, a pupunha, o buriti e a juça-ra. As duas primeiras são da região amazônica, a terceira é encontrada nas áreas úmidas do Cerrado do Brasil Central e a última é natural da Mata Atlântica. Seu palmito é o mais apreciado como alimento no-bre e iguaria tipicamente brasileira. Por causa do seu grande consumo,

o Brasil tornou-se o maior produtor e consumidor, e já foi o maior expor-tador.

O palmito é a parte terminal do caule, macia e branca, envolvida pe-las bainhas das folhas, próxima ao gomo de crescimento. Cada palmi-to extraído de palmeira monocaule provoca a morte da planta, pois seu meristema apical – grupo de células de crescimento – é eliminado. Por esse motivo, sua coleta na nature-za coloca em risco as espécies das quais é obtido, em especial a Euter-pe edulis, a mais procurada. Com a exploração ilegal, exemplares ima-turos são cortados, dificultando a regeneração das matas.

Os extratores de palmitos, chama-dos de palmiteiros, são contratados em regiões pobres. Entram na mata à noite, cortam e carregam dezenas. Um palmiteiro pode extrair até 200 unidades num dia. Após o corte, são levados a acampamentos clan-destinos, cozidos e embalados em condições de higiene precária ou vendidos a indústrias pouco escru-pulosas, que os compram indiscri-minadamente. Seu consumo acaba representando um risco à saúde.

Demanda e ameaça de extinção

Praticamente todo palmito brasi-leiro, com exceção da pupunha, é extraído de matas nativas. A espé-cie Euterpes edulis, com suas po-pulações drasticamente reduzidas, está extinta em várias áreas de sua ocorrência e encontra-se hoje na Lista Oficial de Espécies Ameaçadas de Extinção, afetando diretamente a fauna que dela se alimenta.

Uma alternativa seria o manejo silvi-cultural da juçara. Como é de cresci-mento lento, no entanto, seu cultivo para a produção de palmito torna-se economicamente inviável. O extrati-vismo ilegal continua, agravando sua

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Sementes da juçara são usadas como matéria-prima

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condição de espécie em extinção. É preciso que a sociedade se cons-cientize da sua importância ecológi-ca na preservação da floresta.

Recentemente, a pupunheira vem sendo cultivada para produção de palmito em vários estados do país. Além de ser ter a capacidade de re-brotar, apresenta outra vantagem para uso comercial: crescimento acelerado e precocidade de corte. Após 14 meses do plantio, começa a colheita, que segue a intervalos de 20 a 45 dias na mesma área. Para saber de qual palmeira é o palmito que está comprando, o consumidor precisa ler o rótulo do produto.

Com finalidade de preservação, a juçara pode também ser usada como planta ornamental – em va-sos, quando pequena, e em jardins, quando adulta. Possui porte médio,

alcançando de 10 a 20 metros de altura e 15 a 20 cm de diâmetro no caule. É uma palmeira elegante e bela, que pode ser mais explorada no paisagismo, plantada isolada-mente ou formando bosques. Sua beleza tropical enriquece a paisa-gem. Os frutos são muito atraentes para a fauna silvestre e seu cultivo é recomendado para quem aprecia a presença de pássaros no jardim.

Dispersão e seus agentes

A palmeira-juçara tem relevante im-portância na floresta por produzir frutos em abundância, que alimen-tam muitas espécies de animais silvestres, responsáveis pela sua reprodução e pela dispersão das sementes. É considerada uma es-pécie-chave, pois seus frutos ficam

Macaco-prego comendo os frutos da juçara

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maduros na época de menor oferta de alimentos. Floresce nos meses de setembro a dezembro e os frutos amadurecem de abril a agosto, po-dendo prolongar-se até novembro.

Para ter uma ideia da sua importân-cia como alimento para os animais nativos, uma pesquisa feita em co-munidades rurais indicou mais de 60 habitantes da floresta que utilizam seus recursos, de acordo com três categorias: os que visitam as flores, os que se alimentam dos frutos nos cachos e os que se alimentam dos frutos no chão.

Os visitantes florais são, na maio-ria, abelhas (africanas, europeias e nativas), seguidas de mamangavas, vespas, borboletas, outros insetos e beija-flores. Eles são essenciais para a reprodução da espécie, pois con-tribuem diretamente para a poliniza-ção de suas flores.

A maior variedade de animais cita-dos foi dos que se alimentam nos cachos, realizando assim a disper-são primária. É grande a riqueza de aves como tucanos, araçaris, suru-cuás, jacus, jacutingas, jacucacas, pavós, periquitos, sabiás, tiês e ma-míferos como macacos, morcegos, caxinguelês e raposas.

Quanto aos que se alimentam no solo, a maior variedade foi de mamí-feros como cateto, queixada, paca, cotia, caxinguelê, quati, macaco, irara, anta, raposa, tamanduá, roe-dores, gambá, aves como macuco, nhambu e uru, e um réptil, o lagarto teiú.

A polpa dos frutosA juçara produz grande quantidade de frutos, dos quais se pode extrair a polpa de modo sustentável e pro-duzir um suco energético. O grande valor do uso dos frutos é deixar as plantas vivas, reduzindo a pressão sobre a espécie. A ideia do apro-veitamento da polpa para obtenção

da bebida açaí de juçara ou açaí da Mata Atlântica é relativamente re-cente, e muitos estudos vêm sendo realizados. O suco é semelhante ao do açaí da Amazônia (também do gênero Euterpes) na cor, no sabor e na textura, mas seu valor nutricional é ainda superior.

Os frutos maduros são colhidos no pé. O coletor escala o tronco até o topo, com auxílio de uma faixa chamada peconha. São seleciona-dos, higienizados e banhados em água morna, depois processados de forma artesanal, com o auxílio de peneira, ou utilizando uma má-quina despolpadeira. Daí restam as sementes, que são preparadas para o plantio.

Quando o palmito é cortado ilegal-mente, o palmiteiro recebe um valor insignificante em comparação com o que se consegue com a utilização dos frutos – geração de renda, me-lhora da qualidade de vida e inclu-são social. Em localidades serranas e litorâneas de Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, agricultores fa-miliares, comunidades tradicionais, caiçaras, índios e quilombolas já vêm trabalhando na produção de polpa e sementes, envolvidos em diversos projetos para utilização desse po-tencial econômico e alimentar e na repovoação da palmeira para a con-servação da floresta.

O fruto da juçara é mais sustentável para a população humana do Sul e do Sudeste porque é um produto da região, que não precisa percorrer longas distâncias para chegar até a mesa do consumidor.

Juçaí: superfruta antioxidante

O economista George Braile, intriga-do com a visão de jacus e tucanos se alimentando dos coquinhos das palmeiras de sua propriedade na

A juçara produz frutos em grande quantidade. O suco é semelhante ao açaí da Amazônia

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Serrinha do Alambari, em Resende (RJ), resolveu despolpá-los artesa-nalmente e testar sua utilização. Pesquisou sobre o valor nutricional da juçara, visitou vários projetos em outros estados para aprender a técnica e decidiu produzir a polpa para criar um sorvete. Foi instalada uma pequena fábrica para a produ-ção dos dois produtos: a polpa pura congelada e o sorvete, acondiciona-do em potinhos de 180 ml, com um mix de polpa acrescida de banana, mel e inhame. Foi a primeira polpa de juçara a ser registrada no Ministé-rio da Agricultura.

O juçaí, como Braile o denominou, tem três a quatro vezes mais antioxi-dante que o açaí, além de uma quan-tidade maior de ferro e potássio. Contém vários compostos saudá-veis, que possuem ação antioxidan-te, anti-inflamatória, antimicrobiana, anticancerígena, cardioprotetora e antialérgica, entre outras. É também importante para a saúde e o bem-es-tar físico como suplemento energé-tico e calórico, melhora a memória, reduz o risco de doenças coronárias e previne a hipoglicemia.

Projeto AmávelNa Área de Proteção Ambiental da Serrinha do Alambari, contígua ao Parque Nacional de Itatiaia, foi criado em 2008 o Projeto Amável – A Mata Atlântica Sustentável, que surgiu da preocupação com a destruição dos palmitais nativos pela extração do palmito. A iniciativa pretende explo-rar os recursos da palmeira juçara de modo sustentável, gerar renda para a comunidade local e preparar semen-tes e mudas para reflorestamento.

De acordo com Oscar Graça Couto, professor de Direito Ambiental da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e, junto com George Braile, cofundador do Projeto Amá-vel, a intenção é recompor o sta-tus que a palmeira já teve na Mata

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Atlântica. Para atingir esses objeti-vos, inicialmente foi preciso fazer o levantamento do potencial de frutos na Serrinha do Alambari, construir o centro de beneficiamento, formar a equipe e capacitá-la para a colheita dos frutos, a produção da polpa e de outros subprodutos, além de deixar as sementes aptas para o plantio.

Depois da extração da polpa, as se-mentes ainda servem como matéria--prima para artesanato. É possível criar joias e utensílios domésticos com sementes e fibras entrelaçadas. Um artesão é capaz de fazer mil co-lares por mês, e muitos coletores trabalham como artesãos na entres-safra.

Frente Pró-JuçaraDando continuidade ao Projeto Amável, foi criado o programa Frente Pró-Juçara, que pretende atingir as seguintes metas: (1) plantar, nos pró-ximos cinco anos, 10 milhões de pal-meiras-juçara nas florestas em que ocorre, no estado do Rio de Janeiro, para exploração sustentável dos fru-tos; (2) envolver no plantio pequenos agricultores familiares, comunidades indígenas e quilombolas, proprie-tários rurais, gestores de Unidades de Conservação, organizações não governamentais etc. para futura ex-ploração dos frutos; (3) desenvolver trabalhos de educação ambiental sobre a importância da Mata Atlân-tica e o papel da palmeira-juçara na proteção da biodiversidade, do solo, das águas e do clima; (4) converter os palmiteiros em plantadores da palmeira e coletores de frutos; (5) in-centivar o uso da polpa da juçara na merenda escolar como suco ou sor-vete; (6) cooperar, por meio do plan-tio de juçara, com empresas sujeitas à obrigação legal de compensar suas emissões de gases de efeito estufa; (7) auxiliar o estado do Rio de Janei-ro no compromisso de compensar as emissões de carbono dos Jogos Olímpicos de 2016; (8) incentivar o

manejo sustentável de espécies nati-vas da Mata Atlântica com potencial de geração de renda e alimento, em especial as que produzem frutos, es-sências, mel etc.

Os gestores do programa têm a in-tenção de doar milhões de sementes da juçara a quem se comprometer a plantá-las para repovoar a Mata Atlântica, enriquecendo-a e ajudan-do a manter sua biodiversidade.

A palmeira-juçara é um recurso im-portante, fundamental mesmo, para as comunidades que estão parti-cipando desta nova exploração de recursos naturais. Mas é também da mesma importância para a manuten-ção, o equilíbrio e o bom funciona-mento do ecossistema. Cabe ao ser humano encontrar os meios para seu manejo sustentável, aquele que permite a exploração humana sem exaurir o recurso natural.

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À esquerda, a coleta dos cachos. As sementes, depois, são armazenadas na estufa

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Paisagem da trilha que leva às praias da Júlia, da Bica e da Crena

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ECoturiSmo

Vegetação exuberante, trilhas, praias e cachoeiras atraem

ecoturistas à Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro

Texto e fotos: Mário Moreira

Poucos destinos no país são capa-zes de agradar tanto ao ecoturista quanto a Ilha Grande, no litoral sul do estado do Rio. Vegetação exu-berante, cachoeiras, trilhas na Mata Atlântica e, claro, belíssimas praias compõem o cenário perfeito para alguns dias de descanso e contato com a natureza. Tudo isso num lugar relativamente fácil de chegar e onde sequer circulam automóveis.

A ilha, como o próprio nome diz, é grande – aliás, enorme. O que signi-fica que um fim de semana é pouco para aproveitar todo o seu potencial, embora um bom par de dias por lá possa ser o revigorante necessário entre duas semanas de trabalho. O ideal, portanto, é ir pelo menos num feriadão. Ou ainda melho: passar lá uma semana nas férias de verão.

Para quem vai pela primeira vez, so-bretudo se for com crianças, o ideal é se hospedar em alguma das muitas pousadas da Vila do Abraão, o nú-cleo urbano da ilha, onde aportam as barcas que fazem a travessia a partir de Angra dos Reis (para quem chega de São Paulo) ou de Manga-ratiba (mais próxima do Rio). Os ho-rários das barcas são bastante res-

Grande e linda

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tritos (apenas uma saída por dia) e a passagem custa R$ 14 por pessoa. De Angra também partem escunas e lanchas, com pelo menos oito saídas diárias e preços de R$ 15 a R$ 40. Outra opção é pegar uma lancha ou escuna, com 11 partidas diárias, em Conceição de Jacareí (entre Angra e Mangaratiba); as tarifas vão de R$ 20 a R$ 30.

Não espere, porém, um serviço “padrão Fifa”. No embarcadouro de Angra dos Reis, por exemplo, não há banheiro ou lanchonete. Então o ne-gócio é ter espírito de aventura e se espelhar nos muitos mochileiros eu-ropeus que fazem a travessia e não parecem se importar tanto assim com o desconforto.

Outra dica importante é levar bas-tante dinheiro em espécie, já que na ilha não existem caixas eletrônicos – há somente dois pequenos pos-tos do Bradesco e da Caixa Econô-mica Federal. Quase ninguém por lá aceita cheque, e as transações com quem não trabalha com cartão de crédito ou débito, caso dos donos de táxi-boats (lanchas que fazem o transporte entre as praias), têm de ser feitas em dinheiro vivo mesmo.

Travessia deslumbrante

Uma vez iniciada a travessia maríti-ma, os senões vão ficando para trás à medida que a barca desliza pela Baía da Ilha Grande rumo à Vila do Abraão. O trajeto leva cerca de 90 minutos (tanto de Angra quanto de Mangaratiba), com direito a uma paisagem deslumbrante. Ilhotas de tamanhos e formatos diversos vão pontuando o canal até que, quase uma hora após a partida, surge a Ilha Grande propriamente dita. Com 193 quilômetros quadrados de área e apenas 5.000 habitantes, ela tem relevo montanhoso e litoral extrema-mente recortado, daí a existência de uma enorme quantidade de praias,

penínsulas e pequenas enseadas. Seu mapa, quase simétrico, asse-melha-se à figura de um caranguejo visto de frente. A ilha é tão extensa que abrange nada menos que três unidades de conservação: o Parque Estadual da Ilha Grande, o Parque Estadual Marinho do Aventureiro e a Reserva Biológica da Praia de Sul.

Antes mesmo de a barca aportar no atracadouro da Vila do Abraão, já dá para apreciar uma das principais atrações da ilha: o Pico do Papagaio, cujo formato lembra incrivelmente a

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ave que lhe dá nome. O morro, com 982 metros, é o segundo mais alto da ilha, só atrás do Pico da Pedra d Á́gua (1.031 metros), mas, por ser o mais vi-sível e característico, é muito mais fa-moso. Há uma trilha que leva ao topo do Pico do Papagaio, só recomendá-vel para os de ótimo preparo físico: são nove quilômetros (três horas só de ida), com trechos íngremes.

De qualquer maneira, a maioria das atrações da ilha pode ser alcançada por barco ou por trilhas que partem da praia do Abraão, onde fica a vila.

A praia não é ideal para banho, de-vido ao intenso movimento de em-barcações e à água um tanto suja – uma pena.

A trilha mais popular é a que se ini-cia no canto direito do Abraão e que leva, em sequência, às praias da Júlia, da Bica, da Crena e, por um desvio do caminho principal, à do Abraão-zinho. Das três primeiras, destaca-se a da Crena, certamente uma das mais bonitas da ilha, a 800 metros da Vila do Abraão. Leva-se meia hora para chegar lá, sem grande sacrifício,

Rochedos da Praia da Feiticeira, onde se formam

piscinas naturais ótimas para banho

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mas o visual compensaria qualquer esforço. A Praia da Crena fica numa pequena enseada cercada de vege-tação densa e com vista privilegiada do Pico do Papagaio, atrás do qual o sol se põe, num cenário inesque-cível. As águas bem calmas e não muito frias ajudam a tornar a Crena um passeio obrigatório, preferencial-mente à tarde, para apreciar o cre-púsculo.

Já a Praia do Abraãozinho, que exi-ge mais uns 20 minutos de trilha, é acessada mais facilmente da Vila do Abraão por meio dos táxi-boats, que cobram R$ 5 por pessoa em cada sentido. Com dois restauran-tes perto de uma das extremidades, o Abraãozinho é o passeio mais popular entre as famílias. As águas também são calmas; o visual, lindo; mas o agito, claro, é muito maior. É um local excelente para passar um dia inteiro, devido à melhor infraes-trutura.

Outra praia que desfruta de grande popularidade é a de Lopes Mendes, considerada por muitos a mais boni-ta de toda a Ilha Grande. É também a de mais fácil acesso, dentre as de mar aberto. Com 2,8 quilômetros de extensão de areia fina e água cristali-na,a praia possui também uma gran-

de quantidade de amendoeiras, que garantem a sombra necessária para passar muitas horas no local. Mas o mar ali é mais agitado, favorecendo a prática de surfe em alguns trechos. Para quem está com crianças ou sim-plesmente não quer enfrentar ondas maiores, o melhor é se instalar numa das extremidades, onde a diversão é procurar siris e caranguejos entre as pedras. Para chegar a Lopes Men-des, onde as embarcações são proi-bidas de atracar, o melhor é pegar um táxi-boat até a praia do Pouso (R$ 20 por pessoa em cada sentido) e de lá tomar a trilha que conduz a Lopes Mendes, com alguns trechos de subida, que leva cerca de 30 mi-nutos para ser percorrida. Para os mais dispostos, uma alternativa é fa-zer a trilha completa desde a Vila do Abraão, numa caminhada de duas horas e meia.

Passeio múltiploUma vantagem dos táxi-boats é que você pode contratar um pacote in-cluindo várias praias num único pas-seio. É possível, por exemplo, combi-nar uma ida à Lagoa Azul (no litoral norte da ilha, a 45 minutos de lancha da Vila do Abraão) com paradas em praias diversas durante o retorno.

A Praia da Crena, bem mansa e cercada de vegetação, é um convite ao relaxamento. Ao centro, a Praia do Abraão, onde atracam as embarcações que trazem os turistas

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Um roteiro desse tipo, saindo por volta das 9h e retornando lá pelas 17h, pode sair por até R$ 80 por pes-soa – mas vale sempre negociar com o taxista.

Uma das principais atrações locais, a Lagoa Azul é na verdade uma pe-quena enseada de águas rasas e normalmente muito azuis, onde é possível, com a ajuda de snorkel, ob-servar peixinhos coloridos nadando ao redor. O melhor é ir cedo, antes que uma quantidade muito grande de lanchas e embarcações maiores atrapalhe a fruição do lugar.

No retorno à vila, pelo menos duas paradas são obrigatórias. A primei-ra é a Praia do Amor, que fica numa enseada bem maior conhecida como Saco do Céu, um verdadeiro santuá-rio ecológico, por sua biodiversida-de. A praia em si é bem pequena e bastante concorrida, o que inclui a companhia nem sempre agradável de escunas coalhadas de turistas. Mas o visual em volta é sensacional. Não por acaso, o Saco do Céu é o lo-cal onde se concentram as maiores mansões da Ilha Grande.

A segunda parada indispensável é a Praia da Feiticeira, que leva esse

nome pela proximidade com a Ca-choeira da Feiticeira, outra das atra-ções da ilha, com 15 metros de que-da. Chegar até a cachoeira, porém, não é desafio dos mais simples: a tri-lha é íngreme e leva pelo menos 30 minutos. Muito mais tranquilo é ficar pela praia, cujo principal atrativo são os rochedos localizados na extre-midade direita. Ali, entre as pedras, formam-se pequenas lagoas, ótimas para banho.

Além de todos esses locais, a Ilha Grande possui muitos outros atrati-vos, principalmente nas áreas mais distantes da Vila do Abraão, mas que em geral demandam embarca-ções maiores, como saveiros ou es-cunas. As agências que oferecem os passeios são inúmeras na vila, basta pesquisar. Na semana que o autor desta reportagem passou na ilha, porém, o mar estava muito agitado na costa de mar aberto, e muitos barqueiros e taxistas preferiam evi-tar esses locais – que incluem nomes sugestivos como Lagoa Verde, Gruta do Acaiá, Praia do Aventureiro e Ilha do Jorge Grego.

Há muito mais a descobrir, portanto. Fica o convite...

*Os valores em dinheiro mencionados na reportagem referem-se ao mês de outubro de 2014.

A Praia do Amor, no Saco do Céu, é uma das menores da ilha, mas a

paisagem é linda

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O imbróglio do clima: ciência, política e economiaJosé Eli da Veiga, Luiz Carlos Baldicero Molion, Petterson Molina

Vale e Sonia Maria Barros de Oliveira (organizadores)

Editora Senac São Paulo, 2014, 168 páginas

Relatórios do Painel Intergovernamental sobre a Mudança do Clima da ONU falam sobre o aquecimento global provocado pelas atividades humanas,

principalmente a queima de petróleo e carvão. Mas vários argumentos são refutados por modelos que apontam causas naturais para a variação do

clima no planeta. Este livro apresenta o estágio atual das discussões sobre o aquecimento global, mostrando as perspectivas científicas de tratamento do tema e seus desdobramentos nas áreas política e econômica. O objetivo

é fomentar o debate, oferecendo um aparato sólido e crítico para refletir sobre uma das questões mais recorrentes nas sociedades contemporâneas.

De áreas degradadas a espaços vegetadosPatrícia Mara Sanches

Editora Senac São Paulo, 2014, 280 páginas

Fruto de pesquisa acadêmica da autora Patrícia Mara Sanches, o livro busca respostas e soluções inovadoras, em vários centros urbanos, para os se-

guintes questionamentos: como as áreas degradadas podem ser recupera-das de forma a otimizar as condições do ambiente e revitalizar a paisagem urbana? Quais critérios ajudam a definir as prioridades para o melhor uso dos recursos disponíveis? Como tomar decisões apropriadas no trato dos

espaços livres urbanos? A obra traz casos de sucesso e apresenta cri-térios urbanísticos, sociais, ecológicos e paisagísticos que devem ser levados em conta na avaliação do potencial de uma área degradada

para ser convertida em área verde.

Meio ambiente & mobilidade urbanaEduardo Fernandez Silva

Editora Senac São Paulo, 2014, 318 páginas

Ao apresentar iniciativas adotadas mundo afora e comentar sobre a legislação brasileira nas diversas interfaces do tema,

o autor nos faz compreender como o futuro da mobilidade se constrói sobre as heranças físicas, institucionais e culturais da

história e depende de decisões tomadas no cotidiano, tanto indivi-dual quanto coletivamente. A obra mostra como e por que o estudo da mobilidade urbana deve considerar tudo o que entra e sai das cidades,

bem como a movimentação que ocorre dentro delas. E reforça que não se pode pensar em soluções sem associá-las a novas maneiras de ocupação e uso do solo. E defende que é preciso buscar aborda-

gens novas para possibilitar às pessoas maior acessibilidade.

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