sebenta espiritualidade parte vii

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Instituto Diocesano de Estudos Pastorais (IDEP) ESPIRITUALIDADE SÉC. XV - XVI Pe. José Carlos A.A. Martins

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Instituto Diocesano de Estudos Pastorais (IDEP)

ESPIRITUALIDADE SÉC. XV - XVI

Pe. José Carlos A.A. Martins

Instituto Diocesano de Estudos Pastorais (IDEP)

FILIPE DE NERI [E O ORATÓRIO]. (1515-1595)

Nasce em Florença numa família modesta embora da nobreza

provincial. Rapaz alegre, simpático, pacífico nos seus modos, dificilmente se

enraivecia. Pela bondade da sua natureza era chamado de “Filipe Bom”. A

estas qualidades de temperamento juntava uma espontânea religiosidade. Aos

18 anos Filipe deixa Florença e transfere-se para junto de um tio paterno, muito

rico, que habita junto a Montecassino. Aqui conhece os monges beneditinos: a

sua vida é de oração e de silêncio. Nele começam a surgir também os desejos

próprios da idade juvenil. Por um lado a vida monacal e por outro a vida que

tinha o seu tio como rico.

Durante esta estadia de alguns meses, outro lugar que teve muita

importância para as suas escolhas futuras, foi o monte chamado de “Montanha

parada” esse lugar beneditino, com o santuário da Trindade, onde Filipe se

recolhia somente para rezar e meditar sobre a paixão e o crucifixo.

Um dia ele sente-se como que iluminado e comovido e decide voltar as

costas à riqueza e decide ir a Roma e ali encontrar uma resposta para a sua

inquietação vocacional. Hospedado numa família Florentina, trabalha como

preceptor dos seus filhos e ao mesmo tempo frequenta alguns cursos de

filosofia e teologia na Universidade de Roma.

Mais de que se dedicar à vida intelectual, ele queria ajudar o próximo.

Encontrou-se com Inácio, Francisco Xavier e outros jesuítas que em 1538

chegaram a Roma para se colocarem ao serviço da Igreja. As sua relações

mais estáveis foram com o Oratório ou Companhia do Divino Amor.

Sob este nome existiam várias associações e confrarias que em

diversas cidades de Itália tinham uma singular importância no movimento de

espiritualidade e de actividade caritativa até ao fim do séc. XV e início do XVI.

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O mais conhecido de entre todos é o romano S. Jerónimo da caridade.

Este nasce por volta de 1515 com sede na igreja de Santa Doroteia, de qual

um dos seus principais membros senão mesmo fundador, foi S. Caetano, que

depois fundará a ordem dos clérigos regulares, os Teatinos. O Oratório de

Roma contou entre os seus membros os principais promotores da reforma da

Cúria Pontifícia, mais tarde eleito Papa com o nome de Paulo IV.

Estas associações tinham como ideal a santificação, favorecendo uma

sólida piedade e um exercício prático do amor para com Deus e para com o

próximo, em particular nos hospitais. Neste ambiente de oração e de serviço

Filipe vive alguns anos. No Pentecostes de 1544, nas catacumbas de S.

Sebastião, teve uma profunda experiência mística. Em Maio de 1551 foi

ordenado sacerdote e foi habitar para o Oratório de S. Jerónimo da caridade,

onde já moravam alguns sacerdotes. “S. Jerónimo” converte-se num centro

comunitário para os sacerdotes seculares. Rezava-se e celebrava-se a missa e

faziam-se obras de caridade, tudo isto livremente sem uma regra determinada.

Este centro comunitário torna-se a base para a “Congregação do Oratório”.

Filipe amava condividir a sua vida com os outros. Não lhe agradava que os

padres vivessem sozinhos e por isso começa a reagrupar e a reunir, a gerar os

fundamentos de uma vida em comum, familiar, que pudesse servir à perfeição

humana e cristã.

Participavam na vida destes grupos sacerdotais também pessoas leigas

e de diversos estratos sociais. O Oratório de S. Filipe apresenta-se como uma

unidade livre de vários cristãos, chamados a várias funções em horas

determinadas por práticas religiosas em comum e pela escuta da Palavra de

Deus, tudo de modo muito familiar. Na espiritualidade do Oratório mostrou-se

patente a personalidade viva de Filipe e isto levou a que se tornasse numa das

personalidades mais populares de Roma.

Pela sua originalidade e espontaneidade e pelo sigilo da autenticidade

cristã, o Oratório Filipino torna-se um maravilhoso instrumento de reforma da

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vida cristã; isto parecia renovar o espírito da primeira comunidade cristã, onde

todos eram um só coração e uma só alma.

Era uma sua convicção que a vida espiritual, considerada

particularmente como algo de aborrecido, se tornasse familiar e doméstica em

cada pessoa, que se tornasse grata e fácil em casa de cada um, clérigo ou

leigo, prelado, príncipe, pai de família ou consagrado, artesão ou erudito, de

modo que todos eram capazes de a viver.

Os escritos de Filipe (cartas, poesias, fragmentos) são poucos e quase

todos redigidos por outros, tendo dele praticamente só mesmo a sua

assinatura. De destacar, a sua profunda devoção a Maria, invocando-a com o

título de “Mater Gratiae”.

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CARLOS BORROMEU (1538-1584) E A REFORMA

TRIDENTINA

Entre aqueles que durante a segunda metade do Séc. XVI, se

empenham na acção de reforma apresentada pelo Concílio de Trento (1545-

1563), encontra-se em primeiro lugar S. Carlos Borromeu. Nascido em Milão

numa família de tradição pontifícia como eram os Medici, foi destinado à vida

eclesiástica; assim, aos sete anos recebeu a tonsura eclesial. Estuda em

Pádua. O seu tio foi eleito Papa, Pio IV, e fez cardeal o seu sobrinho Carlos

com apenas 22 anos. Trabalhou muito perto do seu tio, para colocar em prática

as reformas do Concílio de Trento. Sendo ainda diácono quer ser ordenado

presbítero em Julho de 1563. Para a ordenação faz os exercícios espirituais de

Sto Inácio, que o influenciarão durante toda a sua vida espiritual. Em Dezembro

do mesmo ano foi consagrado arcebispo de Milão com 25 anos.

Durante todo o seu episcopado, Carlos Borromeu foi um grande

pregador. Geralmente pregava todos os domingos pelo menos uma vez. Por

dia tinha discursos três ou quatro vezes diferentes para abordar vários temas.

Preparava-se sempre muito bem. É importante salientar como ele fazia as

visitas pastorais às paroquias; a sua chegada era sempre precedida por alguns

dias em que primeiro um grupo de sacerdotes pregavam e confessavam. As

visitas pastorais eram minuciosas a ponto de terem relatórios detalhados, e de

decretos para que estes não ficassem letra morta! Para isso mandava

inspectores para averiguar do seu cumprimento. Assim a maior diocese do

mundo foi sendo aos poucos organizada segundo as reformas saídas do

Concílio de Trento.

O Seminário, fundado durante o seu episcopado, foi confiado a um corpo

de sacerdotes diocesanos (com este fim fundou os “Oblatos de Sto. Ambrósio)

com o objectivo de dar ao clero de Milão unidade de formação espiritual e

intelectual.

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A essência principal da espiritualidade sacerdotal de Carlos Borromeu é

o de Cristo Bom Pastor. Os passos bíblicos onde podemos encontrar isto nos

seus escritos são frequentes, como o mostram muitas das suas obras.

O objectivo principal das suas preocupaçoes era o de dar à sua diocese

padres excelentes, elevar em todos os sentidos a qualidade do clero, insistir

continuamente na sua responsabilidade e, em primeiro lugar, tender à

perfeição apostólica. S. Carlos compreende rápido que o impulso renovador

era em vão sem a reforma daqueles que teriam a responsabilidade de a

colocar em prática. A primeira reforma foi para os cónegos da sua catedral.

Depois procedeu a uma nova organização territorial e administrativa da diocese

e uma reforma da prática da vida da fé. Começou a reforma por si próprio, isso

mesmo o disse numa carta ao tio, Papa.

Outra característica da pastoral de Carlos Borromeu é o seu carácter

comunitário, centrado sobre o valor humano e cristão da família, em particular o

papel dos pais. S. Carlos é incansável no chamar os pais e em lembrar-lhes a

sua grande responsabilidade na educação dos filhos.

S. Carlos salienta a importância do ministério apostólico dos leigos.

Assim ele soube valorizar as numerosas associações de fieis leigos e

movimentos laicais que existiam.

Carlos Borromeu é sem dúvida o melhor exemplo para reconhecer a

vasta e longa acção reformadora iniciada pelo Concílio de Trento. Aqui as

diversas tendências reformadoras ja existentes, com excepção das Luteranas,

uniram-se. Nas suas 25 sessões, o Concílio afronta as questões colocadas

pelos Protestantes, entre as quais as que dizem respeito à Sagrada Escritura e

à Tradição, com uma particular atenção à interpretação e à leitura da dos

textos bíblicos, para melhorar a formação do clero e a pregação.

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O Concílio evita o pessimismo antropológico que já Erasmo tinha

observado na teologia Luterana. Descrevendo, depois, o dinamismo da vida

cristã, que não se limita à confiança na fé, mas compreende uma complexidade

de comportamentos da liberdade humana, o Concílio releva que o pecador está

sempre justificado pela fé, porque a fé em Cristo “é o princípio de uma

salvação, o fundamento é a raiz de cada justificação, sem a qual é impossível

agradar a Deus” e fomentar a comunhão com Ele.

A Reforma protestante não teve muito efeito em Espanha nem em Itália

graças ao fermento renovador e operante, em especial através das figura aqui

tratada.

O Concílio de Trento deu à vida Cristã um robusto ancoramento

teológico, sacramental e espiritual. No seu centro colocou-se a Eucaristia,

entendida sobretudo como “Presença Real” de Cristo o que favoreceu o culto

eucarístico fora das celebrações, a adoração ao Santíssimo Sacramento, em

paralelo com a prática da confissão frequente.

Trento relançou a catequese e a importância dos santos como reflexo

humano da santidade divina, como intercessores na obra salvífica de Cristo e

ajuda moral, encorajante, no seu seguimento. Infelizmente, a esperança da

reforma tridentina foi depressa uma desilusão no “depois” Trento, por causa da

polarização dada entre Reforma e Contra Reforma, que durou até ao fim com

Concílio Vaticano II, ou seja até aos nossos dias.