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ESPAA, 2012/13 — Área de Integração, Tema 4.1: A identidade regional — Professor Paulo Sousa p. 1 Neste tema estudaremos a região. A primeira parte será teórica, a segunda será prática. Sugere-se ao alunos que alunos observem bem o que se passa à sua volta e aproveitem para dar alguns passeios, falar com os mais velhos e prestar atenção às pessoas ao lado de quem viajam nos autocarros. I Factores físicos ou naturais 1. Geologia e morfologia 1.1. História geológica do Algarve A geologia é a ciência que estuda a constituição, a formação e a evolução das rochas e o movimento das placas tectónicas. O estudo geológico de uma região permite-nos compreender algumas das condições e potencialidades que ela tem, por exemplo, para as actividades económicas, os recursos hídricos, o planeamento urbano ou as normas a ter em conta na construção de edifícios e obras públicas, por exemplo. O Algarve é uma zona sensível aos riscos sísmicos, devido: 1) à proximidade do banco de Gorringe (E-SW de Sagres) e de outras importantes falhas tectónicas ativas. A actividade sísmica pode ser observada e em http://www.meteo.pt/pt/sismologia/actividade/. Ao longo da serra algarvia, em especial na Serra de Monchique, ocorrem semanalmente vários pequenos sismos que não são sentidos pelas pessoas (círculos brancos na imagem). Os sismos registados ao longo da costa acompanham a falha que separa as placas europeia e africana, que se deslocam a velocidades e em direcções diferentes, criando linhas de tensão. As regras de construção e os planos da Protecção Civil, por exemplo, têm de ter em conta a possibilidade de ocorrência de um grande sismo. Tendo em conta a regularidade de, aprox., 200 anos entre grandes sismos e o facto de o último ter ocorrido há 260 anos, há cerca de 50 anos que se espera o próximo. Rochas do Algarve Existem na região três grandes tipos de rochas: plutónicas, sedimentares e metamórficas. Correspondem a diferentes períodos da história geológica da região. Os processos através dos quais se formaram essas rochas e os solos da região são igualmente diferentes. Rochas plutónicas:Algumas das rochas do Algarve testemunham os movimentos das placas e alguma atividade vulcância ocorrida no passado: na Serra de Monchique encontramos uma grande massa de rocha plutónica (sienito) que se formou a grande profundidade, arrefecendo lentamente, caracterizada por grandes critais (quanto mais rápido é o arrefecimento, menores são os cristais). O sienito é uma rocha de aspecto (e origem) semelhante ao granito, mas de diferente composição química. Junto à localidade da Nave existe uma pedreira, da qual se extrai sienito para a produção de rochas ornamentais e outros fins. As fontes termais (fontes de água quente) das Caldas de Monchique indicam a presença de falhas geológicas activas: são zonas onde o calor do interior do planeta chega mais perto da superfície. 15/10/2012

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Page 1: Sebenta Algarve

ESPAA, 2012/13 — Área de Integração, Tema 4.1: A identidade regional — Professor Paulo Sousa p. 1

Neste tema estudaremos a região. A primeira parte será teórica, a segunda será prática. Sugere-se ao alunos que alunos observem bem o que se passa à sua volta e aproveitem para dar alguns passeios, falar com os mais velhos e prestar atenção às pessoas ao lado de quem viajam nos autocarros.

I – Factores físicos ou naturais 1. Geologia e morfologia

1.1. História geológica do Algarve

A geologia é a ciência que estuda a constituição, a formação e a evolução das rochas e o movimento das

placas tectónicas. O estudo geológico de uma região permite-nos compreender algumas das condições e

potencialidades que ela tem, por exemplo, para as actividades económicas, os recursos hídricos, o

planeamento urbano ou as normas a ter em

conta na construção de edifícios e obras

públicas, por exemplo.

O Algarve é uma zona sensível aos riscos

sísmicos, devido: 1) à proximidade do banco de

Gorringe (E-SW de Sagres) e de outras

importantes falhas tectónicas ativas. A

actividade sísmica pode ser observada e em

http://www.meteo.pt/pt/sismologia/actividade/. Ao longo

da serra algarvia, em especial na Serra de

Monchique, ocorrem semanalmente vários

pequenos sismos que não são sentidos pelas

pessoas (círculos brancos na imagem). Os

sismos registados ao longo da costa

acompanham a falha que separa as placas

europeia e africana, que se deslocam a velocidades e em direcções diferentes, criando linhas de tensão. As

regras de construção e os planos da Protecção Civil, por exemplo, têm de ter em conta a possibilidade de

ocorrência de um grande sismo. Tendo em conta a regularidade de, aprox., 200 anos entre grandes sismos e

o facto de o último ter ocorrido há 260 anos, há cerca de 50 anos que se espera o próximo.

Rochas do Algarve

Existem na região três grandes tipos de rochas: plutónicas, sedimentares e metamórficas. Correspondem a

diferentes períodos da história geológica da região. Os processos através dos quais se formaram essas

rochas e os solos da região são igualmente diferentes.

Rochas plutónicas:Algumas das rochas do Algarve testemunham os movimentos das placas e alguma

atividade vulcância ocorrida no passado: na Serra de Monchique encontramos uma grande massa de rocha

plutónica (sienito) que se formou a grande profundidade, arrefecendo lentamente, caracterizada por grandes

critais (quanto mais rápido é o arrefecimento, menores são os cristais). O sienito é uma rocha de aspecto (e

origem) semelhante ao granito, mas de diferente composição química. Junto à localidade da Nave existe uma

pedreira, da qual se extrai sienito para a produção de rochas ornamentais e outros fins. As fontes termais

(fontes de água quente) das Caldas de Monchique indicam a presença de falhas geológicas activas: são

zonas onde o calor do interior do planeta chega mais perto da superfície.

15/10/2012

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Na praia da Luz existe um conjunto de chaminés vulcânicas, uma das quais se pode visitar durante a maré

vazia.

No talude da estrada IC4, imediatamente abaixo do hospital do Barlavento, é visível um tufo de basalto, uma

rocha vulcânica: uma “bolha” de rocha líquida subiu quase até à superfície e aí se solidificou. O calor da rocha

líquida “cozeu” e alterou as rochas sedimentares que já aí existiam, alterando a sua cor e a sua composição

química. Isto significa que antes de se formar o referido tufo basáltico já se tinham formado as rochas

sedimentares que o rodeiam.

O vulcanismo da região é muito antigo e já não há vulcões propriamente ditos. No entanto, é de notar que

actividade tectónica da região é muito intensa, havendo diversas falhas activas. A superfície do planeta Terra,

em particular a dos continentes, está dividida em grandes placas que se deslocam constantemente, mais ou

menos à velocidade a que crescem as unhas das mãos (se imaginarmos que as unhas crescem três cm por

ano, em duzentos anos teremos um crescimento de 6m). As falhas geológicas são fracturas nas placas

continentais ou entre as placas continentais. Quando as placas se empurram umas às outras, a tensão

acumula-se até atingir um ponto de ruptura. Nesses momentos, como aconteceu nos terramotos de 1755 ou

de 1969, as placas ou os dois lados de uma falha podem deslocar-se vários metros. Estima-se que em 1755,

ano em que o Algarve foi arrasado pelo grande terramoto de 1 de Novembro, as placas se tenham deslocado

ca. 4m.

Rochas sedimentares: estas rochas formam-se através da deposição de materiais arrastados de outros

locais, por acção do vento ou de águas correntes (rios, enxurradas), ou precipitados em ambientes de águas

calmas, como lagos e lagunas. Podem consistir em brechas (conglomerados de seixos, areias e lama que

depois se petrificam), arenitos (areias cimentadas – coladas – com calcário), margas, argilas, grés ou calcário.

De entre estas, o grés de Silves é uma rocha que sobressai, devido à sua invulgar cor vermelha.

Na fotografia acima (http://www.dct.uminho.pt/pogp/telheiro/telheiro_p.html), de uma excepcional formação rochosa da em

Ponta do Telheiro, Vila do Bispo, observamos várias camadas de épocas geológicas diferentes: a) cascalhos

de uma antiga praia do quaternário (até 2 MA = 2 milhões de anos), que entretanto se elevou 30 m acima no

nível do mar devido a movimentos tectónicos; b) arenito do Triásico (grés de Silves – 250 a 205 MA) sobre d)

camadas pregueadas do Carbónico marinho (360-268 MA). O ponto c) corrsponde a um movimento tectónico

ocorrido há ca. 55 MA, na sequência do qual terão sido arrastados para o mar entre 3 e 5 Km da faixa

costeira. e) Superfície actual da plataforma de abrasão marinha, predominantemente rochosa devido à forte

acção erosiva do mar.

As rochas calcárias formam-se em ambientes aquáticos. Algumas podem resultar de antigos recifes de coral

fossilizados, formando um tipo de pedra de alto valor decorativo chamada lioz (a pedra usada para decoração

nesta escola, sendo que em algumas delas são bem visíveis os cortes dos braços de antigos corais ou a

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forma de esponjas e de bivalves). Todavia, as rochas calcárias mais frequentes, formaram-se por deposição

dos esqueletos calcários de organismos microscópicos, ao longo de milhões de anos.

As rochas sedimentares são típicas do barrocal e do litoral,

ocorrendo também em algumas zonas de serra, como pode Têm

outros aproveitamentos, conforme as suas características:

construção, produção de cal e cimento (Loulé), gravilha, blocos

para calçadas, cantarias, etc.

A oxidação/transformação das rochas calcárias produz terra

rossa, que está na origem de solos de boa aptidão agrícola. Por

outro lado, tanto as rochas calcárias como os grandes depósitos

subterrâneos de areias e arenitos funcionam como grandes

esponjas que retêm as águas e permitem a formação de lençóis

de água subterrâneos. São elas que permitem a existência dos

grandes aquíferos (depósitos subterrâneos de água doce) da

região.

(Fotografias: em cima, ponta João d’Arens, Portimão, por P.

Sousa; em baixo, Algar Seco, Lagoa – fonte: alovelyworld.com)

As cavidades onde a água se armazena formam-se por

alteração química: são rochas alcalinas que a água da chuva,

ligeiramente mais ácida, vai dissolvendo lentamente. Aliás, é de

notar que geralmente as rochas sedimentares são muito susceptíveis de erosão. As arribas da costa sul da

região, formadas por rochas pouco duras, sofrem um constante e rápido processo de erosão, formando-se

algares que abatem sucessivamente. Apesar de ser muito apetecível construir habitações ou hotéis na orla

das arribas, devido à vista, isso é muito perigoso, devido à constante erosão, podendo até acelerar esse

processo. (em baixo: Mapa geológico do Algarve (simplificado), retirado de http://rochadapena.no.sapo.pt/pages/enquadr_geolog.htm)

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Areias, cascalheiras e outros aluviões: correspondem a antigos depósitos fluviais ou marinhos. Reagra geral,

são do quaternário, ou seja, formaram-se nos últimos 2 MA.

(Uma curiosidade: Na imagem acima, “Mapa morfológico…”, repare- e que a falha que percorre o Algarve no sentido W-E foi

cortada, perto de Portimão, por uma outra falha mais recente cujos lados deslizaram ca. 3 Km.)

Rochas metamórficas: metamorfose significa transformação. As rochas metamórficas formam-se por

transformação de rochas mais antigas, através do calor, da pressão e ou de alterações químicas. Surgem no

interior e na costa vicentina, sobretudo sob a forma de xistos e argilas. São geralmente rochas muito antigas.

Regra geral, os xistos estão associadas a solos pobres e sem aptidão agrícola. Por serem antigas, perderam

muitos dos minerais que poderiam ter interesse para o crescimento das plantas. Quando apodrecem, por

degradação química, dão origem a cascalhos e barros estéreis, densos e pouco permeáveis: as raízes das

plantas não os penetram facilmente; absorvem pouca água das chuvas e facilitam a formação de enxurradas,

que arrastam a camada superficial do solo e são agravadas pela escassa cobertura vegetal, em parte

resultante da intensa desflorestação a que algumas áreas foram sujeitas.

1.2. Relevo e sua formação

O relevo da região divide-se em três grandes sectores: serra, barrocal e litoral. A serra é, em geral, formada

pelos relevos e rochas mais antigos, encontrando-se muito erodidos e suavizados. O litoral caracteriza-se

pelas camadas geológicas mais recentes. As características de cada um destes sectores condicionam a

ocupação humana e as actividades que podem ser desenvolvidas:

1.2.1. Litoral: consiste na faixa costeira e caracteriza-se por terras mais ou menos planas, com poucos

relevos, quer a costa costa seja alta (arribas) ou baixa (praias e estuários), exceptuando-se a costa ocidental.

O facto de a faixa litoral ser constituída por terras mais ou menos planas torna-a propícia para a agricultura,

quando os solos e a disponibilidade de água o permitem, e para a construção. A existência de praias extensas

e acessíveis levou, nas últimas décadas, a uma urbanização intensiva (e, muitas das vezes, descuidada e

sem planos de ordenamento).

O litoral tem áreas bastante diferentes, conforme os tipos de costas e com o ambiente envolvente. Algumas

dessas áreas foram desde cedo muito atractivas, ao passo que outras só há pouco tempo deixaram de ser

repulsivas. As áreas mais atractivas são aquelas em que foi possível a construção de portos (quase todos

piscatórios), sobretudo se na orla costeira existissem terras aráveis e mais ou menos férteis. Onde os solos

têm pouca aptidão agrícola, ou nos locais mais remotos, as comunidades cresceram menos e mais

tardiamente.

Neste momento estão atribuídas concessões para prospecção e exploração de petróleo e gás natural ao largo

da costa, podendo haver novas oportunidades económicas.

Devido à proximidade do mar, as temperaturas são amenas ao longo do ano, por comparação com o interior e

com o resto de Portugal Continental.

1.2.2. O barrocal caracteriza-se por relevos suaves e pouco elevados, predominando as margas e os

calcários (jurássico e cretácico). Foi razoavelmente povoada até meados do Séc. XX, por ter algum potencial

agrícola. Predominam os solos alcalinos (Ph >6), associados a rochas sedimentares carbonatadas do

Jurássico e do Cretácico (calcários e margas). Porém, o relevo, mais acentuado que no litoral, dificulta

algumas culturas. O seu povoamento é mais ou menos disperso, marcado por alguns centros urbanos.

Coincide com grande parte dos aquíferos subterrâneos da região. Permite a exploração agrícola, sobretudo

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se houver disponibilidade de água. É nesta faixa que se encontra a maior parte dos vestígios arquológicos de

povos antigos (como em Alcalr) e as antigas cidades importantes do Algarve, como Silves ou Loulé.

Em cima: Principais características geomorfológicas do Algarve, com a localização da Serra, Barrocal e Litoral (Litoral Ocidental e Litoral

Meridional: Barlavento e Sotavento) e as pricipais falhas geológicas (adaptado de Feio, 1952 e Dias, 2001 pelo site

http://rochadapena.no.sapo.pt/pages/enquad_geog_geomorf_rp.htm).

Em baixo: relevo do Algarve. A castanho, as áreas mais elevadas; a verde, as de menor altitude

1.2.3. A serra ocupa 50% do território do Algarve. Divide-se em três conjuntos distintos: Espinhaço de

Cão, Monchique e Caldeirão. Sendo verdade que as elevações não atingem grandes altitudes, com a

excepção da Fóia e da Picota, a verdade é que são relevos íngremes e de solos pobres e que não permitem o

cultivo de grandes áreas e dificultam a mecanização. Os solos são, em regra, magros (muito pouco

profundos) e ácidos. Daí, neste sector são poucas e más as condições para a prática da agricultura, estando

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esta limitada a pequenas várzeas (terrenos planos, de aluvião, junto aos leitos dos rios e ribeiros) e a

socalcos/terraços.

O principal recurso disponível nas serras é a floresta, a qual permite algumas actividades: apicultura,

pastorícia e indústrias madeireiras.

A serra é a parte do território que se situa mais para o interior e ocupa uma grande parte do território. É

composta por grandes elevações e por inclinações acentuadas. Tem pouco potencial agrícola e não facilita a

fixação de pessoas ou de actividades económicas. A zona da serra está dividida em três grandes sistemas:

Monchique, Espinhaço de Cão e Caldeirão. Estes dois não atingem altitudes muito elevadas, mas os seus

relevos acentuados fazem deles áreas repulsivas.

A flora das serras foi muito alterada devido à acção humana ao longo de séculos. As antigas florestas

mediterrâneas, supostamente semelhantes àquela que encontramos na Mata do Solitário, na Serra da

Arrábida (Setúbal-Sesimbra), desapareceram há muito. Os antigos sobreiros e azinheiras também

desapareceram de muitas áreas. Na sua maior parte as encostas encontram-se cobertas por plantas de

pequeno porte, de espécies adaptadas à secura: medronheiro, aroeira, rosmaninho, carrasco, urze, alecrim,

rosmaninho e esteva. Nas encostas mais degradadas, subsiste apenas a esteva, o que representa um sinal

de risco de erosão e de desertificação iminente.

As serras do Algarve influenciam o clima da região (embora não sejam os únicos factores), funcionando como

barreiras à circulação das massas de ar e acumulando ar quente nas encostas viradas para Sul. A norte das

serras e na costa ocidental predominam os ventos de NW; no sul do território, os ventos de NW dão lugar

muitas vezes a ventos de SE (Levante), de E e de SW (geralmente associado a mau tempo). As serras

protegem a costa sul dos ventos fortes do quadrante Norte

Para além de tenderem a dificultar a passagem de algumas massas de ar, as serras obrigam outras a passar-

lhes por cima. Iso faz com que o ar arrefeça e facilite a precipitação. Quanto maior for a altitude que as

massas de ar têm de superar, maior será a tendência para ocorrer precipitação.

O povoamento destas áreas é muito diferenciado, devido às características físicas e ao potencial económico

de cada uma delas.

1.3. Tipos de solos

Na sua maior parte, os solos da região são pobres e pouco aptos à agricultura. A faixa mais fértil é a do

barrocal, com solos que por vezes são ricos, que permitem culturas mais ou menos produtivas. Os solos mais

ricos estão localizados junto às localidades mais antigas. Estas foram aí fundadas exactamente devido à sua

aptidão para a agricultura.

No Sotavento, os solos da orla costeira são formados essencialmente por areias e o teor de sal é muito

elevado, dificultando o crescimento das plantas cultiváveis. Quando estes solos arenosos e salgados

terminam começam os solos esqueléticos (muito finos, sem húmus e sem nutrientes), barrentos e pedregosos

da serra. Estes solos deterioraram-se em grande parte por acção humana, nomeadamente devido à

desflorestação. Em muitos deles já só crescem estevas, plantas que correspondem à última etapa antes do

início da desertificação.

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2. Recursos hídricos

A importância de se falar das bacias hidrográficas é a de conhecer quais são os recursos hídricos da região e

a forma como as águas circulam. Deste conhecimento depende o ordenamento do território, com destaque

para o planeamento urbano e para o licenciamento de actividades económicas:

Quais são os recursos hídricos existentes?

Como se pode captar água para uso doméstico e industrial/agrícola?

Quais sãos as reservas necessárias para fazer frente a eventuais situações de crise?

quais são as culturas mais rentáveis e quais são as suas necessidades de água?

quanta água consome um campo de golf?

como se devem tratar e reaproveitar, ou não, as águas residuais produzidas pelas actividades

económicas (incluindo a agricultura e os campos de golf) ou pela população?

...etc.

Fig.3: Principais aquíferos do Algarve.

Os principais aquíferos da região situam-se nas zonas de rochas calcárias e aluviões quaternários (barrocal e

litoral). Dos vários sistemas apresentados na figura acima, o mais importante é o de Querença-Silves. Estes

diferentes lençóis de água subterrâneos têm sido explorados ao longo das últimas décadas. No entanto, a

reposição das suas águas é muito demorada, podendo eles esgotar-se se não se obtiver água por outras vias.

Por outro lado, a extracção de águas subterrâneas e a consequente descida dos níveis dos lençóis de água

faz com que haja intrusão de água salgada no subsolo, contaminando os depósitos naturais de água doce.

Daí a necessidade de construção de barragens.

Esta necessidade torna-se mais urgente devido à irregularidade e à escassez das chuvas que caiem na

região, sendo muitas as partes do território onde não caem mais de 500 mm de chuva por ano (o que é

considerado um valor baixo). Assim, a chuva que cai durante o semestre húmido pode ser guardada para ser

utilizada durante o semestre seco; e aquela que cai durante os anos em que chove pode ser usada nos anos

em que há seca. O ideal é haver reservas que garantam pelo menso dois anos de consumo.

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As principais albufeiras são, de W para E, as das barragens da Bravura, de Odelouca (em construção), do

Arade, do Funcho e do Beliche. Elas encontram-se interligadas para que em caso de necessidade se possa

transferir águas de umas para outras. Essa possibilidade é fundamental em caso de seca.

A necessidade de garantir água não só para abastecimento doméstico como para garantir e requalificar a

actividade turística (em especial com a aposta na abertura de novos campos de golf destinados aos turistas

mais endinheirados do N da Europa que se deslocam para passar o Inverno na região) levou à decisão de se

construir a barragem de Odelouca, entre Portimão e Silves. Leva também a pensar em recuperar e

reaproveitar águas residuais, de maneira a não desperdiçar um recurso precioso.

A agricultura é outro sector para o qual a disponibilidade de água é vital, sendo de aproveitar o potencial da

região para a produção de primores ou de culturas que amadurecem muito antes das de outros países da

Europa.

Fig. 4: Pricipais cursos de água e albufeiras do Algarve. Nesta imagem ainda não está representada a

abarragem de Odelouca.

(http://www.cvrm.ualg.pt/projectos/malgar/publ_archive/10_LNEC-2007-jpm_ok.pdf

http://www.ccdr-alg.pt/ccdr/parameters/ccdr-alg/files/File/upload//Ambiente/RecHid_Rel/Recursos_Hidricos_200805.pd)

3. Clima

O Algarve apresenta um clima do tipo mediterrâneo, caracterizado pela existência de um semestre chuvoso

que coincide com a estação fria e um semestre seco na época quente.

Precipitação: As zonas com maiores valores da precipitação anual são as montanhosas: a serra do Caldeirão,

com um máximo de 1 621 mm, em Barranco do Velho, a 475 m de altitude, e a serra de Monchique com um

máximo de 2 081 mm, em Monchique, a 465 m de altitude. A zona com valores mais baixos da precipitação

anual é o litoral, com o mínimo de 230 mm, em Vila Real de Santo António, a 7 m de altitude.

Em termos médios, a precipitação anual varia entre 1 277 mm e 406 mm, com o valor médio ponderado de

653 mm para todo o Algarve. No que respeita à variação mensal, cerca de 80% da precipitação ocorre no

semestre húmido e 20% no semestre seco. Em termos médios o mês mais chuvoso é o de Dezembro, com

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cerca de 17% da precipitação anual, seguido dos meses de Novembro e de Janeiro, com cerca de 15%

daquela precipitação. Os meses menos chuvosos são os de Julho e Agosto, com menos de 1% da

precipitação anual média, seguindo-se Junho e Setembro com, respectivamente, 2 e 3% daquela

precipitação.

Temperatura: No Algarve, a temperatura média anual situa-se entre 17 ºC, em Faro, e 15 ºC, em

Monchique,apresentando uma variação regular ao longo do ano, atingindo os valores menores em Janeiro e

os máximos em Agosto. A amplitude térmica anual, que não é muito importante na região comparativamente a

outras regiões do país, varia desde um mínimo de 6,3 ºC, no Cabo de S. Vicente, até um máximo de 16,5 ºC,

em Ameixial.

Fonte: http://www.meteopt.com/forum/climatologia/clima-no-algarve-1405.html

O Algarve desfruta, ao longo de todo o ano, das melhores condições climatéricas da Europa. O seu clima é

ameno, com temperaturas menos extremas do que as do resto de Portugal Continental: invernos menos frios

e verões menos quentes. Estas características devem-se à influência do mar e ao facto de as massas de ar

que afectam o Algarve serem muitas vezes diferentes daquelas que afectam o resto do continente.

A precipitação concentra-se sobretudo entre Novembro e Março e não é, em geral, abundante. No entanto, é

frequente ocorrerem chuvas torrenciais, podendo em poucas horas cair um quinto da precipitação de um ano

inteiro. Estas chuvas torrenciais são destrutivas e não chegam a ser absorvidas pelo solo.

O número de horas de sol por ano é muito elevado.

No conjunto, a região apresenta óptimas condições meteorológicas para o desenvolvimento da actividade

turística.

A distribuição irregular da precipitação condicionou desde sempre a agricultura. Este obstáculo foi desde cedo

ultrapassado pelas técnicas introduzidas pelos povos árabes, os quais introduziram plantas e técnicas de

irrigação e de cultivo que lhes permitiam optimizar o rendimento das terras.

Os verões secos e quentes propiciam a ocorrência de fogos florestais. A escassez de precipitação torna a

região muito sensível a secas.

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I –Factores físicos (continuação)

As características físicas da região são importantes para podermos compreender a forma como se

desenvolveram e se desenvolvem ainda as actividades e a ocupação humanas: o relevo, os solos, o clima e a

localização do território dependem directamente desses factores, os quais condicionam, por outro lado, muitas

das oportunidades de desenvolvimento da região.

2. Recursos naturais

A região não é rica em recursos que possibilitem actividades económicas muito lucrativas nos dias de hoje.

No entanto, os recursos existentes na região tinham, no passado, alguma importância, uma vez que a base

da economia (da produção de bens e riqueza) era o sector primário: agricultura e pescas.

As condições para a agricultura não são/eram muito favoráveis, excepto em algumas áreas relativamente

pequenas. As terras aráveis situam-se sobretudo nos vales dos rios e em alguma áreas do barrocal. O regime

de chuvas limitou o tipo de culturas praticáveis até ao período árabe, durante o qual se

desenvolveram/introduziram técnicas de irrigação e de cultivo, bem como novas plantas, que possibilitaram

um aproveitamento mais intensivo e diversificado dos solos. A ocupação dos solos e o desenvolvimento de

povoações desde a proto-história (neolítico e idade do cobre – a época em que foram construídos os

monumentos de Alcalar) fez-se quase sempre junto daquelas terras aráveis. Durante o século XX e já no

século XXI, o crescimento urbano tem sido feito à custa da destruição de algumas das melhores terras de

cultivo, à beira das quais se situavam os povoamentos mais antigos. No final do Séc. XX tentou-se atenuar

este problema através da criação da Reserva Agrícola Nacional (REN) e dos planos directores municipais

(PDMs)...

Fig 1: Área artificializada por Unidade de Paisagem, entre 1985 e 2000

As pescas têm tido grande

importância desde pelo menos o

período romano. Nesta época era

muito procurado o atum, o qual era

exportado (os árabes também o

procuravam – foram eles que

introduziam o termo almadrava, que

designa uma armação de pesca do

atum que remonta à época romana.

A almadrava é/era uma gigantesca

armadilha para a qual os atuns

eram/são conduzidos para depois

serem chacinados). Outra das

exportações de pescado eram as

conservas (salgadas) de peixe e o

garum, um molho que se obtinha por fermentação do pescado em tanques próprios. Alguns destes tanques,

chamados cetárias, ainda são visíveis no sítio arqueológico de Cerro da Vila, em Vilamoura.

Fig. 2: Praia do Barril: âncoras utilizadas nas armações de pesca do atum (almadrava)

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Os recursos minerais não são abundantes, se exceptuarmos a

pedra. Desde a antiguidade foram sendo explorados alguns filões

de minério de cobre, como o do Parque da Mina (Monchique?) e

o da Cova dos Mouros (Alcoutim), mas trata-se de explorações

pouco importantes para os padrões actuais. Em Loulé existem

minas de sal-gema, cuja utilização é sobretudo industrial: o sal-

gema, ou halite, é cloreto de sódio, ou seja, o mesmo que o sal

de cozinha, mas é extraído em minas, não a partir da água do

mar. Destacam-se ainda, em Monchique, a exploração de água

termal e de rochas ornamentais (sienito).

As florestas da região são escassas e pobres. A intensa exploração ao longo dos séculos empobreceu-a e

levou a que em algumas áreas ela não se renovasse. Das principais árvores nativas destacam-se o sobreiro e

a azinheira, o medronheiro (que pode ter o porte de árvore se o solo e a humidade disponível o permitirem), o

zambujeiro (oliveira selvagem). Essas árvores cobriam praticamente toda a serra, mas o seu abate e a

consequente perda de solo (arrastado pela chuva e não renovado pelos restos de folhas e ramos caídos e

apodrecidos) fizeram com que algumas áreas da serra se transformassem em desertos onde apenas crescem

estevas (as últimas plantas a resistir à desertificação).

Fig 3: Índice de susceptibilidade à desertificação

Mais tarde foram introduzidas espécies cultivadas, como o pinheiro manso e o eucalipto. No entanto, estas

espécies, em especial o eucalipto, quando são cultivadas de forma extensiva e exclusiva, são pouco

favoráveis à fixação de outras espécies vegetais e, consequentemente, à vida animal; além disso, consomem

grandes quantidades de águas subterrâneas e empobrecem os solos. Por outro lado, constituem um dos

poucos recursos económicos disponíveis na serra.

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ESPAA, 2012/13 — Área de Integração, Tema 4.1: A identidade regional — Professor Paulo Sousa p. 12

Recentemente foi lançado um projecto de produção de energia eléctrica a partir de biomassa, ou melhor, de

restos florestais. Esta forma de produção de energia incentiva a limpeza das florestas, diminuindo os riscos de

fogos florestais. Nas zonas de serra, especialmente em Vila do Bispo e em Monchique, foram recentemente

instalados parques eólicos que ajudam a regularizar o abastecimento de energia eléctrica à região.

Fig 4: Áreas ardidas,

por anos (2003-2005) – em

cima

Fig. 5: Uso do solo em 2000 –em baixo

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3. Ambiente: zonas de especial interesse, zonas protegidas, rede natura 2000

Segue-se um texto retirado de: http://www.ccdr-alg.pt/ccdr/index.php?module=ContentExpress&func=display&ceid=382

Fig. 6: Localização das áreas protegias do Algarve

A Rede Nacional de Áreas Protegidas é constituída pelas áreas protegidas especificadas ao abrigo do Decreto-Lei

n.º19/93, de 23 de Janeiro, classificadas nas seguintes categorias: Parque

Nacional, Reserva Natural, Parque Natural e Monumento Natural.

No Algarve esta Rede é constituída pelo(a):

Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina

(PNSACV): O Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa

Vicentina, criado pelo Decreto Regulamentar n.º26/95, de 21 de

Setembro, é uma zona costeira que se estende desde a Ribeira da

Junqueira, a norte de Porto Covo (concelho de Sines – Alentejo, até

ao Burgau (concelho de Vila do Bispo - Algarve).

Parque Natural da Ria Formosa (PNRF): O Parque Natural da

Ria Formosa, criado pelo Decreto-Lei n.º373/87, de 9 de

Dezembro, abrange uma área de cerca de 18 400 há, distribuídos

ao longo de 60 km de costa, compreendida entre o Ancão

(concelho de Loulé) e a Manta Rota (concelho de Vila Real de Santo

António).

Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de

Santo António (RNSCMVRSA): A Reserva Natural do Sapal de

Castro Marim e Vila Real de Santo António, criada pelo Decreto-Lei

n.º162/75, de 27 de Março, está situada junto à foz do Rio

Guadiana e ocupa uma área de 2 153 hectares ao longo dos

concelhos de Castro Marim e Vila Real de Santo António.

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Outras áreas com estatuto de protecção:

4. Rocha da Pena: O Sítio Classificado da Rocha da Pena, criado pelo Decreto-Lei n.º392/91 de 10 de

Outubro, localiza-se nas freguesias de Salir e Benafim (concelho de Loulé), numa zona de transição entre

o Barrocal e a Serra Algarvia, ocupando uma área de 637 ha.

5. Fonte Benémola: O Sítio Classificado da Fonte Benémola, criado pelo Decreto-Lei n.º 392/91 de 10 de

Outubro, localiza-se nas freguesias de Querença e Tôr (concelho de Loulé), ocupando uma área de 392

ha. [Fim de citação]

A delimitação de áreas protegidas é feita para preservar sistemas ecológicos e habitats onde existem

espécies animais e vegetais ameaçadas, ou para preservar áreas de grande interesse económico. São de

especial importância os ambientes húmidos, ou seja, os estuários e sapais, bem como a orla costeira. Os

sapais são de extrema importância por serem zonas de desova de muitas espécies de peixes com interesse

económico. Por outro lado, são áreas sensíveis, devido à proximidade de cidades e grandes aglomerações

urbanas e a, por isso, estarem sujeitos a serem espezinhados, aterrados ou contaminados com esgotos e lixo.

Em algumas áreas podem existir ambientes muito bem preservados (como algumas áreas de floresta na

Serra de Monchique) ou ambientes em que as actividades humanas atingiram um ponto de equilíbrio com a

natureza. Esses ambientes são reservas genéticas para um futuro incerto, no qual podemos necessitar das

plantas selvagens para melhorar o nosso conhecimento acerca da resistência a pragas ou a secas, por

exemplo. Por outro lado, trata-se de ambientes/paisagens de grande valor turístico, com especial importância

num momento, como este, em que se procura diversificar, melhorar e reformar a oferta turística, de maneira a

compensar a perda de alguns dos turistas mais tradicionais e a atrair os mais ricos.

Imagem: Pego do Inferno, Tavira

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II – Factores humanos

1. História da ocupação do Algarve: principais momentos da ocupação humana

Fig. 7: Monumento funerário (mamoa) de Alcalar (~5000 anos). Fonte:

ahistorianacidade.wordpress.com

1.1. Pré-história e proto-história

A região do Algarve é habitada por povos sedentários há alguns

milhares de anos. Na zona de Alcalar, perto de Portimão,

encontram-se diversos vestígios de povoamentos pré-históricos,

das épocas neolítica e calcolítica (idade do cobre). No caso de

Alcalar, temos um povoamento situado num monte, para defesa, e junto a terras férteis, propícias à cultura de

cereais. Este povoamento foi suficientemente importante para permitir a construção das necrópoles que ainda

podem ser visitadas: significa que que havia pessoas suficientes para mobilizar para a construção dos

edifícios e monumentos, uma economia que permitia sustentá-las, a existência de uma elite (porque apenas

os indivíduos mais importantes eram sepultados nos edifícios importantes) e uma povoação que era o centro

de uma grande área e fazia trocas comerciais com o exterior.

Estes povos antigos forma sendo contactados pelos povos mercantis do Mediterrâneo e forma por ele

influenciados – pelos fenícios/cartagineses, os gregos e os romanos. Pouco se sabe dos povos nativos dessa

época, mas essa influência dos povos mediterrâneos é visível nos bens importados (cerâmicas, joalharia) e

nas primeiras formas de escrita peninsular, escritas em caracteres já decifrados, mas numa língua entretanto

perdida (no Museu de Silves pode ser observada um exemplar desta escrita).

1.2. Idade do Ferro: Fenícios, gregos e romanos

Os fenícios/cartagineses instalaram feitorias ao longo da

costa sul da Península, sendo-lhes atribuída a fundação do

povoado que viria a ser Portimão. (As feitorias são centros de

importação e exportação de bens instalados no território de

outros povos.)

Imagens: mosaico romano e banheira de Milreu, Faro -

pt.wikipedia.org; algarvivo.com

Os romanos instalaram-se no sul da Península, incluindo o

Algarve, a partir do Séc. III a.C., e aí permaneceram até

aproximadamente ao séc. V d.C. No caso deste povo, tratou-

se de uma verdadeira conquista e ocupação do território, que

pouco tempo depois passou a ser um conjunto de províncias

romanas (Bética, Lusitânia e Terragonensis). O Algarve

pertencia à província da Lusitânia, que ocupava então partes

dos actuais territórios de Portugal e Espanha. A economia

romana baseava-se na exploração directa dos produtos da

terra: a agricultura e a extracção de metais (a pesca também

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tinha alguma importância, sobretudo para o mercado de exportação). Por isso, instalaram-se em quintas e

estabeleceram cidades ao longo de todo o território. No Algarve existem vestígios importantes da ocupação

romana em Milreu (Estói), no Cerro da Vila (Vila Moura) e na Abicada (Mexilhoeira Grande).

A importância da ocupação romana é enorme, tanto pelo desenvolvimento de alguns povoados e pelo

arroteamento de terras para a agricultura, como pela integração do território no mundo cosmopolita do

mediterrâneo, como ainda pela introdução da língua, das leis e de outros costumes.

1.3. Período árabe e integração na coroa de Portugal.

A fase seguinte da história do Algarve é a da cultura árabe, que

decorreu entre os séculos VIII e XIII – um longuíssimo período

que deixou marcas profundas na paisagem, na ocupação do

território e na cultura da região. Os povos árabes continuaram a

desenvolver uma economia baseada na agricultura, mas foram

responsáveis pela introdução de novas culturas (como as dos

citrinos, originários da Ásia) e, sobretudo, pela introdução de

novas técnicas agrícolas.

Imagens desta página: Nora e picota, engenhos de rega introduzido pelos

árabes; açoteias (terraços) de Olhão; castelo de Paderne (em taipa)

De entre estas destacam-se as técnicas de irrigação, que

permitiram aumentar a produtividades das hortas e uma

intensificação da exploração das parcelas de terra onde havia

água disponível para a irrigação. Além disso, introduziram a co-

plantação, ou seja, a existência de culturas diferentes, em

simultâneo, nos mesmos terrenos (como a combinação de

culturas arbóreas, como a do olival, com produtos hortícolas,

cereais de sequeiro ou leguminosas). Estas inovações foram tão

importantes que ainda hoje caracterizam a agricultura de

subsistência de grande parte do país. Graças a uma agricultura

mais produtiva, a população da região cresceu durante este

período.

Durante o período árabe, a cidade mais importante do Algarve

veio a ser Silves, dada a sua importância económica e

estratégica: permitia a construção de uma cidade fortificada junto

ao limite das marés, no curso do Rio Arade, permitindo o

embarque e a descarga de mercadorias do comércio marítimo e

um porto abrigado e seguro para as embarcações (os ataques de

piratas ao longo da costa foram frequentes até ao séc. XVIII).

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Há na língua portuguesa cerca de 600 palavras de origem árabe. Algumas delas são fáceis de identificar porque começam por al. O nome de muitas terras portuguesas é também de origem árabe, como por exemplo: Silves, Loulé, Tavira, Évora, etc.

ALGUMAS PALAVRAS PORTUGUESAS DE ORIGEM ÁRABE

Algarve azeite alambique algarismo limão açude almotolia

azenha alcatifa alguidar almotolia arsenal alcachofra tapete

alface alfama laranja picota almirante abóbora albarda

oxalá almocreve algodão gato alcaide açorda nora

http://www.prof2000.pt/users/forma.tic/constinternet/cfpvnp/2003/grupo07/mu%C3%A7ulmanos.htm

O período árabe terminou durante o Sec. XIII, passando a integrar o Reino de Portugal e dos Algarves.

Durante a primeira fase desse período, a região continuou a ter uma forte presença muçulmana, se bem que

os muçulmanos, ou ladinos, fossem cidadãos de terceira categoria (depois dos aristocratas e de outros

cristãos), formando uma identidade muito peculiar. Aliás, essa identidade peculiar, que misturava as culturas

árabe e cristã (e um pouco de judaísmo), designada como cultura moçárabe, vinha-se formando desde há

séculos e continuou a desenvolver-se sob o domínio dos reis cristãos.

Imagem: Pesca de cerco a bordo de uma traineira

Fonte: http://fototecalagos.blogspot.pt/

1.4. Da revolução industrial ao turismo de massas

A grande mudança seguinte que ocorreu na região aconteceu durante o final

do Séc. XIX e início do século XX, com a criação das indústrias do pescado e

com a chegada do caminho de ferro. Este foi um momento decisivo porque

trouxe dinheiro para a região e dinamizou a economia local, graças a

exportação dos enlatados de peixe e ao envio de mercadorias para

outros pontos do país, por via férrea;

aproximou a região do resto do país, na medida em que as

deslocações passaram a ser mais fáceis, baratas, rápidas e fiáveis;

fez crescer e desenvolver as cidades do litoral;

fez surgir uma nova classe social: o operariado que trabalhava nas

fábricas e, em geral, para os grandes patrões;

levou à formação de uma classe capitalista-burguesa, que passou a

competir com a aristocracia e a concorrer aos cargos públicos;

gerou na mente das pessoas novos objectivos de vida e novas expectativas relativas à qualidade que

deveriam ter as suas vidas;

facilitou/estimulou o êxodo rural e a migração de famílias de trabalhadores para outras regiões, em

particular para Lisboa e para o Barreiro (onde havia procura crescente de mão-de-obra para a

indústria pesada).

Por outras palavras, a par do tradicional Algarve rural, rústico e pouco desenvolvido, começou a emergir um

Algarve urbano, cosmopolita e semi-industrializado; mas também de um Algarve cujo povoamento era mais

ou menos equilibrado e centrado no interior para um Algarve progressivamente desequilibrado.

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Esse desequilíbrio demográfico e económico acentuou-se a partir da segunda metade do séc. XX, com o

crescimento da importância do turismo. O turismo levou à criação de inúmeros empregos directos e indirectos

(por exemplo, na construção civil e na distribuição de mercadorias). Daí resultaram:

o crescente abandono das povoações rurais e da serra;

o envelhecimento das populações que permaneceram nesses locais;

o quase abandono dos campos e a queda acentuada da produção agrícola, especialmente de

produtos hortícolas ou de outros que exijam cuidados mais frequentes;

crescimento e rejuvenescimento da população do litoral;

chegada de trabalhadores de outros pontos do país e de outros países, muitos dos quais são

residentes permanentes, e outros que são trabalhadores sazonais;

estabelecimento de cidadãos estrangeiros na região, atraídos por um custo de vida menor, por

habitações a preços atractivos ou simplesmente pelo clima ameno – e formação de comunidades de

cidadãos estrangeiros, por nacionalidades, que por vezes funcionam como comunidades semi-

fechadas.

O turismo tem sido o grande motor de desenvolvimento e o sustento do Algarve.

No entanto, o seu peso na economia (66%) é tão grande que torna a

sobrevivência da região muito sensível a qualquer variação da procura por parte

dos turistas. As indústrias e outras actividades económicas da região são

relativamente poucas e muitas delas existem em função da actividade turística:

a construção civil, as serralharias de alumínio, a distribuição de produtos

alimentares, o comércio a retalho…

Esta dependência poderá, porventura, ser excessiva e seria conveniente

a) diversificar e melhorar a oferta turística, de maneira a atrair mais turistas endinheirados ao longo de

todo o ano;

b) qualificar a mão-de-obra;

c) diversificar as actividades económicas e encontrar mercados fora da região para as mercadorias

que esta produz.

Um dos problemas para pensar em outras actividades económicas é a escassez de recursos.

A agricultura continua a ser um sector promissor, apesar de não permitir absorver grandes quantidades de

mão-de-obra. No entanto, podem ser cultivadas espécies de elevado valor, aproveitando o facto de

amadurecerem mais cedo do que no resto da Europa.

Os produtos da serra podem atingir valores elevados, mas a capacidade de os produzir é limitada.

Os recursos piscícolas têm de ser explorados cuidadosamente, para se evitar a pesca excessiva e assegurar

a manutenção de stocks; no entanto pode ser desenvolvida a aquicultura.

Outras indústrias podem ser implantadas no Algarve como em qualquer outra parte. Para isso, é preciso

estudar os mercados e apostar na formação profissional e no conhecimento, usando a Universidade como

foco de dinamização e a proximidade do aeroporto de Faro e do porto de Sines (ou talvez de outros) como

vias de escoamento de produtos e de comunicação com o exterior.