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ROLAGEM AUTOMÁTICA Filho no banquinho comendo cascalhos FAIXA 2 DO CD “CALEIDOSCÓPIO DO CORAÇÃO”

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Page 1: ROLAGEM AUTOMÁTICA Filho no banquinho comendo cascalhos FAIXA 2 DO CD “CALEIDOSCÓPIO DO CORAÇÃO”

ROLAGEM AUTOMÁTICA

Filho no banquinho comendo cascalhos

FAIXA 2 DO CD “CALEIDOSCÓPIO DO CORAÇÃO”

Page 2: ROLAGEM AUTOMÁTICA Filho no banquinho comendo cascalhos FAIXA 2 DO CD “CALEIDOSCÓPIO DO CORAÇÃO”

Fim de tarde ensolarada.São cúmplices mãe e filho,em banquinho e cadeira na calçada,aguardam o vendedor de cascalho.

Menino com a graça dos quatro,mulher com a beleza dos trinta.Filho com a pureza no banquinho,mãe com a meiguice na cadeira.

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Ao som da matraca,o brilho nos olhos,a água na boca,enfim, os cascalhos.

Apesar de meio século distante,no homem, vive e brinca o menino,que guardou, para sempre, o instantecom a mãe, os cascalhos e o banquinho, que guardou, para sempre, o instantecom a mãe, os cascalhos e o banquinho.

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A seguir a crônica “Lembrança Criança” narra a história da canção “Instantâneo de Ternura”.Caso seja de interesse é só utilizar o “ratinho”

Imagens:Desenho Mãe e Filho Comendo Cascalhos: Ruy Horta;Arquivo Pessoal ; e

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Ao experimentarmos momentos de extrema pureza, simplicidade e beleza, o que sentimos? Provavelmente, essa é uma pergunta que não nos fazemos, a não ser quando tentamos registrar um desses momentos.

É nessa situação que testemunhamos as dificuldades da escrita. Para um desses momentos, que vamos tentar registrar, a palavra que emergiu foi “ternura”.

Não sabemos qual o sentido que lhe é dada nos dicionários. Entretanto, vamos entender ternura como: “o sentimento do homem quando experimenta um momento que reúne o belo, o puro e o simples”.

Há de chegar o dia em que o homem, sem usar a palavra, por um processo semelhante à telepatia, irá transmitir as cores, as formas, os sons, os cheiros, os gostos e os sentimentos, numa comunicação sem ruídos…

Era Julho. Como ninguém é de ferro, gozávamos férias na Salinópolis, mais conhecida como Salinas. Município do litoral paraense, distante 257 km da capital, Belém.

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Levado pelo casal anfitrião, íamos todos os dias à Atalaia, bela e extensa praia localizada a 16 km do centro.

Foi num desses dias de muito sol, sal e mar, que meu amigo e anfitrião, enquanto saboreava um cascalho, narrou uma de suas doces lembranças de menino.

O degustar do cascalho foi interrompido. Um brilho de saudade no olhar e a alegria de criança na voz deram início a narração de meu amigo.

Esclarecendo: cascalho é uma leve e fina massa de biscoito, enrolada em forma de canudo, que dissolve na boca ao ser degustada. Atualmente, os vendedores se valem de sons tirados de um triângulo para anunciarem sua passagem. Entretanto, em tempos passados, utilizavam matracas – instrumento de madeira com uma alça móvel de ferro que, ao ser movimentado contra a base de madeira, produzem ruídos.

Recordou que o vendedor de cascalhos passava todos os dias nos fins de tarde em frente a sua casa.

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O horário coincidia com uma hora após aquele banho para tirar o suor e aquela murrinha, conseqüência das cestas, que as crianças faziam contrariadas, pois eram obrigadas a abandonar as brincadeiras.

Lembrou que o seu banquinho de macacaúba e envernizado era dirigido por sua imaginação ora como barco, ora como carro, ora como cavalo e funcionava, algumas vezes, como garagem. Entretanto, na hora do vendedor de cascalhos passar, era só banquinho…

Dissimulando aquele nó na garganta que a emoção provocara, continuou: chego quase a sentir a excitação que me dava, enquanto minha mãe me vestia. Pronto, apanhava o banquinho, andava em direção de minha mãe, que tal como cúmplice, apanhava umas moedas, uma cadeira, se dirigia para a porta da rua e sentávamos, em frente da nossa casa, para esperar os cascalhos.

Meu amigo parecia ter se transportado pela máquina do tempo. Seu rosto se encheu da meiguice dos quatro anos e contrastando, sua voz de cinqüentão narrou: minhas pernas, que ficavam levando meus pés para chutar o ar e trazendo-os para pendurá-los na travessa do banquinho, ficavam imóveis a partir do momento em que meus ouvidos identificavam o som da matraca.

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A força e a emoção da narrativa fizeram com que fosse invadido pela beleza das tardes de Belém, pela pureza dos quatro anos e pela simplicidade do banquinho e do cascalho.

Não sei se a invasão que sofri foi percebida pelo amigo e anfitrião, pois, quase sem parar para respirar, continuou: o som da matraca ia aumentando; o vendedor se aproximava; tirava das costas o latão cilíndrico; entregava-me os cascalhos; recebia as moedas de minha mãe e, sorrindo, consciente da importância do seu produto, se despedia.

Degustava meus cascalhos sobre o olhar, carinho e cumplicidade maternos.

Sinto que apesar de todo o esforço, minhas limitações e as da palavra escrita deixaram muito a desejar na tradução da beleza das tardes de Belém, da pureza das crianças, da simplicidade do cascalho e da meiga cumplicidade materna.

Ternura foi o que me veio de mais próximo daquele momento de sol, sal, mar e vento.

“Instantâneo de Ternura” são rimas para registrar momentos, como esse, que só acontecem quando se têm raízes e amigos.

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