roberto eduardo da costa macedo - os meus versos

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os meus versos Nascimento: sANTO TIRSO, 14 de JULHO de 1887 Morte: PORTO, 19 de JULHO de 1977 (90 anos) OS MEUS VERSOS Os meus versos não são meus! São um fio delgadinho, Mais fino que o fino linho, Da inteligência de Deus! Sou o espelho unicamente: Colho a imagem fulgurante De estrela, de sol ardente, Milhões de léguas distante. Como, no búzio, cantando Vem o mar, seu cavo grito Anda talvez silabando Em mim a voz do Infinito. A frágil haste do trigo Vibrou ao passar o vento; Sucede o mesmo comigo, Sacode-me o pensamento. Ando, às vezes, distraído E a ideia sorrateira Vem-me falar ao ouvido, Vem-me achar de que maneira!... E quando os meus versos traço E os assino, como autor, Reconheço que não passo De receptor-transmissor. Surge na várzea rasteira Seara em verde lençol; E cresce e fica altaneira E quem a ergueu foi o Sol. Até ao fundo covil Do coração mais lapuz Chega o hálito de Abril, Vai uma réstia de luz. O que somos, nesta vida, Nós o devemos a Alguém E passamos, de corrida, Do Além para o Além. 1 Viseu, Março de 1948 Roberto Eduardo da Costa Macedo JUIZ, escritor, publicista e pOETA Português

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Page 1: Roberto Eduardo da Costa Macedo - Os meus Versos

os meus versos

Nascimento: sANTO TIRSO, 14 de JULHO de 1887Morte: PORTO, 19 de JULHO de 1977 (90 anos)

OS MEUS VERSOSOs meus versos não são meus!

São um fio delgadinho,

Mais fino que o fino linho,

Da inteligência de Deus!

Sou o espelho unicamente:

Colho a imagem fulgurante

De estrela, de sol ardente,

Milhões de léguas distante.

Como, no búzio, cantando

Vem o mar, seu cavo grito

Anda talvez silabando

Em mim a voz do Infinito.

A frágil haste do trigo

Vibrou ao passar o vento;

Sucede o mesmo comigo,

Sacode-me o pensamento.

Ando, às vezes, distraído

E a ideia sorrateira

Vem-me falar ao ouvido,

Vem-me achar de que maneira!...

E quando os meus versos traço

E os assino, como autor,

Reconheço que não passo

De receptor-transmissor.

Surge na várzea rasteira

Seara em verde lençol;

E cresce e fica altaneira

E quem a ergueu foi o Sol.

Até ao fundo covil

Do coração mais lapuz

Chega o hálito de Abril,

Vai uma réstia de luz.

O que somos, nesta vida,

Nós o devemos a Alguém

E passamos, de corrida,

Do Além para o Além.

1

Viseu, Março de 1948

Roberto Eduardo da Costa MacedoJUIZ, escritor, publicista e pOETA Português