versos amalia libro
DESCRIPTION
Poesias de Amalia Rodrigues.En la casa de la artista siempre se juntaron grandes actores culturales como poetas,pensadores,cantantes .Ella misma ha sido un delicada escritora. Aqui de su pluma .TRANSCRIPT
Amor de Mel Amor de Fel
Tenho um amor
Que não posso confessar
Mas posso chorar
Amor pecado
Amor de amor
Amor de mel
Amor de flor
Amor de fel
Amor maior
Amor amado
Tenho um amor
Amor de dor
Amor maior
Amor chorado
Em tom menor
Em tom menor
Maior o fado
Choro a chorar
Tornando maior o mar
Não posso deixar de amar
O meu amor em pecado
Foi andorinha
Que chegou na primavera
E eu era quem era
Fado maior
Cantado em tom de menor
Chorando um amor de dor
Dor de um bem e mal amado
Amália Rodrigues
................................................................
Asa do Vento
Sou charneca sou monte
Brisa a correr ligeira
Sou água fresca
A correr na fonte
Sou rosada
Roseira
Sou o cheiro das flores
Fé do meu pensamento
Filha d'amores
Irmã das dores
Sou mãe
Do sofrimento.
Tenho no peito
Um pássaro encantado
Que anda sem jeito
A mim amarrado
Sou charneca sou monte
Sou noite enluarada
Flor de alecrim
Ramo de jasmim
Sou papoila
Encarnada
Sou flor de Primavera
Sou sonho de Verão
Planície aberta
Praia deserta
Que espera
A tua mão
Coração fruto
Que é maduro e verde
Meu choro enxuto
Dor que se não perde
Sou charneca sou monte
Sou manhã perfumada
Planície aberta
Praia deserta
Sou ilha
Abandonada
Sou charneca sou monte
Verde fruta colhida
Erva cidreira
Mansa Oliveira
Sou lágrima
Perdida
Asa de vento
Inimiga da sorte
Roseira brava
Não há quem me corte
Amália Rodrigues
..................................................
Cá Por Dentro da Cabeça
Cá por dentro da cabeça
Vazia como eu a tenho
Por estranho que me pareça
Atendendo ao seu tamanho
Cá por dentro da cabeça
Estão as idéias da vida
Queira Deus não me aconteça
Ficar com ela partida
Amália Rodrigues
...............................................
Cá Vou Cantando, Cantando
Cá vou cantando, cantando
Cá vou chorando, chorando
Cantando chorando e rindo
Lembro agora a minha rua
Não é minha nem é rua
E tudo me vai fugindo
Cala-te lá rapariga
Já não posso com a cantiga
E a minha avó ralhava
Mas eu que no meu pensar
Não fazia mal cantar
Cantava e não me calava
Amália Rodrigues
...........................................
Carta a Amélia Rey Colaço
Os destinos são fatais
Foi só por duas vogais
Foi o e em vez do a
Só por serem desiguais
Duas pequenas vogais
A diferença que faz
Quem inventou os destinos
Que logo de pequeninos
Nos fazem como Deus quis
Inventou duas vogais
Que nascerão desiguais
Para pôr os pontos nos ii
Amélia queria ter sido
Só o não fui por um triz
O meu a tratou-me mal
O seu e fê-la uma grande atriz
Amália Rodrigues
............................................
Carta à Irmã Détinha
A final fiquei pasmada
Está bem melhor do que eu
Que não tenho fé em nada
Deus lhe pague esta alegria
De me deixar encantada
Você que bem me conhece
Sabe que às vezes parece
Que não dou pelo que acontece
Que não gosto de crianças
Que sou seca e sou distante
Bem...passemos adiante!
O que eu lhe queria dizer
E dizer não me dá jeito
Do nó que tenho no peito
Com saudades do Tomás
E saudades do Miguel
Que são uns filhos da mãe
Parece que você tem
A varinha do condão
Onde você põe a mão
Fica logo diferente
Mesmo o Souto que era cão
Parecia que era gente
Por mim peço-lhe perdão
De assim me ter encontrado
Ou por outra, tão deitado,
E ri aquele bocado
Com os versos da figueira
Foi porque a tinha ao meu lado
Vou esperar o resultado
Fiada na medicina
Tanto remédio tomado
E a fraqueza não declina
Mas se ela declinar
E eu me poder levantar
Lá irei ver a menina
A menina e os meninos
A carta já vai comprida
E é pouco divertida
Mas ando tão desnutrida
Que até me sobe ao miolo
A falta de nutrição
Vou hoje comer um bolo
Parece que melhorei
Té comi um bolo rei
Sabe do que me lembrei?
A fava que me calhava!...
Amália Rodrigues
.....................................................
Carta a Vitorino Nemésio [1]
Talvez que o anjo esquecido,
O anjo da poesia,
Se tenha de mim perdido
Sem reparar que o fazia...
Por isso me faltam asas
E me sobejam as penas
De um desejo inalcançado:
Que eu gostava de voar
Até ao anjo perdido
O anjo de mim esquecido,
Que por mim é tão lembrado.
Ai se eu tivesse voado
Aonde queria voar
Não estava agora a rimar
Versos de asas cortadas.
Voava junto de si
Assim fico aonde me vê
Mesmo pregadinha ao chão
Com asas de papelão
E sem entender porquê.
Pois a uns faltam-lhe asas
Mas por ter asas cortadas
Sofrem uns e outros não?
Eu tenho sofrido muito
Nos meus voos ensaiados
Que ao querer sair do chão
Ficam-me os pés agarrados,
...E por falar dos pés
Com versos de pés quebrados
Perdoe lá a quem os fez
Pelo mal dos meus pecados
Só os fiz por timidez
Que tenho em me dirigir
A quem tem por lucidez
Razão para distinguir
O bom e o mau Português.
Assim à minha maneira
Aqui venho responder
Desta forma tão ligeira
Que a sério não pode ser!
Amália Rodrigues
...................................................
Carta a Vitorino Nemésio [2]
Ai meu querido professor
O senhor fez-me chorar
Apesar do bom humor
Com que se quis disfarçar.
Não se pode ser mais triste
New ter-se maior razão
Em tudo aquilo que disse,
Do pobre deste país.
Também eu, senhor professor,
Estou triste como o senhor,
Sem poder desabafar
Por não saber versejar.
Mas não me posso calar
Falo comigo sozinha:
Aonde a terra que eu tinha?
Aonde os heróis que amava?
Ou eu andava enganada
Amando o que muito amei?
Francamente já não sei
Aonde está a razão.
Só me dói o coração,
E o coração não engana.
A mim nunca me enganou
De si sempre ele gostou!
E continua a gostar.
Por isso me fez chorar;
Chorou o meu coração
Que lhe sentiu a razão.
Ai meu querido professor
Eu nunca fui sua aluna
Não tenho instrução nenhuma,
Como é que posso entender
O que o senhor quis dizer
Sem saber ler nem escrever?
Há coisas, senhor professor,
Que até se entendem melhor
Se se não é complicado.
Há quem, por ter estudado
Tudo o que outros escreveram,
Entre as letras se perderam,
Já não sabem sequer quem são;
Perderam o coração
Que não se deve perder...
Renego a preparação
De gente tão preparada,
De angústias fazedores
Tudo em nome da justiça
[Desculpe mas digo Chiça!
E eu não sou malcriada]
Mas há coisas que por feias
Dizem melhor das idéias
Que nos passam pela cabeça...
A mim, faltam-me argumentos
Mas ficam-me os sentimentos:
Com eles gosto de si,
Com eles o distingui,
Sem saber ler nem escrever!
Amália Rodrigues
...............................................
Contigo Fica o Engano
Tu andas atrás de mim
Como a pêra atrás do ramo
Tu andas p'ra me enganar
Contigo fica o engano
Contigo fica o engano
Como havia de ficar
Como a pêra atrás do ramo
Andavas p'ra me enganar
Ai vai do vira
Quem ficou a rir
De ti fui eu
Ai vai do vira
O raminho é meu
E o engano é teu
Ai vai do vira
Até Judas mau
Se arrependeu
Ai vai do vira
Quem te vira
A ti sou eu
Tu andas p'ra me enganar
Mas és tu o enganado
Ainda tu estás a mondar
Já tenho o trigo ceifado
Hás de comer muito pão
Hás de sofrer muito frio
Se não me deitas a mão
Eu vou-me deitar ao rio
Amália Rodrigues
.............................................................
Depois Disto...Desisto
Tantas coisas que já li
Outras tantas que vivi
Fazem de mim o que sou
Ai se eu tivesse esquecido
Tudo o que tenho vivido
E o coração decorou
Tudo é questão de memória
É o nosso pensamento
Que a vida nos vai passando
A memória faz história
Do que foi cada momento
Que nós vamos recordando
Isto da alma é segredo
Ninguém sabe desvendar
Os porquês de tudo isto
Sabemos que tarde ou cedo
Iremos a enterrar
E depois disto... desisto
Amália Rodrigues
.....................................
Desespero
Se o desespero ensinasse
Eu já sabia viver
Talvez alguém me pagasse
O que me anda a dever
Se o desespero ajudasse
Eu era muito ajudada
Talvez não desesperasse
De ser tão desesperada
Se o desespero não fosse
Como parece que é meu
Se o desespero não fosse
Seria o que é: sou eu
Amália Rodrigues
..................................................
Entrei Na Vida a Cantar
Entrei na vida a cantar
E o meu primeiro lamento
Se foi cantando a chorar
Foi logo com sentimento
Com as outras raparigas
Pelas ruas a brincar
Corri ao som das cantigas
Parava só p'ra cantar
Mas tarde já mulherzinha
Cantei meu primeiro amor
E também cantei sozinha
A minha primeira dor
A vida tenho passado
Alegre triste a chorar
Tem sido vário o meu fado
Mas constante o meu penar
Amália Rodrigues
...............................................
Estranha Forma de Vida
--------------------------------------------------------------------------------
Foi por vontade de Deus
Que eu vivo nesta ansiedade
Que todos os ais são meus
Que é toda minha a saudade
Foi por vontade de Deus
Estranha Forma de Vida
Que estranha forma de vida
Tem este meu coração
Vive de vida perdida
Quem lhe daria o condão
Que estranha forma de vida
Estranha Forma de Vida
Coração independente
Coração que não comando
Vives perdido entre a gente
Teimosamente sangrando
Coração independente
Estranha Forma de Vida
Eu não te acompanho mais
Pára deixa de bater
Se não sabes onde vais
Porque teimas em correr
Eu não te acompanho mais
Estranha Forma de Vida
..................................................
Eu Vivo a Vida Perdida
Viver é estar-se perdido
Não sei se o terei ouvido
Se o li ou inventei
Desta ou daquela maneira
Não sou menos verdadeira
Nesta verdade que achei
Eu vivo a vida perdida
Sem esperança de me encontrar
Eu vivo e vai-se-me a vida
A tentar compreender
Sem conseguir entender
Porque me sinto perdida
Porque me sinto viver
Cantai-me o último fado
Peço flores dai-me flores
Que eu já vou a enterrar
Já me mataram as dores
Do sol que eu tinha no olhar
Ficou-me a noite tão escura
Talvez fosse de chorar
Amália Rodigues
.......................................................
Faz-me Pena
Que culpa tem o destino
Deste destino que eu tenho
Se o desgosto é pequenino
Eu aumento-lhe o tamanho
É meu destino
Se o desgosto é pequenino
Eu aumento-lhe o tamanho
Se o desespero matasse
Eu já teria morrido
Talvez alguém me chorasse
Talvez o tenha merecido
Talvez alguém
Talvez alguém me chorasse
Talvez o tenha merecido
Sinto que cheguei ao fim
Das ilusões que não tive
Porque alguém gosta de mim
Algo de mim sobrevive
Cheguei ao fim
Mas se alguém gosta de mim
Algo de mim sobrevive
Adeus que chegou a hora
Há muito a venho esperando
E se por mim ninguém chora
Faz-me pena e vou chorando
Já vou embora
E se por mim ninguém chora
Faz-me pena e vou chorando
Amália Rodrigues
...........................................................
Feijoca Catarina
Olha o feijão carrapato
Que é vagem na minha aldeia
Tenho a pedra no sapato
Ninguém ma tira da ideia
O feijão diz à feijoca
Quando lhe toca a ramada
Dá-me cá uma beijoca
Antes de seres descascada
A feijoca Catarina
Mais o feijão Catarino
Queriam uma menina
E nasceu-lhe um menino
Tira o marmelo do forno
Tira o nariz da panela
Toma o café que está morno
Não me abras a janela
Menina minha menina
Onde vais a estas horas
Ó dona da minha sina
Que já sei aonde moras
O galo que tinha medo
Que a dona fosse matá-lo
Saiu de noite em segredo
E foi à missa do galo
Amália Rodrigues
...................................................
Flor De Lua
--------------------------------------------------------------------------------
Solidão
Campo aberto
Campo chão
Tão Deserto
Meu Verão
Ansiedade
Meu irmão
De saudade
Campo sol
Girassol
Branco lírio
Ilusão
Solidão
Meu martírio
Torna a flor
Minha Flor
Campo chão
Torna a dor
Minha dor
Solidão
Vai no vento
A passar
Um Lamento
A gritar
Dó ré mi
Mi fá sol
Dó ré mi
Girassol
Velho cardo
Esguio nardo
Flor de Lua
Mi fá sol
Girassol
Eu sou tua
Torna a flor
Minha flor
Campo chão
Torna a dor
Minha dor
Solidão
Grita o mar
Geme o vento
Teu olhar
Meu tormento
Chora a lua
Flor dourada
Madressilva
Madrugada
Canta a lua
Seminua
Flor mimosa
Sargaçal
Roseiral
Minha rosa
Chora a fonte
Reza o monte
Branca asa
Canta a flor
Chora a flor
Campa rasa
Amália Rodrigues
............................................................
Fiquei à Espera de Ti
Fiquei à espera de ti
Esperei-te todo o dia
E tu deixaste-me aqui
Esqueceste que existia
Fiquei à espera de ti
Mas o dia foi passando
E tu deixaste-me aqui
À espera desesperando
Fiquei à espera de ti
E parou-me o coração
Mas tu deixaste-me aqui
Com a minha solidão
Fiquei à espera de ti
Com meu coração parado
Mas tu deixaste-me aqui
Isso não te deu cuidado
Fiquei à espera de ti
Horas cheias de ansiedade
E tu deixaste-me aqui
Sem nenhuma caridade
Fiquei à espera de ti
E continuo esperando
E tu deixaste-me aqui
E eu vou desesperando
Fiquei à espera de ti
A adivinhar que não vens
E tu deixaste-me aqui
A morder os teus desdéns
Fiquei à espera de ti
Estava tão esperançada
E tu deixaste-me aqui
À espera desesperada
Fiquei à espera de ti
Queria ver-te chegar
E tu deixaste-me aqui
Deixaste-me aqui ficar
Amália Rodrigues
...............................................
Fui Ao Mar Buscar Sardinhas
Fui ao mar buscar sardinhas
Para dar ao meu amor
Perdi-me nas janelinhas
Que espreitavam do vapor
A espreitar lá do vapor
Vi a cara dum francês
E seja lá como for
Eu vou ao mar outra vez
Eu fui ao mar outra vez
La o vapor de abalada
Já lá não vi o francês
Vim de lá toda molhada
Saltou de mim toda a esperança
Saltou do mar a sardinha
Salta a pulga da balança
Não faz mal não era minha
Vou ao mar buscar sardinha
Já me esqueci do francês
A ideia não e minha
Nem minha nem de vocês
Coisas que eu tenho na ideia
Depois de ter ido ao mar
Será que me entrou areia
Onde não devia de entrar
Pode não fazer sentido
Pode o verso não caber
Mas o que eu tenho rido
Nem vocês queiram saber
Não é para adivinhar
Que eu não gosto de adivinhas
Já sabem que fui ao mar
E fui lá buscar sardinhas
Sardinha que anda no mar
Deve andar consoladinha
Tem água sabe nadar
Quem me dera ser sardinha
Amália Rodrigues
...............................................
Fui Atrás da Lua
Fui atrás da lua
Levou-me o luar
Que na minha rua
Me andava a espreitar
Venho atrás da lua
Perdi o luar
Que na minha rua
Me andava a espreitar
Apanhei pampilhos
Que são amarelos
Deixei lá os milhos
Deixei os marmelos
Cantavam papoilas
Cantigas p'ró ar
E andavam moçoilas
Também a cantar
Amália Rodrigues
.......................................
Gostava de Ser Quem Era
Tinha alegria nos olhos
Tinha sorrisos na boca
Tinha uma saia de folhos
Tinha uma cabeça louca
Tinha uma louca esperança
Tinha fé no meu destino
Tinha sonhos de criança
Tinha um mundo pequenino
Tinha toda a minha rua
Tinha as outras raparigas
Tinha estrelas tinha lua
Tinha rodas de cantigas
Gostava de ser quem era
Pois quando eu era menina
Tinha toda a Primavera
Só numa flor pequenina
Amália Rodrigues
.........................................
Gosto de te Ver Assim
Gosto de te ver assim
Gosto de ti ao meu lado
Mas tu não gostas de mim
E andas muito afastado
Gosto de te ver assim
Com qualquer coisa no rosto
A dizer-me que é por mim
Que andas assim bem disposto
Gosto de ter ver assim
A fingir não entender
O sofrimento ruim
Da doença de te querer
Gosto de te ver assim
Mas gostava ainda mais
Que esse assim fosse por mim
Ai Amália, aonde vais...
Amália Rodrigues
.......................................................
Grilo
Grilo grilo grilo
Grigrigrigrigri
O que era aquilo
Que eu nunca vi
Afinal aquilo
Com tanta bravata
Se era mesmo grilo
Parecia barata
Amália Rodrigues
...............................................
Grito
Silêncio
Do silêncio faço um grito
E o corpo todo me dói
Deixai-me chorar um pouco
De sombra a sombra
Há um céu tão recolhido
De sombra a sombra
Já lhe perdi o sentido
Ó céu
Aqui me falta a luz
Aqui me falta uma estrela
Chora-se mais
Quando se vive atrás d'ela
E eu
A quem o céu esqueceu
Sou a que o mundo perdeu
Só choro agora
Que quem morre já não chora
Solidão
Que nem mesmo essa é inteira
Há sempre uma companheira
Uma profunda amargura
Ai solidão
Quem fora escorpião
Ai solidão
E se mordera a cabeça
Adeus
Já fui p'r'além da vida
Do que já fui tenho sede
Sou sombra triste
Encostada a uma parede
Adeus
Vida que tanto duras
Vem morte que tanto tardas
Ai como dói
A solidão quase loucura
Autora: Amália Rodrigues
.................................................
Horas de Vida Perdida
Horas de vida perdida
À procura de viver
Vai-se à procura da vida
Não a encontra quem quer
Quem sou eu para dizer
Quem sou eu para o saber
Nem sei se sou ou não sou
Ninguém pode conhecer
Isto de ser e não ser
Sem saber sei entender
Assim sei o que não sei
Sinto que sou e não sou
Entre o que sei e não sei
A minha vida gastei
Sem conseguir entender
Ai quem me dera encontrar
As rimas da poesia
Ai se eu soubesse rimar
Tantas coisas que eu dizia
Amália Rodrigues
..................................
Ilusão
O mundo fez em bocados
O meu pobre coração
Que eu trazia sem cuidados
Na palma da minha mão
Roubaram-me a confiança
E a ilusão com que nasci
Desde então perdi a esperança
E nunca mais me iludi
A vida desfez em choro
O sol que eu tinha no olhar
Na solidão onde moro
Meus olhos são p'ra chorar
Meus olhos são p'ra chorar
Meu Coração p'ra sofrer
Minhas mãos para fechar
Meu corpo para morrer
Amália Rodrigues
............................................
Lágrima
--------------------------------------------------------------------------------
Cheia de penas
Cheia de penas me deito
E com mais penas
E com mais penas me levanto
No meu peito
Já me ficou no meu peito
Esse jeito
O jeito de te querer tanto
Desespero
Tenho por meu desespero
Dentro de mim
Dentro de mim o castigo
Não te quero
Eu digo que não te quero
E de noite
E de noite sonho contigo
Se considero
Se considero que um dia
Hei de morrer
No desespero
Que tenho de te não ver
Estendo o meu xaile
Estendo o meu xaile no chão
Estendo o meu xaile
E deixo-me adormecer
Se eu soubesse
Se eu soubesse que morrendo
Tu me havias
Tu me havias de chorar
Uma lágrima
Por uma lágrima tua
Que alegria
Me deixaria matar
Autora: Amália Rodrigues
..............................
Lavadeira Cheirosa
Lá p'rós lados da Malveira
Conheci a malva rosa
Que era uma lavadeira
Que andava sempre cheirosa
Nas camisas sem botões
Ela pregava o botão
Tudo por cinco tostões
E ainda dava o sabão
Foi um dia lavar roupa
A casa d'um senhorio
E a danada da garota
Achou que ele era bonito
Cheira bem a malva rosa
Dizia todo o freguês
E ela sempre bem cheirosa
La lá mais uma vez
Ai menina da Malveira
Que cheiras a malva rosa
Deixa-me ver a maneira
De eu te cheirar tão cheirosa
Amália Rodrigues
...................................................
Lavava No Rio Lavava
--------------------------------------------------------------------------------
Lavava no rio lavava
Gelava-me no frio gelava
Quando ia ao rio lavar
Passava fome passava
Chorava também chorava
Ao ver minha mãe Chorar
Cantava também cantava
Sonhava também sonhava
E na minha fantasia
Tais coisas fantasiava
Que esquecia que chorava
Que esquecia que sofria
Já não vou ao rio lavar
Mas continuo a chorar
Já não sonho o que sonhava
Se já não lavo no rio
Porque me gela este frio
Mais do que então me gelava
Ai minha mãe minha mãe
Que saudades desse bem
Do mal que então conhecia
Dessa fome que eu passava
Do frio que me gelava
E da minha fantasia
Já não temos fome mãe
Mas já não temos também
O desejo de a não ter
Já não sabemos sonhar
Já andamos a enganar
O desejo de morrer
Amália Rodrigues
...............................................
Mãos Desertas
Nesta solidão que é minha
Mora a minha inquietação
E esta angústia que me mata
Mora no meu coração
Salvai o meu coração
Que se queima na fogueira
No fogo desta paixão
Que será pr'á vida inteira
O nosso amor, meu amor
É bom e faz-me sofrer
Prazer que me traz a dor
Do medo de te perder
Amália Rodrigues
......................................................
Menina da Saia Verde
Menina da saia verde
Menina do verde olhar
Quem por amores se perde
Muito terá que chorar
Menina da saia verde
E do avental de folhos
Quem por amores se perde
Não sabe onde põe os olhos
Menina da saia verde
Que bem que lhe fica a saia
Quem por amores se perde
Deixa-me a mim de atalaia
Menina da saia verde
Eu já lhe vejo encarnada
Quem por amores se perde
Troca as cores não vê nada
Menina da saia verde
Ai que verde que ainda é
Quem por amores se perde
Olarilarilolé
Amália Rodrigues
................................
Menina Menina
Olhei um arbusto
Que era o meu busto
E entre sargaços
Estendi os meu braços
Pelos areais ficaram meus passos
E dos meu cabelos caíram os laços
No meu coração
Ficaram Cansaços
Perdi meus abraços entre a solidão
E o meu coração
Na palma da mão
Deixei-o ficar
Caiu-me no chão
Caiu-me no chão
Deixei-o ficar
Que sem coração
Não se pode amar
Disseram-me estrelas
E desejei tê-las
Disseram-me céu
E o céu era meu
Disseram-me amor
Conheci a dor
Disseram-me irmão
E era traição
Disseram-me lua
E eu dormi na rua
Disseram-me Deus
Ai pecados meus
Menina menina
Flor de Primavera
Quem te deu a sina
Quem tua já era
Amália Rodrigues
.........................
Menina Que Sabe Ler
Menina que sabes ler
Também sabes soletrar
Diga lá minha menina
Quantos peixes tem o mar
Quantos peixes tem o mar
Eu ainda os não contei
Vou aprender a nadar
Pois contar ainda não sei
Vou aprender a nadar
Meu senhor nadar não sei
Só depois lhe posso dar
A resposta que não dei.
Amália Rodrigues
...............................
Meu Coração Sem Direito
Lá foi o tal coração
Que eu tinha contravontade
Lá foi aquele ladrão
Não sei para que cidade
O meu velho coração
Que ficou triste comigo
Por causa desse ladrão
Não volta a ser meu amigo
Pobre de quem envelhece
Por fora do coração
Que novo nos aparece
Com uma nova paixão
Meu coração sem direito
De bater tão apressado
Anda dentro do meu peito
Onde não cabe coitado
Vai-te embora coração
Eu não sou boa morada
Onde mora a solidão
Não há lugar p'ra mais nada
Amália Rodrigues
.............
Morrinha
Ai sonhos prantos rios vosso corpo
De lírio e hortelã agreste
São sonho que morre
São água que corre
Que da minha sede
Bebeste
Na minha cama há um lençol de linho
Que hoje é como eu sozinho
A sua brancura
E a minha ternura
São minha loucura
Meu espinho
Na minha solidão que é toda minha
Na minha solidão sozinha
Tristeza em botão
Que eu guardo na mão
Crescendo crescendo
Morrinha
Amália Rodrigues
..................................
Nasçam os Amores
Lembram lenços a acenar
Lembram bandeirinhas brancas
As nuvens que andam no ar
Nossa Senhora medita
Do Céu em paz a descer
E a manhã está tão bonita
Morram dores
E nasçam os amores
Abram flores
A cantar
Oliveira
Na paz do olival
Dá-me a tua flor primeira
Natal
Sobre uma nuvem além
Eu vi mas não posso crer
O menino e sua mãe
Menino de mãos macias
Sejam teus gestos primeiros
Louvados todos os dias
Amália Rodrigues
......................................
O Bicho de Conta
O bicho de conta
Todo se fechou
Na minha mão tonta
Quando o apanhou
E nela ficou
Todo enroladinho
Fez-me comichão
O raio do bichinho
Encontrei o mocho
Agarrei o gato
O mocho era coxo
Era gago o gaio
Mas fugiu-me o coxo
E falou-me o gaio
Ora vai do vira
À noite é que eu saio
Fui atrás da lua
Encontrei o sol
E vi os pauzinhos
A um caracol
Amália Rodrigues
.......................................
O Fado Chora-se Bem
Moram numa rua escura
A tristeza e a amargura
A angústia e a solidão
No mesmo quarto fechado
Também lá mora o meu fado
E mora meu coração
Tantos passos temos dado
Nós as três de braço dado
Eu a tristeza e a amargura
À noite um fado chorado
Sai deste quarto fechado
E enche esta rua tão escura
Somo vizinhos do tédio
Senhor que não tem remédio
Na persistência que tem
Vem persistência que tem
Vem p'ró meu quarto fechado
Senta-se ali a meu lado
Não deixa entrar mais ninguém
Nesta risonha morada
Não ha lugar p'ra mais nada
Não cabe lá mais ninguém
Só lá cabe mais um fado
Que neste quarto fechado
O fado chora-se bem
Amália Rodrigues
...........................................
Ó Gente da Minha Terra
Ó gente da minha terra
Agora é que eu percebi
Esta tristeza que trago
Foi de vós que a recebi
É meu e vosso este fado
Destino que nos amarra
Por mais que seja negado
Às cordas de uma guitarra
Sempre que se ouve um gemido
Duma guitarra a cantar
Fica-se logo perdido
Com vontade de chorar
E pareceria ternura
Se eu me deixasse embalar
Era maior a amargura
Menos triste o meu cantar
Amália Rodrigues
.............................
O Mosquito Mordeu-me No Olho
Passou um mosquito
Mordeu-me no olho
Não vi a lagarta
Comi o repolho
Comi a larga
Que o repolho tinha
E disse à lagarta
Que a couve era minha
E a lagartinha
Deu-me uma resposta
E eu não repito
Que você não gosta
O raio da lagarta
Tão mal se portou
Um raio que a parta
Tanto me enjoou
Comi a lagarta
Fiquei enjoada
Mordeu-me o mosquito
E não vejo nada
Vejo agora ali
Aquilo que eu queria
Vi o que já vi
Que é da minha tia
É o seu burrico
Que passa na estrada
Aqui já não fico
Vou nele montada
Burro sem ser burro
Burro sem burrice
Burro inteligente
Que grande chatice
Sem andar p'rá frente
Nem andar p'ra trás
Apanhou-me rente
Deu-me um coice...zais
Amália Rodrigues
...........................
Ó Pinheiro Meu Irmão
Ribeiro não corras mais
Que não hás de ser eterno
O verão vai-te roubar
O que te deu o Inverno
Até a lenha do monte
Tem sua separação
Duma lenha se faz santos
E d'outra lenha
Se faz o carvão
Ando caída em desgraça
O que é que eu hei de fazer
Todos os santos que pinte
Demônios têm que ser
São tão grandes minhas penas
Que me deitam afogar
Vêm umas atrás das outras
Tal como as ondas
Andam no mar
Apanho e como as raízes
Que estão debaixo da terra
Só as ramas não as como
Porque essas o vento as leva
Ó pinheiro meu irmão
Tu também es como eu
Também tu estendes em vão
Ó pinheiro meu irmão
Teus braços p'ró céu
Amalia Rodrigues
...................................
O Tempo Dantes Corria
O tempo dantes corria
E eu ainda corria mais
Mas vi-te e desde esse dia
Que correm mais os meus ais
O tempo dantes corria
E com ele meus folguedos
Mas vi-te e desde esse dia
Correm p'ra ti meus segredos
O tempo dantes corria
E eu corria para a vida
Mas vi-te e desde esse dia
Fiquei de vida perdida
O tempo dantes corria
E eu vivia a correr
Mas vi-te e desde esse dia
Que corro só p'ra te ver
Amália Rodrigues
....................................
Olha a Ribeirinha
Olha a ribeirinha
Que sonhou ser rio
Sonho de grandeza
De ribeira presa
Que vai com certeza
Deixar de sonhar
Anda ribeirinha
Corre ligeirinha
Não choras sozinha
Mais chorou o mar
Olha a ribeirinha
Que é do sonho que ela tinha
De pedra, pedrinha a pedrinha
Vai correndo a ribeirinha
Vi a ribeirinha
Que triste que vinha
Sonhou a ribeira
Com a terra inteira
A correr ligeira
Seu sangue gastou
Da mesma maneira
Sequei eu ribeira
Da mesma maneira
Meu sonho secou
Ai a ribeirinha
Que tinha o sonho que eu tinha
Chorando, gotinha a gotinha
Vai secando a ribeirinha
Amália Rodrigues
Os Teus Lindos Olhos Pretos
Os teus lindos olhos pretos
Teus olhos de negro olhar
Olham-me tão inquietos
Que me andam a inquietar
Inquieta se te não vejo
Inquieta por te não ver
Inquieta-me o que eu desejo
E o medo de o dizer
Cá me ando com a ternura
Que tem o tem negro olhar
Nunca vi tanta negrura
Mesmo no escuro a brilhar
Amália Rodrigues
...................
Perdoai Senhor
Deus me perdoe o pecado
Que não há de perdoar
O de ter na vida andado
Sem ter vontade de andar
Perdoai Senhor pecados
De meu pobre coração
Que eu trazia sem cuidados
Na palma da minha mão
Deus me perdoe o pecado
E que pese na balança
Depois de o ter confesso
Que peço perdão sem esperança
Faço ato de contrição
Senhor meu Deus perdoai-me
Dou-vos o meu coração
Em troca dele ajudai-ma
Perdoai-me meu Senhor
Senhor do meu coração
O pecado ainda maior
Perdoai-me a ingratidão
Amália Rodrigues
.................................
Perlimpimpim
Perlimpimpim
Com galhardia
Lá vem a banda
A marchar
Com o marcar
Da bateria
Olha os rapazes
Que lindos modos
E que afinadas
São quarenta
Parece um
E tocam todos
Cadenciados
Os seus passinhos
Enfileirados
Como vês
Vão três a três
Todos certinhos
Tchim pum tchim pum
Fazem os pratos
Tchim pum tchim pum
Fazem saltar
O coração
Dos mais pacatos
Vão saxofones
E Clarinetes
Parecem d'oiro
Os cornetins
Parecem d'oiro
Os cornetins
Mais os flautins
E os trompetes
Pim pim pim pim
Faz o flautim
Pim pim pim pim
Me faz assim
O coração
Dentro de mim
Olhem ali
Aquele miúdo
Pim pim pim pim
Toca Ferrinhos
Com ar de quem
Toca tudo
O meu rapaz
É o do bombo
Olhou p'ra trás
Para me ver
Zás catrapás
Que grande tombo
O contrabaixo
Que vai ao alto
Para acertar
Com o compasso
Deu agora
Um grande salto
E cada um
Toca o que sabe
Na opinião
Do pelotão
O sabichão
Nunca lá cabe
Se desafina
Alguma nota
Foi a má sina
E logo o baixo
Toca alto
E não se nota
Não é sinfónica
Mas é harmónica
A dominante
É a alegria
E a amizade
A sinfonia
Amália Rodrigues
..................................
Por Que Voltas De Que Lei
Por que voltas de que lei
Vem este sentir profundo
Por te saber como sei
Me sinto dona do mundo
Por que espada de que rei
Meu amor é fogo posto
És tanto de quanto amei
Que és tudo de quanto gosto
Por este amor que te tenho
Por ser assim como sou
És inferno donde venho
És o céu para onde vou
Por que voltas de que lei
És tudo de quanto gosto
Me perdi e me encontrei
Nas voltas que tem teu rosto
Por que voltaste de que rei
Em meu peito teu desenho
És tanto de quanto amei
Que és todo o mundo que tenho
E de tão rica que estou
Nunca tão pobre fiquei
Por ser assim como sou
E te saber como sei
Amália Rodrigues
.........................
Quadras Soltas
Joguei às cinco pedrinhas
Perdi todas as jogadas
Quando vi que tu não vinhas
Pedrinhas eram pedradas
Papoila grito de cor
Tanto trigo te quer bem
Mais quero eu ao meu amor
Amor que amor não me tem
Tenho um lindo namorado
Que me ama perdidamente
Tem um defeito coitado
Ama assim toda a gente
Quem o seu amor perdeu
E não queria ter perdido
Anda a chorar como eu
Que trago o meu no sentido
Abri-te o meu coração
Tu fechas-me a tua casa
E não te vejo senão
Com um grãozinho na asa
Ao alto céu eu subi
Fiz escritura com Deus
Quando te der morte a ti
Quando te der morte a ti
Nessa hora morra eu.
Amália Rodrigues
.......................................
Quando Lavava No Rio
Quando lavava no rio
Ao pé de um grande salgueiro
Olhei para cima e vi-o
Mas ele vi-me primeiro
Sentei-me de madrugada
Na minha cama vazia
Era uma alma penada
Nem sonhava nem dormia
Tu estrela da manhãzinha
Que me olhas lá do céu
Gostava que fosses minha
Que o teu brilho fosse meu
Deixai-me com passarinhos
Que quando andam no chão
Que saltando pelos caminhos
Me alegram o coração
Deixai-me viver nos montes
Comendo frutos da terra
Bebendo água das fontes
Deixai-me perder na serra
Correndo correndo a terra
Dá tantas voltas redondas
Voltas que fazem o vento
O vento que faz as ondas
Amália Rodrigues
..................................
Quando o Domingo Chegava
--------------------------------------------------------------------------------
Quando o domingo chegava
Vestia a saia amarela
E o meu avental de folhos
Mais roupa não precisava
Que o meu avental de folhos
E o sol que eu tinha nos olhos
Com a minha saia amarela
Com o meu avental de folhos
Com o meu corpete encarnado
Calçava a minha chinela
Notava-se me nos olhos
Que já tinha namorado
Domingos da minha rua
Não é minha nem é tua
O limão anda na roda
Alargai-vos raparigas
Lembram-me ainda as cantigas
Que enchiam a rua toda
Cantigas de boca em boca
Boca de criança louca
Ora chorando ora rindo
Domingos da minha rua
Não é minha nem é tua
E tudo me vai fugindo
Quando o domingo chegava
Vestia a saia amarela
E o meu lenço cor de rosa
Calçava a minha chinela
Que bem dançava com ela
Que nisso era caprichosa
Com a minha saia amarela
Todos Olhavam p'ra ela
Depois olham-me nos olhos
Não era feia catraia
Ficava-me bem a saia
E o meu avental de folhos
Quando o domingo chegava
Tinha uns tostões que guardava
E comprava um pirolito
Metia o dedo na bola
E ficava toda tola
Achava aquilo bonito
Quando o domingo chegava
Chegava a segunda-feira
La-se a minha alegria
E aí pela sexta-feira
Já meu coração sorria
Amália Rodrigues
.......................................
Quando Se Gosta de Alguém
--------------------------------------------------------------------------------
Quando se gosta d'alguém
Sente-se dentro da gente
Ainda não percebi bem
Ao certo o que é que se sente
Quando alguém gosta d'alguém
É de nós que não gostamos
Perde-se o sono por quem
Perdidos de amor andamos
Quando alguém gosta d'alguém
Anda assim como ando eu
Que não ando nada bem
Com este mal que me deu
Quando se gosta d'alguém
É como estar-se doente
Quanto mais amor se tem
Pior a gente se sente
Quando se gosta d'alguém
Como eu gosto de quem gosto
O desgosto que se tem
É desgosto que dá gosto
Amália Rodrigues
........................................
Quem Conseguir Esquecer
--------------------------------------------------------------------------------
Quem conseguir esquecer
Que veio cá para morrer
Pode guardar ambições
Pode rir pode viver
Se não pensar em morrer
Pode viver de ilusões
Quem conseguir esquecer
Que veio cá para morrer
É mais feliz do que eu
Faça eu o que fizer
Não posso deixar de ver
Morrer tudo o que nasceu
Amália Rodrigues
........................................
Quero Cantar Para a Lua
--------------------------------------------------------------------------------
Quero cantar para a lua
Deixem-me cantar na rua
Pois foi da rua que eu vim
Vim da rua vim das pedras
Nada sei das vossas regras
Regras não são para mim
Deixem-me chorar ao vento
Deixem andar meu lamento
Pode ser que chegue ao céu
Deixem-me o meu pensamento
Que embora seja tormento
Que seja mas seja meu
Amália Rodrigues
.....................................
S. João Menino
--------------------------------------------------------------------------------
Ó meu S. João Menino
Dá-me cá a tua mão
P'ra me mudar o destino
Ó meu rico S. João
Ó meu S. João Menino
Dá-me cá a tua mão
Ö meu rico S. João
s. João das Fontaínhas
Vim de longe S. João
Já gastei as chinelinhas
Dá-me meu S. Joãozinho
Dá-me cá a tua mão
Que eu ponha nela um raminho
Lá das Serras do Marão
Eu prometo S. João
Pecar o menos que posso
E que depois do serão
Rezo sempre um padre nosso
Eu trago-te S. João
Raminhos de bem querer
Faz S. João que o João
Me faça sua mulher
Que eu trago-te S. João
Raminhos de bem querer
Ó meu S. João
Ó meu S. João
Tu és o santinho
Do meu coração
Ó meu S. João
Ó meu S. João
S. João menino
Dá-me a tua mão
Amália Rodrigues
.....................
Saloia Bonita
--------------------------------------------------------------------------------
Lá p'rós lados da Malveira
Há uma saloia bonita
Tem a cor duma roseira
E a quem mexe nela pica
Ai que bonita maneira
Tem ela no seu andar
Passa e lá vai a roseira
A picar quem a olhar
Todos sabem que o João
Gosta daquela roseira
P'ra lhe colher o botão
Dava a sua vida inteira
Mas a saloia é que não
Quer o João da Malveira
Já deu o seu coração
Por isso pica a roseira
Por isso pica a roseira
Roseira de linda cor
Sua cor é verdadeira
Roseira dum só amor
Lá anda pela Malveira
A rosa dum só amor
Pelos caminhos ligeira
A picar seja quem for
Amália Rodrigues
Se Deixas de Ser Quem És
--------------------------------------------------------------------------------
Meu amor d'alfazema
De alecrim e rosmaninho
Queria fazer-te um poema
Mas perco-me no caminho
Nossa Senhora das Dores
Meu raminho d'oliveira
Eu ando cega d'amores
Não me cureis a cegueira
Nossa Senhora das Dores
Sede a minha padroeira
Entra em mim um mar gelado
Em dias que te não vejo
Sou um barco naufragado
Mesmo sem sair do Tejo
Ai de mim que ando perdida
Que ando perdida de amores
Perdida entre temores
Perdida entre as marés
Ai de mim fico perdida
Se deixas de ser quem és
Tens mãos macias de gato
Meio manso meio bravio
Olhas às vezes regato
Outras mar e outras rio
Amália Rodrigues
.........
Se é Vida Não me Parece
--------------------------------------------------------------------------------
Tinha duas mãos abertas
E o sentimento do mundo
Tenho agora as mãos desertas
E um desgosto profundo
Se é vida não me parece
A este acontecimento
Que tão pouco me apetece
Chamo eu aborrecimento
P'rá vida ser tão cantada
Tem de ser melhor por certo
Não é decerto a maçada
Que eu tenho neste deserto
É morte o que me acontece
E morta ainda me espanto
Da vida que não merece
Nem mesmo este desencanto
Que vontade de chorar
Ai pranto de sete rios
Que ânsia de descansar
Amortalhada de estios
Amália Rodrigues
............................
Sofrendo da Alma
--------------------------------------------------------------------------------
Mais do que o corpo é a alma
É a alma que me dói
Que foi sofrendo da alma
Que a minha vida se foi
Que foi sofrendo da alma
Que a minha vida se foi
Mais do que o corpo é a alma
É a alma que me dói
Há muito que não sonhava
E esta noite sonhei
Sonhei hoje que tem amava
Deus o que eu hoje sonhei
Longe do meu pensamento
A ideia de te amar
Amei-te em sonho um momento
Vê lá o que eu fui sonhar
Foi sonho que não esperava
Sonho que me deslumbrou
Não sabia que te amava
E hoje não sei quem sou
Amália Rodrigues
...................
Sou Filha das Ervas
--------------------------------------------------------------------------------
Trago o alecrim
Trago o saramago
Cheira-me a jasmim
O resto que trago
Trago umas mezinhas
Para o coração
Feitas das ervinhas
Que apanhei no chão
Sou filha das ervas
Nelas me criei
Comendo as azedas
Todas que encontrei
Atrás das formigas
Horas que passei
Sou filha das ervas
E pouco mais sei
Rosa desfolhada
Quem te desfolhou
Foi a madrugada
Que por mim passou
Foi a madrugada
Que passou vaidosa
Deixou desfolhada
A bonita rosa
Ramos de salgueiro
Terra abrindo em flor
Amor verdadeiro
É o meu amor
Papoila que grita
No trigo doirado
Menina bonita
Rainha do prado
Amália Rodrigues
.....................
Tenho Campos Tenho Flores
--------------------------------------------------------------------------------
Tenho campos tenho flores
Tenho sol e tenho o céu
Tenho o mar e tenho amores
Que mais posso querer eu
Depois do dia vem noite
Depois da noite vem dia
E depois de ter saudades
Vem as saudades que havia
Porquê esta ânsia louca
Que de repente me invade
Que não quer a minha boca
Dizer que é mais que saudade
Será que valho a canseira
Do nosso tempo perdido
Não sei de qualquer maneira
Acho o retracto parecido
Amália Rodrigues
.........................
Tenho Desgostos de Amor
Tenho desgostos de amor
Não quero deixar de os ter
Para mim seria pior
E quero guardá-los bem
É um mal de bom sabor
Quando se gosta d'alguém
Tenho desgostos d'amor
E quero guardá-los bem
Não quero que a minha dor
Faça sofrer mais alguém
Tudo é verdade e caminho
Tudo leva ao mesmo fim
O mundo todo inteirinho
Não há ninguém que não chore
Tudo passa tudo morre
E tenho pena de mim.
Amália Rodrigues
..............................
Tenho Dois Corações
--------------------------------------------------------------------------------
Eu tenho dois corações
Dentro e fora do meu lar
Eu tenho dois corações
Já me não podem bastar
Quando a tristeza é tão triste
Qual dos dois sofrerá mais
O que é real não existe
Eu tenho dois corações
Ambos eles irreais
Dois corações o primeiro
Pertence à rua e ao pecado
O segundo é cativeiro
De quem me fez caminheiro
Sem nunca ter caminhado
Amália Rodrigues
.......................................
Tenho Uma Cabra Cabrita
--------------------------------------------------------------------------------
A rola põe-se na rua
O botão põe-se na casa
Vem o sol e vai a lua
E a formiga perde a asa
Perco eu a inspiração
Tudo o que faço não rima
Já perdi o que foi para baixo
E vou perder
O que vem para cima
Tenho uma cabra cabrita
Que lindos saltos me dá
É uma cabra tão bonita
Que é cabra mas não é má
Tenho uma abelha rainha
Que da minha aldeia trouxe
Linda toda amarelinha
Da cor do seu mel tão doce
Tenho um grilo na gaiola
Um galo na capoeira
Tenho na porta uma argola
E vivo desta maneira
Tenho um noivo militar
Que já me deu um anel
Só espero p'ra me casar
Que ele saia do quartel
A casca da fava não é
Igual à da ervilha
E também o garrafão
É diferente da bilha
Vinho leva o garrafão
Cheia de água vai a bilha
Já tenho a fava na mão
Já só me falta a ervilha
Amália Rodrigues
...................................................
Teus Olhos São Duas Fontes
--------------------------------------------------------------------------------
Teus olhos são duas fontes
Que eu queria ver chorar
Agua a correr pelos montes
Que chegasse ate ao mar
Teus olhos são meus pecados
Teus olhos pecados são
Que eu mesmo d'olhos fechados
Sei aonde teus olhos estão
Teus olhos são andorinhas
Que aparecem com o calor
Meu amor vê se adivinhas
O que já sabes de cor
Teus olhos duas asinhas
Que tu bates de mansinho
Teus olhos são andorinhas
Que perderam o caminho
Autora: Amália Rodrigues
................................
Tive Um Coração Perdi-o
--------------------------------------------------------------------------------
Tive um coração perdi-o
Ai quem mo dera encontrar
Preso no fundo do rio
Ou afogado no mar
Quem me dera ir embora
Ir embora sem voltar
A morte que me namora
Já me pode vir buscar
Tive um coração perdi-o
Ainda o vou encontrar
Preso no lodo do rio
Ou afogado no mar
Amália Rodrigues
.........................
Trago Fados Nos Sentidos
--------------------------------------------------------------------------------
Trago fados nos sentidos
Tristezas no coração
Trago os meus sonhos perdidos
Em noite de solidão
Trago versos trago sons
Duma grande sinfonia
Tocada em todos os tons
Da tristeza e da agonia
Trago amarguras ao molhos
Lucidez e desatinos
Trago secos os meu olhos
Que coram desde meninos
Trago noites de luar
Trago planícies de flores
Trago o céu e trago o mar
Trago dores ainda maiores
Amália Rodrigues
.....................
Vi o Menino Jesus
Vi o Menino Jesus
Que bonito que ele vinha
Trazia estrelas de luz
Ou eram brincos que tinha
Cabelos de seda tinha
Deu-lhos Nossa Senhora
Com pezinhos de andorinha
Andava pelo céu fora
Nossa Senhora
Meu roseiral
Enchei de rosas
Este Natal
Dois passarinhos azuis
Nos seus olhos lhe vi eu
Voando descendo à terra
Cantando voando ao céu
Lá vai uma lá vão duas
Três estrelinhas brilhando
Anda o Menino Jesus
À roda delas brincando
Vi o Menino Jesus
Seus olhos são estrelinhas
Suas mãos sinal da cruz
Seus pezinhos de andorinhas
Andam as nuvens ligeiras
E as estrelas no céu
A dizer umas às outras
O meu menino é meu
Amália Rodrigues
.............................................
335 Gafanhotos
335 gafanhotos
30 carochas
3 cabrochas
335 gafanhotos
Eu de galochas
30 carochas
Eram cem sapos
Cabras cabrochas
Vinham patinhos
Pintainhos
Outros bichinhos
Engraçadinhos
E as galinhas
Molhadinhas
Estupidazinhas
Iam atrás
Amália Rodrigues