versos diversos

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Livro experimental da disciplina de Processos de Edição II do curso de Letras (Tecnologias de Edição) do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais

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Page 1: Versos Diversos

VersosDiversos

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Organizadoras

Ana Paula BritoMaria Madalena Santos Pereira

Laura Perácio Rezende BorgesRosemary Gonçalves

VersosDiversos

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Versos Diversos © 2015

Este livro foi produzido de forma experimental como trabalho da disciplina Pro-cessos de Edição II, do curso de Letras (Tecnologias de Edição), no CEFET-MG.

Ficha catalográfica elaborada pelas organizadoras

OrganizadorasAna Paula Brito

Maria Madalena Santos PereiraLaura Perácio Rezende Borges

Rosemary Gonçalves

Seleção de poemasLaura Perácio

Diagramação/CapaThaís Carolina Girodo Andrade

RevisãoAna Paula Brito

ProfessorPablo Guimarães

Versos Diversos /Ana Paulo Brito, Maria Madalena Santos Pereira, Laura Pe-rácio Rezende Borges, Rosemary Gonçalves.Belo Horizonte: CEFET-MG, 2015. 108 p.

ISBN 123-45-6789-012-8

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Sumário

Apresentação ................................................................................. 7

Ana Elisa Ribeiro .......................................................................... 9

Bianca Bruzinga ............................................................................ 12

Carolina Bezerra de Souza ............................................................ 23

Dafne Marques .............................................................................. 25

Filipe Fernandes ............................................................................ 28

Gabriel Calassa ............................................................................. 38

Karine Faria .................................................................................. 40

Luís Antônio Matias Soares .......................................................... 60

Marco Antônio Trindade ............................................................... 80

Pedro H. Lopes .............................................................................. 82

Rafael Rosa ................................................................................... 84

Raquel Rodrigues .......................................................................... 86

Rogério Barbosa Silva ................................................................. 102

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Apresentação

Nossa ideia inicial não era produzir um livro de poesias, mas optamos por esse tema porque tínhamos maior afinidade. Pensamos em poesia, pois é um modo de ver o lado simples

das coisas e valorizá-las por tal singularidade.Este livro é resultado de uma tarefa árdua de alunos e tam-

bém de alguns professores do Centro Federal de Educação Tecno-lógica de Minas Gerais (CEFET-MG), que nos cederam poemas, na qual a colaboração de todos foi de extrema relevância para o desen-volvimento desse projeto.

Primeiramente pensamos em como conseguiríamos o con-teúdo para o livro, foi quando Laura, participante do projeto, teve a ideia de divulgar pelas redes sociais que precisaríamos de poesias para a confecção do nosso livro de antologias poéticas. Para nossa surpresa, a caixa de entrada do e-mail e o facebook não paravam de receber poesias de estudantes do CEFET, que concediam um pou-quinho de suas emoções transcritas em versos para a preparação do livro, cada uma com sua própria essência e autenticidade.

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Ana Elisa Ribeiro1

reza

eu tenho pensado em tanta coisaultimamente tenho me distraído tantotudo porque faço ficção com minhas lembrançase comparo meus dias com meus desejos

se eu deixasse estarficasse como épassaria grande parte do meu tempovivendo meus dias queimando meus desejos em velas acesasem intenção de santa rita

meus desejos realizadosviraram vigase os que são ainda desejosviraram cinza

1 Todos os poemas foram retirados do livro Fresta por onde olhar (2008).

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cultivo

planta vento,poeta que me arremessa

tempestades-ninfas virão entregar-teconfissões da musa inquieta

planta o vento sossegado que aponta ao lestee colhe a tempestade de amorque tu mesmo fizeste

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bem-servida [receita para servir crua]

esta carne brancacrua, quase francaquase nuaé pra ser tua

pra ser comida rentemuito quente

bem-servidaé pra ser bebida

na dúvida,crava o dente

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Bianca Bruzinga

poxa vida

Poxa vidaQue vida é essa?Não há intrigasE nem conversas

Estão malucosE viciadosNa pior droga Dos desalmados

Paga está me tira dessaSaca essa e vem pra cáPoxa vida, mas que fadigaIsto só é vida em Bagdá

Poxa vida, mas quem me digaHoje é dia de eu ir cantar Na varanda da minha casa Eu posso ver o mundo acabarDá varanda da minha casa Eu vou ver tudo terminar

Em mais uma dessas tais guerras Que o homem só inventou

Pra acabar com todas as maldades E se tornar um superior

Pra acabar com todas as maldades E se tornar um superior

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Onde estão todas as verdadesQue ninguém nunca descobriuDevem estar em alguma caixaProgramadas para nunca abrirDevem estar dentro de uma caixaProgramadas para nunca abrir

Poxa vida vamos pra briga Obrigados querendo ou nãoHoje eu quero dizer a vidaIsso não é só ilusãoHoje eu quero dizer pra vida Que somos donos dessa nação Hoje eu quero dizer a vidaViva sem medo da emoção.

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é mulher

Todo dia ela acorda cedoTodo dia ele vai para o trabalhoSe arruma, se costura E se impõem novamenteHá uma postura delicada

Leva uma cantada bem de leveNa garagem estaciona o carroSe prepara para um novo diaDe uma mesma rotinaCom o mesmo cansaço

Bota salto, mas não sei por que Tá com raiva, mas não quer baterDe segura na amarguraPega e jura que na rua Aquela mulher vai ver

Tá botando sua cara á baterBota fogo, mas não sei em queTá com raiva quer extravasarEla então vai dançarAté o fim chegar

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cavalheiros não existem mais

Decidiu ao se lembra de um caraQue pediu pra esperar Foi embora sem nem darUma palavra delicadaUma palavra que lhe agradaUma palavra de amor

Tá cantando mesmo sem querer Tá fazendo o maior lerereTá botando pra quebrar É hoje que tem que achar O cara certo pra amar

É mulher também mãe dedicadaPõe na mesa ela é dona de casaPai e mãe ela também trabalhaEla quer ser amadaAmada e respeitada

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pra continuar!

Não se pode esquecer o que não da pra lembrarPorque já foi esquecidoNão se pode chorar pelo o que já passouPois o passado ficou e não vai voltarEsconder a cabeça e fugir da verdadeAceitar a maldade do mundoNão da , não da, não da...Pra continuar

A fazer o que você faz todo diaQuando atravessa pra não passar ao ladoDa tristeza da falta de amorDa insanidadeQuando vira as costas para o que não que verQuando fecha os olhos para se esconderQuando você se deixa manipular, se deixa manipular.Não da, não da, não daPra continuar

Pare de correr em cima da esteiraPare de falar com a mão na bocaPare de escutar só com um ouvidoAcorde e saia da bolhaTrate de tirar a mascara do inimigo

Tende de descobrir os verdadeiros heróisTente preservar seus leais amigos

Tende desatar todo esse nóNão dá, não dá, não dáPra continuar

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A fazer o que você faz todo diaQuando atravessa pra não passar ao ladoDa tristeza da falta de amorDa insanidadeQuando vira as costas para o que não que verQuando ao se sentar em frente a TVVocê se deixa manipular, se deixa manipularNão da, não da, não daPra continuar

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falo o que posso fazer

Olhe bem aquele moço que só vive a falarTão correto que as vezes me coloco a perguntarSerá que seu mundo é certo ou é uma bagunça total?Será que acredita em si ou é somente um falador?

Eu sou pobre, brasileiro, sou mineiro e falo uaiFalo errado e acredito que correto é assim falarNão escondo minha origem nem o meu jeito de ser Falo errado, mas eu falo, o que eu poço fazer

Conheci aquele moço e agora posso dizerTudo aquilo que ele diz ele não procura fazerEle é um falso poeta que fala de um falso amorVive a falar de justiça e nunca foi um justiçorVive a falar de justiça, mas nunca foi um justiçor.

Olhe moço eu sou mineiro falo uai e digo sôAquele trem que eu te disse num é de ferro não sinhor Ce respeita minha origem e o meu geitim de serFalo errado e acredito que correto é assim dizer!

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mendiga do amor

Olhe bem pra mimVeja bem o que sou Sou uma mendiga simUma mendiga do amor

Desde cedo aprendiA morrer por uma paixãoA vida me fez assimMas me deixou só então

Eu luto pra encontrarUma forma de viver sem uma paixãoEu luto pra resistirMas foi deus quem quis assim Foi ele quem fez o amor

Para quer ficar mendigando tristezaSe a vida não é eterna eu também nãoMas enquanto for durarTorne-a belaNunca desperdice o tempo sem razão

Pois cada instante na vida é sagradoA beleza de um amor não é normalPois quem ama tem no peito algo lindoPois o amor se faz peito sobrenatural

Nessa estrada de amores a minha vidaÉ como outra qualquer eu sei que éMas carrego aqui dentro a obra primaDá poesiaDá poesia que me tornou mulher

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Nessa estrada eu andeiSem um dia imaginarQue mendigando o amorEu iria encontraÓdio tristeza e dorAlegria e paixãoFui ingênua e não negoEntreguei meu coraçãoEu me entreguei a vidaEu vivi e reviviEu sonhei em ser amadaE quando amando eu sorri

Hoje sou uma poetaQue sempre mendigou amorE hoje contei minha historia Para mais um amador

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acho graça!

Acho graça quando você passaOlha pra mim e disfarçaSem graça por me querer

Acho graça quando você some Quando do nada se escondeTentando me esquecer

Acho graça quando se revela Quando você se entregaEntrega-se a mim sem pensarAcho graça quando o seu coraçãoDispara e emite um somAvisando que o seu cheiro esta no ar, ta no ar

Acho graça quando você passaDisfarça, some, se escondeRevela , se entrega ao meu coração

E quando agente finge não se verQuando os olhos só sabem dizer que ainda Existe paixão

Acho graça quando você mente

De forma indisplicenteVocê tenta me enganar,se enganar

Acho graça quando você surtaQuando você vai a luta Pelo o que não da pra lutar

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Acho graça quando o desejoVai nos tomando de jeitoE roubando o nosso não

Acho graça quando se estressa com a dorMata a saudade e nasce o amorNasce o amor

Acho graça quando você passaDisfarça, some, se escondeRevela , se entrega ao meu coração

E quando agente finge não se verQuando os olhos só sabem dizer que simExiste paixão

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Carolina Bezerra de Souza

josé

SenhorJoséO ReiMigué

Tem PãoCaféMamãoDo pé

ManéQuis rirDo cãoChuparLimão.

AnãoCaiuNo marCo’a páNo pé.Quem riu?José.Fim

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ausência

A dor de não te terA dor de não te ver faz meu meio coração chorarTransformam em brasa meus olhos.

Ausência sempre presente.Escuto teus risos, na imensidão,do silêncio que se fez contestante,volto a respirar,pela esperança do teu voltar.

O mundo já despertou?

O sentimento apenas se confirmou,O sentido está a escorrer.A vida não tem cor,Meu fôlego está fragmentado.

O amor em harmonia com a dorTe toco em meus sonhosBeijo o teu perfume...

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Dafne Marques

agora

{O que é o agora?Agora é depois?Agora é apenas agora,quando o agora vai chegar?}

Agora eu sou uma menina.Estou no ônibus e escrevo,sobre um agora que já passou.Porque o agora é o agorae o agora é o depois.O agora que passou,já não importa mais.Quem sou eu agora?Agora estou em outro continente,e nunca comi uma refeição completa.Nem quando tenho sorte consigo agua.Estou com fome constante e minha barriga grandenão significa algo bom.A Doença me devora por dentro.E esse é o meu agora e meu sempre.Desde quando agora virou sempre?Quem sou eu agora?

Agora sou um garoto,tenho 10 anos e essa noite não parece acabar.Dói tanto e eu tenho medo.Não posso gritar então choro em silêncio.Minha mãe dorme na minha frente,eu vejo pela porta aberta,e eu não posso fazer barulho.

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Não queremos acorda-la.Meu pai não é meu pai.E eu deveria ser uma menina.Não quero pensar nele.Não quero tocar nele.Não quero sentir ele.Minha mãe deve amar ele.Ele me ama,e eu não o odeio.Afinal a culpa é minha.E esse agora não acaba nunca.Agora ou nunca?Agora e nunca.

E agora quem sou eu?Já tenho 17 anose não vejo meu padrasto desde os 14.Nem minha mãe a um ano,acho que ela não me perdooupor ter sido abusado por ele.Mas agora isso não importante,tenho de achar outro homempara me atar e me machucar.Essa foi minha escolha de vida.Acho que sou masoquista.E eu nunca me apaixoneiate agora.E agora?Agora continuo colecionando machucados.Agora continuo me escondendo.Agora continuo fantasiando ele chorar.Acho que também sou sádico.Então porque estou chorando?Agora estas lagrimas não param,Quando o agora acaba?

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Estou novamente na salae novamente me pergunto:quem sou eu agora?Agora eu não sei.No agora do depois espero saber.Porque no presente agoraeu posso estar acordando no Japão,eu posso estar em Valhala,eu posso estar com 27 anos,eu posso estar com 7.Agora eu sei que o presente agorapoderia ser muitas coisas.Mas agora – agora- eu não faço nada,apenas sinto o meu agora passar.E o meu agora de depoisser igual ao meu agora que passou.Agora sou uma menina,estou sentada na minha sala de aulae escrevo.Espero que quando o meu agora morrermeu futuro agora venha logo.

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Filipe Fernandes

chegue logo

Um resultado de dois corações espera calmo, vivo, a porta da vida, mesmo que mistério, que um dia se abrirá.

Ainda não se sabe, ainda não é, mas, já é aguardado, já provoca sentimentos, sensações que não existem, e que todo mundo quer.

Num lugar próximo, quentinho, uma semente, um segredinho, faz do gelo um riso, do sólido um sorriso, do mar alto um belo rio.

Já se sabem os primeiros contornos, já se sentem os primeiros carinhos, já nascem as primeiras emoções, que, para o amor, curtíssimos caminhos.

Prévia para a expectativa, demora para o encanto, daqui meses, momentos e alguns sonhos, o mundo ganhará mais um anjo.

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duas peças

Como nasce a amizade? Asserções diversas. Nascem das impressões, expressões e imperfeições. Surge dos encontros fortuitos, da cor igual e outra qualquer.

Nasce dos ois, das dúvidas e das prosas fáticas. Começa da necessidade de novos mundos, de histórias inéditas, e de perspectivas longes e possíveis, que a paisagem inventa.

Nasce no abraço das palavras, no beijo das falas e na cumplicidade dos gostos. Nasce do olhar torto e belo, que em sua totalidade se maravilha, se encanta e se reflete, na desconhecida antítese.

Como a linda irisação, amizade é vária, é um ato em mil. Reúne matizes, uma cidade em formas, constelação de modelos.

A pequena e só sorriso. O desenhista e poeta, a musicista e artesã. O leitor e apaixonado, o casal e seus times distantes. A persistente e carismática, e rara... Todos únicos, intrínsecos e próprios.

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Todos em um só. Ah, amizade. Grande, vida, contrária.

É sentimento mais quadros, é conforto. Das quatro coisas essenciais, não menos importante.

É toque, é o atingir. É aquilo, é aquilo forte, que terna, que brilha, que embeleza os defeitos. Em definição, amizade são duas peças, Aquilo e o próximo.

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grande silêncio2

Os seres não se encontram, as vidas não se combinam. Coisas voam e logo caem, e um grande silêncio se ouve.

Resistir ou desistir, já não se sabe a melhor palavra. Se viver é algo claro, ou se o amor é o remédio.

A cada dia jardins se esvaem, a cada hora respiros se findam. A cada momento casas estremecem, e toda a paz perde sentido.

Amiúde as coisas caem, e ferem a pele do mundo! Os pássaros se olham e tudo, e as crianças o nada não entendem.

E, bem de longe o meu coração, que punge a cada notícia, sufoca ao ver as lágrimas, de um lugar que nem conheço.

Um lugar onde há pessoas, de que um amanhã novo duvidam. E se perguntam se há um futuro, ou apenas sonhos incertos?!

2 Poema feito em sentimento aos conflitos (o genocídio, a guerra, o “nada”) que se sucederam/sucedem no Oriente Médio entre Israel e a Palestina em 2014.

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Se há um sonho ainda sonham, com uma flâmula inexistente. Que reluzente movimenta, o fim do nada e a esperança.

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coisa clara

Visões em si se chocam, atravessam países, árvores, águas. Atravessam a vida e até sentimentos, em busca de algo melhor.

O eu não é suficiente, é insaciável, não preenche, é comum, parece vazio.

Não há lugar. O tempo doce, que é belo e devagar, vai passando correndo. Corre como as ideias, que perpassam por gerações, por anos, por conflitos e por repetições. Não mudam.

Aquele eu, que também é o outro, que respira, que sente, que é recíproco e imensurável, é a menor das considerações.

Mas há uma coisa clara, inenarrável, que contém todos os lindos adjetivos, e, não se sabe onde, tentam encontrá-la. É a mais difícil das coisas fáceis...

Ontem, ou no próximo instante. Amanhã, ou no fim da vida, se houver um cisco, um fio, transparente talvez,,, Qualquer ínfima possibilidade,

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qualquer pontinha oculta, uma pontinha. Se descobrirem um momento plácido, uma hora sem notícias, uma inverossímil chance. Se virem um gentil senhor,que se impressionou com uma mudinha...

Que acabara de nascer.

Ou um quase sorriso,ou um indivisível átomo da existência dessa coisa clara,sempre, sempre terei a certeza,de que o mundo é possível.

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longe e perto

Um sonho, de um amigo,refletido sobre gestos,revelado entre sílabas,representado em versos.

Um brilho em seus olhose na face das palavras,certeza feéricaem todas as falas.

Em si um horizonte,premido, forte, no peito.Saltou em alegrias,e interjeições de desejo.

Um futuro, diuturno,mas que ao longe, é nítido.Dividido por estrelas, pedras,e desconhecidos destinos.

Um sonho, de infância,de vida, de um amigo.Que imagina, na paisagem,o desenho do seu caminho.

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a um sorriso

O sorriso é o nascere o fim da poesia,pois cerca o doce ser,de um olhar que irradia.

Seus gestos são brancos,as intenções são livres.A descoberta é um milagre,e o presente são os dias.

A amizade é o cerne.A tradução da ternuraé a alegria que vive,na inseparável tertúlia.

A natureza a respira,assim são as coisas límpidas!O verde da forma purase completa ao seu encontro.

O carisma é o brilho,é o tempo liberto.É o abraço das horas,num instante eterno.

A realidade não a conhece,só as folhas e os lugares mudos.Onde em tudo há significado,e as vidas não se escondem.

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Macio tal as flores,colorido feito os rios.Sereno como as árvores,igual ao céu é o seu sorriso.

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Gabriel Calassa

duplo reflexo

Quieto no meu quarto escuroescuto passos no corredornão espero ninguémsou eu

Pulo da janelafujo de mim mesmo

Busco formas inteiras em bocas de bueiro lâmpadas foscas postes pombassou avenidas que desbocam em ruas e becos sem saídarotatória que aponta aos setes ventossigo sem ventos sem norte

No maior dos outdoors vejo o anúncio que custo a afrontar“hoje estou fora de mim mesmotão foraque por dentro nem me reconheço”

Procuro novas coresfumaça preta carburador semáforome vejo em uma moldura vermelharetrato linearuma face de Picasso

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“por que sou dois se a face no espelho é uníssona?”Com um soco quebrei o espelho em cada caco repousa uma face de uma complexa existênciasecos pulsos que chicoteiam a fina teia do equilíbrioSistema ópticoafino lâminasme examino em cada vultofaço do céu meu cobertorabraço com força para me escondermas sob os lençóis se escondem nossos piores medos

O terror se instalou sob minha pele dentro de mimcontinuo nessa guerrae os tiros me acertam a certezarevólver canhão abismos.

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Karine Faria

tudo tem seu tempo

Tem livro que fica ali na estanteTodo eleganteSó de longe te vendoTem ali na rua aquela meninaQue nunca te dá bolaMas sempre na escolaComemora quando no futebol tem bola dentroTem aquela antiga namoradaQue por tudo ou por nadaSe afastou oceano adentroTem aquele sentimento de criançaQue chama a vida para uma contradançaEnamorando cada sentimentoAos poucos, livro se lêMulher se comeAmor consomeE a criança vira criança-homem.

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o elixir

Uma noite sem luaEnquanto Valéria nuaA Pablo acariciaDesejando realizar todas as suas fantasiasE fazer arder o fogo da paixão.Enquanto isso Pablo matutaChama Valéria de putaE suspeita de uma possível traição.Não sabe se faz amor ou se pensaSe ri ou se choraSe beija ou se grita.Na cabeça de PabloSempre paira uma nuvem de confusão.Elixir do amor ou do ódioContido neste singelo frasco chamado paixão.Traição veladaPaixão escancaradaSentimentos soltos.Onde habita o amorO ódio também faz canção.

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lisbella, a rosa

Era uma vez uma meninaQue de música clássica gostavaE facilmente se apaixonavaDevido a tamanha doçura do coração.De voz afávelCheiro amávelJeito apaixonávelColoria a vida como as pétalas de rosa são.De tanto colorirLisbella, a RosaDeixava o mundo cor de rosaRia, abraçava, dançava e amavaCriando seu próprio mundoDoce que nem seu coração.

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cigana

Um dia uma cigana me falouQue era feliz quem com sorriso no rosto andavaPensei cá com meus botõesPobre cigana!Mal ela sabeQue tem dias que sorrio mesmo é por dentroMas por fora nada!

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melíflua voz

Uma voz melífluaFalando aos meus ouvidosTodos os meus desejos sem pudor.Anjo, diabo?Certo, errado?Ou somente um ser humano enamorado?

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desfalecendo

Uma estaca no peitoUma flecha na almaSangue fulminandoMascarando-se com batom vermelhoQue, inocentemente, mostrava-seNaqueles lábios carnudosE o vermelho ia tomando contaDaquela pele fresca como o mar.Cabelos naturalmente embaraçadosPelo vento que ia e vinha.Ajoelhou-se, sem poder ficar de péSem saber que rumo tomarE o que fazer com tamanha dor.Sereia de águas cristalinasOlho cor-de-mel, assemelhando-se ao solSuas forças foi perdendoAté curvar-se mais e maisDiante de um sol que estava se pondoNuma tarde de outonoBanhada de vermelho, como rubiCom cheiro de jasmimRefletindo em si o brilho de um castiçal.

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ode ao violinista

De repente, no metrôEntra um homem com um violinoO homem era argentinoÉ tudo o que seiNão sei seu nome, telefone, nada maisChegou e anunciou: “irei tocar um pouco de música clássica para vocês”E começou com “Ode à Alegria”, nona sinfonia de Beethoven.Algo brotou dos meus olhosRio ou cachoeira, não seiTalvez uma gota de chuvaSó sei que foi com sentimentoCom sentimento típico de gotinhas que saem dos olhos.Depois até tango tocouMúsica de seu paísDeu vontade de bailarBailar pelos corredores do metrô.Minha esmola ele não levouMas como gratidão fiz para ele esse poema.

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costas nuas

Costas cheias de versosNão vai saberSe cheira, se morde, se lêE aí vai lendo meus gestosMinha peleNum indo e vindo infinitoBrincando com a questão de serDecodifica minha peleDesencripta meus lábiosDe versos simples e curtosVai construindo o cenário.

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olhos falantes

Gostaria de deixar mudoNão por um dia ou uma semanaMas por uma vida inteira.Cala-teCala-teAprenda a falar com os olhos.Talvez, assim, me compreendas melhor.

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hélices que desenham

Laços helicoidaisRugem caladosApertam como um nó na gargantaAté chegarem ao meu âmagoÉ aí que tenho só essência

Toda forma, toda beleza fora emboraRestando apenas aquilo que é meuQue é meu....Essência não muda, revigoraMovimenta como em nenhum movimento browniano é capaz de se prever.

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vida de flor

E as flores reluziram pela manhãNem o vento, a névoa ou a chuvaForam capazes de apagá-la, de reduzir o seu brilho.Brilhante cor da névoaBrilhante cor da flor.A flor com sua cor, brilho e doçuraÉ sensível como a noite que dóiComo o frio que gelaComo o vento que arrepia.Névoa parece forteMas se rende aos encantos de flor.Névoa e florFlor e névoaPonto circundante ao solCalor proveniente da luaEnche os olhos, o coraçãoFaz com que a vida não fique nua.Clarão do luarTudo deslumbraDeslumbra a mente e o coraçãoVida nua, vida nua.

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cativando e seguindo a canção

Cada um planta uma sementeAo germinar cresce, invade o corpo e a menteChegando ao coraçãoCativa então a almaFormando uma ligação raraUma ligação que independe dos corposÉ mais forte que os ossosMais forte que a carne.Ligação que distância nenhuma separaÉ muito forte, raraÉ uma ligação de almas, de almas...

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vamos nos permitir

Vamos viver o que há de melhor pra viverVamos viver no melhor mundoAquele que existe na nossa menteCheio de sensações boasCom rostos preenchidos por sorrisosE um lugar bonito para conversar.

Vamos viver num lugar cheio de amorOnde a alegria vence a dorCheio de gente com o coração querendo amar.

Aquela conversa no portão no fim de tardeAquele abraço apertado de boa noiteAquele carinho sincero e reconfortanteGostoso como chocolateE totalmente viciante

Mundo onde há flores que sorriemOlhos que falamBocas que pensam.

Mundo belo, mundo lindo.O que falta para ser verdade?

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sem título

ConstruirReconstruir ...

Mesmo depois que a muralha é construídaNão está pronta.A vida molda e muda.Deparamo-nos então com a surpresa, com o inimaginável

Saber viver implica contar até com os imprevistos.Erguer, reerguer, rerreerguer...

Desistir de nós mesmos é o maior fracasso.Se há alguém que merece amor, esse alguém sou eu.É a pessoa por quem mais se vale a pena lutar.

O fracasso viráMas um dia será coroado pela vitória.A luta vale a penaPorque estamos lutando pela pessoa que mais vale a pena lutar.Fracassado não é aquele que perde, mas sim aquele que desistiu de tentar.

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a vida é tão rara...

Põe teu coração na bocaRespira o fogoNão tenha medo da tempestadeTudo passa.

Todos os diasO que é dia dormePara que o que é noite acorde.

A noite adormeceSonho que aqueceE brota um novo dia:inédito, extasiante.

E como o dia, a gente também se renovaPara que algumas coisas em nós adormeçamE outras acordem.

A vida se resume em transformação.Tudo mudaTudo passaA vida é um cicloOnde passamos por quente e frio.

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eyes

Aqueles olhos dourados cor do solQue muito veem e pouco sabemQue registram acontecimentos, lugaresReluzem o brilho do mundoE são a melhor câmera que já poderiam ter inventado...

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colcha de retalhos

Nós somos uma colcha de retalhos.Numa ponta, um retalho de cor exuberante, com uma estampa alegre e colorida.Eis o primeiro retalho que iniciou o processo de facção da colcha.E então, surge mais um retalho prestes a ser costurado.A cor é mais apagada, não traz a mesma sensação.A estampa nem existe. É um breu de uma única cor, escura e densa.Esse foi o retalho escolhido para a continuação da montagem da colcha.Menos bonito?Não. Beleza não se compara.Trazem sensações diferentes e devem ser apreciadas de modos di-ferentes.Com o maior carinho, foi costurado, unido ao primeiro pedaço.E assim foi sendo construída uma linda e enorme colcha.A cada olhar, uma nova perspectiva, uma nova sensação.A mudança do conceito de belo a cada novo olhar.O que temos que aprender é que cada retalho tem sua beleza.Cada retalho é importante. Pois, sem ele, a colcha nada bela seria.A questão não é ter os retalhos mais exuberantes.É saber tecer a colcha.É o conjunto que faz a obra.Assim é a colcha. Assim é a vida.

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lua

Olhe a luaO quão majestosa ésÓ lua que ilumina a noiteLivrando-me da escuridão plenaÓ lua que tira meu vazioE preenche-me com tamanha robustezLua linda que enche os olhosEnche de alegria meu viverLua que ilumina a noiteTrazendo um clarão pro meu ser.

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oásis

Que venha a mim o infinito UniversoQue venham a mim infindáveis possibilidadesQue eu seja capaz de enxergar além do que meus imperfeitos olhos me mostramSem a visão dos meus olhos, e somente com a visão da almaPercebo que tudo vai muito, muito além do que eu imaginavaEu via um grão de areiaE esqueci-me que aquele grão foi retirado de um conjunto de zilhões de grãos do desertoEu via o deserto como seco e tórridoAté que vi um oásisPensei ser o deserto então úmido e prósperoSinto que consigo enxergar um ponto, mas não sou capaz de enxer-gar suas combinações: um traço, uma figura, uma vírgula...É... Está na hora de enxergar através de outra janela: a janela da alma!

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sol loiro

Um sorriso com a beleza do céuUm olhar com a imensidão do marUm coração sempre ao léuSuspirando e com a mente a pensar.O encanto de uma princesaE a doçura que nenhum doce é capaz de perto chegar.Cabelo cor-do-solCom a beleza do marEla é uma princesaQue tem doçura e encanto no olhar.

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Luís Antônio Matias Soares

Viver é continuumSempiterna transiçãoIn-constante vir a ser Não imobilização:Abelha voando ao leu À procura de zangão

Entre a razão e a loucuraA sorte, Deus e o destinoVão se revezando no caminhoO meu velhoO meu jovemE o meu menino

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poética mineira

Existe a éticaMas eu prefiro a poéticaEla é mais sensual e saborosaComo o nosso feijão com arrozE o queijo com goiabada

O que surpreende: A vidaEsta coisa incompleta:A gente Aquilo que nos faltaO outroA vida, a gente, o outro:Tantos mistérios...

O controle está no controleÉ ele que ascende ao poderÉ ele que se põe a pensarÉ o controle de novoMas a visão de uma borboletaE o rebuliço nas ancas da mocinha Estão a dizer que o controle pode ser outroE mais atrevido, e mais intensoAbaixo o politicamente corretoTem ocasiões em que a gente quer mesmo é um amor Com gosto e prazo de validade vencido

Será que ela era um anjoDe especial proteção e guarida?Mas se ela era um anjoPor que suas asas não me protegem mais?Ah, entendi: ela deve ser um daqueles tais anjos caídos

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pernoite

O mar não está para peixeNem para sereias e serenatasE esta noite tão pouco marítima Sequer se abriu como uma florPara um tipo qualquer de estrelaCadente ou guiaImagino - e com que tremor n’alma! -Que um ligeiro amor possa aqui talvez pernoitarE perpetrar de vez como algo que ferisse a fina flor da peleDele e delaCom ela levando consigo uma porçãozinha de polpa E ele perpetuando uma ternura qualquer Um dente Ou um pote de ouro

Lutar contra moinhos de ventoPode não significar uma batalha importanteNos anais da história Ainda assim é uma forma possível de lutaA metade Quixote(aquele e-terno e alucinado caballero)E a outra metade escudeiro (o tal escudeiro singularmente humano)Saíram juntos à procura da mesma donzelaDe seios fartos E repletos de leite e mel

Pedra Grande de Igarapé Com suas VistosasBorboletas

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AzuisQue SeMovimentamEm Giros levesE ligeiros rodopiosComo a vida

Não posso teObrigarA me amarIsso me éImpossívelEu bem seiPosso apenas tentar me manter EretoAbertoE cativoDeste teu olhar sem corDeste teu olhar descolorido

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poema da amarelinha(Para Soninha)

Ela é amarelaÉ toda amarelinhaFeito a vaca amarelaQue a janela pulou

Ela é brincadeiraOu a coisa mais séria?

Ela é pique escondeE se mostra e se escondeRouba a minha bandeiraE me passa o anel

Ela é brincadeiraOu a coisa mais séria?

Ela é amarelaÉ todinha amarelaUne a beleza da terraÀ leveza do céu

Ela é brincadeiraOu a coisa mais séria?

Ela é o toucinhoQue o gato comeuE nesse poema-brinquedoO tal gato sou eu

Ela é brincadeiraE é a coisa mais séria:

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É a menina mais linda Que me aconteceu

O amigo quer saber comoEu me matei pela primeira vez?Pois foi assimEu me aproximei da garotaE perguntei a ela se tinha algo importante pra dizerNegócio assim de vida e de morteCoisas do coraçãoO amigo sabe como éEla então me olhou nos olhos com aquele olhar que ela fazDe não-sei-por-que-o-céu-é-azulE foi então que eu me rasguei todinhoE proclamei aos céus e à terra que pensava nela o tempo inteiroE que até quando achava que não pensava nelaQue ainda era dela o sentimento que havia em mimEla então fechou a boca pela vez derradeira Pois foi assim, meu prezadoFoi exatamente dessa maneira a vez primeira em que eu ousei me matar

Quanto mais me afasto de tiMais me recuso a te esquecerQuanto mais tento me esconder Mais te encontro entre as dobras e frestas do vestido E é como numa brincadeira de criança que agora nos temosE havemosUm pique esconde de um homem sóMas veja só que coisa bobaNeste momento Já é você outra vez nem se lembrando de mimE neste outroJá sou eu outra vez só pensando em vocêComo num vícioOu num jogoUm pique esconde de um homem só

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Você me (in)dispôs prisioneiroMe fez ser óvulo retidoE foi como mosquito nada distraído Que em sua armadilha caíComo aranha manhosa e esquisitaInoculou seu perfume-veneno e partiuMas vejaEstranhíssima fiandeiraBelíssima criaturaVeja que apesar de não ter percorrido o ziguezague Frenético dessa sua cadeia em forma de três ângulosVeja que levei comigo o ziguezagueSensitivo e imaginário dela

O poeta brinca Com a noiteCom a dorE a própria morteO poeta - ad aeternum -Dirão os sofistas É um bobo alegre

Faz tempo que não vejo batráquios na cidadeAqui não mais habitam avesBorboletasE besouros

Aqui só se veem homensMulheresE crianças

Que trafegam em alta velocidade por entre ruas e praçasOu permanecem imóveis em suas casas miraculosamente construídasCom pedrasTijolosE alguma espécie absurda de areia movediça

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Não se veem mais batráquios nessas terrasE essa é a provável razão desta cidade andar tão feia

É bom que a vida tenha o seu rumoE que siga o próprio ritmoÉ bom que o mundo se desdobre e que se altereQue se divida e se multiplique sempreGeração após geração O que rege é a mudança e a novidade

(enquanto nos despedimos das coisascheios de graça e (im)perfeiçãoum mundo inteiro se ergue dentre os escombros)

Mas a juventudeÉ sempre bela e aguardada com expectativaE, maravilha: quão difícil é corrompê-la!

Por mais que o mundo seja denso de vidaDessa vida aparenteQuímicaFísica quântica E biológicaSem cuidado e carinho a existência se apequenaE em qualquer jardim pode surgir um desertoSó o amor é capaz de tornar o mundo habitável

Quantas vezes eu já não me mateiFizesse dia claro ou noite escura em minha almaE em quantas madrugadas tornei a nascer e renascerBico e pena jovem de águia envelhecida?

Mas entãoPor quantas vezes ainda haverei de me matar?E em quantas outras renascerei?

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Assim é o amor:Nos livra do abismoUm pouquinho todo diaTraz promessas de ilusãoE pedacinhos de alegria

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tudo que é sólido se desmancha no ar

Sobre tudo que aparenta ser sólidoBasta às vezes o toque sutil deligeira brisaOu leve ventania:O que é sólido muitas vezes se desmancha no ar

Picado por inseto vil e atrevidoChoro e sofro horrores de febres e suoresPicado por inseto vil E absolutamente insolente — O amor Choro e sofro mil horrores de febresE suores noturnos

Entre a razão e a loucuraA sorte, Deus e o destinoVou levando no caminhoO meu velho, o meu jovem e o meu menino

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simplicidade

Fazer da vidaUm passo da dança:Alegria, beleza, esperança

Abraço a minha melhor idade Com as pernas e o travesseiro doido E acordo entre piruetas e prostitutasLevo comigo uns olhinhos de peixe Que não se cansam de apreciar Tuas enormes coxas brancas

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dúvida de tudo

Karl M., muito antigamente, já dizia:Duvida de tudo!Principalmente de tudo que for dito sem amorCom pouca ou nenhuma transparência e sabedoriaPelos Marechais e Generais do hoje em diaOs Mandachuvas da contemporaneidadeOs maiorais deste ou de qualquer outro tempo e espaçoSó não duvida do amorPois o amor é a única força capaz de apaziguarAs guerras e batalhas no campo da dor

Que tal dormirmos juntosMeu bemPara bem juntinhos acordarmos?A vida está a um passo e a um toqueObservePor exemploA luz dos teus olhos no reflexo dos meus

Meu coração tão puro e límpido (Mas como pode um coração ser assim tão límpido e puro?) Viu-se tragado de repenteE lançado à estranha voragemPor três vezes mergulhou e afundouO pobre infeliz E bebeu muita água E outros elementos líquidos e pastorisMas sobrevivemos os dois Eu e ele E ele mais eu

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essa tua pokã(Para a poeta Clevane Pessoa)

Como um ofídioVou rastejando até a fonte de mel e prazerQue se revela entre teus lábios e gomosPois é com a ponta da línguaEm movimentoQue primeiro toco e adentroA pele rósea e aveludada dessa tua pokã

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olhares

Nossos olhos tecem Curioso código e diálogo Segredo de (in) suspeitada esperança É como se trocássemos no mar dos olharesQue tecemos Os muitos mistérios aquáticos Que ondeiam entre mim e tiÉ como se partilhássemos o anseio Que decerto vai preencher o vazio das coisasE nos fazer caminhar de vez ou secar

Nem olhos de bandidosNem olhar de heróisBichos da terra tão pequenosPalmilhamos caminhos desiguais

Nem só de anjos e demônios Vive o homem e a mulherMas de todas as suas palavras e beijosSagrados são os sutis movimentos de quadrisDessa absurda espécie em extinção

Nós os casaisFomos feitos assimPara nos celebrar Fortalecer e dar guarida Mas muitas vezesTambém fomos feitos para nos fazer esquecer É que os olhares de um para o outro E de um e de outroGuardam a inestimável possibilidade do esquecimentoDas dores do um e das mágoas do outro

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os olhos da mulher

Ela já ousa erguê-losAinda que timidamente E postá-los DiretosNos olhos da genteE eu bem sei que isso significa alguma coisa

Tocado por tuas partes pudicas(oh sarça ardente)Tocado por este teu áureo olho de gafanhotoE por teus cílios e lábiosE este teu chicote de flores úmidasVi surpresa nos teus olhosMas nos meusMinha queridaSó represas entrevi

SegueQue o momento passouNão pense em esfregar nem de leveA pele branca do seu dedo nu Sobre a superfície negra do meu corpo

Vai Para você eu devia dizer só issoMas pra mim tinha que ser café mais forteDifícil tirar da cabeça o que não sai do coração

Amada minhaÉ do poeta isto de sofrer sozinho e caladoAfastado de Deus e do mundo Quase morrendo de amor imaginário

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Inexistente e não correspondidoDepois que te conheci comecei a amar toda aquela espécie De música mais triste que existeMas devo confessar que este foi o melhor prêmio Que eu poderia levar de ti

A palavra gratuita é a palavra mais linda que existeMas é também a mais triste que háÉ ela que faz o peito tremer E o coração saltar boca aforaÉ ela que faz o ser pensante e sensível se assustar E suspirar diante do inusitado segredo No topo do edifício mais altoÉ a palavra gratuita que contém e sustém toda a vida que há E também a ausência de vida e sentido que estão presentes no amor e na morteA palavra gratuita pode até ser confundida com o amor e a morteTão parecida com elas possa ser

A minha proposta de amorNão era assim tão perigosaNem curiosa demaisEra até bastante banal(Talvez tivesse valido a pena perderes um ou dois segundos do teu precioso tempo para te debruçares no pensamento dela)Esta proposta de amor incluía desejo e risadaUm quase nada – tu o sabes - Coisas com as quais o coração suspira e se envolve todos os diasPois se me perguntasses agora o porquê desses meus olhos mareja-dos,Eu te diria, envergonhado: é só um ciscoUm cisco apenas e nada mais

Olho para tiPara o teu corpo nu e adornado

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(Nu e adorado)Olho para ti Com esta minha ânsia urgente de homemTu então me sorris e me convidas outra vez A me erguer assustadoramente humano

Porque o amor, afinal,São dois Corações-corpos entrelaçadosComo no coringa de copasOu o solitário Ás do baralhoA escolha depende de nós

Aqueles que sabemOu imaginam conhecer a terrível verdade(oh a velha sensação do enfant terribleE o horrível fardo de saber Que a vida não vale a pena, meu amor!)Muitas vezes se perguntam abismados: O que fazer que seja um pouco mais que apenas viver e deixar viver Pálida representação de um laissez faire inútilMas como viver não requer explicação algumaNem traz rótulo, bula, fórmula secreta Ou promessa de compra e vendaQuem disse para você que as coisas necessitam de sentido?E quem ainda acredita que elas sequer precisem de nós?

Já há algum tempo andamos juntos, meu bem,Se te saíres bem, portanto, nos testes da simpatia Do amor e do uso das concordâncias verbais e nominais(sabe-se, afinal, o quanto tudo isso é importante para a felicidade de um casal!)Eu te promovo a namoradoMas se acaso não passares no teste, Considera-te exonerado

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imitação de poesia

PoesiaAqui me tens de regressoE suplicando, confessoÉs a mais doce ilusão...

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à poeta líria porto

Lír(i)aDe lirismo solto e apaixonadoOra doce ora salgadoOra torto ora engajadoFaz-se às vezes de anjo mortoÓ terrível Líria Porto?Líria é delírio em flor Camisa de força de vento e amor

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palavras do pórtico

Amada:Espero por ti.Desde sempre.Desde ontem eu já te conhecia.Desde sempre eu te aguardava em segredo.Desde ontem eu te esperava e concebia em espírito.

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Marco Antônio Trindade

feito de vazio

esse sou euescultura de friovagando por aisem amor ou amigoslevando a vida pelas metadeslevanto, deixo pra mais tardeiludido, com os olhos vermelhosnão tanto quanto aqueles fiosum doce, um colíriodiferente desse amargo que levo comigomeu coração feito de pedra partiusentimento que nunca vi antes, surgiue antes não tê-lomexeu comigo por inteiroainda me deixa em desesperocomo pode algo tão bonito, doer tanto?ela tão pequena, com todo esse encantome tira o sono e entra nos meus sonhosesqueço, largo de cantoe logo tudo volta em minha cabeçaesse seu olhar, faço-o pra mimnum breve ponto de lucidez, percebomelhor enlouquecer a ficar apaixonado

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você não faz valer3

nem mesmo uma poesianem sequer uma palavraainda que de letras vazias quem liga, não é mesmo?fez meu coração arder no vazionem por educação falou comigoe eu me pergunto o que te fizcomo pode, tão doce e tão fria?perfeitamente te esculpiramcarrega consigo um coração de pedracapaz de deixar o meu só o pópassa o tempo e não passavocê passa e meu olhar não disfarçadepois de tudo, volto pra casacom mais uma peça pro meu acervo de mágoas

3 Poema de Marco Antonio Trindade, porém não há título.

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Pedro H. Lopes

Não sei por onde começar, ou recomeçar, a contar essa história.

Não sei se ainda cabe recontá-la,depois de tanto tempo, tantas vezes.

Porém ela vive aqui, remexendo em mim, reacendendo toda vez que acordo, esfriando meus pés toda noite que durmo.

Não existe mais remédio, música, conselho, dor, tática que eu não tenha tentado.

Sou mestre graduado nessa história.Sei de cor toda vez que vai doer.

Já aprendi toda vez que você vai sumir.Já pressenti toda vez que vais voltar.

Às vezes acho que se eu nunca mais disser seu nome, nunca mais ouvir nossas músicas, nunca mais todas as outras partes de nós dois, você nunca mais vai voltar.

Mas lá, bem no fundo, naquela parte em que eu escondo sentimentos de mim mesmo, eu quero que você volte.

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Quero que tudo isso tenha sido um grande equívoco de nós dois.Quero voltar no tempo e desfazer o mal-entendido, resolver o que foi confundido e fazer você ficar aqui.

Porém nada do que eu diga é novo.Nada do que eu faça te trará de novo.Assim, nosso passado se confunde com uma loucura minha onde eu não sei o que realmente foi.

Mas eu sei.Sei que em alguma dessas noites,o vento leva até sua janela um pouco da saudade que mora aqui comigo.Então você também sente que tudo pode ter sido um erro.Que ainda existe alguma coisa… não.

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Rafael Rosa

vida de mulher

Seria mais fácilComprar sapatosCaso meus pésFossem menoresTamanho trinta e seis /Trinta e seteBem mais fácilDeixar o cabelo crescerCaso não fosseA calvície anunciadaDemorei muito para nascer,Vim ao mundo apósVinte e quatro anos de gestaçãoE ainda prematuraComigo não foi diferenteNasci careca

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oblíquo

Imprimo no corpoTudo que sintoPermito um gestoDesajustadoAtrevo um toqueDelicadoAbuso de trejeitosColoco cabelosImagináriosAtrás da orelhaTraço com os olhosMagia negraCruzo as pernasEstico a saiaMeio vulgarPara toda laiaMeu corpo falaMeio afeminadaDiz tudo não dizNada

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Raquel Rodrigues

e tem sido você

Você está sempre em meus pensamentos.Engraçado que a cada dia eu te amo mais, e sinto que é de uma forma cada vez mais sincera.É tão fácil me perder no tempo,imaginando o teu rosto,lembrando das nossas conversas,os nossos risos e todos os momentos que temos compartilhados juntos.

Você surgiu e conseguiu fazer, com que as dúvidas que eu tinha há tanto tempo,fossem embora, dando espaço para momentos de alegria.

E cada dia que passa,eu tenho a certeza que é você quem eu quero.Eu tenho medo, não vou negar.Já vivi algo semelhante,mas as emoções e os sentimentos que eu tenho,são novos para mim.

Você diz que eu só saberei se dará certo,caso eu tente.Mas eu não quero te perder.Não quero voltar para aqueles dias escuros,em que eu não tinha alegria.

Quero ser sua. Sou capaz de fazer tudo.Quero muito poder sentir o seus braços.Dê-me uma chance?Eu sei que posso ser diferente.Eu sei que você pensa em mim,nas coisas que eu digo e faço.

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Fico me perguntando se um dia,eu saberei qual é a sensação de poder te abraçar.Ver o seu sorriso, olhar nos seus olhos,deixar-me perder na importância do momento e,principalmente, te fazer feliz.Dê-me uma chance. Só isso que eu te peço.

Não é fácil desistir de um sonho.Eu não sou perfeita,mas eu sei que sou capaz de mudar,e tentar ser uma pessoa melhor.Mas eu preciso que você permita.Por isso eu te peço: Dê-me uma chance.

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demais ao dê menos

Eu e essa mania de:Amar demais,querer demais,ajudar demais,entregar-me demais ,sonhar demais,desejar demais,acolher demais,perdoardemais,esperar demais...

Demais.De-mais... Mais.

E o engraçado que o que resta,é sempre o pensando de que,no futuro,as coisas serão no “DE-menos”...

Dê menos amor,dê menos carinho,dê menos importância,para as coisas quem um dia,você deu atenção demais.

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depois de agosto

Foi escrita em fevereiro de 1995, entre Rio de Janeiro, Fortaleza e Porto Alegre. Há pouco a dizer sobre ela, ainda está muito próxima para eu tratá-la com frieza e distanciamento. Talvez seja um tanto cífrada, mas para um bom leitor certo mistério nunca impede a compreensão.

Porque o Eterno, teu Deus, te há abençoado em toda a obra das tuas mãos; soube da tua longa caminhada por este grande deserto; há já quarenta anos que o Eterno, teu Deus, está contigo e nada te tem faltado. (Deuteronômio, II, 7)(Uma historia positiva, para ser lida ao som de Contigo em La Distância)

Naquela manhã de agosto,era tarde demais.Foi à primeira coisa que ele pensou,ao cruzar os portões do hospital,apoiado náufrago nos ombros dos dois amigos.

Anjos da guarda,um de cada lado.Enumerou: tarde demais para a alegria,tarde demais para o amor,para a saúde,para a própria vida,repetia e repetia para dentro sem dizer nada,tentando não olhar os reflexos do sol cinza,nos túmulos do outro lado da avenida Dr. Arnaldo.

Tentando não ver os túmulos,mas sim,a vida louca dos túneis e viadutos,desaguando na Paulista,experimentava um riso novo.

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Pé ante pé,um pouco para não assustar os amigos,um pouco porque não deixava de ser engraçado,estar de volta à vertigem metálica daquela cidade à qual,há mais de mês,deixara de pertencer.

Vamos comer sushi num japonês que você gosta,disse a moça do lado esquerdo.E ele riu.Depois, vamos ao cinema ver o Tom Hanks,que você adora,disse o rapaz do lado direito.E ele tomou a rir.Riram os três,um tanto sem graça,porque a partir daquela manhã de agosto,embora os três e todos os outros que já sabiam ou viriam a saber,pois ele tinha o orgulho de nada esconder,tentassem suaves disfarçar,todos sabiam que ele sabia que tinha ficado tarde demais.

Para a alegria,repetia,a saúde,a própria vida.Sobretudo para o amor,suspirava.

Discreto,pudico,conformado.

Nunca-mais O amor era o que mais doía,e de todas as tantas dores,essa a única que jamais confessaria.

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nomes

Gosto de nomes. Embora eu tenha dificuldade em pronunciar e me-morizar alguns, eu realmente gosto de nomes. E por causa dessa mi-nha mania com nomes acabei entrando em um café chamado “Café com Letras”. Queria um lugar para ficar até o horário daquela con-sulta marcada a qual eu queria mesmo era não ir.

Ao fundo o rádio gritava, docemente, Billie Holiday. Sem dúvidas gostei do lugar. Abri o cardápio para ver o que tinha e diante de tantas coisas, acabei me limitando ao suco de laranja com abacaxi e hortelã. Sete reais. Esse suco tinha que ser realmente muito bom.

Na espera pelo suco acabei apropriando-me, de forma indevida, cla-ro, da conversa das duas moças na mesa ao lado da minha. Uma de-las chorava. E a outra, pacientemente, balbuciava algumas palavras para a amiga, imagino. Fiquei observando aquela cena. Como um toque, uma palavra, um carinho podem proporcionar uma pseudo-sensação de segurança nas pessoas. E senti falta daquilo.

Por algum motivo não muito lógico fechei os olhos na tentativa idio-ta de escutar melhor a conversa das duas. Talvez fosse um modo de me concentrar. Até que, no meio do meu esforço, a amiga pergunta para a garota chorona:

“— Mas e se não der certo?” “— Fico com a certeza de que tentei. Ou tentamos.” — Respondeu a Chorona.

Por algum motivo gostaria de não ter ouvido aquelas frases balbu-ciadas tão silenciosamente uma para a outra. Engoli o meu suco de forma que nem deu para apreciar os sete reais pagos por ele. Levan-tei apressadamente e fui para a rua.Detesto me identificar com algumas situações alheias.

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adentrando o mês de agosto.

Mesma náusea.Mesmo vício.Mesmo choro.Muda, muda sim.

Aos poucos. Lentamente. Ferindo. Sentindo.

Tornando cada vez mais evidente a sua incapacidade de mudar. Engraçado, não?

Chora, ri, brinca, canta.

Cidade diferente, cabelo diferente. Sorriso diferente, pensamentos diferentes, pessoas diferentes.

Mas, ainda sim, aquela vontade persiste,como se fosse um veneno que matasse aos poucos cada dia em que o seu ser tentasse um novo caminho.

Não entendo mais nada do que se passa – amor secreto, amor calado.

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Mas como pode ser amor? Inferno secreto - inferno calado?

Relaxa,mês de agosto é o mês do cachorro louco, baby. Quem sabe a próxima cachorra a sair desvairada pelas ruas seja você. Demente por ainda insistir nessa insistência,sem sentido, sem sabor, sem cheiro, puro vazio.

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maria de deus

Mais uma noite. Embora fosse mais uma, as cenas eram as mesmas.

Maria de Deus (ou seria de todos?) era uma mulher de meia idade. Devia ter por volta de uns quarenta anos por debaixo de toda aquela maquiagem. Sozinha, solteira, vivida, madura. Essa era Maria de Deus, Maria de todos.

Todas as noites eram regadas das mesmas expectativas. Chegava do serviço, onde era a Maria de Deus, e preparava-se para ser a Maria de Todos. Banho, perfume, maquiagem, roupas escolhidas a dedo,e aquele conhecido sorriso nos lábios.

E de Deus, ia para todos. Caminhava nas ruas do centro de Belo Horizonte sempre na espera de todos.

Bar, música, gente bonita. Ali Maria ficava. Cigarro, pernas cruzadas, olhar faceiro, sorriso maroto. E assim ficava Maria de Deus a espera dos outros. E muitos apareciam.

Muitos conversavam. Muitos sorriam. Muitos beijos. Muitos amores. Muitos, muitos, mas nenhum carregava aquele todo que fazia com que ela se sentisse completa, de Deus. Assim era a Maria, sempre a procura do seu Deus[?].

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Vários foram os deuses, os todos, os outros. Vários foram os beijos, os abraços. Maria vadia e nada de Deus. Maria amada, Maria querida. Essa era a Maria.

E mesmo que vários corpos ela tivesse, mais Maria queria. A essência, o cheiro, o gosto. Aquele gosto antigo que inda estava guardado em sua lembrança.Cheiro de hortelã e gosto de amora. Não encontrava, não entendia. Não queria.

Maria de Deus, que na verdade, era a Maria de Todos ficou maluca. Maria Maluca, moribunda.Dizem que ela se entregou a exaustão. Procurar por pássaros imaginários no terreno da sua imaginação, era o seu novo hobby das noites solitárias, vazias, sem Deus, sem todos, sem ele.

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só, somente só

E hoje não me interessa se haverá sol.Estarei de olhos fechados para o futuro. Certo, incerto, feroz.Não quero me preocupar com o que virá,nem com o que foi. E nem com o que é.

Canso, tento, insisto, choro, alegro-me, sorrio.

Mas hoje,especialmente hoje,queria que todos morressem.Tanto que pelo que foram,pelo que não forame pelo que são.

Estou cansada de falsa hipocrisia,falso moralismo. Facetas.Hoje eu quero sentir o vento tocar o meu rosto. Fechar os olhos e esquecer. Esquecer-se de todos os problemas e de tudo o que se perdeu com o tempo.

Hoje eu não quero provar nada. Talvez até prove, mas para mim. Provar que ainda posso ser eu. Só-eu-comigo-e-mais-ninguém.

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escreva uma carta, envie um scrap. rs

Sabe,Apesar dos tombos que a vida tem me proporcionado, ela também tem me ensinado bastante coisa. Tenho algumas “filosofias de vida” que na maioria das vezes servem-me apenas de motivação pessoal...

Seja para persistir em algum objetivo traçado,ou simplesmente para não ter vergonha de desistir quando lutar já não é a solução. Acredito que a gente só procura aquilo que sentimos falta. Assim, seguindo essa “forma de ver as coisas” venho aqui. Não pra cobrar, reclamar, fazer o auê...rs Apenas para saber... Se fiz algo, se errei em alguma coisa, se está tudo bem com você.

Caso você tenha feito algo do qual se arrependa... [sim, estou falando daqueles caracteres que você me escreveu ante-riormente] não se acanhe.. não fique sem graça... Relaxa, enganos acontecem, na maioria dos casos...

Só não saia assim, sem deixar ao menos uma explicaçãozinha... Minha vida tem sido uma ciranda de fatos que na maioria das vezes,terminam sem alguma explicação ou conclusão.

Gosto da sua amizade e isso que importa. rsrs

E... infelizmente ainda to naquela... lá no passado, ele ainda. Tão vivo, ao mesmo tempo em que,eu gostaria que estivesse morto em meus pensamentos.

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Sendo assim, boy Não seja mais um, que sai da minha vida,sem me dar ao menos a oportunidade de eu entender onde eu errei, o que eu fiz...

Ficarei na espera...caso vc não responda...entenderei que já não pos-so fazer mais nada.Fica na paz, mocinho...uma ótima semana pra ti. Na ausência das cartas, salvem os scraps.

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troca de caracteres

Weapon,Ás vezes buscamos no silêncio uma forma de equilíbrio.O sorriso disfarça, o olhar mente...mas a mente, esta aos gritos se encontra.Não manifestar talvez nem seja uma escolha, mas sim a única opção.

Tenha paciência, boy... do caos que surgem estrelas... Belas. Mesmo caladinha... Aquela menina, mesmo que em estado de inércia se encontra, em pensamentos ela te deseja sempre a paz e a sabedoria..

E que você sempre esteja bem.

Ósculos e amplexos, com carinho...

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embriagai-vos!4

“É necessário estar sempre bêbado”. Tudo se resume a isso, eis o único problema. Para não sentir o fardo horrível do tempo, que abate e faz pender a terra, é preciso que nos embriaguemos sem cessar.

Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, como achar melhor. Contanto que nos embriaguemos.

E se, algumas vezes...nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do nosso quarto, você despertar com a embriaguez já atenuada ou desaparecida. Pergunta ao vento:À onda, à estrela ao pássaro ao relógio. A tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala.

Pergunta-lhes que horas são:E o vento, e a onda, 4 “Embriagai-vos”, de Charles Baudelaire, em Pequenos Poemas em Prosa.

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e a estrela, e o pássaro, e o relógio. Hão de vos responder:— É a hora da embriaguez!

Para não ser martirizado pelo tempo, embriaga-te. Embriaga-te sem tréguas. De vinho, de poesia, ou de virtude, como achar melhor.

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Rogério Barbosa Silva

poemas rasgadossintomas(prelúdio)

Acústicas reluzem fosforescênciassenis dunas dardos flamejantesrepercutemna areia.

Os antigos sons. Passos invisíveis.O vento seco de permeio.Caminho contra.

A música ondeia.Airosidades.O canto estrila.Glórias dantes ouvidas.

Na imensidão.Granula-se o espaço.Medida do que resta a vencer.Um nada a desafiar gigantes.

O corpo delira.Regurgita.Papilações.O cheiro rubro de outro corpo.

Colcheias.Semibreves ecoam aéreas.Um tom a mais.

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Uma corsem mais: O desejo.Acende, silvando...Olor de cornucópias.Palavra íris.

Querências. Almiscares.Febriluzes.E é dia.

ICHOROa lágrimasibilaa luzopacaencandece

IIFOGOlavrano suora escrita írisda fomeincessante

IIIVENTOsopro rasuradoalgures suspensoum amorespera

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IVCANTAa leve dançarinaseu arco-írisde passosairados

VSAMBAentre a passistae a colombinae o desmesurado amoro rei está nu

VIOUTRO SAMBAum terno ladinoseu assoviar finoamor mais sovinaum cutelo n’alma

VIICHEIROAnódino,se se escoa no tempo,essa outra substânciaa vida inconsútil.Mas dentro do cheiroa força brutaldas sensaçõesas cores vibrantesdos sentidoso tato álacreo gosto picantedo gengibre.

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VIIIIMAGOtatuar no olhoo cheiro rubroa fenda ardenteA.Aha letra encena:a aventurada criaçãoé o abismo.Os sentidos.

IXSABERa que sabeo amoresplendorde aromaromãfrutossanguíneosenergias milenaresque produzem?

XERUPÇÕESfotografei uma core o som ásperoda palavra orangetatuou-se no brancoda página

traceina página rústicao fluxo caudalosode um rio

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a água friacorreu célere

contra a luz fizfugir uma revoadade pássaros cantantese o silêncio do textopreencheu-se de azul

Na página friasopro continuamentee grita e lavra o turbilhãonegro pela mão escrava

escorre a larva espessatexto ígneo florente ligaonde a silente voz de Narcisoentoa o cântico dos séculos.

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Este livro foi impresso em julho de 2015. As fontes utilizadas foram: Liberation Serif, corpo 12, para os

textos e Papyrus, corpo 20, para os títulos.

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