revolta de beckman~ 1 - jorgearbage.com.brjorgearbage.com.br/web/images/downloads/artigos/artigo -...
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Historicamente, a mais recuada manifestação, ocor
rida durante a fase do Brasil-Colônia, em favor de nossa autono
mia polfticr3, foi a chamada Revolta de Beckman~ que eclodiu em 1
1684, motivada sobretudo, pela exploracão tributária, imposta p~
la Metrõpole.
Manoel Beckman (1630-1685) era portugues, radica
do no Maranhão, sendo escolhido para liderar a Revolta, contra a
atuação dos jesuítas e do governo local, que acabou sendo depos
to. A Revolta, porém, fracassou, sendo Beckmen condenado à forca
em Portugal; esse lfder revolucionário, considerado o pioneiro 1
de nossa independência, não tinha, entretanto, um programa defi
nido de governo, nem de regime polftico, isto ~~ monãrquico ou 1
republicano.
Enquanto os ideais republicanos se propagaram pe
la AmP.rica Espanhola, desde principias do Século XIX, em feitos/
gloriosos, na epopêia em que se destacaram Simôn Bolivar e Jose/
de San Martin~ verificou-se no Brasil um movimento local: a RevQ
lucão Pernambucana (1817), em que se distinguiu a figura de José
Inácio Ribeiro de Abreu Lima, conhecido como Padre Roma; apõs a
vitória do movimento sedicios8 no Recife, ele recebeu a missão I
de sublevar as provfnclas de Alagoas e da Bahia. Todavia, depois
de cumprir parte de sua missão, foi preso ao desembarcar em Sal
vador, tendo sido logo em seguida sumariamente fuzilado no Campo
da Pólvora, por determinação do conde dos Arcos.
Alguns dos participantes desse movimento heróico/
se reorganizaram depois, constituindo a chamada Confederação do
Equador, que se alastrou pelas provincias vizinhas de Pernambuco 0
que rompe ram com o gove rno central, sendo afinal esm~gada a revol
ta,· com o fuzi lamen to de vãrios de seus lide res, dentre os quais o
ca rmelita frei Caneca. Em 1826, finalmente, os pernambucanos ace i
t aram a autori dade impe rial, fazendo-se representar no Parlamento.
A propósito, me rece destaque o fnto de Jose/
Inãci o de Abreu Lima, filho do lendário Padre Roma, ter participa
do da Revolução Pernambucana (1 817) , passando em seguida a comba
t er sob as ordens de Bolivar, nas guerras de li bertação, que, este
desencadeou, tendo inclusive cogitado a possibi lidade de luta e 11
dest ituição da Casa de Bragança, que então dominava o Brasil.
Ma is tarde , retornando ao Brasil, JosP. Inà
ci o tomou P8 rte ati va na vida pol í t ica naci onal , entre 1832 e 1844.
Era li vre-pensador, republicano e defendi a ideais socialistas.
Em 1848 ec lodi u nova sedição em Pernambuco,/
a chamada Revolução Praieira, logo em seguida debelada.
No Rio Grande do Sul , ocorreu tamb~m um movi
menta au t onom ista, em 1835, chefi ado por Bent o Gonçalves ·da Silva,
visando à consti tu ição da Repúbl ica de Pi rat ini ou Farroupilha sob
o reg ime fede rali st a, unindo as provincias que aderissem ao movi -
menta. Durante a guerra que se travou, os revol tosos chegaram a o
cupar, efemerament e, pa rte da ProvÍQcia de Santa Cata rina (Lajes);
em Aleg rete (cidade riog randense), instalou-se a Assembleia Consti
tuinte, em 1842. Fi nalmente, em 1845, os rebe ldes fo ram submeti
dos, conqui stando o di rPi to de indicar o presidente da Provfncia ,
com a ap rovação do governo imperial.
Na Bahia, em 1837, eclodiu a Sabinada, movi -
menta sed icioso republicAno e federalista, Afinam debel ado . Naque-
la oportunidade, Teixeira de Freitas foi nomeado juiz, pelos revol
tosos, o que valeu contra aquele um processo criminal, do qual se
livrou, sendo absolv ido da imputacão que lhe fora feita, como par- ~
ticipante da revolta <SILVIO MEIRA, TeixPira de Freitas - o Juris-
consulto do Impé r io).
Afora esses episódios, manteve-se o ca
rater unitário do Império, em bases conservadoras, e certo , com 11
marchas e contramarchas legislativas , ora com tendênc ias liberali
zantes, ora reacionar ias, como no caso da Lei nQ 16, de 12.08.1834
- o chamado Ato Ad icional - que in troduziu inovac6es orogressis -
tas na Consti tuic§o de 1824, de mn lde a conc ilia r as fo rcas polftl
cas, segu indo-se, po rém, um retrocesso, com o advento da Lei nQ ..
105, de 12.05.1840, §guisa d~ intero retac§o da Reforma Constitu
cional, ocor r ida com o ci t ado Ato Adiciona l .
Contudo, o ideal · r8publicano mantinha-
se latente, acalentado por muitos. Teõfoli Otnnf. por exempln. que
part icipou do movimento insurrecional do Se rro (Mi nas Gerais). cul
minando com a abdicac§o de D. Pedro I (07.04.1831). consoirou para
a i~plantac~o da R8oGblica. mas compreendendo a imp rat icabilidadel
dela. naquele momento. devotou-se à causa de sua preoaracão: nao 1
inves de oregar o seu advento. mostrou ao oovo as suas virtudesn
por meio. sobr~tudo. do exemplo oessoal. iniciat ivas. probidade no
exe rcício das v~rias func6es pGblicas que exerceu. Um anos apõs a
sua morte (1869) surqe o Manifesto Reouhlicano de 03.12.1870. sttb~
crito oela Juventude que ele tinha inspirado <Paulo Pinheiro Cha -
gas. Te6foli Otoni. Ministro do Povo. os. 17 e seqs,) .
A PROCLAMACÃO DA REPOBLICA E A CARTA DE 1891. =============================================
No dia fatal para a ~anarqu i a - 15 de I
Novembro de 1889 -, no Quartel General do Exérc ito. o Visr.onde dr. Ou ro Preto. presidente dn Conselhn de Ministros . teve ri~nrta de I
aue o Marer.hal Dendorn da Fon~era . saindo rlP sua residP.nria. at tlal
PritanetJ Milita r. iunto ao Camoo de Sant'Ann. no Rio de Janeiro. I
diri qi a-se ao refe ridn RtJartrl GRneral. instantes 8D~s. era oroclô
mada a Rr.o~bl i ca. Ainda no dia lS de nnvembro. foi baixado oel0 o~
verno Provisõrio. chefiado cor n~odoro. o Decr~to nQ 01. ~~tab~l~
rPndo como forma dP QOVPrno a RPo~blira FPdPr~tiva; as Provlnci -
as. rRunidas oRlo laca da FRdRrac~o. passavam a constituir os Es
tados Unidos do Brasil.
A partida da familia rRal. oara Rxllio na
Europa. foi narrada de maneira sRntimRntal. Rm oãqinas candRntRs
da lavra de Raul Pompeia. SucP.deram-sR os instrumRntos lPqais I
dP. dRf Rsa do novo rP.q imP. submPtPndo-sP a .J ust i c a Mil i ta r R às I
oRnas dP.sta. os nue atP.ntassem. r.om oalavras. Rsr.ritos P. atos 11
contra a nova ordP.m (Fvaristo dP. MoraP.s. Da Monarauia à RPoubli
ra. os. lll e seqs. . e 179 a l q7) .
Em 03 dP. de?embro de l88q, o Governo Pro
visaria nomeou uma r.omissão oara Plaborar o ProiP.to de (onstitui
c~o. r.omiss~o essa comoosta do conselheiro .Joanuim Saldanha Mar!
nho CoresidP.ntP.). AmPrir.o RrasiliP.nsP dP. Melo Cvice-oresidente).
Franr.isr.o Ranqel Pastana. Antonio l_ui7 dos Santos WPrnP.r.k e Jose
Antonio Pedreira de Maqalhães (astro.
Foram elaborados trP.s ProiPtos dP. (onsti
tuicão. rRunidos afinal num sà. entrequp ao qovPrno Rm 30 de 111 -maio dP. 1890. auP. o confiou a Ruv Barbosa. r.om a tarPfa dR revR-
lo. Ruv. como se sabe. tinha uma formacão intPlRr.tual mais inqlR
sa R americana do nue francesa. oor isso "não era oositivista //
nem af ranr.essado. mas constituc ional ista e ameri can izado". Dal a
influência enorme do Direito amRrir.ano· (escr ito e não -escrito} I
sobre a Constituicão brasileira de 24 de Fevereiro de 1891. de I
aue Ruv foi cerebro mais ootente (Afonso Arinos de Melo Franco .
ob. cit .. p, 61). -Nos EUA. oorem. Pxistiam outras condicões
sociais. histàricas. ooliticas. econômiras R iurldicas. aue ser
viam de suoorte oara a ordem constitucional ali viqente. ordP.m I
essa aue se baseava sobretudo nas tradicões e no resoeito nacional
oela Consti tuicão <como obra dos Pais da Pàtria). no orestlaio do
Conqresso e no ooder oolltico da Corte Suorema. tudo isso como re
sultante do lonao orocesso de Plaboracão constituciona l estaduni -
dense. oreced{do .de vàrios encontros de representantes das diver
sas colônias. ainda na fase de oreoaracão da GuPrra de TndeoendPn
cia (William Soence Robertson. "Indeoend~ncia e Oroani?acão ronst!
tucional dos Estados Unidos (1763-1789". in Histõria das Am~ricas.
vol. 8. os. 3 e seos.}.
Por ocasião das arti cu lacões oara a eleicão do
oresidente e vice-presidente da Reoublica , para o primeiro perlodo
presidencial, houve uma tendência de ~e eleqer Prudente de Moraes,
mas acabou por prevalecer a ameaca velada de aue as Forcas Armadas
emoossariam. "oor bem ou por mal", o generalissimo Deodoro da Fon-, . ,,
seca, cabendo a vice-pres idênci a ao marechal Flori ano Peixoto, o I
aue se concret izou, pela forma de eleicão ind ireta. prevista no ar
tQ lQ das Disposições Trans itàrias da Consti tui ção de 24.02.1891 :<
Emmanuel Sod re. Lauro Sodre na Hi stària da Republica, os . 52 e 53).
Durante a elaboração do Proieto de Const itui -
cão, escreveu Ruv Barbosa . "A dissolução do Congresso qerminava no
esoirito do Marechal Deodoro como tentacão maligna, desde oue se I
tratou de orqani zar o reoimen". E de fato, loqo aoõs a promulgação
da Const ituição Federa l de 24.02.1891. Deodoro fez oublicar o De
ereto nQ 641, de 03.11.1891. dissolvendo arbitrariamente o Conqre~
so Nacional. convocando a Nacão para escolher novos representantes
e determinando aue se procedesse à revisão daauela Carta Polltica,
tudo isso em frontal violacão dG texto constitucional viqente. aue
não atribulra tais poderes ao oresidente da Reoublica. tratando-se
oortanto. de um qoloe de Estado.
Mas a reacão veio loqo de diversos setores da
soc:iPdadP. alP.m danuPla oriunda dos orõorios parlamenta res:· a Ma
rinha. sob o comando do almirantP [ustÕdio dP MPlo. ~Prlafou-sP I
rPvoltada e Deodoro renunciou. oara não desencadear a ouP rra ci -
vil . AssumP Pntão o vic:e-orPsidentP. marechal Floriano Vieira Pei
xoto (2~.11.18911. as func~Ps dP orPsidPnte da RPo0blira. dPtP rm!
nando a reabertura do [onoresso Nacional.
A oosse de Floriano dPsoPrtou looo forte o
oosicão. considerando-se aouela um contra-ooloe . sob vàrios arou
mPntos. dPntre os auais o fato de nue era de riqor se proceder à
eleicão de um novo orPsidentP.. oela c:irrunstância dP ainda falta
rem mais de dois anos do oPrlodo danuPle ouP renunriàra. em fare
do disoosto no arto 42 da Carta Polltica dP 1891. AIP.m disso. ve
rifir.aram-sP numProsas deoosicões de oovernadores. nue se haviam
mostrado solidàrios com o oo-loe de Estado. desfec:hado oelo mare
c:hal Deodoro <ob. cit .. os. 5? a hll.
AtÀ então. observa Oswaldo Triqueiro. os bª
r.hareis da RPoublira ainda não haviam inventado a fioura do inter
ventor federal e a doutrina rom nuP burlariam a autonomia estadu
al. o oue exolica a desenvoltura c:om oue o ooverno Floriano aoiu.
mandando deoor sumariamPntP qs odvernadores de Fstado (en_tão int!
tulados oresidPntes). substituindo-os oor outros aoentes de sua I
conf i anca. Assim, na Pa ral b~ do 1
NO rt.e. o o r PXPmo I o. a Junta ou e I
sur.edeu ao oovernador Venâncio Neiva. determinou. oelo DPc:rPto no
O?. dP 13.01.1892 e DPlo dP nQ 15. de '14.02.1892. a destruicão de
toda a construcão constitucional do Estado. der.larando sPm PfPito
a Constituicão de 05.08.1891: disso~vendo o [onorPsso Leoislativo
e convocando eleicões oara uma nova Assembleia Constituinte.
A sequnda AssPmblP.ia [onstituinte do Estado
instalou-s~ a 01.07.1892 e. em trinta dias. aorovou a nova [onst!
tuicão. oromuloada a 30 daouele mês. texto esse oue reoeu a Parai
ba do NortP onr trinta P oito anos. dando-lhe oroani7acão politi
ca semelhante à anterior. nada lhP altPrando nos fundamPntos ou I
na estrutura do regime, salvo um ou outro asoecto <A Paraiba na I
PrimPira Reoublica. o. 18).
De resto. o marechal Floriano Peixoto oerma
neceu com a funcão dP orPsidPntP. atP 15.11.1894. auando tomou 11
posse o novo ores i dente da Repub 1 i c a·, P rudentP JosP de Mo r a i s Bar
ros. a cuia posse não compareceu Fl6riano.
No Brasil. observa Afonso Arinos. "a Const i
tulcao. talve7 oPlo seu artificialismo. foi. desd~ o .inicio. con-~ . i
testada e violada. O Conqressd raramente exibiu indeoend~ncia an-.' ~ ...
te o Executivo. do aual f_oL as mais das vezes, comparsa passivo.
Quanto ao Suoremo Tribunal/ se, teve ele iuizes aue bem comoreend~
ram as suas funções. nunca exerc~u o oao~l eminent~ nue desemoe -
nha nos Estados Unidos" <ob. cit .. ps, 61 e 62).
Invocando o testemunho de Ruv, acerca do pa
pel do Suoremo Tribunal no Brasil~ João Manoabei ra assim se mani-. ..
fes ta, de maneira contundente: "O Õrgão aue a Constituição criara
para seu guarda supremo. e destinado a conter, ao mesmo tempo, os
excessos do Conoresso e as viol~ncias do Governo. a deixava desam i
oarada nos :dias de risco ou de terror. auando exatamente. mais ne . :~ '·· -
' .. cessitada es-.;ava ela da i,ealdade, da fidelidade e da coragem dos/
' .
seus defensores < ... >. Fo1 esse o Õrgã~ aue, pela ~aioria dos///
seus membros, mais falhou à Republica, e em todos os momentos de
sua angustia, de 92 ate 37 < .. . >. O Supremo TRibunal Federal, erigido como su
premo interorete da Constituicão e seu ouardá.supremo contra as I
tempestades do arbitrio. recuava~ nos dias t~moestuosos. de sua I
sagrada missão" <Ruv- o Estadista da Republica, os. 69 a 71>.
J~ em 1892, Gaspar Silveira Martins levanta a questão da revisão da Constituição de 24 de Fevereiro de 1891,
para que se consagrasse o regime ·parlamentar. Em 1896, J. F. Assis Brasil propugnava pela revisão constitucional, propondo a 11
instituição de um presidencialismo parlamentarizado, com o compª recimento dos ministros ao Congresso e o ministeri o como Õrgão I
coletivo, bem assim o voto secreto, o voto feminino e a represeo tação proporcional.
Por sua vez, Ruy Barbosa, em sua Plataforma
de 1910, propos, dentre outras medidas reformistas, a definição/ dos principias constitucionais que os Estados-membros devem respeitar, a regulamentação do estado de sitio e diversos aspectos/
orçament~rios . Em 192~, o presidente Artur Bernardes, em mensa -
gem ao Congresso, encareceu a necessidade de ser reformada a 111
Constituição, reforma essa oco rrida em 1926, de que pouco valeu/
para efeito de aprimoramento do regime CPaulino Jaques, ob. cit. ps. 57 e segs,). Pelo seu conteudo, "essas reformas não mais satisfaziam, sendo imposslvel deter o colapso das instituições po
llticas da Primeira RepÚblica". Para Afonso Arinos, Ruy foi um grande cons
titucionalista, que "construiu um verdadeiro monumento à questão
dos direitos humanos< ... >. Mas, notocante aos direitos sociais/ do homem, Ruy Barbosa conservou-se em surpreendente inatualida -
de. Nos seus v~rios coment~rios ~Constituição< ... ) v~mo-lo bª sear-se nas doutrinas de Adam Smith e de outros representantes I
do mais ortodoxo liberalismo econômico, e sua considerações so -
bre o trabalho sõ visam a defender o conceito de liberdade, isto e, de aus~ncia de regulamentação pelo Estado" (ob. cit,, p. 36) .
Efetivamente, Ruy não chegou a aderir ao 11
pensamento socialista, mas não deixou de vislumbrar a necessida-
de de reformas constitucionais, inspiradas no "sopro de socializª cão que agita o mundo". conforme o texto de sua autoria, jà cita
do. Na verdade, quando esse "sopro de socialização" começou a cor rer o mundo, Ruy jà se encontrava no ocaso da vida, epllogo duma/ longa e combativa existência, que se estendeu de 05.11.1843 a 01.
03.1923. O "sopro" a que Ruy se referia correspondia
ao movimento socialista mundial, sobretudo os acontecimentos ocor ridos na Europa, que culminaram com a Revolução Socialista de /// 1917, na Russia, e o advento da Constituição de Weimar, de 1919 , marcando esta um pacto entre a burguesia e o proletariado alemães como vimos anteriormente.
A essa altura, a chamada "questão social" -as reivindicações operàrias, de natureza econômico-social - era I
considerada e tratada. oficialmente, na Republica Velha, como "cª so de pollcia". expressando com esse entendimento todo o conservª dorismo e prepotência das concepções das classes economicamente I
fortes e politicamente dominantes em nosso Pals, representativas/ sobretudo da aristocracia cafeeira.
Nesse contexto, em meio à violenta repres-são polotico-operària, sucederam-se os movimentos contestatàrios/ e insurrecionais, envolvendo civis e militares. o mais expressivo desses movimentos foi a celebre Coluna .Prestes, ou Coluna Invicta, uma das manifestações do chamado tenentismo, que promoveu di versos levantes militares abortivos, a partir de 1922.
Ideologicamente, o tenenti smo consistiu num movimento tipico da classe media: partia-se da suposição de que ao substituir os homens no poder a situação estaria satisfatoriamente resolvida. pois, entendia-se que a corrupção era o vlcio fundamen-
tal do regime republicano, em si mesmo considerado bom. Dal, o tenentismo afigurou-se aos olhos da nação como um movimento de herois 4
do povo. Em 1924. o General Isidoro Dias Lopes e outros partem de são Paulo, sobem o Rio Paranà e na Foz do Iguaçu fazem junção com Luiz Carlos Prestes e seus companheiros que compunham a Coluna do Sul, a qual se formara apÕs o levante do Batalhão Ferrovi~rio de Santo Ângelo <RS>.
Seguindo para Alegrete (RS) a Coluna Prestes percorreu mais de 33.000 quilometros, em dois anos e três meses ,
semeando a revolução, despertando o sertão e alertando as cidades por onde passava, abrangendo os Estados do Paran~. São Paulo, Mi
nas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Paralba, Cearà,/
Maranhão, Goiàs e Mato Grosso. Prestes transformara-se em mito: I
jà e o Cavaleiro da Esperança, como ficou mundialmente conhecido.
Jorge Amado escreveria: nEstrela para o povo, para os tiranos I.ugubre cometan.
No Cearà, a Coluna enfrentou os cangaceiros que afinaltambem lutavam, embora sem criterio e sem ideologia, 11
contra as injustiças do sertão, lideradas por Lampião, prat icando saques e assassinatos, tendo inclusive recebido armamento para // combater a Coluna, enquanto se divulgava pela imprensa governista que esses saques e atrocidades eram praticados pelos legionàrios/
da Coluna.
Uma das mais fascinantes proezas da Coluna/ consistiu na famosa manobra denominada .Laco H~ngaro, da qual foram palco as margens do Rio são Francisco, em Minas Gerais, em 11
que a Coluna volta, quase sobre os prÕprios passos, para o Norte,
ludibriando as forças legalistas. Exausta, a Coluna termina por I
se internar na Bollvia, em 1926, com seus homens famintos, maltrg pilhas, as armas descalibradas, sem dinheiro, mas invictos e aray tos do inconformismo <Helio Silva, 1926: A Grande Marcha).
Todavia, não bastam o inconformismo e a
revolta; para a ocorrência das mudanças sõcio-econômicas profun -das, e indispensàvel um substancioso programa ideolÕgico, pois,///
sem teoria revolucionària não hà movimento revolucionàrio <Lênin>. Cumpre lembrar que a Grande Marcha da China, li
derada por Mao Tse-Tung, em 1934, foi precedida da Coluna Prestes/ no Brasil, constituindo, ambos esses acontecimentos, pontos marcao tes da evolução polltica dos respectivos palses, como ressaltamos/ noutro trabalho <Curso de Direito Internacional Publico, ps, 298 e segs, ),
Prepotência e autoritarismo pollticos, fraude~ leitora!, inautenticidade representativa dos Õrgãos legislativos,/
brutal exploração econômica sobre as classes assalariadas e implacàvel repressão penal exercida sobre os pobres, eis as principais
características da Primeira Republica, que, ao desmoronar-se, em 1
1930, passou a chamar-se Republica Velha. A propÕsito, nada e mais expressivo do que o tl
tulo do livro de Virgllio Donnici, sobre a mentalidade altamente I
repressiva existente no Brasil, desde que aqui chegaram os conqu i ~
tadores europeus: A Criminalidade no Brasil <Meio Milênio de Re -pressão>. E cita o referido autor as palavras de Edgar Carone. no que tange às caracterlsticas dessa repressão. durante a Primeira I
Republica: "as greves se fazem sempre pelas mesmas reivindicações" ou seja, salàrios melhores. jornada de trabalho, etc. usando·a 111
classe dominante de todos os recursos para abafar os movimentos operàrios, com uma repressão policial que resultava em mortes, fe -chamentos de sindicatos, prisão e deportação de lideres e uma le -gislação cada vez mais ferrenha" (Ob. cit,, p, 43),
No terceiro anos do governo Washington Luiz Pereira de Souza <1926-1930) repercutiu no Brasil a crise financeira
norte-americana - o crack de 1929, que provocou uma crise geral do a
sistema capitalista, com uma colossal onda de desemprego e super
produção, ocorrida nos palses sob esse sistema. Os nossos esto -
ques de caf~ alcançaram nlveis nunca vistos, recusando-se o gover
no a atender auxilias financeiros pretendidos pela lavoura cafeel ra. Seguiu-se, durante a Primeira Republica, o costume de o presi dente escolher o seu sucessor; parece, no entanto, que Wash ington
Luiz hesitou em escolher o seu, acabando por impor-se o nome Ju -lio Prestes, o que provocou ressentimentos no candidato do Estado de Minas Gerais, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, o que levou I
este a aproximar-se do candidato do Rio Grande do Sul, Getulio 11
Vargas.
No fim do ano de 1929, sucedem-se vàrios I
conflitos pollticos, inclusive assassinatos de pollticos, em ple
na Assemblkia Legislativa. Finda a campanha eleitoral, as elei -ções de lQ de março de 1930 processa ram-se regularmente, na sua a
parência formal, resultando na esperada vitoria das forças majori tàrias governamentais. Houve uma forte tendência para serem reconhecidos por todos, os resultados eleitorais, preparando-se o 111
Pais para o processo normal de sua vida pol.ltica, na convivência/ harmônica entre governo e oposição.
Mas, tal não aconteceu; ao iniciar-se em I
maio, com a instalação do Congresso, o reconhecimento dos resultª dos eleitorais, pelos deputados e senadores, a maioria não reve -lou propositos de pacificação. Antes, pelo contràrio, foi negado/
reconhec imento por toda a bancada paraibana e a grande parte da I
bancada mineira. Com isso, animaram-se os exaltados e voltou o am biente a eletrizar-se. Entrementes, o assassln io do governador da
Paralba, João Pessoa, ainda que por motivos não ligados ã polltica federal, deflagrou o incêndio insurrecional. Pouco antes, um I
movimento mi litar na Argentina termi nou der rubando o gove rno da -
quele pals, fato esse que repercutiu consideravelmente no Brasil.
Em sintese, formou-se um clima insurrecional no Brasil, galvanizª do pela Aliança Liberal, coligação polltica essa que congregava I
as oligarquias dos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e I
Paralba, contando ainda com o apoio de vàrios lideres, remanesceo tes do tenetismo, à exceção de Luiz Carlos Prestes, jà então de -
claradamente incorporado na luta pelo socialismo internacional. o Partido Comunista Brasileiro denunciou ,
de imediato, o carater burguês da Aliança Liberal, tendo o lider/
comunista Astrojildo Pereira sustentado o seguinte, acerca do ch~ fe aliancista Antonio Carlos Ribeiro de Andrade: "A famosa pala -vra de ordem, lançada pelo sr. Antonio Carlos nos prlmÕrdios do I
movimento - "façamos a revolucão antes que o povo a faca" - sign! ficava, na realidade, o seguinte: "façamos a contra-revolução antes que as massam façam a revolução". E foi efetivamente o que se fez: contra revolução preventiva, golpe reacionàrio contra as ma~ sas operàrias e camponesas, terror fascista contra o proletariado
revolucionàrio e sua vanguarda comunista". E concluía: "O outu brismo brasileiro vem a ser, para as massas operàrias e camponesas
uma imitacãozinha camuflada do fascismo italiano" CObras, I, URSS, Itàlia, Brasil, ps. 129 a 131).
Tambem nao escapou ao llder Astrojildo Pereira a apreciação do aspecto polltico-econõmico, de indole impe -
rialista, que servia de pano de fundo para a Aliança Liberal, ou I
seja, esse movimento significou e expressou os rumos da transição/
entre a hegemonia britânica, ate então dominante entre nos, e a tQ mada de posição do imperialismo norte-americano, em nossos desti -nos, dal em diante Cob. cit., p, 138).
Em 03 de outubro de 1930 estourou o movimeo to insurrecional, polltico-militar, tipicamente latino-americano , c
conhecido como Revolucão de 1930~ envolvendo simultaneamente os·
três Estados-membros, que haviam integrado a chamada Aliança L! beral, que apoiara a chapa composta por Getulio Vargas e João I
Pessoa, para a presidência e vice-presidência da Republica, //
respectivamente. Partindo do Rio Grande do Sul, as tropas do
Exercito, as da Policia e batalhões improvisados, todos sob o I
comando do tenente-coronel GÕis Monteiro, atingem o limite do I
Paranà com São Paulo, enquanto as tropas mineiras dominavam os raros focos fieis ao governo, fazendo ainda ameaças aos gover -nos do Estado do Rio de Janeiro e Esplrito Santo.
Na capital da Republica, Rio de Janeiro, I
os generais Tasso Fragoso, Mena Barreto e o almirante Isalas de
Noronha constituíram-se em uma Junta Pacificadora e intimaram o Presidente da Republica, Washington Luiz a deixar o poder, condição essa a que ele sõ acedeu apÕs longos entendimentos e med!
ante a interferência do Cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, Se
bastião Leme. Em seguida, a Junta Pacificadora entrou em
negociações com o comando revoltoso, chefiado por Getulio vargas, o qual assumiu então o governo da Republica. Assim findou/ a Primeira Republica no Brasil, isto e, com a eclosão da impro
priamente chamada Revolução de 1930. Como vimos noutra parte deste trabalho, o
termo revolução, sob o ângulo da Ciência Polltica, exprime um
movimento polltico-econômico-militar, de grande envergadura, cu jo principal aspecto se traduz na substituição das classes economicamente fortes e politicamente dominantes, que detêm o po
der do Estado, por outras classes sociais e forças pollticas. Assim, por exemplo, a Revolução Francesa I
(1789) marcou a derrocada da nobreza, do clero e dos resquícios
do feudalismo, ensejando a ascensão polltica de uma nova classe ou seja, a burguesia, acontecimento esse que teve repercussão I
internacional, especialmente na Europa. Da mesma forma, a Revolução Socialista, li
quidando com os resqulcios do tzarismo e da burguesia, ensejou/ a vitoria do movimento socialista, na antiga Russia, em 1917.
Ora, os acontecimentos ocorridos no Era -sil, em 1930, sob a Õtica do rigor cientifico, não configuraram uma revolução, e sim um golpe polltico-militar, de lndole burguesa, afinado com os interesses imperialistas, em face da conjuntura capitalista internacional, marcada pela Queda da Bolsa
<crack> ~ em 1929.