revista xcultura - edição nº 1

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Revista-laboratório produzida para a disciplina Laboratório de Texto VI do curso de Jornalismo da Unisanta, em Santos-SP, sob orientação dos professores Hélder Marques Coelho e Raquel Alves. Mais créditos no EXPEDIENTE, página 3

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Page 1: Revista XCultura - Edição nº 1
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Page 3: Revista XCultura - Edição nº 1

Caro leitor

Diretor da FaAC Humberto Iafullo CHalloub

Coordenador de Jornalismorobson bastos

Professores ResponsáveisTextos Helder marques CoelHo

raquel alves

Diagramação fernando ClaudIo Peel

fotografia luIz C. t. nasCImento

EditorWagner tavares

RepórteresCarolIna Yasuda

JéssICa alves

matHeus José marIa

vInICIus KePe

YonnY furuKaWa

Wagner tavares

FotosCarolIna Yasuda

tHIago Costa

YonnY furuKaWa

Wagner tavares

Diagramação e artesWagner tavares

CarolIna Yasuda

A Revista X Cultura é trabalho curricular da disciplina Laboratório de Texto III do 3º ano do curso de Jornalismo da Unisanta

EXPEDIENTE

Esta é a primeira edição da XCultura, uma revista que nas-ceu depois de muita conversa, muita análise e, principalmen-te, muito querer.

Nós que fazemos a revista, es-tamos criando algo que tem como público-alvo pessoas como nós mesmos. Pautas, textos, fotos, estilos, fazemos tudo desse jeito porque gostamos assim. E acha-mos que esta é a melhor maneira de estabelecer um vínculo com você, leitor, que vai acreditar e apreciar o que está vendo e lendo.

Para lançar esta nova publica-ção, estampamos, logo na capa, a imagem de uma banda santista em que estamos botando a maior fé, a Music Box. Começou fazendo co-vers e hoje já está divulgando quatro músicas próprias e dois vídeo-clipes gravados, além de ser a única da Bai-xada Santista fazendo shows regu-lares em São Paulo. Mais do que ler a matéria, entenda, procurando as músicas que estão disponibilizadas na internet gratuitamente.

O u t r o destaque da edição é o gui-tarrista Mauro Hector. Nesse, a gente não está botando fé, já acredi-tamos. Com

quatro CDs lançados e alguns vídeos gravados em Los Angeles, nos Estados Unidos, o músico está na estrada há 30 anos. Ele nos conta do início na guitarra

e do apoio de Dona Rosita, mãe dele, que não se incomoda com o barulho e com os cabeludos na casa dela.

E na hora de gravar, qual e s t ú d i o escolher? A q u e l e que fica p e r t o para fa-cilitar a logística? Mas se a sua necessi-dade é a criação de trilhas so-noras para comerciais e filmes, talvez a gravadora melhor es-teja a milhares de quilômetros de distância.

As Oficinas Querô continu-am revelando talentos. 20 adolescentes ajudaram a

produzir e gravar o curta Tempo É Morfina, com locações em Santos, em pouco mais de 48 horas.

Em nossa matéria de “perfil”, conheça Isa-bel Ortega, uma ex-atriz de teatro que agora virou “cartola” da arte e, para isso, tem que atuar mais do que nunca.

E para finalizar esta primeira edição, o lançamento de um li-

vro escrito por três senhori-nhas simpá-ticas, permi-tindo a quem o lê, receber histórias do passado com

muita poesia e até ilustrações feitas por elas.

Esperamos que desfrutem do que vão ver na mesma proporção que adoramos produzir estes tex-tos. Boa leitura!

Music Box, pág. 12

FAZEMOS PORQUE ACREDITAMOS

Hector pág. 16

Isabel,pág. 20

Estúdios, pág. 6

Querô, pág. 10

Livro, pág. 22

Page 4: Revista XCultura - Edição nº 1

Índice12MUSIC BOX, a banda

da Baixada Santista que está fazendo sucesso aqui e promete muito na capital

16MAURO HECTOR, o guitarrista que tem a sorte de ter apoio (e o apartamento)da mãe até hoje para fazer muito barulho

ARTISTA

10OFICINAS QUERÔ e seus alunos produzem mais um filme em Santos

AUDIO-VISUAL

4 X CULTURA | NOVEMBRO 2014

NOVEMBRO DE 2014 | ANO 1, NÚMERO 1

CAPA

Page 5: Revista XCultura - Edição nº 1

06

20 De ATRIZ a “CARTOLA” das

artes cênicas. A trajetória de

Isabel Ortega

PERFIL

22 Três senhoras se juntam para

escrever histórias, poesias e desenhar. Dessa amizade veio

um livro

LEITURA

a marca do seu entretenimento

NOVEMBRO 2014 | X CULTURA 5

ESTÚDIOS de gravação podem

estar perto de você ou muito distantes. Com

a internet, isso não importa

TéCNICA

Page 6: Revista XCultura - Edição nº 1

Cheguei ao endereço marcado, um lugar rodeado de comércios na aveni-da Siqueira Campos, mais conhecida como Canal 4, na cidade de Santos, litoral de São Paulo. Constatei que o número era aquele mesmo, mas não havia placa identificando o estabele-cimento que eu queria encontrar. Era o lugar certo? Aproximei-me da porta de entrada, bem antiga, de cor bege, descasca-da e estreita, com uma abertura pequena na altura do rosto, grade e janelinha de vi-dro com desenhos em relevo. “Isso é um estúdio?”, pensei.

Toquei a campainha, daquelas pa-drão “cigarra”, nada agradável. En-quanto aguardava, olhei pela abertura, com a parte inferior do vidro quebra-da, e veio a confirmação de que havia acertado o endereço. Um som de rock abafado e de estilo bem pesado descia por aquela escadaria comprida.

O próprio administrador do local apa-receu, Nando Bassetto, dono do Estúdio Play Rec, que nem precisou descer, pois no topo da escada havia um interruptor. Quando o acionou... “TÁ-TÁ”. Essa infan-til onomatopeia escrita não evidencia o susto que levei. Parecia o duplo disparo de uma arma de fogo.

Na subida, mais bege. Tudo bege! Quando se chega, ofegante, na parte de

cima, a certeza de se estar em um estúdio de gravação é completa.

Tapando um pouco desse mar de

bege infinito, fotos de ídolos do rock, pratos de bateria, discos de vinil e um extintor. O último item estava estranho ali, tão a mão, até atrapalhando a passa-gem, mas entendi logo quando Basseto me convidou para dar uma olhada geral. Havia muito revestimento acústico, co-nhecido pela marca, Sonex. São feitos de espuma e, por isso, tal cuidado. É aplicado em algumas salas, mas, estra-nhamente, não no principal estúdio de gravação. Ali, era acabamento em madeira em três das paredes e um inu-sitado muro de pedras cobria a última parede. Segundo meu anfitrião, a grava-ção precisa de uma certa reverberação, um eco, na medida certa, para adquirir qualidade, e esse tipo de arquitetura proporciona isso.

O estabelecimento já existia desde 1996. Bassetto, guitarrista que passou por várias bandas, inclusive pela primei-ra formação do Charlie Brown Jr., e hoje está na banda de hard rock Garage Fuzz, começou a prestar mais atenção nos de-talhes de produção enquanto alugava o local para gravação das músicas de sua banda de estreia, o Mr. Green, formada em 1989, e que fazia a linha hard rock instrumental. Em toda sessão, ele ficava de olho nas dedilhadas do antigo dono, Alexandre Siaglia, na centena de botões

MAS ONDE?Estúdios dE gravação dE som podEm sE difErEnciar Em prEço, localização, qualidadE técnica, conforto, disponibilidadE. todos têm itEns distintos, mas alguns podEm Existir fisicamEntE E outros nEm tanto

Por Wagner Tavares Fotos: WAGNER TAvARES

Técnica

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Page 7: Revista XCultura - Edição nº 1

da mesa de som e no manuseio do mou-se para operar os softwares de áudio, como o aclamado Pro Tools. Bassetto interessou-se tanto pela parte técnica que começou a trazer outras bandas a partir de 2005 para ele mesmo fazer a produção. Nessa época, o estúdio ga-nhou um prêmio Grammy com o Char-lie Brown Jr. na categoria Melhor Álbum

de Rock Bra-sileiro, pelo t r a b a l h ’ o Tamo Aí na A t i v i d a d e . Em 2008, as-sumiu de vez o comando dos equipa-mentos, pois Siaglia se-guiu para ou-tra carreira, advocacia!

A Play Rec tem qua-tro salas. A principal, a de gravação, é anexada à

sala de comando, onde ficam os equipa-mentos de captura e de processamento

de áudio. É nessa sala que Bassetto assume o papel de grande coman-dante. Dali, ele dirige os músicos

falando em um microfone e também fazendo gestos bem exaltados através do vidro que liga os dois cômodos. Há mais duas salas de ensaio, onde são ministradas aulas de instrumentos, principalmente guitarra. Ainda bem que existe isolante acústico na sala do general. A entrevista foi feita lá, pois há barulho em todas as outras salas. E por um bom período do dia, tudo acon-tece ao mesmo tempo.

No meio das perguntas, o mestre de todo aquele equipamento ia me falan-do curiosidades de uma área que desco-nheço. Apesar de o computador possuir todas as ferramentas necessárias para captura, edição, processamento e finali-zação do áudio, é nos aparelhos antigos, os analógicos, que estão a qualidade, o peso do som. Ali, naquele lugar, a mesa com vários canais e o PC são os prin-cipais, mas há muitos equipamentos espalhados, com aquela cara de antigo que, segundo ele, ainda são essenciais para a boa gravação.

E gravação de quê? Estranho, mas fiz essa pergunta. Sempre de som, lógico, mas com muitas vertentes. Sempre há a tradicional gravação de CDs e EPs (um CD com menos faixas, não considerado como um álbum), além de músicos que que-rem mandar seu trabalho, instrumental ou vocal, para um concurso; o cantor ou instrumentista que apenas quer eterni-

zar o talen-to próprio em boa qualidade; p r o d u ç ã o de trilhas sonoras de filmes, ví-

deos e

Tv; jingles comerciais e de campanhas políticas; o grupo de rodinha de samba, por exemplo, que quer ter essa experiên-cia, mesmo sem a pretensão de se tornar profissional da música.

Logicamente que todo trabalho tem um preço, e Basseto abriu o jogo com os valores. São R$ 75 por hora. O estúdio tem a alternativa do pacote, que sai por R$ 650 cada música gravada e finalizada.

Apesar do estúdio tradicional, per-guntei se a internet entra em algum momento do processo. Resposta afir-mativa. Principalmente nos testes, quando ele precisa enviar uma demo para alguém aprovar. Mas diz que até quando tem de mandar o produto final, com total qualidade, para uma empresa de remasterização, não há impedimen-to. “Com as velocidades que a rede tem hoje, tudo pode ser feito”.

Nando Basseto, proprietário e comandante da Play Rec

Basseto pilotando o equipamento central do estúdio de gravação

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Page 8: Revista XCultura - Edição nº 1

Fui atrás de outro estúdio, um que já conhecia, o de Flávio Medeiros. Pas-sei em frente onde ficava o imóvel, também em Santos, no canal 2.

Decepção! Atualmente, no local, há uma escola infantil e de ensino funda-mental. Como nunca marquei o telefo-ne de Flávio, comecei a procurá-lo na internet. Achei o site oficial dele, www.flaviomedeiros.com.br, mas notei um detalhe. Havia um telefone de contato com códigos dos Estados Unidos. Fui para o batido, mas salvador, Facebook. Ali, em uma breve procura, encontrei o perfil dele. Sem hesitar, enviei uma mensagem pedindo uma entrevista e onde eu poderia encontrá-lo. A res-posta confirmou o número de telefo-ne disponível em seu site. O produtor musical e engenheiro de som está tra-balhando em Los Angeles há três anos. “Aqui nós pós-produzimos e mixamos os trailers oficiais que o mundo todo vê nas salas de cinema. Nossos clientes são Universal Studios, Disney, MGM,

Legendary, 20th Cen-tury Fox, DreamWorks, Warner, Pixar, Miramax, Lions Gate e outros”.

Em 2012, Flávio se formou pela The Los An-geles Recording School. ´Associate of Science in Recording Arts´, nos Es-tados Unidos. “Após o curso, fui recomendado e contratado por uma em-presa de pós-produção de áudio para o mercado de cinema, chamada Benchmark Sound Services, que atua dentro da NBC Uni-versal Studios, em Hollywood, Califór-nia. Hoje, atuo nesta empresa como compositor, produtor musical e enge-nheiro de áudio”.

Mas Flávio tem uma longa história antes dessa mudança para outro país. Durante mais de 25 anos, foi autodi-data, investiu e trabalhou profissio-nalmente na área de áudio. Músico

atuante desde 1986, realizava grava-ções caseiras em um pequeno quarto no próprio apartamento, onde atendia alguns clientes e bandas. Foi contrata-do pela Rádio Cultura, de Santos, em 1990. Atuou na emissora por um ano como compositor e produtor musical. Quando saiu da rádio, montou seu pri-meiro negócio, os “Estúdios Flávio Me-deiros”, nome que usa até hoje na sua empresa. Era em um imóvel alugado na Rua Euclides da Cunha. Eram ape-nas duas salas de 4 por 6 metros. Por cinco anos, realizou vários trabalhos nesse primeiro local.

Em 1995, montou o segundo estú-dio, em uma edícula de um imóvel pró-prio, o mesmo onde hoje é uma escola infantil. Na frente, dois comércios ad-ministrados pelos pais dele. Na parte de cima, uma loja de aluguel de roupas e embaixo, uma loja de doces e salga-dos. Mesmo nos fundos, Flávio não ficou tímido em seu espaço. Em 2008, expandiu a edícula e montou o maior estúdio de gravação de áudio da cida-de, obedecendo normas técnicas em uma obra de engenharia extremamen-te complexa, segundo ele. Eram dois

Tem estúdio que não está mais em um lugar físico, virou virtual

Flávio em estúdio da Los Angeles Recording School, locado por ele, para realizar um trabalho de mixagem de uma faixa de samba

Flávio, ao centro, mixando a trilha sonora que fez para um curta-metragem - L.A. Film Dub Stage- Campus Hollywood

Técnica Fotos: ARQuivO pESSOAL

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estúdios bem maiores, uma sala téc-nica e uma cabine de gravação de voz.

E a variação de serviços executados ali também era grande. vários álbuns em CD para o Brasil e exterior, muitos jingles comerciais e de campanha elei-toral, projetos especiais para grandes empresas, musicais teatrais, trilhas sonoras e pós-produção de áudio para documentários e audiovisuais diver-sos. Até otimização de áudio para in-vestigações e dublagem e voice-over em conferências internacionais. “En-fim, sempre há trabalho a fazer”.

Também lista alguns nomes co-nhecidos que fizeram trabalhos com ele: os músicos Cláudio Zoli, Tomati (do Sexteto Onze e Meia) e José Simo-nian. Artistas do vídeo também, como Marcelo Tas, Selton Mello, Francisco Cuoco, Carlos Casagrande, Humberto Martins, Marcos Pasquim, Monique Alfradique e Oscar Magrini.

E há mais um nome, que ficou bem em evidência durante as eleições pre-sidenciais, Marina Silva. A equipe de campanha da ex-candidata contratou Flávio, mesmo ele estando em um país distante. “Já tenho um histórico de mais de dez anos trabalhando em campanhas políticas. Para esta campa-nha da candidata, fui contratado por um cliente de marketing político com quem já trabalhei anterior-mente. Posso dizer que esta conquista é fruto de um his-tórico positi-vo de traba-lho”.

F l á v i o era o res-p o n s á v e l pela mú-sica e áudio dos programas. Recebia os vídeos da produção pela inter-net. Como tem trabalho fixo nos E.U.A, criava as músicas para os audiovisuais durante a noite e depois as enviava para um colaborador. Em Santos, Flávio conta com um engenheiro de som, vi-nicius Suzuki, seu funcionário desde 2005, que cuida das finalizações e pós--produção do som. Com tudo pronto, o material era entregue para o pessoal de produção da candidata.

Mesmo criando, ele próprio, as tri-lhas e músicas, Flávio diz que mudou muito pouca coisa dos tempos em que tinha o maior estúdio de Santos. “Se necessário, contrato músicos. Se eu estiver produzindo uma banda, vou até ela, usando o estúdio que o cliente pode pagar. Ele me contrata como pro-dutor musical, como músico intérpre-te ou como engenheiro de som, fazen-do uma ou mais do que uma função”.

Se o trabalho se restringe apenas a criar uma trilha, isto é, se Flávio não de-pende de mais ninguém para realizá-lo, ele faz no próprio estúdio em casa. Mas há outros serviços que necessitam de um lugar acusticamente tratado e com equipamento apropriado.

Mas, em Santos, na Rua São Francis-co, ainda mantém um estúdio em fun-cionamento desde 2012, com a ajuda do engenheiro de som vinicius Suzuki, que atende os clien-

tes locais e faz a manutenção do equi-pamento. Quando há produção, Flávio fica online pelo Skype, um software de computador que permite comunicação com áudio e vídeo em tempo real. Flávio e Suzuki trabalham em conjunto com os clientes que querem produção ou algo especifico, mas ainda com a supervisão do próprio Flávio. “vários trabalhos fo-ram agilizados dessa forma e o cliente não se sente abandonado por mim. En-fim, funciona!”.

Em outra locação de estúdio, na Paramount American Studios, em North Hollywood, Flávio faz a mixagem final do CD da banda santista No Froid, produzido no estúdio de Santos, com a presença virtual dele, e depois mixado em casa, nos Estados Unidos

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Acostumados a produzir em ritmo acele-rado, a turma avançada do projeto Oficinas Querô terminou as filmagens de Tempo é Morfina, curta-metragem produzido por 20 alunos de audiovisual sob a coordenação do instituto Querô. O filme é uma adaptação do roteiro escrito pelo premiado diretor pau-listano de O Pacote (2011), Rafael Aidar, 35 anos, convidado especialmente para orien-tar os estudantes durante a gravação das cenas, todas feitas em Santos.

O enredo do filme é baseado em uma ex-periência relatada por uma amiga do diretor, que teve seu relacionamento abalado com as sucessivas recaídas do marido no vício das drogas. Porém, no roteiro escrito exclusiva-mente para os alunos, Aidar contou que re-solveu inverter os papéis assim que recebeu o convite feito pela produção.

“Eu já tinha toda essa história na cabe-ça, porque ela seria o tema do meu próxi-mo curta-metragem. Fiquei tão surpreso e feliz com o convite que sentei e escrevi todo o roteiro em um único dia. Essa é a pri-meira vez que trabalho como orientador de alunos de Audiovisual”, confessa Aidar.

LUZ, CâMERA E AçãO!Após mais de 48 horas de gravação, foi

possível notar a expectativa de toda a equi-pe que participou da produção do filme para dar forma a mais um sonho que esta-va saindo do papel. Com os olhos cheios de lágrimas, a diretora Kamilli Semenov, 16 anos, também responsável pela direção do premiado curta visão Privilegiada (2013), disse que, mesmo com o tempo apertado, todos os objetivos planejados para as gra-vações do filme foram alcançados.

“Esse foi um trabalho muito importante para mim. Falar sobre drogas e de reações pessoais que não são suas é uma tarefa difí-cil. porém, trabalhar com profissionais como

o diretor Rafael e os atores vinícius e Priscilla facilitou bastante todo esse processo. Todos nós chegamos a um equilíbrio”.

igualmente emocionado, Daniel Quei-ja, 17 anos, que divide a direção do filme com Kamilli, comentou que todos tiveram muito trabalho durante os dois dias de fil-magem, mas que todas as ideias se encai-xaram. O esforço, físico e mental, parece ter sido compensado pela oportunidade de trabalhar ao lado do diretor paulista-no. “Foi incrível. Todos nós estávamos em sintonia na hora de filmar. Não tenho mais explicações para dizer como foi bom traba-lhar neste filme.”

ATORESOs atores escalados para dar vida aos

personagens já foram premiados por ou-tros trabalhos. Um deles, o ator brasiliense vinícius Ferreira, 38 anos, ganhou em 2004 o prêmio de Melhor Ator no II Encontro de Teatro Latino-Americano, em Bogotá, pela sua atuação no curta-metragem Danae, do diretor Gustavo Galvão (38). Seus últimos

trabalhos foram em Uma Dose violenta de Qualquer Coisa e Nove Crônicas para um Coração aos Berros, ambos de 2013.

“Fiquei muito contente e assustado por ter sido escolhido pelos alunos. Eu as-sisti ao filme Querô (2007) quando ainda estava morando em Brasília e fiquei sur-preso, pois não sabia que a produção tinha originado esse excelente projeto. A pouca idade dos alunos não interferiu em nada. Notei que todos estavam bem focados no que estavam fazendo. Me senti seguro.”

Já a atriz paulistana Priscilla Maia, 39 anos, que interpreta a dependente quí-mica da história, venceu em 2002 como Melhor Atriz por seu trabalho em Rasgue Minha Roupa, do diretor Lufe Steffen, du-rante o Festival de Cinema Super 8 de Cam-pinas. Em 2010, Priscila integrou o elenco da produção Belas Adormecidas, de Érika Fromm, desempenhando o papel de uma jovem em busca da beleza.

“Trabalhar em Tempo é Morfina foi um verdadeiro desafio. Tive pouco tempo para trabalhar a personagem. A concentração

Audiovisualalunos dE cinEma das oficinas quErô finalizaram as gravaçõEs dE tEmpo é morfina, Escrito ExclusivamEntE pElo dirEtor rafaEl aidar. pErto dE complEtar dEz anos, o instituto quErô continua a rEvElar jovEns talEntos da baixada santista para o cEnário cinEmatográfico

Por vinicius KePe

O diretor Rafael Aidar (esq.) orientando os jovens diretores Kamilli e Daniel, durante as gravações de Tempo é Morfina

Foto

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e objetividade dos alunos me ajudaram a compreender o que eles queriam. Gosto de desafios. E trabalhar com tanta gente nova, como o vinícius e o Rafael, além dos estudantes, foi uma grande experiência. Me entreguei neste trabalho.”

EQuipE DE FiLMAGEMUma preparação é feita para que os

alunos, adolescentes entre 15 e 18 anos de idade, se acostumem com o mercado de trabalho. Entre outras atividades, eles aprendem a fazer o próprio portfólio, assim como sua apresentação, criação de currícu-lo, desenvolvimento de projetos para ins-crição em festivais e editais culturais e, por fim, a produção de um curta-metragem como verdadeiros profissionais de audio-visual disputando o mercado de trabalho.

Entre os estudantes está Bianca Mu-nhoz, 18 anos, moradora do bairro Cidade Náutica, em São vicente. A aluna tem um tio que sempre teve uma coleção de máquinas fotográficas antigas, o que explica sua estrei-ta relação com a fotografia. Com o término do ensino médio, Bianca, que admira os trabalhos do cineasta norte-americano Tim Burton, decidiu que está pronta para cursar uma faculdade de Cinema.

“Mesmo eu não sendo uma profissio-nal, as Oficinas Querô abriram a minha ca-beça para que eu pudesse trabalhar como tal. Aprendemos a lidar mais com as nossas próprias ideias e com as outras pessoas. Tudo o que eu sei sobre cinema foi por causa das Oficinas Querô, que deixa de ser uma escola convencional para dar liber-dade e conforto para os alunos extraírem todo conhecimento que puderem”.

PRIMEIRO CAPíTULOEm 2005, 1.200 jovens que moravam

em bairros com população de baixa renda em Santos foram selecionados para par-ticipar do teste de elenco do filme Querô (2007), que teve boa parte de suas cenas

gravadas na zona portuária e no centro his-tórico pelo cineasta Carlos Cortez. Nessa experiência foram descobertos novos talen-tos para o cinema, o que fez nascer oficial-mente em 2005 o projeto Oficinas Querô, idealizado pela produtora Gullane Filmes, com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Em 2008, alunos trabalharam e deci-diram criar a própria produtora, a Querô Filmes, considerada em 2010 a primeira produtora social do País.

Um dos jovens que participaram do filme, e que logo após se tornou um dos primeiros alunos, foi Nildo Ferreira. Aos 25 anos, o garoto, que sonhava ser jogador de futebol, acabou se tornando diretor, rotei-rista e professor de roteiro em Santos. Ele contou que foi “fisgado” pelo cinema e que não se arrependeu nem um pouco de ter abandonado o antigo sonho.

Entre as experiências que teve enquan-to estudante destacou sua atuação na direção de fotografia de ver ou Não ver, curta-metragem que integra o filme Mun-do Invisível, do aclamado cineasta alemão Wim Wenders. “Prestar atenção em tudo e

em todos, além de nunca ter medo de per-guntar ou de aprender. Isso foi o que mais aprendi com as Oficias Querô. Sem ela, não teria conseguido nada do que conquistei e venho conquistando”, explica Nildo.

SEM FINALperto de completar dez anos, as Ofi-

cinas Querô continuam a capacitar com aulas de audiovisual jovens que moram em bairros de vulnerabilidade social da Baixada Santista. Ao longo deste perío-do, foram produzidos 14 filmes, além de vídeos institucionais e webprogramas. Alguns destes trabalhos foram premia-dos em importantes festivais brasileiros de cinema, como o filme Carregadores do Monte (2013), que recebeu menção hon-rosa no Festival de Cinema de Gramado.

Desde então, as aulas e os exercícios práticos, agora desenvolvidos anualmente em parceria com uma universidade de San-tos, continuam com o foco em seus prin-cipais objetivos: estimular novos talentos e formar profissionais competitivos, tudo em prol do fomento do mercado cinema-tográfico regional.

Os premiados atores Priscilla Maia (esquerda) e Vinícius Ferreira (centro) foram escalados para dar vida aos personagens centrais da trama. Na foto à direita, cena de bastidores

Equipe de filmagem formada por 20 alunos das Oficinas Querô gravaram por mais de 48 horas em Santos

NOVEMBRO 2014 | X CULTURA 11

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Capa

12 X CULTURA | NOVEMBRO 2014

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music box é uma banda indEpEndEntE quE busca sucEsso no Estilo rock ‘n’ roll E Encara as dificuldadEs dE vivEr dE música com o apoio dE amigos E familiarEs

NOVEMBRO 2014 | X CULTURA 13

Page 14: Revista XCultura - Edição nº 1

Horários apertados, noites mal dormi-das, busca pela própria identidade. Essa descrição pode ser a da vida de qualquer um, mas se acrescentar ensaios noturnos que avançam na madrugada e pesquisa árdua por patrocinadores, se torna, de cara, a defi-nição da banda Music Box. Existente há três anos, o reconhecimento começou a chegar após a divulgação do primeiro clipe Nosso Tempo Começou, que, há cinco meses tem mais de 20 mil visualizações no Youtube. “A coisa está saindo do nosso controle. Outro dia me pararam no shopping e pergunta-ram: Music Box?”, conta Carol. E mais que re-conhecimento, já tem muita gente vestindo a camisa do grupo. “Eu já vi gente andando na rua com a blusa que tem a nossa marca”, diz André, surpreso.

A banda é composta por Carol Germa-no (21) no vocal, Percy Castanho (32) na guitarra e no vocal, Bruno Soares (25) na bateria, André Ricardo (34) no baixo e Luiz Ramos (30) nos teclados.

Carol, que cantava em festas de família, também costumava dar canjas em um bar em Praia Grande, onde conhecia o dono. Nada profissional, mas que chamou a aten-ção do Percy, que já havia notado “os berros da hora” que ela dava. “A gente estava na banda de alguém, era outra formação. Aí, eu

e o Luizinho, decidimos chamá-la pra formar uma banda nossa, como se fosse a nossa em-presa”, conta o guitarrista. Desde então, o boca a boca dos amigos e a rede social têm sido aliados da banda em busca do sucesso.

A Rock Show, empresa que promove a maioria dos eventos musicais em Santos, é parceira do grupo e ajuda no valor pago pela banda à Lobo Estúdio, onde ensaiam duas vezes por semana, das 23 às 2 horas da madrugada. Sem assessoria ou outro tipo de apoio, fica por conta dos integran-tes: alimentação da página na rede social, busca por espaço em rádios e emissoras de

televisão, e contatos para os shows. Para realizar o clipe não foi diferente,

“A gente quase pediu uma bolsa clipe pra Dilma ou fez uma passeata. Foi mais difícil que ter um filho”, desabafa Carol. “Ganha-mos a produção de um clipe em um festi-val de bandas independentes, mas quando a empresa soube que teria que descer a serra para gravar, cobrou 1.500 reais”. Os integrantes correram atrás de inúmeras gravadoras de pequeno, médio e grande porte, mas não obtiveram resposta de ne-nhuma quanto a valores e disponibilidade de gravação. Após um ano de tentativas,

Capa A INDEPENDêNCIA DE UMA CAIXINHA DE MÚSICA

CAROL PERCY BRUNO ANDRE LUIZ

Juntos há três anos, a banda é a unica da Baixada Santista que faz shows regularmente em São Paulo

Por Jéssica alves

Fotos: ARQuivO pESSOAL DA BANDA / DivuLGAçãO

14 X CULTURA | NOVEMBRO 2014

Page 15: Revista XCultura - Edição nº 1

o videoclipe da música Nosso Tempo Co-meçou foi lançado em junho e concorreu na categoria videoclipe Caiçara no Curta Santos 2014. No mês de setembro, a ban-da lançou o seu segundo clipe, desta vez, da música Bailinho. Totalmente custeado pelos próprios músicos, o escolhido para dirigir o videoclipe foi o Lucas Romor, res-ponsável por videoclipes premiados.

PRIORIDADESA banda é prioridade para todos os in-

tegrantes e uma das principais regras é não deixar os problemas pessoais atrapalha-rem os ensaios ou compromissos do grupo. “Se você quer fazer um trabalho profissio-nal, não tem essa de horário. você tem que abrir mão do lazer, família e, muitas vezes de tudo o que você gosta de fazer. É lógico que a gente tem bom senso, como no caso do Bruno”, explica percy.

O baterista Bruno Soares tem a roti-na mais puxada, acorda diariamente às 6 horas, trabalha e faz faculdade de Direito. Quando tem show em uma região dis-tante durante a semana, o chefe conse-

gue liberá-lo na metade do dia. “É uma cor-reria boa, então a gente vai levando. Mas sempre durmo na van na hora de voltar e o pessoal tenta fazer menos barulho, mas o percy e a Carol não conseguem ficar quie-tos”, brinca Bruno.

Todos têm um trabalho paralelo à ban-da. A vocalista Carol dá aulas de canto em sua própria residência e vende acessórios femininos; Percy Castanho trabalha com o pai, que também é músico e compositor; André Ricardo é analista de sistemas; Luiz Ramos ministra aulas de teclado e faz frilas para outras bandas.

Por ser uma banda sem patrocínio, cada um é responsável pelos seus instrumentos. “Isso é um investimento pessoal, cada um tem que ter o seu. E, claro, a gente também investiu em conjunto para comprar coisas que a banda inteira usa, por exemplo, mesa de som e caixa de som”, explica percy.

E para conseguir uma grana extra, o con-junto vende CDs a 5 reais, camisetas e cane-cas a 30 reais. “Sempre que estou no palco e vejo alguém interessado, ou perguntando para uma pessoa onde vende a camiseta da banda, peço para um conhecido começar a vender. Fico responsável por essa parte por-que não tem quem ajude, então eu conto com o auxílio dos fãs”, explica Carol.

SHOW

A faixa etária dos frequentadores é de 30 anos. O local é rústico e com pou-

cos assentos, mas parece não incomodar o público. Pouco tempo antes de o show

começar, o Torto Bar já estava lotado. Num clima totalmente rock ‘n’ roll, as pessoas se soltavam conforme as músicas tocadas.

“Gosto muito da banda Music Box.

Eu tenho 45 anos e sempre que posso ve-nho aqui para ouví-los. O show me remete a momentos marcantes da minha vida. As músicas dos anos 70, 80 e 90, como, por exemplo, Queen, Legião urbana, Guns N’ Roses e Aerosmith ajudaram na minha formação. É muito difícil encontrar jovens que gostem de rock e que façam rock, por isso os prestigio”, afirma o empresário Luis Gomes Lamaison.

Assim como Gomes, outras pessoas tam-bém frequentam assiduamente o local para assistir ao show. O estudante William Andra-de, de 24 anos, viu a performance da banda pela primeira vez e ficou comovido. “Eu gosto de rock por causa dos meus pais. Cresci ou-vindo esse tipo de música e, hoje, não consigo ouvir outra coisa. Quando passei por aqui e escutei tocarem My Sacrifice, da banda Creed, tive que parar. Fiquei emocionado com o de-sempenho de todos no palco”.

“Cada vez que a gente conversa so-bre sucesso e fãs, percebemos o quanto estamos ficando mais conhecidos. Ainda não temos noção dessa popularidade. Pra gente, todos são amigos, conhecidos e etc.”, fala percy.

A banda tem um EP lançado com as quatro músicas próprias (Nosso tempo começou, Bailinho, Etiqueta ou Patrão e Minha vida) que foi produzido pelo Nan-do Bassetto, guitarrista da banda hardco-re Garage Fuzz (mais sobre ele na pág. 6). Além dessas canções, o grupo que se in-titula pop/rock, costuma fazer covers de artistas como Janis Joplin, Led Zeppelin, The Beatles, The Doors, Jessie J, Joss Sto-ne, Pitty, Charlie Brown jr. De acordo com a casa em que a banda toca, eles também atendem aos pedidos do público.

A Music Box agitou a galera, que retribuiu calorosamente, na abertura do show das bandas NX Zero e Gloria, em Santos

Em todos os shows Carol faz um cover de Janis Joplin, principal

influência da vocalista

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A orla da praia de Santos é um mes-clado de arranha-céus modernos, luxu-osos e exuberantes, com edifícios anti-gos, tortos e residenciais. Dentre esses mais velhos, está o prédio Astro. Uma construção com 14 andares, com arqui-tetura ímpar e corredores com vista pa-norâmica para o Atlântico.

Quem nunca olhou para as janelas dos apartamentos e tentou imaginar o que acontece neles? Pois é, um des-ses apartamentos já presenciou muitas histórias e muita “sonzeira”. É o lar da Dona Rosita, mãe do guitarrista e com-positor santista Mauro Hector.

Foi nesse lugar que tudo começou. Desde a sua adolescência, o músico pro-duziu, compôs, improvisou e tocou com sua primeira banda, “Os Druidas” – que existe até hoje.

Dona Rosita se acostumou rápido com o entra e sai do pessoal da banda. “Minha mãe via um pessoal cabeludo chegando e já sabia que ia rolar um ba-rulho”. Talvez, para a época, muitos pais poderiam não ter apoiado a escolha de um filho que queria ser guitarrista, mas a família de Mauro sempre o apoiou.

Hoje em dia o músico é casado e não mora mais com a mãe, mas ainda utiliza o apartamento para receber seus alunos e estudar música com mais tranquilidade.

Mas de onde surgiu a ideia de to-car guitarra?

Depois de entrar por engano em uma sala de cinema do antigo cine Roxy e assistir ao filme AC/DC: Let There Be Rock, Mauro resolveu que esse seria seu caminho. “Foi naquele dia que eu gostei de rock e quis ser guitarrista”.

Artista

Por carolina Yasuda

Com vocês...

MAURO HECTOR!Foto: CAROLINA YASUDA

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Durante sua trajetória, o músico escolheu o rock, o blues e o jazz para trabalhar. Lançou quatro CDs, tocou em diversos palcos brasileiros, gra-vou vídeos em Los Angeles, nos Esta-dos Unidos, e criou, aos poucos, uma rotina intensa, incluindo o “trampo” de professor de guitarra.

“A vida artística é meio complicada e incerta, mas graças a Deus foi tudo bem”. Mauro vive de música, respira música e todos os dias tem atividades que envolvem essa arte.

Durante a semana, costuma reser-var algumas manhãs para estudo e en-saios. As tardes e noites são para dar aulas de guitarra.

Nos finais de semana, além das au-las nas manhãs de sábado, as tardes e noites são para tocar em lugares di-ferentes, de acordo com sua agenda mensal. Mas, e a família? “Bom, a gen-te vai se encaixando. Minha esposa,

Ana Sierra, me apoia e fica responsável pelo equilíbrio entre trabalho e lazer”, brinca o guitarrista.

Essa vida corrida foi inevitável para construir seu espaço no meio musi-cal. Como Mauro dá aulas desde os 15 anos, está um pouco mais acostuma-do, mas nem sempre as coisas foram fáceis. “A profissão de músico, assim como as outras, exige bastante disci-plina, dedicação e estudo. Músico não para de estudar”.

Fora as suas responsabilidades pro-fissionais, o guitarrista percebeu al-guns problemas durante esses 30 anos de carreira. “Existe uma falta de res-peito com música na cena nacional. Os próprios instrumentistas não se valori-zam e isso se reflete no público. Muita gente prefere pagar 600 reais para ver um guitarrista gringo do que pagar 20 reais para ir ao show de um brasileiro. isso atrapalha muito.”

Essa desvalorização gera um desa-bafo. “No Brasil, temos um dos melho-res guitarristas do mundo, Heraldo do Monte. Também temos Hélio Delmiro, que é um gênio, e aqui em Santos, te-mos o Alexandre Birkett. Quais desses as pessoas conhecem?”

Um conselho que Mauro dá para quem quer ser guitarrista profissional é se acostumar a fre-quentar shows. “Quer ser presti-giado? prestigie.”

Apesar de reconhecer que é um músico privilegiado pela presença constante de seu público em sho-ws e workshops, ele também avalia que, na Baixada Santista, muitas coisas poderiam ser diferentes. “Por aqui temos muitas bandas de rock e pop que são boas, mas acho que ain-da faltam espaços para tocar. Isso mudaria a cultura das cidades e in-centivaria novos projetos”.

Atitude Blues2007 (Independente)

Blues From Earth 2000 (Demo)

Mauro Hector 2000 (Demo)

Sonoridades2002 (Independente)

MAIS RECENTE

Retratos2011 (Independente)

Foto: CAROLINA YASUDA

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TÉCNICAS E GUITARRICES

Para a maioria dos músicos, chegar ao pon-to de improvisar numa canção talvez seja uma das conquistas mais complexas de estudo do instrumento. Para Mauro Hector, essa habili-dade sempre fez parte do seu som. “Gosto pra caramba de improvisar. No começo, a gente não conseguia tocar como as músicas esta-vam gravadas nos discos, então improvisava. Lógico que depois estudei técnica, escalas e tudo mais.”

Para finalizar, Mauro Hector dá algumas

dicas diferentes para quem quer se arriscar na área musical. Ele não só fala sobre estudo e interpretação da arte, mas coloca pontos de caráter individual como itens indispensáveis para ser um bom guitarrista.

“Primeiro, o cara tem de ser legal. Assim como nas outras profissões, não acho que um bom guitarrista vai passar por cima dos outros ou tentar se promover de uma forma inadequa-da. Depois, ele tem de ser humilde, criativo, sen-sível e, acima de tudo, comprometido. Quando o músico é comprometido com os estudos, seu público e sua arte, tudo flui.”

Foto: THIAGO COSTA

Artista

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Uma coisa que não se pode dizer de Isa-bel Ortega é que ela passa despercebida.

pequena – não tem mais que 1,55m. Ela pode parecer frágil, mas seu olhar firme e a entonação da voz mostram uma altivez inesperada.

Sua postura é firme e correta, quase como a de uma pessoa que por anos dançou balé e sabe da impor-tância de andar com as costas retas e olhar firme para a frente.

Pode ser confundida com uma des-sas avós mais modernas, que se recusam a ficar em casa tricotando e se vestem com roupas elegantes, porém sóbrias e se divertem com o que ainda lhes des-perta o interesse.

Os cabelos pintados de vermelho lu-tam contra os fios brancos que insistem em se fazer notar e contrastam com os olhos azuis que não perdem o brilho.

“O teatro me mantém viva e jo-vem. É quase como uma fonte da ju-ventude” diz com orgulho, enquanto conta sua trajetória.

Mesmo fora da cena teatral, perce-be-se que ela não abandona a postura teatral. Seus gestos, suspiros, olhares e falas são pontuados, pausados, quase que ensaiados, mas apresentados de modo que não pareçam artificiais.

vivendo na Espanha atualmente, Isabel adora usar um ou outro termo em espanhol e realmente me põe em dúvi-da se é um costume comum ou apenas uma forma de enfeitar sua fala e criar uma aura de glamour.

“Holá Matheus, como estás?” é como ela normalmente me cumprimen-ta, com um sorriso que exibe os dentes um pouco amarelados pelos anos do ví-cio em cigarro.

Se precisasse dizer uma palavra para definí-la, acho que seria elegância. Sim,

essa é uma palavra que posso atribuir a ela com certeza. Nos dias em que passa-mos juntos, sempre notei como ela era discreta – pelo menos no que tange a seu vestuário – e sempre combinava as pe-ças com os adereços. Lenços e echarpes europeias com terninhos claros que sem-pre realçam seus olhos, dos quais ela faz questão de falar e exibir. Outras pessoas, como alguns técnicos que trabalham di-retamente com ela, já usariam outros ter-mos como arrogante, mas isso dito “em off”, longe dos ouvidos atentos dela.

Isabel é muito bem relacionada com grandes personalidades e mesmo que alguns digam que “ela ainda vive mui-to de aparência”, é inegável que é uma pessoa influente. “Esses olhos já viram muitos países e muitos palcos diferen-tes” diz sorrindo e piscando um pouco mais que o necessário.

Pouco fala de sua origem riopreten-se, não por vergonha ou vaidade, mas percebe-se que sua vida gira em torno da Europa e dos festivais de teatro por onde circula, ora como curadora, ora como convidada ou palestrante.

Com um pouco de insistência, ela conta sua origem artística e deixa seus olhos marejarem ao falar do início da sua carreira na década de 1970, e como foi premiada como atriz revelação, com a peça A Exceção e a Regra, de Bertold Brecht. “Em plena ditadura, ganhei o prêmio Governador do Estado e, com isso, recebi uma bolsa para estudar mú-sica. Foi algo que ajudou a alavancar mi-nha carreira”, diz.

A bolsa de música era o prêmio co-mum dado na época e não necessaria-mente era desejado por todos. Para Isa-bel, teve pouca utilidade prática, porém a colocou em contato com outras pesso-as do meio artístico e cultural, o que re-

sultou em outro convite. Como era filha de pais espanhóis, foi convidada pelo Consulado Espanhol para concorrer a uma bolsa na Real Escola Superior de Teatro e Ópera Oficial da Espanha. Esse convite surgiu devido ao fato de já ter feito Macunaíma no teatro e, também, por estar se tornando um nome conhe-cido no teatro nacional.

“Fui para lá, e achei que fosse ficar só o tempo que durasse o curso, mas sur-giu um convite do diretor para que eu me tornasse sua assistente. Aceitei e fui ficando na Espanha”.

Nessa época, já era casada e mãe de dois filhos. Casou cedo, aos 18 anos, e veio de uma família tão humilde quan-to grande. Tendo outros dez irmãos, foi criada sem qualquer influência artística e, também, sem o apoio dos pais, que eram trabalhadores rurais. Sua voz falha um pouco – mais uma vez quase como se estivesse atuando para acentuar a sensação de tristeza

Perfil

UMA VIDA DEDICADA AO TEATRO

ISABEL ORTEGA

“O teatro me mantém

viva e jovem. É quase como uma fonte da

juventude”

Por MaTheus J. Maria

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– ao contar que nunca teve apoio de sua família e que nenhum de seus fa-miliares chegou a vê-la atuar.

Isabel foi uma das idealizadoras do festival Mirada – o Festival ibero--americano de Artes Cênicas -, quando conheceu o diretor regional do Sesc São Paulo em Cádiz (Espanha), mas não é muito bem vista pelos outros organiza-dores. Sabendo dessa situação delicada e por vezes desconfortável para os que trabalham próximos a ela e aos demais organizadores, ela sempre faz questão de reforçar sua posição e autoridade, por vezes de forma discreta e por vezes de forma incisiva, recitando a lista de contatos e conhecidos que ela tem.

Para Sérgio Luis Oliveira, um dos coordenadores do Mirada, “ela é uma figura a ser isolada pouco a pouco”, alguém que usa de suas relações para manter-se em uma posição de status. E de fato ela gosta de sempre frisar que é uma das criadoras desse festival e que certas coisas “podem acontecer ou não,

dependendo da minha permissão”, fala essa que suscita alguns risos contidos e olhares de desaprovação a sua volta.

Sentada em sua mesa e isolada das demais pessoas que trabalham na orga-nização do Mirada 2014, ela passa o dia entre telefonemas para seus amigos e convidados internacionais que, segun-do ela, precisam estar aqui. A cada in-tervenção realizada por ela em alguma lista de convites já feita ou discussão em andamento, o sorriso de aquiescên-cia é seguido por um rolar de olhos das pessoas envolvidas.

“Deixa ela falar e achar que faz e depois fazemos o que realmente temos que fazer”, essa é a orientação mais co-mum dada pela coordenação do evento a todos que entram na sala e a conhe-cem pela primeira vez. Esse tipo de co-mentário e piadas ditas em tom baixo, longe dos ouvidos atentos de Isabel, são comuns e por diversos momentos criam um ar de constrangimento em que todos são obrigados a atuar para

não transparecer o que realmente está acontecendo.

Pergunto-me se ela realmente per-cebe a situação que a cerca, o descon-forto com algumas decisões que ela toma à revelia da organização ou se ela percebe, mas apenas não se importa.

Isabel é tão atriz que talvez esse ar alheio seja apenas uma encenação, uma peça pela qual ela conduz as pes-soas à sua volta sem que elas se deem conta de que estão sendo manipula-das. Mas talvez o ego dela que, embora permaneça domado na maior parte do tempo, a cegue para o que realmente acontece ao redor.

Seja como for, uma coisa que não se pode negar é que Isabel Ortega encara o mundo e a vida como um grande espe-táculo onde ela sempre precisa atuar da melhor forma e, se possível, ser a estrela.

Afinal de contas, como ela sempre me dizia “O show só acaba quando a luz apaga e a cortina fecha. Até lá, não po-demos parar de dar o nosso melhor”.

Foto: ARQuivO pESSOAL

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Três autoras, três estilos literários diferentes. vamos contar essa história? As amigas Wilma Terezinha Fernandes de Andrade, Graziella Tognetti e Maria Zilda da Cruz resolveram unir suas ex-periências e fantasias para encantar os leitores em um livro.

O início do livro Um, dois, três... vamos Contar Histórias foi há dois anos e o in-centivo foi aproximar as velhas amigas de faculdade e, no futuro, mostrar tudo para os netos.

A ideia surgiu através de uma li-gação telefônica na qual Maria Zilda convidou Graziela a escrever o livro. Depois, para completar a equipe, cha-maram a amiga Wilma, que se surpre-endeu e adorou a ideia.

Estão registradas em 232 páginas edi-tadas pela Comunicar, histórias que atra-

vessam gerações, mescladas com a expe-riência, aprendizado e uma “pitadinha” de ficção. Com mais de 60 anos, as escritoras nos levam à reflexão por meio de narrati-vas, poesias, contos e crônicas.

O leitor viaja por guerras, conhece grandes personagens, entre escritores e trabalhadores comuns, e também sobre animais de estimação. Além de entender aquelas histórias de mãe para filha e pen-sar sobre acontecimentos vividos no dia a dia. Tudo com muito bom humor.

Escrita em dois países, Brasil e Itália, a obra foi montada pela internet, via Skype, e mesmo a distância foi superada com muita dedicação.

Wilma Therezinha é nascida em San-tos, formada em História e Geografia pela Pontifícia Universidade de São Pau-lo (PUC), mestre e doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Já foi professora por mais de 40 anos e é escritora premiada. Teve a opor-tunidade de resgatar no livro o primeiro texto de sua carreira, escrito aos 17 anos. “Me sinto muito feliz e realizada em po-der reviver e publicar o meu primeiro tex-to no nosso livro”.

Já Maria Zilda não nasceu em Santos, mas cresceu na cidade. Concluiu Pedago-gia e História na Universidade Católica de Santos (Unisantos) e é mestra e dou-

tora em psicologia também pela USP. Já lecionou em universidades e hoje escreve por hobby. Ela preenche o livro com poe-sias, e garante que a inspiração pode vir de onde menos se espera. “É uma coisa que nasce de dentro de você, não dá para explicar”, contou sorrindo. Zilda escreve sobre o cotidiano, mas a sua predileção é detalhar a natureza.

E além de escrever poesias, conta que cuidou de toda a parte gráfica do livro. “Não foi tão difícil, a tecnologia me ajudou bastante. Foi um jogo de aprendizagem”.

E as ilustrações? A italiana Graziella Tognetti, que veio da Itália recentemen-te, adotou o Brasil como seu segundo lar. Formada em Ciências Econômicas e Co-merciais pela Unisantos, especializou-se em Sociologia Educacional em Santo An-dré e em Economia na Itália. Inspirou-se nas obras das amigas e nos fatos que re-tratou no livro, para criar as imagens que dão vida à história. “Leio uma ou duas vezes cada texto e pronto. A imaginação vem. Adoro desenhar”.

Para quem quer adquirir o livro, é possí-vel encontrá-lo na Papelaria Organização, em Santos e nas, nas livrarias Realejo e Loyo-la, também em Santos, por R$ 39,00. Se você pensa que acabou por aí, não! As autoras dis-seram que é só o começo, e que pretendem continuar a escrever novos livros.

Leitura

UM, DOIS, TRêS...um livro E três autoras. as amigas quE, juntas, são pura cultura, artE E sabEdoria

Foto: YONNY FURUKAWA

Por YonnY FuruKaWa

As três autoras exibem com orgulho o livro que criaram pensando nos netos e tque também ajudou a se reaproximarem

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