revista viração - edição nº 67 - dezembro/2010

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Que Ensino Médio queremos? O Brasil possui mais de 8 milhões de estudantes cursando o antigo 2º grau. Saiba quais são os desafios e as perspectivas para a educação.

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Page 1: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

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Page 2: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Sexo e Saúde

Associação Imagem ComunitáriaBelo Horizonte (MG)

Universidade Popular Belém (PA)

Rede Sou de Atitude MaranhãoSão Luís (MA)

Centro Cultural Bájò Ayò João Pessoa (PB)

Avalanche MissõesUrbanas Underground

Vitória (ES)

Casa da Juventude Pe. BurnierGoiânia (GO)

Centro de Refererência Integralde Adolescentes

Salvador (BA)

Cipó Comunicação InterativaSalvador (BA)

Jornal O Cidadão

Rio de Janeiro (RJ)

Movimento de Intercâmbiode Adolescentes de Lavras

Lavras (MG)

Bemfam - Recife (PE)

Gira Solidário Campo Grande (MS)

Instituto de Estudos SocioeconômicosBrasília (DF)

Ciranda – Curitiba (PR) Central de Notícias dos Direitos da

Infância e Adolescência Catavento Comunicação e Educação

Fortaleza (CE)

Agência FototecNatal (RN)

Projeto Juventude, Educaçãoe Comunicação Alternativa

Maceió (AL)

Centro Cultural Escrava Anastácia

Florianópolis (SC)

União da Juventude SocialistaRio Branco (AC)

Grupo Cultural Entreface (DiversidadeJuvenil, Comunicação e Cidadania)

Belo Horizonte (MG)Grupo Makunaima

Protagonismo Juvenil (RR)

Taba - Campinas (SP)

Veja quem faz a Vira

pelo Brasil

2a capa_apoios_67:Layout 1 29/11/2010 00:40 Page 33

Page 3: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Apoio Institucional

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 03

Copie sem moderação!

Você pode:

• Copiar e distribuir• Criar obras derivadas

Basta dar o crédito para a Vira!

Conteúdo

‘O lugar onde se faz amigos / não se trata só de prédios,

salas, quadros /programas, horários, conceitos... / Escola é,

sobretudo, gente / gente que trabalha, que estuda / que se alegra, se

conhece, se estima. / O diretor é gente / O coordenador é gente, o professor

é gente / o aluno é gente / cada funcionário é gente. / E a escola será cada vez

melhor / na medida em que cada um / se comporte como colega, amigo, irmão. /

Nada de ‘ilha cercada de gente por todos os lados’. / Nada de conviver com as

pessoas e depois descobrir / que não tem amizade a ninguém / nada de ser como o

tijolo que forma a parede / indiferente, frio, só. / Importante na escola não é só

estudar, não é só trabalhar / é também criar laços de amizade / é criar ambiente de

camaradagem / é conviver, é se ‘amarrar nela’! / Ora , é lógico... / numa escola assim

vai ser fácil / estudar, trabalhar, crescer / fazer amigos, educar-se / ser feliz.’

Esse poema de Paulo Freire, grande inspiração para a Vira, tem tudo a ver com o

tema deste especial: o Ensino Médio. Convidamos você a refletir conosco sobre como

tornar melhor esse período tão importante em nossas vidas.

Para proporcionar essa conversa, trazemos reportagens sobre as diferentes

realidades da educação no Brasil, pegando emprestado o tema de uma

importante pesquisa desenvolvida pela ONG Ação Educativa em 2008,

chamada “O Ensino Médio que queremos”. Pedimos à socióloga Ana

Paula Corti, que coordenou o levantamento, para que nos

ajudasse a pensar nas principais pautas relacionadas

ao tema. Valeu, Ana! Valeu Virajovens!

Boa leitura!

AViração é um uma organização nãogovernamental (ONG), de educomunicação,

sem fins lucrativos, criada em março de 2003.Recebe apoio institucional do Fundo das NaçõesUnidas para a Infância (UNICEF), da Organizaçãodas Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), do Núcleo deComunicação e Educação da Universidade deSão Paulo e da Agência de Notícias dos Direitosda Infância (Andi). Além de produzir a revista,oferece cursos e oficinas de capacitação emcomunicação popular feita para jovens, porjovens e com jovens em escolas, grupos e comunidades em todo o Brasil.

Para a produção da revista impressa e eletrônica (www.viracao.org),contamos coma participação dos conselhos editoriais jovensde 22 Estados, que reúnem representantes deescolas públicas e particulares, projetos emovimentos sociais. Entre os prêmiosconquistados nesses seis anos, estão PrêmioDon Mario Pasini Comunicatore, em Roma(Itália), o Prêmio Cidadania Mundial, concedidopela Comunidade Bahá'í. E mais: no ranking daAndi, a Viração é a primeira entre as revistasvoltadas para jovens. Participe você tambémdesse projeto. Veja, ao lado, nossos contatosnos Estados.

Paulo Pereira de lima Coordenador Executivo da Viração – MTB 27.300

Conheça os Virajovens em 22 Estados brasileirose no distrito FederalBelém (PA) - [email protected]

Belo Horizonte (MG) - [email protected]

Boa Vista (RR) - [email protected]

Brasília (DF) - [email protected]

Campinas (SP) - [email protected]

Campo Grande (MS) - [email protected]

Curitiba (PR) - [email protected]

Florianópolis (SC) - [email protected]

Fortaleza (CE) - [email protected]

Goiânia (GO) - [email protected]

João Pessoa (PB) - [email protected]

Lavras (MG) - [email protected]

Maceió (AL) - [email protected]

Manaus (AM) - [email protected]

Natal (RN) - [email protected]

Porto Velho (RO) - [email protected]

Recife (PE) - [email protected]

Rio Branco (AC) - [email protected]

Rio de Janeiro (RJ) - [email protected]

Sabará (MG) - [email protected]

Salvador (BA) - [email protected]

S. Gabriel da Cachoeira - [email protected]

São Luís (MA) - [email protected]

São Paulo (SP) - [email protected]

Serra do Navio (AP) - [email protected]

Teresina (PI) - [email protected]

Vitória (ES) – [email protected]

Quem somos

Rua Augusta, 1239 - conj. 11 - Consolação

01305-100 - São Paulo - SP

Tel./Fax: (11) 3237-4091 / 3567-8687

HoRáRio dE atEndimEnto

Das 9h às 13h e das 14h às 18h

E-mail da REdação E assinatuRa

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atendimento ao leitor

A Revista Viração é publicada

mensalmente em São Paulo (SP) pela

ONG Viração Educomunicação, filiada

ao Sindicato das Empresas

Proprietárias de Jornais

e Revistas de São Paulo (Sindjore);

CNPJ: 11.228.471/0001-78;

Inscrição Municipal: 3.975.955-5

Escola é...

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Page 4: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

22Sempre na ViraManda Vê. . . . . . . . . . . . . . 06De Olho no ECA . . . . . . . . . 10PCU (Plataforma dos Centros Urbanos)28Que Figura! . . . . . . . . . . . . 32No Escurinho . . . . . . . . . . . 33Parada Social . . . . . . . . . . . 34Rap Dez . . . . . . . . . . . . . . . 35

Conselho EditorialEugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Izabel Leão,Immaculada Lopez, João Pedro Baresi, Mara

Luquet e Valdênia Paulino

Conselho FiscalEveraldo Oliveira, Renata Rosa e Rodrigo Bandeira

Conselho ConsultivoDouglas Lima, Isabel Santos,Ismar de Oliveira e Izabel Leão

Presidente

Juliana Rocha Barroso

Vice-Presidente

Cristina Paloschi Uchôa

Primeiro-Secretário

Eduardo Peterle Nascimento

Direção ExecutivaPaulo Lima e Lilian Romão

EquipeAna Paula Marques, Carol Lemos, ElisangelaNunes, Eric Silva, Gisella Hiche, Luciano deSálua, Manuela Ribeiro, Maria Rehder, RafaelLira, Rafael Stemberg, Sâmia Pereira, SoniaRegina, Vânia Correia e Vivian Ragazzi

Administração/Assinaturas

Douglas Ramos e Norma Cinara Lemos

Mobilizadores da ViraAcre (Leonardo Nora), Alagoas (Jhonathan Pino),Amapá (Camilo de Almeida Mota), Amazonas(Cláudia Ferraz e Délio Alves), Bahia (NiltonLopes), Ceará (Amanda Nogueira e Rones Maciel),Distrito Federal (Ionara Silva), Espírito Santo(Filipe Borges, Jéssica Delcarro, Leandra Barros eWanderson Araújo), Goiás (Érika Pereira e SheilaManço), Maranhão (Sidnei Costa), Mato Grosso

do Sul (Fernanda Pereira), Minas Gerais (Maria deFátima Ribeiro e Pablo Abranches), Pará (AlexPamplona), Paraíba (Niedja Ribeiro), Paraná(Juliana Cordeiro), Pernambuco (Maria CamilaFlorêncio), Piauí (Anderson Ramos da Luz),

Rio de Janeiro (Gizele Martins), Rio Grande do

Norte (Alessandro Muniz), Rondônia (LucianoHenrique da Costa), Roraima (CleidioniceGonçalves), Santa Catarina (Celina Sales e Ciro Tavares) e São Paulo (Dam iso Faustino,Luciano de Sálua, Sâmia Pereira, SimoneNascimento e Virgílio Paulo).

ColaboradoresAna Paula Corti, Antônio Martins, Diego Pereira dos Santos, Emilia Merlini, HeloísaSato, Lentini, Karina Lakerbai, Márcio Baraldi,

Natália Forcat, Novaes e Sérgio Rizzo.

Consultor de Marketing

Thomas Steward

Projeto GráficoAna Paula Marques e Cristina Sayuri

Jornalista ResponsávelPaulo Pereira Lima – MTB 27.300

Divulgação

Equipe Viração

E-mail Redação e [email protected]@viracao.org

Preço da assinatura anualAssinatura Nova R$ 58,00Renovação R$ 48,00De colaboração R$ 70,00Exterior US$ 75,00

RG VÁLIDO EM TODO TERRITÓRIO NACIONAL

Formação integralAlém das matérias previstas no currículo, escolastrabalham temas considerados “transversais”, comosexualidade, meio ambiente e ética

23 Jovens especialistas Ensino técnico dá bases para quem quer aprender umaprofissão; estudantes discutem prós e contras

24 Democratizando o ensinoA socióloga Helena Singer falou sobre experiências

relacionadas à educação democrática. Aproveitamos

e batemos um papo também com o português José

Pacheco, da Escola da Ponte. Confira!

8 Nova legislaçãoÉ de lei: Ensino Médio agora é obrigatório. Antes, obrigaçãodo governo se estendia somente até o Ensino Fundamental

18 Inovação na escolaProjeto do governo federal incentiva Estados a reformular a educação, baseando-se nas escolhas e autonomia dos estudantes

12 Apostila polêmicaCaderno do Aluno, apostila proposta pelo governo de

São Paulo como complementar ao ensino, gera insatisfação

entre estudantes

27 Bullying em vídeoIniciativa da ONG mineira Entreface, vídeo produzido poradolescentes e jovens traz opiniões sobre ofensas físicas everbais nas escolas

14 Para todos, não para algunsAcessibilidade não é opção; escolas buscam adaptarsuas dependências para torná-las acessíveis paratodos, alunos com e sem deficiência 16 Escola educomunicativaViração forma núcleos de comunicação e mobilização jovem

em escolas públicas de São Paulo, Pará e Ceará

30 Tradição em sala de aulaEncontro em Mato Grosso do Sul aborda umaeducação indígena que promova aprendizado sobrecultura e costumes do povo guarani

04 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

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Page 5: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

A Vira pela igualdade. Diga lá. Todas e todos Mudança, Atitude e Ousadia jovem.

Diga lá

Ponto GPara garantir a igualdade entre

os gêneros na linguagem da Vira,

onde se lê “o jovem” ou “os

jovens”, leia-se também “a jovem”

ou “as jovens”, assim como outros

substantivos com variação de

masculino e feminino.

Fale com a gente!

Eêêê! O beijo foiencaminhado, Lara!Também curtimos

muito ter feitoessa entrevista.

Mande�seus�comentários�sobre�a�Vira,dizendo�o�que�achou�de�nossasreportagens�e�seções.�Suas�sugestõessão�bem-vindas!Escreva�para�nosso�endereço:�RuaAugusta,�1239�-�Conj.�11Consolação�-�0135-100�-�São�Paulo�(SP)ou�para�o�e-mail:�[email protected]�sua�colaboração!

Parceiros�de�Conteúdo

Mande um e-mail [email protected]... Por láexplicaremos como você pode

fazer parte dessa turma!

Está dadoo recado!

@marcelolirio,via�Twitter�

@viracao Eu quero fazerparte! Como faço?

Siga a Vira no Twitter!

Nosso perfil é

http://twitter.com/viracao

@bolaearte,�via�Twitter�Iniciativa muito importante!!

Divulguem!!! http://digi.to/tY5tE DiaNacional de Luta Contra a Elitização

do Futebol Brasileiro

Lara�Dee,�por�e-mail,de�São�Paulo�(SP)

Oi jovens da Viração!

Aqui é Lara Dee, do Instituto Beleza &Cidadania. Recebi a revista de setembro(nº 65) e quero dar um beijo enorme em

todos que fizeram a minha entrevista(Galera Repórter). Adoreiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!

Continuem assim!

Esta�edição�da�Vira�contou�com�um

atrativo�"especial".�Todos�os

desenhos�que�você�confere�ao�longo

das�36�páginas�foram�feitos�por

Manuela�Ribeiro,�nossa�super

estagiária�de�Arte.�Ela�contou�com

Ana�Paula�Marques,�designer�da

revista,�pra�criar�os�cenários�fofos

por�onde�passeiam�os�personagens.

Esperamos�que�vocês�gostem.

Obrigado,�meninas!�=)

Rodolfo,�Maria�Cláudia�eMariana,�por�e-mail,�de�São�Paulo�(SP)�

Nós do CEU Caminho do Mar gostaríamos deagradecer imensamente a matéria sobre o Projeto

"Balaio Cultural" (edição nº 65). Muito nos honrou serpauta da série de reportagens feitas pelos adolescentes

da PCU. Gostaríamos de sugerir também um outro projetopara vocês conhecerem, o "Sarau Literário", criado por um

morador daqui da comunidade do Jabaquara (SP), e quereúne desde grandes poetas e escritores até jovens

talentos da arte literária, sempre no últimodomingo de cada mês.

Abraços e mais uma vez obrigado.

Legal! Fica a dicapara os nossos leitorescolocarem na agendado final de semana.

diga_la_67:Layout 1 1/12/2010 15:23 Page 5

Page 6: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Manda Vê

* Integrantes de Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal([email protected] e [email protected])

06 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Qual o Ensino Médio que você deseja?

João Paulo Pucinellei,20 anos, Caldas Novas (GO)

“Acredito que o Ensino Médio temque ser um lugar que dá conta degarantir aos jovens uma leitura domundo, apontando horizontes epotencializando a elaboração

de projeto de vida”.

Izabella Mantovani,16 anos, Campinas (SP)

“Professores mais competentes.Uma melhor qualidade naeducação, tanto na escola

(estrutura) quanto noslivros didáticos”.

Luana Gonçalves,17 anos, Campinas, (SP)

“Melhores professores,que dão mais atenção

aos alunos, e salasadequadas”.

Qual a receita para tornar a escola um espaço maisagradável entre os que a frequentam? Essa resposta, comcerteza, todos (estudantes, educadores, governos esociedade civil) gostariam de tê-la. Em todo o mundo, éconsenso que a educação é uma questão fundamentalpara o desenvolvimento de uma sociedade. Masinfelizmente, alcançar um nível educacional de qualidadetem sido uma tarefa difícil para os governos e gestores deeducação. Principalmente no que diz respeito ao EnsinoMédio, fase escolar que pode ser compreendida dediferentes maneiras.

Alguns o tem como a ponte para a entrada nauniversidade e, consequentemente, a conquista de um bomcargo profissional no futuro. Essa visão faz com que escolas,

públicas e privadas, preparem o aluno para apenas um fimespecífico: passar nos vestibulares mais concorridos do País.E tentam, a todo custo, garantir o máximo de seus alunosentre os primeiros na lista de egressos de cursos comoMedicina e Engenharia. Já outras pessoas encaram o EnsinoMédio como a oportunidade de ampliar a formação cidadãdo estudante, valorizando suas habilidades e incentivando abusca pela descoberta do novo.

Mas esses são apenas dois formatos de ensino no qual ojovem precisará escolher ao avançar a educaçãoFundamental. E para entender melhor o que a moçada pensasobre o Ensino Médio, os Conselhos Jovens da Vira Campinas(SP) e Goiânia (GO) foram ouvir a opinião de algunsestudantes sobre o assunto, que você confere a seguir.

Mayara Mantovani, do Virajovem Campinas (SP)*, e Érika Pereira, do Virajovem Goiânia (GO)*

Janis de Oliveira,18 anos, Campinas (SP)

“Queria que tivesse um preparomais forte para o vestibular e para

o Enem (Exame Nacional doEnsino Médio). E que o esporte

estivesse mais presentenas escolas”.

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Page 7: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Que Ensino Médio Queremos?

(vários autores) Ação Educativa

Essa publicação foi o relatório final do projeto JovensAgentes pelo Direito à Educação (Jade) e traz osplanos de ações para as políticas públicas de

educação em escolas do Ensino Médio, a partir de umapesquisa realizada entre estudantes, professores e

funcionários de escolas públicas, integrantes dacomunidade, agentes governamentais e da sociedadecivil. Dividido em duas partes, a primeira apresenta umperfil dos 880 alunos que participaram da pesquisa deopinião, mostrando suas visões e perspectivas sobre oEnsino Médio. Na etapa seguinte, a comunidadeescolar de cinco instituições públicas de ensino de SãoPaulo (SP) foram convidadas para discutir o EnsinoMédio ideal. O livro pode ser baixado gratuitamenteno site da Ação Educativa: http://tinyurl.com/27z2qrb

Vanilson Farias, 16anos, Senador Canedo (GO)

“Quero um Ensino Médio queaproxima o aluno da escola, comaulas menos chatas, divertidas,

usando ferramentas como a músicapara deixá-las mais alegres

e interessantes”.

Michelly BezerraGuedes, 15 anos,

Goiânia (GO)

“O Ensino Médio que querodeveria ser aquele que nosajuda a ter uma base para

a vida profissional”.

Baixa qualidade

Divulgado no início de novembro de2010, o relatório do Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH) para 2010coloca o Brasil na 73ª posição, em um total

de 169 países. Realizado pelo Programa dasNações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), odocumento aponta a educação de baixa qualidade comoum dos principais problemas do País. Segundo o IDH, aescolaridade média do brasileiro é de 7,2 anos deestudo, e a expectativa de vida escolar é de 13,8 anos.Como neste ano o PNUD adotou novos critérios deavaliação, não é possível fazer uma comparação com osanos anteriores. Na nova metodologia, por exemplo, nãobasta apenas as crianças e os jovens estaremmatriculados na escola, mas eles precisam estar nasséries adequadas às suas idades. Apesar disso, o Brasilainda configura entre os países de alto desenvolvimentohumano, como em 2009.

FazParte

Thais Pereira dosSantos, 17 anos,

Goiânia (GO)

“Eu quero um Ensino Médio que meprepare para a universidade pública.E que não haja discriminação entre

os alunos de ensino públicoe privado”.

Raissa KatiaRodrigues, 19 anos,

Campinas (SP)

“Professores que ensinemcom mais dedicação e

que respeitem maisos alunos”.

WellingtonFernandes, 17 anos,

Campinas (SP)

“Que os professores seinteressem em dar matéria e

que sejam mais focadosno assunto”.

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Page 8: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Governo tem que garantir educação gratuita até o Ensino Médio; proposta foi aprovada em 2009

Fernanda Garcia e Jefferson Baicere, do Virajovem Campo Grande (MS)*

08 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Este ano vai ficar marcado por muitas mudanças importantes na

educação brasileira. Foi o ano de aprovação da Proposta de

Emenda Constitucional (PEC) que prevê responsabilidade para o

governo em oferecer instituições de ensino gratuitas até o término do

Ensino Médio. Antes, essa obrigação se estendia somente até o

Ensino Fundamental.

O Senado Federal aprovou a proposta (Lei 12.061/09)

por unanimidade e garante, inclusive, a oferta gratuita

para todos os que não tiveram acesso ao ensino

na idade apropriada. Ou seja, agora o

governo tem a obrigação de fornecer

educação de qualidade para os

adolescentes até os 17 anos. O prazo

segue até 2016, nos termos do Plano

Nacional de Educação, com apoio

técnico e financeiro da União, mas

espera-se que as autoridades políticas

comecem a trabalhar logo.

Após essa alteração, meninos e

meninas devem ter garantido o direito de se

matricular aos quatro anos de idade e

permanecerem na escola até

os 17 anos, pelo

menos. Conforme

dados do

Ministério da

V

Agora é lei

Educação, cerca de 10 milhões de adolescentes estão

com idade entre 15 e 17 anos, porém só a metade está

cursando o Ensino Médio. Os outros saíram da escola

ou continuam no Ensino Fundamental.

A ampliação dos anos de escolaridade está em

sintonia com as metas do movimento Todos Pela

Educação. De acordo com a proposta, a distribuição dos

recursos públicos tem como prioridade o atendimento

das necessidades do ensino obrigatório. Sendo assim,

estão inclusas a universalização, garantia de padrão de

qualidade e equidade, nos termos do Plano Nacional

de Educação.

Investir na Educação para o futuroO Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revela que uma criança

com acesso à pré-escola tem 32% mais chances de

concluir o Ensino Médio. Dirigentes educacionais, governo

e as escolas devem ficar atentos à Lei de Diretrizes

Básicas (LDB) e nas Diretrizes Curriculares Nacionais do

Ensino Médio, para criarem grades curriculares que

causem interesse e estimulem os jovens.

As finalidades do Ensino Médio

estão previstas no artigo 35 da LDB. Os

estudos devem ser voltados para

consolidar e aprofundar os

conhecimentos adquiridos no Ensino

Fundamental, possibilitando o

prosseguimento de estudos; fornecer

preparação básica para o trabalho e a

cidadania; aprimorar o estudante como

pessoa, incluindo a formação ética e o

desenvolvimento da autonomia

intelectual e do pensamento crítico;

preparar o aluno para compreender os

fundamentos científico-tecnológicos dos

processos produtivos, relacionando a

teoria com a prática.

Integrantes de Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados do

País e no Distrito Federal ([email protected])

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Page 9: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

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Page 10: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

10 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

IvoSousa De olho no ECA

geralmente, consolida-se o exercício de participação e protagonismo:

seja na formação de grêmios estudantis ou mesmo nas inquietações

dos adolescentes no universo da escola ou da própria comunidade; seja

nas insatisfações com um sistema educacional que geralmente é dado

de antemão, sem lugar para a conversa com os jovens. Muitas vezes é

no EM que os adolescentes se organizam para exigir a prioridade na

formulação e execução de políticas públicas (e, naturalmente,

investimentos no orçamento público) que lhes é de direito.

Há certamente uma qualidade de diálogo no Estatuto que é, sem

dúvida, um desafio no universo escolar brasileiro. Para uma pedagogia

dialógica, é indispensável que os estudantes se identifiquem enquanto

sujeitos protagonistas e ativos de suas próprias vidas. O diálogo deve

ser priorizado nas relações entre os adolescentes e os membros de

suas escolas e comunidade (e não apenas aí) — mesmo que aquele

gere tensões e conflitos. Mesmo que perturbe e incomode, o diálogo

deve ser promovido.

À criança e ao adolescente foi reservado um autêntico papel

de protagonismo. E no EM, esse protagonismo pode se maximizar

e atingir significativa potencialidade. Deixemos ressoar os ecos do

ECA: o diálogo e o paradigma de que os adolescentes vivam suas

vidas com liberdade e conscientes de sua condição de sujeitos de

direitos. Não é porque o EM é citado apenas uma vez no Estatuto

que ele não seja considerado apropriadamente. O EM está lá no ECA,

singelamente, entretanto, permeando toda uma filosofia de

protagonismo e participação.

Onde está o Ensino Médio no ECA? O que o ECA menciona sobre o Ensino Médio e quais são suas

reflexões acerca desse período educacional?

Esqueceram-se do Ensino Médio no Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA)? Há quem se

pergunte isso. Apesar de o termo "Ensino Médio"

aparecer uma única vez no texto do Estatuto, isto não quer

dizer que tal período da educação seja desconsiderado, ou

mesmo deixado de lado pela legislação. Em todo o

Estatuto, a exclusiva referência ao EM consta do capítulo

IV, que, entre outras coisas, dispõe sobre o direito à

educação. "Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e

ao adolescente: (...) II - progressiva extensão da

obrigatoriedade e gratuidade ao Ensino Médio; (...)".

A aparição do EM na lei é importante na medida em

que debate uma questão fundamental: a obrigatoriedade e

gratuidade do EM. É indiscutível confirmar a relevância de

um pequenino inciso que, progressivamente, propõe-se a

estender a escolaridade dos adolescentes brasileiros.

Melhor ainda é saber que o que já figurava no ECA foi

ampliado por uma Emenda Constitucional (EC) ano

passado. A EC nº 59/2009 definiu, de fato, a

obrigatoriedade da educação básica (que é a soma da

Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio). Agora, o

Ensino Médio também é obrigatório.

Apesar disso tudo (e olha que é muita coisa), é possível

que a relação principal do EM com o ECA resida em uma

autêntica potencialidade de protagonismo. O EM é um

espaço privilegiado para se pensar o protagonismo juvenil

e, portanto, o próprio paradigma de crianças e

adolescentes enquanto sujeitos de direitos (somado,

também, à proteção integral). É nas escolas de EM que,

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no Distrito Federal ([email protected])

Pedro Couto, do Virajovem Brasília (DF)*

V

eca_67:Layout 1 29/11/2010 00:47 Page 16

Page 11: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Como representar o Ensino Médio? O que ele lembra pra você? Pedimos aos adolescentes e jovens de projetos da Viração que

colocassem suas opiniões e sentimentos no papel sobre esta importante etapa educacional, baseando-se em suas experiências

pessoais. O resultado foi um poema e os dois desenhos que você confere a seguir.

o Ensino Médio pra mim

Soluções?

“O ensino médio não é fácil

mesmo assim temos que encarar

se os alunos não se esforçarem

não vão conseguir conquistar.

Na escola existem muitos problemas

e os professores conhecem esse

dilema.

Os alunos não respeitam o professor

e isso pode causar terror.

A educação não está muito boa

porque falta muito professor.

A melhor coisa a fazer

é estudar para valer.”

VIRARTE

Agatha Morais, de 16 anos, estudante de São Paulo (SP)

Ayrton Rodrigues de Souza, de 16

anos, adolescente comunicador da

Plataforma dos Centros Urbanos

(PCU), de Itaquaquecetuba (SP)

Bruna Constância Nascimento, de 15 anos, adolescente

comunicadora da Plataforma dos Centros Urbanos (PCU),

em São Paulo (SP)

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 11

virarte_67_1:Layout 1 29/11/2010 00:45 Page 11

Page 12: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

12 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Assim que chegaram na rede estadual de ensino de SãoPaulo, em 2008, os “cadernos do aluno” geraramcuriosidade por parte de estudantes e professores. Com

quatro edições por ano (uma por bimestre) e divididos pormatérias, eles trazem textos, gráficos e exercícios do 5º anodo ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio.

Mas rapidamente a curiosidade que a novidade gerou viroumotivo de reclamações. Fazendo uma breve pesquisa noGoogle, dá para achar diversas comunidades e blogs criticandoa iniciativa. O caderno do aluno surgiu um ano depois dolançamento do “caderno do professor”, criado em 2008, comsugestões de metodologias e abordagens em sala de aula.

“Quando vi pela primeira vez, achei o máximo, que ia darum 'up' nas aulas”, conta Marina Lenk Baltazar, de 17 anos, dazona norte de São Paulo. “Pareciam aquelas apostilas de escolaparticular”, lembra a estudante. Mas a alegria durou pouco.“Logo em seguida, vi que não era o que eu pensava, porquenão melhorou a qualidade das aulas, continuava tudo'relaxado'. Alguns professores nem corrigem o que a gente fazno caderno”, comenta Marina. Ela sentiu isso na pele quando a professora pediu aos estudantes para preencherem umcaderno inteiro de Geografia em apenas uma semana. Para darconta da missão, pediu ajuda para a mãe, que acabou fazendoduas páginas da apostila para a filha. A letra materna, bemdiferente da de Marina, não chamou a atenção da professora,que simplesmente “deu um visto” no caderno e 1 ponto a maisna média final da estudante.

Para o vestibulando em História Victor Aquino, de 17 anos,a obrigatoriedade de unificar o currículo e garantir que todosos estudantes de escolas estaduais tenham o mesmo acessoaos conteúdos faz com que os professores “corram” parafinalizar os cadernos, muitas vezes passando as matériasrapidamente, fazendo com que os alunos tenham dificuldadepara fazer os exercícios. Por isso, dificilmente sobra tempopara aprofundar certos tópicos. “Pedi para um professorexplicar um conteúdo de Matemática muito importante para ovestibular, mas que não estava no caderno do aluno. Ele disseque não poderia dar, pois estava fora do programa”, lamentaVictor, que diz achar que os cadernos foram feitos às pressas,sem muito planejamento.

Enquanto alguns acham as apostilas fracas, outrosencontram dificuldade para acompanhar os conteúdos. É o caso

Estudantes reclamam que conteúdo de “Cadernos do Aluno” é fraco e que

professores não estão capacitados para usá-los

Vivian Ragazzi, da Redação

de Michel Ribeiro, de 17 anos. Ele e outros colegas de escolaacham algumas matérias muito difíceis de entender. “Nãoaprendemos um monte de coisas que estão nos cadernos, entãofica complicado recuperar matérias que ficaram para atrás emanos anteriores”, argumenta. Gutierrez de Jesus Silva concorda,mas compreende a origem do problema. “Se tivéssemosestudado com os cadernos do aluno desde a 5ª série,provavelmente estaríamos melhor preparados”.

Para os entrevistados, os professores não estãopreparados para usar os cadernos. “Tem coisas lá que osprofessores nem conhecem”, opina Nayara Lima, de 18 anos.

Outro desafio apontado pelos estudantes é a demora paraa chegada dos cadernos no início dos bimestres. Só no fim denovembro a escola de Michel recebeu os cadernos do 4º

bimestre. “Já estamos com as notas fechadas, o que vaiadiantar agora?”, pergunta.

Segundo informações divulgadas pela Secretaria de Estadoda Educação, o “Caderno do Aluno“ é um materialcomplementar que não substitui o material didático, que deve

Caderno da discórdia

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ser utilizado em conjunto com os materiais destinados aosprofessores.

A Secretaria destacou, em entrevista à Vira, que os professores estão sim preparados para utilizar oscadernos, pois contam com uma apostila paralela à doaluno, o “caderno do professor”. Além disso, o órgãoressalta que “todos os professores aprovados no últimoconcurso estão participando do Curso de FormaçãoEspecífica, oferecido pela Escola Paulista de Formação deProfessores”, com o objetivo de oferecer melhor formaçãoaos professores da rede estadual, e consequentemente,um ensino de melhor qualidade aos alunos. Sobre ademora na chegada das apostilas, a Secretaria disse queprecisa apurar para verificar a veracidade da denúncia, e a partir daí, tomar as medidas cabíveis.

Proposta aceitaEm junho de 2010, a estudante Bruna Sevilhano Silva, de

16 anos, de Guainazes, zona leste de São Paulo, foi delegadana Conferência Municipal de Educação. Na ocasião, foidesenvolvido o plano decenal de educação, e Bruna apresentou uma proposta de fim do caderno doaluno. “Essas apostilas não têm conteúdo e os professoresnão estão preparados para usá-los”, destaca.

Segundo Bruna, a proposta foi aceita naConferência, com a redação que ela e outrosadolescentes propuseram. “Até os professores daminha escola apoiaram”, diz. O Plano Municipal deEducação deve ser um documento orientador depolíticas públicas, definindo, com força de lei, asprioridades do setor no prazo de dez anos.

Como forma de acompanhar a proposta de fim docaderno do aluno, Bruna e outros adolescentes queparticiparam da redação da proposta se reúnembimestralmente, para discutir sobre o tema e pensarem encaminhamentos. “A apostila não tem lógica!Ninguém entende porque os professores e nóssomos obrigados a usar o caderno do aluno. Todomundo copia as respostas da internet e aí passa de ano.Mas e para entrar na faculdade? O ECA (Estatuto daCriança e do Adolescente) nos garante educação dequalidade. Cadê ela?”, desabafa.

Estudantes reclamam que cadernos chegamatrasados às escolas. Em outras, estoquesocupam salas inteiras

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Dois Paraguais

Em 2009, o caderno do aluno de Geografia ficouconhecido nacionalmente por trazer duas vezes oParaguai no mapa da América do Sul e por invertera localização do Paraguai e do Uruguai. Outro erroencontrado foi a não-inclusão do Equador num dosmapas. Na época, a secretaria responsabilizou aincorreção à Fundação Vanzolini, que “elaborou osmapas e o projeto gráfico”, que se defendeudizendo que o material é produzido por professoresindicados pela secretaria.

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Ana Luíza Vastag e Luciano de Sálua, do Virajovem São Paulo (SP), e Jéssica Delcarro, do Virajovem Pinheiros (ES)*

Integração em sala de aula é benéfica para todos

OEstado de São Paulo prevê, em legislação, garantia de

alunos com deficiência serem matriculados em escolascomuns. E para que isso aconteça, a Secretaria de Educação

criou, em algumas escolas da rede estadual, o Serviço de ApoioPedagógico Especializado (Sape), em que diariamente o alunorecebe acompanhamento dos conteúdos desenvolvidos em salade aula, uma espécie de complemento didático.

Mas caso essa inclusão não consiga fazer o aluno se adaptarao ensino regular, a lei abre a exceção de se montar uma classeespecial, com demandas específicas, em que o aluno somente éaceito com a apresentação de laudo médico e havendoprofessores capacitados para tal ensino.

Um exemplo disso é a Escola Estadual Professora ZenaideVilalva de Araújo, na zona oeste de São Paulo (SP), estruturadacom acessibilidade e materiais didáticos diferenciados para arecepção de alunos com deficiência intelectual. A instituição deensino mantém, há três anos, uma classe especial para alunos deEnsino Fundamental II, com quinze estudantes, entre 15 e 22 anos.

Professora de classe especial, Deise Cazarine conta que alémdas disciplinas comuns, como Português e Matemática, osestudantes desenvolvem, durante as quatro horas e meia de aula,trabalhos manuais como artesanato e desenhos. Por meio deprojetos que trabalhem ao mesmo tempo o individual e o coletivoem sala de aula, Deise também explora o conhecimento e asolidariedade dos estudantes, valorizando o desenvolvimento deconteúdos atitudinais.

A alfabetização é feita da forma tradicional, em que osestudantes passam inicialmente pelo processo de cópia dasletras, entendimento do seu significado e, então, formação daspalavras. “Eu tenho quatro alunos que são alfabetizados, osoutros (11) não são. Eles só conhecem 'A, B, C' e '1,2,3,4'. Elesdistinguem a letra do número, mas fora isso, não. Muitosescrevem o nome de memória”, conta a educadora.

Nessa classe especial, cada pessoa tem uma síndromediferente, porém todos possuem deficiência intelectual. A diretorada escola, Sirlene Manoel, alega que essa diversidade é um ponto

positivo, pois os estudantes aprende a aceitar as diferenças unsdos outros, e passam a se considerar como iguais. “Cria-se umsentimento de solidariedade, em que um pode ajudar o outro nasua deficiência. Os alunos se descobrem, além de úteis,pertencentes”, fala.

Aplicando o conceito de escola inclusiva, os estudantes sãoavaliados um a um e, conforme o progresso que apresentam,deixam a sala especial e passam a frequentar a sala regular. Masquando a situação exige, pela inadequação etária ao ambienteescolar, é oferecida a terminalidade de estudos.

Coordenadora da E.E. Zenaide, Iracema Pereira afirma que a dificuldade é justamente a falta de um grupo que acompanhemais de perto o desenvolvimento e implementação do projeto, e mostre aos educadores da classe regular como aplicar osconceitos de inclusão propostos no capítulo 5 da Lei deDiretrizes e Bases da Educação (LDB). “Nós temos algumaspalestras e materiais de estudo, mas no dia a dia é complicado.Nós ainda não conseguimos lidar muito bem com a inclusão,porque envolve não só questões acadêmicas, mas emocionais e de adaptação. A sala especial surge pela dificuldade da escolaem lidar com alunos com deficiência”, ressalta Iracema.

À Vira, alguns estudantes relataram considerar positiva a integração entre estudantes que a escola oferece, pois quasetodos se ajudam mutuamente e aceitam as diferenças uns dosoutros. Caio de Carvalho, de 18 anos, lembra que nas outrasescolas onde estudou os professores não lhe ensinavam a matéria. “Eles não tinham muita paciência comigo, e diziam quenão tinham tempo pra me ensinar porque eles tinham de ensinaro resto da sala. Mandavam eu pedir ajuda para outra pessoa”.

Em outra escola da capital paulista, a coisa é um poucodiferente.“Na minha escola há uma estudante com Síndrome deDown. Quando iniciou os estudos, todos os alunos a receberam,mas ainda possuem receios de se aproximar dela por conta dasua deficiência”, diz a jovem Isabela Andrade Vaz.

Especialista em educação diferenciada, a pedagoga AgdaFelipe Gonçalves, que atua no Espírito Santo, acredita que todo

Escolainclusiva já!

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profissional da área de educação deveria ter conhecimentos básicossobre como lidar com pessoas com deficiência. “A escola além deser um espaço de apropriação do conhecimento também se tornaum local de encontros e amizades, favorecendo o desenvolvimentodo aluno com deficiência e propiciando uma maior interação social.Sabemos que há preconceito por parte de alguns alunos ditos'normais', mas podemos afirmar que a presença dapessoa com deficiência dentro da escola e na salade aula comum tem possibilitado um outro olharem relação à deficiência”.

Mas além da boa formação dos professores, a escola deve assegurar estrutura física adequadapara receber qualquer aluno. Em todo o Brasil, instituiçõespúblicas não conseguem recursos financeiros para investirna reforma de seus prédios, como conta a coordenadorapedagógica Hilda Cristina. “Este tipo de reforma nasescolas, para torná-las acessíveis, é muito complicada,pois não depende da escola e sim dos órgãos do governo”.

A reportagem enviou perguntas para o Ministério daEducação para falar sobre a distribuição de recursosdestinados à educação e se existem recomendações paraa construção de escolas acessíveis no Brasil. Mas até o fechamento desta edição não houve resposta.

“O aluno com deficiência é um cidadão de direitos e, dentre esses direitos, está o direto à educação dequalidade no espaço escolar. Precisamos pensar em umaescola que acolha a todos sem preconceito oudiscriminação. A pessoa com deficiência tem potencialpara alcançar pleno conhecimento em todas as áreas”,finaliza Agda Gonçalves. V

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados eno Distrito Federal ([email protected] e [email protected])

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Dentro das instituições de ensino público, os estudantes

vivem diversas realidades em todo o País. Porém, uma

realidade comum a todos é a falta de disciplinas na grade

curricular que proporcionem maior entendimento sobre o papel

dos meios de comunicação e uma leitura crítica desses

espaços de informação. Michael Vinicius Nascimento, 17 anos,

estudante de São Paulo, reclama dessa ausência: “Na minha

escola não tem nenhuma matéria que fale sobre a imprensa.

Seria muito importante ter algo do tipo, afinal precisamos

saber quais e que tipos existem e como podemos utilizá-las”.

Pensando nisso, a Viração Educomunicação, em parceria

com as ONGs Instituto Universidade Popular (Unipop), do Pará,

e a Catavento Comunicação e Educação, do Ceará, iniciaram a

criação de núcleos de comunicação e mobilização jovem em

escolas públicas. O projeto “Formação nas Escolas”, que

começou em março deste ano, escolheu seis escolas públicas

Projeto Formação nas Escolas traz formação em mídias sociais,

mobilização e articulação para estudantes de escolas públicas

Luciano de Sálua, da Redação

para receberem as formações nessa etapa piloto do projeto. São

duas instituições públicas em São Paulo, duas no Pará e outras

duas no Ceará. E as regiões escolhidas não foram por acaso,

pois a ideia era contemplar diferentes biomas: uma região de

grande centro urbano, uma região amazônica e outra no

semiárido brasileiro.

O objetivo das oficinas é criar espaços de participação

juvenil, por meio da utilização da comunicação no cotidiano da

escola. Além dos debates, os participantes discutem linguagem

e técnicas jornalísticas, ética na comunicação, jornalismo

social, novas tecnologias, redes sociais, entre outros assuntos.

Em São Paulo, as escolas participantes são a E.E. Ana

Siqueira e a E.E. Valdir Pinto, ambas localizadas na capital. “As

oficinas nos trazem diversas informações. Aprendemos várias

características de rede para mobilização, e isso é muito legal!”,

disse a estudante Pâmela Alves de Jesus, da escola Ana Siqueira,

A midia dentro da sala de aula

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ao término da oficina sobre redes (participação coletiva).

Já na Escola Valdir Pinto, o estudante Jackson de Araújo

Silva afirma que as formações que têm recebido ajudarão na

forma como enxerga a mídia. “Daqui pra frente vou poder me

comunicar melhor! Vou entender melhor os meios de

comunicação e saber como posso participar deles”.

No Ceará, o projeto realizado pela ONG Catavento

acontece em três cidades diferentes. Em Fortaleza, na Escola

Marvin, em Osébio, na E.E. Ana Bizerra, e em Paramoti, na E.E.

Tomé Gomes. A educadora Clarissa Diógenes é quem conta

um pouco sobre como tem sido a experiência por lá. “A ideia

é que, ao término das formações, o projeto não acabe, que

eles possam alimentar o site da Agência de Notícias

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E a galera que integra as formações já está colocando em

prática tudo o que estão aprendendo nas oficinas. No dia 22

de setembro, na E.E. Ana Siqueira, em São Paulo, foi realizada

uma festa para o Dia Nacional da Juventude, que foi planejada

pelos adolescentes e jovens do projeto.

Eles se reuniram e escreveram o projeto do evento, que

logo foi aceito pelos professores e funcionários da escola. Em

seguida, fizeram a mobilização pela escola falando sobre a

importância de comemorar a data.

A festa, que durou todo o dia, contou com uma baladinha

com direito a DJ e gincanas para os estudantes, além de uma

roda de samba para fechar a noite.

utilizando torpedos SMS. Ao todo, participam 300 pessoas,

entre funcionários, professores, estudantes e moradores das

comunidades onde estão inseridas as escolas”. Clarissa diz

que mesmo sendo de regiões próximas, cada escola possui

uma realidade diferente da outra, mas que isso não impede a

realização das oficinas. “Já vemos os sinais de que tem dado

certo as formações, pois (os alunos) já conseguem diferir o

que é uma reportagem, fazem produção de conteúdo e avaliam

criticamente as diferentes mídias”.

A primeira etapa do projeto termina neste ano, mas a partir

de 2011 os participantes das oficinas vão iniciar a produção de

conteúdo para diversas mídias com temáticas trazidas por eles

mesmos, ocupando o espaço com suas vozes!

Acompanhe no blog do projeto como tem

sido as oficinas realizadas nas escolas:

http://movimentovirajovem.blogspot.com

Mão na massaMovimento Virajovem

Movimento Virajovem

Estudantes recebem formação em educomunicação

no Pará, São Paulo e Ceará

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Capa

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Um ensino diferente

Com a proposta de incentivar as redes estaduais deeducação a diversificar os currículos escolares e tornar aescola um espaço mais atraente para os alunos, o

Ministério da Educação (MEC) criou o projeto Ensino MédioInovador. Pela proposta, as instituições de ensino participantespodem incluir, na grade de aulas, atividades que integremeducação escolar e formação cidadã.

Iniciada neste ano, participam dessa primeira etapa doprojeto 357 escolas em todo o Brasil, totalizando mais de296.312 mil alunos matriculados. O Paraná é o Estado commaior número de escolas participantes, com 84 instituições,seguido do Pará, que possui 34. O MEC convidou todos osEstados, mas apenas 17, e o Distrito Federal, toparam aderirao novo modelo de Ensino Médio, que somou recursos de R$22,6 milhões, destinados pelo governo federal.

No Ensino Médio Inovador, uma das mudanças sugeridaspelo MEC é o aumento da carga horária de aulas, que passadas atuais 2400 horas para 3 000 horas ao final dos três anosletivos. Outra mudança é a possibilidade de deixar o alunoescolher, pelo menos, 20% da grade curricular que irá estudar,dentro das atividades que a escola oferece. Também faz parteda proposta incluir aulas em laboratórios, valorizar a leitura egarantir formação cultural.

Ilka Madeira Basto, que está na coordenação de EnsinoMédio do Ministério da Educação explica que o programa temalguns indicativos a serem seguidos, que garantem asdisciplinas básicas, como Língua Portuguesa e Matemática.“Quando falamos de 'inovador', esperamos que a escola tenhaa oportunidade de adequar e pensar a educação de acordocom a sua realidade local, tendo os eixos trabalho, ciência,tecnologia e cultura”, fala Ilka. Entre as atividades oferecidaspelas escolas estão oficinas de hip hop, rádio escola, bandafanfarra e instalação de cineclubes.

No Amapá, oito escolas foram contempladas com oprojeto, quatro em Macapá e quatro em Santana, cidade a 20quilômetros da capital. O projeto foi inicialmente implantadoem conjunto com avaliações anteriores do Ensino Médio daregião. A carga horária da escola foi ampliada para 3600 horase cada unidade trabalha de forma diferente com o projeto, deacordo com a realidade de cada localidade.“O maior avançodiz respeito à evasão escolar, que diminuiu consideravelmente.

Uma grande conquista também é a o aumento de participaçõesem olimpíadas (de Matemática e Português) e nos índices doENEM. Além disso, acreditamos que o projeto trabalha o alunoenquanto cidadão e membro de uma comunidade”, conta o gerente do Núcleo do Ensino Médio de Macapá e Região (AP),Antônio Carlos Favacho. As ações realizadas nas escolas doAmapá incluem aulas de teatro, implantação de salasespecíficas para o uso de diversas mídias (midiatecas) e exibição de filmes, além de permitir que a escola fique abertaà comunidade nos finais de semana. “Além disso, fornecemostreinamento específico para os professores. Acreditamos que o Ensino Médio Inovador contempla tanto alunos quantoprofessores”, diz Antônio.

Pelo Brasil, além do Ensino Médio Inovador, outraspropostas de “revolucionar” a educação acontecem. A seguir,você confere duas iniciativas, feitas no Paraná e Ceará, com aintenção de ter um espaço educativo construído por alunos eprofessores.

Com mais de oito milhões de jovens frequentando o Ensino Médio em todo o Brasil,

desafio é criar uma educação inovadora e atraente

Vinícius Gallon, do Virajovem Curitiba (PR), Caroline Brito, do Virajovem Fortaleza (CE), Sâmia Pereira, do Virajovem

São Paulo (SP)*, e Rafael Stemberg, da Redação

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UALIDADE

colabo

ração inovaç

ão

cidadania

Transformando experiência em conhecimento

Ainda hoje, salvo raras exceções, o modelo vigente deeducação no Brasil carrega heranças do período medieval, emque a Igreja era detentora de todo o conhecimento etransmitia as orientações que julgava necessárias para opovo. A escola atual parece ignorar as evoluçõestecnológicas e da sociedade ao insistir em educar seusalunos como se eles mesmos já não fossem capazes de fazerisso, por meio de instrumentos como a internet e a televisão.A perda de interesse nas aulas e a evasão escolar são apenasalguns dos resultados de um currículo que nada ou poucodialoga com a realidade.

Na contrapartida desse modelo tradicional de educação,um programa realizado no Paraná tem gerado ótimasexperiências e resultados para os alunos, professores eestudiosos da educação. Trata-se do “Projeto Folhas”, criadoa partir da necessidade de produzir materiais didáticos quefossem frutos das experiências vivenciadas nas salas de aulaspor professores atuantes na educação básica e pública doEstado. “Acredito que por serem registros de suasexperiências cotidianas, em sala de aula, as publicaçõesrefletem, ao mesmo tempo, as dificuldades enfrentadas noensino de determinados conteúdos e as alternativasmetodológicas criativas encontradas pelos professores. Esseprocesso é então registrado no 'Folhas' e socializado comoutros professores que diariamente passam por situaçõessemelhantes e encontram nesses textos um suportepedagógico que os auxilie também”, relata um doscoordenadores do projeto, o professor Marcelo Cabarrão.

Em vigor desde 2004, apenas com professores doEnsino Médio, incluindo em 2007 as 14 disciplinas daEducação Básica (séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio), o “Folhas” tem atraído cada vez maisprofissionais da educação. “Diariamente novos 'Folhas' sãoinscritos no processo de validação. Temos uma grandeprocura por parte de estudantes, já que este tipo de textoé escrito tendo como leitor primeiro o aluno, e também porprofessores, principalmente daquelas disciplinas carentesde oferta de materiais didático-pedagógicos, como é ocaso de Arte, Filosofia, Educação Física e Sociologia, porexemplo”, conta Marcelo.

A escrita do texto “Folhas” é marcada pela pesquisabibliográfica ou de campo, num processo em que o autornecessita de "validadores", ou seja, orientadores para seutexto. Esses validadores são os próprios professores de suadisciplina e da disciplina de relação interdisciplinar, que oauxiliarão na escrita e revisão de conceitos de seu texto.Depois disso, é encaminhado a uma equipe para validação e orientação no Departamento de Educação Básica naSecretaria de Estado da Educação do Paraná. Portanto,durante todo o processo de escritura, diferentes leitoresirão ponderar, comentar, criticar, analisar e sugerir sobresua produção e, com isso, o texto é aprimoradogradativamente até sua publicação no portal educacionaldo Paraná, ficando disponível a todos os professoresinteressados. Dessa forma, a formação continuada eaprofundamentos teóricos acontecem, não somente para

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Em Curitiba (PR), materiais didáticos são criados a partir das experiências vivenciadas nas salas de aulas

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o autor, mas para todos os envolvidos neste processo. A professora de Artes Silviane Stolker de Lima acredita

que quem participa da concepção de um “Folhas” crescemuito com a experiência. “É muito estimulante podercontribuir com a educação a partir das vivências positivas dasala de aula. Sei de professores de artes que têm muitadificuldade em trabalhar com a música, pois imaginam queprecisam tocar algum instrumento. Isso não é verdade, játrabalhei com música inúmeras vezes e tive resultados muitointeressantes com meus alunos. Essas vivências estão todasrelatadas num “Folhas” que escrevi e podem ajudarprofessores, não só de Artes, mas os que queiram trabalhar amúsica de diferentes formas”, relata.

Silviane conta que o principal objetivo é despertar ointeresse e a curiosidade dos alunos. “Nesse texto que agente prepara, procuramos colocar uma linguagem para oaluno, como numa conversa. Existem várias formas de sefazer isso, uma delas é abrindo os capítulos com umproblema para motivar a curiosidade do aluno, para que elese interesse em responder essa questão”. Outra forma deabordagem, segundo Silviane, é a possibilidade de trabalhar

os conteúdos de forma interdisciplinar. “Assim, alunos quetêm dificuldade ou não gostam de Física, mas que adoramarte e música possam, numa aula sobre acústica, porexemplo, aplicar os dois conhecimentos e desmistificar aideia de que teoria não tem prática, e quem sabe, passem aenxergar a física de outra forma”.

Livro aberto

Na esteira do projeto “Folhas”, foi produzido, publicadoe distribuído a todos os professores e alunos do EnsinoMédio do Paraná o Livro Didático Público, que é uma formade política pública educacional que faz coincidir com oprofessor a figura do escritor. Trata-se de um materialproduzido por profissionais da rede pública estadualparanaense, envolvendo as disciplinas de tradição curricularno Ensino Médio, como Língua Portuguesa, Matemática eBiologia. Caracteriza-se como material de apoio paraestudantes e professores do Ensino Médio das escolaspúblicas estaduais de todo o Estado do Paraná. Aspublicações podem ser acessadas no sitehttp://tinyurl.com/livrospr

Capa

20 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Acesse o "Projeto Folhas"http://migre.me/2CPG2

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Caroline Brito

Foi-se o tempo em que os estudantes preocupavam-se apenas com as provas e trabalhos da escola. Narotina das instituições de ensino profissionalizantes, os alunos buscam além do aprendizado tradicional,conhecimentos que possam orientá-los para o mercadode trabalho. Na escola de ensino profissionalizanteMarwin, localizada no Bairro Pirambu, em Fortaleza (CE),essa é a realidade dos estudantes de Ensino Médio.

No Marwin, os alunos estudam em dois turnos(manhã e tarde) e têm aulas tradicionais aliadas aoconhecimento de um curso técnico que escolhem no atoda matrícula. No total são nove aulas todos os dias. A instituição oferece os cursos de Enfermagem,Informática e Turismo desde março de 2009. Este ano,os alunos também puderam escolher entre Modelagem eVestuário ou Hospedagem.

A grade curricular dispõe que os estudantes vejam asdisciplinas do Ensino Técnico juntamente com asdisciplinas tradicionais de forma integrada. Dessa forma,durante a manhã os alunos podem estudar Matemática edepois uma disciplina de Informática, por exemplo. Noúltimo ano, os alunos fazem um estágio supervisionadoorganizado pela escola, que os encaminha a umadeterminada instituição. As aulas de campo reforçam oaprendizado, já que os alunos têm a possibilidade deconhecer empresas de sua área de atuação.

Em Fortaleza (CE), escola prepara estudantes para o mercado de trabalho

Conhecimento técnico

V

Arquivo ABr

Por todo o Brasil escolas reinventama educação no ensino médio

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 21

A estudante de Vestuário Paula Franciar, de 15 anos,diz que o curso profissionalizante é uma oportunidadeúnica para garantir um futuro melhor para ela, pois aspossibilidades de entrar logo no mercado de trabalhosão maiores com os conhecimentos adquiridos no curso.

A infraestrutura da escola também é alterada a fimde complementar o aprendizado dos estudantes. A biblioteca, por exemplo, além dos livros de literatura e de disciplinas tradicionais, possuem livros específicosdos cursos profissionalizantes. Além disso, a escolafornece apostilas para cada turma. A instituição possuidois laboratórios específicos. O terceiro, que será umaagência de turismo, ainda está em construção.

A coordenadora Maria do Socorro do Amaral apontaque a escola possibilita um amadurecimento aos alunose uma preparação melhor para o ingresso nauniversidade. “O aluno fica mais preparado paraenfrentar os desafios do cotidiano”, diz. A coordenadoracomenta que um dos destaques da escola Marwin é oprojeto Diretor de Turma, no qual cada professor éresponsável por uma sala de aula. Assim, cada docenteacompanha o rendimento dos alunos e entra em contatocom a família para informá-los do resultado dosestudantes. A coordenadora informa ainda que o projetoé eficaz, pois os docentes têm tempo de se dedicar a elejá que também estão na escola em tempo integral.

* Um dos Conselhos Jovens da Vira espalhados em 22 Estados mais oDistrito Federal ([email protected], [email protected] e [email protected])

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22 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Provavelmente você já deve ter visto ououvido alguém falar sobre uma aula, palestraou oficina na escola sobre prevenção de

dst/aids, bullying, ética, meio ambiente, entreoutros temas. Não, não são disciplinas novasinseridas na grade curricular. São os chamados“temas transversais”, inseridos nos ParâmetrosCurriculares Nacionais da Educação, em 1996.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)constituem um referencial para fomentar areflexão sobre os currículos estaduais emunicipais do Ensino Fundamental e Médio. A função deles é orientar e garantir a coerênciadas políticas de melhoria da qualidade de ensino.Nesse sentido, é necessário que existamparâmetros a partir dos quais o sistemaeducacional do País esteja organizado, paragarantir que, para além das diversidades culturais,regionais, étnicas, religiosas e políticas queatravessam uma sociedade múltipla e complexa,estejam também garantidos os princípiosdemocráticos que definem a cidadania. E por issoforam incorporados nas disciplinas já existentesos temas transversais Ética, Pluralidade Cultural,Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual.

O problema é que a inserção desses temas éalgo que não tem sido implementado na maioriadas escolas, principalmente as da rede pública deensino. Isso se dá principalmente por doismotivos: primeiro, porque alguns professores nãose sentem capacitados para trabalhar com o tema– principalmente os relativos às questões dasexualidade e livre orientação sexual, que mexemcom a criação e valores das pessoas; e segundo,porque mesmo aqueles com muita boa vontade,que procuram essa formação e se sentem hábeispara isso, não encontram estrutura ou materiaispara tal.

É pensando nesses problemas queorganizações da sociedade civil desenvolvemprojetos para trabalhar com esses temas em

escolas, o que tem tornado mais comum o debate e aprendizado, como aconteceem projetos como “Trilha dos Direitos – Uma reflexão de gênero e saúde edireitos sexuais e reprodutivos”, do Coletivo de Jovens Feministas em Pernambuco(CJF-PE), apoiado pelo Fundo SAAP (Serviço de Análise e Assessoria a Projetos) daorganização Fase Solidariedade e Educação.

A intenção do projeto, relata a integrante do CJF-PE, Mariana Karilena, de 24anos, “é mais do que pautar o tema, é estimular os alunos e as alunas a buscarmais informações nas temáticas e fornecer materiais para eles e os professoresseguirem com os debates nas escolas. Por isso, ao final das oficinas quefacilitamos, deixamos um kit com filmes, apostila com sugestão de atividades etextos, entre outros materiais.” Segundo ela, os alunos têm bastante interessepelos temas e as dinâmicas desenvolvidas pelo grupo por terem abordagens queaproximam mais das práticas nos cotidianos destes, diferente da abordagem dasdisciplinas que eles possuem na escola.

Também com esse propósito de inserir os temas nas escolas, é que surge oPrograma Saúde e Prevenção nas Escolas [figurinha conhecida entre nós], que hápouco tempo foi recepcionado pelo Programa Saúde na Escola (PSE). Este, aocontrário da maioria das iniciativas na área, não é um projeto de organizações dasociedade civil e sim do governo, por meio da Área Técnica de Saúde doAdolescente e Jovem do Ministério da Saúde. Mas mesmo este possuindofinanciamento próprio, também encontra obstáculos e limitações para suaefetivação mesmo em escolas nas principais capitais brasileiras.

Boas práticas existem, não faltam exemplos. Mas faltam decisõespolíticas por parte do executivo inserindo essas questões na pauta das prioridades das políticas públicas para efetivar o que já vem sendo garantido em dezenas de marcos legais.

Maria Camila Florêncio, do Virajovem Recife (PE)*

Além do currículoInserir disciplinas com foco nos temas atuais é uma

alternativa para despertar o interesse do estudante pela aula

* Um dos Conselhos

Jovens da Vira

presentes

em 22 Estados e no

Distrito Federal

([email protected])

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Escolas técnicas tentam romper com a educação

tradicional e apostam no ensino prático

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados eno Distrito Federal ([email protected])

Sâmia Pereira, do Virajovem São Paulo (SP)*

V

As chamadas escolas técnicas, ou Etecs, são instituiçõesde ensino que oferecem, além do Ensino Médio regular,a opção do aluno realizar cursos de capacitação

profissional em áreas como agropecuária, eletrônicae metalurgia.

Iniciadas na década de 1960, quando o capital estrangeiropassou a entrar no País de forma expressiva, as escolastécnicas acompanharam o desenvolvimento de São Paulo,quando houve a criação de diversas profissões. Desse modo, ogoverno do Estado criou instituições que atendessem aoacompanhamento profissional e à expansão industrial de SãoPaulo. Em 1969, foi criada a primeira instituição voltada apenaspara a Educação Tecnológica na região, o Centro Paula Souza.

Para ingressar em uma dessas escolas, é necessário fazeruma prova de seleção, o vestibulinho, que contém uma médiade 50 questões interdisciplinares. Em todo o Estado, existemmais de 90 opções de cursos técnicos, que variam de acordocom o mercado de trabalho de cada localidade onde a escolaestá funcionando.

Segundo o último ranking do Exame Nacional do EnsinoMédio (Enem) de melhores escolas do Brasil, as escolastécnicas de São Paulo alcançaram boas colocações. Noentanto, apesar desse resultado positivo, as Etecs apresentamos mesmos problemas de uma escola pública: falta deprofessores, de materiais para uso pedagógico e, por vezes,infraestrutura para acomodar todos os alunos.

Tainá Holanda, de 15 anos, estuda o 1º ano do EnsinoMédio em uma escola técnica e diz ter se decepcionado com aescola. “Eu esperava, no mínimo, ter aulas sempre. O CentroPaula Souza não pensa nos alunos como indivíduos, e simcomo massa. Esse é um problema que abrange a maior partedas escolas, sejam elas particulares ou públicas”.

SarespExame criado para avaliar o domínio dos estudantes do

Ensino Fundamental e Médio em disciplinas como Português eMatemática, o Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento

Outro método

Escolar do Estado de SP) passou a ser aplicado, desde 2009,também nas Etecs. Desde então, os alunos argumentam que ainclusão das escolas técnicas na avaliação foi apenas paraaumentar os pontos do governo no cálculo do Índice deDesenvolvimento da Educação do Estado (Idesp).

“O Saresp é uma forma de contabilizar a educação, e asescolas técnicas estavam sendo usadas porque sua pontuação semisturava com a das demais escolas, aumentando a média geral.É injusto, já que Etecs têm um método de ensino diferente, e ogoverno tem consciência disso”, fala Mayra Cyrne, de 17 anos,aluna de uma Etec. A jovem foi uma das participantes do protestoque aconteceu no dia do Saresp, em novembro de 2010, e quereuniu cerca de 200 estudantes em frente à sede do Centro PaulaSouza, na região central de São Paulo.

Em nota divulgada à imprensa, o Centro Paula Souza, que estávinculado à Secretaria de Desenvolvimento do Estado, diz que “asnotas das Etecs não integram o cálculo do Índice de Desenvolvimentoda Educação do Estado de São Paulo (Idesp), que inclui apenas asnotas das escolas da rede da Secretaria de Educação do Estado”.Em novembro de 2009, cerca de seis mil alunos de 84 Etecsparticiparam pela primeira vez da avaliação do Saresp. Os alunos do3º ano do Ensino Médio obtiveram média de 329,2 em línguaportuguesa e de 340,7 em matemática, pontuação acima da médiaobtida pelos alunos das escolas particulares (324,7 em línguaportuguesa e 324,8 em matemática) e os das escolas da redeestadual (274,6 em língua portuguesa e 269,4 em matemática).

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Aprimeira escola democrática de que se tem notícia foicriada pelo escritor russo Leon Tolstói (Guerra e Paz).Chamava-se Yásnaia-Poliana e guiava-se pela liberdade,

pois, para Tolstói, “a liberdade torna os sujeitos responsáveispor suas experiências e lhes permite um desenvolvimentoglobal”. A afirmação é da educadora Helena Singer, pós-doutoraem Educação pela Universidade de Campinas (Unicamp) em suaobra A República das Crianças: sobre experiências escolares deresistência, nossa entrevistada do mês no Galera Repórter.Especialista em educação democrática, Helena é diretorapedagógica da ONG Cidade Escola Aprendiz, sócia-fundadora doInstituto de Educação Democrática Politeia e uma dasfundadoras da escola Lumiar, em São Paulo. Saiba mais sobre aeducação democrática na entrevista que fizemos com ela!

Viração: Fale-nos um pouco sobre o que o modelo tradicional

de ensino, chamado de disciplinador, representa para a formação

dos estudantes.

Helena Singer: O modelo disciplinar baseia-se na hierarquia dagestão e do conhecimento. Em relação à gestão, o poder ficacentrado, sobretudo na direção, que detém todas as informaçõese toma as decisões. Os professores participam precariamente dosprocessos decisórios da escola e exercem a autoridade absolutana sala de aula. Em relação ao conhecimento, o modelo disciplinar

baseia-se na seriação, como se as pessoas pudessem acumularconhecimentos em ordem crescente, como se o conhecimentofosse quantificável a partir de exames cujos resultados atribuemnotas, graus, àqueles que os respondem. Portanto, o impacto domodelo disciplinar é formar pessoas incapazes de tomar decisõese assumir a responsabilidade pelas organizações de que participame também incapazes de estudar simplesmente por prazer, a partirde suas próprias perguntas e desejo de conhecer. Elas se tornamdependentes de alguém que lhes diga sempre o que estudar e lhesatribua uma nota que signifique o quanto aprenderam.

E como funciona a educação democrática?

A gestão é compartilhada entre estudantes, educadores,funcionários e gestores. Juntos, eles definem as regras deconvivência, elaboram o planejamento pedagógico e discutem assituações em que alguém desrespeita o bem comum. Osestudantes se organizam em grupos de trabalho, a partir dostemas que lhes interessam. Os educadores são tutores, queconhecem os estudantes individualmente de modo a seremcapazes de orientar itinerários de pesquisa a partir dos interessesdos estudantes e garantindo a eles oportunidades de ampliação derepertório e sistematização do conhecimento construído. Aavaliação é um processo de reflexão sobre o próprio aprendizado.

Alessandro Muniz, do Virajovem Natal (RN)*, Elizângela Nunes e Rafael Stemberg, da Redação

2003 2009

A socióloga Helena Singer fala à Vira sobre educação democrática

A escolademocrática maisantiga ainda emfuncionamento ficaem Summerhill, naInglaterra.

Escolas livrespassam a sepopularizar pelomundo

1921 1970

Linha do Tempo

24 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Escola da Ponteé fundada emPortugal

1976

Educaçãocom liberdade e autonomia

Div

ulga

ção

Galera Repórter

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Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 25

eles também se iniciam num novo processo educativo,aprendendo a criar outros parâmetros para acompanhar odesenvolvimento de seus filhos, que não se expressa em liçõesde casa, notas e seriação.

Como é a articulação internacional das escolas democráticas?

Como essa rede atua no Brasil?

Atualmente cerca de 500 organizações do mundo todoparticipam da rede internacional de educação democrática, pormeio de fóruns virtuais, grupos de discussão e encontros que acada ano acontecem em um continente diferente. No Brasil, oprincipal representante desta rede é a Politeia que, inclusive,organizou o encontro de 2007 em Mogi das Cruzes (SP), durante oFórum Social Mundial. Há também um crescente número de escolase outras organizações brasileirasque se inspiram naportuguesa Escola daPonte. Mas o paísem que aeducaçãodemocráticaconseguiuefetivamentetornar-se políticapública é Israel.

Como se desenvolve a autonomia nas crianças,

adolescentes e jovens? E como se lida com a questão dos

que se aproveitam da liberdade garantida e não tomam as

responsabilidades para si?

A autonomia se relaciona com algumas habilidadesespecíficas: reconhecimento da própria história e projeçãono futuro; auto-conhecimento (reconhecimento dos desejos,talentos) e adoção de atitudes de auto-cuidado;reconhecimento da comunidade em que vive (aspectoshistóricos, sociais, culturais e políticos); apropriação doterritório (circulação, reconhecimento das organizações,conhecimento das políticas públicas); conexões sociais;atitudes responsáveis com o coletivo (alteridade,participação nas decisões, cuidados com o outro e o bem-comum). O desenvolvimento destas habilidades só podeacontecer no seu próprio exercício. É no exercício de pensaro futuro, de cuidar de si, de circular pela comunidade, de seconectar e de assumir a responsabilidade pelo coletivo, queas pessoas desenvolvem sua autonomia. Neste exercício, emdeterminados momentos, as pessoas podem se aproveitardas oportunidades sem assumir suas responsabilidades e,nestes casos, elas acabam sofrendo as consequências, seja docoletivo, que deixa de respeitá-las, seja delas próprias que, aorefletirem sobre seu percurso, num processo orientado deauto-avaliação, acabam por reconhecer que perderamtempo no caminho da conquista da autonomia.

E a família, como é inserida no processo

educativo, como ela recebe essa educação tão

diferente da tradicional?

A família participa da escola compartilhandosaberes e assumindo sua parte na rede sócio-pedagógica integrada de que participam seus filhos.Para poder garantir o desenvolvimento integral dosjovens. A família, a escola e as demais agências educadorasda comunidade precisam dialogar. Mas, como os adultosnão tiveram a experiência da educação democrática,quando matriculam seus filhos numa escola destas,

“É no exercício de pensar o futuro, de cuidar de si, decircular pela comunidade, de se conectar e de assumir aresponsabilidade pelo coletivo, que as pessoas desenvolvemsua autonomia.” Helena Singer, educadora

Arquivo pessoal

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26 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

2003 2009

Linha do Tempo

Criada nos anos 1970, a Escola da Ponte é referênciamundial quando se fala em educação democrática.Localizada em Vila das Aves, no distrito do Porto, emPortugal, a escola é pública e conta com cerca de 175estudantes entre 5 e 16 anos, que não estão divididos nempor turmas nem por anos de escolaridade. Não existemsalas de aula, mas espaços de trabalho, sem lugares fixos.Conversamos com José Pacheco, idealizador e coordenadorda Escola da Ponte, para saber mais sobre a filosofia dainstituição. Confira!

Viração: Como se organizam as responsabilidades e

atividades na Escola da Ponte entre os estudantes,

professores e demais funcionários? Não existe nenhuma

hierarquia?

José Pacheco: Existe um dispositivo chamado “grupo deresponsabilidades”. Cada um desses grupos assegura ofuncionamento de uma parcela de atividade, ou espaço daescola. Hierarquia, se existir, é mitigada. Na Ponte, somostodos diretores.

Como é a articulação internacional das escolas

democráticas? Como a Escola da Ponte se articula com

os grupos, redes, movimentos que pensam a ideia da

Escola Democrática?

São múltiplos os conceitos de “escola democrática” ealgumas das escolas como tal consideradas estarão longede o ser... Nós mantemos alguns contatos colaborativoscom escolas de inspiração libertária, com as quaispartilhamos êxitos e fracassos.

Qual é o panorama da Escola Democrática no Brasil?

Esse panorama em nada difere das escolas de outrospaíses. Embora seja no Brasil o lugar onde encontrei mais

escolas ditas democráticas, são raras aquelas que poderãoreclamar essa designação. Tenho visto menos democracia doque importação de modismos.

Qual é o papel da instituição escola na sociedade

ocidental contemporânea?

Na sociedade ocidental contemporânea, como em todosos lugares onde houver escolas, o papel dessa instituiçãoparece ser o de reproduzir ignorância. As escolas que aindatemos assentam as suas práticas num tipo de organização demodelo único. Em todos os sistemas educativos, a aula dura50 minutos.

Como a Escola da Ponte envolve a família no

processo educativo?

Talvez haja quem considere que a família deve ser parceirada escola. Nós consideramos que a escola deverá ser uma dasparceiras da família. A família no centro do processoeducativo, a família que é comunidade, a “cidade educadora”,porque “é necessária uma tribo para educar uma criança”. Emcentenas de reuniões, fomos apresentando e explicando aospais sucessivas mudanças, acolhendo deles a permissão pararealizá-las. Diante dos efeitos das mudanças, os pais setornaram os maiores defensores do projeto.

Quando o líder percebe que é necessária uma mudança,

mas o grupo não concorda, como mediar essa situação?

Talvez se deva tentar aceitar opiniões opostas,compreender atitudes consideradas anômalas, buscar possíveisconsensos. Se nada disso resultar, talvez se deva substituir olíder. Ou mudar de grupo.

Escola da ponte

Escola Lumiar éfundada emSão Paulo

1993 2002

Surge o Institutode EducaçãoDemocráticaPoliteia, emSão Paulo

2006

Começa a acontecer, anualmente, oInternational Democratic EducationConference (IDEC), em um paísdiferente a cada ano

*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados doPaís e no Distrito Federal ([email protected])

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Pablo Abranches, Virajovem Belo Horizonte (MG)*

Perigo na escola

O papel da escolaO primeiro papel da escola é informar professores, pais e,

sobretudo, alunos sobre a prática. Moradora de Ribeirão dasNeves (MG), a professora de português Gisele Moreira trouxe otema para a sala de aula com o objetivo de diminuir os apelidosgrosseiros e a “zoação” rotineira dos alunos para com oscolegas de classe. Ela afirma que os “alvos” preferidos parasofrerem com a prática são aqueles estudantes com perfil maisreservado, tímido e, por não conseguirem lidar com a situação,se excluem e até deixavam de frequentar as aulas.

No bairro de Rosaneves, também em Ribeirão das Neves,jovens do projeto de educomunicação EntreMídias, realizadopelo Grupo Cultural Entreface, sentiram a necessidade demobilizar a comunidade em relação ao tema. Eles decidiramfazer um vídeo sobre o assunto e realizar atividades desensibilização nas escolas públicas do bairro. A jovem Grazielede Moura, uma das produtoras do vídeo, afirma que na escolaonde estuda “as brigas são frequentes e geralmente começamcom pequenas agressões e olhares de intimidação”.

O importante também para prevenir o bullying nas escolas éque o corpo docente e a coordenação pedagógica identifiquem oagressor para que possam fazer o acompanhamento sistemáticodesse aluno. Geralmente, os agressores não se comportam assimsomente na escola, mas também em casa e com os seus vizinhos.Por isso é importante que os pais estejam atentos também.

Todos nós sabemos que a escola merece especial atençãodentre várias outras áreas sociais, Já que para o Brasil sedesenvolver é necessário que tenhamos educação de

qualidade. No entanto, não dá pra estudar em um ambiente noqual não exista respeito entre todos os colegas, não é? Se osalunos não se sentirem intimidados no ambiente escolar, atendência é que as notas comecem a cair ou, no pior dos casos,que esses adolescentes e jovens abandonem a escola.

A explicação para esse comportamento intimidativo chama-se bullying (palavra de origem inglesa), prática sistemática deagressão que pode ser física ou não, praticada de formaintencional e repetitiva com o objetivo de intimidar os colegasna escola. Estão inclusos neste comportamento apelidospejorativos até agressões verbais, físicas, psicológicas e sexuais,sendo que essa última é menos frequente em escolas.

É preciso ressaltar que o bullying também pode ocorrer emoutros ambientes. Na internet, podemos encontrar jovensutilizando ferramentes tecnológicas para discriminar e difamaroutras pessoas, comportamento que caracteriza o ciberbullying.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça, que recentementelançou a cartilha “Justiça nas Escolas” para orientar pais eeducadores, o fenômeno pode ser explicado por comportamentosviolentos no ambiente escolar, praticados tanto por meninosquanto por meninas. Os atos de violência ocorrem geralmentecom um ou mais alunos que se encontram impossibilitados defazer frente às agressões sofridas. De alguma forma, é difícilencontrar quem nunca tenha sofrido bullying, principalmente setiver alguma característica física marcante.

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Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 27

Agressões físicas ou verbais podem causar transtornos na vida escolar dos jovens

Você pode baixar o PDF da cartilha“Justiça nas Escolas”, produzida

pelo Conselho Nacional de Justiça:http://tinyurl.com/cartilha12

O vídeo educativo produzido pelosjovens do projeto EntreMídias podeser visto no canal da Vira no YouTube:www.youtube.com.br/revistaviracao

* Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados eno Distrito Federal ([email protected])

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28 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Em setembro de 2010, cerca de cem estudantes do Ensino

Médio se reuniram em Brasília (DF) para a seleção nacional de

participação do Parlamento Juvenil do Mercosul, projeto que

tem como objetivo abrir espaços de participação e diálogo

entre jovens de seis países da América do Sul (Argentina,

Bolívia, Brasil, Colômbia, Paraguai e Uruguai).

A ideia do Parlamento

é discutir os problemas

e as possíveis soluções para

melhorar o Ensino Médio nos

países participantes.

A iniciativa do projeto é dos

Ministérios da Educação dos

Estados-membros do

Mercosul e conta com o apoio

da Organização dos Estados

Americanos (OEA).

Nesse encontro, a proposta

foi escolher 27 representantes

brasileiros para participarem da primeira reunião do

Parlamento, que aconteceu em outubro em

Montevidéu, no Uruguai. Esse foi o primeiro encontro

com os jovens dos países membros, que criaram um

documento oficial com recomendações de melhoria

para o Ensino Médio da América Latina. Tendo cinco

eixos, como inclusão educativa, participação cidadã e

gênero, a carta pode ser lida na internet

(http://tinyurl.com/parlamentosul).

Entrevista

Durante o encontro sobre o Parlamento, o diretor de diretor de

Concepções e Orientações Curriculares para Educação Básica no

MEC (Ministério da Educação), Carlos Artexes Simões, concedeu

uma entrevista à reportagem da Vira, que viajou a convite do

Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Na conversa, ele

fala sobre os desafios da educação dos jovens.

Alisson Rodrigues, adolescente comunicador da Plataforma dos Centros Urbanos*,

Eric Silva e Maria Rehder, da Redação, em Brasília (DF)

Estudantes brasileiros do Ensino Médio se reuniram em Brasília para a

seleção nacional de participação do Parlamento Juvenil do Mercosul

Viração: Como os dez milhões de jovens do Brasil podem ter

voz ativa na rede do Mercosul?

Carlos Artexes Simões: A democracia, que é uma conquista da

sociedade, está cada vez mais ganhando mais um caráter não só

de representação mas de participação. Precisamos ter pessoas que

representem democraticamente os interesses de

um coletivo ou segmento para garantir que esta

representação dialogue com as pessoas e ouça mais

os jovens.

Hoje quais são os desafios dos estudantes do

Ensino Médio no Brasil? Os estudos mostram que,

além das condições adversas, hoje 70% dos jovens

brasileiros de 15 a 17 anos têm a renda per capita

familiar menor que um salário mínimo, e quando

você pensa na diversidade de pessoas que ainda

têm de trabalhar

obrigatoriamente para

sobreviver, surge um

grande desafio e até uma

questão nova que mostra a

importância e significado

do Ensino Médio para o

projeto de vida dos

adolescentes.

É preciso que o Ensino

Médio dialogue com essa

realidade e seja capaz de

responder a esta fase de

desenvolvimento do jovem enquanto sujeito que vive na

contemporaneidade. Eles não vivem mais a realidade do século

passado. Há estudos que mostram que hoje muitos jovens estão

abandonando o Ensino Médio por falta de significados. Por isso é

preciso oferecer a estes jovens uma escola mais contemporânea.

Uma escola que seja capaz de criar os bens de uma nova

formatação, não só na formulação educacional, mas também o

que os jovens trazem.

Parlamento jovem

Carlos Artexes em entrevista à Vira

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Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 29

Inovando o ensino médio!

* A Plataforma dos Centros Urbanos (PCU) é uma iniciativa do Fundo das NaçõesUnidas (UNICEF), desenvolvida com diferentes parceiros, que tem como objetivomelhorar a qualidade de vida e garantir os direitos das crianças e dos adolescentesque vivem nas grandes cidades. A Plataforma está sendo implementada inicialmentenas cidades de São Paulo, Itaquaquecetuba (SP) e Rio de Janeiro (RJ), com duraçãoprevista até 2011. Os chamados adolescentes comunicadores são membros dascomunidades que integram a PCU e são responsáveis por auxiliar na mobilizaçãocomunitária para a conquistas das metas e comunicação de ações realizadas noâmbito de suas comunidades.

Entre agosto e setembro deste ano, o Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Cidadania (IIDAC) e o Fundo das Nações Unidas paraa infância (UNICEF) promoveram atividades com cerca de 30 adolescentes, de 12 a 18 anos, com o objetivo de construir eixos inovadores para oEnsino Médio. As oficinas aconteceram no Rio de Janeiro, São Paulo, Aracaju e Belém.

Para esquentar o debate e iniciar a aplicação da metodologia, os adolescentes participaram, anteriormente, de um chat na internet. A galeraconversou sobre questões como: “De que forma veem o Ensino Médio?”, “O que poderia ser melhor?” e “Como fazer isso acontecer?”

Abaixo, você confere o depoimento de Michel Ribeiro, adolescente comunicador da Plataforma dos Centros Urbanos, sobre a atividade.“No chat, a minha ideia era discutir, principalmente, a relação entre aluno e professor. Frequentemente eles se olham como inimigos e isso

desestrutura a convivência escolar. Nós, alunos, consideramos que o professor não nos entende e eles, muitas vezes, veem os jovens comodesinteressados. Temos que quebrar todos os estereótipos para mudar essa relação.

No dia da oficina tivemos uma palestra com um professor super ‘gente fina’, o Diego Marinnelo. Ele tinha a missão importante deconversar e nos mostrar o seu trabalho. Ele é o tipo de professor ‘zoeira’, que todos na escola gostam e, claro, nós também nos apegamos aele. Diego fez uma ponte com os adolescentes, depositou uma enorme confiança em nós.

Durante a oficina pudemos perceber que não faltava adolescente com os mesmos problemas nas escolas, mas a ideia era apresentarpropostas para melhorar o Ensino Médio, não ficar só reclamando.

Tudo nesse dia foi bom, mas o que mais me chamou a atenção foi aconfiança em nós adolescentes, o quanto mostrou que somos importantes na

vida social e na transformação da escola. Minha vontade de mudar as coisasestá ainda maior. Estou disposto a falar, agir, discutir, sem medo de errar.”

Qual a importância de se pensar o Ensino Médio juntamente

com os países do Mercosul, sendo que cada um possui cultura

diferente?

Na verdade, o Brasil tem uma diversidade étnica muito maior

do que a gente sabe. São quase duzentos dialetos falados no País,

além da língua portuguesa. E essa diversidade muito grande

também nós encontramos nos outros países do Mercosul, que são

extremamente significativos. Nós temos uma cultura de relação

educacional que precisamos trocar com esses

países. Além disso, essa união será importante na

luta pelos direitos humanos e fortalecimento da

ideia de superar as desigualdade regionais e

aprender diferentes maneiras de desenvolver

políticas públicas voltadas à educação.

Tá Na Mão:

Para ter mais informações sobre as ações do Parlamento Juvenildo Mercosul, acesse: www.emdialogo.uff.br/parlamento-juvenil

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Cleymenne Cerqueira e Egon Heck, em Eldorado (MS)*

“Aescola deve ser formadora de guerreiros... Aeducação deve reforçar nossa identidade e nosensinar a lutar pelos nossos direitos... A escola deve

estar a serviço da comunidade... a escola indígena deve terautonomia, ser diferenciada, com ensino de qualidade”.

Durante o XVI Encontro de Professores e Lideranças GuaraniKaiowá, que aconteceu em novembro de 2010, na aldeia Cerrito,município de Eldorado (MS), foi realizada uma avaliação do atualmodelo de educação escolar indígena implementado nascomunidades Guarani do Estado. Atualmente, a situação estábem longe da ideal e percebe-se uma grande distância entre aescola que o povo precisa e as escolas que de fato têm.

Embora ao longo da história do povo Guarani já se tenhamconseguido importantes avanços no campo da educação escolarindígena, muitos desafios ainda se fazem presentes no dia-a-diadas comunidades. Em pouquíssimas aldeias é oferecido EnsinoFundamental e Médio diferenciados e de qualidade. A gestão damaioria das escolas também não está na mão dos indígenas, emuitos professores também não o são.

Mesmo com todas as conquistas e políticas educacionais jáem curso, nota-se que existe um ranço colonial nas escolas e nassecretarias de educação de grande parte dos municípios sul mato-grossenses. Os marcos legais que garantem educação específica ediferenciada são muitos. No entanto, na prática ainda falta muitopara se ter uma educação indígena voltada para a vida, cultura ehistória Guarani, dentro da dinâmica social de construção de umpresente e futuro cada vez melhor para as mais de 40 mil pessoasdeste povo que vive no Mato Grosso do Sul.

O movimento de professores indígenas tem conseguidoimportantes avanços na luta por uma melhor educação. Mas ogrupo tem enfrentado inúmeras dificuldades para avançar emnovos patamares, principalmente no Estado, onde seconcentram os maiores índices de discriminação, racismo eviolência contra os indígenas. Existe uma paralisação ou atémesmo um retrocesso em vários aspectos da educação escolarnas aldeias. O que, de acordo com os educadores indígenas etambém representantes do movimento indigenista, estáintimamente ligado à luta pela terra e a postura anti-indígena do

30 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Encontro de educadores no Mato Grosso do Sul discute

educação indígena autônoma, diferenciada e de qualidade

Pela tradição

atual governo e das elites econômica e política da região.Na maioria das escolas não são permitidas discussões sobre

a luta pela posse da terra tradicional. O que, de acordo comlideranças presentes no encontro, é algo inadmissível. “É umabsurdo esse tipo de atitude, pois esse é justamente um denossos principais temas de discussão. As ações em prol dacomunidade e a procura pela posse do território tradicional éalgo transmitido de geração em geração, faz parte da história donosso povo. Dessas discussões e encaminhamentos dependem ofuturo do povo Guarani”, disse um dos participantes.

Outro problema enfrentado atualmente pelas comunidadestem sido o diálogo entre os professores indígenas e as liderançastradicionais. Nem sempre isso tem acontecido de forma facilitadae continuada. Ambos exercem diferentes papéis junto ao seupovo e devem trabalhar em conjunto – sabedoria tradicional econhecimento técnico – para reforçar a luta e traçar estratégiaspara a resolução dos problemas.

Uma questão presente desde o início do processo deformação dos professores é a participação das lideranças

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V

políticas e tradicionais das comunidades nessas atividades. Sócom um trabalho integrado entre essas lideranças e oseducadores indígenas se conseguirá, de fato, definir umaestratégia de educação a partir, com e para a comunidade.Também por esta escolha a realização deste encontro emCerrito, que uniu o XVI Encontro de Professores e Lideranças doPovo Guarani Kaiowá e a grande assembleia das liderançastradicionais deste povo, a Aty Guassu.

Nem sempre os professores têm conseguido implementar aspolíticas definidas pelo próprio movimento que integram. Estes nãotêm autonomia e instrumentos disponíveis para levar às salas deaula todo o planejado e discutido quando destes encontros. Paratanto é necessário que estes tenham mais autonomia eindependência para realizar suas atividades. Como solução paramuitos desses problemas, os próprios professores e liderançasapontam a gestão compartilhada dessas escolas, realização decursos de Guarani e capacitação para os educadores, bem como aconstrução de um novo projeto pedagógico.

Outra dificuldade apontada durante o encontro é arepresentação indígena nos espaços de debate e decisão dasinstituições acadêmicas, educacionais e organismosgovernamentais. Isso atropela e desrespeita os processoscoletivos, próprios das comunidades indígenas.

Dialogando com o passado, construindo o futuroNo trabalho em grupos, debates e exposições uma questão

se sobressaiu: hoje a educação escolar indígena tem umaimportância fundamental na consolidação de caminhos para opresente e futuro das comunidades Guarani Kaiowá.Consequentemente, a responsabilidade dos mais de 300professores indígenas é cada vez maior, não apenas natransmissão de conhecimento, mas principalmente no diálogo,aprendizado e transmissão da sabedoria milenar Guarani.

A transmissão da história, costumes e tradições do povoGuarani acontece, principalmente, na convivência familiar, nosrituais, na vivência espiritual nas oga pysy (casas de reza), nosroçados (prática ainda possível, embora grande parte viva nosconfinamentos ou na beira de rodovias do Estado), naconvivência com os sábios (os mais velhos, os ñanderu eñandesi). Portanto, é preciso aproveitar esses espaços pararepassar aos mais jovens os sentimentos de luta pela posse daterra, que não é mercadoria, fonte de renda, moeda de troca,mas vida para os Guarani Kaiowá.

Uma das sugestões apontadas durante o encontro para sereforçar o diálogo e a luta pelos direitos é a construção de ogapysy junto às escolas. Esse seria o espaço em que os alunos teriama transmissão de sabedoria e rituais pelos ñanderu. Seria umaatividade integrada dentro do currículo e projeto pedagógico dasescolas. Porém, tudo isso certamente exigirá muito diálogo ecompromisso das comunidades, hoje muito marcadas porinterferências religiosas e políticas partidárias que se opõem a essacaminhada e muitas vezes divide as comunidades.

Atuação missionáriaDesde a década de 1980, o Conselho Indigenista Missionário

(Cimi) regional Mato Grosso do Sul, iniciou um trabalho junto aosprofessores Guarani Kaiowá para definir o que de fato seria umaescola indígena, com formação diferenciada e específica e dequalidade. Esse trabalho, posteriormente, foi ampliado com aconstrução de diversos mecanismos e espaços, articulando taisatividades com instituições locais, regionais e até mesmo nacionais.

Desta iniciativa surgiram duas importantes construções: omagistério indígena Ará Verá, que iniciou suas atividades em1999, e o curso de licenciatura indígena Teko Arandu,implantado na Universidade Federal da Grande Dourados, em2006. Essas foram importantes conquistas dentro do universo demais de 500 estudantes universitários indígenas no Mato Grossodo Sul, que também devem ter seu conhecimento integrado naconjuntura de luta de seu povo.

Dentro dos métodos e currículos da universidade tambémdevem estar garantidos a busca do povo Guarani pela garantia deseus direitos fundamentais à vida, à saúde e educação, à terra, àidentidade Guarani e à autonomia dentro de seus territórios.Educação, escola e luta pela terra devem ser um conjunto de açõese estratégias que se articulam e fortalecem mutuamente.

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 31

* Reportagem publicada originalmente no site do Conselho IndigenistaMissionário (Cimi) em 15/11/2010. Saiba mais em: www.cimi.org.br

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*Um dos Conselhos Jovens da Vira presentes em 22 Estados e no DistritoFederal ([email protected])

A diferença entre

ensinar e fazer aprender

Jean Piaget (1896-1980) trouxe a ideia de que o aluno

é o agente do processo de construção do conhecimento

Que Figura!

Cristina Uchôa, colaboradora da Vira em São Paulo (SP)

32 Revista Viração • Ano 8 • Edição 67

Osuíço Jean William Fritz Piaget, umepistemólogo, ou seja, um estudioso doconhecimento, é uma das pessoas que hoje

fazem parte do círculo de ídolos de muitospedagogos e educadores, apesar de não ter sidoexatamente um estudioso de pedagogia.

Agradeça, estudante, se hoje você não sabe oque é a “pedagogia bancária” – aquele método deensinar que pratica a repetição do mesmo conteúdoprogramático a cada ano, durante muitos anos,para diferentes turmas e gerações. Mas agradeçaprincipalmente a Piaget, que trouxe uma viradaessencial para o pensamento dos educadores: aideia de que o aprendizado não é umaconsequência pura e simples do contato cominformações ou com qualquer prática de ensino.Aprender é um desafio muito maior.

Ao concentrar-se em como o conhecimento seforma, a questão central para o trabalho doseducadores passou a ser como provocar a criança aaprender, e não mais como transferir conhecimentoe informações acumuladas. Na prática, o quemudou depois das contribuições de Piaget foi oentendimento dos lugares que ocupam professor ealuno no processo de passagem e construção doconhecimento: o aluno é o agente do processo.

A inteligência, segundo Piaget, é umaadaptação: o indivíduo desenvolve formas de agir epensar para superar os desafios colocados pelosmeios natural e social. Ao se deparar com umanovidade, um desafio, a pessoa é capaz deremanejar suas ideias e criar novas conclusões apartir delas, para resolver seu problema. “Opensamento se desenvolve a partir das açõessensoriais e motoras que antecedem oaparecimento da função simbólica, isto é, dacapacidade de pensar”, explica a docente do cursode Psicologia da PUC-SP Maria Regina Maluf,

V

presidente daSociedadeInteramericana dePsicologia eestudiosa de Piaget.

Assim, cada novoconteúdo traz um“desequilíbrio” para oaluno, sendo que elevolta à situação deequilíbrio depois deassimilar esses novosconhecimentos. Ouseja, na escola e navida, o cerne daquestão é aproblematização, fazercom que os alunos enfrentem osdesafios e se sintam capazesde superá-los.

O educador, porém, não é uma figura menos importante nosistema do aprendizado, lembra Maria Izabel Azevedo Noronha,professora de português e atual presidente do Sindicato dosProfessores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).“O professor é o grande provocador, é o que tem que reconhecer ascondições dos alunos para traçar suas estratégias para fazer com queseja realizado o objetivo, que é o aprendizado”, reflete. Mais do que aresponsabilidade de trazer todas as respostas, o educador faz com queo aluno tenha a iniciativa de buscar por si as informações e, assim,“construir”* seu conhecimento e suas próprias estruturas dedesenvolvimento mental.

É por causa desse raciocínio de que as experiênciasconstroem as estruturas mentais e lógicas paradesenvolver o conhecimento que a linha pedagógicainspirada em Piaget leva o nome de construtivista.

Nov

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Page 33: Revista Viração - Edição Nº 67 - Dezembro/2010

Sérgio Rizzo, crítico de cinema

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Pantera, que fez sucesso na internet)adapta romance homônimo de IsmaelCaneppele. O protagonista (Henrique Larré)tem 16 anos, vive com a mãe em cidadedo interior e se mantém conectado aomundo pela internet. Sua rotina em casa,na escola e com os amigos combinaregistro mais realista a passagens oníricas(associadas a lembranças, desejose fantasias).

Ainda inédito em DVD, Antes que oMundo Acabe também foi rodado no RioGrande do Sul. Dirigido por Ana LuizaAzevedo, opta por tratar de maneira maisleve pequenos dramas vividos poradolescentes. Já o documentário Pro DiaNascer Feliz, de João Jardim (co-diretor deJanela da Alma), visita escolas de diversasregiões do País e recolhe dezenas dedepoimentos. Alunos e professores falamuns dos outros, de si mesmos, do cotidianoescolar, dos papéis que desempenham nelee do que mais lhes vem à mente. A correnteverbal é especialmente feliz quando sedistância das reclamações para seconcentrar, de modo mais confessional, noque pensam e sentem os adolescentes.

Oreduzido número de filmes para (esobre) jovens costuma ser lembradocomo uma das principais lacunas do

cinema brasileiro. É preciso registrar, noentanto, que a situação começou a sealterar nos últimos anos. Três longas deficção (As Melhores Coisas do Mundo, OsFamosos e os Duendes da Morte, Antesque o Mundo Acabe) e um documentário(Pro Dia Nascer Feliz) formam um pacotediversificado para debate do universojovem e de características do EnsinoMédio no País.

As Melhores Coisas do Mundo destaca-se pelo amplo trabalho de pesquisaempreendido pela diretora Laís Bodanzky epelo roteirista Luiz Bolognesi, querealizaram Bicho de Sete Cabeças (2001) eChega de Saudade (2007). Originalmente, oprojeto mantinha o nome da série delivros de Gilberto Dimenstein e HeloísaPrieto na qual se inspira, Mano. O títulodefinitivo foi escolhido em concurso queintegrou os esforços da equipe para seaproximar do público jovem, com oenvolvimento de adolescentes, antesmesmo das filmagens, em ações ligadasaos personagens e à história.

Filho de professores universitários,Hermano (Francisco Miguez) tem 15 anose, como deveria ocorrer com todos de suafaixa etária, cursa o Ensino Médio. Tocarguitarra, andar de bicicleta e encontrar osamigos em festas são atividades que lhedão prazer. Certo dia, uma notícia mexecom toda a família. Mano precisará lidarcom ela, e com o episódio de "bullying"que provoca na escola, em paralelo aosdramas naturais de quem deixou de sercriança, mas ainda não virou adulto.

Em Os Famosos e os Duendes daMorte, rodado no interior do Rio Grande doSul, o diretor Esmir Filho (do curta Tapa na

V

Revista Viração • Ano 8 • Edição 67 33

No Escurinho

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Fique por dentro de algumas ações sobre o Ensino Médio:

Ação Educativa: www.acaoeducativa.org

Todos pela Educação: www.todospelaeducacao.org.br

Da Redação

Está lá na Constituição Federal, no

artigo 205: “A educação, direito de

todos e dever do Estado e da família,

será promovida e incentivada com a

colaboração da sociedade, visando ao

pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e

sua qualificação para o trabalho”. Mas

mesmo assim, o Brasil é o sétimo país do

mundo em número de analfabetos. São 18

milhões de pessoas que não sabem ler

nem escrever.

Entre os que passaram pela sala de

aula, apenas 47,1% terminaram o Ensino

Médio, segundo dados de 2008 do

movimento Todos Pela Educação,

organização financiada pela iniciativa

privada, que se baseia em informações

divulgadas pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE). Nesse

grupo, o melhor resultado está na região

Sudeste, que concentra 58,8% de pessoas

concluintes desse ciclo escolar. O

Nordeste, que aparece no final da lista,

possui 30,8% dos jovens concluintes.

Uma pesquisa (Que Ensino Médio

Queremos? - 2008) feito pela ONG Ação

Educativa em cinco escolas públicas de São

Paulo (SP) mostra que o principal motivo

dos alunos abandonarem o Ensino Médio é

a dificuldade de conciliar trabalho e estudo.

Parada Social

Meta do movimento Todos Pela Educação é ter, em 2022, mais de90% dos jovens brasileiros de 19 anos com o Ensino Médio completo

Prioridade a

curto prazo

V

Entre os entrevistados, 24% deram essa

resposta como o principal motivo, seguida

pela falta de vontade de estudar (15%).

Para transformar essas estatísticas em

números favoráveis para o Brasil, o

movimento Todos Pela Educação,

organização financiada pela iniciativa

privada, estabeleceu como uma de suas

cinco metas ter, até o ano de 2022, 90%

ou mais dos jovens brasileiros de 19 anos

com o Ensino Médio completo. Segundo a

organização, o País está no caminho para

alcançar essa taxa, já que em 2008 (último

dado divulgado), os dados estavam acima

da meta estabelecida para o ano, que foi

de 47,1%, enquanto o esperado era de

43,9%. Neste mês, está programada a

divulgação de dados atualizados.

Segundo o Todos Pela Educação,

o sucesso dessa meta dependerá, em

alguma medida, do bom resultado

e cumprimento das outras quatro metas,

sendo uma delas ter crianças e jovens

frequentando a escola na idade correta,

aprendendo o que é adequado à sua série.

Com isso, poderão concluir a educação

básica na idade apropriada e ajudar a

alcançar a meta do Ensino Médio. Objetivo

audacioso, mas possível de realizá-lo se

acontecer uma atuação conjunta entre

governos e sociedade civil.

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Novaes

Herbert de Souza, o Betinho (1935-1997)

Sociólogo e ativista político, fundador do Instituto Brasileiro de Análises Sociaise Econômicas (Ibase) e da campanha Natal Sem Fome

“Cidadania é a prática de quem está ajudando a construir os valores democráticos.”

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