viração : união para superar os desafios

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 9 • nº 1896 Fevereiro/2015 Jequitinhonha/MG Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 9 • nº 1897 Maio /2015 Joaíma/MG Viração : União para superar os desafios "Nós somos o Vale. Nós valemos, mais pelo que somos, menos pelo que temos. Valendo assim, e assim sendo, sempre valeremos". (Gonzaga Medeiros) É no vale do Jequitinhonha, aproximadamente 7 km do município de Joaíma, 23 famílias lutam pela permanência digna na terra onde fizeram morada. A Viração como é denominada pelos seus moradores, vive o dilema da luta pela regularização fundiária dos 534 hectares. Apesar de todas as dificuldades nos mostra que com união outra história é possível. Os relatos dos moradores da Viração, aponta para uma história que tem início com a chegada de Seu Divino e Jacão em 1987 num mutirão para abrir estradas, naquele período muitas pessoas eram contratadas pela prefeitura para executar esse trabalho. Eles ficaram no mutirão até 1991, quando fizeram um acordo de trabalho com o fazendeiro Juquinha, antigo dono do que hoje é a Viração. Seu Divino nos conta um pouco da sua história de vida que se intercruza com a luta da comunidade pelo acesso à direitos. “Meu começo aqui foi assim, eu entrei para trabalhar para Juquinha que era o Dono da Fazenda. Eu trabalhei uns 4 meses no serviço dele, aí ele me deu para fazer roça e tirar lenha. Quando eu entrei para aqui eu entrei ganhando 1 cruzado, eu estava sem nada vim ganhar um cruzado. Quando Miguel entrou eu já estava aqui. Miguel entrou para poder botar o pessoal, eu já estava, Jacão já estava também”. Seu Miguel ao narrar como chegou, esclarece que em momento algum invadiu as terras ditas de Zélia de Matos, herdeira da segunda geração. Pelo contrário, a fazendeira ordenou que ele colocasse 40 pessoas para morar na terra. Ele optou por 20 pessoas achando 40 uma grande quantidade. Mutirão para aterrar a cisterna Reunião de Mobilização para o Mutirão

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É no vale do Jequitinhonha, aproximadamente 7 km do município de Joaíma, 23 famílias lutam pela permanência digna na terra onde fizeram morada. A viração como é denominada pelos seus moradores, vive o dilema da luta pela regularização fundiária dos 534 hectares. Apesar de todas as dificuldades nos mostra que com união outra história é possível.

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Page 1: Viração : União para superar os desafios

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 9 • nº 1896

Fevereiro/2015

Jequitinhonha/MG

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 9 • nº 1897

Maio /2015

Joaíma/MG

Viração : União para superar os desafios

"Nós somos o Vale.Nós valemos,

mais pelo que somos,menos pelo que temos.

Valendo assim,e assim sendo,

sempre valeremos".(Gonzaga Medeiros)

É no vale do Jequitinhonha, aproximadamente 7 km do município de Joaíma, 23 famílias lutam pela permanência digna na terra onde fizeram morada. A Viração como é denominada pelos seus moradores, vive o dilema da luta pela regularização fundiária dos 534 hectares. Apesar de todas as dificuldades nos mostra que com união outra história é possível.

Os relatos dos moradores da Viração, aponta para uma história que tem início com a chegada de Seu Divino e Jacão em 1987 num mutirão para abrir estradas, naquele período muitas pessoas eram contratadas pela prefeitura para executar esse trabalho. Eles ficaram no mutirão até 1991, quando fizeram um acordo de trabalho com o fazendeiro Juquinha, antigo dono do que hoje é a Viração.

Seu Divino nos conta um pouco da sua história de vida que se intercruza com a luta da comunidade pelo acesso à direitos. “Meu começo aqui foi assim, eu entrei para trabalhar para Juquinha que era o Dono da Fazenda. Eu trabalhei uns 4 meses no serviço dele, aí ele me deu para fazer roça e tirar lenha. Quando eu entrei para aqui eu entrei ganhando 1 cruzado, eu estava sem nada vim ganhar um cruzado. Quando Miguel entrou eu já estava aqui. Miguel entrou para poder botar o pessoal, eu já estava, Jacão já estava também”.

Seu Miguel ao narrar como chegou, esclarece que em momento algum invadiu as terras ditas de Zélia de Matos, herdeira da segunda geração. Pelo contrário, a fazendeira ordenou que ele colocasse 40 pessoas para morar na terra. Ele optou por 20 pessoas achando 40 uma grande quantidade.

Mutirão para aterrar a cisterna Reunião de Mobilização para o Mutirão

Page 2: Viração : União para superar os desafios

Seu Miguel em sua fala esclarece essa questão: “Eu morava em fazenda mudei para Joaíma, depois vim para cá. Quando eu vim para cá foi a Dona que me deu, não teve nada de invasão, eu morava na rua ela me deu para mode eu morar aqui, eu vim e eles pediram para botar 40 pessoas para limpar a manga. Mas eu não quis botar as 40 pessoas, eu pus de 18 a 20 pessoas. Mas aqui não é fácil para levar a vida desse jeito, Deus me ajudou que eu aposentei e melhorei mais, mas já passei aqui muita travessa ruim, aí eu estou continuando até hoje. Hoje pelo menos não está difícil como era, melhorou muito, mas que era difícil era aí para trás, tem 15 anos que eu estou aqui”

Seu Divino complementa: “Diz que é dela, mas se ela conseguir tirar esse povo que está aqui dentro, com os projetos que estão aqui dentro, nós não vamos querer nada de ninguém por que não foi invasão, nós não somos invasores foi ela que mandou pôr aqui dentro, quando Miguel entrou eu já estava. Tinha outro companheiro que morreu agora de pouco que morou também, mas foram eles que deu para nós trabalhar. Muitas pessoas falam: ah! Vocês invadiram as terras. Não, não foi invasão, ninguém invadiu, foi ela que mandou Miguel colocar o povo aqui.” Na atual conjuntura a comunidade aguarda a regularização das terras pelo Estado, pois a ideia de que eles invadiram cria um desconforto grande . A comunidade deu entrada aos trametes jurídicos para regularizar a situação, entretanto esbarra nas exigências do Incra, que não desapropria uma área do tamanho da Viração para quantidade de famílias que vivem lá, ou seja, na concepção do INCRA 534 hectares para 23 famílias é pouca terra para muita gente. Mas para o povo da Viração está ótima a quantidade de terra que possuem . A falta da legalização das terras dificulta a vida dessas pessoas que não tem acesso à energia elétrica e a políticas de crédito para investir em suas parcelas de terra e melhorar a qualidade de vida.

Dona Têra relata como é a rotina, e as dificuldades impostas pela falta de energia elétrica. “Como não tem energia nós usamos candeia, vela. Nós aqui compramos um geradorzinho a gasolina só que além de gastar muito ele dá problema, e de 3 em 3 meses tem que levar para limpar. Se Deus quiser essa energia vai vim. Nós colocamos água numa garrafa, leva para cidade faz o gelo e traz, a roupa lava lá batida, estende aqui”.

Associação Comunitária dos Produtores Rurais da Fazenda Viração, ACRUTAF existe há 12 anos. Netinha atual presidenta relata a dificuldade de regularizar a terra “Da última reunião que eu fui lá eles falaram assim: Que

ia fazer uma nova vistoria e se dava para encaixar o tanto de família que estava aqui. Para eles aqui é pequeno para o tanto de família que tem, só que a advogada da Fetaemg veio visitar nós aqui. Ela falou com nós que saiu uma lei agora que o INCRA pode desapropriar qualquer tanto de Terra, acima de de100 hectares, para o Incra aqui é pouca terra para muita família. Para nós pode deixar do jeito que está”.

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Mariah e sua candeia

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Netinha aponta as possibilidades de acesso a outros benefícios caso as terras fossem regularizadas. “Se fosse legalizado, podia pegar o papel fazer um empréstimo para você conseguir alguma coisa, conseguir ir mantendo, coisa que você tem que ter documento você não consegue. Eles podiam vim e legalizar nós como nós estamos aqui e deixar, já que todos nós estamos vivendo aqui até hoje. Queria que legalizasse para não falar que a mulher é dona e nós estamos morando no invadido. O que estava faltando para nós era água e luz, a água já veio com essas duas caixas que serve e vai servir muito de agora para frente, e a luz, que está difícil, mas agora vem”.

Os programas da Asa contribuíram com a organicidade na Viração. Com os projetos houve o fortalecimento da organização comunitária, o mutirão passou a ser uma nova estratégia de trabalho. Dona Anedina 61 anos compart i lha um pouco da sua experiência: “Aqui não tinha nada, depois que a Caritas começou a mexer aqui que começou a melhorar, depois que eles chegaram a presidente começou a correr atrás das coisas aí começou a chegar esse benefício, começou a melhorar. Agora já tem as caixas, nossas caixas graças a Deus estão cheias.

Para Seu Divino: “Depois que caiu esses projetos para nós melhorou 100%, facilitou a água. Por exemplo, a água de beber, porque a água da Anta podre é uma água contaminada, desse córrego beira rio que passa aqui. Depois que caiu esse projeto dessas caixas para nós, nós bebe água da chuva, já facilitou muito. Que nem mesmo, quando eu entrei para cá eu não tinha nada, eu comprei na mão de Miguel umas 4 novilhas e Deus me ajudou que hoje eu tenho minhas criaçõesinhas eu vivo tranqüilo, acontece que tem uns anos que tá muito seco mas a gente panha um pouco mais pouco para tá comendo, eu achei que Deus ajudou muito para nós, mesmo nos anos que falta a chuva, não ta ruim de como nós entramos”.

Seu Antônio casado com Dona Têra diz que: “Quando eu vim para cá nem água tinha, então nós pegávamos água num pocinho que tinha ali, coava aquele tanto de bus para poder banhar depois, era muito perigoso, diz que ele faz doença na gente, então nós coávamos tomávamos banho. Então depois que chegou às caixas, agora todo mundo tem água tratada, satisfeito”.

Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais

Moradores da Viração

Técnologia Social - Primeira àgua

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Dona Anedina e Senhor Dema no «Terreirão»

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais

Realização

A união desse coletivo fica visível quando nos conta sobre o Mutirão que fizeram para aterrar caixas de companheiros que não t inha condições financeiras e nem físicas para executar o trabalho. O Mutirão foi composto por beneficiários e não beneficiários dos programas da ASA. Em um dia as três caixas foram aterradas. Outro mutirão foi feito para ajudar um companheiro que não tinha condição de fazer sua caixa. Na viração é assim, quando um companheiro não tem condições de pagar ajudante ou aquentar fazer o serviço eles fazem mutirão. Com a união e organização o trabalho em mutirão fica fácil.

Hoje eles têm uma criação de porcos coletiva, que fica na área de Seu Antônio, tem uns 50 porcos, de João e André, os porcos ficam todos juntos, a ação e os cuidados são divididos. A l g u n s t e m v a c a s . O u t r o s s ã o aposentados, mas de forma geral todos praticam a agricultura familiar e vivem dela e por ela. Plantam: milho, feijão, mandioca, mamão, fazem farinha, goma para vender nas feiras locais.

Os desafios ainda são grandes, mas com persistência e união o povo da Viração vai tecendo uma nova história bordada de luta e esperança, enfeitada de flores no caminho que ainda é preciso trilhar.

Seu Antônio colhendo capim para alimentar a criação