revista terra e cultura nº 62

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Ano 32 62 nº Ano 32 | Janeiro a Junho 2016 nº 62

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Ano 32

62nº

Ano 32 | Janeiro a Junho 2016

nº 62

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Ano 31

CENTRO UNIVERSITÁRIO FILADÉLFIA

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CENTRO UNIVERSITÁRIO FILADÉLFIA

Diretoria:

Sra. Ana Maria Moraes Gomes .................................................................................................................................................................................................. PresidenteSr. Getúlio Hideaki Kakitani ....................................................................................................................................................................................... Vice-PresidenteSra. Edna Virginia Castilho Monteiro de Mello ............................................................................................................................................. SecretáriaSr. José Severino ................................................................................................................................................................................................................................................. Tesoureiro

Dr. Osni Ferreira (Rev.) .......................................................................................................................................................................................................................... Chanceler

Dr. Eleazar Ferreira ..................................................................................................................................................................................................................................................... Reitor

ENTIDADE MANTENEDORAINSTITUTO FILADÉLFIA DE LONDRINA

Rua Alagoas, 2050 • CEP 86020-430 • Fone: (43) 3375-7401 • Londrina • Paranáwww.unifil.br

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Revista Terra e Cultura: cadernos de ensino e pesquisa./ Centro Universitário Filadélfia. – Londrina, PR, v.32, n. 62. Jan./Jun.

(1985-).v. 32, n. 62, Jan./Jun. 2016 Semestral.

ISSN 0104-8112

1. Educação superior - Periódicos. I. UniFil – Centro Universitário Filadélfia.

CDD 378.05

Bibliotecária Responsável Erminda da Conceição Silva de Carvalho CRB9/1756

CENTRO UNIVERSITÁRIO FILADÉLFIA

REITOR Dr. Eleazar Ferreira

PRÓ-REITOR DE ENSINO DE GRADUAÇÃOProf. Ms. Lupercio Fuganti Luppi

PRÓ-REITOR DE EXTENSÃO E ASSUNTOS COMUNITÁRIOSProf. Dr. Mario Antônio da Silva

PRÓ-REITORA DE PÓS-GRADUAÇÃO E INICIAÇÃO A PESQUISAProf.ª Dra. Damares Tomasin Biazin

Coordenadores de Cursos de Graduação Administração Prof.ª Ms. Denise Dias Santana

Agronomia Prof. Dr. Fábio Suano de Souza

Arquitetura e Urbanismo Prof. Ms. Ivan Prado Júnior

Biomedicina Prof.ª Dra. Karina de Almeida Gualtieri

Ciência da Computação Prof. Ms. Sérgio Akio Tanaka

Ciências Contábeis Prof. Ms. Eduardo Nascimento da Costa

Direito Prof. Dr. Osmar Vieira

Educação Física Prof.ª Ms. Rosana Sohaila T. Moreira

Enfermagem Prof.ª Ms. Thaise Castanho da S. Moreira

Engenharia Civil Prof.ª Ms. Carolina Alves do Nascimento Alvim

Estética e Cosmética Prof.ª Ms. Mylena C. Dornellas da Costa

Farmácia Prof.ª Ms. Fabiane Yuri Yamacita Borim

Fisioterapia Prof.ª Ms. Heloisa Freiria Tsukamoto

Gastronomia Prof.ª Esp. Cláudia Diana de Oliveira

Logística Prof. Esp. Pedro Antonio Semprebom

Medicina Veterinária Prof.ª Dra. Katia Cristina Silva Santos

Nutrição Prof.ª Esp. Lucievelyn Marrone

Psicologia Prof.ª Dra. Denise Hernandes Tinoco

Sistemas de Informação Prof. Ms. Sérgio Akio Tanaka

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ISSN 0104-8112

TERRA E CULTURAAno XXXII - Edição 62

CONSELHO EDITORIAL

PRESIDENTEProfª Drª Damares Tomasin Biazin

CONSELHEIROS

Conselho Editorial Interno

Prof.ª Ms. Ana Claudia Cerini TrevisanProf.ª Dra. Damares Tomasin Biazin Prof.ª Dra. Denise Hernandes TinocoProf.ª Ms. Elen Gongora MoreiraProf. Dr. Fábio Suano de SouzaProf. Dr. João JulianiProf. Dr. Leandro Henrique MagalhãesProf. Dr. Marcos Roberto GarciaProf.ª Ms. Maria Eduvirge MarandolaProf.ª Dra. Miriam Ribeiro Alves MaiolaProf.ª Dra. Mirian Cristina MarettiProf.ª Ms. Mirian Maria Bernardi MiguelProf.ª Ms. Patricia Martins C. BrancoProf.ª Dra. Selma Frossard CostaProf. Ms. Sérgio Akio TanakaProf.ª Ms. Silvia do Carmo P. FachineeliProf.ª Dra. Suzana Resende LemanskiProf. Dr. Tiago Pellini

Conselho Editorial Externo

Prof. Ms. Adalberto BrandalizeProf.ª Ms. Angela Maria de Souza LimaProf. Ms. Eduardo M. de A. MaranhãoProf.ª Dra. Gislayne F. L. Trindade Vilas BoasProf. Ms. José Antônio BaltazarProf. Ms. José Augusto Alves NettoProf. Dr. José Miguel Arias NetoProf.ª Ms. Karina de Toledo AraújoProf. Dr. Lourival Antonio Vilas BoasProf. Ms. Marcelo Caetano de Cervec RosaProf.ª Ms. Maria Elisa PachecoProf.ª Ms. Patricia QueirozProf. Ms. Pedro Lanaro FilhoProf. Dr. Rovilson José da SilvaProf.ª Ms. Silvia Helena CarvalhoProf.ª Ms. Elis Carolina de Souza FatelProf. Dr. Rodrigo Duarte Seabra

REVISORESPriscila Tomasin Biazin

SECRETARIARosimara de Araújo

EDITORIAL

A Revista Terra e Cultura: cadernos de Ensino e Pesquisa em sua edição de número 62, mantendo sua tradição multidisciplinar, publica artigos de três núcleos: Núcleo de Ciências Biológicas e da Saúde, Núcleo de Ciências Humanas e Sociais, Núcleo de Ciências Sociais Aplicadas e Núcleo de Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias. No que se refere ao núcleo de Ciências Biológicas e da Saúde, apresentamos artigos que abordam o perfil nutricional de escolas da rede municipal, interações medicamentosas entre outros. Já no âmbito das Ciências Humanas e Sociais e das Sociais Aplicadas, temos artigos da área de contabilidade, teologia, dentre outros. E no Núcleo de Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias, artigo na área de desenho urbano.

Espero que gostem e que aproveitem a leitura. Lembramos ainda que o envio de artigos para a revista é contínuo, e podem ser encaminhado para o e-mail [email protected], respeitando-se as normas do periódico, que podem ser encontradas no final da mesma.

Boa Leitura.

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SUMÁRIO

NÚCLEO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE – NCBS

DIFERENTES TERAPIAS NO TRATAMENTO DO DIABETES MELLITUS TIPO 1 11SOUZA, A.G.; SILVA, C.V.

GASTRONOMIA E MÍDIA: crescimento dos quadros culinários em programas de televisão 19BARBOSA, C.R.; BARBOSA, L.R.; BIAZIN, D.T.

INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS NO BLOQUEIO NEUROMUSCULAR DESPOLARIZANTE NA ANESTESIA GERAL 33MELO, M.B.; PONCES, M.Y.; BORIN, F.Y.Y.; BRUNIERA, L.B.

PERCEPÇÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE ATIVIDADE FÍSICA E QUALIDADE DE VIDA DE FREQUENTADORES DE ACADEMIAS DO MUNICÍPIO DE CAMBÉ-PR 43MARQUI, L.A.; RUAS, E.A.

PERFIL NUTRICIONAL DE ESCOLARES DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE LONDRINA-PR. 57PONTES, F.P.; PIRES, C.R.

RELAÇÃO DA QUALIDADE AMBIENTAL E OS PARÂMETROS ABIÓTICOS EM CÓRREGOS DE CABECEIRA NA BACIA DO RIO TIBAGI 65TOZZO, R.A.; SOUZA, F; FROTA, A.

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO MOTORA, EQUILÍBRIO E RISCO DE QUEDAS DE INDIVÍDUOS PÓS ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO E SUA CORRELAÇÃO COM A INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL E A PERCEPÇÃO DE QUALIDADE DE VIDA: um estudo transversal 73INACIO, N.R.; SILVA, T.A.; TSUKAMOTO, H.F.

NÚCLEO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS – NCHSNÚCLEO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – NCSA

JOGOS DE EMPRESAS: avaliação da cognição em relação ao processo de tomada de decisão e formação de estratégia. 87BERTO, A.R.; BERTO, J.V.

LIDERANÇA SERVIDORA: uma proposta inovadora na gestão empresarial 99OLIVEIRA, A.A.; SANTOS, V.M.B.M.; BIAZIN, D.T.

O HISTORIADOR NO MUNDO GLOBALIZADO CONTEMPORÂNEO: entre dilemas, crises e (in)determinações 111KUPPER, A.

PLANEJAMENTO: uma ferramenta de gestão do assistente social 121SILVA, J.G.

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E SEUS BENEFÍCIOS PARA AS EMPRESAS DE LUCRO REAL 131GIROLDO, A.R.; FIORI, D.H.; ITO, F.T.; CARNEVALLI, M.H.; GAION, A.V.F.

NÚCLEO DE ARQUITETURA, URBANISMO E TECNOLÓGICO – NAUT

O DESENHO URBANO INTERVINDO NA QUALIDADE DE VIDA EM ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS 137CAMILO, C.B.

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NÚCLEO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE – NCBS

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DIFERENTES TERAPIAS NO TRATAMENTO DO DIABETES MELLITUS TIPO 1

DIFFERENT THERAPIES FOR THE TREATMENT OF DIABETES MELLITUS TYPE 1

Amanda Gomes de Souza¹ Camila Vieira da Silva²

RESUMOOs estudos realizados para o tratamento de diabetes mellitus tipo 1, almejam terapias que estabilizem o quadro dos insulinodependentes. Vários autores apontaram que as insulinoterapias, como método convencional, ainda não proporcionam o controle glicêmico equilibrado. Porém novas terapias promissoras tem surgido, dentre elas, o transplante de células tronco hematopoéticas (TCTH), que prometem a reprogramação imunológica. O presente trabalho destaca os avanços destas novas terapias em um diagnóstico precoce para proporcionar uma melhor qualidade de vida através do controle glicêmico aos portadores. PALAVRA-CHAVE: DM1, insulinodependentes, autoimunidade, TCTH.

ABSTRACTStudies for the treatment of diabetes mellitus type 1, crave therapies that aim to stabilize the condition framework of insulin dependent. Several authors pointed out that the insulinoterapias as conventional method, not yet provide a balanced glycemic control. But promising new therapies have emerged, among them, the hematopoietic stem cell transplantation (HSCT), which promise immune reprogramming. This paper highlights the advances of these new therapies in early diagnosis to provide a better quality of life through blood glycemic control to patients.KEYWORDS: DM1, Insulin dependent, autoimmunity, HSCT.

INTRODUÇÃO

De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) (2014), a incidência de portadores de diabetes mellitus tipo 1 (DM1) em 100 mil indivíduos com menos de 15 anos no Brasil equivale a 7,6, porém este número tende a crescer.

Por se tratar de uma doença autoimune, atribuída a destruição das células betas pancreáticas do pâncreas, a doença provavelmente vai progredindo lentamente por alguns anos. Ao se manifestar, primariamente ocasiona hiperglicemia e cetose, sabe-se que as células secretoras de insulina apresentam densidade baixa ou ausência nas ilhotas pancreáticas (SESTERHEIM; SAITOVITCH; STAUB, 2007).

O tratamento mais tradicional, chamado insulinoterapia, característico de injeções subcutâneas diárias de insulina humana solúvel e associação de análogos com ação rápida, buscam melhor controle metabólico, porém apenas diminuem a incidência de complicações microvasculares (TOLWINSKA; GLOWINSKA-OLSZEWSKA; BOSSOWSKI, 2013).

Alternativas estão sendo estudadas para obter o controle correto, entre elas a terapia com células tronco com grande evolução na ciência, demonstrando resultados esperançosos na patogenia (ABDELHAY et al., 2009). Uma linha de pesquisa é a utilização de células tronco do próprio diabético para controlar seu sistema imunológico (RUIZ et al.,2009).

Por apresentar uma interação entre respostas imunológicas, fatores genéticos e influências do meio ambiente, o DM1 diagnosticado no início da doença contribui para esta terapia avançada de Transplante Autólogos de Células Tronco Hematopoéticas (TCTH) (RUIZ et al., 2009).

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são marcadores como, anticorpos anticélulas das ilhotas (I-CAs), anti-insulina (IAAs), antiácido glutâmico descarboxilase (GAD-65) como citado anteriormente e antitirosino fosfatases IA-2 e 1A-2B, presentes no sangue dos portadores da doença em estágio inicial, possibilitando identificar indivíduos com risco elevado (PIHOKER; GILLIAM; LERNMARK, 2005).

As infecções virais especialmente o enterovírus Coxsackie e Rubéola, estão associados com o processo autoimune da doença. A falta de vitamina D no organismo por dietas precoces e alimentação (amamentação e introdução do leite de vaca prematuro, cereais e glúten) também são vistos como fatores determinantes. A partir de estudos realizados viabilizou a indicação de outros fatores como vacinas, estresse emocional e agentes sanitários (SESTERHEIM; SAITOVITCH; STAUB, 2007). Porém as infecções virais são geralmente os principais iniciadores de lesões pancreáticas, atuando através de indução de autoimunidade específica para célula beta, infecção direta e destruição das células betas (TANNUS et al., 2007).

Calliari (2004) descreve que a autoimunidade pode estar ligada a outros antígenos extrapancreáticos, partindo da explicação de que a presença de autoanticorpos contra mais de um órgão, cause a desordem autoimune, devido à presença de doença celíaca e tireoidite linfocítica crônica. Segundo Silva, Mory e Davini (2008), afirmam em seu trabalho que os agentes ambientais são apontados como gatilhos da autoimunidade.

Suscetibilidade Genética

Para Fernandes et al. (2003) o diabetes tipo 1 apresenta supostos genes de associação, compreendido como suscetibilidade herdada. Esses genes são do Complexo Principal de Histocompatibilidade (MHC ou CPH) também chamados no ser humano de HLA, estão inseridos no braço curto do cromossomo 6, dividido em três grupos, no qual apenas dois são de maior importância.

“O HLA de classe II, que codifica moléculas envolvidas com a apresentação de antígenos para os linfócitos CD4+, consiste no marcador genético mais forte, embora o HLA de classe I, em alguns casos, também o seja” (ALVES et al., 2005, p. 109).

O principal locus encontrado no desenvolvimento da diabetes mellitus tipo 1, que está presente na região que codifica moléculas MHC classe II (DR,DQ e DP) no cromossomo 6p21 (HLA-D), verificado a partir do mapeamento de 20 regiões cromossômicas, no qual 13 são mais significantes (FERNANDES et al., 2003).

Observou-se que a maioria dos portadores de DM1, apresentam os alelos DR3 ou DR4, com genes HLA DQB1*0302 e DQB1*0201, DQA1*0301, DQA1*0501 (FERNANDES et al., 2003). Entretanto as combinações gênicas podem variar de acordo com a diversidade étnica das populações (ALVES et al., 2005).

A identificação dos alelos de histocompatibilidade aponta que a diversidade alélica em nível populacional tenha sido desenvolvida através de agentes patógenos. As formas de conversão gênica e a mutação de ponto como formas de diversidade alélica, considerando α e β, as regiões com maior polimorfismo. O tratamento preventivo foi recomendado para pacientes com história familiar de DM1, que apresentam autoanticorpos contra antígenos pancreáticos e positividade para o alelo HLA-DQB1*0302 (DONADI, 2000).

Existem estudos que acreditam que alguns subconjuntos podem diminuir o risco

Este presente trabalho pretende descrever os tratamentos convencionais e compará-los com os métodos mais avançados que ainda estão sendo estudados na tentativa de conseguir um melhor controle desta doença.

METODOLOGIA

Esta revisão foi construída através do levantamento de dados já existentes, utilizando, as bases de dados LILACS, MEDLINE, SCIELO, onde foram consultados artigos científicos de pesquisa e de revisão. Foram utilizados os termos, diabetes mellitus, diabetes mellitus tipo 1, insulinodependentes, DM type 1, autoimune, insulinoterapias, transplantes de pâncreas, transplantes de ilhotas, novas terapias, células tronco e TCTH. Os critérios de seleção foram através do título e resumo dos artigos. Os critérios de inclusão são artigos e nacionais e internacionais, autores que são referência no assunto, com publicações entre 1998 e 2015.

DESENVOLVIMENTO

Ação da Insulina

O hormônio insulina tem como principal função metabólica aumentar o nível de transporte de glicose do sangue para os tecidos periféricos do corpo. A liberação deste hormônio acontece nas células betas pancreáticas, que são estimuladas pela própria glicose. Uma vez a insulina secretada, se liga ao receptor insulínico das células dos tecidos periféricos, promovendo respostas intracelulares e tornando possível a captação de glicose, proporcionando o controle glicêmico (FORJAZ et al.,2002).

No DM1 as células betas não conseguem acompanhar o aumento da necessidade de insulina, então ocorre uma grande concentração de glicose no sangue, decorrente do processo de autoimunidade (HABER et al., 2001).

Autoimunidade

Embora o início clínico do DM1 seja abrupto, a autoimunidade acontece, após células T autoreativas serem ativadas pelo sistema HLA (human leukocyte antigen) expressando antígenos próprios. Este evento acontece devido a uma falha no desenvolvimento da tolerância aos autoantígenos das células betas das ilhotas de Langerhans, que resultam em mecanismos imunológicos celulares e humorais (ALVES et al., 2005).

Dos mecanismos celulares estão incluídos linfócitos T CD4+ e CD8+, linfócito B, macrófagos e células dendríticas. Com a participação do sistema de HLA classe II, primariamente os linfócitos T CD4+ causam insulite, caracterizada como necrose celular das ilhotas, através da apresentação dos autoantígenos feita pelos macrófagos e células dendríticas (SESTERHEIM; SAITOVITCH; STAUB, 2007). Em seguida, os linfócitos T CD8+ destroem as células betas pancreáticas diretamente por citólise ou por indução de apoptose em conjunto com citocinas secretadas pelos macrófagos. Os linfócitos B agem também na apresentação de autoantígenos, principalmente do autoantígeno GAD-65 (ácido glutâmico descarboxilase) (FERNANDES et al., 2005).

Dos mecanismos humoral a detecção de autoanticorpos com maior presença,

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da doença, como a presença do alelo DR4, subconjunto DRB1*0403. Faz-se importante para melhores afirmações, o mapeamento genético principalmente para pessoas que possuem parentescos de primeiro grau com histórico de DM1, podendo diagnosticar precocemente, evitando o aparecimento de episódios de cetoacidose (GROSS et al.,2002).

Característica da doença

A incidência de diagnóstico de insulinodependentes é maior na infância e adolescência, que acomete manifestações clínicas de cetose e até mesmo hiperglicemia (ROITT, 2013). A cetose em diabéticos é resultado da desordem de uma via metabólica que ocorre para ministrar energia e tem fins benéficos. A falta de insulina faz com que essa via metabólica não seja regulada causando descontrole e produção excessiva de ácidos graxos que decorrem em queda de pH sanguíneo, podendo se agravar pela inativação de enzimas presentes no sangue ( JAMESON, 2014).

Conforme a UK Prospective Diabetes Study (UKPDS) Group (1998) sintomas como poliúria, polidipsia, perda de peso, polifagia e visão turva estão relacionadas a hiperglicemia, que podem estar agregados a danos, como disfunção e falência de vários órgãos.

É comum o desenvolvimento das macroangiopatias, que comprometem as artérias coronarianas, dos membros inferiores e as cerebrais. Outras complicações também são conhecidas no DM e englobam as microangiopatias, afetando, especificamente, a retina, o glomérulo renal e os nervos periféricos (FERREIRA; SAVIOLLI; VALENTI; ABREU, 2011).

Insulinoterapia

O tratamento padrão, principalmente para conter as crises de hiperglicemia, são as injeções subcutâneas diárias de insulina humana solúvel e associação de análogos com ação rápida, denominadas insulinoterapia e também algumas recomendações feitas pelo Diabetes Control and Complications Trial (DCCT), como significativas mudanças na conduta do paciente: automonitoramento da glicose sanguínea capilar, três a quatro vezes por dia, mudanças nas rotinas alimentares, prática de atividades físicas e adequação das doses de insulina de acordo com a alimentação e os exercícios ( JOSE et al., 2009).

As insulinoterapias, foi sem dúvida um grande avanço para o tratamento da Diabetes mellitus tipo 1, que acomete desde a purificação da insulina animal, passando para insulina humana sintética, utilizando-se DNA recombinante. Mais recentemente síntese de insulina de ação rápida e prolongada até mesmo à insulina inalada. A administração subcutânea é a forma mais apropriada para imitar a liberação fisiológica de insulina pelo pâncreas (PIRES; CHACRA, 2007).

O modelo de tratamento com insulina basal (NPH,glargina e detemir), que previne a hiperglicemia de jejum e interprandial, associado à insulina em bolus (regular,aspart, lispro, glulisina) para controle da glicemia após as refeições é o método preferido para alcançar e manter o controle glicêmico em pacientes internados fora da unidade de terapia intensiva (BALTHAZAR; RIGON, 2013).

Afinal as doses insulínicas ideais são aquelas convencionadas individualmente, que proporcionem melhor controle metabólico (PIRES; CHACRA, 2007). Conforme Nery

(2008) os tratamentos feitos com insulinoterapias apresentam constantes episódios de hipoglicemia, sendo uma barreira para o controle glicêmico.

Transplante de Pâncreas e Ilhotas

Outra alternativa específica para o tratamento DM1 é o transplante de pâncreas isolado, recomendado para pacientes com boa reserva cardíaca e função renal controlada, como também problemas emocionais e clínicos que se encontram incapazes do automanejo de insulinas exógenas (SÁ et al., 2008). Indicado e realizado o transplante após aproximadamente 20 anos do diagnósticos da doença, promove imunossupressão no decorrer da vida para se evitar rejeição e desencadear um novo processo autoimune (AMERICAM DIABETES ASSOCIATION POSITIONAL STATEMENTS, 2006).

Melhores resultados são encontrados em pacientes que fazem transplante duplo de pâncreas e rim, esses com insuficiência renal grave. Embora controverso, vários estudos evidenciam melhora de algumas das complicações crônicas do diabetes e ganho em anos de vida aos pacientes (SÁ et al., 2008).

Segundo Eliaschewitz et al. (2009, p. 21) transplante de pâncreas desencadeou estudos e experimentos que chegaram até o transplante de ilhotas de Langerhans, estas presente entre 1% e 2 % da massa celular do órgão. As ilhotas são implantadas no fígado por infusão na veia porta, onde o acesso ao sistema venoso portal se faz através de cateterização transcutânea dirigida por ultrassonografia. O fígado tem uma capacidade elástica de acomodar o volume da infusão e pelo fato de que a insulina ser fisiologicamente secretada no sangue portal, ou seja, foi o órgão escolhido para a implantação e pelo sucesso clínico alcançado com este sítio.

Porém, segundo Rodrigues (2012) requerem terapia imunossupressora por toda vida, que consiste em medicações para a sobrevivência do enxerto. Relatos também indicam que após cinco anos do procedimento, poucos pacientes ficaram livres das insulinas exógenas, por este motivo não se deve titular como um modo seguro de atingir o controle glicêmico (POSSELT et al., 2010).

Transplante de Células Tronco

As células tronco estudadas na terapia de diabetes mellitus tipo 1 são as hematopoéticas que se encontram na medula óssea e sangue periférico do adulto, ou no cordão umbilical e fígado fetal (INCA, 2010). Os estudos de células tronco afirmam que essas células, são capazes de diferenciação em mais de uma linhagem celular, para produzir células filhas maduras e autorrenovação (ABDELHAY et al. , 2009).

O transplante de células tronco hematopoéticas (TCTH) busca reprogramação imunológica na doença (RUIZ et al., 2009). Em estudos acredita-se que existem dois tipos de células tronco hematopoéticas (CTH), as de longo prazo( CTH-LP), sua capacidade de autorrenovação é baixa, já as CTH de curto prazo( CTH-CP) geram progenitores multipotentes (SILVA- JUNIOR; ODONGO; DULLEY, 2009).

A obtenção das CTH para o transplante pode ser de três formas, destas, alogênico, vindo de familiares ou não familiares, mas que sejam compatíveis. Singênico nos casos de quando se tem irmão gêmeo, ou autólogo quando se obtém do próprio corpo do indivíduo insulinodependente, este último com maior aceitação, nas doenças autoimune

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(SILVA-JUNIOR; ODONGO; DULLEY, 2009). Autólogo também obtém uma grande quantidade de células satisfatórias para o transplante (SENEGAGLIA et al, 2009). De acordo com Ruiz et al. (2009) o TCTH autólogo ou autogênico é sugerido por apresentar menor toxicidade e mortalidade do transplante.

A indicação do TCTH autólogo para tratamento do Diabetes Mellitus tipo 1, são para pacientes com diagnóstico com a menos de seis semanas, por neste período ainda possuírem uma boa parte das células betas pancreáticas (VOLTARELLI; COURI, 2009). Esses pacientes normalmente apresentam casos de DM na família ou possuem informação anteriores sobre os sintomas, sendo o diagnóstico a confirmação de uma suspeita prévia (SANTOS et al.,2012).

Dos procedimentos, a medula óssea é retirada durante o processo de remissão da doença, após preservada para mais tarde a infusão (VOLTARELLI et al., 2010). As células tronco hematopoéticas são congeladas, e posteriormente, após duas semanas são ligada na infusão, com imunossupressão, em altas doses diárias. “É como se fosse um desligamento do sistema imunológico, com quimioterapia, em ambiente hospitalar, usando drogas como ciclofosfamida e globulina antitimocitária endovenosas, durante cinco dias” (MORAES, 2015).

A possibilidade de impedir a destruição em massa das células betas pancreáticas, produtoras de insulina, promovendo sua conservação e regeneração, desse modo elas voltariam a produzir insulina (SANTOS et al., 2012).

Uma das pesquisas, afirmam que a maioria dos pacientes ficaram livres da insulinoterapia por períodos que variaram de 6 meses a 8 anos (SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES, 2014). Este tipo de tratamento não provoca a cura da doença, mas sim estabiliza o quadro desta, já que TCTH é indicado para pacientes que tiveram diagnósticos recentes, pois o restante das células betas, que ainda não foram destruídas, passam a produzir insulina de forma adequada novamente (RUIZ et al., 2009).

CONCLUSÕES

O diabetes mellitus tipo 1 não apresenta possível prevenção, já que vários fatores contribuem para o aparecimento da patogenia, mas alternativas foram citadas para diminuição de quadros graves de hiperglicemia. Mesmo que os portadores associem as doses de insulina ao monitoramento da glicose, alimentação equilibrada e atividades físicas, para adequação das insulinoterapias, ainda podem ocorrer falhas que ocasionam desvios na glicemia. O transplante de pâncreas e ilhotas de Langerhans mostrou a necessidade de medicamentos para sobrevivência dos enxertos por toda vida que podem desenvolver outras complicações, visto também que são de doadores e não sendo indicados para todos os insulinodependentes. Em comparação aos tratamentos citados, a terapia com células tronco apresentou menor toxidade, devido a célula vir do próprio portador e melhor controle glicêmico. Apesar de exigir imunossupressão por determinado tempo, seus resultados são animadores, pois evitará as agulhadas diárias, que proporcionam desconforto e preocupação aos insulinodependentes, resultando numa melhor qualidade de vida. Porém estudos mais avançados devem ser realizados para que os portadores possam desfrutar de terapias avançadas, como TCTH e que investimentos sejam feitos para não mais restringir somente alguns casos.

REFERÊNCIASABDELHAY, E. S. F. W. et al. Células-tronco de origem hematopoética: expansão e perspectiva de uso terapêutico. Revista brasileira de Hematologia e Hemoterapia, Rio de Janeiro, p. 2-8, Out. 2009.

ALVES, C. et al. Associação do sistema de histocompatibilidade humano (hla) com doenças endócrinas auto-imunes. Revista Baiana de Saúde Pública, Salvador, p. 105-120,jan./ jun.2005.

AMERICAN DIABETES ASSOCIATION POSITIONAL STATEMENTS. Pancreas and islet transplantation in type 1 diabetes. Diabetes Care. 2006;29:935.

BALTHAZAR, A. P. ; RIGON, F. A. Avaliação dos diferentes esquemas de insulinoterapias prescritos aos pacientes hiperglicêmicos do Hospital Governador Celso Ramos, Florianópolis, SC, Brasil. Arq. Catarinenses de Medicina, Florianópolis, p. 34-39, Jan./Mar. 2013. Disponível em : <http://www.acm.org.br/revista/pdf/artigos/1210.pdf> . Acesso em : Abr. 2015.

CALLIARI, L. E. P. A autoimunidade extra-pancreática no DM1: pesquisando também doença celíaca. Arq Bras Endrocrinol Metab, São Paulo, v. 48, n. 6, p.785- 786, Dez. 2004. Disponível em : <http://www.scielo.br/pdf/abem/v48n6/a01v48n6.pdf>. Acesso em : 14 mar. 2015.

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GASTRONOMIA E MÍDIA: crescimento dos quadros culinários em programas de televisão1

Carolina Rocha Barbosa2

Luciana Rocha Barbosa3

Damares T. Biazin4

RESUMOA gastronomia como objeto de estudo se deu por sua projeção atual nos meios de comunicação, pela relação instintiva de sobrevivência e relação social que os homens mantêm com os alimentos. Enquanto campo de conhecimento é preciso que a gastronomia se torne visível e faça parte dessa História, até porque ela se apresenta como um grande desafio para os profissionais que se aventuram nessa área, visto que a busca por informações é árdua já que além de exigir uma integração de saberes, existe uma latente carência de estudos que envolvam o tema ou que se proponham investigá-lo. Assim foi feita uma pesquisa bibliográfica, com o objetivo de levantar um panorama sobre os quadros de culinária nos programas de televisão e confirmar a influência do mesmo e verificar se existe mudanças comportamentais no cotidiano dos telespectadores. Pela falta de material publicado, todos os materiais obtidos foram utilizados nesta pesquisa, sem determinação de tempo. Dessa forma, após análise dos textos escolhidos, foi apresentada uma visão crítica da mídia enquanto canal de veiculação da gastronomia como cultura, assim como o crescimento e afirmação do tema na sociedade contemporânea.PALAVRAS CHAVES: Gastronomia, mídia, cultura, culinária e programas de culinária.

ABSTRACTGastronomy as an object of study was given by its current projection in the media, the instinctive respect of survival and social relationship that men have with food. While knowledge of the field is necessary that the food is visible and part of that history, because it presents a major challenge for professionals who venture in this area, as the search for information is difficult as well as require a integration of knowledge, there is a latent lack of studies involving the subject or which intend to investigate it. Thus a literature search was made, with the goal of raising an overview of the paintings of cooking on television programs and confirm the influence of it and check for behavioral changes in the daily lives of viewers. The lack of published material, all materials were used in this research without determination of time. Thus, after analysis of selected texts, a critical view of the media as gastronomy serving channel as culture was presented, as well as growth and theme statement in contemporary society.KEYWORDS: Gastronomy, media, culture, cuisine and cooking shows.

INTRODUÇÃO

A alimentação, como outras práticas da vida privada, é de tal forma deixada de lado pela História que é possível se esquecer de que se trata de uma importante parcela da vida sociocultural dos povos.

E enquanto campo de conhecimento é preciso que a gastronomia se torne visível e faça parte dessa História, até porque ela se apresenta como um grande desafio para os profissionais que se aventuram nessa área. Além de exigir uma integração de saberes, existe uma latente carência de estudos que envolvam o tema ou que se proponham investigá-lo, bem como a ausência de uma literatura específica. A mais tradicional das vertentes modernas de estudos culturais da alimentação é a dos livros sobre história da culinária, que têm como base compilações de receitas e derivações em um terreno estético, de história do gosto, que se imbrica com a história dos hábitos, dos costumes e das modas (CARNEIRO, 2003).1  Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Alta Gastronomia do Centro Universitário Filadélfia – UniFil.2  Jornalista, Chef de cozinha e Especialista em Alta Gastronomia pela UniFil.3  Pedagoga, Chef de cozinha e Especialista em Alta Gastronomia pela UniFil.4  Enfermeira. Doutora  em Enfermagem. Docente  do Curso  de Especialização  em Alta Gastronomia  da UniFil. Orientadora  do Trabalho.

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No entanto, a história da alimentação não é somente a dos alimentos e tampouco se restringe a um discurso gastronômico. Os sabores são algo mais do que o desfrute de um sentido que indica a comestibilidade das coisas.

O gosto diferenciado é o que caracteriza os diferentes povos e as diferentes épocas de uma mesma cultura, já que a maturidade de uma cultura foi identificada não apenas com as suas conquistas espirituais ou realizações materiais, mas com o grau de elaboração de suas técnicas e criações alimentares, que são, ao mesmo tempo, expressão técnica material e inventividade artística (CARNEIRO, 2003). Até porque, está na alimentação uma dupla natureza, a de primeira necessidade do homem e a de prazer, culturalmente ratificado, e que se traduz pela estética da gastronomia.

Pretende-se com esse trabalho, responder perguntas que hoje se encontram sem respostas, justamente pela dificuldade em encontrar a solução em livros publicados. De que maneira a gastronomia, constituída como prática sociocultural tem sido apresentada na mídia, e até que ponto se pode afirmar que o tema vem sendo abordado com maior frequência? Qual o espaço dado pelas mídias televisivas aos temas gastronômicos e quais os resultados se pode encontrar?

Diante desses problemas, espera-se com essa pesquisa bibliográfica, entender o crescimento da área gastronômica nos últimos anos, bem como o espaço que se abre na mídia para os quadros culinários; confirmar a influência do mesmo e verificar se existem mudanças comportamentais no cotidiano dos telespectadores.

A Gastronomia enquanto formação superior é muito nova, o que dificulta a atuação de profissionais que desejam abordar este tema em pesquisas e estudos. Mas a construção dessa identidade se dá no processo de efetivação da

formação na área, e em sua continuidade, gerando novos pesquisadores oriundos de outras ciências. Segundo Carneiro (2003, p.123) a noção histórica do gosto é um objeto de intensas especulações literárias que abrangem afirmações de identidades culinárias. Não é apenas como um campo específico de investigação da disciplina histórica ou antropológica que a alimentação interessa à ciência e constitui-se em um objeto científico, mas como arte e criação de identidades culturais.

A escolha da gastronomia como objeto de estudo se deu por sua projeção atual nos meios de comunicação, pela relação instintiva de sobrevivência que os homens mantêm com os alimentos, pela potencial interferência desse conteúdo mediado nos hábitos e costumes da sociedade e suas relações de consumo. A mídia trabalha com informações gastronômicas diariamente em diversos programas e publicações. Um olhar desatento pode imaginar que esse conteúdo apenas satisfaz a necessidade de um público-alvo, responsável por preparar refeições caseiras, sem grandes implicações sociais. No entanto, a culinária há muito tempo não é mais praticada somente para satisfazer as necessidades fisiológicas e de sobrevivência, possui relações mais complexas e culturais, está relacionada com o consumo, o mercado e com os valores sociais.

Na busca por respostas que elucidem a relevância do tema, verificou-se a ausência de dados que justifiquem o constante crescimento do ramo gastronômico e a chamada glamorização dos profissionais de cozinha.

Necessita-se de enorme esforço para que questões da gastronomia façam parte dos campos de conhecimento, visto que a busca por informações é árdua já que existe uma grande carência de estudos e bibliografias destinadas a esse tipo de informação.

O estudo da alimentação é um vasto domínio multidisciplinar capaz de oferecer uma síntese de conhecimentos ao reunir os recursos das diversas disciplinas para buscar desvendar em cada período do passado as informações alimentares e para poder efetuar a análise da dinâmica temporal das transformações da alimentação humana.

Diante do exposto, foi o objetivo deste estudo realizar uma pesquisa bibliográfica sobre a relação da gastronomia e a mídia, especificamente a mídia televisiva.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente trabalho pretendeu compreender a relação entre a gastronomia e a mídia e, de forma específica, pontuar a importância do tema para programas de televisão que se utilizam da gastronomia como pauta total ou parcial.

A proposta foi analisar através de pesquisa de bibliográfica nas áreas de gastronomia, mídia e comunicação, de que forma o tema é transmitido e como pode influenciar a programação dos programas de televisão ou até mesmo o comportamento dos telespectadores.

A pesquisa feita com base em dissertações, TCCs, artigos e livros já publicados e que possuem como tema central as palavras-chave: gastronomia, mídia, culinária e programas de culinária.

De acordo com Biazin (2013, p. 85) a pesquisa bibliográfica é “aquela baseada na análise da literatura, já publicada, para a construção de uma base conceitual organizada e sistematizada do conhecimento disponível”, por meio de “teorias, abordagens e estudos que permitam compreender o fenômeno a partir de múltiplas perspectivas”. Sem deixar, no entanto, de resultar em novo enfoque e trazer a luz, conclusões inovadoras.

Pela escassez de material publicado, todos os materiais obtidos foram utilizados nesta pesquisa, sem determinação de tempo.

Dessa forma, após análise dos textos escolhidos, foi apresentada uma visão crítica da mídia enquanto canal de veiculação da gastronomia como cultura, assim como o crescimento e afirmação do tema na sociedade contemporânea.

REVISANDO A GASTRONOMIA

História da alimentação

A alimentação humana se apresenta de forma útil, interessante e mesmo agradável a partir de vários pontos. Sendo a segunda necessidade biológica mais frequente e imperativa, a alimentação ingere-se e participa de todos os atos dos seres humanos. Muitos diriam que a alimentação determina a evolução humana e das espécies, sejam animais ou vegetais, que interagem com o ser humano. “É uma verdade óbvia, esquecida com frequência excessiva, que o alimento não é somente inseparável da história da raça humana, mas básico para ela. Sem

alimento não haveria raça humana e não haveria história” (TANNAHILL apud RENTERÍA, 2007, p. 127).

Aos primórdios da arte culinária associa-se a invenção dos utensílios de pedra ou barro, que proporcionam dietas variadas. Do uso da cerâmica advieram técnicas de preparo, o cultivo da terra, a fabricação de fornos e utensílios. A cozinha expressa as relações do

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homem com o ambiente, o aproveitamento dos produtos, meios e técnicas naturais e desde o princípio contribuiu para a formação de comunidades.

De acordo com Araújo (2005) a refeição-ritual originou-se de preparar carnes de caça para logo consumi-las com a família e os grupos próximos, vez que sem técnicas de conservação os alimentos estragavam-se muito rápido. A refeição em horários certos vem desses antigos ritos, onde a mesa era o centro das relações, simbolizando organização, crítica familiar, alegrias, dissabores, novidades. Na história da alimentação isso veio se quebrar recentemente com o surgimento dos fast-foods, sendo consequência do avanço tecnológico que, segundo Araújo (2005, p.14) “ameaça-se retroceder à fase pré-social que eliminava a fraternidade e a solidariedade”.

A maior revolução na alimentação humana ocorreu no período moderno com a ruptura no isolamento continental, quando o intercâmbio de produtos de diferentes continentes, ocorrido no bojo da expansão colonial europeia, alterou radicalmente a dieta de praticamente todos os povos do mundo.

Além dos metais preciosos, especialmente o ouro e a prata das Américas, os alimentos foram as principais mercadorias do mercado intercontinental. Alimentos indispensáveis e triviais como o trigo, no comércio mediterrâneo e norte-europeu, e exóticos de luxos, como as especiarias do Oriente e, mais tarde, o açúcar da América, inicialmente foram consumos santuários e supérfluos das elites aristocráticas e, depois, tornaram-se necessidades alimentares de massas e um dos motores mais importantes do comércio mundial (CARNEIRO, 2003, p.84).

A história humana marcou-se por uma troca intensa e pela migração de plantas e animais. O comércio de especiarias motivou expedições marítimas e formou impérios coloniais. No século XV, Veneza era o principal empório europeu, a interação mais lucrativa com o oriente. Rompido o isolamento continental e iniciado o intercâmbio de produtos, entrecruzaram-se hábitos alimentares.

Apesar de a gastronomia já existir nos palácios aristocráticos, é com invenções como o fogão a gás, a pasteurização e a refrigeração que ela se desenvolve (ARAÚJO, 2005). A exportação e a importação de produtos ampliaram o espectro de ação dos grandes chefs e a gastronomia começou a se estabilizar no seio da Europa.

Foi somente a partir da Belle Epoque - o período de 44 anos que se estende de 1870, quando Napoleão III foi derrotado na batalha de Sedan, até o início da Primeira Guerra Mundial, em 1914 - foi um período longo de paz e prosperidade em toda a Europa Ocidental; que a comida, sua preparação, apresentação e consumação foram destacadas como formas indispensáveis de civilização. A maneira como essas formas eram praticadas na França, que, sabia-se era modelo para o resto do mundo civilizado, foi incluída entre as aspirações das pessoas bem-educadas.

GASTRONOMIA NA CONTEMPORANEIDADE

A alimentação representa um elemento fundamental da cultura nacional, um espaço privilegiado onde se manifestam as particularidades culturais, reivindicações regionais ou nacionais.

A imagem que Freire (1982) criou da cozinha brasileira ainda persiste e

corresponde tanto a uma realidade quanto a um estereótipo. O que faz com que a indústria do turismo e a mídia, que pretendem vender uma imagem atraente do Brasil, se utilizem desse estereótipo, geralmente para classificar essa cozinha como exótica. Por esse motivo, os anúncios de publicidade sobre as praias paradisíacas do Nordeste incluem sempre a culinária da região.

A comensalidade contemporânea caracteriza-se pela escassez de tempo para preparar e consumir alimentos, por uso de produtos inovadores no preparo e na conservação; pela mudança de local das refeições; pela oferta de produtos em toda a terra (BOLAFFI, 2006).

Essa transformação na alimentação mundial aconteceu como consequência das mudanças comportamentais ocorridas com o avanço da industrialização. A mão de obra tornou-se mais jovem e rotativa. A comunicação à mesa cedeu espaço a descartáveis e fast-foods. Simplificaram-se e homogeneizaram-se os processos culinários.

Sustentam-se duas faces para o fenômeno: a diminuição das necessidades calóricas, dados os perfis ocupacionais e de lazer; a redução da qualidade dos alimentos, por aumento da oferta de produtos industrializados, pelo valor publicitário agregado a eles, pela praticidade maciça superficialmente adequada à vida contemporânea (BOLAFFI, 2006, p.87).

Se a praticidade resolve a falta de tempo doméstica no preparo das refeições, acompanham-na consequências negativas de alimentação industrializada, rápida: contaminação ambiental, excesso de aditivos, padronização de gostos e o aumento de populações obesas ou desnutridas (BOLAFFI, 2006).

Para combater a os fast-foods surge, em 1986, o slow-food, um movimento que deseja resgatar rituais alimentares e outras atividades que envolvem qualidade de vida. Demoradas e fartas refeições norteiam a atitude, sinônimo de comida artesanal – preferencialmente sem agrotóxico e livre da manipulação genética - protetora de prazeres sensoriais oposta ao ritmo stress versus fast-food. Além de gastronômico, o movimento é literário e ambientalista.

Durante a época contemporânea e, particularmente nas ultimas décadas, conheceram-se transformações globais nos padrões alimentares de importantes consequências sociais. A guerra, não só por provocar carências e fomes, mas também por promover mudanças de hábitos e adoção de novos tipos de alimentos, a indústria, por trazer inovações essenciais para a alimentação e o surgimento dos restaurantes, por provocar transformações no comportamento moderno.

A alimentação é assim um fato da cultura material, da infraestrutura da sociedade; um fato da troca e do comércio, da história econômica e social, ou seja, parte da sua estrutura produtiva da sociedade. Mas também é um fato ideológico, das representações da sociedade – religiosas, artísticas e morais – ou seja, um objeto histórico complexo, para o qual a abordagem científica deve ser multifacetada.

MÍDIA X GASTRONOMIA

Gastronomia é a boa mesa; é a atividade de indivíduos que tem um interesse predominante pela comida, as quais experimentam e criticam, e sobre a qual frequentemente teorizam e publicam essas observações. Gastronomia é ainda, a procura deliberada de

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modificações que podem aumentar o prazer da mesa,incluindo sua divulgação por escrito mediante críticas e exposições em livros e

periódicos, porque não se trata só de saber comer, mas também de saber escrever e de se saber representar na tela da televisão.

Comer e entender o porquê de comer melhor é algo que avança cada vez mais nas atenções do público. É um interesse real, é um assunto, é um sinal social, é um fato antropológico, é um prazer mundano. A cobertura dessa movimentação, dessa importância crescente da gastronomia, vem conquistando espaço porque existe uma curiosidade geral a respeito.

Os costumes alimentares, a forma como as pessoas consideram o ato alimentar, por si e no meio de suas outras atividades, refletem as escalas de valores e as áreas de interesse que retêm a atenção dos membros da sociedade.

No entendimento científico, os efeitos socializantes de alimentar-se em grupo harmonizam, fortalecem vínculos e estabilizam estruturas de convívio. Para Araújo (2005), extinguir refeições regulares desestrutura o contato assíduo, indisciplina apetites, induz à solidão, como se o espírito fosse o estômago e a alimentação individual gerasse a não comunhão ao não se socializar o alimento.

Não convidamos pessoas para jantar em nossa casa a fim de alimentá-las como corpos biológicos, mas para alimentar e reproduzir relações sociais... (...) A comida é uma coisa que, para além da sua materialidade, fala da família, do corpo e de relações sociais (WOORTMANN, 2006, p.25).

Nas relações entre indivíduos, as mudanças sociais transformam ao mesmo tempo as suas normas de comportamento e as suas disposições afetivas, particularmente a respeito do que é sentido como agradável e desagradável. Nesse contexto, encontra-se o entendimento da gastronomia e a partir daí segue-se um refinamento das condutas e um aumento da sensibilidade, que encontram nas boas maneiras e nas conveniências da mesa, a sua expressão.

Desde o aparecimento dos primeiros Meios de Comunicação Social (MCS): imprensa, rádio e televisão; se começou a procurar dar resposta aos eventuais efeitos destes meios na sociedade e qual o seu papel enquanto formadores de opinião e de transmissão de conhecimento. No entanto, o papel destes MCS enquanto elementos que produzem informação e enquanto veículos de transmissão de conteúdos culturais têm sido um dos temas mais aflorados, mas, pouco esclarecidos.

A mídia têm uma forte influência sobre as cambiantes culturais no que diz respeito à produção, reprodução e transformação dessas mesmas cambiantes, uma vez que são afetados os modos de vida, a organização social, os gostos, a língua, o relacionamento entre as pessoas (...) a produção simbólica quotidiana (SOUSA apud SILVA, 2008, p.5).

No mundo contemporâneo, observa-se que a gastronomia é um tema da “moda”. Ser um gastrônomo significa cozinhar com elegância, conhecer temperos, ingredientes refinados e saber se portar nesse universo e tais elementos podem distinguir socialmente quem os incorpora. Jacob (2007) entende esse fenômeno como um modo de se obter sua visibilidade no mundo, característica da indústria cultural.

E o interesse no mundo da gastronomia vai além, pois muitos desses gastrônomos sonham se tornarem chefs e ter o glamour de personagens olimpianos da mídia, como o inglês Jamie Olivier ou o brasileiro Alex Atala — que teve o seu restaurante incluído entre os 38 melhores restaurante do mundo em 2007 —, invejados por seu status de especialistas em gastronomia e pela exposição midiática que conseguem com isso, vendendo a imagem de ricos, bonitos e bem-sucedidos. Hoje, além da faceta ritualística do ato de comer, ela pode ser também um passaporte de status social, já que, para muitos, o interesse com a gastronomia nasce pela possibilidade que ela proporciona de ter visibilidade no mundo da mídia ( JACOB, 2007, p. 4).

De certa forma vincular-se com esse momento contemporâneo, de valorização de atividades que envolvem a gastronomia, é como tornar a comida em uma imagem daquilo que se deseja ser socialmente.

Ao longo do tempo, o tema gastronomia na mídia evoluiu devido a uma série de fatores. Foi pelo aumento do interesse pelo assunto, pela sofisticação do gosto médio, pelo aumento de referências neste universo - mais chefs, mais restaurantes, mais receitas -, pela mudança de cultura alimentar.

Antes, cozinhar em casa era a função materna; depois, as mulheres passaram a trabalhar, e a cozinha virou um espaço para ocasiões especiais, para gourmets, homens em especial; e cada vez mais pessoas passaram a recorrer a restaurantes, como necessidade e como forma de lazer, e o contínuo surgimento dos programas de culinária acompanharam a confirmação da gastronomia como fenômeno social.

Com o avanço das tecnologias, houve um maior fluxo da informação. A culinária deixou os livros e chegou aos programas de TV, que hoje são uma constante na grade de programação das emissoras, um nicho que teve origem em programas voltados ao público feminino.

A TV Tupi de São Paulo produziu diversos programas dirigidos à mulher, principalmente com foco na dona de casa. Segundo Pinheiro (2004), o primeiro programa foi a Revista Feminina, apresentado por Lolita Rios e colocado por Maia (2008) como o primeiro destinado a mulheres a ter periodicidade, trazendo atrações, receitas culinárias, sugestão de filmes, artesanato e entrevistas.

Na década de 90 alguns programas femininos colocaram seu foco na culinária e o que mais se destacou foi a Cozinha Maravilhosa da Ofélia, na Bandeirantes, em 1991, com a chef de cozinha Ofélia Anunciato, cujo estilo tornou-se uma marca dos programas femininos.

Em 1991, a Rede Record lançou o Programa Note e Anote, inicialmente apresentado por Ana Maria Braga e depois por Cátia Fonseca e Claudete Troiano, tendo sido extinto em 2005 (MAIA, 2008). O canal fechado GNT foi pioneiro em apresentar novos formatos de programas culinários, como o Menu Confiança e atrações americanas, como o “Hell´s Kitchen”, “Truques de Oliver” e “Receitas de Nigella”, em uma proposta de atender um público interessado um movimento que coloca a comida como forma de arte. Normalmente, os programas de TV focam mais no preparo do prato em si, tendo como apoio sua página na internet para disponibilizar a receita completa.

Segundo Belda e Gamonar (2014) o conteúdo culinário representado na mídia pode promover forte influência nos hábitos alimentares e no comportamento humano relacionado à gastronomia, sobretudo atualmente com os avanços tecnológicos e o

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acesso a informações do mundo inteiro na televisão e na internet. Nos dias de hoje, a gastronomia está em destaque nos meios de comunicação, nas universidades e na formação de profissionais do ramo. Os programas de televisão com conteúdos gastronômicos e as revistas de grande circulação nacional que trabalham com esse tipo de informação estão em expansão no mercado e dialogam indiretamente com essas questões profundas da evolução humana e sua relação simbólica com os alimentos.

Nunca se viu tamanho interesse no Brasil por programas de gastronomia. Chefs, culinaristas e até artistas de ambos os sexos são convidados a mostrar seus dotes na cozinha eletrônica para um público crescente. Hoje os programas estão mais gostosos, mais culturais. Não tem mais aparência monótona do dia-a-dia.

O interesse na alimentação, além de ser motivado pela questão da sobrevivência, não se restringe à busca pela satisfação puramente fisiológica, sobretudo da forma como é trabalhada nas mídias – está relacionado aos valores sociais, à organização social das famílias, às necessidades de consumo, em sintonia com as particularidades culturais de alimentação, daí a importância de estudar as informações sobre gastronomia na mídia e as particularidades de mediação do sabor em diferentes meios de comunicação.

A inserção do conteúdo gastronômico nos meios de comunicação é explícita, seja nos programas de entretenimento da televisão aberta ou a cabo, seja em matérias e reportagens especializadas nos jornais impressos e revistas. O fato é que o jornalismo especializado em gastronomia está em crescimento, assim como o interesse pelo assunto, atribuindo cada vez mais o status de consumo, de conhecimento e de diferenciação social. (...) Na televisão, a sequencia de imagens e explicações de como executar a receita culinária pode ter correspondência ao conteúdo apresentado na mídia impressa, informando os ingredientes e modo de preparo para atingir o resultado final apresentado na foto ou imagem da receita finalizada. No entanto, cada mídia apresenta particularidades e códigos específicos para a produção de sentido (FREDERICO, 2008, p. 23).

Vemos dessa forma, implicações decorrentes da comunicação de massa, e não podemos deixar de reconhecer sua interferência nas interações humanas. “As formas simbólicas transmitidas via comunicação de massa são, muitas vezes, recebidas em contextos da vida cotidiana e incorporadas ao conteúdo simbólico da interação social” (THOMPSON, 1995, p. 343).

Antes do avanço tecnológico das mídias, a cultura gastronômica era mantida ou transmitida pelas gerações por meio da experiência presencial, pelo contato direto para o aprendizado da culinária ou por meio de livros e cadernos pessoais com anotações de receitas culinárias. As mídias primárias e secundárias eram as principais formas de transmissão e perpetuação do conhecimento das técnicas e receitas culinárias.

A evolução tecnológica permitiu um maior acesso a esse tipo de informação do mundo todo por meio da internet e um volume infinitamente maior de opções de receitas. Houve uma ampliação da dimensão de espaço e alcance públicos, muito maiores do que a dimensão anterior que era doméstica e privada. Hoje, é possível aprender as técnicas culinárias de receitas tradicionais pelas mais diversas formas, como por meio de consultas na internet, em programas de televisão de origens variadas, jornais diversos e grande oferta de revistas desse segmento.

Dessa forma, as informações de culinária mediadas pela televisão, por jornais e revistas devem ser consideradas textos culturais, uma vez que comportam significados

complexos e podem ser classificadas como um gênero discursivo por preencherem uma função comum: a de oferecer informações sobre gastronomia.

O desenvolvimento das mídias visuais, como a televisão e o cinema, contou com uma importante variável: ao representar visualmente uma circunstância, não tem a alfabetização como pré-requisito para estabelecer de certa forma a comunicação, ao contrário do que acontece com livros, jornais e revistas.

A tendência das mídias é cada vez mais utilizar os recursos visuais na comunicação e menos os textuais, pela eficiência da comunicação, rapidez de compreensão e não exigência de conhecimentos específicos para sua apreensão.

A experiência de recepção do conteúdo televisivo, rica em percepção visual e auditiva, não envolve os sentidos de tato, paladar e olfato, embora seja possível fazer referência a esses sentidos mesmo não estando inseridos no processo de recepção. Num programa de culinária é possível falar sobre o aroma dos alimentos, sobre a textura e até mesmo mostrar detalhes de suas características visuais, o que pode dar indícios de como seria a sensação tátil, mas a experiência desse contato físico não é permitida nesse tipo de comunicação mediada.

Mesmo quando a apresentadora Ana Maria Braga saboreia os quitutes durante o programa televisivo Mais Você, da Rede Globo, tecendo seus comentários a respeito do sabor e produzindo sons e gemidos de prazer ao degustá-los, a experiência de recepção da imagem mediada pela televisão não permite que o receptor sinta efetivamente seu sabor. Outra representação comum para o aroma é a presença da fumaça saindo da comida, o que também indica sua temperatura quente. A preparação de alguns alimentos, especialmente quando são levados ao fogo, perfumam o ambiente quando são aquecidos, liberando seu aroma. A reprodução dessa imagem em vídeo ou foto pode remeter, portanto, ao seu aroma, mas a experiência olfativa só será possível em contato direto com o alimento durante esse procedimento.

A produção culinária que prepara o alimento antes de ter sua imagem capturada em fotografia ou vídeo para ser posteriormente disponibilizada

em larga escala é inicialmente o principal recurso de supervalorização dos atributos do objeto. Há uma seleção criteriosa do alimento a ser reproduzido em imagem, escolhendo sua melhor porção, com menos imperfeições naturais de seu processo de preparação, mostrando o que de mais gostoso ele pode oferecer. Ao compor um prato de comida para ser fotografado ou filmado, escolhem-se os pedaços mais bonitos do alimento: o lado mais suculento de um assado, o lado da torta em que os morangos estão mais vermelhos, a fatia do pão em que mais se concentrou o recheio, o bombom com a cobertura de chocolate mais lisinha, entre outros.

Se por um lado esse processo indica uma redução por não mostrar todas as suas facetas (BAITELLO, 2005) ou seja, as imperfeições naturais dos alimentos preparados, por outro lado amplia a possibilidade de indicar o seu sabor, uma vez que valoriza o visual que melhor pode estimular o paladar do receptor (leitor ou telespectador). O encantamento por esses programas se justifica pela desmistificação da gastronomia antes inatingível, dos lindos pratos servidos nos restaurantes e a percepção de que você é capaz de preparar um prato delicioso como os grandes chefs.

Segundo o site ZH entretenimento, a chef Carla Pernambuco, que já apresentou programas na TV, em recente debate na TV Brasil teceu uma tese interessante sobre a

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proliferação da gastronomia nos canais de televisão. De acordo com ela, “a culinária virou quase como o futebol no Brasil. Todo mundo entende e todo mundo tem uma receita para ensinar”. E isso é reflexo, da tamanha exposição do tema na mídia.

Hoje pode-se encontrar nas grades de programação de emissoras de canais abertos e fechados uma diversidade de programas culinários que vão em de encontro com os mais diversos perfis de telespectadores. Se nos primórdios esse tipo de atração estava restrito a programas femininos, agora eles são democráticos. Homens e mulheres, adultos e crianças: há espaço para todo mundo nesse nicho televisivo.

O antigo formato de programa, com a senhora de idade de avental na beira do fogão ensinado o trivial, foi desdobrado em dezenas de modelos. Programas com apelo lúdico para as crianças, com cardápio atrativo para homens, ensino de técnicas para quem pretende se profissionalizar, reality’s que dão dicas para melhorar cardápio de restaurante e shows que colocam amadores ou

profissionais competindo para saber quem cozinha a melhor refeição; entre outros tantos especializados em bolos, festas de aniversário, cozinha natural, viagens gastronômicas onde se degustam viajando pelo interior do país ou em terras longínquas; o que não falta na televisão são programas de culinária.

Destacam-se os reality shows, como a franquia Masterchef, o Cake Boss, de Budy Valastro, os tradicionais programas de receitas, como os dos chefs britânicos Nigella Lawson e Jamie Oliver, além dos programas brasileiros The Taste Brasil, Que Marravilha!, do chef Claude Troigros e Diário do Olivier, do chef Olivier Anquier. Só no canal GNT, da Globosat são mais de 10 apresentadores. Até o público infantil está contemplado nesta tendência. O canal por assinatura Gloob estreou em abril de 2013 o programa “Tem Criança na Cozinha”, onde dois meninos e uma adolescente procuram mostrar que cozinhar não é algo complicado.

O leque é variado. A febre por atrações de gastronomia é tanta que, em outubro de 2014, chegou ao Brasil o Food Network, canal especializado em culinária e comportamento (disponível na operadora Sky) e em abril de 2015 surgiu o programa Chef ’s Table, da Netflix, que é o preferido dos chefs de cozinha. O programa mostra o que está por trás da fama e da culinária de chefs renomados.

A jornalista Cynthia Malta, escreveu para o site Observatório da Imprensa em setembro de 2014, e falou sobre a segmentação do tema. A segmentação fez com que o número desse tipo de atração desse um salto de 38% na grade de programação da TV no país, de julho de 2013 a julho de 2014. Segundo levantamento feito pelo Ibope para o jornal Valor Econômico, em mais de 70 canais abertos e pagos, há 67 programas de culinária sendo veiculados na televisão brasileira – há um ano eram “apenas” 49.

O número de programas aumenta porque a audiência cresce. Novelas, programas de auditório, shows, futebol e jornalismo continuam no topo da lista das atrações mais assistidas pela maioria dos brasileiros. Mas os programas de culinária estão subindo no ranking. No primeiro semestre de 2013 ocupavam a 31ª posição, numa lista de 38. Neste ano, até junho, estão na 26ª.

Em uma entrevista com Cynthia; Fred Muller, diretor executivo comercial da Globosat, falou sobre a segmentação atual: “Culinária é um tema afetivo, capaz de reunir não só as mulheres, mas a família inteira ao redor da mesa ou em frente a TV. Por isso estamos constantemente atrás de novos formatos e

diferentes formas de explorar o tema”. Outro exemplo constata o crescimento do formato de programa são as visualizações no Now, sistema da Net pelo qual o consumidor pode alugar programas como se fosse um serviço de videolocadora, as receitas culinárias foram o conteúdo mais acessado do GNT em junho de 2014. Segundo Muller, foram 145 mil “views” (acessos), um crescimento de 45% com relação a maio.

Segundo a jornalista, esse crescente interesse do brasileiro por temas gastronômicos já vinha sendo notado no mercado de livros há pelo menos quatro anos e pode ajudar a entender o fenômeno na TV. “Este movimento é forte no Brasil e no exterior”, diz Breno Lerner, diretor-geral da editora Melhoramentos, que já tem 10% das vendas atreladas a livros de culinária. Há cinco anos, essa fatia ficava entre 5% e 6%.

Juntamente com o crescimento do ramo gastronômico na TV, crescem também os anunciantes. A Talent é uma das agências que estão recomendando aos clientes anunciar em programas de culinária. “A oferta de conteúdo de programas de culinária aumentou e o horário, o espaço para o anunciante, também”, diz Rafael Amorim, diretor de mídia da Talent. “É possível inserir os produtos dentro do programa, em uma receita que está sendo feita”, diz ele.

Segundo dados do Ibope Media, publicados pela revista especializada “Meio & Mensagem”, os gastos em publicidade do setor de alimentos somaram R$ 1,5 bilhão em 2013. O valor é bem menor quando comparado ao setor de varejo, mas em relação a 2012, o setor de alimentos aumentou a sua verba em 28%.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os textos analisados elucidam a ideia de que o mundo da gastronomia teve grande ascensão após a década de 80 com o surgimento dos programas de televisão. Vive-se um momento de valorização intensa da gastronomia, especialmente na mídia. No entanto, o alvo dos produtos midiáticos de gastronomia mudou. Não atingem mais apenas público formado por donas de casa que passavam suas tardes em casa assistindo aos chamados “programas de

receitas”, os novos interessados em gastronomia são os jovens, de ambos os sexos, crianças, adolescentes, homens e mulheres de perfis variados.

Os jornais estão lançando cadernos especiais sobre o tema, e as revistas, um dos veículos mais antigos a investir nesse ramo, mudaram e cresceram.

Em vista da importância que a mediação representa na interação social dos indivíduos com o mundo e na transmissão cultural de informações, é preciso ter consciência das limitações e possibilidades dos códigos midiáticos para que seja feito o melhor uso de seus recursos.

Com essa monografia, espera-se contribuir para o estudo da gastronomia e suas perspectivas de atuais. Atual e em constante mudança, o universo gastronômico inegavelmente ganhou espaço na mídia televisiva nacional e consequentemente local, criando assim um ambiente favorável a profissão do chef de cozinha, elevando o prestígio do cozinheiro e é cada vez maior o número de cursos técnicos e faculdades que surgem para suprir a demanda de interessados no ramo da alimentação.

O ato de cozinhar evoluiu ao longo dessa trajetória e hoje o ato de comer agora proporciona prazer e também lazer, incentivando que as pessoas se desloquem para

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degustar um prato ou se reúnam para comer. A arte de cozinhar alimentos visto há 10 anos como tradição, hoje pode ser aprendido pela tela da TV. Pois, as técnicas e habilidades antes passadas apenas de geração em geração podem ser encontradas ao toque do controle remoto.

Se hoje, há uma obsessão pela história da mesa, fazendo com que a gastronomia saia da cozinha e passe a ser objeto de estudo é porque a questão da alimentação ganhou a devida importância no campo da história e das reflexões sobre a evolução da sociedade e dos comportamentos sociais.

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INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS NO BLOQUEIO NEUROMUSCULAR DESPOLARIZANTE NA ANESTESIA GERAL

MELO, Maxsuel Borges5

PONCES, Michele Yamabayashi5

YAMACITA-BORIN, Fabiane Yuri6

BRUNIERA, Lenita Brunetto6

RESUMOCom avanço da anestesiologia e da farmacalogia, inúmeros fármacos foram elaborados e são utilizados atualmente durante o procedimento anestésico. Atualmente, na anestesia de uma cirurgia de médio porte, são utilizados pelo menos dez fármacos diferentes durante o procedimento, o que fomenta o surgimento de estudos dessas interações medicamentosas. Durante a anestesia geral, necessária para execução de vários procedimentos cirúrgicos, é imprescindível a intubação endotraqueal para manter o paciente em ventilação mecânica. Na prática clínica dos médicos anestesistas é comum, para realização da intubação traqueal do paciente, a administração do suxametônio junto à sedação do paciente, sobretudo nos casos emergencias de intubação em sequência rápida, promovendo um bloqueio neuromuscular despolarizante. Neste estudo, através de revisão bibliográfica, são identificadas as principais interações farmacológicas com o suxametônio e as possíveis reações medicamentosas resultantes. Diante das interrelações farmacodinâmicas, fica evidente a necessidade de maiores cuidados na administração desses fármacos. PALAVRAS-CHAVE: Anestesia geral. Interações medicamentosas. Suxametônio. Bloqueio neuromuscular despolarizante.

ABSTRACTWith advancement of anesthesiology and farmacalogia, numerous drugs have been developed and are currently used during the anesthetic procedure. Currently, the anesthesia of a midsize surgery, are used at least ten different drugs during the procedure, which fosters the emergence of studies of these drug interactions. During general anesthesia, required for performing various surgical procedures, endotracheal intubation to maintain the patient on mechanical ventilation is essential. In clinical practice of anesthesiologists is common to perform tracheal intubation of the patient, the administration of succinylcholine with the sedation of the patient, especially in cases of emergencies intubation in rapid succession, providing a depolarizing neuromuscular blockade. In this study, through literature review, the main drug interactions with succinylcholine and potential drug reactions result are identified. On pharmacodynamic interrelationships, it is evident the need for greater care in the administration of these drugs.KEYWORDS: General anesthesia. Drug interactions. Succinylcholine. Depolarizing neuromuscular blockade.

INTRODUÇÃO

Com o advento da Anestesiologia no século XIX, a dor deixou de ser um empecilho para o avanço na terapêutica cirúrgica, no entanto, o desenvolvimento dessa especialidade médica sempre esteve associado ao conhecimento e domínio dos fármacos envolvidos no processo. Assim, inúmeros fármacos foram elaborados e são utilizados atualmente durante o procedimento anestésico (CANGIANI, L.M et al; 2011).

Atualmente, na anestesia geral de uma cirurgia de médio porte, são utilizados pelo menos dez fármacos diferentes durante o procedimento: anestésicos locais, anestésicos inalatórios, opióides, bloqueadores neuromusculares, hipnóticos, analgésicos, antiinflamatórios, corticóides, antagonistas seratoninérgicos e dopaminérgicos. A

5 Discentes do Curso de Pós Graduação em Farmacologia com Tópicos Especiais em Farmacoterapia no Centro Universitário Filadélfia;6 Orientadoras do Curso de Pós Graduação em Farmacologia com Tópicos Especiais em Farmacoterapia no Centro Universitário Filadélfia

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segurança dos medicamentos utilizados já é garantida antes de seu uso clínico, no entanto, cabe ao médico anestesista não se ater apenas às características farmacológicas individuais, mas contextualizar as diversas interações medicamentosas com o estado clínico do paciente (CANGIANI, L.M et al; 2011).

Diante disso, não é difícil perceber a necessidade de estudos clínicos que envolvam a interrelação de fármacos. Para realização de uma anestesia geral com segurança, é imprescindível o procedimento de intubação orotraqueal a fim de manter o paciente em ventilação mecânica.

Assim, depois da sedação do paciente, administra-se, por via endovenosa, um bloqueador neuromuscular para permitir a passagem do tubo orotraqueal. Usada durante a intubação endotraqueal em sequência rápida (ISR) nos pacientes com estômagos cheios ou considerados como tal, a succinilcolina (Sch), também denominada suxametônio, é um dos bloqueadores neuromusculares mais disponíveis e utilizados nestes procedimentos (AMERICAN HEART ASSOCIATION, ACLS; 2011). Este fármaco está presente ainda na maioria das unidades médicas brasileiras de atendimento de urgência do sistema único de saúde (SUS), sendo administrado para ISR durante a parada cardiorrespiratória (BRANDÃO, N. et al; 2015).

Diante do uso clínico bastante disseminado do suxametônio, é de grande importância a análise das possíveis interações medicamentosas com esse fármaco. O suxametônio, único bloqueador neuromuscular despolarizante em uso clínico atualmente, ainda se mantém como medicação de escolha quando se prevêem dificuldades na intubação ou se planeja uma intubação orotraqueal em sequência rápida (MACE, S.E; 2008).

O objetivo deste estudo é listar fármacos que possam interferir na ação do suxametônio e alertar sobre os possíveis riscos das interações medicamentosas com o uso deste bloqueador neuromuscular despolarizante.

METODOLOGIA

Estudo realizado através de revisão bibliográfica de livros de referências relevantes nas áreas de farmacologia e anestesiologia, revistas, artigos e materiais disponíveis na biblioteca virtual do site da sociedade brasileira de anestesiologia (www.sba.com.br). Diante da escassez do tema na atualidade, foram consultados estudos desde a década de 60 até o ano de 2015.

PROCEDIMENTO ANESTÉSICO Anestesia geral é definida como um estado reversível de analgesia, hipnose e

inconsciência, induzida, sobretudo por fármacos opióides, hipnóticos e bloqueadores neuromusculares. O fentanil é um dos principais opióides utilizados na indução anestésica, utilizado para diminuir resposta simpática durante intubação traqueal. Os fármacos mais utilizados como hipnóticos são propofol, midazolam, cetamina e etomidato (IRWIN, R.S et al; 7° Ed; 2012).

Almejando um melhor condicionamento para intubação traqueal e ventilação mecânica controlada, são administrados bloqueadores neuromusculares. Estes são classificados como despolarizantes, sendo a succinilcolina a única em uso clínico

atualmente, e os não despolarizantes: rocurônio, atracúrio, cisatracúrio, vecurônio, pancurônio (FLOOD, P., 2005; CANGIANI, L.M et al; 2011).

Em anestesia, a classe de drogas mais relacionadas com choque anafilático são os bloqueadores neuromusculares. Em algumas populações, antibióticos e látex são relacionados em segundo lugar. Como o uso de antibióticos é comum entre a população, muitas vezes o paciente vai relatar se tem alergia a determinado antibiótico. Entretanto, nos pacientes sem histórico anestésico, não é possível prever sua reação ao uso de relaxantes musculares (MERTES, P.M et al; 2010).

O suxametônio, ou succinilcolina, está em uso clínico desde 1951 e, a despeito da supremacia de suas reações adversas em relação aos bloqueadores neuromusculares não despolarizantes, continua sendo administrado até os dias atuais (REVISTA BRASILEIRA ANESTESIOLOGIA; 2002). No Brasil, usa-se com freqüência a succinilcolina na indução anestésica rápida em crianças e adultos (REVISTA BRASILEIRA ANESTESIOLOGIA; 2004).

Como alternativa do suxametônio, para uso em sequência rápida de intubação, pode ser utilizado, em doses de 1,0 a 1,2 mg por kg, o rocurônio, bloqueador neuromuscular adespolarizante com duração de ação intermediária. Na prática clínica, nas condições de dificuldade de intubação, onde é necessária a pronta recuperação do bloqueio neuromuscular, pode ser utilizado o sugammadex na dose de 16 mg por kg, que promove encapsulamento da molécula de rocurônio e subsequente inativação. No entanto o custo elevado desse antagonista ainda inviabiliza seu uso sobretudo no sistema de saúde pública (CANGIANI, L.M et al; 2011).

Diante do uso ainda freqüente do suxametônio, torna-se imperativo o estudo de suas possíveis interações medicamentosas para que possam ser evitados efeitos indesejáveis ao paciente.

ASPECTOS FARMACOLÓGICOS DA SUCCINILCOLINA

A succinilcolina foi introduzida em 1952 por Thesleff e Foldes. É o único bloqueador neuromuscular despolarizante clinicamente utilizado atualmente. É composta de duas moléculas de acetilcolina ligadas através de radical metilacetato; possui início e duração de ação curtos, o que torna essa medicação importante nos casos em que se pressupõe intubação difícil ou indica-se intubação em sequencia rápida (KATSUNG, B.G., et al; 2014; FUCHS, F.D et al; 2010).

O bloqueio neuromuscular resulta da ligação da succinilcolina com seus receptores pós-sinápticos mimetizando a ação da acetilcolina, abrindo os canais iônicos e ocasionando a despolarização da membrana pós-juncional. Ela se liga a receptores colinérgicos nicotínicos, ativando-os, e assim, leva à despolarização inicial da placa motora, inibindo a ligação da acetilcolina a seu receptor. Com essa ligação, a placa motora permanece despolarizada por um tempo maior, fazendo com que os canais de sódio se acomodem (dessensibilização dos receptores nicotínicos) e se fechem (inativação dependente de voltagem). Quando o potencial de ação desaparece, a membrana retorna ao repouso e ocorre o relaxamento muscular, bloqueio despolarizante ou de fase I (MORGAN, G.E et al; 1999).

Seu curto período de ação se deve à hidrólise da succinilcolina pela pseudocolinesterase ou butirilcolinesterase, processo que ocorre muito rapidamente e

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INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS

Interação medicamentosa ou farmacológica ocorre quando um dos fármacos interfere em ação ou efeito do outro fármaco (LAURENCE, L. et al; 2012). É um evento clinico em que os efeitos de um fármaco são alterados pela presença de outro fármaco, alimento, bebida ou algum agente químico ambiental. Constitui causa comum de efeitos adversos (RENAME, 2010).

A incidência de interações farmacológicas clinicamente importantes em pacientes internados aumenta muito com a quantidade de fármacos administrados: 7% (6 a 10 fármacos) para 40% (10 a 20). Os pacientes com probabilidade de desenvolver interação ficaram internados, em média, por quase o dobro do tempo (8 e 15 dias, respectivamente). Embora os valores reais não sejam conhecidos, sabe-se que há um aumento no custo das internações quando associadas à presença de interações medicamentosas (RENAME, 2010).

Já a incidência de interações farmacológicas em pacientes de ambulatório é desconhecida, mas ocorreram entre 2% e 4% das prescrições atendidas em farmácias comunitárias. As interações farmacológicas são uma das causas de reações adversas a medicamentos – RAM. Embora a incidência de RAM decorrentes de interações farmacológicas não seja estabelecida, as RAM foram responsáveis ou contribuíram por 6,6% das internações em hospitais em estudo brasileiro, e 10% em estudo australiano, das quais 4,4% foram imputadas a interações de medicamentos (RENAME, 2010).

Interação de medicações com a Succinilcolina

As interações relativas aos bloqueadores neuromusculares podem se manifestar de duas formas principais: as que refletem alterações na biotransformação (inibição da colinesterase plasmática prolongando o efeito da succinilcolina) e aquelas que podem interferir no processo de transmissão neuromuscular (drogas que agem na propagação do potenciaI de ação no terminal nervoso, as que modificam o influxo do cálcio nesse local através do bloqueio dos canais de cálcio ou por interferência com as enzimas envolvidas nesse processo, as que inibem a síntese da acetiIcolina (ACh) dificultando a transmissão neuromuscular (TNM), as que interferem com a hidrólise da ACh, e, também as drogas que atuam diretamente na fibra muscular, alterando o processo excitação-contração (PEDERNEIRAS, S.G., 1988).

Há uma infinidade de medicações que podem exercer interação medicamentosa com a succinilcolina resultando em aumento ou diminuição de seu efeito. Assim, podemos avaliar as diversas classes de drogas, avaliando o principal mecanismo da interação e sua importância na prática clínica. A seguir estão explanadas, na forma de tabelas, as principais interações medicamentosas pesquisadas nesse trabalho:

permite que apenas dez por cento da dose injetada atinja o seu local de ação: a junção neuromuscular. Da hidrólise resulta a succinilmonocolina, que será hidrolisada pela pseudocolinesterase plasmática em succinato e colina. A meia-vida de eliminação da succinilcolina é cerca de 47 segundos. Como a butirilcolinesterase não é encontrada na junção neuromuscular em grandes quantidades, o bloqueio neuromuscular cessa quando o suxametônio se difunde para o líquido extracelular (LAURENCE, L. et al; 2012).

Pode ocorrer aumento na duração do bloqueio neuromuscular pelo suxametônio devido a atividade reduzida da pseudocolinesterase plasmática: causas congênitas ou adquiridas. Estas podem ser subseqüentes à síntese enzimática diminuída, que pode ocorrer na presença de doença hepática, carcinomatose, gestação ou jejum prolongado (estados hipoproteinêmicos), insuficiência cardíaca, insuficiência renal e queimaduras. Causas hereditárias ocorrem devido à produção de colinesterase plasmática atípica. A estrutura da enzima colinesterase é determinada geneticamente por um gene no cromossomo 3, descrito como o gene normal (94% da população é homozigota). Existem três variantes desse gene que são denominadas: variante atípica, variante silenciosa e gene resistente a fluoretos. Indivíduos com esses genes variantes têm colinesterase plasmática atípica, e apresentam bloqueio neuromuscular prolongado após administração do succinilcolina. A duração do bloqueio varia de 30 minutos nos pacientes heterozigotos para o gene atípico, a várias horas, nos homozigotos para o gene silencioso (APPIAH-ANKAM, D. et al; 2004).

A dose efetiva (DE95) da succinilcolina é 0,5mg/kg a 0,6mg/kg. Após a injeção da dose de 1,5mg/kg, em adulto, o inicio de ação ocorre em 60 segundos (MILLER, R.D., et al; 2010).

A succinilcolina pode apresentar vários efeitos colaterais: bradicardia e hipotensão arterial, seguida de taquicardia e hipertensão, dor muscular devido às fasciculações, aumento das pressões intragástrica, intraocular e intracraniana; e aumento nos níveis de potássio sérico. O efeito colateral mais grave e importante é a hipertermia maligna, que envolve despolarização muscular intensa, aumento de frequência cardíaca, aumento de temperatura e aumento no CO2 expirado (SCHOENSTADT, D.A et al; 1963; FUCHS, F.D et al; 2010).

A hipertermia maligna, com incidência 1:3.000 a 1:250.000 anestesias, é uma doença farmacogenética em que há alteração do gene da rianodina (enzima produtora de cálcio no retículo sarcoplasmático), marcada pela hipercalcemia intracelular, com alta taxa de mortalidade. O paciente evolue com elevação da temperatura, rigidez da musculatura esquelética e acidose metabólica. Se na administração de suxametônio ocorrer taquicardia ou arritmias mais rigidez do masseter, a hipótese de hipertermia maligna deve ser aventada e o tratamento específico deve ser instalado de imediato (BRITT, B.A et al; 1986).

Em pacientes normais a succinilcolina aumenta os níveis de potássio sérico de 0,5 a 1,0 mEq por litro. Aumentos maiores que 5,0 mEq por litro seguidos de parada cardíaca são raros. O suxametônio é contraindicado nos casos em que os níveis de potássio já estejam elevados, como no paciente grande queimado e traumas maciços, onde ocorre destruição celular e liberação de potássio; nas proliferações de receptores nicotínicos extrajuncionais, como nas lesões de neurônio motor superior e inferior, denervações (paraplegias), acidente vascular encefálico, atrofia muscular e distrofia muscular; nas situações de aumento da pressão intracraniana, como ocorre no trauma cranioencefálico grave e nos traumas oculares, em que o aumento da pressão intraocular é indesejável (MILLER, R.D et al; 2010).

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Tabela I: Interações diversas parte 1

Tabela II: Interações diversas parte 2

(CANGIANI, L.M et al; 2011;PEDERNEIRAS, S.G., 1988; WANNAMACHER, L. et al., 2010; MILLER, R.D., et al, 2010; KATSUNG, B.G., et al., 2014).

Tabela III: Interações diversas parte 3

Tabela IV: Interações diversas parte 4

(CREMONESI, E., et al, 1982; PEDERNEIRAS, S.G., 1988; MILLER, R.D., et al, 2010; KATSUNG, B.G., et al., 2014).

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Tabela V: Interações diversas parte 5

Tabela VI: Interações diversas parte 6

(TSAI, S.K., et al, 1994; CREMONESI, E., et al, 1982; MILLER, R.D., et al, 2010; TERRA et al., 1986; PEDERNEIRAS S.G., 1988, KATSUNG et al., 2014).

CONCLUSÕES

A succinilcolina, apesar de estar sendo menos utilizada em centros cirúrgicos devido ao surgimento de drogas mais novas e com menos efeitos colaterais, ainda tem sua indicação na prática clínica, principalmente em prontos socorros do serviço público, onde seu uso se faz necessário visto que, na maioria das vezes, é a única medicação disponível na emergência durante a intubação em sequência rápida.

Com base nos artigos e livros revisados, foi possível verificar que a succinilcolina apresenta inúmeras interações medicamentosas, a maioria levando à potencialização de seu efeito (cetamina, anestésicos locais, anestésicos inalatórios, antibióticos), outras diminuindo seu efeito (uso de corticoides) ou até com risco de efeito colaterais importantes (arritmias durante uso concomitante de digitálicos).

Não é difícil perceber a importância do conhecimento das possíveis interações medicamentosas da succinilcolina com as diversas medicações utilizadas pelos pacientes ou com aquelas utilizadas concomitantemente durante o ato anestésico.

É imprescindível o conhecimento de forma perita de toda a farmacologia envolvida no bloqueio neuromuscular despolarizante para que o médico assistente preste um atendimento sem negligência diante das situações em que a intubação em sequência rápida seja conduta imperativa.

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PERCEPÇÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE ATIVIDADE FÍSICA E QUALIDADE DE VIDA DE FREQUENTADORES DE ACADEMIAS

DO MUNICÍPIO DE CAMBÉ-PRAutor: MARQUI, L.A.7

Co-autor: RUAS, E.A.8

RESUMOA prática de atividades físicas podem trazer benefícios a todos aqueles que a praticam, além de manter uma vida social e saudável. Ela pode ser definida como qualquer movimento produzido pela musculatura resultando em um gasto energético. O objetivo geral do presente artigo consistiu em investigar os impactos da prática de atividades físicas na qualidade de vida. A pesquisa que gerou as reflexões aqui trazidas resultou da aplicação de um estudo de campo em diferentes bases de dados, impressas e virtuais, além de uma pesquisa de campo concretizada por meio da aplicação de um questionário com onze questões fechadas a um grupo de frequentadores de duas academias do município de Cambé, Paraná. Baseado nas respostas dos participantes do questionário pode-se perceber que as pessoas aderiram a pratica de exercícios para manter uma rotina saudável longe de doenças e complicações de saúde.PALAVRAS-CHAVE: Atividade desportivas; qualidade de vida, condicionamento físico.

ABSTRACTThe physical activity can be beneficial to all those who practice it, in addition to maintaining a social and healthy life. It can be defined as any movement produced by the muscles resulting in energy expenditure. The overall objective of this paper was to investigate the practical impact of physical activity on quality of life. The research that led to the reflections here brought resulted from the application of a field study in different databases, printed and virtual, as well as a field research accomplished by applying a questionnaire with eleven closed questions to a goers group two academies in the city of Cambridge, Paraná. Based on the answers of the participants of the questionnaire can be seen that people joined the practice exercises to maintain a healthy routine away from diseases and health complications.KEYWORDS: Sports activities; quality of life, physical fitness.

INTRODUÇÃO

Desde a Antiguidade, a atividade física era vista como meio de proteção aos homens, na medida em que a força e resistência eram vitais para a sobrevivência em guerras e batalhas. Nesta dimensão, Oliveira (2006) destaca a Grécia, que uniu a atividade física com a formação moral e espiritual, ou seja, praticando atividade física com a ênfase intelectual e espiritual. Também em Roma buscava-se a formação espiritual e moral do indivíduo. O treinamento militar de muitos povos reflete a preocupação com esta prática.

No entanto, nos últimos dois séculos, houve um declínio em relação ao condicionamento físico da sociedade. Um dos fatores associados aponta para os grandes avanços tecnológicos, como escadas rolantes, celulares, computadores e outros artefatos eletroeletrônicos que facilitam a vida das pessoas e conduzem ao sedentarismo. (TOSCANO; OLIVEIRA, 2009)

Quando se consideram os benefícios da atividade física para a qualidade de vida, convém assinalar que na sociedade deste terceiro milênio, observa-se uma diminuição da prática de atividades físicas, em virtude das tecnologias que proporcionam maior conforto e comodidade às pessoas, tanto no trabalho como em casa. Haskell et al. (2007) referem que este estilo de vida pouco saudável implica um risco muito grande de enfermidades crônicas ou cardiovasculares. Estes autores mencionam que 54% das mortes estão relacionadas ao estilo de vida, ou seja, má alimentação e ausência de atividade física.7   Discente do curso de Ciências Biológicas da Faculdade de Apucarana (FAP).8   Doutor em Agronomia pela Universidade Estadual de Londrina. Docente da FAP.

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Ferreira e Silva (2001) afirmam que a atividade física exerce papel importante no desenvolvimento global do indivíduo, pois seu desenvolvimento físico, mental e emocional e sua adaptação social dependem, em grande parte, das oportunidades que ele adquire de mover-se e de descobrir-se, bem como conhecer o mundo que o cerca.

Lopes e Ferreira (2013) mencionam que o conceito vigente de atividade física mostra-se abrangente e engloba todo tipo de movimentação corporal que resulte em gasto energético maior que o gasto de repouso, incluindo os contextos domésticos, do trabalho, do lazer e os deslocamentos diários. Estes autores definem a atividade física como qualquer movimento corporal produzido pela musculatura esquelético, cujo resultado é um gasto energético acima dos níveis de repouso.

A definição proposta engloba quatro dimensões da vida humana: o trabalho, ou as atividades ocupacionais, as atividades domésticas, o transporte e as atividades de lazer, nas quais se inserem os exercícios físicos, esportes, dança, artes marciais etc. Os autores apresentam a classificação dos níveis de atividade física: leves, citando como exemplos as ações de caminhar normalmente, realizar tarefas domésticas, banhar-se, jogar boliche; moderadas, caracterizada por ações como caminhar em passos rápidos, pedalar, jogar voleibol recreativo ou lavar o carro; e intensas ou vigorosas, as quais ocorrem quando o indivíduo se dispõe a correr, pedalar ou nadar em ritmo forte, jogar futebol ou basquete, capinar ou cavar buracos (LOPES E FERREIRA, 2013).

Pereira et al. (2012) referem que a qualidade de vida tem sido contemplada, por muitos autores, como sinônimo de saúde, enquanto outros consideram-na um conceito mais abrangente, considerando também as condições de saúde. É possível perceber, assim, que o conceito de qualidade de vida é multidimensional, na medida em que apresenta uma organização complexa e dinâmica dos seus componentes, diferindo de pessoa para pessoa de acordo com o ambiente ou contexto e mesmo entre duas pessoas inseridas em um contexto similar.

Algumas evidências científicas mostram que a prática de exercícios físicos pode ser benéfica para a saúde, podendo trazer alterações no metabolismo, como por exemplo na queima de gordura corpórea, e também inibir aparecimento de alterações orgânicas. Toscano e Oliveira (2009) confirmam essa linha de pensamento ao mencionarem que um estilo de vida saudável está associado ao incremento da prática de atividades físicas, realizadas no âmbito do trabalho, da locomoção, do lazer e das atividades domésticas, no intuito de obter melhores padrões de saúde e qualidade de vida.

Silva et al (2013) pontua que a atividade física mostra-se benéfica tanto no aspecto biológico, no que diz respeito à melhora na capacidade cardiorrespiratória, aumento na expectativa de vida, entre outras e, no nível psicológico, no potencial aprimoramento dos níveis de autoestima, da autoimagem e diminuição dos níveis de estresse. Este mesmo autor salienta que os efeitos posi2tivos sobre os aspectos psicológicos têm origem no prazer obtido na atividade realizada e posterior bem-estar, os quais resultam da satisfação das necessidad2es ou do sucesso no desempenho das habilidades em desafio.

Toscano e Oliveira (2009) reiteram que a prática de atividade física não é considerada apenas recurso fundamental para promover a saúde, mas como auxiliar na reabilitação das pessoas com patologias de grande índice de mortalidade no país. Assim sendo, reforçam que a atividade física pode beneficiar no geral os indivíduos, aumentando o metabolismo, auxiliando na queima de gordura corporal, no aumento da massa muscular, ajudando a prevenir doenças cardíacas e outras causas de morbidade.

Quando se pensa em atividade física, volta-se para as academias como locais privilegiados para tal prática, sobretudo nas últimas décadas, conforme se posiciona Silva et al (2013), quando refere que a academia de ginástica é uma opção para as pessoas que aderem ao exercício físico com o intuito de obter um aumento no bem-estar geral. As academias caracterizam-se por ser um lugar que oferece um espaço adequado para a prática da atividade física, com orientação de profissionais de Educação Física que avaliam e orientam os alunos.

Também Diniz (2014) explica que as academias oferecem diversificadas possibilidades para a prática de atividade física, tendo como finalidade elevar a qualidade de vida de seus frequentadores.

No entanto, Costa et al. (2007) ponderam que um aspecto fundamental é a aderência das pessoas por períodos prolongados, ou seja, a realização regular de atividade física. Nesta direção, conseguir um aumento na aderência às atividades oferecidas nas academias requer um maior detalhamento dos vários motivos e fatores que levam uma pessoa a optar pela prática de uma atividade física (MENDONÇA et al, 2013).

Uma vez apresentados os suportes teóricos que subsidiam a elaboração deste estudo, destaca-se que o objetivo geral do presente artigo consistiu em investigar os impactos da prática de atividades físicas na qualidade de vida. Os objetivos específicos podem ser assim relacionados: a) relacionar os benefícios da atividade física para a qualidade de vida; b) apontar a percepção de usuários de academias acerca dos impactos da prática de exercícios na saúde.

METODOLOGIA

A pesquisa que gerou as reflexões aqui trazidas resultou de uma pesquisa de campo concretizada por meio da aplicação de um questionário com onze questões fechadas a um grupo de frequentadores de duas academias do município de Cambé, Paraná, neste estudo denominadas Academia 1 e Academia 2.

A pesquisa de campo, conforme Lakatos e Marconi (2010) é utilizada coma finalidade de se comprovar hipóteses e/ou buscar informações para um problema, em associação a dados coletados na pesquisa bibliográfica, podendo gerar conclusões novas e/ou novos problemas a serem resolvidos. Permite ainda ampliar os conhecimentos sobre um determinado assunto, pois é nesta etapa que o pesquisador define os objetivos da pesquisa, as hipóteses, o meio de coleta de dados e a metodologia aplicada.

A amostra deste estudo foi selecionada por meio da técnica de amostragem por conveniência, sendo abordados frequentadores de duas academias, para responder o questionário constante do Apêndice A, até que se completasse o número estabelecido de 15 participantes em cada local.

Quanto à natureza, a pesquisa mostra-se quantitativa, pois, conforme Mattar (2005), este tipo de pesquisa tem o objetivo quantificar os dados e generalizar os resultados, segmentando uma população-alvo e aplicando questionários de contato pessoal.

Os dados obtidos foram tabulados através da plataforma Excel. Em seguida, os resultados foram confrontados com o referencial teórico pesquisado. Foi utilizada a estatística descritiva para fazer a análise dos dados, devendo ser informado que estes foram analisados em porcentagem e, dada a quantidade de informantes em cada academia, os

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resultados correspondem a 99,90% da amostra.Os questionários impressos foram entregues pessoalmente pelo pesquisador em

diferentes datas do mês de agosto de 2015. Foi informado em cada questão deveria ser assinalada apenas uma resposta. A amostra da pesquisa constou de 15 praticantes de cada academia. A tabulação dos dados foi realizada por meio de planilha de Excel, sendo os resultados confrontados com outras pesquisas de teor semelhante.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na primeira questão do questionário dirigido a frequentadores de duas academias, foi solicitado que indicassem a frequência da prática de atividades físicas. A Tabela 1 aponta os resultados obtidos.

Tabela 1- Frequência da prática de atividade física

1 - Quantos dias na semana você pratica atividade física? Academia 1 Academia 2

a) Uma vez por semana 6,66% -

b) Duas vezes por semana 26,64% 39,96%

c) Três vezes por semana 53,28% 33,33%

d) Quatro vezes por semana 13,32% 26,64%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

Conforme se pode verificar pelos dados expresso na Tabela 1, a prevalência de respostas na Academia 1 foi de três vezes por semana, com 53,28% do total de respostas, enquanto na Academia 2 o maior percentual foi de 39,96%, referente a duas vezes por semana. Em contrapartida, apenas uma pessoa, perfazendo 6,66% da amostra, frequentam uma vez por semana a academia 1, e nenhum dos respondentes da Academia 2 disse frequentá-la apenas uma vez.

A este respeito, encontra-se em Dumit (2008) a informação de que a recomendação atual mais difundida sugere que são necessários ao menos 30 minutos de atividade física de intensidade moderada em pelo menos cinco dias da semana, ou 20 minutos de atividade vigorosa em pelo menos três dias da semana, para que a atividade física proporcione benefícios para a saúde.

Haskell et al. (2007) recomendam ainda a prática de atividades que aumentem a força e resistência muscular 2 vezes por semana, com vistas a uma possível minimização dos riscos predisponentes às doenças cardiometabólicas e a mortalidade na população em geral.

A segunda questão do instrumento de coleta de dados buscou relacionar os motivos pela qual cada participante resolveu começar a praticar atividade física, conforme se apresenta na Tabela 2.

Tabela 2-Motivos da decisão de iniciar a prática de atividade física

2 - Qual(is) foi o motivo da decisão em começar a praticar atividade física? Academia 1 Academia 2

a) Indicação Médica 6,66% 19,98%

b) Incentivo de amigos 6,66% 13,32%

c) Condicionamento físico 26,64% 19,98%

d) Estética 59,94% 46,62%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

Nesta questão, foram apontados motivos diversos dos indicados no instrumento de coleta de dados. Assim, na Academia 1, 59,94% dos respondentes mencionaram outros motivos, como estética (33,33%), qualidade de vida (19,98%) e ocupar o tempo (6,66%), enquanto na Academia 2 46,62% dos praticantes que compuseram a amostra referiram-se à estética como motivo para iniciar atividade física. Um percentual pouco expressivo de pessoas começou a fazer atividade física por indicação média.

Mendonça et al (2013) referem que a opção por iniciar a prática de qualquer tipo de atividade física depende de um estímulo ou incentivo, que podem estar relacionados à influência social, da família ou amigos.

Na terceira questão, foi questionado quanto aos benefícios que a atividade pode trazer para as pessoas, ou até os objetivos esperados para quem pratica exercícios físicos. Na tabela a seguir, podem ser conferidos alguns benefícios esperados pelos praticantes

Tabela 3- Benefícios da atividade física, na concepção dos praticantes abordados

3 - Qual(is) são os benefícios da atividade física praticada regularmente pode trazer para a sua saúde? Academia 1 Academia 2

a) Eliminação de gorduras indesejáveis 6,66% 53,28%

b) Melhor disposição no dia a dia 19,98% 26,64%

c) Menor riscos de adquirir alguma doença cardiovascular 6,66% 19,98%

d) Melhora no aspecto psicológico 6,66% -

Fonte: pesquisa realizada, 2015

A prevalência de respostas nesta questão referiu-se à eliminação de gorduras indesejáveis, com 66.66% e 53,28%, respectivamente na Academia 1 e Academia 2. A melhor disposição no dia a dia foi mencionada por 19,98% dos respondentes da Academia 1 e 26,64% dos praticantes que responderam ao questionário na Academia 2. Apenas uma pessoa da Academia 1 referiu-se à melhora no aspecto psicológico.

Hannibal et al. (2010), ao avaliarem os efeitos do exercício no combate à obesidade, explicam que os benefícios extrapolam a perda de peso, na medida em que possibilitam a diminuição do percentual de gordura, o aumento da massa magra, melhora da capacidade aeróbia, além de proporcionar benefícios relacionados aos fatores de riscos cardiovasculares associados à síndrome metabólica.

De acordo com Matsudo et al. (2002), os benefícios proporcionados pela atividade

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por uma pessoa (6,66%) na Academia 1 e nenhum respondente assinalou este item na Academia 2.

A questão relativa à autoestima, como também ressaltado por Saba (2001), aponta a estética como um dos principais objetivos dos indivíduos ao procurarem uma academia de ginástica, evidenciando a preocupação pela aceitação social no grupo.

A questão seis investigou o consumo de suplementos alimentares para melhorar o desempenho das atividades físicas, conforme dados presentes na Tabela 6.

Tabela 6- Uso de suplementos alimentares

6- Para atingir seus objetivos de conseguir uma boa forma física, você faz uso de suplementos alimentares? Academia 1 Academia 2

a) Sim. Consumo hipercalóricos e Whey Protein 26,64% 26,64%

b) Sim. Somente hipercalóricos 6,66% 13,32%

c) Sim. Somente Whey Protein 39,96% 33,33%

d) Não. Somente controlo na alimentação 26,64% 26,64%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

O número mais expressivo de respostas indicou que os praticantes de academias consomem suplementos alimentares, pois apenas 26,64% dos informantes das duas academias disseram que apenas controlam a alimentação. O consumo do suplemento proteico Whey Protein foi mencionado por 39,96% dos praticantes da Academia 1 e 33,33% na Academia 2, enquanto 26,64% dos praticantes das duas academias consomem tanto hipercalóricos quanto o suplemento proteico.

Estes resultados também foram encontrados por Carvalho et al. (2007), que afirma que o consumo de suplementos alimentares entre praticantes de atividades dentro da academia é grande e crescente, porém nem sempre está diretamente relacionado com a alimentação saudável. Esta autora considera apropriado o uso de suplementos, vitaminas e minerais, seguindo evidências científicas que demonstram segurança e eficiência em seu consumo.

Na questão seguinte, foi investigada a percepção dos participantes em relação ao modo de como se pode obter uma melhor qualidade de vida. Os achados podem ser conferidos na Tabela 7.

Tabela 7- Concepção dos praticantes sobre a relação entre atividade física e qualidade de vida

7 - Na sua opinião, somente a atividade física sendo realizada diariamente, você conseguirá ter uma melhor qualidade de vida?

Academia 1 Academia 2

a) Sim. 19,98% 39,96%

b) Não 39,96% 26,64%

c) Não. Dependerá também da boa alimentação 33,33% 19,98%

d) Uma boa sequência de abdominais já é o suficiente 6,66% 13,32%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

física podem ser agrupados em duas categorias. No tocante aos benefícios fisiológicos, ocorre a diminuição da pressão arterial, controle do peso corporal, aumento da densidade óssea e resistência física, melhora da força muscular, do perfil lipídico e da mobilidade. Os autores apontam ainda benefícios psicológicos, como a melhora da autoimagem, aumento da autoestima e do bem-estar, diminuição do estresse e da depressão, além da manutenção de autonomia e redução do isolamento social.

Na quarta questão constante do questionário aplicado aos sujeitos que compõem esta pesquisa, foi investigada a percepção dos entrevistados sobre os riscos de doenças que as pessoas podem contrair, caso não pratiquem algum tipo de exercício físico. As respostas podem ser observadas na Tabela 4.

Tabela 4- Riscos potenciais da ausência de exercícios físicos

4 - Quais são os riscos a que a pessoa pode estar sujeita, caso não pratique qualquer exercício físico? Academia 1 Academia 2

a) Tornar-se sedentária 39,96% 39,96%

b) Adquirir problemas cardiovasculares, ortopédicos e outros 33,33% 19,98%

c) Corpo dolorido com trabalhos diários 6,66% 13,32%

d) Cansaço excessivo 19,98% 26,64%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

Nas duas academias, a prevalência das respostas notemos ocorreu em relação ao sedentarismo, indicado por 39,96% dos respondentes nos dois locais onde foi aplicada a pesquisa. O risco de problemas de saúde foi assinalado por 33,33% dos informantes na Academia 1 e 19,98% na Academia 2. O risco de dores nos trabalhos diários foi menos considerado, sendo 6,66% na Academia 1 e 13,32% na Academia 2.

Na questão cinco, buscou-se avaliar os benefícios que os exercícios físicos podem trazer para vida cotidiana, como incentivo para aqueles que não se sentem tão motivados para se condicionar fisicamente. Os resultados encontram-se dispostos na Tabela 5.

Tabela 5- Benefícios da atividade física na vida cotidiana

5 - Praticando exercícios regularmente, assinale alguns benefícios que isso poderá trazer em sua vida cotidiana Academia 1 Academia 2

a) Melhor preparo para enfrentar o trabalho diário 6,66% 13,32%

b) Aumento da autoestima 73,26% 53,28

c) Aumento da capacidade de atenção 6,66% -

d) Elevação do bom humor 13,32% 33,33%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

Notadamente, o aumento da autoestima foi assinalado por percentual elevado de frequentadores das duas academias. Assim, enquanto na Academia 1 houve um percentual de 73,26% do total da amostra, na Academia 2 houve 53,28% de respostas em relação a este benefício. Em contrapartida, o aumento na capacidade de atenção foi apontado

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Nesta questão, os resultados obtidos mostram-se diferenciados, pois enquanto na Academia 1, 19.98% dos praticantes acreditam que somente a atividade física garante uma melhor qualidade de vida, na Academia 2 este percentual se eleva para 39,96% dos respondentes. Foi obtida ainda a comprovação de que 39,96% dos praticantes da Academia 1 acreditam que os suplementos garantem, sucesso no pós treino, enquanto 26,64% dos participantes da pesquisa da Academia 2 assinalaram esta resposta. Apenas 6,66% dos praticantes da Academia 1 e 13,32% da Academia 2 disseram que uma boa sequência de abdominais é suficiente,

Na questão seguinte, foi questionado sobre um dos problemas psicológicos mais sérios na atualidade, a depressão. Foi perguntado se as atividades físicas podem auxiliar as pessoas com algum problema psicológico. Os resultados a esta questão podem ser melhor visualizados na Tabela 8.

Tabela 8- Concepção dos praticantes sobre exercícios físicos e problemas psicológicos

8 - Na sua opinião, problemas psicológicos, como a depressão, ansiedade podem ser tratados também com exercícios físicos?

Academia 1 Academia 2

a) Não. Problemas psicológicos devem ser tratados a base de medicamentos e repouso - 6,66%

b) Não. Pessoas com esses problemas devem ficar isolados da sociedade, sem a prática de nenhuma atividade

- -

c) Sim. Mas somente com orientação médica 19,98% 6,66%

d) Sim. Exercícios físicos podem ser praticados desde que sejam acompanhados de um profissional da área 79,92% 86,58%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

A prevalência de respostas obtidas a esta questão voltou-se para a afirmação de que os exercícios físicos podem ser praticados desde que haja um acompanhamento de um profissional da área, sendo que 79,93% dos praticantes da Academia 1 e 86,58% da Academia 2 apontaram este item.

Diante de tais resultados, é importante retomar os achados de Haskell et al. (2007), quando salientam que o sedentarismo vem evoluindo na sociedade contemporânea como uma grande epidemia, desencadeando riscos à saúde da população. Do mesmo modo, estes autores associam a inatividade física e a prevalência de doenças, tais como doença arterial coronariana, hipertensão, acidente vascular encefálico, diabetes, osteoporose, obesidade, câncer, depressão entre outras. Silva et al. (2010) relatam a existência de fatores físicos e psicológicos que interferem na qualidade de vida das pessoas.

Dando continuidade à investigação, foi questionado em relação à hidratação das pessoas durante atividade física, conforme a Tabela 9 que dispõe sobre os resultados encontrados.

Tabela 9- Consumo de água durante os treinos

9 - Durante o treino ou uma corrida, qual a quantidade de água você consome? Academia 1 Academia 2

a) 1 copo de água 33,3% 19,98%

b) 2 copos de agua 53,28% 59,94%

c) 3 copos de água 6,66% -

d) 4 ou mais 6,6% 19,98%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

A maior parte dos entrevistados, sendo 53,28% da Academia 1 e 59,94% da Academia 2, disseram tomar 2 copos de água durante o treino ou em corridas.

Ainda em relação à hidratação, foi questionado sobre as lesões que podem acontecer quando um atleta não consome a quantidade adequada de liquido, riscos de fraturas, desmaios etc. Os resultados são expressos na Tabela 10.

Tabela 10- Riscos do consumo insuficiente de água durante os treinos

10 - Qual(is) são os riscos que a pessoa corre caso ela não consuma a quantidade necessária de água durante a atividade física?

Academia 1 Academia 2

a) Perda excessiva de líquido 66,66% 79,92%

b) Baixo desempenho nos exercícios 6,66% 13,32%

c) Pela desidratação pode ocorrer algum problema muscular 6,66% -

d) Queda de pressão podendo gerar algum acidente 19,98% 6,66%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

Dentre os problemas que podem ocorrer pela falta de hidratação durante a atividade física, 66,66% dos praticantes da Academia 1 e 79,92% da Academia 2 referiram-se à perda excessiva de líquido. Em menor percentual, 19,98 % dos respondentes da Academia 1 mencionaram a queda de pressão e 13,32% de informantes da Academia 2 reportaram-se ao baixo desempenho nos exercícios.

Picolli e Bonomini Jr. (2012) relatam que a tanto a falta quanto o excesso da ingestão de líquidos causam efeito favorável no rendimento atlético, sendo assim estratégias de prevenção devem ser instituídas para minimizar a incidência dos distúrbios hidroeletrolíticos durante a prática de atividades físicas.

Na última questão foram analisados os pontos positivos na vida cotidiana das pessoas que praticam atividade física, benefícios que podem ter durante seu cotidiano. Na Tabela 11, podem ser comprovadas as respostas obtidas a este respeito.

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Tabela 11- Aspectos da vida cotidiana que apresentaram melhora após a prática de atividade física

11 - Qual(is) aspectos melhoraram após você ter começado a realizar atividade física? Academia 1 Academia 2

a) Melhor qualidade de vida 73,26% 66,66%

b) Elevação da imunidade 6,66% -

c) Desaparecimento de dores pelo corpo 13,32% 6,66%

d) Mais disposição no dia a dia 6,66% 26,64%

Fonte: pesquisa realizada, 2015

A melhor qualidade de vida foi apontada por 73,26% dos praticantes da Academia 1 e 66,66% da Academia 2, enquanto 13,32% dos respondentes da Academia 1 reportaram-se ao desaparecimento de dores no corpo e 26,64% da Academia 2 disseram sentir mais disposição no dia a dia.

Martins et al. (2012) sinalizam que no domínio social, atividade física esteve positivamente associada à qualidade de vida. Para os autores, a prática de atividade física é um comportamento do estilo de vida, portanto, pode ser alterado para beneficiar a saúde. Novamente, os resultados concordam com os achados de Silva et al. (2010).

Tendo em vista os resultados obtidos na pesquisa de campo realizada junto a praticantes de duas academias do município de Cambé, Paraná, torna-se relevante mencionar os achados de estudos correlatos.

Macedo et al. (2003) confirmaram, em pesquisa realizada junto a estudantes universitários do município de Londrina, a importância do exercício físico na qualidade de vida do indivíduo. Destacaram ainda que a prática deste tipo de atividade é um fator preponderante para o desempenho produtivo do ser humano, capacitando-o a realizar de maneira eficiente suas tarefas cotidianas.

Um estudo que merece destaque foi conduzido por Azevedo et al. (2008). Os autores referem que um potencial benefício da prática regular de exercícios físicos está associado à diminuição nos níveis de insulina de jejum, por favorecer a utilização periférica da glicose e melhorar a sensibilidade à insulina.

Toscano e Oliveira (2009) conduziram um estudo junto a 587 mulheres, com idade mínima de 60 anos e cadastradas nos 23 grupos de convivência do município de Aracaju. Os resultados evidenciaram que programas de atividade física podem contribuir de forma expressiva na qualidade de vida na população de idosos, tanto pelo engajamento social que eles promovem, quanto pelo estimulo positivo nos aspectos físicos, o que na prática resulta em maior autonomia. Os níveis elevados de atividade física parecem intervir de maneira positiva pelo fato de estarem associados as limitações funcionais que interferem direta ou indiretamente em todos os domínios da qualidade de vida relacionada com a saúde.

Mendonça et al (2013) realizaram estudo, de natureza qualitativa, cujo objetivo foi analisar os principais fatores da aderência e manutenção de programas de exercícios físicos regulares, realizados em academias. A população alvo do estudo foi formada por uma amostra de cinquenta alunos frequentadores de uma academia na cidade de Rio Claro/SP, com idades variando até 24 anos, de ambos os sexos e com nível de escolaridade diversificado.

Macedo et al. (2003) realizaram pesquisa de campo com 69 estudantes da Universidade Estadual de Londrina e confirmaram que, na população estudada, os

exercícios físicos habituais, e não excessivos, bem orientados, sejam aeróbicos ou com pesos, melhoram os parâmetros de qualidade de vida dos indivíduos em geral, independente do sexo. Dentre os achados dos autores, encontrou-se que os benefícios para praticantes do sexo feminino são superiores quando comparados ao sexo masculino.

Comparando os resultados dos estudos anteriormente mencionados é possível verificar que o principal motivo de adesão para a prática de atividade física tem sofrido modificações. Algumas mudanças podem estar relacionadas aos padrões estéticos na atualidade. Isso mostra, como citado por Mendonça et al (2013), o interesse e a preocupação pela aceitação social no grupo, ou, ainda, por fazer parte de um grupo já consagrado de culto ao corpo. A mídia, de certa forma, vem contribuindo para o aumento na procura pelas academias de ginástica, uma vez que divulga constantemente corpos considerados modelos de beleza.

Machado et al. (2015) compararam a qualidade de vida de praticantes de exercício em academia e de sujeitos sedentários. A amostra foi constituída de 50 participantes de ambos os sexos, selecionados por conveniência. Os participantes foram divididos em dois grupos, um com 25 praticantes de exercício em academia e outro com 25 sedentários. Os achados referem que os praticantes de exercício físico em academias apresentam maior percepção de qualidade de vida e satisfação com a saúde, comparados a indivíduos sedentários. O exercício físico parece contribuir mais precisamente aumentando a percepção de qualidade de vida nos domínios físico, relações sociais e meio ambiente. Portanto, os resultados apresentados confirmam os benefícios do exercício físico, mostrando que, além dos benefícios físicos amplamente divulgados, também é possível obter melhoras em aspectos psicológicos, quando realizado de forma correta e adequada.

Conclusão

Este artigo, cujo objetivo geral consistiu em investigar a percepção dos praticantes de academia sobre a relação existente entre esta prática e a qualidade de vida dos indivíduos.

Pode-se perceber que as respostas apontando a importância da prática de atividades físicas para a manutenção da qualidade de vida.

Desta forma, entende-se que há muitos fatores que levam à aderência e subsequente manutenção à prática de uma atividade física e, os dados obtidos com este trabalho podem apontar sugestões para futuras pesquisa, ampliando-se o universo da amostra.

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APÊNDICE 1- INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

1. Quantos dias na semana você pratica atividade física?a) Uma vez por semanab) Duas vezes por semanac) Três vezes por semanad) Quatro vezes por semana

2. Qual(is) foi o motivo da decisão em começar a praticar atividade física?a) Indicação Médicab) Incentivo de amigosc) Condicionamento físicod) Outro motivo

3. Qual(is) são os benefícios da atividade física praticada regularmente pode trazer para a sua saúde?

a) eliminação de gorduras indesejáveisb) menor disposição no dia a diac) Menor riscos de adquirir alguma doença cardiovasculard) Melhora no aspecto psicológico

4. A que riscos a pessoa pode estar sujeita, caso não pratique qualquer exercício físico?a) Tornar-se sedentáriab) Adquirir problemas cardiovasculares, ortopédicos e outrosc) Corpo dolorido com trabalhos diáriosd) cansaço excessivo

5. Praticando exercícios regularmente, assinale alguns benefícios que isso poderá trazer em sua vida cotidiana.

a) Melhor preparo para enfrentar o trabalho diáriob) Aumento da autoestimac) Aumento da capacidade de atençãod) Elevação do bom humor

6- Para atingir seus objetivos de conseguir uma boa forma física, você faz uso de suplementos alimentares?

a) Sim. Consumo Hiper Calóricos e Whey Proteinb) Sim, somento hipercalóricosc) Sim, somente Whey Proteind) Não, somente controlo a alimentação

7 - Na sua opinião, somente a atividade física sendo realizada diariamente, você conseguirá ter uma melhor qualidade de vida?

a) Simb) Não. Os suplementos garantem sucesso pós treinoc) Não. Dependerá também de boa alimentação.d) Uma boa sequência de abdominais já é o suficiente

8 - Na sua opinião, problemas psicológicos, como a depressão, ansiedade podem ser tratados também com exercícios físicos?

a) Não. Problemas psicológicos devem ser tratados a base de medicamentos e repouso.b) Não. Pessoas com esses problemas devem ficar isolados da sociedade, sem a pratica de nenhuma atividade.c) Sim. Mas somente com orientação médicad) Sim. Exercícios físicos podem ser praticados desde que seja acompanhados de um profissional da área

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PERFIL NUTRICIONAL DE ESCOLARES DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE LONDRINA-PR.

NUTRITIONAL PROFILE OF THE MUNICIPAL SCHOOL TEACHING LONDRINA-PR.

PONTES, Franceli Paes9

PIRES, Carla Regina10

RESUMOINTRODUÇÃO: A avaliação do estado nutricional de crianças é tradicionalmente realizada a partir da aferição de medidas antropométricas de peso, da estatura em relação à idade e ao sexo, medidas estas mais utilizadas para avaliação e monitoramento na infância, durante a idade pré-escolar, por refletir as condições nutricionais e, as influências do ambiente socioeconômico. A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saú de (MS) reconhecem a importante influência das condições de vida sobre o crescimento, tornando o ambiente escolar ideal para a realização de atividades de atenção nutricional à criança. OBJETIVO: Identificar através da avaliação de medidas antropométricas o estado nutricional dos escolares da rede municipal de ensino da cidade de Londrina-PR em relação à idade e ao sexo. MÉTODOS: Trata-se de uma pesquisa quantitativa e seccional, onde foi realizado um levantamento de dados em 3 (três) escolas da rede municipal de ensino da cidade de Londrina-PR, totalizando 610 crianças, na faixa etária compreendida entre 6 - 15 anos matriculados no ano letivo de 2014. Os dados foram analisados no software IBM SPSS (versão 21.0), empregando-se o teste ANOVA para análise de variância (p<0,05) e o teste U de Mann-Whitney para a comparação de variáveis quantitativas entre grupos independentes. RESULTADOS: As crianças que apresentaram como diagnóstico nutricional adequado, de acordo com o indicador IMC/I foram 53%, 44,2%, 62,5% das escolas 1, 2, e 3 respectivamente, seguido por uma parcela significativa de sobrepeso de valores acentuados com 31,6%, 42,9% e 35,8%, destacando-se a escola 2 com maiores resultados que variou de 41,0% (n=48) em meninos e 44,9% (n=48) em meninas. O estudo demonstrou baixa frequência geral do índice baixo peso com 15,4%, 12,9% e 1,7% nas Escolas 1, 2 e 3 respectivamente, sendo que os maiores percentuais foram observados entre as meninas. CONCLUSÃO: A prevalência destes resultados leva a um aumento na demanda de atenção das áreas de saúde e educação entre os escolares, incluindo ações que visem prevenir e/ou tratar a obesidade quando já está instalada e que levem orientações nutricionais aos pais e familiares dos mesmos.PALAVRAS CHAVE: Estado nutricional; crianças; medidas antropométricas; pré-escolar.

ABSTRACTINTRODUTCTION: The evaluation of the nutritional status is traditionally performed from the anthropometric mensuration by weight, height in relation to the age and the gender, these is the most used measures for childhood evaluation and monitoring, during the kindergarten age, by reflecting the nutritional status and, the influences of the socioeconomic environment. The World Health Organization (WHO) and the Health Ministry (MS) recognize of the important influence of the life conditions about the growth, making it ideal to activities school environment for performing nutritional care to children. OBJECTIVE: To identify through assessment measures of anthropometric nutritional status of school children from municipal schools in the city of Londrina-PR in relation to age and gender. METHODS: About a sectional and quantitative research, where a data collection was conducted in three (3) schools of municipal network in the city of Londrina-PR, totaling 610 children, aged between 6 - 15 years enrolled in academic year 2014. The data were analyzed with IBM SPSS (version 21.0) software, using ANOVA test’s for analysis of variance (p <0.05) and the U Mann-Whitney test’s for comparison of variables quantitative between independent groups. RESULTS: The children who presented as adequate nutritional diagnosis, according to the BMI / I indicator were 53%, 44.2%, 62.5% of schools 1, 2, and 3, respectively, followed by a significant proportion of overweight accented values with 31.6%, 42.9% and 35.8%, highlighting the school 2, with major results that ranged from 41.0% (n = 48) in boys and 44.9% (n = 48 ) in girls. The study showed low overall frequency of low weight rate with 15.4%, 12.9% and 1.7% in Schools 1, 2 and 3 respectively, the highest percentages were observed among girls. CONCLUSION: The prevalence of these results leads to an increase in demand for care in the areas of health and education in schoolchildren, including actions aimed at preventing and / or treating obesity when it is already installed and leading nutritional guidance

9   Discente do Centro Universitário Filadélfia - Unifil.10   Docente do Centro Universitário Filadélfia - Unifil.

9 - Durante o treino ou uma corrida, qual a quantidade de água você consome?a) 1 copo de águab) 2 copos de águac) 3 copos de águad) 4 copos de água

10. Qual(is) são os riscos que a pessoa corre caso ela não consuma a quantidade necessária de água durante a atividade física?

a) a) Perda excessiva de liquidob) b) Baixo desempenho no exercícioc) c) Pela desidratação pode ocorrer algum problema musculard) d) Queda de pressão podendo gerar algum acidente

11, Qual(is) pontos em sua vida cotidiana que melhoraram após você ter começado a realizar atividade física?

a) Melhor qualidade de vidab) Elevação da imunidadec) Desaparecimento de dores pelo corpod) Mais disposição no dia a dia

OBS: ASSINALAR APENAS UMA RESPOSTA EM CADA QUESTÃO:

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to parents and their relatives.KEYWORDS: Nutritional status; children; anthropometric measurements; kindergarten.

1 INTRODUÇÃO

A avaliação do estado nutricional de crianças é tradicionalmente realizada a partir da aferição de medidas antropométricas de peso, da estatura em relação à idade e ao sexo, medidas estas mais utilizadas para avaliação e monitoramento na infância (FARIAS; GUERRA-JÚNIOR; PETROSKI, 2008), durante a idade pré-escolar, por refletir as condições nutricionais e, as influências do ambiente socioeconômico (PINHO et al., 2010). A criança é considerada em idade escolar dos 6 aos 12 anos, onde apresentam intenso crescimento físico e intelectual com altas demandas nutricionais (MENDONÇA, 2010).Estudos demonstram as vantagens da análise do estado nutricional de crianças com base na instituição escolar que elas frequentam, possibilitando identificar os distúrbios nutricionais, monitorar desigualdades sociais em saúde e, a identificação de necessidades de implementação de ações de nutrição e saúde específicas (GUIMARÃES; BARROS, 2001).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saú de (MS) reconhecem a importante influência das condições de vida sobre o crescimento, tornando o ambiente escolar ideal para a realização de atividades de atenção nutricional à criança (PINHO et al., 2010). O crescimento e o desenvolvimento são processos dinâmicos que sofrem influência de fatores genéticos, nutricionais, sociais e culturais (MENDONÇA, 2010).

Na infância, pode ocorrer o início da obesidade que se não intervinda, virá a persistir na idade adulta. Estudos mostram que a correta formação dos hábitos alimentares na infância favorece a saúde permitindo o crescimento e o desenvolvimento normal e prevenindo uma série de doenças na idade adulta (GANDRA, 2000). Assim, o diagnóstico precoce constitui grande interesse para a saúde pública, pois o tratamento na fase inicial pode ser mais eficiente e gerar menor custo ao Estado. Durante a infância, a avaliação da obesidade deve levar em consideração as alterações da estrutura corporal como a massa óssea, massa magra e gordura para esta fase de crescimento (BUENO; FISBERG, 2006).

O consumo de alimentos não saudáveis e algumas trocas errôneas na alimentação frequentemente realizadas como: substituição do consumo de frutas por doces, ou, alto consumo de salgadinhos industrializados e gordurosos remetem às crianças um status social, que têm ocasionado a substituição da subnutrição pela obesidade (MENDONÇA, 2010).

A avaliação do estado nutricional tem se tornado aspecto cada vez mais importante no diagnóstico nutricional e no planejamento de ações de promoção à saúde e prevenção de doenças. Sua importância é reconhecida tanto na atenção primária, para acompanhar o crescimento e a saúde da criança, quanto na detecção precoce de distúrbios nutricionais, seja desnutrição ou obesidade (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA, 2009).

Assim, o presente estudo objetiva identificar através da avaliação de medidas antropométricas o estado nutricional dos escolares em 3 escolas da rede municipal de ensino da cidade de Londrina-PR em relação à idade e ao sexo.

2 MÉTODOSEste estudo caracterizou-se como uma pesquisa quantitativa e seccional, onde foi

realizado um levantamento de dados em 3 (três) escolas da rede municipal de ensino da cidade de Londrina-PR, totalizando 610 crianças, na faixa etária compreendida entre 6 - 15 anos matriculados no ano letivo de 2014.

As medidas antropométricas foram tomadas de acordo com as técnicas estabelecidas pela OMS por acadêmicas capacitadas do curso de Nutrição da Unifil, com supervisão da docente responsável, durante o desenvolvimento do estágio curricular obrigatório do presente ano letivo. Para a interpretação dos dados antropométricos em crianças desta faixa etária, três índices foram utilizados: Peso/ Idade (P/I), Altura/ Idade (A/I) e IMC/ Idade (IMC/I). Estes índices são obtidos comparando-se as informações de peso, altura, idade e sexo com curvas de referência recomendadas pela OMS. A idade dos escolares foi calculada com base na data da avaliação antropométrica e na data de nascimento obtida nas fichas escolares.

Os dados foram analisados no software IBM SPSS (versão 21.0), empregando-se o teste ANOVA para análise de variância (p<0,05) e o teste U de Mann-Whitney para a comparação de variáveis quantitativas entre grupos independentes.

O presente estudo não teve a obrigatoriedade de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos do Centro Universitário Filadélfia - UNIFIL, pois foram utilizados dados pré-existentes de coletas anteriores autorizadas pelas escolas onde foram realizadas atividades de nutrição.

3 RESULTADOS

A amostra foi constituída por 610 crianças de 3 (três) escolas da rede municipal de ensino da Londrina-PR sendo, 329 (53,9%) do sexo masculino e 281 (46,1%) do sexo feminino (tabela 1). A média e desvio padrão de idade foi de 8,25±1,648, com 76,2% (n=465) dos avaliados entre 6 e 9 anos (tabela 2).

Tabela 1 - Distribuição dos escolares por gênero da rede municipal de ensino na cidade de Londrina-PR, em 2014.

Escola Gênero n % TOTAL

Escola 1Masculino 147 55,3

100%Feminino 119 44,7

Escola 2Masculino 117 52,2

100%Feminino 107 47,8

Escola 3Masculino 65 54,2

100%Feminino 55 45,8

TOTAL 610

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Tabela 2 - Distribuição dos escolares por faixa etária da rede municipal de ensino na cidade de Londrina-PR, em 2014.

Escola Faixa Etária n %

Escola 1De 6 a 9 anos 203 76,3

De 10 a 12 anos 62 23,3Acima de 12 anos 1 0,4

Escola 2De 6 a 9 anos 166 74,1

De 10 a 12 anos 57 25,5Acima de 12 anos 1 0,4

Escola 3De 6 a 9 anos 96 80

De 10 a 12 anos 23 19,2Acima de 12 anos 1 0,8

Com relação ao estado nutricional dos escolares, observa-se que as crianças de ambos os sexos (masculino e feminino) apresentaram como diagnóstico nutricional peso adequado (tabela 3), de acordo com o indicador IMC/I. Quando comparados os dados obtidos entre os sexos, os meninos possuem relativamente menor índice de baixo peso do que as meninas, 13,6%, 12,8% e 1,5% nas escolas 1, 2 e 3 respectivamente. Na faixa de risco para sobrepeso, verifica-se que as meninas das escolas 1 (36,1%) e 2 (44,9%) estão com maior percentual de classificação neste índice do que os meninos. Na escola 3, os meninos possuem maior índice de sobrepeso (40%) do que as meninas (30,9%).

Tabela 3 - Prevalência do estado nutricional dos escolares da rede municipal de ensino na cidade de Londrina-PR, em 2014.

Escola ClassificaçãoMeninos Meninas Totaln % n % n %

Escola 1

Baixo Peso 20 13,6 21 17,6 41 15,4

Peso Adequado 86 58,5 55 46,2 141 53,0

Sobrepeso 41 27,9 43 36,1 84 31,6

Escola 2

Baixo Peso 15 12,8 14 13,1 29 12,9

Peso Adequado 54 46,2 45 42,1 99 44,2

Sobrepeso 48 41,0 48 44,9 96 42,9

Escola 3

Baixo Peso 1 1,5 1 1,8 2 1,7

Peso Adequado 38 58,5 37 67,3 75 62,5

Sobrepeso 26 40,0 17 30,9 43 35,8

As médias e desvios padrão de peso, estatura e IMC dos escolares foram de 32,54±10,48; 1,33±0,12 e 18,02±3,86, respectivamente, não havendo diferença estatística. A análise individual dos dados de peso, estatura e IMC dos escolares, demonstra diferença estatística na média do IMC apresentada pela Escola 1 em relação as demais, ou seja, 17,53±3,22; 18,50±4,12 e 18,23±4,54 respectivamente, o que sugere que a Escola 1 é significativamente diferente das demais em relação ao diagnóstico nutricional IMC/I com média menor do que as apresentadas pelas Escolas 2 e 3.

4 DISCUSSÃO

O peso é a medida antropométrica que demonstra o volume corporal (somatória de células, órgãos, gordura, água) e juntamente com idade e sexo, torna-se um índice fácil para avaliar o estado nutricional (NOVELLO; SBRUSSI; QUINTILIANO, 2007).

O estudo demonstrou baixa frequência geral do índice baixo peso com 15,4%, 12,9% e 1,7% nas Escolas 1, 2 e 3 respectivamente, sendo que os maiores percentuais foram observados entre as meninas do que entre os meninos. Esses resultados vão ao encontro de dados observados em estudo de Flores et al. (2013), que também encontraram maior percentual em escolares do sexo feminino (4%) do que no sexo masculino (1,7%) analisados no período compreendido entre 2009-2011. Em outra pesquisa realizada em uma escola municipal no Tocantins em 2011, das 59 crianças avaliadas, 73% apresentaram peso normal e somente 8% estavam com baixo peso (TAVARES; GARDENGHI, 2012).

Os resultados do índice de peso adequado foram expressivos com percentuais de 53%, 44,2% e 62,5% nas Escolas 1, 2 e 3 respectivamente. Em comparação com pesquisas realizadas no Brasil recentemente, verifica-se que os escolares encontram-se no geral com maiores percentuais de peso adequado do que os demais índices. Netto-Oliveira et al. (2010) em estudo realizado na cidade de Maringá-PR, identificaram índices adequados em 38,2% (n=625) e 39,7% (n=648) em meninos e meninas respectivamente enquanto Gilglioni, Ferreira e Bennemman (2011) avaliaram 27 escolas públicas municipais da mesma cidade e obtiveram o resultado de 59,3% de peso adequado. Em outra pesquisa realizada em 2010 com 939 alunos na cidade de Cruzeiro do Oeste - PR demonstrou 78,3% dos meninos e 73,0% das meninas com índices de peso adequado (AZAMBUJA et al., 2013). Ribeiro et al. (2013) analisaram 1.728 escolares de São Miguel do Oeste-SC encontrando 1.270 (73,5% da amostra) com peso adequado e somente 16 alunos em baixo peso (0,9% da amostra). No município de Gravataí-RS, foi detectado 65,2% de eutrofia entre os escolares de 6 a 9 anos em uma amostra de 501 alunos (MONTEIRO; AERTS; ZART, 2010). Em Montes Claros - MG, 72,9% dos meninos e 75,0% das meninas de uma amostra composta de 1.306 crianças foram classificadas com o mesmo índice (RODRIGUES et al., 2012). Em Parnaíba-PI 61,3% dos escolares (n=231) também se encontram na faixa de peso adequado (FILGUEIRAS et al., 2012).

O índice de sobrepeso dos escolares teve resultado percentual que deve ser considerado com relevância devido ao fato que os mesmos são de valores acentuados com 31,6%, 42,9% e 35,8%, destacando-se a Escola 2 com maiores resultados que variou de 41,0% (n=48) em meninos e 44,9% (n=48) em meninas. Estudos realizados na região sul do país com crianças entre 6 e 10 anos também identificaram altos índices de sobrepeso de escolares, 38,9%, 30,4%, 27,2% e 26,4% (VIEIRA et al., 2008; MELLO et al., 2010; OLIVEIRA et al., 2011; POLLA; SCHERER, 2011).

Ao analisar os dados dos escolares classificados com índice de sobrepeso, verifica-se maior número de meninos (n=115) do que meninas (n=108), resultado divergente de estudo realizado em Brasília (DF) entre os anos de 2000-2001 com 528 escolares que obteve em conjunto 18,8% dos meninos (n=48) e 21,2% das meninas (n=58) com sobrepeso (GIUGLIANO; MELO, 2004), porém assemelha-se com estudo de Balaban; Silva (2001) que observaram que o sobrepeso mostrou-se mais prevalente entre os meninos (34,6%) do que nas meninas (20,6%).

O sobrepeso entre escolares destaca-se como o índice nutricional de maior frequência percentual encontrado atualmente em vários estudos. Recentemente, a Pesquisa

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de Orçamentos Familiares (IBGE, 2008-2009) revelou uma prevalência de sobrepeso de 34,8% nos meninos e 32,0% nas meninas de 5 a 9 anos de idade. Na região sul do Brasil, os percentuais foram de 36,3% nos meninos e 35,5% nas meninas. Altos índices de sobrepeso também foram encontrados em 2 (dois) estudos com escolares na faixa etária 7 - 10 anos em cidades do Estado do Paraná. Em Apucarana, Guedes et al. (2006) avaliaram 1.564 escolares encontrando sobrepeso em 17,9% dos meninos e 22,4% nas meninas, Ronque et al. (2005) avaliaram 511 alunos matriculados em uma instituição privada de Londrina, relatando 37,2% (n=102) dos meninos e 26,6% (n=63) das meninas com sobrepeso.

Em um estudo longitudinal de tendência, realizado com amostra voluntária constituída de dados provenientes do Banco de Dados do Projeto Esporte Brasil (PROESP-Br), foi constatado uma média da prevalência de excesso de peso no período 2009-2011 de 27,6% no sexo masculino e de 33,8% no sexo feminino (FLORES et al., 2013).

A maioria dos estudos com esta população demostra que percentuais de peso adequado são predominantes, porém em segundo lugar de classificação encontra-se o índice de sobrepeso com valores preocupantes. Goulart de Andrade (2006) encontrou em sua pesquisa com 492 crianças, 59,6% com peso adequado e 24,6% com sobrepeso. Nogueira (2009) analisou 1.512 escolares de Porto Alegre-RS e obteve 70,9% dos meninos (n=506) e 67,82% das meninas (n=541) com peso adequado seguido de 23,1% dos meninos e 27,5% das meninas com excesso de peso onde, as meninas da faixa etária de 8 e 9 anos possuem maior frequência do que os meninos da mesma idade (34,9% e 30,4%, respectivamente). Panazollo et al. (2014) demonstraram que a prevalência de excesso de peso dos escolares do município de Feliz-RS em 2010 foi de 31,4% (65,2% com peso adequado).

A obesidade na infância tende a permanecer na fase adulta, se não for convenientemente controlada, aumentando os índices da morbimortalidade (LEÃO et al., 2003; NASCIMENTO; MUNIZ; PINHEIRO, 2010). Assim, constitui-se uma grande importância a avaliação do estado nutricional dos escolares por meio do cálculo do IMC, haja vista que possibilitam o diagnóstico do estado nutricional de forma simples, econômica e de fácil interpretação para detecção precoce de crianças com risco de obesidade, fazendo com que o prognóstico seja em longo prazo mais favorável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados apresentados neste estudo estão diretamente relacionados com o atual processo de transição nutricional, visto que uma parcela significativa das crianças foi considerada com alto índice de sobrepeso. A prevalência destes resultados leva a um aumento na demanda de atenção das áreas de saúde e educação entre os pré-escolares, pois podem influenciar as crianças em vários aspectos como o crescimento, qualidade de vida e desempenho escolar.

Sendo assim, reforça-se que há necessidade de mais estudos de acompanhamento nutricional por profissionais de nutrição entre os escolares, incluindo ações que visem prevenir e/ou tratar a obesidade quando já está instalada e que levem orientações nutricionais aos pais e familiares dos mesmos.

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RELAÇÃO DA QUALIDADE AMBIENTAL E OS PARÂMETROS ABIÓTICOS EM CÓRREGOS DE CABECEIRA NA BACIA DO RIO

TIBAGIRELATION OF ENVIRONMENTAL QUALITY AND ABIOTIC PARAMETERS IN

HEADWATERS STREAMS IN THE TIBAGI RIVER BASIN

Robson Alexandre Tozzo11

Fagner de Souza12

Augusto Frota13

RESUMO:As atividades humanas são as principais responsáveis em contexto global de mudanças ambientais. Sendo assim, é essencial que a água esteja em condições adequadas para o consumo dos seres vivos e novas tendências para a conservação devem surgir, a fim de preencher uma lacuna entre a produção humana e o equilíbrio ambiental. Desta forma, traçamos a hipótese de que os parâmetros abióticos são afetados pela qualidade ambiental. Com isso, objetivamos avaliar os parâmetros físicos e químicos em dois córregos, na bacia do rio Tibagi, comparando os valores encontrados de cada parâmetro com a qualidade ambiental de cada córrego. Foram realizadas quatro coletas periódicas, com intervalo de três meses, em dois córregos na bacia do rio Tibagi, comparando os valores encontrados de cada parâmetro com a qualidade ambiental de cada córrego. Os parâmetros amostrados foram: pH, Oxigênio Dissolvido, DQO, Nitrito, Nitrato e Fosfato. A qualidade ambiental foi analisada por meio do protocolo de diversidade de hábitats. Nos resultados, foi observado diferenças entre os córregos na qualidade ambiental e nos parâmetros abióticos. Estes dados evidenciaram que a qualidade ambiental se apresentou como um fator que influencia a alterações nos parâmetros abióticos, quando estes submetidos a ambientes qualitativamente diferentes. PALAVRAS-CHAVE: Análise físico-química. Bacia do alto rio Paraná. Degradação ambiental. Impactos antrópicos. Impactos ecológicos.

ABSTRACT:The human activities are the mainly responsible in global context of environmental changes. Thus, is is essential that the water is under appropriate conditions for consumption by living organisms and new trends for conservation should arise, to fill a gap between human production and environmental balance. In this way, traced the hypothesis of that the abiotics parameters are affects by environmental balance. Thereby, aimed to evaluate the physical and chemical parameters in two streams, in the Tibagi River Basin, comparing the values found of each parameter with the environmental quality of each stream. The sampled parameters were: pH, Dissolved Oxygen, OCD, Nitrite, Nitrate, Phosphate. The environmental quality was analyzed by habitats diversity protocol. In results, differences were observed between streams in the environmental quality and abiotic parameters. These data demonstrate that the environmental quality presented as a factor that influences changes in abiotic parameters, when they are subjected to environmental qualitatively different environments.KEYWORD: Physico-chemical analysis. Upper Paraná River Basin. Environmental degradation. Human impacts. Ecological impacts.

INTRODUÇÃO

O planeta terra apresenta 71% de sua área coberta por água (BRUSCA; BRUSCA, 2007), entretanto deste total apenas 0,01% está disponível para população humana (ORR, 1986). Segundo Morais e Jordão (2002), a água é um recurso renovável. Com o aumento populacional em pouco tempo esse recurso pode se tornar finito ou indisponível para a população, principalmente devido à poluição de rios e lagos (MORAIS; JORDÃO, 2002).

11  Fap - Faculdade de Apucarana.  R. Osvaldo de Oliveira, 600, 86811-500, Apucarana-PR.12 Programa de Pós-Graduação em Ecologia de Ecossistemas Aquáticos Continentais. email para contato: [email protected] 13 Universidade Estadual de Maringá, Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aquicultura. Coleção Ictiológica do Nupélia. Av. Colombo, 5790, 87020-900 Maringá-PR.

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FIGURA 1 – Área de estudo amostrada. A) Localização na América do sul, B) Localização na bacia do alto rio Paraná e C) Pontos amostrados. Estrelas vermelhas= córrego Japira; estrelas amarelas= córrego Água do Xaxin.

Amostragem

Foram realizadas quatro coletas periódicas com intervalo de três meses de outubro de 2012 a julho de 2013, durante o período matutino e em dias de sol com 48h no mínimo de ausência de chuva. As amostras foram levadas em seguida até o laboratório de química e bioquímica da FAP- Faculdade de Apucarana para as análises dos parâmetros físicos e químicos. Os parâmetros amostrados foram: Potencial Hidrogeniônico (pH); Oxigênio Dissolvido (OD); Demanda Química de Oxigênio (DQO); Nitrito (NO2-); Nitrato(NO3-), Fosfato (PO3-).

Além disso, foi realizada uma caracterização sobre a diversidade de hábitats e qualidade ambiental, este dados foram amostrados utilizando o Protocolo de Diversidade de Hábitats proposto por Callisto et al. (2002).

Análise de Dados

Depois de obtidos os valores dos parâmetros físicos e químicos e de qualidade ambiental, estes foram comparados ponto a ponto a fim de ver evidenciar correlações entre estas variáveis. Para as comparações entre os parâmetros foi realizado o teste não paramétrico de “Mann-Whitney U test” entre os córregos amostrados. Este teste foi aplicado devido quantidade de replicas das amostras, menores que 15, e também por elas não terem atingido os pressupostos necessários, de normalidade ou homocedasticidade nos dados, para realização de testes paramétricos. Todos gráficos e análises foram realizadas no software Statistica versão 7.1 (STATSOFT, 2005).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nos resultados sobre a qualidade ambiental dos córregos no protocolo de diversidade

A ocupação desordenada em ambientes naturais pelo homem, consequentemente afeta drasticamente os organismos e toda a sua cadeia trófica no ecossistema (MILANO, 2012).

As atividades humanas são as principais responsáveis em contexto global de mudanças ambientais (STERN et al.,1993). Atividades como emissão de resíduos industriais e domésticos, são os fatores principais pelo alto desequilíbrio dos corpos aquáticos. Sendo assim é essencial que à água esteja em condições adequadas para o consumo dos seres vivos (CRUZ et al., 2007) e novas tendências para a conservação tendem a surgir, a fim de preencher uma lacuna entre a produção humana e o equilíbrio ambiental (PRIMACK; RODRIGUES, 2001).

Visando a integridade desse recurso o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), em sua resolução nº 357/05, descreve que a água está entre as maiores preocupações para o desenvolvimento sustentável. Neste contexto, análises de parâmetros físico-químicos da água, segundo Galdino e Trombini (2010) podem auxiliar no levantamento de informações sobre a qualidade da água, identificando e monitorando possíveis efeitos negativos para as populações que se utilizam deste recurso.

Diante do exposto traçamos a hipótese de que os parâmetros abióticos são afetados pela qualidade ambiental, apresentando diferenças nas concentrações físicas e químicas de cada ambiente. Objetivamos avaliar os parâmetros físicos e químicos em dois córregos na bacia do rio Tibagi no Município de Apucarana-PR, comparando os valores encontrados de cada parâmetro com a qualidade ambiental de cada córrego.

MATERIAIS E MÉTODOS

Área de Estudo

O estudo foi realizado em nove pontos amostrais, sendo três no córrego Japira e os outros três pontos no córrego Água do Xaxin. Ambos os córregos são pertencentes a bacia do rio Tibagi. Contudo, os córregos estão contidos na mesma dimensão longitudinal, ou seja, o córrego Japira é montante do córrego Água do Xaxin, contudo estão separados por dois lagos, lago do Shimit e lago da Raposa (Figura 1).

O córrego Japira (23º32’26.77’’S/51º25’48.60’’O) está localizado no perímetro urbano na cidade de Apucarana e é afluente na Represa do Schmid. Apresenta ao longo de todo o trecho amostrado pouca mata ciliar, erosão em extremo avanço nas margens, fluxo d’água dominado por remansos e pequenos poços, e seu leito com assoreamento acentuado.

O córrego Água do Xaxin (23º32’13.44’’S/52º24’27.69’’O) está localizado em uma Unidade de Conservação (UC Parque da raposa), sua montante está situada após a da barragem que forma o lago da Raposa. Apresenta ao longo de todo o trecho amostrado uma densa mata ripária, fluxo d’água sem influência antrópica e com predominância de corredeiras e poços, e seu leito é composto por seixos e sedimento argiloso.

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de hábitats o córrego Água do Xaxim foi considerado um ambiente com características em todos os pontos amostrados e consequentemente com status de ambiente Natural na média geral. Já o córrego Japira seguiu uma tendência inversa, sendo considerado impactado em todos os pontos e também em sua média geral (Tabela 1).

Em relação aos parâmetros abióticos, o córrego Água do Xaxim apresentou, em relação ao córrego Japira, maiores valores médios para potencial hidrogeniônico (pH), oxigênio dissolvido (OD), fosfato e Nitrito, e menores valores para demanda química de oxigênio (DQO) e Nitrato. No entanto apenas pH (z=-1,96; p=0,04), OD (z=1,96; p=0,04), DQO (z=1,96; p=0,04) e Nitrato (z=23,33; p=0,00002) apresentaram diferenças estatisticamente significativas (Figura 2).

Figura 2 - Valores dos parâmetros analisados nos córregos Japira (C. Japira) e Água do Xaxim (C. Xaxim).

Tabela 1 - Resultados das médias gerais entre os córregos e os períodos sazonais do protocolo de avaliação da diversidade de habitas nos riachos amostrados. M.P.P.A.H (Média da Pontuação).

Local M.P.P.A.H. Montante Médio Curso Jusante

Córrego Água do Xaxim 73,3Natural

68,5Natural

68Natural

83,5Natural

Córrego Japira 37,6Impactado

36,3Impactado

39,8Impactado

36,8Impactado

Com base nos resultados, a relação parâmetros abióticos e qualidade ambiental também é um fator que se altera quando submetidos a ambientes qualitativamente diferentes. Esta mesma tendência já foi evidenciada em outros trabalhos que utilizaram parâmetros bióticos diferentes (SOUZA et al., 2013, SOUZA et al., 2014). Nestes trabalhos, ambientes com características naturais apresentaram maiores valores na riqueza e diversidade de espécies.

Neste contexto, uma ponte entre estes trabalhos e nossos resultados pode ser observada, principalmente nos valores divergentes de oxigênio, pois os organismos utilizados foram heterotróficos aeróbicos, peixes (SOUZA et al., 2013) e macroinvertebrados(SOUZA et al., 2014), ou seja, necessitam de altas taxas de oxigênio para sobreviver e manter as comunidades ecologicamente estruturadas.

Além disso, as características divergentes de fluxo d’água entre os córregos amostrados podem estar influenciando as taxas de oxigênio dissolvido, de demanda química de oxigênio e nitrato. O fluxo mais rápido no córrego Água do Xaxim propicia o aumento da concentração de oxigênio dissolvido em toda coluna d’água. Por causa do rápido fluxo, taxas dos parâmetros supracitados diminuem devido a maior taxa de renovação d’água e menor tempo para decomposição e sedimentação de matéria orgânica (ESTEVES, 1998; ALLAN; CASTILLO, 2007).

No córrego Japira em um contexto de química ambiental, a alta concentração de demanda química de oxigênio e nitrato encontrada em nossos dados, de acordo com Galdino e Trombini (2010), indica que as fontes podem ser oriundas de agentes químicos e de resíduos urbanos, causando aos córregos fortes impactos e poluição aquática. Ainda o baixo fluxo d’água no córrego Japira, em relação ao córrego Água do Xaxim, propicia a deposição e a oxidação de matéria orgânica proveniente de resíduos domésticos e industriais (PEREIRA, 2004; CETESB, 2004), resultando em um alto consumo de oxigênio, por bactérias anaeróbias, em períodos de seca em corpos fluviais (SPERLING, 1996).

Os ambientes aquáticos possui uma estreita ligação com os fatores externos, estes podem regrar a qualidade ambiental e moldar as estruturas bióticas e abióticas (GALDEAN et al., 2000). Desta maneira, o córrego Japira vem sendo foco de vários trabalhos (GALDINO; TROMBINI, 2010; SOUZA et al., 2013; SOUZA et al., 2014) que comprovam a sua intensa degradação e a ameaça que está impacto pode causar em as comunidades aquáticas submetidas e este regime.

A presença de uma unidade de conservação, no qual o córrego Água do Xaxim está inserido, pode ter contribuído para a caracterização de sua qualidade ambiental. Contudo, Souza e Klepka (2013) alertam que esta unidade de conservação já apresenta vários focos de impactos na comunidade aquática e a necessidade de uma atenção redobrada para estas regiões consideradas naturais é prioridade, visando a estabilidade da estrutura ecológica ali presente.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em síntese, foi constatado que a qualidade ambiental e as características do local, como fluxo hidrodinâmico, leito, margens e urbanização, podem influenciar os parâmetros abióticos de um ambiente. Assim, novamente um apelo pelo córrego Japira é solicitado, como outros já relatados em trabalhos anteriores, tendo em vista que planos estratégicos para restauração dos trechos de mata ciliar e uma fiscalização mais intensa sobre o descarte de resíduos (domésticos e industriais), devem estar presente nos planos gerenciadores do município. Além disso, a manutenção e uma fiscalização eficaz devem estar presentes na unidade de conservação Parque da Raposa, a fim de sanar e evitar futuros impactos nos ambientes considerados naturais.

AGRADECIMENTOS

À Professora de Química da FAP Rosana Trombini, pela ajuda nas análises físico-químicas, aos Biólogos Emerson Gonçalves e Genilson Santos, pela ajuda nas coletas do material, à bióloga/professora Ellenn Christie, por revisar o manuscrito, à secretaria de Meio ambiente e Turismo de Apucarana. Souza F. agradece à Capes e ao programa de PPG em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais, e Frota A. agradece à Fundação Araucária.

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AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO MOTORA, EQUILÍBRIO E RISCO DE QUEDAS DE INDIVÍDUOS PÓS ACIDENTE VASCULAR

ENCEFÁLICO E SUA CORRELAÇÃO COM A INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL E A PERCEPÇÃO DE QUALIDADE DE VIDA: um

estudo transversalEVALUATION OF MOTOR FUNCTION, POSTURAL BALANCE AND RISK OF FALLS IN

INDIVIDUALS POST STROKE AND CORRELATION WITH FUNCTIONAL INDEPENDENCE AND HEALTH-RELATED QUALITY OF LIFE: cross sectional study

INACIO, Nathália Rodrigues14

SILVA, Thais Aparecida15;TSUKAMOTO, Heloísa Freiria16

RESUMO Introdução O acidente vascular encefálico (AVE) frequentemente acarreta alterações motoras que afetam a função do sobrevivente, com aumento da dependência para atividades de vida diária (AVDs) e ruptura na interação social, resultando em prejuízos sobre a qualidade de vida (QV). Objetivo Avaliar o desempenho físico, equilíbrio postural e risco de quedas em indivíduos após AVE e verificar a existência de correlações das variáveis com a autopercepção de QV e independência funcional. Métodos Trata-se de um estudo transversal, com abordagem quantitativa e amostra composta por 12 pacientes pós-AVE. Foram utilizados: Protocolo de Desempenho Físico de Fugl-Meyer (FM); Escala de Equilíbrio de Berg (EEB); Escala de Eficácia de Quedas Internacional (FES-I); Stroke Specific Quality of Life Scale (SSQOL); Índice de Barthel modificado (IBm). Os dados foram analisados no programa estatístico SPSS. Adotou-se p<0,05. Resultados Dos 12 participantes do estudo, sete (58,3%) eram mulheres, com média de idade de 61 anos (±15,7). O hemicorpo afetado era o esquerdo para oito (66,7%) pacientes e o tipo de AVE, hemorrágico para sete (58,3%). As médias das pontuações foram: FM=142 pontos (±42,3), EEB=35,1 pontos (±18,8), FES-I=37,9 pontos (±11.5), SSQOL=157,2 pontos (±36,1) e IBm=40,4 pontos (±4,4). Encontrou-se correlação forte entre SSQOLxEEB (r=0,76;p=0,004) e SSQOLxFES-I (r=-0,93;p<0,001) e correlação moderada entre SSQOLxFM (r=0,63;p=0,028) e SSQOLxIBm (r=0,65;p=0,021). Conclusão Observou-se que o AVE acarreta prejuízo sobre a QV dos indivíduos do estudo, sendo mais evidente quando existe maior limitação dos movimentos. Porém, apesar da limitação física, a maior parte dos indivíduos apresentou dependência ligeira ou moderada, mostrando que com o passar do tempo, ocorre adaptação para realizar as AVDs de forma independente.PALAVRAS-CHAVE: Acidente vascular encefálico; Déficits neurológicos; Equilíbrio postural; Qualidade de vida; Quedas.

ABSTRACTIntroduction Stroke often entails motor and sensory changes that affect the survivor physical function leading to increased dependence for daily activities, moods changes and breakdown in social interaction, which can result in significant damage in quality of life (QoL). Objective Evaluate physical performance, postural balance, QoL, functional independence and risk of falls in individuals after stroke, check for the variables correlations with self-perception of QoL and functional independence. Methods This is a cross sectional study with a quantitative approach and sample consisted of twelve patients with a diagnosis of stroke. To compose the study data were used: Physical Performance Protocol of Fugl_Meyer (FM); Berg Balance Scale (BBS); Falls Efficacy Scale International (FES-I); Stroke Specific Quality of Life Scale (SSQOL); Modified Barthel Index (BI). Was adopted p>0,05. Results Among the twelve participants in the study, seven (58,3%) were women and the average age was 61 years (±15,7). The hemibody affected was the left for eight (66,7%) patients and the hemorrhagic type of stroke for seven (58,3%). The average total of

14  Graduanda do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Filadélfia de Londrina – UniFil, e-mail: [email protected]  Graduanda do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Filadélfia de Londrina – UniFil, e-mail: [email protected]  Fisioterapeuta, Mestre em Ciências da Reabilitação, Especialista em Fisioterapia Neurofuncional Adulto, Docente do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Filadélfia – UniFil, e-mail: [email protected].

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vida (QV) dos mesmos (BORGES; FILHO; MASCARENHAS, 2010).Dessa forma, é importante avaliar parâmetros de desempenho físico, equilíbrio

postural e o medo de cair de indivíduos hemiparéticos, verificando assim a repercussão dessas condições sobre a QV e a independência funcional dos mesmos. Identificando esses fatores, é possível elaborar um programa terapêutico que melhor atenda às necessidades desses pacientes, contribuindo para o resgate da identidade pessoal e reinserção no convívio em sociedade.

O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho físico, o equilíbrio postural e o risco de quedas em indivíduos após AVE e verificar a existência de correlações das variáveis com a autopercepção de QV e a independência funcional.

2 MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal, com abordagem quantitativa, desenvolvido nas dependências da Clínica de Fisioterapia do Centro Universitário Filadélfia – UniFil, na cidade de Londrina-PR, no período de abril a junho de 2015.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética na Pesquisa em Seres Humanos da UniFil, e todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido (Parecer nº 885.023/2014).

Foi selecionada para o estudo uma amostra não probabilística, por conveniência e intencional, de indivíduos atendidos na referida Clínica de Fisioterapia, com diagnóstico médico de AVE. Os critérios de inclusão estabelecidos foram: indivíduos maiores de 18 anos; de ambos os gêneros; sem restrição quanto ao tempo de lesão neurológica; com quadro motor de hemiparesia a direita ou a esquerda e que fossem capazes de responder as questões propostas. Os critérios de exclusão foram: indivíduos com déficits de compreensão, que impediam o entendimento das atividades do estudo.

Procedimentos do estudo

A coleta dos dados foi realizada individualmente, sob forma de entrevista e avaliação física, por um único avaliador previamente treinado, com o intuito de evitar erros de interpretação. Foi realizada em data previamente agendada, antes ou após a realização do atendimento fisioterapêutico dos pacientes, para não impor ônus aos mesmos.

Inicialmente, foi preenchida a ficha de identificação do participante, contendo dados pessoais, anamnese e antecedentes pessoais. Em seguida, foram aplicados alguns instrumentos padronizados de avaliação.

Os instrumentos de avaliação selecionados para este estudo foram: Protocolo de Desempenho Físico de Fugl-Meyer (FM), Índice de Barthel Modificado (IBm), Escala de Equilíbrio de Berg (EEB), Escala de Eficácia de Quedas-Internacional (FES-I), e questionário de QV Stroke Specific Quality of Life Scale (SSQOL).

O Protocolo de Desempenho Físico de Fugl-Meyer (FM) avalia seis aspectos do paciente: a amplitude de movimento, a dor, a sensibilidade, a função motora da extremidade superior e inferior e o equilíbrio, além da coordenação e velocidade. A pontuação máxima da extremidade superior é igual a 66 pontos e a da inferior, 34 pontos, dando uma pontuação da função motora máxima igual a 100 pontos, o que define a função motora normal. O equilíbrio é avaliado por sete

FM was 142 points (±42,3), BBS was 35,1 (±18,8) and FES-I was 37,9 points (±11,5), SSQOL was 157,2 points (±36,1) and BI was 40,4 points (±4,4). The results of the statistical analysis of the questionnaires showed strong correlation between SSQOLxBBS (r=0,76;p=0,004) and SSQOLxFES-I (r=-0,93;p>0,001) and moderate correlation between SSQOLxFM (r=0,63;p=0,028) and SSQOLxBI (r=0,65;p=0,021), respectively. Conclusion It was observed that stroke causes damage on the QoL if individuals interviewed in the study and this is more evident when is a bigger limitation of movement. However, despite the physical limitations the majority part on individuals had mild or moderate dependence, showing that over time occurs an adaption of hemiparetic individual to perform activities of daily living independently.KEYWORDS: Stroke; Neurological deficits; Postural balance; Quality of life; Falls.

1 INTRODUÇÃO

O acidente vascular encefálico (AVE) é uma injúria vascular do sistema nervoso central (SNC) que pode ser relatado como uma ocorrência aguda de um distúrbio neurológico (SANTOS et al., 2014). É prevalente em adultos e idosos, sendo reconhecido como a segunda causa de morte no mundo e a primeira causa de incapacidade funcional para as atividades de vida diária (AVDs) (RANGEL; BELASCO; DICCINI, 2013).

O AVE constitui uma síndrome de rápido desenvolvimento, consequente da restrição na irrigação sanguínea do encéfalo, com sinais e sintomas clínicos de perda da função cerebral com provável origem vascular que perduram por mais de 24 horas, provocando sequelas motoras, sensitivas e/ou cognitivas, podendo ser isquêmico (AVEi) ou hemorrágico (AVEh) (TRINDADE et al., 2011; BRAUN; HERBER; MICHAELSEN, 2012; BRITO et al., 2013).

A sequela física mais comum é a hemiparesia, que pode ser definida como uma perda parcial das funções motora e/ou sensitiva e/ou perceptual de um hemicorpo, mais notável pelo comprometimento dos membros superior e infe rior de um mesmo lado do corpo, comumente acompanhado de um padrão patológico espástico nos músculos flexores do membro superior e nos extensores do membro inferior, com acometimento mais frequente dos músculos antigravitacionais. Ainda, grande parcela dos prejuízos funcionais apresentados pelos indivíduos hemiparéticos advém da disfunção do segmento corporal tronco (FERLA; PERICO, 2015).

A presença dessas alterações em um hemicorpo frequentemente ocasiona assimetria corporal. Esta pode estar relacionada com a dificuldade na execução de atividades motoras durante a manutenção da postura, na marcha e nas transferências funcionais, além da diminuição na capacidade de tomada de peso no lado afetado, impossibilitando a estabilidade necessária para realização de movimentos com o tronco e membros, bem como a execução de AVDs como se vestir, alimentar, mudar de postura, andar e sentar, levando à dependência funcional (MAGALHÃES et al., 2013).

Neste contexto, independência funcional pode ser definida como a capacidade de o indivíduo realizar atividades físicas e mentais necessárias para manutenção de suas atividades básicas e instrumen tais. Quando o indivíduo sofre um dano à saúde que provoca limitação física, sua independência para execução de AVDs estará prejudicada. A perda dessa capacidade está associada também a um quadro de fragilidade, risco au mentado de quedas, problemas de mobilidade e até a morte, implicando em complicações ao longo do tempo, caso este indivíduo não receba cuidados (DELBONI; MALENGO; SCHMIDT, 2010; BRITO et al., 2013).

Assim, a presença de dificuldades para a mobilidade e para a manutenção do controle postural e do equilíbrio em indivíduos com sequelas de AVE geram consequências significativas como o isolamento social, interferindo negativamente sobre a qualidade de

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itens, utilizando-se a mesma escala de graduação. A sen sibilidade é testada através da exterocepção e propriocep ção recebendo uma classificação de zero (0) para anestesia, um (1) para hipoestesia, e dois (2) para sensibilidade normal. A movimentação passiva é avaliada com pontuações de zero (0) para nenhum ou quase nenhum grau de movimentação, um (1) para perda de alguns graus de movimentação, e dois (2) para amplitude nor mal de movimento. Para a avaliação da dor, zero (0) significa dor pronunciada, um (1) alguma dor, edois (2) ausência de dor (TELES; GUSMÃO, 2011).

O Índice de Barthel Modificado (IBm) é um método quantitativo para avaliação do grau de independência na realização de AVDs, que permite uma ampla graduação entre máxima dependência (10 pontos) e máxima independência (50 pontos). São avaliadas dez atividades básicas de vida diária: alimentação, higiene pessoal, uso do banheiro, banho, continência do esfíncter anal, continência do esfíncter vesical, vestir-se, transferências cama-cadeira, subir e descer escadas, deambulação e manuseio da cadeira de rodas (alternativo para deambulação). É baseado em pontuações que fornecem um número absoluto para quantificar o grau de dependência funcional sendo possível classificar o indivíduo em níveis funcionais (dependência total, severa, moderada, ligeira dependência ou independência total) (PINHEIRO et al., 2013).

A Escala de Equilíbrio de Berg (EEB) avalia quantitativamente a habilidade do indivíduo em manter o centro de gravidade dentro da base de suporte du rante a execução de atividades funcionais diárias, além de determinar fatores de risco para dependência e ocorrência de quedas. A escala avalia o equilíbrio funcional, ba seada em 14 itens comuns do cotidiano, tais como alcan çar, girar, transferir-se, permanecer em pé e levantar-se. A pontuação máxima que pode ser alcançada é 56 pontos. Cada um dos 14 itens possui cinco alternativas possíveis para pontuação; zero (0) remete a uma situação de incapaci dade ou necessidade extrema de terceiros para a realização da atividade, enquanto o escore quatro (4) demonstra total independência (POMPEU et al., 2011).

A Escala de Eficácia de Quedas Internacional (FES-I) consiste em uma escala que avalia o medo da possibilidade de quedas, com 16 questões simples, relacionados com atividades do cotidiano do paciente, como limpar a casa, tomar banho, levantar e sentar, atender ao telefone, visitar parentes, realizar atividades sociais. Os itens são pontuados de um (1) a quatro (4) pontos, em que um não há preocupação de cair e quatro se mostra extremamente preocupado com a queda (MONTEIRO et al.,2013).

O questionário Stroke Specific Quality of Life Scale (SSQOL) é uma escala específica de avaliação da QV em pacientes após AVE. É composto por 49 questões, divididas em 12 domínios (energia, papel familiar, linguagem, mobilidade, humor, personalidade, autocuidado, papel social, raciocínio, função de membro superior, visão e trabalho/produtividade), e para cada questão existem escores de um (1) até cinco (5) pontos, na qual, quanto maior a pontuação, melhor a percepção de QV (BRITO et al., 2013).

Análise dos dados

Os dados foram analisados de forma descritiva e analítica, através do programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão IBM 20. Para verificar a normalidade dos dados das variáveis numéricas, utilizou-se o teste de Shapiro WilK e para verificar a existência de correlações, utilizou-se a Correlação de Pearson. Os dados foram apresentados através de média e desvio padrão, ou mediana e quartis. Adotou-se p<0,05.

3 RESULTADOS

3.1 Caracterização da amostra

Participaram do estudo 12 indivíduos com diagnóstico clínico de AVE, sendo a média de idade de 61anos (±15,7) e a mediana do tempo de lesão de três anos (1,5-5), sendo 50% aposentados. Os demais dados estão mostrados na tabela 1.

Tabela 1 – Caracterização da amostra do estudo (n=12).

VARIÁVEL FREQUÊNCIA ABSOLUTA (n)

FREQUÊNCIA RELATIVA (%)

Gênero FemininoMasculino

0705

58,341,7

Tipo AVE IsquêmicoHemorrágico

0507

41,758,3

Hemicorpo afetado DireitoEsquerdo

0309

2575

RaçaBrancaPardaAmarela

090102

758,3

16,7

Ocupação atual

AposentadoDo larArquitetoNão têm

06040101

5033,48,38,3

Nota: AVE – acidente vascular encefálico.

3.2 Fugl-Meyer (FM)

A pontuação total do FM confirma que os participantes do estudo apresentam sequelas decorrentes do AVE, sendo a motora a mais evidente, uma vez que os resultados do FM mostraram que 58,3% (7) dos indivíduos possuem comprometimento motor severo, 33,4% (4) comprometimento motor marcante e 8,3% (1) comprometimento motor moderado. Os dados dos demais domínios estão mostrados na tabela 2.

3.3 Índice de Barthel Modificado (IBM)

relação à independência funcional auto-avaliada pelo indivíduo através do índice, observou-se a seguinte classificação: 41,6% (5) apresentaram dependência moderada, 25% (3) ligeira dependência e 33,4% (4) independência total. Dentre as questões, a que apresentou pior pontuação foi “subir escadas”. Os demais dados estão apresentados na tabela 2.

3.4 Escala de Equilíbrio de Berg (EEB)

Na avaliação de equilíbrio postural, 50% (6) dos indivíduos apresentaram um baixo risco de quedas, 25% (3) um médio risco de quedas, e 25% (3) elevado risco de quedas. As maiores dificuldades foram notadas em atividades que envolviam “rotações de tronco”, “translação”, “apoio unipodal” e “passos alternados sobre um degrau”. Os demais dados estão apresentados na tabela 2.

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3.5 Escala de Eficácia de Quedas Internacional (FES-I)

Quanto à preocupação com a possibilidade de cair, a média obtida no FES-I foi de 37,9 pontos. As atividades que mostraram uma maior preocupação para os indivíduos foram “limpar a casa”, “pegar algo acima da cabeça ou no chão”, “andar sobre superfície escorregadia e irregular” e “subir ou descer uma ladeira”. Os demais dados podem ser visualizados na tabela 2.

3.6 Stroke Specific Quality of Life Scale (SSQOL)

Observou-se prejuízo na autopercepção referida de QV,e quando avaliada nos domínios do cotidiano, mostrou-se afetada e comprometida principalmente em relação aos “papéis familiares”, “papéis sociais”, “memória” e “trabalho”. Os dados dos demais domínios estão mostrados na tabela 2.

Tabela 2 – Valores de média e desvio padrão das escalas Fugl-Meyer, EEB, FES-I, IBm e SSQOL (n=12).

VARIÁVEL PONTUAÇÃO MÁXIMA POSSÍVEL MÉDIA DESVIO

PADRÃO

Fugl-Meyer Total 226 142,0 42,3

FM motor 100 48,9 30,1

FM sensitivo 24 18,4 4,3

FM ADM 88 66,4 14,5FM equilíbrio 14 8,5 2,6

EEB 56 35,1 18,8

FES-I 64 37,9 11,5

IBm 50 40,4 4,4

SSQOL Total 245 157,1 36,1

Energia 15 10,2 4,4Papéis Familiares 15 8,1 3,9

Linguagem 25 19,2 5,3

Mobilidade 30 19,6 6,9

Humor 25 16,0 5,1

Personalidade 15 9,8 3,6

Auto cuidado 25 19,6 4,3

Papéis sociais 25 9,9 3,7

Memória 15 6,3 3,0

Função MS 25 16,4 6,2

Visão 15 12,1 2,2Trabalho 15 8,1 3,8

Nota: FM= Fugl Meyer; ADM= Amplitude de movimento; IBm= Índice de Barthel modificado; EEB= Escala de Equilíbrio de Berg; FES-I= Escala de Eficácia de Quedas Internacional; SSQOL= Stroke Specific Quality of Life Scale, MS= membro superior.

3.7 Correlações entre as escalas e o SSQOL e o IBm

Os resultados da análise estatística dos questionários mostraram correlação forte entre a EEB (r=0,76; p=0,004) e a FES-I (r= -0,93; p<0,001) com o SSQOL, e correlação moderada entre o FM (r=0,63; p= 0,028) com o SSQOL. Correlação forte foi observada também entre a EEB (r=0,74; p=0,005) com o IBm. Entre o IBm e o SSQOL, verificou-se correlação moderada (r=0,65; p= 0,021).

4 DISCUSSÃO

Neste estudo, a amostra foi composta por pacientes de ambos os gêneros, com uma prevalência de mulheres (58,3%). O tipo de AVE mais frequente foi o hemorrágico (58,3%). Esses dados são contrários aos encontrados na literatura (SCALZO et al., 2011; BENVEGNU et al., 2008), que aponta o gênero masculino como o mais acometido, e o tipo isquêmico de AVE como mais frequente. Vale ressaltar que a amostra é não probabilística.

Metade dos participantes da pesquisa se declarou como “aposentado(a)”. Para parte desses, pode-se atribuir o fato ao quadro clínico decorrente do AVE, geralmente incapacitante, que faz com que muitos indivíduos permaneçam dependentes de terceiros para a realização de atividades após a lesão, circunstância essa que pode prejudicar ou até mesmo impossibilitar o retorno ao trabalho (LIMA, 2010). Cabe dizer também que alguns participantes já estavam aposentados antes de sofrer o evento.

Limitações no desempenho físico dos pacientes hemiparéticos ficaram evidentes na análise do instrumento FM, especialmente nas atividades que envolvem motricidade voluntária fina e coordenada das extremidades e atividade reflexa anormal. Segundo Bobath (2001), pacientes com um quadro de hemiplegia/hemiparesia que sofreram lesão do neurônio motor superior, apresentam problemas de força muscular alterada secundário aos da coordenação da ação muscular, o que justifica os déficits percebidos e ressalta a importância do tratamento fisioterapêutico ser baseado em objetivos funcionais, que valorizem o resgate da simetria em relação à tomada de peso para o lado afetado ou não afetado.

De acordo com Trindade et al. (2011) a assimetria corporal é o comprometimento mais evidente da hemiparesia. A distribuição de peso diminuída sobre o lado parético influencia negativamente o controle postural, interferindo na estabilidade para a realização dos movimentos das extremidades, já que, para a realização de atividades funcionais diárias adequadas, é necessária uma adaptação postural, um bom controle de tronco e membros, equilíbrio estático e dinâmico satisfatório, distribuição de peso corporal simétrica e boa coordenação motora. O desalinhamento das extremidades distais está relacionada com a perda do controle de movimento e mudanças no alinhamento proximal, visto que os músculos do tronco devem realizar atividades antecipatórias antes e durante a atividade dos membros.

Pode-se completar a informação com o relato do estudo de Costa, Bezerra e Oliveira (2006), que diz que o déficit de força e alterações no tônus muscular do tronco leva a um padrão de coordenação anormal do movimento, prejudicando a estabilização das cinturas escapular e pélvica, induzindo a um quadro de assimetria corporal que irá afetar a orientação e a estabilidade para realização dos movimentos funcionais. Essa justificativa pode ser aceita como sendo um problema gerador do desempenho insuficiente apresentado

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pelos pacientes nos itens do FM.Um outro dado interessante do presente estudo, ao analisar o desempenho físico

e a independência funcional, foi que, apesar do prejuízo motor ser moderado, grave ou severo para a totalidade da amostra (mostrado pelo FM), os participantes relatam ser leve ou moderadamente dependentes ou independentes para a realização de suas AVDs (pela auto avaliação no IBm). Esse fato mostra que apesar das limitações motoras causadas pela hemiparesia, com o passar do tempo o indivíduo aprende a lidar com suas dificuldades e se adapta para desempenhar da forma mais satisfatória possível sua rotina diária, mesmo que com o uso do hemicorpo sadio, apenas. Souza, Lanza e Bertolini (2008) apontaram em seu estudo que a independência funcional dos hemiparéticos tende a melhorar com o passar do tempo.

A independência ou leve dependência relatada pelo paciente é benéfica no sentido de que as atividades desenvolvidas são mais fáceis e possíveis de serem realizadas de forma adaptada. No entanto, é desfavorável quando o indivíduo se predispõe a realizar atividades mais complexas que exigem um controle adequado do centro de gravidade sobre a base de suporte e receptores proprioceptivos íntegros para o planejamento motor.

Isto fica evidente ao analisar os resultados dos demais instrumentos de avaliação aplicados no estudo, quando foi possível notar que a presença de assimetria corporal e negligência são fatores que contribuem para as principais dificuldades encontradas nas atividades da EEB, IBm e FES-I (“subir escadas”, “apoio unipodal”, “passos alternados sobre um degrau”, “subir ou descer uma ladeira”, “pegar algo acima da cabeça ou no chão”), pois estas envolvem a necessidade de boa distribuição e transferência de peso entre os hemicorpos.

Tsukimoto e Valester (2005) relatam que uma consequência altamente comum pós-AVE devido à assimetria, é a negligência unilateral, que se refere a uma dificuldade na habilidade de direcionar, responder ou orientar-se a estímulos apresentados ao lado oposto da lesão cerebral, ou seja, ao lado hemiparético. Tal alteração influencia diretamente os aspectos relacionados às atividades cotidianas, como os motores, os cognitivos e os motivacionais, sendo comum os pacientes utilizarem apenas o hemicorpo sadio para realização das AVDs. Esta adaptação desfavorece a recuperação funcional ideal após lesão, agravando ainda mais o quadro de negligência e provocando o surgimento de posturas estereotipadas.

Ainda, o déficit de equilíbrio apresentado pode ser explicado pela fraqueza muscular associada com a espasticidade, que dificultam o recrutamento coordenado de fibras musculares e a força suficiente para a execução de uma tarefa funcional (SILVA et al., 2013; TANAKA; SCHEICHER, 2013).O equilíbrio em pacientes com lesões neurológicas tende a estar afetado devido à falta de interação entre os sistemas sensorial, cognitivo e motor, concomitantemente o risco aumenta conforme a vulnerabilidade e instabilidade do paciente, que tende a apresentar uma redução da capacidade de reagir às barreiras impostas pelo ambiente com ações de proteção (POMPEU et al., 2011). Todavia, Monteiro et al. (2013) afirmam que pessoas com AVE crônico podem aprender e se adaptar às suas limitações de equilíbrio e evitar situações comprometedoras que aumentam o risco de quedas.

Sabe-se que as limitações impostas pós-AVE geram um impacto emocional negativo sobre os indivíduos, comprometendo sua evolução no processo de reabilitação, uma vez que o paciente não irá realizar adequadamente as atividades propostas devido

à falta de perspectiva de melhora em seu quadro atual. Condição esta, que limita o fisioterapeuta em seu processo de reabilitação, não conseguindo atuar de forma integral (PIASSAROLI et al., 2012).

Todas essas limitações geram um grande impacto no convívio social dos indivíduos prejudicando a QV, que quando avaliada em domínios do cotidiano tende a se mostrar afetada e comprometida. Este fato está relacionado às correlações encontradas entre as escalas FM, EEB e FES-I com o SSQOL, que mostrou que quanto maior é o comprometimento no desempenho físico, pior o equilíbrio e o medo de quedas, mais prejudicada é a percepção do indivíduo sobre sua QV.

Neste estudo, dos quatro domínios do SSQOL com piores pontuações, três se referem à questão social e apenas um com o próprio indivíduo, dados estes que se relacionam com o estudo de Delboni, Malengo e Schmidt (2010), que afirmam que esses domínios se caracterizam pelo contexto de relação com o outro, no sentido de gerir-se e significar-se numa vivência social, estando ambos diretamente ligados com a capacidade funcional e o que essa significa em uma vida de relação.

A dependência desses pacientes pode levar a um baixo escore do domínio “papéis familiares”, uma vez que gera uma sobrecarga aos cuidadores, refletindo no emocional do paciente em relação à atenção recebida da família (RANGEL; BELASCO; DICCINI, 2013). Por outro lado, a dificuldade para se concentrar ou até mesmo para lembrar as coisas pode levar a improdutividade do trabalho caseiro diário ou até mesmo terminar trabalhos ou tarefas que havia começado, levando a irritabilidade, impaciência e mudança de personalidade (RIBEIRO et al., 2014). Outro item que acarreta prejuízo sobre a QV é a impossibilidade de retornar ao trabalho, uma vez que a ocupação se mostra importante não só para sobrevivência, como também para o status social, relações sociais e auto-conceito (LIMA, 2010).

Ao considerar a QV relacionada à saúde, de acordo com a percepção dos indivíduos pós-AVE, notou-se que quanto mais vulnerável o indivíduo for em relação ao seu desempenho físico no cotidiano, pior será sua interação no convívio social e familiar, posto que a QV reflete a compreensão dos indivíduos de que suas necessidades estão sendo concretizadas, ainda que haja pouca oportunidade de alcançar a felicidade e a auto-realização, com independência de seu estado de saúde físico ou das condições sociais (PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).

Uma das limitações desse estudo foi o tamanho da amostra e o fato da seleção ter sido feita por conveniência, composta apenas por pessoas que estavam em atendimento na Clínica de Fisioterapia da UniFil. Outro apontamento se relaciona ao caráter de auto relato de alguns instrumentos de avaliação aplicados, quando talvez o mais adequado para uma coleta apurada seria a observação em campo das informações, especialmente das relacionadas com a independência funcional.

Deste modo, como apontamento para a prática clínica, pode-se citar que o principal papel do fisioterapeuta na reabilitação é estimular a simetria corporal do paciente através de exercícios que envolvam atividades bimanuais e que intensifiquem a percepção e consciência corporal do hemicorpo afetado. Ainda, é de suma importância orientar corretamente o paciente sobre como realizar adequadamente suas AVDs no contexto domiciliar, posto que o maior tempo do seu dia e/ou semana ele está fora do ambiente terapêutico, que se restringe geralmente a uma, duas ou três horas semanal.

E por fim, salienta-se a importância do fisioterapeuta especialista desde o início

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do processo de reabilitação, uma vez que a simetria poderia ser resgatada mais facilmente se preconizada já na fase aguda da lesão.

5 CONCLUSÃO

Ao finalizar este estudo, pode-se concluir que existe prejuízo do desempenho físico e do equilíbrio e também medo de quedas para a amostra estudada, e que estas variáveis se correlacionam com a autopercepção de QV.

Foi possível observar que o AVE acarreta impacto negativo sobre a QV dos indivíduos entrevistados no estudo, e que este é mais evidente quando existe maior limitação dos movimentos. Porém, apesar da limitação física, a maior parte dos indivíduos apresentou dependência ligeira ou moderada, mostrando que com o passar do tempo, ocorre uma adaptação do indivíduo hemiparético para realizar as AVDs de forma independente, estando o desequilíbrio postural correlacionado a um pior desempenho funcional.

O resultado deste estudo pode impulsionar novas pesquisas sobre o tema abordado, propondo modelos de reabilitação com o objetivo de promover uma melhor QV desses indivíduos.

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NÚCLEO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS – NCHS

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JOGOS DE EMPRESAS: avaliação da cognição em relação ao processo de tomada de decisão e formação de estratégia.

CORPORATE GAMES:cognition assessmentin relation to the decision process and strategy concept.

André RogérioBerto17

Janaina VanzoBerto18

RESUMOA mutabilidade e dinâmica do ambiente em que atuam as empresas possui uma resultante importante no novo ambiente empresarial. Do empresário e do executivo é exigido maior preparo para o estabelecimento de estratégias e de tomadas de decisões. A utilização de jogos de empresas computadorizados permitem a identificação das competências necessárias a essa nova ordem empresarial, sendo um instrumento efetivo no desenvolvimento de habilidades cognitivas fundamentais para a gestão de negócios. Quando bem escolhidos, estruturados adequadamente e aplicados por profissionais preparados para avaliar potencial, facilitam a observação objetiva de diversos recursos cognitivos: pensar por hipóteses, usar várias fontes de informação, exercitar planejamento, tomar decisões, criar novas formas de resolver desafios, exercer liderança no grupo, demonstrar habilidades em geral. Este trabalho pretende mostrar que é possível modelar o comportamento dos indivíduos em computador, criando um ambiente simulado (jogo de empresa) onde se praticam as principais situações do dia-a-dia empresarial em forma de desafio e problemas.PALAVRAS-CHAVE: Jogos de Empresa, Cognição, Formação de Estratégia e Tomada de Decisão.

ABSTRACTThe changeability and dynamic environment in which companies operate have an important result in the new business environment. For the entrepreneur and the executive is required greater preparation for the establishment of strategies and decision making. The use of computerized gaming companies allow the identification of the skills needed for this new business order, being an effective tool in the development of basic cognitive skills for business management. When well chosen, properly structured and applied by professionals prepared to assess potential, facilitate the objective observation of several cognitive resources: think for hypotheses, using various sources of information, exercise planning, make decisions, create new ways of solving challenges, to exercise leadership in group in general skills. This paper aims to show that it is possible to model the behavior of individuals in computer, creating a simulated environment (business game) where is possible to practice the day-to-day business in the form of challenge and problems.KEY WORDS: Company games, Cognition, Strategy Formation and Decision Making.

INTRODUÇÃO

Os jogos de empresas têm sido amplamente utilizados para testar modelos e teorias de uma forma dinâmica e rápida. Eles proporcionam meios para que os participantes aprendam, na prática, a lidar com seus mais importantes problemas surgidos no decorrer do dia-a-dia. Os jogos, ao comprimir tempo e espaço, possibilitam que se realizem experiências e se aprendam ainda quando as conseqüências de nossas decisões estão no futuro e em partes distantes da organização. Os jogos criam um cenário para forjar objetivos e experimentar uma grande variedade de estratégias e diretrizes que poderiam ser usadas para alcançá-los. São um campo de treinamento para equipes administrativas, um lugar onde aprenderão em grupo enquanto tratam de resolver seus problemas mais importantes referentes à empresa.

Os jogos de empresa, como ferramenta de desenvolvimento, oferecem a oportunidade

17  DOUTOR  em Administração  UNAM-ARGENTINA, MESTRE  em Administração  de  empresas  com  ênfase  em  Gestão  de Negócios- UEL Universidade Estadual  de Londrina,  Pós Graduando  em Psicopedagogia UNICID- São Paulo,  Pós-Graduado  em Metodologia  da Ação  Docente,  Especialista  em  Comércio  Exterior,  Pós-Graduado  em Marketing  e  Logística  Empresarial,  Pós-Graduado em Administração Industrial, MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas FGV, Técnico em Contabilidade e Bacharel em Administração. E- mail: [email protected]  Doutoranda em Administração pela Unam (Universidad Nacional de Missiones – Argentina), Mestre em Administração pela UEL (Univerisdade Estadual de Londrina), Especialista em Marketing e Logística pela Unespar, Especialista em Metodologia da ação docente pela UEL, Bacharel em Administração, docente de cursos de graduação e pós-graduação. E-mail: [email protected].

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às pessoas de vivenciar (de forma simulada) todo um tecido social, onde os desafios reproduzem situações do cotidiano. Na dinâmica de ação de jogo, os participantes revelam suas atitudes, valores e crenças, levando para o ambiente de laboratório sua experiência.

O grau de realismo é determinado pela perfeição de sua concepção e descrição de cenários, variáveis e condições. É compreensível que quanto maior seu grau de realismo, maior seu valor pedagógico e sua eficácia didática. Estreitamente ligado a este objetivo pedagógico está sua característica de complexidade. Quanto mais complexo, maior o grau de amadurecimento requerido dos jogadores, maior o preparo intelectual exigido e consequentemente, presume-se maior a eficiência.

Tomar decisões e formular estratégias são tarefas difíceis que normalmente somente são dominadas durante o exercício da profissão dos dirigentes das empresas. Assim, este trabalho apresenta pesquisa realizada sobre os jogos de empresas onde são discutidos aspectos cognitivos desta técnica didática, atuando de forma a integrar e revisar conteúdo de disciplinas, oriundas de diversas áreas do conhecimento, necessárias para um gestor de empresas. Como resultado propõe-se o uso de Jogos de Empresa para difundir o conhecimento de formação de estratégia e tomada de decisão.

Para tanto, o texto esta estruturado em 4 seções, além desta introdução. A primeira trata do pano de fundo da discussão: os jogos de empresa. É construído um quadro referencial ressaltando algumas características dos jogos, além de um breve histórico e seus objetivos. A seção seguinte introduz o ambiente de aprendizagem, discorrendo sobre o uso de cenários e computadores como instrumentos de avaliação. A próxima seção discute a cognição presente nos jogos de empresa, focando a formação de estratégia e a tomada de decisões. E, finalmente, na conclusão, é enfatizada a importância de estudos pontuais, que analisem os jogos de empresas como instrumentos que de fato avaliam o comportamento dos jogadores.

Metodologia

Dentro os principais métodos de investigação, optou-se pelo estudo exploratório, que segundo Munhoz (1994) visa diagnosticar um problema de forma mais precisa, podendo compreender a formulação da questão, com a discussão sobre diferentes hipóteses, a partir do que se estabeleceriam os caminhos para uma investigação mais profunda e tentativamente conclusiva.

Um estudo exploratório pode ser desenvolvido a partir de estudos teóricos existentes, ou de investigações disponíveis, levadas a efeito num esquema de levantamento de dados e informações de campo que compreendem, em ambos os casos, pesquisas com base em documentação. O estudo exploratório também pode partir da observação da própria realidade da qual se extraem elementos de informação para a formulação do problema a ser objeto de outros estudos.

O JOGO DE EMPRESAS

Jogo de Empresas é uma simulação de um ambiente empresarial, onde os participantes atuam como executivos de uma empresa, avaliando e analisando cenários hipotéticos de negócios e as possíveis conseqüências decorrentes das decisões adotadas.

Para Tanabe (1977), Jogos de Empresas são uma produção intelectual destinada

ao treinamento de executivos, oriunda dos jogos de guerra, iniciados depois da Primeira grande guerra, até o final da Segunda grande guerra.

A Business Games Conference realizada na Tulane University (USA, 1961) definiu jogos de negócios como:

uma simulação planejada que encaixa os jogadores em um sistema de negócios simulado onde eles devem tomar de tempos em tempos decisões de chefia. Suas escolhas geralmente afetam as condições do sistema onde a decisão subseqüente deve ser tomada. Desta maneira a interação entre a decisão e o sistema é determinada por um processo de apuração que não sofre a influência dos argumentos dos jogadores (Naylor, 1971)

Segundo Bernard (2000), os jogos de empresa podem ser classificados como abstrações matemáticas simplificadas de uma situação relacionada com o mundo dos negócios. Um exercício estruturado e seqüencial, de tomada de decisões em torno de um modelo de operação de negócios, no qual os participantes assumem o papel de administradores de uma empresa simulada.

Os jogos são classificados de maneiras diversas. Tanabe (1977) classificou os jogos dentre outras maneiras:

• quanto ao meio de apuração: manuais (cálculos feitos pelos alunos/professor) e computadorizados (cálculos e relatórios fornecidos pelo computador);• quanto a sua amplitude: administração geral (a empresa é vista como um todo) e jogos funcionais (apenas um setor da empresa é analisado);• quanto a interação de suas equipes: interativos (onde as decisões de uma afeta as demais) ou não-interativos (as decisões alteram apenas a empresa);• quanto ao setor da economia: industrial, comercial, financeiro ou serviços.Os jogos podem ser divididos pelo seu âmbito: jogo funcional abrange algumas

funções de uma empresa simulada; jogo de empresa que compreende a maioria das funções de uma empresa; ou jogo de negócios envolve diversas empresas concorrendo entre si. (Elgood, 1987).

Já Sauaia (1997), classifica os jogos nas categorias de jogos funcionais, que abordam uma área funcional da empresa (marketing, finanças, produção e outras), onde o foco da aprendizagem se concentra na área escolhida; e jogos sistêmicos que abordam a empresa como um todo, incluindo decisões em todas as áreas organizacionais e do ambiente econômico.

Gramigna (1993) para efeito didático sugere a classificação dos jogos da seguinte maneira: jogo de comportamento voltados para o desenvolvimento de pessoal, visando habilidades comportamentais; jogos de processo voltado para o desenvolvimento gerencial ou de equipes, enfatizando produtos/processos e visando a preparação técnica do grupo; e por fim jogos de mercado com as mesmas características dos jogos de processo, porém reproduzindo situações de mercado.

O termo Jogos de Empresas tem origem no termo inglês Business Game. A tradução para o português como Jogos de Empresas dá uma computação lúdica para a atividade. Enquanto o termo simulação de gestão, que se aproxima da forma francesa Simulation de Gestion, explicaria o objetivo desta prática didática (Almeida, 1998).

Martinelli (1987) relaciona os seguintes termos substitutivos para Jogos de

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Empresas: simulação de negócios, simulação de gestão, exercício de gestão simulada, simulação empresarial, atividade empresarial simulada ou somente simulação.

Outro tipo de abordagem sobre jogos é feita por Vicente (2001) onde ele identifica os Jogos de Tomada de Decisão ( JTD) em quatro grupos: jogos de guerra (wargames ou bélicos), jogos de estratégia (Civilization, Colonization), role playing games, os RPG (interpretação de personagem) e em jogos de empresas (tomador de decisões empresariais).

Breve Histórico

As simulações já eram encontradas em jogos praticados no Antigo Egito (Motomura, 1980). O primeiro uso de jogos em educação e desenvolvimento de habilidades e pesquisa teria ocorrido na China, por volta de 3000 a.C. com a simulação de guerra Wei-Hai e na Índia, com o jogo chamado Chaturanga (Wolfe, 1993). O uso militar de jogos ampliou-se em 1664 com o The King’s Game; em 1780 com o War Chess; e em 1798 com o New Kriegspiel (South-Western, 2000).

Oficiais do exército Prussiano no século XIX preparavam-se para o combate simulando previamente o desenvolvimento de batalhas sobre mapas com o movimento de tropas representadas por peças de madeira, estudando possíveis opções táticas a serem adotadas na batalha real (Motomura, 1980). Estratégias de batalhas chegaram a ser estudadas na Segunda Guerra Mundial por alemães e japoneses (Wolfe, 1993).

Segundo Tanabe (1977), o desenvolvimento dos jogos de empresas iniciou-se a partir de meados da década de 50. Tomou novo impulso dez anos depois, com o advento dos computadores (main frames), que lhes permitiu maior grau de complexidade e amplitude de treinamento. Tanabe, no entanto, não define jogos de empresas como instrumentos pedagógico, mais antes como um processo decisório e de feedback de decisões.

Objetivos dos jogos de empresas

Além do conceito de jogos de empresas, é importante abordar os objetivos básicos do método. Tanabe (1977) discute rapidamente os objetivos gerais de jogos de empresas. Para ele, são três os objetivos: 1) de treinamento; 2) didáticos; e 3) de pesquisa. Os objetivos de treinamento dizem respeito ao desenvolvimento das habilidades para tomadas de decisão. Os objetivos didáticos referem-se à metodologia prática e experimental de transmitir conhecimentos específicos. Finalmente, os objetivos de pesquisa visam a tornar os jogos de empresas em um laboratório para descobrir soluções, esclarecer e testar aspectos teóricos e investigar o comportamento individual e grupal em ambientes específicos de pressão.

Crivelaro (1996) relaciona alguns campos onde os jogos podem ser aplicados: no treinamento, no desenvolvimento de pessoal, na avaliação de potencial, no planejamento, no processo de mudança, na tomada de decisão, na seleção de pessoal, na integração de pessoas, ou na formação acadêmica.

O AMBIENTE DE APRENDIZAGEM

O uso de cenários revela-se particularmente útil no ambiente de turbulência e incerteza em que vivem as empresas, e no qual os métodos convencionais de formulação de estratégias, calcados principalmente na análise de tendências, apresentam limitações.

Para Schwartz (1999), “cenários são uma ferramenta para nos ajudar a fazer previsões em um mundo de grandes incertezas, [...] para ordenar a percepção sobre ambientes alternativos futuros, nos quais as decisões pessoais podem ser cumpridas”.

O autor define oito etapas para o processo de elaboração de cenários: identificação da questão principal; identificação dos fatores-chave (microambiente); identificação das forças motrizes (macroambiente), classificadas em elementos predeterminados e incertezas críticas; ranking das incertezas críticas; definição das lógicas dos cenários; descrição dos cenários; seleção de indicadores e sinalizadores principais; análise das implicações e opções. Durante todo o processo, devem ser levados em consideração os modelos mentais dos dirigentes da empresa, de modo a conhecer suas visões de mundo, preocupações e incertezas.

Para Baranauskas et al. (1999) as aplicações computacionais dirigidas à educação estão provocando uma mudança nos métodos de ensino e aprendizagem, redefinindo os objetivos e resultados desejáveis desses processos.

Estas aplicações educacionais podem ser classificadas em “ensino assistido por computador” onde o sistema mantém o controle da interação sistema/estudante (aprendizado instrucionista); “ambientes interativos de aprendizagem” onde o controle da interação está nas mãos do aprendiz ou é compartilhado entre o sistema/aprendiz (aprendizado construcionista); e “aprendizado socialmente distribuído” representado pelas novas possibilidades surgidas com a Internet e a globalização da informação.

No “ambiente interativo de aprendizagem”, Baranauskas et al. (1999) comentam que o aprendiz constrói o conhecimento a partir de atividades de exploração, investigação e descoberta, feitos a partir da análise do sistema em experimentação, dando como princípios: a construção e não a instrução; o controle do estudante e não do sistema; a individualização determinada pelo estudante e não pelo sistema; e o feedback gerado a partir da interação do estudante com o ambiente da aprendizagem e não pelo sistema.

Estes ambientes de aprendizagem envolvem o aprendiz no ciclo básico de expressão, avaliação e reflexão sobre o domínio considerado. Levam o aluno a questionar o modelo, reavaliar o seu conhecimento e expressá-lo novamente, continuando o ciclo de ações, ao estilo construcionista de aprendizagem.

O computador é um importante recurso para promover a passagem da informação ao usuário ou facilitar o processo da construção do conhecimento. Pois, o aprender não está restrito ao software, mas à interação aluno-software (Valente, 1999).

Ainda segundo Valente (1999), para que a aprendizagem ocorra é preciso envolver o aprendiz com o fenômeno e que essa experiência seja completada com a elaboração de hipóteses, leituras, discussões. O uso do computador valida a compreensão do fenômeno.

A COGNIÇÃO SEGUNDO PIAGET

Piaget preocupa-se com as mudanças qualitativas na organização mental de uma pessoa desde o nascimento até a maturidade. Para ele o organismo humano tem uma organização interna que é responsável pelo modo único de funcionamento do organismo, o qual é invariante. Em resultado do contato entre o organismo e o meio, através de invariantes funcionais, o organismo adapta as suas estruturas cognitivas.

O desenvolvimento cognitivo é, então, o resultado da interação “amadurecimento do organismo versus interação com o meio.” As adaptações das ações do organismo ao meio

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é a cognição. O conjunto dessas ações coordenadas formam esquemas e esses esquemas em algum momento formam estruturas.

As estruturas cognitivas mudam através dos processos de adaptação: assimilação e acomodação. A assimilação envolve a interpretação de eventos em termos de estruturas cognitivas existentes, enquanto que a acomodação se refere à mudança da estrutura cognitiva para compreender o meio. O desenvolvimento cognitivo consiste de um esforço constante para se adaptar ao meio em termos de assimilação e acomodação (Turner, 1976).

À medida que o organismo se desenvolve as estruturas cognitivas passam de instintivas a sensório-motoras até finalmente serem a estrutura operacional do adulto.

Para Ruble e Silverman (1990), os estilos cognitivos observados em resposta a uma larga variedade de jogos de simulação testados podem servir de base para a discussão do processo cognitivo, embora haja variações no uso da terminologia entre diversos autores.

Pensar é a representação da “realidade” ou do mundo externo, esteja ele presente ou não, por meio de símbolos ou imagens. O processo é bastante comum e essas representações podem variar desde processos muito simples até os mais complexos ¾ desde reminiscências ou recordações, num extremo, até julgamentos envolvidos em decisões sobre atitudes a assumir, decisões essas baseadas na recombinação de associações anteriores.

Raciocinar é justamente uma tal recombinação de experiências passadas destinada a fornecer uma reação significativa a determinada situação. O termo raciocínio é, às vezes, empregado no lugar de “solução de problemas” ou até mesmo de “tomada de decisões”, mas deve ser encarado, mais corretamente, como um processo que é básico a essas atividades.

Solução de problemas é uma atividade direcionada a uma meta e que deve superar algum obstáculo que se interpõe a essa mesma meta. A verdadeira solução de problemas, entretanto, vai muito além da reação habitual face a um problema; requer mais raciocínio para a obtenção de um resultado do que um simples reflexo condicionado.

Tomada de decisões significa escolher entre alternativas e decidir-se por uma linha de ação. As alternativas podem variar desde uma simples situação binária (ir, não ir) até àquela em que o número de alternativas é infinito. Freqüentemente, as decisões devem ser tomadas em situações em que as informações pertinentes ao assunto são incompletas. Embora muitas vezes encontremos implicações de que as decisões são tais formas a alcançar o melhor resultado possível, isso nem sempre pode ser justificado com base em evidência empírica.

Percepção é a experiência obtida em face dos resultados imediatos dos estímulos sensoriais. Esse processo consiste na seleção e organização das sensações de modo a configurar a entidade significativa que experimentamos.

Conceituação é o processo cognitivo através do qual chegamos a identificar uma propriedade ou relação comum entre objetos ou condições, que, então, podem ser designadas por meio de um termo ou nome.

Julgamento é a avaliação e apreciação das características de uma situação. Podemos perceber, ao longe, uma pessoa, porém julgar a sua altura requer uma atividade mais elaborada do que a encontrada numa percepção. Algum padrão comparativo, presente ou mais antigo, é evocado de modo a que se possa chegar a uma conclusão.

Criatividade envolve pensamento inovador, que produz resultados melhores,

mais engenhosos ou estéticos do que os habituais. Diferencia-se da originalidade, com a qual podem ser confundida, porque esta significa apenas algo de novo ou diferente, independente do valor ou utilidade que estão implícitos na criatividade.

Outras variáveis, que desempenham um papel nesse processo, variam desde os antecedentes pessoais e fatores da experiência vital, tais como atitudes, crenças ou participação em grupos, até fatores como inteligência, língua (e sua estrutura) e condições físicas.

ESTILO COGNITIVO E FORMAÇÃO DE ESTRATÉGIA

A cognição está relacionada à forma como as pessoas adquirem, armazenam e usam conhecimento (Hayes & Allinson, 1994). Por volta de meados da década de 1950 os pesquisadores começaram a se interessar por diferenças no processamento de informações (estilo cognitivo) em oposição a estudos de habilidades cognitiva (nível cognitivo). Enquanto diferentes níveis de habilidades cognitivas podem levar a diferentes níveis de desempenho, estilos não têm relação com a eficácia ou eficiência e podem, apenas, ser julgados mais ou menos adequados a determinadas situações.

Estilo cognitivo tem sido definido como diferenças individuais estáveis na preferência por modos de obter, organizar e utilizar informação na tomada de decisões (Kirton, 1976). De acordo com Kirton (1976), já foi demonstrado que estilo cognitivo influencia a adoção de comportamentos em solução de problemas, tomada de decisão, e possivelmente formulação de políticas.

Vários modelos e medidas de diferenças individuais de estilo cognitivo podem ser encontrados na literatura. Hayes e Allinson (1994) discutem a importância de se analisar os fenômenos organizacionais sob o ponto de vista de estilos cognitivos e listam uma série de dimensões diferentes pelas quais estilo cognitivo pode ser observado nos jogos empresariais.

A tabela 1 apresenta uma descrição resumida destas dimensões.

DIMENSÃO DESCRIÇÃO

Varredura x FocoEnvolve a identificação de informação relevante ver-sus informação irrelevante na solução de problemas

Dependente de campo x In-dependente

Uma maneira global ou analítica de percepção, com ou sem influência do contexto.

Impulsividade x Reflexivi-dade

Impulsividade é caracterizada por respostas rápidas, reflexividade por maior deliberação, respostas mais lentas.

Raciocínio lógico x Raciocí-nio por ponto de referência

Raciocínio lógico envolve a preferência por uma abordagem sistemática e uma amostragem adequa-da de dados disponíveis, enquanto que por ponto de referência indica uma preferência por raciocínio em cima de um caso específico conhecido.

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Partição x Totalização

Partidores lidam com a realidade decompondo-a em componentes. São analíticos e obtêm informação através de uma série de passos claramente defi-nidos. Totalizadores preferem olhar para o quadro completo.

Convergência x Divergência

Pensadores convergentes buscam uma solução úni-ca usando critérios de busca estreitos, lógico-deduti-vos, enquanto que divergentes são amplos e abertos na sua busca de critérios de solução.

Concreto-abstrato/ativo-re-flexivo

A preferência por lidar com objetos tangíveis (concre-to) versus conceitos teóricos (abstrato). A preferência por participação direta (ativa) versus observação dis-tante (reflexão).

Adaptação x Inovação

Adaptadores se voltam para procedimentos conven-cionais quando procurando soluções, enquanto que inovadores preferem reestruturar problemas e abor-dá-los por novos ângulos

Serialista x Holista

Serialistas progridem de maneira linear através da aprendizagem e solução de problemas, tomando um passo de cada vez e aumentando o conhecimento em incrementos pequenos. Holistas tendem a usar uma abordagem mais global e rapidamente perdem a visão de componentes individuais.

Risco x Cautela

Tomar riscos se caracteriza por fazê-lo mesmo quan-do as chances de sucesso são pequenas. Cautela é caracterizada pela relutância em tomar riscos exceto quando as chances de sucesso são grandes.

Conforme Hayes e Allinson (1994) sugeriram, medidas de estilo cognitivo podem ser usadas para informar decisões administrativas relacionadas a seleção e colocação de pessoas, composição de grupos, administração de conflitos, desenho de tarefas, estilo administrativo, treinamento e desenvolvimento, tomadas de decisões, formação de estratégia.

Entre as diversas dimensões de estilo cognitivo descritas, destaca-se o modelo proposto por Kirton (1976) – a teoria da Adaptação-Inovação. Kirton (1976) propôs que os indivíduos adotam estilos preferidos de criatividade, solução de problemas e tomada de decisão. Esta teoria define um continuun com dois pólos distintos de tomada de decisão e solução de problemas indicando uma preferência por “fazer as coisas melhor” ou “fazer as coisas diferentes”. Os extremos deste continuun foram denominados preferências de comportamento adaptativo ou inovativo, respectivamente.

Indivíduos que têm um estilo adaptativo enfatizam precisão, eficiência, disciplina, e atenção às normas. Eles tentam resolver problemas através da aplicação de soluções que se derivam de métodos conhecidos e já testados. O estilo inovador, por outro lado, é caracterizado como sendo indisciplinado, desafiador de regras, e que procura maneiras novas e diferentes de resolver problemas.

Escolhas são determinadas pela maneira como os indivíduos concebem seu mundo, mais especificamente, escolhas estratégicas são determinadas pela forma como os estrategistas visualizam seu ambiente e indústria (Schwenk, 1988). Como foi visto, estilo cognitivo são formas preferidas de processar informação. Se visões do

mundo são conseqüência de processamento de informações, pode ser que estas sejam influenciadas por estilos cognitivos.

TEORIA COMPORTAMENTAL DE DECISÃO

Tomar decisões significa fazer uma escolha entre alternativas, que podem ser numerosas e variadas ou apenas duas entre as quais se deve optar. Podem existir muitas ou poucas informações disponíveis sobre as diferentes situações e as conseqüências das respectivas escolhas. De modo geral, as decisões têm que ser tomadas em face de informações imperfeitas. Os responsáveis pelas decisões gostariam de pensar que visam resultados ótimos, e esse ponto de vista muitas vezes está implícito em discussões sobre tomadas de decisões. Sob esse aspecto, alguns autores encaram o processo como sendo racional, com bases lógicas ou estatísticas bem definidas. Outros podem dar provas empíricas de decisões influenciadas por fatores sociais ou pessoais, levando a resultados não apoiados em bases lógicas adequadas.

O padrão da racionalidade econômica tem sido há muito a pedra fundamental do estudo formal de tomada de decisões. Indivíduos são tidos como agindo em acordo com seus interesses próprios e fazem escolhas que são consistentes com as predições de maximização deste interesse próprio.

Uma questão central na área da pesquisa comportamental de decisões, então, é como os tomadores de decisão se comportam de verdade, usando como comparação o padrão de desempenho ótimo (racional). Justapondo o padrão de racionalidade contra o comportamento real, vários pesquisadores na arena decisória começaram a mapear os desvios sistemáticos de racionalidade que observavam. Pesquisadores comportamentais sobre decisões focam sua atenção nestas inconsistências sistemáticas no processo decisório que impedem os humanos de tomarem decisões completamente racionais.

Quando tomando decisões, as pessoas se baseiam em um número de estratégias simplificadoras, ou regras, chamadas heurísticas. Embora as heurísticas freqüentemente nos impeçam de encontrar a decisão ótima por eliminar a melhor escolha, elas possuem alguns benefícios: o tempo poupado esperado pelo seu uso poderia superar qualquer perda potencial resultante de uma estratégia de busca completa. Ao fornecer as pessoas uma maneira simples de lidar com um mundo complexo, as heurísticas produzem julgamentos corretos ou parcialmente corretos mais freqüentemente do que não.

Em estudo realizado por Affisco e Chanin (1990), foi constatado que o “sistema de decisão baseado em computador” melhorou a efetividade das ações dos participantes.

Para Davis (1988), existem evidências dos efeitos dos jogos no processo de decisão, mais ainda há muitas perguntas que devem ser feitas.

CONCLUSÃO

O jogo de empresa não é um fim em si mesmo. É, antes de tudo, um dos meios para atingir objetivos maiores, e um instrumento riquíssimo nos programas de desenvolvimento. Serve como ponto de partida para elaboração de conceitos e reformulação de atitudes. Neste artigo procurou-se avaliar a efetividade dos jogos de empresa em estimular os aspectos cognitivos dos jogadores em situações - tomar decisões e formular estratégias - que normalmente somente são dominadas durante o dia-a-dia profissional

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dos mesmos.Constatou-se que embora hajam características distintas entre um ambiente

simulado e um real, não existem diferenças significativas na tomada de decisões e formulação de estratégias por parte dos jogadores. A avaliação dos jogos de empresa aponta que eles são consistentes na formação profissional e no desenvolvimento de habilidades gerenciais.

Entretanto, existe a necessidade de consideráveis pesquisas antes de entendermos por completo o importante papel dos jogos de empresas, tendo em vista a complexidade dos procedimentos metodológicos requeridos para a sua investigação.

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LIDERANÇA SERVIDORA: uma proposta inovadora na gestão empresarial19

SERVANT LEADERSHIP: an innovative proposal on management

Ana Amélia de Oliveira20

Valéria Maria Barreto Motta dos Santos21

Damares Tomasin Biazin22

RESUMOO mercado de trabalho absorve muitos profissionais que desempenham funções específicas e que tenham competência interpessoal para atuarem dentro do cenário organizacional. As empresas também estão buscando cada vez mais profissionais que tenham capacidade de se adaptarem às mudanças constantes e possuam espírito de liderança. Deste modo, este estudo realizado por meio de uma pesquisa bibliográfica priorizou identificar quais os estilos de liderança que melhor se adequam ao ambiente em que as pessoas estão inseridas, enfatizando a Liderança Servidora à luz dos estudos de Hunter, apresentando uma proposta inovadora na gestão empresarial.PALAVRAS-CHAVE: mercado de trabalho; competência interpessoal; estilos de liderança; liderança serva, ética profissional.

ABSTRACTThe labor market absorbs many professionals who perform specific functions and have interpersonal skills to work within the organizational setting. Companies are also increasingly seeking professionals who are able to adapt to constant changes and have leadership. Thus, this study through a literature search prioritized to identify which leadership styles that are best suited to the environment in which people are inserted, emphasizing the Servant Leadership in the light of Hunter studies, presenting an innovative approach in business management.KEYWORDS: Job market; interpersonal skills; leadership styles; servant leadership, professional ethics.

INTRODUÇÃO

Com o advento da globalização, as empresas estão buscando cada vez mais profissionais capacitados com a intenção de sistematizar os dados e assegurar um padrão de qualidade nas organizações, tanto no âmbito público, quanto no privado. Deste modo, os mesmos estão se adaptando a esta nova forma de gestão, com o intuito de retroalimentar o meio no qual estão inseridos.

Em decorrência da crescente competitividade entre as empresas, houve a necessidade das mesmas se organizarem, de modo a conquistar e fidelizar sua clientela, buscando adaptar-se as novas demandas impostas pelo mercado. Contudo, para que funcione bem dentro da organização, a figura do líder surge como alguém atento as metas e filosofias da organização, com competência relacional desenvolvida, sendo uma peça fundamental que empreenda mudanças significativas junto aos seus colaboradores e na organização.

As atuais exigências do mercado levam os profissionais a buscarem novas formas de trabalho, ou melhor, estilos de lideranças, visando o reforço de competências e habilidades de forma prática e rápida, buscando a satisfação dos seus subordinados e empregadores.

19  Monografia  apresentada  ao  Curso  de  Especialização  em  RH–  Gestão  de  Pessoas  e  Competências  do  Centro  Universitário Filadélfia – UNIFIL, Londrina, PR.20  Filósofa. Especialista em RH – Gestão de Pessoas e Competências pela UniFil.21  Teóloga. PHD em Teologia e Filosofia.22 Enfermeira. Doutora em Enfermagem Fundamental. Orientadora. Docente de Metodologia da Pesquisa dos Cursos de Especialização da UniFil

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Observa-se que a cada dia surge novas propostas de aperfeiçoamento destes modelos existentes e pretende-se neste estudo abordar um estilo de liderança que ainda é pouco desenvolvido no mercado atual, tendo como ícone maior de sua defesa o Dr. James Hunter (2004), utilizador de uma alegoria sacerdotal cristã que demonstra o quanto o líder pode exercer uma gestão competitiva e cooperativa, quebrando paradigmas que envolvem poder e autoridade, buscando servir e demonstrar empatia com os seus cooperadores, obtendo resultados que satisfazem os seus superiores.

Busca-se responder ao questionamento que muitos fazem ao aprofundar neste seguimento, utilizando teóricos que já transitam neste espaço, objetivando descobrir a melhor resposta para a seguinte pergunta: “porque o modelo de Liderança Servidora não é tão utilizado nas gestões da atualidade?”

Os indivíduos dentro de uma organização exercem atividades diferenciadas, bem como, emergem pensamentos heterogêneos, com a finalidade de se estruturarem dentro da coletividade, visando os objetivos pré-estabelecidos. Esta interação é definida como fator preponderante para a construção social, onde o líder tenta buscar a sinergia entre os envolvidos.

E para isso, buscamos no presente estudo, realizar uma Pesquisa Bibliográfica para analisar o modelo de Liderança Servidora como uma possibilidade na gestão empresarial.

METODOLOGIA

O artigo foi conduzido por meio de uma Pesquisa Bibliográfica que segundo Biazin (2103, p. 85) é aquela “baseada na análise de literatura, já publicada, para a construção de uma base conceitual organizada e sistematizada do conhecimento disponível”.

Esta pesquisa não determinou um período de busca, pois foi embasada na proposta de Hunter (2004), porém utilizou outros autores para melhor fundamentar a proposta. As palavras-chave utilizadas nesta pesquisa foram: mercado de trabalho; competência interpessoal; estilos de liderança; liderança serva, ética profissional.

COMPREENSÃO DOS TERMOS LIDERANÇA, PODER E AUTORIDADE

A liderança dentro das empresas é primordial para sua sustentabilidade, aumento nos lucros, gerando com isso melhor produtividade e maior motivação entre os envolvidos.

De acordo com Chiavenato (1999, p. 147) a liderança exercida dentro das organizações é um processo importante, já que “o administrador precisa ser um líder para lidar com as pessoas que trabalham com ele. A liderança é uma forma de influência”. Esta influência está diretamente interligada com a relação interpessoal, onde o administrador é capaz de instigar e influenciar o comportamento das pessoas. Robbins (2002, p.303-304) afirma que, liderança é todo o processo de “enfrentamento de mudanças”. Salientando ainda que, ao exercê-la é “... como a capacidade de influenciar um grupo em direção ao alcance dos objetivos”.

Líder é aquele que sabe ponderar suas decisões, tendo objetivos claros e definidos, e que tomando uma decisão errônea, saiba reconhecer seu erro, fazendo além do que lhe é exigido, tendo espírito de equipe, sendo uma pessoa confiável, assumindo riscos pelos erros de seus subordinados e ganhando com isso a empatia da sua equipe. Um líder é capaz

de ganhar uma guerra, derrotar inimigos, desenvolver culturas organizacionais, modificar o ambiente de trabalho, conduzindo tudo isso com sabedoria e de forma responsável. O líder precisa ter uma visão holística dentro da organização, com capacidade de influenciar um grupo para alcançar as metas.

Para exercer uma liderança forte, o gestor precisa ser uma pessoa capaz de administrar todos os recursos disponibilizados pela empresa, sejam eles tecnológicos, físicos, humanos ou financeiros para um melhor resultado, minimizando possíveis problemas que possam surgir no dia a dia, estabelecendo um planejamento estratégico enquanto ferramenta que fornece à organização uma visão de futuro, aumentando a probabilidade de a empresa aproveitar as oportunidades e explorar suas potencialidades, sobretudo a dos funcionários. Novos paradigmas estão sendo adotados por alguns autores como Barrett (2014, p. 11) o qual preconiza, afirmando que o mercado:

... exige que nossas empresas e líderes políticos abandonem seus interesses próprios e adotem uma abordagem colaborativa baseada em valores que apóiam o bem estar de todos os stakeholders, incluindo a humanidade e o planeta, não porque seja a coisa certa a se fazer, mas porque é a melhor estratégia de negócios para o sucesso e para um futuro sustentável para todos.23

Uma das habilidades inerentes ao líder é sua relação interpessoal frente aos seus liderados, para direcioná-los para uma maior eficiência e comprometimento diante dos resultados esperados. Em consonância com Robbins (2002, p. 15) todo funcionário comprometido tem menor resistência e probabilidade de abandonar a empresa. Desta forma, o líder é o agente transformador que levará a empresa a sobreviver frente às demandas e turbulências que ocorrem no mercado. Muitas empresas perdem poder de competitividade, por falta de liderança.

O significado de “Poder” e “Autoridade” na gestão atual também influenciam a aplicação do modelo que se potencializa na vivência diária da gestão que o líder utilizará. Chiavenato (1999, p.147) apropria-se deste termo para explicar que:

A influência é uma transação interpessoal, na qual uma pessoa age no sentido de modificar ou provocar o comportamento de uma outra, de maneira intencional. O controle, por outro lado, representa as tentativas de influência que são bem sucedidas, isto é, que produzem consequências bem-sucedidas, e desejadas pelo agente influenciador. O poder significa o potencial de influência de uma pessoa sobre outra ou outras. Poder é a capacidade de exercer influência, embora isto não signifique que essa influência realmente seja exercida. Em outras palavras, o poder é o potencial influenciador que pode ou não ser efetivamente realizado. Por outro lado, a autoridade é o poder legítimo, ou seja, o poder que tem uma pessoa em virtude do papel que exerce, de sua posição em uma estrutura organizacional. E, portanto, o poder legal é socialmente aceito.24

Observando as idéias que este pesquisador apresenta, entende-se que os graus de influência de uma liderança ultrapassam limites que vão desde a coação de pessoas, persuasão, sugestão e emulação, neutralizando as reais potencialidades que poderiam ser desenvolvidas.

Warren Bennis (1996, p. 42) tem um posicionamento muito interessante sobre a diferença entre gerentes e líderes que ajuda na construção de novas visões empresariais:

23  A palavra em itálico foi destacada pelo autor.24  As palavras em itálico foram destacadas pelo autor.

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Tendo a considerar a diferença entre líderes e gerentes como diferenças entre aqueles que dominam o contexto e aqueles que se rendem a ele. Além desta, há outras diferenças grandes e cruciais:

• O gerente administra, o líder inova.

• O gerente é uma cópia, o líder um original.

• O gerente mantém, o líder desenvolve.

• O gerente prioriza sistemas e estruturas, o líder prioriza pessoas.

• O gerente depende de controle, o líder inspira confiança.

• O gerente tem uma visão de curto prazo, o líder perspectiva de futuro.

• O gerente pergunta como e quando, o líder o que e por quê.

• O gerente vive com os olhos voltados para o possível, o líder com os olhos no horizonte.

• O gerente imita, o líder inventa.

• O gerente aceita o status quo,o líder o desafia.

• O gerente é o bom soldado clássico, o líder é seu próprio comandante.

• O gerente faz as coisas direito, o líder faz a coisa certa.

Utilizando o termo gerente, Alfred Tack (1987 apud BERGAMINI, 1994, p.106) faz um alerta para que se entenda que nem todo gerente é líder, ao dizer que:

Os gerentes, muitas vezes, gerenciam departamentos, gerenciam pessoas, mas não as lideram. Muito poucos empregados trabalham utilizando seu potencial. A liderança eficaz os motiva voluntariamente e esta é a palavra-chave, a dedicarem suas mentes e atributos físicos para o objetivo maior.

LIDERANÇA E SEUS ESTILOS

A partir do aspecto motivacional, Chiavenato (1999, p. 179) destaca que esta é uma das principais responsabilidades gerenciais, pois a influência do líder sobre seus liderados exige uma contínua motivação da equipe, de modo que este atue como um dinamizador e impulsionador do comportamento humano, investigando as variáveis dentro de sua equipe, criando assim um clima organizacional promotor de satisfação individual das necessidades e metas institucionais, por extensão. Nesse sentido, pode-se pensar que situações que privilegiem ou punam a equipe devem ser evitadas, uma vez que podem acarretar em resultados negativos e contrários às expectativas dos funcionários, desmotivando-os e causando um desconforto para a equipe como um todo.

Atentando-se às metas organizacionais e ao ambiente de trabalho, cabe ao gestor definir quais os critérios e o canal de comunicação que irá utilizar, sempre fornecendo feedbacks (positivos e/ou negativos) ao grupo para que este se sinta importante (sentimentos internos).

Robbins (2002, p. 249) acrescenta que “as equipes estão sendo introduzidas no mundo inteiro como meio para aumentar a produtividade”.

Alguns acontecimentos podem ocorrer durante o trabalho, atrapalhando o processo de trabalho e cabe ao facilitador identificar o clima existente, identificando transferência múltipla, muitas vezes insultos a sua pessoa, enfrentamento de autoridade e reações adversas. Neste momento, o facilitador necessita desviar um pouco o assunto e depois

retorná-lo. O apoio do grupo ou equipe é fundamental para “o caminhar em equipe”, onde alguns dos participantes têm a chance de expor aquilo que estão sentindo.

O trabalho em equipe ou grupo é um grande delimitador para a gestão pessoal e para os líderes que buscam o equilíbrio entre as partes e tentam facilitar o processo de trabalho contínuo. Normalmente se utiliza o brainstorming (explosão de idéias) para se desenvolver idéias criativas dentro de um trabalho em equipe ou grupo. Saber administrar conflitos é a capacidade de gerenciar equipes de trabalhos diversos, heterogêneos, sendo facilitador das dificuldades, ajudando os membros da equipe a cumprir com os resultados pré-estabelecidos. Para Robbins (2000, p.57) a administração de conflitos,

requer a conservação de um nível ótimo de conflitos em um grupo. Pouco conflito cria estagnação. Muito conflito cria rupturas e brigas internas. Ambos os casos são negativos porque prejudicam o desempenho do grupo. Dessa forma, o trabalho do gerente é equilibrar essas forças utilizando técnicas de resolução e estimulação de conflitos.

Necessita-se então identificar qual o estilo que melhor se enquadra dentro do contexto de cada empresa, sendo este um dos grandes desafios enfrentado pelo gestor nos dias atuais. Dentre os muitos existentes as autoras priorizaram neste estudo os estilos utilizados por Chiavenato (1992, p.149-151) com ênfase em três enfoques:

a liderança autocrática que potencializa sua força no líder, levando-o a tomar decisão por todos, sem uma programação sistematizada das tarefas, elegendo os companheiros de trabalho que seus liderados devem se agregar, dominando individualmente os seus liderados.

Na liderança liberal o líder permite que seus liderados ou grupos tomem a decisão com um mínimo de sua participação, só interagindo em um debate se for solicitado, apresentando alternativas a partir do grupo, dando absoluta liberdade para cada liderado escolher a execução das tarefas e com quem as desempenhará, não estabelecendo uma forma direta de avaliar o desempenho da equipe, a não ser que o busque.

Em contrapartida, na liderança democrática os objetivos da equipe e do trabalho são decididos conjuntamente com o grupo, estimulando para que estabeleçam alvos a partir dos debates em grupo, tendo a divisão de tarefas a critério deles mesmos, não havendo uma linha de divisão entre o líder e liderados, mas interagindo para que seja um membro como os outros subordinados da sua equipe.

A diferença entre os estilos é marcante e cada um segue filosofias de gestão bastante distintas. Entre alguns fatores que aparecem em um trabalho em equipe ou grupo, existe a paralisação do grupo que ocorre quando estão exauridos ou quando precede a alguma situação específica, normalmente o grupo não fica inerte, mas sim em sinergia com o meio, desta maneira, surgem disputas, desintegração entre os membros, provocações, conflito de gêneros, coalizações, porta-voz, entre outros motivos.

Neste sentido é necessário definir qual resultado se pretende alcançar com determinado estilo de liderança e verificar se o propósito alcançado é o desejado.

Antes de se passar para o ponto seguinte, é interessante conferir a conclusão de Robbins (2002, p.305-6) para as teorias dos traços e comportamentais:

Se as teorias dos traços tivessem sido comprovadas, teriam proporcionado uma base para a seleção das pessoas ‘certas’ para assumir posições formais em

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grupos e organizações em busca de liderança. Em comparação, se a abordagem comportamental conseguisse identificar os determinantes críticos do comportamento dos líderes, seríamos então capazes de treinar as pessoas para a liderança. A diferença entre as abordagens dos traços e a comportamental, em termos de aplicabilidade, está em suas premissas básicas. Se as teorias dos traços estiverem certas, os líderes são natos: ou nascem ou não nascem líderes. Por outro lado, se existissem comportamentos específicos que identificassem os líderes, a liderança poderia ser ensinada – poderíamos elaborar programas para implantar esses padrões comportamentais nos indivíduos que desejassem tornar-se líderes eficazes. (...) Se o treinamento funcionasse, teríamos um celeiro inesgotável de líderes eficazes. 25

O que o teórico reforça é que a liderança deve ou não ser nata, mas que pode ser aprendida, desde que o líder se disponha a rever os seus conceitos e valores para que o grupo ganhe e cresça, desenvolvendo suas potencialidades. Portanto, o desafio é entender que para exercer uma liderança eficaz, prioriza-se um conjunto que envolve o preparo do líder, os pilares que sustentam a filosofia de vida da empresa, os liderados e acima de tudo, o bom êxito que beneficiará a todos. A visão nunca deve ser individualizada porque busca alcançar objetivos que envolvem todos os que estão no processo corporativo.

A LIDERANÇA SERVIDORA A PARTIR DE HUNTER E SUAS IMPLICAÇÕES

Os vários modelos de liderança que foram destacados anteriormente apontam para inúmeras possibilidades vivenciadas nos espaços corporativos. Contudo, a proposta de Hunter (2004) vem como um divisor de águas, demonstrando que existem alternativas para liderar a partir de um modelo que precisa ser pautado no amor, respeito e ética. Partindo do pressuposto que para liderar deve-se exercer dominação, a liderança servidora apresenta não apenas chavões ou ditames que precisam ser seguidos, mas quebra de paradigmas, demonstrando um estilo de vida que é compartilhado por aqueles que se dispõe a deixar com que outros brilhem no cenário empresarial.

A Liderança Servidora não começou com Hunter, mas anteriormente a ele outros teóricos também utilizavam termos que tinham a mesma conotação, ou seja, apontavam para modelos que se conflitavam por estabelecer uma diferenciação entre os governantes (líderes que exercem autoridade sobre outros de cima para baixo) e Servos (líderes que não estão acima, mas entre os liderados, doando-se e compartilhando seus objetivos). Segundo Richards (1996, p.110): “relacionamento nivelado significa que cada um sabe que o outro é igual a ele, e cada um participa livremente no dar e receber da auto-revelação e do serviço mútuo”.

Essa liderança é estabelecida pelo fazer com emoção e através de exemplo prático de vida, ou seja, para ser um líder servo tem que levar adiante um projeto que exige preparo emocional e estabilidade para reconhecer que existe a possibilidade dos outros se tornarem melhores do que o seu mestre.

Pode-se afirmar que este desafio é inovador em dias que a competitividade, auto-afirmação e luta por maiores cargos estão dominando os segmentos mais almejados da atualidade, mas Chaves (2015) indica que:

o caminho para a construção de uma liderança autêntica passa pela formação do caráter do líder. A lógica que rege o mundo corporativo distancia aqueles

25  As palavras destacadas em negrito foram feitas pelo autor.

que exercem liderança dos processos de nossa própria humanização. Não é raro encontrar metáforas que exemplificam essa realidade: liderar com mãos de ferro, ser uma coluna firme, ter pés de boi. As virtudes mais valorizadas, que conduzem ao sucesso, são: coragem, inovação e superação, como se fossem conquistas isoladas da complexidade humano. Tudo isso é legítimo, mas nada disso acontece se a personalidade do sujeito não sofrer um longo, e muitas vezes penoso, processo de construção.

Baseando-se na liderança de Jesus de Nazaré, Hunter destaca alguns conceitos interessantes, explicando posteriormente por que se deve utilizar o modelo de Liderança Servidora. Portanto, é preciso determinação e quebra do padrão já estabelecido, com o propósito de fazer um trabalho integrativo, onde o grupo caminha no mesmo patamar com responsabilidades e limites estabelecidos. Hunter (2004, p.34-35) reforça isso ao afirmar que:

as crianças e os adultos precisam de um ambiente com limites, um lugar onde haja padrões estabelecidos e onde as pessoas sejam responsáveis. Elas podem não querer limites e responsabilidade, mas precisam de limites e responsabilidade. Não fazemos favor a ninguém dirigindo lares ou departamentos indisciplinados. O líder nunca deve aceitar a mediocridade ou o segundo lugar – as pessoas têm necessidade de receber estímulo para se tornarem o melhor que puderem ser. Talvez isto não seja o que querem, mas o líder deve estar sempre mais preocupado com as necessidades do que com as vontades.

Aceitar o desafio de ser um Líder Servo implica em rever conceitos e valores que foram passados durante séculos como um modelo de invencibilidade e fortaleza, demonstrando que o mais importante não é o jogo, mas as peças que o compõe, humanizando um processo de gestão de pessoas baseado no respeito e relacionamento mútuo.

Este modelo nem sempre é aceito porque envolve não somente o conhecimento para gerir situações e habilidades específicas para atuar com destreza nas mais diferentes situações, mas uma escolha em ser diferente no sentido de deixar os conceitos gerenciais de atuar com ditames e regras e passar a ser um agente participante de um processo que é dividido com os seus liderados, onde se busca o bem comum de todos.

Para melhor entendimento, foram destacados quais são os diferenciais que o modelo aponta e os desafios para que se coloque em prática em um mundo individualista, descartável e totalmente competitivo.

DIFERENCIAIS DA LIDERANÇA SERVA PARA A ATUALIDADE

O que caracteriza um líder servo? Esta é uma pergunta que merece uma resposta satisfatória porque envolve algumas qualidades que nem todos os líderes possuem, mas que os diferenciam dos demais. O primeiro tópico foi embasado na Inteligência Emocional tão falada por Goleman (2001a, p. 23): “inteligência emocional refere-se à capacidade de identificar nossos próprios sentimentos e os dos outros, de motivar a nós mesmos e de gerenciar bem as emoções dentro de nós e em nossos relacionamentos”.

Nos dias hodiernos, percebe-se que, existe uma variedade de especializações que oferecem para todos os gestores e candidatos a esse posto ferramentas imprescindíveis para equipá-los, dando-lhes conhecimento, habilidade e competências natas para exercerem as

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mais determinantes funções de chefia que existem. Contudo, verifica-se que muitos dos que adentram aos cargos de chefias, não possuem equilíbrio e sensatez o bastante para superar as demandas estressantes do dia a dia que vivenciam. Como se não bastasse todo o sufoco do cotidiano, ainda enfrentam propostas paralelas que podem desviar a conduta e o comportamento ético, minando o comprometimento com a organização e outros campos de atuação.

Muitos podem questionar: mas o que é preciso adquirir para encontrar o equilíbrio nas funções de grande escalão? A partir do exemplo de Jesus, verifica-se que Ele conseguiu exercer uma liderança que foi acompanhada de perto por doze discípulos e que atingiu o século XXI com a confirmação de que foi o maior líder de todos os tempos, através das seguintes características: autoridade conquistada através do serviço, sacrifício através de ações concretas, intenções que se manifestavam no comprometimento com o outro, amor e muita vontade de ver mudanças acontecerem.

A mudança de liderança se dá a partir do momento que se controla os comportamentos, sem desumanizar as pessoas. Hunter (2004, p. 68) não apresenta um modelo de perfeição ao afirmar que “o amor pode ser definido como ato ou os atos de doação aos outros, identificando e atendendo suas legítimas necessidades”. Portanto, o projeto de Jesus foi feito de palavras que compõem o campo semântico do verbo “amar” 26, demonstrando que as mesmas expressam justamente as características que este líder servo deve possuir, ressaltando nos seus liderados as suas necessidades e não as suas vontades, sendo flexível no que precisa efetivar para o bom andamento das demandas que atuam.

Diante disso, destacam-se algumas comparações feitas pelo autor à luz de I Coríntios 13 (BÍBLIA, 1999), ressaltando o amor agapé27 e fazendo uma ligação com o fato de que o exemplo que utiliza para demonstrar cada uma das qualidades é o próprio Jesus, que externou na sua caminhada por essa terra os pontos ressaltados ao lado dos seus discípulos, demonstrando com atitudes nas mais diferentes ocasiões que se apresentaram e exigiram dele uma posição de líder. Afirma, portanto que as palavras amor e liderança são sinônimas e que podem caminhar juntas, sendo esta uma quebra de paradigma muito difícil de compreender. A seguir, foram apresentadas algumas palavras do texto bíblico, estabelecendo um paralelo entre o texto bíblico e este tipo de liderança ao fazer um destaque de todo o processo.

- Paciência: ressalta a importância que o líder servo possui ao mostrar autocontrole em toda situação, independente das circunstâncias, pois quando o mesmo perde o controle das situações, todo o seu time também se perde, afetando todo o trabalho que está sendo feito. Com esta característica, estabelece confiança na equipe e a certeza de mesmo que o liderado venha a errar, o líder não o punirá imediatamente, pois é ponderado nas decisões e não fere a dignidade dos seus liderados.

- Bondade: além de dar atenção, apreciação e incentivo, serve de realimentação para apontar êxitos ou mesmo efetuar correções, já que consegue conquistar através do bom trato a liberdade para que o outro expresse suas reais ansiedades. Ao parar para ouvir os seus liderados, o líder servo consegue extrair o mais importante: a dignidade de se sentir parte de um processo que envolve tantas pessoas, aumentando com isso a auto-estima e entrando no mundo da outra pessoa tentando não emitir nenhuma posição pré-concebida.

- Humildade: para assumir funções de grande responsabilidade sem deixar de

26 Os itálicos são das autoras.27   Palavra grega utilizada para falar sobre o amor de Deus para com o ser humano.

ser autêntico e sem pretensão ou arrogância. Consegue descer no nível dos seus liderados quando necessário, não precisando se impor ou usar de artifício de auto-afirmação. Hunter (2004, p.61) destaca que:

o ego pode de fato interpor-se no caminho e criar barreiras entre os líderes e seus liderados. Os líderes arrogantes que acham que sabem tudo são um estrago para muitas pessoas. Essa arrogância também é uma pretensão desonesta, porque ninguém sabe tudo ou tem tudo. Humildade para mim é pensar menos a respeito de si mesmo.

É interessante que o individualismo que impera nos dias atuais tem afetado inclusive as posturas dos líderes corporativos, deixando-os com a ilusão de que são auto-suficientes.

- Respeito: primeiramente consigo mesmo, entendendo suas limitações e necessidade de complementaridade em prol de um trabalho em que pode ter mais de uma pessoa agregada. Prefere tratar os outros como pessoas importantes, agrupando-as junto a si e deixando-as criar e acrescentar novas possibilidades que não foram pensadas por ele porque realmente elas são únicas e por isso são importantes.

- Abnegação: sua motivação é fazer com que os outros recebem o melhor que podem, satisfazendo suas necessidades, sem medir esforço para que todos sejam beneficiados. Não é mimá-las fazendo com que todas as suas vontades sejam realizadas, mas realmente é o oposto do egoísmo.

- Perdão: capacidade de caminhar a segunda milha e desistir de ressentimento quando prejudicado, amadurecendo os processos que envolvem os sentimentos. Geralmente se faz muitas expectativas em relação ao que se espera das pessoas, mas nem sempre elas correspondem ao esperado e também nos causam surpresas neste contato com os liderados. Portanto, ultrapassar a barreira do que foi planejado e prosseguir sem deixar que as intempéries venham a prejudicar as relações, mantendo um comportamento positivo e não agressivo, trazendo na alma o amargor das decepções.

- Honestidade: a ética é uma das suas características e prima para ser livre de engano, buscando sempre processos que sejam feitos com transparência e respeito, sem fraudar os resultados ou subir em troca de prejudicar outros. Ela opta sempre pela verdade, buscando trazer as evidências do que realmente acontece, sendo firme e previsível.

- Compromisso: o líder servo sustenta suas escolhas, independente das críticas e elogios que recebe e se empenha para que cumpra o que assumiu diante da vida. É uma característica muito importante que exige esforço e comprometimento, envolvendo o crescimento do indivíduo e do grupo, fazendo com que o mesmo desenvolva um projeto de aperfeiçoamento constante.

- Resultado: na maioria das vezes, põe de lado suas vontades e necessidades em prol do trabalho conjunto que estabeleceu, mas se sente satisfeito porque realmente faz a sua tarefa com prazer, sem manipulação, mas em benefício mútuo do grupo.

- Serviço e Sacrifício: está disposto a servir e sacrificar as regalias que poderia usufruir, buscando sempre o maior bem para os outros. Jesus administrou muito bem esta característica ao apresentar na ocasião da última ceia com os discípulos o lava pés, utilizando a toalha como metáfora do serviço ao próximo. Ele nunca falou que seria fácil, mas ganhou autoridade com essa atitude e o direito de ser líder.

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Ressaltar-se ainda dois aspectos importantes para que esta liderança serva seja exercida, ou seja, o ambiente de trabalho e a escolha por trilhar o caminho. É sabido que o líder tem a tarefa de assumir posturas e atitudes que influenciarão os seus liderados, conforme reforça Hunter (2004, p.73):

a metáfora da conta relacional nos ensina a importância de manter saudável o equilíbrio dos relacionamentos com as pessoas importantes de nossas vidas, inclusive as que lideramos. Em palavras simples, quando conhecemos uma pessoa, o saldo da conta de relacionamento com ela é neutro, porque vamos iniciar um conhecimento. À medida que o relacionamento amadurece, porém, fazemos depósitos e retiradas nessas contas imaginárias, baseados na forma como nos comportamos. Por exemplo, fazemos depósitos nessas contas sendo confiáveis e honestos, dando às pessoas consideração e reconhecimento, mantendo nossa palavra, sendo bons ouvintes, não falando de outras pessoas pelas costas, usando a simples cortesia de um olá, por favor, obrigado, desculpe, etc. Fazemos retiradas sendo agressivos, descorteses, quebrando promessas e compromissos, apunhalando os outros pelas costas, sendo maus ouvintes, cheios de empáfia, arrogância, etc.

Quando os liderados percebem que estão integrados ao grupo de trabalho que fazem parte, ressalta este sentimento de pertencimento e tem prazer em trabalhar para que o conjunto possa alcançar os objetivos da equipe, sendo espontâneo na sua produtividade e desempenhando com afinco as suas tarefas. A partir desta constatação de satisfação, líder e liderados caminham juntos, fazendo um bom trabalho, pois este é o desejo de todos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pensar no quanto o gestor é peça-chave para mudanças organizacionais leva a perceber este enquanto um diferencial da empresa, pois o gestor traça um planejamento estratégico de modo a influenciar as ações/atitudes e a postura dos membros de sua equipe na promoção de melhorias e na busca da construção de saberes facilitadores da operacionalização e dos resultados, enfim.

O cenário mundial hoje é vivenciado por grandes mudanças comportamentais e ambientais. Para ocorrer mudanças é imprescindível romper com o passado e não ser resistente com as mudanças. Toda mudança tem sua transição e aceitação ao novo sistema a ser implantado, muito embora a existência de um clima organizacional propício facilitaria estas transformações. Para tanto, a necessidade de uma preparação (planejamento adequado) para reduzir a resistência se faz necessário. Depois da aceitação da mudança, os responsáveis (gerentes ou facilitadores) devem fazer a implementação e o acompanhamento das mudanças, para que não ocorra rejeição futura e possível retorno ao passado.

Fazendo uma analogia, é como no ciclo da aceitação da morte, primeiro a pessoa rejeita ou cria uma resistência que a pessoa morreu (ou mudança), depois vem o processamento sobre a morte (ou mudança), depois a aceitação que essa pessoa morreu (ou mudança), mas neste último somente o tempo possibilita a superação do fato, como no caso da mudança, as pessoas precisam de um tempo relativo para assimilar que há necessidade de se mudar.

O líder é o agente transformador de mudanças, capaz de direcionar e conduzir os funcionários a terem uma visão do futuro, estabelecendo estratégias para atingir as metas

pré-estabelecidas. Assim, o líder é o responsável que levará a empresa a sobreviver frente às demandas e turbulências que ocorrem no dia a dia. Seu grau de comprometimento requer que tenha uma visão holística sobre o todo e que crie uma homeostase perante o grupo que esteja trabalhando. Considerando o status quo, o líder muitas vezes necessita de mudanças de paradigmas para melhor adequar os funcionários às novas situações impostas, readequando-os conforme a necessidade da organização.

Após a análise da figura do Líder Servo a luz dos estudos de Hunter, ficou claro que o desafio de colocar em prática este tipo de liderança exige que o próprio líder assuma um comportamento ético, que está intrinsecamente ligado ao respeito e honestidade nas ações, conhecimento e habilidades técnicas, atitudes para agir no tempo certo e no lugar necessário, uma comunicação transparente e clara, onde as tarefas são compreendidas tanto quanto as recompensas alcançadas, o comprometimento com o outro visando não somente o trabalho, mas a integralidade de cada indivíduo na busca por realizações plenas e a oportunidade de desenvolver no grupo a criatividade, afim de que as potencialidades sejam ressaltadas e desvendadas.

Que através dessa reflexão que não termina aqui, entende-se que existe um processo longo para que mais adeptos ao estilo de liderança proposto venham a ser desafiados e possam humanizar os espaços corporativos, entendendo que “alegria é satisfação interior e a convicção de saber que você está verdadeiramente em sintonia com os princípios profundos e permanentes da vida. Servir aos outros nos livra das algemas do ego e da concentração em nós mesmos que destroem a alegria de viver” (HUNTER, 2004, p. 96).

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BIAZIN, Damares Tomasin. Normas da ABNT, aspectos gráficos e padronização para relatórios acadêmicos. Londrina: EduUnifil, 20013, 112 p.

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CHIAVENATO, Idalberto. Gerenciando pessoas: o passo decisivo para a administração participativa. São Paulo: Makron Books, 1999, 257 p.

DAFT, Richard L. Administração. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005, 581 p.

FRITZEN, Silvino José. Formação de líderes. Petrópolis: Editora Vozes, 2004, 180 p.

GOLEMAN, Daniel. Trabalhando com a Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001a, 414 p.

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MACARENCO, Isabel; DAMIÃO, Maria de Lurdes Zamora. Competência: a essência da liderança pessoal. - 2ª Ed. – São Paulo: Editora Saraiva, 2011, 215 p.

QUINN, Robert E. Desperte o líder em você: mudança organizacional a partir do autoconhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 1998, 211 p.

RICHARDS, Lawrence O. Teologia da educação cristã. São Paulo: Vida Nova, 1996. 266 p.

ROBBINS, Stephen Paul. Comportamento organizacional. – 9ª Ed. - São Paulo: Prentice Hall, 2002, 637 p.

TACK, Alfred. Liderança Motivacional. São Paulo: Ed. Siamar, 1987, 241p.

O HISTORIADOR NO MUNDO GLOBALIZADO CONTEMPORÂNEO: entre dilemas, crises e (in)determinações

Agnaldo Kupper28

RESUMOO pragmatismo histórico inscreve a História no rol das ciências, uma vez que a ciência histórica é capaz (se praticada com os rigores exigidos) de propor questões e prover soluções utilizando-se de metodologia própria, como a análise documental. Mas o que vemos na atualidade? De forma geral, historiadores envolvidos em uma crise de identidade entre o que se julga fazer e o que realmente se faz, exatamente quando a História, enquanto ciência, exige uma postura crítica que conduza à idéia de que, mais do que formular previsões, colabore para as observações das perdas acumuladas através das transformações. Fazer História não é buscar o exótico. Muito ao contrário: a função do historiador é a de formular o presente em relação ao passado, conciliando contradições, evitando estar ao simples serviço da memória e recriando a si mesmo. O profissional da História deve entender que esta não é a ciência da totalidade, mas dos detalhes específicos, devendo mostrar e demonstrar o funcionamento simultâneo dos pontos de vista, diversificando-os, sob o risco de, ao não proceder desta forma, articular discursos e legitimá-los como verdadeiros. Neste sentido, a História Regional torna-se premente. A História não deve ser produzida apenas para debates entre os pares acadêmicos, mas para ganhar espaço entre seus verdadeiros edificadores. Ou seja, não se deve fazer História apenas para se sentir inteligente, mas com a humildade necessária para se atingir a quem dela necessita.PALAVRAS-CHAVE: papel do historiador; dilemas; história regional.

ABSTRACTThe historical pragmatism writes history in the role of science, since the historical science is able (if practiced with the rigors required) to propose issues and provide solutions using its own methodology, such as document analysis. But what we see today? Generally, historians involved in an identity crisis between what judges do and what they actually do, just as history as a science, requires a critical posture that leads to the idea that, rather than making predictions, collaborate to the observations of the accumulated losses through transformations. Making history is not seeking the exotic. On the contrary: the question of the historian is to formulate the present in the past, reconciling contradictions, avoiding being the simple service of memory and recreating himself. Professional history must understand that this is not the science of the whole, but the specific details, must show and prove the simultaneous operation of the views, diversifying them, or you risk by not doing so, articulate speeches,looking legitimize them as true. Accordingly, the Regional History becomes acute. History must not be produced only for discussions between academic peers, but winning space between your true builders. One should not make history just to feel smart, but with the humility needed to reach those who need it.KEYWORDS: history of paper; dilemmas; regional history.

DAS TRANSFORMAÇÕES

No mundo teocêntrico, próprio do período medieval ocidental (V ao XV), ao homem não era dado o direto de desafiar e se impor, já que havia um poder acima do indivíduo. Cabia ao indivíduo obedecer. O comportamento humano era o de limitar-se enquanto ser e aceitar o estado geral da realidade, sem questionamentos ou dúvidas.

A partir das últimas décadas do século XV, próprio das transformações sociais e econômicas do período, houve uma revitalização das culturas clássicas. O homem passou a se tornar mais audacioso e a rejeitar a posição de uma autoridade invisível com quem não podia dialogar. Este mesmo homem tornou-se, paulatinamente, o centro de tudo, dessacralizando a cultura e a sociedade e sentindo-se dono dos instrumentos técnicos, científicos e filosóficos que lhe passaram a permitir decifrar, diagnosticar, prever, controlar,

28   Professor de Ensino Médio, Superior e de Pós-graduação; escritor; mestre pela  Universidade Estadual  Paulista;  doutorando  pela  Universidade  Estadual  Paulista (área  Política: Ações  e Representações).

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Não há dúvidas que o mundo atual é outro. Muito diferente daquele que proporcionou e fez emergir as teorias marxistas no século XIX.

Todo o processo que envolveu o ser humano ocidental a partir do século XV, transformou-o, fazendo-o passar pela evolução de pensamento e postura em relação à vida, assim como pelos temores da Guerra Fria (1945–1989).

Em um passado remoto, calcado nas décadas de 1960 e 1970, os indivíduos, em geral, estavam engajados em alguma estrutura de apoio, fosse ela política ativista ou artística ou mesmo um investimento de existência.

No ar, um clima de entusiasmo, calcado em bandeiras políticas e sociais.O mundo contemporâneo globalizado, por sua vez, parece carecer de modelos

orientadores, estando marcado pela mundialização da produção e das finanças, grande movimento migratório, discussões sobre a questão ambiental (que adquirem amplitude internacional), avanço das empresas transnacionais, formação de blocos econômicos, desenvolvimento e proliferação dos meios de comunicação, esvaziamento do Estado no que tange à proteção da economia interna e valorizador de políticas de bem-estar social, fusão de empresas e conglomerados e internacionalização da publicidade.

Com a globalização capitalista, a sensação e aparência humana é a de que não se tem pelo que lutar, a não ser por uma estrutura material que permita usufruir da melhor maneira uma vida confortável.

Isto não significa que o mundo atual seja menos vigoroso do que o de décadas anteriores, já que todas as últimas transformações (próprio do mundo globalizado nos padrões capitalistas) nos conduziu à conquista da liberdade humana, ao aumento dos bens e equipamentos técnicos, ao desenvolvimento de um poder político mais democrático e à diversificação das manifestações artísticas.

No que tange ao avanço dos recursos tecnológicos de comunicação, ao pensarmos na possibilidade de acessos culturais a acervos de bibliotecas, museus, conceitos científicos, históricos, musicais, no acesso a informações e opiniões divergentes, a proliferação que a indústria cultural provoca não se configura como necessariamente negativa.

No entanto, tal conquista tecnológica trouxe dissabores. A máquina e os objetos assumiram importância decisiva, substituindo, na maioria das vezes, o convívio mais pleno e verdadeiro e transformando um mundo real em um aparente.

No mundo tecnocêntrico, próprio da atualidade, o homem passa a submeter-se ao controle generalizado das máquinas, comportando-se como uma, com um número e com uma função. Isto significa dizer que na esfera da vida tecnocêntrica o indivíduo passou a poder vivenciar uma série de experiências através de uma realidade virtual que mexe com o real ao criar simulações de vivências através dos sistemas eletrônicos, com o conceito de mundo convergindo a partir de uma realidade aparente.

O que marca a visão tecnocêntrica de nossa cultura é o aparecimento de uma sociedade que se torna cada vez menos social. Os indivíduos falam menos, se encontram com mais dificuldade e se tocam com menor durabilidade de tempo. Ou seja, ao que parece, o mundo técnico apodera-se do real. Ao mesmo tempo, os sentimentos de insegurança, de perda de sentido e orientação e vazio político, passam a prevalecer.

O mundo tecnocêntrico não possui base filosófica ou religiosa. Não possui, portanto, apoio. É imediatista e altamente racional, com o prevalecimento de formas

administrar e programar sua própria história. Ou seja, se o saber teocêntrico reunia as informações no Evangelho, o homem

moderno passou a construir explicações para o mundo, tornando-se agente de sua própria existência. Em outras palavras: mais do que endeusar um suposto ser, os valores antropocêntricos passaram a exaltar o conhecimento.

A Renascença passou a significar uma nova visão do mundo que, embora aceitando devotadamente a existência de Deus, encaminhou-nos para uma série de atitudes intelectuais do antigo mundo pagão (greco-romano), mostrando-se interessada pela estética, admiradora do conhecimento da História, convencida de que o dever primordial do homem seria o de desfrutar sua vida sobriamente e servir à sua comunidade ativamente.

O pensamento liberal, articulado definitivamente a partir das revoluções inglesas do século XVII (Puritana e Gloriosa), ganhou corpo definido no século XVIII (“século das Luzes”). As posições liberais, a liberdade econômica, a defesa da propriedade privada, a abolição dos privilégios, a divulgação da cultura e a revisão do sistema fiscal, tornaram-se premissas fundamentais para uma nova vida econômica, política e social no velho continente.

Os iluministas acreditavam que somente pelo uso da razão os homens atingiriam o progresso pleno, uma vez que o racional permitiria instaurar no mundo uma nova ordem, caracterizada pela plenitude (o homem visto como ser concreto e não apenas como integrante de uma coletividade), felicidade, autonomia (cada homem apto a pensar por si mesmo, sem a tutela da religião ou ideologia, devendo agir no espaço público),otimismo ao alcance de todos (universalidade) e liberalismo político, com o Estado tornando-se constitucional (com poderes bem definidos e limitados a uma ampla margem de liberdade civil).

A Revolução Industrial do século XVIII na Inglaterra significou o auge da expansão burguesa, simbolizada pela aliança entre ciência e técnica e trazendo mudanças jamais vistas em todos os campos do conhecimento e da vida humana e social.

Neste sentido, a ciência passou, no século XIX, a ser considerada a única forma de conhecimento possível e admissível, trazendo-nos a concepção do cientificismo, segundo o qual as abordagens da realidade devem ser rigorosas e realizadas por especialistas dotados do tecnicismo que execre o senso comum e outras formas “duvidosas” (para a ciência) da busca de entendimentos e conhecimentos. A afirmação do capitalismo na Europa a partir da concretização dos caminhos industriais e liberais do século XIX, fez emergir ciências como a economia, a psicologia, a antropologia, a geografia humana, a ciência política e a sociologia.

Embora complementares, as ciências sociais e humanas vinculam-se, cada uma, a aspectos específicos da realidade social.

Já o século XX assistiu à ascensão e queda do socialismo. Quando a Rússia, em 1917, tornou-se a primeira nação efetivamente socialista

do mundo, mesmo os mais otimistas defensores do regime não imaginavam que sua derrocada fosse tão rápida.

Para os socialistas convictos, porém, o sonho da sociedade igualitária não teve seu fim decretado, mesmo porque o “socialismo real” não foi o imaginado, já que teria sido traído pelos erros e mesquinharias humanas, desviando-se de sua proposta original.

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Talvez, diante do panorama contemporâneo, passamos à necessidade de se “fazer” a História, no sentido de busca de que não se está só, mas de que existem explicações para as novas tendências.

História e Historiador

Certa vez um poeta espanhol disse que todo dia pela manhã olhava o jardim da casa em que morava através de um vitral colorido. A cada dia as flores assumiam tonalidades diferentes, dependendo do vitral que focava. Assim, creio, é a ciência histórica.

História se faz desvendando os processos reais, levantando problemas. Sabemos que fazer História concentra um duplo sentido: ação do sujeito que opera o conhecimento e a ação individual ou coletiva que foi considerada relevante em determinada fase da vida humana. Mas o que é relevante? Para quem? Podemos, sim, como historiadores, defender teses e revê-las quando oportuno. A vontade da verdade parece-me insuficiente.

Nos dias atuais, a aparente falência definitiva do marxismo teria estabelecido também a falência das preocupações políticas, estabelecendo-se na história a multiplicação do insignificante, com os historiadores lançando mão de uma série de pesquisas sem a preocupação do conjunto, da totalidade.

Na busca de significados e do funcionamento das sociedades, as mais diversas linguagens devem tornar-se objetos privilegiados para as análises, vistas, cada vez mais, como metáforas da realidade. Os variados discursos (orais, rituais, escritos, musicais, arquitetônicos) devem ser codificados com maior freqüência, procurando apreender seus elementos de tensão social e seus sentidos históricos, sua produção e sua circulação num dado meio social.

Para Antoine Prost31, a ciência histórica está vinculada com o social e com o contexto cultural. Neste sentido, para que possamos fazer História, é fundamental que tenhamos a presença do verdadeiro historiador. Não o aventureiro jornalista, apontador de curiosidades jogadas ao vento. Não o curioso incapaz de perceber o amanhã. Não o viajante narrador selecionador de apontamentos exóticos, desvinculado de projetos. Não o estudioso que está a serviço da simples memória.

Através da História uma sociedade pode conceber seus projetos, transformando-se. Caso contrário, a ciência histórica ergue-se vazia e recheia-se de fundamentos supérfluos e decorativos.

A História Ocidental parece caracterizar-se – nos dias globalizados capitalistas – por uma ausência de consenso. Vive-se uma multiplicação de pesquisas que perdem a dimensão do todo, retraindo-se às particularidades dos objetos, com os historiadores lançando mão de conceitos polêmicos sem relevância. O historiador aparenta - na maioria das vezes - estar indefeso e inseguro, relativizando conclusões e críticas, em clara tendência de reafirmar dúvidas.

Como se sabe (ou se deve saber), o valor da ciência histórica está nas questões e nos problemas, não nos fatos em si. Não nas questões que nos façam revisitar o passado apenas como curiosidade, mas nas conciliações das contradições.

Mas qual tem sido o papel do historiador neste novo mundo aparentemente claro, porém obscuro?

31   Antoine Prost. Dez Lições da história. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.

simplificadas e simplificadoras de resolução de problemas. Por um lado, com a proliferação das informações através das televisões, da evolução

acelerada da informática e da informatização, do crescimento assustador da robótica, entre outros, vemos nossas vidas transformarem-se. Tudo se tornou mais dinâmico, mais informativo, o que permite que nos posicionemos em algumas questões, sejam elas ambientais, de direitos ou culturais. Porém, os hábitos tornaram-se menos duradouros, com as transformações tornando-se mais abruptas e a solidariedade menos consistente.

Dentro deste quadro, como deve comportar-se o historiador em meio às transformações abruptas iniciadas em especial ao final dos anos 1990?

O Homem e o Tempo

Nas condições contemporâneas de perda de tradições consistentes, os indivíduos aparentam estar desorientados. Os laços sociais horizontais e os ideais teriam sido pulverizados. Ou seja, o problema existencial dos indivíduos não é mais o de “como chegar lá”, mas para “onde devo ir?”.

Difícil calcular com exatidão os benefícios e as desvantagens das transformações ditadas pela vida moderna. Certamente, um dos prejuízos trazidos pelo individualismo é a solidão que faz com que as separações e rupturas tornem-se cada vez mais numerosas e comuns entre os indivíduos.

A idéia da individualidade é historicamente constituída. Ou seja, cada sociedade, em determinado momento histórico, apresenta uma visão própria a respeito do problema da individualidade.

Para a sociedade capitalista, a existência de uma estrutura mercadológica no qual proprietários individuais vendem seus produtos, criou condições para que a sociedade seja pensada apenas como o conjunto de interesses individuais.

Porém, por mais individualistas que tenhamos nos tornado, não há como eliminar o problema da relação entre indivíduo e sociedade, uma vez que nossas ações individuais influenciam quem nos cerca.

Um dos sintomas mais sentidos e ressentidos nos dias atuais relaciona-se com o tempo, ansiosos que estão os homens modernos por fazer previsões.

Como bem nos aponta François Hartog29, “estamos presos entre a aminésia e a vontade de não esquecer nada”, o que nos deixa claro que História não é progresso e que deve ser ferramenta de ações identificadoras e, por que não afirmar, transformadoras.

Os tempos globalizados esvaziam o nacionalismo, fazendo-o perder espaço, o que pode ser percebido tanto no capitalismo editorial quanto na imprensa em geral. Datas, hinos, mapas, apontados por Anderson30 como símbolos da perda da individualidade, parecem desvalorizados, não atingindo os propósitos de décadas atrás. Neste sentido, a figura do Estado perde essência e valor.

Em outras palavras: a culpa está sendo paulatinamente deletada. Paralelamente, dentro das relações horizontais, não se corre grande perigo, já que há o suposto controle sobre o mundo.

29   François Hartog. Regimes de Historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013.30   Benedict Anderson. Comunidades Imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão do nacionalismo. SP: Cia. das Letras, 2008.

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Para Michel Foucault33, “ (...) a mudança pode ser objeto de análise em termos de estrutura, o discurso histórico é povoado por análises tomadas emprestado da etnologia e da sociologia, das ciências humanas”. Entendamos assim: a História, enquanto ciência, não caminha sozinha.

História se faz investigando vestígios, como um detetive na busca de detalhes que complementem um quebra-cabeça. Afinal, não está apenas a serviço da memória e não é uma ciência exata, por mais que não suporte imprecisões.

As questões formam o âmago de uma pesquisa e de um trabalho histórico. As fontes devem ser apreciadas sob o ângulo que se deseja para sanar a alguma questão, sempre se deixando de lado as paixões pessoais (embora seja esta uma atitude difícil para o historiador). De qualquer forma, uma formulação nunca será definitiva e sempre deve estar pronta para ser reescrita.

Um evento não deve ser apenas mostrado, mas analisado em seu contexto, o que significa dizer ser fundamental que as escolhas e ações se façam da maneira mais consciente possível. E desenvolver essa consciência é, sem dúvidas, um dos papéis da História.

O tempo, para a História, vincula-se aos fatos que se deseja ver analisados, como aos documentos que se tem em mãos e, em especial, às questões que se pretende sanadas.

História se faz com historiador, nunca pelo curioso que, na necessidade de se afirmar, traz mais confusões do que esclarecimentos, já que pode ocultar verdades e basear-se em documentos curiosos e ricos, porém falsos. Ou seja, não faz sentido a elaboração de um bom trabalho a partir de um bom problema se a narrativa não contemple ou consiga traduzi-lo convenientemente.

A grande novidade dos Annales não está no método, mas no estudo histórico vinculado às questões, apontando o trabalho a partir dos documentos e na citação das fontes, livre do factual, em claro trabalho interdisciplinar. Só assim a História torna-se científica, ensinando-nos que o valor das questões está ligado aos documentos e aos fatos e muito menos no tempo.

O profissional da História: entre a escrita e dilemas

Na História, rui, há muito, a glorificação das elites, a supervalorização dos príncipes e governantes, os heróis das guerras intermináveis, a exaltação dos vencedores.

Mas até que ponto esta nova concepção da História afirma-se em direção aos intitulados “vencidos”. Não estaria a História contemporânea valorizando firmemente os perseguidos sob uma concepção que interessa aos detentores das opiniões, mesmo que de forma camuflada? Não estaria a História fazendo uso de um discurso popular para fazer crer que a realidade está posta de forma clara e determinante? Estaria prevalecendo um panorama conciliador e sem quaisquer chances de outros determinismos?

A procura por novas metodologias de trabalho no campo da educação demonstra estarmos vinculados a uma realidade nova, bem diferente daquela que os docentes viveram em sua formação como jovens, adultos e mesmo como acadêmicos e profissionais. Esta nova realidade insere-se em uma nova proposta que leve em consideração não apenas o lado racional, mas também o emocional e o sensitivo.

A História tem, entre suas tarefas, uma que me parece essencial: investigar os 33   Michel Foucault – Ditor e Escritos in 1967 – Sobre as Maneiras de Escrever a História, p.64.

Esta é uma pergunta que me faço quase que diariamente. Confesso, porém, que a tentativa de obtenção de respostas me traz mais dilemas do que confortos. Por ser a tarefa do historiador extremamente subjetiva, mesmo a prática da seleção dos documentos que se queira analisar, particulariza a atividade. Mais: o que se constituiu em fato? E em acontecimento? Mesmo a narrativa, por ser pessoal, pode induzir ou conduzir o iniciante e mesmo o curioso leitor a visões distorcidas, levando-o a interpretações ou de formulações de discursos que venham a interessar a grupos, sejam eles elitistas ou populares. É cada vez mais claro que o papel do historiador não é o desvendar problemas, mas analisar como se evoluiu para tal. Da mesma forma, o historiador deve formular questões a partir do presente em relação ao passado, não deixando de reescrever a História periodicamente, afinal esta não é uma ciência paralisada, mas em trânsito. E nem pode, já que não se pode postar a História como uma ciência a serviço da memória, embora o passado permita ao homem analisar seus feitos ao longo do tempo e, desta forma, compreender seu presente. Porém, o historiador não pode e não deve imaginar que os acontecimentos passados possam ser simplesmente considerados no plano de vida atual sem qualquer tipo de análise ou adaptação, uma vez que a repetição do passado não se dá de forma absoluta.

A História deve prescindir das conclusões fechadas e absolutas. Todo problema deve ficar aberto a novas perspectivas. O importante é apontá-lo e cercá-lo de dados informativos analisados sob a ótica de que tudo muda e de que tudo se relaciona. Neste sentido, a interdisciplinaridade se torna obrigatória por estabelecer diálogos com outras ciências correlatas.

Precisamente a partir do fim da década de 1980, com a queda do Muro de Berlim e com a derrocada do mundo comunista, memória e patrimônio passaram a ser indícios e sintomas das transformações. Diante da nova realidade, o desejo do historiador passou a ser o de compreender e, em especial, prever, estabelecendo um novo regime de historicidade, sempre na ânsia de esclarecer o que se desenha duvidoso. Neste sentido, a História moderna parece ter abandonado a idéia do exemplo, apegando-se à idéia do acontecimento, aparentemente no desejo de se prever as perdas.

Mesmo nas universidades, na ânsia de se lançar teses e revisões, profissionais têm buscado trabalhos pautados na curiosidade. Talvez como forma de impressionar seus pares ou como forma de obtenção de um repertório que lhe permita a ascensão. Isto sem falar no “curioso-leigo” que, na maior parte das ocasiões, aponta para revisões históricas sem base concreta, almejando ser lido e, portanto, consumido.

March Bloch afirmou ser a História “(...) uma ciência em marcha, novíssima”32. Para amadores ou curiosos em geral, uma “semi-ciência”.

Desta forma, premente que o historiador reveja-se, assim como a seus propósitos.A História é a mais política das ciências. Talvez por essa razão seja difícil manter

a objetividade e, ao mesmo tempo, dar uma marca pessoal à apresentação das análises e dos fatos. Caso não seja feita com rigor e critérios bem definidos, pode fazer perdurar ideologias nacionalistas, fundamentalistas ou étnicas.

A História torna-se científica quando interpreta e não apenas narra fatos. Estes últimos, por sua vez, devem ser vistos como ingredientes a serem cuidadosamente avaliados em qualidade e autenticidade.

32   March Bloch, Introdução à História. Trad. Maria Miguel e Rui Grácio. Lisboa: Publicações Europa-América, 1965, p. 19.

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particularizar a História, desprezando a micro-história e seus personagens anônimos. Uma das grandes tarefas do historiador é a de buscar a compreensão das lutas

políticas entre os grupos dominados e dominantes em todos os níveis, garimpando as suas fontes criteriosamente selecionadas e procurando desvendar as verdadeiras causas dos marasmos ou das tensões e conflitos e suas repercussões.

Não se pode errar na ciência histórica. O historiador pode, sim, defender teses e revê-las quando oportuno e necessário.

Neste sentido, somente ao se ver no espelho de sua História, um povo que sempre lutou e quase sempre perdeu, se identificará consigo mesmo.

Deve-se levar em consideração que conflitos históricos são travados pelo evento em si ou pela versão passada pelos populares, pelas elites, pelos curiosos historiadores e pelos acadêmicos em geral.

Uma atitude anti-histórica de ruptura abrupta com o passado, ignorando-se as conquistas sociais, políticas e culturais, leva, pois, à renúncia da liberdade e à valorização do Estado. Ao fazer uma análise histórica superficial e sem critérios, contribuímos para a propagação de ideologias dominantes, garantindo continuidades e sedimentando supostas verdades.

A História regional está aberta, esperando para ser feita e reconhecida enquanto tal. Através dela, poderemos preencher o vazio do eu, vinculando-a ao nós.

Tenhamos, assim, em mente, o poeta espanhol e seus vitrais coloridos.

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SANTOS, Wanderley G. dos. Cidadania e Justiça: a política social na ordem brasileira. RJ: Campus, 1985, 2 edição.

“cabras” em sua trajetória; de forma particular e desvinculada de nacionalismos. Ou seja, o resgate do povo deve ser o caminho escolhido como trajetória para uma História em crise. Neste sentido, a História ainda está por ser feita.

Desde os gregos, o discurso histórico pertence a uma elite dita cultural. Mas somente o círculo acadêmico têm capacidade para produzir trabalhos de valor histórico? Claro, com os rigores exigidos, sim. Porém, creio que a narrativa histórica não pertence somente aos teóricos das universidades, mas pode ser encontrada nas esquinas das ruas ou mesmo nas cercanias rurais.

Talvez não seja uma História fundamentada, escrita e científica, mas uma História que possui valor. E a História que possui valor não deve ser escrita em direção a quem a produz, o que significa dizer que a produção histórica deve também ser direcionada para os que por ela se interessam, sejam leigos ou não.

A partir dos anos 1990, com a concretização da queda do muro de Berlim (1989), o desmoronamento das experiências socialistas e a ascensão da globalização capitalista, há um vazio a ser preenchido na História Ocidental, atestado pelo que já foi definido como a multiplicação do insignificante.

Talvez seja o momento de preenchimento deste vazio.Em um país como o Brasil, em que as elites são se reconhecem como tal, necessário

que a História seja periodicamente reescrita. Um dos caminhos propostos é o de resgatar os populares dentro de sua própria trajetória.

Não se trata de uma proposta que procure afirmar direitos, mas que estabeleça proteção do que foi e é conquistado. Afinal, como seria a História brasileira se narrada por mulheres, crianças, negros, indígenas, operários? Certamente diferente ou, pelo menos, com enfoques mais variados. Afinal, temos a certeza de que os a história dos negros do Brasil não ficou na abolição, que a história indígena não estancou na colonização, que a história dos operários não estacionou nos movimentos das décadas de 1910 e 1920. O que dizer das mulheres ou das crianças, nunca focalizadas claramente na historiografia brasileira?

O próprio carnaval carioca, fonte de arrecadação turística, vê, em seus dias atuais, celebridades disputando seus lugares nos camarotes de luxo (sejam elas diplomatas, atores e atrizes de televisão, bicheiros, traficantes, banqueiros ou jogadores de futebol). Não se percebe, no entanto, que tais camarotes são a extensão da varanda dos antigos sobrados (este é apenas um exemplo para que concluamos sobre a importância de uma História que se inicie regional).

Não creio ser por acaso que personalidades que alcançam certa notoriedade e sucesso, mesmo que momentâneo, remontem às suas origens.

É no regional que o homem brasileiro confia, encrava base e ganha valor. Portanto, que seja a História iniciada do princípio, para que se justifique e ganhe dimensão e amplitude.

CONCLUSÕES

Cabe ao historiador buscar e definir o sentido político de suas ações, em especial nos dias globalizados contemporâneos, quando se corre o risco de perder as fronteiras entre a economia, a política, a cultura e a sociedade. Neste cenário, o historiador tende a

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PLANEJAMENTO: uma ferramenta de gestão do assistente social.

Juscilene Galdino da Silva34

RESUMOO planejamento é um processo sistemático de tomada de decisões e constitui-se como uma ferramenta de gestão para os profissionais que trabalham em instituições públicas ou privadas. Este artigo é resultado do trabalho de conclusão de curso de pós graduação em planejamento e gestão de projetos sociais da Universidade Filadélfia - UNIFIL-Londrina-PR. Este é um estudo teórico que aborda o planejamento com ênfase na metodologia de planejamento estratégico. Este processo, nas instituições públicas e privadas torna-se uma ferramenta de gestão indispensável que, embora complexo, pode orientar o trabalho de assistente social, que deve ter uma qualidade social para seus usuários do Serviço social. PALAVRAS-CHAVES: planejamento, gestão, assistente social.ABSTRACTPlanning is a systematic process of decision-making and is constituted as a management tool for professionals working in public or private institutions. This article is the result of completion of course work to graduate in planning and management of social projects at the University Philadelphia - UNIFIL - Londrina -PR. This theoretical study addresses planning with an emphasis on strategic planning methodology. This process, in public and private institutions becomes an indispensable management tool that, while complex, can guide the work of social workers, which should have a social quality to its users of social service.KEYWORDS: Planning, management, case worker.

INTRODUÇÃO

O planejamento é uma atividade racional, processual e possui dimensões técnicas e políticas, através da qual se exerce uma ação sobre variáveis empíricas, de uma dada situação para alterá-las. Contém, pela própria natureza, uma dimensão política com princípios de ação que direcionam o que se quer fazer, mediante atividades que imprimem organização à ação.

Os elementos teóricos metodológicos se expressam em instrumentos de consolidação das decisões, através dos documentos que são os planos, programas e projetos.

Os tipos de planejamento mais utilizado na atualidade são o participativo e o estratégico. Segundo Costa(2009) o planejamento estratégico intenciona promover a reorganização institucional na perspectiva de uma atuação mais adequada integrada entre seus diversos setores, é um instrumento direcionador e promotor de mudanças.

Portanto a reorganização institucional é visualizada a partir da definição da visão, missão e princípios institucionais. A instituição se concretiza em pilares com propostas sociais e políticas firmes, definindo sua melhor forma de atuar de acordo com a intencionalidade.

Sendo assim o instrumento que direciona o trabalho profissional é o planejamento, o qual através de ações política e tecnicamente pensadas, formulam, executam e avaliam essas políticas no objetivo de enfrentar a questão social, permitindo a sociedade o resgate dos seus direitos, acessos ao serviços e serviços, sendo esses de qualidade.

A partir da participação como aluna na Pós-graduação em Planejamento e Gestão de Programas e Projetos Sociais da Universidade Filadélfia – UNIFIL nos atentamos para

34  Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e pós graduação em Gestão e Planejamento em Projetos sociais pelo Centro Universitário Filadélfia (UNIFIL). Atualmente atua como Assistente social na Defensoria Pública do Paraná- Cianorte.

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reflexão.A autora acima mencionada afirma que reflexão é o momento do conhecimento de

dados, é à análise e estudo de alternativas, à superação e reconstrução de conceitos e técnicas de diversas disciplinas relacionadas com a explicação e quantificação principalmente dos fatos sociais. Em contra partida a decisão se refere à escolha de alternativas, à determinação de meios, e definição de prazos.

A ação está relacionada à execução das decisões, é o foco central do planejamento, orientando-se por momentos que a antecedem e é subsidiada pelas escolhas efetivadas da decisão, quanto aos necessários processos de organização.

Ainda segunda a autora, a retomada da reflexão é a operação de crítica dos processos e dos efeitos da ação planejada, com vistas ao embasamento do planejamento de ações posteriores.

Neste sentido Barbosa também diz que “oportunizar a todos os homens o exercício da reflexão é acreditar na sua capacidade de pensar, analisar, decidir, de pensar no passado e no futuro, propondo criações conjuntas e um assumir responsável diante das suas decisões e ações” (1991, p.26). Desta maneira, observa-se um processo imbuído de diferentes histórias, valores e princípios, onde;

O privilegiamento da dimensão político-decisório é base das novas reflexões que se fazem sobre o planejamento. Essas reflexões evidenciam de partida, a necessidade de o técnico ter presente, ao realizar seu trabalho, as ideias e o sistema de valores subjacentes às decisões norteadoras do planejamento e, ao mesmo tempo, procurar compreender a realidade trabalhada em seu contexto de tensões e pressões de interesses diversos, como base de sustentação da decisão. Evidenciam, ainda, a necessidade de uma análise crítica do significado e das decorrências das novas propostas para aqueles que estejam sob seu raio de influência” (BAPTISTA, 2000 p.).

Além dessa perspectiva de escolhas políticas, o planejamento tem outro plano de intervenção, que é mais vinculado à realização das ações,

A definição das atividades necessárias para atender a problemas determinados e à otimização de sua sequência e inter-relacionamento, levando em conta os condicionantes impostos a cada caso – recursos, prazos e outros – diz respeito, também, às providencias necessárias à sua adoção, ao acompanhamento da execução, ao controle, à avaliação e à redefinição da ação” (BAPTISTA, 2000 p.).

Para que o planejamento atinja seu objetivo fundamental, deve estar associado a uma leitura de realidade além da apreensão das condições objetivas e subjetivas do ambiente no qual ela ocorre, ou seja, informações significativas para tomar a decisão.

Sendo assim, pode-se considerar que o planejamento é um instrumento de gestão importante, pois proporciona visibilidade para a instituição, uma vez que, posiciona a mesma sobre o contexto real, trazendo idealizações futuras e métodos para atingir essas idealizações e realizar assim a transformação social almejada.

Os tipos de planejamento são o planejamento tecnocrata, participativo e estratégico.O planejamento tecnocrático é aquele que uma única pessoa ou grupo detém o

poder de decisão, ou influência nas decisões dos demais a fim de obter os seus próprios interesses, muitas vezes fazendo com que as pessoas pensem que teve participação e que a

a importância do processo de planejamento enquanto instrumento de gestão para o agir profissional, dando maior significado na prática.

Neste viés de pensamento esse artigo também é uma reflexão teórica sobre os conteúdos ministrados em sala de aula e pesquisa em acervos bibliográficos. Além do interesse pessoal pelo tema, bem como a formação profissional desta autora, conceituamos o planejamento, demonstrando assim ser um dos importantes instrumentos de gestão para o agir profissional do assistente social, nas instituições públicas, como privadas.

Conceituando o Planejamento

Planejar atividades é algo que todos fazemos em maior ou menor grau, ainda que não tenha nada registrado, sempre se pensa naquilo que precisa ou deseja fazer. Planejar segundo o dicionário é traçar, fazer o plano, planificar, ou seja é a decisão antecipada daquilo que se quer que aconteça e a definição da melhor forma de se concretizar.

O ato de planejar é comum para o ser humano e faz parte da sua história, pois, “já no início dos tempos, o homem refletia sobre as questões que o desafiavam, estudava as diferentes alternativas para solucioná-las e organizava sua ação de maneira lógica”. Enquanto assim fazia, estava efetivando uma prática de planejamento. Segundo Baptista (2000).

[...] desde épocas remotas da história da humanidade identifica-se o ato de planejar, embora sob formas evidentemente diferentes das atuais, podendo ser lembradas algumas atitudes de enfrentamento criativo a situações que se apresentavam, como por exemplo, a guarda de alimentos, tendo em vista a previsão para enfrentar períodos rigorosos de inverno etc. (BARBOSA, 1991, p.17).

Essa atitude, em si dialética, segundo o autor é inerente ao ser humano. Todo homem é capaz de planejar, tomar decisões em relação ao futuro, entretanto, esta consideração, nos possibilita partir da premissa de que o planejamento é basicamente um processo de racionalidade.

De acordo com Baptista (2000), o planejamento, é parte integrante das ações de um projeto, pode-se definir como a etapa em que se determina como será a execução de todas as ações planejadas, e seu acompanhamento. São determinadas as prioridades de intervenção bem como a definição dos objetivos e metas que se pretende alcançar, também deverá ser levado em consideração os recursos disponíveis e os prazos pré-estabelecidos.

Neste enfoque, o planejamento é a ferramenta para pensar e agir dentro de uma sistemática analítica própria, estudando as situações, prevendo seus limites e possibilidades, propondo objetivos, e definindo estratégias (BAPTISTA, 2000).

Para Oliveira (2007) o planejamento é um processo sistemático e constante de tomada de decisões, onde os resultados das decisões tomadas deverão aparecer futuramente.

Já Maximiano (2000) define planejamento como um instrumento que as pessoas e as organizações usam para administrar as decisões futuras, ou seja, planejar é definir os objetivos ou resultados a serem alcançados no futuro. Diz que planejamento é uma ação que fazemos antes de agir.

Retomando ao pensamento de Baptista (2000) diz que sua dinâmica se organiza por operações complexas e interligadas, sendo elas: reflexão, decisão, ação, e retomada da

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alcançadas através de uma gestão institucional sólida.COSTA (2009) diz que quando há racionalidade à ação de intervenção numa

situação real, esta se da para transformar numa situação idealizada. Sendo assim segundo a autora, esta ação de intervenção deve possuir uma base ideológica, teórica e metodológica e sua intenção de transformação deve estar numa perspectiva política.

Para que esse trabalho seja executado da melhor forma possível, as metas sejam atingidas, as instituições podem utilizar a metodologia do planejamento estratégico, o qual pode considerar, um processo em que as pessoas que atuam na organização, acordam a principal ação a ser realizada e os meios para alcançá-la.

Segundo Queiroz (2004) o planejamento estratégico, deve ser entendido como um processo através do qual as pessoas que atuam em uma organização acordam a essência do que pretendem realizar, e com que meios devem utilizar.

Baptista (2000) complementa que o planejamento estratégico é uma forma nova de pensar, que determina uma nova forma de agir dentro das instituições.

Para tal o planejamento estratégico estabelece a técnica e a metodologia que viabilizam o resultado com qualidade, permite determinar previamente objetivos estratégicos a serem alcançados e os meios pelos quais possam ser executados.

Sendo assim o principal instrumento para se concretizar este trabalho é o planejamento estratégico, pois poderá proporcionar as instituições um trabalho com caráter transformador sendo esta a principal demanda dos usuários que procura seus direitos através de serviços com qualidade social e principalmente resolutividade.

Para Costa o planejamento estratégico é o instrumento através do qual a entidade se mobiliza, para transformar a sua estrutura funcional e organizacional, construindo o seu futuro e novas formas de relacionamento com a população usuária de seus serviços.

[...] o planejamento estratégico intenciona promover a reorganização institucional na perspectiva de uma atuação mais adequada integrada entre seus diversos setores, e ser instrumento direcionador e promotor de mudanças. (COSTA, 2009 p.36)

Esta reorganização institucional é adquirida a partir da metodologia do Planejamento Estratégico, permitindo a definição da visão, missão e princípios institucionais. A instituição se concretiza com propostas sociais e políticas firmes, definindo sua melhor forma de atuar de acordo com a intencionalidade.

Para sua implementação o Planejamento Estratégico pode seguir três etapas, sendo a primeira um levantamento de dados; a segunda a diagnose que irá avaliar o ambiente e as respostas da entidade aos impactos, a partir do levantamento de dados e a terceira a identificação da missão, definição das finalidades e explicação dos objetivos.

Sendo assim, visão, missão e princípios são as diretrizes a serem definidas no processo de planejamento, a partir da análise de conjuntura para a compreensão do contexto no qual a instituição está inserida.

Segundo Costa (2009), o estabelecimento da Visão Institucional define um modelo, ao qual a instituição seguirá no seu agir é a direção que ela se moverá e constitui o que se deseja para o futuro.

A Visão deve ser um ideal que serve como inspiração, motivação, força e orientação.

decisão foi democrática.Exemplo disso é a participação da sociedade nas decisões políticas que fica

limitada, fazendo com que àqueles que não detêm do conhecimento científico se submetam aos interesses daqueles que detém o saber técnico que neste caso são os políticos e, consequentemente, o poder.

Podemos então dizer que existe uma estreita relação entre os planejamentos tecnocráticos e os regimes políticos autoritários, na medida em que o tecnocrata acredita num Estado forte (autoritário) que mantêm sob controle as classes com menor poder econômico e político, através da sua “autoridade técnico-científica”. (HORTA, 1982, p. 229).

Isso também ocorre nas instituições públicas ou privadas onde ainda se percebe que esta prática é bastante comum e não tão longe de nossa realidade, no que diz respeito a patrão e empregado ou superior e subordinado.

Já o planejamento participativo é aquele que a ideia ou sugestão de todos é levada em consideração principalmente os ligados a instituição, e ou, a comunidade.

De acordo com Gandin (1997) a característica principal do planejamento participativo não é somente o fato de se estimular a participação das pessoas ou comunidade em geral. Isto existe em praticamente todos os processos de planejamento: não há mínimas condições de fazer algo na realidade atual sem, pelo menos, pedir às pessoas que tragam sugestões ou novas ideias. Esse tipo de planejamento é, de fato, uma nova tendência dentro do campo de propostas de ferramentas para intervir na realidade apresentada.

É por isso que o planejamento participativo se distingue de outras correntes. Prova disso é que observamos essa nova tendência em quase todas as organizações, principalmente as de cunho social, que valoriza as ideias, ao modo de pensar que constituem a organização seja social ou não, principalmente o público interno, funcionários, diretoria, entre outros que são os que trabalham diariamente e diretamente para a construção de um objetivo comum a todos.

Quando houver desejo real de planejamento participativo, um aspecto metodológico constitui-se em ponto fundamental: recolher o que as pessoas sentem, desejam e pensam da maneira como elas o pensam, desejam e sentem, utilizando as próprias palavras que as pessoas escrevem ou pronunciam. O importante é definir que, para construir um processo participativo com distribuição de poder, não é suficiente pedir sugestões e aproveitar aquelas que pareçam simpáticas ou que coincidam com pensamentos e expectativas dos que coordenam: é necessário que o plano se construa com o saber, com o querer e com o fazer de todos. (GANDIN, 1997, p. 136)

Outro tipo muito utilizado atualmente é o planejamento estratégico, sua metodologia gerencial permite estabelecer a direção a ser seguida pela organização, visando o melhor resultado possível, no tempo estabelecido seja um curto ou longo prazo, discorreremos sobre esse assunto no próximo item.

O planejamento se dá dentro das instituições, pois as mesmas necessitam tomar decisões, realizar as melhores escolhas, definir ações; por isso é preciso ter clareza o que se pretende realizar, coerência e integridade, para desenvolver o seu trabalho com qualidade.

Partindo do pressuposto de que uma instituição que prima por um trabalho de qualidade social, onde a atuação profissional e técnica devem proporcionar aos usuários o seu bem estar social e a garantia dos seus direitos, estas são características somente

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alternativas, dos meios e dos prazos que serão colocados em prática, bem como do sistema de monitoramento e avaliação das ações a serem executadas; são definidos os programas e seus respectivos projetos. De acordo com a autora, a programação responderá às seguintes perguntas: “O que faremos para chegar à situação ideal?, Como faremos isso?

Ao final da etapa de elaboração do plano, é realizada, pelo grupo de planejamento, a avaliação de todo o processo de elaboração, quando são pontuados os principais êxitos e fracassos desse processo, aumentando assim a competência do planejamento e das tomadas de decisão.

Portanto o instrumento que direciona o trabalho é o planejamento, o qual através de ações política e tecnicamente pensadas, formulam, executa e avalia as políticas sociais, com objetivo de enfrentar a questão social, permitindo a sociedade o resgate dos seus direitos, acessos ao serviços de qualidade.

As diferentes profissões utilizam-se do planejamento como instrumento em seu cotidiano profissional para que as decisões fiquem marcadas pela racionalidade técnica e política, que vão, permeia todo o processo de reflexão, decisão e ação da intervenção profissional, com destaque aqui para o profissional de Serviço Social.

Serviço Social e o processo do planejamentoSegundo IAMAMOTO (1993) o Serviço Social enquanto profissão é uma

atividade institucionalizada, legitimada pelo Estado e pelo conjunto dominante. Na divisão sócio-tecnica do trabalho, este trabalho se desenvolve de acordo com as condições de produção sobre a qual se baseiam as relações entre os membros da sociedade.

A natureza da profissão, segundo a autora, se baseia na intervenção, ou seja, uma atividade predominantemente prática que visa introduzir mudanças imediatas no contexto social. Quanto ao papel do assistente social, evoca-o basicamente instrumental como educador, orientador da hegemonia e da coerção de classes a que se vincula objetivamente. Segundo a autora, as funções do assistente social são exercidas através da mediação dos serviços sociais, criando condições favoráveis à reprodução da força de trabalho.

Segundo Iamamoto e Carvalho (1983), a profissão Serviço Social surgiu devido às contingenciais geradas pelo capitalismo com suas grandes instituições, que exploram a força de trabalho e desse modo, produzem populações de trabalhadores e desempregados que necessitam de serviços de assistência social implementados pelo Estado. Assim, o profissional de Serviço Social atua no âmbito das relações humanas e deve contribuir para que seja garantido o direto do trabalhador.

Para se adquirir uma prática transformadora, combatendo o ativismo cotidiano, o profissional assistente social adota o processo de planejamento como instrumento para enfrentamentos. É necessário atuar, buscando respostas sólidas e concretas as demandas que cotidianamente são postas. Segundo Neto (2011), o profissional deve desenvolver em sua atuação a perspectiva da totalidade institucional, sendo que a formação desses profissionais deve ser capaz de responder, com eficácia e competência, às demandas tradicionais emergentes na sociedade brasileira.

A prática profissional, em qualquer campo, está permeada por problemas de naturezas diversas que tornam o seu debate um verdadeiro desafio para aqueles que se propõem a realizá-lo. Assim também ocorre com o assistente social, em seu ambiente profissional, na instituição que atua, seja ela, governamental ou não, atende na maioria das vezes, pessoas e/ou famílias com situações diversas e necessidades, geralmente, urgentes,

Trata-se, portanto, de um modelo mental, claro e luminoso, de um estado ou situação altamente desejável, de uma realidade futura e possível, descrita de forma simples e objetiva, compartilhada por todos os dirigentes e colaboradores da organização. A Visão responde à pergunta: para que direção nos moverá? Ao ser elaborado, deve-se ter em mente o que o grupo deseja para a instituição no futuro.

Já a missão é o foco central de uma instituição, é a razão de sua existência e deve responder as seguintes questões: o que a organização deve fazer? Para quem ela deve fazer? Para que ela deve fazer? Como ela deve fazer? Onde ela deve fazer? E qual a responsabilidade social que deve ter para com a comunidade?

Quando nos remetemos a realidade na qual estão inseridas essas Instituições observamos o movimento permanente, sendo a tendência à mudança uma de suas características.

A seguir definem-se os princípios, nessa etapa, cabe definir o posicionamento ético, político e ideológico da instituição frente à questão social por ela atendida, defini-se também a concepção da instituição em relação à sua população usuária.

Os Princípios são os pontos básicos sobre os quais a instituição fundamenta sua atuação, balizam o que deve limitar e condicionar os processos decisórios da instituição no cumprimento de sua Missão. Esses princípios podem ser de natureza ética, política, cultural.

A segunda fase, parte da elaboração do planejamento é a análise diagnóstica. Nesta fase, a visão, a missão, e os princípios, definidos anteriormente, são tomados como parâmetro, comparando-os com a análise de conjuntura e com a análise da situação real da instituição, buscando o esclarecimento a respeito dos problemas existentes no contexto da atuação institucional, das causas e efeitos desses problemas e onde, com quem e de que forma esses problemas aparecem.

Portanto, o diagnóstico compreende saber o grau de dificuldade existente para, a partir da situação real, alcançar a situação ideal, que é a visão estabelecida. Nesse são determinados quais os maiores obstáculos existentes para o alcance da visão já estabelecida e para o cumprimento da missão institucional, buscando as razões dessas dificuldades. São levantados os pontos fortes e fracos da instituição e as oportunidades e ameaças na, em função do alcance da situação ideal, ou seja, a diagnóstica parte da descrição da situação real e mostra qual a distância existente entre a situação real e a desejada.

O processo de elaboração do diagnóstico segue dois importantes momentos: o da reflexão e o do enunciado, que segundo Costa (2009) nesse processo são observados, identificados e selecionados os principais fatos e fenômenos determinantes da realidade atual vivida no contexto institucional. Esses fatos e fenômenos, em seguida, são descritos, revelando suas características, suas causas e seus efeitos, bem como a relação deles entre si, com o contexto institucional e com a realidade mais ampla. Por último, é identificado o problema central, apontado pelo diagnóstico, é que irá determinar todos os demais. É a partir do problema central que serão definidos o objetivo geral do plano gestor e os respectivos objetivos específicos.

Segundo Gandin (1997), nesse momento surge a proposta de ação para aproximar a realidade existente da realidade desejada.

Costa (2009), diz que a definição da programação traz implícita a operação da decisão. É o momento em que são feitas as escolhas dos objetivos e das metas, das

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externo em que a sociedade está inserida continuamente. Deve ser tratado como um processo primordial ao trabalho profissional, pois é um método aplicado para a intervenção profissional, ou seja, o profissional deve investigar e analisar a realidade para assim propor uma intervenção eficaz.

O autor destaca que para o profissional de Serviço Social o planejamento deixa de ser um método de estudo e passa a ser um procedimento importante para a profissão, tornando um instrumento essencial para compreender a profissão, sendo que esta precisa repensar suas práticas para atender as mais diversas realidades e expressões da questão social que surgem no cotidiano profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo contínuo do planejamento é de fundamental importância em instituições onde atuam profissionais, com destaque nesse artigo para o assistente social. Adotar este processo como instrumento de gestão institucional, bem como, no agir de cada área profissional permite dar maior significado na prática do cotidiano profissional.

O planejamento, enquanto processo contínuo, de elaboração, execução e avaliação, proporcionam transformações importantes no contexto onde a instituição atua se deste instrumental, a mesma se apropriar. Pois, conforme demonstramos este instrumento é possível que a prática profissional seja concretizada, combatendo ações imediatas e emergentes e proporcionando a instituição maior clareza quanto aos princípios, visão e desempenhar sua missão com a população usuária do serviço.

O profissional de Serviço Social está qualificado para atuar nas diversas áreas ligadas à condução das políticas sociais públicas, para tal deve se apropriar do instrumento de gestão que é o planejamento para efetividade de sua atuação e tendo como objetivo responder às demandas dos usuários dos serviços prestados.

Enquanto profissional planejador, o assistente social, ao apropriar-se desse instrumento de gestão que é o planejamento, mostra que sua ação vai além de práticas assistencialistas, imediatistas, traz ao profissional técnica política e sistematizada, sendo o facilitador para as demais áreas.

REFERÊNCIASBAPTISTA, Myriam Veras. Planejamento Social: intencionalidade e instrumentação. São Paulo: Veras Editora, 2ª edição, 2000.BARBOSA, Mário da Costa. Planejamento e Serviço Social. 4.ed. São Paulo: Cortez Editora, 1991.COSTA, Selma Frossard. Planejamento estratégico: instrumento de gestão do terceiro setor/Selma Frossard Costa.2 ed. – Londrina: Edunifil,2009IAMAMOTO, Marilda Vilela; CARVALHO, Raul. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. São Paulo: Cortez, 1983.GANDIN, Danilo. A prática do Planejamento Participativo: na educação e em outras instituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religioso e governamental. 4ª Edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.HORTA, José Silvério Baia. Liberalismo, tecnocracia e planejamento educacional no Brasil. São Paulo: Autores Associados/Cortes, 1982.MAXIMIANO, Antonio César Amaru. Introdução à administração. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2000. MIOTO, R.C. T. Processo de construção do espaço profissional do assistente social em contexto multiprofissional: um estudo sobre o Serviço Social na Estratégia Saúde da Família. Projeto de Pesquisa:

não possuindo recursos financeiros suficientes para a realização dos encaminhamentos necessários.

Diante disso BAPTISTA (2000) argumenta, que;

O profissional que pretende criar condições para uma intervenção, que conduza a mudanças significativas e não apenas na singularidade do seu objeto, deve necessariamente procurar superar os limites do enfoque situacional para identificar prioridades de intervenção, adotando uma visão que não reduza a ação à imediaticidade.

Para Mioto (2004), as ações profissionais, se estruturam sustentadas no conhecimento da realidade e dos sujeitos para as quais são destinadas, bem como na definição de objetivos, considerando o espaço dentro do qual se realiza na escolha de abordagens adequadas para aproximar-se dos sujeitos destinatários da ação e compatíveis com os objetivos.

Para tanto, continua a autora, implica na escolha de instrumentos apropriados às abordagens definidas e também de recursos auxiliares para a sua implementação. Todo esse processo se opera com base no planejamento, na documentação e num apurado senso investigativo, o planejamento sem dúvida é uma ferramenta importante para toda ação profissional. O Assistente social tem um desafio em seu cotidiano onde deverá buscar alternativas de gestão para que possa construir propostas de trabalho efetivas, capaz de preservar e efetivar direitos, dentro da instituição seja ela pública ou privada. O profissional tem que ficar atento às mudanças e inovações da realidade apresentada, a fim de buscar as melhores alternativas e estabelecer efetivação de direitos.

Contudo, GANDI (1997), destaca e caracteriza três tipos de profissionais que apesar de não indicados, são encontrados muitas vezes no âmbito das instituições. O primeiro são os extremos conservadores, que não fazem distinção entre a realidade desejada e a realidade existente, se esforçam para manter sociedade assim como está, ou no máximo, desejam aperfeiçoá-la ou reformá-la. Já o segundo inclui os extremos revolucionários que acreditam não haver possibilidade de contato entre a realidade desejada e a existente e que, portanto não poderá ocorrer mudanças a não ser pelas armas. O terceiro tipo de profissional diz respeito aos que querem a mudança a partir do que existe e acreditam nela. Pregam que a realidade desejada e a realidade existente têm pontos de contatos e pontos discordantes, e as mudanças podem ser produzidas através do campo de trabalho em que atuam.

Destacamos aqui esse terceiro tipo de profissional que é o mais promissor para o processo transformador, pautados em ações refletidas, decididas, executadas e avaliadas de acordo com as necessidades apresentadas pela realidade foco de intervenção.

Para garantir a transformação, é necessária também uma consciência crítica que, segundo GANDI (1997) isto somente é alcançado por um processo de planejamento no qual a tensão e a dialética entre a realidade existente e a realidade desejada é o mais importante. Somente assim o profissional não estará reproduzindo a sociedade ingênua e espontaneamente, com base no senso comum ou na ideologia, mas reproduzindo o que se escolheu, com a firmeza da opção crítica e da teoria, com modelos de interpretação da realidade e metodologias de ação que sejam eficazes.

O planejamento segundo Vieira (2010) é um importante aliado ao exercício do trabalho profissional, pois permite antecipar possíveis e certas mudanças do ambiente

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PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E SEUS BENEFÍCIOS PARA AS EMPRESAS DE LUCRO REAL

Alison Roberto GiroldoDiego Henrique Fiori

Fábio Takao ItoMatheus Henrique Carnevalli

Orientadora – Profª. Especialista Aparecida Vani Frasson Gaion

RESUMO:O presente artigo teve como objetivo, fornecer informações sobre a importante a função de execução do planejamento tributário em uma empresa, tendo com foco principal as empresas optantes pelo Lucro Real. Com base no que fora relatado, pode se conhecer mais precisamente sobre as formas licitas de fazer um planejamento tributário e suas principais diferenças em relação as maneiras de burlar a lei praticando fraudes. Este artigo apresenta também informações sobre os vários impostos que uma empresa optante pelo Lucro Real é obrigada a pagar, e fornece auxilio para reduzir a carga tributária. Também são informadas no artigo as maneiras de apuração do Lucro Real, se dividindo em Lucro Real Anual ou Trimestral, pode-se e com a devida analise pode se identificar as diferenças que possuem e em quais empresas se adequam de forma mais precisa. A metodologia utilizada neste artigo foi a de pesquisa bibliográfica. Com o estudo pode-se compreender como é importante para a empresa fazer um planejamento tributário adequado e os beneficio que trará para a empresa e para todos os presentes na sociedade da qual faz parte.PALAVRAS CHAVES: Planejamento, Informações, Diferenças, Impostos.

ABSTRACT: This article aims to provide information about the important role for the implementation of tax planning in a company, with the main focus with companies opting for real profit. Based on what was reported, you can know more precisely about the licit ways to make a tax planning and their main differences with the ways to circumvent the law by practicing fraud. This article also presents information on the various taxes that a company opting for Real income is required to pay, and provides assistance to reduce the tax burden. Are also reported in the article the ways of calculating taxable income, dividing into annual or quarterly taxable income, we can and with proper analysis can identify the differences we have and which companies fit more accurately. The methodology used in this article was to literature. With the study can be understood as important for the company to make a proper tax planning and the benefit it will bring to the company and to all present in the society of which it is part. KEYWORDS: Planning, Information, Differences, Taxes.

O Planejamento Tributário é uma ferramenta importante para as empresas, ele tem como objetivo a diminuição da carga tributária a ser paga ao governo. Um bom planejamento tributário é fundamental para a empresa diminuir seus custos, pois os tributos pagos pelas empresas são altíssimos e controlá-los é uma boa forma de aumentar o rendimento da empresa.

De acordo com OLIVEIRA, CHIEREGATO, JUNIOR e GOMES (2009, p. 29):

Entende-se por planejamento tributário uma forma lícita de reduzir a carga tributária, o que exige alta dose de conhecimento técnico e bom-senso dos responsáveis pelas decisões estratégicas no ambiente corporativo. Trata-se do estudo prévio à concretização dos fatos administrativos, dos efeitos jurídicos, fiscais e econômicos de determinada decisão gerencial, com o objetivo de encontrar a alternativa legal menos onerosa para o contribuinte.

No Brasil temos 3 principais tipos de tributação: Lucro Real, Lucro Presumido e Simples Nacional. E para escolher qual tributação será mais bem aplicada na empresa é

UFSC/CNPq. Florianópolis, 2004 NETTO, José Paulo. Revista Serviço Social e Saúde: formação e trabalho profissional. In: A construção do projeto ético político do Serviço Social. Disponível em <www.fnepas.org.br/serviço_social_saúde>. Acesso em: 12/11/2013.OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Planejamento Estratégico: conceitos metodologia práticas. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2007.QUEIROZ, Marco. Empreendedorismo social e desenvolvimento. In: VOLTOLINI, Ricardo (Org.). Terceiro Setor: planejamento e gestão. São Paulo: Senac, 2004. VIEIRA, Talita Carmonia. A importância do planejamento social. Disponível em: <www.webartigos.com/aimportanciado planejamentosocial>. Acesso em: 10/11/2013.

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Para um planejamento adequado o profissional deverá verificar qual período de apuração do imposto de renda e da contribuição social trará mais benefícios para a empresa, pois, a maneira de ser calculados se distingue e dependendo da empresa uma maneira de apuração pode significar em incidência de um ônus maior, conforme será informado a seguir.

Na opção de apuração trimestralmente, o recolhimento dos tributos é de forma trimestral, no qual pode ter mais benefícios para empresas que não possuem prejuízos fiscais, conforme informado por REIS, GALLO e PEREIRA (2012, p. 32 e 33):

Porém, cada trimestre corresponde a um período, limitando a compensação do prejuízo fiscal (falaremos dos tópicos adiante) em 30% sobre o lucro fiscal dos trimestres. Para as pessoas jurídicas que têm prejuízos fiscais, isso acaba se tornando um malefício, pois momento da compensação a pessoa jurídica poderá compensar apenas 30% do Lucro Real seguinte com o prejuízo dos trimestres anteriores, enquanto no Lucro Real Anual a pessoa jurídica pode compensar os prejuízos fiscais integralmente dentro o mesmo ano-calendário.

No lucro real anual, o recolhimento dos tributos deverá ser feito mensalmente, ou seja, no mês subseqüente da apuração do período. E como informado acima nessa opção os prejuízos do período poderão ser compensador no mesmo ano-calendário.

Após a apuração do período independente da escolha de apuração feita, o Lucro Liquido é transportado para o LALUR (Livro de Apuração de Lucro Real), e nele são ajustados valores para se apurar o Lucro Real obtido pela empresa. Dentre os ajustes são destacados três mais relevantes conforme Fabretti (2012, p.217):

Adições: referem-se às despesas contabilizadas pela PJ, mas que são limitadas ou não admitidas pela lei. Exemplo: multas por inflações fiscais.

Exclusões: são valores que a lei permite subtrair do lucro líquido (IR) para efeito fiscal. Exemplo: depreciação acelerada por incentivos fiscais, dividendos obtidos de investimentos em ações de outras empresas avaliadas pelo custo de aquisição etc.

Compensações: podem ser compensados os prejuízos fiscais dos períodos-base anteriores.

É importante verificar o que poderá reduzir o valor dos impostos a serem pagos, e aumentar o valor do lucro a ser obtido pela empresa no período deixando a empresa em uma situação mais segura financeiramente e também fiscalmente. O Planejamento Tributário é sem duvida uma das principais ferramentas da atualidade para reduzir os custos das empresas, mas depende de como será executado, e da capacidade do responsável para por em prática seus conhecimentos à beneficio da empresa desenvolvendo soluções licitas para a empresa pagar menos tributos.

REFERÊNCIASBIAZIN, Damares Tomasin. Normas da ABNT, aspectos gráficos e padronização para relatórios acadêmicos. Londrina: Unifil, 2013.FABRETTI, Láudio Camargo. Contabilidade Tributária 12. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2012.OLIVEIRA, Luís Martins de; et al. Manual de Contabilidade Tributária 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009.REIS, Luciano Gomes dos; GALLO, Mauro Fernando; PEREIRA, Carlos Alberto. Manual de Contabilização de Tributos e Contribuições Sociais 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

preciso uma analise criteriosa dos vários tributos escolhidos de âmbito Municipal, Estadual e Federal, tendo como base o tipo da empresa, o seu faturamento, e outras informações que irão influenciar na sua tributação.

O profissional tributário que tem a responsabilidade de efetuar esse tipo de planejamento deve ter conhecimentos em Contabilidade e Fiscal, e entender do sistema tributário nacional é um diferencial importante conforme afirmam OLIVEIRA et al (2009, p. 31):

Para a correta execução das tarefas inerentes ao planejamento tributário, o contador precisa aplicar todos os seus conhecimentos sobre a legislação do tributo a ser reduzido, para que, a partir desses cenários, possa planejar com bastante antecedência a melhor alternativa para a empresa executar suas operações comerciais.

É importante saber também que planejamento tributário é diferente de sonegação fiscal, pois o planejamento tributário se resulta de escolhas feitas entre opções de caráter licito, que não vão contra a legislação tributária vigente no país. Já sonegação fiscal é utilizar uma forma ilegal para burlar o pagamento de um tributo que se é devido, ou seja, é um ato de má fé, e gera conseqüências negativas principalmente em períodos de auditorias fiscais.

O tema em estudo tem como prioridade a tributação de Lucro Real, no entanto, é importante conhecer as principais diferenças do Lucro Real para aos outras opções de tributação, o Lucro Presumido, podem fazer parte todas as empresas em que não há obrigação de tributação pelo Lucro Real. Seu Lucro é feito por presunção sendo que tecnicamente custos e despesas não são tão relevantes na tributação, e a Contribuição Social e o Imposto de Renda incidem diretamente sobre as Receitas obtidas pela empresa. Para essa opção a Receita Bruta da empresa não deverá ultrapassar o montante de R$ 48.000.000,00. O Simples Nacional é uma opção para Microempresas e Empresas de Pequeno porte cuja Receita Bruta Anual não seja superior a R$ 3.600.000,00 tem como uma das principais vantagens o Recolhimento mensal dos impostos através de um único Documento de arrecadação, conhecido como DAS.

Enquanto que o Lucro Real de acordo com OLIVEIRA et al (2009, p. 209):

Contabilmente falando, pode-se concluir que o lucro real é aquele realmente apurado pela contabilidade, com base ma completa escrituração contábil fiscal, com a escrita e rigorosa observância dos princípios fundamentais de contabilidade e demais normais fiscais e comerciais.

O lucro real é uma opção de tributação mais complexa que as outras, por isso é importante o profissional entender bem de todos os lançamentos e de como iram influenciar no lucro da empresa. Nela o lucro real o Imposto de Renda e a Contribuição Social são apurados sobre o Lucro Liquido da pessoa Jurídica, sendo que podem ser calculados trimestralmente ou anualmente, conforme a vontade do contribuinte e são calculados de forma isolada. Nessa Tributação os valores de PIS e COFINS mais do que dobram comparado ao do Lucro presumido, pois, no Lucro Presumido as alíquotas de PIS e COFINS são respectivamente 0,65% e 3,00%, já no Lucro Real as alíquotas são de 1,65% e 7,60%. Sendo que para minimizar essa diferença é permitida dedução de algumas despesas no calculo das contribuições, como por exemplo, depreciações e insumos.

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NÚCLEO DE ARQUITETURA, URBANISMO E TECNOLÓGICO – NAUT

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O DESENHO URBANO INTERVINDO NA QUALIDADE DE VIDA EM ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS

THE URBAN DESIGN INTERVENING QUALITY OF LIFE PRECARIOUS SETTLEMENTS

Claudia Barboza Camilo35

RESUMO:Com base em teóricos com especialidade em desenho urbano, voltado a qualidade dos espaços e influencia na qualidade de vida dos usuários, o presente artigo visa destacar a arquitetura e urbanismo enquanto figura organizadora do espaço, na sua habilidade de criar, recriar e aprimorar suas obras, no que diz respeito às intervenções urbanas de áreas espontaneamente ocupadas por população de baixa renda, ou seja assentamentos precários.PALAVRAS CHAVE: Assentamento precário; desenho urbano; integração urbana e qualidade de vida.

ABSTRACT:Based on specialized theorists in urban design, focusing the quality of spaces and influences on life quality of users, this article aims to highlight the architecture and urbanism while organizing figure of the space in its ability to create, recreate and improve their works , as regards to urban intervention on spontaneously occupied areas by low-income population, i.e., precarious settlements.KEYWORDS: Precarious settlements; urban design; urban integration; quality of life of residents.

INTRODUÇÃO

O desenho urbano é a busca por modos diversos de responder a demandas sociais e problemas urbanos, que através dos componentes essenciais, da leitura do lugar e da visão de integração da cidade resulta em propostas coerentes e capaz de melhorar a qualidade de vida do usuário.

Como todas as intervenções visam melhorias, quando trata-se de um projeto urbano, não é diferente, a intenção do projeto sempre visa o melhor para o espaço, e consequentemente conduzem o comportamento das pessoas que utilizam do lugar, influenciando na qualidade dos espaços de acordo com suas diretrizes.

Um local em que o desenho urbano vai se compondo sem um devido planejamento, a partir da necessidade, como é o caso dos assentamentos, raramente se atentam a ações que possam tornar o lugar de intervenção em uma área mais agradável. E isso não acontece só em áreas irregulares. O desenho urbano é uma maneira de organizar e propor soluções espaciais no que diz respeito à formação da cidade.

DESENHO URBANO

É entendido por Del Rio (1990, p.10) como “Campo disciplinar que trata a dimensão físico-ambiental da cidade, enquanto conjunto de sistemas físico-espaciais e sistemas de atividades que interagem com a população através de suas vivências, percepções e ações cotidianas.” É a proposta de um traçado que vise qualificar o local.

A cidade se expressa através de seus componentes, as formas, os espaços, as circulações e os diferenciais atraem as sensações perante um lugar, conforme pensamentos de Kevin Lynch, relatados no livro. “A imagem da cidade” (1997).

Para que o desenho resulte em perspectivas positivas, alguns elementos são 35   Discentes do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UNIFIL. Orientanda do Trabalho Final de Graduação  (e-mail: [email protected]).

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Lamas (2004) vê o desenho urbano como a forma de construção do espaço, tendo total influencia arquitetônica. E acredita que o processo para a elaboração de um desenho deve ser contínuo desde sua concepção até sua finalização.

DESENHO URBANO E SUA INTERFERÊNCIA NA QUALIDADE DE VIDA

Cada detalhe de composição do desenho urbana é um componente de ações e sensações do espaço, intervindo diretamente na qualidade de vida dos usuários, para Lamas (2004) reflete sobre a influência comportamental que o desenho urbano pode propiciar através de suas formas, ruas, fachadas, e de sua composição como um todo. Coloca a forma pode vir a solucionar situações de espaços mal utilizados, por definir através de traços o modo de utilização dos espaços.

Além do que, ao referir-se a estética dos espaços, Lamas (2004) explana que o desenho urbano não precisa ser apenas funcional, para que ele seja completo e coerente é necessário ser levado em consideração à beleza, que contribui para um ambiente mais estimulante. E relata que arquitetos urbanistas devam sempre propor intervenções que visem boa qualidade da paisagem, inserindo esta visão como um direito de todos.

Com a grande repercussão de programas políticos voltados a habitação e que visam atender a população de baixa renda, algumas construtoras iniciaram a produção em massa de Empreendimento Habitacional de Interesse Social (EHIS), dando a maior atenção para a quantidade de casas produzidas e deixando um pouco de lado a qualidade dos espaços a serem produzidos.

É o caso do Residencial Vista Bela em Londrina, considerado o maior EHIS do PMCMV, conforme publicação da Folha de São Paulo (SANTIN, 2012), que comporta aproximadamente 10.000 pessoas e que inicialmente foi projetado sem equipamentos necessários para o atendimento da demanda gerada. O projeto inicial não contava com áreas projetadas para convívio e interação, e mesmo as vias não possuindo perfis estreitos, a predominância de casas geminadas seguindo uma mesma tipologia, assim como nos conceitos de Lamas (2004), o local perde sua dinâmica, influenciando diretamente na qualidade do espaço. Conforme imagem a seguir.

Figura 2 - Casas do Residencial Vista Bela, Londrina.

Fonte: LEÃO, 2014.

primordiais para a composição da forma da cidade. Gouvêa (2008) ressalta a influencia do relevo e do solo, destacando as ocupações ocorridas em terrenos e alta declividade como é o caso de favelas alocadas em morros. Cita a hidrografia e o clima, evidenciando os casos de desenho urbano-arquitetônico apropriados de acordo com cada região, como acontecia nas “cidades árabes próximas ao mar Mediterrâneo, com seu complexo sistema de labirintos largos e casas pátio”, e os aspectos legais que configuram a cidade através de normas e legislações pertinentes a cada cidade e a cada cultura.

Enquanto Lamas no livro “Morfologia Urbana e Desenho da Cidade” (2004) apresenta o solo, o edifício, o lote, o quarteirão, a fachada, o logradouro36, os traçados das vias, a praça, o monumento, a vegetação, o mobiliário urbano como principais elementos ara a composição de um espaço urbano bem elaborado.

Gouvêa (2008) também além de descrever elementos de composição para o desenho urbano menciona conceitos urbanos necessários para que o desenho de qualquer área que abrigue espaço e pessoas seja bem elaborado. Destacando a função social do espaço garantindo o equilíbrio ambiental. Como “Solidária e flexível”, descreve uma postura que não delimite segregações espaciais. Buscar uma dinâmica de fluxos utilizando elementos projetuais ou naturais resultando em uma “Orientabilidade”. Prever uma hierarquia de forma a criar uma “Centralidade”. Destaca a “Diversidade” que deve ser elaborada para se evitar corredores monótonos e sem vida. Estabelecer hierarquias viárias e sistemas de espaços livres a fim de promover o convívio e a dinâmica dos espaços, utilizando de praças para áreas de lazer. E por fim desenvolver um traçado completo com as necessidades mencionadas a fim de estabelecer espaços harmônicos e de boa qualidade. Não podendo deixar de ser mencionada a necessidade de infraestrutura.

Gouvêa (2008) critica o fato de muitas vezes o ser humano se adaptar as condicionantes existentes dos espaços, em especial, uma vez que os avanços tem resultado em, cada vez mais, recursos e habilidades para a transformação dos espaços de forma bem-sucedida.

Ao focar na imagem do lugar, Lynch (1997) destaca a importância da diversidade das vias, e assim como Gouvêa (2008) e Lamas (2004), mencionam a questão dos usos hierarquias e jogos com materiais que induzam a uma melhor relação entre o usuário e o espaço.

Lamas (2004) também menciona alguns aspectos que contribuem para a organização dos espaços, como é o caso dos aspectos quantitativos que controlam a aparência da cidade, através de “densidades, superfícies, fluxos, coeficientes volumétricos, dimensões de perfis, etc.” (Lamas, 2004, p.44). Os aspectos de organização funcional tendo em vista os usos estabelecidos (comercial, residencial, etc.). Insere a questão da qualidade do espaço, criado para o usuário, também ressaltando assim como Lynch (1997) e Gouvêa (2008), a importância dos materiais escolhidos para a composição da arquitetura urbana, bem como acessibilidade e soluções climáticas. E por fim, menciona o aspecto figurativo relacionado à estética do lugar.

Ao falar das escalas existentes para o desenho urbano Lamas (2004) argumenta que quando se trata de uma proposta que abrange a escala do bairro, existe a necessidade de uma composição que estruture vias, praças, sua totalidade, tratando-se da escala em que se inicia a composição da cidade.

36   Logradouro: “constitui o espaço privativo do lote não ocupado por construção, as traseiras, o espaço privado, separado do espaço público pelos contínuos edificados”. (Lamas, 2004, p. 98).

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Lyon, Perth, Copenhagen – o grande exemplo de requalificação do espaço através do projeto urbano, entre outros. Em entrevista ao jornal Tages Wocke, Gehl (2015) ressalta que: “o comportamento das pessoas depende do que você as convida a fazer”, tendo em vista que todos os projetos urbanos influenciam no comportamento das pessoas, para que o resultado seja positivo, é necessário que o foco do projeto seja os usuários do espaço a ser planejado.

Em entrevista ao CAU, Ohtake ressalta que o arquiteto é capaz de fazer um projeto de grande qualidade independente dos recursos fornecidos, e que a integração dos espaços urbanos tende a melhorar a qualidade de vida da população, ainda diz que: “A arquitetura e o urbanismo podem contribuir para uma cidade mais igualitária”.

Ruy Ohtake (2012) menciona a necessidade de atenção para os empreendimentos que visem atender uma população de baixa renda, classificado como faixa 1 (Lei 10.850/2009) que correspondem a famílias com renda inferior a três salários mínimos. Ele é responsável pelo conjunto de prédios elaborados para a comunidade de Heliópolis, São Paulo, projeto este que proporcionou um bem estar muito significativo na vida dos moradores. Para Ruy “acreditar em uma comunidade como Heliópolis é acreditar no Brasil”.

Figura 5 - Intervenção Heliópolis por Ruy Ohtake.

Fonte: COHAB SP, 2015.

Figura 6 - Intervenção Heliópolis por Mario Biselli.

Uma vez que a imagem do lugar influencia no estilo de vida dos moradores, ao se comparar dois bairros com visões diferentes, fica nítido quando um projeto se preocupa em trazer melhoria de qualidade aos espaços criados como demonstram as imagens comparativas na Figura 3.Figura 3 - Imagens comparativas Res. Vista Bela (PR) x Cidade da Pedra Branca (SC).

Fonte: ANIZELLI e CIDADE PEDRA BRANCA/Adaptado pela Autora.

Contrapondo esta situação, a qual parte do mercado mobiliário visa garantir números, alguns bairros planejados são produzidos. Como o exemplo da cidade de Pedra Branca, no município de Palhoça - Santa Catarina, inspirada no livro “Cidade para as pessoas” (Cities for people) de Jan Gehl, como relatado pelo Gerente de Negócios de Pedra Branca – Renato Ramos da Silva Neto, em entrevista ao programa Festas e Eventos TV, Rede Band (NETO, 2014).

Além de ruas e calçadas darem preferência a pedestres e ciclistas, o projeto do bairro buscou alocar áreas de comercio, serviço e educação próximos melhorando a integração e estimulando o uso dos espaços livres que se encontram no meio do caminho. O bairro também utiliza de câmeras de segurança para a maior comodidade dos moradores. Somando-se assim, as condicionantes que tornam um local qualificado e bem urbanizado.Figura 4 - Vias da Cidade da Pedra Branca (SC).

Fonte: CIDADE PEDRA BRANCA/Adaptado pela Autora.

Cabe destacar a visão de Jan Gehl sobre a necessidade das cidades serem produzidas para pessoas, como refletem suas experiências bem sucedidas em Melbourne, Estocolmo,

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atualmente serve de exemplos para intervenções em áreas invadidas a nível mundial.Este programa buscava intervir na qualidade das comunidades, proporcionando aos

moradores o direito de posse legal das suas casas, a instalação da infraestrutura necessária, a composição de espaços que permitissem áreas de uso comum, bem como a integração com o restante da cidade.

Figura 7 - Morro do Alemão, RJ (Antes e depois).

Fonte: BRANDÃO, 2012.

Além do que, como afirma Vicente Del Rio (2013), o favela-bairro cumpriu seus objetivos, melhorou a qualidade de vida dos moradores, através das novas condições sanitárias implantadas, melhores condições de acesso a moradias, as novas formas, os espaços de convívio e a nova estética vinculada as ações arquitetônicas.

Algumas consequências que repercutiram negativamente sobre as diretrizes projetuais do programa Favela-Bairro, aconteceram em decorrência do aumento da qualidade de vida resultante para o local. A implantação de novos condomínios na área atraíram olhares de empresários e da alta sociedade, valorizando o preço da terra e do aluguel, e que de forma indireta, os moradores carentes da área acabam sendo prejudicados e reprimidos por esta alteração de valores. O que era para ser uma benfeitoria ao povo, em parte, acabou sendo um investimento empresarial. Todavia, estes acontecidos servem de experiência para se abordar a problemática dos assentamentos ao condiciona-los como alternativa habitacional.

Um dos grandes referenciais na categoria de intervenção em favelas é o arquiteto urbanista Jorge Mario Jauregui, tendo em vista sua gama de projetos e ações que contribuíram para a melhoria de qualidade de vida de habitantes de áreas precárias.

Para Jauregui (2012), ao se interferir em uma área já ocupada, o ideal não é buscar respostas pontuais para cada problemática, mas sim, analisa-la como um todo para se atingir uma solução completa. Para isto ele utiliza de sua metodologia própria para alcançar os objetivos desejados.

Primeiramente, para propor soluções a áreas já habitadas é preciso criar uma tática de leitura do lugar, que seja composta por todas as condicionantes predominantes do local (ambientais, sociais, culturais e econômicos). Jauregui busca fazer esta análise através de um esquema de leitura da estrutura do lugar, setorizando e traçando as condicionantes existentes, conforme croqui abaixo. Figura 8 - Esquema de Leitura da estrutura do Lugar, por Jorge Jauregui.

Fonte: KON, 2014.

A qualidade de vida de uma população depende de suas condições de existência, do seu acesso a certos bens e serviços econômicos e sociais: emprego e renda, educação básica, alimentação adequada, acesso a bons serviços de saúde, saneamento básico, habitação, transporte de boa qualidade etc.

Contudo, as intervenções devem ser promovidas através da realidade de cada local, porém sempre com o objetivo de recuperar o espaço com traçados urbanos que otimizem as condições de vida dos moradores, no que estiver no alcance dos arquitetos, pois um projeto urbano é capaz de aumentar a segurança e melhorar a qualidade de vida dos morados.

DESENHO URBANO PARA FAVELAS

A arquitetura e o urbanismo presentes nos assentamentos irregulares provem da necessidade de abrigo e conquista por um espaço criado através dos recursos existentes. E cabe ao arquiteto urbanista através da situação encontrada nestes locais intervir com todo seu conhecimento em favor de garantir um espaço apropriado para a vida destes habitantes.

Trata-se de uma área onde a arquitetura contribui com a organização das cidades nos pontos mais crítico, cujos beneficiados com a implantação do projeto são as famílias de baixa renda estas com pouco acesso a um espaço de qualidade e moradias dignas, que acabam ficando em segundo plano para os profissionais ligados a construção civil.

A complexidade de levantamento dos fatos existentes no local de intervenção, de análises espaciais, bem como, em propor de maneira viável um desenho urbano para uma área já habitada e que já possuem suas características predominantes, leva o arquiteto a estudar e redesenhar a forma afim valorizar a estrutura existente.

Quando se trata de desenho urbano destinado a favelas brasileiras, um dos maiores exemplos é o programa favela-bairro (DEL RIO, 2013), ao qual propusera projetos destinados a urbanização das favelas do Rio de Janeiro, com auxilio da prefeitura, e que

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Figura 9 - Favela Fubá-Campinho.

Fonte: INTERMEDIATELANDSCAPE, 2011.

Outro exemplo de arquitetura e urbanismo que pode fazer a diferença em assentamentos é a Favela Nova Jaguaré, em São Paulo (SP), elaborado pelo escritório Boldarini Arquitetura e Urbanismo, cujas propostas focaram nas questões ambientais devido aos riscos que a área apresentava.

Figura 10 - Imagens favela Nova Jaguaré (SP).

Fonte: DUCCI, 2014/Adaptado pela autora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como apresentado em exemplos bem-sucedidos em intervenção em áreas ocupadas, é possível chegar a resultados de articulação entre a cidade formal e a cidade informal, apresentando assim resultados positivos para a qualidade de vida dos moradores, através de um projeto urbanístico bem estruturado.

Contudo, pode-se verificar que para que um desenho urbano em assentamentos precários atinja seus objetivos, também é necessário que ele utilize de elementos composição básicos para projeções de espaços qualitativos.

Portanto, conclui-se que a arquitetura capaz de modificar a cidade, é aquela que consegue criar a integração entre as partes formais e informais da cidade, proporcionando infraestrutura básica, áreas seguras e espaços qualitativos.

REFERÊNCIAS

Fonte: JAUREGUI, 2012, p. 90.

Para gerar a síntese de problemáticas é necessário organizar todas as informações, tendo traçado os planos de intervenção, Jauregui parte para o partido, delimitando e questionando os problemas existentes. No livro “Estrategias de Articulación Urbana” Jorge destaca as fases que antecedem a etapa final de desenvolvimento de projeto, sendo elas:

• Reconhecimento do local;• Consultas no local;• “Ouvir” a população;• Interpretação do processo de configuração;• Identificação das centralidades;• Análises especificas;• Diagramas de leitura da estrutura do lugar;• Consideração de aspectos referentes a engenharia;• Elaboração de croqui de investigação; e• Formulação do esquema urbano integrado aos aspectos físico-ambientais,

infraestrutura, socioeconômicos e culturais.Um exemplo de intervenção de Jorge Jauregui é a favela Fubá-Campinho que

buscou reforçar a área de convívio com praça, área de esportes e área para edificações.

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