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Um compromisso congregacional

Instituto de Pastoral de JuventudeCanoas - RS

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Conselho Editorial:

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Conselho editorial- Instituto de Pastoral de Juventude do RS- Trilha Cidadã - Casa da Juventude do Paraná- Pastoral Juvenil Marista- Irmãs da Divina Providência- Fraternidade Apostólica da Boa Nova

Jornalista responsávelJoana Paloschi MTB 11119

proJeto GráfiCoGas Propaganda

revisãoProfa. Ir. Margaret Godoy, fabn

impressãoGráfica Odisséia

Contatos e assinaturas www.ipjrs.org.br [email protected] Rua Alegrete, 400 B. Niterói Canoas – RS CEP 92120-170 Fone: (51) 3428-4993

Redemoinho é uma publicação do Instituto de Pastoral de Juventude do RS. É destinada a: educadores/as, assessores/as de jovens, lideranças juvenis e pessoas interessadas em juventu-de. Aceita colaborações que lhe forem enviadas, reservando-se o direito de publicá-las ou não, deixando aos autores a responsabilidade pelo conteúdo.

eXpediente

Foi através do IPJ-Leste II que a Revista Redemoinho chegou pela primeira vez às mi-nhas mãos. E chegou mesmo num momento apropriado, quando eu me sentia desafiada no trabalho com a juventude. Sabia que eu precisava de algum instrumento dinâmico, atualizado, que me fizesse chegar mais perto do mundo e da linguagem jovem destes nos-sos tempos. Posso afirmar que a leitura de todos os números da Revista, que assino há 4 anos, tem me posto no dinamismo que eu precisava para pensar e atuar com a juventu-de hoje. Tenho em minhas mãos o número de setembro 2009 e recomendaria a todos a leitura proveitosa de seus artigos, iluminan-do nossa busca de pistas para colaborar com jovens na compreensão da necessidade e na elaboração de um bom Projeto de Vida. Pa-rabéns IPJ do RS e toda a equipe que faz acontecer este belo REDEMOINHO!

DO LEITOR

Ir.Rosinha, RSCM/BH.

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CAPA6

DESTAQUES

36AssessoriaAcompanhamento, Juventude e Economia

06 | Economia de Comunhão Editorial

06 | Economia Solidária Daniel Baioto

12 | Uma economia para a vida tem que ser solidária Elvino Bohn Gass

18 | Economia e vida: reflexões Fabiane Asquidamini

22 | Economia e comunhão: Sonetos sobre a sacralidade da vida aos educadores e educadoras de jovens Maicon André Malacarne

25 | Corpos juvenis fluidos: coisificação e fetichização em tempos Pós-modernos Antonio Carlos Frutuoso

Falar sobre Economia Solidária é falar de orga-nização de pessoas com os mesmos objetivos econômicos e a disposição de trabalhar de forma conjunta. Esta é a definição que o mestre em Ciências Sociais, Daniel Baioto, nos apresenta na entrevista desta edição, que tem como tema “Economia de Comunhão”. Ele ainda nos explica qual a função da economia solidária e nos apre-senta alguns caminhos, inclusive no meio juvenil.

30Políticas PúblicasAção solidária Madre Cristina

29 | Ação Solidária Madre Cristina Érico José Hickmann e Letícia Tietböhl Melo

34 | Economia Popular Solidária: a possibilidade de desmonte de um sistema que mata Ir. Margaret R. Godoy, fabn

34 | Acompanhamento, juventude e economia: cinco pães e dois peixes sempre fazem a diferença Pe. Edson André da Cunha Thomassim, fabn

42 | Centro Marista de Juventude de Colatina Ir. Carlos Henrique da Silva, FMS

45 | Experiência que gera vidas Adriano Lúcio de Almeida

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Após um período de pau-sas para planejamento e fé-rias, a Redemoinho está de volta. Acompanhando o tema da Campanha da Fraternida-de Ecumênica de 2010 que é “Economia e Vida”, trazemos nesta edição reflexões tendo como pano de fundo o foco da “Economia e Comunhão”. Queremos contribuir no traça-do de caminhos para a cons-trução do modelo econômico justo e solidário para e com a juventude, no qual prevaleça a partilha e que tenha a pessoa humana em seu centro.

Nosso entrevistado é o mestre em Ciências Sociais, Daniel Baioto, que explica o que é e qual a função da eco-nomia solidária. Além disso,

ele aponta caminhos para que a juventude preserve os valo-res do cooperativismo e os de-safios de viver a economia da partilha.

No mesmo pensamento, o deputado gaúcho Elvino Bohn Gass destaca em seu artigo que “uma economia para a vida tem que ser solidária” e lembra da necessidade de se produzir para viver, não para acumular. O parlamentar tam-bém nos traz um histórico da Economia Popular Solidária e como esta se organiza hoje, inclusive quais políticas públi-cas existem nesta área.

A assistente social Fabia-ne Asquidamini inicia o seu texto com questionamentos provocatórios: O que é mais

importante para a vida? O que é primordial na defesa da vida? Como caminhos para respostas, ela faz uma citação do evangelista Mateus (25, 31-46), no qual destaca que a centralidade é a garantia das necessidades básicas dos pequenos, daqueles que não podem pagar. Neste contexto, ela lembra Pedro Casaldáliga que diz que “é primordial a construção de um outro mun-do possivel”, de um mundo só, o que vai ao encontro da pro-posta da Campanha da Frater-nidade Ecumênica de 2010.

No texto “Economia e Co-munhão: Sonetos sobre a sa-cralidade da vida“ aos educa-dores e educadoras de jovens”, o estudante de Teologia, Mai-

Economia de comunhão

EDITORIAL

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7con André Malacarne, questio-na como propor uma mudança de relações nas quais Deus e o dinheiro não estejam no mes-mo nível. Além disso, ele nos recorda princípios da peda-gogia do amor, da comunhão e da sustentabilidade como nova proposta pedagógica. Leia o texto e descubra o que Malarcarne quer nos dizer com o “tempo do re”.

Em “Corpos juvenis fluidos - Cosificação e fetichização em tempos Pós-modernos” o assessor da Casa da Juventude do Paraná, Antonio Frutuoso, traz em pauta a sexualidade e a afetividade da juventude que inicia cada vez mais cedo. Diante disso ele nos leva a uma reflexão dos porquês.

A seção “Políticas Pú-blicas” traz a experiência da Ação Solidária Madre Cristina com a iniciativa da campanha da coleta de óleo de cozinha que acontece em Porto Alegre

e em Santa Cruz do Sul, tendo como elemento básico a soli-dariedade.

O Pe. Edson Thomassim (Pe. Edinho) nos fala sobre o instigante desafio do acompa-nhamento a grupos juvenis de economia solidária, a partir da passagem bíblica da “multipli-cação dos pães”, atualizando-a e construindo caminhos para noções e práticas de partilha no rumo da solidariedade e da comunhão.

A Profa. Ir. Margaret Godoy, em sua crônica “Economia Po-pular Solidária: a possibilidade de desmonte de um sistema que mata”, fala da pós-modernida-de. Num primeiro momento ela nos releva a visão do ficcionis-ta, poeta e ensaísta paranaense, Jair Ferreira dos Santos, que a apresenta como algo plural, sem unidade, e depois, inserida num processo de globalização, como algo que separa, que evidencia as diferenças. Neste contexto

e na contramão, surge a Eco-nomia Popular Solidária que coloca o ser humano como sujeito.

Nesta edição, na seção “Ponto de Cultura” trazemos a experiência dos grupos de produção e resistência da PJR em Goiás, Tocantins e Bahia. E, em “Centros e Institutos”, partilhamos a caminhada do Centro Marista de Juventude de Colatina (ES), que em 2010, completa 15 anos de trabalho com a juventude. São iniciati-vas em favor da vida.

Na vivência de uma eco-nomia de comunhão a serviço da vida, para a construção de uma cultura de solidariedade e de paz e no desejo de mu-danças, partilhamos com você amigo/a leitor/a estes textos. Demo-nos as mãos na constru-ção deste novo mundo possível.

Boa leitura!Equipe Editorial

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REDEMOINHO: O que é Eco-nomia Solidária?

DANIEL: Por Economia Soli-dária (ES) entendem-se as or-ganizações de pessoas com os mesmos objetivos econômicos e como disposição de trabalhar de forma conjunta. Entende-se como prerrogativa de trabalho o sentido de autogestão (onde todos decidem coletivamente os rumos do empreendimen-to), a democracia e a solida-riedade. A base representativa, quando tem, é de cooperativas ou associações, mas também pode não haver nenhuma for-ma jurídica. Exemplo: grupo de costureiras, artesanato, do-ceiras, catadores de lixo orga-nizados coletivamente em um centro de triagem. Parece fácil, mas faço a seguinte compara-ção: se em uma associação de pessoas organizadas em fa-mília já surgem divergências, imagine-se em um grupo de pessoas diferentes, com traje-tórias de vida diversas e per-cepções de trabalho distintas. A proposta de trabalho cole-tivo é um grande desafio. Por outro lado, o que se tem iden-

Um outro mundo possível

tificado, pelos dados de pes-quisas do governo ou de uni-versidades, é que esta forma de organização tem crescido muito no mundo todo, prin-cipalmente nos países em de-senvolvimento. Esta forma de organização tem representado uma alternativa à crise do que definimos dos mitos da socie-dade do emprego e do salário, sendo substituída pela socie-dade do trabalho e da geração de renda. Parece semelhante, mas não é, pois uma coisa é ser empregado de carteira as-sinada que pode a qualquer momento ser desempregado, outra coisa é organização para o trabalho. Entende-se que o emprego está em baixa, mas o trabalho continua crescendo. A principal forma de orga-nização de empreendimento solidário é a organização co-operativa e neste caso temos experiências que demonstram a força deste tipo de organiza-ção de pessoas. Como exem-plo conhecido temos o Sicredi (cooperativa de crédito), Uni-med (cooperativa de médicos), Univens (cooperativas de cos-tureiras que esporta para Eu-

ropa), Uniodonto (cooperativa de dentistas), Vinícola Auro-ra (cooperativa de produtores uvas e vinhos) destaque tam-bém para as organizações de agricultura familiar. São mui-tos e representam aproxima-damente 30% dos postos de trabalho RS. REDEMOINHO: O Empreen-dimento Econômico Solidá-rio (EES) tem função social e econômica. Como se dá esta diferenciação?

DANIEL: Realmente a propos-ta cooperativa é representada por uma dupla função aos as-sociados. Ao mesmo tempo de uma instância social de quali-dade de vida, tende também a ser um espaço democrático e solidário, além de econômico pois é uma forma de geração de trabalho e renda. Assim, o que vai delimitar a prática da ação social junto à coopera-tiva é a forma como os coo-perados percebem ou tem por representação essa prática. Em outras palavras, vai depender de como estes sujeitos se en-tendem em sociedade, quais

Economia Solidária

ENTREVISTA

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Um outro mundo possível daniel baioto*

os sentidos que construíram em suas trajetórias de vida a respeito do que vem a ser res-ponsabilidade social. Por ou-tro lado, o fator econômico também passa por sentidos de representação, por exemplo: como é trabalhado com o coo-perado o sentido de gestão co-operativa, gestão democrática, compartilhada, planejamento estratégico de impacto sócio-econômico, questões como gestão dos resíduos da produ-ção, inter-cooperação sentidos de eficiência e eficácia e tantas outras questões relacionadas a uma gestão cooperativa de um empreendimento que se pro-põe a ser cooperativa. Nesta instância é que entra a educa-ção cooperativa solidária como ferramenta para trabalhar sen-tidos de representação e prá-tica junto ao corpo social do empreendimento. Estas formas de representação referentes ao sentido de ser cooperativo, de aliar teoria e prática, podem não estar na cultura do tra-balhador que entra em uma cooperativa, mas o ambiente

cooperativo deve proporcionar aos seus membros espaços que potencializem estas represen-tações.

REDEMOINHO: No campo educacional, que caminhos podem ser apontados para os jovens brasileiros para a manutenção dos valores e princípios orientadores do cooperativismo, com base na solidariedade?

DANIEL: Acredito que a de-nominada educação formal, direcionada ao emprego e ao vestibular já está saturada, ou seja, não responde mais às necessidades da sociedade contemporânea. Sendo assim abre-se espaço para novas for-mas de pensar uma educação que se proponha a ser cidadã. As possibilidades de se traba-lhar educação cooperativa e solidária junto a jovens, ne-cessitam ser pensadas e traba-lhadas antes na formação dos professores. A possibilidade de contemplar questões relacionadas a práti-

cas de vida em sociedade mais saudáveis e sustentáveis, vol-tadas para a proposta de coo-peração e solidariedade vai de encontro à proposta conteu-dista das salas de aula lotadas, de escolas violentas e do isola-mento da escola do local onde está inserida.

Encontram-se várias expe-riências de escolas em que o convívio com a sociedade local tem demonstrado resultados positivos na redução da vio-lência escolar e na comunida-de, experiências de professores que transformam seus conteú-dos em momentos lúdicos de

A principal forma de organização de empre-endimento solidário é a organização coope-rativa e neste caso te-mos experiências que demonstram a força deste tipo de organi-

zação de pessoas.

* Mestre em Ciências Sociais

Economia Solidária

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10 pensar intervenção no meio e na vida dos alunos e famílias. Mas estas iniciativas são iso-ladas e vão alem da formação acadêmica. Acredito que for-mação cooperativa e solidária para poder gerar efeitos con-sistentes os jovens passa por repensar este tipo de formação nos bancos acadêmicos, e o repensar de forma urgente o que se entende por escola.

REDEMOINHO: De que ma-neira os instrumentos de comunicação podem servir pedagogicamente para a divulgar uma educação coo-perativa solidária?

DANIEL: Existem vários instru-mentos de comunicação, tanto na programação da TV (aberta ou fechada), como em revistas das mais diversas áreas, além de programas e artigos que trabalham questões de forma criativa, sobre desenvolvimen-to local a partir da cooperação e solidariedade. São vários os exemplos da movimentação e do interesse de profissionais da comunicação sobre este temas, mas estes continuam distantes do cotidiano da vida escolar, como forma de me-diação pedagógica. A revista Escola de setembro ou outu-bro traz na capa algumas pis-tas para compreender o por quê deste distanciamento. Se-gundo a revista, que traz uma pesquisa apontando pontos críticos na formação acadêmi-ca dos professores, há lacunas na compreensão de “o que” e de “como” ensinar, o que limi-ta a efetividade da ação deste

profissional no campo de tra-balho. Ainda segundo a revista há um distanciamento da prá-tica acadêmica e a realidade escolar. Sendo assim mesmo que os meios de comunica-ção, desenvolvam programas relacionados à solidariedade e a cooperação, os canais para efetivar esta mediação pas-sam primeiro pela formação do professor, pelos projetos educacionais das secretarias de educação, para depois poder alcançar a escola, a sala de aula e o cotidiano do jovem. Acre-dito que há um desperdício das potencialidades do meio escolar para se efetivar uma educação cooperativa e solidá-ria adequada às necessidades da sociedade contemporânea.

REDEMOINHO: Quais os principais desafios da orga-nização de empreendimentos solidários?

DANIEL: Avalio que o prin-cipal desafio dos empreen-dimentos que se propõem a ser solidários, cooperativas ou associação ou organização informal, é permanecer fiel à proposta da ação, manter-se fiel aos princípios e valores fa-lados anteriormente que cer-cam esta idéia. O problema é que muitos empreendimentos são de fachada de cooperati-va ou associação, mas atuam com um dono que manda e tem os lucros, além de sócios que dividem as sobras dos cus-tos e decidem coletivamente e empregados. Tudo isso em vez de sócios autônomos que tra-balham coletivamente. Infeliz-

mente isto ocorre muito em cooperativas de serviços como vigilantes, pedreiros, diaristas e transporte ou grandes em-presas que demitem os fun-cionários e estimulam a criar uma cooperativa que presta serviço à mesma empresa, só que sem vinculo empregatício. São estes desvios de proposta que tem manchado a iniciati-va cooperativa associativa. No entanto tem surgido muito apoio do governo e organi-zações não governamentais (ONGs) que têm apoiado em especial as pequenas inicia-tivas de trabalhadores com consultoria, formação, apoios financeiros o que se denomi-nam tecnologias sociais. Como exemplo disso, encontramos o Mapeamento da Economia Solidária estruturado pela Se-cretaria de Economia Solidária em parceria com as universida-des de todo Brasil que traba-lham com Incubadoras Sociais, para desenvolver pesquisas sobre como estão e quais as necessidades deste setor. Com estas iniciativas, estas formas de organização têm crescido e demonstrado que outra eco-nomia é possível além do mer-cado, e que se o emprego está terminando no mercado for-mal, por outro lado as possi-bilidades humanas de se orga-nizar coletivamente em favor de encontrar soluções para os problemas de geração de tra-balho e renda têm crescido. Os desafios da economia solidária são muitos, mas as possibilida-des também são grandes.

ENTREVISTA

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11REDEMOINHO: Qual a ação possível para a sociedade em geral, isto é, consumidores que não fazem parte deste tipo de iniciativa podem colaborar para o crescimento da ES?

DANIEL: A proposta de ES é o desenvolvimento local sus-tentável, ou seja, apoiar o de-senvolvimento do local onde as pessoas vivem, propondo a circulação do capital na co-munidade ou cidade. Se pen-sarmos que o desenvolvimento do capitalismo se dá a partir de como direcionamos o ca-pital, em outras palavras das escolhas que fazemos de onde vamos comprar e a quem va-mos presentear com nosso dinheiro, podemos comprar e gerar mais renda, de uma empresa ou um mercado, que muitas vezes é um multinacio-nal, a partir da qual o dinheiro vai para outro país, ou uma empresa privada que acumula o lucro das vendas e negócios

em um pequeno grupo de do-nos, proprietários. Ou podemos escolher comprar produtos de empreendimen-tos solidários gerando renda e trabalho pra mais pessoas da mesma comunidade em que moramos ou estado.

A esta ação chamamos de comércio justo, ou consumo consciente (que tem um viés ecológico mas também é so-cial).

Como exemplo podemos pen-sar o seguinte: destinar o lixo produzido no nosso trabalho, casa, escola.... pra um grupo de catadores organizados co-letivamente mais próximo, ou podemos escolher comprar pão, ou biscoitos de um gru-po de doceiras do bairro ge-rando renda para pessoas da comunidade, também pode-mos sugerir que os uniformes de nossa escola sejam com-prados de uma cooperativa de costureiras, ou no mercado dar preferência para produtos que são de cooperativas. Outra ma-neira é cuidarmos a procedência dos produtos que compramos, se são feitos de material reci-clável, ou de agricultores (caso de geléias biscoitos...); comprar mais produtos de artesanatos etc. Parecem pequenas ações, mas geram um grande resultado na sociedade, mudando a nossa forma de pensar. Assim, é pos-sível dizer que o como consumi-mos pode gerar mais desenvolvi-mento na nossa comunidade.

“Se pensarmos que o desenvolvimento do capitalismo se dá a

partir de como dire-cionamos o capital,

em outras palavras das escolhas que fazemos de onde vamos com-prar e a quem vamos presentear com nosso

dinheiro”

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Produzir para viver. Esta é a grande razão do ato de trabalhar, de inteirar-se com a natureza para dela extrair o sustento da vida. Por isso só consigo entender a Economia como uma organização da so-ciedade que garanta sua so-brevivência e de suas gerações futuras.

A complexidade das orga-nizações sociais tornou difí-cil o auto-sustento, exigindo também uma organização econômica complexa. Trocar, comercializar, mercar, se tor-nou necessário para produzir e distribuir em quantidade. Po-rém, o que deveria alimentar a vida, passou a ser comandado pela acumulação de riquezas. No capitalismo, a economia não está subordinada à vida, é a vida quem está subordinada ao mercado, ao produtivismo, à ganância e ao consumismo.

Para o capitalismo, a vida não é o centro da organização social e econômica, tampouco a natureza o é. A lógica des-te sistema é produzir sempre mais, seja o que for – comida ou veneno, moradia ou armas – desde que gerem lucros para serem acumulados por poucos. Essa lógica concentrou rique-

za e pobreza, ostentação e miséria humana. Claro, trouxe avanços tecnológicos e facili-dades para a vida, mas não ad-mitiu erradicar a fome, mesmo gerando condições materiais técnicos para isso.

Depois de séculos de con-sumo desenfreado dos recursos naturais e geração interminá-vel de lixo, não é mais possível esconder a insustentabilidade – ambiental, social, cultural, econômica – do sistema domi-nante. E se os países não en-tram em acordo para reduzir a poluição, é porque esta é a mais profunda contradição do capital, pelo menos no sentido de não poder superá-la ou ab-sorvê-la nas condições atuais.

A Economia Popular Soli-dária (EPS) é o reencontro da economia, do produzir e dis-tribuir, com a vida. É a prática de milhões de pessoas mundo afora, que fazem da coopera-ção e da solidariedade mais do que um meio para satisfazer suas necessidades de renda e consumo. É uma proposta concreta, política, teórica e cultural de contraposição às explorações do capitalismo.

A prática, discussão e difu-são da EPS chamam a atenção

principalmente da juventude, pois ajudam a construir um imaginário e formas organiza-tivas que conduzem ao reen-contro com valores como paz e comunhão entre criaturas e ambiente. Isto é o que temos observado desde as Comu-nidades de Base das Igrejas, as organizações de catadores e recicladores, as cozinhas e creches comunitárias, as asso-ciações e cooperativas de agri-cultores familiares até coope-rativas de consumo e empresas autogestionárias.

Autogestão, um modo cristão de fazer

A característica mais desta-cada da EPS é a autogestão. Isso significa que é um traba-lho no qual não há mais pa-trões e empregados. Os meios de produção (equipamentos, instalações) pertencem a todos os que trabalham. A adminis-tração é feita coletivamente, de forma democrática, e os resultados são compartilhados entre todos. Para tomar deci-sões, cada cabeça é um voto. Para que a autogestão acon-teça de fato, é preciso que alguns valores cristãos sejam

Uma Economia para Vida tem que ser Solidária

ARTIGO 1

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garantidos a todos os traba-lhadores associados, como a igualdade e a solidariedade.

Igualdade

A EPS exerce a igualdade na prática. É um jeito diferente de produzir, vender, comprar e trocar o que é preciso para viver. Sem explorar ninguém e sem destruir o ambiente. A EPS é realizada a partir de uma prática de cooperação, fortalecendo o grupo, sem pa-trão nem empregado, cada um pensando no bem de todos e no seu próprio bem através do associativismo e da solidarie-dade. Tem como grande virtu-de o fato de ser uma atividade que enfrenta a exclusão social do trabalho precário (sem di-reitos sociais) e estar sustenta-da em formas coletivas, justas e solidárias de geração de tra-balho e renda.

Solidariedade

O nome já diz: a economia que se produz nesta atividade é solidária. E esta solidarie-

dade é coletiva; portanto, só se realiza numa relação entre iguais cuja dimensão pode ser medida pela justa distribuição dos resultados alcançados; pelas oportunidades que le-vam ao desenvolvimento de capacidades e da melhoria das condições de vida dos partici-pantes; pelas relações que se estabelecem com a comunida-de local; pelas relações com os movimentos sociais e popula-res de caráter emancipatório.

Uma idéia que nasce dos oprimidos

A EPS existe desde o sé-culo XIX, quando surgiram as primeiras cooperativas de trabalhadores na Europa. Ela surge da organização dos tra-balhadores que sofrem com o desemprego e a miséria vi-gentes. As práticas de EPS retornam na década de 1990, na América Latina, em função do aumento do desemprego a partir das reformas neoliberais, que foram responsáveis pela quebra de milhares de micro e pequenas empresas. Muitos

trabalhadores organizaram a resistência, criando Empreen-dimentos Econômicos Solidá-rios. Hoje, existem mais de 1 milhão e 700 mil pessoas que vivem da EPS, organizadas em mais de 20 mil empreendi-mentos em todo o país.

Como está organizada no Brasil

O setor organiza-se através

de Fóruns, que são espaços de mobilização, articulação e or-ganização dos empreendimen-tos e entidades que a apoiam. Os fóruns se organizam nas esferas locais, estaduais e na-cional. O Fórum Brasileiro de Economia Solidária – FBES, criado em 2003, é o espaço nacional de organização polí-tica dos trabalhadores e mili-tantes da EPS.

Em todos os fóruns é ga-rantida a representação dos diferentes atores que fazem o setor. São trabalhadores que atuam em espaços públicos e privados:

• Empreendimentos Eco-nômicos Solidários EES (co-

Uma Economia para Vida tem que ser Solidária elvino bohn gass*

*deputado estadual do rio grande do sul - autor do projeto de lei 393/03, que institui a política estadual de Fomento à economia popular solidária no estado e dá outras providências

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14 operativas e associações de produtores, clubes de trocas, grupos de geração de trabalho e renda, empresas recupera-das);

• Redes produtivas e de cooperação;

• Entidades de apoio (Ongs, Sindicatos, Universida-des/Incubadoras, Centrais);

• Movimentos Sociais (Quilombolas, Sem-terras, Ca-tadores, etc);

• Gestores Públicos (muni-cipal, estadual e nacional).

É a partir da interação des-tes atores que se criam proje-tos, políticas e condições para sustentar economicamente os trabalhadores.

União

Para participar de um em-preendimento solidário há um requisito básico: a união. Pode-se participar juntando-se a um empreendimento já existente (cooperativa popular, grupo de geração de renda, rede ou associação), apoiando a criação de um novo empre-endimento solidário, integran-do um Fórum de Economia Solidária do seu bairro, muni-cípio e Estado ou, ainda, pro-curando entidades que apoiam o setor, como Ongs, sindica-tos, associações de moradores, governos que tenham progra-ma específicos para EPS.

Todos os tipos de empre-endimentos que existem só passaram a funcionar porque neles há boa vontade de seus integrantes em fazer coisas de forma conjunta e igualitária. Veja os exemplos:

Associações: são formas de empreendimentos solidários de pequenos grupos, com o mínimo de 6 (seis) associados. No meio rural, são formados por pequenos produtores que se associam para comercializar coletivamente os seus produ-tos. No meio urbano, são os trabalhadores da reciclagem que na maioria organizam-se em associações.

Grupos Informais: são empreendimentos solidários formados por três ou mais pessoas que ainda não se for-malizaram (padarias comuni-tárias, grupos de costureiras, bordadeiras, artesãos, grupos de jovens que geram renda através da cultura).

Organizações Cooperativas: são grupos de trabalhadores de mais de 20 associados de diferentes setores produtivos e de serviços dos meios rural e urbano. Podem ser coope-rativas populares de produção (alimentação, confecção), coo-perativas oriundas de empre-sas falidas que são recuperadas pelos trabalhadores (metalúr-gicas, biodiesel), cooperativas de consumo (voltadas para co-mercialização de produtos or-gânicos e agroecológicos), coo-perativas de serviço (construção civil, tecnologias livres) ou ainda cooperativas de crédito.

Outras formas de organi-zação:

• Clubes de Trocas (grupos que se organizam para trocar produtos e serviços com utili-zação de moeda social);

• Micro e Pequenas Em-presas autogestionárias (em-

presas que têm personalidade jurídica de empresa LTDA, mas que mantêm uma gestão co-letiva);

• Bancos Comunitários; • Redes e cadeias produti-

vas (redes de cooperação, em-preendimentos solidários de determinado segmento econô-mico como confecção, meta-lurgia, alimentação etc...).

Políticas Públicas para a Economia Solidária

O governo Lula criou a Secretaria Nacional de Eco-nomia Solidária (SENAES) na estrutura direta do Ministério do Trabalho para implementar políticas públicas destinadas ao setor.

A Plenária Nacional de Economia Solidária reuniu em Brasília mais de 800 partici-pantes e definiu a constitui-ção do Conselho Nacional da Economia Solidária, o qual, segundo o Profº Paul Sin-ger, Secretário da SENAES, se constituiu como a instância de interlocução da Secretaria com a sociedade.

O RS tem referenciado ações nacionais pela sua pre-cursoria no apoio aos empre-endimentos da EPS. A Cáritas Regional, organização vincu-lada à Igreja Católica, desen-volve no estado, há mais de vinte anos, programas e ações de apoio à organização de trabalhadores em empreendi-mentos populares. A Prefeitu-ra Municipal de Porto Alegre desenvolve políticas de apoio ao setor há mais de 10 anos, tendo constituído, em 1996,

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a Supervisão de Economia Popular, no âmbito da Secre-taria Municipal de Produção, Indústria e Comércio, com o objetivo de coordenar tais po-líticas. Neste sentido, diversas outras prefeituras do interior têm priorizado políticas para este público.

No âmbito estadual, em 2001 foi instituído o Programa Economia Popular Solidária, que teve sua coordenação sob responsabilidade do Departa-mento de Economia Popular Solidária na Secretaria do De-senvolvimento e dos Assuntos Internacionais. O Programa, que consolidava ações desen-volvidas desde 1999, teve por objetivo a elaboração e imple-mentação de políticas públicas

para o fomento do setor no estado. Entre outras medidas, estruturou ações em parcerias com diversas entidades, como a Cáritas e diversas universida-des como UFRGS, UNISINOS, UNIJUI, UCPEL UNISC E UPF. Ao todo, o Programa abrangeu cerca de 25.000 trabalhadores organizados em mais de 400 empreendimentos, desde as-sociações de recicladores, cos-tureiras, alimentos, produtores de leite, produtores de cana-de-açúcar, até indústrias de álcool combustível, tecelagem, metal mecânica, fogões entre outras.

Hoje, segundo o Sistema de Informações em Economia Solidária da SENAES/MTE, o setor tem cerca de 400 mil

trabalhadores/as no RS, onde desde 2003 está constituído o Fórum Gaúcho de Economia Popular Solidária, organizan-do em conjunto os empreendi-mentos, as entidades de apoio e os gestores públicos.

Uma Lei Estadual para a EPS

Em nosso mandato no Le-gislativo, já apresentamos um projeto de lei para criar uma política estadual de Econo-mia Popular Solidária no RS, que foi aprovado pelos depu-tados, mas vetado pelo então governador Germano Rigotto. Faltou apenas um voto para derrubarmos o veto. Como a

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16 luta é justa, reapresentamos a proposta como de iniciativa popular, com mais de cinco mil assinaturas favoráveis. O projeto está tramitando e es-tamos concentrando esforços para aprová-lo em 2010.

Mais do que constituir uma política estadual, que sempre dependerá do governo de plantão, queremos que a Economia Solidária seja reco-nhecida, aceita na legislação, para que seus trabalhadores também tenham este reconhe-cimento. Aliás, esta também é uma luta para o Congresso Nacional. Já temos alguns de-putados comprometidos, mas os avanços ainda são poucos. Precisamos do reconhecimen-to legal de empresas que te-nham a propriedade coletiva e não busquem o lucro, mas a satisfação de necessidades.

Campanha da Fraternidade e

Economia Popular Solidária

A Campanha da Fraterni-dade 2010, “Economia e Vida” foi lançada no mês de setem-bro de 2009, com o lema “Vo-cês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24).

Coordenada pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil - CONIC, a Campanha é ecumênica. Esta é a terceira Campanha deste tipo (as ou-tras foram realizadas em 2000 e em 2005) e tem potencial para unir Igrejas e sociedade em favor de uma mudança na visão econômica dominante.

A expectativa é construir um projeto de economia que este-ja a serviço da vida, sem exclu-sões, estimulando a cultura da solidariedade, da cooperação e da autonomia. Uma economia que coloque a pessoa acima do lucro: a “Boa Nova” que a CF 2010 pretende difundir.

Em tempos de crises eco-nômica, ambiental e social, espalhar a paz e a esperança através de outra prática, que não a do capital, é a utopia, o sonho e principalmente a pro-posta de reforma íntima que deve ser assumida pelo jovem cristão. Além disso, a CF 2010 lembra a sociedade de que a Terra chegou ao seu limite por conta da ganância e da falta de senso de coletividade; de que estamos todos ligados e dependemos uns dos outros, empresas, natureza, homens e mulheres. O que ainda pode ser feito é preservar o que não foi totalmente destruído e recuperar o que for possí-vel, através da despoluição de rios e mares, reconstituição de ecossistemas, etc. A EPS é uma referência porque está associa-da a uma visão ecológica. Sua contribuição politiza o debate quando afirma que depreda-ção ambiental não resulta de ações individuais, mas de um sistema econômico produtivis-ta, que subordina a vida e o planeta ao lucro.

Ecologia é a ciência que estuda as condições da natu-reza e as relações entre tudo que existe, trazendo uma me-lhor compreensão das cone-xões entre os organismos vi-vos, como plantas e animais, e

o seu meio. Essa visão de redes de co-

operação, que também é prin-cípio da EPS, foi surrupiada pelo capitalismo. Os donos do dinheiro perverteram a idéia de Deus, que criou tudo, do-tou o homem de razão e deu a ele a missão de comandar o desenvolvimento do planeta. Esse domínio foi interpretado por alguns como espoliação, exploração e abuso. Nisso, os rios foram poluídos; os mares, contaminados; a monocultura tomou conta de vários biomas, o ar foi envenenado.

Agora, resta uma única chance: passar do paradig-ma da exploração para o da cooperação, da lucratividade para a sustentabilidade. Ou seja: voltar a viver da forma que Deus orienta. Apostar nas novas gerações e plantar se-mentes de liberdade, amor e companheirismo são o legado que a CF2010 deixará, profe-tizando a nova era que a hu-manidade começa a trilhar e desafiando-nos a esta missão, para denunciar o sistema de exploração vigente e esperan-çar os crentes no reino de Deus.

Nesse contexto, a juven-tude deve abraçar a opor-tunidade de novas relações econômicas e desafiar suas comunidades a organizarem grupos de trocas solidárias, cooperativas e associações, que gerem renda e humanizem a visão de empreendimentos e suas relações com a natureza.

Entre 2003 e 2007, foram criados quase oito mil Em-preendimentos Econômicos Solidários no Brasil. Com uma

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média de 1,5 mil novos EES a cada ano, a Economia Solidária mantém seu ritmo de cresci-mento. É o que revelam os no-vos dados do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária (SIES), coordenado pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Para se ter uma idéia, na década de 1990, a média de criação de novos EES era de 855 por ano. Até 2007, foram cadastrados 21.859 EES, onde participam 1.687.496 pessoas, sendo 62,6% homens e 37,4% mulheres.

Esse crescimento é acen-tuado, sobretudo, na Região Nordeste, onde se concentra o maior número de EES, ob-tendo 43,5% do total dos re-gistros. Em segundo lugar está a região Sudeste, com 17,9%, seguida pela região Sul, com 16,4%. As regiões Norte e Cen-tro-Oeste representam 12,2% e 10,1%, respectivamente. Só no RS, 360 mil trabalhadores estão associados direta ou in-diretamente a EES.

O SIES revela também que o valor médio mensal dos ser-

viços e produtos do total dos empreendimentos chega a R$ 653 milhões de reais, ou seja, são quase R$ 8 bilhões gera-dos por ano na Economia So-lidária. Deve-se considerar que esse potencial de geração de riqueza e de melhoria de renda para os associados poderá ser ampliado com as políticas pú-blicas de Economia Solidária que estão sendo implementadas.

Um 3º Mapeamento está sendo desenvolvido e será finalizado até fevereiro de 2010.

Trabalhadoras e trabalhadores associados

referências bibliográficas: atlas da economia solidária - ministério do trabalho e emprego

A Economia Popular Solidária é compreendida por um sistema ou conjunto de empreendimentos e ações que objetivam, em um primeiro e es-sencial plano, gerar condições de tra-balho, renda, facilitação de crédito e consumo. Tais empreendimentos são caracterizados por buscarem a criação e recriação de postos de trabalho atra-vés da organização coletiva de traba-lhadores excluídos da atividade laboral do mercado formal e mesmo informal. Outra característica própria reside na organização interna das empresas, pri-mando pela cooperação e autogestão, onde a assembléia geral de todos tra-balhadores associados se constitui na instância máxima de decisão. A pro-priedade dos meios e instrumentos de

produção pertencem a coletividade; e os resultados, são distribuídos entre os trabalhadores de acordo com o traba-lho de cada um, de acordo com crité-rios definidos pelos próprios.

A própria natureza da EPS, formada por trabalhadores excluídos do merca-do de trabalho e, na sua maioria, das condições dignas de vida, revela as diversas dificuldades que atravessam para manter e fazer prosperar seus empreendimentos. A maioria dos em-preendimentos é descapitalizada, pos-sui poucos instrumentos de produção, quando os tem são defasados tecnolo-gicamente e os trabalhadores têm pou-ca formação gerencial. Isso acarreta, obviamente, dificuldades para competir no mercado.

O QUE É A EPS, DE FATO

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O que é mais importante para a vida? O que é primordial na defesa da vida? Fabiane asquidamini*

Sabemos que as pessoas não vivem e se desenvolvem quando não há o que comer, beber, vestir, onde habitar, como cuidar da saúde. Quando não há liberdade, acolhimen-to, afeto, diálogo, garantia de direitos, acesso a educação, trabalho e lazer. Em Mateus (Mt 25,31-46), está o ensina-mento do que é primordial na defesa da vida. O compromis-so pela garantia da comida, do que beber, do que vestir... dos pequenos, daqueles que se encontram à margem desta sociedade, daqueles que não podem pagar ou “contribuir”. Essa é a centralidade. É o im-portante; o caminho que se faz necessário escolher.

O direito à vida - essa como bem soberano - precisa ser defendido e garantida para todas as pessoas da terra. É primordial a construção de um “outro mundo possivel”,

(...) somente a construção de um mundo só (não dois ou três ou quatro) poderá salvar a humanidade. É utopia, uma utopia “necessária como o

pão de cada dia”. “Onde não há utopia não há futuro.” ¹

A campanha da frater-nidade ecumênica, quando se propõe a discutir e refletir Economia e Vida, contribui para essa construção, de um “outro mundo possível” por que, mais do que uma outra economia possível que se faz urgente, também impõe-se a exigência da construção de um mundo só.

A Campanha objetiva co-laborar na promoção de uma economia a serviço da vida, fundamentada no ideal da cultura da paz, a partir do esforço conjunto das Igrejas Cristãs e de pessoas de boa vontade, para que todos con-tribuam na construção do bem comum em vista de uma so-ciedade sem exclusão.²

É importante denunciar as ameaças, as violações, os des-casos e a ausência de políticas públicas que defendam a vida de todas e todos, inclusive do planeta. As novas relações pre-cisam pautar-se por princípios éticos e de justiça social. O

significado da palavra econo-mia nos remete para a vivência destes valores. A palavra “Eco-nomia” vem do grego oikos + nomos que significa “adminis-tração da casa”. Precisamos administrar a casa com senso de necessidade e justiça. Ela se constitui numa ferramenta para ajudar a melhor viver e conviver no mundo, portanto, precisa estar a serviço do bem comum, das novas gerações e das populações mais necessi-tadas.

Essa administração da casa tem que estar comprometida com a superação da pobreza, com a geração de mais vida e felicidade. Neste sentido a Campanha da Fraternidade es-trategicamente quer:

DENUNCIAR a perversidade de todo modelo econômico que vise em primeiro lugar o lucro, sem se importar com a desigualdade, miséria, fome e morte.

EDUCAR para a prática de uma economia de solida-riedade, de cuidado com a

* assistente social¹ pedro casaldáliga, 2006² conic, 2009, pg.21

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criação e valorização da vida como o bem mais precioso.

CONCLAMAR as Igrejas, as religiões e toda a sociedade para ações sociais e políticas que levem à implantação de um modelo econômico de solidariedade e justiça para todas as pessoas.³

Com isso, a discussão se di-reciona no combate ao modelo econômico neoliberal, onde a economia está orientada para a geração máxima de riqueza, para o acúmulo desta rique-za na mão de poucos. Neste modelo a centralidade está na inovação tecnológica e geren-cial, acelerando e agravando o desemprego estrutural.

Remete-nos, também, à construção de um outro modo de vivermos a Economia, mui-to mais social e solidário, em que os meios de produção e a própria produção sejam par-tilhados, autogestionáveis e direcionados para o compro-misso de construção do bem comum. Pensando na reali-dade do trabalho, Luther King (1996), referindo-se à digni-

dade humana, dizia que privar o homem do trabalho ou dos meios para a sobrevivência, é assassiná-lo pisicologicamen-te. É dizer que esse homem não tem direito a existir.

Em uma sociedade demo-crática de direitos, globaliza-da, com liberdade de ir e vir, a “administração da casa”, pre-cisa possibilitar que o acesso aos bens e direitos seja de to-dos e não somente do capital e das mercadorias. C

Conforme dados do Insti-tuto de Estudos do Trabalho e Sociedade - IETS, (2007) no Brasil tem 10,7 milhões de pessoas em situação de indi-gência, ou seja, são famintos e 46,3 milhões são pobres. Um modelo de economia que não consegue administrar para ga-rantir as necessidades básicas e o acesso aos direitos essen-ciais das pessoas e dos povos, precisa ser questionando, con-frontado e modificado.4

Y el pueblo, no tiene po-der alguno. Quien manda en la política son los que tienen el poder económico de las grandes empresas y bancos

que controlan la producción y circulación de la riqueza. Y acumulan todavía más rique-za, aunque afecten a las posi-bilidades de consumo básico del pueblo. 5

A estrutura complexa e contraditória deste modelo so-cietário faz nascer uma socie-dade onde muita riqueza con-vive com a extrema miséria, na qual a necessidade de so-brevivência das pessoas é su-plantada pela necessidade de consumo exagerado de outras, em que não há sentimento de indignação frente à injustiça e a morte de crianças, adoles-centes, jovens em função de guerras, tráficos e extermínio.

Nessa realidade, a Cam-panha da Fraternidade Ecu-mênica, tem muito a dizer, a pronunciar e a denunciar. A mensagem de evangelização tem que se traduzir em con-cretude e exige estar enraiza-da na historicidade dos po-vos. Portanto, “intrometer-se” na economia é uma questão evangélica e profética, pois se trata de questões relativas à vida humana e social.

³ conic, 2009, p.22

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4 conic, 20095 stédile, 20086 conic, 2009, p.35

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Dados trabalhados em do-cumentos da Campanha da Fraternidade Ecumênica de-vem gerar entendimento e mobilização para modificar a realidade. Esses precisam nos levar ao engajamento político, social e humanitário da cons-trução de um outro mundo possível. A ONU, no que se refere às metas do milênio, denuncia:

(...) os bancos ganharam mais dinheiro em 2008 do que todas as nações pobres do mundo em 50 anos. R$ 4 bilhões foram doados pelos países ricos às nações pobres e miseráveis. Já as institui-ções financeiras ganharam nove vezes mais, cerca de R$ 35 milhões para salvá-los da falência. [...] A fome, a des-nutrição e a pobreza devem aumentar em todo mundo. Em, 2008, 915 milhões de pessoas passavam fome no mundo. Recentemente, esse número chegou a um bilhão de pessoas.6

Quem conhece o Deus da Vida, conhece e se compro-mete com a defesa da vida, principalmente daquelas que são ameaçadas por forças eco-nômicas, pela violência e pelos extermínios (culturais, étnicos e de classes sociais).

Essa realidade nos exige posturas éticas, proféticas e comprometidas com a Boa Nova do Evangelho. Em At, 4,32-35:

A multidão dos que ha-viam credo era um só cora-ção e uma só alma. Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum.

Com grande poder os apóstolos davam o testemu-nho da ressurreição do Se-nhor, e todos tinham grande aceitação.

Não havia entre eles ne-cessitado algum. De fato, os que possuíam terrenos ou casas, vendendo-os, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos após-tolos. Distribuía-se então, a cada um, segundo a sua ne-cessidade.

Este texto contribui para nos orientar, também, na “ad-ministração da casa”. A distri-buição, conforme as possilida-des e as necessidades de cada um, faz com que as pessoas que convivem em um mesmo lugar se transformem em co-munidade. É a observância de que é necessário para a con-vivência e a vivência do bem comum.

Conforme SUNG (1998) a fé na ressurreição de Jesus re-vela que a salvação não está em acumular poder e rique-za, mas na forma em que se constitui como comunidade. O reconhecimento das pessoas, o pertencimento a uma comu-nidade são pertinentes para a transformação da realidade social. Reconhecer as pessoas

como imagem e semelhança de Deus, nos interpela a com-prometer-nos com a constru-ção de um mundo melhor, onde todas e todos tenhamos possibilidades e oportunidades de vida com dignidade e em plenitude.

Se conseguirmos entender e compreender o que é mais importante para a vida, o que é primordial, podemos discutir, propor e promover uma eco-nomia que esteja direcionada para satisfazer as necessidades humanas e, consequentemen-te, a construção do bem co-mum.

O bem comum é possível quando observamos duas ca-racterísticas: o da não exclu-sividade e o da não rivalidade, ou seja, não é exclusivo de alguns e não desperta a rivali-dade de outros. A água, como exemplo, trabalhado pela Campanha da Fraternidade Ecumênica, é um bem comum, importante elemento para a vida e para a religiosidade.

A água é bem comum por sua essencialidade. Nenhum outro líquido substitui a água em suas inúmeras funções e benefícios para o ser huma-no, a natureza e o planeta. Ela precisa ser pública e universal, pela sua importância frente à manutenção da vida e da so-lidariedade de uma sociedade frente às novas gerações.

Sendo assim, a construção do bem comum não é fim em si mesmo; seu sentido está no

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21respeito à dignidade da pessoa e de toda a humanidade. Não podemos ficar calados e ser-mos coniventes com uma ad-ministração da casa onde pes-soas morrem por falta de água e de comida. Segundo a ONU, 1,2 bilhões de pessoas não têm água de qualidade para beber e 2,4 bilhões não têm serviços sanitários adequados. Dados da Campanha da Fraternidade de 2004, já denunciavam que morriam, por dia, 30.000 pes-soas por falta de água limpa. 7

É imprescindível dizer que esse modelo societário neoli-beral, divide as pessoas entre os que têm direito a viver – a bem viver - e aqueles que po-dem morrer. Ou seja, nessa sociedade há mortes e mortes, e cabe a nós percebermos que não existe a morte de 1ª ou de 2ª categoria; existem, sim, pessoas morrendo por falta de

acesso a bens que são univer-sais e imprescindíveis para a vida humana. Isso precisa nos mobilizar para a construção de um modo de administrar a casa diferente e para o con-fronto e superação deste mo-delo de Economia.

Por isso, administrar a casa requer princípios éticos. Não podemos restringir as ne-cessidades humanas e o bem comum a leis e acordos do mercado e deste modelo so-cietário neoliberal. Precisamos sim, estar aptos a ensinar para as futuras gerações que temos que viver na paz e no limite da ecologia, que as pessoas e os seres que vivem neste planeta precisam ser respeitados com absoluta importância.

Para falarmos de Economia e Vida, precisaremos falar de educação e de atitudes práti-cas. Segundo Vandana Shiva:

referênCias BiBlioGráfiCas:

casaldÁliga. pedro. Humanizar a Humanidade praticando a proximidade. premi internacional catalunya

2006. disponível em: http://www.servicioskoinonia.org/casaldaliga/textos/index.html. acessado em 02 de

janeiro de 2010.

conic. conselho nacional das igrejas cristãs do brasil.conic 2009. manual da campanha da Fraternidade

ecumênica. são paulo: cnbb,2009.

cnbb. conferência nacional dos bispos do brasil. Fraternidade e água. são paulo: salesiana, 2003.

FilHa, elza oliveira. a consciência da finitude dos recursos naturais vem junto com o esgotamento destes

recursos. revista iHu on line (são leopoldo) são leopoldo, nº 60, p.12 a 15, maio,2003.

King, luther. o redentor negro. coleção mensagens espirituais. são paulo: martin claret, 1996.

iets instituto de estudos do trabalho e sociedade.

sHiva, vandana. eu sigo a minha consciência, vou para onde meu senso de realidade me levar. revista iHu

on line (são leopoldo), nº 61, p.2 a 5, maio, 2003.

sung, mo jung. desejo, mercado e religião. editora vozes, 1998.

stÉdile, joão pedro. crítica a la política econômica. agenda latinoamericana ano: 2008.

Existem dois limites. Um deles é a obediência aos limi-tes ecológicos que realmente restringem a condição hu-mana. E o outro é o limite da justiça social de dividir, todos devem dividir. E isso é, na verdade, educar para a sobre-vivência das espécies. Se con-tinuarmos ensinando a gera-ções futuras como construir edifícios, ares-condicionados, computadores e não capacitá-los a ter o conhecimento bási-co nem ensiná-los as obriga-ções para viver neste Planeta, não teremos futuro.8.

A Campanha da Fraterni-dade Ecumênica de 2010 vem contribuir na construção e no apontamento destas ações e atitudes necessárias e urgentes para descobrir cada vez mais o que é importante para a vida e primordial na sua defesa.

7 cnbb, 20048 shiva, 2003, pg. 3

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A Campanha da Fraternida-de Ecumênica desse ano pede para refletirmos as relações econômicas que são estabe-lecidas entre as pessoas e, da mesma forma, qual a palavra que os cristãos precisam usar diante dessa relação estabeleci-da. Unimo-nos em uma grande roda para conversarmos e pro-pormos novas relações pelas quais reconheçamos a vida como o maior bem sagrado. É essa sacralidade que queremos celebrar nas próximas linhas. Nós, educadores e educadoras, temos em mãos a missão de não deixar essa reflexão passar despercebida. Como, em nos-sa realidade, propor uma mu-dança de relações onde Deus e o dinheiro não estejam nos mesmos níveis e, através disso, façamos brotar sentimentos de comunhão, produzindo novas formas de vida onde o amor seja o critério de uma nova hu-manidade.

Para amar precisamos co-nhecer. E para conhecer preci-samos fazer-se um com... Mais do que tudo é ‘estar junto’. Lembramos o Nazareno que caminha junto com os discí-pulos de Emaús (Lc 24) sem segundas intenções Caminha e escuta. Ama-os profunda-

mente. O caminho é revelador de necessidades. Quem se faz eterno caminhante tem capa-cidade de amar cada sinal de vida que aparece no percurso. Quem está a caminho conse-gue sentir-se mais perto do horizonte, que nunca chega, que nos inquieta de tal manei-ra que é impossível ficar para-do. O caminho busca o inédito. Felizmente, o caminho é mais horizonte do que cansaço. Apesar das pedras, do suor, dos buracos, das ameaças, o cami-nho é sedutor. Chama atenção, (com o perdão dos biblistas pela simplicidade exegética), a passagem em que Maria cho-ra a morte de Jesus (Jo 20) e escuta um simples: ‘Maria’. É a simplicidade misturada com a explosão do amor. A voz de quem ama chega ao ouvido e ao coração de quem se sente amada profundamente e reco-nhece o som do amor ecoando. Quem já se sentiu amado, sabe a implicância da palavra festa, da palavra liberdade, do grito que insiste em sair mesmo em silêncio. Maria, com certeza, teve vontade de gritar, de sal-titar, de correr e falar pro mun-do inteiro que o Filho amado estava vivo.

Querido educador e queri-

da educadora, quando aceita-mos a violência ou qualquer tipo de relação em que o lucro é o fim, definitivamente, não acreditamos no amor. Ora, não tem como acreditar em alguns momentos e não acreditar em outros. Ou acreditamos ou não acreditamos. O aumento quan-titativo de todas as formas de violência promovida individu-almente ou por organizações é sinal de uma crescente cultura de morte. Economicamente, a América Latina foi afetada, fortemente, pelo imaginário capitalista cujas promessas beneficiam sempre as elites o que faz crescer cada vez mais a brecha que distanciam ricos e pobres. Acreditar no amor é di-zer não a tais muralhas psico-lógicas de violência e de capi-tal. Amar e acreditar em outra humanidade é negar o descaso com a vida humana e a vida do planeta.

A pedagogia do amor e da comunhão não distancia edu-cadores (as) e educandos (as). A tarefa do (a) educador (a) é escutar os gritos que nascem dos educandos (as) e, partin-do desses, propor o enrique-cimento de ambos. Cada um aprende da condição e do con-texto que vive se esse for res-

Sonetos sobre a sacralidade da vida aos educadores e educadoras de jovens

Economia e Comunhão:

maicon andré malacarne*

*estudante de teologia e pastoral – itepa. assessor da pastoral da juventude - [email protected]

EDUCAÇÃO

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peitado e amadurecido nas re-lações. Entre educadores (as) e educandos (as) do amor não há senhores e escravos, mestres e servos, mandantes e obedien-tes, faltantes e ouvintes; há construção conjunta da cria-tividade e da reflexão. Confiar na capacidade dos educandos (as), queridos (as) educadores e educadoras, é confiar no pro-tagonismo e na certeza de um projeto de vida para a liberda-de e para o amor.

Infelizmente precisamos dizer que o nosso meio educa-cional não está preparado para uma educação crítica. Ensina-mos a escutar e decorar con-teúdos. Ensinamos para passar no vestibular. Essa maneira de aprendizagem dá margem à manipulação estrutural dos educandos. Vivemos um tem-po em que se põe em questio-namento a validade da escola. Reformas pedagógicas não são suficientes para desmascarar o contexto educacional estabe-

lecido. Enquanto não forem modificadas as condições ob-jetivas em que vivem educado-res (as) e educandos (as) não haverá grandes mudanças. O pensamento não se encontra reconciliado com a realidade. Pensar em um ser humano ‘humanizado’ em meio a uma sociedade da barbárie econô-mica e social é lutar pela nossa reconciliação com a reflexão crítica.

Para falamos em econo-mia e amor é necessário dizer algo sobre a ecologia. Como pensarmos uma ética de sus-tentabilidade do planeta? Está colocada, aqui, uma questão de cuidado com a vida. Co-munidades sustentáveis pre-cisam ser apostas para nossa proposta pedagógica. Fritjof Capra falando sobre o que é uma comunidade sustentável afirma: são estilos de vida, de negócios, de relações econô-micas, de estruturas físicas e tecnológicas que respeitem a

vida da natureza. É necessária uma postura crítica diante de um mundo que devora energia e desestrutura ecossistemas. O lucro faz com que a humani-dade faça da natureza instru-mento de progresso econômi-co. É esse sistema civilizatório que mata a vida e que tomba projetos. A vida de comunhão é anunciadora da realidade da natureza que chora e geme em dores de parto (Rm 8,22).

Queridos (as) educadores e educadoras, será que ainda estamos entusiasmados com a educação? Temos o ambiente pedagógico como espaço da fascinação, da criatividade e do amor à educação? A educação é também um processo corpo-ral. Diante disso é possível falar em prazer. Sentimos prazer nas relações entre educadores (as) e educandos (as) e nos espa-ços revisitados diariamente? É o tempo do ‘re’: reinventar, recriar, reencantar, refazer, renascer, reeducar, renovar,

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24 re-sensibilizar, reaprender a aprender. Seremos melhores se andarmos na contramão, se nadarmos contra a maré, se lançarmos nossos sonhos num grito subversivo. Manoel Bar-ros poetiza: Preciso atrapalhar as significâncias. O despropósi-to é mais saudável que o sole-ne. Nasci para administrar o à-toa, o em vão, o inútil. Prefiro as máquinas que servem para não funcionar: quando cheias de areia, de formiga e musgo – elas podem um dia milagrar de flores. Também as latrinas desprezadas que servem para ter grilos dentro – elas podem um dia milagrar violetas.

Educadores e educadoras que amam e acreditam em uma nova humanidade, com novas relações, precisam e de-

vem provocar para o Projeto de Vida. Não é fazer demago-gia. É necessário criarmos uma cultura de projetos de vida. Tomarmo-nos nas mãos e aju-dar os educandos a tomar-se. Não quero dizer para entregar esquemas de projetos de vida para eles responderem, mas criar idéias inspiradoras e cria-tivas, livros e materiais. Pro-jetos, objetivos, metas, prin-cípios, valores, dão sentido a vida de todos e ajudam organi-zar ações e pensamentos. Isso pela felicidade daqueles que se tomam nas mãos e das pessoas que estão em sua volta.

Tânatos é o deus da mor-te, filho de Nix. a noite. Sísifo, certa vez, algemou Tânatos e por determinado tempo a mor-te cessou de aniquilar a vida da

humanidade. Zeus, entretanto, decidiu libertar Tânatos que, com sua força, aniquilou Sísifo. E, então, a morte voltou a ani-quilar o mundo. Tânatos tem força e apetite. Não gosta de mortes lentas e prefere mortes grupais. Queridos educadores e educadoras, é hora de vencer Tânatos, limpar o chão banha-do de sangue, impedir que o Tânatos vestido de capitalismo mate e dissemine tanta pobre-za. Temos que segurar Tânatos nas suas empreitadas contra a vida da natureza, do ecossiste-ma. É urgente reinventarmos o amor à vida, a criação de uma nova humanidade e de uma nova economia com princípios eucarísticos.

Que o Deus da vida nos aju-de a sermos bênçãos do amor!

EDUCAÇÃO

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A cena é comum. Corpos juvenis em jogos eróticos atraves-sam as madrugadas em baladas. Com quantos “ficar” na noite? Sim, o termo é “ficar”. Ficar pelo tempo de um beijo ou de uma relação mais próxima. Com quantos “mais” se ficarem, melhor! Na continuação, já dia, não saberão com quem ficaram.

No Brasil, meninos e meninas iniciam cada vez mais cedo suas atividades sexuais. Meninos perdem a virgindade em média com 14 anos e meninas com 16 anos . Segundo pesquisa da Folha de São Paulo de 27 de julho de 2008, um em cada cinco jovens já têm filhos, sendo que destes 71% disseram que a gra-videz não foi planejada e 42% dos jovens pais e mães, não vivem ou nunca viveram juntos. Em média, jovens ficam grávidas pela primeira vez com 16 anos . No Brasil, dados do Ministério da Saú-de apontam para 480 mil grávidas adolescentes no ano de 2008.

O que as pesquisas nos mostram é a ponta do iceberg. Di-ríamos a parte visível, aquilo que se constata e se pode quan-tificar. No entanto, o fenômeno não é apenas quantitativo, ele também é qualitativo. Este é o desafio daqueles que se preo-cupam e estudam juventude: desvelar os aspectos qualitativos que subjazem aos aspectos quantitativos. Outra questão refere-se a nos perguntamos como esse fenômeno foi e é gerado e as conseqüências que daí decorre. Fazem-nos perguntas, como por exemplo, por que tantos jovens iniciam-se cada vez mais cedo sexualmente? O que está em jogo quando a juventude diz querer “ficar” em vez de namorar? Por que há tantos corpos em evidência expondo atributos sexuais como se quisessem ser consumidos?

Coisificação e fetichização em tempos pós-modernos

antonio carlos Frutuoso*

* assessor da casa da juventude do paraná.2. castro, mary garcia et alli. juventude e sexualidade. brasília:unesco, 2004, p.122.3. idem, p. 167.

AFETIVIDADE E SEXUALIDADE

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e Consciência de Classe (São Paulo: Martins Fontes, 2003) escreve que por conta do pro-cesso de alienação, o sujeito se vê como mercadoria e, por conseguinte, vê também os outros como mercadoria. Esse processo é descrito pelo pensa-dor como reificação ou coisifi-cação. O processo de alienação do trabalho e a objetivação desse trabalho conduz à sub-jetivação igualmente alienada do indivíduo. Em outras pala-vras, a produção da existência material pelo trabalho do indi-

Vivemos um tempo em que os corpos são vitrine. Como numa sala de espelhos, vêem-se e são vistos e são consumi-dos. Graciliano Ramos em São Bernardo conta-nos a história de Paulo Honório, que toma os outros, empregados e sua companheira, como objetos, coisas que podem ser usadas. Paulo Honório descreve seus empregados, trabalhadores ru-rais, como bichos (“as criaturas que me serviram durante anos eram bichos”), e sua mulher, a professora Madalena, ele

a trata às brutas e de forma egoísta, a querer sempre junto de si (“Madalena chegou aqui cheia de bons sentimentos e bons propósitos... [e] esbarra-ram com minha brutalidade e egoísmo”). No livro, o perso-nagem central aos poucos se percebe também como “bicho” ou “coisa” e não vê sentido em continuar sua vida (“O que es-tou é velho... Cinqüenta anos perdidos, cinqüenta anos gas-tos sem objetivo, a maltratar-me e a maltratar os outros.”). Georg Lukács no livro História

Consumir e ser consumido. Decifrar e ser devorado pela esfinge.

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27víduo implica também a pro-dução subjetiva das relações sociais e do próprio sujeito. Se essa produção é alienada, isto é, o trabalhador não se reco-nhece naquilo que produz e aquilo que produz não é para si mas de outrem, o trabalha-dor não se vê sujeito daquilo que produz, mas se percebe como assujeitado por aquilo que produz. Carlitos no fil-me Tempos Modernos dá-nos uma mostra do que queremos dizer com esse processo de alienação. É antológica a cena em que o personagem, um empregado de fábrica, é engo-lido por uma engrenagem e se configura na própria engrena-gem. Crítica ácida ao modelo taylorista e, por conseguinte, a todo modelo industrial. Re-tornando a São Bernardo, no final do livro também se evi-dencia o processo de assujei-tamento e de alienação produ-zido pelo trabalho: “creio que nem sempre fui egoísta e bru-tal. A profissão é que me deu qualidades tão ruins”. Como se vê, o processo de coisificação é tecido nas relações sociais e destas com o trabalho e com o capital.

Em tempos de pós-mo-dernidade, em que a máxima marxiana – tudo que é sólido se desmancha no ar – se con-firma, a juventude torna-se o grupo social mais suscetível a viver alienado e, em con-seqüência, coisificado e feti-chizado. A pós-modernidade, como se sabe, acentua a frag-mentação do individuo, pri-vatiza-o, especifica. Newton

Duarte em Crítica ao fetichis-mo da individualidade (Cam-pinas: Autores Associados, 2004) parafraseando Mesza-ros, chama a pós-modernida-de de “expressão teórica da barbárie produzida em escala crescente pelo capitalismo”. E como já se disse, nenhum ou-tro grupo social vive o ethos modernizante de forma mais acentuada do que a juventu-de. Numa ode ao progresso os jovens vivem o carpe diem e o self made man como máximas a serem seguidas. Tudo é em si e para si. Para a sobrevivên-cia do espólio da modernida-de é necessário inculcar nas novas gerações, em especial nos adolescentes e jovens, os valores modernizantes em que o imperativo é consumir. A força ideológica da moder-nidade torna-se “imaginário social” aceito e participado por todos os jovens. É esse imaginário social que defi-ne o que e como consumir. Sim, não basta consumir, é necessário consumir produtos específicos. Produtos que são motivo de culto e celebra-ção e, portanto, fetichizados, tornando-se razão do próprio ser: eu sou aquilo que consu-mo.

Observe-se que não há dicotomia entre ser e ter. A aspersão ideológica pós-mo-derna leva-nos a crer que ter implica em ser. Ou melhor, que o ter é o próprio ser. O dilema hamletiano, do “ser ou não ser”, a crise do sujei-to moderno, desloca-se para o “ter ou não ter” do indiví-

duo pós-moderno. Assim, ao consumir um tênis o que se olha, primeiro, é a marca do tênis. Não é à toa que am-bulantes fazem a festa com falsificações de marcas de grife. O que se consome é a marca, a grife. Desta forma, estar “antenado” é estar usu-fruindo daquilo que é moda e que o deus mercado apresen-ta como sendo o último grito. E ao ter, o jovem é.

Nesse processo de consu-mir, de ser aquilo que se é por aquilo que se consome, em uma sociedade fetichizada, o jovem é coisificado e também é fetichizado. Ele é tomado como objeto que está para ser consumido. A questão está que ao ser consumido, o objeto perde o encanto, des-fetichizado ele não encontra “sentido” em existir. Precisa ser descartado. Assim fazemos com celulares, com computa-dores, roupas... e assim faze-mos com as relações pessoais.

O “ficar” encontra senti-do nesse imaginário. Pode-se dizer que essa seja uma ati-tude de experimentação entre os adolescentes e jovens. Que isso até seja saudável. E os jovens entendem que o ficar não é tão sério como o namo-rar. O namoro exige um sair de si e encontrar-se no outro. O si e para si não cabe para quem namora. A outra pes-soa ganha importância e toma parte na vida do jovem. Desta forma, namorar exige um des-locamento do sujeito que se percebe no outro. O outro é complementaridade de si.

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Paulo Freire escreve em Pedagogia da Autonomia (São Paulo: Paz e Terra, 2009) que reconhecer-se condicionado não é determinismo, mas é imperativo para gestar a mu-dança. Produzir sulcos capazes de criar anomalias na máquina pós-moderna. O sistema não suporta anomalias e as com-bate como anticorpos atrás de infecção. Disso Durkheim, pai do funcionalismo, alertou os senhores capitalistas. E quem produzirá anomalias é a pró-pria juventude com seu in-conformismo, teimosia, inven-tividade e originalidade. No âmbito da pastoral cabe-nos instrumentalizarmos os jovens para que efetivamente sejam capazes de se colocarem no movimento contrário da roda. O movimento exige, de nossa parte, educadores e educado-res, despirmo-nos do moralis-mo que anuvia a visão e não nos permite ver aquilo que é qualidade do fenômeno. En-

Mas a engrenagem emperra e o movimento anomaliza as condicionantes

quanto punimos e somos pu-nidos pela leitura moralizante, perdemos a oportunidade de efetivamente fazer a critica àquilo que se mostra moder-nizante, ou se a fazemos, não a fazemos no que é basilar. Queremos cuidar de telhas que-bradas que gotejam quando deveríamos também nos preo-cupar com os fundamentos que suportam a estrutura, inclusive o telhado. É necessário que me-diemos processos de formação “efetivamente” integrais com vistas ao amadurecimento hu-mano (e da própria fé).

Marx escreveu, em 1844, nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos que deveríamos substituir a riqueza e a pobre-za geradas pela sociedade ca-pitalista pela “pessoa rica de necessidades humanas, isto é, pela individualidade cuja plena realização e desenvolvimento necessitam da expressão da vida humana em sua totalidade. Essa perspectiva é ao mesmo tempo

Está aí o desafioPreferem ficar, porque não

compromete. Preferem ficar porque podem ser consumi-dos. Preferem ficar porque, fetichizados, cultuam-se a si e aquilo que podem ou não consumir. Descartáveis, prag-máticos, nada fazem que não viver a lógica dos dias atuais. Aliás, tudo é atual até a pró-xima esquina. É importante que se diga que, como peça de uma engrenagem, eles ha-bitam o imaginário criado para

serem isso que são. Não há sal-vação fora do mercado. O mer-cado, para usar de uma expres-são de Pe. Libânio, é o “Messias do final dos tempos” . São con-dicionados de forma alienada a serem assim. Estão aí para con-sumir. Desta forma a sexualida-de também é vista como algo a ser consumido. Não por menos que por volta de 70% dos jovens tem a virgindade como algo do passado. Não estamos aqui a defender posições do contra ou

uma meta pela qual lutar e uma referência para crítica ao feti-chismo da individualidade” .

Reconstruir a totalidade. A totalidade da sociedade e, por conseguinte, do próprio su-jeito jovem. Fazê-lo no movi-mento constante de ruptura e superação a ode pós-moderna e de suas estruturas alienantes que atravessam a pessoa. Fa-zê-lo oportunizando para que a sexualidade humana seja uma das expressões da pleni-tude do individuo totalizado. Fazê-lo numa atitude de aco-lhida para que o humano seja valor e não mercadoria. Fazê-lo porque a nossa perspectiva é a do amor, e como nos lem-bra evangelista João, o Verbo precisa fazer-se carne para que habite entre nós.

Quem sabe assim possa-mos resgatar os verdadeiros paulos honórios e trazê-los à vida, não mais reificados e fe-tichizados, mas plenos de hu-manidade.

favor deste ou daquele tema da vida sexual do jovem, o que pretendemos é focar a reflexão nos aspectos qualitativos, do re-fletir do porque os jovens agem como agem. Nesse sentido, a virgindade perde “valor” entre os jovens porque a relação se-xual é algo que foi feita para ser consumida e fetichizada. Quan-do consumida perde o encanto e deve ser descartada. O corpo não é para ser amado, mas está para ser consumido.

AFETIVIDADE E SEXUALIDADE

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A questão da solidarieda-de é extremamente atual. As sociedades contemporâne-as, assentadas sobre os valo-res do capitalismo, estão em alta, fundadas em sistemas de competição orientada a interesses. Essa experiência coletiva, que invade tanto as instituições sociais quanto os espaços privados do mundo da vida, constrói-se dentro de uma moral egoísta, na qual a presença dos outros só é reco-nhecida a partir dos benefícios concretos que possa gerar; o

que implica, em contraparti-da, uma forte indiferença em relação aos não produtivos e uma enorme e constante vio-lência de uns contra os outros, especialmente os que não se adaptem às regras desse ego-ísmo social.

Por outro lado as ativida-des solidárias fazem parte da cultura brasileira, fato este que vem amenizando algu-mas carências da parcela de menor - ou nenhum - poder aquisitivo da população, po-rém que reflete, também, uma

característica notável no povo brasileiro: a solidariedade, ca-pacidade de compartilhar dos sofrimentos de outras pessoas e, literalmente, colocar a mão no bolso para ajudá-las.

Aprofundar e ajudar a cul-tivar este espírito e mística da solidariedade é também tarefa da Ação Solidária Madre Cristi-na. Esta entidade entende que ajudar é servir, contribuindo na construção de uma sociedade com pilares como igualdade, democracia, soberania, huma-nidade.

Sabemos que cultura da so-lidariedade diz mais que práti-cas solidárias.

O pouco de cada um ajudará a muitosÉrico josé Hickmann* e letícia tietböhl melo**

Ação Solidária Madre Cristina

Por uma cultura de Solidariedade

* coordenador nacional da ação solidária madre cristina assessor das pastorais da juventude da diocese de cacheira do sul** Formada em pedagogia pela uergs, 2007, secretaria da ação solidária madre cristina - porto alegre/rs, assessora da pastoral da juventude rural do rs

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A cultura da solidariedade instaura a harmonia no inte-rior de si, o diálogo no seio da família, a cooperação dentro da mesma classe. É nova ma-neira de entender o mundo, de pensar a realidade, de ver as coisas. A cultura da solida-riedade impregna nossos atos de modo que ser solidário se torna natural.

Um sinal mínimo seria como o daquela criança pobre que re-cebeu uma barra de chocolate. Quebrou-a pela metade e disse: “esta outra parte é para meu irmãozinho”. A criança já tinha entendido que ela seria feliz e conviveria bem na partilha de tudo com o menor. Cultura da solidariedade viceja lá onde os si-nais internos e externos da nossa existência apontam primeiro para o movimento de cooperação, de integração da comunidade.

Solidariedade de fato é mais do que prestar serviços ao ou-tro: é um tipo especial de rela-cionamento social. É um dom que não se manifesta apenas

em palavras, mas principal-mente em atitudes.

Mas nos dias atuais, solida-riedade pode ser considerada uma virtude, porque quem a vive contrapõe a lógica do siste-ma em que vivemos. Para viver-mos num contexto onde a soli-dariedade “impere”, é necessário negar diversos elementos impos-tos pelo sistema capitalista, tais como: o consumismo, a compe-tição, o egoísmo, a destruição do meio ambiente, entre outros.

Por tudo isso, podemos afir-mar que para a Ação Solidária Madre Cristina a solidariedade é um elemento básico para a construção do novo, onde só a boa vontade não é suficiente, pois ela é mais que doar o que sobra, é doar também o que nos pode fazer falta, por enten-der que o ser humano tem essa possibilidade de permitir que to-dos os povos tenham o direito de satisfazer suas necessidades, mesmo que isso dependa da ajuda e da participação solidária de todos.

Uma experiência de Solidariedade

Pensar e concretizar ações de solidárias a partir dos em-pobrecidos e excluídos é pen-sar ações que sejam capazes de resgatar a dignidades des-tes, ou seja, garantir que os excluídos e esquecidos possam ter, em primeiro lugar, as con-dições reais para continuar so-brevivendo, ou seja, trabalho, comida, lazer, cultura.

Este desafio, em tempo de um mundo cada dia mais indi-vidualizado, nos exige pensar uma economia solidária que contribua para a superação desta economia “divisória” e excludente do sistema capi-talista. Na oportunidade des-te artigo, partilhamos uma iniciativa que contribui para construção desta economia solidária: é a Campanha da Coleta de Óleo de Cozinha.

Esta é uma iniciativa que está sendo realizada na região

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31metropolitana de Porto Alegre e tem os objetivos de contri-buir com a limpeza e preser-vação do meio ambiente e ajudar a viabilizar a realização de projetos sociais com índios, jovens urbanos em situações de riscos, quilombolas, cata-dores, entre outros.

A campanha acontece em parceria com uma cooperati-va de pequenos agricultores – COOPERFUMOS - e com o Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA. Ambas as organizações desenvolveram juntas, um centro de pesquisa e formação em energias reno-váveis e bioconstrução.

Na área de 40 hectares, lo-calizada na zona rural do mu-nicípio de Santa Cruz do Sul, há um centro de formação com auditórios, alojamentos, refeitórios todos construídos a partir da bioconstrução, isto é, com técnicas de construção que utilizam terra, água e ma-deira. Esta é uma alternativa de construção viável para pe-quenos agricultores que dis-põem destes recursos naturais em suas propriedades.

Também nesta área está instalada uma usina de álco-ol e uma usina de biodiesel. Esta última possui capacidade para produzir 30 mil litros de Biodiesel por mês, a partir da extração de óleo de algumas plantas oleaginosas como a semente de girrasol, o tunge, a mamona e também a partir da reciclagem de óleo de cozinha saturado.

A Ação Solidária Madre Cristina, organiza a coleta de óleo disponibilizando tonéis

e matérias de conscientiza-ção em diferentes pontos das cidades, como nos restauran-tes, bares, escolas, paróquias, galpões de reciclagem, entre outros. Após a colocação dos tonéis para a coleta, o óleo é recolhido mensalmente e en-viado para a Usina de Biodiesel em Santa Cruz do Sul.

O Biodiesel produzido na usina é destinado para abaste-cer as pequenas propriedades dos agricultores e os cami-nhões, que fazem o transporte da produção que chega para as famílias carentes, benecifiadas pelo Programa de Aquisição de Alimentos do governo federal.

O óleo destinado à Coope-rativa é revertido em recursos financeiros que viabilizam a realização de outros projetos desenvolvidos pela Ação Soli-dária Madre Cristina, entre es-tes, a construção de casa para famílias guaranis, a realização de oficinas de capacitação com jovens pobres que vivem em situações de riscos, ajuda aos catadores na manutenção de carros de coletas entre ou-

tros.Esta é uma campanha que

visa a beneficiar muitas pesso-as, a partir de uma rede soli-dária. Inicia com a doação do óleo que, na maior parte das residências, não se sabe que destino dar. Chega até as pe-quenas propriedades de agri-cultores como biodiesel o que ajuda a diminuir o custo da produção, produção esta que irá beneficia famílias caren-tes, as quais recebem produtos de boa qualidade, na maioria ecológicos. Nossa tarefa, como Ação Solidária Madre Cristina é continuar criando redes e frentes de solidariedade como esta que sejam capazes de ani-mar pessoas e envolvê-las para que animem outras pessoas a repetirem, ampliarem o gesto da partilha, quando se colo-carem a serviço, sem esperar nada em troca. É, pois, neste sentido que a Ação Solidá-ria Madre Cristina convida as pessoas a cultivar este dom maravilhoso que está presente em cada um de nós que é a solidariedade.

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Muito se tem falado, nos últi-mos meses, sobre EPS face ao tema da CFE 2010 “Não se pode servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24). As-sim, pensamos também em apre-sentar nossa pequena contribui-ção, relacionando o assunto mais diretamente à sociedade atual. Pensamos, porém, não ser possível falar em sociedade contemporânea sem um, ainda que rápido giro so-bre como se podem entender pós-modernidade e globalização.

O ficcionista, poeta e ensaísta paranaense, Jair Ferreira dos San-tos, entende que o pós-modernis-mo é um ecletismo, isto é, mistura várias tendências e estilos, abri-

gados sob o mesmo nome. Para ele, o pós-modernismo não tem unidade; é aberto, plural e muda de aspecto se passamos da ciência tecnológica para as artes plásticas, da sociedade para a filosofia, da educação para a medicina. De fato, essas misturas mencionadas por Santos acabaram por invadir o co-tidiano de todos nós, com a tecno-logia eletrônica, com informações, serviços e diversões que preenchem grande parte do campo de com-preensão da realidade que permeia existência das pessoas. É evidente o quanto, hoje, lidamos mais com signos (simbólico) do que com coi-sas propriamente ditas...

ir. margaret r. godoy*

a possibilidade de desmonte de um sistema que mata

* mestre em linguística

1. conhecida como eps

2. santos, jair Ferreira dos. o que é o

pós-moderno. rio: brasiliense, 1986.

Economia Popular Solidária¹

CRÔNICA

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Agora, um chip, um mi-croprocessador do tamanho de um confete, está mos-trando como somos diu-turnamente programados e condicionados em algumas de nossas atividades mais simples... A pós-modernida-de passeia livremente pelo ávido mercado, à cata de cada pessoa isoladamente, até enredá-la na sua arma-dilha hedonista, cujos valo-res, calcados no prazer do ter e do usar, propõem um estilo de vida do qual emer-gem idéias como o nada, o vazio, a ausência de sentido para vida...

Ao lado disso tudo, nes-te tempo insinuado como senDo de pós-modernidade, o processo de globalização vem mascarando as rela-ções de desigualdade entre os países ricos e os países periféricos, o que provoca o afastamento do Estado das suas responsabilidades primárias, entrando num contexto de Estado “mini-malista”, dependente das políticas dos países “ri-cos”. O mesmo se dá entre as pessoas individualmen-te, entre grupos... as desi-gualdades se acentuam e a dependência dos que não sabem com relação aos que

sabem, dos que não podem tomar decisões em relação aos que podem, dos que falam errado em relação aos que falam certo etc, se acentua, aumentando verti-ginosamente o abismo que os separa ...

É nesse contexto, de ex-clusão determinista, que a Economia Popular Solidária surge, diríamos na contra-mão, representada por um conjunto de iniciativas ins-piradas em valores que co-locam o ser humano como sujeito no processo da vida e na atividade econômi-ca, em vez da acumulação de capital. Isso pressupõe mudanças importantes no mundo do trabalho, incen-tivando a eqüidade, a de-mocracia, a cooperação, a solidariedade e a qualidade das relações no trabalho. Compreende uma grande diversidade de práticas eco-nômicas e sociais - de pro-dução, distribuição, finan-ças, trocas, comércio, con-sumo, poupança e crédito - organizados sob a forma de autogestão.

As iniciativas são inúme-ras em todo o mundo, em-bora haja grupos fortemen-te armados para torná-las invisíveis. Estas empresas

se utilizam de valores tais como o bem da organi-zação e a não sujeição às ambições pessoais, o dis-curso e a prática honestos; valores que têm seu foco em praticar a justiça e que têm a coragem de propor o desmonte de uma estru-tura inteira para refazê-la de modo diferente, se for necessário; que propõe a flexibilidade e a prontidão a ceder quando encon-tra um plano melhor... é possível, pois, uma visão sistêmica de novos para-digmas, que nos permi-tam a inserção em outro mundo, numa nova “glo-balização”, com uma ou-tra percepção da história em que se incluam outros modos de apreciação de nós mesmos como pessoas e nossa situação junto às nossas comunidades, na-ções e ao próprio plane-ta... E, se a realização da história, a partir dos veto-res “de cima”, é ainda do-minante, a realização de uma outra história – EPS, que já viceja soberana – a partir dos vetores “de bai-xo” é tornada possível! E esta possibilidade é a que antevemos para construir uma história renovada.

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Tendo sido desafiado a produzir um texto sobre o papel do acompanhamento a grupos juvenis que estão or-ganizados em grupos de eco-nomia solidária, como é o caso de jovens de nossa ONG, a Trilha Cidadã, me deparei com uma dificuldade inicial para não repetir que já havia escrito em outro momento.

Então, após uma leitura es-piritual, fiquei envolvido com a passagem da “multiplicação dos pães” presente nos Evan-gelhos. De modo especial com a ideia do ter o que oferecer para que se possa encaminhar uma organização que sacie a fome da multidão.

Encontrei dois diferentes movimentos provocados por Jesus:

a) Passagem da ideia de

incapacidade – perante um desafio muito grande – para o esforço de partir do que se tem;

b) Passagem da ideia de multidão como realidade de dispersão, para a condição de povo organizado, possibilitan-do a organização do povo.

Pensei então: nossa! Este texto tem muito a ver com o tema da economia. E também com uma leitura que permite olhar para a realidade e pensar nas possibilidades de organi-zação. Pois a impressionante relação do “milagre/sinal” com o público, sempre expressando um número grande de pessoas presentes, com fome de Deus e de pão, revela aquilo que nós acompanhantes de vidas de jovens refletimos sobre as dimensões do projeto de vida e

o caminho para uma formação que contemple todas as di-mensões da pessoa do jovem.

É interessante este texto porque se coloca como anta-gonismo ao “banquete da cor-te do rei Herodes”, que gera a morte do profeta João Batis-ta, uma vez que denuncia as contradições da “corte”, com suas luxúrias, sua ganância e traições. E numa festa do pa-lácio certamente há abundân-cia de comida, muito além da quantidade necessária para os que dela participam; logo, o desperdício, a bebedeira, entre outras realidades, é parte da vida desta elite.

Percebi que esta passagem, sem pormenorizar seus aspec-tos literários, está nos quatro Evangelhos - e em Mateus e Marcos está em dois relatos.

pe. edson andré cunha thomassim, fabn*

* ong trilha cidadã, pároco da rede de comunidades são joão batista, assessor da pastoral da juventude na diocese de novo Hamburgo e no rs. contato: [email protected]

com base nos textos do evangelho: mt 14, 13-21; mt 15,32-39; mc 6, 30-44; mc 8, 1-9 lc 9, 10-17; jo 6,1-13

o desafio do ministério do acompanhamento de jesus e o olhar para uma economia que gera solidariedade e encantamento de vida.

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Notei que é provocadora a di-nâmica catequética deste tex-to, principalmente na ideia do número sete, como sugestão de oferta, ponto de partida para a solidariedade, e o seu resultado do número doze, como sinal da partilha que apresenta o excedente daqui-lo que não se desperdiça, mas se recolhe para que seja nova-mente solidarizado.

Sempre aprendi que este texto tem a ver com a orga-nização das comunidades pe-rante as necessidades do povo onde se está atuando. Mas agora gostaria de fazer uma caminhada pensando esta trí-plice realidade – economia, juventude e organização soli-dária.

Como vê Jesus a necessi-dade de sustento, do saciar a fome e dar de comer a todos?

Tendo Jesus se retirado com os seus discípulos para o deserto, com o propósito de refletir sobre os aconteci-mentos que levaram à morte de João e percebendo que não há como sair da realidade, pois a multidão de pessoas, que é

real, vai ao seu encontro, se questiona sobre o que deve-ria fazer para saciar a fome destes. É claro que a multi-dão ainda hoje está faminta de muitos tipos de alimentos. Assim também, a juventude se coloca na condição de cresci-mento, de desenvolvimento e aprendizado, de descoberta da vida como possibilidade ou como ameaça. É daí que vem a necessidade de pensar a Campanha Nacional contra a Violência e o Extermínio de Jovens, pois a realidade, que deveria ser oportunidade para a juventude é aquela que ame-aça a sua vida.

Por isso, nos deparamos com várias realidades que cla-mam nossa percepção como acompanhantes da juventude:

Desigualdade: Nossa ju-ventude vive, como toda a po-pulação, a realidade do local onde mora. As questões de gê-nero, a cor da pele e condição de responsabilidade perante a família necessariamente apre-sentam os disparates de desi-gualdades em que a maioria da juventude brasileira se encon-tra, situação na qual, de fato,

mergulha como uma multidão dispersa e faminta, buscando de diferentes maneiras, saciar a sua fome.

Liberalismo: O modelo econômico vigente está mar-cado pela ideia de que cada um tem a mesma condição de se dar bem na vida. Basta esforço! Por isso, o liberalis-mo caracteriza as condições de desigualdade como falta de sucesso dos jovens na vida, em que suas escolhas são cer-tas ou erradas, porque tudo é meramente um problema do individuo.

Mercado – lucro – concor-rência: A grande arma deste liberalismo é a sacralização do mercado como local mais eficaz para o desenvolvimen-to dos potenciais individuais, fortalecendo aqueles que sa-bem fazer as “escolhas certas”. E neste caso, certo é o jogo do lucro, como prêmio para aqueles que sabem jogar efi-cazmente com a concorrência. Por isso um jovem bom é um jovem de iniciativa, de ousa-dia, que sabe as qualidades empreendedoras para “se dar bem na vida”, mesmo que isso

o desafio do ministério do acompanhamento de jesus e o olhar para uma economia que gera solidariedade e encantamento de vida.

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36 lhe acarrete renúncias. Por exemplo, ter que renunciar aos amigos, ao convívio familiar, ao tempo livre.

Consumismo: A recompen-sa para o jovem que assume como pseudo-dignidade o va-lor do mercado, é que, sendo um gerador de lucro, poderá ser um virtuoso colaborador para a engrenagem do con-sumo, tendo direito a todos os benefícios e prazeres que a tarefa de consumir lhe propor-ciona.

Moda – padrões estéti-cos e comportamentais: Tal recompensa lhe possibilitará estar inserido ao simbolismo máximo da eficiência de toda engrenagem liberal, quer di-zer, estar de acordo com os padrões estéticos e compor-tamentais que a “democracia” de mercado lhe proporciona. Tudo na vida de cada cidadão, de modo especial dos mais jovens, pode ser encontra-do para a sua satisfação, dos objetos às terapias, do mode-lo alimentar ao lazer no raro tempo livre, disponível. In-clusive no que diz respeito ao modelo de religiosidade.

Desencanto da vida: Há uma multidão dispersa e se-denta, faminta de muitos tipos de pães, que não vai participar desta “maravilha” que o siste-ma lhe propõe. Pois o que se vê de fato, é uma parte da rea-lidade. Mas Jesus vê para além da realidade “palaciana” – que lhe colocaria, inclusive num messianismo temporário que não modificaria a lógica de so-ciedade. E por isso, Jesus vê a multidão jovem que, conscien-

te de sua fragilidade, entra no ciclo de desilusão, por jamais corresponder aos apelos que a sociedade lhe impõe como modelo de vida.

Violação e violência: E tendo os seus direitos viola-dos, reage no que lhe resta como possibilidade de vida, com violência. Aqui se trata de uma constatação no meio de uma multidão não orga-nizada, onde necessariamente há grupos em conflitos. Por isso, nossa população jovem, pobre, de periferia, sendo uma multidão dispersa e faminta, que deseja valores de vida, mas não se encontra dentro dos padrões que o modelo de sociedade projeta para ela, re-age dentro de suas contradi-ções agressivamente. E é neste horizonte que podemos ver inclusive a forte influência do tráfico de drogas como uma brecha no sistema, que lhe oportuniza uma vivência dos valores negados.

Jesus tem compaixão de toda esta gente, porque são ovelhas sem pastor.

Em alguns dos relatos da multiplicação dos pães, Jesus está há três dias com o povo no deserto. Este pode signi-ficar o tempo de estar junto para ver e sentir a realidade do povo. Não apenas uma cons-tatação, mas poder sentir re-almente os desafios do povo. Por isso a ideia da compaixão com o povo. No caso da ju-ventude, é necessário perceber os sinais da realidade e ter a capacidade de estar junto à “paixão” de vida que os jovens vivem em todos os sentidos:

paixão de amor e de dor, sofri-mentos, inclusive pelo horror de tantas vidas exterminadas pela violência.

E onde estão aqueles que deveriam lhe dar as garantias de direitos? Onde estão aque-les que, como os pastores, cuidam das ovelhas para que não sofram riscos de vida, de-veriam oportunizar perspecti-vas seguras para o realização e felicidade de vida? Será a so-ciedade? As instituições como a Escola, as Igrejas, ONGs? E o Estado, com seus governos?

Cenário atual da falta de acompanhamento:

A certeza que temos é a de que para esta multidão jovem presente em nossa socieda-de, há, sim, a falta de muitos acompanhantes de vida. Em qualquer que seja a área de atuação, a maioria não tem o apoio, e até a proteção, neces-sários para a realização de seus projetos de vida.

Falta de pessoas que acom-panhem a vida da juventude: Temos uma grande dificulda-de de conseguir mais pessoas que se disponham a acompa-nhar a juventude, que se colo-quem de fato, ao lado da vida de tantos jovens que buscam, muitas vezes intuitivamente, alternativas por mais ingênuas que sejam, de ser grupo, e se realizarem como tal.

Muitos dos que estão junto à juventude, não têm clareza do seu papel de acompanha-mento: Por outro lado, vemos também a realidade de pessoas adultas, que ao se colocarem na tarefa de acompanhan-tes, perdem-se na clareza de

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37sua responsabilidade, às ve-zes disputando espaço com os “acompanhados” ou até mesmo, lhes impondo mo-delos que vêm de cima para baixo, não dialogando com a perspectiva de que todo o acompanhamento é processo. E processo é relacional, dialó-gico e dinâmico, não podendo haver fórmulas prontas, rigo-rismo institucional e impo-sição de valores. Pois sempre há uma perspectiva histórica e aberta para que se faça o ca-minho do acompanhamento.

As estruturas organizativas não disponibilizam gente para o acompanhamento: Quando as instituições estão presas a esquemas muito fechados, em nome de determinadas delibe-rações e acúmulos estruturais – como patrimônios, títulos... – não é fácil perceber que o acompanhamento é a tarefa educativa mais importante, pois sendo educação é passível de mudança, de dinamicida-

des, de vivências e possibilida-des novas. Os sujeitos do fazer educativo rompem necessa-riamente com os esquemas fechados. Do contrário não é educação do que quer que seja. E isso incomoda as estru-turas muito amarradas.

“O que temos não é nada para toda esta gente e o local é deserto, e não temos dinhei-ro para comprar comida para toda a multidão.”

E claro que a reação ime-diata de todo acompanhante de jovens e de organização que se propõem a fazer pro-cesso coerente (ou não) vem carregada de diversos senti-mentos básicos que, por vezes, nos colocam numa posição de alerta sobre os riscos que se correm.

Impotência: Um primeiro sentimento que temos é o de impotência. Nos sentimos in-capazes de alterar esta realida-de e de vermos alternativas. A fragilidade nos dá a sensação

de que não somos capazes de encarar os desafios presentes na realidade de luta da juven-tude.

Medo – insegurança: Outra face de nossos sentimentos é o medo, de modo especial no trabalho com a juventude: temos medo de perceber que o novo nos desestabiliza. E é próprio do jovem nos colocar na vitrine do problema, es-perando que de nós também saia alguma contribuição para a sua vida. Inseguros, temos medo de lidar com os ques-tionamentos, as indagação e até mesmo as acusações que a realidade juvenil nos coloca face a face.

Comodismo: Vemos muitos problemas. Até teríamos pos-sibilidade de colaborar, mas é mais fácil “deixar como está”, “não ter que se envolver”, por puro comodismo. Comodismo esse presente em muitas tare-fas educativas, em organiza-ções que poderiam colaborar

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38 mais com o acompanhamen-to da organização e da vida da juventude, mas há tanta coisa que no dia a dia tanto “puxa para trás” que acaba sendo “melhor deixar assim”. “Que pena! Jovens morrem, uma barbaridade, mas fazer o quê?” “Eu não vou me dar o trabalho de ir atrás... “

Preocupação sem ação: Aliada ao comodismo está a realidade daqueles que até se preocupam, mas não con-seguem agir. Ou então não agem por que é mais fácil fa-lar: “precisamos cuidar mais da juventude e acompanhá-la mais, mas não faço nada”.

Marasmo militante: Muitas lideranças que atuaram ativa-mente na defesa do direito e das diversas formas de atuação da rapaziada, hoje se encon-tram desanimados, vivendo uma vida “sossegada”, garan-tindo “o seu”, e não se dis-pondo a fazer nada. Quando perguntados até sabem bem do processo de caminhada, na defesa da vida da juventu-de, mas não estão disponíveis para se envolver.

Deslocamento de olhar – “não ver para não pesar na consciência”: Há também aqueles que já nem se dispõem a ver a realidade gritante, que clama por quem dê uma opor-tunidade de ser manifestada. Preferem não olhar a realidade, desviando o olhar para outras necessidades e vontades. São aqueles que se concentram em mundos muito fechados, evi-tando o comprometimento. É comum em nós padres, por exemplo, ficarmos presos em

nossos ativismos paroquiais e não dar atenção aos jovens que pedem apoio. Ou então intelectuais na academia que não podem dar atenção, por-que se não perdem a sua capa-cidade intecto-produtiva. São aqueles sabem muito bem o peso da consciência quando se dá tempo para ver a realidade da juventude à nossa volta, ou do povo em geral que clama por nosso compromisso.

7. Fatalismo – não vai mu-dar: Há aqueles que preferem dizer que é uma utopia, não vale a pena mexer em algumas realidades, pois “é muito com-plicado”. “Não vai mudar”. “A casa já caiu”. “A meninada já caiu nas drogas”. “Estão todos perdidos”. “Nós não vamos mudar mais isso”. “É melhor nem se envolver...” . ”Fazer o quê?”

Porém, para aqueles que

buscam caminhar na perspec-tiva de Jesus como colabora-dores do Reino, que aceitam o desafio, estes discursos ferem diretamente o projeto. Por isso, relacionando as temáticas da juventude e economia é ne-cessário perpassar por alguns princípios fundamentais:

Princípios de Economia na lógica do Reino:

Economia como necessida-de: A ideia de economia tem que estar relacionada com a necessidade de vida das pes-soas. Não dá para falar de dinheiro, ou recursos, para a juventude, se não for dire-tamente relacionada com a garantia de suas necessidades

para uma vida digna, para a garantia de seus direitos fun-damentais – moradia, alimen-tação, educação, roupa, tempo livre, cultura...

Economia como possibili-dade de serviço: A economia, embora seja muito comple-xa em sua especificidade, é uma atividade humana fun-damental, por isso não pode ser a mestra organizativa da realidade social, mas estar a serviço das demais realidades de vida. No que se refere ao universo juvenil, a possibili-dade de sustentabilidade deve ser o que nos move, como a luta por vida e não por ganhar dinheiro a qualquer custo, pois isso não garante a realização de seu projeto de vida.

Economia como oferta, ge-nerosidade: As relações econô-micas não podem, fatalmente, ser o ônus que se carrega para garantir o equilíbrio social. Mas devem ser o modo que a sociedade tem de pensar o conjunto de suas necessidades e possibilidades. Por isso, falar em economia tem a ver com a oferta nossa para que a so-ciedade dê conta das diferen-tes necessidades. Mas isso só será possível se a realidade da macro-economia for alterada.

Economia como organi-zação comunitária: A dimen-são comunitária da economia é fundamental para inverter a lógica da economia liberal. Como pensar em experiências e práticas comunitárias da economia? Compondo outros referenciais para os processos produtivos e de relação com as necessidades de consumo,

ASSESSORIA

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39passando da necessidade do indivíduo para o paradigma da realização pela possibilidade e felicidade de todos.

Economia como partilha: Partilhar é uma dimensão fun-damental do Evangelho no campo da organização e vi-vência do povo, ao ponto de este texto da multiplicação dos pães colocar esta experi-ência, a da partilha, como algo fundamental para a organiza-ção do povo e para saciar as suas necessidades.

Economia como liturgia da vida: A economia não pode ser vista como diabólica, mas sim como simbóli-ca. E, neste sentido, pode-se dizer que a economia apresen-ta em sua realida-de uma liturgia da convivência huma-na que manifesta a vida. É claro que não dizemos isto em relação à economia do li-vre mercado, que, como vimos mais ao início deste artigo, é geradora de morte, principal-mente pela primazia de um individualismo anti-comunitá-rio. Mas se entendermos esta ideia de liturgia como o con-junto de vivências que garan-tem o atendimento das neces-sidades básicas de cada pessoa que participa da experiência comunitária, aí acontece a justiça plena, no exercício do cuidado com os outros, como possibilidade solidária. E isso é sagrado, e o Divino está aí.

Economia como sobra e não lucro, nem lixo – mas,

equilíbrio das forças de vida: A economia vai para além do monetário, do dinheiro. Ca-minha para a administração, o cuidado da vida. Economia como modo de passar das re-lações possíveis de estabilida-de e de pensar o bem e não o patrimônio acumulativo, subsistência e necessidades, não acúmulo e posse. Trata-se aqui do confronto com os dois banquetes, o de Herodes e o da partilha de Jesus. Por isso, vemos justamente esta relação de forças contrárias que se

expressam na consciência hu-manitária e ecológica em que não há a criação do que divide as pessoas e gera a ganância, neste caso o lucro, mas, por sua possibilidade de suprimir as futilidades de consumo, a geração irresponsável de lixo e o esbanjamento desenfrea-do dos recursos e dos bens de consumo.

Quem será este menino que apresenta 5 pães e 2 pei-xes em meio à multidão?

Dentro do texto da multi-plicação dos pães, vemos que no Evangelho de João, os cin-co pães e os dois peixes são

apresentados por um menino anunciado pelo apóstolo Feli-pe. Creio que aí está uma boa chave de leitura do papel do Acompanhante da Juventude: é papel daquele que acompa-nha perceber na realidade da juventude o que pode saciar a fome desta multidão.

Dialogar com a realidade da Juventude:

Economia – sustentabilida-de: A realidade econômica cria necessidades. Mas, como an-teriormente já foi explicitado,

é necessário identifi-car a realidade eco-nômica de grupos juvenis concretos e perceber quais são os aspectos funda-mentais para a sus-tentabilidade como garantia do direito à vida. Pensar para além do supérfluo, do consumo. Ouve-se por aí o discurso

de que a meninada tem o di-reito a querer o tênis de mar-ca, “a querer isso ou aquilo”, e que isso faz parte do jeito de ser da juventude. No meu modo de ver, a juventude tem direito à beleza, à coisas boas, mas é necessário diálogo, em espírito educativo: de que tipo de beleza se está falando? Que noção de coisas boas se tem? Pois, com este tipo de realida-de pode-se estar destruindo valores da história e deixando-se envolver por qualquer pu-blicidade que se coloque como a onda da vez. E a sustentabi-lidade passa a ser suporte de superficialidades.

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40 Jovens – relação com o di-nheiro: É necessário conhecer o modo como os jovens lidam com o dinheiro, sendo impres-cindível identificar a maneira como cada um consome as coisas, utilizando o seu escas-so recurso.

Jovens – modelo de vida: É fundamental superar a fal-sa expectativa de vida que se tem a partir dos diferentes padrões que são apresenta-dos aos jovens. Os meios de comunicação em geral repro-duzem determinados mode-los juvenis, sendo espécies de formas, onde os demais devem ser moldados. Daí busca-se determinado tipo de roupa, celular, carro.... E quando não se tem recurso? Outras formas podem ser adquiridas. Mas o papel daquele que acompanha

a vida da juventude é propor novos modos de se relacionar com as necessidades, discer-nindo em três dimensões bási-cas: o que é necessário, o que é importante e o que é desne-cessário, tendo em mente que cada jovem constrói um itine-rário de vida.

Jovens – perspectiva co-munitária: Um dos maiores desafios no universo juvenil é a garantia de uma vivência comunitária que seja para a realidade da vida, para a felici-dade. Daí o sentido do ser gru-po. Esta experiência possibilita aos jovens fazerem o caminho da vivência da diversidade e da co-responsabilidade.

Jovens – sustentabilidade compartilhada: Fruto da pers-pectiva comunitária surge a dimensão da sustentabilidade

compartilhada, na qual não é possível pensar a sustentabi-lidade individual, mas a cons-trução coletiva de condições dignas para todos.

“Dai-lhes vós mesmos de comer – Como? Apenas com cinco pães e dois peixes”

O apelo anterior de Jesus é o de que se faça uma experi-ência de organizar as pessoas para superarem suas dificul-dades. Superando dos grandes riscos no acompanhamento:

A visão assistencialista/pa-

ternalista: Fazer pela juventu-de, sem que ela possa ser su-jeito de seu processo, até por achamos que os jovens não serão capazes de fazer sem a nossa participação.

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41A visão espontaneísta: É ver o processo de qualquer modo. Deixar o rumo seguir de maneira desordenada, sem o real comprometimento do acompanhante. Até há um bom relacionamento, mas não há consistência no trabalho.

A fartura do Reino em 12 cestos de pedaços de pães.

Para finalizar, toda expe-riência solidária tem que fazer a diferença, pois é da natureza da solidariedade o compro-misso com as outras pessoas. E toda vez que a solidariedade e o compromisso com a justi-ça são paradigmas para a vida fraterna, então há o Reino de Deus, e acontece com apenas os cinco pães e os dois peixes.

Criação de grupos de eco-nomia popular solidária de jovens: Todo gesto solidário protagonizado pela juventu-de é um gesto que fortalece uma nova cultura econômica. E toda participação juvenil na perspectiva de uma nova eco-nomia é uma ação transforma-dora do mundo.

Buscar fortalecer as habili-dades da rapaziada: Reconhe-cer que na juventude está a possibilidade para a constru-ção de uma cultura mais soli-dária, pois esta carrega em si o horizonte de uma nova cultura para o bem comum.

Incentivar as redes de tro-cas juvenis – bens e saberes: que os jovens descubram em diferentes espaços os grupos de troca, onde o exercício da generosidade seja valorizado.

Trabalho em rede – espírito organizativo relacional e não

fechado: Um trabalho em rede, não fechado, mas em diálogo, onde as outras experiências se manifestem como riqueza, para a construção de novos traba-lhos e ampliação dos horizon-tes de possibilidade de mudan-ça de realidades concretas.

Mobilizar para as possibi-lidades de intercâmbios: Valo-rizar os jovens a descobrirem outras realidades, nas quais se oportunizam novas relações, outros mundos, vendo e vi-vendo a diversidade.

Monitorar as vivências co-letivas juvenis: Todo acompa-nhante da juventude é con-vidado a fazer experiência de trabalho coletivo, fortalecendo o aprendizado e a sociabilidade.

Efetivos e afetivos no pro-cesso: Que os trabalhos sejam sempre encarados como parte de um processo de construção para a realização de vida.

Fraterno, mas seguros e não “bobos alegres”: Que as organizações juvenis se des-cubram como portadores de identidades e tenham segu-rança desta, não correndo atrás de cada modismo que se apresenta por aí.

Engajamento nas lutas maiores: Toda iniciativa com os jovens não pode estar iso-lada, devendo estar compro-metida com outras lutas na construção de outro mundo possível.

Estabilidade integral e não só remunerativa: As iniciativas de economia alternativa com a juventude não sejam somente financeiristas, mas tenham em vista a realização integral de cada jovem, caminhando para além de lucratividade, pensan-

do o seu bem-estar.Místicos – misteriosos

– devotos: Trabalhar com a juventude exige sempre, de quem acompanha a possibili-dade de fazer o encontro com uma força muito maior do que a mera responsabilidade com tal trabalho; mas é necessário ter uma mística que conduza sempre para um imperativo ético e comprometido com a vida e com força divina que se expressa em toda realidade em que pulsa o sopro da dignida-de. Aí é possível falar de uma nova realidade econômica.

Transcendentes na trans-cendência: Da relação de quem tem uma atitude de vi-vência do sagrado brota a pos-sibilidade de formar pessoas que, ao se relacionarem com o Totalmente Outro - Deus, manifestem a realidade de se tornarem novos “outros” que possibilitem a presença deste Deus que tem compaixão pela vida das pessoas. Pois o Reino acontece quando nos torna-mos seus seguidores, e acei-tamos as consequências de tal seguimento.

Como disse no início, são apenas intuições que devem corresponder com a sacralida-de da vida e do novo que pulsa no nosso caminhar. Somos de-safiados a também apresentar os nossos “cinco pães e dois peixes” para acontecer a graça do acompanhamento juvenil e convidar a juventude a fa-zer o mesmo, buscando novas formas de relações humanas, inclusive com as questões da sustentabilidade, da economia e, por consequência, de seus modelos de vida.

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Em nossos registros histó-ricos, os primeiros passos para a criação do CMJ de Colatina, foram dados no ano de 1996. No espaço em que hoje atu-amos, funcionou o juventato, onde eram preparados os jo-vens vocacionados para futu-ramente servirem como Irmãos Maristas. Sendo desativado o espaço, surgiu a idéia de que esse lugar, devido a toda sua infraestrutura, poderia se tor-nar um local de referência para formação de lideranças jovens.

Os Irmãos Israel Poste e Vi-tor Pravato deram o “pontapé inicial” para a criação do Cen-tro, convocando representan-tes do Colégio Marista, Pas-toral da Juventude e outros movimentos que trabalhavam com a juventude para estru-turar o projeto. Após algumas reuniões, surgiram duas pro-postas: deixar o espaço sob a responsabilidade do Colégio e cedê-lo nos finais de semana para as atividades da juventu-de, ou transformar o local em um ponto de referência para

os jovens, podendo ser utili-zado pelo Colégio durante a semana – esse espaço se cha-maria Casa da Juventude.

A segunda proposta defini-da pela PJ ganhou força com o apoio do então Provincial Ir. Gentil Paganotto, e do então Bispo da Diocese de Colatina D. Geraldo Lírio Rocha. Além das reformas no local, foi for-mada a equipe de voluntários para coordenar e assessorar o espaço de formação espiritual, pastoral e sócio-política para jovens com idade entre 15 e 30 anos, ligados à PJ, Pastoral Vocacional e a outras iniciati-vas da igreja e do Colégio.

Num primeiro momento o lugar foi batizado como “Casa da Juventude”, com a sigla CAJU. O próprio nome acolhia e convidava os jovens a sen-tirem-se em casa. A CAJU foi inaugurada em 17 de Agosto de 1996, com uma missa cele-brada por D. Geraldo, contan-do com a presença dos Irmãos, dos assessores e de todos os participantes do processo de

construção, a fim de manifes-tarem a alegria e manterem vivas e atuantes as manifesta-ções da juventude que, a partir de então, teriam um espaço de referência para desenvolverem o projeto de evangelização e de formação dos jovens na Diocese de Colatina.

Os trabalhos do Centro Marista de Juventude são re-alizados por meio de projetos desenvolvidos e elaborados com o apoio de toda equipe de assessores, contando com sua formação espiritual e dis-ponibilidade para servir a ju-ventude.

OPÇÕES PEDAGÓGICO-PASTORAIS:

Foco de nosso trabalho é a realidade dos jovens

O Centro Marista de Ju-ventude de Colatina, nasceu a partir da necessidade de formação e de capacitação de líderes jovens e de assessores de diversos grupos do norte do Espírito Santo. Neste ano de 2009 completamos 14 anos, e desde a nossa fundação mar-camos presença na caminhada das juventudes desta diocese.

ir. carlos Henrique da silva, Fms*

UM POUCO DE NOSSA HISTÓRIA...

*diretor do centro marista de juventude de colatina

CENTRO MARISTADE JUVENTUDE DE COLATINA

CENTROS E INSTITUTOS

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43Hoje oferecemos cursos e ofi-cinas nas áreas de formação humana, social, política, cul-tural, ecológica, bíblico-teoló-gica, artística e em metodolo-gias de Educação Popular.

O foco de nosso trabalho é o mundo juvenil, com sua diversidade e pluralidade de expressões. Sensível ao nosso carisma Marista e aos apelos de nosso fundador, São Mar-celino Champangnat, vamos aos jovens onde estão, sempre com o olhar especial para os mais vulneráveis socialmente.

Participam de nossas ati-vidades, adolescentes e/ou jovens engajados em grupos eclesiais, sociais,e culturais. Atentos às necessidades das juventudes, tendo sempre em vista o protagonismo juvenil, buscamos em nossas ativida-

des, considerar os adolescen-tes e/ou jovens em todas as suas dimensões. Compreen-demos que nesse processo é fundamental, integrar o viven-cial e o teórico, fazendo rela-ção entre fé e vida, utilizando como eixos norteadores cinco princípios: espiritualidade, subjetividade, cidadania e so-lidariedade, missionariedade e ecologia integral.

Há 14 anos em Colatina, passamos por vários processos de mudanças e reestruturação. Nossa casa, que é hoje CMJ, já teve três nomes em sua histó-ria: CAJU- Casa da Juventude, CMP- Centro Marista de Pas-toral, e por fim, CMJ, Centro Marista de Juventude. Essas mudanças foram sempre em vista de dar continuidade e di-nâmica ao nosso trabalho.

AÇÃO SOCIAL NA LUTA PELOS DIREITOS DA JUVENTUDE

Seminário de discussão sobre as realidades juvenis

Vivemos em um mundo globalizado, onde a violência, a miséria, a exclusão social e outros fatores comprometem cada vez mais a vida de nossos jovens. É preciso que cada vez mais atuemos com o intuito de lutar por políticas públicas que garantam e efetivem os direitos das juventudes. Nesse processo, estamos ampliando nossos horizontes, desenvol-vendo projetos em parceria com organizações locais, par-ticipando de conselhos muni-cipais e de outros espaços de discussão cobre juventudes. Compreendemos também, que

Foto centro marista de juventude de colatina

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44 o trabalho em rede é funda-mental para fortalecermos nossas experiências e ampliar-mos nossos horizontes.

No contexto atual, além de buscarmos a excelência em pastoral e sermos referência em formação de juventudes, estamos focando nosso tra-balho em algumas iniciativas com as quais visamos à for-mação e à qualificação profis-sional, sócio-cultural, política e metodológica dos jovens e adolescentes. Dessa forma, objetivamos o desenvolvimen-to humano e a formação de li-deranças juvenis para atuarem em suas comunidades como agentes transformadores e protagonistas numa perspecti-va emancipadora e de contri-buição com o desenvolvimen-to local.

Como Centro de juven-tudes que tem compromisso com a vida e a luta para ga-rantir os direitos de nossos jovens, acreditamos que não é possível pensar em uma ação pastoral e evangelizadora, que

não passe pelo viés do social. Em sintonia com a CF 2010, que refletirá Economia e Vida, precisamos de cada vez mais, por meio de uma conscientiza-ção em nossa ação, junto com os jovens e adolescentes, assu-mir compromisso de lutar por uma economia a favor da vida, uma economia que busque o desenvolvimento sustentável, que nos ajude a criar políticas públicas, que garanta direitos básicos aos nossos jovens. A

constituição Federal em seu art. 5°, nos fala dos direitos e garantias fundamentais, asse-gura a todos nós o direito à vida, à saúde com qualidade, à alimentação, à educação, à cul-tura e ao lazer, ao salário digno entre outros. E fica a pergunta: por que isso não acontece?

Nosso maior desafio, em tempos de dificuldades, in-certezas e crise mundial, é nos capacitarmos e capacitar lideranças para que conscien-tes, se proponham a trabalhar numa perspectiva libertadora. Que o Deus da partilha, da abundância e da justiça social seja nossa força e nos encora-je cada vez mais junto com os nossos jovens, adolescentes e demais parceiros para sermos capazes de, numa perspectiva de libertação e promoção da vida, continuar lutando por políticas públicas e formar jovens que sejam sujeitos de direitos, capazes de criarem e recriarem seus direitos, sendo reconhecidos como membros ativos da sociedade.

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A Pastoral da Juventude Rural – PJR, serviço pastoral a serviço da juventude campo-nesa está articulada no Brasil desde o ano de 1983. Iniciou a organização da juventude camponesa no estado do Rio Grande do Sul e logo se es-palhou por este belo e imen-so Brasil. No estado de Goiás a PJR está articulada desde o ano de 1988. No princípio as atividades eram voltadas para a formação político pastoral da juventude camponesa.

Para entendermos o ob-jetivo dos GPR’s é preciso conhecer a realidade da ju-ventude que está no campo. A juventude camponesa não recebe incentivo dos poderes Executivo, Legislativo e Judi-ciário para a permanência no campo e nas pequenas cida-des. Os poderes não suprem as necessidades básicas da ju-ventude que está no campo, estes não recebem educação de qualidade e voltada para o campo. São inexistentes os

investimentos para a criação de oportunidades de trabalho e renda, sendo que a maioria dos jovens reside e trabalha com seus pais e não, necessa-riamente, participa da divisão da renda. Quando se trata de opções de lazer e cultura resta para uma minoria dos homens jogarem futebol nos povoados e para as mulheres assistirem ou/e sobra à juventude partici-

par das festas de devoção aos padroeiros/as nos povoados. Os índices de violência contra as juventudes que estão no campo e na cidade aumentam cada vez mais. Os eleitos pelo povo para serem nossas vozes nas instâncias representativas transformam as juventudes, vítimas deste contexto assom-brador, nos vilões da história. Mais uma: as principais víti-

os grupos de produção e resistência da pjr (goiás, tocantins e bahia)

“Só após a última árvore ser cortada, o último peixe ser pescado e o último rio ser poluído, só en-

tão, o homem (ser humano) verá que não se pode comer o dinheiro” (Cacique Seatler)

Experiência que gera vidasadriano lúcio de almeida*

*secretário estadual da pastoral da juventude rural de goiás, articulador do centro oeste e tocantins da pastoral da juventude rural, coordenador da campanha nacional contra a violência e o extermínio de jovens, promovida pelas pastorais de juventude do brasil, técnico em agropecuária – pela escola Família agrícola de orizona

PONTOS DE CULTURA

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46 mas deste modelo de socie-dade, que gera o êxodo rural, falta de oportunidade de tra-balho digno, falta de educação de qualidade, falta de espaços para lazer, desvalorização da cultura, dentre outros, são apontados como baderneiros, desinteressados com o futuro e precursores da violência.

Foi frente a essa realida-de que, em meados dos anos 2000, uma parceria foi firma-da entre a PJR de Goiás, a PJR do Tocantins e uma entidade espanhola, Manos Unidas. Tal parceria possibilitou a realiza-ção da 1ª Escola Regional de Formação Agroecológica que contou com a participação de mais de 40 (quarenta) jovens. Ao término da Escola os/as participantes afirmaram a ne-cessidade de desenvolverem nas suas comunidades/assen-

tamentos o conteúdo acu-mulado, desse modo a Escola seria marcante também na comunidade de cada um/uma.

A juventude da PJR está or-ganizada em diversas formas, uma delas são os GPR’s – Gru-pos de Produção e Resistência. A experiência do GPR iniciou no estado do Mato Grosso do Sul. A juventude organizada no grupo, além de reunir-se para estudo político pastoral, também produz seguindo os princípios da agroecologia.

No ano de 2008 a PJR dos estados de Goiás, Tocantins e Bahia firmaram com a Manos Unidas uma parceria, chama-da “Projeto Terra Livre Brasil” para a execução de 17 Grupos de Produção e Resistência nos três estados. Cada grupo pro-duz conforme a possibilidade de sua região, sempre diversi-

ficando a propriedade, conse-quentemente a renda dos/das jovens envolvidos. No ano de 2009 os grupos começaram a produzir e a comercializar seus produtos em feiras de peque-nos agricultores familiares, nos pequenos comércios e/ou na própria comunidade rural.

Os Grupos de Produção e Resistência são experiências que geram vida. Geram vida quando possibilitam a conti-nuidade de a juventude residir, trabalhar, viver e sobreviver no campo. Geram vida por dis-cutirem a realidade de cada comunidade, estado e país. Geram vida por ter como base a agroecologia, um jeito de produzir e de viver no campo. Geram vida por organizar a juventude camponesa em gru-pos e, consequentemente, na Igreja.

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Foto jovemcampones.spaceblog.com.br

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