revista ponto virgula

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1 ponto vírgula junho 2009

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revista ponto virgula

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1ponto vírgula junho 2009

junho 2009

Mutarelli

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PONTO DE VISTAEditorial

PONTO BLÁ BLÁSem papas na língua

PONTO DE INOVAÇÃOA chegada do Blue Ray

PONTO DO LEITORO que vocé quer ler?

PONTO DE DISCUSSÃOCrise! E agora?

MUTARELLI

CIDADE DIGITAL

PONTO DE EQUILÍBRIOBalada Sustentável

PONTO CULTURALPara ler

PONTO DE ENCONTROExposição do Rico Lins no Tomie Otaki

PONTO FINALFernando Luna

POEMA VISUAL

REFORMA ORTOGRÁFICA

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CORAGEM, CÂMERA E AÇÃO

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Bate papo com Clara Averbuck!

pág.10

Crise!!pag 14

pag 25

pag 16

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“Para ser o que sou hoje, fui vá-rios homens e, se volto a encon-trar-me com os homens que fui, não me envergonho deles.”

ponto de vista

A revista ponto vírgula acredita que existe vida in-teligente entre os jovens. Assuntos como cultura, arte, tecnologia e sustentabilidade são tratados em uma linguagem simples e jovial. Nós acredita-mos na troca de informações entre os jovens e na multiplicidade de pontos de vista.

A matéria de capa é sempre uma entrevista, organizada graficamente com uma nova lingua-gem artística. Nesta edição, o desenhista e escri-tor brasileiro Lourenço Mutarelli. O autor revela a sua trajetória no cinema, arte e literatura. Apesar de ser um artista considerado marginal, sua obra demonstra que as pessoas podem se interessar por pontos de vista diferentes e algumas vezes chocante, como aconteceu com a adaptação do seu livro “Cheiro do Ralo” para o cinema.

Nesta edição também você vai ler a matéria e ser informado sobre a Clara Averbuck, a chegada do Blue Ray e as consequência da crise na vida dos jovens.

Sendo assim, bem vindo a uma nova maneira de ver o mundo!

Graduação em Design

Escola Superior de Propaganda e Marketing

Língua Portuguesa III: Regina Ferreira da SilvaProjeto III (cultura e informação): Marise ChiricoMarketing II: Vivian StrehlauMódulo Cor | Sub-módulo Cor: Paula CsillagProdução Gráfica: Celso Collaro

Ana Carolina NovaesIsabelle RaineirePaula FiorettiLeif W. Magalhães

São Paulo Junho de 2009

[Goethe]

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Ana Carolina NovaesIsabelle RaineirePaula FiorettiLeif W. Magalhães

São Paulo Junho de 2009

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ponto blá blá

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A escritiora Clarah Averbuck traz a palavra polêmica tatuada em seu corpo, ao lado de outros tantos símbolos e desenhos tribais. Em poucos anos, afinal, tornou-se o primeiro grande ícone da literatura pop nacional a despertar taman-has reações extremas aos seus escritos. Muitos a amam e nunca se esquecem de dar uma pas-sadinha diária em seu blog, um dos campeões de visitas do gênero no país. Outros, sem dó nem piedade, massacram-na por causa de seu mé-todo não muito ortodoxo de inspiração: expor sem qualquer pudor ou vergonha sua vida louca vida, regada a muito rock, sexo e pensamentos contundentes. Revelada pelo extinto e cultuado e-zine gaúcho Cardoso On Line, Clarah optou por deixar Porto Alegre há menos de um ano e ir para São Paulo. Andando pelas ruas da maior cidade do país, ela topou com a Editora Conrad, que topou lançar seu primeiro livro. Em Máqui-na de Pinball, Clarah é Camila e Camila é Clarah. Sob um alterego nem tanto alter assim, ela cria uma personagem para revelar muito do que viveu recentemente, inclusive narrando seu encontro com os Strokes na Inglaterra.. Abonico R. Smith entrevistou Lady Averbuck. Sem papas na lín-gua, ela respondeu tudo na lata e ainda antecipou novidades de seu próximo livro.Clarah Averbuck: Faz parte de usar a própria vida como matéria-prima.

Qual é o limite entre a Clarah e a personagem Camila? Às vezes você se assusta na possibili-dade de uma passar a “interferir” na outra? Alterego significa “outro eu”. A Camila é uma parte

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de mim, mas as pessoas real-mente se recusam a entender que ela não é a Clarah. Eu con-trolo a Camila. Ela é minha per-sonagem, faz o que eu quero. Mas isso é proposital, faço para confundir os leitores mesmo. Funciona, como dá pra notar, mas também dá bastante inco-modação. Tudo bem, enchiam o saco do Bukowski e do Celine também. Faz parte de usar a própria vida como matéria-prima.

eu não tenho essa preocupação.Mas não me importo mesmo com críticas. Sem querer ser mala, mas tenho que citar o Leminski: “O primeiro person-agem que um escritor cria é ele mesmo. Só os imbecis procuram um eu atrás do texto literário. Em literatura, a própria “sin-ceridade” é apenas uma jogada de estilo. Um escritor medíocre não consegue ser “sincero”. Téc-nica, coração. Para ser sincero, é preciso dispor das técnicas que indiquem sinceridade.

Faz parte de usar a própria vida como matéria-prima.

Como você lida com a superex-posição de sua vida em fatos relatados no blog e no livro? Certamente atrai a contra-riedade de muita gente, que deve te achar exibida ou qualquer outro adjetivo pior. Ah, azar o de quem falar mal. Escrevo porque preciso. Quanto à exposição, bem, só exponho o que quero. Perco umas histórias muito boas por isso, às vezes pra preservar os envolvidos, outras pra preservar minha integridade física. Isso no blog. Nos livros

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Sem isso, a mais pura das ex-plosões verbais, a mais direta, a mais espontânea, será apenas mais uma manifestação de im-perícia literária. Um amontoado de bobagens que o tempo vai se encarregar de destinar ao lixo, onde jazem as ilusões.” Isso pode ser usado contra ou a favor da minha pessoa, depende na boca de quem estiver. No meu caso, com licença, é a favor. Sem contar que o livro vai ficar e todo mundo, inclusive eu, vai virar pó. Máquina de Pinball é bem curtinho. Em quanto tempo você escreveu o livro? Quando você esteve aqui em Curitiba, me disse que já estava com mais dois prontos. Demorei seis meses, de julho a dezembro. Na verdade, tem uma história curtinha pronta, Três Dias, e um livro novo, que é o Vida de Gato, mais ou menos do mesmo tamanho do Máquina.... Não tenho nenhuma preocupação com tamanho, o que eu quis no Vida... foi contar uma história. Quando acabou, acabou. Máqui-na... não tem exatamente uma história, mas quem disse que eu queria que tivesse?

Você é compulsiva por es-crever? Quanto tempo gasta diante do computador?

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Todo. Escrevo como uma malu-ca. Acordo pensando em pará-grafos e vou direto para o com-putador. Ainda mais agora que estou cobrindo férias de uma pessoa na MTV, no departa-mento de promo, fazendo vin-hetas e chamadas e essas coisas. Depois, quero começar um livro novo que está na minha cabeça.

Aparentemente um capítu-lo de Máquina de Pinball não possui ligação com o outro, apesar de alguns fatos ap-resentarem certa seqüência. Isso foi intencional? Eu não queria contar uma história. Queria que o leitor en-trasse na cabeça da Camila. Mas nada foi intencional, a não ser a parte de confundir o leitor com realidade/ficção. O livro se es-creveu sozinho, ao longo do que fui passando. Diferente do Vida de Gato, que era uma história que eu queria contar.

O que você já criou para as vinhetas da MTV? Do jeito que gira a sua cabeça, já de-vem ter saído muitas idéias...Ah, eu tô adorando. Fiz umas vinhetas legais,umas chamadas divertidas, sempre ironizando tudo, porque não dá pra fazer uma chamada para o The Calling sem ironizar, que eu não sou de ferro. Ando largando umas frases

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Acordo pensando em parágrafos e vou direto

para o computador.

em Latim no meio, que agora eu decidi que vou estudar Latim e italiano.

Você já é uma expoente da literatura junkie-pop nacional. O que acha de dividir estantes dos leitores com nomes como Charles Bu-kowski, Paulo Lemisnki e Nick Hornby? Eu acho ótimo, ora bolas. Como poderia não gos-tar? É muito legal ter o trabalho reconhecido, mesmo que seja através de opiniões equivocadas de jornalistas bobos... Porque antes de tudo, antes de qualquer coisa, eu sou escritora. Nasci assim e vou morrer assim. Porque ninguém vira escritor. Ou o cara se descobre, ou tenta virar e resulta em um mau escritor. Ninguém aprende a ter talen-to. Você se cansou de autografar cada exemplar de seu livro? Você acha que a numeração pode ser mesmo uma saída para o mercado de discos e liv-ros? Acho legal o lance de numeração. A gente fez aquilo porque disseram que era impossível assinar todos os exemplares. Impossível não é, é só cansa-tivo. Mas é o jeito de controlar a própria obra.

Carlos Eduardo Miranda (produtor, músico, jornalista) escreveu que você é uma garota com culhão. Você acha que esta sua mistura dosada de feminilidade (“sou uma mulher-zinha”, Camila diz no começo do livro) com agressividade é um pontos fortes para que o nome Clarah Averbuck atraia tantas opiniões pró e contra dos leitores? Talvez. Eu tenho personalidade forte desde que nasci, e pessoas assim não agradam a todos. E nunca foi minha intenção, de qualquer forma. Quem gostar, sensacional. E azar de quem resolv-er me julgar pelas tatuagens ou pelas coxas. Nelson Rodrigues dizia que considerava o impar-cial um monstro de circo de cavalinhos e um vi-garista. Eu também acho.

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ponto de discussão

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Crise! E agora?

Veja quais benefícios a

crise econômica pode

trazer para sua vida

Jovem leitor, deve-se comemo-rar este momento! Não existe melhor período para uma crise do que no começo de nossas vi-das de investidor. Temos muito tempo para transformar esses prejuízos temporários em lu-cro, ainda mais quando se sabe aproveitar as promoções do mercado para comprar empre-sas subvalorizadas.

Todos os dias pessoas se con-taminam pelas notícias do mer-cado e se desesperam. No fim, acabam esquecendo do óbvio: crises são as melhores oportuni-dades de compra.

Muitos investidores espe-raram pacientemente por este momento. Aquele que não sepa-rou uma reserva para investir na crise, deve estar sofrendo. Pior é quem investiu dinheiro que vai precisar no curto prazo e terá que realizar esse enorme prejuízo.

No entanto, os americanos já perderam muito dinheiro com imóveis, ações e agora não adian-ta investir em renda fixa. Antes da crise os bonds americanos pa-gavam cerca de 5% ao ano. Com

o corte dos juros para 1,5%, este investimento não servirá nem para proteger da inflação.

Note que existe uma grande diferença entre empresas ame-ricanas e brasileiras. A desvalo-rização americana das ações é menor, mas fundamentada. O preço das ações cai à medida que o valor das empresas degrada.

No Brasil, as empresas conti-

nuam sólidas, apresentando re-sultados recordes e aumentando o seu valor. Em ambos os casos, os preços das ações desabaram. A diferença é que no Brasil o valor das empresas continua crescen-do. Isso significa que hoje pode-mos comprar empresas que con-tinuam com o mesmo valor (ou até maior), mas têm descontos de 50% no preço, as vezes até 85%.

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Yuri da Matta, 19, percebeu uma alteração de humor em casa. Após o estouro da crise, a escola de inglês de sua família teve que ser fechada. Seu pai tinha planos para abrir outra unidade, mas teve a proposta barrada pela franquia dona da marca, que achou que não era um bom momento para fazer investimentos.

Caso esteja garimpando ações, vale a pena analisar as em-presas que realizaram abertura de capital nos últimos anos. A maior parte dos acionistas eram estrangeiros que resgataram o dinheiro agora e derrubaram as cotações em mais de 65%.Para o investidor inteligente, o que importa?

O tempo que a crise vai du-rar e o fundo do poço para Ibo-vespa são fatos irrelevante, pois ninguém consegue prever.

Relatos de jovens sobre a crise

Eitan Kashtan, 23, por outro lado, viu na crise uma oportuni-dade. Estudante de administra-ção, ele teve êxito onde muitos quebraram a cara. Assim que as ações da Bolsa de Valores caíram, ele decidiu investir pela primei-ra vez: comprou papéis de uma gigante brasileira por um terço do preço habitual. Três semanas depois, obteve lucro revendendo as ações. A experiência o levou a mudar seus planos de carreira.

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tt

Lourenço Mutarelli diz que usa-

va o nanquim de seus desenhos para se

defender, como fazem os polvos. Mas

em 2002, após nove livros de quadri-

nhos, o desenhista resolveu trocar o

nanquim pelas palavras e lançou seu

primeiro romance: O Cheiro do Ralo,

que deu vida ao filme de mesmo nome.

Depois deste nasceram ainda mais

dois: O Natimorto e Jesus Kid. Lou-

renço Mutarelli dos quadrinhos, da li-

teratura e do cinema – ainda atuou em

O Cheiro do Ralo –, também escreve

peças de teatro.

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A voz metálica que sai do viva-voz fala so-bre caos da cidade grande, sobre cultura brasileira e sobre as parcerias com Marçal Aquino e Heitor Dhalia, respectivamente roteirista e diretor de O Cheiro do Ralo.

O que influencia mais as suas obras? O con-texto político, econômico e social ou a sua individualidade?Eu acho que a minha individualidade; o aspecto mais psicológico das pessoas em geral. Muito de mim, mas não só de mim. Do que eu observo, do que eu vivencio, de muita observação. Eu estudo muita psiquiatria e algumas outras coisas assim que eu gosto e em geral isso me ajuda muito... para diagnosticar primeiro, para depois criar um personagem.

Que autores tiveram influências nas suas obras, tanto literárias como de quadrinhos?Literárias pra mim as primeiras grandes influên-cias foram Kafka, Dostoiévski, Machado de Assis e Augusto dos Anjos. Literárias acho que foram essas minhas experiências fortes. Nos quadrinhos foram Will Eisner e muito do quadrinho argenti-no Muñoz e Bretcha... algumas pessoas do quadri-nho argentino me influenciaram muito.

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E das suas outras influências literárias, como Kafka e Dostoi-évski, você as detecta nas obras de outros autores contempo-râneos, como Marçal Aquino, Patrícia Melo ou Daniel Galera?Olha, eu tenho um problema grave assim, que há mais de dois anos eu não leio ficção. Eu tenho estudado um assunto e tenho dedicado todo o meu tempo de leitura a esse assunto. Então, desse pessoal mais novo eu só li Marçal. Eu conheço essas pessoas, mas eu nunca li nada deles, por uma questão de administrar meu tempo. Então eu não posso opinar muito sobre várias pessoas. Eu acho que o que o Marçal tem forte, que é quem eu conheço mais pessoalmente, co-nheço mais o trabalho, é o impacto que a gente recebe vivendo em uma cidade como essa (São Paulo), não tem como isso não refletir no nosso trabalho. Por menos que a gente pense ou racionalize essa cidade, inconscientemente isso reflete no nosso trabalho.

A linguagem noir, de autores como Dashiell Hammett, Ray-mond Chandler ou até Quentin Tarantino exerce alguma influência na literatura,quadrinhos e cinema contemporâ-neos no país?Eu acredito que sim, mesmo que a pessoa não tenha lido nada disso. Isso influenciou tanto a cultura, né? Isso está tanto nos filmes que a gente assistiu que a gente acaba se impregnando. Acho que, depois de um modismo que teve muito forte dos filmes de western, o Marçal tem uma seqüela aí que eu acho bem interes-sante. Acho que veio isso do romance noir mesmo. Acho que esses autores influenciaram demais a cultura num mo-mento em que ela se massificava pelo rádio e televisão. Isso está muito enraizado na gente.

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Há elementos em sua narrativa e em seus desenhos que você considera como fatores de ruptura lingüística e temática?Eu costumo falar que eu desenho e escrevo não como eu quero, mas como eu consigo. Se eu inovo em alguma é porque eu não consigo fazer direito. Eu não tenho essa pretensão e nem esse pensamento quando estou fazendo alguma coisa. Ela sai mais ou menos do jeito que me agrada e do jeito que ela vai fluindo... Tudo que eu faço é experimental, eu faço como uma experiência. Então eu não estou preocupado se eu vou agradar, se eu vou ser aceito ou não. Eu faço pela experiência. Acho que isso talvez, somado ao fato de eu não conseguir fazer uma coisa mais formal, acho que acaba criando o que pode determinar um estilo, talvez. Mas não existe essa in-tenção, entende? Ela acaba acontecendo talvez por isso, porque eu me permito experimentar. Tentar fazer do meu jeito, com o que eu tenho nas mãos.

Qual é a importância da interação entre formas de arte dife-rentes (literatura, cinema, teatro, quadrinhos...) para a cul-tura de modo geral?Eu acho que é fundamental pra qualquer... acho que o grande pro-blema dos quadrinhos no Brasil, é que a maioria das pessoas que fa-zem quadrinhos só bebem os quadrinhos, diretamente, pelo menos.

Tudo que eu faço é experimental...

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E eu acho fundamental a gente estar aberto ao teatro, ao cinema, literatura, quadrinhos... eu acho importante perceber as diferenças e as semelhanças que existem entre essas formas de comunicação e de expressão.A mistura tem dado resultados interessantes...Eu acho bastante in-teressante e acho que é quase... é cada vez mais difícil que não haja essa interação, né? Eu acho que cada vez mais a gente abre os olhos e experimenta e mistura possibilidades, porque cada vez a gente tem mais recursos pra isso.

Quais são as diferenças no diálogo entre autor e espectador dos livros para o cinema para os quadrinhos?A minha primeira experiência marcante de diferença entre quadri-nho e literatura, a única grande diferença é o respeito com o que você é tratado fazendo uma e outra coisa. Existe um abismo de dife-rença de tratamento que você recebe, mas não pelo leitor imediato. Você não tem um retorno imediato. O meu primeiro retorno ime-diato que tive foi com a minha primeira peça de teatro, que como minha cara não é conhecida, eu fui algumas vezes assistir a peça e eu podia ver tudo o que funcionava ou não funcionava, eu tinha uma resposta imediata. Isso variava com a platéia, mas eu sempre tinha uma resposta imediata. Eu nunca tinha experimentado esse retor-no tão direto. Isso foi muito importante pra mim, foi muito praze-roso vivenciar essa experiência. No cinema você tem isso de uma forma semelhante, embora o filme demore tanto pra ficar pronto que, quando fica pronto, você não agüenta mais ver nem ouvir falar e aí você não acaba vivenciando muito. Eu vivi muito pouco isso, só nos festivais eu senti o público reagindo ao filme, mas aí é um público diferente porque é um público de festival.

Como você enxerga a relação entre produção artística e a in-dústria de distribuição cultural?Eu acho que isso depende. No geral, é tudo muito mal distribuído. Acho que acaba, se você persiste fazendo seu trabalho de alguma forma, você vai arrebanhando pessoas que descobrem seu trabalho, e acabam indo atrás, que acabam sendo independentes dessa distribuição. Esse agrupamento acaba ajudando você, por outro lado, a ter uma distribuição um pouco melhor. Mas acho muito mal distribuído, embora existam entidades e experiências que são bastante positi-vas. Se não fosse o Sesc, e outras iniciativas privadas... por mais que isso seja limitado, acho que isso possibilita a viabilização de muita coisa, indiretamente.

Nina é um filme mais complexo e elaborado. Qual a impor-tância de produções com este tipo de linguagem, na contra-mão dos temas mais recorrentes, para a cultura brasileira?Eu entrei no Nina, porque eu achava... isso é culpa do Heitor (Dhalia, diretor), né... é muito a visão do Heitor mesmo.

Tudo que eu faço é experimental...

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Adaptação de Heitor Dhália do livro “O Cheiro do Ralo”

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E gostei justamente por isso. Embora eu também ache que outras formas... também é legal você expe-rimentar coisas que estão se repetindo e você tentar dar um pouco da sua cara ou da sua visão, até pra quebrar um pouco essas coisas que se repetem. E o Nina tem toda uma concepção, que eu acho que no fim das contas ele não alcançou, como geralmente não alcança, o objetivo. Mas ele foi uma experiência muito estimulante e muito interessante. Eu só acho que o resultado ficou aquém do que a gente vislum-brava durante o processo. Para mim, pelo menos. Minha opinião pessoal, assim... Quando o filme co-meçou a ser montado, ele começou a ser montado de tantas formas diferentes e por estar muito envolvido eu tinha já uma concepção do que seria. Eu estranho, pra mim causa um estranhamento, o corte final do filme. Eu achei que ele tinha uma outra direção que me agradava mais.

Como foi fazer parte O cheiro do ralo, com as peculiaridades que o filme apresenta em financiamento e produção?A princípio, eu sempre quis ficar distante, eu não queria me envolver no processo, porque desde o começo eu achava que o mais interessante para mim era ter esse outro olhar, a adaptação mesmo. Mas eu acabei fazendo, tendo que ajudar. Quando o Selton não podia fazer teste com elenco, eu aca-bei fazendo alguns testes no lugar dele e ele aca-

bou me convidando pra fazer um personagem e foi muito bom pra mim, foi muito divertido, mas eu tentei não interferir em nada. Quem opinava era o Heitor e o Selton. Quando alguém me per-guntava eu falava que não sabia de nada, porque eu fiz o livro e isso era o filme e são coisas total-mente diferentes. Mas foi um set totalmente... muito bacana, muito passional.

Como passou a trabalhar com Heitor Dhalia e qual é a importância de parcerias como es-tas para a produção cultural do país?Acho que a importância disso a gente não vai conseguir perceber agora. Se esse filme ficar, perdurar, ou se for uma tendência a possibilitar outros, daqui a um tempo a gente vai saber a im-portância disso. Eu não sei até que ponto isso é importante ou isso é importante só para as pes-soas que estão envolvidas, eu não sei qual a re-levância disso. Na minha parceria com o Heitor a ponte foi justamente o livro O Cheiro do Ralo. Ele me procurou pra comprar os direitos, aí ele acabou conhecendo meus quadrinhos, e ele esta-va na pré-produção do Nina, e me convidou pra fazer os desenhos. Foi uma parceria muito boa, foi muito bom trabalhar com ele, foi uma expe-riência legal. A gente tem muita identidade, mas ao mesmo tempo a gente tem muita diferença.

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E com o Marçal Aquino, como foi?Marçal participou do primeiro almoço, quando eu conheci o Heitor, ele indicou o livro para o Heitor ler. Ele é uma pessoa... eu adoro o Marçal, ele é uma pessoa extrema-mente gentil e divertida que eu gosto muito de encontrar e eu tenho uma afinidade muito grande com ele, uma gratidão imensa por essa generosidade de ele estar... a literatura em geral me recebeu muito bem, muito de braços de abertos, e o Marçal é um grande exem-plo disso pra mim, é uma pessoa que gosto muito, muito mesmo, é uma pessoa que eu tenho um afeto muito grande. E ele participou, a gente se encontrou, ele participou do primeiro almoço. Ele fez de certa forma essa ponte e a gente ainda se encontrou algumas vezes os três, e aí depois ele seguiu os dois trabalhando a adaptação. Eu não participei da adaptação.

Então, com essa relação temática – essa história de quebrar um pouco o sertão e trazer mais o urbano – e a relação lin-güística que os filmes têm com os livros, o conjunto lingüís-tico-temático pode trazer uma quebra no que já existe de cinema brasileiro, uma ruptura, no cinema e na literatura?Acho que vem acontecendo e acho que isso acontece mesmo no Ci-nema, Aspirinas e Urubus, ele mostra a realidade que a gente co-nhece, mas por uma perspectiva e com uma delicadeza que eu acho muito nova. Acho que mesmo que você fale de coisas que estão sendo ditas, se é um olhar um pouco mais sensível, eu acho que isso traz uma con-tribuição. A afinidade que existe entre o nosso trabalho e que aca-ba refletindo nas nossas pessoas, eu, pelo menos, penso que cada uma dessas pessoas fazendo seu trabalho, não pensando “ah, eu vou mostrar isso”, mas pensando na sua realidade, no que ela vive, no que ela vê e tenta mostrar, dividir isso... não sei se existe um, pelo menos da minha parte não existe, um dogma ou “ah, eu vou mostrar isso porque isso não está sendo mostrado”, não.

Quando alguém me perguntava eu falava que não sabia de nada, porque eu fiz o livro e isso era o filme...

Selton Melo em cena do filme

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Eu vou falar isso porque essa é minha língua den-tro desse país, então eu acho que é mais ou menos isso. Uma questão de você impor, de certa forma, através do seu trabalho, sua identidade.Pra quem olha de fora, o que parece é que não há a intenção de se fazer algo necessariamente novo, mas que está sendo feito...Isso acaba trazendo o novo, gerando o novo. Eu acho que o novo não nasce com a intenção de ser novo. Ele nasce com sinceridade e com experi-mentação e com pessoas que de repente tentam realizar o seu trabalho contra a corrente e não en-contram uma forma de produzir isso, de uma for-ma fácil ou com parceiros grandes. Então elas se juntam e fazem o seu trabalho, que foge porque as grandes produções visam o que dá certo. Elas vão martelar nessa tecla porque dá certo e nunca vão arriscar. E elas devem começar a arriscar agora, por exemplo, quando surge uma coisa diferente, que dá um resultado, e esse resultado é financei-ro, é um resultado de bilheteria ou de uma massa, de atrair uma massa de público, aí eles começam a se pautar nesse tipo de coisa pequena que aponta o caminho e aí eles começam a investir um pouco. Então isso acaba refletindo através de experiên-cias corajosas... Porque, para mim, fazer um livro não custa nada. Mas para se fazer um filme cus-tou... Essa parceria é um trabalho muito maior, que por outro lado atinge um número de pessoas multiplicado à potência.

Dos filmes roteirizados pelo Marçal Aquino, O Cheiro do Ralo parece ter dado mais resultado?O Invasor parece que tinha dado uma bilheteria legal... não tenho certeza se foi 100 mil, ou alguma coisa assim, mas parece que O Invasor teve um, eu nem sei se a venda foi o cinema ou se foi DVD ou VHS. Eu sei que foi um filme que foi muito bem aceito, sei lá, acho que tinha uma novidade, um frescor ali que acabou atraindo, talvez isso indire-tamente encoraje outras pessoas a fazerem... Tal-vez o primeiro que fez um e não foi tão visto ou tão aceito, encorajou o outro a fazer um outro que vai seguir uma trilha que já começou a ser aberta de alguma forma, mesmo que outros tenham me-nos visibilidade.É essa coragem de tentar fazer o que quer que im-porta, é o que tem a ver pra eles, não por dinheiro, mas, enfim, por um ideal, mais por aquilo que eles querem fazer.

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ponto de equilíbrio

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Balada SustentávelImagine uma danceteria em que, enquanto você se di-verte na pista, produz uma energia para alimentar o som.

Foi inaugurada em Londres esse ano, uma casa noturna sustentá-vel, que consegue a sua energia através da animação das pessoas. A boate utiliza uma tecnologia chamada piezoeletricidade, que transforma movimento em ener-gia. Como ela funciona ? A pista de dança é formada por cerâmica e cristais de quartzo, que ao serem pressionados ge-ram corrente elétrica. Com essa energia eles conseguem abaste-cer a luz e o som da boate.

Se a animação das pessoas não for suficiente, eles ainda contam com baterias, painéis de energia solar e uma turbina eólica.

Além desse sistema, bebidas or-gânicas em copos biodegradáveis serão vendidas e as pessoas que

provarem que chegaram ao local a pé, de bicicleta ou por transpor-te público não precisarão pagar as 10 libras necessárias para entrar. A boate utilizará nas descargas e torneiras dos banehiros água da chuva. Os papéis , vidros , plásti-cos e metais são todos reciclados e as paredes ainda mudam de cor quando a boate está cheia, fazendo referência ao aquecimento global.

A balada fica em King’s Cross e foi projetada por An-drew Charalambous, diretor de uma nova organização que combate as mudanças climáti-cas chamada Club4Climate.

Charalambous acredita que cerca de 60% da energia pode ser gerada graças ao piso.

Essa balada vai dar o que falar!

Entenda seufuncionamento

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para ler!

O gosto que Lieset Meminger sentia em roubar livros valeu-lhe uma alcunha e uma ocupação e as palavras que neles encontrou seriam, mais tarde, aplicadas na sua própria vida. Emocionante!Preço: R$ 39.90 na Livraria Cultura

Acreditando piamente que a sala escura do cinema permite a rara fusão entre imaginação e raciona-lidade, o francês Ollivier Pourriol teve uma idéia inusitada ensinar filosofia através de enredos de filmes cultuados no mundo inteiro. Preço: R$ 39.90 na Livraria Cultura

Z A menina que roubava livros

Autor: Markus ZusakEditora: IntrínsecaAssunto: Literatura estrangeira - Romance

L Cinefilo - As Mais Belas Questões Da Filosofia No Cinema

Autor: Pourriol, OllivierEditora: Jorge ZaharAssunto: Filosofia

ponto cultural

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para ler!Treze contos que, quando publicados, criaram grande impacto no público e na comunidade literá-ria. A autora os concebeu como se o leitor estivesse participando da elaboração de uma pintura.Preço: R$ 24.00 na Livraria Cultura

Além do registro histórico, o catálogo é um óti-mo currículo para o artista que teve o trabalho exposto. Considerado um dos mais importantes do mundo no universo das artes gráficas, da in-dústria editorial e das HQs, o Salão de Piracicaba ganhou projeção internacional há mais 30 anos.Preço: R$ 40.00 na Livraria Cultura

h Laços de família

Autor: Clarice LispectorEditora: RoccoAssunto: Literatura Nacional - Contos

X Salão internacional de humor de Piracicaba

Autor: Vários autoresEditora: IMESPAssunto: Humorismo

Z nas férias L para estudar h na cabeceira X no banheiro

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ponto final

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Mendigo com

3Vicente Aparecido Fernando Luna2

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Mendigo comA coisa está feia, tão feia que agora até mendigo precisa de algum tipo de especialização.

Difícil saber se é consequência dos recordes de desemprego, da recessão iminente ou da crise do subprime. Mas fica cada vez mais raro encontrar um pedinte clássico – aquele que apenas estende a mão e espera uns trocados caírem do céu ou de bolsos generosos.

Na nova economia, essa figura se encontra ameaçada. A concor-rência nas ruas se acirrou. Não basta mais o sujeito exibir, sei lá, a radiografia do pulmão comprometido ou um pé tomado por chagas para coletar doações comovidas. Não. Ninguém mais se sensibiliza facilmente.

É preciso, como dizem os consultores de RH, ter um diferencial. Até para pedir dinheiro. Sem um bom marketing pessoal, não dá para enfrentar o mercado de trabalho dos que não trabalham. Es-pecialmente com tantas campanhas apregoando “não dê esmola”.

A solução mais comum é vender alguma coisa. Qualquer coisa, não interessa se ninguém quer comprar a tal coisa. Basta o álibi do consumo para o dinheiro trocar de mãos, sem culpa. Esmola? Ima-gina. Queria mesmo esta bala de sabor melancia, um tanto derreti-da e de procedência duvidosa, que vai ser esquecida no carro até ser devorada pelas baratas.

Outra saída são os malabarismos. Se bem que a área saturou: os sinais de trânsito estão cheios de gente girando bolinhas de tênis no ar. Cada vez mais bolinhas. Quem tem network junta os colegas para formar pirâmides humanas. Outros, arrojados, balançam to-chas acesas entre carros e motos.

É, as esquinas começam a ficar overqualifieds. Numa, aqui perto de casa, um ambulante fala inglês. Fluentemente. O sinal fecha e lá vem o homem, de terno e gravata: “Hello, my friend! Nice to meet you” e por aí vai, sem tradução simultânea.

E esse não é o único a exibir conhecimento de línguas. Alguns quarteirões adiante, seu colega de não-profissão recita poemas. Ainda deixa o, por assim dizer, cliente escolher o autor. Quer um Manuel Bandeira ou um Carlos Drummond, quem sabe uma Flor-bela Espanca? É um real.

Talvez o último romântico seja o mendigo que encontrei outro dia, na porta do supermercado. Um pedinte autêntico, de raiz. Daquele que não vende bala, não faz malabares e nem fala inglês. Sentado na calçada, ele simplesmente pede: “Tem 50 reais para me dar?”.

Cinquentinha, não faz por menos. A coisa está feia.

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