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  • 5/20/2018 Revista imagem(i)mat ria

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    Editorial

    Toda imagem , em potencial, material e imaterial. Se apresenta por meio deelementos aparentes e outros que no se fazem ver, mas existem e persistem diantedo observador, entre as estratgias da significao e as maravilhas do onrico.

    O Comunicador Visual, incansvel criador de imagens, vive diariamente sua buscapor superar dicotomias e pensar a imagem para alm da materialidade, no exercciode sua atividade projetual, que cada vez mais aproxima os polos pesquisa tericae prtica cotidiana.

    Ao apresentar a produo terica e prtica do curso de Comunicao VisualDesign, da UFRJ, a revista imagem(i)matria pretende constituir um espao dereflexo e exposio necessrio a todos aqueles que pensam e fazem design nocenrio contemporneo.

    Nesta primeira edio, agradeo aos professores: Anglica de Carvalho, DanielPortugal, Doris Kosminsky, Marcelo Ribeiro, Marcus Dohmann e Norma Menezes;e aos alunos: Ana Seno, Igor Amorim, que gentilmente elaboraram e cederam seustextos e imagens para a realizao da publicao.

    Todo esforo e dedicao, que tornou possvel a materializao de uma idia,devo aos meus alunos de projeto que no pouparam esforos, enfrentando prazoscurtos, aulas durante o ms de janeiro e constantes mudanas por mim solicitadas,para ao final do semestre oferecem 14 vises diferentes de como imagem e texto(transfigurado tambm em imagem) podem convidar leitura e transformar oencontro leitor-revista em um momento prazeroso.

    Julie Pires

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    Comunicao Visual

    contempornea: olhares

    ecolgicos

    Uma marca dinmica

    para o LabVis

    Objetos da

    adversidade: Um olhar

    etnogrfico sobre arecontextualizao

    material urbana

    Norma Menezes Marcus Dohmann Doris Kosminsky e Igor Amorim

    sumrio #1

    08 2014

    Livro Objeto Casa - Sentidos do habitarPercepo visual,

    memria e cadeira

    Daniel Portugal Marcelo Ribeiro e Ana Seno Anglica de Carvalho

    imagem(i)matria

    Revistadocursode

    ComunicaoVisualDesig

    n

    daEscoladeBelasArtes

    UniversidadeFederal

    doRiodeJaneiro

    edio

    JuliePires

    design

    AmandaRosetti

    JuliannaParaizo

    fotografia

    AmandaRosetti

    JuliannaParaizo

    ilustrao

    AmandaRosetti

    tratamentodeimagem

    AmandaRosetti

    JuliannaParaizo

    reviso

    JuliePires

    colaboradores

    destenmero

    AnaSeno

    AnglicadeCarvalho

    DanielPortugal

    DorisKosminsky

    IgorAmorim

    MarceloRibeiro

    MarcusDohmann

    NormaMenezes

    impresso

    GrficaDefinir

    tiragem

    1.000exemplares

    contato

    imagem.i.m

    [email protected]

    m

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    imagem (i) matria 2013.2 Percepo visual, memria e cadeira

    Q

    uando batemos o olho em uma coisa qualquer, em fraes desegundo realizamos uma operao complexa que costumamoschamar de percepo visual. algo to corriqueiro que raramentenos perguntamos o que ocorre nesse tempo infinitesimal.Entretanto, uma vez que comeamos a questionar essa tal

    percepo, as perguntas comeam a se acumular

    Percepo visual, memria e cadeiraDaniel B. Portugal

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    imagem (i) matria 2013.2 Percepo visual, memria e cadeira

    Digamos que, em um dado ambiente, eu olhe para uma cadeira parecida com aque aparece na figura a esquerda. Eu vejo imediatamente uma cadeira. Mas o que uma cadeira se no um objeto que serve para sentar? Ora, a funo de servir parasentar no faz parte do objeto que vejo. Eu que atribuo a ele esta funo e, porisso, dou-lhe o nome de cadeira.

    Se assim, entretanto, devo reconhecer que eu no vi, na verdade, uma cadeira. Oque eu vi foi um objeto de madeira com quatro pernas e uma aparncia especficaao qual, atravs de um ato classificatrio, dei, posteriormente, o nome de cadeira. En-tretanto, mesmo nessa nova formulao, o problema permanece: objeto, pernas emadeira so, mais uma vez, nomes dados a alguma coisa que aparece para mim eque requerem categorias especficas para existir. Em ltima instncia, se eu seguireste raciocnio at o fim, terei que admitir que o que efetivamente vi foi apenas umaimagem singular ainda inclassificada. Entretanto, tal suposta imagem singular in-classificada no faz parte de minha experincia: quando olhei para a cadeira, ela jera cadeira, e no um objeto estranho que s depois virou cadeira para mim.

    Algum leitor poderia perguntar neste ponto: mas no seria irrelevante o fato deeu chamar a cadeira de cadeira? Eu vi, diria ele, o que quer que seja que estivessena frente dos meus olhos naquele momento e depois classifiquei essa coisa comocadeira. Se fosse um objeto desconhecido, isso em nada afetaria minha maneira de

    perceb-lo, ele continuaria a ser o mesmo objeto, apenas eu no o consideraria umacadeira por no atribuir a ele a funo de servir para sentar. Ser que podemosnos satisfazer com tal explicao?

    A ideia do leitor a de que eu vejo o que est l, na frente do meu olho e de-pois classifico aquilo que vi. Mas o que est l de fato, na frente dos meus olhos?Ser que tenho como saber? O nico acesso que tenho ao que o leitor diz estar l a imagem que vejo. Portanto, dizer que eu vejo o que est l na frente dos meusolhos apenas outra forma de dizer que eu vejo o que vejo. Ou seja, na minha

    Mas o que est l de fato, na frentedosmeus olhos? Ser que tenho como saber?

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    imagem (i) matria 2013.2 Percepo visual, memria e cadeira

    sentidos e uma sobreposio de imagensj conhecidas, imagens-lembrana, a estapercepo bruta. Para citar Bergson:Na verdade, no h percepo que no

    esteja impregnada de lembranas. Aosdados imediatos e presentes de nossossentidos misturamos milhares de detalhesde nossa experincia passada. Na maio-ria das vezes, estas lembranas deslocamnossas percepes reais, das quais noretemos ento mais que algumas indi-caes, simples signos destinados a nostraze-rem memria antigas imagens.

    Com efeito, se considerssemos todas

    as possveis nuances da percepo bru-ta, no poderamos produzir as ima-gens ordenadas que efetivamente vemos.Funes, o memorioso, personagem deum conto homnimo de Borges per-sonifica este paradoxo de uma percep-o sem esquecimento:Ns, de uma olhadela, percebemos trs

    taas em uma mesa; Funes, todos os re-bentos e cachos e frutos que compreendeuma parreira. [...]. Uma circunferncianum quadro negro, um tringulo retn-gulo, um losango so formas que podem-os intuir plenamente; o mesmo aconteciaa Irineu com as emaranhadas crinas deum potro, com uma ponta de gado numacoxilha, com o fogo mutvel e com a inu-mervel cinza, com os muitos rostos deum morto num longo velrio. No sei

    quantas estrelas via no cu.Funes, com sua memria perfeita, no

    percebia do modo que fazemos ns, pro-jetando nas imagens nossas lembran-as, despindo-as de suas singularidadesde acordo com nossas categorias. Funesno precisava de classificaes: viviaem um mundo abarrotado de inclassi-

    ficveis singularidades. Desnecessriodizer, portanto, que todas as categori-zaes e ordenaes, das lingusticas svisuais, pareciam-lhe absurdas, j queidentificam coisas inteiramente ds-pares: aborrecia-o, por exemplo, queo co das trs e catorze (visto de perfil)tivesse o mesmo nome que o co das trse quarto (visto de frente). Seu prpriorosto no espelho, suas prprias mos,surpreendiam-no todas as vezes.

    Ns, porm, que no somos Funes,precisamos de nossas categorias. Pre-cisamos da possibilidade de ordenar

    um mundo que, pelo menos tal comoaparece para nossa percepo bruta, inteiramente catico. O fato , enfim,que no poderamos ver uma nica ca-deira como cadeira se fssemos privadosda nossa humana, demasiado humana,capacidade de simbolizar.

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    experincia, eu simplesmente vejo umaimagem. Eu nada sei do que a causou.A imagem simplesmente aparece paramim. E, como observei acima, ela nor-malmente aparece j permeada de sen-tidos. A questo que se coloca, portanto,: eu posso separar a imagem que vejodos significados que a permeiam naminha experincia corriqueira?

    Ora, sabemos que alguns pintoresimpressionistas se colocaram questobem semelhante e tentaram o experi-mento: o que eu percebo se tento aomximo abs-trair tudo aquilo que seisobre o mundo? Eles tentaram colocarna tela essa percepo imaculada pelopensamento. Se um pintor quer repre-sentar cavalos correndo, por exemplo,costuma desenh-los com quatro patas

    cada um, porque ele sabe que um cav-alo tem quatro patas. Mas quando ve-mos os cavalos correndo, se tentarmosabstrair o fato de que sabemos haverquatro patas se movimentando, deixa-mos de ver as patas e passamos a verum borro cheio de qualidades especfi-cas impossveis de descrever.

    Assim, possvel fazer um esforo eabstrair da imagem que vemos umagrande parte dos significados que costu-mamos dar s coisas. Entretanto, a ima-gem resultante desse olhar inocente algo muito diferente daquilo que o leitorque colocou a questo imaginava estarl quando disse que via o que estava lindependentemente do fato de chamaro que via de cadeira ou no.

    O fato que, ao tentar abstrair os sig-nificados da imagem, a prpria percep-o muda, se torna ao mesmo tempomais complexa e mais instvel: umamassa catica de sensaes. Ou seja, asformas estveis que acreditamos com-poros objetos s existem em um mundoj ordenado pelo nosso entendimento.Em outros termos: um mesmo material

    perceptual bruto pode se transformarem diferentes percepes conscientesdependendo de como o significamos.Na percepo auditiva, mais fcil per-ceber o que digo: quando escutamosalgum falar uma lngua estrangeiraque desconhecemos, no escutamos aspalavras e apenas no as entendemos. O

    que escutamos um rudo complexo noqual no conseguimos distinguir difer-entes palavras. Para que possamos sepa-rar as palavras, preciso j conhec-lasde uma maneira ou de outra.

    Outra lio interessante que se tiradesta experincia de abstrao a de quesignificar uma imagem e nvolve principal-mente uma simplificao da imagem, eno, como poderamos pensar a princpio,uma complexificao. O ato de preenchera imagem de significados ele prpriouma espcie de abstrao que ajudaa tornar tal imagem consciente comopercepo. A imagem despida de sig-nificados composta de inumerveissingularidades, catica. Em nossa vidacotidiana no poderamos viver com talpercepo catica do mundo. Assim, abs-

    tramos dessa percepo bruta umaquantidade enorme de singularidadesde modo a format-la em uma percep-o visual coerente: ali uma cadeira,aqui cho, ali parede etc.

    O processo de percepo visual normalenvolve, portanto, uma atividade de es-quecimento de parte do dado bruto dos

    Quando olhei para a cadeira, ela j era cadeira, e no umobjeto estranho que s depois virou cadeira para mim.

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    imagem (i) matria 2013.2 Livro objeto

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    Apesar das grandes transformaes que as tecnologias recentes trouxe-ram, atualmente ainda possvel evidenciar o destaque dado ediodo livro em papel e com sua organizao tradicional. A relao entreo leitor, a estrutura e o contedo do livro pode parecer j consolidada,mas cabe a ns, designers, refletir sobre estas relaes. A significaode um texto est tambm na forma como ele nos apresentado.

    A estrutura do livro como conhecemos hoje chamada de cdex. Com o surgimen-to da imprensa na Idade Moderna, o cdex passou a ser reproduzido e fez com queo livro fosse utilizado socialmente, conferindo-lhe um status importante a partirda sua grande difuso pblica. Este tipo de publicao se mantm como uma dasprincipais formas de veiculao de conhecimento, apesar das inmeras possibili-dades em outros meios, como as edies on line. Estas outras formas de publicao,mesmo estando livres de normas de autorizao, controle e at mesmo de formasde censura, ainda faro concorrncia com a bibliocultura durante um certo tempo.A publicao de um livro continua sendo um recurso de reconhecimento e crdito.

    Desde o incio de sua reproduo, a estrutura do livro se mantm praticamentea mesma. Dentro desta estrutura podemos notar a existncia de controles sobrea leitura, que esto presentes desde a criao do livro como objeto at a ao doleitor. Diferentes elementos presentes no livro permanecem margem, acompa-

    nhando e dando suporte ao texto, considerado como principal. Ou seja, a estruturade um livro tambm reconhecida pela disposio dos elementos paratextuais,que do suporte ao texto. Podemos citar como exemplos destes elementos o ndice,o prefcio, o posfcio, a dedicatria, a bibliografia, entre outros. Estes elementosparatextuais que foram mantidos e respeitados no meio editorial so uma formade sustentar o controle sobre a leitura.

    A pesquisadora Daisy Turrer observa alguns momentos em que os dados tcnicosfortaleceram a ideia de oposio entre o texto principal e o paratexto:

    O trabalho do designerpossibilita a reflexona criao do livro que

    escapa s noes habituaisestabelecidas ao longo

    do tempo e difundidas nomeio editorial.

    Marcelo Ribeiro e Ana SenoLivro objeto

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    imagem (i) matria 2013.2 Livro objeto

    13Valorizao do paratexto

    Para isso, busca-se neste ensaio tercomo base a reviso dos conceitos dafilosofia, ou seno, apenas demonstrara permanncia da matriz platnica nopensamento terico ocidental, mas pro-curando um deslocamento dessa rela-o. Ao desestabilizar o pensamentodas oposies binrias, Derrida se uti-liza dos mesmos autores que, apesar deainda imersos no pensamento logocn-trico, indicam um local para alm dasoposies. O deslocamento realizado

    por Derrida, por exemplo, se apoia nopensamento clssico e, para Paulo CesarDuque-Estrada (Duque-Estrada, 2002),h dois momentos inseparveis:

    (...) este momento de inverso estru-turalmente inseparvel de um momentode deslocamento com relao ao sistemaa que antes pertenciam os termos deuma dada oposio conceitual. Estes lti-mos, uma vez deslocados para outro lu-gar, vo inscrever um outro sistema, umoutro registro discursivo. J se pode an-tever, portanto, que no se trata de umapura e simples inverso [das oposies],nem tampouco do aprofundamento deum nico e mesmo sistema conceitual.(DUQUE-ESTRADA, Paulo Cesar (org.). smargens: a propsito de Derrida. Col. Teo-logia e cincias humanas. Rio de Janeiro:

    Ed. Puc-Rio; So Paulo: Loyola, 2002.)As teorias elaboradas por Jacques Derridaresgatam e do visibilidade a este espao margem e transforma esses elementossecundrios em um objeto de estudo ereflexo. Se pensarmos a desconstruona relao hierrquica que dava privi-lgio ao texto em relao aos outros ele-

    mentos do livro impresso, pode-se dizerque se abre a possibilidade de valorizaro paratexto, compreendido como se-cundrio, desestabilizando o texto prin-cipal e consequentemente o privilgiodo escritor como elemento central emum livro. Esta postura uma parcelafundamental aos estudos em Designgrfico, pois reavalia a importncia dosestudos da ilustrao, da tipografia, damancha grfica, entre outros. Ou seja,do visibilidade a elementos que sem-pre foram compreendidos como peassecundrias deste objeto.

    Tambm devemos considerar a afir-mao de Rachel Nigro (Nigro, 2004),quando considera que a desconstruono um vale-tudo ou uma destruioniilista. A desconstruo em resumo,uma postura diante da leitura de tex-tos. (NIGRO, Rachel. O Direito da Des-construo. In: DUQUE-ESTRADA, PauloCesar (org.). Desconstruo e tica: ecosde Jacques Derrida. Rio de Janei ro: Ed. Puc-Rio; So Paulo: Loyola, 2004. 248p. P. 93-94)

    Explorao e participao do leitor

    A estrutura do livro impresso, pensada inicialmente como uma cidade fortificada,pode tambm ser apresentada por meio da valorizao dos detalhes que chamamosde elementos paratextuais: ilustraes, manchas grficas, lombadas, entre outras.

    So exemplos dessa explorao e participao do leitor, os livros produzidos pelaeditora Visual Editions. The Life and Opinions of Tristram Shandy, Gentleman foi

    escrito no sculo XVIII e publicado pela editora com a proposta de adicionar novoselementos visuais, mantendo o mesmo esprito do livro. Em Tree of Codes, o autoramericano Jonathan Safran Froen cria uma infinidade de possibilidades de leituraao cortar partes do texto da publicao The Street of Crocodiles de Bruno Schulz. Aspartes cortadas permitem a leitura de mltiplas pginas ao mesmo tempo.

    Por meio de um diferente olhar para a estrutura, o livro-objeto nos oferece umarealidade de transformao do artefato editorial cotidiano e das nossas atividadestradicionais de leitor. Ao repensar o design e a feitura do livro, estamos dando uma

    A estrutura do livro impresso passaa ser oferecida, antecipadamente, peladisposio grfica de seus elementosparatextuais. Pode-se dizer que a ar-quitetura da folha de rosto do sculoXVI institui um modelo que se repete epermanece ainda no sculo XVII, paradepois se transformar e se fixar de formamais rgida no final do sculo XVIII e noXIX. A partir de ento, formata-se o livrolevando-se em considerao a exteriori-zao do texto por outra espacialidade, afolha de rosto se desdobra e ganha vriaspginas, separando ttulo, dedicatria,

    epgrafe, ndice e prlogo. O paratextotorna-se uma cidade fortificada em tornodo texto, fortalece e coloca em evidncia oautor. Todos os elementos que fazem parteda publicao de um livro e o colocam emcirculao passam a ocupar lugares deter-minados, definidos por fronteiras rgidas,estabelecendo-se uma relao hierrquicaentre texto e margem. (TURRER, Daisy. Olivro de artista e o paratexto. Ps: Belo Ho-rizonte, v. 2, n. 3, p. 73 - 81, mai. 2012. P. 74-75)

    Podemos dizer que ainda hoje h estetipo de indicao e para essa classificaohierrquica foi importante a relao en-tre arquitetura e o cdex. Nomenclatu-ras de elementos que cons-tituem o livrotambm esto presentes no cotidiano doprojeto arquitetnico: citamos como exem-plo, o frontispcio que na arquitetura sig-

    nifica a fachada de uma construo e quese tornou tambm uma pgina do livroque pode ser decorada com desenhosenvolvendo ttulos e textos, sobretudoentre os sculos XVI e XVIII. Outro exem-plo da analogia com a arquitetura so asilustraes, que ornam um impresso comgravuras ou figuras alusivas ao texto.

    Os elementos pr-textuais e ps-tex-tuais formam camadas que, tradicional-mente, envolvem um texto de autoriadefinida. O contexto histrico citado an-teriormente construiu a ideia que sus-tenta o profissional da rea de Comuni-cao Visual Design como construtor emantenedor de limites que garantem aproteo de um corpo principal, sendoos principais elementos criados pelo es-critor. O que vemos uma repetio daestrutura tradicional do livro, que propeuma leitura linear do texto e uma no-leitura dos elementos paratextuais.

    Apesar de muitas dessas normas teremsido criadas para facilitar o trabalho tc-nico para a publicao de um texto nopassado, elas ainda sobrevivem no livroou mesmo em um documento eletrnico,como elementos que avalizam o contedocriado pelo autor e sustentam a oposioentre texto principal e o paratexto.

    O trabalho do designer possibilita areflexo na criao do livro que escapas noes habituais estabelecidas aolongo do tempo e difundidas no meioeditorial. Nossa proposta iniciar um breveapontamento a respeito do livro visto comoobjeto e contribuir para um melhor en-tendimento da complexa relao entredesigner-artefato e leitorvdo livro, que setornaram, ao longo do tempo, sofistica-dos e complexos.

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    nova significao ao texto e ao paratexto. Este tipo de livro se prope a estabelecer umdilogo com o usurio, na inteno de produzir uma experincia multissensorial mar-cante que nos envolve: nossa memria dos sentidos do tato e da viso so afetadasao explorar as estruturas tridimensionais do livro, na feitura e na utilizao da obra.

    Diferente do livro em que se busca um sentido pr-determinado, no livro-objeto, ocontedo se estabelece com a participao do leitor-usurio. Dentro deste dilogoesto presentes uma multiplicidade de sentidos e o ldico do objeto.

    Estabelecemos o mesmo tipo de dilogo quando, por exemplo, abrimos um encartede CD e procuramos desdobrar as possibilidades da pea grfica. Tais possibilidadesvo alm do contedo visual, de sua utilidade e praticidade. Mesmo quando contamoscom um nmero l imitado de possibilidades, a tendncia procurar esgotar as formaspossveis. Ao manusear um objeto estamos adicionando experincias sensoriais quealteram nossa compreenso do mesmo. Permitir ao usurio explorar possibilidades pensar que o produto final possui tambm parte da autoria de quem o utiliza.

    No livro-objeto mais do que decifr-lo, a proposta experiment-lo. O usuriono apenas um participante e sim o agente principal, onde o objeto no existesem ele. Um nico movimento pode transformar toda sua estrutura. Nesta conversa,o usurio convidado a estabelecer metforas ao desdobrar, construir, montar edesmontar, ou simplesmente folhear um livro-objeto, transformando a matriainerte em um suporte para criar iluses.

    No livro-objeto mostrado ao decorrer dessa matria, podemos observar que a flexi-bilidade, a tenso e a posio estvel, o esforo e a movimentao em si, permitemao usurio a experincia que se torna o contedo principal do livro.

    Diferente do livro em que se busca um sentidopr-determinado, no livro-objeto, o contedo se

    estabelece com a participao doleitor-usurio.

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    imagem (i) matria 2013.2

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    Para isso ele julga importante no considerarmos apenas a ecologia ambientalmas sim a conscincia sobre uma mltipla ecologia que seria das relaes sociais, dasubjetividade humana e do meio ambiente. Ele fala de uma revoluo poltica, sociale cultural e que esta seria necessria no s em grande escala como tambm nosdomnios moleculares da sensibilidade, da inteligncia e do desejo. E isso s seriapossvel se trabalhssemos em micro instancias, isto , se tornssemos efetivo o tra-balho considerando as micro escalas de relacionamento social, subjetivo e ambiental.

    Ele escreveu este livro h 20 anos. Devemos portanto considerar que de l pra cmuita coisa se sedimentou assim como outras se volatilizaram nos ismos do posmodernismo. Mas um aspecto importante, o da subjetividade, foi amplamente ma-nipulado pelo consumo de massa e hoje se torna palavra de lei, ao que ele chama deserialismo de mdia (mesmo ideal de status, mesmas modas, mesmos funk, hiphopetc.), j no nos permite ser capazes de nos vestir diferente de todos, termos hbitosdiferentes, pois seramos tratados como Ets! A complexidade humana, antes tradu-zida pelos tratados da psique, pelos estudos clssicos do comportamento humano,regidos por uma linearidade planejada sobre as coisas, hoje j no mais capaz deresolver os problemas da humanidade em mbito algum! O prprio conceito decultura hoje est comprometido.

    Este ltimo, muito vantajoso para o aumento de consumo e a obsolescncia planejada. Ler o livro A Idia de Cultura de Terry Eagleton em que ele posiciona o conceito de culturahistrico e etmologicamente.N

    o livro As Trs Ecologias, Guattari posiciona o homemps moderno em uma situao de ossificao(eudiria engessamento) diante das alternativas impostaspelo consumo de massa. Ele acredita que a relao desubjetividade que temos para com tudo e todos (social,

    animal, etc) est seriamente comprometida pelo consumo globalps moderno e coloca que o que est em jogo como se viver daquiem diante, num contexto de aceleradas modificaes e mutaestcnicas e sobretudo com o aumento populacional .

    Comunicao Visual contempornea:olhares ecolgicos

    Norma Menezes

    imagem (i) matria 2013.2

    O prprio conceito de culturahoje est comprometido.

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    imagem (i) matria 2013.2 Comunicao Visual contempornea: olhares ecolgicos

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    versal to necessrio as nossas ecologias.A transversalidade do ambiente virtualdeveria estar equilibrada aos valorestransversias palpveis da humanidade.

    Guattari e muitos outros j prenun-ciavam que o Capitalismo Mundial In-tegrado, ou Capitalismo Mundial Tar-dio, ou simplesmente capitalismo (i.e. aglobalizao do capital) iria se inscrevernuma curva de crescimento logartmicosem precedentes. A questo saberat quando o Capital Natural (Lovins &Lovins, 1999) ir resistir ou se haverooperadores ecolgicos que orientaroessa transversalidade de uma formamenos sem sada e absurda que ele.Atualmente, existe um movimento de mu-dana para a medio da qualidade de vidadas populaes em substituio ao valor

    do PIB cuja matemtica no caracteriza asqualidades totais para uma sociedadesaudvel, economicamente equnimee ambientalmente sustentvel: A ideiade FIB Felicidade Interna Bruta, cujaorigem butanesa rapidamente se espa-lhou pelo mundo e que vem medindo aspopulaes dos pases em geral, princi-

    palmente os em desenvolvimento, peloseu grau de satisfao pessoal e das co-munidades. No entanto at pelo valor deFIB - Felicidade Interna Bruta j encon-tramos deturpao na aplicao de seuvalor chave e que este n o estaria maisligado ao bem estar social (sade, alimen-tao, saneamento, educao, lazer) e sima quanto de entrenimento e aparatustecnolgico essas populaes podempossuir! E este cenrio acena para umfuturo assustador!

    Varios tericos postulam serem as artes,em especial as aplicadas, a prxis precurso-ra ao caminho desta reinvenohumana.Considerando o ser criativo como aquelecapaz de tomar para si uma ecologia do im-aginrio humano podemos acreditar nisso,uma vez o imaginrio (aquilo que vem da

    imaginao) pertencer ao campo das sub-jetividades e estas poderem ser tratadasde forma ecolgica, logo concordamos comtais tericos sobre a importncia de sermoseco designers de comunicao visual! Nosentido de ecoarmos os diversos camposde resignificaao humana to necessriosa nossa qualidade de vida.

    Ttulos a parte, consideremos o queTerry Eagleton, terico da cultura con-tempornea postula sobre o gap (espaoa preencher) entre questes humana-mente significativas:

    A teoria cultural tal como a vemos,promete atacar al guns pr oblemas fun-damentais, mas, no todo, falha. Temsido acanhada com respeito a mor-alidade e a metafsica, embaraadaquando se trata de amor, biologia, re-ligio e revoluo, grandemente silen-ciosa sobre o mal, reticente a respeitoda morte e do sofrimento, dogmticasobre essenciais, universais e funda-mentos, e superficial a respeito de ver-dade, objetividade e ao desinteressa-da. Por qualquer estimativa, essa umaparcela da existncia humana dema-

    siado grande para ser frustrada. Almdisso, este um momento bastante em-baraoso da histria para que nos ache-mos com pouco ou nada a dizer sobrequestes to fundamentais. Vejamos sepodemos comear a corrig ir noss as de-ficincias abordando esses problemassob uma outra luz.

    Hoje somos todos eternamente jovens,esmagados pelas relaes econmicasque nos conferem apenas o direito desermos globalizados, acreditamos queser in poder conhecer sobre o ltimolanamento de um aparato tecnolgico re-cm lanado, ou de uma musica ou o queseja, na tentativa frgil de constituir ummnimo territrio existencial e com issonossa identidade. Ainda que seja inato aoser humano as caractersticas existenciaisde medir qualidade, buscar proximidade,verificar semelhana e obter simpatia,estas so abusivamente exploradas pelasestratgias de marketing, na manipu-lao destes valores, no permitindo suautilizao para outro fimque no seja o doconsumo desenfreado. O reconhecimentodestes valores por boa parte da humani-

    dade, determinaria sua melhor utilizao.O ps modernismo j tratou (e destra-tou!) inmeros contextos de rupturas,de descentramento, de globalizao, deachatamento das massas, de tudo! E jno funcionam mais os mecanismos s-cio polticos do Sc XX. (toda a poltica deglobalizao prova isso) A Igreja j era(h

    muito tempo!) e o Estado tambm. O quesobra? O homem desprovido de um senti-do de propriedade de si mesmo, (sem nadapara por em troca!). Lembram do ditadoque diz que cabea vazia lugar do cape-ta?Bem, esse tal capetapoderia estar tra-duzido nos interesses das grandes corpo-raes e ao capital flutuante multinacionalna imposio do consumo de massas.

    Mas, deixemos de figuraes e volte-mos a Guattari. Ele postula que este novosentido para a prxis humana estaria soba gide de uma perspectiva tico-polticae que a problemtica da existncia hu-mana neste novo contexto histricodeveria se ater a desenvolver prticasespecficas que tendam a modificar ereinventar maneiras de ser no seio doser, do casal, da famlia, do contexto ur-

    bano, do trabalho, etc., a que ele chamade ecosofia ou lgica das intensidades.Outros tericos do pensamento e prxishumana encontraram outras denomi-naes para este reinventar de um es-tado de Ser, mas o importante dissotudo compreendermos que na atualdescentralizao do ser desejo em si

    mesmo, para o ser desejo no desejo dooutro (Arruda, 1999), no estamos cons-truindo o ser-em-grupo saudvel, nempra humanidade, muito menos para omeio ambiente!

    Encontrar no campo prtico-profissionaldo design o pensamento de Guattari, seriatrabalharmos o design como cerne gera-dor e planejador de aes mais justas (nosentido de ajustadas) a presente urgen-cia socio ambiental. Em outras palavras,fazer design deveria significar assegu-rar a nossa sobrevivncia na Terra e nocompromet-la levando-nos a exaustode recursos, fsicos, sociais e subjetivos.

    A frase a seguir, formulada por Guattari,parece ser instigante na promoo destenovo fazer design ecolgico:O inscons-ciente permanece agarrado em fixaes

    arcaicas apenas enquanto nenhum enga-jamento o faz projetar-se para o futuro.Ao que parece, satisfazemos essenossofuturo pela viajem infinita das pos-sibilidades do mundo virtual. Mas e omundo fsico?... importante que a sub-jetividade seja trabalhada em ambos am-bientes... Esse seria o pensamento trans-

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    Fazer design deveria significar assegurar a nossasobrevivnciana Terra e no compromet-la levando-nos

    a exausto de recursos, fsicos, sociais e subjetivos.

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    A FUNO PRIMEIRA DO DESIGNER : MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA DAS PESSOASECONSEQUENTEMENTE DO AMBIENTEQUE AS CERCA ao que acrescentaramos: A

    RESPONSABILIDADE SOBRE O PROCESSO CRIATIVO E SEU EFEITO EXPANCIONAL.

    Referencias BibliogrficasBonsiepe, Gui Teoria e Prtica do Design In-dustrial. Edio Portuguesa Centro Portugusde Design, Lisboa 1992Eagleton, Terry. A Ideia de Cultura. EditoraUnesp. So Paulo, 2003.

    ______ Depois da Teoria. Ed Civilizao Bra-sileira. Rio de Janeiro, 2003Guattari, Felix As Trs Ecologias. PapirusEditora. Campinas, 2001.Hawken, Paul & Lovins, A.& Lovins, L.H. Natu-ral Capitalism. Back Bay Books. NY, 1999Arruda, Francimar Duarte. Tese de Douto-rado Niteroi: UFF, 1999.

    Eu diria que, a arte, seja ela aplicada afins comerciais e de produo seriada ouno, deve servir como partida para umfazer tico universal. Infelizmente, paraa maioria das mentes criativas tudo issono passa de uma falcia, pois embe-vecidos com as inmeras possibilidadesque a tecnologia estado-da-arte oferecea cada minuto, deferem um segundoplano a estas questes.

    Em origem o homem objetivo e sub-jetivo, da podermos criar um universotodo prprio de representaes emlinguagens as mais diversas que temorigem em nossos instintos e percepo.Por termos como capacidade esta infini-ta fonte possibilidades (as linguagensque construmos), basta-nos escolherque caminho redesenhar. Comear uma

    sociedade justa depende de reconhecer-mos que objetividade e tica no socoisas do passado e que apesar de todomovimento de desconstruo humana, osenso de sobrevivncia perdura e com elea linguagem se adequa formulao denovas formas de ser e estar com o outro.

    Um outro ponto importante, caracters-

    tico do ps modernismo o fato de notemos mais informaes sobre o mundoe sim temos o mundo como informao.O anti realismo j no mais teoria, fazparte do cotidiano virtual em que esta-mos inseridos. A prpria cultura de massad formato, incorpora-o em nosso dia-a-dia. Viramos fantoches exibicionistas emuma busca frentica por identidade.

    Se visto sob uma perspectiva posta porGuattari, poderamos dizer que: a eco-logia mental de que precisamos para areformulao das questes de sobrevivncia humanas deveria se apropriardos estudos da subjetividade criativa eplantar as sementes de novas formas deSer sujeito singular. No entanto, jogar ojogo da ecologia do imaginrio pode sertanto quanto perigoso (quando e porque

    criamos para a manipulao humanas)quanto profcuo (quando revientamosformas singulares e ecolgicas de ser eagir). Seja na vida social, na vida indi-vidual ou coletiva a ecologia mental nodeve se valer de conceitos importadosde estudos sobre a psique humana. Elanecessita se apropriar de tudo o que j

    vivemos e que desejamos ainda viverpara editar ento uma prxis ecolgica.E essa propriedade pertence ao campoda criao e no de padres cataloga-dos da experincia humana. o novo,novamente planejado.

    Sendo assim, e dando foco ao principalassunto tratado no livro de Guattari, (asecologias social e subjetivas), devera-mos focar o desenvolvimento de projetosem comunicao visual design que pro-movam um investimento efetivo e prag-mtico em grupos humanos diversos,cuja demanda por afeto (do latim afectio= poder de afetar e ser afetado) ocorram.

    A arte sempre props ser transnacion-al, cabe a ns, designers criativos, plane-jarmos e criarmos essa transcendnciade forma a garantir a sobrevivncia den-tro de padres de vida sustentveis, res-peitando a diversidade e, trabalhando empequenos nichos, produzir efetivas aessiginificativas. Ou no seria essa a nossafuno maior, postulada por Bonsiepe:

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    Casa: sentidos do habitarAnglica de Carvalho

    H

    avia muita expectativa no incio da disciplina Fotografia I. Descobrique, para muitos, como alunos do segundo perodo, uma das disci-plinas mais esperadas do curso. O que me fez pensar no encantamen-to que a fotografia exerce, mesmo com a avalanche de imagens daera digital. Partindo da ementa, os alunos deveriam adquirir noesbsicas da tcnica para expandi-las no desenvolvimento de um ex-

    presso fotogrfica. Iniciamos com algumas questes que nos direcionaram e com

    a tentativa de descobrir o que os alunos esperavam. Muitos pretendiam desvendaras funcionalidades do equipamento para expressar ou capturar algo. Quase sem-pre um conceito a ser expressado, transmitido atravs da imagem fotogrfica. Comocomeamos a fotografar e a pensar a fotografia? Por qu fotografamos? O que seriao olhar construdocom o aparelho, transformado como aparelho? Nos pergunta-mos: que aparelho esse com o qual iramos trabalhar? Quanto ao aparelho fotogr-fico, hoje, com o uso massivo das cmeras digitais, muito mais caixa preta do que

    antes, encontrei alunos que j haviamdesenvolvido alguns trabalhos, mesmona esfera profissional, e que no conhe-ciam bem os princpios bsicos envolvi-dos na produo da imagem fotogrfica.Nos primeiros dias, aps as entrevistas,identifiquei um enorme desejo peloaprendizado da tcnica para aplic-la aconceitos que deveriam ser em imagens.Talvez, o desejo por um roteiro de regrasbsicas a seguir. Jogo? Pensando comFlusser (1985), de certa forma, sim, masera preciso conhecer as regras e sub-vert-las. Necessrio entender que sepoderia pensar para alm da linearidadedos conceitos, devolvendo imagem apossibilidade de abertura para outrasdimenses e significaes (ibidem, p.8). No se deter s regras funcionais de

    um programa pr-definido, mas visar obranqueamento dessacaixa na relaosubjetiva do complexo operador-aparel-ho (ibidem, p.11), conhecendo fissuras -passagens vivenciadas e abertas duranteo processo de um olhar com, de um refle-tir a construo de imagens como um de-sejo de criar, como um desejo de iluminar.

    Nos arriscamos ento, a construir umprojeto de final de semestre buscando apotencializao de uma sensao comouma vontade que se elabora em ima-gens, que constri um ser em devir, serque ilumina e cria realidades. Ainda queFotografia I fosse um curso introdutrio,acreditei que o desenvolvimento dotrabalho deveria ultrapassar a funcion-alidade do aparelho na dimenso de umgesto do olhar.

    Refletimos ento, sobre o gesto que sed na imerso do processo, enquanto oolhar modifica e modificado, quando,distanciados da percepo cotidiana daao, deixamos que o tempo possa atu-ar, redimensionado no alargamento doinstante potico.

    Casa delineava apenas um ttulo geraldo tema proposto, no primeiro dia de

    aula, como uma provocao para que to-dos os alunos, a partir de reflexes gera-das junto turma, pudessem desenvolvero trabalho final da disciplina. A propostapretendia dirigir a ateno, para nosaproximarmos, diferentemente, de algosupostamente conhecido.Assim, o tema

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    inicialmente entendido como casa fsica,espao arquitetnico, foi aos poucos sen-do expandido e, com a ajuda dos debatese das orientaes, fomos definindo, emcada projeto, um sentimento de habitar.Nos perguntvamos: o que casa paramim? O que no ? Qual o avesso do sesentir em casa? Esses sentimentos sorealmente antagnicos? Quais os es-paos do mundo onde me sinto em casa?Essa casa pode existir no meu corpo? Nosmeus amigos? Na minha famlia? Queespaos do mundo abrigam ou repelem,nutrindo um ser em devir?

    Dois textos centrais guiaram o proces-so de construo do ensaio: A Filosofiada Caixa Preta, de Vilm Flusser e a Po-tica do Espao de Gaston Bachelard. ComFlusser pensamos sobre as possveis sig-nificaes que as imagens tcnicas ad-

    quirem em sua dimenso histrica. Dis-cutimos as implicaes da linearidadedo pensamento ocidental e o campo decontradies e possibilidades no quala imagem se instaura como mediaoentre o homem e o mundo. Com a in-troduo da Potica do Espao busca-

    mos potencializar o processo de criaocom uma abertura ao lugar do vnculo;seguindo Bachelard, adotamos a noode topofilia (1993, p.19). A habitaoseria, numa perspectiva ntima, um es-pao de criao do ser ser da imagem,com seu delineamento e existncia in-ternos a ela, com seus sentidos e poten-cialidades vivenciados como uma reali-dade inaugural, criada na imagem. Suacoerncia se dava independente de el-ementos externos a ela. Assim, a noode habitao acabava por elaborar umaimagem imprevista.

    Nessa perspectiva, a ideia inicial derepresentao de um conceito, coloca-da por alguns alunos, revelou-se intildentro de um processo de criao noqual possveis conceitos se constroempor dentro do processo, onde direes

    a priori, poderiam funcionar apenascomo um delineamento sutil do tema.Estvamos refletindo sobre sentimen-tos muito fludos, guiados por sonori-dades de uma imagem potica, que,por seu carter variacional, elabora in-finitamente um ser em sua atualidade

    um ser da imagem em tal concretudee mutabilidade que, qualquer tentativade mera representao ou de fixaoem um conceito, asfixiava e diminuaas possibilidades do trabalho.

    Retornando a pergunta: o que seria oolhar construdo com o aparelho? O quemuda quando o meu gesto de olhar coma cmera se configura no ato fotogr-fico? Excluindo os aspectos legais, comoresponder a pergunta de quem essafoto? Do fotgrafo? Do modelo? E quemv essa imagem, tambm, de certa for-ma, no a engendra? Estas perguntasnos ajudaram a estar no processo decriao da imagem com uma aberturamaior a um campo de possibili dadesonde o fotgrafo, assim como o poeta, aquele que conhece, isto , que tran-scende, e d nome ao que conhece

    (1993, p.15) e onde os limites entre ob-jeto e sujeito se diluem. O traba lho sedesenvolveu ento, como uma abertu-ra a algo que se deu a conhecer no pro-cesso, que se instaurou e continuouem uma imagem potica, no processode repercusso da imagem.

    Nos perguntvamos: o que casa para mim?

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    g ( ) 3 Casa Sentidos do habitar

    Quando me deparei com o questiona-mento do que seria casa, percebi quepara mim, ela constitua mais do queum espao fsico. Bachelard comparacasa a uma topografia de nosso serntimo e partindo disso, me coloqueicomo objeto central de meu processocriativo, buscando explorar, analisar equestionar minha prpria intimidade....Amanda Rosetti...Comida unio. Voc sai com seus

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    Comida unio. Voc sai com seus amigos para comer... e ela est sempre l, apoiando uma conversa, ou po-dendo at ser o tema de uma... nisso que o meu trabalho tamb m se baseia, em como a comida est presenteem nossas relaes. Ento, comecei muito resistente, com a ideia fixa de tentar reproduzir isto, at que chegouuma hora em que tateei no escuro. S consigo perceber o rumo que tomei agora que o projeto terminou. Sagora consigo ver o que dominou o meu olhar... Me perdi muitas vezes sem saber o que fazer, mas essas perdasme levaram a resultados melhores... Passei a ver com outros olhos as pessoas que eu amo, as cachorras que euamo, as atividades que eu amo, mudanas que eu nunca achei que fossem possveis...Livia Prata

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    27Bahamut, meu desprazer. Sua chegada trouxe consigo muitas desgraas, instan-taneamente remetidas por mim, a ele. Minha casa se tornou um lugar sombrio edesconfortvel com tais acontecimentos. Entretanto, com o desenrolar do ensaio,percebi que o que mais me desagradava naquele gato, era que eu me via nele e emcada um de seus olhares.Lara Torres

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    ...Foi difcil encontrar um caminho para o tema do projeto. Quanto mais esforoera feito mais longe ficavam os resultados. Foi s quando comecei a relaxar e medeixar levar, que os caminhos foram surgindo e o ensaio acabou ficando muito maisrico e profundo do que eu tinha planejado inicialmente. O processo me fez entrarem contato com sentimentos que antes me negava a deixar fluir. Passei a olhar omomento que minha casa passa de outra forma...Mayara Lista

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    ...Queria algo diferente, divertido, que despertasse um sorriso espontneo emquem visse minhas fotos; mas como se minha inspirao no aparecia?... Foi trabal-hoso e demorado... Achar cenas que, de alguma forma, deixassem as pessoas livrespara imaginar... espaos em branco! Comecei a criar mais intimidade com o temae, no final, at que deu certo! Uma frase que a professora disse: suas fotos tm essacoisa engraada. Isso me remeteu primeira ideia do projeto e me deixou muitofeliz, pois consegui alcanar os objetivos.Beatriz Barcelos

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    ...Alma e local... Anterior a esse lao, o que existia era o desejo de conhecer o que setratava de um mistrio... Fui apresentada cidade do Rio de Janeiro com a viso demundo de uma adolescente... O que encontrei no foi o caos de que ouvia falar, masalgo muito maior do que qualquer resistncia que eu pudesse ter levantado...Hend Karime Ayoub

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    Referncias BibliogrficasBACHELARD, Gaston. A potica do Es-

    pao; traduo Antonio de Pdua Danesi.1 edio. So Paulo: Martins Fontes, 1993.

    FLUSSER, Vilem. A filosofia da caixa pre-ta. So Paulo: Ed. Hucitec,1985.

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    Categorias utenslios domsticos/Bules ecanecas - Acervo Lina Bo B ardi - So Paulo/SP

    Objetos da adversidade:

    Marcus Dohmann

    sta pesquisa, empreendida ao longo de 12 meses, no perodo de agosto de 2011a agosto de 2012, com a finalidade de obter o ttulo de ps-doutoramento, foidesenvolvida no Programa Avanado de Cultura Contempornea da UFRJ, nalinha de pesquisa de Cultura e Desenvolvimento, sob a superviso da Prof.Dr. Rosza W. vel Zoladz e d continuidade ao grande interesse despertadosobre os objetos e cultuado desde o meu ingresso na graduao em Desenho

    Industrial, na dcada de 1970; gradativamente encorpado na trajetriadas pesquisas empreendidas durante o Mestrado e Doutorado, junto aoPrograma de Ps-graduao em Artes Visuais da Escola de Belas Artes daUFRJ, ao longo dos ltimos 15 anos.E

    Um olhar etnogrfico sobre a recontextualizao material urbana

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    conectam indivduos com as suas realidades, segundo tcnicas nada convencio-nais, ou mesmo, a partir da total ausncia destas.

    Entendendo que as cincias e as tcnicas so inextricveis dos modos de percep-o humana, empreende-se aqui um relato sobre alguns aspectos dessa experinciamaterial urbana, onde habilidade e percepo se misturaram definitivamente para agerao de solues materiais oriundas da cultura ps-industrial.

    Desta sorte, o artefato, como resultado da trade meio/homem/habilidade, no sen-

    tido da tcnica, mais investido de funo e finalidade do que de sentido e repre-sentao, tem seu contorno evidenciado como elemento central desta pesquisa, aoapresentar novas facetas que permitem ao leitor situ-lo e, sobretudo, entend-locomo mediador entre o homem e o ambiente urbano.

    As imagens coletadas ao longo da pesquisa testemunham de forma inegvel umaparcela pouco revelada e estudada da histria tecnolgica das sociedades, alm derefletirem exemplos do psiquismo individual e dos seus meios sociais.

    Lanterna feita atravs da recontextualizaomaterial de lata de conserva - Imagens do autor.

    Quando imaginei o ttulo Objetos da

    adversidade percebi que seria a expres-so mais adequada e o ponto de partidapara categorizar o sentido singular quea palavra objeto representa no conjuntode casos estudados. A temtica do objetoaqui abordada em investigao profundaexpe sua condio ps-industrial comoeixo temtico e denominador comum.

    Nessa relao objeto/sujeito, face aorestrito referencial terico existente,inaugurado por Lina Bo Bardi, em suaspesquisas no Nordeste do Brasil, nadcada de 1960, torna-se necessria aconstruo de princpios analticos es-pecficos para sua compreenso, fun-damentando teorias e hipteses para oestudo sobre esta nova ordem dos arte-fatos, nem industrial, nem artesanal.

    O estudo aqui apresentado inicia um

    trabalho idealizado h mais de dezanos, para a construo de um Ncleode Estudos do Objeto [NEO], para ondeprocuro convergir olhares multidiscipli-nares que tm no sistema de objetosseu ponto comum de investigao e,ao mesmo tempo, procurando redefinir

    Viver, de todo modo, provoca necessidadesque, por suavez, so atendidas com objetos, artefatos ou produtos,

    mediante funes que ligam o homem aos seus objetos.

    termos e noes nos modos de pensar e

    ver a nossa cultura material.Como resultado, esta pesquisa resgata

    uma consistente iniciativa que chama aateno para a questo da experinciamaterial humana, sobretudo, mais es-pecificamente, no processo de reapro-veitamento dos refugos materiais juntos categorias menos favorecidas dosgrandes centros urbanos.

    Objetos da adversidade lana um olharetnogrfico sobre os artefatos como com-panheiros nas experincias da vida coti-diana urbana simples, captando a relaoobjeto-indivduo, ento transformada emum predicado da prpria sobrevivncia.

    Concordando que nos tempos atuaisa sociedade humana experimenta umaimerso total no culto aos objetos, quese renovam e multiplicam aos milhares,

    configurando o nosso entorno e influen-ciando profundamente nossas relaessociais, esta abordagem expe artefatos,sujeitos e novos sentidos em uma mistu-ra que proporciona renovadas reflexesacerca desse fantstico universo fsicoto presente no cotidiano do homem.

    Com a inteno de chamar a ateno

    para um novo olhar que visa compre-ender uma faceta mais obscura des-se universo material que nos cerca,fundamentado em um levantamentosobre a reutilizao dos objetos des-cartados pela sociedade de consumo,este estudo foi idealizado sob um visdiferenciado, onde a carncia mate-rial identifica-se como fator motivadorpara a inventividade dos indivduos.

    Viver, de todo modo, provoca necessi-dades que, por sua vez, so atendidascom objetos, artefatos ou produtos, me-diante a funes que ligam o homemaos seus objetivos.

    No sentido do objeto ter a funo deaproximar o indivduo dos seus resul-tados, facilitando, surpreendendo ouemocionando, apresenta-se aqui uma

    questo problematizada, transfiguradano jeitinho brasileiro que, sob um visempirista, registra maneiras incomunsde lidar com as situaes advindas dacarncia material; a partir do improvisode solues verdadeiramente espont-neas e intuitivas, nas quais os objetos

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    Cumprindo o objetivo de destacar, regis-

    trar e documentar a produo materialdessa verdadeira massa que inventa,em expresso adotada pela prpria LinaBo Bardi, o presente estudo tem o seu di-ferencial perpassado por esta etnografiavisual que revela a originalidade des-sas criaes; identificadas em um tristeexemplo do gap social da cultura materialurbana, quando utiliza iniciativas fundi-das na informalidade e na marginalidadeda sociedade de consumo, subvertendo osartefatos no seu processo original de uso,em curiosas assemblages, combinando eadicionando-lhes novas funes.

    De acordo com Lina Bo Bardi, o concei-to de design popular era fortementemarcado pelo aspecto alternativo que asprodues materiais apresentavam, so-bretudo no tangente s relaes sociais

    atravs delas empreendidas.Deste instvel e imprevisvel cam-

    po de produo poderemos traar doisgrandes grupos iniciais: um primeiro,categorizado a partir dos objetos da au-tonomia, ligados ao entorno mais ime-diato dos indivduos e caracterizado pe-

    los utenslios da vida cotidiana, em uma

    produo voltada de forma exclusiva aovalor de uso dos artefatos; e uma segun-da categoria caracterizada pelos objetosda subservincia, muitas vezes vistoscomo falsos retratos de uma imagemsimples e bondosa do homem do ser-to nordestino, que nas figuras de barroe estrias de cordel tm estampados oseu exclusivo valor de troca.

    A documentao deste inventrio, pre-conizado no estudo feito por Lina, estestruturada com base no binmio danecessidade e do utilitarismo que, aomesmo tempo em que estabelece o cri-trio fundamental que valorizava o ladopositivo dos objetos criados neste tipode produo alternativa, procura supe-rar sua carncia sgnica, portando algomais do que simples valores sociais sub-

    jetivos que possam refletir a capacidadeinventiva do p ovo no sentido de dobrar econtornar as multifacetadas barreiras danecessidade em favor da sobrevivncia.

    A princpio pensou-se em uma delimi-tao para essa pesquisa, em um espaoa ser compreendido principalmente pe-

    las zonas Sul e Centro da cidade do Rio

    de Janeiro, porm no decorrer da inves-tigao surgiram outros exemplos signi-ficativos e interessantes de serem regis-trados, talvez menos pela quantidade, emais pela variedade de composies re-contextualizadas a partir dos materiaisresiduais encontrados.

    Como metodologia empregada para oregistro dos dados coletados, incluiu-seo levantamento fotogrfico e o trata-mento grfico-analtico de alguns des-ses objetos investigados, procurandodetalh-los um pouco mais atravs dedesenhos ilustrativos para o auxlio nacompreenso das formas estudadas, porvezes necessrio devido complexidadede detalhes das peas empregadas.

    Com a preocupao de registrar a ef-mera presena desses fascinantes obje-

    tos que se criam e se perdem diariamen-te na resposta s necessidades e desejosmaterializados pela prtica da improvi-sao, o presente trabalho reafirma a suaimportncia na documentao dessasemblemticas manifestaes configura-das pela imaginao dos indivduos que

    Jnior do Churrasquinho/So Cristvo/RJ -Imagens do autor

    imagem (i) matria 2013.2 Objetos da adversidade

    vivem de forma mais intensa as carn-d b b

    nas quantidades, mltiplas funes sod h d d d fi l

    tativas convencionais, ao assumir for-l l

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    Nas grandes capitais como o Rio de Janeiro, o lixo umafonte de sobrevivncia para milhares de indivduos, entreadultos e crianas. Ainda que em pequenas quantidades,mltiplas funes so desempenhadas antes do destino

    final dos materiais descartados nos lixes.

    cias do ambiente urbano que os cerca.Artefatos recontextualizados a partir

    da lata abandonada na esquina, da ge-ladeira descartada, do pneu usado e des-gastado junto calada, expem e iden-tificam traos e peculiaridades de umacultura material advinda da urbe e res-sucitada em uma segunda vida, atravsde arranjos e composies carregadoscom novos propsitos e intenes; cons-trudos com o auxlio de ferramentassimples e saberes empricos, para a for-mao de um singular universo materialpresente nas ruas, exclusivamente clas-

    sificado pelos seus atributos funcionais.Para finalizar, entendendo que a his-

    tria oral dos atores sociais envolvidosconfigura um testemunho real do jeiti-nho brasileiro, o qual, sob um vis em-pirista, denota uma maneira especial delidar com as situaes, a partir do impro-viso e da espontaneidade de soluespara os problemas materiais do cotidia-no dessa gente.

    Nesse sentido, confirmou-se ser defundamental importncia incluir um re-corte de uma das entrevistas realizadasdurante a pesquisa, reiterando o valor dotrabalho de campo e da documentaofotogrfica em estudos dessa natureza.

    Os materiais provenientes do descar-te da sociedade de consumo h muitoorientam diversos projetos na rea da

    sustentabilidade, atravs de programasgovernamentais, ONGs, cooperativas erecontextualizaes industriais.

    Nas grandes capitais como o Rio de J a-neiro, o lixo uma fonte de sobrevivn-cia para milhares de indivduos, entreadultos e crianas. Ainda que em peque-

    desempenhadas antes do destino finaldos materiais descartados nos lixes.

    A admirvel capacidade de transfor-mar muitos desses materiais descarta-dos resulta em um estranho e curioso in-ventrio de objetos criados para suprir asnecessidades daqueles que personificamos crescentes ndices das desigualdadessociais, em uma faceta pouco estudadada nossa cultura material urbana.

    Como bem nos lembra Stuart Hall, acultura tem assumido uma funo deimportncia sem igual no que diz res-peito estrutura e organizao da so-

    ciedade moderna tardia, aos processosde desenvolvimento do meio ambienteglobal e disposio de seus recursoseconmicos e materiais. Os meios deproduo, circulao e troca cultural, emparticular, tm se expandido, atravsdos mais diversos tipos de tecnologias,das computacionais s alternativas.

    O recorte estudado na presente pesqui-sa, nos mostra uma dimenso da culturaque segue uma via expressa em direo materialidade, permitindo interessan-tes anlises acerca dos objetos que ocu-pam nosso cotidiano, que nos faz con-cordar com Roy Wagner, quando afirmaser o homem um mediador de coisas,uma espcie de catalisador universal.Em sua imaginao ele um construtor,um ator e um modelador da natureza

    imbudo de propsito, ou ento um par-ceiro e colaborador solidrio dos poderesdo mundo (Wagner, 2010: 211).

    Ferramentas, instrumentos, peas, ve-culos, utenslios e geringonas formamum repertrio mpar de objetos nicos,tecnicamente desvinculados das expec-

    mas que revelam a incontestvel marcada excluso social, ilustrando de manei-ra enftica a frase estampada na capa--parangol (1966) de Hlio Oiticica: Daadversidade vivemos.

    Objetos originrios de uma bricolageurbana, por vezes rotulada como de-sign espontneo, no permitem suaidentificao autoral, porm, no obs-tante, carregam a personalidade de seusverdadeiros autores, em um fascinanteprocesso de inveno formal, consti-tuindo a essncia de um tipo de designverdadeiramente popular.

    um tipo de cultura material mar-ginal onde vemos o velho transfigu-rando-se em novo, a partir da trans-formao de um objeto em outro, queno previsto em seu momento inicial,quando da produo industrial.

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    O desmonte e seriao dos mtodos deproduo das ltimas Revolues Indus-triais props uma lgica baseada na frag-mentao e no intercmbio, para a otimi-zao de seus produtos. O processo linearque as artes e ofcios em oficinas traziamevoluiu para um ambiente multifaceta-do, movido e mantido pela mudana tec-nolgica, imposio do modelo industrialcapitalista que tem como suas principaistintas a versatilidade da mudana.

    Essa viso globalizada aqui une duasreas que, dada suas origens, dificil-mente seriam associadas de incio: as

    marcas ou identidades visuais coma visualizao de dados. A interseodesses dois campos gera as incipientesmarcas dinmicas. A primeira rea, comorigens remotas que datam dos sine-tes mesopotmicos e dos brases defamlias da Idade Mdia, uma maneira

    As marcas dinmicas, do que adquiriram das marcas tradicionais, so unidades ousistemas visuais representativos de uma ideia ou entidade; e devido a visualizao dedados, so capazes demodificarsua forma com dados especficos.

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    representar uma ideia, pessoa, grupo ouentidade atravs de uma marca grfica,geralmente visando sua manifestaomais sinttica e marcante. Teve augeno design modernista do sculo XX, queaperfeioou um sistema comunicativonico com diversos elementos, comosinalizao de ambientes, tipografia ins-titucional e grid padro.

    J a visualizao de dados um campohbrido e interdisciplinar por natureza,conectando arte, design, cincia e com-putao na gerao de representaesvisuais que traduzem dados brutos em

    sistemas grficos, no raro com inter-faces interativas. Por refletir uma visode mundo bem difundida hoje, calcadano excesso de dados, heterogeneidadee fluxo, est sendo empregada prolifica-mente em outras reas para a visuali-zao de complexas cadeias informativas.

    Uma marca dinmica para o LabVisDoris Kosminsky e Igor Amorim

    E

    m uma anlise superficial do mundo natural e cultural, a mudana a nica constante que possumos. Essa tendncia se observa tanto emmacro mudanas climticas, revolues quanto em micro nosgrupos sociais urbanos e manifestaes estticas de movimentos dearte. Em ltimas consequncias observamos esse caminho voltar a serpercorrido com o design, porm com associaes inditas.

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    As marcas dinmicas, do que adquiriram das marcas tradicionais, so unidades ousistemas visuais representativos de uma ideia ou entidade; e devido a visualizaode dados, so capazes de modificar sua forma com dados especficos. Em um reflexoda pluralidade recorrente da contemporaneidade, um vis recente de design cor-porativista uma das primeiras manifestaes foi a marca da MTV, nos anos 80 que vem se prometendo como mais de uma mera moda estilstica. Comprova-seessa ideia com as representativas marcas dinmicas do LabMedia do MIT, da Casada Msica de Portugal e da regio de Nordkyn.

    A marca do LabMedia do MIT inicialmente formada por trs quadrados coloridosque projetam entre si outros quadrados maiores. A posio e cores dos quadradosso modificadas de acordo com um algoritmo, gerando 40 mil variaes com signifi-cativas diferenas. Cada marca cedida a uma pessoa componente da instituio professor, aluno, funcionrio , que passa a possuir uma variao nica da marca,

    sem que seja repetida em 20 anos.A marca da Casa da Msica foi retirada do slido geomtrico que deu origem planta do edifcio que abriga a instituio portuguesa. Como sua forma permitediferentes apreenses de acordo com a localizao de seu observador, a marca sevale de seis diferentes rotaes e preenche suas faces com cores que variam deacordo com o ambiente visual em que a marca inserida fotos, ilustraes, cores,texturas gerando infinitas variaes cromticas.

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    A posio e cores dos quadrados so modificadas deacordo com um algoritmo, gerando40 mil variaes

    com significativas diferenas.

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    Nordkyn uma inspita regio aonorte da Noruega, e sua marca, a fimde incentivar o turismo, inspirada nohexgono do floco de neve. Seus vrticestm seus ngulos alterados e formamuma seta que indica a direo do vento,e as cores da forma indicam a tempera-tura do local. Os dados a alteram a cadacinco minutos, e podem ser observadosno site. Embora seja um sistema comnmero limitado de variaes, ilustraum fator imprevisvel como o tempo.

    A marca para o Laboratrio da Visuali-dade e Visualizao est sendo desen-volvida nesse momento com orientaoda professora Doris Kosminsky, di-

    rigente do LabVis. Partindo do conceitoda comunicao universal que guia odesign desde sua gnese bauhausiana,e fazendo referncia visualizao dedados e infografismo temas aborda-dos no LabVis vai ser uma vitrine doque desenvolvemos no curso.

    Teve auge no design modernista do sculo XX, queaperfeioou um sistema comunicativonico com

    diversos elementos.

    A ideia que coletemos dados relativosao sistema de educao brasileiro tan-to mbito nacional quanto na seo uni-versitria e/ou apenas da prpria U FRJ.Tal coleta seria automtica atravs doRSS de sites relativos ao assunto e gera-ria modificaes em tempo real na marca.Como o LabVis trata tanto do mundoexterno (Vis, visualizao de dados)quanto do interno (Lab, laboratrio de es-tudantes), pareceu adequado a escolha dedados tanto sobre a educao brasileiracomo um todo como algo mais especficoda UFRJ. As opes de dados so diversas:a quantidade de alunos que colam graupor perodo, nmero de matrculas ativas,

    circulao de veculos na Cidade Univer-sitria, montante de notcias positivasou negativas sobre a educao, valoresde verba investidos, consumo de energia,etc.. O desafio conseguir um modo efi-ciente capturar esses dados automatica-mente e process-los na marca.

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    Outro ponto de importncia justamente o controle de tamanhainformao: devem-se estabelecerlimitespara que os dadosno se sobreponham totalmente ao seu invlucro visual

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    Outro ponto de importncia justamente o controle de tamanha informao: de-vem-se estabelecer limites para que os dados no se sobreponham totalmente ao seuinvlucro visual e no distoram o desenho da marca no ponto em que suas variaesse tornem muito distintas em outros termos, a marca deve conviver harmoniosa-mente com a visualizao de dados. Como os trs exemplos citados acima, essenciala conexo formal da marca-me com suas subsequentes. E, de uma maneira geral, apropriedade dinmica deve ser usada como uma ferramenta potencializadora das ne-cessidades do projeto, e no como uma amarra formal. Mesmo que com novas peasem jogo, os princpios de que a forma segue a funo continuam a se aplicar aqui.

    A marca, a ser aplicada novo site do LabVis, alm de suas utilidades imediatas, vema fim de trazer essa tendncia de design, at agora indita no Brasil, ao grupo de pes-quisa do curso de Comunicao Visual Design da UFRJ. Paralelamente, tambm vaiser uma maneira de se atentar a uma nova mdia, que faz de sua anlise um modo deentender as novas manifestaes visuais de nosso tempo, naturalmente hbridas e conec-tadas a outros campos de igual e vital importncia.

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    Daniel B. PortugalDoutorando em Comunicao e Cultura na UFRJ,

    Mestre em Comunicao e Prticas de Consumo pelaESPM-SP e De signer pela UFRJ. Atua como professorsubstituto no curso de Comunicao visual Design daUFRJ. Pesquisa temas relacionados a: comunicao,consumo, tica, esttica, teoria da imagem, design.

    Marcelo RibeiroPossui graduao em Desenho Industrial - Pro-

    gramao Visual pela Universidade Federal do Rio de

    Janeiro (1995), mestrado (2004) e doutorado (2009)em Design pela Pontifcia Universidade Catlica(RJ). Foi professor substituto (disciplina Desenho) daUniversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e foiprofessor do c urso tcnico Multimdia no NAVE (N-cleo Avanado em Educao), projeto financiado peloGoverno do Estado do Rio de Janeiro e Oi Futuro. Foiselecionado para participar do UNESCO-BIB Work-shop, Bienal de Ilustrao. Recebeu o Prmio Petrobraspara a realizao do curta Avenida Rio Branco: quadroa quadro e, em 2004, recebeu o Prmio de Melhor Il-ustrao FNLIJ. Atualmente coordenador e ProfessorAdjunto do curso de Comunicao Visual Design (EBA-UFRJ) das disciplinas Bidimensional, Tridimensional,Mdia Digital e Anlise da Imagem. Tem experin-cia na rea de Design, atuando principalmente nosseguintes temas: design grfico, design de exposio,ilustrao e animao.

    Ana SenoEt occaecat. Ad modignam que volorest rera veli-

    taqui inullabo. Anim aut aut qui tes et, in re quodiailiqui cum vit ut omnis assim remqui corehendio eiciomnita peligni musciisciis eum ipiet fugiati aut etdoluptate lam hiciatur, con plabo. Nem reiciet quesequi cusam qui officia dem il .

    Norma:Possui graduao em Desenho Industrial pela Uni-

    versidade Federal do Rio de Janeiro (1997), graduaoem Escultura pela Universidade Federal do Rio deJaneiro (1991) e mestrado em Cincias da Arte pela

    Currculo

    Universidade Federal Fluminense (2003). ProfessoraAssistente 40DE do Curso de Comunicao Visual De-sign da Universidade Federal do Rio de Janeiro atuarea de ensino (graduao) e coordenao(projetosde extenso), Criao em Artes e Design, com nfaseem Design Institucional, de Informao e Educao,Eco Design e Sustentabilidade, atuando principal-mente nos seguintes temas: design & comunicaosustentvel, comunicaao design, oficina basicapara c omunica o v isual , info de sign, ecolo gia s o-cial, ilustrao e potica das artes visuais. total-

    mente fluente nos idiomas Portugues, Ingls e Es-panhol . Franc s, l be m. Rea liza p esquis as junto aoNcleo de Comunic ao De sign NC D-EBA /UF RJ, foiCo Orientadora do Projeto de Extenso Ilha Designda UFRJ e colaboradora do Instituto Multidiscipli-nar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro- UFRRJ. Coordenadora de Extenso do Depar-tamento BAV, coordenando projeto de extenso"Design em Emergncia objeto de pesquisajunto ao NCD/CVD/ EBA.

    Anglica de Carvalho

    Int quidi di debitiaspic te raero tes et ur mi, nectemvelluptur molor alibea dipsam net ex eatem facestinumendis is estia nos audi reriandi con rem abor autenisqua spidiorestem vellum net la volupta ipiet do-luptur susam nobitae mo maionsed quunt, qui simdolorepro dit estio. Nitibus et es demquia tempori-atem voluptatur, idesequi rati iusapit faccum apid maquias simodic ienihilit volent in rem facia nos dolectaecust, commodi tatus.

    Marcus DohmannCom Ps-Doutorado em Estudos Culturais, pelo

    Programa Avanado de Cultura Contempornea PACC/UFRJ, Doutor em Artes Visuais e Mestre emHistria da Arte pelo Programa de Ps-Graduaoem Artes Visuais da Escola da Belas Artes PPGAV/EBA/UFRJ; e Bacharel em Desenho Industrial pelaEscola de Belas Artes da UFRJ. Professor do Depar-tamento de Comunicao Visual da Escola de BelasArtes da UFRJ e membro do quadro permanente da

    linha de pesquisa Imagem e Cultura do Programade Ps-Graduao em Artes Visuais PPGAV/EBA/UFRJ. Coordenador do Laboratrio Grfico de Comu-nicao Visual LabGraf/EBA/UFRJ e lder do Grupode Pesquisa do Ncleo de Estudos do Objeto NEO,vinculado Plataforma Lattes/CNPq. Consultor paraDesign da Incubadora de Empresas da COPPE/UFRJ.

    E-mail: [email protected]

    Doris KosminskyProfessora do curso de Comunicao Visual Design

    e do Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais(Linha Poticas Interdisciplinares - PPGAV) da Escolade Belas Artes da UFRJ onde coordena o Laboratrioda Visualidade e Visualizao - LabVis / EBA-UFRJ.Possui graduao em Des enho Industr ial pel a ESDI-UERJ (1982), mestrado (2003) e doutorado (2008) emDesign pela PUC-Rio com Meno Honrosa no PrmioCapes de Tese de 2009. Trabalhou como editora dearte no jornalismo da TV Globo e lecionou em cur-sos de especializao no SENAI-CETIQT e na PUC-Rio.Tem experincia interdisciplinar nas reas de designde informao, TV graphics, imagem e animao,construo social da visualidade, visualizao arts-tica de dados, artes visuais e novas mdias.

    Igor AmorimNusandus exerspi endio. Nem simporum net a e t

    audam, im dis el idit mossimint aspicil idus rescili-bus. Uga. Net exere quatque eossunt alitas dolorererunt, ut lam qoluptiumquo blaccuptas el moluptadoluptatum eatur sus.