revista doctor plinio 211_201510

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Publicação Mensal Ano XVIII - Nº 211 Outubro de 2015 Holocausto incondicional

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Revista Doctor Plinio DrPlinio-211_201510

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Page 1: Revista Doctor Plinio 211_201510

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

Holocausto incondicional

S

Viacutetima expiatoacuteria

2

anta Teresinha tinha uma certeza interior mdash baseada em indiacutecios

muito bem escolhidos definidos e analisados de sua vida espiritual mdash de que ela seria uma viacutetima expiatoacuteria do Amor Misericordioso e de que deveria realizar isto no Carmelo

Diante dos maiores obstaacuteculos ela natildeo teve nenhuma duacutevida de que entraria para o Carmelo e de que o Amor Misericordioso a chamaria em determinado momento para consumi-la como viacutetima

Assim ela teve ocasiatildeo de dizer no meio de todas as amarguras pelas quais passou que a taccedila dos seus desejos estava cheia ateacute os bordos Essas amarguras eram os desejos dela os sofrimentos que ela queria ter

Isto eacute a confianccedila Santa Teresinha tinha uma soacutelida convicccedilatildeo de que era esta a finalidade dela e a certeza de que a Providecircncia faria todo o necessaacuterio para que se realizasse este objetivo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1781973)

Rep

rodu

ccedilatildeo

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

Holocausto incondicional

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

INSC - 115227674110

Diretor

Gilberto de Oliveira

Conselho Consultivo Antonio Rodrigues Ferreira Carlos Augusto G Picanccedilo

Jorge Eduardo G Koury

Redaccedilatildeo e Administraccedilatildeo Rua Antocircnio Pereira de Sousa 194 - Sala 27

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Impressatildeo e acabamento Graacutefica Print Induacutestria e Editora Ltda

Av Joatildeo Eugecircnio Gonccedilalves Pinheiro 350 78010-308 - Cuiabaacute - MT

Tel (65) 3617-7600

SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

Preccedilos da assinatura anual

Comum R$ 13000Colaborador R$ 18000Propulsor R$ 41500Grande Propulsor R$ 65500Exemplar avulso R$ 1800

Serviccedilo de Atendimento ao Assinante

TelFax (11) 2236-1027

Editorial 4 A essecircncia de um holocausto

PiEdadE Pliniana 5 Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do

holocausto incondicionaldona lucilia

6 Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS 8 Desejo de admirar e contemplar

rEflExotildeES tEoloacutegicaS 12 Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

gESta marial dE um varatildeo catoacutelico 16 Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

PErSPEctiva Pliniana da hiStoacuteria 22 Dom Joatildeo VI no Brasil - II

calEndaacuterio doS SantoS 26 Santos de Outubro

hagiografia 28 O carisma da boa conversa

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde 32 A beleza da luta - II

Uacuteltima Paacutegina 36 Oraccedilatildeo que move montanhas

Na capa Dr Plinio na deacutecada de 1990 Foto Arquivo Revista

Editorial

A

A essecircncia de um holocausto

o recordar os vinte anos do falecimento de Dr Plinio ocorrido a 3 de outubro de 1995 e ana-

lisando sua vida e a coerecircncia de seu pensamento torna-se inequiacutevoco o quanto ele foi um ho-

mem de Feacute inteiramente disposto a sofrer por amor agrave Igreja

Desde cedo Nossa Senhora me concedeu a graccedila de perceber que a Feacute catoacutelica era o maior valor da Terra mais precioso que a luz dos meus olhos mais inestimaacutevel que os meus dias mais rico do que tudo E portanto viver era viver desta Feacute consagrar-me completamente agrave Santa Igreja lutando pelo triunfo dela sobre o mal que procurava erradicar do mundo a Feacute catoacutelica apostoacutelica romana1

Graccedilas a Nossa Senhora uma coisa eacute verdade poder-me-atildeo faltar outras qualidades mas com a ajuda de Maria Santiacutessima natildeo hesito em afirmar Feacute eu tenho Nunca me atribuiacute virtude alguma mas como afirmar minha Feacute eacute de si mesmo um ato de Feacute eu reafirmo Feacute eu tenho Sei que devo es-ta graccedila agrave intercessatildeo da Santiacutessima Virgem pois natildeo a mereccedilo e sem Ela eu natildeo a teria obtido

Isso me potildee dentro da alma um todo em funccedilatildeo do qual vivo existo sou penso dentro do qual me movo e o qual de modo consciente e sem nunca ter duvidado analisei inteiramente Isso eu quis e quero com toda a minha vontade e a isso me dou num ato verdadeiramente de doaccedilatildeo religiosa2

Para manter acesa esta Feacute e levar ao extremo seu entusiasmo pela Igreja natildeo faltaram a Dr Plinio

grandes sofrimentos pedindo-lhe uma contiacutenua renuacutencia de si mesmo

A grande imolaccedilatildeo de nossa vida espiritual eacute querermos deixar de ser o que somos e sermos intei-ramente aquilo que a Igreja quer que sejamos Este eacute o grande holocausto de nossa vida espiritual O resto ― doenccedila provaccedilotildees etc ― satildeo meios para nos tornarmos generosos para praticar esse sacrifiacute-cio [] O centro do holocausto de um homem eacute a integridade com que ele o deseja

Sempre tive o anseio de inteiramente desejar essa minha imolaccedilatildeo e considerei que a essecircncia do meu holocausto era ter o meu espiacuterito preparado por meio da coerecircncia doutrinaacuteria da previsatildeo e de outros fatores espirituais para ser uma fortaleza no meio das trevas ou um navio no meio da tem-pestade3

Agrave luz dessas consideraccedilotildees inauguramos nesta ediccedilatildeo a seccedilatildeo ldquoPiedade plinianardquo na qual contem-

plaremos uma das oraccedilotildees compostas por Dr Plinio pedindo a graccedila do holocausto incondicional agrave von-

tade divina

1) Conferecircncia de 8919822) Conferecircncia de 9319803) Conferecircncia de 19121973

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

C

Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do holocausto

incondicional

5

Piedade Pliniana

Dr Plinio conduz em seu automoacutevel a imagem peregrina de Nossa Senhora de Faacutetima

oncedei-nos Matildee e Senhora nossa que assim como o guerreiro natildeo esco-lhe o teatro de batalha e estaacute disposto a fazer em qualquer campo o ho-locausto de sua vida assim tambeacutem saibamos lutar contra os inimigos mdash

velados ou declarados mdash de vosso Nome e da Santa Igreja onde quer que seja-mos mandados tanto no anonimato quanto na gloacuteria tanto no heroiacutesmo invisiacute-vel e como que impalpaacutevel da existecircncia prosaica de todos os dias quanto nos lances traacutegicos dos acontecimentos que vossa mensagem de Faacutetima prenuncia

Essa graccedila noacutes Vo-la imploramos como favor do qual natildeo somos dignos e se natildeo estremecemos diante de tudo o que ela significa eacute que sabemos poder con-fiar com confianccedila sem limites no vosso Coraccedilatildeo Imaculado forccedila dos fracos esperanccedila dos desvalidos refuacutegio e consolaccedilatildeo dulciacutessima dos humildes Ameacutem

(Oraccedilatildeo composta por Dr Plinio na deacutecada de 1960)

Arq

uivo

Rev

ista

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

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vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

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dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

11

Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

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zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

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quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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de M

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

tavo

Kra

lj

Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 2: Revista Doctor Plinio 211_201510

S

Viacutetima expiatoacuteria

2

anta Teresinha tinha uma certeza interior mdash baseada em indiacutecios

muito bem escolhidos definidos e analisados de sua vida espiritual mdash de que ela seria uma viacutetima expiatoacuteria do Amor Misericordioso e de que deveria realizar isto no Carmelo

Diante dos maiores obstaacuteculos ela natildeo teve nenhuma duacutevida de que entraria para o Carmelo e de que o Amor Misericordioso a chamaria em determinado momento para consumi-la como viacutetima

Assim ela teve ocasiatildeo de dizer no meio de todas as amarguras pelas quais passou que a taccedila dos seus desejos estava cheia ateacute os bordos Essas amarguras eram os desejos dela os sofrimentos que ela queria ter

Isto eacute a confianccedila Santa Teresinha tinha uma soacutelida convicccedilatildeo de que era esta a finalidade dela e a certeza de que a Providecircncia faria todo o necessaacuterio para que se realizasse este objetivo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1781973)

Rep

rodu

ccedilatildeo

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

Holocausto incondicional

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

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SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

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Editorial 4 A essecircncia de um holocausto

PiEdadE Pliniana 5 Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do

holocausto incondicionaldona lucilia

6 Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS 8 Desejo de admirar e contemplar

rEflExotildeES tEoloacutegicaS 12 Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

gESta marial dE um varatildeo catoacutelico 16 Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

PErSPEctiva Pliniana da hiStoacuteria 22 Dom Joatildeo VI no Brasil - II

calEndaacuterio doS SantoS 26 Santos de Outubro

hagiografia 28 O carisma da boa conversa

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde 32 A beleza da luta - II

Uacuteltima Paacutegina 36 Oraccedilatildeo que move montanhas

Na capa Dr Plinio na deacutecada de 1990 Foto Arquivo Revista

Editorial

A

A essecircncia de um holocausto

o recordar os vinte anos do falecimento de Dr Plinio ocorrido a 3 de outubro de 1995 e ana-

lisando sua vida e a coerecircncia de seu pensamento torna-se inequiacutevoco o quanto ele foi um ho-

mem de Feacute inteiramente disposto a sofrer por amor agrave Igreja

Desde cedo Nossa Senhora me concedeu a graccedila de perceber que a Feacute catoacutelica era o maior valor da Terra mais precioso que a luz dos meus olhos mais inestimaacutevel que os meus dias mais rico do que tudo E portanto viver era viver desta Feacute consagrar-me completamente agrave Santa Igreja lutando pelo triunfo dela sobre o mal que procurava erradicar do mundo a Feacute catoacutelica apostoacutelica romana1

Graccedilas a Nossa Senhora uma coisa eacute verdade poder-me-atildeo faltar outras qualidades mas com a ajuda de Maria Santiacutessima natildeo hesito em afirmar Feacute eu tenho Nunca me atribuiacute virtude alguma mas como afirmar minha Feacute eacute de si mesmo um ato de Feacute eu reafirmo Feacute eu tenho Sei que devo es-ta graccedila agrave intercessatildeo da Santiacutessima Virgem pois natildeo a mereccedilo e sem Ela eu natildeo a teria obtido

Isso me potildee dentro da alma um todo em funccedilatildeo do qual vivo existo sou penso dentro do qual me movo e o qual de modo consciente e sem nunca ter duvidado analisei inteiramente Isso eu quis e quero com toda a minha vontade e a isso me dou num ato verdadeiramente de doaccedilatildeo religiosa2

Para manter acesa esta Feacute e levar ao extremo seu entusiasmo pela Igreja natildeo faltaram a Dr Plinio

grandes sofrimentos pedindo-lhe uma contiacutenua renuacutencia de si mesmo

A grande imolaccedilatildeo de nossa vida espiritual eacute querermos deixar de ser o que somos e sermos intei-ramente aquilo que a Igreja quer que sejamos Este eacute o grande holocausto de nossa vida espiritual O resto ― doenccedila provaccedilotildees etc ― satildeo meios para nos tornarmos generosos para praticar esse sacrifiacute-cio [] O centro do holocausto de um homem eacute a integridade com que ele o deseja

Sempre tive o anseio de inteiramente desejar essa minha imolaccedilatildeo e considerei que a essecircncia do meu holocausto era ter o meu espiacuterito preparado por meio da coerecircncia doutrinaacuteria da previsatildeo e de outros fatores espirituais para ser uma fortaleza no meio das trevas ou um navio no meio da tem-pestade3

Agrave luz dessas consideraccedilotildees inauguramos nesta ediccedilatildeo a seccedilatildeo ldquoPiedade plinianardquo na qual contem-

plaremos uma das oraccedilotildees compostas por Dr Plinio pedindo a graccedila do holocausto incondicional agrave von-

tade divina

1) Conferecircncia de 8919822) Conferecircncia de 9319803) Conferecircncia de 19121973

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

C

Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do holocausto

incondicional

5

Piedade Pliniana

Dr Plinio conduz em seu automoacutevel a imagem peregrina de Nossa Senhora de Faacutetima

oncedei-nos Matildee e Senhora nossa que assim como o guerreiro natildeo esco-lhe o teatro de batalha e estaacute disposto a fazer em qualquer campo o ho-locausto de sua vida assim tambeacutem saibamos lutar contra os inimigos mdash

velados ou declarados mdash de vosso Nome e da Santa Igreja onde quer que seja-mos mandados tanto no anonimato quanto na gloacuteria tanto no heroiacutesmo invisiacute-vel e como que impalpaacutevel da existecircncia prosaica de todos os dias quanto nos lances traacutegicos dos acontecimentos que vossa mensagem de Faacutetima prenuncia

Essa graccedila noacutes Vo-la imploramos como favor do qual natildeo somos dignos e se natildeo estremecemos diante de tudo o que ela significa eacute que sabemos poder con-fiar com confianccedila sem limites no vosso Coraccedilatildeo Imaculado forccedila dos fracos esperanccedila dos desvalidos refuacutegio e consolaccedilatildeo dulciacutessima dos humildes Ameacutem

(Oraccedilatildeo composta por Dr Plinio na deacutecada de 1960)

Arq

uivo

Rev

ista

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

6

vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

7

dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

8

Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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uivo

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10

Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

11

Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

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Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

tavo

Kra

lj

Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 3: Revista Doctor Plinio 211_201510

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

Holocausto incondicional

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

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SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 211 Outubro de 2015

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Editorial 4 A essecircncia de um holocausto

PiEdadE Pliniana 5 Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do

holocausto incondicionaldona lucilia

6 Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS 8 Desejo de admirar e contemplar

rEflExotildeES tEoloacutegicaS 12 Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

gESta marial dE um varatildeo catoacutelico 16 Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

PErSPEctiva Pliniana da hiStoacuteria 22 Dom Joatildeo VI no Brasil - II

calEndaacuterio doS SantoS 26 Santos de Outubro

hagiografia 28 O carisma da boa conversa

luzES da civilizaccedilatildeo criStatilde 32 A beleza da luta - II

Uacuteltima Paacutegina 36 Oraccedilatildeo que move montanhas

Na capa Dr Plinio na deacutecada de 1990 Foto Arquivo Revista

Editorial

A

A essecircncia de um holocausto

o recordar os vinte anos do falecimento de Dr Plinio ocorrido a 3 de outubro de 1995 e ana-

lisando sua vida e a coerecircncia de seu pensamento torna-se inequiacutevoco o quanto ele foi um ho-

mem de Feacute inteiramente disposto a sofrer por amor agrave Igreja

Desde cedo Nossa Senhora me concedeu a graccedila de perceber que a Feacute catoacutelica era o maior valor da Terra mais precioso que a luz dos meus olhos mais inestimaacutevel que os meus dias mais rico do que tudo E portanto viver era viver desta Feacute consagrar-me completamente agrave Santa Igreja lutando pelo triunfo dela sobre o mal que procurava erradicar do mundo a Feacute catoacutelica apostoacutelica romana1

Graccedilas a Nossa Senhora uma coisa eacute verdade poder-me-atildeo faltar outras qualidades mas com a ajuda de Maria Santiacutessima natildeo hesito em afirmar Feacute eu tenho Nunca me atribuiacute virtude alguma mas como afirmar minha Feacute eacute de si mesmo um ato de Feacute eu reafirmo Feacute eu tenho Sei que devo es-ta graccedila agrave intercessatildeo da Santiacutessima Virgem pois natildeo a mereccedilo e sem Ela eu natildeo a teria obtido

Isso me potildee dentro da alma um todo em funccedilatildeo do qual vivo existo sou penso dentro do qual me movo e o qual de modo consciente e sem nunca ter duvidado analisei inteiramente Isso eu quis e quero com toda a minha vontade e a isso me dou num ato verdadeiramente de doaccedilatildeo religiosa2

Para manter acesa esta Feacute e levar ao extremo seu entusiasmo pela Igreja natildeo faltaram a Dr Plinio

grandes sofrimentos pedindo-lhe uma contiacutenua renuacutencia de si mesmo

A grande imolaccedilatildeo de nossa vida espiritual eacute querermos deixar de ser o que somos e sermos intei-ramente aquilo que a Igreja quer que sejamos Este eacute o grande holocausto de nossa vida espiritual O resto ― doenccedila provaccedilotildees etc ― satildeo meios para nos tornarmos generosos para praticar esse sacrifiacute-cio [] O centro do holocausto de um homem eacute a integridade com que ele o deseja

Sempre tive o anseio de inteiramente desejar essa minha imolaccedilatildeo e considerei que a essecircncia do meu holocausto era ter o meu espiacuterito preparado por meio da coerecircncia doutrinaacuteria da previsatildeo e de outros fatores espirituais para ser uma fortaleza no meio das trevas ou um navio no meio da tem-pestade3

Agrave luz dessas consideraccedilotildees inauguramos nesta ediccedilatildeo a seccedilatildeo ldquoPiedade plinianardquo na qual contem-

plaremos uma das oraccedilotildees compostas por Dr Plinio pedindo a graccedila do holocausto incondicional agrave von-

tade divina

1) Conferecircncia de 8919822) Conferecircncia de 9319803) Conferecircncia de 19121973

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

C

Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do holocausto

incondicional

5

Piedade Pliniana

Dr Plinio conduz em seu automoacutevel a imagem peregrina de Nossa Senhora de Faacutetima

oncedei-nos Matildee e Senhora nossa que assim como o guerreiro natildeo esco-lhe o teatro de batalha e estaacute disposto a fazer em qualquer campo o ho-locausto de sua vida assim tambeacutem saibamos lutar contra os inimigos mdash

velados ou declarados mdash de vosso Nome e da Santa Igreja onde quer que seja-mos mandados tanto no anonimato quanto na gloacuteria tanto no heroiacutesmo invisiacute-vel e como que impalpaacutevel da existecircncia prosaica de todos os dias quanto nos lances traacutegicos dos acontecimentos que vossa mensagem de Faacutetima prenuncia

Essa graccedila noacutes Vo-la imploramos como favor do qual natildeo somos dignos e se natildeo estremecemos diante de tudo o que ela significa eacute que sabemos poder con-fiar com confianccedila sem limites no vosso Coraccedilatildeo Imaculado forccedila dos fracos esperanccedila dos desvalidos refuacutegio e consolaccedilatildeo dulciacutessima dos humildes Ameacutem

(Oraccedilatildeo composta por Dr Plinio na deacutecada de 1960)

Arq

uivo

Rev

ista

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

6

vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

7

dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

8

Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

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evis

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

11

Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

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zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

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Rin

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quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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de M

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

tavo

Kra

lj

Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 4: Revista Doctor Plinio 211_201510

Editorial

A

A essecircncia de um holocausto

o recordar os vinte anos do falecimento de Dr Plinio ocorrido a 3 de outubro de 1995 e ana-

lisando sua vida e a coerecircncia de seu pensamento torna-se inequiacutevoco o quanto ele foi um ho-

mem de Feacute inteiramente disposto a sofrer por amor agrave Igreja

Desde cedo Nossa Senhora me concedeu a graccedila de perceber que a Feacute catoacutelica era o maior valor da Terra mais precioso que a luz dos meus olhos mais inestimaacutevel que os meus dias mais rico do que tudo E portanto viver era viver desta Feacute consagrar-me completamente agrave Santa Igreja lutando pelo triunfo dela sobre o mal que procurava erradicar do mundo a Feacute catoacutelica apostoacutelica romana1

Graccedilas a Nossa Senhora uma coisa eacute verdade poder-me-atildeo faltar outras qualidades mas com a ajuda de Maria Santiacutessima natildeo hesito em afirmar Feacute eu tenho Nunca me atribuiacute virtude alguma mas como afirmar minha Feacute eacute de si mesmo um ato de Feacute eu reafirmo Feacute eu tenho Sei que devo es-ta graccedila agrave intercessatildeo da Santiacutessima Virgem pois natildeo a mereccedilo e sem Ela eu natildeo a teria obtido

Isso me potildee dentro da alma um todo em funccedilatildeo do qual vivo existo sou penso dentro do qual me movo e o qual de modo consciente e sem nunca ter duvidado analisei inteiramente Isso eu quis e quero com toda a minha vontade e a isso me dou num ato verdadeiramente de doaccedilatildeo religiosa2

Para manter acesa esta Feacute e levar ao extremo seu entusiasmo pela Igreja natildeo faltaram a Dr Plinio

grandes sofrimentos pedindo-lhe uma contiacutenua renuacutencia de si mesmo

A grande imolaccedilatildeo de nossa vida espiritual eacute querermos deixar de ser o que somos e sermos intei-ramente aquilo que a Igreja quer que sejamos Este eacute o grande holocausto de nossa vida espiritual O resto ― doenccedila provaccedilotildees etc ― satildeo meios para nos tornarmos generosos para praticar esse sacrifiacute-cio [] O centro do holocausto de um homem eacute a integridade com que ele o deseja

Sempre tive o anseio de inteiramente desejar essa minha imolaccedilatildeo e considerei que a essecircncia do meu holocausto era ter o meu espiacuterito preparado por meio da coerecircncia doutrinaacuteria da previsatildeo e de outros fatores espirituais para ser uma fortaleza no meio das trevas ou um navio no meio da tem-pestade3

Agrave luz dessas consideraccedilotildees inauguramos nesta ediccedilatildeo a seccedilatildeo ldquoPiedade plinianardquo na qual contem-

plaremos uma das oraccedilotildees compostas por Dr Plinio pedindo a graccedila do holocausto incondicional agrave von-

tade divina

1) Conferecircncia de 8919822) Conferecircncia de 9319803) Conferecircncia de 19121973

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

C

Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do holocausto

incondicional

5

Piedade Pliniana

Dr Plinio conduz em seu automoacutevel a imagem peregrina de Nossa Senhora de Faacutetima

oncedei-nos Matildee e Senhora nossa que assim como o guerreiro natildeo esco-lhe o teatro de batalha e estaacute disposto a fazer em qualquer campo o ho-locausto de sua vida assim tambeacutem saibamos lutar contra os inimigos mdash

velados ou declarados mdash de vosso Nome e da Santa Igreja onde quer que seja-mos mandados tanto no anonimato quanto na gloacuteria tanto no heroiacutesmo invisiacute-vel e como que impalpaacutevel da existecircncia prosaica de todos os dias quanto nos lances traacutegicos dos acontecimentos que vossa mensagem de Faacutetima prenuncia

Essa graccedila noacutes Vo-la imploramos como favor do qual natildeo somos dignos e se natildeo estremecemos diante de tudo o que ela significa eacute que sabemos poder con-fiar com confianccedila sem limites no vosso Coraccedilatildeo Imaculado forccedila dos fracos esperanccedila dos desvalidos refuacutegio e consolaccedilatildeo dulciacutessima dos humildes Ameacutem

(Oraccedilatildeo composta por Dr Plinio na deacutecada de 1960)

Arq

uivo

Rev

ista

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

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vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

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dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 5: Revista Doctor Plinio 211_201510

C

Oraccedilatildeo para pedir a graccedila do holocausto

incondicional

5

Piedade Pliniana

Dr Plinio conduz em seu automoacutevel a imagem peregrina de Nossa Senhora de Faacutetima

oncedei-nos Matildee e Senhora nossa que assim como o guerreiro natildeo esco-lhe o teatro de batalha e estaacute disposto a fazer em qualquer campo o ho-locausto de sua vida assim tambeacutem saibamos lutar contra os inimigos mdash

velados ou declarados mdash de vosso Nome e da Santa Igreja onde quer que seja-mos mandados tanto no anonimato quanto na gloacuteria tanto no heroiacutesmo invisiacute-vel e como que impalpaacutevel da existecircncia prosaica de todos os dias quanto nos lances traacutegicos dos acontecimentos que vossa mensagem de Faacutetima prenuncia

Essa graccedila noacutes Vo-la imploramos como favor do qual natildeo somos dignos e se natildeo estremecemos diante de tudo o que ela significa eacute que sabemos poder con-fiar com confianccedila sem limites no vosso Coraccedilatildeo Imaculado forccedila dos fracos esperanccedila dos desvalidos refuacutegio e consolaccedilatildeo dulciacutessima dos humildes Ameacutem

(Oraccedilatildeo composta por Dr Plinio na deacutecada de 1960)

Arq

uivo

Rev

ista

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

6

vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

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dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

Arq

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

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)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

nhar

dhau

ke (

CC

30

)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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nza

(CC

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

Dor

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0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

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caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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Hol

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

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ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 6: Revista Doctor Plinio 211_201510

dona lucilia

P

Elo para a devoccedilatildeo a Nossa Senhora

6

vre mas sendo tatildeo prodigamente iluminada e auxiliada torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado

Primazia do amor materno

Quando Nossa Senhora por razotildees misteriosas ob-teacutem para algueacutem esta graccedila que trabalha a alma trans-formando-a e fazendo-a florescer daacute-se com ela algo anaacutelogo ao que aconteceu com a aacutegua que por sua inter-venccedilatildeo transmutou-se em vinho nas bodas de Canaacute Ma-ria Santiacutessima intercede junto a Nosso Senhor o Qual impossibilitado de recusar um pedido de sua Matildee pro-nuncia sobre nossas almas uma palavra que as transfor-ma no mais saboroso dos vinhos Tais satildeo as extraordinaacute-rias graccedilas que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermeacutedio de Maria

Muito bonito eacute outro aspecto do ldquoSegredo de Mariardquo pois o vazio dentro do qual as coisas se precipitam deve ter como contraacuterio a presenccedila de Nossa Senhora Pode--se imaginar em que espeacutecie de vazio ficam os que natildeo recebem essa graccedila da Matildee de Deus Se eu natildeo fosse fi-lho drsquoEla teria um vazio na alma que seria irremediaacute-vel Essa graccedila eacute a da primazia do amor materno gratui-to direto pessoal terno e desinteressado como nenhu-ma outra forma de amor eacute capaz Mesmo o amor paterno natildeo eacute o amor materno Dou-lhes o exemplo

Certo dia em nossa residecircncia ouvi uma conversa de papai e mamatildee que estavam no living

Ela perguntavamdash Joatildeo Paulo vocecirc acha que Plinio gostaria de comer

tal coisa hojeEle natildeo respondia de maneira satisfatoacuteria e ela insis-

tia querendo saber se papai natildeo tinha observado ulti-mamente o que eu mais comia Ela natildeo queria me per-guntar diretamente pois havia percebido que me agra-

elo que tenho notado a accedilatildeo de Dona Lucilia junto a algueacutem move a alma a deixar a posiccedilatildeo er-rada de egoiacutesmo e a se dirigir a Nossa Senhora

Atuaccedilatildeo para aceitar o Segredo de Maria

A atuaccedilatildeo dela incide sobre o temperamento especi-ficamente eliminando as afeiccedilotildees viciosas que o defor-mam inteiramente Essa deformaccedilatildeo faz com que conce-bamos como um horror tudo o que eacute contraacuterio ao nosso apego Mas mamatildee desenvolve uma accedilatildeo especiacutefica na alma por onde esta comeccedila de repente a perceber quan-to eacute atraente e afaacutevel aquilo do que ela tinha horror e compreende a cegueira devido agrave qual considerava como deliacutecia o que na realidade era horror e como horriacutevel o que de fato deveria ser a sua deliacutecia

Por exemplo o apego de querer parecer rico A pes-soa arrasta esse horror mas subitamente ela que era louca pelo dinheiro passa a sentir desafogo na separaccedilatildeo do dinheiro E tudo isso mamatildee faz com respeito pela al-ma com delicadeza quase pedindo desculpas por entrar no subconsciente da pessoa e operar isso

No Pai-Nosso Deus quer ser chamado de Pai para que compreendamos pelos bons pais da Terra a pater-nidade drsquoEle Assim uma matildee terrena que tenha tatildeo ple-namente realizado sua missatildeo junto a um filho compre-ende-se que continue a agir desse modo apoacutes sua morte mas natildeo soacute em benefiacutecio dele como tambeacutem para toda a famiacutelia de almas por ele fundada Portanto se Dona Lu-cilia foi para mim o siacutembolo de Nossa Senhora eacute natural que o seja tambeacutem para aqueles que me seguem Mamatildee atua de modo preacute-dispositivo para a aceitaccedilatildeo do ldquoSegre-do de Mariardquo1 esta graccedila especialiacutessima que age na von-tade humana fazendo a alma progredir e se converter e por cuja accedilatildeo a pessoa natildeo deixa de ser inteiramente li-

No contato com Dona Lucilia uma comunicaccedilatildeo da graccedila oposta ao egoiacutesmo ao sentimentalismo e outros viacutecios existentes na alma revolucionaacuteria

Joatildeo

Dia

s

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dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

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zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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CC

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 7: Revista Doctor Plinio 211_201510

7

dava a surpresa no jantar Eu mesmo natildeo tinha me dado conta disso ateacute entatildeo e ela jaacute entendia o que soacute ali ex-plicitei

Papai disse para ela que fizesse qualquer coisa e me dissesse ldquoAqui estaacute o jantar e se natildeo gostar vaacute para um restauranterdquo

Soacute matildee eacute assim outras relaccedilotildees natildeo satildeo desse modo E ou se foi objeto de relaccedilotildees assim ou natildeo se compre-ende o princiacutepio axioloacutegico2

A imagem mais terna do amor de Deus para conosco eacute essa Satildeo coisas miuacutedas mas nas quais estaacute posta uma vida inteira

Doccedilura cristatilde admiraacutevel

Eacute preciso sentir coisas assim para se compreender Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora Do contraacute-rio fica-nos um vazio na alma que eacute depois preenchido por ldquocobras e lagartosrdquo sentimentalismos invejas revol-tas etc Daiacute nascem egoiacutesmos duacutevidas desrespeitos

Por vezes eacute dado aos homens conhecerem reflexos desse modo mas muitos os desprezam Eu vi manifes-taccedilotildees dela assim serem desprezadas Ora deveriacuteamos ser sempre sensiacuteveis a elas

Ela sofria as rejeiccedilotildees sem desejos de vinganccedila Era de tal bondade que ao peacute da letra tinha o procedimento evangeacutelico que eacute imitar Nosso Senhor Jesus Cristo E de uma doccedilura cristatilde admiraacutevel Mas natildeo imaginem que era doce apenas como matildee Ela era assim para todo mundo e especialmente como matildee

Externamente a vida de Dona Lucilia nada teve de extraordinaacuterio Foi soacute a irradiaccedilatildeo da sua alma Quan-do recebi a graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus em frente agrave ima-gem de Nossa Senhora Auxiliadora3 compreendi o que era Maria Santiacutessima por comparaccedilatildeo com ela Mamatildee era um caminho que me conduzia para laacute Ela havia pre-parado meu espiacuterito para receber o sorriso de Maria Au-xiliadora Ela era como um pedaccedilo de um espelho dentro do qual se reflete o Sol inteiro Assim foi seu papel para minha devoccedilatildeo a Nossa Senhora

Quando eu lia o ldquoTratado da Verdadeira Devoccedilatildeo agrave Santiacutessima Virgemrdquo entrava um mundo de reminiscecircn-cias impliacutecitas a ela Assim compreendi-o a partir dela A influecircncia exercida por ela sobre mim era o comeccedilo de uma accedilatildeo que Nossa Senhora desempenharia em minha vida Mamatildee foi portanto o viacutenculo o elo para a devo-ccedilatildeo a Maria Santiacutessima

A tal ponto que quando analisei pela primeira vez a muacutesica natalina Stille Nacht e senti que passava a conhe-cer melhor Nossa Senhora mdash pois Ela deveria ter expe-rimentado ao peacute do Preseacutepio os sentimentos que este cacircntico inspira mdash tambeacutem pensei em mamatildee

Muito respeito mas natildeo intimidadesDona Lucilia estabelece com cada um que dela se

aproxima um viacutenculo pessoal tomando-o como filho em linha de misericoacuterdia especial com respeito sem siacutemile

Ela me respeitava muito ateacute mesmo quando eu era crianccedila Brincava comigo como uma matildee faz mas com grande respeito Como eu me sentia bem assim tratado com esse respeito Por exemplo quando vinha tomar mi-nha temperatura Como toda crianccedila de vez em quando eu adoecia e tinha febre Apesar de me extasiar com ela eu era impaciente quando queriam tomar minha tempe-ratura pois natildeo gostava disso Ela percebia mas tendo que verificar se eu tinha febre de longe jaacute vinha com jei-to Depois de modo calmo punha sua matildeo em minha tes-tahellip Isso aumentava meu respeito por ela e me fazia con-cluir ldquoSe nessa alma existe tanta capacidade de respei-tar como a respeitarei quando a conhecer inteiramenterdquo

Eu gostava do respeito mais do que do carinhoMamatildee respeitava todos considerando em cada um a

idade virtude classe social etc Era assim por exemplo com um membro de nosso Movimento que vinha em ca-sa tratar do expediente Jamais diria a ele ldquoEspere um pouco que jaacute lhe mando servir qualquer coisardquo Ela di-zia ldquoO senhor aceitaria tomar chaacute agorardquo

Por outro lado natildeo permitia intimidades Diante de um bispo que nos visitava frequentemente jamais o cum-primentava sentada Levantava-se osculava o anel e pe-dia-lhe permissatildeo para oscular o Santo Lenho que ele trazia em sua cruz peitoral e lhe fora dado pelo Papa Era este um tratamento bem apropriado para um bispo

Quando eu via tudo isso em mamatildee deixava-me to-car profundamente e depois vinha a anaacutelise truculenta Eacute assim que a Igreja ensina Isso estaacute de acordo com a boa Doutrina Catoacutelica

Eu aderia agrave Igreja e analisava mamatildee ponto por pon-to atentissimamente Natildeo era entretanto uma anaacutelise criacutetica ou cheia de suspeitas

Recebida uma graccedila de comunicaccedilatildeo com ela assim preenchemos lacunas que existem em milhotildees de almas revolucionaacuterias Uma vez que a graccedila penetre nesses va-zios exorciza-os retirando as serpentes do egoiacutesmo do sentimentalismo etc   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 3151971 e 2151977)

1) Ver Revista Dr Plinio n 156 p 25-262) Termo derivado de ldquoAxiologiardquo ramo da Filosofia que estu-

da os ldquovaloresrdquo isto eacute os motivos e as aspiraccedilotildees superiores e universais do homem as condiccedilotildees e razotildees que datildeo ru-mo agrave sua existecircncia para os quais ele tende por insuprimiacutevel impulso da sua natureza

3) Ver Revista Dr Plinio n 122 p 18-23

Desejo de admirar e contemplar

O

8

Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

Arq

uivo

Rev

ista

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

Arq

uivo

Rev

ista

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

ivo R

evis

ta

reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

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Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

tavo

Kra

lj

Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

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Page 8: Revista Doctor Plinio 211_201510

Desejo de admirar e contemplar

O

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

Revelando aspectos iacutentimos de seu relacionamento com o Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e com Maria Santiacutessima

Dr Plinio manifesta o caraacuteter anti-igualitaacuterio dessas devoccedilotildees em sua alma e na de sua extremosa matildee

muito de perto com Ela Mas eacute de relance Depois resta-belece aquela distacircnciahellip

Natildeo eacute uma distacircncia in obliquo mas como se houves-se um vidro grossiacutessimo entre a Santiacutessima Virgem e eu

Contudo gosto muito dessa distacircncia porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar

utro dia veio-me ao espiacuterito a seguinte ideia Haacute pessoas que ao rezarem tecircm toda a impres-satildeo de que estatildeo falando com um Santo ou com

Nossa Senhora ou com Nosso Senhor Jesus Cristo e que eles estatildeo ouvindo e considerando como um de noacutes o que dizem Outras tecircm a impressatildeo de que haacute um vi-dro entre elas e os Santos e que natildeo se podem pocircr propriamente na presenccedila deles

Profunda humildade ao rezar a Nossa Senhora

Comigo daacute-se uma coisa curiosa sinto uma su-perioridade muito grande dos seres celestes E com Nossa Senhora nem se fale Eu A sinto como no alto de uma ogiva a uma distacircncia colossal de mim e que assim mesmo existe certo atrevimento de minha parte em me aproximar Aquilo que Satildeo Luiacutes Maria Grignion diz ldquopetit vermisseau et miseacute-rable peacutecheurrdquo1 eacute bem a impressatildeo que eu tenho

Estou certo de que Ela me ouve mas numa im-passibilidade de iacutecone e aquilo que eu digo che-ga laacute por um eco amortecido fraco distante Ma-ria Santiacutessima toma conhecimento completo mas da parte drsquoEla natildeo procede nada para mim porque natildeo sou digno disso Eacute a impressatildeo Eu sei teologi-camente que natildeo eacute assim e rezo com a certeza de que natildeo eacute mas a impressatildeo eacute esta

Numa ou noutra rara ocasiatildeo tenho a sensa-ccedilatildeo de que Nossa Senhora daquela distacircncia sor-ri com uma afabilidade muito grande Mas natildeo sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa Mas sin-to que a distacircncia diminui e eacute como se eu falasse

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

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evis

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reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

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Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

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CC

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

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Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 9: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Alegria em sentir-se insignificante

A tendecircncia de mi-nha piedade eacute de imaginar Nosso Senhor Je-sus Cristo Deus Nossa Senhora todos os An-jos e Santos enormes com distacircncia extraor-dinaacuteria por assim dizer fabulosa E sentindo--me muito pequeno de algum modo nessa sepa-raccedilatildeo sinto uma uniatildeo Eacute o prazer de me sentir in-significante Aquilo me enche de contentamento de uma alegria de uma dedicaccedilatildeo de espiacuterito fi-lial que corresponde a um modo de ser

Sei teologicamente que natildeo haacute essa distacircn-cia Ela eacute Matildee de misericoacuterdia e se eu tivesse uma duacutevida neste ponto me desintegrava na hora entatildeo nada eacute nada na terra de ningueacutem Mas enfim eacute o modo de ser de cada um

Por exemplo confianccedila Quando eu falo da confianccedila e ateacute de senti-la eacute como se partisse daquele alto nicho um veratildeo suave perfuma-do mas a distacircncia continua a mesma

Isso pode ser visto de modos diferentes mas creio que para mim provavelmente eacute uma via

Tudo o que estou dizendo eacute muito natural natildeo tem nada de extraordinaacuterio eacute comum Mas outro dia eu estava rezando o Rosaacuterio e isso sobreveio assim pela primeira vez ocor-reu-me rezar os misteacuterios do Rosaacuterio como quem estivesse junto a Nossa Senhora co-mentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles fatos que se passaram E um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasiatildeo Mas achei que essa era uma situaccedilatildeo diferen-te das habituais Rezei ateacute muito bem o Rosaacuterio assim

Digo isso para mostrar como eacute uma coisa individual que natildeo deve ser toma-da como padratildeo

Desde entatildeo tenho rezado o Rosaacuterio assim com proveito Neste caso vem cer-ta impressatildeo de proximidade drsquoEla fazen-do contraste com o que acabo de dizer

A vida consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus

Um corolaacuterio saudaacutevel disso eacute a ideia preconcebida e preestabelecida de que Deus Nossa Senhora tecircm o di-

ldquoLe Beau Dieurdquo (O Belo Deus) Catedral de Amiens Franccedila

Arq

uivo

Rev

ista

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

ivo R

evis

ta

reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

Arq

uivo

Rev

ista

Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

C

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

13

reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

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)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

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dhau

ke (

CC

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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de M

endo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

21

interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

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Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 10: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Sagrado coraccedilatildeo de JeSuS

tudes deste gecircnero ldquoEu peccedilo a Deus mas Ele laacute nas coisas drsquoEle a mim natildeo aten-

de Atende a todo mundo mas natildeo a mim Ele comigo faz o contraacuterio do

que eu queria que acontecesserdquoNatildeo era esse absolutamen-

te o estado de espiacuterito de Do-na Lucilia Esse estado de es-piacuterito de um terceiro em re-laccedilatildeo a Deus que cobra in-vectiva alega direitos natildeo estaacute naquela fotografia em nada

Mais ainda no fundo es-sa paz que vemos no Quadri-nho2 sob o qual se poderia

escrever a frase Ite vita est eacute como quem diz ldquoEu fiz a von-

tade drsquoEle ateacute o uacuteltimo elemen-to bebi todo o caacutelice de fel ateacute

a uacuteltima gota Mas estaacute bebido e agora chegou minha hora de ajudar

os outrosrdquoSem duacutevida uma das coisas mais tocan-

tes para mim naquela fotografia em que mamatildee tem cerca de 50 anos eacute essa resignaccedilatildeo dela no meio da dor Vecirc-se que ela natildeo entende e haacute qualquer coisa de uma pergunta ansiosa ldquoComo seraacute por que seraacuterdquo mas sem o menor laivo de revolta de inconformidade nem nada Eacute como algueacutem que adora o misteacuterio do sofrimen-to que estaacute tendo

Isso partia de uma ideia altiacutessima que mamatildee tinha de Deus

Aliaacutes uma coisa curiosa ela nos ensinou o Pai--Nosso de um modo um pouquinho diferente da foacuter-mula corrente Natildeo sei se no tempo dela se tinha in-troduzido talvez no haacutebito brasileiro ou pelo menos de Pirassununga um acreacutescimo que era ldquoO patildeo nos-so de cada dia nos dai hoje Senhorrdquo Este ldquoSenhorrdquo natildeo estaacute na oraccedilatildeo dominical Durante algum tempo eu rezei o Pai-Nosso assim Depois por conformida-de com a Igreja suprimi o ldquoSenhorrdquo Mas a minha al-ma se regozijava de poder dizer este ldquoSenhorrdquo O ldquoSe-nhorrdquo calha ali com uma precisatildeo no ritmo da ora-ccedilatildeo muito bem Suprimi porque a Igreja ensina de um modo diferente Quando mamatildee rezava alto co-nosco nas Sextas-feiras Santas natildeo saiacutea o ldquoSenhorrdquo Eu acho que ela em certo momento se deu conta tambeacutem e suprimiu

Mas era a ideia do Dominus cheio de bondade de mi-sericoacuterdia de carinho que estava no espiacuterito dela Ela ti-nha muito isso mas muito

Arqu

ivo R

evis

ta

reito de nos tratar mdash se pudeacutessemos nos ex-primir assim sem blasfecircmia mdash do modo mais ldquodespoacuteticordquo que se possa imagi-nar permitindo que nos aconteccedilam as coisas aparentemente mais ir-racionais mais arbitraacuterias e mais pungentes Isso eacute inteiramente natural porque corresponde a essa desproporccedilatildeo Portan-to natildeo temos que reclamar nem estranhar nem alegar direitos nem nada disso

Um aspecto que me im-pressionava em mamatildee era notar como se davam os acontecimentos mais impre-vistos e debaixo de certo pon-to de vista mais iloacutegicos e ela os tomava como se fossem a coi-sa mais natural do mundo

Mamatildee natildeo tinha direitos a ale-gar perante Deus Ele era Senhor de-la como de todas as criaturas poden-do fazer o que bem entendesse Ela sabia que isso correspondia a desiacutegnios de misericoacuter-dia drsquoEle Mas existe aquele misteacuterio Nosso Senhor Je-sus Cristo pediu para se afastar o caacutelice drsquoEle ldquose possiacute-velrdquo Ora para Deus tudo eacute possiacutevel Eacute um misteacuterio por-que Deus quis que o holocausto fosse ateacute laacute E da parte do Divino Redentor a plena submissatildeo como quem dis-sesse ldquoDiante de vossos desiacutegnios absolutos de vossos direitos de vossa sabedoria Eu Me dobro Dai-Me ape-nas forccedilasrdquo Isso eu notava em Dona Lucilia muitiacutessimo

Ela rezava com muito afeto e sua devoccedilatildeo ao Sagra-do Coraccedilatildeo de Jesus a Nossa Senhora era muito im-pregnada de ternura Mas ela rezava com muito empe-nho quando queria obter as coisas Entretanto se natildeo as obtivesse era com uma naturalidade uma paz de alma a maior do mundo

Naquela fotografia em que mamatildee tem aproximada-mente 50 anos de idade ela estaacute cheia disso Encontra-se na voragem da dor mas natildeo pergunta a Deus por quecirc Eacute assim e deve ser assim Haacute um desiacutegnio de Deus e a vi-da consiste em cumprir os desiacutegnios de Deus E portan-to se eacute assim natildeo se discute O que eacute uma posiccedilatildeo funda-mentalmente anti-igualitaacuteria

Estado de espiacuterito de Dona Lucilia em relaccedilatildeo a Deus

Mas eu tenho visto gente que eacute protuberantemen-te o contraacuterio disso e em quem percebo laivos de ati-

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

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Rev

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

C

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

(CC

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)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

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dhau

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CC

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)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

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Rev

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

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caro

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

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)

Page 11: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Doccedilura dentro na majestadeNo tocante ao meu relacionamento com Nosso Se-

nhor com Nossa Senhora eu sempre tive e continuo a ter aquela certeza que a graccedila de Genazzano3 corrobo-rou de ser atendido diante de problemas que envolvem a Causa Catoacutelica Por exemplo quando recebi a graccedila de Genazzano eu me lembro perfeitamente da impressatildeo que tive de Nossa Senhora tomando aquela atitude fa-zendo-me entender o que Ela quis que eu compreendes-se Ali sim natildeo tenho duacutevida nenhuma de que foi uma graccedila uma promessa

Depois me contaram que o provincial dos agostinia-nos do Santuaacuterio a quem haviam narrado o fato disse que esse tipo de graccedila era caracteriacutestico da Matildee do Bom Conselho de Genazzano Para mim natildeo tem duacutevida ne-nhuma Nossa Senhora me concedeu essa graccedila

Lembro-me de que o quadro drsquoEla como que se ani-mou Natildeo tive nem um pouco a impressatildeo de que Ela estivesse falando comigo Mas o quadro como que ad-quiriu uma vida dulciacutessima revelando um interior drsquoEla mas com uma suavidade inexprimiacutevel Poreacutem conservando sempre essa superioridade De maneira que era um sorriso materno dentro do esplendor e da majestade

Segundo meu modo de ser essa doccedilura que se ma-nifesta dentro da majestade eacute mais doce do que fora da majestade

Naquele hino a Nos-sa Senhora do qual gosto muito ldquoSi quaeligris cœlum anima Mariaelig nomen invo-cardquo haacute uma estrofe que eacute assim ldquoPelo nome drsquoEla fogem as culpas e as trevas as dores da doenccedila e as uacutel-ceras Aos vencidos se de-satam os peacutes e para os na-vegantes as aacuteguas se tor-nam mansasrdquo

Acho muito bonito Ali-aacutes toda essa canccedilatildeozinha eacute linda ldquoSe tu queres o Ceacuteu oacute alma invoca o nome de Maria Pois aos que invo-cam Nossa Senhora as por-tas do Ceacuteu se abremrdquo

Satildeo grupos de quatro es-trofes Eacute como se houvesse asteriscos entre elas

ldquoGloacuteria a Maria Filha do Padre e Matildee de Nosso Senhor Jesus Cristo Espo-

sa do Espiacuterito Santo por todos os seacuteculos dos seacuteculos ameacutemrdquo

ldquoPelo nome de Maria os Ceacuteus se alegram os Infernos estremecem O ceacuteu a terra e os mares o mundo inteiro se rejubilardquo

Tem muita canduraPor exemplo estou falando disso mas natildeo se disso-

cia de Nossa Senhora no Ceacuteu altiacutessima puriacutessima e por causa disso exercendo sobre a Terra essa accedilatildeo benfazeja enorme Natildeo haacute mares natildeo haacute trevas natildeo haacute coisas que Ela natildeo domine em razatildeo de ser tatildeo boa e estar tatildeo alta

Sensibilidade eucariacutestica diante do Santiacutessimo Sacramento exposto

Jaacute minhas Comunhotildees natildeo costumam ser sensiacuteveis Aliaacutes tenho por assim dizer mais sensibilidade eucariacutes-tica quando estou diante do Santiacutessimo Sacramento ex-posto do que quando comungo

Em geral quando estou diante do Santiacutessimo Sacra-mento fico muito mas muito tocado A noccedilatildeo da pre-senccedila drsquoEle me comove muito Mas na Comunhatildeo para-doxalmente de um modo habitual menos sensiacutevel O que predomina eacute a presenccedila de um Visitante desmedida-mente grande a Quem se trata de pedir Daiacute calhar intei-ramente no meu modo de ser o meacutetodo de Comunhatildeo

sugerido por Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort pedir que Nossa Senhora venha agrave minha alma para recebecirc-Lo E Ele encontrando-A como dona desta casa e fazendo--Lhe as honras por mim te-nho entatildeo muito comprazi-mento Donde dirigir a Ele por meio drsquoEla os atos de adoraccedilatildeo reparaccedilatildeo accedilatildeo de graccedilas e peticcedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 671985)

1) Do francecircs vermezinho e miseraacutevel pecador2) Quadro a oacuteleo que muito agradou a Dr Plinio pintado por um de seus disciacutepulos com base em uma das uacuteltimas fotografias de Dona Lucilia Ver Revista Dr Plinio n 119 p 6-93) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 16-23

Arq

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Rev

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Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

C

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

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)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

nhar

dhau

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CC

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Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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caro

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 12: Revista Doctor Plinio 211_201510

Grandeza incomparaacutevel do sacrifiacutecio

C

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Devido ao pecado original o homem mesmo inocente tem necessidade de fazer sacrifiacutecio E no Paraiacuteso terrestre caso natildeo

tivesse havido o pecado era preciso a ascese Dr Plinio julga que sim pois seria um ato ordenativo do homem em estado de prova

ascese mas natildeo eacute a principal nota do ponto de vista da dedicaccedilatildeo que se deve considerar No homem nascido sem pecado original essa ascese natildeo pareceria necessaacute-ria porque o homem tinha um inteiro domiacutenio de si mes-mo Portanto vigorava a ideia de que aquela fruta tatildeo excelente melhor conviria a uma pessoa mais excelente Representaria uma forma de justiccedila colher aquela fruta tatildeo linda e daacute-la a uma pessoa tatildeo bela Esta seria uma dedicaccedilatildeo

Creio que eacute esse o espiacuterito com que muitas pesso-as colhem flores para oferecer nos altares de Nossa Senhora Por exemplo ornar um altar para o ldquomecircs de Mariardquo uma pessoa pode colocar nisso uma intenccedilatildeo de reparaccedilatildeo mas natildeo eacute o intuito comum e que este-ja proacutexima e imediatamente na natureza do ato O que estaacute nisso eacute a noccedilatildeo de que agrave Santiacutessima Virgem sendo a Flor da Criaccedilatildeo fica bem que as flores muito bonitas estejam postas junto a Ela por assim dizer porque simi-lis simili gaudet2 Entatildeo junto Agravequela que poderia ser chamada por algum lado ldquoFlor das floresrdquo conveacutem co-locar flores

Oferecimento de Isaac Museu de Arte de Cincinnati EUA

Rep

rodu

ccedilatildeo

onsiderando o sacrifiacutecio na perspectiva da Doutri-na Catoacutelica parece-me que ele natildeo tem o caraacuteter de mera expiaccedilatildeo mas de um reconhecimento da

supremacia de Deus pelo fato de serem consumidas em honra drsquoEle coisas que Ele mesmo deu ao homem por onde este reconhece implicitamente que privar-se daqui-lo e dar ao Criador afirma a superioridade drsquoEle em rela-ccedilatildeo a todas as coisas

Sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo

Corneacutelio a Laacutepide1 distingue o sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo e de expiaccedilatildeo no Antigo Testamento

Analisemos o que significa essa dedicaccedilatildeoUma crianccedila pode ver pendente numa aacutervore uma

fruta muito bonita corre apanha-a e a oferece ao pai ou agrave matildee Eacute propriamente um sacrifiacutecio de dedicaccedilatildeo que a crianccedila faz Isso que parece muito razoaacutevel pode ser des-dobrado em aspectos

Um aspecto eacute a crianccedila renuncia agrave fruta para dar aos pais O que significa essa renuacutencia Haacute nisso um ato de

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

(CC

30

)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

nhar

dhau

ke (

CC

30

)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

17

Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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caro

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 13: Revista Doctor Plinio 211_201510

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

Sacrifiacutecio de louvorEntra tambeacutem outro aspecto me-

tafiacutesico que me parece mais boni-to e mais importante por onde haacute uma afirmaccedilatildeo do Absoluto Aque-las coisas satildeo lindas mas passagei-ras e conveacutem que elas no que tecircm de passageiro e contingente sejam oferecidas a Deus que eacute eterno e Absoluto

Essa destruiccedilatildeo do transitoacuterio e do contingente em honra do eter-no e do Absoluto fica meio impliacutecita na natureza E eacute uma grande verda-de que o homem tem vontade de ex-plicitar e Deus deixa a cargo do ho-mem fazer a explicitaccedilatildeo O desejo de explicitar o que Deus pocircs impliacute-cito leva o homem a dizer ldquoVoacutes que sois Absoluto eu a Voacutes entrego tal coisa porque me destes o domiacutenio sobre ela E a destruo em vossa honra porque a Voacutes que sois o Criador de tudo compete que se Vos honre des-truindo algo do que criastesrdquo Eacute uma espeacutecie de home-nagem ao proacuteprio Criador a Quem se homenageia em parte em alguns aspectos destruindo mostrando que Ele merece aquela destruiccedilatildeo

Da parte psicoloacutegica do homem entra nessa destrui-ccedilatildeo um reconhecimento efetivo do Absoluto

Contudo para o homem concebido no pecado origi-nal entra um reconhecimento de caraacuteter necessariamen-te asceacutetico pois o ser humano tem tal tendecircncia a se ape-gar e a dar agravequilo que eacute contingente o valor que ele da-ria ao Absoluto que para corrigir este defeito e desagra-var a Deus dessa tendecircncia a que tantos homens cedem eacute preciso sacrificar alguma coisa para dizer ldquoEu cheguei ao ato concreto e assim esmaguei internamente a minha tendecircncia a ver isso como uma coisa absolutardquo

Eacute preciso notar que isto eacute um aspecto muito importan-te mas que natildeo estaacute na essecircncia do ato praticado Haacute o sacrifiacutecio portanto de louvor que eacute o sacrifiacutecio do amor O louvor eacute a voz do amor A adoraccedilatildeo o louvor o sacrifiacute-cio de louvor se exprimem assim

Deus como Causa exemplar

Aliaacutes o Ofiacutecio Divino mdash recitado por exemplo se-gundo o estilo beneditino mdash tem o sentido do louvor a Deus que o religioso faz cantando de um modo belo um texto adequado que O louva com suas proacuteprias palavras porque quase tudo eacute tirado da Escritura e quando natildeo eacute da Biacuteblia eacute da Igreja Ademais louva-O tambeacutem com

um cerimonial bonito objetos e oacutergatildeos bonitos numa igreja bonita etc A organizaccedilatildeo do belo para louvar eacute um predicado eminentemente beneditino e de fato se-ria necessaacuterio que no seu conjunto a Igreja Catoacutelica ti-vesse algo especialmente voltado para isso

Tal modo de proceder eacute perfeito e condiz com outro aspecto da questatildeo formando uma espeacutecie de gemina-ccedilatildeo onde se tem o equiliacutebrio perfeito Esse sacrifiacutecio de louvor pode dirigir-se a Deus como Causa eficiente fi-nal e tambeacutem como Causa exemplar E enquanto Causa exemplar noacutes podemos oferecer ao Criador coisas cria-das por Ele e semelhantes a Ele pela conexatildeo com Ele E neste sentido por exemplo um grande abade bene-ditino pode constituir uma abadia magniacutefica sem ceder nada a um luxo emoliente mas para louvor a Deus como Causa exemplar de todo o belo na Criaccedilatildeo

O luxo pode ter uma nota de sacrifiacutecio

Ateacute uma pessoa como Salomatildeo antes do pecado que lembrava muito a Deus como Causa exemplar poderia cercar-se de todo aquele luxo virtuosamente louvando o Criador como Causa exemplar e dizendo ldquoVede em mim como Deus eacute granderdquo

Este constitui o elogio certo mas arriscado de muita forma de grandeza e de beleza indispensaacutevel para uma ci-vilizaccedilatildeo considerada no seu total Entatildeo por exemplo eu creio bem que o Louvre de Satildeo Luiacutes deveria ter por vaacuterios aspectos muito luxo Este luxo deve ser visto assim

Isso tem a nota do sacrifiacutecio no seguinte sentido satildeo riquezas que foram desviadas do uso do rei para simboli-

Abadia de Cluny - Borgonha Franccedila

Bon

hom

me

(CC

30

)

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

nhar

dhau

ke (

CC

30

)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

16

geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

17

Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

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ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

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luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

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)

Page 14: Revista Doctor Plinio 211_201510

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

zar perante Deus uma determinada per-feiccedilatildeo que lembra a Ele Seria por exemplo o luxo da Sainte-Chapelle mas poderia ser o luxo da pompa real enquanto mostrando o rei como representante de Deus ou da pompa papal enquan-to manifestando no Papa o Vigaacuterio de Nosso Senhor

A meu ver esta eacute a me-lhor resposta agrave criacutetica pro-testante ao luxo eclesiaacutesti-co O protestante diz ldquoEacute para o gaacuteudio do padre que se usa issordquo A respos-ta eacute ldquoO padre de fato go-za muito pouco disso mas se gozasse era um aspecto secun-daacuterio O importante eacute que Deus seja glorificado tambeacutem nissordquo

Entretanto suporia para manu-tenccedilatildeo do equiliacutebrio nesse proacuteprio lou-vor que o homem fizesse rebaixamentos atos de humildade e de ascese que compensas-sem isso para que o equiliacutebrio se apresentasse perfeito

Entatildeo se eu imaginasse por exemplo um rei que fos-se um Salomatildeo da Cristandade resplandecente com to-do o brilho da realeza mas que na Sexta-Feira Santa na hora de adorar a Cruz fosse a peacute e descalccedilo em trajes de penitente flagelando-se de maneira que todo o povo visse que de fato sua intenccedilatildeo sincera era de se humilhar diante de Deus Esse homem realizaria um equiliacutebrio ad-miraacutevel das duas coisas e que seriam duas formas de sa-crifiacutecio que se completam formam um carrilhatildeo E nesse carrilhatildeo haacute a harmonia perfeita

Quando numa civilizaccedilatildeo falta ou miacutengua uma dessas formas de sacrifiacutecio ela natildeo eacute completa

Necessidade da ascese ateacute no Paraiacuteso terrestre

Restaria saber como seria no Paraiacuteso terrestre caso natildeo tivesse havido o pecado original e a consequente ex-pulsatildeo do homem

Parece-me que natildeo haveria a penitecircncia porque os homens natildeo tinham pecado mas existiria o que diziacuteamos haacute pouco do sacrifiacutecio de louvor da doaccedilatildeo da entrega pelo reconhecimento de que Deus eacute Absoluto e perfeito

No que diz respeito agrave presenccedila da ascese no Paraiacuteso terrestre uma vez que o homem se encontraria ali em estado de prova eacute patente que ele seria tentaacutevel Isso me inclina a pensar que para prevenir essa tentaccedilatildeo e ofe-

recer um corretivo para algo que natildeo era o pecado original mas uma possibili-

dade de pecar uma determinada ascese pareceria ser necessaacuteria

Natildeo se trataria portanto de uma expiaccedilatildeo mas de um ato ordenativo do homem por-que naquilo em que ele era tentaacutevel havia a raiz de al-go que poderia propender para a desordem

Estamos pois em pre-senccedila de uma hipoacutetese que poderia dar ao sacri-fiacutecio de louvor certo caraacute-

ter preventivo da tentaccedilatildeoPropriamente no sacrifiacute-

cio de louvor de que eu es-tava falando o gaacuteudio supre-

mo que tem aquele que oferece o sacrifiacutecio eacute uma espeacutecie de estre-

mecimento de alma diante do fato de que oferecendo alguma coisa que se des-

troacutei ele pratica um ato que aparentemente na ordem natural natildeo eacute razoaacutevel e encontra sua razatildeo de ser apenas no caraacuteter de daacutediva ldquoinuacutetilrdquo ldquodesarrazoadardquo Agravequele que eacute Absoluto E desta maneira se afirma com louvor mdash e com o uacutenico louvor adequado mdash o caraacuteter absoluto drsquoEle e o nosso reconhecimento deste caraacuteter absoluto Nisto entra exatamente uma espeacutecie de oacutescu-lo do contingente no Absoluto que eacute uma atitude total-mente desinteressada realizada por ser Ele Quem eacute

A doaccedilatildeo supotildee o sacrifiacutecio feito como que gratuitamen-te diante do mero fato de que Deus eacute Deus mais nada

Sacrifiacutecio desinteressado

Este eacute o estado de espiacuterito com que se deve morrer Na hora da morte a pessoa deve aceitaacute-la como sacrifiacute-cio merecido pelo pecado original e pelos seus pecados atuais Pode ateacute oferecer pela Cristandade por outros interesses o que Nossa Senhora quiser mas acrescenta-ria um elemento altiacutessimo se dissesse soacute isto ldquoPor serdes Voacutes Quem sois eu me ofereccedilordquo

Entatildeo o fazer-se pequeno eacute o uacutenico modo a garantia uacutenica que o homem tem de que todas as grandezas cons-truiacutedas por ele natildeo deem em vangloacuteria Por quecirc Porque teraacute atendido agrave exigecircncia dessa ordem metafiacutesica mais profunda que eacute o sacrifiacutecio desinteressado

Aliaacutes tenho a impressatildeo de que no sacrifiacutecio de Isaac entrava isso era um sacrifiacutecio tributado a Deus porque Ele quis o filho uacutenico de Abraatildeo que disse ldquoBem Voacutes

Tim

othy

Rin

g

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reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

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CC

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)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 15: Revista Doctor Plinio 211_201510

15

reflexotildeeS teoloacutegicaS

quereis esta hoacutestia de louvor que eacute meu filho inocente Voacutes o tendesrdquo

Algo disso parece-me estar presente tambeacutem na res-posta de Nosso Senhor agrave objeccedilatildeo de Judas contra San-ta Maria Madalena quando esta lavava os peacutes do Divi-no Mestre com um perfume muito valioso ldquoPor que natildeo se vendeu este perfume por 300 denaacuterios para daacute-los aos pobresrdquo (Jo 12 5) mdash reclamava Judas Ao responder ldquoDeixai-a ela conservou esse perfume para o dia da mi-nha sepultura Pois sempre tereis pobres convosco mas a Mim nem sempre tereisrdquo (Jo 12 7) Jesus dava a enten-der que natildeo se deve deixar de prestar a Deus o sacrifiacutecio desinteressado de puro louvor sob o pretexto de acabar com a pobreza

Essa atitude de abnegaccedilatildeo tem seu reflexo nas rela-ccedilotildees humanas Tambeacutem a perfeiccedilatildeo da amizade vem do fato de algueacutem ser capaz de fazer uma coisa dessas por outrem que mereccedila Por exemplo estou com uma pes-soa que eacute santa e vejo que vatildeo mataacute-la Posso substituir--me ao santo para ser morto eu e natildeo ele pela seguin-te razatildeo ldquoNatildeo toque naquele que eacute uma obra-prima de Deusrdquo A primeira ideia eacute a incolumidade daquele que eacute obra-prima de Deus para continuar a dar gloacuteria a Ele Eu pecador desapareccedilo dentre os viventes mas conse-gui que o santo continuasse a existir Eacute uma coisa mui-to bonita

A autecircntica imolaccedilatildeo deve ser total

Tambeacutem me parece que na humilhaccedilatildeo bem aceita es-taacute o sacrifiacutecio voluntariamente realizado Esta necessaacuteria humilhaccedilatildeo diante de Deus absoluto traz consigo uma passageira transitoacuteria mas efetiva como que destruiccedilatildeo de si proacuteprio por onde aleacutem do lado expiatoacute-rio o indiviacuteduo faz por amor o que ele faria da flor que ele ofereceria a Nossa Senhora Ele co-mo que se destroacutei pon-do-se ateacute abaixo do que eacute para fazer consigo o que realizaria com a flor

Este ato por ser co-mo que uma destrui-ccedilatildeo produz sofrimen-to nesta Terra dado o pecado original De al-gum modo o mais hu-milde dos homens rea-liza isso num espiacuterito de sofrimento Porque por

mais santo que ele seja tem uma parte ruim natildeo con-sentida que sofre com a humilhaccedilatildeo

Como seria no Paraiacuteso terrestre para o homem con-cebido sem pecado Ele se apequenar ao ponto de ser um nada diante de Deus natildeo traria revolta Isso eacute mui-to misterioso

Vecirc-se que com satanaacutes em determinado momento o fato de sentir-se natildeo pequeno mas ldquoapenasrdquo o primei-ro dos grandes da corte de Deus e natildeo o proacuteprio Deus trouxe uma inconformidade e esta participa da dor Por-tanto vejo de um modo um tanto nebuloso como seria este fenocircmeno na natureza angeacutelica

Entretanto mesmo para o homem concebido sem pe-cado original se esse aniquilamento natildeo chegasse efeti-vamente ao uacuteltimo limite de si mesmo e reservasse qual-quer coisinha ele natildeo seria autecircntico

Haacute atitudes em que a imolaccedilatildeo soacute eacute autecircntica quan-do eacute total Foi o que em uacuteltima anaacutelise Deus quis de Joacute quando permitiu que o democircnio o tentasse

Eacute nessa perspectiva que tomam toda a beleza coisas que a ldquoheresia brancardquo3 admira sem consideraacute-las debaixo des-te ponto de vista Entatildeo por exemplo um de noacutes tem um inimigo leproso e faz por ele um determinado benefiacutecio humilhando-se inenarravelmente diante do opositor que ainda responde com um desaforo Tal ato visto somente como o considera a ldquoheresia brancardquo mdash ou seja a pena do leproso e o leproso que natildeo tem compaixatildeo de mim mdash natildeo manifesta toda a sua profundidade O fundo estaacute na pes-soa ter-se apequenado de tal maneira que chegou a sofrer isto Aiacute nesse sentido do apequenamento que viemos ex-pondo o sacrifiacutecio tem uma grandeza incomparaacutevel Mas isso a ldquoheresia brancardquo natildeo considera porque tem horror agrave perspectiva de grandeza e de seriedade   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 2791984)

1) Jesuiacuteta e exegeta flamen-go ( 1567 - dagger 1637)2) Do latim o semelhante alegra-se com o semelhante3) Expressatildeo metafoacuteri-ca criada por Dr Plinio pa-ra designar a mentalidade sentimental que se manifes-ta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam mo-les mediacuteocres pouco pro-pensas agrave fortaleza assim co-mo a tudo que signifique es-plendor

Infortuacutenio de Joacute - Igreja da Visitaccedilatildeo de Nossa Senhora Limbourg Beacutelgica

Rei

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ke (

CC

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)

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

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aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 16: Revista Doctor Plinio 211_201510

Chamado a prestar grandes serviccedilos agrave Igreja

H

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

Quando jovem Dr Plinio se perguntava se teria a vocaccedilatildeo de ser viacutetima expiatoacuteria Depois de muitos sofrimentos fiacutesicos e morais recebeu a graccedila de compreender que natildeo era chamado a seguir o caminho de Santa Teresinha mas o de Godofredo de Bouillon visando a derrota da Revoluccedilatildeo e a vitoacuteria da Santa Igreja

Arq

uivo

Rev

ista

aacute duas espeacutecies de posiccedilotildees de Deus em relaccedilatildeo aos homens criados por Ele Alguns homens en-tram naquilo que chamamos providecircncia geral

e outros no que se denomina providecircncia especial

Previdecircncia e providecircncia

A providecircncia de Deus eacute aquela suprema perfeiccedilatildeo a sabedoria com a qual Ele conduz as coisas sabendo o que vai acontecer

Entatildeo noacutes podemos fazer uma distinccedilatildeo entre previ-decircncia e providecircncia Na linguagem comum se pode dizer que um homem prevecirc alguma coisa como por exemplo um comerciante ao ver antecipadamente o inverno che-gar conjetura que se vai acentuar muito mais o frio e pres-supotildee em consequecircncia disso a multiplicaccedilatildeo do nuacutemero de resfriados Entatildeo calcula que a demanda de remeacutedios antigripais vai aumentar muito tambeacutem Sendo um bom negociante compra de antematildeo uma porccedilatildeo de medica-mentos por atacado vendidos mais caros depois a varejo

Ele eacute previdente quando prognostica o agravamen-to do frio no inverno e eacute providente quando investe na

compra do necessaacuterio para realizar o plano dele Eis a distinccedilatildeo entre previdecircncia e providecircncia

Com respeito a Deus natildeo haacute propriamente previdecircn-cia porque Ele natildeo prevecirc as coisas Para Deus o presen-te o passado e o futuro satildeo um mesmo ato Ele vecirc tudo ao mesmo tempo

Poreacutem eacute providente Pois em vista de como as coisas satildeo Ele as conduz dispotildee e arranja de acordo com seu plano a respeito de cada criatura

Providecircncia geral e providecircncia especial

A grande maioria dos homens Deus conduz de acordo com a providecircncia geral Quer dizer daacute ao mundo uma organizaccedilatildeo faz com que as coisas sejam de um determi-nado modo a satisfazer as necessidades comuns das pes-soas Para o indiviacuteduo comum Ele proporciona uma vi-da normal concedendo-lhe recursos ordinaacuterios e intelec-to suficiente para utilizaacute-los a fim de prover as suas ne-cessidades

Contudo para outras pessoas o Altiacutessimo tem uma vo-caccedilatildeo especial conduzindo-as de um modo peculiar Vis-

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Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

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C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

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Kra

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 17: Revista Doctor Plinio 211_201510

17

Arqu

ivo R

evist

a

to ser um chamamento especial Ele tambeacutem lhes daacute um cuidado proacuteprio que natildeo eacute o ordinaacuterio

A pessoa colocada sob uma providecircncia especial tem habitualmente uma noccedilatildeo pelo menos confusa dos de-siacutegnios de Deus a respeito dela Eacute o comeccedilo de uma vo-caccedilatildeo um chamado indefinido para algo que a pessoa no iniacutecio ainda natildeo discerne o que eacute Na proacutepria Escri-tura haacute o caso do Profeta Samuel a quem Deus chama trecircs vezes Mas ele pensava que era Eli o pontiacutefice do Templohellip E numa quarta ocasiatildeo ao ouvir ldquoSamuel Sa-muelrdquo o profeta retrucou ldquoFala Senhor que o teu servo escutardquo(1Sm 3 3-10) Assim tambeacutem esses impulsos pri-meiros nos chamam sem sabermos bem de quem vecircmhellip

Um chamado para algo sublime

Praticamente o problema que eu tinha na minha juven-tude era vocacional e se exprimia da seguinte maneira

Desde pequeno eu sentia um chamamento para algo maiorhellip Sentia-o muito acentuadamente sem saber de-fini-lo Era-me claro que devia ter uma vida muito di-ferente da dos outros Percebia bem que eu transborda-va do meu copo e que coisas enormes estavam no meu caminho Coisas luminosas magniacuteficas importando em sacrifiacutecios para os quais me devia preparar mas tambeacutem vitoacuterias que me encheriam de alegria

Juntamente com isso uma espeacutecie de horror de natildeo se confirmarem esses pressentimentos comigo e pare-cer-me que cabia inteiro dentro do tipo do padratildeo de vi-da de qualquer homem de minhas condiccedilotildees no meu tempo Eu sentia uma espeacutecie de asfixia com esse pen-samento

Assim a minha luta contra a Revoluccedilatildeo o choque com ela a ideia da Contra-Revolu-ccedilatildeo foram correspondendo a esses movi-mentos de alma Embora a luta contra a Revoluccedilatildeo me fizesse sofrer muito por outro lado trazia-me muita alegria a dimensatildeo de alma e de vida na pers-pectiva de todos esses acontecimen-tos grandiosos

Encontrei a minha via

Foi um destampamento uma coi-sa magniacutefica o dia abenccediloado em que passei pela Praccedila do Patriarca1 e encontrei o aviso da realizaccedilatildeo do Congresso da Mocidade Catoacutelica Foi um brado E deste modo uma porccedilatildeo de coisas que eu julgava inviaacuteveis de repente se me apresentavam aos borbototildees

Imaginem um rapaz que chega mais ou menos aos seus 19 ou 20 anos poreacutem jaacute muito maduro e sofrido pa-ra a idade buscando um objetivo que natildeo se realiza E por aiacute tem a impressatildeo de que todo o futuro desejado estaacute comprimido e agarrado pelas matildeos Natildeo vai De suacute-bito passa por um lugar vecirc algo e aquela janela se abre Podem calcular bem a alegria de alma que isso daacute

Dali em diante sucessivas alegrias com o Movimen-to Mariano fundaccedilatildeo da Liga Eleitoral Catoacutelicahellip De-pois a minha eleiccedilatildeo para deputadohellip tudo indo num voo contiacutenuo e eu dizendo-me com deliacutecias para a mi-nha alma ldquoA via estaacute encontrada Daqui para a frente eacute batalhar duro natildeo haacute duacutevida mas a via eacute estardquo

Seria um pouco como um cruzado que vai agrave Cruza-da na alegria de sua alma mas natildeo encontra o caminho Erra por uma porccedilatildeo de lugares sem chegar a entender qual seja o sulco a seguir para encaminhar-se a Jerusa-leacutem Em determinado momento ele avista uma estrada e exclama ldquoEacute por laacute que eu chego ateacute o mar onde es-tatildeo as naus que me vatildeo levar para a Terra Santardquo Eacute uma alegria e laacute vai ele Isso se deu comigo E pensei ldquoDa-qui para a frente eacute caminhar rumo agrave minha Jerusaleacutem Eacute a minha batalha contra a Revoluccedilatildeo Agora eacute soacute viver eacute soacute lutarrdquo

Provaccedilatildeo serei apenas um advogado

Ora os acontecimentos a partir de um determinado momento depois desse movimento ascensional quando eu tinha entatildeo 25 ou 26 anos tudo quanto parecia cons-tituir uma estrada dava em nada ou no contraacuterio tor-

nando-me impossiacutevel o que eu queria fazendo--me voltar ao ponto de partida

Daiacute o tormento ldquoEntatildeo eacute soacute isso Tu-do foi ilusatildeo A minha vida vai ser a de

um advogado que vai ao Foacuterum toma nota para preparar umas argumenta-ccedilotildees para o cliente porque este bri-gou com outro e eu preciso fazer a defesa de seus direitos em questotildees sem importacircnciardquo

Lembro-me da falta de graccedila do meu primeiro cliente de advocacia Era um litiacutegio entre dois franceses Meu cliente tinha inventado uma foacutermula de sorvete chamada ldquoFlanrdquo

ou quando punha um ovo a mais no sorvete recebia o tiacutetulo de ldquoSuper-

flanrdquo Vendia seus sorvetes junto a par-ques de diversotildees circos etc Parecia ga-

nhar algum dinheiro com isso Um concor-rente pegou-lhe a foacutermula e comeccedilou a fabri-

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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(CC

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)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

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)

Page 18: Revista Doctor Plinio 211_201510

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

car um idecircntico Meu cliente queria fazer um processo contra o outro e este negava ter feito qualquer imitaccedilatildeo Nessa caceteaccedilatildeo eu advogar para provar que o sorve-te ldquoFlanrdquo natildeo era de um mas de outrohellip Mas meu Deus do Ceacuteu E assim quantos negoacutecios de advocacia sem gra-ccedila nenhumahellip

E me perguntava ldquoSeraacute que vou chegar ao fim de mi-nha vida mdash ateacute os 80 90 anos mdash advogando causas sobre lsquoFlanrsquo ou lsquoSuperflanrsquordquo

Causas de terras Meu pai e meu avocirc advogaram muito com demandas de terras Chega ou natildeo chega ateacute tal ponto a propriedade de Fulano Entatildeo vai laacute medir depois provar que chega mesmo ou natildeo chegahellip

Deixe que se arranjem com suas terrashellip Eu natildeo nas-ci para tratar delas Toda a minha alma se volta para ou-tra coisa Ainda que eu faccedila dinheiro nisso mdash e eacute duvido-so mdash natildeo nasci para ganhar dinheiro Eu nasci para ou-tra coisa

As dificuldades satildeo um sinal de que a vocaccedilatildeo eacute bem-amada de Deus

Comecei a perceber esse esboroamento do meio para o fim de meu mandato como deputado Consistiu no des-moronar do patrimocircnio de minha famiacutelia o empobrecer e a necessidade de trabalhar para viver quando eu queria dedicar todo meu tempo e esforccedilos em fazer apostolado

Ademais ateacute aquela ocasiatildeo tinha tido uma sauacutede de ferro que graccedilas a Deus com pequenos inconvenien-tes gripes e resfriados de um modo ou de outro conti-nua Mas apareceram alguns inconvenientes que depois a Providecircncia fez cessar

Por exemplo nevralgias que me atacaram naquele tempo Agraves duas ou trecircs horas da manhatilde acordava e fica-va sentado com uma dor forte na cabeccedila como se hou-vesse um prego cravado e o tempo passando Ouvia os reloacutegios do hotel e da igreja darem horas e eu senta-do meditando nesses infortuacutenios e aguentando o ldquopre-gordquo Entatildeo ao sentir-me exausto dormia com o peso da opressatildeo que me preocupava

Depois comecei a perceber a crise religiosa e poliacuteti-ca minando o caminho que eu tinha diante de mim Aiacute o terror e a asfixia da ilusatildeo ldquoAquilo natildeo foi senatildeo um en-gano um sonho um bluff Resigne-se agrave vontade de Deus que quer que vocecirc sofra esse bluff Depois aguente a sua vida como der porque Deus quer assim Ele tem ou natildeo tem o direito de querer Quem traccedila seu futuro eacute Deus ou vocecirc E se as coisas acontecem de outro modo e vo-cecirc natildeo tem culpa tem ou natildeo obrigaccedilatildeo de aceitar de se curvar e de ficar satisfeitordquo

Eu era escravo de Maria logo precisava aceitar com resignaccedilatildeo o meu futuro como ele se abria diante dos

meus passos Tinha que comprimir dentro de minha al-ma esses voos esses desejos essas elevaccedilotildees como coi-sas inaceitaacuteveis que natildeo exprimiam a vontade de Deus E se fosse vontade do Altiacutessimo precisava voltar para dentro de meu copo ou ir ateacute para um copo menor do que aquele no qual tinha nascido

Eacute difiacutecil calcular o abafamento de alma o desnortea-mento causado em mim por essa situaccedilatildeo

Na realidade Deus daacute uma vocaccedilatildeo muito grande e depois aparecem as dificuldades O fato de surgirem es-sas dificuldades natildeo quer dizer que natildeo se tenha voca-ccedilatildeo Pelo contraacuterio eacute uma vocaccedilatildeo bem-amada de Deus ao longo da qual Ele provecirc coisas que natildeo se queria situ-accedilotildees com as quais natildeo se contava fazendo parecer que Deus nos abandonouhellip Mas haacute tambeacutem um movimento interno de alma que nos diz ldquoNatildeo a Providecircncia natildeo nos abandonou Vamos para a frenterdquo

Holocausto de Santa Teresinha

Por cima deste punha-se outro problema Eu tinha li-do o livro Histoacuteria de uma alma de Santa Teresinha do Menino Jesus o qual me impressionara profundamente com sua narraccedilatildeo e parte da ideia de que natildeo se pode fa-zer para a Igreja Catoacutelica uma coisa mais uacutetil do que ser uma viacutetima ex-piatoacuteria do amor misericordioso de Deus

Assim se explica Os homens pe-cam e eacute preciso que outros os ajudem a expiar a pagar por seus pecados de maneira tal que com nosso sofrimen-to Deus perdoe a outros e conquiste outras almas dando-lhes graccedilas muito grandes porque noacutes sofremos

Poderaacute ser por exemplo uma pes-soa da longiacutenqua Birmacircnia da Tai-lacircndia ou um esquimoacute ou um alto poliacutetico um importante intelectual ou um elevado personagem eclesiaacutes-tico que precisa realizar uma gran-de accedilatildeo pela causa de Deus mas natildeo eacute bastante forte Entatildeo fica-se doen-te e morre-se desaparecendo da me-moacuteria dos homens Soacute Deus Se lem-braraacute de noacutes no Ceacuteu Soacute Deus Ora Deus eacute tudo

Santa Teresinha queria morrer assim viacutetima expiatoacuteria pelas almas dos outros Foi atendida Muito jo-vem contraiu tuberculose Durante uma noite sentiu que estava expec-

Arq

uivo

Rev

ista

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

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Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

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PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

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Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

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Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 19: Revista Doctor Plinio 211_201510

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torando sangue coisa caracteriacutestica dessa doenccedila e fi-cou tatildeo alegre com a ideia de morrer que por espiacuterito de sacrifiacutecio natildeo quis acender a luz para ver se era sangue mesmo Dormiu em paz De manhatilde sua primeira atitude foi ver se era sangue Se fosse significaria ter sido acei-to o holocausto e que ela natildeo demoraria a ir para o Ceacuteu

A partir de entatildeo comeccedilou o holocausto no duro pro-vaccedilotildees aridezes incompreensatildeo de uma superiora des-deacutem das irmatildes de haacutebito etc Ateacute o uacuteltimo momento da vida tudo foi tormento Deus parecia tecirc-la abandonado No derradeiro instante de vida mdash uma pessoa tuberculo-sa fica extremamente fraca sem forccedilas para nada mdash le-vantou-se e num ecircxtase de alegria disse ldquoOacute meu Deusrdquo E caiu morta Um aroma de violeta comeccedilou a encher todo o convento Era o siacutembolo da humildade dela

Devo ser uma viacutetima expiatoacuteria

Eu me punha este problema Quem sabe se Deus quer que eu seja uma viacutetima expiatoacuteria ignorada por todos Noto ter possibilidades recursos talvez possua ateacute talen-tos para ser um homem incomum e prestar grandes ser-viccedilos agrave Igreja mas poderia estar condenado a ser um ho-mem comum percebendo a trajetoacuteria de um outro que vai seguindo um caminho luminoso Caminho seguido pelo outro porque sou a viacutetima que estaacute carregando a cruz dele Natildeo serei mais uacutetil agrave Igreja e agrave Contra-Revo-luccedilatildeo afundando assim nos padecimentos e no anonima-to do que empreendendo a galopada heroica da Cruza-da que quereria realizar Entatildeo o que devo esperar de Deus para a minha vida

Como toda a minha tendecircncia ia para natildeo ser a viacuteti-ma expiatoacuteria mas sim o homem que caminhava para o campo de batalha a fim de lutar eu julgava realizar um sacrifiacutecio especialmente grande aceitando ser o contraacute-rio do que eu queria Eu serviria melhor agrave Igreja na mi-nha aniquilaccedilatildeo do que na minha realizaccedilatildeo pessoal En-tatildeo devia aceitar e voltar para o meu proacuteprio copohellip e inclinar-me agrave dura realidade dos fatos O que Deus que-ria de mim

Uma peccedila teatral de Claudel

Certa ocasiatildeo assisti a uma peccedila de teatro de Paul Claudel2 intitulada LrsquoAnnonce fait agrave Marie mdash Anuncia-ccedilatildeo feita a Maria considerada uma peccedila catoacutelica Come-ccedilava com uma cena no interior de uma casa de uma pe-quena famiacutelia de trabalhadores manuais da Idade Meacutedia Estava o pai homem que jaacute ia caminhando para a velhi-ce a matildee quase da idade do marido e duas filhas Natildeo me lembro muito bem dos pormenores pois haacute muitos anos que assisti a essa peccedila

Uma das filhas chamava-se Violaine e era a protagonistaNessa cena a matildee enquanto servia a refeiccedilatildeo matu-

tina agrave famiacutelia perguntava ao marido que estava visivel-mente preocupado

mdash Com o que vocecirc estaacute apreensivo assim As nossas terras estatildeo produzindo bem todos estamos fortes com sauacutede e contentes Olhe quantas coisas haacute na mesa pa-ra vocecirc comer No que vocecirc estaacute pensando homem Fi-que alegre

A certa altura depois de a mulher o ter interpelado muito o homem se levanta e diz

mdash Mulher vocecirc seraacute tatildeo cega que natildeo percebe o tor-mento pelo qual estaacute passando a Santa Igreja de Deus

A mulher daacute uma resposta deste gecircneromdash Natildeo percebo O que temos a ver com issomdash Vocecirc natildeo vecirc que haacute no momento quatro homens

disputando o papado e cada um pretende ser o legiacutetimo Papa e que a Igreja parece um grande tronco glorioso partido de alto a baixo

Ela daacute uma gargalhada e perguntamdash Eacute vocecirc que vai consertar issoEle respondemdash Para mim nada tem conserto nada tem alegria en-

quanto natildeo vir a Cristandade recomposta Mulher eu vou dizer-lhe uma coisa que vocecirc natildeo vai crer velho como es-tou meus braccedilos ainda tecircm forccedila como vocecirc bem vecirc na hora da lavoura Estes braccedilos natildeo vatildeo mais plantar nem colher mas pegaratildeo uma espada Eu vou levar a minha velhice ateacute o campo de batalha Se eu morrer tanto me-lhor terei oferecido a minha vida para que dos quatro ldquopapasrdquo resulte um soacute para que o Sacro Impeacuterio floresccedila para que as Ordens religiosas se expandam Eu sofrerei e morrerei mas vencerei a favor da Santa Madre Igreja

Violaine se oferece como viacutetima expiatoacuteria

Violaine ouve esta proclamaccedilatildeo e como jaacute acalentava anseios semelhantes sente-se profundamente interpreta-da nas palavras do pai Entatildeo ela tambeacutem quer oferecer--se a Deus ser uma viacutetima expiatoacuteria para a vitoacuteria da Igre-ja e da Franccedila invadida pelos ingleses os quais seriam fu-turamente protestantes Embora a jovem natildeo soubesse dis-so compreendia ser preciso expulsar de seu paiacutes os inimi-gos Por tudo isso ela precisava oferecer-se em holocausto

Nisto ouve-se tocar a sineta da porta e Violaine vai atender Era um rapaz conhecido da famiacutelia que lhe diz

mdash Natildeo toques em mimmdash Mas por quecircmdash Porque sou da raccedila infeliz dos homens em quem

ningueacutem toca porque tecircm horror Trago comigo uma do-enccedila que se te disser qual eacute o nome fugiraacutes de mim com asco Bateraacutes com a porta no meu rosto porque todo o

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

nso

de M

endo

nza

(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

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0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 20: Revista Doctor Plinio 211_201510

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geSta marial de um varatildeo catoacutelico

mundo foge de mim Sobre mim pesa uma maldiccedilatildeo Sou um pobre leprosohellip

Ela tem pena e em vez de lhe bater a porta conversa procurando consolaacute-lo dominando seu horror por ele

Em certo momento o leproso dizmdash Eu tenho que ir embora Vou para a solidatildeo das es-

tradas moccedilo aindahellip Abandonado obrigado em cons-ciecircncia a dizer que sou um leprosohellip E no momento em que faccedilo ao meu proacuteximo este ato de amor dizendo ser um leproso ele me retribui fugindo de mim Tem pena e dize-me uma palavra de amizade que eu possa levar pe-las estradas afora e na qual verei ter havido uma criatu-ra no mundo a quem natildeo causei horrorhellip

Ela se compadece e vencendo a repugnacircncia despe-de-se dele com um oacutesculo fraterno no rosto

Dias depois ela percebe as manchas da lepra

Um toque de clarim anuncia o cortejo de Santa Joana drsquoArc

Violaine compreendeu o futuro que a esperava Have-ria de seguir o destino terriacutevel de uma leprosa

Em outra cena aparece um leprosaacuterio Eacute noite friahellip Noite de Natal Umas barraquinhas pequenas onde mo-ram os leprosos Uma luz violaacutecea no ceacuteuhellip Eles todos com frio aconchegando-se a fogueirinhas e con-versando entre si De vez em quando se ou-viam risos de desespero Era gente deses-perada esfrangalhada sofrendohellip Uma coisa pavorosa

Ela ali no meio com um pano co-brindo parte do rosto afundada na-quele mar de horror

Ouve-se mais nitidamente uma conversa de um grupo de leprosos os quais diziam que o Rei da Fran-ccedila estava ganhando muitas bata-lhas pois aparecera uma virgem vinda de Domreacutemy na Lorena guerreira invenciacutevel que estava expulsando os ingleses da Franccedila porque era esta a vontade de Deus

Violaine ia se entusiasmando com isso

E a grande nova era a sagraccedilatildeo do Rei O cortejo da virgem da Lore-na iria passar ali por perto com todos os cavaleiros e exeacutercito para assistir agrave coroa-ccedilatildeo do Rei em Reims

Em certo momento ouve-se ao lon-ge um toque de clarim era Santa Joana drsquoArc que ia passandohellip

Por uma iluminaccedilatildeo divina Violaine compreende que Santa Joana drsquoArc estava vencendo os ingleses e tendo a gloacuteria de ir assistir agrave coroaccedilatildeo do Rei porque ela estava comprando esse triunfo com sua lepra3

Este aspecto eacute muito bonito ateacute empolgante Eacute uma forma de heroiacutesmo de estrangular de tirar o ar Mas Nosso Senhor Jesus Cristo natildeo sofreu muito mais por noacutes E Ele natildeo nos convida para isso

Surpresas difiacuteceis na linha da vocaccedilatildeo

Vinham-me entatildeo as perguntasldquoEssa doenccedila que provoca as nevralgias natildeo seraacute de

repente um cacircncer ou outra coisa qualquer que lhe le-va cedo a vida para outro ganhar a batalha que vocecirc an-siava tanto vencer Agora eu quero ver como eacute seu amor a Deus Vocecirc estava muito contente de ser algueacutem Vocecirc teraacute a mesma coragem de ser ningueacutem Vocecirc aceita isso Ateacute que ponto vocecirc eacute um homem seacuterio Se for seacuterio vocecirc aceitaraacute isso Se natildeo aceitar quer apenas representar um papel Entatildeo natildeo vale nada Vocecirc natildeo ama a Deus e me-rece ser esquecido por Ele sobre a face da Terrardquo

Agraves vezes aparecem na vocaccedilatildeo surpresas difiacuteceis de aguentar A Providecircncia nos conduz por um caminho mas nos daacute a impressatildeo de termos errado a estrada e de

que as vias de Deus talvez sejam outras Entre-tanto eacute este o sinal de que Ele nos quer le-

var por laacutePor outro lado a ideia de me oferecer

assim me incomodava Eu fiz o ofere-cimento mas parecia-me que alguma coisa natildeo estava bemhellip

Encontrava-me nesta situaccedilatildeo quando na Igreja do Sagrado Co-raccedilatildeo de Jesus situada perto do ho-tel onde eu morava no Rio de Ja-neiro vejo realizar-se uma feira de livros O vigaacuterio que era mui-to atencioso comigo e dava-me a Comunhatildeo na hora em que eu che-gasse aproximou-se de mim e me disse

mdash Dr Plinio estamos fazendo uma feira de livros Se o senhor a

quiser visitar seraacute bem-vindo O lucro da feira se destinahellipEra para uma boa obra qualquer

Equivalia a dizer ldquoO senhor decirc-nos um di-nheirinho a ganharrdquo

Pensei ldquoBem natildeo haacute remeacute-dio eu vou entrar e comprar alguma coisardquo Encontrei alguns livros que me

Alo

nso

de M

endo

nza

(CC

30

)

Santa Joana DrsquoArc na coroaccedilatildeo do Rei da Franccedila - Museu do Louvre Paris Franccedila

21

interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 21: Revista Doctor Plinio 211_201510

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interessaram e comprei-os Cha-mou-me atenccedilatildeo especial um cujo tiacutetulo era O Livro da Confianccedila

O efeito causado pelo Livro da Confianccedila na alma de Dr Plinio

Natildeo podem imaginar o efeito que me causou no espiacuterito quando o abri mdash natildeo lembro se logo no mo-mento ou se chegando ao hotel mdash e li as suas primeiras palavras um efeito apaziguante magniacutefico em minha alma

ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio dos coraccedilotildees voacutes murmurais no fundo das nossas consciecircncias palavras de doccedilura e de pazrdquo

Depois continua expondo mais ou menos nestes termos a seguinte doutrina Deus pode fazer uma pes-soa caminhar pelas vias mais duras e imprevistas mas se atendermos agrave voz de Cristo em noacutes mdash voz mis-teriosa da graccedila mdash ela murmuraraacute em nossas almas palavras de doccedilu-ra e de paz

Aquilo que nos arrebenta e nos trinca afinal na gran-de maioria dos casos natildeo eacute o caminho que devemos se-guir Haveraacute um movimento interno em nossas almas o qual nos daraacute confianccedila de que seraacute de outra maneira e nos conduziraacute para onde os nossos primeiros anelos nos levavam

Esse livro produziu em mim um efeito maravilhoso porque em uacuteltima anaacutelise dava exatamente essa ideia de que estando colocado sob uma providecircncia espe-cial e pedindo a Deus Nosso Senhor invocando a in-tercessatildeo drsquoAquela que tudo pode junto a Ele Nossa Senhora eu seria atendido E afinal por aqueles vai-veacutens de um jeito ou de outro aquilo que desejo se re-alizaraacute

foi como uma ponte abenccediloada que o ajudou a transpor muitos abismos

Natildeo sou chamado para o caminho de Santa Teresinha Sinto-me mais bem chamado para a via de Godofredo de Bouillon Vamos para a frente por cima de paus e de pe-dras por montes vales e colinashellip Vaacute a estrada por onde for e decirc nos descaminhos aparentes que houver preciso

confiar confiar confiarhellip ldquoVoz de Cristo voz misteriosa da graccedila que ressoais no silecircncio de nossos cora-ccedilotildees voacutes murmurais palavras de do-ccedilura e de pazrdquo Doccedilura e paz traz-me isto Eu vou rezar pedir rezar pe-dirhellip

Daiacute vinha-me uma pergunta ldquoMas vocecirc natildeo estaraacute enganado Seraacute que se vocecirc ficar quieto e for heroico natildeo pedindo nada a Nossa Senhora realizaraacute mais do que pe-dindo Pedindo Ela daacute Mas agraves ve-zes Ela concede o que natildeo quere-ria dar Natildeo peccedila nada e deixe tudo acontecerrdquo

Eu natildeo soube resolver o proble-ma e pensei entatildeo da seguinte ma-neira ldquoPedirei mas com a condi-ccedilatildeo de que se faccedila a vontade drsquoEla e natildeo a minha Se a vontade que haacute em mim eacute tambeacutem a drsquoEla faccedila-se Eu peccedilo peccedilo peccedilordquo

Encontrei um equiliacutebrio no meio de um torvelinho medonho

O Livro da Confianccedila foi a pon-te admiraacutevel e abenccediloada que me ajudou a passar por natildeo sei quantos abismos ateacute encontrar alguma coi-

sa que significava realmente estar eu no caminho certo e andando para a frente

Com o favor de Nossa Senhora um dos indiacutecios disso eacute este querido auditoacuterio tatildeo cheio de gente que natildeo ti-nha sequer nascido naquele tempo Eu procurava em torno de mim os que viriam mas os caminhos estavam desertoshellip Eu natildeo sabia que das mais variadas partes do Brasil e do mundo estavam nascendo ou comeccedilariam a nascer dali a uns anos aqueles cujas vias se encontra-riam com as minhas pelas naccedilotildees afora para fazer a Contra-Revoluccedilatildeo   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1351989)

1) Situada no Centro velho de Satildeo Paulo

2) Diplomata dramaturgo e poeta francecircs ( 681868 - dagger 2321955)

3) Nota do Editor O enredo aqui descrito difere em alguns pormenores do composto por Paul Claudel o que talvez se deva a uma adaptaccedilatildeo da peccedila ao puacuteblico catoacutelico que a assistia ou a uma interpretaccedilatildeo mdash em nosso parecer sublimada mdash de Dr Plinio

Arq

uivo

Rev

ista

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

Dor

nick

e (C

C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Dor

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0)

Lece

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C 3

0)

banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 22: Revista Doctor Plinio 211_201510

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

Dom Joatildeo VI no Brasil - II

P

22

Napoleatildeo retirando-se de Moscou incendiada - Museus do Kremlin Moscou Ruacutessia

Dr Plinio conseguia evocar grandes e pequenos episoacutedios da Histoacuteria tornando-os vivos atraveacutes de

interessantes pormenores

ara vingar-se de Napoleatildeo por ter invadido seu paiacutes D Joatildeo VI mandou ocupar a Guiana Fran-cesa ao norte do Brasil Aquilo naquele tempo

era o fim do mundo Mas era como uma vinganccedila E natildeo foi faacutecil fazer com que ele depois de Napoleatildeo cair de-volvesse a Guiana para a Franccedila porque ele natildeo a que-ria mais largar

Um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cristandade

Abro aqui uns parecircnteses a respeito da resistecircncia agraves invasotildees napoleocircnicas

Napoleatildeo queria ficar dono da Europa inteira e inva-diu quase ao mesmo tempo mdash natildeo foi ao mesmo tem-

po eacute claro mdash a Espanha e a Ruacutessia os dois extremos da Europa A partir de en-tatildeo as coisas lhe ficaram difiacuteceis

Na Ruacutessia o problema foi o ldquogeneral invernordquo As tropas napoleocircnicas foram avanccedilando paiacutes adentro e em certo momento vi-ram-se imersas num inver-no horriacutevel Napoleatildeo es-perava passar o inverno em Moscou Deixaram-no en-trar e alojar-se ali

Quando ele se alojou os proacuteprios moscovitas toca-ram fogo na cidade Ele te-ve de bater em retirada e o seu impeacuterio estava liquida-do

Tendo Napoleatildeo invadi-do a Espanha os espanhoacuteis o combateram heroica-

Rep

rodu

ccedilatildeo

rsquo

23

Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

rodu

ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

24

Dor

nick

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C 3

0)

Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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Hol

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n(C

C 3

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

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ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

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)

Page 23: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Batalha de Valdepentildeas onde o povo espanhol investiu contra as tropas napoleocircnicas - Museo del Vino Valdepentildeas Espanha

mente Foi um dos mais belos feitos da Histoacuteria da Cris-tandade

O povo todo se levantou contra a invasatildeo napoleocircni-ca Quando as tropas de Napoleatildeo entravam nas cidades os homens as mulheres as crianccedilas iam agraves janelas e jo-gavam o que tivessem agrave matildeo mdash moacuteveis e toda espeacutecie de objetos mdash em cima da soldadesca Negavam alimen-to queimavam as plantaccedilotildees de trigo de maneira que o exeacutercito francecircs natildeo tinha com que fazer patildeo Os espa-nhoacuteis caiacuteam na pobreza mas puxavam Napoleatildeo para baixo na pobreza tambeacutem

Muitos historiadores sustentam que ateacute os padres sa-iacuteam dos conventos e iam com armas de fogo fazer guer-rilha E Napoleatildeo natildeo estava habituado agrave guerrilha Em mateacuteria de combate ele soacute entendia da grande guerra convencional com grandes exeacutercitos

Conta-se que enquanto esses fatos se passavam Na-poleatildeo que era um anticlerical perguntou para um pa-dre

mdash Quais satildeo os dois povos mais religiosos da Europa Devem ser os mais atrasados natildeo

O padre respondeumdash Julgue Vossa Majestade satildeo a Espanha e a Ruacutes-

sia

Casamento de Dona Leopoldina com Dom Pedro I

Fechando os parecircnteses e voltando ao Brasil pode-mos ver por esses episoacutedios o senso poliacutetico com que D Joatildeo VI fazia as coisas Ele chamou um dia o filho dele o futuro D Pedro I e disse-lhe

mdash Pedro mais dia menos dia o Brasil vai ficar indepen-dente de Portugal porque eacute grande demais para ser gover-nado a partir de uma metroacute-pole tatildeo distante Potildee tu a co-roa do Brasil na cabeccedila antes que um aventureiro a tome

Para muitos historiadores o brado do Ipiranga ldquoInde-pendecircncia ou Morterdquo natildeo foi uma traiccedilatildeo a Portugal De fato D Pedro I seguiu o con-selho do pai e proclamou a Independecircncia conservando o Brasil para a dinastia O ho-mem sabia jogar

D Joatildeo VI resolveu pe-dir ao Imperador da Aacuteustria que era o maior potentado do

tempo uma de suas filhas para se casar com seu filho e vir morar no Brasil O Imperador da Aacuteustria concedeu

O monarca portuguecircs nomeou o Marquecircs de Marial-va como procurador do Priacutencipe D Pedro herdeiro do trono de Portugal para realizar as tratativas do casamen-to com a Princesa Dona Leopoldina

O Marquecircs de Marialva teve a ideia de que para re-presentar um homem com tal poder imperial como o de D Joatildeo VI mdash senhor do reino de Portugal mas tambeacutem de tantas colocircnias na Ameacuterica na Aacutefrica e na Aacutesia mdash era preciso gastar uma faacutebula no casamento Ora o Rei de Portugal estava com as financcedilas muito prejudicadas devido agrave invasatildeo napoleocircnica

Por isso o Marquecircs gastou toda a sua fortuna mdash que era grande mdash soacute nessa missatildeo Assim o casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina filha do Imperador da Aacuteustria com o Priacutencipe D Pedro representado pe-lo Marquecircs de Marialva figurou entre as festas mais ceacute-lebres da Europa

Nessa ocasiatildeo estabeleceram uma combinaccedilatildeo pe-la qual a Aacuteustria fazia uma expansatildeo poliacutetica do lado do Oceano Atlacircntico para ajudar Portugal e Brasil contra a Inglaterra e outras potecircncias coloniais e garantir mais a independecircncia do Brasil Mais uma prova de como D Joatildeo VI sabia jogar bem

Original presente ao Duque de Wellington

Dou outro pequeno exemploNaquele tempo nesse clima de pompa das monar-

quias os monarcas costumavam dar presentes suntuosos a homens ceacutelebres

Rep

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ccedilatildeo

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

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Lece

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

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luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

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entildeo

(CC

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)

Page 24: Revista Doctor Plinio 211_201510

PerSPectiva Pliniana da hiStoacuteria

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Estou me lembrando de um diplomata francecircs que re-cebeu da matildee de Maria Antonieta a Imperatriz Maria Tereza uma mesa cravejada de pedras preciosas

Um libertador da Europa foi o Duque de Wellington o famoso vencedor de Napoleatildeo em Waterloo Entatildeo to-dos os reis da Europa deram-lhe bonitos presentes O que D Joatildeo VI lhe mandou

Naquele tempo mesa de banquete era para cem pes-soas Os palaacutecios enormes com galerias colossais com muitos lacaios empregados uma coisa pomposa Ele presenteou o general vitorioso com um conjunto de jar-ros de floreiras e de adornos para colocar na mesa de banquetes O serviccedilo era todo de prata maciccedila e re-presentava de ponta a ponta cenas do Brasil com pal-meiras etc Uma coisa colossal fazendo propaganda do Brasil

Todos os anos no aniversaacuterio da batalha de Waterloo o Duque de Wellington que tinha recebido da Inglaterra um grande castelo e vivia na fartura oferecia um banque-te agraves maiores celebridades da Europa com quem ele tinha relaccedilotildees para comemorar a vitoacuteria Em todos os anos ateacute ele morrer sobre a mesa do banquete estavam os utensiacute-lios evocativos do Brasil um presente de D Joatildeo VI

Congresso de Viena a primeira grande reuniatildeo de diplomatas

Vejam como se compunha o ambiente poliacutetico da eacutepocaQuando Napoleatildeo caiu realizou-se a maior reuniatildeo

de diplomatas que ateacute entatildeo tinha havido na histoacuteria do

mundo o Congresso de Viena Os dois gecircnios dessa reu-niatildeo eram da parte da Aacuteustria o Priacutencipe de Metternich e do lado francecircs Talleyrand

O primeiro uma faacutebula de homem inteligente educa-diacutessimo finiacutessimo com uma conversa muito agradaacutevel um verdadeiro fidalgo e um diplomata de primeira or-dem Os reis da Europa inteira o consultavam de tal ma-neira ele era um colosso

Talleyrand era ministro do Rei da Franccedila Luiacutes XVIII e passava por ser o melhor causeur1 da Europa Apesar de Metternich ser um colosso havia muitos que susten-tavam que Talleyrand passava a perna nele tatildeo esperto era este ministro francecircs Era um diplomata fenomenal

Conto um pequeno episoacutedio para verem como os tempos eram diferentes

Luiacutes XVIII quis dar diretrizes a Talleyrand sobre as conversaccedilotildees em Viena Este de modo muito respeito-so disse ao Rei

mdash Sire2 diretrizes para mim mdash ele era um poliacutetico muito mais experiente do que o monarca mdash Natildeo Ma-jestade natildeo faccedila isso

mdash Mas o que o senhor quer entatildeo como colaboraccedilatildeo de minha parte

mdash Oh Majestade eu lhe peccedilo apenas duas coisas envie--me muito bons cozinheiros para eu poder dar grandes ban-quetes na embaixada e com regularidade mande-me queijo Brie de maneira a chegar fresquiacutessimo e eu ter a mesa mais concorrida do Congresso de Viena O resto eu arranjo

O Rei mandou os cozinheiros e periodicamente par-tia da Franccedila grande quantidade de queijo Brie para os

Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina no Brasil - Museu Nacional de Belas Artes Rio de Janeiro Brasil

Coroaccedilatildeo de D Pedro I (quadro a oacuteleo pintado por Jean-Baptiste Debret)

Palaacutecio do Itamaraty Brasiacutelia Brasil

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

31

Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 25: Revista Doctor Plinio 211_201510

25

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banquetes de Talleyrand Sua atuaccedilatildeo no Congresso de Viena ficou ceacutelebre

Quanta pompa quanta inteligecircncia quanta habilida-de quanta bondade e ateacute quanta simplicidade Todos es-ses predicados viviam juntos numa harmonia da qual tal-vez natildeo faccedilamos bem ideia

Descendentes de Dom Pedro I visitam famiacutelia de Dona Gabriela

Termino com um fatinho ligado agrave Famiacutelia Imperial brasileira

Quando foi proclamada a Repuacuteblica D Pedro II foi expulso do Brasil com toda a sua famiacutelia Mas no ano de 1922 festejou-se o centenaacuterio da Independecircncia do Brasil e ficava muito mal celebrarem D Pedro I estan-do os descendentes dele exilados do Paiacutes Por isso o en-tatildeo Presidente da Repuacuteblica Epitaacutecio Pessoa revogou o decreto de banimento da Famiacutelia Imperial a qual pocirc-de entatildeo regressar ao Brasil E vindo a Satildeo Paulo eles foram visitar naturalmente as famiacutelias que conheciam entre as quais estava a de minha avoacute em cuja casa eu morava

Foi-nos ensinada entatildeo uma seacuterie de regras de corte-sia para recebermos os meninos de nossa idade da Famiacute-lia Imperial

Havia em nossa casa duas salas de visitas uma mais pomposa e outra mais iacutentima Os priacutencipes adultos fo-ram recebidos na sala mais pomposa e na mais iacutentima fi-cou a crianccedilada

Junto ao porta-chapeacuteus existia uma bandejinha para colocar cartotildees de visita E os priacutencipes entraram mdash to-dos muito vivos muito espertos e animados mdash e foram colocar seus chapeacuteus no porta-chapeacuteus Ao verem aquela bandejinha que tinha um desenho em alto-relevo repre-sentando um papagaio exclamaram

mdash Olha o papagaio Olha o papagaio Estavam interessadiacutessimos pelo papagaio Eu tinha

um na cozinha e julguei fazer o papel de bom dono de casa dizendo-lhes

mdash Mas este papagaio natildeo tem nada de extraordinaacuterio Haacute toda espeacutecie de papagaios aqui no Brasil Aqui perto na cozinha tem um papagaio

mdash Onde estaacutemdash LaacuteE foram todos correndo para ver o papagaio Os mais velhos ficaram aterrorizados quando verifica-

ram que a recepccedilatildeo tatildeo pomposamente calculada esta-va se dando logo de iniacutecio na cozinha

Veio entatildeo o decreto e toda a crianccedilada mdash priacutencipes e natildeo priacutencipes mdash teve que voltar para a sala de visitas sentar em cadeiras e comeccedilar a conversar   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 26101985)

1) Do francecircs Pessoa que desenvolve conversa interessante e atraente

2) Tratamento que se dava aos reis da Franccedila e aos senhores feudais

ldquoGrito do Ipirangardquo (Independecircncia do Brasil) Museu Paulista Satildeo Paulo Brasil

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

26

Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

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Kra

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

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Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

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caro

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

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ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

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luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 26: Revista Doctor Plinio 211_201510

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

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Santo Anjo da Guarda

9 Satildeo Dioniacutesio bispo e companheiros maacutertires (daggerseacutec III)Satildeo Joatildeo Leonardi presbiacutetero (dagger1609)Santa Puacuteblia viuacuteva (daggerc seacutec IV) Viuacuteva da Antioquia

se fez monja apoacutes a morte do marido Foi esbofeteada por ordem do imperador Juliano por cantar salmos que con-denavam a idolatria

10 Satildeo Daniel Comboni bispo (dagger1881) Primeiro Bis-po catoacutelico da Aacutefrica Central fundou o Instituto dos Mis-sionaacuterios Combonianos do Coraccedilatildeo de Jesus Morreu em Khartum Sudatildeo

11 XXVIII Domingo do Tempo ComumSatildeo Pedro Lecirc Tuy presbiacutetero e maacutertir (dagger1833) Deca-

pitado no tempo do Imperador Minh Mang em Hanoi Vietnatilde

12 Solenidade de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo Apare-cida

Beato Romatildeo Sitko presbiacutetero e maacutertir (dagger1942) Reitor do seminaacuterio de Tarnoacutew Polocircnia foi preso e torturado no campo de concentraccedilatildeo de Auschwitz

13 Beata Alexandrina Maria da Costa (dagger1955) Por de-fender sua castidade ficou parapleacute-gica aos 14 anos em Balasar Portu-gal Viveu confinada no leito o resto da vida oferecendo-se como viacutetima pela conversatildeo dos pecadores

14 Satildeo Calisto I Papa e maacutertir (daggerc 222)

Satildeo Domingos Loricato presbiacute-tero (dagger1060) Religioso da Ordem Camaldulense foi designado por Satildeo Pedro Damiatildeo para dirigir um mosteiro de sua Ordem em San Se-verino Itaacutelia

15 Santa Teresa de Jesus vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1582)

Santa Tecla da Inglaterra aba-dessa (daggerc 790) Enviada da Ingla-terra agrave Alemanha para auxiliar Satildeo Bonifaacutecio dirigiu o mosteiro de Ochsenfurt e depois o de Kitzingen

16 Santa Edwiges religiosa (dagger1243)

1 Santa Teresinha do Menino Jesus virgem e Doutora da Igreja (dagger1897) Ver paacutegina 2

2 Santos Anjos da GuardaSatildeo Beregiso abade (daggerd 725) Fundou em Andage

atual Beacutelgica um mosteiro de Cocircnegos Regulares do qual foi abade

3 Bem-aventurados Andreacute de Soveral Ambroacutesio Fran-cisco Ferro presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1645)

Satildeo Maximiano bispo (daggerc 410) Bispo de Bagai atu-al Argeacutelia torturado por hereges lanccedilado do alto de uma torre e dado por morto Mas recuperado continuou lutan-do pela Feacute Catoacutelica

4 XXVII Domingo do Tempo ComumSatildeo Francisco de Assis religioso (dagger1226)Satildeo Petrocircnio bispo (daggerc 450) Eleito sucessor de Satildeo

Feacutelix em Bolonha Itaacutelia Renunciando agraves honras que pos-suiacutea no Impeacuterio Romano fez-se sacerdote

5 Satildeo Benedito o Negro religioso (dagger1589)Santa Faustina Kowalska virgem (dagger1938) Religiosa

das Irmatildes da Bem-Aventurada Virgem Maria da Miseri-coacuterdia em Cracoacutevia Polocircnia traba-lhou para anunciar o misteacuterio da di-vina misericoacuterdia

6 Satildeo Bruno presbiacutetero e eremi-ta (dagger1101)

Santa Maria Francisca das Cha-gas de Nosso Senhor Jesus Cristo virgem (dagger1791) Terciaacuteria francisca-na destacou-se por sua paciecircncia nas tribulaccedilotildees e adversidades bem co-mo pelas penitecircncias e pelo amor de Deus e das almas em Naacutepoles Itaacutelia

7 Nossa Senhora do RosaacuterioSatildeo Marcos Papa (dagger336) Insti-

tuiu o paacutelio em seu curto pontificado fez o primeiro calendaacuterio das festas religiosas e mandou construir as basiacute-licas de Satildeo Marcos e Santa Balbina

8 Satildeo Feacutelix bispo (daggerseacutec IV) Or-denado por Santo Ambroacutesio de Mi-latildeo foi o primeiro Bispo de Como Itaacutelia

Fra

nccediloi

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oula

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

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Kra

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Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

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caro

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convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 27: Revista Doctor Plinio 211_201510

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash outubro ndashndashndashndash

27

Santo Inaacutecio de Antioquia

Gus

tavo

Kra

lj

Santa Margarida Maria Alacoque vir-gem (dagger1690)

Satildeo Galo presbiacute-tero e monge (dagger645) Educado por Satildeo Co-lumbano no mosteiro de Bangor Irlanda propagou o Evange-lho nesta regiatildeo

17 Santo Inaacutecio de Antioquia bispo e maacutertir (dagger107)

Santo Oseias Pro-feta Com suas pala-vras e exemplo de vi-da demonstrou ao po-vo de Israel o incomensuraacutevel amor de Deus

18 XXIX Domingo do Tempo ComumSatildeo Lucas EvangelistaSanto Amaacutevel presbiacutetero (daggerseacutec V) Paacuteroco de Riom

Franccedila conhecido como ldquovaratildeo de admiraacutevel santidaderdquo por suas virtudes e dons de milagres

19 Satildeo Joatildeo de Breacutebeuf Isaac Jogues presbiacuteteros e companheiros maacutertires (dagger1642-1649)

Satildeo Paulo da Cruz presbiacutetero (dagger1775)Beato Tomaacutes Heacutelye presbiacutetero (dagger1595) Exercia seu mi-

nisteacuterio durante o dia e dedicava a noite agrave oraccedilatildeo e agrave peni-tecircncia na Diocese de Coutances na Normandia Franccedila

20 Beato Tiago Strepa bispo (dagger1409) Prior do conven-to franciscano de Lviv Ucracircnia nomeado Bispo de Halicz estimulou a vida religiosa a devoccedilatildeo a Jesus Eucariacutestico e a Nossa Senhora

21 Santa Laura Montoya Upegui virgem (dagger1949) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes Missionaacuterias de Maria Imaculada e Santa Catarina de Sena em Medelliacuten Colocircmbia

22 Satildeo Marcos bispo (daggerseacutec II) Primeiro Bispo proce-dente dos gentios a ocupar a Seacute de Jerusaleacutem

23 Satildeo Joatildeo de Capistrano presbiacutetero (dagger1456)Beato Arnaldo religioso (dagger1890) Religioso da Congre-

gaccedilatildeo dos Irmatildeos das Escolas Cristatildes dedicou-se agrave forma-

ccedilatildeo dos jovens como professor e com ora-ccedilotildees assiacuteduas em Rei-ms Franccedila

24 Santo Antocircnio Maria Claret bispo (dagger1870)

Satildeo Fromundo bis-po (daggerseacutec VII) Fundou o mosteiro de mon-jas de Ham e exerceu o ministeacuterio pastoral em Coutances atual Franccedila

25 XXX Domingo do Tempo Comum

Santo Antocircnio de SantrsquoAna Galvatildeo presbiacutetero (dagger1822)Beato Tadeu Machar bispo (dagger1492) Nobre irlandecircs elei-

to Bispo de Cork e Cloyne teve que sair de sua paacutetria pela hostilidade dos poderosos Faleceu em Borgo SantrsquoAntonio Itaacutelia durante a viagem para Roma

26 Beata Celina Chludzindska Borzecka religiosa (dagger1913) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Res-surreiccedilatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo em Cracoacutevia Polocircnia

27 Santo Evaristo Papa (dagger108) Dirigiu a Igreja Roma-na como quarto sucessor de Satildeo Pedro no tempo do im-perador Trajano

28 Satildeo Simatildeo e Satildeo Judas Tadeu ApoacutestolosSatildeo Germano abade (daggerseacutec XI) Insigne pelo seu amor

agrave solidatildeo fundou e dirigiu a abadia de Talloires em An-necy Franccedila

29 Satildeo Narciso bispo (daggerc 222) Eleito Bispo de Jeru-saleacutem aos 100 anos de idade foi modelo de paciecircncia e feacute Faleceu aos 116 anos

30 Beato Aleixo Zaryckyj presbiacutetero e maacutertir (dagger1963) Sob um regime hostil a Deus foi deportado para um cam-po de concentraccedilatildeo em Dolinka Cazaquistatildeo onde en-controu a vida eterna

31 Santo Afonso Rodriacuteguez religioso (dagger1617) Ver paacute-gina 28

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

29

Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

30

hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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Hol

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C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

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)

Page 28: Revista Doctor Plinio 211_201510

E

O carisma da boa conversa

28

hagiografia

A boa conversa eacute uma forma comunicativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Senhora que

extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fala

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues confessor Sobre ele Scha-moni em seu livro A verdadeira fisionomia dos

Santos1 daacute as seguintes notas

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531 em Se-goacutevia Era filho de um piedoso negociante

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influecircncia do Bem-aventurado Padre Faacutebio que durante algum tempo viveu entre eles assim como mais tarde o san-to religioso Francisco de Vilanova

Com a morte de seu pai Santo Afonso passou a cuidar dos negoacutecios familiares poreacutem a sua pouca habilidade le-vou os negoacutecios agrave falecircncia ao mesmo tempo em que a mor-te arrebatava a sua esposa seus filhos e sua matildee

ldquoNa desgraccedila mdash disse o Santo mdash vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida Fizera por causa do mundo pouco caso de Deus e agora estava na iminecircncia de perder-me eternamente Ante mim vi a sublime grandeza de Deus enquanto eu jazia no poacute da minha proacutepria miseacute-ria Imaginei ser um segundo Davi e um comovedor Mise-rere foi a expressatildeo do meu estado de espiacuteritordquo

Dirigiu-se entatildeo agrave Companhia de Jesus e depois de seis meses de noviciado mandaram-no para o coleacutegio de Mon-te Sion em Palma de Mallorca de cujo convento foi irmatildeo porteiro durante quarenta e cinco anos

Doutor de Mallorca

A confianccedila que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem pedindo

conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais Santo Afonso possuiacutea em especial o dom da conversa espiritual Seu proacuteprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmatildeo leigo Atendia tambeacutem os pedidos que lhe faziam atraveacutes de numerosas correspondecircncias Por isto foi chamado o ldquoDoutor de Mallorcardquo

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mes-mo precisou suportar numerosas dificuldades iacutentimas e materiais e enfrentar duras batalhas

ldquoSentia mdash comentou mdash cada vez com maior profundi-dade a grandeza do Senhor enquanto se aguccedilava em mim a consciecircncia da debilidade do meu ser Graccedilas a esta ex-periecircncia mergulhava no estado de absoluta inconsciecircncia Entatildeo soacute sabia amarrdquo

Trecircs dias antes de sua morte depois da sua uacuteltima Co-munhatildeo permaneceu iluminado e em ecircxtase

ldquoQue felicidade mdash escreveu uma testemunha ocular mdash despertava em nosso espiacuterito ao contemplaacute-lo E eram so-mente algumas migalhas da sua felicidade Decidimos cha-mar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonsordquo

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta eacute uma vida verdadeiramente magniacutefica porque traz trecircs notas muito importantes

A primeira delas costuma ser comentada a propoacute-sito da vida de Santo Afonso Rodrigues e eacute digna de ser recordada este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha a todo o mundo e conseguiu realizar es-te bem num posto humiacutelimo Ele era porteiro de um

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Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

gio

Hol

lman

n(C

C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

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Imagem de Santo Afonso Rodrigues Basiacutelica de Loyola Espanha

Fran

cisc

o Le

caro

s

convento numa ilha que naquele tempo tinha comu-nicaccedilatildeo difiacutecil com o continente e ficava muito mais isolada do que estaacute hoje Ali ele consumiu 45 anos de sua existecircncia

Pois bem apesar de estar nesse recanto o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca depois pela Espanha e mais tarde pelo mundo com a figura veneraacutevel deste portei-ro velho acolhedor afaacutevel sempre ao alcance de todo mundo na portaria e portanto podendo ser consultado por todos os que quisessem o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria Todos iam laacute vecirc-lo e ou-vi-lo

Vemos o que haacute de magniacutefico numa vida mesmo mui-to humilde como esta quando eacute toda integrada e empre-gada no serviccedilo de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Catoacutelica Por quecirc Porque a santidade a sabedoria tem uma irradiaccedilatildeo proacutepria que natildeo eacute comparaacutevel a nada Natildeo eacute tatildeo importante que o Santo esteja num lugar on-de todos veem porque para atrair quer o afeto quer a admiraccedilatildeo em qualquer lugar onde ele esteja este afe-to e esta admiraccedilatildeo confluem Basta que seja um San-to verdadeiro e autecircntico com uma santidade como di-ziam os antigos victa et non picta quer dizer verdadeira e natildeo pintada

Com essa consideraccedilatildeo devemos fazer duas outras que me parecem bem mais importantes

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contem-plar a Deus Nosso Senhor fala muito agrave minha alma Con-siderar a grandeza divina Deus infinitamente grandioso majestoso saacutebio transcendente a tudo excelente mag-niacutefico sublime radioso absoluto em toda a sua essecircncia misterioso insondaacutevel

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos acabamos descobrindo tal insuficiecircncia tal debilidade que chegamos agrave seguinte conclusatildeo ou va-lem porque satildeo um reflexo de Deus ou natildeo satildeo absolu-tamente nada

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de mi-nha vida se natildeo cresse em Deus Sentiria ao cabo de al-gum tempo uma insipidez uma sensaccedilatildeo de vazio Por exemplo diante de um belo objeto Aqui estaacute esta pe-ccedila de ouro estaacute bem mas o que importa Custa muito Sim poreacutem o que me interessa Satisfaz as minhas ne-cessidades Suponhamos que sim E do que me adianta satisfazer minhas necessidades Prolongar esta vida para quecirc Tudo isto natildeo eacute nada

Mas se eu tomo em consideraccedilatildeo que isso tudo natildeo eacute senatildeo um veacuteu por detraacutes do qual estaacute o Ser absolu-

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hagiografia

Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

Ser

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C 3

0)

to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

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ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

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Cristo Rei ladeado pela Santiacutessima Virgem e por Satildeo Joatildeo Evangelista - Museu do Prado Madri Espanha

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to perfeito eterno sapientiacutessimo sublime transcen-dente entatildeo encontro algo que eacute inteiramente supe-rior a todos os homens a mim aos que me rodeiam e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto amado e de que a Ele eu me de-dique completamente E isto por causa da grandeza drsquoEle Porque Ele natildeo eacute uma simples criatura con-cebida no pecado como eu mas eacute o proacuteprio Criador perfeitiacutessimo

Agora a vida tomou sentido a existecircncia eacute alguma coi-sa A grandeza de Deus me ergueu do poacute e me deu o de-sejo das coisas infinitas

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem este Santo na consideraccedilatildeo da grandeza de Deus subiu alto e ateacute o fim da vida dele se arrepen-dia dos seus pecados e desejava ir para o Ceacuteu a fim de conhecer essa infinita grandeza

Confesso francamente que me eacute impossiacutevel pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha

alma Muitos morrem com medo de pensar na grande-za de Deus Eu pelo contraacuterio tenho a impressatildeo de que se Nossa Senhora me ajudar mdash e natildeo duvido que me ajudaraacute mdash na hora da minha morte morrerei radio-so com a ideia de que afinal de contas vou encontrar a grandeza de Deus vou me libertar do caacutercere de to-das as limitaccedilotildees de todas as mesquinharias de todas as pequenezes de todas as contingecircncias para encon-trar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande Senhor meu Pai meu Rei meu tatildeo grande que nem sequer apesar da visatildeo beatiacutefica poderei dispensar um inter-mediaacuterio junto a Ele

Entatildeo eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo o Verbo de Deus encarnado

Uma forma de grandezahellip quando se fala as palavras Jesus Cristo todas as formas todos os sons todos os ma-tizes de grandeza se concentram ali de um modo super-lativo E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo infini-tamente abaixo drsquoEle e incomensuravelmente acima de mim Nossa Senhora Rainha de uma majestade inson-daacutevel

Entatildeo o que sou eu Uma poeira um gratildeo de areia perdido no meio disto tudo Pois bem me enche a al-

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Satildeo Charbel Makhlouf

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A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

Page 31: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Satildeo Charbel Makhlouf

Rep

rodu

ccedilatildeo

A conversa pode ser um meio de santificaccedilatildeo

Haacute um eremita que me en-canta o Bem-aventurado Char-bel Makhlouf2 Eacute uma maravi-lha de silecircncio e aquele silecircn-cio me deslumbra Mas uns de-vem falar e outros devem calar Aparece nesta biografia de San-to Afonso a doutrina de que es-te homem tinha uma graccedila es-pecial para conversar

Portanto a conversa pode ser uma graccedila e existe um caris-ma proacuteprio a ela E as conver-sas abenccediloadas satildeo exatamente aquelas nas quais interveacutem este fator sobrenatural

Haacute entretanto um carisma negativo que natildeo vem do Ceacuteu para a ldquoanticonversardquo Estaacute-se numa roda onde se desenvolve uma conversaccedilatildeo muito boa de

repente chega algueacutem senta-se e natildeo diz nada A con-versa morre Creio que vaacuterios experimentaram isso pois eacute de observaccedilatildeo comum

Qual eacute a razatildeo deste fenocircmeno Eacute a accedilatildeo de presenccedila de uma pessoa que pensa em si

Quando o indiviacuteduo entra para uma roda onde a con-versa vai alta mas ele estaacute pensando em si carregan-do um ressentimento uma preocupaccedilatildeo uma ambiccedilatildeo uma preguiccedila e procura fazer com que a conversa tome a orientaccedilatildeo deste seu pensamento em vez de seguir ao sopro da graccedila o tema dominante mdash ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos mdash corta a becircnccedilatildeo da conversa

Qual eacute o carisma da boa conversa Eacute uma forma co-municativa do amor a Deus agrave Santa Igreja a Nossa Se-nhora que extravasa do coraccedilatildeo para a boca de quem fa-la

Temos na vida de Santo Afonso portanto um ponto de nossa doutrina bem firmado a conversa pode ser uma graccedila e quando assim eacute decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora daacute para fazer do conviacutevio das almas um meio para que elas se santifiquem   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 30101967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da referida obra2) Canonizado em 9 de outubro de 1977

ma a ideia de que natildeo sou se-natildeo um gratildeo de areia uma po-eira mas que existe aquilo que eu vou para aquilo que eu me reuacuteno agravequilo e aquilo me acolhe me aceita me envol-ve e eu passo ali a eternidade inteira Confesso que eacute nesta consideraccedilatildeo que a minha al-ma se dilata

Natildeo seraacute talvez assim para outras pessoas Mas haacute vaacuterias moradas no Ceacuteu Que a miseri-coacuterdia me receba nessa morada porque para ela eu sinto uma atraccedilatildeo superlativa

A via do silecircncio e a da conversa

Parece-me haver outro as-pecto que deve ser muito nota-do aqui e eacute o seguinte

Muitos autores espirituais fa-lam do perigo das conversas e da vantagem que haacute em natildeo conversar

Lembro-me de que quando o nosso Movimento es-tava no comeccedilo tiacutenhamos muita dificuldade com cer-tos elementos do clero e do laicato catoacutelico que diziam ldquoVocecircs conversam muito Todas as noites reuacutenem-se para conversar Natildeo era muito melhor que vocecircs to-massem um serviccedilo Por exemplo confeccionem enve-lopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas Cada um faccedila por exemplo cem envelopes por noite isso eacute muito mais abenccediloado do que essas conversasrdquo

Eu era moccedilo naquele tempo natildeo conhecia muitos pontos de doutrina e natildeo sabia defender-me inteiramen-te entatildeo tentava laboriosamente explicar que podia ha-ver maior bem numa conversa do que numa obra de ca-ridade material

ldquoCuidado mdash replicavam eles mdash as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos Mais vale calar do que falar porque o silecircncio eacute ouro e o fa-lar eacute prata Muitos satildeo os homens que nesta hora pade-cem o Inferno porque natildeo retiveram a sua liacutengua Quan-tos estaratildeo no Ceacuteu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietosrdquo

Eacute uma via para muitos mas para muitos outros natildeo eacute Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abenccediloadas

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

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Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

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ccedilatildeo

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

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ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

(CC

30

)

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luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

A beleza da luta - II

O

32

Do alto da Cruz Nosso Senhor teve um consolo ao contemplar misticamente a epopeia das Cruzadas que lutaram pela

libertaccedilatildeo da Terra Santa E ateacute hoje a palavra ldquocruzadordquo evoca nos coraccedilotildees algo de especial luminoso e belo

utro desenho de Gustavo Doreacute representa Ricar-do Coraccedilatildeo de Leatildeo desembarcando com suas tropas em Satildeo Joatildeo drsquoAcre

Vemos uma pequena elevaccedilatildeo de terreno Eacute uma ba-talha em pleno curso natildeo de cavalaria porque esta natildeo podia subir ali Satildeo os soldados de infantaria que atacam Trata-se da bataille melleacutee porque se misturaram os de um lado com os de outro completamente Usando um termo corriqueiro de hoje em dia estatildeo engalfinhados uns nos outros

Anjos de combate que parecem ser feitos de cristal

Os cruzados com risco enor-me da vida estatildeo subindo e re-chaccedilando os inimigos da Feacute Na guerra medieval estar em cima fornecia muita vantagem por-que quem se encontrava por baixo era mais sujeito a gol-pes Ao contraacuterio das guerras de hoje onde quem se afunda numa trincheira tem vantagem Eacute que em nossos dias haacute vanta-gem para quem desce Naque-le tempo havia vantagem para quem subia

O efeito dramaacutetico Gustavo Doreacute obteacutem magnificamente com essas velas altas que pa-recem furar o ceacuteu e o entre-laccedilamento dos homens os ca-toacutelicos defendem a Feacute e os iacutem-pios que natildeo querem aceitar a

Feacute estatildeo querendo matar os catoacutelicos Por detraacutes estaacute um bispo com uma cruz

A gravura seguinte representa uma legiatildeo de Anjos mandada por Maria para socorrer os cruzados

Eu queria chamar a atenccedilatildeo para o senso fino de in-terpretaccedilatildeo de Gustavo Doreacute a propoacutesito desses An-jos Eles parecem feitos de cristal voam como Anjos po-dem voar e vecircm numa revoada gloriosa Poreacutem satildeo An-jos de combate E que quando pousarem vatildeo dizimar os inimigos da Feacute que provavelmente jaacute os viram antes

de eles pousarem e saiacuteram na disparada

Ali vem representado de costas e na primeira filei-ra um cruzado que viu a le-giatildeo celeste e que brandin-do sua espada aclama os An-jos que vatildeo baixando Pen-sem nisso quando estiverem em meio aos castigos previs-tos por Nossa Senhora em Faacute-tima e digam Regina angelo-rum succurre nos1

Consolaccedilatildeo de Nosso Senhor no alto da Cruz

Eis nesta outra cena a ci-dade de Jerusaleacutem com suas muralhas fortiacutessimas e o ata-que que se desenrola Tam-beacutem aqui os guerreiros es-tatildeo aproximando uma das tais torres de madeira quase da altura da grande torre qua-drangular da muralha

Rep

rodu

ccedilatildeo

33

Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

35

seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

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Page 33: Revista Doctor Plinio 211_201510

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Os cruzados escalam as mu-ralhas da cidade subindo por uma escada enquanto os maometanos estatildeo fazendo o possiacutevel para derrubaacute-los Os combatentes cristatildeos querem descer mas vejam a di-ficuldade para saltar por cima dessas lanccedilas e pedrashellip

Isso eacute o caracteriacutestico da guerra medieval os mao-metanos eram censuraacuteveis debaixo de todos os pontos de vista os cruzados eram admiraacuteveis Pois bem mas a guerra se desenvolvia de tal modo que se acaba tendo certo respeito por ambos os lados pela coragem mani-festada pelos contendores

Neste outro lance os cruzados estatildeo entrando e to-mando conta da cidade

Vecirc-se um bispo que caminha debaixo do paacutelio Haacute quanto tempo natildeo se via isto um bispo da Santa Igreja Catoacutelica Apostoacutelica Romana desfilando na cidade onde Nosso Senhor Jesus Cristo morreu Eles entravam can-tando com certeza muacutesicas sacras Eacute a vitoacuteria de Nos-sa Senhora

O bispo parece conduzir o Santiacutessimo Sacramento Ao menos eacute a interpretaccedilatildeo que eu dou

Os cruzados entraram em Jerusaleacutem numa Sexta-Fei-ra Santa agraves trecircs da tarde hora em que Nosso Senhor Je-sus Cristo morreu

O Redentor que conhecia o passado o presente e o futuro do alto da Cruz conheceu isso e teve a consolaccedilatildeo de ver que se os disciacutepulos drsquoEle mdash que estiveram com Ele naquela intimidade do Horto das Oliveiras mdash dormi-ram seacuteculos depois vieram esses heroacuteis que por amor a Ele morreram Isso eacute supremamente belo

Quem natildeo combate o mal atraiccediloa a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo

Este eacute um elemento inte-grante da psicologia do ca-toacutelico O verdadeiro catoacutelico deve saber ser assim

Distingamos contudo en-tre ser e fazer ldquoFazerrdquo seraacute quando Nossa Senhora der as ocasiotildees e que for liacutecito de acordo com a Moral catoacutelica Entretanto devemos ser jaacute Eacute assim que nos preparamos para as lutas da vida

Eacute preciso amar ser assim e pedir a Nossa Senhora noite e dia a graccedila de secirc-lo Entatildeo seremos contrarrevo-lucionaacuterios filhos de Nos-sa Senhora de alma e cor-

po inteirosAlgueacutem poderia preparar sua alma para amar isso

aplicando a esta temaacutetica o meacutetodo loacutegico sugerido por Santo Inaacutecio em seus Exerciacutecios Espirituais

Esta guerra eacute liacutecita Sim e ateacute uma obrigaccedilatildeoO que aconteceraacute se eu natildeo combater Tais conse-

quecircnciasO que aconteceraacute se eu combater Gloacuteria para Nossa

Senhora e tais outras consequecircnciasEu tenho o direito de natildeo querer combater Natildeo por-

que atraiccediloo a Causa de Nosso Senhor Jesus Cristo meu Rei e de Nossa Senhora minha Rainha se eu natildeo cum-prir o meu dever

A pessoa imagina-se entatildeo no dia seguinte jogado num campo de batalha ou levado de volta estropiado Tomou uma pancada na cabeccedila e ficou cego inutilizado portanto Mas contente porque perdeu a visatildeo por amor a Nosso Senhor e a Nossa Senhora e porque a batalha apenas mudou de campo ele teraacute agora um combate in-terior Dia e noite estaraacute em presenccedila da privaccedilatildeo tre-menda a que ficou sujeito por toda a vida

Entretanto dia e noite se recusaraacute a entristecer--se lutaraacute contra a invasatildeo do desacircnimo e diraacute ldquoMeu Deus pelas matildeos de vossa Matildee eu Vos ofereccedilo de no-vo a pancada que sofri Se Voacutes me restituiacutesseis a vista por um milagre e eu tivesse de perdecirc-la novamente por Voacutes de bom grado eu a sacrificariardquo

Quando um homem assim morresse de velho teria vencido mil Cruzadas

Rep

rodu

ccedilatildeo

luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

34

O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

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luzeS da civilizaccedilatildeo criStatilde

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O suaviacutessimo Satildeo Francisco de Sales estimulou uma Cruzada

A vitoacuteria dos europeus sobre os maometanos se con-solidou depois da Batalha de Lepanto Mas jaacute bem antes dela era improvaacutevel que os maometanos conseguissem dominar a Europa Por duas vezes chegaram ateacute as por-tas de Viena e ateacute conseguiram tomar esta cidade mas veio o Rei Joatildeo Sobieski da Polocircnia e expulsou-os res-tituindo Viena ao Imperador

Mas eram invasotildees que natildeo tinham comparaccedilatildeo com aquelas avalanches de muccedilulmanos que invadiram a Eu-ropa no tempo da Reconquista ou por ocasiatildeo de Car-los Martel

Com isso espalhou-se pelo Ocidente um sentimento legiacutetimo de seguranccedila As Cruzadas quebraram o iacutempeto dos povos maometanos

Por outro lado a Europa cresceu muito tornou-se mais rica desenvolveu-se intelectualmente ficou capaz de elaborar taacuteticas de guerra muito mais eficazes De maneira que por efeito da Civilizaccedilatildeo Cristatilde mdash portanto da gra-ccedila de Nosso Senhor Jesus Cristo e das preces de Maria mdash a Europa esta-va gozando de uma explicaacutevel seguran-ccedila Essa seguranccedila era a paz de Cristo no reino de Cristo

Pronunciou-se com is-so uma dulcificaccedilatildeo dos cos-tumes O homem medieval ain-da era muito rude O poacutes-medieval comeccedilou a lutar contra essa rudeza que jaacute natildeo se enquadrava com a doccedilura da vitoacuteria E com isso houve uma insistecircn-cia muito grande nas virtudes doces su-aves E uma insistecircncia menor nas virtudes beacutelicas mili-tares

Entatildeo por exemplo Satildeo Francisco de Sales A Filo-teacuteia a Introduccedilatildeo agrave Vida Devota e outras obras de Satildeo Francisco de Sales satildeo admiraacuteveis de uma doccedilura mara-vilhosa Era jaacute a eacutepoca da douceur de vivre2 que comeccedila-va a invadir a Europa e a coroa de gloacuteria posta na fronte da Europa E isso estava justo

Contudo para se compreender o equiliacutebrio que deve haver nisso eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o seguinte

Satildeo Francisco de Sales era Bispo de Genebra cidade da Suiacuteccedila que naquele tempo constituiacutea o foco de irra-diaccedilatildeo do calvinismo protestante Mas ele natildeo era ape-nas bispo mas tambeacutem o Priacutencipe de Genebra porque pelos estatutos o Bispo de Genebra era de direito o priacutencipe que governava a cidade E Satildeo Francisco de Sa-les foi expulso de Genebra

Tendo obtido o apoio do Duque de Savoacuteia cujas ter-ras eram contiacuteguas a Genebra e de outros nobres da zo-na armou uma Cruzada contra os genebrinos

Quando visitei Genebra um liacuteder catoacutelico mostrou--me a parte da velha muralha precisamente onde os pro-testantes conseguiram derrotar Satildeo Francisco de Sales

Ele o Doutor suaviacutessimo o Doutor boniacutessimo ideou desenvolveu a manobra diplomaacutetica necessaacuteria e estimu-lou que fosse feita uma Cruzada para esse bispo perfeito reconquistar sua diocese na ponta da lanccedila da alabarda

e da espada com mosquetatildeo e tudo o mais Esta era a doccedilura deste Santo

Deformaccedilotildees provocadas pela

rdquoheresia brancardquoMas depois veio a

deformaccedilatildeo da ldquohe-resia brancardquo3 se-gundo a qual sua-vidade correspon-de a entrega a ca-pitulaccedilatildeo diante do

adversaacuterioDou um exemplo

do feitio da piedade ldquoheresia brancardquoO martiacuterio de Satildeo Sebas-

tiatildeo eacute enormemente veneraacutevel Ele era chefe da guarda responsaacutevel

pela seguranccedila do imperador e por-tanto um grande combatente romano O imperador descobrindo que ele ti-nha se tornado catoacutelico ficou indigna-

do e mandou executaacute-lo mediante flechadasEsse homem que era chefe de uma guarniccedilatildeo do exeacuter-

cito que dominava o mundo que tinha conquistado to-da a bacia do Mediterracircneo eacute apresentado por certo es-tilo de iconografia como um mocinho rosadinho com ca-ra de quem estaacute levantando da cama atado a um tronco com uma perninha para frente a outra para o lado co-mo quem estaacute se distraindo em ver os passarinhos voa-rem e cantarem em aacutervores hipoteacuteticas Aquelas flechas parecem natildeo fazecirc-lo sofrer em nada Escorre um pou-

Jean-Pol G

RANDMONT(CC 30)

Vitoacuteria do Rei Joatildeo III Sobieski contra os turcos na batalha de

Viena - Museus Vaticanos

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

Alc

azar

entildeo

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seacuteculos um pouco misteriosamente de maneira que todos ficam com essa ideia da palavra ldquocruzadordquo como queren-do representar alguma coisa luminosa especial bela

Este eacute o legado que com ou sem as deformaccedilotildees sen-timentais posteriores existe no consciente ou no sub-consciente de incontaacuteveis catoacutelicos Por onde se o catoacuteli-co comum eacute posto em confrontaccedilatildeo com uma represen-taccedilatildeo muito viva do heroiacutesmo que se notou nas Cruza-das o cruzado que ldquodormerdquo em sua alma se levanta e uma chama se acende   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1931988)

1) Do latim Rainha dos Anjos socorrei-nos2) Do francecircs doccedilura de viver3) Expressatildeo metafoacuterica criada por Dr Plinio para designar a

mentalidade sentimental que se manifesta na piedade na cultura na arte etc As pessoas por ela afetadas se tornam moles mediacuteocres pouco propensas agrave fortaleza assim como a tudo que signifique esplendor

quinho de sangue mas ele tem ar de quem natildeo estaacute pa-decendo

A ldquoheresia brancardquo tambeacutem natildeo gosta que se fale de Cruzadas

Eu ainda alcancei a eacutepoca em que associaccedilotildees reli-giosas chamavam-se ldquoCruzadasrdquo Entatildeo por exemplo ldquoCruzada Eucariacutestica Infantilrdquo ldquoCruzados do Santiacutessimo Sacramentordquo A palavra ldquoCruzadardquo era usada para cer-tas coisas religiosas Depois isso foi abolido completa-mente

Contudo haacute certas gloacuterias sagradas na Histoacuteria que natildeo se apagam e cujo flash os livros natildeo transmitem mais mas se transmitem de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo por uma espeacutecie de milagre uma eacute a gloacuteria de Carlos Magno ou-tra a das Cruzadas e outras ainda satildeo a gloacuteria do Sacro Impeacuterio Romano Alematildeo da Reconquista espanhola da Reconquista portuguesa que foram Cruzadas na Espa-nha e em Portugal

Essas gloacuterias conservam algo na imaginaccedilatildeo e na Feacute de todas as camadas do povo e isso se transmite ao longo dos

Rep

rodu

ccedilatildeo

Roberto da Normandia na tomada de Antioquia (1097-1098)

HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

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HOraccedilatildeo que move montanhas

aacute uma confianccedila heroica pela qual natildeo desistimos de esperar

apesar de tudo Por vezes essa con-fianccedila faz a alma ldquosangrarrdquo mas ela continua a confiar e diz ldquoA promes-sa interior inefaacutevel que Nossa Se-nhora me fez natildeo falharaacute Confiarei e cumprirei a minha missatildeo Eu con-fio na palavra drsquoElardquo

Qual eacute a palavra da Santiacutessima Virgem Eacute uma voz da graccedila uma apetecircncia que sentimos e que nos leva a todas as virtudes ao amor de Deus A isso nos devemos dar e com base nessa palavra devemos estruturar a nossa confianccedila

A alma assim vence a batalha pois a oraccedilatildeo dela move as montanhas

Eis por que Nossa Senhora soacute reve-lou a Satildeo Pio V a vitoacuteria dos cristatildeos na Batalha de Lepanto depois de ele ter rezado um terccedilo Ela quis mostrar que esta oraccedilatildeo Lhe eacute tatildeo grata e que agrada tanto a Ela pedirmos aquilo de que precisamos por meio da reci-taccedilatildeo do Rosaacuterio que Maria Santiacutes-sima esperou aquela oraccedilatildeo do San-to Pontiacutefice para conceder esse enor-me galardatildeo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 7101975)Santiacutessima Virgem do RosaacuterioAlcaacutezar de San Juan Espanha

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