revista doctor plinio 205_201504

36
Publicação Mensal Ano XVIII - Nº 205 Abril de 2015 A verdadeira glória nasce da dor

Upload: luiz-prestes

Post on 12-Apr-2016

18 views

Category:

Documents


8 download

DESCRIPTION

Revista Doctor Plinio DrPlinio-205_201504

TRANSCRIPT

Page 1: Revista Doctor Plinio 205_201504

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

A verdadeira gloacuteria nasce

da dor

SDe bandido a religioso

2

Satildeo Pedro Armengol na forca sustentado por Nossa Senhora - Museu do Prado Madri Espanha

atildeo Pedro Armengol eacute o modelo da confianccedila Pecador medonho

ele se arrependeu confiou e natildeo soacute foi perdoado mas recebeu uma vocaccedilatildeo religiosa Nossa Senhora chamou o bandido para ser religioso Eacute uma bondade extraordinaacuteria

Nas dificuldades peccedilamos a Satildeo Pedro Armengol a confianccedila e a calma dele certos de que Nossa Senhora resolveraacute tudo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1621988)

Mac

arro

nes

(CC

30

)

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

A verdadeira gloacuteria nasce

da dor

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

INSC - 115227674110

Diretor

Antonio Augusto Lisbocirca Miranda

Conselho Consultivo Antonio Rodrigues Ferreira Carlos Augusto G Picanccedilo

Jorge Eduardo G Koury

Redaccedilatildeo e Administraccedilatildeo Rua Santo Egiacutedio 418

02461-010 S Paulo - SP Tel (11) 2236-1027

E-mail editora_retornareiyahoocombr

Impressatildeo e acabamento Pavagraf Editora Graacutefica Ltda Rua Baratildeo do Serro Largo 296

03335-000 S Paulo - SP Tel (11) 2606-2409

SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

Preccedilos da assinatura anual

Comum R$ 13000Colaborador R$ 18000Propulsor R$ 41500Grande Propulsor R$ 65500Exemplar avulso R$ 1800

Serviccedilo de Atendimento ao Assinante

TelFax (11) 2236-1027

Editorial

4 A verdadeira gloacuteria nasce da dor

dona lucilia

6 Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 Sabedoria e sacralidade - I

dr Plinio comEnta

12 Per lucem ad crucem

a SociEdadE analiSada Por dr Plinio

18 Origem do direito consuetudinaacuterio - I

dE maria nunquam SatiS

22 Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

calEndaacuterio doS SantoS

26 Santos de Abril

Hagiografia

28 Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

aPoacuteStolo do PulcHrum

32 De requinte em requinte

Uacuteltima Paacutegina

36 ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Na capa crucifixo venerado na Igreja de Nossa Senhora do Carmo Caieiras Brasil Ao fundo interior da Sainte-Chapelle Paris Franccedila Foto Timothy Ring e Joe de Souza

A verdadeira gloacuteria nasce da dor

Q

Editorial

uinta-feira Santa apoacutes o jubiloso cacircntico do ldquoGloacuteriardquo os instrumentos emudecem o alegre bimbalhar dos sinos cede lugar aos estalidos das matracas e a cerimocircnia se desenrola numa atmosfera que pressagia a tristeza da alma catoacutelica por ver o Senhor preso flagelado cruci-

ficado morto e por fim sepultadoTerminada a Missa o Santiacutessimo Sacramento eacute conduzido em procissatildeo ao monumento deixando

atraacutes de Si o sacraacuterio vazio e o templo em penumbrasInicia-se o pungente cerimonial do ldquodesnudamento do altarrdquo enquanto o coro entoa o Salmo 22

em cujas palavras introdutoacuterias ouvimos aquele mesmo brado lancinante proferido pelo Redentor do alto da Cruz ldquoMeu Deus meu Deus por que Me abandonasterdquo1

Matildee e Mestra a Igreja escolheu este Salmo para esta cerimocircnia pois nele se medita pro-feticamente natildeo apenas os tormentos da Paixatildeo mas a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Com isso ela imita seu divino Fundador e adoraacutevel Modelo que exalou este brado de verdadeira anguacutestia mas natildeo de desespero pois se trata de uma oraccedilatildeo a Deus seguida pela certeza jubilosa do triunfo final2

Assim no poacutertico da Paixatildeo jaacute se prenuncia a gloacuteria que como pondera Dr Plinio natildeo estaacute ape-nas na vitoacuteria final mas na proacutepria dor padecida de maneira santa e exemplar

Com efeito ao aproximar-se o momento do supremo sacrifiacutecio Jesus declarara ldquoEacute chegada a ho-ra em que seraacute glorificado o Filho do Homem E quando Eu for elevado da terra atrairei todos a Mimrdquo3

Do alto do patiacutebulo como de um puacutelpito alccedilado diante de toda a humanidade a Sabedoria eter-na e encarnada legava assim agrave Histoacuteria este sublime ensinamento ldquoA verdadeira gloacuteria soacute nasce da dorrdquo4

Dr Plinio possuiacutea esta verdade profundamente vincada em sua alma o que o levou a tecer comen-taacuterios como os transcritos a seguir5

Quando a dor chega ao extremo de fazer bradar ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonas-tesrdquo a pessoa em seu interior estaacute sentindo que todas as dores possiacuteveis desabaram sobre ela e pa-dece a plenitude do sofrimento em todo o seu corpo e em sua alma natildeo haacute nada que natildeo seja dor ela toda natildeo eacute senatildeo dor Entatildeo clama ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonastesrdquo como quem diz ldquoEu esperava de Voacutes oacute Deus um pequeno auxiacutelio que fosse mas vejo que esse auxiacutelio natildeo vem porque de todo lado onde o adversaacuterio poderia me ferir ele me feriu de todos os lados onde pode-

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

ria me humilhar ele humilhou e fez com que eu bebesse inteiro o caacutelice amargo da dor Vosso am-paro onde esteve oacute Deusrdquo

Tatildeo traacutegica situaccedilatildeo manifesta uma beleza especial que eacute o pulchrum fascinante do sacrifiacutecio do holocausto da dor da derrota da humilhaccedilatildeo que a pessoa sofre ateacute o fim resignada e conforme o caso ateacute entusiasmada por ver que se verifica assim um princiacutepio da ordem do universo com o pe-cado original a dor e ateacute mesmo a cataacutestrofe tornaram-se uma imposiccedilatildeo

A Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo toma neste sentido uma perspectiva extraordinaacuteria Aquele que era o Inocente e o Perfeito por excelecircncia ao ser assassinado por ter feito o bem daacute explicaccedilatildeo e significado agrave Histoacuteria Assim quando lemos a narraccedilatildeo da Paixatildeo no primei-ro momento pensamos ldquoComo aconteceu como fizeram issordquo Mas depois de levar a leitura ateacute o ldquoConsummatum estrdquo6 fechamos a Biacuteblia e dizemos ldquoQue coisa ordenada Que extraordi-naacuterio Que bonitordquo

Deste modo tambeacutem o homem deve considerar todo o sofrimento que ele carrega nesta Terra Quer dizer se insere numa ordem que eacute mais bela do que a vitoacuteria debaixo do seguin-te ponto de vista a beleza especiacutefica do martiacuterio que eacute a renuacutencia agrave vida por onde morrer a favor de um ideal torna-se mais belo do que triunfar com ele De maneira que para a gloacuteria de Deus era melhor que o Filho do Homem fosse morto Vemos nisso o pulchrum do sofri-mento e da derrota

Por isso quando reflito sobre a gloacuteria penso mais nos heroacuteis que estatildeo resistindo ateacute o uacuteltimo ponto a uma ofensiva inimaginaacutevel do que no desfile depois de terem vencido Porque quando o heroacutei estaacute nesta posiccedilatildeo a alianccedila dele com Deus eacute muito mais evidente e a presenccedila deste pul-

chrum em sua alma eacute muito mais clara do que na hora da vitoacuteria Daiacute o fato de que ao longo de to-da a Histoacuteria almas de escol se comprouveram em analisar descrever e valorizar de modo especial como sendo as culminacircncias da vida os episoacutedios traacutegicos

Nesta perspectiva ateacute no Ceacuteu onde se diria que a dor natildeo tem mais papel ela encontra seu signi-ficado ela se reverte em gloacuteria mas natildeo eacute apenas a gloacuteria da vitoacuteria mas a gloacuteria da dor

Natildeo eacute verdade que sem isso o Ceacuteu seria menos bonito E se a dor adorna o Ceacuteu haacute de adornar tambeacutem a ordem terrena

1) Mt 27 462) Cf Biacuteblia de Jerusaleacutem Satildeo Paulo Paulus 2013 p 1756 b3) Jo 12 23 324) Tiacutetulo de um artigo de Dr Plinio publicado em Catolicismo n 78 ndash Junho de 19575) Cf conferecircncias de 1371980 e 10219906) Do latim estaacute consumado (Jo 19 30)

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 2: Revista Doctor Plinio 205_201504

SDe bandido a religioso

2

Satildeo Pedro Armengol na forca sustentado por Nossa Senhora - Museu do Prado Madri Espanha

atildeo Pedro Armengol eacute o modelo da confianccedila Pecador medonho

ele se arrependeu confiou e natildeo soacute foi perdoado mas recebeu uma vocaccedilatildeo religiosa Nossa Senhora chamou o bandido para ser religioso Eacute uma bondade extraordinaacuteria

Nas dificuldades peccedilamos a Satildeo Pedro Armengol a confianccedila e a calma dele certos de que Nossa Senhora resolveraacute tudo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1621988)

Mac

arro

nes

(CC

30

)

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

A verdadeira gloacuteria nasce

da dor

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

INSC - 115227674110

Diretor

Antonio Augusto Lisbocirca Miranda

Conselho Consultivo Antonio Rodrigues Ferreira Carlos Augusto G Picanccedilo

Jorge Eduardo G Koury

Redaccedilatildeo e Administraccedilatildeo Rua Santo Egiacutedio 418

02461-010 S Paulo - SP Tel (11) 2236-1027

E-mail editora_retornareiyahoocombr

Impressatildeo e acabamento Pavagraf Editora Graacutefica Ltda Rua Baratildeo do Serro Largo 296

03335-000 S Paulo - SP Tel (11) 2606-2409

SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

Preccedilos da assinatura anual

Comum R$ 13000Colaborador R$ 18000Propulsor R$ 41500Grande Propulsor R$ 65500Exemplar avulso R$ 1800

Serviccedilo de Atendimento ao Assinante

TelFax (11) 2236-1027

Editorial

4 A verdadeira gloacuteria nasce da dor

dona lucilia

6 Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 Sabedoria e sacralidade - I

dr Plinio comEnta

12 Per lucem ad crucem

a SociEdadE analiSada Por dr Plinio

18 Origem do direito consuetudinaacuterio - I

dE maria nunquam SatiS

22 Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

calEndaacuterio doS SantoS

26 Santos de Abril

Hagiografia

28 Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

aPoacuteStolo do PulcHrum

32 De requinte em requinte

Uacuteltima Paacutegina

36 ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Na capa crucifixo venerado na Igreja de Nossa Senhora do Carmo Caieiras Brasil Ao fundo interior da Sainte-Chapelle Paris Franccedila Foto Timothy Ring e Joe de Souza

A verdadeira gloacuteria nasce da dor

Q

Editorial

uinta-feira Santa apoacutes o jubiloso cacircntico do ldquoGloacuteriardquo os instrumentos emudecem o alegre bimbalhar dos sinos cede lugar aos estalidos das matracas e a cerimocircnia se desenrola numa atmosfera que pressagia a tristeza da alma catoacutelica por ver o Senhor preso flagelado cruci-

ficado morto e por fim sepultadoTerminada a Missa o Santiacutessimo Sacramento eacute conduzido em procissatildeo ao monumento deixando

atraacutes de Si o sacraacuterio vazio e o templo em penumbrasInicia-se o pungente cerimonial do ldquodesnudamento do altarrdquo enquanto o coro entoa o Salmo 22

em cujas palavras introdutoacuterias ouvimos aquele mesmo brado lancinante proferido pelo Redentor do alto da Cruz ldquoMeu Deus meu Deus por que Me abandonasterdquo1

Matildee e Mestra a Igreja escolheu este Salmo para esta cerimocircnia pois nele se medita pro-feticamente natildeo apenas os tormentos da Paixatildeo mas a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Com isso ela imita seu divino Fundador e adoraacutevel Modelo que exalou este brado de verdadeira anguacutestia mas natildeo de desespero pois se trata de uma oraccedilatildeo a Deus seguida pela certeza jubilosa do triunfo final2

Assim no poacutertico da Paixatildeo jaacute se prenuncia a gloacuteria que como pondera Dr Plinio natildeo estaacute ape-nas na vitoacuteria final mas na proacutepria dor padecida de maneira santa e exemplar

Com efeito ao aproximar-se o momento do supremo sacrifiacutecio Jesus declarara ldquoEacute chegada a ho-ra em que seraacute glorificado o Filho do Homem E quando Eu for elevado da terra atrairei todos a Mimrdquo3

Do alto do patiacutebulo como de um puacutelpito alccedilado diante de toda a humanidade a Sabedoria eter-na e encarnada legava assim agrave Histoacuteria este sublime ensinamento ldquoA verdadeira gloacuteria soacute nasce da dorrdquo4

Dr Plinio possuiacutea esta verdade profundamente vincada em sua alma o que o levou a tecer comen-taacuterios como os transcritos a seguir5

Quando a dor chega ao extremo de fazer bradar ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonas-tesrdquo a pessoa em seu interior estaacute sentindo que todas as dores possiacuteveis desabaram sobre ela e pa-dece a plenitude do sofrimento em todo o seu corpo e em sua alma natildeo haacute nada que natildeo seja dor ela toda natildeo eacute senatildeo dor Entatildeo clama ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonastesrdquo como quem diz ldquoEu esperava de Voacutes oacute Deus um pequeno auxiacutelio que fosse mas vejo que esse auxiacutelio natildeo vem porque de todo lado onde o adversaacuterio poderia me ferir ele me feriu de todos os lados onde pode-

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

ria me humilhar ele humilhou e fez com que eu bebesse inteiro o caacutelice amargo da dor Vosso am-paro onde esteve oacute Deusrdquo

Tatildeo traacutegica situaccedilatildeo manifesta uma beleza especial que eacute o pulchrum fascinante do sacrifiacutecio do holocausto da dor da derrota da humilhaccedilatildeo que a pessoa sofre ateacute o fim resignada e conforme o caso ateacute entusiasmada por ver que se verifica assim um princiacutepio da ordem do universo com o pe-cado original a dor e ateacute mesmo a cataacutestrofe tornaram-se uma imposiccedilatildeo

A Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo toma neste sentido uma perspectiva extraordinaacuteria Aquele que era o Inocente e o Perfeito por excelecircncia ao ser assassinado por ter feito o bem daacute explicaccedilatildeo e significado agrave Histoacuteria Assim quando lemos a narraccedilatildeo da Paixatildeo no primei-ro momento pensamos ldquoComo aconteceu como fizeram issordquo Mas depois de levar a leitura ateacute o ldquoConsummatum estrdquo6 fechamos a Biacuteblia e dizemos ldquoQue coisa ordenada Que extraordi-naacuterio Que bonitordquo

Deste modo tambeacutem o homem deve considerar todo o sofrimento que ele carrega nesta Terra Quer dizer se insere numa ordem que eacute mais bela do que a vitoacuteria debaixo do seguin-te ponto de vista a beleza especiacutefica do martiacuterio que eacute a renuacutencia agrave vida por onde morrer a favor de um ideal torna-se mais belo do que triunfar com ele De maneira que para a gloacuteria de Deus era melhor que o Filho do Homem fosse morto Vemos nisso o pulchrum do sofri-mento e da derrota

Por isso quando reflito sobre a gloacuteria penso mais nos heroacuteis que estatildeo resistindo ateacute o uacuteltimo ponto a uma ofensiva inimaginaacutevel do que no desfile depois de terem vencido Porque quando o heroacutei estaacute nesta posiccedilatildeo a alianccedila dele com Deus eacute muito mais evidente e a presenccedila deste pul-

chrum em sua alma eacute muito mais clara do que na hora da vitoacuteria Daiacute o fato de que ao longo de to-da a Histoacuteria almas de escol se comprouveram em analisar descrever e valorizar de modo especial como sendo as culminacircncias da vida os episoacutedios traacutegicos

Nesta perspectiva ateacute no Ceacuteu onde se diria que a dor natildeo tem mais papel ela encontra seu signi-ficado ela se reverte em gloacuteria mas natildeo eacute apenas a gloacuteria da vitoacuteria mas a gloacuteria da dor

Natildeo eacute verdade que sem isso o Ceacuteu seria menos bonito E se a dor adorna o Ceacuteu haacute de adornar tambeacutem a ordem terrena

1) Mt 27 462) Cf Biacuteblia de Jerusaleacutem Satildeo Paulo Paulus 2013 p 1756 b3) Jo 12 23 324) Tiacutetulo de um artigo de Dr Plinio publicado em Catolicismo n 78 ndash Junho de 19575) Cf conferecircncias de 1371980 e 10219906) Do latim estaacute consumado (Jo 19 30)

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 3: Revista Doctor Plinio 205_201504

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

A verdadeira gloacuteria nasce

da dor

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

INSC - 115227674110

Diretor

Antonio Augusto Lisbocirca Miranda

Conselho Consultivo Antonio Rodrigues Ferreira Carlos Augusto G Picanccedilo

Jorge Eduardo G Koury

Redaccedilatildeo e Administraccedilatildeo Rua Santo Egiacutedio 418

02461-010 S Paulo - SP Tel (11) 2236-1027

E-mail editora_retornareiyahoocombr

Impressatildeo e acabamento Pavagraf Editora Graacutefica Ltda Rua Baratildeo do Serro Largo 296

03335-000 S Paulo - SP Tel (11) 2606-2409

SumaacuterioSumaacuterioAno XVIII - Nordm 205 Abril de 2015

Preccedilos da assinatura anual

Comum R$ 13000Colaborador R$ 18000Propulsor R$ 41500Grande Propulsor R$ 65500Exemplar avulso R$ 1800

Serviccedilo de Atendimento ao Assinante

TelFax (11) 2236-1027

Editorial

4 A verdadeira gloacuteria nasce da dor

dona lucilia

6 Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

Sagrado coraccedilatildeo dE JESuS

8 Sabedoria e sacralidade - I

dr Plinio comEnta

12 Per lucem ad crucem

a SociEdadE analiSada Por dr Plinio

18 Origem do direito consuetudinaacuterio - I

dE maria nunquam SatiS

22 Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

calEndaacuterio doS SantoS

26 Santos de Abril

Hagiografia

28 Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

aPoacuteStolo do PulcHrum

32 De requinte em requinte

Uacuteltima Paacutegina

36 ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Na capa crucifixo venerado na Igreja de Nossa Senhora do Carmo Caieiras Brasil Ao fundo interior da Sainte-Chapelle Paris Franccedila Foto Timothy Ring e Joe de Souza

A verdadeira gloacuteria nasce da dor

Q

Editorial

uinta-feira Santa apoacutes o jubiloso cacircntico do ldquoGloacuteriardquo os instrumentos emudecem o alegre bimbalhar dos sinos cede lugar aos estalidos das matracas e a cerimocircnia se desenrola numa atmosfera que pressagia a tristeza da alma catoacutelica por ver o Senhor preso flagelado cruci-

ficado morto e por fim sepultadoTerminada a Missa o Santiacutessimo Sacramento eacute conduzido em procissatildeo ao monumento deixando

atraacutes de Si o sacraacuterio vazio e o templo em penumbrasInicia-se o pungente cerimonial do ldquodesnudamento do altarrdquo enquanto o coro entoa o Salmo 22

em cujas palavras introdutoacuterias ouvimos aquele mesmo brado lancinante proferido pelo Redentor do alto da Cruz ldquoMeu Deus meu Deus por que Me abandonasterdquo1

Matildee e Mestra a Igreja escolheu este Salmo para esta cerimocircnia pois nele se medita pro-feticamente natildeo apenas os tormentos da Paixatildeo mas a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Com isso ela imita seu divino Fundador e adoraacutevel Modelo que exalou este brado de verdadeira anguacutestia mas natildeo de desespero pois se trata de uma oraccedilatildeo a Deus seguida pela certeza jubilosa do triunfo final2

Assim no poacutertico da Paixatildeo jaacute se prenuncia a gloacuteria que como pondera Dr Plinio natildeo estaacute ape-nas na vitoacuteria final mas na proacutepria dor padecida de maneira santa e exemplar

Com efeito ao aproximar-se o momento do supremo sacrifiacutecio Jesus declarara ldquoEacute chegada a ho-ra em que seraacute glorificado o Filho do Homem E quando Eu for elevado da terra atrairei todos a Mimrdquo3

Do alto do patiacutebulo como de um puacutelpito alccedilado diante de toda a humanidade a Sabedoria eter-na e encarnada legava assim agrave Histoacuteria este sublime ensinamento ldquoA verdadeira gloacuteria soacute nasce da dorrdquo4

Dr Plinio possuiacutea esta verdade profundamente vincada em sua alma o que o levou a tecer comen-taacuterios como os transcritos a seguir5

Quando a dor chega ao extremo de fazer bradar ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonas-tesrdquo a pessoa em seu interior estaacute sentindo que todas as dores possiacuteveis desabaram sobre ela e pa-dece a plenitude do sofrimento em todo o seu corpo e em sua alma natildeo haacute nada que natildeo seja dor ela toda natildeo eacute senatildeo dor Entatildeo clama ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonastesrdquo como quem diz ldquoEu esperava de Voacutes oacute Deus um pequeno auxiacutelio que fosse mas vejo que esse auxiacutelio natildeo vem porque de todo lado onde o adversaacuterio poderia me ferir ele me feriu de todos os lados onde pode-

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

ria me humilhar ele humilhou e fez com que eu bebesse inteiro o caacutelice amargo da dor Vosso am-paro onde esteve oacute Deusrdquo

Tatildeo traacutegica situaccedilatildeo manifesta uma beleza especial que eacute o pulchrum fascinante do sacrifiacutecio do holocausto da dor da derrota da humilhaccedilatildeo que a pessoa sofre ateacute o fim resignada e conforme o caso ateacute entusiasmada por ver que se verifica assim um princiacutepio da ordem do universo com o pe-cado original a dor e ateacute mesmo a cataacutestrofe tornaram-se uma imposiccedilatildeo

A Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo toma neste sentido uma perspectiva extraordinaacuteria Aquele que era o Inocente e o Perfeito por excelecircncia ao ser assassinado por ter feito o bem daacute explicaccedilatildeo e significado agrave Histoacuteria Assim quando lemos a narraccedilatildeo da Paixatildeo no primei-ro momento pensamos ldquoComo aconteceu como fizeram issordquo Mas depois de levar a leitura ateacute o ldquoConsummatum estrdquo6 fechamos a Biacuteblia e dizemos ldquoQue coisa ordenada Que extraordi-naacuterio Que bonitordquo

Deste modo tambeacutem o homem deve considerar todo o sofrimento que ele carrega nesta Terra Quer dizer se insere numa ordem que eacute mais bela do que a vitoacuteria debaixo do seguin-te ponto de vista a beleza especiacutefica do martiacuterio que eacute a renuacutencia agrave vida por onde morrer a favor de um ideal torna-se mais belo do que triunfar com ele De maneira que para a gloacuteria de Deus era melhor que o Filho do Homem fosse morto Vemos nisso o pulchrum do sofri-mento e da derrota

Por isso quando reflito sobre a gloacuteria penso mais nos heroacuteis que estatildeo resistindo ateacute o uacuteltimo ponto a uma ofensiva inimaginaacutevel do que no desfile depois de terem vencido Porque quando o heroacutei estaacute nesta posiccedilatildeo a alianccedila dele com Deus eacute muito mais evidente e a presenccedila deste pul-

chrum em sua alma eacute muito mais clara do que na hora da vitoacuteria Daiacute o fato de que ao longo de to-da a Histoacuteria almas de escol se comprouveram em analisar descrever e valorizar de modo especial como sendo as culminacircncias da vida os episoacutedios traacutegicos

Nesta perspectiva ateacute no Ceacuteu onde se diria que a dor natildeo tem mais papel ela encontra seu signi-ficado ela se reverte em gloacuteria mas natildeo eacute apenas a gloacuteria da vitoacuteria mas a gloacuteria da dor

Natildeo eacute verdade que sem isso o Ceacuteu seria menos bonito E se a dor adorna o Ceacuteu haacute de adornar tambeacutem a ordem terrena

1) Mt 27 462) Cf Biacuteblia de Jerusaleacutem Satildeo Paulo Paulus 2013 p 1756 b3) Jo 12 23 324) Tiacutetulo de um artigo de Dr Plinio publicado em Catolicismo n 78 ndash Junho de 19575) Cf conferecircncias de 1371980 e 10219906) Do latim estaacute consumado (Jo 19 30)

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 4: Revista Doctor Plinio 205_201504

A verdadeira gloacuteria nasce da dor

Q

Editorial

uinta-feira Santa apoacutes o jubiloso cacircntico do ldquoGloacuteriardquo os instrumentos emudecem o alegre bimbalhar dos sinos cede lugar aos estalidos das matracas e a cerimocircnia se desenrola numa atmosfera que pressagia a tristeza da alma catoacutelica por ver o Senhor preso flagelado cruci-

ficado morto e por fim sepultadoTerminada a Missa o Santiacutessimo Sacramento eacute conduzido em procissatildeo ao monumento deixando

atraacutes de Si o sacraacuterio vazio e o templo em penumbrasInicia-se o pungente cerimonial do ldquodesnudamento do altarrdquo enquanto o coro entoa o Salmo 22

em cujas palavras introdutoacuterias ouvimos aquele mesmo brado lancinante proferido pelo Redentor do alto da Cruz ldquoMeu Deus meu Deus por que Me abandonasterdquo1

Matildee e Mestra a Igreja escolheu este Salmo para esta cerimocircnia pois nele se medita pro-feticamente natildeo apenas os tormentos da Paixatildeo mas a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Com isso ela imita seu divino Fundador e adoraacutevel Modelo que exalou este brado de verdadeira anguacutestia mas natildeo de desespero pois se trata de uma oraccedilatildeo a Deus seguida pela certeza jubilosa do triunfo final2

Assim no poacutertico da Paixatildeo jaacute se prenuncia a gloacuteria que como pondera Dr Plinio natildeo estaacute ape-nas na vitoacuteria final mas na proacutepria dor padecida de maneira santa e exemplar

Com efeito ao aproximar-se o momento do supremo sacrifiacutecio Jesus declarara ldquoEacute chegada a ho-ra em que seraacute glorificado o Filho do Homem E quando Eu for elevado da terra atrairei todos a Mimrdquo3

Do alto do patiacutebulo como de um puacutelpito alccedilado diante de toda a humanidade a Sabedoria eter-na e encarnada legava assim agrave Histoacuteria este sublime ensinamento ldquoA verdadeira gloacuteria soacute nasce da dorrdquo4

Dr Plinio possuiacutea esta verdade profundamente vincada em sua alma o que o levou a tecer comen-taacuterios como os transcritos a seguir5

Quando a dor chega ao extremo de fazer bradar ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonas-tesrdquo a pessoa em seu interior estaacute sentindo que todas as dores possiacuteveis desabaram sobre ela e pa-dece a plenitude do sofrimento em todo o seu corpo e em sua alma natildeo haacute nada que natildeo seja dor ela toda natildeo eacute senatildeo dor Entatildeo clama ldquomeu Deus meu Deus por que me abandonastesrdquo como quem diz ldquoEu esperava de Voacutes oacute Deus um pequeno auxiacutelio que fosse mas vejo que esse auxiacutelio natildeo vem porque de todo lado onde o adversaacuterio poderia me ferir ele me feriu de todos os lados onde pode-

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

ria me humilhar ele humilhou e fez com que eu bebesse inteiro o caacutelice amargo da dor Vosso am-paro onde esteve oacute Deusrdquo

Tatildeo traacutegica situaccedilatildeo manifesta uma beleza especial que eacute o pulchrum fascinante do sacrifiacutecio do holocausto da dor da derrota da humilhaccedilatildeo que a pessoa sofre ateacute o fim resignada e conforme o caso ateacute entusiasmada por ver que se verifica assim um princiacutepio da ordem do universo com o pe-cado original a dor e ateacute mesmo a cataacutestrofe tornaram-se uma imposiccedilatildeo

A Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo toma neste sentido uma perspectiva extraordinaacuteria Aquele que era o Inocente e o Perfeito por excelecircncia ao ser assassinado por ter feito o bem daacute explicaccedilatildeo e significado agrave Histoacuteria Assim quando lemos a narraccedilatildeo da Paixatildeo no primei-ro momento pensamos ldquoComo aconteceu como fizeram issordquo Mas depois de levar a leitura ateacute o ldquoConsummatum estrdquo6 fechamos a Biacuteblia e dizemos ldquoQue coisa ordenada Que extraordi-naacuterio Que bonitordquo

Deste modo tambeacutem o homem deve considerar todo o sofrimento que ele carrega nesta Terra Quer dizer se insere numa ordem que eacute mais bela do que a vitoacuteria debaixo do seguin-te ponto de vista a beleza especiacutefica do martiacuterio que eacute a renuacutencia agrave vida por onde morrer a favor de um ideal torna-se mais belo do que triunfar com ele De maneira que para a gloacuteria de Deus era melhor que o Filho do Homem fosse morto Vemos nisso o pulchrum do sofri-mento e da derrota

Por isso quando reflito sobre a gloacuteria penso mais nos heroacuteis que estatildeo resistindo ateacute o uacuteltimo ponto a uma ofensiva inimaginaacutevel do que no desfile depois de terem vencido Porque quando o heroacutei estaacute nesta posiccedilatildeo a alianccedila dele com Deus eacute muito mais evidente e a presenccedila deste pul-

chrum em sua alma eacute muito mais clara do que na hora da vitoacuteria Daiacute o fato de que ao longo de to-da a Histoacuteria almas de escol se comprouveram em analisar descrever e valorizar de modo especial como sendo as culminacircncias da vida os episoacutedios traacutegicos

Nesta perspectiva ateacute no Ceacuteu onde se diria que a dor natildeo tem mais papel ela encontra seu signi-ficado ela se reverte em gloacuteria mas natildeo eacute apenas a gloacuteria da vitoacuteria mas a gloacuteria da dor

Natildeo eacute verdade que sem isso o Ceacuteu seria menos bonito E se a dor adorna o Ceacuteu haacute de adornar tambeacutem a ordem terrena

1) Mt 27 462) Cf Biacuteblia de Jerusaleacutem Satildeo Paulo Paulus 2013 p 1756 b3) Jo 12 23 324) Tiacutetulo de um artigo de Dr Plinio publicado em Catolicismo n 78 ndash Junho de 19575) Cf conferecircncias de 1371980 e 10219906) Do latim estaacute consumado (Jo 19 30)

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 5: Revista Doctor Plinio 205_201504

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

ria me humilhar ele humilhou e fez com que eu bebesse inteiro o caacutelice amargo da dor Vosso am-paro onde esteve oacute Deusrdquo

Tatildeo traacutegica situaccedilatildeo manifesta uma beleza especial que eacute o pulchrum fascinante do sacrifiacutecio do holocausto da dor da derrota da humilhaccedilatildeo que a pessoa sofre ateacute o fim resignada e conforme o caso ateacute entusiasmada por ver que se verifica assim um princiacutepio da ordem do universo com o pe-cado original a dor e ateacute mesmo a cataacutestrofe tornaram-se uma imposiccedilatildeo

A Paixatildeo de Nosso Senhor Jesus Cristo toma neste sentido uma perspectiva extraordinaacuteria Aquele que era o Inocente e o Perfeito por excelecircncia ao ser assassinado por ter feito o bem daacute explicaccedilatildeo e significado agrave Histoacuteria Assim quando lemos a narraccedilatildeo da Paixatildeo no primei-ro momento pensamos ldquoComo aconteceu como fizeram issordquo Mas depois de levar a leitura ateacute o ldquoConsummatum estrdquo6 fechamos a Biacuteblia e dizemos ldquoQue coisa ordenada Que extraordi-naacuterio Que bonitordquo

Deste modo tambeacutem o homem deve considerar todo o sofrimento que ele carrega nesta Terra Quer dizer se insere numa ordem que eacute mais bela do que a vitoacuteria debaixo do seguin-te ponto de vista a beleza especiacutefica do martiacuterio que eacute a renuacutencia agrave vida por onde morrer a favor de um ideal torna-se mais belo do que triunfar com ele De maneira que para a gloacuteria de Deus era melhor que o Filho do Homem fosse morto Vemos nisso o pulchrum do sofri-mento e da derrota

Por isso quando reflito sobre a gloacuteria penso mais nos heroacuteis que estatildeo resistindo ateacute o uacuteltimo ponto a uma ofensiva inimaginaacutevel do que no desfile depois de terem vencido Porque quando o heroacutei estaacute nesta posiccedilatildeo a alianccedila dele com Deus eacute muito mais evidente e a presenccedila deste pul-

chrum em sua alma eacute muito mais clara do que na hora da vitoacuteria Daiacute o fato de que ao longo de to-da a Histoacuteria almas de escol se comprouveram em analisar descrever e valorizar de modo especial como sendo as culminacircncias da vida os episoacutedios traacutegicos

Nesta perspectiva ateacute no Ceacuteu onde se diria que a dor natildeo tem mais papel ela encontra seu signi-ficado ela se reverte em gloacuteria mas natildeo eacute apenas a gloacuteria da vitoacuteria mas a gloacuteria da dor

Natildeo eacute verdade que sem isso o Ceacuteu seria menos bonito E se a dor adorna o Ceacuteu haacute de adornar tambeacutem a ordem terrena

1) Mt 27 462) Cf Biacuteblia de Jerusaleacutem Satildeo Paulo Paulus 2013 p 1756 b3) Jo 12 23 324) Tiacutetulo de um artigo de Dr Plinio publicado em Catolicismo n 78 ndash Junho de 19575) Cf conferecircncias de 1371980 e 10219906) Do latim estaacute consumado (Jo 19 30)

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 6: Revista Doctor Plinio 205_201504

Q

Incoacutelume tabernaacuteculo interior - I

6

Dona LuciLia

Ser

gio

Hol

lman

n

A serenidade e a seguranccedila que tanto caracterizavam Dona Lucilia e que ela difundia tatildeo prodigamente em torno de si vinham-lhe de um tabernaacuteculo interior que os vagalhotildees da

vida natildeo conseguiram atingir

uando algueacutem recebe um toque da graccedila vinda do Ceacuteu e sente uma espeacutecie de gloacuteria que o cerca o ilumina eacute envolvido de uma tranquilidade uma

serenidade esplecircndida uma seguranccedila magniacutefica e de um gaacuteudio em que natildeo entra em jogo a vidinha de todos os dias nem o ldquovidatildeordquo do dia da gloacuteria Eacute uma espeacutecie de participaccedilatildeo da honra que Deus fa-raacute ao indiviacuteduo quando ele entrar no Ceacuteu que eacute uma coisa uacutenica

Em todo homem haacute duas histoacuterias a interna e a externa

Todos noacutes mais ou menos tive-mos ocasiatildeo numa circunstacircncia ou noutra da vida de experimentar uma consolaccedilatildeo especial na qual entre outras coisas sentimos to-do o nosso ser honrado dignifica-do e elevado por esse contato com Deus Perto disso todas as gloacuterias terrestres de fato natildeo satildeo nada natildeo valem nada natildeo contam para nada

Em geral as pessoas com ver-dadeira vida interior tecircm em rela-ccedilatildeo a esta vida terrena uma posi-ccedilatildeo assim elas podem dizer que a vida natildeo vale nada em certo senti-do vanitas vanitatum et omnia va-nitas1 ou ldquotudo eacute vaidade e afliccedilatildeo do espiacuteritordquo2 mdash expressotildees lindiacutes-simas aliaacutes

Entretanto em outro sentido natildeo eacute tanto assim Por exemplo Joacute recebeu um precircmio na Terra que foi o de ter muito mais depois da prova do que a enormidade que ele recebera antes dela Ademais viveu muitos anos e mdash coisa muito pouco moderna e por isso mesmo muito ver-dadeira e bela mdash teve uma grande quantidade de filhos

Apoacutes perder todos os filhos ter uma grande quantidade de filhos era ainda uma grande gloacuteria

Esta vida portanto tem o seu valor e o verdadeiro catoacutelico com-preende esse valor

Mas haacute duas coisas que se fun-dem e estatildeo por cima disso Uma eacute a histoacuteria externa do indiviacuteduo aconteceu isso fez aquilo etc Ou-tra eacute a histoacuteria interna aquilo por onde ele passou de grande de pe-queno de glorioso de insignifican-te toda a histoacuteria de sua alma com as cicatrizes que o sofrimento dei-xou nela e que preparam esta per-gunta Em funccedilatildeo do meu passa-do como seraacute o meu futuro e co-mo terminaraacute para mim esta vida

Eacute uma indagaccedilatildeo muito impor-tante e que o homem cozinha so-zinho consigo porque ela eacute inco-municaacutevel Eacute tatildeo iacutentima tatildeo inter-na que eu acho que a maior parte das pessoas nem saberia como di-zer para outro o que leva dentro de sua menteJoacute - Catedral de Pamplona Espanha

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 7: Revista Doctor Plinio 205_201504

7

Ale

xand

er K

link

(CC

30

)

Arq

uivo

Rev

istaComo os rochedos

batidos pelas ondas

Se a pessoa internamente jul-ga ter levado ou estar levando bem sua vida e que esta corre segundo a loacutegica das coisas ainda que os outros achem que natildeo ela tem uma seguran-ccedila uma calma interna e uma noccedilatildeo de gloacuteria interior as quais vecircm da consciecircn-cia tranquila que constitui um elemento dis-tinto da vida externa e daacute para a pessoa uma cal-ma muito grande em razatildeo exatamente do bem articula-do de tudo aquilo que ela fez

Quando natildeo agiu bem tem a calma da contriccedilatildeo do perdatildeo recebido e da vida consertada E portanto a pes-soa vai andando pois tendo sido perdoada eacute amada por Deus Essa sensaccedilatildeo de ser amado por Deus proporcio-na uma convicccedilatildeo ultrarreconfortante e o indiviacuteduo po-de receber os piores vagalhotildees da vida que ele natildeo eacute atingido no seu tabernaacuteculo interior E o fato de natildeo ser atingido nesse tabernaacuteculo lhe daacute uma calma que pode coincidir com todas as agonias e todas as anguacutestias

Essa calma natildeo existe na pessoa que tem seu proacuteprio tabernaacuteculo interior devastado ou que nem o possui Eacute tatildeo sem reflexatildeo sobre sua vida tatildeo sem histoacuteria proacutepria que eacute como uma corticcedila levada pelas ondas

A noccedilatildeo da histoacuteria interior e da satisfaccedilatildeo que essa histoacuteria pode dar eacute possiacutevel perceber eminentemente em uma pessoa mesmo quando vagalhotildees enormes se solta-ram sobre ela Exatamente quando chega a hora do va-galhatildeo baixar a sensaccedilatildeo de que o tabernaacuteculo interno ficou intacto se manifesta Essa sensaccedilatildeo bem como a de

que o vagalhatildeo foi inuacutetil daacute uma seguranccedila que eacute meio parecida com a dos rochedos batidos pelas ondas vem o mar com aqueles furores e lanccedila ondas que podem dar respingos que chegam ateacute o alto do rochedo mas este natildeo se move Quando o mar se retira o rochedo estaacute ali

Morte de Dona Gabriela

Dona Lucilia era inteiramente assim nas ocasiotildees mais aflitivas Lembro-me de quando ela perdeu a matildee3 a quem ela queria respeitava e venerava muitiacutessimo Um

fatinho pode dar ideia de ateacute onde ela levava issoA casa em que moraacutevamos era dessas re-sidecircncias de antigamente teacuterreas e enor-

mes E a distacircncia entre o quarto de dor-mir dela e o da matildee era grande Minha

avoacute tinha uma espeacutecie de governanta de casa muito boa dedicada correta que dormia ao seu lado De manei-ra que qualquer coisa que minha avoacute quisesse essa mulher atendia Ela estava inteiramente bem atendida

Minha matildee mandou puxar um cordatildeo eleacutetrico com campainha da cama de minha avoacute ateacute a cama de-

la porque a matildee dela estava velha e no caso de urgecircncia podia levar certo

tempo de a tal governanta chegar ateacute o quarto de mamatildee e ela queria tocando a

campainha ir correndo atender minha avoacuteQuando a matildee dela morreu fizeram-se as exeacute-

quias e compareceu muita gente Cumprimenta um re-cebe abraccedilo de outro perde-se um pouquinho a noccedilatildeo das coisas Em certo momento me lembrei mamatildee on-de estaraacute Comecei a procuraacute-la e natildeo a vi Com certeza pensei ela se sentiu muito abalada e foi para o seu quar-to e eacute possiacutevel que esteja com alguma indisposiccedilatildeo Fui ao quarto dela para ver Ela estava deitada em atitude inteiramente serena com uma fisionomia muito triste a posiccedilatildeo composta e pensando

Eacute a tal coisa o vagalhatildeo natildeo alcanccedilaNunca eu vi vagalhatildeo algum atingi-la Em duas vezes

poreacutem quase a alcanccedilou   v(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2141990)

1) Do latim Vaidade das vaidades tudo eacute vaidade (Ecl 1 2)2) Ecl 2 173) Dona Gabriela Ribeiro dos Santos falecida em 6 de janei-

ro de 1934

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 8: Revista Doctor Plinio 205_201504

Sabedoria e sacralidade - I

E

8

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

A visatildeo sacral do universo haurida no Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus por meio da Santa Igreja Catoacutelica levava Dr Plinio a tudo analisar sob este prisma e a

discernir o cunho dessacralizante da Revoluccedilatildeo

m menino recebi a influecircncia altamente beneacutefi-ca dos jesuiacutetas em minha formaccedilatildeo Assim gra-ccedilas a Nossa Senhora vincou-se muitiacutessimo no

meu espiacuterito a noccedilatildeo de que por cima de tudo aquilo que eu vinha considerando e admirando nas etapas an-teriores pairava a autoridade doutrinaacuteria da Igreja e o que havia na minha alma de bom de belo eu o tinha porque era catoacutelico e o recebia de minha comunicaccedilatildeo espiritual sobrenatural e religiosa com a Igreja Catoacutelica

A Igreja fonte de todo o bem

Os jesuiacutetas natildeo insis-tiam sobre a metaacutefora do Corpo Miacutestico mas a doutrina eles davam Naturalmente prestei muita atenccedilatildeo nela e se cravou muito em meu espiacuterito a ideia de que a Igreja era a proacute-pria fonte de onde vi-nha tudo quanto havia de bom em mim Ou seja o Sagrado Cora-ccedilatildeo de Jesus por meio do Coraccedilatildeo Imaculado de Maria Essa noccedilatildeo era muito vivaz mas foi ldquodoutrinalizadardquo soacute mais tarde quando li Satildeo Luiacutes Grignion de Montfort

Tudo quanto era de Jesus Cristo para mim vinha por meio da Igre-

ja a concha na qual pousavam todos os benefiacutecios drsquoEle para todos os homens Eu me entregava agravequilo e hauria tudo dali

Mas a Igreja era a minha mestra e corrigiria os desvios eventuais a que meu espiacuterito estava sujeito Eu me sentia capaz de erro pelo lapso da inteligecircncia pela tendecircncia ao mal mas tambeacutem enormemente protegido pela ideia da infalibilidade da Esposa de Cristo

Eu percebia a impossibilidade de fazer todos os ho-mens pensarem do mesmo modo Ou havia uma autori-dade infaliacutevel que ensinava a todos ou natildeo existiria pos-

Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Jebu

lon

(CC

30

)

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 9: Revista Doctor Plinio 205_201504

9

sibilidade de pensarem da mesma for-ma Enquanto isso natildeo se desse a vida seria um caos indigna de ser vivida

Daiacute uma veneraccedilatildeo enorme pelo Pa-pado E depois correspondentemente pelo Episcopado e pelos outros graus da Hierarquia

Jardim protegido pelas muralhas do dogma e da lei

Juntamente com tudo isso tambeacutem uma ideia do poder governativo da Igreja

Em primeiro lugar as leis feitas por Deus sacratiacutessimas venerabiliacutessimas mas obrigando como a lei obriga De-pois as leis da Igreja complementaccedilatildeo das leis de Deus obrigando tambeacutem com uma autoridade divina

Portanto a noccedilatildeo do dogma do pre-ceito da necessidade de obedecer mdash sobretudo em ma-teacuteria religiosa mdash se vincou em meu espiacuterito a fundo E quem natildeo obedecesse teria que cumprir uma pena Eu tinha entusiasmo pela aplicaccedilatildeo efetiva da penalidade e repulsa em relaccedilatildeo agraves autoridades que aplicam de um modo dorminhoco negligente a lei que velam com matildeo mole sobre o dogma

Tudo isso formou uma vertente do meu espiacuterito como fruto das etapas anteriores Natildeo como uma etapa nova mas uma complementaccedilatildeo a uma coisa jaacute existente

E a inocecircncia era para mim como um jardim magniacutefi-co mas protegido pelas muralhas do dogma e da lei Um jardim fortificado

Haacute em certo lugar da Escritura uma referecircncia ao hor-tus conclusus1 mdash jardim fechado mdash que a Igreja aplica a Nossa Senhora A Igreja me parecia um horto fortifica-do cheio de maravilhas no interior mas do lado de fora preparado ajustado e assestado para o combate A ideia da fortaleza era um complemento

Ordem do universo e combates sacrais

Do choque com a Revoluccedilatildeo vinha a ideia de que a or-dem do universo pedia que fosse possiacutevel haver comba-tes sacrais Porque seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais elevados sacrifiacute-cios os heroiacutesmos mais extremos os sacrifiacutecios mais ter-riacuteveis as abnegaccedilotildees mais cruciantes Portanto o sacral de si era beliacutegero no sentido de que a presenccedila dele na Terra ao mesmo tempo atraiacutea e repelia criava uma divi-satildeo E essa divisatildeo provocava a luta

A luta de vez em quando daria na guerra E esta guerra em certo sentido completava a ordem do univer-so porque era a efetivaccedilatildeo do holocausto com sangue agrave sacralidade que o homem deveria pagar

De maneira que o pacifismo exagerado e o laicismo sempre me pareceram coisas correlatas natildeo na primeira superfiacutecie mas no fundo

Eu ainda natildeo conhecia o ecumenismo falso inteira-mente diferente do ecumenismo verdadeiro Podem cal-cular quando conheci esse falso ecumenismo que sabor desagradaacutevel me produziu na bocahellip

Sempre me pareceu que esses utopismos natildeo queriam considerar que sendo o mundo um vale de laacutegrimas de vez em quando era necessaacuterio que nele aparecessem lu-tas conflitos os quais levassem ateacute esse ponto

Era uma necessidade deploraacutevel fruto do pecado ori-ginal e dos outros pecados dos homens mas de uma na-tureza tal que seria ainda mais deploraacutevel se natildeo houves-se Porque ateacute mesmo o homem concebido sem pecado original ficaria amputado e deformado se ele natildeo tivesse a possibilidade agraves vezes de levar a luta pelo sacral ao ex-tremo de todas as dedicaccedilotildees

Holocausto sublime que daacute beleza agrave vida

Nesse sentido a guerra legiacutetima me aparecia como uma nota da sacralidade Porque eacute um holocausto prati-cado pelo homem que vai agrave batalha mesmo quando es-ta natildeo tem motivo religioso mas eacute uma questatildeo de fron-teiras ou algo assim Neste caso o combatente defenderaacute o direito de seu paiacutes por uma razatildeo moral Ele catoacutelico

Promulgaccedilatildeo do dogma da Imaculada Conceiccedilatildeo - Museus Vaticanos

Alfv

anB

eem

(C

C 3

0)

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 10: Revista Doctor Plinio 205_201504

10

SagraDo coraccedilatildeo De JeSuS

O Papa Bem-aventurado Urbano II prega a Cruzada em Clermont-Ferrand

vai agrave luta porque um Mandamento de Deus o obriga a ir Nesse sentido para ele eacute uma ldquoguerra santardquo Natildeo san-ta na sua meta imediata mas na sua meta uacuteltima de cum-prir o dever para com seu paiacutes

De onde entatildeo em toda guerra justa exatamente nos seus horrores aparecer um sentido de holocausto subli-me que daacute uma beleza agrave vida indispensaacutevel para compor os aspectos da existecircncia tal como ela eacute em consequecircn-cia do pecado original e dos pecados atuais

Algueacutem para fazer chicana perguntaria ldquoVocecirc natildeo deseja uma era de paz Veja na Escritura tudo quanto se diz a respeito da paz da beleza dela como se deve que-rer uma paz eterna que nunca mais tenha fim Vocecirc natildeo deseja isso E fica como uma hiena um chacal agrave espera da efusatildeo do sangue E vocecirc se diz catoacutelicordquo

Como as doenccedilas que nunca desapareceratildeo

A resposta eacute muito simples Aplica-se aqui tudo quan-to sabemos a respeito da necessidade da doenccedila Natildeo haacute quem possa em certo sentido da palavra gostar que ha-

ja enfermidades na Terra Mas de outro lado ningueacutem pode imaginar ateacute onde o mundo cairia se natildeo houves-se doenccedilas

Entatildeo o homem deve fazer o possiacutevel para diminuir o nuacutemero de enfermidades bem certo de que Deus nunca permitiraacute que elas desapareccedilam E pelo contraacuterio pode Ele dispor que na medida em que o homem vaacute vencen-do na luta contra as doenccedilas vatildeo aparecendo enfermida-des menos numerosas eacute verdade entretanto mais crueacuteis Por quecirc Porque Ele natildeo quer que a dor desapareccedila den-tre os homens

A proacutepria Igreja que tanto fez para diminuir os so-frimentos do homem doente mdash com os bens do espiacuteri-to e do corpo incitando estimulando e consolando mdash entretanto sabe que a doenccedila eacute de uma grande utilida-de Faz o possiacutevel para evitaacute-la mas o faz tranquilamente porque tem ciecircncia de que jamais desapareceraacute de modo completo e que portanto nunca faltaratildeo doenccedilas nes-ta Terra

Assim tambeacutem eacute a guerra

Sacralidade e luta

Entatildeo a esse senso de sacralidade se acrescentou um colorido militante pelo qual a minha alma ansiava e que se representava pouco nas expressotildees religiosas que eu conhecia ateacute essa eacutepoca

Lembro-me de que quando os jesuiacutetas falavam de Santo Inaacutecio como grande combatente no cerco de Pam-plona mdash eles ressaltavam muito isso mdash eu ficava encan-tado embora visse bem que a guerra dentro da qual a batalha de Pamplona era um episoacutedio referia-se a ques-totildees de limites da Franccedila com a Espanha e mais remota-mente com o Sacro Impeacuterio portanto uma guerra tem-poral Mas era um heroacutei Quando contavam que Santo Inaacutecio ficava entusiasmado em ler os romances de Cava-laria eu me regozijava

Quando vi aquele livrinho de Carlos Magno2 a minha alma teve uma sensaccedilatildeo de algo de completo que se lhe acrescentava com a consideraccedilatildeo desse maravilhoso

Rep

rodu

ccedilatildeo

Seria necessaacuterio que em homenagem aos mais altos valores houvesse os mais

elevados sacrifiacutecios os heroiacutesmos mais extremos

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 11: Revista Doctor Plinio 205_201504

11

Por quecirc Precisamente porque o sacral sem a luta natildeo me parecia completo E pelo contraacuterio a fina ponta da sacralidade parecia simbolizar-se para mim muito bem na fina ponta de uma espada

O Protestantismo e a Revoluccedilatildeo Francesa satildeo dessacralizantes

Mais tarde entrou a ideia da sacralidade ligada agrave questatildeo da Revoluccedilatildeo

Eu tinha noccedilotildees esparsas sobre protestantismo e o de-testava possuindo em relaccedilatildeo a ele um horror intuitivo e muito profundo

Lembro-me de que em certa ocasiatildeo a Fraumlulein Ma-thilde3 precisou falar com algueacutem dentro de um templo natildeo sei de que seita protestante construiacutedo numa rua natildeo muito distante de minha casa Ela entrou levando Roseacutee por uma das matildeos e a mim pela outra

Quando me pilhei dentro daquele recinto e perce-bi que era uma igreja protestante sentia horror ateacute de respirar por se tratar de uma coisa que natildeo era catoacutelica contraacuteria agrave Igreja Catoacutelica E toda a semente protestante se afigurava ao meu espiacuterito como sendo um horror algo satacircnico nojento

Depois comecei a ler algumas coisas sobre a Revolu-ccedilatildeo Francesa No fundo embora natildeo se explicitasse is-so no meu espiacuterito eu via bem que havia um elemento comum entre as duas Revoluccedilotildees natildeo soacute o que estaacute em meu livro Revoluccedilatildeo e Contra-Revoluccedilatildeo mas algo que quando o escrevi estava no fundo de minha alma mas ainda natildeo chegara a explicitar inteiramente eacute que ambas essas Revoluccedilotildees satildeo dessacralizantes

As igrejas ou as seitas nascidas do protestantismo tecircm doses diferentes de restos de uma sacralidade envene-nada conspurcada Satildeo restos de bom vinho misturado com pus e portanto falso adulterado asqueroso

O protestantismo eacute todo ele um resto de sacralidade dado para tranquilizar as pessoas que colocadas entre a negaccedilatildeo ou a aceitaccedilatildeo completa da sacralidade acaba-riam por optar pela Santa Igreja Catoacutelica Entatildeo os pro-testantes ofereciam como uma espeacutecie de mal menor o patildeo feito sei laacute de que farinha ldquoleprosardquo que era o patildeo da doutrina protestante em vez da Doutrina Catoacutelica o mais puro dos patildees

Daiacute por exemplo eles natildeo usarem batina e uma por-ccedilatildeo de outras coisas que a Igreja Catoacutelica potildee por intei-ro Eles natildeo colocavam por natildeo terem o estofo do sagra-do que soacute a Igreja Catoacutelica possui

E onde havia dessacralizaccedilatildeo eu me sentia exilado ex-patriado e inimigo de morte

Na Revoluccedilatildeo Francesa tambeacutem A sociedade do An-cien Reacutegime4 com os defeitos que eu percebia bem era ainda toda feita de um respeito sacral para com pessoas que se fossem como as aparecircncias pediam deveriam se apresentar de um modo profundamente sacral protoco-lo etiqueta maneiras decoraccedilatildeo etc

Em relaccedilatildeo agrave Idade Meacutedia eu ainda natildeo tinha feito a com-paraccedilatildeo mas vistas do tempo em que eu vivia entatildeo mdash os anos 20 com a influecircncia laicista do cinema de Hollywood mdash as coisas do Ancien Reacutegime eram sacralizantes Em graus diferentes mas ao menos comportavam a sacralidade   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 1441989)

1) Ct 4 122 ) Dr Plinio se refere ao episoacutedio ocorrido na Estaccedilatildeo da Luz

em Satildeo Paulo quando ainda menino tomou conhecimento pela primeira vez da existecircncia de Carlos Magno ao se de-parar com um livro popular que narrava a histoacuteria deste Im-perador e de seus pares Ver Dr Plinio n 8 p 4-5

3) Srta Mathilde Heldmann preceptora alematilde contratada por Dona Lucilia

4) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIIIB

en S

kaacutela

(C

C 3

0)

Santo Inaacutecio de Loyola pisando o

democircnio - Basiacutelica de Satildeo Pedro Vaticano

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 12: Revista Doctor Plinio 205_201504

Per lucem ad crucem

D

12

Dr PLinio comenta

A constataccedilatildeo de nossa insuficiecircncia em face dos sofrimentos pode nos levar a fugir do caminho da cruz

indispensaacutevel agrave nossa santificaccedilatildeo Como estarmos preparados para oferecer sem pacircnicos nem desacircnimos os

sacrifiacutecios que nos venham a ser pedidos

Ant

anO

(C

C 3

0)

num soacute voo para a admiraccedilatildeo e a eventual aceitaccedilatildeo da dor no que ela tem de mais lancinante e terriacutevel

Entatildeo dizem ldquoEu vou falar da cruz Olha Satildeo Vicente sofreu tal martiacuterio assim Este outro fez isso e suportou tal situaccedilatildeo etcrdquo Pergunto Isso eacute bom ou natildeo

Para tratar da questatildeo da cruz eacute preciso antes de tu-do um discernimento dos espiacuteritos porque de fato a gra-ccedila chama a alma para a cruz conforme as ocasiotildees os momentos Haacute determinados lampejos em que ela con-vida de uma vez a pessoa para o pinaacuteculo da cruz e pode ser um principiante Agraves vezes ela natildeo chama para o pi-naacuteculo mas vai se revelando lentamente gradualmente

Entatildeo pode ser que para um auditoacuterio em certo mo-mento em determinada situaccedilatildeo um pregador seja levado pelo discernimento dos espiacuteritos a ensinar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel ldquoMeus caros irmatildeos quereis saber

evo tratar nesta conferecircncia a respeito de co-mo acondicionar a cruz para que a pessoa sai-ba andar com ela entendendo-se desde jaacute co-

mo cruz natildeo apenas os sofrimentos lancinantes que dila-ceram e estraccedilalham mas tambeacutem a vida cotidiana nos seus aspectos normais com uma dose de felicidade ou de bem-estar normal que natildeo eacute a alegria de delirar e as do-res tambeacutem normais Portanto a matalotagem que o in-diviacuteduo precisa levar no caminho da cruz e como ele de-ve ver esse caminho e a suportabilidade da cruz para ne-le andar

Os grandes e os pequenos sacrifiacutecios

Muitos pregadores mdash natildeo os censuro por isso acho normal mdash quando falam da cruz querem levar as almas

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 13: Revista Doctor Plinio 205_201504

13

Vic

tor

Dom

ingu

es

Primeira Missa do Bem-aventurado Miguel Rua - Turim Itaacutelia

o que eacute a cruz Ouvi essas palavras lsquoEli Eli lamaacute sabactacirc-nirsquo1rdquo Comeccedilar por aiacute e produzir um choque Como tam-beacutem pode acontecer que inicie pela doutrina dos pequenos sacrifiacutecios de Santa Teresinha do Menino Jesus porque a cruz eacute tatildeo divina tatildeo enorme tatildeo complexa que natildeo a pega quem quer do jeito que deseja Cada um eacute atraiacutedo pelo Es-piacuterito Santo pela graccedila a apanhaacute-la de um jeito E se pegar do jeito errado natildeo entra no caminho da cruz

Admirar as pessoas mais perfeitas

A grande maioria dos fieacuteis tem que viver a cruz nas condiccedilotildees de vida comum porque do contraacuterio a socie-dade temporal desaparece Isso estaacute ligado agrave teoria do estado de perfeiccedilatildeo A perfeiccedilatildeo eacute sempre uma cruz e uma cruz insigne E o estado de perfeiccedilatildeo vivido em to-da a sua autenticidade eacute um estado de cruz

Entretanto o estado de perfeiccedilatildeo deve ser praticado por muitos natildeo poreacutem por todos E esses muitos cons-tituem uma multidatildeo e ao mesmo tempo uma minoria Porque em absoluto o nuacutemero dos que seguem a perfei-ccedilatildeo eacute muito grande Por exemplo podemos dizer que a Igreja tem um nuacutemero colossal de Santos Natildeo haacute exage-ro nem mentira nisso Mas se for comparado com o nuacute-mero de homens eacute um pingo

Entatildeo satildeo tantos que se poderia falar que haacute um nuacuteme-ro infindaacutevel de Santos Mas de outro lado se poderia di-zer tambeacutem eacute pequeno o nuacutemero de Santos canonizados

Na perspectiva de que esse nuacutemero eacute pequeno que haacute uma quantidade infindaacutevel de almas que natildeo satildeo chama-das para determinada perfeiccedilatildeo mas a admiram embo-ra sabendo que natildeo iratildeo adquirir aquela perfeiccedilatildeo elas devem ter uma espeacutecie de tristeza de natildeo serem chama-das para aquela perfeiccedilatildeo E soacute a alma que admirou pro-fundamente a cruz para a qual ela natildeo eacute chamada conse-gue ser correta

Aqueles que admiram os mais corretos e os mais exiacute-mios conseguem ser corretos A partir do momento em que o indiviacuteduo deixa de ter um amor abrasado um en-tusiasmo pela perfeiccedilatildeo para a qual natildeo foi chamado ele comeccedila a relaxar

Eacute um modelo que ele sabe que natildeo tem proporccedilatildeo pa-ra seguir e fica com certa nostalgia de natildeo poder acom-panhar Este ponto eacute muito importante

Um cuidado ao se levantar o estandarte da cruz

Entatildeo pode-se pregar a cruz no que ela tem de mais terriacutevel tranquilizando as pessoas ldquoNatildeo se tomem de um escruacutepulo torturante ao verem que natildeo satildeo capazes disso mas compreendam que podem amar sem ser tra-gadas por esse sofrimento que natildeo lhes seraacute pedido Ou se for pedido mdash porque natildeo se sabe qual eacute o futuro do homem mdash vocecircs receberatildeo outras graccedilas que natildeo tecircm agora Sentirem-se proporcionadas com isso no momen-

to natildeo eacute sua obrigaccedilatildeordquo Tenho a im-pressatildeo de que ao levantar o estan-darte da cruz a primeira precauccedilatildeo eacute essa do contraacuterio perde-se o rumo

Lembro-me de uma experiecircncia pes-soal Eu tinha muita admiraccedilatildeo pelos maacutertires mas um medo enorme de pas-sar pelos sofrimentos que eles tiveram E me perguntava ldquoVocecirc estaacute embeve-cido de admiraccedilatildeo por eles Do que va-le essa sua admiraccedilatildeo Eu queria ver se vocecirc diante de um leatildeo tomaria a ati-tude deles Natildeo toma Eacute um fracalhatildeo Essa sua admiraccedilatildeo eacute hipoacutecritardquo

Eu sentia que isso me perturbava a fundo Parecia uma increpaccedilatildeo virtuo-sa tinha seu quecirc de virtude mas com algo mal visto mal compreendido Ateacute que ouvi um padre dizer de pas-sagem diante de mim ldquoA maior parte desses maacutertires tinha a graccedila no mo-mento de chegar diante da ferardquo

Para mim foi uma descoberta Co-mecei a admirar os maacutertires sem me

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 14: Revista Doctor Plinio 205_201504

14

Dr PLinio comenta

Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos

sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas contra noacutes mesmos

causar nenhum arrepio Isso eu vi repetido depois em mil situaccedilotildees e de mil modos

Portanto eu colocaria como primeiro problema en-tender bem isso Com o seguinte acreacutescimo aquilo que se daacute com os sofrimentos lancinantes ocorre tambeacutem com os padecimentos menores que conhecemos na vi-da de todos os dias Vemos de repente algueacutem fazer um sacrifiacutecio de que noacutes natildeo somos capazes Admiremos E admiremos sem remorsos nem increpaccedilotildees tontas con-tra noacutes mesmos

Algueacutem poderia dizer ldquoEacute bem verdade essa cruz no momento natildeo tenho que carregar Eu terei que carregar algum dia Como vai ser de mim quando precisar levaacute--lardquo

A resposta eacute a seguinte Natildeo se ponha o problema Admire debandadamente e sem restriccedilotildees e peccedila a gra-ccedila mdash caso se ponha para vocecirc esse sofrimento mdash de ter a coragem de enfrentaacute-lo mas sem certa forma de anguacutes-tia que faz mal agrave alma

O caacutelice por onde algo de superior penetra em noacutes

Quem de noacutes seria capaz de arcar com o sofri-mento que teve Nosso Senhor Jesus Cristo ou Nos-sa Senhora Natildeo haacute um Nem de longe noacutes temos substacircncia para isso Mas de tanto admirar aquilo de que natildeo somos capazes algo daquela graccedila en-tra em noacutes

A admiraccedilatildeo eacute o caacutelice por onde a coisa superior en-tra em noacutes

E na medida em que eu admiro a capacidade de outro sofrer entra em mim essa capacidade Natildeo quero dizer que entre tanto quanto haacute nele mas dentro de minhas proporccedilotildees recebo esta capacidade agrave forccedila de admirar

A alma capaz de admirar eacute aberta a todas as estrelas a todos os soacuteis A alma fechada agrave admiraccedilatildeo estaacute entregue a si mesma Da alma invejosa entatildeo nem sei o que dizer Esta apedreja insulta as estrelas

Como entrada no caminho da cruz devemos admi-rar a cruz naturalmente antes de tudo o Crucificado e a Corredentora mas natildeo nos limitemos a exemplos histoacute-ricos Procuremos ver a cruz naqueles que em torno de noacutes praticam o amor agrave cruz

Porque ficar no mundo do que passou eacute permane-cer no zero Eu soacute entro em nexo com aquilo que passou quando admiro algo de congecircnere que ocorre em torno

Mac

arro

nes

(CC

30

)

Hel

vetik

er (

CC

30

)

Ao lado martiacuterio dos cartuxos de Roermond - Museu do Prado Madri Espanha Abaixo decapitaccedilatildeo das Santas

Catarina e Baacuterbara - Museu Nacional Zurique Suiacuteccedila

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 15: Revista Doctor Plinio 205_201504

15

Cada pessoa eacute chamada para um grau de perfeiccedilatildeo

Outro lado que ainda estaacute no condicionamento da via da cruz eacute o seguinte essas multidotildees de pessoas a quem nos referimos acima aparentemente natildeo satildeo chamadas agrave perfeiccedilatildeo Por quecirc Seria pelo fato de estarem destina-das agrave sociedade temporal Esse eacute um erro

Eacute verdade que todos os que pertencem a Ordens re-ligiosas satildeo chamados para o estado de perfeiccedilatildeo O re-ligioso que consciente e voluntariamente deixe de ten-der para a perfeiccedilatildeo comete pecado grave Essa eacute a dou-trina da Igreja

Contudo se natildeo houver entre os membros da socieda-de temporal um bom nuacutemero de pessoas que dentro das condiccedilotildees proacuteprias ao acircmbito civil pratiquem intencio-nalmente a perfeiccedilatildeo a sociedade temporal fenece pe-rece De maneira tal que natildeo devemos identificar a per-feiccedilatildeo com a condiccedilatildeo eclesiaacutestica ou religiosa e a im-perfeiccedilatildeo consentida e desavergonhada com a sociedade

de mim e por aiacute chego ateacute o passado A Pai-xatildeo de Nosso Senhor natildeo passou pois de al-gum modo ela eacute permanente

Entatildeo deveriacuteamos olhar admirativamente em torno de noacutes E se natildeo temos o costume de fazer exame de consciecircncia para saber o que se passa em nossas almas entram pedregulhos de inveja que causam relutacircncia em relaccedilatildeo a es-sas consideraccedilotildees Natildeo tenhamos ilusotildees por-que entram A inveja eacute tal que ou temos a cer-teza de tecirc-la expulsado ou ela habita em noacutes Natildeo eacute alentador mas eacute a pura verdade Trate-mos de vencecirc-la portanto e procuremos admi-rar pois temos importantes razotildees para querer que nossas almas progridam nisso

Pedir forccedilas a Nossa Senhora

Se fosse possiacutevel fazermos uma meditaccedilatildeo sobre nossa proacutepria cruz precedida de uma cuidadosa preparaccedilatildeo na linha do que estou dizendo sairiacuteamos da pura teoria e teriacuteamos condiccedilotildees para entrar no caminho da cruz Se natildeo for assim natildeo entramos verdadeiramente

Pode acontecer que algueacutem tenha diante de si um sacrifiacutecio que natildeo tem coragem de fa-zer E o pior eacute o seguinte natildeo se trata de algo extraordinaacuterio mas estaacute abaixo das reais re-sistecircncias do indiviacuteduo Poreacutem por ser ele um poltratildeo natildeo tem forccedilas

Entatildeo se sou um poltratildeo rezo ldquoSalve Rai-nha Matildee de Misericoacuterdia vida doccedilura e es-peranccedila nossa salverdquo Vou pedir para Ela me dar as for-ccedilas que eu deveria ter e natildeo possuo que Ela tenha pena de mim Vou rezar rezar e acabarei obtendo Mas nun-ca devo me aproximar da cruz em seco porque isso cos-tuma causar muitos desvios

Com essa postura a cruz se torna manuseaacutevel Fora disso natildeo E o exemplo foi Nosso Senhor o Qual como que Se manifestou sem proporccedilatildeo com a Cruz drsquoEle a tal ponto que disse ldquoPater si fieri potestrdquo2 e a oraccedilatildeo drsquoEle como natildeo podia deixar de ser foi gratiacutessima a Deus Pai que Lhe mandou um Anjo E depois o Cireneu no per-curso da Via Crucis que O ajudou a carregaacute-la a Verocircni-ca o encontro com Nossa Senhora etc

Tudo isso eacute muito matizado e sem essas matizaccedilotildees noacutes fugimos da cruz o que eacute um disparate pois se Deus matiza tanto para noacutes o caminho do sofrimento por que havemos de imaginaacute-lo sem matizes

A meu ver para percorrermos esse tema sem constri-ccedilatildeo para nossas almas seria absolutamente necessaacuterio considerar esses matizes como poacutertico do tema da cruz

Uba

yrbd

(C

C 3

0)

Santiacutessimo Cristo da Coluna - Tenerife Espanha

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 16: Revista Doctor Plinio 205_201504

16

Dr PLinio comenta

temporal Cada pessoa eacute chamada para um grau de per-feiccedilatildeo Para o grau de perfeiccedilatildeo dos religiosos a grande maioria natildeo eacute chamada mas sim a um determinado te-to de perfeiccedilatildeo dentro da vida que leva e para isso de-ve tender

Tomemos por exemplo a Igreja de Satildeo Basiacutelio em Moscou com aquelas cuacutepulas Aquilo poderia ser o graacute-fico das perfeiccedilotildees Algumas perfeiccedilotildees satildeo enormes outras satildeo pequenas como os torreotildeezinhos que tecircm na ponta uma cuacutepula pequenininha tambeacutem Assim eacute a multidatildeo das almas cada uma eacute como um torreatildeo que tem no alto uma cuacutepula ou seja uma perfeiccedilatildeo proacutepria para a qual deve tender

Considerar que algueacutem pode ateacute chegar ao Ceacuteu sem passar pelo Purgatoacuterio por ter vivido retamente na so-ciedade temporal para uma perfeiccedilatildeo menor que foi atingida faz com que a pessoa esteja animada por ter encontrado para si um ideal muito belo Com isso creio que a alma fica arejada e balizada para entrar no cami-nho da cruz

Esse caminho eacute lindo e cheio de surpresas como uma navegaccedilatildeo num mar ignoto que apresenta as borrascas e as ciladas mais tenebrosas mas tambeacutem os panoramas mais magniacuteficos

Deus nos pede o sacrifiacutecio mas nos sustenta com sua graccedila

Assim haacute certas coisas que para o comum das pessoas constituiriam um sacrifiacute-cio medonho a prati-car entretanto quan-do se eacute chamado pe-la graccedila a uma vo-caccedilatildeo a alma se enche de alegria e de consolaccedilatildeo

E xempl i f ic o com a Gruta de Lourdes Haacute vo-luntaacuterios que se esmeram em dar banho aos doentes em piscinas apro-priadas

Algueacutem diria ldquoOlhe vocecirc vai ter contato com o que haacute de mais repugnan-te mais terriacutevel Vocecirc precisaraacute mexer naquela aacutegua de banhos imundos onde haacute as cascas de

feridas o pus de todos os que por ali passaram e os mi-croacutebios mais ameaccediladores de todas as doenccedilas Aquelas piscinas satildeo anti-higiecircnicas no sentido mais violento e li-teral da palavra e vocecirc poraacute as suas matildeos limpas que desinfetou antes naquela aacutegua para lavar aqueles doen-tes Isso seraacute para vocecirc uma tortura todos os diasrdquo

Para quem se sentiu chamado por uma graccedila para fa-zer isso natildeo eacute uma tortura Vaacute laacute mexa naquilo a graccedila vai mexer na sua alma de outro jeito e vocecirc daraacute os ba-nhos com naturalidade Natildeo considere portanto a situa-ccedilatildeo como ela natildeo vai ser

Com muitas modalidades de sofrimento se daacute isso Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele pade-cimento de maneira que quando o sofrimento acabou tem-se gosto de se lembrar dele E agraves vezes vai-se ao lu-gar onde se padeceu para dar graccedilas a Nossa Senhora por aquele sofrimento

Conveacutem pois cada um compreender que natildeo deve confrontar o sofrimento futuro com o seu estado de espiacute-rito atual porque quando chegar a hora de sofrer Ma-ria Santiacutessima obteraacute as forccedilas Ainda mais Ela que eacute Matildee de Misericoacuterdia providenciaraacute os meios para se pa-decer aquilo potavelmente

Diz-se que quando Deus permite que fiquemos doen-tes Ele mesmo prepara a cama para nos deitarmos

Existe uma doccedilura especial no acircma-go do sofrimento quando nos lem-

bramos de que ele nos foi da-do por Deus eacute o travesseiro

suave que a Matildee de Mi-sericoacuterdia nos prepa-

rou para aguentar-mos tal padecimen-to Vamos adian-te porque quan-do isso terminar teremos sauda-des desses dias Parece-me muito importante con-siderar isso tam-

beacutemSatildeo das tais gra-

ccedilas como a de Je-sus com os disciacutepulos

de Emauacutes no momen-to de ir embora revela-Se

Na hora do sofrimento cessar percebemos que uma matildeo esta-va nos segurando e ficamos en-cantados

Valerii Tkachenko (CC 30)

Catedral de Satildeo Basiacutelio - Moscou Ruacutessia

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 17: Revista Doctor Plinio 205_201504

17

Sofre-se muito mas natildeo se percebe que a Providecircncia

pocircs uma suavidade na alma a propoacutesito daquele padecimento de maneira

que quando o sofrimento acabou tem-se gosto

de se lembrar dele

Aversatildeo agrave atitude de Muacutecio CeacutevolaEntretanto as pessoas que tratam habitualmen-

te da dor natildeo a apresentam assim mas agrave maneira de um Muacutecio Ceacutevola3 Sempre tive aversatildeo agravequele tipo de atitude Queimar minha matildeo Natildeo Fico apavora-do tenho horror ao fogo e natildeo vou pocircr nele meu bra-ccedilo Poreacutem se eu receber uma graccedila especial ponho Mas numa perspectiva catoacutelica como Satildeo Lourenccedilo na grelha

Haacute portanto atenuantes acolchoados que nos con-duzem agravequilo Natildeo nos apavoremos A entrada no ca-minho do sofrimento eacute ao mesmo tempo uma resolu-ccedilatildeo heroica e viril mas tambeacutem uma ponderaccedilatildeo dos mil acolchoados que entram dentro disso Do contraacuterio natildeo se viveu e natildeo se sofreu catolicamente

Fizemos juntos uma preparaccedilatildeo para a entrada da cruz em nossas vidas e para o modo pelo qual devemos ver a cruz Foi apresentado um equiliacutebrio entre a luz e a cruz de tal maneira que se poderia dizer per crucem ad lucem4 mas tambeacutem per lucem ad crucem que eacute o rever-so da medalha que poucas pessoas consideram   v

(Extraiacutedo de conferecircncia

de 6121985)

1) Mt 27 462) Do latim ldquoPai se for possiacutevelrdquo (cf Mt 26 39)3) Conta Tito Liacutevio historiador romano em sua obra Histoacuteria

de Roma desde a sua fundaccedilatildeo que em 508 aC Roma foi cercada por um rei etrusco de nome Porsena Ante o perigo um jovem romano chamado Gaio Muacutecio Ceacutevola se volunta-riou a matar o rei Mas ao entrar no acampamento inimigo foi aprisionado Levado ante o rei e questionado sobre a es-trateacutegia dos romanos Gaio disse ldquoSou um cidadatildeo de Ro-ma e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia e muitos como eu estatildeo dispostos a fazer o mesmordquo O rei o ameaccedilou de queimaacute-lo vivo se natildeo contasse detalhes dos pla-nos romanos Entatildeo Gaio Muacutecio colocou sua matildeo direita em um fogo que havia ao seu lado deixando-a queimar ateacute os ossos diante do rei e de outros nobres assombrados com tal ato de valentia

4) Do latim pela cruz agrave luz

Rol

and

Dar

reacute (

CC

30

)

Joao Paulo Rodrigues

Aspectos da Basiacutelica de Lourdes Franccedila

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 18: Revista Doctor Plinio 205_201504

Origem do direito consuetudinaacuterio - I

E

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

18

videntemente a sociedade orgacircnica tem como mateacuteria-prima homens e se natildeo estudarmos es-sa organicidade no campo das relaccedilotildees privadas

de homem a homem natildeo teremos apanhado a coisa na sua maior profundidade De maneira que me pareceu que valeria a pena estudarmos essas relaccedilotildees como co-meccedilam como brotam de homem a homem para depois irmos mais adiante

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Carcassone Franccedila

O verdadeiro benquerer gera a amizadeNatildeo sei se esse pressuposto estaacute bem explicado por-

que do contraacuterio pode causar certa estranheza eu descer de niacutevel mas como veratildeo natildeo eacute descida de niacutevel e sim aprofundamento

No que consiste esse analisar relaccedilotildees de homem a homem Vou entrar logo na realidade praacutetica e poste-riormente a examinaremos

Durante a Idade Meacutedia e mesmo ateacute a Revoluccedilatildeo Francesa as relaccedilotildees sociais eram baseadas na verdadeira amizade entendida como a Doutrina Catoacutelica a conceitua Daiacute se

originavam costumes que regulavam a vida social

Ano

ush

K (

CC

30

)

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 19: Revista Doctor Plinio 205_201504

P

19

enso que quem fizesse um estudo mais ou me-nos aprofundado dos assuntos da Idade Meacutedia chegaria agrave conclusatildeo de que nessa eacutepoca as re-

laccedilotildees de homem a homem em qualquer terreno gera-vam uma coisa mdash quando elas se desenvolvessem nor-malmente mdash que hoje estaacute quase desaparecida a ami-zade Uma amizade condicionada agrave natureza do assun-to que os tinha levado a entrarem em contato Mas um contato correto mais ou menos longo gerava necessaria-mente a amizade

Por exemplo dois homens que tomam contato entre si porque tecircm uma profissatildeo e a exercem em comum Natildeo se compreenderia que eles exercessem essa profissatildeo di-gamos durante dez anos sem motivo seacuterio de queixa um com o outro e que um natildeo reconhecesse no outro as qua-lidades de bom catoacutelico etc e natildeo nascesse daiacute um sen-timento de afinidade que natildeo precisaria ser necessaria-mente pessoal mas aquele tipo de afinidade que decorre do fato de estarem marcados pela mesma profissatildeo

Pode haver uma afinidade de caraacuteter religioso-moral Dois homens reconhecem um no outro um bom pai de famiacutelia respeitaacutevel um catoacutelico prestimoso que efetua bons serviccedilos agrave paroacutequia que nas relaccedilotildees comuns natildeo mente cumpre a palavra paga bem as diacutevidas que de-ve pagar ou natildeo tem diacutevidas eacute econocircmico parcimonio-so estaacute construindo razoavelmente sua vida Ainda que natildeo tenham afinidades pessoais isto gera entre eles uma afinidade profissional que redunda numa amizade por-que o apreccedilo reciacuteproco de qualidades leva as pessoas a uma confianccedila a um verdadeiro benquerer o qual gera uma amizade

Amizade de caraacuteter ontoloacutegico

Numa sociedade intensamente catoacutelica onde a forte maior parte das pessoas vive em estado de graccedila e pra-ticando bem os Mandamentos etc essas amizades nas-cem do contato profissional ou de outros contatos Veja-mos diferentes exemplos

Dois outros homens se conhecem porque fazem parte haacute muitos anos da mesma Irmandade que se consagra ao culto do Padroeiro da cidade Entatildeo naturalmente se es-tabelece o mesmo mecanismo de compreensatildeo muacutetua e eles se estimam Ou seraacute porque satildeo parentes e aiacute o caso eacute muito mais seacuterio pois na Idade Meacutedia se compreendia mdash e eacute a doutrina da Igreja mdash que as relaccedilotildees de famiacutelia devem gerar independente das afinidades pessoais uma amizade de caraacuteter ontoloacutegico metafiacutesico

Ao pai e agrave matildee mdash e os filoacutesofos os moralistas datildeo es-ta razatildeo mdash deve-se homenagem e respeito ainda quando eles sejam ruins porque satildeo nossa causa e o efeito deve filosoficamente reverecircncia agrave causa E por isso nasce daiacute

uma seacuterie de bons ofiacutecios dos filhos para com os pais do respeito tiacutepico do efeito para com a causa que se pode-ria fazer sentir assim

Imaginemos um artista que esculpe em pedra uma imagem de um homem e logo depois fosse dado a ela o dom de inteligir e mover-se e que a primeira coisa que a estaacutetua fizesse era dar uma bofetada no escultor Noacutes te-riacuteamos a impressatildeo de que essa estaacutetua violou a ordem das coisas Por quecirc

Aquele que a esculpiu natildeo eacute o pai mas a causa e sendo a causa daquela escultura esta natildeo pode ultrajar a causa Eacute uma razatildeo de caraacuteter profundo E dessa maneira tam-beacutem a pertencenccedila agrave mesma causa quer dizer vaacuterios pro-virem da mesma causa cria entre eles um nexo E o que se pode dizer do pai com os filhos deve-se afirmar guarda-das as devidas proporccedilotildees dos avocircs bisavocircs e ateacute dos tri-savocircs se algueacutem chegasse a conhececirc-los e portanto da-quela ascendecircncia agrave qual noacutes somos vinculados mdash mais ou menos remotamente mas vinculados mdash por causa de uma fonte uma origem comum da qual procedemos

Confianccedila superaguda

Aiacute se acresce outra coisa na Idade Meacutedia em geral toda a famiacutelia tinha a mesma profissatildeo ou profissotildees afins Se por exemplo o pai era sapateiro e pertencia agrave corporaccedilatildeo dos sapateiros o gosto dele era que o filho fosse sapateiro como ele mdash hoje natildeo o sapateiro quer que o filho seja advogado meacutedico ou engenheiro mdash e que tivesse ateacute vaacuterios filhos sapateiros que em diversos locais da cidade abrissem sapataria

Mais tarde jaacute no iniacutecio do Ancien Reacutegime1 quando co-meccedilavam a aparecer as sociedades comerciais os fami-liares constituiacuteam firmas que antigamente em Satildeo Pau-lo eu conheci muito ldquoFulano e irmatildeosrdquo ou ldquoFulano e fi-lhosrdquo ou entatildeo ldquoFamiacutelia talrdquo como donos Eacute o nome da firma que explora o negoacutecio todos trabalham juntos e tecircm um viacutenculo comum na Igreja Catoacutelica mais firme mais forte mais vital do que todos os outros viacutenculos E junto com esse viacutenculo o viacutenculo da famiacutelia no seu fun-damento filosoacutefico como acabei de expor

Em terceiro lugar o viacutenculo de famiacutelia criando nor-malmente afinidades que existem entre parentes pela mesma educaccedilatildeo pelo mesmo temperamento modo de ser agraves vezes ateacute pela semelhanccedila dos rostos

Depois todas as outras relaccedilotildees sociais tendendo na medida em que se prolongam a formar viacutenculos mais profundos que se chamam amizades De maneira que enquanto na vida contemporacircnea o nexo que prende uns homens aos outros satildeo interesses na vida antiga o que prendia era a amizade Amizade podendo agraves vezes jogar contra o interesse

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 20: Revista Doctor Plinio 205_201504

20

a SocieDaDe anaLiSaDa Por Dr PLinio

Quer dizer um amigo pode definir-se como aque-le que estaacute disposto a sacrificar o interesse por seu ami-go a confiar nele e confiar natildeo cegamente mdash a expres-satildeo ldquoconfianccedila cegardquo bem analisada eacute estuacutepida mdash mas eacute uma confianccedila superaguda que foi a tal ponto que le-vou a perceber no outro as razotildees pelas quais ele merece confianccedila A confianccedila natildeo eacute um ato de cegueira quan-do natildeo eacute uma coisa de um tonto eacute um ato de perspicaacutecia

Isto eacute algo tatildeo diferente do mundo de hoje que nos eacute meio difiacutecil compreender como seria uma sociedade vi-vendo assim mas creio que sem esse elemento funda-mental a sociedade orgacircnica natildeo eacute possiacutevel

A necessidade de negoacutecios etc tanto quanto a nature-za mdash a necessidade muitas vezes eacute natural mdash geram amiza-des e toda relaccedilatildeo humana que se desenvolve normalmen-te e de um modo um tanto prolongado produz amizade

A verdadeira caridade

Um outro ponto eacute que as amizades satildeo expansivas por si de maneira que haacute um proveacuterbio portuguecircs que pas-sou para o Brasil Amigo de meu amigo meu amigo eacute Quer dizer o ciacuterculo de amigos tende a espraiar-se dila-tar-se e numa cidade pequena chega a abranger toda a cidade como se fosse uma famiacutelia soacute

De permeio com isso existiam numerosas Ordens Re-ligiosas na Idade Meacutedia sem falar dos padres secula-res com esse poder de atraccedilatildeo sobrenatural que possui a Igreja fazendo com que numa cidadezinha por exem-plo com vinte mil habitantes possa facilmente ter dois trecircs conventos sem que ningueacutem julgasse demais Con-ventos vivendo de terras que lhes foram doadas as quais

os religiosos mandavam cultivar de donativos que rece-biam de direitos de cobrar impostos que o senhor feu-dal da cidade ou o governo municipal davam-lhes eles viviam disso e mantinham obras de caridade E estas eram outro circuito de amizade porque se entendia que o homem perfeitamente caridoso natildeo eacute soacute o que manda doaccedilotildees para a obra de caridade mas o que visita os do-entes e em geral os que sofrem

Por exemplo no ambiente da Idade Meacutedia uma pes-soa sabe que Fulano seu colega tem um filhinho que nasceu cego o pai estaacute fazendo o possiacutevel para curaacute-lo mas natildeo consegue e sofre muito com isso Entatildeo a pes-soa aparece num domingo na casa desse colega com o seu proacuteprio filhinho para brincar com o filhinho cego do outro explicando-lhe ldquoVocecirc vai brincar com ele que eacute cego precisa tomar cuidado ter pena porque vocecirc um dia pode ficar cego tambeacutemrdquo

O pai do menino cego via este passar uma tarde entreti-da e sabia que o amigo estava exigindo um sacrifiacutecio de seu proacuteprio filho em benefiacutecio do filho dele Podemos imaginar o viacutenculo que isso cria numa sociedade medieval

Creio que sem noacutes restaurarmos essa noccedilatildeo das rela-ccedilotildees pessoais todo o conceito de sociedade orgacircnica natildeo se apanha bem fica uma coisa ao mesmo tempo muito bonita mas tem-se a impressatildeo de que algumas raiacutezes fi-cam de fora do chatildeo

A doccedilura de viver

Essas consideraccedilotildees satildeo altamente distensivas dos ner-vos E de outro lado natildeo apresentam a famiacutelia como um caacutercere Eacute todo um ambiente que se desdobra os parentes

O amigo estaacute disposto a sacrificar seus interesses pelo

outro a ponto de perceber as razotildees

pelas quais ele merece confianccedila

Bayard arma cavaleiro a Francisco I na batalha de Marignan - Castelo

de Blois Franccedila

Fran

cisc

o Le

caro

s

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 21: Revista Doctor Plinio 205_201504

21

depois haacute relaccedilotildees parecidas com as que se tecircm com os pa-rentes uns amigos tatildeo proacuteximos que satildeo como parentes de-pois os mais estranhos Isto eacute grande como o mar que vemos longe perto em vaacuterias distacircncias e nos regalamos de obser-vaacute-lo nessas diversas posiccedilotildees Assim eacute essa espeacutecie de mar de amizade mas de catoacutelica boa vontade que se espraia por todo um ambiente e que eacute propriamente a douceur de vivre2

Eu queria que lessem Gens de la vieille France do Le-notre3 mdash natildeo eacute mais a Idade Meacutedia mas a douceur de vivre existente na Franccedila antes da Revoluccedilatildeo Francesa cuja explicaccedilatildeo se encontra aqui

Por exemplo um homem que possuiacutea uma hospedaria na qual uma famiacutelia inglesa hospedou-se por uma noi-te para prosseguir viagem no dia seguinte rumo a Paris O dono da hospedaria e o inglecircs conversaram e fizeram muito boas relaccedilotildees Na hora de pagar as despesas o do-no cobrou uma quantia que o inglecircs achou pequena e quis pagar mais o proprietaacuterio natildeo concordou saiu uma discussatildeo amistosa entre os dois mas afinal ele cedeu e cobrou mais e o inglecircs pagou

Quando o inglecircs estava longe ele precisou de alguma coisa que estava no porta-malas da carruagem abriu-o e encontrou uma duacutezia de garrafas de vinho que o francecircs tinha ali colocado agraves ocultashellip

De onde vem isto Eacute da possibilidade de dois homens se encontrarem e terem de fato se formado viacutenculos de tatildeo boa vontade reciacuteproca que na simples passagem criava um relacionamento deste tipo

Um exemplo de autecircntica amizade

Meu avocirc tinha terras pelo sistema claacutessico com que os paulistas antigos faziam fortuna quer dizer os pais dele trabalhavam em Satildeo Paulo e conseguiam dinhei-ro exercendo vaacuterias profissotildees Quando podiam eles compravam extensotildees de terra enormes situadas lon-ge a dois trecircs quatro ou cinco dias de viagem da ca-pital em lugares completamente ermos onde a terra era baratiacutessima Eles educavam os filhos aqui e quan-do concluiacuteam os estudos o pai lhes dava um dinheiri-nho e dizia

mdash Vocecirc deve ir para o interior no limite em que a ci-vilizaccedilatildeo chegou e vai exercer a sua funccedilatildeo laacute Eu lhe dou estas terras e com o dinheiro que economizar vai fazer uma fazenda para vocecirc laacute de maneira que vocecirc ho-je que natildeo tem nada morre fazendeiro

Isso aliaacutes deve ter acontecido nos paiacuteses da Ameacuterica do Sul que tinham terra sobrando e o sistema provavel-mente foi mais ou menos esse

Meu avocirc se formou na Faculdade de Direito e a minha avoacute tinha herdado do pai terras muito grandes suficien-tes para formar uma fazenda esplecircndida

Ele era muito bom advogado e fez dinheiro rapida-mente exercendo a profissatildeo E agrave medida que ganha-va dinheiro foi montando uma fazenda e assim tocava a vida Ateacute que um dia passou pelo escritoacuterio dele um se-nhor mdash o qual era seu amigo desde o tempo de crianccedila e que o Imperador tinha elevado a Baratildeo de Araraqua-ra mdash e lhe disse

mdash TotoacutehellipO meu avocirc chamava-se Antocircnio e seus amigos iacutenti-

mos o chamavam de Totoacutemdash Totoacute eu estive vendo sua fazendamdash Que talmdash Olhe vocecirc eacute muito bom advogado mas eacute um desas-

tre como fazendeiro Sua fazenda eacute a mais mal monta-da que pode haver porque estaacute gastando laacute um dinheiro que natildeo fica representado pelo que vocecirc despende Vocecirc estaacute se enterrando com isso

mdash Mas o que vou fazer natildeo tenho jeito para dirigir aquilo

mdash Se vocecirc quiser eu tomo conta de sua fazenda e lhe entrego pronta daqui a alguns anos Basta o seguinte agrave medida que eu for lhe mandando as contas vocecirc vai me enviando dinheiro para aplicar laacute

O meu avocirc aceitou e tinha a delicadeza de natildeo lhe perguntar como ia fazer Ele tambeacutem natildeo dizia

Ao cabo de tantos anos ele apareceu e perguntoumdash Totoacute quando eacute que vocecirc vai visitar a sua fazendamdash Quando vocecirc quiserMarcaram o dia e foram Estava uma fazenda primo-

rosa valendo muito bom dinheiro por causa do trabalho do Baratildeo de Araraquara ali Ele fez isso sem cobrar nada e foi amigo do meu avocirc ateacute morrer

Isso era uma amizade nascida no coleacutegio em que es-tudaram Mas como no coleacutegio se formava tanta amiza-de Por causa de um ambiente e o ser colega uma coisa completamente irrelevante na vida de hoje gerava fre-quentemente amizade

O que decorria daiacute Formava-se com muita facilidade toda espeacutecie de grupos sociais   v

(Continua no proacuteximo nuacutemero)

(Extraiacutedo de conferecircncia de 391991)

1) Sistema social e poliacutetico aristocraacutetico em vigor na Franccedila entre os seacuteculos XVI e XVIII

2) Do francecircs doccedilura de viver3) G Lenotre pseudocircnimo de Louis Leacuteon Theacuteodore Gosselin

(1855 - dagger1935) Historiador e escritor dramaacutetico francecircs

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 22: Revista Doctor Plinio 205_201504

Sublime intimidade entre o Menino e a Matildee

N

22

De maria nunquam SatiS

Aplicando o senso catoacutelico e o discernimento dos espiacuteritos ao comentar o afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho de

Genazzano Dr Plinio sonda as encantadoras profundidades do conviacutevio entre o Menino Jesus e sua Matildee santiacutessima

ossa Senhora do Bom Conselho se apresenta a noacutes com uma invocaccedilatildeo que agrave primeira vis-ta talvez natildeo pareccedila ter muita relaccedilatildeo com o

quadro Este representa uma Rainha de um pequeno pa-iacutes balcacircnico o que se nota na figura nos ornamentos e mais ainda no tipo marcadamente oriental com os olhos um pouco em amecircndoa e voltados para baixo

Ela estaacute com o Menino nos braccedilos e numa atitude de muita intimidade em que se tem impressatildeo de que Ela esqueceu que eacute Rainha e Ele esqueceu que eacute Rei Natildeo que hajam pedido demissatildeo ou abdicado da realeza Mas no momento aquilo que estaacute no fundo do espiacuterito na primeira plana da atenccedilatildeo e do modo de sentir eacute o fa-to de que Ela eacute Matildee e Ele eacute Filho

Profundeza de sentimento e de pensamento

Mais ainda mdash e eacute uma das coisas que mais me atrai no quadro mdash haacute uma profundidade na intimidade de relacionamento pela qual se sente ateacute o fundo da alma drsquoEla Ela eacute Matildee e Matildee daquele Filho quer bem agraveque-le Filho e ateacute o fundo da alma drsquoEle Ele eacute Filho e Filho daquela Matildee Haacute entre Eles uma uniatildeo de alma que ex-plica a tranquilidade e quase a imobilidade daquele afe-to

Ou seja eacute um afeto que chegou tatildeo ao fundo que Eles natildeo tecircm nada para dizer entre Si Estatildeo quietos e ape-nas querendo-Se bem mais nada como quem nota que de parte a parte o conhecimento e o afeto muacutetuos che-garam ateacute o fim E que portanto natildeo haacute mais o que con-siderar Eacute soacute fruir uma bem-aventurada deliacutecia daquele muacutetuo entendimento e muacutetuo estar juntos

Nesse ponto o artista foi muito delicado porque pin-tando o Menino com todas as feiccedilotildees de crianccedila daque-la idade e nada de comum com o hominho precoce vecirc--se nrsquoEle uma profundeza de sentimento e de pensamen-to que o homem feito natildeo tem E que corresponde intei-ramente agrave Doutrina Catoacutelica sobre o Homem-Deus

A unidade das naturezas divina e humana na mesma Pessoa traz como consequecircncia que aquele Menino da-quela idade concebido sem pecado original e que por-tanto natildeo passou por nenhuma das debilidades e das mdash eu digo no sentido etimoloacutegico latino mdash imbecilidades das fraquezas da infacircncia tenha a profundidade do sen-tir Ele estaacute tatildeo consciente do que eacute uma matildee do que eacute aquela Matildee quais as profundezas de alma que Ela ofere-ce a Ele e Ele entra tatildeo a fundo nessas profundezas que se potildee na matildeo drsquoEla como uma crianccedila

Quadro que tem um voo sobrenatural extraordinaacuterio

Com um sublime paradoxo Ele eacute crianccedila para tudo exceto para entender e querer as coisas sublimes extra-ordinaacuterias De maneira que natildeo me espanta que Ele qui-sesse precisar drsquoEla para os serviccedilos mais modestos Por-que eacute assim que se compagina a condiccedilatildeo de crianccedila no Menino-Deus E o quadro exprime isto admiravelmente Eacute uma obra de arte mediana mas tem um voo sobrena-tural extraordinaacuterio

O afresco nos daacute bem a noccedilatildeo da relaccedilatildeo entre Eles O modo como Nossa Senhora O carrega eacute o de uma pessoa que leva um tesouro de um valor infinito mas eacute uma pes-soa muito generosa Se supusermos um indiviacuteduo levan-

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 23: Revista Doctor Plinio 205_201504

23

do um tesouro noacutes o imaginamos agarrado ao tesouro e voltado a impedir que algueacutem o roube e sua atitude eacute de quem diz para qualquer um ldquoIsto eacute meu natildeo eacute seu Natildeo chegue perto e natildeo amole porque eacute meurdquo

Nossa Senhora natildeo Ela O segura com muito cuida-do muita delicadeza de maneira tal que nada se passa nrsquoEle ou em torno drsquoEle que Ela natildeo note imediatamen-te uma vigilacircncia materna dulciacutessima Mas Ela natildeo dei-

xa ver a menor preocupaccedilatildeo de que Lhe tirem o tesouro Ela sabe que eacute desses tesouros que quando se compar-tem natildeo se dividem E uma vez dado ele fica inteiramen-te com quem deu e inteiramente a quem foi concedido De maneira que sem propriamente mostrar o Menino a proacutepria posiccedilatildeo do rosto drsquoEla foi calculada com cuidado para que natildeo ocultasse nada da face do Menino E que o Menino ficasse em primeiro plano e Ela no segundo

Arq

uivo

Rev

ista

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 24: Revista Doctor Plinio 205_201504

24

De maria nunquam SatiS

E pelo respeito e pela seriedade tranquila distendi-da e afetuosa com que Ela O carrega vecirc-se que Ela tem uma noccedilatildeo inteira de que estaacute levando o Filho de Deus E que O adora com o mais profundo respeito

Mas de outro lado Ela tem a sensaccedilatildeo de estar de tal modo penetrada pelo afeto drsquoAquele a quem Ela res-peita que Se sente desembaraccedilada para sem nenhuma vacilaccedilatildeo nenhum acanhamento dar ordens ao seu proacute-prio Deus De maneira que Ela delibere quando eacute ho-ra de deitaacute-Lo ou tiraacute-Lo do Preseacutepio se eacute hora de dor-mir ou natildeo E Ela sabendo que eacute nada ou como que na-da para o Deus drsquoEla diz ldquoMeu Deus chegou a hora de dormirrdquo E Ele cuja natureza humana estaacute hiposta-ticamente ligada agrave natureza divina a Segunda Pessoa da Santiacutessima Trindade fecha os olhos e dorme porque sua Matildee mandou

Desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Todas essas possibilidades estatildeo contidas no ldquoet Ver-bum caro factum est et habitavit in nobisrdquo Quando Satildeo Joatildeo diz no proacutelogo de seu Evangelho ldquoO Verbo de Deus se fez carne e habitou entre noacutesrdquo1 todo esse celes-te turbilhatildeo de relaccedilotildees vertiginosas admiraacuteveis e dulciacutes-simas seraacute contido na Encarnaccedilatildeo satildeo desdobramentos da Encarnaccedilatildeo

Natildeo conhecemos detalhes do conviacutevio entre Eles mas eacute possiacutevel por exemplo que Ele com um pouco mais de idade na hora de brincar mdash e era Deus querendo brin-

car mdash natildeo tenha dito a Ela o que queria como natildeo diz uma crianccedila que natildeo sabe ainda falar E que Ela por amor precisou adivinhar que Ele queria uma bola E que tenha arranjado uma bola para Ele

Podemos imaginar Nossa Senhora e Satildeo Joseacute confa-bulando sobre o tamanho o diacircmetro da bola de que mateacuteria seria como fazer a bola oca para natildeo ficar mui-to pesada para a matildeozinha drsquoEle etc Mas ambos jaacute ima-ginando em cima desta bola uma cruz como se haveria de ver depois nas matildeos de incontaacuteveis reis da Terra

Ou entatildeo Maria Santiacutessima prestando atenccedilatildeo para saber de que comida Ele gostava mais Ou fazendo oraccedilatildeo para pedir a Ele que Lhe desse o conhecimento de qual era a refeiccedilatildeo que Ele queria comer naquele dia E Ele tal-vez fazendo dificuldade para falar de repente dizendo a Ela uma palavra qualquer proacutepria de crianccedila mas na qual Ela percebia misteriosamente que queria dizer ldquoNatildeo sa-beis minha Matildee que Eu vim agrave Terra para sofrerrdquo

Ningueacutem pode calcular o que foram as relaccedilotildees dessa infacircncia os misteacuterios as sublimidades Deus brincando A Escritura diz que antes de todos os seacuteculos Deus que eacute a Sabedoria brincava na superfiacutecie de Terra2 Mas daiacute a uma bolinha feita na oficina de Nazareacute Que diferenccedila

A Matildee que criei e da qual nasci

E Nossa Senhora falando com Ele Assim como Ele se transfigurou para trecircs Apoacutestolos no alto do Monte Ta-bor quantas vezes Ele Se transfigurou para Ela E em

que atitudes Dormindo talvez E no dormir que poder que majestade que inocecircncia que delicadeza Agraves vezes de fugidio de repente eacute Deus que Ela vecirc

Quem pode calcular istoNoacutes sabemos pelo Gecircnesis que

Deus no seacutetimo dia repousou e con-siderou todas as coisas que tinha feito Mas nenhuma delas era bonita como Nossa Senhora E Jesus como Criador confabulando com sua natureza huma-na por assim dizer pensando

ldquoComo eacute linda esta Matildee que Eu fiz e da qual nasci Como a alma drsquoEla eacute in-comparaacutevel Ali no quarto mdash estando entreaberta a porta mdash vejo que Ela es-taacute rezando Eacute noite e uma candeia daacute uma luz indecisa Vejo o perfil drsquoEla e noto que Ela reza para Mim Mas natildeo entro no quarto E percebo que Ela estaacute orando para o Padre Eterno para o Di-vino Espiacuterito Santo Eu mdash como Segun-da Pessoa da Santiacutessima Trindade di-

Joatildeo

Dia

s

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 25: Revista Doctor Plinio 205_201504

25

Quadro da Matildee do Bom Conselho (ao lado) venerado na capela do

Coleacutegio Satildeo Luiacutes (acima)

ria Ele mdash conheccedilo a oraccedilatildeo drsquoEla Entretanto eacute hora de chamaacute-La para tal coisardquo E grita ldquoMamatildeerdquo

Poder-se-iam multiplicar as situaccedilotildees desenvolver is-to ao infinito Ele A vecirc em certo momento chorar E Ele sabe porque a Santiacutes-sima Trindade mdash Ele por-tanto mdash estaacute dando esclare-cimentos a Ela sobre a Pai-xatildeo e depois sobre a mor-te drsquoEle E Ele nota a doci-lidade drsquoEla como Ela acei-ta como Ela quer Mas Ele vecirc desde jaacute aquela espa-da que transpassa a alma drsquoEla E Ele Se deleita em considerar que pelo amor que Ela tem aos homens Ela quer que Ele morra E no dia seguinte quando Ela se levanta Ele perce-be um sulco de dor que daacute uma majestade uma gravidade uma interio-ridade agrave fisionomia drsquoEla que eacute verdadeiramente indes-critiacutevel

Imaginemos Nossa Senhora ten-do conhecimento profeacutetico dos milagres dos ensinamentos das paraacutebolas drsquoEle vendo a figura drsquoEle num alto de um monte que passa A Paixatildeo a Cruz a morte e a gloacuteria da Ressurreiccedilatildeo Quem poderia imaginar tudo isso adequadamente Ningueacutem

Quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho no Coleacutegio Satildeo Luiacutes

No Coleacutegio Satildeo Luiacutes havia um quadro da Matildee do Bom Conselho colocado no retaacutebulo do uacutenico altar da modesta capela que era uma sala transformada em ca-pela Inuacutemeras vezes entrei laacute Por exemplo para cele-brar o mecircs de maio em honra de Nossa Senhora diaria-mente todos os alunos entravam na capela cantando Eu olhava para a imagem naturalmente e minha atenccedilatildeo era solicitada por duas coisas muito desiguais uma era a Matildee de Deus e outra o Menino Jesus mas tomados em tese como a Doutrina Catoacutelica os considera e como a mente de uma crianccedila pode alcanccedilar

E pensava ldquoEacute a Matildee de Deus Maria Santiacutessima que me deu aquela graccedila no Coraccedilatildeo de Jesus3 e estaacute aqui sob outra invocaccedilatildeo outra roupagem Mas eacute Ela E vou rezar para Ela porque jaacute vi como eacute misericordiosa comigo Sem a misericoacuter-

dia drsquoEla eu natildeo me arranjo Mas com a misericoacuterdia drsquoEla eu alcanccedilo tudo Portan-

to eacute mais uma oportunidade de me unir bem a Ela e rezar a Ela para alcanccedilar esta uniatildeordquoEu sabia que o tiacutetulo a invocaccedilatildeo drsquoEla era

Mater Boni Consilii portanto Matildee do Bom Conselho E tentei algumas vezes rezar para esta invocaccedilatildeo que eu notava ser excelente mas natildeo me dizia grande coi-sa A piedade eacute assim agraves vezes uma invocaccedilatildeo excelente natildeo nos fala muito agrave alma

De maneira que isto ficou assim ateacute eu ler um livro so-bre Nossa Senhora de Genazzano pouco antes de sofrer aquela crise de diabetes4 e depois suceder tudo quanto sucedeu Seria mais ou menos como um facho de luz que nasce pequenino de uma lacircmpada pequena mas forte e que depois se torna imenso Assim seria essa primeira vi-sualizaccedilatildeo minha de Nossa Senhora de Genazzano   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2641985)

1) Jo 1 142) Cf Pr 8 313) Ver Revista Dr Plinio n 1 p 4-74) Ver Revista Dr Plinio n 21 p 20-21

Arqu

ivo R

evist

a

Arq

uivo

Rev

ista

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 26: Revista Doctor Plinio 205_201504

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

26

Martiacuterio de Satildeo Pedro de Verona

8 Beato Domingos do Santiacutessimo Sacramento Iturrate presbiacutetero (dagger1927) Sacerdote Trinitaacuterio que se dedicou a promover a salvaccedilatildeo das almas Morreu em Belmonte Es-panha dois anos depois de ter sido ordenado

9 Beato Ubaldo de Sansepolcro presbiacutetero (dagger1315) Apoacutes uma juventude dissipada em Florenccedila tornou-se sa-cerdote da Ordem dos Servos de Maria ao ouvir um ser-matildeo de Satildeo Filipe Beniacutecio

10 Santa Madalena de Canossa virgem (dagger1835) Re-nunciou agraves riquezas para seguir a Cristo e fundou os ins-titutos das Filhas e dos Filhos da Caridade em Verona Itaacutelia

11 Satildeo Estanislau de Cracoacutevia bispo e maacutertir (dagger1079)Santa Gema Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana

insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo do Senhor e pelos so-frimentos suportados com paciecircncia Morreu em Lucca Itaacutelia aos 25 anos num Saacutebado Santo

12 II Domingo de Paacutescoa Domingo da Divina Miseri-coacuterdia

Satildeo Juacutelio I Papa (dagger352) Defendeu tenazmente os prin-ciacutepios do Conciacutelio de Niceia durante a perseguiccedilatildeo ariana e protegeu Santo Atanaacutesio contra as acusaccedilotildees acolhen-do-o durante seu exiacutelio

13 Satildeo Martinho I Papa e maacutertir (dagger656)Beata Ida viuacuteva (dagger1113) Ficando viuacuteva de Eustaacutequio

II conde de Bolonha Franccedila dedicou-se por inteiro agraves obras de piedade e de caridade Matildee de Godofredo de Bouillon

14 Satildeo Bento de Avignon (dagger1184) Jovem pastor que por inspiraccedilatildeo celeste construiu em Avignon Franccedila uma ponte sobre o rio Roacutedano

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austeridade e oraccedilatildeo no mosteiro de Landelles Franccedila e foi assiacuteduo na assistecircncia aos pobres e enfermos

16 Satildeo Magno maacutertir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-das Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacutelica e foi assassinado trai-ccediloeiramente durante tratativas de paz com seu adversaacuterio no principado

17 Beata Mariana de Jesus virgem (dagger1624) Vencendo a oposiccedilatildeo do pai tomou o haacutebito da Ordem Mercedaacuteria

1 Satildeo Gilberto bispo (daggerc 1245) Erigiu a catedral em Dornoch Escoacutecia e fundou vaacuterios hospiacutecios Governou a diocese de Caithness durante 20 anos

2 Satildeo Francisco de Paula eremita (dagger1507)Satildeo Domingos Tuoc presbiacutetero e maacutertir (dagger1839) Do-

minicano martirizado na perseguiccedilatildeo religiosa em Xuong Dien Vietnatilde

3 Sexta-Feira da Paixatildeo do SenhorSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero (dagger1884) Sacerdote da

Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou a Congregaccedilatildeo das Ir-matildes da Divina Providecircncia em Udine Itaacutelia

4 Saacutebado SantoSanto Isidoro bispo e Doutor da Igreja (dagger636)Beato Joseacute Bento Dusmet bispo (dagger1894) Religioso be-

neditino que apoacutes ser nomeado Bispo da Catacircnia Itaacutelia promoveu o culto divino e a instruccedilatildeo cristatilde do povo

5 Domingo da Paacutescoa da Ressurreiccedilatildeo do SenhorSatildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1419)Santa Maria Crescecircncia Houmlss virgem (dagger1744) Religio-

sa franciscana que foi mestra de noviccedilas e superiora em Kaufbeuren Alemanha

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Fi-

lho de maniqueus abra-ccedilou a Feacute Catoacutelica ain-

da crianccedila e tornou-se dominicano Comba-teu a heresia ateacute ser assassinado em Mi-latildeo Itaacutelia

7 Satildeo Joatildeo Ba-tista de la Salle presbiacutetero (dagger1719)

Santo Aiberto presbiacutetero e mon-

ge (dagger1140) Recitava todos os dias o Salteacute-

rio junto ao mostei-ro de Crespin Fran-ccedila e ministrava o Sa-cramento da Penitecircn-cia aos penitentes que a ele acorriam

Reproduccedilatildeo

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 27: Revista Doctor Plinio 205_201504

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash abril ndashndashndashndash

27

Santa Catarina de Sena

Satildeo Vicente Ferrer

santiebeatiit

Rep

rodu

ccedilatildeo

em Madri e ofereceu suas oraccedilotildees e penitecircncias pelos po-bres e necessitados

18 Beata Sabina Petrilli virgem (dagger1923) Fundadora da Congregaccedilatildeo das Irmatildes dos Pobres de Santa Catarina de Sena falecida na Toscana Itaacutelia

19 III Domingo de PaacutescoaBeato Bernardo penitente (dagger1182) Para expiar os pe-

cados da juventude partiu descalccedilo e quase sem alimentos em peregrinaccedilatildeo pela Terra Santa Morreu no Mosteiro de Saint-Bertin Franccedila

20 Beato Anastaacutesio Pankiewicz presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1942) Sacerdote franciscano polonecircs morto no ca-minho que conduz de Dachau a Hartheim Aacuteustria Deu teste-munho de sua feacute ateacute a morte

21 Santo Ansel-mo bispo e Doutor da Igreja (dagger1109) Ver paacutegina 28

22 Satildeo Teodoro de Sykeon bispo e abade (dagger613) Jovem anaco-reta fundou um mos-teiro para atender os numerosos disciacutepulos que o procuravam Eleito Bispo de Anas-tasioacutepolis pediu para voltar agrave vida eremiacuteti-ca Morreu em Syke-on atual Turquia

23 Santo Adalberto de Praga bispo e maacutertir (dagger997)Satildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Gerardo bispo (dagger994) Durante os 31 anos em

que foi Bispo de Toul Franccedila deu agrave cidade oacutetimas leis dedicou a catedral ajudou os mosteiros alimen-tou os pobres e veio em socorro do povo em tempo de peste

24 Satildeo Fideacutelis de Sigma-ringa presbiacutetero e maacutertir (dagger1622)

Beata Maria Isa-bel Hesselblad vir-gem (dagger1957) Na-tural da Sueacutecia que apoacutes um lon-go tempo de ser-viccedilo num hospital reformou a Or-dem de Santa Briacute-gida dedicando-se agrave contemplaccedilatildeo e agrave caridade em Roma

25 Satildeo Marcos Evangelista

Satildeo Pedro de Satildeo Jo-seacute Betancur religioso (dagger1667) Irmatildeo da Ordem Terceira Franciscana fundou a Ordem dos Bethlemitas em Antigua Guatemala

26 IV Domingo de PaacutescoaMatildee do Bom Conselho Ver paacutegina 22Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten religioso (dagger1938) Monge da

Trapa de Santo Isidoro de Duentildeas em Palecircncia Espanha Sendo ainda noviccedilo atingido por uma grave enfermidade suportou tudo com paciecircncia falecendo aos 27 anos

27 Satildeo Pedro Armengol religioso (dagger1304) Ver paacutegina 2

28 Satildeo Pedro Chanel presbiacutetero e maacutertir (dagger1841)Satildeo Luiacutes Maria Grignion de Montfort presbiacutetero

(dagger1716)

29 Santa Catarina de Sena virgem e Doutora da Igre-ja (dagger1380)

Santo Acardo Bispo (dagger1172) Sendo abade de Satildeo Viacute-tor em Paris escreveu vaacuterias obras para conduzir as al-mas rumo agrave perfeiccedilatildeo Foi mais tarde Bispo de Avranches Franccedila

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)Santa Maria da Encarnaccedilatildeo religiosa (dagger1672) Apoacutes

a morte do marido fez profissatildeo religiosa nas Ursulinas em Tours Franccedila Fundou a casa destas religiosas em Queacutebec Canadaacute

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 28: Revista Doctor Plinio 205_201504

D

Santo Anselmo varatildeo de muitas lutas

28

Hagiografia

Os grandes homens que marcaram a Idade Meacutedia mdash entre os quais se destaca Santo Anselmo mdash patenteiam a solidez a forccedila a grandeza dessa eacutepoca histoacuterica que

contrastam com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coisas de nossos dias

la do martiacuterio natildeo veio completar tanta gloacuteria pode-se di-zer que a palma faltou a Anselmo mas que ele natildeo faltou agrave sua palma Sua vida foi toda entregue agraves lutas pela liber-dade da Igreja Nele o cordeiro revestiu-se do vigor do leatildeo ldquoCristo dizia natildeo quer uma escrava para esposa Nada Ele ama tanto no mundo quanto a liberdade de sua Igrejardquo O nome de Anselmo lembra a mansidatildeo do homem do claus-tro unida agrave firmeza episcopal a ciecircncia junto com a pieda-de Nenhuma memoacuteria foi mais suave e ao mesmo tempo mais brilhante do que a sua

Um varatildeo que marcou o seacuteculo XI

Notem as lutas que esse santo precisou enfrentar em plena Idade Meacutedia Ele parece natildeo ter tido mdash ao me-nos segundo esses traccedilos biograacuteficos mdash especiais lutas em seu convento Mas ele teve dois grandes inimigos a vencer um rei prepotente que queria sujeitar a Igreja agrave sua autoridade e os cismaacuteticos gregos que reunidos no Conciacutelio de Bari com os catoacutelicos ele conseguiu persua-dir mas de maneira efecircmera de que a doutrina catoacutelica era verdadeira

Ele ao mesmo tempo foi um homem que viajou mui-to Era italiano depois foi para a Normandia Inglaterra Bari Roma E numa eacutepoca em que essas viagens repre-sentavam empreender um enorme esforccedilo Eram feitas em estradas peacutessimas com riscos de toda ordem muita dificuldade lentidatildeo etc

Um homem favorecido por Nosso Senhor por espe-ciais graccedilas e que levou a bom termo tudo aquilo de que foi incumbido como abade foi muitiacutessimo estimado Ar-cebispo de Cantuaacuteria ele empreendeu uma luta rigo-

ia 21 de abril comemora-se a festa de San-to Anselmo de Cantuaacuteria bispo confessor e Doutor da Igreja cuja biografia apresenta os

seguintes traccedilos1

Mansidatildeo do cordeiro e vigor do leatildeo

Anselmo nasceu em Aosta no Piemonte de famiacutelia no-bre Como o pai o afastasse da vida religiosa entregou-se aos prazeres durante alguns anos Mas aos 26 anos entrou na abadia de Bec na Normandia onde se entregou agrave prati-ca das virtudes religiosas e ao estudo das Escrituras Aos 30 anos tornou-se prior e em seguida abade

Governou sua abadia com uma bondade incansaacutevel que lhe permitiu triunfar de todas as dificuldades Os Pa-pas Gregoacuterio VII e Urbano II manifestaram-lhe grande es-tima ldquoO bom odor de vossas virtudes chegou ateacute noacutesrdquo es-crevia-lhe Gregoacuterio e Urbano II diz ldquoVinde caacute o mais de-pressa possiacutevel a fim de podermos gozar juntos da afeiccedilatildeo que nos unerdquo

Chamado agrave Inglaterra em 1092 natildeo pocircde voltar agrave Fran-ccedila pois foi nomeado Arcebispo de Cantuaacuteria Nesse cargo muito sofreu do Rei Guilherme o Ruivo pela defesa dos di-reitos e liberdade da Igreja Exilado foi a Roma onde o Pa-pa o cumulou de honras e lhe deu ocasiatildeo no Concilio de Bari de convencer do seu erro os gregos que negavam que o Espiacuterito Santo procedesse do Filho como do Pai

Voltando agrave Inglaterra apoacutes a morte de Guilherme San-to Anselmo morreu a 21 de abril de 1109 Clemente XI em 1720 o declarou Doutor da Igreja

Monge bispo Doutor Anselmo reuniu em sua pessoa os grandes apanaacutegios do cristatildeo privilegiado E se a aureacuteo-

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 29: Revista Doctor Plinio 205_201504

29

rosa contra o rei e acabou sendo reintegrado na sua sede episcopal lutando contra os cismaacuteti-cos conseguiu persuadi-los de seus er-ros Depois extinguiu-se na alegria e no amor de todos pela vida que tinha levado porque a morte dos santos eacute muito mais uma alegria do que uma fonte de tristeza

Vemos entretanto qual a na-tureza da verdadeira grandeza da Idade Meacutedia esse homem marca o seacuteculo XI pela sua ciecircncia sua pie-dade pelas suas lutas e leva a Cau-sa Catoacutelica agrave vitoacuteria

Entatildeo considerando a vida de-le tem-se a impressatildeo de uma for-taleza formidaacutevel de um homem que encheu o seu tempo venceu e cuja gloacuteria perdura por todos os seacuteculos por causa das vitoacuterias que ele obteve em favor da Feacute Quando se olha isso fica-se com a sensaccedilatildeo da solidez da forccedila da grandeza de to-da a Idade Meacutedia que contrasta com a pequenez o efecircmero a iacutendole de ldquomateacuteria plaacutesticardquo de todas as coi-sas de nossos dias E essa impressatildeo natildeo eacute falsa eacute verda-deira porque nos mostra a solidez da estatura dos gran-des homens que marcaram a Idade Meacutedia

Precisamos lutar sempre com os olhos postos em Nossa Senhora

Mas de fato ele teve muitas lutas E se natildeo tivesse ha-vido campeotildees como ele a Igreja teria perecido Na Ida-de Meacutedia havia uma batalha contiacutenua a solidez natildeo con-sistia em natildeo haver luta mas em que a boa reaccedilatildeo ven-cia sempre e era portanto nesse sentido soacutelida Entre-tanto por um pouco que os homens fraquejassem a coi-sa poderia cair

Podemos vislumbrar de antematildeo qual vai ser a soli-dez e a precariedade do Reino de Maria A solidez seraacute enorme enquanto houver homens de uma grande firme-za dispostos a lutar em todos os sentidos Entatildeo o Rei-no de Maria poderaacute durar seacuteculos e seacuteculos

Se encontrar homens fracos ele soccedilobraraacute imediata-mente porque o reino do democircnio se tornaraacute forte pois estamos numa humanidade marcada pelo pecado origi-nal e num mundo imerso na presenccedila dos tais democircnios dos ares de que falava Satildeo Paulo2

Portanto eacute preciso estar lutando sempre com uma energia inquebrantaacutevel uma atividade contiacutenua um des-prendimento de si inteiro tendo os olhos postos comple-tamente em Nossa Senhora para que a luta seja levada a

bom termo Mas encontrando autecircnticos lutado-res verdadeiramente dependentes da Santiacutes-

sima Virgem a causa eacute solidiacutessima ela vence mesmo A questatildeo eacute haver quem

lute por Ela Peccedilamos a Nossa Senhora que nos

decirc forccedilas e nos compenetre da verda-de para entendermos bem o seguin-te agora como durante o Reino de Maria a nossa vida deve ser de luta constante e no dia em que natildeo tiver-mos lutado precisamos nos compe-netrar de que natildeo carregamos a Cruz de Cristo e que esse foi um dia frus-trado em nossa existecircncia

Natildeo lutar eacute natildeo sofrer natildeo so-frer eacute natildeo carregar a Cruz de Cris-to Para um catoacutelico um dia passa-

do longe da Cruz de Cristo longe de Maria Santiacutessima eacute um dia cancela-

do um dia em branco

Ordenado arcebispo apesar de seus protestos

Temos agora uma nota sobre a sagraccedilatildeo de Santo Ansel-mo extraiacuteda da ldquoVida dos Santosrdquo do Padre Rohrbacher3

Decidiram os bispos ingleses sagrar Santo Anselmo Ar-cebispo de Cantuaacuteria mas ele recusou terminantemente porque sabia da intromissatildeo real neste cargo

Mostraram-lhe os prelados as consequecircncias de sua ne-gativa para a Inglaterra Replicou o Santo que conhecia tais problemas mas que era velho mal conseguindo car-regar a si proacuteprio como poderia levar o fardo de toda uma Igreja Por outro lado natildeo era de sua iacutendole cuidar de ne-goacutecios temporais

ldquoConduzi-vos somente nos caminhos de Deus noacutes nos en-carregamos dos negoacutecios temporaisrdquo replicaram os prelados

Alegou Anselmo suas muacuteltiplas obrigaccedilotildees e a impossi-bilidade de abandonaacute-las Resistindo ainda levaram-no ao soberano que se encontrava gravemente enfermo

O rei aflito disse-lhe ldquoAnselmo que fazes Por que me envias ao Inferno Lembra-te da amizade que meus pais ti-nham por ti e natildeo me deixes perecer porque sei que estou condenado a morrer conservando este Arcebispadordquo To-dos os assistentes comovidos insistiam com Santo Ansel-mo acusando-o de matar o rei

O Santo voltou-se para os dois monges que o acompa-nhavam e disse ldquoMeus irmatildeos por que natildeo me socorreisrdquo

Um deles respondeu ldquoSe esta eacute a vontade de Deus quem somos noacutes para resistir-Lherdquo

ldquoAi mdash disse Anselmo mdash Voacutes vos rendestes mui pronta-menterdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 30: Revista Doctor Plinio 205_201504

30

Hagiografia

Vendo-o assim obstinado acusaram-no de covardia Buscaram uma cruz tomaram-lhe o braccedilo direito e o apro-ximaram do leito O rei lhe apresentou a cruz mas ele fe-chou a matildeo Os bispos empenharam-se em abri-la ateacute fazecirc--lo gritar Por fim seguram-lhe a matildeo com a cruz dizendo ldquoViva o bispordquo e entoaram o ldquoTe Deumrdquo Levaram-no agrave igreja vizinha e sob seus protestos sagraram-no

Fato estranho e magniacutefico ao mesmo tempo

Maus reis queriam eliminar a liberdade da Igreja

Para compreender um pouquinho o conjunto dos acontecimentos eacute preciso tomar em consideraccedilatildeo o se-guinte Cantuaacuteria eacute a mais antiga diocese portanto a se-de primacial da Inglaterra E naquele tempo mais do que hoje os arcebispos e os primazes tinham certa juris-diccedilatildeo certa influecircncia sobre os bispos de seu paiacutes

Estava-se num periacuteodo de comunicaccedilotildees com Roma devido agrave distacircncia muito difiacuteceis e natildeo havia um corpo de nuacutencios apostoacutelicos inteiramente organizado De ma-neira que se fazia sentir mais do que hoje em dia a ne-cessidade dos bispos de um determinado paiacutes se apoia-rem sobre um que fosse a pedra de acircngulo de todos e es-te era o Arcebispo de Cantuaacuteria

Esse arcebispo tinha muita importacircncia por outro lado estava-se num periacuteodo em que a Revoluccedilatildeo mdash em sua for-ma absolutamente ancestral e original nem se pode ainda falar de Revoluccedilatildeo mdash ou melhor os germes dos quais fu-turamente a Revoluccedilatildeo nasceria se exprimiam sob a for-ma de um desejo do poder temporal Quer dizer dos che-fes de Estado em concreto dos reis de se apoderarem da liberdade dos atributos da Igreja transformando-a num instrumento de dominaccedilatildeo material

Os soberanos natildeo queriam por exemplo que os bis-pos os censurassem porque havia naquele tempo muitos bispos que repreendiam os reis e os poderosos Eles que-riam se assenhorear dos bens com que a Igreja socorria inuacutemeros pobres e mantinha o esplendor do culto divino

O medo do Inferno leva muitas pessoas para o Ceacuteu

Por outro lado os bispos eram muitas vezes senho-res feudais e constituiacuteam um elemento de imparcialidade dentro do jogo da vida feudal Certos reis movidos por mau espiacuterito queriam se assenhorear dos feudos eclesi-aacutesticos para por esta forma combater os outros senho-res feudais

E isto tudo fazia com que os reis tivessem uma preo-cupaccedilatildeo constante de nomear para os cargos importan-tes bispos que fossem seus instrumentos

Entatildeo Santo Anselmo monge jaacute idoso com inuacutemeros serviccedilos prestados agrave Igreja era desejado ardentemente pelo rei e pelos bispos para ser Arcebispo de Cantuaacuteria

Pelos bispos porque era um liacuteder natural para defendecirc--los contra o rei Pelo rei porque este jaacute tinha tido dificulda-des com a Igreja mas estava doente e temia morrer E ele achava que ia para o Inferno se antes de falecer natildeo evitas-se para a Igreja a cataacutestrofe de uma maacute nomeaccedilatildeo por isso ele queria nomear um bom arcebispo para Cantuaacuteria

Quer dizer o rei estava com a espada da ameaccedila do Inferno colocada no peito e noacutes sabemos que o medo do Inferno tem levado muita gente para o Ceacuteu Para a grande maioria dos homens poucas coisas fecham tanto a porta do Inferno quanto o medo de ir para laacute

Entatildeo todos queriam que Santo Anselmo ficasse Ar-cebispo de Cantuaacuteria

Uma violecircncia tipicamente medieval

Aiacute se daacute a cena muito curiosa Os bispos pedem ele recusa dando um argumento que estaacute agrave altura de um Santo Natildeo eacute um argumento baseado em falsa modeacutes-tia mas eacute uma coisa verdadeira Sendo um homem velho que mal se carrega a si proacuteprio exausto por anteriores serviccedilos agrave Igreja eacute natural que ele tenha receio de natildeo conseguir desempenhar satisfatoriamente um cargo tatildeo pesado e portanto procure tirar o corpo

Tanto mais que ele devia conhecer bem o rei e sua en-tourage e o Santo poderia conjecturar que o rei tendo jaacute criado encrenca com a Igreja criaria outra caso ficas-se curado mdash como diz o ditado cesteiro que faz um ces-to faz um cento

Os sucessores do monarca que faziam parte daquela entourage do palaacutecio tinham a mesma mentalidade San-to Anselmo teria que travar uma luta portanto contra o poder temporal coisa muito mais difiacutecil do que qualquer outra batalha E ele naturalmente temia por sua proacutepria fraqueza achava que um homem moccedilo estaria mais em condiccedilotildees de conduzir essa luta

Mas tal era a forccedila da virtude dele a confianccedila que ti-nham no auxiacutelio que a graccedila lhe prestaria que todos que-riam que ele ficasse arcebispo

Entatildeo se daacute esta cena Os bispos natildeo conseguindo na-da levam Santo Anselmo ao quarto onde o rei estava do-ente Depois de muita insistecircncia acaba havendo uma espeacutecie de violecircncia bem medieval

Pegam uma cruz e dizem ao rei ldquoPotildee na matildeo delerdquo O Santo declara ldquoNatildeo natildeo querordquo

Com forccedila abrem a matildeo dele a ponto de doer ele se-gura a cruz e levam-no entatildeo para ser sagrado

Por meio dessa violecircncia material que talvez tivesse tido um caraacuteter afetuoso e feita no meio de sorrisos mdash

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 31: Revista Doctor Plinio 205_201504

31

a crocircnica eacute muda a respeito deste particular mdash o que houve foi isto Mas o fato eacute tatildeo estranho que natildeo eacute de se repelir como absurda a hipoacutetese deste ter sido feito no meio de sorrisos

Houve um momento em que Santo Anselmo pelo ex-tremo desejo dos outros que chegou ateacute agrave violecircncia re-solveu ceder Ceder natildeo mais coagido fisicamente mas moralmente persuadido de que ele natildeo deveria resistir a um anseio tatildeo unacircnime

E entatildeo ele mesmo aceitou a sagraccedilatildeo a qual natildeo aceitaria se estivesse convencido de que outra era a von-tade de Deus Ele teria certamente mdash sendo um Santo mdash morrido maacutertir mas natildeo se deixaria sagrar se tal fosse a vontade do Altiacutessimo Seria o primeiro caso de martiacuterio de um padre que se faz matar para natildeo ser bispo

Uma vez que Santo Anselmo estaacute no Ceacuteu devemos es-tar persuadidos de que ele de fato quis em determinado momento e por esta forma ele foi Arcebispo de Cantuaacuteria

Devemos ser insistentes em nossas oraccedilotildees

Podiacuteamos nos perguntar se essa violecircncia feita na pes-soa dele eacute censuraacutevel Agraves vezes a graccedila na sua sabedo-ria e imensa liberdade de movimentos se serve de meios muito estranhos Meios imorais ou ilegiacutetimos jamais Meios surpreendentes e desconcertantes bem possivel-mente

Quem sabe se a graccedila quis que a insistecircncia chegasse ateacute esse ponto para mostrar o desapego deste homem e depois lhe dar mais liberdade de lutar contra o rei mos-trando que ele tinha sido forccedilado a aceitar o cargo

De qualquer forma lembramo-nos das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo no Evangelho ldquoO Reino dos Ceacuteus padece violecircnciardquo4 Eacute preciso fazer violecircncia para se entrar no Ceacuteu

Agraves vezes eacute necessaacuterio fazer ateacute uma santa violecircncia com Deus O proacuteprio Redentor contou aquela paraacutebola admiraacutevel de um homem que estaacute deitado na cama jun-to com seus filhos e um indiviacuteduo cacete bate do lado de fora pedindo patildeo

O dono da casa explica que jaacute estaacute deitado e natildeo pode atender Afinal o outro eacute tatildeo cacete que o primeiro se le-vanta abre a porta e lhe daacute os patildees

E Nosso Senhor afirma que o dono da casa atendeu por causa da importunidade do outro e acrescenta que isto eacute o modelo daquele que reza

Quer dizer quando natildeo temos meacuteritos devemos ser muito insistentes Porque agrave forccedila de insistecircncia como que caceteamos a Deus Nosso Senhor e obtemos aquilo que noacutes queremos

No caso ocorrido com Santo Anselmo houve qualquer coisa de parecido com isso e vemos as vias superiores de

Deus insondaacuteveis nem sempre inteiramente explicaacuteveis e que formam uma das belezas da Histoacuteria da Igreja

Misteacuterios de Deus e da vida da Igreja

Se na Histoacuteria da Igreja tudo fosse explicavelzinho clarinho limpinho natildeo seria a Histoacuteria da Igreja de Deus Faltaria a ela uma das notas daquilo que eacute verda-deiramente divino

Naquilo que eacute autenticamente divino precisaria haver misteacuterio E vou dizer mais quanto mais claro que deter-minada coisa eacute divina tanto mais conveacutem que nela ha-ja misteacuterios Porque a presenccedila do misteacuterio eacute uma marca de superioridade divina que impotildee respeito aos homens

Aqui tambeacutem satildeo os misteacuterios da vida da Igreja os fa-tos misteriosos por onde Deus mostra a sua divina gran-deza Depois as coisas se explicam

Com certeza para alguns contemporacircneos de Nosso Senhor a Paixatildeo haacute de ter parecido um misteacuterio inexpli-caacutevel e foi preciso a Ressurreiccedilatildeo para que se compreen-desse esse misteacuterio

Atualmente noacutes estamos em presenccedila do maior mis-teacuterio dentro de vinte seacuteculos de vida da Igreja Creiamos na divindade dela e amemos a Santa Igreja Catoacutelica mais do que nuncahellip eu jamais diria apesar do misteacuterio mas sim por causa deste misteacuterio

Soacute uma Igreja santa e divina pode ter uma fortaleza uma grandeza tal que nela caiba um misteacuterio tatildeo profun-do tatildeo tenebroso Eacute preciso ser uma Igreja divina para natildeo morrer deste misteacuterio para atravessar a era de mis-teacuterio e do outro lado se mostrar gloriosa e resplande-cente como se tivesse ressuscitado

Noacutes desse pequeno fato misterioso da vida de Santo Anselmo devemos voar para regiotildees muito mais altas dos grandes misteacuterios da Igreja Catoacutelica E entatildeo faccedilamos ho-je agrave noite a Nossa Senhora um ato de amor pelo misteacute-rio tremendo diante do qual noacutes vivemos certos de que os grandes misteacuterios tecircm depois as suas grandes explicaccedilotildees

Nunca um homem se defrontou com um misteacuterio tatildeo terriacutevel quanto Satildeo Joseacute mas depois que explicaccedilatildeo que esclarecimento Eacute a explicaccedilatildeo das explicaccedilotildees   v

(Extraiacutedo de conferecircncias de 2041966 e 2041967)

1) Natildeo dispomos dos dados bibliograacuteficos da obra citada por Dr Plinio

2) Cf Ef 6 123) Cf ROHRBACHER Reneacute Franccedilois Vies des Saints pour

tous les jours de lrsquoanneacutee Volume II Paris Gaume fregraveres li-braires-eacutediteurs 1853 p 401-410

4) Mt 11 12

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 32: Revista Doctor Plinio 205_201504

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

Hed

wig

Sto

rch

(CC

30

)

Sendo um estilo artiacutestico expressatildeo da mentalidade de um povo ou de uma aacuterea de civilizaccedilatildeo em determinada

eacutepoca pode ele sofrer variaccedilotildees ser copiado ou substituiacutedo por outro Dr Plinio aborda estas e outras interessantes

questotildees em torno do tema ldquoarterdquo

De requinte em requinte

Se houvesse uma arte moderna contemporacircnea boa teria propoacutesito restaurar as coisas coloniais Natildeo eacute legiacutetimo que artisticamente falando as coi-

sas evoluam e que cada eacutepoca tenha o estilo que lhe eacute proacute-prio Natildeo eacute isso uma coisa adequada conveniente Noacutes natildeo vemos cada paiacutes ter seu estilo proacuteprio Natildeo notamos como na civilizaccedilatildeo ocidental o goacutetico foi substituiacutedo pe-la arte da Renascenccedila e depois por outras formas artiacutesticas sucessivas Entatildeo se cada eacutepoca criou um estilo proacuteprio por que haveremos de rejeitar um estilo suposto bom de nossa proacutepria eacutepoca Isso pareceria ser uma coisa antina-tural um conservantismo levado ao excesso

Distinccedilatildeo entre os estilos e os seus matizes

Imaginemos uma construtora que fizesse casas de es-tilo antigo bonitas confortaacuteveis poreacutem que se prestas-sem agrave seguinte criacutetica de caraacuteter artiacutestico e natildeo funcio-nal satildeo coacutepias em nossos dias de um estilo que natildeo eacute de

hoje Portanto um estilo morto Ora copiar eacute intrinseca-mente uma falta de originalidade Eacute ateacute uma coisa arti-ficial copiar algo que morreu E nesse sentido essa accedilatildeo conservadora eacute um mal

Parece-me que eacute preciso fazer uma distinccedilatildeo entre o estilo e os matizes dentro do mesmo estilo Quer dizer o estilo po-de continuar igual a si mesmo passando por matizes por va-riantes Mas ele eacute sempre o mesmo estilo Entatildeo a pergunta se desdobra Primeiro o estilo deve variar Em segundo lu-gar ele deve mudar em seus matizes internos Em terceiro lugar um povo uma civilizaccedilatildeo devem variar de estilo

Seria mais interessante tratar da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo para depois abordar a mudanccedila de matizes que eacute um assunto menos importante e que se resolve dentro da questatildeo da variaccedilatildeo de estilo

Todo estilo eacute o produto de um estado de espiacuterito E eu chamo estado de espiacuterito um conjunto de verdades fun-damentais ou de princiacutepios mdash agraves vezes natildeo verdadeiros mdash a partir dos quais uma determinada civilizaccedilatildeo vecirc o

A Grande Esfinge e a piracircmide de Queacuteops - Planalto de Guizeacute Egito

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 33: Revista Doctor Plinio 205_201504

33

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

Den

nis

Jarv

is (

CC

30

)

homem e o universo e o estado temperamental com que a civilizaccedilatildeo adota essa vivecircncia

Mentalidade e estilo

Tomemos por exemplo o estilo egiacutepcio Eacute evidente que ele comporta uns tantos princiacutepios que natildeo satildeo pura-mente artiacutesticos mas filosoacuteficos e filosoacuteficos do mais al-to porte porque metafiacutesicos

Eacute evidente tambeacutem que a partir desses princiacutepios me-tafiacutesicos os egiacutepcios elaboraram uma visatildeo do universo de toda a realidade material e modelaram essa visatildeo de acordo com aqueles princiacutepios metafiacutesicos

As muacutemias os desenhos as esculturas satildeo compostos de figuras hieraacuteticas mas muitas delas natildeo o satildeo repre-sentam o egiacutepcio na vida quotidiana E haacute qualquer coi-sa de uma placidez profunda meditativa e ativa na coisa egiacutepcia incubada de misteacuterio que constitui propriamen-te a mentalidade do egiacutepcio Ora o estilo egiacutepcio foi uma expressatildeo dessa mentalidade

E o estilo medieval o goacutetico foi igualmente uma ex-pressatildeo da mentalidade catoacutelica

Entatildeo se o estilo eacute a consequecircncia necessaacuteria de uma mentalidade a questatildeo sobre se o estilo deve ser mudado im-porta em perguntar se precisa ser mudada a mentalidade

Mudanccedila de matizes

Se focircssemos apelar para o exemplo da Histoacuteria seriacutea-mos levados a dizer que todos os grandes povos que sur-gem e definem a sua mentalidade de certo modo cons-tituem um estilo e natildeo saem mais dele e esse estilo natildeo decai natildeo degenera Ele continua a produzir obras bo-as e dignas indefinidamente ateacute que um fator extriacutenseco derruba uma determinada ordem de coisas

Por exemplo o estilo chinecircs nasceu desde quando Com variantes eacute evidente formou-se ao longo de quantos seacutecu-los Noacutes natildeo podemos dizer que o estilo chinecircs esteja mo-ribundo Se os ocidentais natildeo tivessem entrado na China e derrubado certas barreiras culturais natildeo tivessem feito im-posiccedilotildees o estilo chinecircs teria continuado indefinidamente

E as obras chinesas elaboradas mesmo no seacuteculo XIX de modo ainda artesanal natildeo eram dominadas pela preocupa-ccedilatildeo de produzir para trazer dinheiro e eram de muito boa cultura e de muito bom quilate Natildeo se pode falar de uma ar-te chinesa de decadecircncia Isso se pode dizer do Egito de Ro-ma da Greacutecia da Peacutersia dos assiacuterios enfim de todos os po-vos antigos Entatildeo a conclusatildeo seria a seguinte eacute preciso natildeo mudar de mentalidade e portanto natildeo variar de estilo Um povo elabora esse estilo fica com este estilo ateacute o fim

Contudo toda mentalidade mesmo quando continua igual a si mesma muda de matizes Um homem confor- Monumentos chineses

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 34: Revista Doctor Plinio 205_201504

34

aPoacuteStoLo Do PuLcHrum

me o estado de espiacuterito o dia as circunstacircncias varia de matizes Entatildeo poder-se-ia dizer que um estilo pode ser matizado mas natildeo propriamente mudar Matizar-se sim mudar fundamentalmente natildeo

Essa conclusatildeo de que sendo um estilo o produto de uma mentalidade que natildeo deve variar nunca consequen-temente ele jamais deve mudar dentro de um mesmo po-vo por mais antipaacutetica que seja a certos feitios tempe-ramentais e por mais evidente que possa parecer a cer-tos espiacuteritos loacutegicos de fato natildeo me parece inteiramente acertada e tenho reservas seacuterias quanto a ela

O progresso soacute surgiu com a Civilizaccedilatildeo Catoacutelica

As reservas procedem do seguinte essa imobilidade dos estilos pagatildeos dos estilos antigos resulta eacute verdade de uma mentalidade muito definida amadurecida Mas haacute outro aspecto a ser considerado Todos os povos antigos estavam sujeitos a uma lei que poderiacuteamos chamar ldquolei da limitaccedilatildeo do progressordquo Quer dizer todos eles chega-vam a certo auge ateacute relativamente depressa mas depois paravam e natildeo progrediam mais E natildeo se pode dizer que um povo antigo tenha progredido mais do que outro por exemplo os romanos em relaccedilatildeo aos egiacutepcios Aqueles eram muito superiores aos egiacutepcios em muitas coisas Mas em outras os egiacutepcios eram muito superiores aos romanos Natildeo havia o que noacutes chamamos de progresso quer dizer um povo que aparece incorpora a si todas as coisas bo-as de uma civilizaccedilatildeo antecedente e vai indo para a frente

O progresso propriamente dito apareceu com a Civi-lizaccedilatildeo Catoacutelica Foi uma mobilidade uma elasticidade uma vitalidade que a sociedade humana tomou batizando--se e que lhe deu exatamente a possibilidade de modifica-ccedilatildeo que noacutes notamos na melhor parte da Histoacuteria catoacutelica

Igrejas de Satildeo Francisco de Assis e de Nossa Senhora do Carmo - Mariana Minas Gerais Brasil

Interior da Catedral de Santiago de Compostela Espanha

Os estilos devem suceder-se agrave maneira de requinte

A elaboraccedilatildeo a partir do estilo romano do romacircnico foi uma mudanccedila Representou uma mudanccedila de caraacuteter contrarrevolucionaacuterio mdash se podemos usar assim esta pala-vra mdash porque o estilo romacircnico eacute muito mais sacral mais hieraacuterquico e mais simpaacutetico agrave alma verdadeiramente ca-toacutelica do que o estilo romano Mais ainda do romacircnico se destilou pelo bafejo da Igreja o goacutetico estilo jaacute entatildeo profundamente diferente do romacircnico De maneira que a vitalidade da Igreja produziu uma mudanccedila de estilo

Por conseguinte deveriacuteamos dizer que natildeo se devem copiar os estilos e sim modificaacute-los

Eacute bem verdade portanto que os estilos devem suceder--se uns aos outros Mas esse suceder-se natildeo pode ser agrave ma-neira do estilo moderno em relaccedilatildeo ao colonial ou outro estilo com uma ruptura e uma aceitaccedilatildeo brutal do contraacute-rio e nem pode ser uma mera diversificaccedilatildeo Porque tam-beacutem a diferenccedila de estilo natildeo eacute soacute para variar mas deve ser um particular progresso no requintar o que um estilo a mentalidade de um povo tecircm de bom fazem-se coisas que satildeo diferentes mas agrave maneira de requinte como o goacute-tico eacute o requinte do romacircnico

Vic

tor

Toni

olo

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 35: Revista Doctor Plinio 205_201504

35

Coro da Catedral Sainte-Cecile Albi Franccedila

Fachada da Catedral de Notre-Dame de Amiens Franccedila

Catedral de Santo Egiacutedio Cheadle Inglaterra

Portanto a sucessatildeo deve ser feita de requin-te em requinte que eacute a linha de progresso e de va-riedade do estilo posta em algo fundamentalmen-te conservador no essencial enquanto eacute no acessoacute-rio muito livre

A resposta agrave pergunta inicial eacute a seguinte ficar no mero colonial em princiacutepio e em condiccedilotildees nor-mais seria um mal Deixaacute-lo para fazer um estilo simplesmente diferente seria igualmente um mal porque teria sido necessaacuterio requintaacute-lo Isso me parece inteiramente loacutegico   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2451967)

Pom

sup2 (

CC

30

)

Gus

tavo

Kra

lj

Joseacute

Lui

s Fi

lpo

Cab

ana

(CC

30

)

copy C

Eph

oto

Uw

e A

rana

s (

CC

30

)

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)

Page 36: Revista Doctor Plinio 205_201504

N

ldquoEacute de noite que eacute belo acreditar na luzrdquo

Rep

rodu

ccedilatildeo

Afresco de autoria de Fra Angelico - Museu de Satildeo Marcos Florenccedila Itaacutelia

ossa Senhora acreditou na luz

durante a terriacutevel treva da Paixatildeo Nesse tremendo desamparo vendo que cada chaga era uma razatildeo humana para tornar indiscutiacutevel a morte de seu Divino Filho Ela teve uma Feacute plena

Quando Maria Santiacutessima segurou aquele cadaacutever nos braccedilos no momento em que O acolheu para ser objeto dos cuidados e levado agrave sepultura tendo aquela imensa derrota fiacutesica nas matildeos Ela via toda a impossibilidade natural da Ressurreiccedilatildeo e fazia um ato tranquiliacutessimo de Feacute ldquoEle ressuscitaraacute Eu creio porque Ele prometeurdquo

(Extraiacutedo de conferecircncia de 19111971)