dr. plinio-157-2011-04

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Publicação Mensal Ano XIV - Nº 157 Abril de 2011 Inteiramente justa, extremamente bondosa...

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Revista Doutor PlinioEditora Retornarei.

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Page 1: Dr. Plinio-157-2011-04

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XIV - Nordm 157 Abril de 2011

Inteiramente justa extremamente bondosa

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2

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Praccedila de Satildeo Pedro Roma

ada festa celebrada pela Igreja eacute acompanhada de enorme efusatildeo de graccedilas correspondentes agraves daacutedivas recebidas em vida pelo santo entatildeo celebrado Isto se daacute tambeacutem quanto aos mis-teacuterios da vida de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora que eventualmente consi-

deremos em determinada celebraccedilatildeo Ora aproxima-se o dia em que a Santa Igreja reserva para contemplarmos liturgicamente o

ldquomisteacuterio dos misteacuteriosrdquo ou seja a morte de Nosso Senhor Jesus Cristo e a redenccedilatildeo do gecircnero hu-mano

No momento em que Ele expirando disse ldquoconsummatum estrdquo e sua Alma se separou do Corpo a redenccedilatildeo se operou O gecircnero humano de perdido que era passou a ser salvo Nesse momento noacutes fomos resgatados e a fonte de todas as graccedilas se abriu para noacutes

De fato por causa de seu sacrifiacutecio Nosso Senhor Jesus Cristo eacute uma fonte de graccedilas aberta para todos noacutes este sacrifiacutecio abriu para noacutes uma infinita torrente de misericoacuterdia que nos traz toda es-peacutecie de bem e de perdatildeo desde que verdadeiramente queiramos dela nos beneficiar

(Extraiacutedo de conferecircncia de 741966)

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XIV - Nordm 157 Abril de 2011

Inteiramente justa extremamente bondosa

3

Dr PlinioDr PlinioRevista mensal de cultura catoacutelica de

propriedade da Editora Retornarei Ltda CNPJ - 023893790001-07

INSC - 115227674110

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Conselho Consultivo Antonio Rodrigues Ferreira Carlos Augusto G Picanccedilo

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Impressatildeo e acabamento Pavagraf Editora Graacutefica Ltda Rua Baratildeo do Serro Largo 296

03335-000 S Paulo - SP Tel (11) 2606-2409

SumaacuterioSumaacuterioAno XIV - Nordm 157 Abril de 2011

Preccedilos da assinatura anual

Comum R$ 10100Colaborador R$ 13000Propulsor R$ 26000Grande Propulsor R$ 43000Exemplar avulso R$ 1300

Serviccedilo de Atendimento ao Assinante

TelFax (11) 2236-1027

Editorial

4 Qual radiosa aurora

datas na vida dE um cruzado

5 17 de Abril de 1913 De volta ao Brasil

dona lucilia

6 Inteiramente justa extramamente bondosahellip

Hagiografia

10 Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

dr Plinio comEnta

14 Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

calEndaacuterio dos santos

18 Santos de Abril

ldquorEvoluccedilatildeo E contra-rEvoluccedilatildeordquo

20 O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

o PEnsamEnto filosoacutefico dE dr Plinio

24 O misteacuterio da vidahellip

luzEs da civilizaccedilatildeo cristatilde

30 A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

Uacuteltima Paacutegina

36 O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

Na capa uma das uacuteltimas fotos de Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte Foto J Dias

EditorialQual radiosa aurora

A

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

regularidade com que se sucedem no calendaacuterio da Igreja os vaacuterios ciclos do ano lituacutergico imperturbaacuteveis em sua sucessatildeo mdash por mais que os acontecimentos da histoacuteria humana va-riem em torno deles e os altos e baixos da poliacutetica e das financcedilas continuem sua corrida de-

sordenada mdash eacute bem uma afirmaccedilatildeo da celestial majestade da Igreja sobranceira ao vaiveacutem capri-choso das paixotildees humanas

Sobranceira natildeo poreacutem indiferente Quando os dias dolorosos da Semana Santa transcorrem em quadras histoacutericas tranquilas e felizes a Igreja como Matildee soliacutecita se serve deles para reavivar em seus filhos a abnegaccedilatildeo o senso do sofrimento heroico o espiacuterito de renuacutencia agrave trivialidade quotidia-na e o inteiro devotamento a ideais dignos de darem um sentido cristatildeo agrave vida humana

Mas a Igreja natildeo eacute apenas Matildee quando nos ensina a grande missatildeo austera do sofrimento Ela tambeacutem eacute Matildee quando nos extremos de dor e aniquilaccedilatildeo faz brilhar aos nossos olhos a luz da espe-ranccedila cristatilde abrindo diante de noacutes os horizontes serenos que a virtude da confianccedila potildee aos olhos de todos os verdadeiros filhos de Deus

Assim a Santa Igreja se serve das alegrias vibrantes e castiacutessimas da Paacutescoa para fazer brilhar aos nossos olhos a certeza triunfal de que Deus eacute o supremo Senhor de todas as coisas de que Cristo eacute o Rei da gloacuteria que venceu a morte e esmagou o democircnio

A alegria e a dor da alma resultam necessariamente do amor O homem se alegra quando tem o

que ama e se entristece quando aquilo que ama lhe faltaO homem contemporacircneo deita todo o seu amor em coisas de superfiacutecie e por isso soacute os acontecimen-

tos de superfiacutecie o emocionam Assim impressionam-no sobretudo suas desgraccedilas pessoais e superfi-ciais a sauacutede abalada a situaccedilatildeo financeira vacilante os amigos ingratos as promoccedilotildees que tardam

Poreacutem tudo isto eacute secundaacuterio para o verdadeiro catoacutelico que cuida antes de tudo da maior gloacuteria de Deus e portanto da salvaccedilatildeo de sua proacutepria alma e da exaltaccedilatildeo da Igreja

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo morreu os judeus selaram sua sepultura guarneceram-na

com soldados julgaram que estava tudo terminadoEm sua impiedade eles negavam que Nosso Senhor fosse Filho de Deus que fosse capaz de des-

truir a prisatildeo sepulcral onde jazia que sobretudo fosse capaz de passar da morte agrave vida Ora tudo isto se deu Nosso Senhor ressuscitou sem qualquer auxiacutelio humano e sob seu impeacuterio a pesada pe-dra da sepultura deslocou-se leve e rapidamente como uma nuvem E Ele ressurgiu

Assim tambeacutem a Igreja imortal pode ser aparentemente abandonada enxovalhada perseguida Ela pode jazer derrotada na aparecircncia sob o peso sepulcral das mais pesadas provaccedilotildees Ela tem em si mesma uma forccedila interior e sobrenatural que lhe vem de Deus e que lhe assegura uma vitoacuteria tan-to mais esplecircndida quanto mais inesperada e completa

Essa a grande liccedilatildeo do dia de hoje o grande consolo para os homens retos que amam acima de tu-do a Igreja de Deus

Cristo morreu e ressuscitouA Igreja imortal ressurge de suas provaccedilotildees gloriosa como Cristo na radiosa aurora de sua Res-

surreiccedilatildeo

(Extraiacutedo drsquoO Legionaacuterio de 141945)

Datas na viDa De um cruzaDo

17 de Abril de 1913

De volta ao Brasil

A

5

braccedilos era um cavalo muito grande e eu tinha inclusive certa dificuldade em movimentaacute-lo Entatildeo chamava-o de ldquoEnormerdquo

Durante a viagem de vez em quando eu falava sobre o ldquoEnormerdquo e quando voltamos eu disse

mdash Quero o meu ldquoEnormerdquoLembro-me como se fosse hoje levaram-me

para o quarto do andar teacuterreo da casa no qual existia um armaacuterio trancado onde haviam sido guardados os brinquedos das crianccedilas da famiacutelia

Abriram-no e tiraram o ldquoEnormerdquo A minha primeira reaccedilatildeo foi de exclamar

mdash Esse natildeo eacute o ldquoEnormerdquoDuas ou trecircs pessoas em torno de mim deram

risada afirmando ser o ldquoEnormerdquo E de fato era terrivelmente parecido

Mas para mim era muito inferior Qual a razatildeo

Eu tinha crescido e o ldquoEnormerdquo tinha deixado de ser enorme

(Extraiacutedo da obra ldquoNotas Autobiograacuteficasrdquo de Plinio Correcirca de Oliveira)

1) 1061912 ndash 1741913

Transatlacircntico Duca drsquoAosta

poacutes dez meses de viagem pela Europa1 sob um radioso e caacutelido sol o jovem Plinio retornava ao Brasil acompanha-

do por Dona Lucilia e sua irmatilde RoseacuteeA viagem de volta havia sido empreendida no

transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta partindo de Gecircnova em direccedilatildeo a Santos no litoral paulista

Em diversas circunstacircncias Dr Plinio narrou as impressotildees que tivera nessa ocasiatildeo

Lembro-me confusamente de uma cena ao embarcar no transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta o navio estava parado no porto com umas rodelas abertas das quais jorrava aacutegua em quantidade Tive a impressatildeo de que haveria alguma maacutequina funcionando para fazer sair aquela aacutegua agraves torrentes e olhava pensando ldquoEstaacute vendo Ali estaacute essa aacutegua que sai de dentro do navio e vai escorrendo Assim eacute a vida Os fatos vatildeo saindo de dentro do possiacutevel para se tornarem reais e depois se perdem no que jaacute passou como essa aacutegua desaparece no mar Eacute bonito ver como isso se sucede E o ruiacutedo que faz essa aacutegua caindo no mar eacute como o rumor dos fatos da vida quando acabam de acontecer e se perdem no passado Eacute uma aacutegua que vai vai e de repente acaba Assim eacute a vida Que bonito esse jorro Como eacute bom que comece como eacute bom que dure como eacute bom que acaberdquo

Afinal aportamos em Santos terminando assim a viagem o que parecia um acontecimento sensacional

Chegando agrave casa apoacutes longo periacuteodo de ausecircncia era natural que algumas coisas causassem surpresa a um menino de apenas quatro anoshellip

Eu possuiacutea um brinquedo comum era um cavalinho de pano posto sobre rodinhas com eixo de metal e com uma pequena fita pela qual eu podia puxaacute-lo Para os meus

6

Dona LuciLiaJ

Dia

s

Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

A

Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

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Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

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Dona LuciLiaM

Shi

noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

S

Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

O

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 2: Dr. Plinio-157-2011-04

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Praccedila de Satildeo Pedro Roma

ada festa celebrada pela Igreja eacute acompanhada de enorme efusatildeo de graccedilas correspondentes agraves daacutedivas recebidas em vida pelo santo entatildeo celebrado Isto se daacute tambeacutem quanto aos mis-teacuterios da vida de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de Nossa Senhora que eventualmente consi-

deremos em determinada celebraccedilatildeo Ora aproxima-se o dia em que a Santa Igreja reserva para contemplarmos liturgicamente o

ldquomisteacuterio dos misteacuteriosrdquo ou seja a morte de Nosso Senhor Jesus Cristo e a redenccedilatildeo do gecircnero hu-mano

No momento em que Ele expirando disse ldquoconsummatum estrdquo e sua Alma se separou do Corpo a redenccedilatildeo se operou O gecircnero humano de perdido que era passou a ser salvo Nesse momento noacutes fomos resgatados e a fonte de todas as graccedilas se abriu para noacutes

De fato por causa de seu sacrifiacutecio Nosso Senhor Jesus Cristo eacute uma fonte de graccedilas aberta para todos noacutes este sacrifiacutecio abriu para noacutes uma infinita torrente de misericoacuterdia que nos traz toda es-peacutecie de bem e de perdatildeo desde que verdadeiramente queiramos dela nos beneficiar

(Extraiacutedo de conferecircncia de 741966)

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XIV - Nordm 157 Abril de 2011

Inteiramente justa extremamente bondosa

3

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SumaacuterioSumaacuterioAno XIV - Nordm 157 Abril de 2011

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Editorial

4 Qual radiosa aurora

datas na vida dE um cruzado

5 17 de Abril de 1913 De volta ao Brasil

dona lucilia

6 Inteiramente justa extramamente bondosahellip

Hagiografia

10 Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

dr Plinio comEnta

14 Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

calEndaacuterio dos santos

18 Santos de Abril

ldquorEvoluccedilatildeo E contra-rEvoluccedilatildeordquo

20 O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

o PEnsamEnto filosoacutefico dE dr Plinio

24 O misteacuterio da vidahellip

luzEs da civilizaccedilatildeo cristatilde

30 A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

Uacuteltima Paacutegina

36 O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

Na capa uma das uacuteltimas fotos de Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte Foto J Dias

EditorialQual radiosa aurora

A

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

regularidade com que se sucedem no calendaacuterio da Igreja os vaacuterios ciclos do ano lituacutergico imperturbaacuteveis em sua sucessatildeo mdash por mais que os acontecimentos da histoacuteria humana va-riem em torno deles e os altos e baixos da poliacutetica e das financcedilas continuem sua corrida de-

sordenada mdash eacute bem uma afirmaccedilatildeo da celestial majestade da Igreja sobranceira ao vaiveacutem capri-choso das paixotildees humanas

Sobranceira natildeo poreacutem indiferente Quando os dias dolorosos da Semana Santa transcorrem em quadras histoacutericas tranquilas e felizes a Igreja como Matildee soliacutecita se serve deles para reavivar em seus filhos a abnegaccedilatildeo o senso do sofrimento heroico o espiacuterito de renuacutencia agrave trivialidade quotidia-na e o inteiro devotamento a ideais dignos de darem um sentido cristatildeo agrave vida humana

Mas a Igreja natildeo eacute apenas Matildee quando nos ensina a grande missatildeo austera do sofrimento Ela tambeacutem eacute Matildee quando nos extremos de dor e aniquilaccedilatildeo faz brilhar aos nossos olhos a luz da espe-ranccedila cristatilde abrindo diante de noacutes os horizontes serenos que a virtude da confianccedila potildee aos olhos de todos os verdadeiros filhos de Deus

Assim a Santa Igreja se serve das alegrias vibrantes e castiacutessimas da Paacutescoa para fazer brilhar aos nossos olhos a certeza triunfal de que Deus eacute o supremo Senhor de todas as coisas de que Cristo eacute o Rei da gloacuteria que venceu a morte e esmagou o democircnio

A alegria e a dor da alma resultam necessariamente do amor O homem se alegra quando tem o

que ama e se entristece quando aquilo que ama lhe faltaO homem contemporacircneo deita todo o seu amor em coisas de superfiacutecie e por isso soacute os acontecimen-

tos de superfiacutecie o emocionam Assim impressionam-no sobretudo suas desgraccedilas pessoais e superfi-ciais a sauacutede abalada a situaccedilatildeo financeira vacilante os amigos ingratos as promoccedilotildees que tardam

Poreacutem tudo isto eacute secundaacuterio para o verdadeiro catoacutelico que cuida antes de tudo da maior gloacuteria de Deus e portanto da salvaccedilatildeo de sua proacutepria alma e da exaltaccedilatildeo da Igreja

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo morreu os judeus selaram sua sepultura guarneceram-na

com soldados julgaram que estava tudo terminadoEm sua impiedade eles negavam que Nosso Senhor fosse Filho de Deus que fosse capaz de des-

truir a prisatildeo sepulcral onde jazia que sobretudo fosse capaz de passar da morte agrave vida Ora tudo isto se deu Nosso Senhor ressuscitou sem qualquer auxiacutelio humano e sob seu impeacuterio a pesada pe-dra da sepultura deslocou-se leve e rapidamente como uma nuvem E Ele ressurgiu

Assim tambeacutem a Igreja imortal pode ser aparentemente abandonada enxovalhada perseguida Ela pode jazer derrotada na aparecircncia sob o peso sepulcral das mais pesadas provaccedilotildees Ela tem em si mesma uma forccedila interior e sobrenatural que lhe vem de Deus e que lhe assegura uma vitoacuteria tan-to mais esplecircndida quanto mais inesperada e completa

Essa a grande liccedilatildeo do dia de hoje o grande consolo para os homens retos que amam acima de tu-do a Igreja de Deus

Cristo morreu e ressuscitouA Igreja imortal ressurge de suas provaccedilotildees gloriosa como Cristo na radiosa aurora de sua Res-

surreiccedilatildeo

(Extraiacutedo drsquoO Legionaacuterio de 141945)

Datas na viDa De um cruzaDo

17 de Abril de 1913

De volta ao Brasil

A

5

braccedilos era um cavalo muito grande e eu tinha inclusive certa dificuldade em movimentaacute-lo Entatildeo chamava-o de ldquoEnormerdquo

Durante a viagem de vez em quando eu falava sobre o ldquoEnormerdquo e quando voltamos eu disse

mdash Quero o meu ldquoEnormerdquoLembro-me como se fosse hoje levaram-me

para o quarto do andar teacuterreo da casa no qual existia um armaacuterio trancado onde haviam sido guardados os brinquedos das crianccedilas da famiacutelia

Abriram-no e tiraram o ldquoEnormerdquo A minha primeira reaccedilatildeo foi de exclamar

mdash Esse natildeo eacute o ldquoEnormerdquoDuas ou trecircs pessoas em torno de mim deram

risada afirmando ser o ldquoEnormerdquo E de fato era terrivelmente parecido

Mas para mim era muito inferior Qual a razatildeo

Eu tinha crescido e o ldquoEnormerdquo tinha deixado de ser enorme

(Extraiacutedo da obra ldquoNotas Autobiograacuteficasrdquo de Plinio Correcirca de Oliveira)

1) 1061912 ndash 1741913

Transatlacircntico Duca drsquoAosta

poacutes dez meses de viagem pela Europa1 sob um radioso e caacutelido sol o jovem Plinio retornava ao Brasil acompanha-

do por Dona Lucilia e sua irmatilde RoseacuteeA viagem de volta havia sido empreendida no

transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta partindo de Gecircnova em direccedilatildeo a Santos no litoral paulista

Em diversas circunstacircncias Dr Plinio narrou as impressotildees que tivera nessa ocasiatildeo

Lembro-me confusamente de uma cena ao embarcar no transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta o navio estava parado no porto com umas rodelas abertas das quais jorrava aacutegua em quantidade Tive a impressatildeo de que haveria alguma maacutequina funcionando para fazer sair aquela aacutegua agraves torrentes e olhava pensando ldquoEstaacute vendo Ali estaacute essa aacutegua que sai de dentro do navio e vai escorrendo Assim eacute a vida Os fatos vatildeo saindo de dentro do possiacutevel para se tornarem reais e depois se perdem no que jaacute passou como essa aacutegua desaparece no mar Eacute bonito ver como isso se sucede E o ruiacutedo que faz essa aacutegua caindo no mar eacute como o rumor dos fatos da vida quando acabam de acontecer e se perdem no passado Eacute uma aacutegua que vai vai e de repente acaba Assim eacute a vida Que bonito esse jorro Como eacute bom que comece como eacute bom que dure como eacute bom que acaberdquo

Afinal aportamos em Santos terminando assim a viagem o que parecia um acontecimento sensacional

Chegando agrave casa apoacutes longo periacuteodo de ausecircncia era natural que algumas coisas causassem surpresa a um menino de apenas quatro anoshellip

Eu possuiacutea um brinquedo comum era um cavalinho de pano posto sobre rodinhas com eixo de metal e com uma pequena fita pela qual eu podia puxaacute-lo Para os meus

6

Dona LuciLiaJ

Dia

s

Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

A

Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

7

Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

Shi

noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

16

Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

18

1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 3: Dr. Plinio-157-2011-04

As mateacuterias extraiacutedas de exposiccedilotildees verbais de Dr Plinio

mdash designadas por ldquoconferecircnciasrdquo mdash satildeo adaptadas para a linguagem

escrita sem revisatildeo do autor

Publicaccedilatildeo Mensal Ano XIV - Nordm 157 Abril de 2011

Inteiramente justa extremamente bondosa

3

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Editorial

4 Qual radiosa aurora

datas na vida dE um cruzado

5 17 de Abril de 1913 De volta ao Brasil

dona lucilia

6 Inteiramente justa extramamente bondosahellip

Hagiografia

10 Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

dr Plinio comEnta

14 Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

calEndaacuterio dos santos

18 Santos de Abril

ldquorEvoluccedilatildeo E contra-rEvoluccedilatildeordquo

20 O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

o PEnsamEnto filosoacutefico dE dr Plinio

24 O misteacuterio da vidahellip

luzEs da civilizaccedilatildeo cristatilde

30 A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

Uacuteltima Paacutegina

36 O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

Na capa uma das uacuteltimas fotos de Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte Foto J Dias

EditorialQual radiosa aurora

A

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Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

regularidade com que se sucedem no calendaacuterio da Igreja os vaacuterios ciclos do ano lituacutergico imperturbaacuteveis em sua sucessatildeo mdash por mais que os acontecimentos da histoacuteria humana va-riem em torno deles e os altos e baixos da poliacutetica e das financcedilas continuem sua corrida de-

sordenada mdash eacute bem uma afirmaccedilatildeo da celestial majestade da Igreja sobranceira ao vaiveacutem capri-choso das paixotildees humanas

Sobranceira natildeo poreacutem indiferente Quando os dias dolorosos da Semana Santa transcorrem em quadras histoacutericas tranquilas e felizes a Igreja como Matildee soliacutecita se serve deles para reavivar em seus filhos a abnegaccedilatildeo o senso do sofrimento heroico o espiacuterito de renuacutencia agrave trivialidade quotidia-na e o inteiro devotamento a ideais dignos de darem um sentido cristatildeo agrave vida humana

Mas a Igreja natildeo eacute apenas Matildee quando nos ensina a grande missatildeo austera do sofrimento Ela tambeacutem eacute Matildee quando nos extremos de dor e aniquilaccedilatildeo faz brilhar aos nossos olhos a luz da espe-ranccedila cristatilde abrindo diante de noacutes os horizontes serenos que a virtude da confianccedila potildee aos olhos de todos os verdadeiros filhos de Deus

Assim a Santa Igreja se serve das alegrias vibrantes e castiacutessimas da Paacutescoa para fazer brilhar aos nossos olhos a certeza triunfal de que Deus eacute o supremo Senhor de todas as coisas de que Cristo eacute o Rei da gloacuteria que venceu a morte e esmagou o democircnio

A alegria e a dor da alma resultam necessariamente do amor O homem se alegra quando tem o

que ama e se entristece quando aquilo que ama lhe faltaO homem contemporacircneo deita todo o seu amor em coisas de superfiacutecie e por isso soacute os acontecimen-

tos de superfiacutecie o emocionam Assim impressionam-no sobretudo suas desgraccedilas pessoais e superfi-ciais a sauacutede abalada a situaccedilatildeo financeira vacilante os amigos ingratos as promoccedilotildees que tardam

Poreacutem tudo isto eacute secundaacuterio para o verdadeiro catoacutelico que cuida antes de tudo da maior gloacuteria de Deus e portanto da salvaccedilatildeo de sua proacutepria alma e da exaltaccedilatildeo da Igreja

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo morreu os judeus selaram sua sepultura guarneceram-na

com soldados julgaram que estava tudo terminadoEm sua impiedade eles negavam que Nosso Senhor fosse Filho de Deus que fosse capaz de des-

truir a prisatildeo sepulcral onde jazia que sobretudo fosse capaz de passar da morte agrave vida Ora tudo isto se deu Nosso Senhor ressuscitou sem qualquer auxiacutelio humano e sob seu impeacuterio a pesada pe-dra da sepultura deslocou-se leve e rapidamente como uma nuvem E Ele ressurgiu

Assim tambeacutem a Igreja imortal pode ser aparentemente abandonada enxovalhada perseguida Ela pode jazer derrotada na aparecircncia sob o peso sepulcral das mais pesadas provaccedilotildees Ela tem em si mesma uma forccedila interior e sobrenatural que lhe vem de Deus e que lhe assegura uma vitoacuteria tan-to mais esplecircndida quanto mais inesperada e completa

Essa a grande liccedilatildeo do dia de hoje o grande consolo para os homens retos que amam acima de tu-do a Igreja de Deus

Cristo morreu e ressuscitouA Igreja imortal ressurge de suas provaccedilotildees gloriosa como Cristo na radiosa aurora de sua Res-

surreiccedilatildeo

(Extraiacutedo drsquoO Legionaacuterio de 141945)

Datas na viDa De um cruzaDo

17 de Abril de 1913

De volta ao Brasil

A

5

braccedilos era um cavalo muito grande e eu tinha inclusive certa dificuldade em movimentaacute-lo Entatildeo chamava-o de ldquoEnormerdquo

Durante a viagem de vez em quando eu falava sobre o ldquoEnormerdquo e quando voltamos eu disse

mdash Quero o meu ldquoEnormerdquoLembro-me como se fosse hoje levaram-me

para o quarto do andar teacuterreo da casa no qual existia um armaacuterio trancado onde haviam sido guardados os brinquedos das crianccedilas da famiacutelia

Abriram-no e tiraram o ldquoEnormerdquo A minha primeira reaccedilatildeo foi de exclamar

mdash Esse natildeo eacute o ldquoEnormerdquoDuas ou trecircs pessoas em torno de mim deram

risada afirmando ser o ldquoEnormerdquo E de fato era terrivelmente parecido

Mas para mim era muito inferior Qual a razatildeo

Eu tinha crescido e o ldquoEnormerdquo tinha deixado de ser enorme

(Extraiacutedo da obra ldquoNotas Autobiograacuteficasrdquo de Plinio Correcirca de Oliveira)

1) 1061912 ndash 1741913

Transatlacircntico Duca drsquoAosta

poacutes dez meses de viagem pela Europa1 sob um radioso e caacutelido sol o jovem Plinio retornava ao Brasil acompanha-

do por Dona Lucilia e sua irmatilde RoseacuteeA viagem de volta havia sido empreendida no

transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta partindo de Gecircnova em direccedilatildeo a Santos no litoral paulista

Em diversas circunstacircncias Dr Plinio narrou as impressotildees que tivera nessa ocasiatildeo

Lembro-me confusamente de uma cena ao embarcar no transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta o navio estava parado no porto com umas rodelas abertas das quais jorrava aacutegua em quantidade Tive a impressatildeo de que haveria alguma maacutequina funcionando para fazer sair aquela aacutegua agraves torrentes e olhava pensando ldquoEstaacute vendo Ali estaacute essa aacutegua que sai de dentro do navio e vai escorrendo Assim eacute a vida Os fatos vatildeo saindo de dentro do possiacutevel para se tornarem reais e depois se perdem no que jaacute passou como essa aacutegua desaparece no mar Eacute bonito ver como isso se sucede E o ruiacutedo que faz essa aacutegua caindo no mar eacute como o rumor dos fatos da vida quando acabam de acontecer e se perdem no passado Eacute uma aacutegua que vai vai e de repente acaba Assim eacute a vida Que bonito esse jorro Como eacute bom que comece como eacute bom que dure como eacute bom que acaberdquo

Afinal aportamos em Santos terminando assim a viagem o que parecia um acontecimento sensacional

Chegando agrave casa apoacutes longo periacuteodo de ausecircncia era natural que algumas coisas causassem surpresa a um menino de apenas quatro anoshellip

Eu possuiacutea um brinquedo comum era um cavalinho de pano posto sobre rodinhas com eixo de metal e com uma pequena fita pela qual eu podia puxaacute-lo Para os meus

6

Dona LuciLiaJ

Dia

s

Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

A

Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

7

Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

Shi

noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

S

Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

C

14

Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

O

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

F B

oula

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Page 4: Dr. Plinio-157-2011-04

EditorialQual radiosa aurora

A

4

Declaraccedilatildeo Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontiacutefice Urbano VIII de 13 de marccedilo de 1625 e de 5 de junho de 1631 declaramos natildeo querer antecipar o juiacutezo da Santa Igreja no emprego de palavras ou na apreciaccedilatildeo dos fatos edificantes publicados nesta revista Em nossa intenccedilatildeo os tiacutetulos elogiosos natildeo tecircm outro sentido senatildeo o ordinaacuterio e em tudo nos submetemos com filial amor agraves decisotildees da Santa Igreja

regularidade com que se sucedem no calendaacuterio da Igreja os vaacuterios ciclos do ano lituacutergico imperturbaacuteveis em sua sucessatildeo mdash por mais que os acontecimentos da histoacuteria humana va-riem em torno deles e os altos e baixos da poliacutetica e das financcedilas continuem sua corrida de-

sordenada mdash eacute bem uma afirmaccedilatildeo da celestial majestade da Igreja sobranceira ao vaiveacutem capri-choso das paixotildees humanas

Sobranceira natildeo poreacutem indiferente Quando os dias dolorosos da Semana Santa transcorrem em quadras histoacutericas tranquilas e felizes a Igreja como Matildee soliacutecita se serve deles para reavivar em seus filhos a abnegaccedilatildeo o senso do sofrimento heroico o espiacuterito de renuacutencia agrave trivialidade quotidia-na e o inteiro devotamento a ideais dignos de darem um sentido cristatildeo agrave vida humana

Mas a Igreja natildeo eacute apenas Matildee quando nos ensina a grande missatildeo austera do sofrimento Ela tambeacutem eacute Matildee quando nos extremos de dor e aniquilaccedilatildeo faz brilhar aos nossos olhos a luz da espe-ranccedila cristatilde abrindo diante de noacutes os horizontes serenos que a virtude da confianccedila potildee aos olhos de todos os verdadeiros filhos de Deus

Assim a Santa Igreja se serve das alegrias vibrantes e castiacutessimas da Paacutescoa para fazer brilhar aos nossos olhos a certeza triunfal de que Deus eacute o supremo Senhor de todas as coisas de que Cristo eacute o Rei da gloacuteria que venceu a morte e esmagou o democircnio

A alegria e a dor da alma resultam necessariamente do amor O homem se alegra quando tem o

que ama e se entristece quando aquilo que ama lhe faltaO homem contemporacircneo deita todo o seu amor em coisas de superfiacutecie e por isso soacute os acontecimen-

tos de superfiacutecie o emocionam Assim impressionam-no sobretudo suas desgraccedilas pessoais e superfi-ciais a sauacutede abalada a situaccedilatildeo financeira vacilante os amigos ingratos as promoccedilotildees que tardam

Poreacutem tudo isto eacute secundaacuterio para o verdadeiro catoacutelico que cuida antes de tudo da maior gloacuteria de Deus e portanto da salvaccedilatildeo de sua proacutepria alma e da exaltaccedilatildeo da Igreja

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo morreu os judeus selaram sua sepultura guarneceram-na

com soldados julgaram que estava tudo terminadoEm sua impiedade eles negavam que Nosso Senhor fosse Filho de Deus que fosse capaz de des-

truir a prisatildeo sepulcral onde jazia que sobretudo fosse capaz de passar da morte agrave vida Ora tudo isto se deu Nosso Senhor ressuscitou sem qualquer auxiacutelio humano e sob seu impeacuterio a pesada pe-dra da sepultura deslocou-se leve e rapidamente como uma nuvem E Ele ressurgiu

Assim tambeacutem a Igreja imortal pode ser aparentemente abandonada enxovalhada perseguida Ela pode jazer derrotada na aparecircncia sob o peso sepulcral das mais pesadas provaccedilotildees Ela tem em si mesma uma forccedila interior e sobrenatural que lhe vem de Deus e que lhe assegura uma vitoacuteria tan-to mais esplecircndida quanto mais inesperada e completa

Essa a grande liccedilatildeo do dia de hoje o grande consolo para os homens retos que amam acima de tu-do a Igreja de Deus

Cristo morreu e ressuscitouA Igreja imortal ressurge de suas provaccedilotildees gloriosa como Cristo na radiosa aurora de sua Res-

surreiccedilatildeo

(Extraiacutedo drsquoO Legionaacuterio de 141945)

Datas na viDa De um cruzaDo

17 de Abril de 1913

De volta ao Brasil

A

5

braccedilos era um cavalo muito grande e eu tinha inclusive certa dificuldade em movimentaacute-lo Entatildeo chamava-o de ldquoEnormerdquo

Durante a viagem de vez em quando eu falava sobre o ldquoEnormerdquo e quando voltamos eu disse

mdash Quero o meu ldquoEnormerdquoLembro-me como se fosse hoje levaram-me

para o quarto do andar teacuterreo da casa no qual existia um armaacuterio trancado onde haviam sido guardados os brinquedos das crianccedilas da famiacutelia

Abriram-no e tiraram o ldquoEnormerdquo A minha primeira reaccedilatildeo foi de exclamar

mdash Esse natildeo eacute o ldquoEnormerdquoDuas ou trecircs pessoas em torno de mim deram

risada afirmando ser o ldquoEnormerdquo E de fato era terrivelmente parecido

Mas para mim era muito inferior Qual a razatildeo

Eu tinha crescido e o ldquoEnormerdquo tinha deixado de ser enorme

(Extraiacutedo da obra ldquoNotas Autobiograacuteficasrdquo de Plinio Correcirca de Oliveira)

1) 1061912 ndash 1741913

Transatlacircntico Duca drsquoAosta

poacutes dez meses de viagem pela Europa1 sob um radioso e caacutelido sol o jovem Plinio retornava ao Brasil acompanha-

do por Dona Lucilia e sua irmatilde RoseacuteeA viagem de volta havia sido empreendida no

transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta partindo de Gecircnova em direccedilatildeo a Santos no litoral paulista

Em diversas circunstacircncias Dr Plinio narrou as impressotildees que tivera nessa ocasiatildeo

Lembro-me confusamente de uma cena ao embarcar no transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta o navio estava parado no porto com umas rodelas abertas das quais jorrava aacutegua em quantidade Tive a impressatildeo de que haveria alguma maacutequina funcionando para fazer sair aquela aacutegua agraves torrentes e olhava pensando ldquoEstaacute vendo Ali estaacute essa aacutegua que sai de dentro do navio e vai escorrendo Assim eacute a vida Os fatos vatildeo saindo de dentro do possiacutevel para se tornarem reais e depois se perdem no que jaacute passou como essa aacutegua desaparece no mar Eacute bonito ver como isso se sucede E o ruiacutedo que faz essa aacutegua caindo no mar eacute como o rumor dos fatos da vida quando acabam de acontecer e se perdem no passado Eacute uma aacutegua que vai vai e de repente acaba Assim eacute a vida Que bonito esse jorro Como eacute bom que comece como eacute bom que dure como eacute bom que acaberdquo

Afinal aportamos em Santos terminando assim a viagem o que parecia um acontecimento sensacional

Chegando agrave casa apoacutes longo periacuteodo de ausecircncia era natural que algumas coisas causassem surpresa a um menino de apenas quatro anoshellip

Eu possuiacutea um brinquedo comum era um cavalinho de pano posto sobre rodinhas com eixo de metal e com uma pequena fita pela qual eu podia puxaacute-lo Para os meus

6

Dona LuciLiaJ

Dia

s

Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

A

Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

7

Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

Shi

noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

S

Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

29

o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 5: Dr. Plinio-157-2011-04

Datas na viDa De um cruzaDo

17 de Abril de 1913

De volta ao Brasil

A

5

braccedilos era um cavalo muito grande e eu tinha inclusive certa dificuldade em movimentaacute-lo Entatildeo chamava-o de ldquoEnormerdquo

Durante a viagem de vez em quando eu falava sobre o ldquoEnormerdquo e quando voltamos eu disse

mdash Quero o meu ldquoEnormerdquoLembro-me como se fosse hoje levaram-me

para o quarto do andar teacuterreo da casa no qual existia um armaacuterio trancado onde haviam sido guardados os brinquedos das crianccedilas da famiacutelia

Abriram-no e tiraram o ldquoEnormerdquo A minha primeira reaccedilatildeo foi de exclamar

mdash Esse natildeo eacute o ldquoEnormerdquoDuas ou trecircs pessoas em torno de mim deram

risada afirmando ser o ldquoEnormerdquo E de fato era terrivelmente parecido

Mas para mim era muito inferior Qual a razatildeo

Eu tinha crescido e o ldquoEnormerdquo tinha deixado de ser enorme

(Extraiacutedo da obra ldquoNotas Autobiograacuteficasrdquo de Plinio Correcirca de Oliveira)

1) 1061912 ndash 1741913

Transatlacircntico Duca drsquoAosta

poacutes dez meses de viagem pela Europa1 sob um radioso e caacutelido sol o jovem Plinio retornava ao Brasil acompanha-

do por Dona Lucilia e sua irmatilde RoseacuteeA viagem de volta havia sido empreendida no

transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta partindo de Gecircnova em direccedilatildeo a Santos no litoral paulista

Em diversas circunstacircncias Dr Plinio narrou as impressotildees que tivera nessa ocasiatildeo

Lembro-me confusamente de uma cena ao embarcar no transatlacircntico italiano Duca drsquoAosta o navio estava parado no porto com umas rodelas abertas das quais jorrava aacutegua em quantidade Tive a impressatildeo de que haveria alguma maacutequina funcionando para fazer sair aquela aacutegua agraves torrentes e olhava pensando ldquoEstaacute vendo Ali estaacute essa aacutegua que sai de dentro do navio e vai escorrendo Assim eacute a vida Os fatos vatildeo saindo de dentro do possiacutevel para se tornarem reais e depois se perdem no que jaacute passou como essa aacutegua desaparece no mar Eacute bonito ver como isso se sucede E o ruiacutedo que faz essa aacutegua caindo no mar eacute como o rumor dos fatos da vida quando acabam de acontecer e se perdem no passado Eacute uma aacutegua que vai vai e de repente acaba Assim eacute a vida Que bonito esse jorro Como eacute bom que comece como eacute bom que dure como eacute bom que acaberdquo

Afinal aportamos em Santos terminando assim a viagem o que parecia um acontecimento sensacional

Chegando agrave casa apoacutes longo periacuteodo de ausecircncia era natural que algumas coisas causassem surpresa a um menino de apenas quatro anoshellip

Eu possuiacutea um brinquedo comum era um cavalinho de pano posto sobre rodinhas com eixo de metal e com uma pequena fita pela qual eu podia puxaacute-lo Para os meus

6

Dona LuciLiaJ

Dia

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Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

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Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

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Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

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noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

18

1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

22

revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 6: Dr. Plinio-157-2011-04

6

Dona LuciLiaJ

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Dona Lucilia um mecircs antes de sua morte

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Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

7

Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

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noda

Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

9

Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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oula

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Page 7: Dr. Plinio-157-2011-04

A

Inteiramente justa

extramamente bondosahellip

7

Mais do que os fatos da vida quotidiana Dr Plinio analisava em Dona Lucilia a

sucessatildeo de estados de espiacuterito Agraves vezes em pessoas censuraacuteveis ela encontrava qualidades e delas se tornava advogada Em seu senso de

justiccedila a bondade vinha como acreacutescimo

vida de Dona Lucilia se passava mais numa suces-satildeo de estados de espiacuterito

do que num conjunto de accedilotildees Ela levou uacutenica e exclusivamente a vida de uma dona de casa de seu tempo pequenas obrigaccedilotildees sociais e do-meacutesticas

Embora possuiacutesse uma constitui-ccedilatildeo fiacutesica forte mamatildee era muito achacada de doenccedilas indisposiccedilotildees Ela viveu 92 anos mas sempre en-ferma e obrigada portanto aos cui-dados limitaccedilotildees e regimes de uma pessoa doente Eacute dentro disso que a alma dela se manifestava

Loacutegica e bondade

Ela era uma pessoa que realiza-va com precisatildeo exatidatildeo a apa-

rente contradiccedilatildeo de ser ao mesmo tempo muito bondosa e muito loacutegi-ca Em geral se entende como bon-dade algo que entra natildeo no antiloacutegi-co mas pelo menos no natildeo loacutegico

Por exemplo a oraccedilatildeo em favor do adversaacuterio agrave primeira vista natildeo parece loacutegica

Uma pessoa ldquoploc-plocrdquo1 poderia fazer o seguinte raciociacutenio ldquoTal in-diviacuteduo eacute meu inimigo quer liqui-dar-me e estaacute passando mal agrave mor-te Se eu pedir a Deus para ele sa-rar ele fica curado e depois me me-te uma porretada na cabeccedila Que sentido tem isso Natildeo digo que vaacute pedir para ele morrer mdash eacute o impul-so de muitos mdash mas natildeo rasgarei minha tuacutenica devido agrave tristeza se ele falecer tampouco vou rezar pa-ra ele viverrdquo

8

Dona LuciLiaM

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Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

S

Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

C

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 8: Dr. Plinio-157-2011-04

8

Dona LuciLiaM

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Dr Plinio no fim da deacutecada de 1970

Esse eacute um pensamento que Dona Lucilia natildeo aprovaria

O fio do pensamento parece mui-to loacutegico mas poderiacuteamos pergun-tar a essa suposta pessoa Por que vocecirc coloca limites agrave bondade de Deus Ele natildeo pode sarar de alma e corpo seu inimigo Ou permitir por exemplo que ele venha em ci-ma de vocecirc para lhe fazer sofrer um tanto por amor a Deus Assim vocecirc natildeo acabaria conquistando uma al-ma para Nosso Senhor No balan-ccedilo estreito e vulgar de seus interes-ses pessoais sua atitude eacute bem loacute-gica poreacutem a premissa natildeo estaacute er-rada Existe soacute vocecirc Nas relaccedilotildees entre vocecirc e seu inimigo natildeo exis-te Deus Ou eacute o Criador que exis-te principalmente e ele e vocecirc satildeo duas meras criaturas Sendo assim procure o interesse de Deus

as Mas agraves vezes ela pegava o lado ruim de um indiviacuteduo com um dis-cernimento espantoso quando ele natildeo tinha dado nenhuma manifesta-ccedilatildeo disso

Lembro-me de um amigo a respei-to do qual ela me desaconselhou Per-guntei-lhe ldquoMas por quecircrdquo Ela disse ldquoPelo jeito de ele pegar no garfordquo

Eu natildeo dizia nem sim nem natildeo porque natildeo queria que ela ficasse alarmada Mas havia necessidade de apostolado com essa pessoa chega-da a mim e eu portanto a suporta-va de olho vivo E percebia na praacuteti-ca de todos os dias como mamatildee ti-nha razatildeo

Essa pessoa tem quase minha ida-de passou a vida no teatro ou seja ldquoteatrandordquo para o mundo e jaacute vai saindo para o outro lado do palco egoiacutesta egoiacutesta

Senso de observaccedilatildeo

A loacutegica de Dona Lucilia coin-cidia com um senso de observaccedilatildeo curioso o qual natildeo fazia dela um Sherlock Holmes2 Mamatildee muitas vezes se iludia a respeito das pesso-

Dona Lucilia era uma pessoa que realizava com

precisatildeo exatidatildeo a aparente contradiccedilatildeo

de ser ao mesmo tempo muito bondosa

e muito loacutegica

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Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 9: Dr. Plinio-157-2011-04

9

Pintura a oacuteleo representando Dona Lucilia aos 92 anos de idade

natildeo soacute para perceber defeitos mas tambeacutem qualidades

Dona Lucilia revelava seu sen-so natildeo soacute em pegar defeitos mas tambeacutem agraves vezes nas pes-soas mais censuraacuteveis algu-mas qualidades e se transfor-mava em advogada delas

Natildeo eram qualidades comuns que se alega co-mumente ldquoEle eacute bonzi-nhordquo mas do seguinte gecircnero

Eu por exemplo ldquotruculentizavardquo con-tra os defeitos de al-gueacutem Raras vezes ela me dizia ldquoVocecirc tem razatildeordquo

Mas quando havia cabimento ela afir-mava ldquoFilhatildeo eacute ver-dade Mas vocecirc note tal lado apesar de tu-do ele eacute por exemplo muito franco Muita gente que natildeo tem es-ses defeitos eacute mais falsa do que ele E essa fran-queza tem seu valor Vo-cecirc quando falar de todos os defeitos dele lembre-se de dizer tambeacutem que eacute mui-to francordquo

E nisso ela manifestava seu senso de justiccedila Nunca tomava uma atitude apaixonada por onde se pudesse dizer que ela foi injus-ta com outrem Absolutamente natildeo Sempre justa justa justa

E a bondade vinha como acreacutesci-mo Quer dizer ainda que uma pes-soa natildeo prestasse para nada fosse muito agrave toa mamatildee rezava por ela suportava-a enfim fazia o bem que coubesse Esse eacute o papel da miseri-coacuterdia v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 421981)

ralelepiacutepedo que ao ser girado sobre o solo emite o ruiacutedo ldquoploc-plocrdquo

2) Sherlock Holmes Detetive fictiacutecio famoso por seu astuto raciociacutenio loacute-gico sua capacidade de assumir qual-quer disfarce e seu uso da ciecircncia fo-rense com habilidades para resolver casos difiacuteceis

1) Expressatildeo onomatopeica criada por Dr Plinio para designar o defeito de certas pessoas que desprovidas de in-tuiccedilatildeo minoram a importacircncia dos siacutembolos e negam o valor da accedilatildeo de presenccedila Querem tudo explicar por raciociacutenios desenvolvidos de modo lento e pesado agrave maneira de um pa-

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

13

Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

C

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

16

Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 10: Dr. Plinio-157-2011-04

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Contemplaccedilatildeo fruto da penitecircncia e do desapego

10

Hagiografia

Estando profundamente arrependida Santa Maria Madalena perdeu o apego agraves coisas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de

pecado e voou agrave contemplaccedilatildeoMeditando na vida da Santa Penitente Dr Plinio potildee-se a seguinte

interrogaccedilatildeo existiraacute alguma correlaccedilatildeo entre espiacuterito de contemplaccedilatildeo espiacuterito de arrependimento e desprendimento das coisas desta Terra

Santa Maria Madalena - Metropolitan Museum of Art Nova York

anta Maria Madalena mereceu ser a primeira pessoa a contem-plar o Salvador ressuscitado

No famoso episoacutedio do banquete em que Maria Madalena mdash tudo le-va a crer que dela se tratava mdash ungiu os peacutes de Nosso Senhor haacute aspectos colaterais os quais nos fornecem al-gumas perspectivas da alma e da vi-da dela bem como de sua posiccedilatildeo no firmamento da Igreja que seria o ca-so de comentarmos

Contemplaccedilatildeo e penitecircncia

Ela era irmatilde de Laacutezaro o qual se-gundo a tradiccedilatildeo pertencia agrave alta socie-dade porque era um homem muito ri-co Portanto Laacutezaro e suas duas irmatildes eram pessoas de alta categoria mas Maria Madalena havia decaiacutedo muito e se tornara uma pecadora puacuteblica

Depois do seu arrependimento Santa Maria Madalena passou a re-presentar duas coisas que se torna-ram claras de um lado a contempla-ccedilatildeo e de outro a penitecircncia

Foto

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11

Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

12

Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 11: Dr. Plinio-157-2011-04

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Agrave esquerda Jesus perdoa Santa Maria Madalena (Catedral

de Salamanca Espanha) agrave direita Judas vende Nosso

Senhor (Capela Notre Dame des Fontaines - La Brigue Franccedila)

Enquanto Santa Maria Madalena

representava a renuacutencia aos

bens da Terra Judas como

ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Judas o oposto de Santa Maria Madalena

Em terceiro lugar ela represen-tou tambeacutem a afirmaccedilatildeo dos direitos da inocecircncia e dos direitos de Nos-so Senhor

Em que sentido Todos se lembram deste fato es-

tando o Divino Salvador em Betacircnia foi oferecida uma ceia em sua honra Madalena entrou e quebrando um vidro de perfume comeccedilou a ungir os peacutes de Nosso Senhor Judas cen-surou-a a esse respeito mas o Re-dentor justificou a atitude dela2

Vemos aiacute a penitecircncia juntamen-te com a contemplaccedilatildeo numa espeacute-cie de irredutiacutevel oposiccedilatildeo ao espiacuteri-to sem nenhum arrependimento de Judas Este em vez de arrepender--se caiu no desespero como mostra o ato pelo qual ele se enforcou na fi-gueira

Enquanto ela como contempla-tiva e penitente representava a re-nuacutencia aos bens da Terra Judas co-mo ladratildeo traidor mdash e traidor por

dinheiro mdash simbolizava o apego aos bens deste mundo

Dois itineraacuterios que se cruzaram

O que pode ter levado esse mi-seraacutevel a ter tanto apego ao dinhei-ro Um apego que naturalmente chegou ao oacutedio ao Redentor por-que ningueacutem faz uma traiccedilatildeo co-mo aquela apenas por lucro sem oacutedio no fundo um oacutedio que do-mina o proacuteprio espiacuterito de lucro A roubar as esmolas coletadas para os pobres Ele que era o defensor dos direitos dos pobres na hora em que se verteu o perfume nos peacutes de Di-vino Mestre Ao desejo de se tor-nar rico para ter uma carreira cola-teral agrave de apoacutestolo e ser um homem considerado importante naquela so-ciedade de Jerusaleacutem julgando que ele perdia algo de sua carreira hu-mana seguindo a Nosso Senhor Je-sus Cristo a quem os fariseus des-denhavam como um homem sem importacircncia

Ela se diferenciou de Marta no ceacutelebre episoacutedio em que Nosso Se-nhor disse a esta uacuteltima mdash que cen-surava Madalena porque natildeo estava se ocupando das coisas da casa mas se limitava a olhar para Ele e ouvi--Lo mdash ldquoMarta Marta Maria esco-lheu a melhor parte que natildeo lhe se-raacute tiradardquo1

A partir de entatildeo Santa Ma-ria Madalena representou o esta-do puramente contemplativo des-tacado da vida ativa E pelo seu grande arrependimento pela sua fidelidade ao peacute da Cruz e pelo fato de ter sido a primeira que te-ve notiacutecia da ressurreiccedilatildeo do Re-dentor ela passou a simbolizar natildeo apenas a contemplaccedilatildeo mas a penitecircncia a penitecircncia na sua gloacuteria no estado do maior perdatildeo e da maior intimidade com Nosso Senhor

Com o exemplo da vida dela e de outros santos alguns teoacutelogos pre-tenderam que o estado de penitecircncia seacuteria profunda eacute mais bonito que o estado de inocecircncia

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Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

29

o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 12: Dr. Plinio-157-2011-04

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Hagiografia

Vemos assim quanto pode subir uma alma que estaacute no lodo e quanto

pode cair uma alma chamada para o que haacute de melhor Foram dois

itineraacuterios que se cruzaram eacute uma coisa que nos arrepia enche de terror

Santa Maria Madalena e Judas espiacuterito de Jacoacute e de Esauacute

A oposiccedilatildeo das figuras de Santa Maria Madalena e de

Judas torna-se tatildeo flagrante que vai ateacute ao Calvaacuterio e agrave Ressurreiccedilatildeo

Ela estava ao peacute da Cruz e ele o apoacutestolo maldito o homem execran-do foi quem encaminhou Nosso Se-nhor para a Cruz Santa Maria Mada-lena eacute a primeira a presenciar a Res-surreiccedilatildeo enquanto ele se enforca e sua alma cai porcamente no Inferno

As antiacuteteses entre um e outro es-tado de alma satildeo tremendas os es-piacuteritos satildeo diferentes Compete-nos fazer uma anaacutelise dos traccedilos desses espiacuteritos

Que nexo haacute entre arrependimen-to pura contemplaccedilatildeo e desapego dos bens do mundo de um lado e de outro lado impenitecircncia final desespero apego aos bens do mun-do enchafurdamento na vida praacuteti-ca ativa como fazia Judas homem que naturalmente roubava e fazia negoacutecios desonestos Que paralelis-mo existe entre uma coisa e outra

Haacute algum tempo tratei neste au-ditoacuterio a respeito de Esauacute e de Ja-coacute e falei sobre o espiacuterito de ambos

Santa Maria Madalena nos afi-gura como quem teve o espiacuterito de Jacoacute Quer dizer espiacuterito superior voltado para as coisas elevadas por-tanto para Deus e indiferente agraves coisas materiais do mundo

Judas eacute o tipo do Esauacute Mais do que vender o direito de primogenitura por um prato de lentilhas ele vende seu

Salvador por trinta dinheiros o que eacute muitiacutessimo pior E natildeo teve verdadeiro arrependimento porque nele natildeo ha-via mais nenhuma forma de virtude so-brenatural Fracassou totalmente caiu no desespero e suicidou-se

Contemplaccedilatildeo nascida da penitecircncia e do desapego

Entatildeo que nexo existe entre estas trecircs coisas o espiacuterito de contemplaccedilatildeo o espiacuterito de arrependimento e o des-prendimento das coisas desta Terra

Eacute faacutecil compreender pois uma pes-soa de qualquer um desses pontos parte para o outro Estando profun-damente arrependida com arrependi-mento eficaz ela perde o apego agraves coi-sas da Terra que lhe foram ocasiatildeo e motivo de pecado e tendo esse desa-pego facilmente vai para a contempla-ccedilatildeo A pura contemplaccedilatildeo e a renuacuten-cia das coisas devido agraves quais ela pe-cou levada ao uacuteltimo extremo satildeo o proacuteprio da penitecircncia Quem pratica a verdadeira penitecircncia natildeo se limita a separar-se daquilo que o conduziu

Judas fez tais coisas porque quan-do ele estava junto a Nosso Senhor e ouvia as preacutedicas e assistia aos mi-lagres do Divino Mestre o seu espiacute-rito saiacutea de laacute e comeccedilava a pensar em Jerusaleacutem nas suas praccedilas ou no Templo onde ficavam os tatildeo ldquofinos simpaacuteticos e inteligentesrdquo fariseus

Porque natildeo se reteve nas contem-placcedilotildees do Redentor e comeccedilou a aspirar agraves coisas do mundo ele caiu em pecado E esse pecado chegando ateacute o extremo o conduziu ao deses-pero Judas entatildeo se enforcou na fi-gueira maldita

Podemos admitir a possibilida-de de que em determinado momen-to Judas esteve em estado de graccedila e Maria Madalena em pecado mor-tal Ela saiu do pecado para subir a um alto grau de virtude e ele desceu da condiccedilatildeo de apoacutestolo para a qual tinha sido convidado por Nosso Se-nhor mdash houve portanto uma hora em que o Redentor natildeo soacute o amou mas o amou ateacute o fim e Judas amou a Nosso Senhor mdash ele desceu des-ta condiccedilatildeo para ser o vendilhatildeo do Salvador

Jesus aparece a Santa Maria Madalena apoacutes a Ressurreiccedilatildeo

- Colmar Alsaacutecia

A morte de Judas - Museu Satildeo Pio V Valecircncia (Espanha)

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 13: Dr. Plinio-157-2011-04

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Pranto sobre o corpo de Jesus - Museu Amedeo Lia Itaacutelia

ao pecado ele o execra E por isso co-loca entre aquilo por onde pecou e si mesmo a maior das distacircncias

Para praticar essa penitecircncia tatildeo grande convinha a Santa Maria Ma-dalena separar-se completamente do mundo E natildeo ficar apenas no esta-do de uma vida contemplativa e ati-va mas levar vida puramente con-templativa em que tudo foi abando-nado e qualquer forma indireta de contato com a mateacuteria execrada de-vido ao pecado foi tambeacutem cortada assim natildeo lhe restava outra coisa se-natildeo a contemplaccedilatildeo Contemplaccedilatildeo que nascida da penitecircncia e do de-sapego faz compreender a excelecircn-cia das coisas do Ceacuteu e que todas as coisas da Terra foram feitas para as do Ceacuteu Portanto era justo e bom derramar unguento nos peacutes sacros-santos de Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo quando houvesse pobre que precisasse de esmola

A pecadora arrependida amava Nossa Senhora e o traidor A detestava

Todos os que tecircm tratado des-te particular dizem o seguinte Ju-das com certeza natildeo tinha devoccedilatildeo a Nossa Senhora Se tivesse para com a Santiacutessima Virgem um miacuteni-mo de instinto filial de simpatia de amor quando ele caiu inteiramen-te em si iria procurar por Ela e ter--Lhe-ia pedido que arranjasse a situ-accedilatildeo dele Mas Judas tinha antipa-tia por Nossa Senhora e A detesta-va O Evangelho diz de modo taxati-vo que o democircnio tinha entrado ne-le E o democircnio afastava-o o quanto possiacutevel da Virgem Maria

Qual o resultado Ele natildeo se diri-giu Agravequela que eacute o canal das graccedilas e isto ocasionou a sua perdiccedilatildeo

Satildeo Pedro depois de ter renegado Nosso Senhor talvez tenha tido tenta-ccedilatildeo de desespero Mas eacute certo moral-mente que ele procurou Nossa Senho-ra Por isso ele que tambeacutem tinha pe-

cado muito foi fiel sendo o primeiro Papa da Santa Igreja Catoacutelica

Santa Maria Madalena sempre aparece fazendo parte do cortejo da Santiacutessima Virgem intimamente unida a Ela em todos os momentos sobretudo na hora reacutegia da vida de Nossa Senhora quando Nosso Se-nhor Jesus Cristo com dores indiziacute-veis disse Consummatum est

Podemos imaginar Santa Maria Madalena junto a Nossa Senhora na hora da piedade quando a Matildee de Deus tinha Nosso Senhor Jesus Cris-to sobre seu colo

Naquele momento tremendo Nossa Senhora ficou inteiramente abandonada Nosso Senhor no se-pulcro o Coleacutegio Apostoacutelico vaci-lante a cidade de Jerusaleacutem entre-gue a terremotos e os justos da An-tiga Lei andando de um lado para o outro A Santiacutessima Virgem nessa situaccedilatildeo tatildeo pouco conhecida esta-va completamente soacute

Tenho a impressatildeo de que natildeo Lhe faltou a assistecircncia de Santa Maria Madalena a qual estava junto drsquoEla E porque permaneceu junto agrave Matildee de Deus ela recebeu um rosaacute-rio de gloacuterias cada uma mais extra-ordinaacuteria do que outra

Quando vemos tudo isto eacute impos-siacutevel natildeo estremecermos com a nos-

sa proacutepria fraqueza Mas eacute impos-siacutevel tambeacutem que natildeo nos sintamos concertados com este ponto por mais fraco que o homem seja desde que ele se apegue muito a Nossa Se-nhora peccedila-Lhe muito por sua proacute-pria perseveranccedila e para que Ela o ampare nunca o abandone ele en-contra aiacute um ponto de firmeza de solidez

A uacuteltima das pecadoras aproxi-mou-se de Nossa Senhora e se tor-nou uma penitente gloriosiacutessima Um apoacutestolo que era distante de Nossa Senhora e frio para com Ela tornou-se o filho da maldiccedilatildeo e da perdiccedilatildeo que Dante coloca no Infer-no dentro da boca de Satanaacutes com as pernas para fora o eternamente triturado Enquanto que podemos imaginar no Ceacuteu Santa Maria Ma-dalena posta bem perto do Sagrado Coraccedilatildeo de Jesus e do Imaculado Coraccedilatildeo de Maria agradecendo os favores imerecidos de que ela foi re-pleta v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2271965)

1) Lc 10422) Cf Jo 121-8

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

18

1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 14: Dr. Plinio-157-2011-04

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Dr PLinio comenta

Lava-peacutes - Catedral de Notre Dame Paris

Formando os Apoacutestolos Nosso Senhor deu-lhes o divino exemplo de despretensatildeo

ldquoEu estou no meio de voacutes como aquele que serverdquo Vindo ao mundo para remir o gecircnero humano Jesus indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve

precisa ser o menor e mais apagado deve sacrificar-se e imolar-se a fim de que seu

apostolado seja fecundo

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omentarei um trecho do Evangelho de Satildeo Lucas mui-to propiacutecio para as comemo-

raccedilotildees da Paixatildeo de Nosso SenhorOra houve uma discussatildeo entre

eles sobre qual deles devia ser con-siderado o maior Jesus poreacutem lhes disse ldquoOs reis das naccedilotildees dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo con-traacuterio o maior entre voacutes seja como o mais novo e o que manda como quem estaacute servindo Afinal quem eacute o maior o que estaacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve Voacutes sois aqueles que permaneceram co-migo em minhas provaccedilotildees Por isso assim como o meu Pai me confiou o Reino eu tambeacutem vos confio o Rei-no Havereis de comer e beber agrave mi-nha mesa no meu Reino e vos sen-tareis em tronos para julgar as doze tribos de Israel1

Desigualdade das classes sociais

Trata-se de uma discussatildeo en-tre os Apoacutestolos durante a Ceia Eacute

curioso que depois de Jesus lhes ter lavado os peacutes instituiacutedo a Euca-ristia eles discutam entre si a res-peito de quem seria o maior Is-so poderia ser chamado de preten-satildeo e tenho a impressatildeo de que es-taria perfeitamente bem designado Na hora mais augusta mais sagra-da quando eles deveriam se prepa-rar para os maiores sacrifiacutecios sua preocupaccedilatildeo era de quem seria o maior Eacute uma coisa completamente extrapolada colocada fora da linha em que deveria estar

E Nosso Senhor lhes daacute uma li-ccedilatildeo dizendo-lhes incidentalmente uma seacuterie de coisas que valeria a pe-na comentar Afirma o Redentor

Afinal quem eacute o maior o que es-taacute agrave mesa ou o que estaacute servindo Natildeo eacute aquele que estaacute agrave mesa Eu poreacutem estou no meio de voacutes como aquele que serve

Vemos aqui uma afirmaccedilatildeo muito interessante da legitimida-de da desigualdade das classes so-ciais feita por Nosso Senhor Ele pergunta o que eacute mais ser servi-do ou servir E responde ser ser-vido eacute mais do que servir o servi-dor eacute menos do que aquele a quem ele serve

A autoridade existe para o bem dos subordinados

Quer dizer haacute uma desigualda-de que vem da natureza das coisas E essa desigualdade que eacute um fato legiacutetimo o Divino Mestre toma co-mo ponto de partida para exprimir a posiccedilatildeo drsquoEle Jesus estaacute no meio dos disciacutepulos como aquele que veio servir

E aqui estaacute a enorme liccedilatildeo de des-pretensatildeo como quem diz ldquoSe Eu Me coloco como servidor como ca-da um de voacutes quer ser considera-do o primeiro em relaccedilatildeo aos ou-trosrdquo Aqui estaacute a coisa acachapan-te Eacute contraacuteria ao espiacuterito de Nosso Senhor a toda a liccedilatildeo de sua vida agrave doutrina que Ele veio ensinar a pre-ocupaccedilatildeo de se fazer valer de se co-locar acima dos outros Em sentido oposto diz o Redentor os que man-dam devem ser como os que servem

Qual o significado disso No ca-so drsquoEle o sentido eacute evidente Je-sus veio para remir salvar os ho-mens Ele estava ali como pastor que salva suas ovelhas portanto para o bem deles Eacute a autoridade consti-tuiacuteda para o benefiacutecio daqueles so-bre os quais deve mandar Daiacute vem

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 15: Dr. Plinio-157-2011-04

Despretensatildeo ensinamento e exemplo divinos

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Uacuteltima Ceia - Catedral de Notre Dame Paris

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a ideia de que a autoridade tem um fim dentro de uma ordem posta por Deus ela precisa ser servidora des-se fim e por isso deve cercar-se de esplendor de grandeza de pompa Nosso Senhor louvou a mulher que derramou unguento precioso sobre a cabeccedila drsquoEle

Quem manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender e amar a autoridade e o princiacutepio de autoridade o qual eacute altamente be-neacutefico

Megalice de certos soberanos da antiguidade

Continua o Divino SalvadorOs reis das naccedilotildees dominam so-

bre elas e os que exercem o poder se fazem chamar benfeitores Entre voacutes natildeo deve ser assim Pelo contraacuterio o maior entre voacutes seja como o mais no-vo e o que manda como quem estaacute servindo

A megalice2 dos reis nas eacutepocas anteriores a Nosso Senhor era uma coisa incriacutevel Os monarcas assiacuterios por exemplo mandavam esculpir nas pedras dos rochedos os relatos dos

seus feitos E para que natildeo se apa-gassem era colocada uma espeacutecie de porcelana coberta com vidro de ma-neira que eles tinham a esperanccedila de que durante seacuteculos ainda se les-sem aquelas inscriccedilotildees E em muitos lugares ainda hoje podem ser lidas Eles contavam coisas que eram evi-

Aqueles imperadores romanoshellip quanta megalice A veneraccedilatildeo que faziam lhes prestar o modo pelo qual dominavam e oprimiam os ou-tros dirigiam tudo pela forccedila e tan-tas outras coisas Jaacute tive ocasiatildeo de comentar neste auditoacuterio o respeito que se tributava aos faraoacutes Li aqui certa vez uma carta ao faraoacute escri-ta por seu agente consular na Assiacute-ria na qual dizia ldquoEu que sou in-digno de beijar os vossos peacutes indig-no de beijar as patas de vossos cava-los beijo o poacute onde as patas de vos-sos cavalos se puseramrdquo Esse era o clima de megalice que os soberanos daquele tempo criavam

Nosso Senhor mostra que quem eacute catoacutelico deve servir Embora sua au-toridade seja muito grande e trans-pareccedila bastante ele como indiviacute-duo deve eclipsar-se por detraacutes de sua proacutepria autoridade O princiacute-pio o cargo a missatildeo o poder valem muito o indiviacuteduo vale pouco

Jorge V e Rainha Mary

Certa vez li numa revista de His-toacuteria um fato a respeito de Jorge V esposo da Rainha Mary Todas as noites em que natildeo recebiam visitas

Aquele que manda existe para o bem de seus subordinados E aqueles que obedecem devem compreender

e amar a autoridade e o princiacutepio de

autoridade o qual eacute altamente beneacutefico

dentemente falsas Uma dessas ins-criccedilotildees que eu li narrava que numa caccedilada o rei tinha domado um leatildeo pegando-o pelas orelhas Ou se tra-tava de um leatildeo velho que havia si-do embebedado previamente pelos cortesatildeos ou era simplesmente uma megalice sem nome

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Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 16: Dr. Plinio-157-2011-04

16

Dr PLinio comenta

Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1980

Papa Bento XVI durante a cerimocircnia de lava-peacutes - Basiacutelica de Satildeo Joatildeo de Latratildeo Roma

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no palaacutecio eles ficavam ouvindo vi-trola enquanto um secretaacuterio ia tro-cando os discos Quando chegavam agraves dez horas em ponto os monarcas se levantavam e o secretaacuterio coloca-va o disco com a muacutesica God save the King mdash Deus salve o Rei mdash Jorge V tomava atitude de continecircncia e a Rainha ficava em posiccedilatildeo de oraccedilatildeo Terminada a audiccedilatildeo iam dormir

E Rudyard Kipling3 comentou que isso era a verdadeira humilda-de Jorge V detentor da autorida-de compreendia que o cargo a dig-nidade era grande mas a pessoa de-le nada E por isso tomava uma ati-tude de respeito diante de seu proacute-prio cargo Nesse ato o Rei presta-va continecircncia agrave realeza e a Rainha rezava como uma fiel qualquer por aquela que era a Rainha da Inglater-ra Vemos aqui o eclipsar-se da pes-soa e o engrandecimento do cargo

Reis de Franccedila e Imperador Francisco Joseacute

Nos tempos de monarquia cristatilde havia fatos nesse sentido Quando os Reis de Franccedila saiacuteam da Catedral de Reims apoacutes serem coroados o po-vo acreditava mdash e parece que algum fundamento havia nisso mdash que eles tinham o poder de curar a escroacutefula4

ja era unida ao Estado em todas as monarquias europeias Pouco antes da guerra de 1914-18 em que qua-se toda a Europa era monaacuterquica na Quinta-feira Santa os reis iam la-var os peacutes dos pobres Francisco Jo-seacute por exemplo Imperador da Aacuteus-tria-Hungria lavava os peacutes dos po-bres na Catedral de Viena E um dos significados desse ato era este uma eacute a dignidade do Imperador e outra a situaccedilatildeo dele enquanto indiviacuteduo que devia estar sujeito a todas as hu-milhaccedilotildees por mais que o cargo por ele ocupado fosse excelente

O Papa ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo

Os proacuteprios Papas realizavam o lava-peacutes De um lado o Papa imita Nosso Senhor Jesus Cristo mdash a dig-nidade pontifical como a dignidade reacutegia deve tocar os pobres mdash mas de outro lado esse ato significa a hu-milhaccedilatildeo do homem indicando o desaparecimento da pessoa mesmo no esplendor do cargo e da funccedilatildeo

Vemos assim na tradiccedilatildeo cristatilde a aplicaccedilatildeo do ensinamento do Divino

Entatildeo filas de es-crofulosos repug-nantes ficavam agrave espera do novo Rei na saiacuteda da catedral o qual toca-va cada doen-te com a matildeo e dizia ldquoLe Roi te touche Dieu te gueacuterisse mdash O Rei te toca Deus te curerdquo Di-ziam os cronistas do tempo que muita gen-te ficava curada Quer di-zer depois daquele esplen-dor maacuteximo da realeza mdash a coro-accedilatildeo de um Rei de Franccedila era uma cerimocircnia fabulosa em que aparecia o cargo e natildeo o homem mdash o monar-ca condescendia em tocar com su-as matildeos reacutegias os enfermos mais re-pelentes do seu reino para curaacute-los usando de um carisma que reconhe-cia natildeo proceder dele A frase ldquoO Rei te toca Deus te curerdquo queria di-zer ldquoO Rei sabe que natildeo cura nada quem cura eacute Deus O Rei eacute um me-ro instrumento para que a accedilatildeo de Deus se exerccedilardquo

O exemplo de Nosso Senhor foi imitado nos tempos em que a Igre-

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 17: Dr. Plinio-157-2011-04

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O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor

dos servidores de Deusrdquo evoca uma

reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Mestre O Papa chamando-se a si proacuteprio ldquoservidor dos servidores de Deusrdquo evoca uma reminiscecircncia do que Nosso Senhor disse

Entatildeo para praticarmos adequa-damente a despretensatildeo devemos compreender que toda grandeza ter-rena deve existir mdash porque Deus quis que houvesse grandes na ordem espi-ritual como na ordem temporal mdash e precisa cercar-se do esplendor que lhe eacute proacuteprio mas o homem que estaacute colocado nesse lugar de grandeza de-ve saber apagar-se E aqueles que es-tatildeo longe da grandeza natildeo possuem o cargo natildeo o devem invejar Para o vaidoso o que adianta ter um cargo se natildeo pode se gabar dele Nenhum cargo nenhuma situaccedilatildeo pessoal na qual o indiviacuteduo natildeo possa consentir no envaidecimento natildeo lhe adianta de nada

Satildeo Vicente Ferrer ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

Lembro-me que li numa biogra-fia de Satildeo Vicente Ferrer um fa-to muito curioso Ao chegar a Bar-celona mdash ele era grande missionaacute-rio mdash foi-lhe preparada uma recep-ccedilatildeo apoteoacutetica Todo o povo estava reunido das janelas pendiam tape-tes preciosos ele caminhava debaixo do paacutelio carregado pelos nobres da cidade Durante o cortejo algueacutem desconfiado perguntou-lhe ldquoIrmatildeo Vicente natildeo estaacutes vaidosordquo Ele respondeu ldquoA vaidade esvoaccedila em torno de mim mas natildeo entrardquo

O que adianta para um homem receber todas essas homenagens se ele eacute obrigado a resistir agrave tentaccedilatildeo de se envaidecer Natildeo adianta nada Porque se eacute para ficar vaidoso haacute um prazer terreno Mas se natildeo po-de se envaidecer andar devagar no meio daquele povo aplaudindo e ele resistindo contra a tentaccedilatildeo eacute muito

sa de refeiccedilotildees aquele que conta a piada mais engraccedilada conhece a uacutel-tima novidade ou comentaacuterio sobre nossa vida interna e o transmite pa-ra o pobre basbaque que ainda natildeo sabe estaacute a par das coisas mais im-portantes diz a coisa mais audacio-sa em mateacuteria de doutrina Tudo is-so satildeo coisas que significam pree-minecircncia e datildeo apego E disso tudo devemos mostrar-nos desapegados lembrando o ensinamento e o exem-plo de Nosso Senhor

A pretensatildeo torna esteacuteril o apostolado

Quanto maior eacute a pretensatildeo de uma pessoa mais esteacuteril eacute seu apos-tolado porque soacute faz apostolado fe-cundo quem estaacute unido ao Divino Mestre Quem natildeo estaacute unido ao Re-dentor eacute como a vinha que estaacute des-tacada do sarmento

Como podemos estar unidos a Ele se temos pretensatildeo Natildeo estou afirmando que sejamos todos uns poccedilos de pretensatildeo Mas quero dizer que todo homem na melhor das hi-poacuteteses eacute como Satildeo Vicente Ferrer estaacute sempre com a pretensatildeo esvoa-ccedilando em torno dele Isso eacute eviden-te Entatildeo cuidado Ainda que rece-bamos manifestaccedilotildees tatildeo mais mo-destas do que as prestadas a Satildeo Vi-cente Ferrer devemos lutar contra a pretensatildeo de todos os modos e com todo o empenho v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 141969)

1) Lc 22 24-302) Megalice termo criado por Dr Plinio

a fim de designar o viacutecio de quem atribui a si mesmo qualidades que natildeo possui ou entatildeo as exagera

3) Joseph Rudyard Kipling (1865-1936) escritor inglecircs

4) Infecccedilatildeo tuberculosa em gacircnglios lin-faacuteticos do pescoccedilo

cansativo Quando termina ele de-sabafa ldquoUf Acabou a tentaccedilatildeo ao menos estou trancado na minha ce-la sozinhordquo Esse eacute o verdadeiro di-namismo das coisas

Quem deseja aparecer natildeo imita Nosso Senhor Jesus Cristo

Precisamos ser muito cautelo-sos Sempre que estamos apetecen-do uma situaccedilatildeo de mando de des-taque de influecircncia devemos tomar cuidado pois facilmente nos apega-mos a isso para nos mostrarmos E se consentirmos ao desejo de apare-cer natildeo estaremos imitando o exem-

plo de Nosso Senhor o qual indicou que entre os catoacutelicos aquele que manda deve ser como quem serve precisa ser o menor apagado sacri-ficado e imolar-se

Algueacutem poderia fazer uma per-gunta-objeccedilatildeo ldquoMas Dr Plinio o senhor nos diz isso com uma ecircnfase como se estiveacutessemos na iminecircncia de sermos eleitos presidentes da re-puacuteblica Ora acontece que noacutes sen-do membros do Movimento natildeo es-tamos em via de ser eleitos para na-da e nem temos ao menos de mo-mento um eleitorado muito grande Entatildeo por que o senhor nos fala es-sas coisasrdquo

Digo isto porque natildeo se trata ape-nas de cargos mas de situaccedilotildees nas quais se exerce alguma influecircncia numa roda de pessoas querer ser o primeiro numa conversa numa me-

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 18: Dr. Plinio-157-2011-04

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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1 Beato Luiacutes Pavoni presbiacutete-ro (dagger1848) Entregou-se agrave formaccedilatildeo dos jovens pobres dedicando-se agrave educaccedilatildeo religiosa e artesatilde Para is-so fundou a Congregaccedilatildeo dos Fi-lhos de Maria Imaculada em Breacutes-cia Itaacutelia

2 Satildeo Francisco de Paula ere-mita (dagger1507)

Santa Teodora virgem e maacutertir (dagger307) Por haver pedido aos cris-tatildeos que estavam diante do tribu-nal em Tiro (Liacutebano) que se lem-brassem dela diante de Deus foi presa torturada e lanccedilada ao mar

3 IV Domingo da QuaresmaSatildeo Luiacutes Scrosoppi presbiacutetero

(dagger1884) Sacerdote da Congregaccedilatildeo do Oratoacuterio fundou em Udine Itaacute-lia a Congregaccedilatildeo das Irmatildes da Di-vina Providecircncia para a educaccedilatildeo cristatilde das jovens

4 Santo Isidoro Bispo e Doutor da Igreja (dagger636)

Beato Joseacute Bento Dusmet Bis-po (dagger1894) Monge e abade bene-ditino foi Bispo de Catacircnia (Siciacute-lia) Entregou-se agrave instruccedilatildeo cristatilde do povo com um cuidado especial ao clero

5 Satildeo Vicente Ferrer presbiacutetero (dagger1350)

Satildeo Geraldo Abade de Saint--Sauve Franccedila (dagger1095)

6 Satildeo Pedro de Verona pres-biacutetero e maacutertir (dagger1252) Nascido de pais maniqueus ainda crianccedila abraccedilou a Feacute Catoacutelica Na adoles-cecircncia recebeu o haacutebito das matildeos de Satildeo Domingos e consagrou-se a combater as heresias Foi marti-rizado durante uma viagem a Mi-latildeo Itaacutelia

7 Santo Hermano Joseacute sacerdo-te premonstratense (1152-1241)

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle presbiacutetero (dagger1719)

8 Satildeo Dioniacutesio de Corinto Bis-po (dagger180)

9 Santa Cacilda de Toledo vir-gem (dagger1075) Nascida de famiacutelia maometana ajudou com misericoacuter-dia os cristatildeos presos e depois jaacute cristatilde viveu como ermitatilde em Bur-gos Espanha

Satildeo Liboacuterio Bispo de Le Mans na Gaacutelia (atual Franccedila) (seacutec IV)

10 V Domingo da QuaresmaSatildeo Beda o Jovem monge

(daggercerca de 883)

11 Santo Estanislau Bispo e maacutertir (dagger1079)

Santa Gemma Galgani virgem (dagger1905) Miacutestica italiana insigne pela contemplaccedilatildeo da Paixatildeo e pe-las dores suportadas com paciecircncia

morreu em Luca Itaacutelia num Saacuteba-do Santo aos vinte anos

12 Satildeo Juacutelio I Papa Eleito para o soacutelio pontifiacutecio em 6 de fevereiro de 337 defendeu valorosamente a Feacute contra os arianos e apoiou San-to Atanaacutesio Doutor da Igreja na mesma missatildeo (dagger352)

13 Satildeo Martinho I Papa (dagger656)Beata Ida de Val-des-Roses vir-

gem (daggercerca de 1290) Religiosa do mosteiro cisterciense de Val-de-Ro-ses Franccedila

14 Satildeo Pedro Gonzaacutelez (chama-do Satildeo Telmo) sacerdote domini-cano (dagger1246)

15 Santo Ortaacuterio abade (daggerseacutec XI) Levou uma vida de austerida-de e oraccedilatildeo no mosteiro de Lan-delles (Franccedila) e foi assiacuteduo em curar enfermos e ajudar os pobres

16 Satildeo Magno de Oacutercadas maacuter-tir (dagger1116) Priacutencipe das Ilhas Oacuterca-

Satildeo Francisco de Paula - Paroacutequia Satildeo Pedro Carmona Sevilha

Satildeo Joatildeo Batista de La Salle - Basiacutelica de Satildeo Pedro Roma

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Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 19: Dr. Plinio-157-2011-04

Calendaacuterio dos santos ndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndashndash Abril ndashndashndashndash

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das na Escoacutecia abraccedilou a Feacute Catoacute-lica e encontrando-se em dificulda-des com o Rei da Noruega por fal-sas acusaccedilotildees foi assassinado trai-ccediloeiramente

17 Domingo de Ramos e da Pai-xatildeo do Senhor

Santos Pedro diaacutecono e Hermoacute-genes seu servo maacutertires em Meli-tene na antiga Armecircnia

18 Beato Joseacute Moreau presbiacutete-ro e maacutertir (dagger1794) Durante a Re-voluccedilatildeo Francesa foi guilhotinado em Anjou (Franccedila) numa Sexta--Feira da Paixatildeo por oacutedio agrave Feacute Ca-toacutelica

19 Satildeo Leatildeo IX Papa (dagger1054) Foi Bispo de Toul durante 25 anos e como Papa convocou vaacuterios siacute-nodos para a reforma da vida do clero e a extirpaccedilatildeo da simonia Foi ajudado pelo futuro Satildeo Gregoacuterio VII

20 Santa Inecircs de Montepulcia-no religiosa (dagger1317) Vestiu o haacute-bito dominicano aos 9 anos e aos 15 contra sua vontade foi eleita su-periora das freiras de Proceno (Itaacute-lia) fundando mais tarde um mos-teiro com a regra de Satildeo Domingos

21 Santo Anselmo Bispo e Dou-tor da Igreja monge beneditino e Arcebispo da Cantuaacuteria (Inglater-ra) defendeu a Igreja na luta das investiduras sendo exilado duas ve-zes Seus escritos exerceram grande influecircncia em sua eacutepoca e lhe gran-jearam o tiacutetulo de ldquoPai da Escolaacutesti-cardquo (seacutec XII)

22 Sexta-Feira SantaSatildeo Maryahb (ldquoO Senhor cha-

mardquo) maacutertir (dagger341) Arcediago na Peacutersia atual Iraque foi martirizado

durante a perseguiccedilatildeo do Rei Sapor II na Oitava da Paacutescoa

23 Saacutebado SantoSatildeo Jorge maacutertir (daggerseacutec IV)Satildeo Geraldo de Toul (dagger994) Bis-

po de Toul (Alemanha) durante 31 anos atendeu aos pobres e interce-deu pelo povo com jejuns e oraccedilotildees no tempo de peste Ajudou os mos-teiros com bens materiais e instruiu os disciacutepulos

24 Domingo da Paacutescoa da Res-surreiccedilatildeo do Senhor

Satildeo Melito abade Foi envia-do por Satildeo Gregoacuterio Magno para evangelizar a Inglaterra e se tor-nou Bispo de Canterbury (Inglater-ra) (dagger624)

25 Satildeo Marcos Evangelista Disciacutepulo de Satildeo Pedro e autor do segundo Evangelho (seacutec I)

Satildeo Pedro de Satildeo Joseacute Betan-cur (dagger1667) Religioso da Or-dem Terceira Franciscana fundou

Santa Catarina de Siena - Igreja de Santa Maria Kitchener (Canadaacute)

em Antigua Guatemala a Ordem de Nossa Senhora de Beleacutem (Be-thlemitas) para cuidar de oacuterfatildeos mendigos doentes jovens aban-donados peregrinos e homens in-vaacutelidos

26 Nossa Senhora do Bom Con-selho de Genazzano

Satildeo Rafael Arnaacuteiz Baroacuten (dagger1938) Religioso no mosteiro cisterciense de Santo Isidoro de Duentildeas Espanha Foi atingido ain-da noviccedilo por graves enfermidades que o acompanharam por toda a vi-da e o obrigaram a abandonar vaacute-rias vezes o mosteiro Autor de nu-merosos escritos asceacuteticos e miacutesti-cos

27 Beata Maria Antocircnia Ban-dreacutes y Eloacutesegui virgem (dagger1919) Religiosa espanhola da Congrega-ccedilatildeo das Filhas de Jesus Morreu aos 21 anos de uma grave enfermida-de pouco depois de entrar para o convento

28 Satildeo Luis Maria Grignion de Montfort presbiacutetero (dagger1716)

Beato Joseacute Cebula presbiacutetero e maacutertir (dagger1941) Sacerdote de nacio-nalidade polonesa da Congregaccedilatildeo dos Missionaacuterios Oblatos de Maria Imaculada foi martirizado no cam-po de concentraccedilatildeo de Mauthau-sen Aacuteustria por oacutedio agrave Feacute Catoacuteli-ca

29 Santa Catarina de Siena vir-gem e Doutora da Igreja (dagger1380)

Santo Acardo de Avranches (dagger1172) Bispo de Avranches e aba-de de Satildeo Viacutetor em Paris Em Lu-cerna (Suiacuteccedila) escreveu vaacuterios tra-tados de vida espiritual no mostei-ro da Ordem Premonstratense on-de foi enterrado

30 Satildeo Pio V Papa (dagger1572)

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O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 20: Dr. Plinio-157-2011-04

O perigo comeccedila com a vitoacuteria - II

D

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

de medieval raiacutezes e lastros de virtu-des suficientes para se eliminar qual-quer preocupaccedilatildeo

Natildeo se pode entretanto afirmar que havia maacute intenccedilatildeo nesta atitu-de Tratava-se apenas de um relaxa-mento e natildeo de uma deliberaccedilatildeo em praticar o mal Nessa fase de afrou-xamento do modo de viver a Idade Meacutedia ateacute nos impressiona pelo que tem de temperante de digna de no-bre mesmo nos seus prazeres

Note-se que isto natildeo eacute uma afirma-ccedilatildeo natildeo eacute uma tese que venha acom-panhada de documento mas uma hi-poacutetese baseada em alguns conheci-mentos Mas quando formulamos es-ta hipoacutetese os fatos se alinham de tal maneira que tudo se torna claro As-sim sendo os acontecimentos ficam arquitetonicamente explicados

Estaacute na substacircncia da santificaccedilatildeo o desejo da cruz

Eacute necessaacuterio considerar que is-to natildeo se refere a desvios existentes mais ou menos excepcionais embo-ra ateacute profundos Encontramos na Idade Meacutedia fenocircmenos marginais como as heresias mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia casos de satanismo mas que natildeo satildeo a Idade Meacutedia um

ainda honestos legiacutetimos e ateacute equi-librados Haacute poreacutem uma sede de prazer que se vai tornado progressi-vamente acentuada Numa terceira etapa notamos todo o corpo social da Idade Meacutedia jaacute deteriorado

Tratava-se de um relaxamento e natildeo uma deliberaccedilatildeo expliacutecita em fazer o mal

Eacute uma espeacutecie de febricitaccedilatildeo de agitaccedilatildeo de deliacuterio que jaacute define bem o seacuteculo XV fazendo com que muitas pessoas do tempo pensassem

que o mundo iria acabarNota-se entatildeo a passagem

sucessiva de um apogeu para um estado de decadecircncia O ponto de partida foi segura-mente a falta de cuidado a fal-ta de prevenccedilatildeo Uma atitude despreocupada da Cristanda-de Medieval foi a causa da de-cadecircncia

Despreocupaccedilatildeo esta que se caracterizava pela excessi-va confianccedila em si mesmo jul-

gando haver na proacutepria socieda-

essa primeira fase em que a Idade Meacutedia se revela ain-da ponderada equilibra-

da passamos para uma eacutepoca em que os prazeres se vatildeo acentuando Satildeo

Apoacutes analisar a primeira fase medieval Dr Plinio nos mostra como a partir de um relaxamento operou-se

a corrupccedilatildeo da sociedade

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Satildeo Fernando de Castela - Catedral de Sevilha Espanha

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

29

o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 21: Dr. Plinio-157-2011-04

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Haacute depois uma segunda fase de estabilizaccedilatildeo em que tudo se torna

menos aacuterduo e mais faacutecil Esta eacute a fase perigosa Natildeo se devem

temer tan-to as lutas de conver-satildeo como

as batalhas de segunda fase porque eacute aiacute que vem a tentaccedilatildeo de se viver sem preocupa-ccedilotildees dentro da virtude o que signi-fica abandonar a virtude e viver fora dela Estaacute na substacircncia da santifica-ccedilatildeo o desejo de cruz

As vaacuterias etapas da decadecircncia medieval

A primeira das vaacuterias etapas da decadecircncia se caracteriza pelo agra-daacutevel-bom que se acentua demais mas ainda honesto nobre e equili-brado Eacute exemplo disto o traje femi-nino habitual na Idade Meacutedia Era lindiacutessimo com os beliacutessimos cha-peacuteus de cone com veacuteus pendentes ou em forma de gomos com uma coroa Eacute algo de mui-to nobre e bonito e tam-beacutem muito calmo e repou-sante Toda a arte medieval pro-duz uma sensaccedilatildeo muito agradaacutevel

O agradaacutevel encontra sua melhor expressatildeo no Goacutetico Flamboyant Mas o Flamboyant vai invadindo to-dos os campos e em vez de ser ape-nas um agradaacutevel-bonito para a sa-

la de visitas passa a ser a nota domi-nante em quase todos os ambientes

Tudo piora sensivelmente a par-tir do momento em que o agradaacutevel se torna iliacutecito e portanto imoral O mesmo se daacute na literatura de Cavala-ria e em inuacutemeros outros setores da vida medieval

Para se analisar como a crise se ge-neralizou no corpo da sociedade me-dieval eacute necessaacuterio ver as profundi-dades dessa crise Por profundidade entendemos as vaacuterias camadas des-sa sociedade a mais baixa a do po-vo constituiacutea a uacuteltima profundidade A mais elevada seriam as cortes

A corrupccedilatildeo da sociedade a partir das elites

Antes de prosseguirmos seria conveniente lembrar um princiacutepio

imperador que eacute ateacute arabizante e muccedilulma-

nizante mas isto tam-beacutem natildeo eacute a Idade Meacute-dia Eacute a doenccedila inteira

do corpo social que es-tou procurando des-crever e natildeo apenas certas chagas

Isto interessa muito aos contrar-revolucionaacuterios so-bretudo tendo-se em

vista o Reinado do Imaculado Coraccedilatildeo

de Maria conforme sua promessa em Faacutetima ldquoPor fim o meu Imacu-lado Coraccedilatildeo triunfaraacuterdquo

Estes princiacutepios satildeo tatildeo verdadeiros que se

aplicam ateacute aos fenocircme-nos de vida espiritual dos

contrarrevolucionaacuterios de hoje Em virtude de qua-se todos os ambientes atu-almente estarem uns mais outros menos impregna-

dos do espiacuterito revolu-cionaacuterio quando uma al-ma ao converter-se tor-

na-se contrarrevolucionaacuteria entra em uma fase de lutas e enormes provaccedilotildees

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A primeira das vaacuterias etapas da

decadecircncia medieval se caracteriza pelo agradaacutevel-bom que se acentua demais

mas sem entretanto deixar de ser honesto nobre e equilibrado

Jesus Crucificado - Lima Peru

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 22: Dr. Plinio-157-2011-04

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revoLuccedilatildeo e contra-revoLuccedilatildeo

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez

corrompe a pequena A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a

meacutedia burguesia e a pequena

pequena Este processo eacute lento mas terrivelmente eficaz

Houve tempo na Idade Meacutedia em que se nota muito claramente es-te fenocircmeno de corrupccedilatildeo nos al-tiacutessimos letrados nos altos aristo-cratas nos altiacutessimos argentaacuterios e mesmo no mais alto clero

Haacute no entanto correntes de opi-niatildeo e umas tantas classes sociais que constituem centros naturais de resistecircncia Eacute o que se passou com

o movimento humanista e renas-centista que tanto floresceu en-

tre os altos intelectuais mas que encontrou focos de re-

sistecircncia nas universida-des a tal ponto que estas

Ao analisarmos algueacutem de personalidade encontra-mos mdash sobretudo caso se trate de um liberal mdash vaacute-rias personalidades conjun-tas que entram numa espeacutecie de diaacutelogo Haacute num mesmo homem o monarquista e o re-publicano o catoacutelico e o protes-tante Eacute o princiacutepio das vaacuterias per-sonalidades opostas estabelecendo um diaacutelogo interno e que se daacute na vida espiritual de um homem

vida de extravagacircncia A metaacutestase agrave ma-neira de cacircncer foi se dando de proche en proche1 para as demais classes sociais

A corte corrompe a meacutedia nobreza que por sua vez corrompe a peque-na A alta burguesia sempre a primeira a corromper-se com os reis deteriora a meacutedia burguesia e a

Na Idade Meacutedia o princiacutepio do di-aacutelogo interior entre vaacuterias persona-lidades dava-se conforme as classes sociais Esse processo de deteriora-ccedilatildeo comeccedilou com os mais ricos e po-derosos

O fenocircmeno eacute mais evidente nas cortes reais e mesmo em certas cor-tes principescas tatildeo altas quanto as cortes de reis Comeccedila-se entatildeo uma

1- Henrique VIII rei da Inglaterra 2- Personagem

caracteriacutestico da meacutedia nobreza (Metropolitan Museum of Art Nova

York) 3- Casal de jovens burgueses

(Metropolitan Museum of Art Nova York)

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

O

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 23: Dr. Plinio-157-2011-04

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audaciosos mas que os bons natildeo lhes oferecem a intoleracircncia e re-sistecircncia que eles demonstram para com o bem

Se algueacutem denuncia publicamen-te o mal praticado pelos revolucionaacute-rios algo se lhes atrapalha ainda que eles natildeo queiram E eacute esta espeacutecie de atrapalhaccedilatildeo interna que produz o estertor dos revolucionaacuterios Poucos tecircm coragem para argumentar contra quem lhes denuncia E vence quem argumenta com mais intoleracircncia

no sentido mais profundo da palavra Pode-se em certo sentido dizer sob este aspecto que tudo depende intei-ramente da intoleracircncia

O mal comeccedila a vencer quando os bons deixam de ter essa intoleracircncia ousada e triunfante   v

(Extraiacutedo de conferecircncia de maio de 1959)

1) Pouco a pouco

durante muito tempo ficaram agrave mar-gem do movimento novo apegadas agraves foacutermulas antigas

Entre as camadas inferiores do povo a corrupccedilatildeo eacute muito mais len-ta havendo muita resistecircncia Mas esta resistecircncia sofre um processo de degradaccedilatildeo que se delineia mais ou menos da seguinte maneira ini-cialmente haacute uma indignaccedilatildeo e re-sistecircncia profunda agrave deterioraccedilatildeo a seguir uma contemporizaccedilatildeo ape-sar da natildeo adesatildeo e ateacute da resistecircn-cia por fim toleracircncia indiferente seguida de admiraccedilatildeo inveja e ade-satildeo ao processo que jaacute estava vitorio-so haacute muito tempo nas camadas su-periores da sociedade

A decadecircncia deveu-se agrave toleracircncia dos bons

Quando estudamos o problema da decadecircncia da sociedade medie-val ocorre-nos uma indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela se ver-gou agrave Revoluccedilatildeo

Muitos afirmam que a decadecircn-cia coube aos reis e ao clero que deram o passo inicial Haacute outra te-oria mais simpaacutetica que eacute a de que tudo foi possiacutevel a partir do mo-mento em que a resistecircncia deixou de ser caracterizada por uma into-leracircncia agressiva indignada e mili-tante Soacute a reaccedilatildeo eneacutergica eacute capaz de deter o progresso do mal O mais lamentaacutevel natildeo eacute que os maus sejam

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Dr Plinio durante uma conferecircncia na deacutecada de 1990

Quando estudamos o problema da decadecircncia da

sociedade medieval ocorre-nos uma

indagaccedilatildeo no sentido de saber por onde ela

se vergou agrave Revoluccedilatildeo

O misteacuterio da vidahellip

O

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 24: Dr. Plinio-157-2011-04

O misteacuterio da vidahellip

O

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

Quem nunca teraacute pensando no que consiste a vida Analisaacute-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um

estarrecido diante dos misteacuterios que ela conteacutemDiante de tatildeo interessante tema Dr Plinio discorre magnificamente agrave

maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos

tema a respeito do qual me pediram que tratasse eacute de tal vastidatildeo imensidade e

complexidade que se fizeacutessemos um simpoacutesio de um ano natildeo teriacuteamos senatildeo aflorado o assunto

Consideraccedilotildees sobre heraacuteldica

Imaginemos por exemplo um leatildeo heraacuteldico O leatildeo eacute sem duacutevi-da um espeacutecime magniacutefico do que a vida pode produzir Como a figu-ra desse animal pintada sobre uma superfiacutecie eacute pouco em comparaccedilatildeo com um leatildeo de verdade Entretan-to ela tem sob certo ponto de vista uma beleza maior do que o proacuteprio leatildeo vivo pois apresentando suas formas de modo mais caracteriacutestico pode ele ser mais bem compreendi-do E para se entender bem uma seacute-rie de leotildees vivos nada melhor do que ter visto um leatildeo bem pintado

Representar bem um leatildeo procu-rando natildeo propriamente imitaacute-lo

estilizaacute-lo mas subl i maacute-

-lo eacute o que faz a heraacuteldica Atraveacutes desta tudo eacute idealizado de um modo esquematizado captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia mais ainda aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a ldquomentalidaderdquo do animal E se olharmos para cem le-otildees vivos teremos aprendido menos do que vendo um leatildeo heraacuteldico

Leatildeo heraacuteldico tintura-matildee da leonicidade

O que de misterioso tem a vida do leatildeo por onde ele parece melhor em alguns aspectos quando natildeo es-taacute vivo mas esquematizado Eacute que ele foi visto considerado por um ser com um tipo de vida mais alto que eacute o homem E o leatildeo depois de ter formado uma imagem na mente hu-mana ter criado no espiacuterito humano uma impressatildeo tatildeo forte propiciou ao homem talentoso apoacutes uma anaacute-lise a vontade e os meios de expri-mi-lo E isto pintado pelo homem tem sob certo ponto de vista mais vida do que propriamente quando vivo no leatildeo

Por quecirc Porque a imagem do leatildeo desprendeu-se deste e entrou na mente do homem passando as-sim para um circuito e um grau de vida superior O leatildeo corre salta

ruge mas natildeo entende a si proacuteprio porque ele natildeo entende nada Mas algueacutem que entende e tem portan-to um grau de vida incomparavel-mente mais elevado olhou para o leatildeo e tirou de dentro dele algo mais alto do que o proacuteprio leatildeo e pintou este algo Assim o que haacute de pre-cioso na vida do leatildeo mas meio es-condido disfarccedilado a vida da alma conseguiu apresentar melhor agrave nos-sa atenccedilatildeo

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leatildeo heraacuteldico hirto figeacute1 faz com que este seja co-mo que o leatildeo dos leotildees uma tintu-ra-matildee da leonicidade O conceito de leatildeo deixou de ser um leatildeo con-creto e passou a ser um leatildeo de quin-tessecircncia

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia ao folhear um aacutelbum e deparar-me com uma pintura repre-sentando uma mulher eu pensava o seguinte ldquoO imponderaacutevel de um ta-lento A fisionomia desta mulher eacute de uma velha mas neste rosto o artis-ta pintou uma pele de moccedilardquo Aquilo produzia uma sensaccedilatildeo de contradi-ccedilatildeo que causava mal-estar

Agrave esquerda leatildeo alado siacutembolo de Satildeo Marcos - Veneza Itaacutelia agrave direita Dr Plinio durante uma conferecircncia

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 25: Dr. Plinio-157-2011-04

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Entretanto o mais curioso eacute que a pele sendo ao mesmo tempo de mo-ccedila tinha qualquer coisa de enseba-do de uma pessoa que se lava pou-co E de uma forma de ensebamento que daacute um brilho falso e ruim agrave pele Natildeo era o brilho da limpeza mas um lustre de sujeira que foi aplicado na-quela pele de moccedila

Que talento tem aquele pintor pa-ra saber exprimir por meio de tintas sucessivas sobre uma superfiacutecie lisa ateacute a sensaccedilatildeo da ligeira paacutetina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante O que haacute na pele de uma pessoa que parece agra-daacutevel de ver e o que nela existe por onde engendra algo que lhe eacute mortal

e se ela deixa durar a torna repug-nante Que quintessecircncia de talen-to precisa ter um homem para saber ver isto e passar por cima de uma pele que ele pintou natildeo sei que lus-trina ou verniz imitando exatamente a sujeira Que tesouros de observa-ccedilatildeo tem ele sobre a vida O que exis-te na vida humana por onde ela al-gumas vezes frutifica a plenitude de si mesma e outras vezes produz sua proacutepria deterioraccedilatildeo e degene-rescecircncia Fonte ao mesmo tempo do que haacute de mais admiraacutevel e mais repugnante De uma pedra natildeo sai nada de repugnante tambeacutem natildeo emerge nada de admiraacutevel

Algueacutem poderia dizer

mdash O brilho Eu digo mdash O brilho eacute uma coisa admiraacute-

vel mas eacute algo que posto na pedra ela devolve A pedra eacute inerte natildeo tem vida O homem entretanto pa-ra elogiar um olhar diz ldquoEsse olhar eacute brilhanterdquo Mas o olhar vivo eacute tan-to mais que ele nunca elogiaraacute um brilhante dizendo ldquoParece o olharrdquo

Um dos brilhantes mais conheci-dos e bonitos o Koh-I-Noor estaacute na coroa da Rainha da Inglaterra Po-de-se fazer daquele brilhante qual-quer elogio afirmar que ele lembra uma inteligecircncia ruacutetila etc O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pes-

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 26: Dr. Plinio-157-2011-04

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

soa ldquoSeus olhos satildeo como o Koh-I--Noorrdquo Mas natildeo se pode afirmar a este uacuteltimo ldquoTu eacutes como um olhordquo

Metaacutefora da floresta

Quais as reciprocidades qual o jo-go das analogias o que eacute no fundo esse misteacuterio da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em to-dos esses exemplos que apresentei de maneira a termos ao mesmo tem-po a impressatildeo de apanhar coisas fi-nas e definidas mas quando se vai apalpar vecirc-se que algo foge eacute inde-finido e resiste a qualquer definiccedilatildeo

Com efeito a palavra ldquovidardquo natildeo se define e tambeacutem o vocaacutebulo ldquomorterdquo sendo a morte a cessaccedilatildeo de algo que natildeo eacute definido ela mes-ma natildeo pode ser definida Porque o termo ldquonatildeordquo posto diante do indefi-nido natildeo define o indefinido

Isso natildeo nos impede de ter certa noccedilatildeo de vida e de vitalidade Que uso fazer dessas noccedilotildees tendo em vista as finalidades para as quais es-tamos reunidos aqui O que eacute a vida natural da alma O que eacute vida sobre-natural O que eacute a vida de Deus O que eacute vida

Aiacute noacutes esbarramos com um mis-teacuterio podemos apalpaacute-lo como faz um cego mas sem o ver e eacute pa-ra apalpaccedilotildees que vos convido nes-ta reuniatildeo Apalpaccedilotildees que faremos tanto quanto possamos natildeo procu-rando abarcar o tema inteiro

Realizaremos algumas incur-sotildees no assunto agrave maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais ele sabe que jamais po-deraacute percorrecirc-la in-teira mas pa-ra ter algumas ideias a res-peito da f l o r e s -

sotildees apalpar pontos a fim de ex-trair ideias e depois fazermos algu-mas consideraccedilotildees Mais do que is-so natildeo nos permite o tempo ainda mais numa reuniatildeo como esta Vou tomar a vida de baixo para cima desde o que ela tem de mais elemen-tar e mais simples ateacute chegarmos ao mais complexo

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de pro-che en proche O espiacuterito humano funciona exatamente agrave maneira dos antigos navegantes portugueses que chegaram ateacute a Iacutendia Eles desciam um trecho ao longo do litoral afri-cano depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa Descansavam e desciam mais um tanto Regressa-vam e anotavam o que tinham vis-to em conexatildeo com o anteriormen-te feito E assim navegando de pon-to em ponto chegaram ateacute a dobrar o Cabo da Boa Esperanccedila

Laacute eles estavam tatildeo longe que o caminho da certeza jaacute natildeo lhes era possiacutevel Em vez de voltar para Sa-gres resolveram seguir em frente No Cabo segundo Camotildees apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gecircnio lusitano Nossos ancestrais por-tugueses vararam o espectro do Ada-mastor e entraram pelo Oceano Iacutendi-co Entatildeo mais valia a pena continu-ar e assim chegaram agrave Iacutendia e mais tarde ateacute a China e o Japatildeo

Haacute certo ponto atingido pelo espiacuteri-to humano do qual ele natildeo volta atraacutes para formar certezas mas embarca nas hipoacuteteses Ou ele pela experiecircncia en-

contra a certeza na ponta da hipoacutetese ou natildeo

ta nela faz algumas incursotildees De-pois disso ele natildeo sai com um mapa da floresta mas leva na alma exem-plos do que haacute dentro dela algumas noccedilotildees sobre a vida da floresta Per-cebendo que a floresta era variaacutevel

O Patildeo de Accediluacutecar eacute colossal Quantos milhares de homens

ele esmagaria entretanto chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu topo e fazer passar uma carreta

dominando-o E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde sequer mover-se

quase ao infinito ele compreendeu que as incursotildees o ajudariam a ter uma ideia dela a qual eacute mais rica do que se apenas a contemplasse de fo-ra para dentro

A vida eacute uma floresta alguns es-tatildeo no meio da picada outros per-to do fim e outros no comeccedilo mas a picada eacute a mesma Conveacutem fazer nela de um lado ou de outro incur-

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

29

o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 27: Dr. Plinio-157-2011-04

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sossega natildeo se sente satisfeito Vamos entatildeo viajar um pouco e lanccedilar algu-mas hipoacuteteses assim teremos obedeci-do agrave seguranccedila e agrave ousadia do gecircnio lu-so do qual tantos de noacutes procedemos

A pedra a grama o homem

Consideremos a coisa mais sim-ples comum que a ordem natu-ral pode oferecer aos nossos olhos Imaginemos que um indiviacuteduo an-dando pelo campo encontre uma pedrazinha sobre uma graminha Quantas pedrinhas e graminhas ha-veraacute pelo mundo Soacute a sabedoria divina conhece

Sendo reflexivo ele se deteacutem e vecirc que a pedrinha estaacute colocada ligei-ramente em cima da grama a qual cresceu inicialmente sob a pedra fez algumas voltas e continuou a se de-senvolver

O indiviacuteduo tem uma impressatildeo de superioridade e ao mesmo tem-po de inferioridade da pedra Es-ta pesa sobre a planta de tal manei-ra que a tornou torta a pedra eacute por-tanto mais forte do que a planta

Entretanto a planta tem algo den-tro de si por onde ela natildeo se confor-ma com a pedra apesar de ser mais fraca ela empurra a pedra como que com o cotovelo Ela se adapta agrave forma da pedra e encontra o caminho do sol A grama tem uma superioridade de outro gecircnero que soacute uma palavra de quatro letras pode explicar bem ldquovrdquo ldquoirdquo ldquodrdquo ldquoardquo Ela tem vida e por isso resiste encontra

um caminho se esgueira fura e brilha agrave luz do Sol embora a pedra queira atrapalhaacute-la

E a pedra que foi co-locada ali fica estupi-damente naquele lo-cal se ningueacutem a reti-rar enquanto o mundo for mundo Se for uma pedra enorme ela pode comprimir tudo quanto eacute vivo Mas se quem tem vida natildeo se deixar com-primir por ela o ser vivo eacute tatildeo supe-rior agrave pedra que faz dela o que en-tende Assim se compreende o que eacute a mateacuteria natildeo-viva e se tem um si-nal do que eacute a vida

O Patildeo de Accediluacutecar por exemplo tatildeo colossal Quantos milhares de homens ele esmagaria entretan-to chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio ateacute seu to-po e fazer passar uma carreta domi-nando o Patildeo de Accediluacutecar servindo--se dele para um passeio E o Patildeo de Accediluacutecar natildeo pocircde nem mover-se

Embora enorme e majestoso ele natildeo sentiu sequer o que lhe aconte-cia E essa formiga chamada homem construiu um torreatildeo em cima dele amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele

O que eacute entatildeo a vida

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal a vida se apresenta mdash estou indicando

sintomas externos

mdash como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudanccedila de sua si-tuaccedilatildeo A planta cresce se desenvol-ve fenece Ela existe dentro do tem-po estaacute sujeita a mil condiccedilotildees a mil infortuacutenios mas de si tem uma coi-sa que o mineral absolutamente natildeo possui uma energia pela qual por um princiacutepio que lhe eacute proacuteprio crava raiacutezes na terra e seleciona o que lhe conveacutem Ela se expande na direccedilatildeo dos minerais que lhe satildeo uacuteteis

O melhor dos mineralogistas natildeo conhece tatildeo bem os minerais como uma planta incapaz de conhecer--se a si proacutepria ou qualquer outra coisa E o trabalho dela por debai-xo da terra eacute de antenas delicadas por onde ela faz esta coisa admiraacutevel que o ser inerte natildeo eacute capaz de rea-lizar encontrar sugar e transformar em si mesma algo que natildeo eacute ela

Quer dizer ela faz um encontro e um trabalho de assimilaccedilatildeo de apro-priaccedilatildeo que eacute o crescimento dela E da noite de suas raiacutezes ela tira a par-te dela que brilha e frutifica

O mais extraordinaacuterio eacute que ela natildeo conhece nada a planta natildeo tem nem sequer sensibilidade E sem ter

sensibilidade ela entretanto porque tem isto chama-

do vida possui de-terminada or-

denaccedilatildeo por

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

P

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 28: Dr. Plinio-157-2011-04

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

onde pega o que lhe conveacutem e se de-senvolve

O heliotropismo eacute a procura que a planta faz do sol Algumas ateacute gi-ram fazem torccedilotildees para encontrar o astro rei como o girassol Se algueacutem quisesse caricaturar o Sol imagina-ria o girassol que eacute a figura do baju-lador procurando imitar o bajulado voltando-se para este mas sem con-seguir imitaacute-lo em nada sol vulgar rasteiro amarelo quando o outro eacute dourado O girassol tem uma borda-dura que imita o dourado e um cebo-latildeo marrom no seu interior O mar-rom eacute o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo

O que eacute propriamente o heliotro-pismo Os cientistas jaacute o estudaram Eles conseguem tornar tantas coi-sas sem graccedila entretanto aprofun-dando-se o que dizem pode-se ve-rificar a existecircncia de alguma graccedila no assunto O Sol traz consigo cer-tas transformaccedilotildees do ar e determi-nados graus de calor necessaacuterios pa-ra que a planta a qual movida pela vida procura mdash notem bem mdash a sua proacutepria conservaccedilatildeo e seu proacuteprio desenvolvimento Trata-se portanto de uma forma de energia nascida de dentro do proacuteprio vegetal que pro-

cura sua conservaccedilatildeo e depois a plenitu-de mdash o que natildeo se conserva natildeo al-canccedila a plenitude

mas agraves vezes o que natildeo alcanccedila a pleni-

tude se conserva Isto que estaacute na planta e dessa for-

ma se desenvolve o que eacute

A graminha e o Koh-I-Noor

Eacute um misteacuterio Mas um misteacuterio ordenadiacutessimo que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha mdash mesmo a mais insignifi-cante que natildeo eacute alimento para o no-bre cavalo nem tapete para um leatildeo mas comida de formiga mdash algo in-trinsecamente mais nobre do que o Koh-I-Noor Este natildeo reage natildeo opera natildeo cresce natildeo tende para perfeiccedilatildeo nenhuma eacute parado den-tro dele natildeo habita nenhuma energia vital A planta porque eacute capaz dessas coisas vale mais que o Koh-I-Noor Isso de tal maneira eacute verdade que se imaginaacutessemos dois artistas um fi-zesse o Koh-I-Noor e o outro elabo-rasse um vegetal diriacuteamos que muito maior eacute aquele que soube fazer uma planta Em outros termos a grande-za de Deus se reflete muito mais nu-ma plantinha feita para alimentar formiga do que no Koh-I-Noor

O Koh-I-Noor vai para a coroa da Rainha da Inglaterra A graminha Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha no dia da coroaccedilatildeo ou da inauguraccedilatildeo do Parlamento ela pisa em cima da graminha sem perceber Ela calca o tesouro mas leva sobre a fronte a coisa secundaacuteria

Metafisicamente falando a obra--prima de Deus eacute mais a graminha do que o Koh-I-Noor De fato o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas de maneira a po-dermos percebecirc-Lo mais no Koh-I-

-Noor do que na graminha mas na realidade a graminha eacute mais do que o Koh-I-Noor

A graminha natildeo sabe nada mas de-la se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os liacuterios do campo ldquoOlhai para os liacuterios do campo natildeo te-cem nem fiam entretanto Salomatildeo em sua grandeza natildeo se vestiu como elesrdquo2 Poderiacuteamos dizer ldquoOlhai para a graminha natildeo tem ciecircncia nem sen-sibilidade entretanto nenhum botacircni-co sabe com tanto acerto o que con-veacutem a ela a graminha procura nas tre-vas na escuridatildeo aquilo que lhe con-veacutem e o encontrardquo

Gramado de uma grande faacutebrica

Considerem uma faacutebrica moder-na fabulosa Ela natildeo realiza o que faz uma graminha quando deita um miliacute-metro a mais de seu proacuteprio vegetal

Houve ateacute quem dissesse que os vegetais eram faacutebricas feitas por Deus por ordem de seu Criador a natureza fabricava coisas que o ho-mem natildeo sabia produzir A compa-raccedilatildeo soacute natildeo me agrada porque di-minui a importacircncia da grama A vi-da que estaacute no vegetal eacute mais do que algo organizado pelo homem para produccedilatildeo de caraacuteter material remexendo coisas minerais quiacutemi-cas etc

Imaginem uma faacutebrica na qual haacute um gramado Quem haveria de dizer que no fundo o gramado eacute mais do que a faacutebrica Um teacutecnico poderia explicar tudo o que se faz na faacutebri-ca mas nenhum grande cientista se-ria capaz de dizer o que eacute a vida que anima aquele gramado

Se compreendecircssemos a liccedilatildeo de sabedoria que Deus nos daacute Enquan-to estamos aqui conversando a gra-ma de nosso jardim estaacute respirando O Criador sabe o que cada folha de vegetal estaacute fazendo por causa des-ta vida que lhe deu E numa hierar-quia tatildeo bem calculada que cada ve-

Coroa da Rainha da Inglaterra em destaque o Koh-I-Noor

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 29: Dr. Plinio-157-2011-04

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o Pensamento fiLosoacutefico De Dr PLinio

getal faz tudo quanto estaacute na sua na-tureza mas natildeo sobe um miliacutemetro um grau aleacutem de sua natureza faz o que estaacute de acordo com a ordem vegetal mas natildeo eacute capaz de reali-zar nada de animal pelo contraacuterio serve de moldura e de comida para o animal O gramado eacute um banque-te das formigas e dos passarinhos e natildeo vive senatildeo voltado para os seres de ordem superior Entatildeo compre-endemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se focircssemos capazes de entender isto nos ajoelhariacuteamos e glorificariacutea-mos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece aci-ma da terra Diriacuteamos

ldquoMeu Deus Voacutes fizestes entre outras coisas as plantas tatildeo feias na sua raiz e tatildeo belas na parte que apa-rece Mas de outro lado para que vossas regras dentro do imobilismo de certos padrotildees tivessem todas as mobilidades possiacuteveis fizestes em algumas plantas raiacutezes tais que elas formam os mais bonitos parques pa-ra os palaacutecios

ldquoE algumas dessas raiacutezes se com-param ao trigo para alimentar o ho-mem o caraacute a mandioca a batata e tantas outras Voacutes quisestes que a planta agraves vezes desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apre-sentar a tiacutetulo de fruto balanccedilando ao ceacuteu Desejastes fazer tudo isso di-verso e apenas neste grau primeiro de vida nos destes uma possibilida-de quase infinita de meditaccedilatildeo

ldquoDe todo esse formigamento de vida Voacutes sois o Autor Mas um Au-tor sem esforccedilo sem o trabalho da aplicaccedilatildeo que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que ne-nhum de noacutes homens conhecerdquo

Eis aiacute uma primeira noccedilatildeo da vi-da que nos aproxima diretamente de Deus E nos faz compreender que es-se primeiro degrau da vida debaixo de certo ponto de vista jaacute eacute um santuaacuterio Noacutes nos sentimos pequeninos descon-certados mas temos uma experiecircncia interna curiosa Olhando para a plan-ta na perspectiva em que estou falan-do noacutes dizemos ldquoComo somos gran-des em relaccedilatildeo aos vegetaisrdquo

O que qualquer homem eacute capaz de falar sobre uma planta ou fazer dela eacute uma coisa fenomenal Pobre planta Mas Deus potildee ali misteacuterios perto dos quais somos pequeninos e entatildeo dizemos ldquoAquele que conhe-ce o que natildeo conhecemos e fez o que natildeo podemos fazer e nos fez a noacutes mesmos eacute superior a noacutes assim co-mo somos superiores agrave plantardquo

Podemos entatildeo imaginar vaga-mente como Ele nos vecirc Somos inco-mensuravelmente superiores a um ve-getal o Criador eacute infinitamente supe-rior a noacutes Como seraacute Ele que criou a mim e a planta e fez que eu pensas-se o que acabo de dizer sobre ela e quis esse contraste essa comparaccedilatildeo para que me reportasse a Ele tives-se uma figura drsquoEle e me enchesse de respeito e de amor para com Ele mas me sentisse face a Ele menor do que

a menor das plantas diante do Hima-laia Oh meu Deus Que liccedilatildeo E quanta sabedoria drsquoEle para que sem me revelar nada nem me falar nada a natildeo ser o que estaacute nos livros da Reve-laccedilatildeo entretanto me desse um espiacuteri-to por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele eacute

O homem criou uma planta imaginaacuteria o liacuterio heraacuteldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou mas natildeo se sabe quan-do surgiram os seres vivos Que coisa gloriosa o homem receber essa comu-nicaccedilatildeo de Deus E como Deus me amou fazendo com que eu conheces-se tal comunicaccedilatildeo e de outro lado deu-me inteligecircncia por onde algo eu descobrisse e me dignificasse Por-que descobrir natildeo eacute de nenhum mo-do criar mas tem analogia com criar E o Criador que eacute infinito deu-me a possibilidade de fazer essa analogia

Um homem colhe uma planta um liacuterio por exemplo e o transfor-ma num liacuterio que natildeo existe o liacute-rio da heraacuteldica Esse homem criou uma planta imaginaacuteria E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real

Isso eacute uma analogia que Deus a propoacutesito dos vegetais bondosamen-te concedeu ao espiacuterito humano

Eacute bonito receber a Revelaccedilatildeo Mas tambeacutem eacute bonito andar com os passos da inteligecircncia e construir uma determinada coisa Como eacute bo-nito viver Porque isso eacute viver E co-mo eacute bela a vida   v

Continua no proacuteximo nuacutemerohellip

(Extraiacutedo de conferecircncia de 221980)

1) Fixo imobilizado2) Mt 6 28-29Jardim do Castelo

de Angers Franccedila

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 30: Dr. Plinio-157-2011-04

A Quarta-Feira de Cinzas em seu nascedouro

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Dentre as inuacutemeras luzes irradiadas pela Santa Igreja sobre a Civilizaccedilatildeo Cristatilde encontra-se uma de inigualaacutevel valor a Liturgia catoacutelica Esta quando vista em funccedilatildeo do contexto no qual surgiu

apresenta brilhos e encantos proacuteprios Analisando a gecircnese da Quarta-Feira de Cinzas Dr Plinio

aponta-nos o verdadeiro estado de espiacuterito com que devemos ingressar na Quaresma

ara bem se compreender a intenccedilatildeo da Igreja ao insti-tuir o cerimonial da Quar-

ta-Feira de Cinzas eacute necessaacuterio con-siderar suas origens bem como sua repercussatildeo na eacutepoca em que foi es-tabelecido

Portanto eacute necessaacuterio voltarmos nossa atenccedilatildeo a um longiacutenquo pas-sado visto que essa praacutetica lituacutergica mdash agrave semelhanccedila de como quase to-das as outras mdash se constituiu prova-velmente de modo definitivo na Ida-de Meacutedia Algo ainda se acrescen-tou nos primeiros seacuteculos dos tem-pos modernos e depois disso quase nada foi acrescido

A Igreja centro da vida social

Como eram constituiacutedas as cida-des no tempo em que essa praacutetica li-tuacutergica surgiu

Por aquilo que delas restou ou pelo que ficou retratado nas ilumi-nuras vecirc-se que as cidades medie-vais eram pequeninas com ruas es-treitas a fim de caber dentro de mu-ralhas as quais eram necessariamen-

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

F B

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Page 31: Dr. Plinio-157-2011-04

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Genazzano Itaacutelia

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

35

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Page 32: Dr. Plinio-157-2011-04

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

acusando-se de algum pecado E por terem sido objeto de uma hon-raria e consideraccedilatildeo agrave qual natildeo ti-nham direito estando arrependidos queriam receber o desprezo que me-reciam

Ademais a estes se somavam muitos que por terem cometido pe-cados que natildeo eram puacuteblicos mas se julgavam pecadores juntavam-se agravequeles para fazer penitecircncia e as-sim reparar suas faltas

Aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem

Assim quando os sinos comeccedila-vam a tocar as pessoas iam saindo de suas casas e no grupo dos ino-centes ou dos pecadores se dirigiam para a igreja Imaginemos o esta-do de espiacuterito desses homens peca-dores andando pela rua ao lado da populaccedilatildeo inocente vendo de longe a fachada imponente da igreja ador-nada de santos e de anjos tendo no centro uma imagem do Crucifi-cado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo abenccediloando ou entatildeo a imagem da Virgem das Virgens concebida sem pecado original

Ouvindo ainda o bimbalhar dos sinos chegam diante da fachada da igreja que se er-gue imponente aparentan-do severidade entretanto tatildeo acolhedora que parece di-zer ldquoVinde filhos Voacutes pe-castes mas aproximai-vos de onde o perdatildeo vos vem confessai-vos e arrepen-dei-vosrdquo

Entravam todos e transcorrida a ceri-mocircnia os pecadores se retiravam para um determinado lugar onde iriam fazer penitecircncia

Contudo isto soacute tinha ver-dadeira au-

te circunscritas pois que serviam para defender os habitantes de ataques ini-migos

Por isso as casas eram mui-to proacuteximas umas das outras o an-dar superior se projetava mais pa-ra a frente de modo a ficar sobre a rua a ponto de estando agrave janela de uma dessas casas ao estender o bra-ccedilo poder-se tocar na casa que esta-va adiante

No centro desse emaranhado or-gacircnico de edifiacutecios erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja Mais proacuteximo agrave igreja havia agraves vezes uma ou mais abadias ou conventos em torno dos quais se agrupava a popu-laccedilatildeo Deste modo tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

Os pecadores ante a sociedade

Ora o que se passava na igreja na quarta-feira que marcava o iniacutecio da Quaresma

As pessoas que haviam se torna-do claramente pecadores mdash tendo

por exemplo matado algueacutem sem disso ter se arrependido e confessa-do portanto vivendo afastadas dos sacramentos ou entatildeo blasfemado publicamente contra Deus e contra a Igreja e apesar de repreendidas

persistiram em sua obstina-ccedilatildeo e ateacute mesmo aque-

las que notoriamente se tinham afastado

da Igreja deixan-do de compare-cer agrave Missa e frequentar os sacramentos mdash eram cha-madas peca-dores puacutebli-cos

Como eram vistos pela so-

ciedade estes pecadoresO conceito do

homem medieval a respeito deste tipo de

gente era o seguinte ldquoEles satildeo pecadores miseraacuteveis e por is-so altamente censuraacuteveis deles de-vemos viver afastados pois o ho-mem reto natildeo convive com o peca-dor e quando tem que tratar com um deles o faz com distacircncia e frie-za pois ateacute que se arrependa e fa-ccedila penitecircncia por seu pecado sendo inimigo de Deus ele eacute tambeacutem ini-migo do gecircnero humanordquo

Apesar disso a centralidade da Igreja na sociedade medieval era tal que ateacute mesmo esses pecadores compareciam agrave igreja por ocasiatildeo da Quarta-Feira de Cinzas mesmo por-que a maior parte deles sabia que es-tava no mau caminho e pesava-lhes viver naquele estado apesar de natildeo querer abandonaacute-lo

Aleacutem desses pecadores nesta ocasiatildeo havia outros que se denun-ciavam como tais Agraves vezes eram homens tidos como muito virtuo-sos mas que nessas cerimocircnias apa-reciam entre os pecadores puacuteblicos

Aspectos da cidade de La Brigue Franccedila

33

No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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No centro do emaranhado orgacircnico de edifiacutecios

erguia-se uma torre o campanaacuterio da igreja

Tudo quanto se passava na igreja constituiacutea o centro da vida social

tenticidade porque o homem na Ida-de Meacutedia possuiacutea uma profunda no-ccedilatildeo da gravidade do pecado

Algueacutem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio

Como manter firme esta noccedilatildeo que inuacutemeras circunstacircncias procu-ram desbotar em noacutes

Para compreendermos isso vou levantar uma pergunta um tanto es-tranha O que meus ouvintes pen-sam de um homem do qual se afir-masse o seguinte ldquoVocecirc eacute um tipo leviano que natildeo se toma a seacuterio a si proacutepriordquo A resposta normal a tal in-juacuteria poderia ser uma bofetada Pois um homem que natildeo se toma a seacuterio a si proacuteprio natildeo vale nada eacute proacuteprio do homem tomar-se a seacuterio e este eacute o primeiro passo para ele ser alguma coisa

Ora quanto mais descabida para natildeo dizer blaacutesfema a seguinte per-gunta Seraacute que Deus se toma a seacuterio a Si proacuteprio

Evidentemente Deus Se toma infinitamente a seacuterio assim como Se ama infinitamente a Si proacuteprio Donde deflui que tendo Ele aponta-do que determinadas atitudes cons-tituem pecado de tal forma que os homens que as praticam rompem com Deus e tornam-se seus inimigos isto eacute tomado realmente a seacuterio por Deus

Tomando-Se a seacuterio Deus natildeo diz algo que natildeo produz efeito natildeo pro-clama uma inimizade que natildeo eacute au-tecircntica Do contraacuterio seria o caso de se perguntar se Deus existe

A seriedade de tudo diante de Deus

Com esta seriedade que participa de sua infinita sabedoria e santidade Deus vecirc as accedilotildees dos homens

Tudo eacute imensamente seacuterio diante de Deus O pecado portanto eacute pro-fundamente seacuterio execraacutevel e graviacutes-

A Virgem e o Menino Aachen (Alemanha) Agrave esquerda Catedral de

Chartres Franccedila

34

Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Imposiccedilatildeo das cinzas

simo Quem o comete rompe com Deus pondo-se na mais miseraacutevel das situaccedilotildees

Por mais rico que algueacutem pos-sa ser ao pecar torna-se o mais de-safortunado dos homens pois ten-do tudo o que a Terra pode oferecer natildeo pode merecer o Ceacuteu O peca-dor deve saber que eacute ainda pior o fa-to de ele estar na contingecircncia de a qualquer momento advir-lhe a puni-ccedilatildeo divina seja com penas nesta vi-da atraveacutes de inuacutemeras e inopinadas desgraccedilas que podem desabar suces-sivamente sobre ele ou entatildeo com a pior das puniccedilotildees que eacute a do infer-no agraves quais nada nesta Terra serve como termo de comparaccedilatildeo as tre-vas eternas onde o fogo queima e natildeo ilumina onde os piores tormen-tos atazanam continuamente os ho-mens os quais compreendem natildeo haver para eles mais remeacutedio

O pecador tem a noccedilatildeo viva do mal que fez contra Deus e que natildeo deveria ter feito por ser Ele infini-tamente Santo Bom e Verdadeiro Sabe igualmente que eacute pela infinita Justiccedila divina que aquela tremenda coacutelera desaba sobre os pecadores

Esta noccedilatildeo os pecadores na Idade Meacutedia a tinham e por isso iam agrave igreja pedir perdatildeo e fazer penitecircncia

Sentir a gravidade do pecado

O que satildeo essa penitecircncia e esse perdatildeo

Em primeiro lugar o pecador de-ve reconhecer todo o mal que fez Para isso a Igreja incita-o a recitar

o reacuteu com uma majestade indiziacutevel com aparatos de forccedila e severidade tremendos mas ao mesmo tempo manda algueacutem entregar ao reacuteu um bilhete que diz ldquoSe rogares ao juiz na sinceridade de tua alma e pedi-res com as seguintes palavras que estatildeo neste bilhete o juiz te manda o recado que te atenderaacuterdquo

Assim o pecador como um reacuteu caminha para o Deus Juiz com a oraccedilatildeo ditada por Ele proacuteprio Natildeo se pode imaginar maior manifesta-ccedilatildeo de misericoacuterdia do que esta

Entatildeo do fundo da igreja vinha o miacutesero cortejo dos pecadores re-zando ldquoMiserere mei Deus secun-dum magnam misericordiam tu-am et secundum multitudinem mi-serationum tuarum dele iniquita-tem meam mdash Tende compaixatildeo de mim oacute Deus segundo a vossa gran-de misericoacuterdia E segundo a mul-tidatildeo de vossas bondades apagai a minha faltardquo

Sentindo-se esmagados pela gran-deza do Juiz e pela infacircmia de sua culpa eles rezam para pedir perdatildeo Mas ao mesmo tempo satildeo alenta-dos pela promessa do Juiz que lhes diz ldquoReza desta forma meu filho sente isto que eu me tornarei teu amigordquo Nisso vecirc-se o magniacutefico equiliacutebrio da atitude divina

Havendo Deus ldquoditadordquo a oraccedilatildeo que deve ser a Ele dirigida para pe-dirmos perdatildeo natildeo poderia ter Ele

pecado mdash ao inveacutes de exterminaacute-lo de imediato conforme a ofensa me-receria mdash Deus ldquocochichardquo no ou-vido do homem aquilo que o ho-mem deve considerar a fim de me-dir a gravidade do mal cometido aleacutem de ensinaacute-lo co-mo pedir perdatildeo tal co-mo um juiz que recebe

Note-se a bela atitude da Igreja ao mesmo

tempo em que ela estimula o uso dos

ciliacutecios institui uma cerimocircnia para

abenccediloaacute-los como se dissesse Penitencia-te

ateacute o sangue mas sendo tu meu filho

aproxima-te que vou deitar minha becircnccedilatildeo

neste instrumento que te tortura

os salmos penitenciais os quais de modo magniacutefico estimulam o sen-tir da enorme gravidade e maliacutecia do pecado Atraveacutes dos salmos pe-nitenciais nota-se que sendo Deus tatildeo insondavelmente bom Ele cria o homem com a gloacuteria do estado de prova para assim poder adquirir meacuteritos Contudo tendo o homem

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Luzes Da civiLizaccedilatildeo cristatilde

Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

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Ciliacutecios utilizados por Satildeo Geraldo Majella

ccedilatildeo dos ciliacutecios os quais geralmente eram cintos cheios de pequenos gan-chos de ferro que arranhavam a car-ne em torno do tronco causando do-lorosas feridas Estes eram usados por alguns durante todo o periacuteodo da Quaresma

Note-se a bela atitude da Igre-ja que aqui estaacute contida Ao mesmo tempo em que ela estimula o uso dos ciliacutecios institui uma cerimocircnia para abenccediloaacute-los como se dissesse Peni-tencia-te ateacute o sangue mas sendo tu meu filho aproxima-te que vou dei-tar minha becircnccedilatildeo neste instrumento que te tortura

Aiacute se vecirc mais uma vez o equiliacute-brio entre a justiccedila e a misericoacuterdia E justamente por dever existir es-te equiliacutebrio entre estas bem como entre as demais virtudes eacute que de-vemos amar a justiccedila tanto quanto a misericoacuterdia

De maneira que diante de uma afirmaccedilatildeo como a seguinte ldquoDeus disse ao pecador Eu te execrordquo Noacutes devemos exclamar assim como o fa-riacuteamos diante de uma frase mise-ricordiosa Pois quando o pecador compreende o mal de seu pecado e percebe quanto Deus odeia o peca-do ele compreende tambeacutem quanto Deus eacute a Pureza E diante da Pureza infinita de Deus como pode algueacutem natildeo se entusiasmar

Quem tem horror ao pecado ama a virtude agrave qual este se opotildee Portan-to eacute sumamente necessaacuterio ter entu-siasmo pela severidade de Deus

Uma bela oraccedilatildeo para se fazer nesta Quaresma eacute a seguinte ldquoOacute meu Senhor como Voacutes odiais meus pecados Eu Vos peccedilo dai-me uma centelha de vosso oacutedio sagrado em relaccedilatildeo a elesrdquo Poreacutem logo depois noacutes devemos tambeacutem pedir a miseri-coacuterdia pois sem ela quem pode sub-sistir  v

(Extraiacutedo de conferecircncia de 231984)

qual opera uma explosatildeo de confian-ccedila ldquoVoacutes me salvareis oacute Deusrdquo

Quando se chega a esta esperan-ccedila cheia de alegria pelo fato de Deus ter dito no fundo da alma do peca-dor que ele seraacute salvo inicia-se a Quaresma Movido por esta espe-ranccedila o pecador quer sofrer para ex-piar suas faltas

Entatildeo aproximando-se do padre o pecador se ajoelha e este lhe traccedila com cinza uma cruz sobre a fronte dizendo ldquoLembra-te homem que eacutes poacute e ao poacute haacutes de voltarrdquo O que naquela ocasiatildeo equivalia a dizer ldquoCuidado A morte ronda em torno de ti Deus apesar de infinitamente bom eacute justo tambeacutem Agora vai e fa-ze penitecircnciardquo

Ela fere mas tambeacutem cuida da ferida

Como eram as penitecircncias Antes de tudo tratava-se de jeju-

ar alguns chegavam a passar os qua-renta dias a patildeo e aacutegua Mas ha-via tambeacutem uma cerimocircnia da becircn-

resumido esta suacuteplica numa jacu-latoacuteria com isso adiantando o mo-mento do perdatildeo

De suacuteplica em suacuteplica ateacute a confianccedila no perdatildeo

Tal como estaacute constituiacutedo este conjunto de salmos daacute a impres-satildeo de que enquanto a pessoa re-za permanece entretanto certa duacutevida acerca do perdatildeo de Deus Por isso o penitente repete o pedi-do com um novo argumento Por vezes apela-se agrave bondade de Deus noutra parte agrave gloacuteria Poreacutem cada uma dessas palavras eacute muito ade-quada e uacutetil para preparar o espiacute-rito agrave compenetraccedilatildeo da gravida-de do pecado mas tambeacutem para que vaacute se adquirindo uma confian-ccedila inabalaacutevel de que Deus o per-doaraacute

Agrave medida que os salmos se suce-dem tem-se a impressatildeo de que o Salmo da Confianccedila vai despontan-do ateacute chegar agrave uacuteltima palavra a

O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

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O aacutepice da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo

C omo teraacute sido a uacuteltima troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Matildee Santiacutessima Imaginemos o afeto o mundo de amor e de respeito a veneraccedilatildeo o entendimento de almas reciacuteproco que nessa hora transpareceu

Este foi o momento culminante da ldquohistoacuteria dos olharesrdquo Caso algueacutem tenha podido contemplar esses dois olhares seria uma vantagem ficar cego em

seguida Pois o que ver depois disso

(Extraiacutedo de conferecircncia de 2391972)

Encontro de Jesus com sua Matildee - Igreja de Nossa Senhora do Bom Socorro Montreal (Canadaacute)

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