revista doctor plinio 206_201505

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 Firmeza do guerreiro católico

 emos aqui São Felipe Néri já idoso,

com a barba inteiramente bran-

ca e o semblante de um homem que lutou

muito, e ainda está no combate. E que es-

tá olhando atento e desconfiado para um

adversário invisível para nós, mas que eledivisava ao longe.

 Dir-se-ia que o Santo estava perceben-

do formar-se uma trama a certa distân-

cia dele, e que pensava na argumenta-

 ção a ser dada e na rasteira a passar em

quem avançava contra ele.O caráter de luta, a meu ver, está não

tanto no olhar, que dá muito a ideia de

vigilância e de pugnacidade, mas no

  formato contorcido das sobrancelhas. Dir-se-ia que de tanto franzir as sobrancelhas

elas ficaram com essa forma singular. Como um guerreiro carrega as características

da guerra, assim também as sobrancelhas dele carregavam o traçado de profundas  preocupações.

 Mas, se o olhar é vigilante, toda a atitude do rosto é plácida: é a firmeza do guer-

reiro católico que tem coragem.

(Extraído de conferência de 17/1/1986)

  w  w  w .  a

  r  a  u

   t  o  s .  o  r  g

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As matérias extraídas

de exposições verbais de Dr. Plinio

— designadas por “conferências” —

são adaptadas para a linguagem

escrita, sem revisão do autor 

Publicação Mensal Ano XVIII - Nº 206 Maio de 2015

Virgo Potens

  3

Dr. PlinioDr. PlinioRevista mensal de cultura católica, de

propriedade da Editora Retornarei Ltda.

CNPJ - 02.389.379/0001-07

 INSC. - 115.227.674.110

 

Diretor:  Antonio Augusto Lisbôa Miranda

Conselho Consultivo:

 Antonio Rodrigues Ferreira

Carlos Augusto G. Picanço Jorge Eduardo G. Koury

Redação e Administração: Rua Santo Egídio, 418

02461-010 S. Paulo - SPTel: (11) 2236-1027

E-mail: [email protected]

Impressão e acabamento: Pavagraf Editora Gráfica Ltda.Rua Barão do Serro Largo, 296

03335-000 S. Paulo - SPTel: (11) 2606-2409

SumárioSumárioAno XVIII - Nº 206 Maio de 2015

Preços da

assinatura anual

Comum . . . . . . . . . . . . . . R$ 130,00Colaborador  . . . . . . . . . . R$ 180,00

 Propulsor  . . . . . . . . . . . . . R$ 415,00Grande Propulsor  . . . . . . R$ 655,00

 Exemplar avulso . . . . . . . R$ 18,00

 Serviço de Atendimento

 ao Assinante

Tel./Fax: (11) 2236-1027 

EDITORIAL 

4  A Virgo Potens vencerá 

DONA  LUCILIA  

6  Incólume tabernáculo interior - II  

S AGRADO CORAÇÃO DE JESUS 

10 Sabedoria e sacralidade - II  

 A SOCIEDADE  ANALISADA  POR DR. PLINIO 

14 Origem do direito consuetudinário - II  

DE M ARIA  NUNQUAM SATIS 

18 O mês de maio e o Reino de Maria 

O PENSAMENTO FILOSÓFICO DE DR. PLINIO 

22 Teoria sobre a sustentação dos seres 

C ALENDÁRIO DOS S ANTOS 

26 Santos de Maio

H AGIOGRAFIA  

28 São Francisco de Jerônimo: despretensão e amor ao sacrifício

LUZES DA  CIVILIZAÇÃO CRISTà 

32 O órgão, o vitral, a ogiva 

ÚLTIMA  PÁGINA  

36  Auxiliadora Onipotente

Na capa, NossaSenhora da ImaculadaConceição - Quito,Equador. Foto: Tito Alarcón

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E d  i  t  o r i  a  l 

 S

 A Virgo Potens vencerá

4

 em dúvida, uma das características mais marcantes do espírito de Dr. Plinio é sua entusiástica de-

 voção à Virgem Maria. Profundamente “cristocêntrico” — como o provam incontáveis matérias

 já estampadas nesta Revista —, compreendeu ele, desde muito cedo, que o caminho mais rápido e

 seguro para chegar a Jesus e glorificá-Lo é unir-se a sua Mãe Santíssima.

Se, pois, o amor deste varão católico ao Divino Salvador é inseparável do amor à Rainha do Céu, tam-

 bém o é seu entusiasmo e sua fidelidade à Santa Igreja Católica.

 Assim, Dr. Plinio não hesitava em associar à promessa de indestrutibilidade da Igreja — “as forças do

 Inferno não poderão vencê-la” 1

 — Aquela que, por ser Mãe da Cabeça, o é igualmente do Corpo Místico.Uma autêntica Teologia da História leva-nos a encontrar no afastamento dos homens em relação a

 Deus a causa das crises que, ao longo dos tempos, assolaram a humanidade. Crises que, na era cristã,

 ameaçaram — e, por vezes, pareceram até conseguir — envolver a própria Esposa de Cristo.

Contudo, na medida em que os povos se abriam à salutar influência da Igreja, as borrascas se acalma-

 vam, como os ventos e o mar de Tiberíades ao obedecerem à voz do Divino Mestre 2 , emanada a partir da

 barca de Pedro.

Ora, essa voz era humana, porque produzida por um corpo também humano, gerado no claustro virgi-

 nal de Maria. Entretanto, era ao mesmo tempo divina, pois as palavras foram pronunciadas pela Segun-

 da Pessoa da Santíssima Trindade.

 Depois da Ascensão de Jesus aos Céus, a Providência determinou que, para acalmar os ventos e os mares revoltos que arrastam e submergem no caos a Civilização Cristã, os homens obedecessem à Pala-

 vra, agora presente e viva na nau de São Pedro. Também nessa barca, a Santa Igreja, tem Nossa Senho-

 ra uma sublime missão: a de manter os fiéis unânimes e perseverantes na oração à espera do Paráclito 3 .

O seguinte discurso, proferido provavelmente no início da década de 1940 e publicado por ocasião do

 mês de Maria4 , atesta uma vez mais a inabalável confiança de Dr. Plinio no poder da Mãe de Deus, sob

cuja proteção a Santa Igreja encontrará sempre a solução perfeita para todas as crises.

Graças a Deus, cria raízes cada vez mais profundas entre os católicos brasileiros a convicção de

que os destinos da humanidade contemporânea estão indissoluvelmente ligados à Igreja, de tal sorte

que o único modo eficiente de trabalhar para a solução da crise tremenda em que nosso século se de-

bate é trabalhar pela expansão da Doutrina Católica. A História registra o caso de nações que conseguiram firmar seus alicerces sobre outras bases que

não a Igreja, e que conheceram um relativo equilíbrio. Mas, enquanto esse equilíbrio falso se trans-

formou no Oriente em estagnação letal, no Ocidente mostrou-se tão precário que provocou as revo-

luções sociais, a corrupção moral e, por fim, o desabamento da civilização greco-romana, humilhadanos seus últimos estertores pela vitória brutal das hordas dos bárbaros invasores.

Quanto à civilização ocidental, nascida da Igreja, criada sob o influxo dela, e constituída para a reali-

zação de um ideal de perfeição e de progresso que só a Igreja soube apontar ao homem, não lhe é possí- vel encontrar fora da Igreja nem sequer o equilíbrio precário das civilizações que a antecederam.

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DECLARAÇÃO:  Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e

 de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou

 na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm

 outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.

 A civilização europeia e católica foi inspirada no Cristo, e sua aurora na Idade Média refulgia

com algo daquela insuperável majestade e daquela indescritível doçura com que o Cristo deslum-brou seus Apóstolos no alto do Tabor.

No recesso de sua prodigiosa fecundidade, continha ela os germes de um arcabouço moral e ma-

terial superior, em grandeza e magnificência, às concepções mais ousadas dos filósofos gregos, dos

estadistas romanos e dos poetas orientais. E está na inexorável ordem das coisas que, se essa civili-zação eleita não perseverasse na sublimidade de sua vocação, despencaria pelos abismos insondá-

 veis e diabólicos da apostasia, cujos frutos políticos e sociais são estas duas irmãs gêmeas, parado- xalmente tão diversas e tão parecidas: a anarquia e a escravidão.

Para o mundo contemporâneo, não há outro caminho senão a ordem perfeita do Catolicismo ouo caos completo da aniquilação. Não é, pois, sem angústia que até mesmo alguns espíritos, nos quais

não arde a Fé católica, indagam se a Igreja não soçobrará ao vendaval da crise moderna.

É para estas almas cegas que a invocação da ladainha lauretana Virgo Potens constitui tema deuma proveitosa meditação. Não é das baionetas, nem do ouro, nem de qualquer outro recurso hu-

mano que a Igreja espera o grande triunfo que salvará mais uma vez a civilização. A Igreja é divina-

mente indestrutível e sê-lo-á amanhã, como já o era ontem. É só de Deus, Nosso Senhor, que lhe vi-rão no momento oportuno os milagres que asseguraram o triunfo de Constantino, o recuo de Átila

e a vitória em Lepanto.

 A respeito de Maria Santíssima, diz a Sagrada Liturgia: “Só tu esmagaste todas as heresias”. Maisforte do que os modernos Césares, há uma Virgem Poderosa que esmagará o mal em nossos dias;

Ela que já esmagou outrora a cabeça orgulhosa da terrível serpente. Sua força, já o dissemos, não

está no ouro nem nos canhões. Sua força está na sua caridade invencível, na sua humildade inco-mensurável, na sua pureza indizível.

Conjuguem-se, embora, contra a infalível Cátedra de São Pedro, o demônio, o mundo e a carne,a Virgem Potente triunfará. E, no momento da derrota, todo o ouro dos seus adversários ser-lhes-á

inútil como se fosse lama, e seus canhões inoperantes como brinquedos. Ao ouvir estas palavras, é possível que um sorriso desdenhoso exprima em certos lábios céticos

uma desaprovação irritada. Um dia virá, porém — e quem sabe se não será amanhã — em que a

Virgem Potente triunfará suscitando uma nova legião de cruzados, ou dando ao Santo Padre a vitó-

ria incruenta e gloriosa que teve outro Papa, São Leão I, quando, armado só com a Cruz de Cristo,fez recuar o terrível Rei dos Hunos.

 A despeito do riso dos céticos, das injúrias dos perversos e da incredulidade dos medrosos, é a

Virgo Potens que vencerá!

1) Mt 16, 18.2) Cf. Mt 8, 26-27.3) Cf. At 1, 14.4) Excertos de um pronunciamento cuja data exata não consta dos nossos arquivos.

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 Incólume tabernáculointerior - II 

6

DONA LUCILIA

                                                                                                      A                                                                            r                                                                            q                                                                                                         u

                                                                                                        i                                                                            v                                                                            o 

                                                                                                        R                                                                            e                                                                             v

                                                                                                        i                                                                            s                                                                                                 t                                                                            a 

Dentro da vida comum de uma dona de casa, o semblante, o

porte e as atitudes de Dona Lucilia manifestavam a calma e

a glória de quem vencera as batalhas da existência deixando

intacto o tabernáculo interior, e conseguira provar que é

possível, mesmo em nossos dias, o verdadeiro afeto.

erta ocasião — tinha eu 21 anos de ida-de e sentia-me muito cansado — umamigo ofereceu-me de irmos à fa-

zenda dele, em Botucatu, para descan-sarmos um pouco. Chegando lá, resol- vemos, como todos os rapazes fazem,

andar a cavalo.

O jovem Plinio cai do cavalo

Mas o caipira que preparou os ani-mais apertou mal a barrigueira do meucavalo. Eu não percebi, montei e, an-tes mesmo de sairmos, fiz um movimen-to meio brusco, virei e tomei uma quedamuito forte; bati com a espinha numa pedrae passei dois ou três meses andando de ben-gala.

Não dei maior importância à coisa. Voltei a São Pauloe mamãe também não se preocupou com o fato.Certa noite, meu amigo veio à minha casa e disse a

Dona Lucilia: “Olha, estive com meu tio — era um dosmelhores clínicos de São Paulo naquele tempo — e elemandou dizer à senhora que vale a pena mandar tiraruma radiografia da espinha do Plinio, porque às vezesnão há sinal de perda de imobilidade das pernas; mas,quando ele tiver 40, 50 anos, se manifesta uma lesão quepode ser muito ruim. Era melhor tirar uma radiografia.”

Ela ficou muito alarmada.

Plinio aos 21 anos. À direita,durante um passeio a cavalo nafazenda de Botucatu, em 1930

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  7

   A  r  q  u

   i  v  o

   R  e  v   i  s

   t  a

Resolvemos no dia seguinteir a um hospital, no qual haviaum parque enorme, chamadoInstituto Paulista. Mamãe quisir junto. Fomos ela, meu amigoe eu; andamos por todo aque-le jardim, etc., e eu me apoian-do na bengala. Depois eu quisir à capela desse instituto, on-de tinha recebido uma graça euma consolação colossal anosatrás, e fui rezar lá. Eu nem es-tava pensando no negócio daespinha...

Quando afinal voltei, encon-trei mamãe sentada num localperto da sala das radiografias,

rezando o rosário durante todoo tempo, e com os olhos úmi-dos de lágrimas. Eu disse: “Masmãezinha, o que é isso?” Elacontinuou a rezar e não respon-deu. Continuei:

— Mas me explique um pou-co...

— Eu estou muito apreensiva, afirmou ela.— Mas por que a senhora está apreensiva?— Conforme for o resultado, você verá.Daí a algum tempo veio o médico, que era conhecido

nosso, com a radiografia, e disse a ela:— Não tem nada.Ela perguntou:— Mas Doutor, o senhor garante que não tem nada

mesmo?Ele a tranquilizou:— Dona Lucilia, a senhora não vai entender, mas pos-

so mostrar um pouco nesta radiografia que está tudoperfeito.

Notei que ela teve um desafogo.

Dia da formatura na Faculdade

do Largo São FranciscoOutro momento no qual ela passou por grande afli-

ção foi quando cheguei quase atrasado à minha formatu-ra na Faculdade de Direito. Aí ela fez um drama comigoque nunca fizera em outra ocasião. Chamou-me para ir-mos ao quarto dela, que era longe, no outro lado da ca-sa. Entramos, era dia de formatura e pensei que ela fos-se me dizer alguma coisa agradável; ela passou a chavena porta, coisa que nunca havia feito, e pôs-se de joelhosdiante de mim.

Eu disse:— Mas mãezinha, o que é is-

so?!Ela respondeu:— Você não sabe o que eu

sofri durante esse tempo, e vo-cê vai me prometer que nuncamais repetirá isso.

Então percebi o que era. Deirisada, ajudei-a a levantar-se.Ela afirmou:

— Não, você não está to-mando a sério o que estou di-zendo e a coisa é seríssima.

— Está bem, eu prometo tu-do o que a senhora quiser...

Passamos, então, à sala onde

estavam as outras pessoas. Fo-ram as duas vezes que a vi as-sim.

Daí essa calma que vemosnesta fotografia. É uma pessoaque viveu sua vida e tem a sen-sação de que os vagalhões to-

dos vieram, mas não penetraram nem desarranjaram emnada esse tabernáculo interior, e que, portanto, a vida es-tava feita. Alguma coisa que nessa idade ainda viesse nãoera mais nada. Ela estava se preparando para o Céu.

 A calma e a glóriaEla possuía uma gaveta na mesa de toilette dela, onde

guardava papéis. Algum tempo antes de morrer, vi queela andava remexendo aquilo e rasgando muitos papéis.Uns dias depois da morte dela, fomos verificar o que ha- via na gaveta, e vimos que ela guardou o essencial; e quefizera aquilo para não termos trabalho com os papéis de-la, quando ela tivesse morrido.

Observei, então, que ela mandou jogar fora coisas queeu teria gostado enormemente de conservar. Mamãe fa-zia as contas da casa — era uma empresa que fornecia

aos fregueses uma espécie de notas, formando um cader-no com todos os dias do ano —, e escrevia, a cada dia, asdespesas. Tudo isso ela jogou fora, pela preocupação denão dar trabalho a ninguém. Vemos, assim, a serenidadeno transpor a morte, com a tendência ainda de dar comisso uma prova de amor e receber uma prova de amor,que era o carinho dela até onde chegava. Mas na calma, vivendo a existência de todos os dias.

De maneira que quando ela adoeceu, foi uma coisacompletamente inopinada. Ao cabo de dois, três dias, es-tava morta.

Dr. Plinio no dia de sua formatura

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DONA LUCILIA

Nesta fotografia se nota,em nível modesto, domés-tico, tanto quanto uma do-na de casa pode ter, a glóriae a calma convivendo. A vidapassou, mas ela está inteira-mente tranquila , com a sen-sação de que aguentou tudo.

E, depois, tão afável, tãoamável, tão pacífica… Mashá um pouquinho de glóriado Céu que recende aí. Nãoexiste só esse sentimento ter-reno de que estou falando.Há alguma coisa de celes-te, que é incomparavelmen-te mais, e se exprimiria assim:

a Providência está protegen-do-a, ela tem um misteriososentir de que não vai sucedertambém mais nada. Só acon-tecerá a morte, para a qualela está preparada. Deixe-a vir, já está tudo em ordem.

O Sinal da Cruz que ela fez ao falecer indica bem isso.Ela se recostou, ergueu-se um pouco mais, fez o “Nomedo Padre” grande e caiu morta. É a calma e a glória noCéu, no plano natural e no sobrenatural.

 Afagos que desfazem um penteadoQuando ela morreu, lembro-me de que chorei até em

altos brados. Depois entrei para o meu quarto a fim defazer a toilette e começar a vida. Recordo-me até de queme deitei na cama para fazer um curativo no meu pé, quetinha sofrido uma amputação. De repente, uma alegriatomou conta de mim, sem nenhum propósito, e passei odia inteiro sereno. Triste, evidentemente, mas calmo.

Eu tinha resolvido ir, no dia seguinte, a uma fazendade amigos meus, para espairecer um pouco. Meu médi-co, que estava em São Paulo, resolveu tirar minha pres-

são para ver se, com a emoção da morte, não tinha leva-do algum abalo, o que seria normal. Ele mediu a pressãoe notou que tinha subido de um grau só, o que é comple-tamente irrelevante. Por causa do dia tranquilo, sereno,que passei.

Eu poderia contar cem coisas, em todas as idades.Por exemplo, lembro-me de que quando fizeram a

inauguração do Teatro Municipal em São Paulo, mamãe— como todas as senhoras da sociedade paulista— deve-riam vestir-se de grande gala. Ela, então, mandou fazerum vestido fino.

Para a criança, ver a mãe vestida de gala é um aconte-cimento. E Rosée, muito vivae inteligente, um pouquinhomais velha do que eu, com-preendeu logo que não podiaabraçá-la e beijá-la sem certaproporção. O temperamentofeminino é mais intuitivo pa-ra isso. Ela beijou e abraçoumamãe, com cuidado.

Depois chegou minha vez...

Mamãe usava os cabeloslongos, e os tinha arruma-do especialmente para aque-la ocasião. Com meus agra-

dos, comecei a desfazer todoo penteado.Os circunstantes falavam:— Lucilia, diga para ele

parar, porque estraga seupenteado!

E ela, me afagando, dizia:— Filhinho, etc....Sem me dar conta, pus aquilo tudo em desordem. Ela,

entretanto, não consentiu em que me fizessem cessar. Ea ouvi dizer em certo momento: “Nunca farei cessar umagrado de meu filho.”

 Alguém afirmará: “Não é um martírio ter que refazerum penteado.” Mas é muito desagradável. Depois, nãocustava nada dizer: “Meu filho, agora não...” Entretan-to, o princípio foi mantido: “Nunca farei cessar um agra-do de meu filho.”

Um hematoma no pulso

Quando menino, meus afagos para ela eram torren-ciais, mas desajeitados. E eu, para agradá-la, batia nobraço dela, etc. Recordo-me de que estávamos almoçan-do todos em casa de minha avó, numa mesa muito gran-

de, e mamãe portava um vestido em que a manga nãochegava até o punho, deixando aparecer uma pulseira demarfim que ela usava.

De repente, alguém lhe perguntou:— Lucilia, o que é esse hematoma que você tem aí no

pulso?Ela, um tanto ingenuamente, respondeu:— Foi um agrado do Plinio.Todos os convivas caíram na gargalhada. Eu, também

sentado à mesa, não compreendi o que aquilo tinha de ri-sível.

Penteadeira de Dona Lucilia

   A  r  q  u

   i  v  o

   R  e  v

   i  s   t  a

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— Mas Lucilia — continuou a pessoa —, onde é quese viu isso?!

Ela manteve-se séria, sem azedume, e disse:

— Não sendo o mal, Plinio pode fazer o que quiser.

Necessidade do verdadeiro afeto

Eu tive todas as doenças que em criança se possa ter,exceto varíola: mil gripes, caxumba, catapora, rubéola…Eu era um menino forte, mas apanhava essas enfermi-dades. Lembro-me de que, quando tive caxumba, mi-nha avó, que era senhora do interior, quis curar a doençacom um processo antigo, o qual consistia em pegar umacolher de pau, introduzi-la em não sei que óleo ou seboquente, e aplicar na caxumba.

Mamãe, que já conhecia meu modo de ser, sentou-sena minha cama — correndo o risco de contrair a doençaque ela nunca tivera — e me disse:

— Filhão, sua avó está querendo que você faça umtratamento antigo para essa sua caxumba, que está de-morando tanto para curar. Se der certo, sara mais de-pressa e você levanta logo da cama. Você quer fazer?

E eu interroguei:— Mas o que é?Quando ela me falou da tal colher de pau com sebo,

eu disse:

— Isso nunca! Não quero essa coisa comigo. Diga pa-ra vovó que não, de nenhum modo.

Deu-me a ideia de sujeira. Aplicar em cima da caxum-

ba — que já se me afigurava como uma coisa suja — umacolher de pau, metida num sebo qualquer, é grotesco; fi-ca aquela sujeira em cima. Isso não!

Mamãe não insistiu e a coisa passou. Ela tinha espe-rança no tratamento, mas como eu não queria, e não ha- via um mal nisso, respeitou minha vontade.

Quem foi objeto desse afeto materno acredita que na vida é possível o afeto. Pelo contrário, quem não o teve,fica como navio sem leme, porque julga que na vida es-se afeto não existe, e fica desgarrado, porque a existênciaperde um dos seus sentidos.

Considerando o caos no qual vamos afundando, é

preciso ter uma confiança em quem, do Céu, é mãe pa-ra nós. Antes de tudo, Nossa Senhora, mas depois al-guém mais próximo, em quem possamos confiar ao nosmetermos nessa barafunda, onde tudo é um entremor-der-se de feras dentro de uma confusão horrorosa, emque ninguém pode confiar em ninguém. Essa disposi-ção de alma confiante é indispensável para nós, ao lon-go de toda a vida. v

 (Extraído de conferência

 de 21/4/1990)

Uma das últimas fotografias deDona Lucilia, mencionada por

Dr. Plinio nesta conferência  A

  i

  R

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   J  o

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   D   i  a  s

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Sabedoria e sacralidade - II 

 A

10

SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

Diante do culto ao “antissacral” prestado pela

modernidade, Dr. Plinio explicita o caráter central

da luta pela sacralidade para a glória de Deus e

sustentação da Fé na humanidade.

História do Ocidente me parecia dividida em

duas partes: uma época em que os homens acei-tavam a sacralidade, e outra em que não a acei-tavam.

Conceito de avião na mentalidade dos anos 20

Meu entusiasmo pelo  Ancien Régime1 vinha pela par-ticipação do espírito sacral da Idade Média, e da oposi-ção à inteira recusa da sacralidade, existente na socieda-de pós-Primeira Guerra Mundial. Nesse ponto me pare-cia que a Primeira Guerra tinha deixado os restos de sa-cralidade que havia no mundo, em estado pós-agônico.

Só faltava morrer. Não tinha mais nada.E notava muito nos adoradores da modernidade umaespécie de satânica alegria em ver a sacralidade desapa-recer. Por exemplo, como o barulho do avião era vistonos anos 20? Como uma coisa feia, não tem dúvida; nãoé um minueto, o qual é bonito. Mas diziam: “Preste aten-ção: é o barulho do futuro! É poderoso, é forte, faz acon-tecer coisas palpáveis, tangíveis, materiais. Vai me trans-portar rapidamente para outro lugar.”

Independente da comodidade, o avião parecia a elescomo um transporte ontologicamente denso, porquetransportava em pouco tempo, e com uma rapidez de im-

pulso extraordinária, um homem de um lugar para outro.O cavalo que vai trotando, a carruagem dourada den-tro da qual está sentada a marquesa comendo pão de mi-nuto, falando, rezando com um devocionário na mão,são ações metafisicamente ralas, em comparação com es-sa ação ontologicamente forte, que é deslocar-se com oimpulso de um avião.

Então, o ruído do avião tinha todo o valor do supersô-nico, do superestrondoso, de uma coisa metafisicamen-te supervalorizada, de uma carga superior ao homem. Eo homem se sentia dignificado em que seu gênio tives-

se desatado essas forças da natureza, que eram tão mais

densas e mais potentes do que ele. Formiga encantadade ter acordado a águia e de se fazer transportar no meiodas plumas da cabeça da ave. Esse era o modo dos meuscontemporâneos dos anos 20 conceberem o avião.

Viagem de automóvel, de São Paulo  para Santos

O automóvel era, com menor densidade, o que erao avião. Por exemplo, descer de automóvel a serra pa-ra Santos, mais rapidamente do que se fazia de trem, eraconsiderada uma ação varonil, densa, com os riscos ine-

rentes a fazer o percurso depressa, de tomar aquela ven-tania, porque os automóveis não eram fechados naque-le tempo.

Esses automóveis eram chamados “torpedo”. Aliás,um automóvel “torpedo” é um veículo comparado a umabomba, que vai com a velocidade do torpedo de encontroa curvas perigosas na serra.

Viajava-se cedinho. Punham-se luvas de couro, al-guns usavam uma espécie de casquete de couro tambéme, às vezes, ainda sopravam sobre as luvas e esfregavamas mãos, como quem estivesse enfrentando algo de mui-to arriscado, dando assim certa importância e grandeza

ao acontecimento.Não se conversava com o chauffeur , porque ele estavainteiramente absorto, e olharia para quem se dirigisse aele com a cara de uma “sacralidade mecânica” insultada.

Eu me portava de modo contrário a isso tudo. Ia otempo inteiro mandando parar o automóvel porque esta- va enjoado, dormia nos pedaços mais empolgantes da es-trada ou então puxava prosa sobre outros assuntos. En-fim, fazia todas as “blasfêmias” possíveis, sem a menorintenção, mas porque a minha natureza inteira extrava-sava para fora do automóvel. Eu não cabia naquele veí-

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culo, sentia-me preso naquilo. En-quanto eles tinham a sensação deestarem num andor, eu me sentianum cárcere dentro daquela lata deferro.

Como era a chegada a Santos?Naquele tempo, o hotel onde

costumavam se hospedar as me-lhores famílias chamava-se ParqueBalneário. Quem chegasse a Santosnão poderia fazer o erro de lavar oautomóvel para aparecer com elelimpinho. Tinha de deixá-lo com ossinais da “batalha”: com lama, umpedacinho de folha preso num pa-ra-lama, porque raspou numa árvo-re... E o automóvel entrava fazendo

grande ruído, dava uma volta emtorno do jardim e parava diante deum terraço cheio de moças, rapa-zes e senhoras, bebericando algu-ma coisa à espera do almoço.

Quando entrava aquele automóvel,todas as conversas cessavam para ver quem tinha chega-do, e contemplar os “heróis” que vinham nimbados pelamitologia da mecânica.

Eles desciam se empertigando, e eu como quem saíada cama, não me incomodando com nada daquilo. Atébocejava ao descer. Era olhado com severidade, mas res-

pondia a essa severidade como quem não percebia, comuma indolência displicente, arrogante.Olhavam-me como quem dissesse: “Você puxou o na-

riz do ídolo?!” Ao que eu como que respondia, bocejando: “Ídolo?!

Qual? Aquele lá? Hã… hã…”Era uma santa sabotagem àquilo que eu via se erguer

como uma espécie de “sacralidade mecânica”, dinâmica,à cata do ouro, ao lado do fandango da impureza. E per-cebia que isso fazia um todo só.

 Batalha do sacral contra o não sacral 

 À noite — era literalmente assim —, terminado o jan-tar, todo mundo ia para esses mesmos terraços e ficavaconversando. A certa hora os rapazes saíam em gruposde dois, três, cinco, sem dizer para as moças aonde iam.E elas, por coincidência, nunca perguntavam. Eles toma- vam o automóvel e saíam discretamente com ares mali-ciosos. Todos entendiam para onde eles se dirigiam.

Eu percebia que esses estados de espírito eram aco-plados: de manhã, adorar o automóvel, e, de noite, en-chafurdar-se na perdição. Eram coisas conexas que cons-

tituíam um só estado de espíritoantissacral por excelência. Porquea “sacralidade mecânica” era ado-rar o não sacral. Tudo isso formavauma frente única, satânica, o con-trário da sacralidade que vivia den-tro de minha alma.

 Ao observar essas correlações enotar que espécie de mundo vinhanascendo, minhas barreiras interio-res iam crescendo.

Naquele tempo, as moças e osrapazes estavam juntos na hora doconvívio social, mas fora dessa ho-ra formavam grupos à parte. E, nogrupo dos rapazes, estávamos umprimo meu e eu. Chegava a hora da

fuga, todos partiam de automóvel,mas meu primo e eu saíamos a pépara outra direção, o que equivaliaa dizer: “Nós não vamos para lá!”Eu percebia a sacralidade existente

nesse gesto, em realizar o oposto doque eles faziam.

 Aos domingos, íamos à Missa numa igreja do Embaré,situada ali perto. Eu rezava, rezava… Não levava a coi-sa a ponto de rezar o Rosário nem de abrir livro de Mis-sa, mas eu rezava mesmo; ajoelhado, seguia a Missa. Elespercebiam que eu estava rezando.

Nessa época os homens ficavam atrás, de pé; e quan-do o fundo da igreja estava muito cheio, ocupavam tam-bém os lados, mas não se ajoelhavam. Um ou outro seajoelhava; só o fazia porque estava tão garantido de tersacrificado aos ídolos, que podia fazê-lo sem que os ou-tros tomassem a sério. E o ajoelhar era tirar um lenço —se o dinheiro dava para isso, tinha que ser lenço de seda— e com todo o cuidado colocá-lo no chão, para se ajo-elhar em cima do lenço, a fim de não manchar a calça;porque o vinco e a limpeza desta eram de uma importân-cia fenomenal. Era a única ação da Missa a que eles da- vam importância: a hora de proteger os joelhos contra a

sujeira do chão.Isso me fazia compreender que a vida terrena, tempo-ral, está para essa batalha do sacral contra o não sacral,como a bainha de uma espada está para a espada.

O jovem Plinio sonhava com a sacralidade cavalheiresca

Todo o resto não passava de aparências; a realidadedaquilo era uma tradição de sacralidade em estado pós--agônico, e que eles todos conspiravam para enxotá-la

Igreja do Embaré - Santos, Brasil

   I  c  a  r  o

   d  e

   F  a  r   i  a

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SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

Dr. Plinio em 1934

passo a passo, de maneira a não se arre-piarem. E iam enxotando-a por várias vias: a adoração do ouro, das grandes velocidades e das ações ilusoriamen-te “heroicas”, o enchafurdamen-to no lodo da impureza, a vulgari-zação das maneiras, o culto do ri-so. A todo momento uma belezacaía, um bom costume se dissol- via, uma verdade era negada.

Outra coisa ainda era o cultoda saúde. Quem tivesse algumamazela que contestasse o ídolo dasaúde deveria vencê-la, ocultando.Se fosse ao médico, também precisa-ria ocultar, porque isso tudo tirava aintensidade da vida. Dizer-se enfermo e

deitar-se na cama era agravar a doença. Seestivesse doente, entrasse num avião e voasse,e o avião curaria a enfermidade…

 A pessoa tinha que ser ultrassaudável, erafeio ser doente.

Isso tudo formava um conjunto, dentro do qual euaté corria certo risco de representar o papel do “patinhofeio”. Porque o “patinho feio” era feito para, à maneirade retrógrado, ser monarquista, por acanhamento de es-pírito; ser católico, por medo de tomar o automóvel pa-ra ir a Santos, etc.

E isso eu não queria! Porque se eu fosse “patinho

feio”, seria a caricatura da sacralidade cavalheiresca coma qual eu sonhava! E a minha polêmica estaria voltadacontra si mesma.

Naturalmente, o descobrimento mais tarde de cer-tas coisas da Idade Média, a diferenciação entre a Ida-de Média e o  Ancien Régime , a subestima proporcio-nal do Ancien Régime e a estima da Idade Média, etc.,deram-me gradualmente com o tempo outro embasa-mento.

Depois, com a encíclica de Leão XIII,  Parvenu à la XXV ème. Année — que não trata das Revoluções propria-mente, mas refere-se à passagem do protestantismo para

o deísmo, e do deísmo para o ateísmo —, por analogia,tirei a teoria sobre as três Revoluções, e constituindo in-teiramente o pensamento que Nossa Senhora destinavaa ser o nosso, e que está condensado em meu livro Revo- lução e Contra-Revolução.

 É pecado ser indiferente à questãoda sacralidade

É preciso notar que, por trás de tudo quanto acabo dedizer, entravam dois pontos capitais.

Primeiro ponto: a batalha pela sacra-lização da ordem temporal é a medu-

la da vida terrena. O cerne desta exis-tência não é o gozo, mas sim perce-ber essa luta e tomar parte nela.

Segundo ponto: não é possívelter um pensamento e um espíritosacral, no que diz respeito às coi-sas da Religião, e ao mesmo tem-po ter um convívio com a vidatemporal, onde fôssemos enchar-cados da antissacralidade.

O homem que não soubesse fa-zer — pelo menos de modo implí-

cito — ao avião, ou à viagem de au-tomóvel, a crítica que eu fazia, se em-

bebia dessas coisas, por mais que ele

fosse um grande teólogo, um grande mo-ralista, um grande liturgista, ou até um mís-tico. Este pecaria contra a Mística e perderiaseu espírito, na medida em que ele simples-

mente se postasse indiferente em relação a essas coisas.Portanto, a defesa da sacralidade da ordem temporal,

além de ser uma defesa da glória de Deus nessa ordem, écondição de sobrevivência da Fé na maior parte dos ho-mens.

Sacralidade e culto a Nossa Senhora

Por exemplo, deve-se lutar numa Congregação Maria-na pela propagação da devoção a Nossa Senhora. Mas,cuidado! Essa luta precisa ser feita com toda a sacralida-de que São Luís Grignion de Montfort ensina. Algumasformas de espalhar a devoção a Nossa Senhora não têmessa sacralidade ou possuem pouco. É preciso tê-la in-tensamente.

Lendo São Luís Grignion, compreendi toda a eleva-ção da sacralidade no culto a Nossa Senhora. Essa com-preensão estava em gérmen na minha alma, e não havianada em mim que negasse isso. Mas entender o que eraNossa Senhora —  Mons in vertice montium 2 —, e como

Deus está infinitamente acima d’Ela, isso tudo, do pontode vista da sacralidade, fez-me um bem enorme!Eu sabia, por exemplo, que Nossa Senhora era virgem

antes, durante e depois do parto, e me regalava de sa-ber. Mas qualquer coisa de etéreo, de sacral na purezad’Ela se tornou para mim muito mais claro, lendo o Tra-tado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, de SãoLuís Grignion.

Também fiquei compreendendo que, no reinado deMaria, todo esse mundo de sacralidade seria muito maisreluzente de aspectos na ordem espiritual, antes de tudo,

  A  r  q   u   i  v  o    R  e  v   i  s   t  a

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mas também na ordem temporal; e aspectos místicos fa-riam do Reino de Maria um paraíso em relação ao quefoi a Idade Média. Não se tratava, portanto, de nenhummodo, de voltar à Idade Média, mas de ir a alguma coisaque estava para a Idade Média como o cedro do Líbanoem relação à ervinha.

O Reino de Maria, sem ser nem um pouco um reinomilenarista, ou um paraíso recuperado com Jesus Cris-to Nosso Senhor vivendo aqui conosco, se me afigurava,entretanto, uma época de sacralidade, de glória e de ele- vação inaudita.

Nasceu assim, em mim, o hábito de rezar cotidiana-mente pedindo a graça de levar a minha devoção a Ma-ria Santíssima até o píncaro dos píncaros, mas trazendoconsigo, como corolário, entre outras coisas, essa sacrali-dade de espírito e esse conhecimento das possibilidadesda sacralidade e do sobrenatural em tudo, que será pró-

prio do Reino de Maria. A sacralidade pede para estar em tudo. Desconfio quese fizéssemos um estudo comparativo entre o que tenhodito sobre a sacralidade e a sabedoria, veríamos que a sa-cralidade é uma fina ponta da sabedoria, com mística.Porque, ou se sente a sacralidade, ou se for ummero esforço da razão, ela não está presente.

Então, tudo quanto se diz de Nossa Senho-ra, Sede da Sabedoria, deve entender-se comotendo intensamente o dom da sacralidade.

Seria preciso compreender que o me-lhor sentido da expressão “a Sabedoria

está presente em tudo” é a sacralidade pre-sente em tudo.

 A transcendência de Deus

 A sacralidade vista como a apre-sentei é um efeito. Sendoum efeito, ela denun-cia a existência de umaCausa. Mas nessa re-lação de causa e efeitohá uma peculiaridade: que, pelo

menos na nossa via, para conhe-cermos bem a Causa, temos quecontemplar longamente o efei-to e nos saturarmos dele.

E aí se compreende —mas de uma dessas compre-ensões que resultam de umaexperiência mística, que de-pois se aprimora no estu-do — o que é propriamenteo sobrenatural, e se entende

propriamente quem é Deus. Mais especialmente, com-preende-se o que quer dizer a transcendência de Deus.

Se se analisar o que eu disse a respeito do papel deNosso Senhor Jesus Cristo, nota-se que Ele é a fonte daqual emana tudo isso. Mas afirmar que Ele é a fonte sig-nifica, desde logo, dizer uma coisa muito correta, masmetafórica e pobre em relação à realidade que está portrás disso. De fato, quando digo isso d’Ele e percebo queisso emana d’Ele, não é apenas porque Ele tem isso, masEle é isso. É uma coisa diferente.

De um Santo eu posso achar que ele é bom; eu di-go: “Ele é santo.” De Nosso Senhor Jesus Cristo eu afir-mo que Ele é Santo, mas com uma nota muito mais pro-funda do que quando eu chamo um homem de santo.Porque Ele é. Toda a santidade nasce d’Ele como de suafonte, de sua causa, no ser d’Ele; Ele é a santidade. Nissoestá a transcendência d’Ele. Entre Ele e todos os Santos

existe, em última análise, uma emanação ou uma dima-nação de algo existente n’Ele e que os outros só têm en-quanto dado por Ele. E o que Ele tem não foi dado porninguém, porque está na natureza d’Ele.

Sempre que se tem essa experiência mística dabondade, ou da justiça, dessa harmonia maravi-

lhosa de justiça e bondade que há n’Ele, tem--se uma experiência dessas virtudes e perfei-

ções, mas em estado transcendente, de umSer que é, enquanto nós apenas participa-mos. E daí vem um sentimento de vene-ração, que se mistura muito legitimamen-

te com a admiração daquilo em que Ele éanálogo a nós, enquanto Homem.Mas, de fato, há em tudo quanto é ex-

periência mística um contato com aqui-lo de semelhante a nós, vivendo em

Deus de modo transcen-dente, porque Deus éaquilo. E é isto queenche o homem de re-

galo, e faz do Batismoum começo da vida divina. v

(Extraído de conferência de 14/4/1989)

   F  r  a  n  c

   i  s  c  o

   L  e  c  a  r  o  s

O Sagrado Coração de Jesusem seu trono - Catedral de

Santiago, Innsbruck, Áustria

1) Sistema social e políticoaristocrático em vigor naFrança entre os séculosXVI e XVIII.

2) Do latim: Monte no cumedos montes (Is 2, 2).

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Origem do direitoconsuetudinário - II 

U

14

A SOCIEDADE ANALISADA POR DR. PLINIO

m dos grupos sociais decorrentes de uma re-de de amizades era a corporação de artífices.Sapateiro, relojoeiro, enfim as diversas pro-

fissões de trabalhadores manuais, por desempenharemum mesmo ofício, formavam um grupo de amizades as-sim e, no dia de festa do Padroeiro ou da fundação da-quele grupo, por exemplo, eles compareciam todos jun-tos na igreja, com o estandarte da corporação, para re-zar. Depois as mulheres eram apresentadas umas às ou-

Porta de BisagraToledo, Espanha

tras, ou moravam perto porque o bairro era de artífices,onde todo mundo era amigo.

 As corporações e sua influência na sociedade

Esses grupos sociais às vezes formavam sociedades in-teiramente definidas, que tinham representação oficial junto ao governo municipal. Na Câmara Municipal, porexemplo, não se elegiam por sufrágio universal os verea-

 As instituições nascidas organicamente de um circuito

de amizades sempre contribuíram possantemente para a

coesão, o equilíbrio e o progresso do tecido social.

   C   h  e  n  s

   i  y  u  a  n

   (   C   C   3

 .   0   )

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dores, mas os chefes das corporações, que eram eleitospelos próprios trabalhadores, faziam parte da Câmara.

Então, havia na Câmara Municipal as corporações das várias categorias de trabalhadores manuais. E a corpora-ção dos homens que viviam dos assuntos de justiça — ju-ízes, delegados, promotores, escrivães, etc., e advogados— eles formavam uma corporação em geral consagradaa Santo Ivo, patrono dos advogados.

Meu pai sabia uma cançãozinha popular, que os ad- vogados cantavam entre si, e que dizia: Ivus advocatus et non latro, res miranda populo, etc. Ele só se lembrava daprimeira estrofe: “Ivo advogado, não porém ladrão, coisaque punha o povo em admiração.” Era um gracejo.

 As corporações eram potências, como também, emoutro sentido, as famílias eram potências.

Por exemplo, moravam num bairro uma família rica euma porção de famílias pobres. A família rica era instituto

de aposentadoria de pensões dos pobres: tratavam das pes-soas enfermas, davam dinheiro, encaminhavam na carreira,etc.; faziam toda uma proteção para as famílias pobres. Nosbairros funcionava uma espécie de família de famílias.

Grupos sociais assim formavam uma rede riquíssimade alto abaixo da sociedade, em que o conceito marxistade luta de classes era quase inconcebível.

Grupos sociais regidos pelo costume

 Algumas dessas corporações se dedicavam ao bem co-mum, espiritual ou temporal. Espiritual muito pitoresco,

como as associações que cantavam durante a noite. Iamandando pela cidade e advertindo — na Espanha issoera muito desenvolvido —, em tom moderado, uma coi-sa cujo sentido era mais ou menos este: “Ó vós que dor-mis, ou então pecais, ó vós que a morte pode tragar deum momento para outro, ó vós, lembrai, lembrai! Tudona vida não é só conforto, não é só prazer. Um dia che-gará a hora do julgamento.” E aí desfiavam os quatro no- víssimos e depois iam para diante.

Não creio que isso hoje tivesse muita popularidade;acho que a polícia exigiria que parassem e voltassem pa-ra casa, sob pretexto de serem proibidos ruídos noturnos.

Os carros de lixo, todos sabem bem até que ponto fazembarulho à noite; não tem nada. Mas cantar canções espi-rituais não. Eram pessoas que no dia seguinte iam traba-lhar com dificuldade, pois participaram do turno de can-tar à noite; e assim quantas almas se teriam salvado?

Podemos imaginar um vigário zeloso, com que empe-nho trabalharia para que uma organização dessas nãomorresse na sua paróquia. Naturalmente deixaram mor-rer tudo, e creio que na própria Espanha não existe mais.

Então, todos esses grupos sociais eram internamen-te regidos pelo costume, que ia variando com a natura-

lidade, a organicidade com que os costumes vão se mo-dificando numa família através dos séculos, mas tam-bém com a continuidade com que um resíduo de costu-mes não varia. Conservavam um equilíbrio entre a muta-ção e a fixidez, que nunca dava a ideia de grupo social as-fixiante, de uma coisa que é uma continuidade sem sequ-ência e que perde completamente a sua graça. A partirdisto é que se compreende a vida do município, do feu-do, de todas as unidades sociais e como eles constituíam,dentro da pátria, minúsculas pátrias verdadeiramente vi- vas, e cuja coordenação formava a pátria.

O giro pelo país

Em geral, esses grupos sociais — sobretudo os profis-sionais — tendiam em estabelecer-se no país inteiro, pe-la união que faziam de uma cidade com outra da região,

depois a região dentro do reino em geral.De maneira que, como eles não tinham tipografia —na Idade Média nem havia tipografia, mas mesmo no Ancien Régime era muito menos desenvolvida do que ho- je, por exemplo, a impressão a cores não existia, etc. —,para certos profissionais tomarem um bom conhecimen-to profissional era preciso que viajassem.

Então, faziam o que se chamava o “giro do país”, pelosprincipais pontos que interessava mais à profissão seremconhecidos. E partiam grupos de dois, três, cinco, oito, dezda mesma cidade, por exemplo, da mesma corporação, emgeral a pé — quando eram trabalhadores manuais e não ti-

nham carro —, muitas vezes com risco porque as estradas,até o começo do  Ancien Régime, eram ainda pouco segu-ras, tinham muitos bandidos, etc. E levavam um bordão queservia para se apoiarem pelo cansaço, mas também para ba-ter na cabeça dos malfeitores que aparecessem.

 Às vezes eram meio profissionais e meio peregrinosporque, se havia no trajeto algum grande lugar de pere-grinação, eles paravam lá para rezarem, etc. Usavam —por exemplo, no século XV e parte do XVI — chapéusgrandes por causa do Sol, mas com uma aba virada pa-ra cima quando não incidiam os raios do Sol, na qual ha- via uma medalha, que era de um Santo em honra do qual

iam peregrinar, ou o escudo da corporação.E em geral eles viajavam cantando, ou conversando, ourezando, por exemplo, o Rosário. Em cada lugar que che-gassem, a corporação correspondente lhes dava comida eestadia, durante o tempo necessário para eles repousareme continuarem a fazer a viagem. E com isso um profissio-nal não rico poderia fazer o giro do país, e voltar com mui-tos conhecimentos adquiridos, com alguns processos defabrico que ele aprendia, modos de trabalhar, etc., e quelhe davam uma outra capacidade profissional, superior àque ele teria se ficasse a vida inteira na sua cidade.

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A SOCIEDADE ANALISADA POR DR. PLINIO

Educação dos pajensIsso com relação aos operários. E quanto aos nobres,

como era?Com os nobres era assim: quando o menino atingia —

 variava de acordo com a região — entre dez, onze, atéquinze anos, o pai mandava-o servir como pajem em ca-sa de um nobre de categoria mais alta, onde ele aprendiamelhores maneiras, mais bom gosto, mais distinção. E ti-nha relações com outros senhores mais nobres que o paidele, e que eram amigos do dono daquele castelo em queele servia; e também com outros jovens, que eram ami-gos do filho do senhor de categoria mais elevada, e ali es-tavam para servir: assear o cavalo, ajaezar, limpar as ar-mas — de caça ou de guerra — do dono do castelo. Etambém levar recados, fazendo mais ou menos um papelde oficial de gabinete, de um diplomatazinho.

Por exemplo, exercia, da parte do senhor dele, a mis-

são de cumprimentar o bispo, porque era o aniversáriode sua sagração. O senhor não ia, mas mandava um pa- jem que soubesse fazer bem o cumprimento, ser amável,etc., o que ficava bem para o senhor. Então este cobravado pajem, mas depois ia perguntar ao bispo como é queo pajem tinha desempenhado a tarefa. Imediatamente opajem sabia disso. E o senhor mandava contar para o paido rapaz como andavam as coisas, ou o próprio pai pas-sava e perguntava: “Como vai meu filho?” E o senhor di-zia, porque era meio educador do filho.

Mas quando aquele filho voltasse para o castelo me-nor do pai, ele estava com o espírito muito alargado, com

outro horizonte, e íntimo amigo dos filhos daquele se-

nhor superior; de onde um vínculo de dedicação, que éa essência do feudalismo, em virtude desse princípio deque toda relação deve gerar amizade.

Na Espanha, por exemplo, era assim que os antigosreinos que a compunham se concretizavam: de famílias,de grupos, de um reino para outro.

O costume do apanágio e a  política dos casamentos

Compreendemos, desse modo, como que tocandocom as mãos, o sentido profundo de certas coisas da-quele tempo, mas que os historiadores muitas vezes nãodão: de grupo para grupo, a consonância e as boas rela-ções, pelas necessidades comuns da vida, geravam ami-zade.

Em geral, os senhores de uma mesma região tinham

interesses comuns, e se encontravam para cultivá-los.Mas havia entre os senhores feudais o costume doapanágio, quer dizer, o filho mais velho era o morga-do, que herdava a maior parte da fortuna, e os filhosmenores herdavam o suficiente para se jogarem na lu-ta pela vida. Em virtude disso, se desenvolvia uma po-lítica de casamentos: duas famílias tinham interessesrecíprocos em se unirem; então os pais tratavam doscasamentos dos filhos, que iam se conhecer pouco an-tes das núpcias. Restos disso duraram até à Revolu-ção Francesa.

O Lenotre1, em Gens de la vieille France, conta esse fa-

to curioso: um rapaz francês — já nos anos da Revolução— entrou no escritório do pai e lhe disse:— O senhor me permite fazer uma

pergunta?O pai interrompeu o trabalho, ficou

preocupado com aquilo e indagou:— O que é?— Ouvi dizer, meu pai, que vós estais

tratando do meu casamento com  Made- moiselle tal.

O pai afirmou:— Talvez. O que você tem a falar a es-

se respeito?— Eu queria dizer uma palavra sobreo meu casamento.

O pai chamava os filhos de Monsieur .—  Monsieur , meta-se nos seus negó-

cios, não nos meus.E o rapaz foi embora.Daí vem o provérbio francês: “O ton-

to casa com a mulher de quem gosta, eo homem criterioso gosta da mulher comquem casa.”

Um guerreiro com seus dois pagens - MuseuMetropolitano de Arte, Nova Iorque, EUA

   R  e  p  r  o

   d  u  ç

   ã  o

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Quer dizer, o romantismo doséculo XIX transtornou com-pletamente isso, e deu no quesabemos. Mas era o modo deeles entenderem as coisas.

”Tu, Áustria  feliz, casa-te!”

Por exemplo, região com re-gião. O casamento entre os fi-lhos dos altos senhores feudaisdas várias regiões, as relaçõespessoais entre eles acarreta- vam, por solidariedade, os rela-cionamentos de toda a provín-cia, de todo o feudo grande.

O famoso casamento de Lu-ís XII, Rei da França, com Anade Bretanha — Duquesa daBretanha, que tinha sido noivado filho do Imperador do Sa-cro Império, mas depois houvebrigas, etc., e romperam — foiconsiderado o matrimônio daBretanha com a França. E realmente ela ficou Rainha daFrança, e — como no caso da Rainha Elizabeth — ela ti-nha o morgadio e levou, como Rainha da França, a coroaducal de Bretanha consigo. O filho dela foi Rei da Fran-

ça e Duque da Bretanha ao mesmo tempo, e a Bretanhase incorporou à França com a condição de conservar sualíngua, suas leis e seus costumes antigos; o que se obser- vou até a Revolução Francesa.

É a mesma espiral que chega até a culminância. En-tão, compreende-se o dito austríaco. A família dos Ha-bsburgos foi sempre muito prolífica, com muitos filhos,donde muitos príncipes e princesas, e eles casavam co-mo quem coloca peças de xadrez no tabuleiro; e se ex-pandiram a ponto de serem quase donos de toda a Euro-pa. Então há um dito, expresso em latim: Bella gerant alii,tu felix Austria nube — Os outros façam guerra à vontade,

tu, Áustria feliz, casa-te.

 A pessoa isolada de nossos dias

Depois da Idade Média começaram a se estabelecer osnacionalismos e as rivalidades entre as nações; aí a coisamudou. Mas São Luís ainda fez algo que causou pasmo: aInglaterra tinha feudos em território francês e, por diver-sas circunstâncias, um desses feudos caiu nas mãos de SãoLuís, não por guerra, mas por herança. E ele deu esse feu-do a outra grande família, e os vários políticos disseram:

— Mas que loucura! A in-tenção do rei é de acabar comos grandes feudos, para ele so-zinho dominar, não ter genteforte abaixo de si.

São Luís afirmou:— Não, eu quero fazer um

tratado com esse meu primo,e ser um modelo do senhor,do grande suserano para ele, emeu primo o modelo do perfei-to vassalo.

— Isso vai dar em guerra.— Faça o que eu estou man-

dando.Fizeram, e foi o único lugar

da França onde, durante cem

anos, não houve guerra entre osenhor feudal e o rei.Um caso interessante, já nos

tempos modernos, relaciona-do com a História da Espanha,é o casamento de Filipe I, o Be-lo, com Joana I, a Louca, filha deFernando e Isabel. Havia todas

as possibilidades de o trono espanhol cair nas mãos da Casad’Áustria, e então a Áustria querendo oprimir a Espanha.

Sabemos que os espanhóis não raciocinavam nessestermos, pois os príncipes da Casa d’Áustria foram bons

e dedicados. Li as memórias do Metternich2

, que se refe-re às mensagens de convite para a Casa d’Áustria voltar areinar na Espanha, ainda no século XIX. Eram as fidelida-des. Tudo isso é a duração da amizade, são reflexos dela.

 Aí está a origem do direito consuetudinário. Os cos-tumes, regulando toda a vida assim, geram as leis costu-meiras.

 A civilização em que vivemos é a civilização do egoís-mo, em que tudo é calculado na inteira absorção de to-dos os recursos de cada um, para satisfação de todas asapetências individuais. Isso forma o homem isolado, queluta extenuado por sua existência, incompreendido, ain-

da quando tenha alcançado grandes sucessos. v

(Extraído de conferência de 3/9/1991)

1) G. Lenotre, pseudônimo de Louis Léon Théodore Gosselin(*1855 - †1935). Historiador e escritor dramático francês.

2) Klemens Wenzel Lothar Nepomuk von Metternich, Príncipede Metternich-Winneburg-Beilstein, (*1773 - †1859). Diplo-mata e estadista do Império Austríaco.

Filipe, o Belo e Joana, a Louca - RealMuseu de Belas Artes, Bruxelas, Bélgica

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O mês de maio e o Reino de Maria

 S

18

DE MARIA NUNQUAM SATIS

No mês de maio, as festas em honra de Maria Santíssima eram

celebradas com muito esplendor e deixavam saudades em todos os fiéis.

O Reino de Maria será um imenso mês de Nossa Senhora, e em todos

os dias se comemorarão as grandezas da Rainha do Universo.

endo o mês de maio dedicado especialmente àSantíssima Virgem, gostaria de tratar sobre a fes-ta, outrora comemorada no dia 31 de maio, de

Nossa Senhora Rainha, que é a festividade do Reino deMaria.

Dar glória a Deus

Este Reino é algo tão trans-

cendental, tão grande, de talmodo ligado à eternidade, quetoda borrasca terrena pode ir e vir, desencadear-se e resolver--se, mas o Reino de Maria per-manece eternamente, sólido ebrilhando na sua glória intrínse-ca, de maneira tal que todas asinjúrias, as propagandas adver-sas não podem nada contra ele.

O que vem a ser propria-mente a Realeza de Maria? E

por que a Igreja instituiu estacomemoração? Ela a estabele-ceu com duas intenções. A pri-meira é de dar glória a Deus,por meio de Nossa Senhora, apropósito do assunto da pró-pria festa. Assim, por exemplo,a solenidade de Corpus Christi foi estabelecida para dar glóriaa Deus — sempre por meio deMaria Santíssima, porque Ela é

Procissão de Corpus Christi na Catedral de SevilhaFundação Banco Santander, Madri, Espanha

a Medianeira universal de todas as graças — pela institui-ção do Santíssimo Sacramento, pelo fato de a Igreja ter si-do adornada, enriquecida e vivificada por esse Sacramentoadmirável, ou seja, a Sagrada Eucaristia.

 Assim também a Igreja estabeleceu uma festa para aRealeza de Nossa Senhora porque ela quer dar glória aDeus pelo fato de Maria Santíssima ser Rainha. Então

ela festeja, canta, com um atode amor e de culto, toda essa

glória que Deus recebe por es-sa realeza da Santíssima Vir-gem. E enquanto católicos,temos que nos associar, evi-dentemente, a essa atitude daIgreja.

 Anteriormente fora esco-lhido para esta comemoraçãoo dia 31 de maio para, destaforma, fechar com chave deouro o mês de Maria, comple-tando assim todas as honras

que a Santíssima Virgem re-cebeu durante esse mês, acla-mando-A Rainha, depois deterem sido ditas todas as ou-tras maravilhas em louvor aEla. Isso implica em procla-mar a mais alta glória d’Ela,abaixo da honra de ser Mãe deDeus e dos homens: ser a Rai-nha dos homens e a escrava deDeus Nosso Senhor.

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A Virgem com o Menino - Museu Nacionalde Arte, Catalunha, Espanha

 Assim, a festa da Realeza de Maria tem um alcancemuito grande. A Igreja espera do interior de nossas al-mas uma alegria, uma satisfação, uma homenagem, umahonra a Nossa Senhora como Rainha.

Concentrar a atenção na realeza de Maria Acrescenta-se a isso um segundo objetivo: a cada ano

que passa essa festa se repete. Desta maneira, a Igreja —conhecedora da facilidade com que o espírito humano sedispersa e se volta para coisas às quais não deveria se voltar— obtém um meio de concentrar novamente a atenção deseus filhos sobre esta realidade: Nossa Senhora é Rainha.

Eis porque a Igreja organizou, ao longo dos séculos, ocalendário litúrgico, consagrando cada dia do ano ao cul-to de vários Santos, alguns dias a determinados mistériosda Religião Católica, e também a alguns títulos de glória

de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Nossa Senhora. Assim, a cada ano que passa, a Igreja pede a todos osseus filhos que se recolham de modo especial e pensem,meditem na realeza de Maria Santíssima.

Esses dois objetivos se ligam, porque ninguém podeamar o que não conhece. Portanto, não pode amar a rea-leza de Maria quem não a conhece. É preciso pensar ne-la, refletir a respeito dela, para depois amá-la.

 A concentração do espírito, o pensamento, a refle- xão antecipam o ato de amor. A Igreja pede que reflita-mos, nos concentremos, para depois fazermos um ato deamor, e com isso darmos a Nossa Senhora a glória pelo

fato de Ela ser Rainha.Vemos, assim, como na Santa Igreja tudo é bonito,bem pensado. Quanta harmonia, quanta profundidade,quanta serenidade, quanta nobreza, quanta força há emtodas as coisas da Igreja! Mesmo em meio aos terríveistorvelinhos pelos quais a Igreja Católica possa passar, elaé ela, a Igreja imortal. E sempre conservará a santida-de que lhe é própria até o fim do mundo, porque ela éindestrutível. Um dos aspectos dessa santidade é exata-mente o conservar a festa da Realeza de Maria.

 As cerimônias de outrora ao

longo do mês de maioOs que não alcançaram o mês de Maria, como tradi-

cionalmente se realizava até uns quinze anos atrás, nãotêm ideia de como era uma verdadeira maravilha.

Toda noite, em geral por volta das 7h30 — os horários variavam um pouco —, em todas as igrejas, e mesmo nascapelinhas do campo, realizavam-se cerimônias em hon-ra de Nossa Senhora.

 A cerimônia constava fundamentalmente do seguinte:as associações religiosas — filhas de Maria, congregados

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DE MARIA NUNQUAM SATIS

 Ao lado, interior daIgreja do Coraçãode Jesus - SãoPaulo, Brasil. Acima,bênção do SantíssimoSacramentoBasílica NossaSenhora do Carmo,Campinas, Brasil

marianos e outras congregações consagradas a Nossa Se-nhora — ocupavam inteiramente os bancos da igreja, deum lado e de outro. O sacerdote subia ao púlpito, por-tando sobre a batina a roquete: aquela espécie de meiatúnica branca com rendas, que os padres usavam.

Do alto do púlpito o sacerdote rezava em silêncio, en-quanto o coro entoava a “Ave Maria”. O padre manti-nha-se ajoelhado no púlpito, e todo o povo, de joelhostambém, constituindo uma massa popular enorme queenchia a igreja, ocupando todos os espaços, até para fo-ra dos bancos.

Todos cantavam a “Ave Maria”, pedindo graças parao sacerdote pregar com bastante unção sobre a Santíssi-ma Virgem. Terminado o cântico, ele iniciava o sermão.

 Após a prédica, o coro recomeçava a cantar, entoavaa ladainha de Nossa Senhora e outras orações em lou- vor a Ela.

 Ao final, era dada a bênção do Santíssimo Sacramen-to. O momento culminante da cerimônia ocorria quandoo sacerdote se voltava para o povo, portando nas mãos oostensório sob a forma de sol com raios de ouro, dentrodo qual estava o Santíssimo Sacramento, e, diante de to-do o povo genuflexo, dava a bênção, voltando-se com aHóstia Sagrada para todos os lados da igreja.

Depois depositava o ostensório novamente sobre o al-tar, ajoelhava-se, rezava algumas orações e guardava oSantíssimo Sacramento no sacrário.

Em seguida, o sacerdote saía enquanto o coro canta- va. A igreja estava tomada pelo perfume do incenso, lar-

gamente utilizado durante a bênção do Santíssimo paraadorar a Sagrada Hóstia.

 Atmosfera abençoada que se difundia As associações religiosas se retiravam pela sacristia, e

as pessoas retornavam para suas casas.Entretanto, ficavam ainda alguns fiéis rezando na

igreja. Era talvez um dos aspectos mais bonitos. Naigreja quase vazia, ouviam-se remanescentes de me-lodias sacras, sentiam-se restos de incenso flutuandopelo ar, o sacristão ia aos poucos apagando as váriasluzes do edifício sagrado, revistando os confessioná-rios, atrás dos altares, para ver se não ficara alguémnesses locais, e ia assim preparando a igreja para serfechada.

 Até esse momento, permaneciam ainda algumas al-mas aflitas, recolhidas diante deste ou daquele altar: oraera uma velhinha, ora um rapagão imenso, ora um se-nhor obeso e atingindo largamente os seus 50 ou 60 anos,ora uma mãe de família de meia idade, ora uma crianci-

nha. Todos rezando com afinco junto a uma imagem epedindo uma graça espiritual ou temporal, de que mui-to necessitavam.

Por fim, o sacristão aparecia e, para dar a entenderque era preciso sair da igreja, ao invés de pôr as pessoaspara fora, ele sacudia um molho de chaves. Todos enten-diam que era preciso sair, e só então o templo esvaziava.Quer dizer, os filhos da Igreja ficavam dentro dela o tem-po que pudessem.

Quando terminava abênção, eram 9h, às vezes 9h30, hora re-

lativamente tardiapara a São Paulo

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Coroação da Virgem - Galeria Nacional, Parma, Itália

daquele tempo. Nas ruas desertas, podiam-se acompa-nhar os últimos fiéis que saíam, andando devagarzinho:uma senhora com uma bolsa na mão, mais adiante umhomem com ar sofrido, outro que estava alegre, espe-rançado, dispersavam-se aos poucos como se fossem asúltimas bênçãos da igreja que se difundiam para os vá-rios cantos da cidade.

O relógio da torre da igreja: símboloda relação entre o pensamentoda Igreja e o do homem

Ficava aquela torre voltada para o céu, o relógio in-dicando as horas noite adentro, silêncio em volta, as nu- vens, a Lua, o tempo, tudo passando à espera da manhãseguinte, quando o templo abrisse de novo as suas por-tas, de madrugadinha, e em que se vissem muitas daque-

las mesmas pessoas da véspera voltarem, às vezes nasmadrugadas frias e ventosas de São Paulo, e entraremna igreja que representava, ao mesmo tempo, um refúgiopara a alma e um abrigo contra as ventanias que sopra- vam sobre o corpo. Iniciava-se, então, uma cerimônia re-ligiosa ainda mais augusta e mais solene do que a da vés-pera: a Missa. Era a vida da igreja que recomeçava quan-do a cidade acordava. Era uma verdadeira beleza!

O simbolismo do relógio na torre das igrejas é lindo!Não é direta e principalmente para que o transeunte oolhe e veja que horas são; tem acidentalmente tambémessa finalidade, mas o objetivo principal é outro. Os pe-

quenos relógios particulares eram menos pontuais doque os grandes que encimavam as torres. Por isso, estesserviam para que todos acertassem por ele os ponteirosdos relógios cambaios.

Esse era o símbolo da relação entre o pensamento daIgreja e o do homem. O homem acerta o seu pensamen-to pelo da Igreja — porque a Igreja não erra nunca, e elepode errar —, assim como acerta o seu relógio pelo reló-gio estável, que os padres mantinham pontual. Essa era abeleza do relógio da torre da igreja.

 A coroação de Nossa Senhora

No encerramento do mês de Maria, no dia 31, em to-das as igrejas, Nossa Senhora era coroada Rainha. Co-locava-se no presbitério, bem na frente, uma pequenaconstrução artística, de madeira, que variava de acordocom a imaginação e o gosto do vigário e das pessoas daparóquia, mas comportava essencialmente um lugar mui-to alto onde havia uma imagem da Santíssima Virgem to-da cercada de flores, uma escadinha por onde, em geral,uma criança levava uma coroa e com ela coroava NossaSenhora Rainha.

Todo o povo permanecia genuflexo, o órgão tocandoa todo volume, o coro cantando, proclamava-se, assim, arealeza de Maria Santíssima.

Feita a coroação, um grupo de pessoas designadas pe-lo vigário tomava a imagem de Nossa Senhora e formavaum cortejo; o vigário ia atrás com a capa magna, e davamuma volta pelas várias naves da igreja com a imagem co-roada. Em seguida, colocavam-na de novo no seu trono.Depois disso vinham diversas orações, e estava termina-do o mês de Maria.

O mês de Maria acabava deixando umas saudadesenormes! Todo mundo gostaria que o ano litúrgico intei-ro fosse um perpétuo mês de Maria.

Eu espero que quando chegar o Reino de Maria issoseja assim, e que da vitória de Nossa Senhora, previstaem Fátima, até o fim do mundo nós tenhamos um imen-so mês de Maria, em que todos os dias a Santíssima Vir-gem seja festejada e se aclame a glória d’Ela, vista comoRainha do Universo. v

(Extraído de conferência de 31/5/1975)

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Teoria sobre a sustentação dos seres

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O PENSAMENTO FILOSÓFICO DE DR. PLINIO

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 Catedral de Santiago deCompostela, Espanha

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O PENSAMENTO FILOSÓFICO DE DR. PLINIO

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desse ser radiografado. Não éisso! É uma noção muito maiselevada e especial.

Deus é o motor

  primeiro A corrida das ciências na-

turais para alcançarem o seupróprio termo final chega-ria a um ponto onde se per-cebesse a insuficiência de to-das, nada mais. A partir des-se momento — hic taceat om- nis lingua2 —, saberíamos queDeus está presente.

Isso nos daria uma espé-

cie de arquitetura do mundodas ciências naturais vistas decima, e renderia a Deus umaglória extraordinária.

Um estudo de ciências na-turais bem feito revelaria quetodos os seres são incapazes,por si sós, de uma ação queos sustente mutuamente.

Quando se trata dos se-res inanimados, por exem-plo, costuma-se ressaltar sua

incapacidade de se moverem espontaneamente. Mas fi-ca insinuado tacitamente que na interação desses seresDeus não tem nada que ver.

Por exemplo, um ímã que atrai uma limalha de ferro.Esta ação do ímã é considerada como inteiramente inde-pendente de Deus.

Eu concedo de bom grado que o poder de imanta-ção possa ser decorrente de uma particular disposiçãode moléculas. Entretanto, sustento que essa disposiçãomolecular não é o único elemento que fez mover aqui-lo, mas que, de um modo geral, a atração da matéria pelamatéria tem Deus como motor primeiro.

 Assim orientados os estudos, encontraríamos Deus naponta das avenidas de todas as ciências.Suponho que, na pluralidade enorme de ações que a

Divina Providência desenvolve por causas segundas, ElaSe reserve algumas intervenções diretas. Não tanto nocaso concreto do ímã com a limalha de ferro, mas talvezna atração dos astros entre si, em certo momento, inter- venha uma ação direta de Deus.

Não é necessária uma ação especial do Criador cada vez que o ferro vai atrair a limalha; pensar isso seria infan-til. Mas Deus, por uma ação habitual d’Ele sobre a natu-

reza do ferro, dá-lhe uma pro-priedade tal, por onde, agru-padas as moléculas de certomodo, elas atraem. É uma fa-culdade de mover, comunica-da no ato criador. Deus nãoprecisa intervir, portanto, emcada atração, pois já comuni-cou esta capacidade ao operara Criação. Mas, como Ele sus-tenta aquele ser, mantém estapropriedade também.

Física e Metafísica

Voltemos a considerar anecessidade da mútua susten-

tação entre os seres criados.Deus tem o poder de criar,mas, como afirma São Tomásde Aquino3, era necessário queEle criasse seres plurais, poisuma única criatura, por maisperfeita que fosse, não seriasuficiente para representar aperfeição e a bondade divinas.

Essa pluralidade de serestem como corolário que umser criado necessita ser sus-

tentado por outro; pois, se para que Deus seja devida-mente conhecido não basta um único ser criado, por aná-loga razão não basta a ação direta de Deus para a susten-tação das criaturas. O próprio instinto de sociabilidadenos homens se explica assim.

Essas considerações dão fundamento à ideia de queexiste uma ação de cerne a cerne, de caráter metafísico,“paradivina”, que deixa seus rastros na ordem natural.

Uma pessoa que tivesse aparelhos de análise superpo-tentes notaria algo dessa ação. Não veria diretamente o“dedo de Deus”, mas perceberia alguma coisa que ela in-tuiria estar acima do que os sentidos podem captar.

Então, a Física perfeita chegaria ao teto de si mesma ediria: “Daqui por diante é Metafísica.” A Física que nega a Metafísica é uma Física de vistas

curtas. Seria mais ou menos como um homem que diz ver muito bem uma determinada sala, mas a vista delenão alcança o teto.

Conjuntos que formam coleções

Outro aspecto importante da questão, e que me agra-da muito considerar, é o fato de o universo ser constituí-

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   (   C   C   3

 .   0   )

 Ao lado, “Comedie française”Paris, França. Abaixo, “Concerto

de gala em Veneza” - AntigaPinacoteca, Munique, Alemanha

do de conjuntos que formam, por assim dizer, co-leções das quais cada elemento é necessário.

Quando a coleção é completa, estabelece-se al-guma coisa que é mais do que a soma dos indi- víduos. À maneira de uma dança lúdica e pura,aquela coleção realiza um movimento que libertade dentro dela uma série de outras potencialida-des. Há uma interação mútua perfeita, muito belae nobre entre os membros do conjunto.

Esse movimento estava potencialmente postopor Deus, dormente em cada ser. A partir do mo-mento em que ficaram juntos, passou a haver umaespécie de circulação de harmonia, determinadapela soma das causas segundas que se encontra-ram. Não obstante, houve uma causa primeira que deu àssegundas a possibilidade e a necessidade de serem assim.

Isso nos permite entrever uma harmonia do universosossegada, nobre e bela, na qual cada elemento tem seupapel.

Imaginem, por exemplo, uma peça de teatro represen-tada por grandes atores, a qual, entretanto, não pode de-

senrolar-se sem haver um menino que faça o papel de office boy, entre e entregue uma carta. Se esse meninochega atrasado para a peça de teatro, tudo fica parado.Quando entra o menino, tudo começa a se mover.

É a imensa colaboração das coisas pequenas. Aliás, adefesa do ente pequeno diante da ameaça de ser esma-gado pelos grandes está nisto: desfalcar as coleções quenão existiriam sem ele.

Pode acontecer que o pequeno agrida o grande. En-tão é o micróbio, o pernilongo, a abelha na tromba doelefante.

Entretanto, tudo isso é muito bonito, sobretudo quan-do não é a mera anedota engraçada da abelha mexendocom a tromba do elefante, mas se percebe por detrás umalei metafísica entre pequenos e grandes, formando o espí-rito metafísico, que é o espírito do Reino de Maria. v

(Extraído de conferência

 de 8/6/1984)

1) Do latim: todo ente ama seu próprio ser. Formulação resumidado princípio contido na asserção tomista: Omne enim quod est,inquantum est ens, necesse est esse bonum; esse namque suumunumquodque amat et conservari appetit. (O que é, enquantoente, tem necessariamente o ser bom, pois cada coisa ama oseu ser e deseja conservá-lo.) SÃO TOMÁS DE AQUINO,Suma contra os Gentios, II, c. 41, n. 5.

2) Do latim: Aqui toda língua se cale.3) Cf. Suma Teológica, II - q. 47, a. 1.

Tudo isso é muito bonito,sobretudo quando não é amera anedota engraçada

da abelha mexendo com atromba do elefante, masse percebe por detrásuma lei metafísica entre

pequenos e grandes.

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C ALENDÁRIO DOS S ANTOS  ––––

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São Filipe

9. Beata Maria Teresa de Jesus, virgem (†1879). Fundoucom insigne previdência a Congregação das Pobres IrmãsEscolásticas de Nossa Senhora, em Neunburg, Alemanha.

10. VI Domingo da Páscoa.

Beato Henrique Rebuschini, res-bítero (†1938). Sacerdote da Ordemdos Clérigos Regulares Ministrosdos Enfermos, que prestou serviçoaos doentes em hospitais de Veronae Cremona, Itália.

11. São Francisco de Jerônimo,

presbítero (†1716). Ver página 28.

12. São Nereu e Santo Aquiles,

mártires (†séc. III).São Pancrácio, mártir (†séc. IV).São Modoaldo, bispo (†c. 647).

Na Diocese de Tréveris, Alemanha,construiu e favoreceu igrejas e mos-teiros, instituiu várias comunidadesde virgens, e foi sepultado junto desua irmã Severa.

13. Nossa Senhora de Fátima.

Santa Inês de Poitiers, abades-sa (†588). Consagrada pela bên-ção de São Germano de Paris, go- vernou com espírito de caridade omosteiro de Santa Cruz de Poitiers,França.

14. São Matias, Apóstolo.Beato Gil de Vouzela, presbítero (†1265). De nobre fa-

mília portuguesa, após exercer a medicina em Paris, in-gressou na Ordem Dominicana, falecendo em Santarém,Portugal.

15. São Retício, bispo (†séc. IV). Governou a diocese de Autun, França, sobressaindo-se por seus dons de pregadore sua sabedoria.

16. São Possídio, bispo (†d. 437). Discípulo e amigo deSanto Agostinho, assistiu à sua morte e escreveu sua bio-grafia. Foi Bispo de Calama, Argélia, e combateu a here-sia donatista.

17. Solenidade da Ascensão do Senhor.

1. São José Operário.

São Ricardo Pampuri, religioso (†1930). Após ter exer-cido generosamente a medicina na vida secular, ingressouna Ordem Hospitalar de São João de Deus. Dois anos de-pois adormeceu piedosamente no Senhor em Milão, Itália.

2. Santo Atanásio, bispo eDoutor da Igreja (†373).

Santa Vilborada, virgem e mártir(†926). Viveu recolhida numa peque-na cela junto à Igreja de São Magno,em São Galo, Suíça, onde levou vidade oração e sacrifícios. Martirizadapelos invasores húngaros.

3. V Domingo da Páscoa.

São Filipe e São Tiago Menor,

 Apóstolos.Beata Maria Leônia Paradis,

 virgem (†1912). Fundadora daCongregação das Irmãzinhas daSagrada Família, em Sherbrooke,Canadá.

4. São Silvano de Gaza, bis-po, e companheiros, mártires (†c.

304). Por ordem do ImperadorMaximino Daia, foi condenadoa trabalhos forçados e decapita-do nas minas de Feno, Palestina,com mais 39 cristãos.

5. Beato Gregório Frackowiak,

religioso e mártir (†1943). Religioso da Sociedade doVerbo Divino, preso e decapitado em Dresden, Alemanha.

6. Beata Maria Catarina Trioani,  virgem (†1887).Religiosa franciscana nascida na Itália, que fundou no

Cairo, Egito, as Irmãs Franciscanas Missionárias doCoração Imaculado de Maria.

7. Santo Agostinho Roscelli, presbítero (†1902). Fundouem Gênova, Itália, a Congregação das Irmãs da ImaculadaConceição da Bem-Aventurada Virgem Maria.

8. São Viro, missionário (†c. 700). Juntamente com oscompanheiros Plechelmo e Odgero, desenvolveu, segundoa tradição, um grande trabalho apostólico para evangelizara região de Roermond, Holanda.

   A  n

   d  r  e  a  s

   F .   B

  o  r  c

   h  e  r   t

   (   C   C   3

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––––––––––––––––––– * M AIO *  ––––

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São Tiago Menor

   A  n

   d  r  e  a  s

   F .   B

  o  r  c

   h  e  r   t

   (   C   C   3

 .   0   )

São Pedro Liu Wenyuan, mártir (†1834). Catequista es-trangulado em Guiyang, China, por causa de sua fé emCristo.

18. São João I, Papa e mártir (†526).Beato Estanislau Kubski, presbí-

tero e mártir (†1942). No tempo daguerra, morreu intoxicado nas câ-maras de gás, no campo de concen-tração de Dachau, Alemanha.

19. Santo Urbano I, Papa (†230).Governou fielmente durante oi-to anos a Igreja, após o martírio de

São Calisto.20. São Bernardino de Sena,

presbítero (†1444).Beata Maria Crescência Pérez,

 virgem (†1932). Religiosa da Con-gregação das Filhas de MariaSantíssima do Horto, na Argentina.Por problemas de saúde, foi transfe-rida para Vallenar, Chile, onde fale-ceu aos 35 anos.

21. São Cristóvão Magalhães,presbítero, e companheiros, már-tires (†1927).

Santo Hemming, bispo (†1366).Na Diocese de Abo, Finlândia, re-novou a disciplina eclesiástica, favo-receu os estudos dos clérigos, digni-ficou o culto divino e promoveu a paz entre os povos.

22. Santa Rita de Cássia, religiosa (†c. 1457).Beata Maria Domingas Brun Barbantini, religiosa

(†1868). Fundadora da Congregação das Irmãs Ministras

dos Enfermos de São Camilo, em Lucca, Itália, após ficar viúva.

23. Beatos José Kurzawa e Vicente Matuszewski, presbí-teros e mártires (†1940). Durante a ocupação da Polônia,foram mortos a tiros, na cidade de Witowo.

24. Solenidade de Pentecostes.

Nossa Senhora Auxiliadora.

Beato João de Prado, presbítero e mártir (†1631).Franciscano espanhol enviado para o norte da África a

fim de prestar auxílio espiritual aos cristãos reduzidos àescravidão. Tendo sido preso, confessou vigorosamentesua Fé perante o tirano Mulay al-Walid e foi por ele con-denado a morrer na fogueira.

25. São Gregório VII, Papa(†1085).

São Beda, o Venerável, presbíteroe Doutor da Igreja (†735).

Santa Maria Madalena de Pazzi,

 virgem (†1607).Beato Gerardo Mecatti, eremi-

ta (†c. 1245). Seguindo os passos deSão Francisco, distribuiu seus bens

aos pobres e retirou-se à solidão emVillamagna, Itália.

26. São Filipe Néri, presbítero(†1595). Ver página 2.

27. Santo Agostinho de Cantuá-

ria, bispo (†604/605).Santo Eutrópio, bispo (†c. 475).

 Após ficar viúvo, decidiu se entre-gar totalmente a Deus. Foi ordena-do diácono e mais tarde eleito Bispo

de Orange, França.

28. São Germano, bispo (†576).Era abade do Mosteiro Beneditinode São Sinforiano, em Autun, França,quando foi chamado para a sedeepiscopal de Paris. Cuidou das al-

mas com grande zelo apostólico.

29. Beata Gerardesca,  viúva (†c. 1269). Passou a vi-da numa cela junto ao Mosteiro Camaldulense de SãoSabino, em Pisa, Itália, consagrando-se ao louvor de Deus.

30. São Fernando III, rei (†1252). Rei de Castela eLeão, usou sua sabedoria para administrar seu reino. Foigrande promotor das artes e das ciências e zeloso propa-gador da Fé.

31. Solenidade da Santíssima Trindade.

 Visitação de Nossa Senhora.

São Noé Mawaggali, mártir (†1886). Morto pelos emis-sários do rei, de quem era fâmulo, enquanto ministravauma aula de catecismo em Mityana, Uganda.

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E

São Francisco de Jerônimo:

despretensão e amorao sacrifício

28

HAGIOGRAFIA

Quem se deixa dominar pelo orgulho perde todas as virtudesque eventualmente possua. Mas ao despretensioso todo o

resto lhe será dado por acréscimo.

Grande devoto da Virgem, que frequentemente enviava--lhe os pecadores que desejava se convertessem. Tornou-se famoso o caso de um homem, há muito afastado da Igreja, que Nossa Senhora o protegeu por causa do respeito com que saudava as suas imagens. Apareceu-lhe três vezes, or- denando que procurasse Francisco para se confessar.

São Francisco de Jerônimo morreu em 1716, cantando o Magnificat em agradecimento pelas graças que recebe- ra em sua vida.

 Meio publicitário de primeira ordem

Essa vida é uma verdadeira beleza! Vê-se como a gra-ça prepara as pessoas de acordo com o ambiente em queelas devem atuar. É uma coisa evidente que este homem,que desejava fazer a pregação na distante China, no dis-tante Japão, tinha todo o necessário para pregar na pró-pria Itália. Ele era italianíssimo e o modo de ele fazer

sermões o era também. É o Sul da Itália, todo entusias-mado por música, por cerimônias externas, por procis-sões, por aparato, gente com a imaginação quente, fértil,ao contrário dos nórdicos.

Vejam como é bem calculado ele sair, pelo Sul da Itá-lia ensolarada, de dentro de uma igreja napolitana, comum grupo de gente cantando e fazendo uma procissão. Émuito diferente, por exemplo, de um grupo de inglesessaindo da Catedral de Westminster, cantando e fazendoprocissão nas brumas de Londres. Na Itália tudo isso to-ma outro aspecto, outra poesia.

m 11 de maio comemora-se a festa de São Fran-cisco de Jerônimo, cuja biografia contém os se-guintes dados1:

São Francisco de Jerônimo nasceu em 17 de dezembro de 1642.

Grande pregador em NápolesTornando-se jesuíta, seu maior desejo era ser missioná-

 rio nas Índias e Japão, mas Deus o destinou a evangelizar o reino de Nápoles, trabalho ao qual se dedicou de corpo e alma.

 Preparou, para auxiliá-lo, uma confraria de artesãos que se chamou Oratório da Missão; além de outros numerosostrabalhos, seus membros todos os domingos acompanha- vam São Francisco em suas pregações pelas ruas e praças de Nápoles. Saíam cantando da Igreja de Gesù Nuovo e, em procissão, dirigiam-se aos locais mais frequentados.

 Ao avistarem a procissão, os elementos de má vida abandonavam, sem cólera, o que estavam fazendo. Francisco subia, então, a um lugar mais elevado e falava

 ao povo. Começava descrevendo, com energia, os horríveis efeitos do pecado e os castigos que esperavam o pecador.

Quando o temor estava em todos os corações, ele fala- va sobre a misericórdia de Deus. Depois dizia aos presen-tes que faria penitência por si e por eles. Ajoelhava-se an-te uma cruz e, com o rosto em lágrimas, flagelava-se comuma disciplina de ferro. Não era preciso mais para o povo segui-lo, cheio de arrependimento.

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Este Santo está inventando, portanto, um processopublicitário de primeira ordem para chamar a atençãonum lugar onde todo mundo canta: a poética Itália da-quele tempo, em que se trabalhava pouco e se vivia mui-to e melhor.

Imaginem as ruas estreitinhas da Itália daquela épo-ca, pelas quais as pessoas, saindo da Igreja do Gesù, ca-minham cantando hinos sacros. Todo mundo vai ver pas-sar a procissão, até mesmo as pessoas de má vida. Sobe osanto num local mais elevado e começa a falar.

 Agudo senso psicológico no agir 

E notem o alto senso psicológico no agir: São Francis-co entende bem que, para aquele gênero de gente, é pre-ciso começar a falar pelo temor, pois se trata de pessoasembrutecidas, endurecidas no pecado e, no seu atual es-

tado de espírito, incapazes de amor. Então, para desco-lar o apego desta gente aos bens da Terra, é necessáriocomeçar a dizer-lhes que são bens efêmeros, passageirose, depois, falar das chamas do Inferno, no duro.

Depois de tê-los amedrontado bem e, pelo temor, pro-duzir neles um início de desapego em relação aos bensterrenos, ele passa a falar da misericórdia para dar a es-perança dos bens futuros, nutrir o amor de Deus e fazercom que Ele comece a lhes aparecer com a sua face amo-rosa.

Vemos, assim, o quanto esse caminho, pelo temor pa-ra o amor, faz bem. Toda espécie de aventureiro, de ma-

fioso, de sem-vergonha de fundo de bodega, sai e come-ça a comentar:— Mas como é esse Inferno? Pega fogo mesmo?! Co-

mo é esse fogo?E ouvem a voz do Santo:— Morre-se de repente… Cuidado com a morte súbi-

ta! Olhai o que aconteceu, no vosso bairro, com a Mar-gherita — porque tem que ser assim, personalizado; pa-ra a oratória popular a coisa não pode ficar em teoria —,que morreu enquanto estava pendurando a roupa no va-ral. Quem haveria de dizer? Agora, eu pergunto: o mes-mo não pode suceder com qualquer um dentre vós?

Dirige-se a um ouvinte e pergunta:— Você não teve já uma tontura?— Eu já tive.Outro pensa: “Eu também tive, mas não conto!”De repente, por essas “coincidências” de que os ora-

dores assim inspirados são capazes, São Francisco diz:— Você conta que teve! Mas não haverá alguém aqui

que não tem coragem de contar que já sofreu algumatontura?

   S  e  r  g

   i  o   H  o

   l   l  m  a  n  n

São Francisco de JerônimoIgreja dos Jesuítas, Paris, França

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HAGIOGRAFIA

E aquele que fizera o propósito de não contar, pen-sa: “Esse homem adivinhou o que está se passando emmim!”

Varão humilde que derrama

o próprio sangueEstando os espíritos assim vacilantes, ele começa en-

tão a falar da misericórdia. Mas aí há uma prática emque a justiça e a misericórdia se osculam: depois de falarda misericórdia, São Francisco dá uma prova da neces-sidade da justiça e uma amostra da imensidade da mes-ma misericórdia. E ele mesmo vai junto a uma cruz, ajo-elha-se e diz: “Este sangue que vou derramar é por vós!”E começa a se flagelar. E vê-se correr o sangue do ino-cente, enquanto o pecador está embaixo, olhando e re-fletindo:

“Mas será possível? Eu fugiria na disparada para evi-tar essa sova, e ele a leva por mim! Que coisa fabulosa!”E a graça começa a atuar. Não há coisa mais eficaz do

que uma dupla graça: a da humildade e a do sangue derra-mado. Ou seja, ouvir um pregador destes que tem a cora-gem de falar sem procurar chamar a atenção sobre si, semser vaidoso, sem fazer espetáculo; ele está empolgando to-da aquela gente, mas pensando abnegadamente na salva-ção das almas e na causa da Igreja, e não está preocupa-do nem um pouco consigo. Pelo fato de sentirem quenão há nele egoísmo, ele arrasta os outros para aban-donarem o seu egoísmo. Ademais, ele leva isso à ge-

nerosidade de derramar o seu próprio sangue.Esse fato me traz à memória um dito de Na-poleão. Certa vez, quando ele estava no fastígio

de sua glória e já pensando em proclamar-se imperador,perguntaram-lhe:

— Por que não te fazes aclamar Deus?Ele respondeu:— Porque, depois de Jesus Cristo, só há um meio de

ser tomado a sério como Deus. É subir numa cruz e fa-zer-se crucificar. E ser crucificado eu não quero.

Christianus alter Christus2. São Francisco de Jerônimonão se crucificava, mas para ser tomado a sério ele se fla-gelava. E no ato de açoitar-se, feito com humildade e des-prendimento — porque uma flagelação orgulhosa não con-seguiria coisa alguma —, ele levava as almas atrás de si.

Vemos, então, qual é o resultado dessas missões, olindo fecho dessa biografia: um pecador a quem Nos-sa Senhora aparecia, recomendando que o fosse procu-rar. Um homem que, apesar desse sucesso estrondoso, seconserva inteiramente humilde e abnegado até o fim de

sua vida, e que morre num ato de humildade, atribuindotudo à Santíssima Virgem, como devia atribuir — por-que, como diz São Paulo, cada um de nós é um servo inú-til —, e cantando o Magnificat para agradecer os dons deque ele fora objeto.

 A morte deste Santo é uma das mais belas que podehaver: morrer entoando o cântico com

que Nossa Senhora agradeceu osdons que Ela mesma recebeu de

Deus! Uma vida cheia e queproclamava, humilde e ale-gremente, sua própria ple-

nitude no momento do seuocaso. Sem dúvida, é uma vida que mereceria queuma pessoa fizesse umpoema a respeito dela.

 A tentaçãode vaidade Alguém poderia dizer-

-me:“Doutor Plinio, o senhor

não está engrandecendo umpouco demais o personagem? O se-nhor se refere a ele como se fosse um

homem que tivesse calcado aos pés todosos louros do mundo, quando ele, afinal decontas, era um modesto pregador popu-lar. O que era isto em comparação com umgrande orador acadêmico?”

E eu respondo: uma das coisas mais di-fíceis é o indivíduo resistir ao apelo da de-magogia, à sedução desse contato vivo com Altar-mor e púlpito da Igreja do Gesù Nuovo - Nápoles, Itália

    J  o  s

   é   L  u

   i  z   B  e  r  n  a  r   d  e  s

   R   i   b  e

   i  r  o   (   C   C   3

 .   0   )

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Pregação de São Vicente Ferrer (Coleção particular)

a multidão e a essa sensação de estar conduzin-do as almas porque está guiando o povo. Essa éa tentação de vanglória mais difícil de ser venci-da, debaixo de muitos pontos de vista, do que ade vaidade de quem está falando para um gran-de auditório frio, que ouve tudo com senso crí-tico e, depois, aplaude batendo com as pontasdos dedos na palma da mão.

Imaginem alguém convidado para falar na Academia Francesa de Letras — um dos mais al-tos cenáculos literários do mundo —, e vendo asfisionomias daqueles franceses críticos, ouvindosua palestra. Terminada a exposição, dizem sim-plesmente: “Oh, bien...” O que é isto em compa-ração com um homem que vai carregado pelo po- vo que o aclama com “vivas” etc.? Aquele turbi-lhão do entusiasmo popular e “populacheiro”

que inebria mais, assim como um determinadogênero de vinho popular embriaga mais do que ac hampagne. É uma magnífica amostra do que po-de um homem, como vitória contra as formas fá-ceis de popularidade, perseverando na humildade e, por is-so mesmo, levando as almas a Nossa Senhora.

Lembro-me de ter lido o seguinte episódio na biogra-fia de São Vicente Ferrer, que talvez tenha sido o maiormissionário de todos os tempos, depois de São Paulo.Quando fazia missões de cidade em cidade, o povo deuma localidade ia acompanhando-o a pé pelo caminho,e a população da outra vinha ao encontro dele e o con-

duzia, debaixo de um pálio, para a cidade seguinte on-de ele deveria pregar. Quando o santo pregador entrava,era como um soberano que estivesse chegando: todos ossinos tocavam. E, naquele tempo, o sino era o máximo daconsagração; era como a televisão de hoje.

No meio de toda aquela popularidade, enquanto eleentrava em Barcelona, onde lhe haviam preparado umaconsagração apoteótica, alguém se aproximou dele eperguntou: “Irmão Vicente, não vos sentis vaidoso?”

Ele deu a resposta do homem humilde: “A vaidade es- voaça do lado de fora de mim, mas não entra.”

Quer dizer, “eu sinto a tentação da vaidade, mas não

consinto”. Vejam que beleza são essas coisas, que fazemde um pequeno detalhe da vida de um Santo uma verda-deira maravilha.

 A despretensão

Que isso nos toque e nos sirva de exemplo. O que eumais desejo para mim e para cada um de nós é a despre-tensão. Não nos preocuparmos com o que estão pensan-do de nós, em fazer bonito papel diante dos outros, massermos indiferentes aos aplausos ou às vaias. E sabermos

calmamente tocar o nosso caminho, executando aquiloque Nossa Senhora quer de nós, compreendendo que,para Deus, todo homem é pecador, tem defeitos, e as vir-tudes que ele possa ter lhe vêm de Deus Nosso Senhor,porque não saem de sua natureza contaminada pelo pe-cado original; portanto, pelos rogos de Maria, tudo deveser agradecido ao Criador.

 Aliás, é preciso dizer, ser vaiado por levar o nome de

Nosso Senhor Jesus Cristo a um ambiente hostil é umabem-aventurança, pois significa sofrer perseguição poramor à justiça. Indica um belo grau de humildade o con-servar-se despretensioso num ambiente onde há simpatiapara conosco, porém é mais difícil, ao ser vaiado, man-ter-se humilde, mas sobranceiro.

Eu os convido, portanto, a praticarmos juntos, nessesseus dois aspectos, a virtude da humildade, enfrentan-do com sobranceria a vaia e preparando as nossas almaspara dominar o contínuo apetite de sermos bem-vistos elouvados pelos outros, e de, veladamente ou não, nos jul-garmos superiores em relação aos demais.

Que Nossa Senhora nos conceda essa despretensão eeu lhes garanto que todo o resto lhes será dado por acrés-cimo. v

(Extraído de conferência de 10/5/1968)

1) Não dispomos dos dados bibliográficos da ficha utilizadanesta conferência.

2) Do latim: O cristão é outro Cristo.

   E  n  r   i  q  u  e

   C  o  r   d  e  r  o

   (   C   C   3

 .   0   )

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LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ

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O órgão, o vitral, a ogivaTrês luzes emanadas da Civilização Cristã que,

sendo representações sensíveis de Deus, elevam as

almas a uma atmosfera celestial.

 

órgão tem esta coisa maravilhosa: é uma “pe-numbra sonora”, feita exatamente de som e si-

lêncio. Porque, ainda que soe com todos os re-gistros, o órgão tem dentro de si qualquer coisa de avelu-dado e silencioso, que é um dos seus melhores charmes, eque mais casam com a penumbra visível da Igreja. Assimé o misto de silêncio e som que há no órgão.

O instrumento de todas as inocências

Entretanto, o órgão quase não comporta a descontinui-dade sonora total. Aquele som vai e vai... Sempre manten-do uma harmoniosa ligação com os sons anteriores.

 A pessoa que, a partir de um instrumento rudimentar,

deu ao órgão as características que conhecemos hoje, po-deria ser chamada de “profeta” em matéria de música. A meu ver, o órgão tem isto de fabuloso: há nele regis-

tros que remetem diretamente para o mais admirável dainocência e que fazem dele, quando bem tocado, o ins-trumento de todas as inocências.

Se fôssemos falar propriamente da inocência na suamaior abertura de asas, deveríamos imaginá-la como umórgão. Ela transforma a alma do homem num instrumen-to capaz de tocar todas as músicas, à maneira do órgão.

 Assim, enquanto não conseguirmos fazer sair das pro-fundidades de nosso ser, não a catedral engloutie1, mas o

órgão englouti, não teremos feito nada.Toda alma tem, com variantes, um “órgão metafísico”para tocar em função do universo, e a descoberta desse“órgão” é o fim da nossa vida. Quando descobrirmos is-so, estaremos prontos para o Céu. Isso se refere, inclusi- ve, ao escopo da vida de piedade.

Representações sensíveis de Deus

 A Santa Igreja tem algo por onde ela relaciona os ho-mens à maneira dos tubos de um órgão. Por isso, a Igre-

 ja Católica, bem constituída e vista na sua inteira norma-lidade, pode ser comparada a um imenso órgão ou a um

imenso vitral, porque o vitral faz com as cores o que o ór-gão realiza com os sons; é o mesmo princípio aplicadoem matéria cromática.

Trata-se, portanto, de formar uma visão da ordemtemporal sacral, dentro da ordem do universo na qualo homem se encaixa, iluminado por este  lumen uno daIgreja, que ela soube exprimir através do órgão e do vi-tral, mas que é um estado de alma, uma supravirtude,uma superposição de temperamento, que eu tenho a im-pressão de que é uma das graças, das mais genuínas, doEspírito Santo.

Em Pentecostes uma chama baixou e depois se dividiu

em várias línguas de fogo. Assim também, o unum dessagraça estaria nessa chama originária, que depois se trans-formou nos vários tubos de um órgão ou nas várias coresde um vitral. É a regra da reversibilidade entre unidadee variedade que está aqui refletida. Variedade levada atéquase ao infinito, partindo de uma unidade que se des-dobra em guirlandas sem se depauperar em nada.

E, a bem dizer, com uma semelhança estupenda comDeus, que sem Se empobrecer e sem Se cansar em nada,no fulgor de sua glória, cria. Também esse unum não seexaure, não empobrece, até se alegra em emitir de den-tro de si as mais valiosas variedades, sem sofrer o menor

abalo. Quase o motor imóvel de tudo o que ele mesmopôs em movimento.Este é o unum do órgão, que é o mesmo do vitral: são

representações sensíveis de Deus, motor imóvel.O órgão tem uma forma de beleza própria à polifo-

nia, diversa da beleza austera do cantochão. Entretanto,o canto gregoriano e o órgão não se contradizem, am-bos são sublimes. Enquanto o gregoriano afirma: “vaida-de das vaidades, tudo não é senão vaidade”2, o órgão pa-rece dizer: “harmonia das harmonias, tudo não é senãoharmonia”.

O

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Órgão da Catedral Saint-GatienTours, França

Órgão da Igreja de São PauloEstrasburgo, França

Catedral de Estrasburgo,França

  T  a  n  g  o  7  1 7 4 ( C C  3 . 0 )

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LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ

 J o s éLuizBernard

Acima, coro e órgão da Catedral

de Toledo, Espanha

Órgão da Catedral de Santo EstêvãoPassau, Alemanha

Órgão da Catedral Notre-Damede Bayonne, França

Por outro lado, vejo no órgão o mesmo que na ogiva eem outras coisas da Idade Média: uma ordem magnífica.

O sublime, o paradisíaco e o alcandoradoNem tudo o que é humano, nesta Terra, é sublime,

mas o órgão seleciona, dentre os sons humanos e terre-nos, os sublimes, procurando elevá-los a um estado para-disíaco. O estilo gótico, por sua vez, busca o mesmo emmatéria de arquitetura.

Poderíamos dizer que metade do espaço ocupado pelogótico e pelo órgão é sublime, e a outra metade é paradi-síaca. Na ponta transparece o alcandorado e a esperançado Reino de Maria.

Já a coexistência tão ordenada desses três valores —o sublime, o paradisíaco e o alcandorado — dá uma ple-nitude muito repousante e que prepara para o alcândor.

O gótico é uma espécie de santa preparação para chegarao alcândor. Reúne tudo quanto nossa natureza é capazde pegar e vai ordenando para perceber a ponta do subli-me, e é nisto que me parece estar o mais belo do gótico.

Vemos, assim, o equilíbrio com que devemos pensarno alcândor do Reino de Maria, que não desprezará nemo sublime nem o paradisíaco. Mas assim como Nosso Se-nhor subiu, caminhando com seus pés divinos, até o al-to do Monte das Oliveiras para ali operar sua Ascensãoaos céus3, na qual já não necessitaria empregar a força deseus membros, também no Reino de Maria se ordenarão

   D  d  a   l   b   i

  e  z   (   C  C   3

 .  0   )

   T  o

   b   i   8   7   (   C   C   3

 .   0   )

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   H  a  n  s

  -   J   ö  r  g

   G  e  m  e

   i  n   h  o

   l  z  e  r

   (   C   C   3

 .   0   )

Ao lado: Órgão da Catedralde Córdoba, EspanhaAo fundo: Igreja de Saint-EustacheParis, França

Órgão da Catedral Notre-Damede Paris, França

esses valores sublimes e paradisíacos para, a partir dessaelevação, ascender-se ao alcandorado.

Lembro-me da primeira vez em que eu vi uma ogiva

em estilo gótico flamboyant. Exclamei: “Ah, que maravi-lha! Era o que faltava e que eu não tinha talento paraimaginar. Que coisa estupenda, maravilhosa!”

Depois ouvi alguém criticá-la, mostrando o que ali ha- via de transição revolucionária para a Renascença. Pen-sei: “Lá vem o famoso mau espírito demolidor, a tal acu-sação seca e destruidora do bom espírito.” Mas depoiscompreendi que a pessoa tinha razão, pois no modo da-quela chama se agitar já entrava algo da Renascença.

Porém, em si, o princípio de que a ogiva tão bonita flo-resceria numa ordem que a transcenderia, me encantou.

Era algo que subia para o alcandorado, cujo voo a pré--Renascença desfigurava. v

(Extraído de conferências de 6/4/1978 e 16/11/1979)

1) Do francês: submersa. Referência a uma lenda bretã segun-do a qual os sinos de uma catedral submersa no mar faziamouvir seu bimbalhar, em certas ocasiões, trazendo à tona amemória do magnífico templo e da belíssima cidade ondeele fora erigido.

2) Cf. Ecl 1, 2.3) Cf. At 1, 12.

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 A

 Auxiliadora

onipotente

NossaSenhoraAuxiliadoraSão Paulo,Brasil

Santíssima Virgem segura no braçoesquerdo o Menino Jesus, e

na mão direita um cetro. Issoquer indicar que, pelo poder que Ela tem sobre seu Divino Filho,

  possui a onipotência sobre todo ouniverso. E por essa razão tem o

  poder de nos auxiliar em tudoquanto necessitarmos. É umaauxiliadora onipotente. Por outro lado, o semblante

risonho e amável d’Ela nos fala

da sua misericórdia. Estão presentes, portanto,os dois fatores para confiarmos no auxíliode Maria Santíssima, que quer e pode socorrer-nos inesgotavelmente, em tudo. Logo, se pedirmos, Ela socorrerá.

 Nossa Senhora Auxiliadora poder-se-ia

chamar, debaixo de certo ponto de vista, Nossa Senhora dos Pedidos. Ela não nosauxilia só quando pedimos, mas sempreque o fazemos, Ela nos ajuda. Por causadisso, é invocada sob o título de “Auxíliodos Cristãos”

   A  r  q  u

   i  v  o

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