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ABRAMETASSOCIAO BRASILEIRA DE MEDICINA DE TRFEGO | V. 28, n. 2, 2011ISSN 1809-8630

Trauma crnio-enceflico. Alguns aspectos epidemolgicos.Direo veicular e epilepsia: uma reviso. Crimes de trnsito: dolosos ou culposos? Sistemas de reteno infantil: Tendncias mundiais das mortes e ferimentos provocados por acidentes de trnsito

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EditorialJos H. C. Montal

Segurana no trnSito

Questes relacionadas sade e segurana no trnsito entraram na agenda da imprensa mundial. Olhemos para o Brasil. inegvel que temos alcanado consistentes progressos neste campo. A legislao brasileira tambm evoluiu e contm hoje um extenso conjunto de procedimentos e determinaes que nos colocam em posio de vanguarda. Mas ainda h muito por fazer. possvel tirar lies quanto teoria e prtica em segurana no trnsito quando se olha para o mundo, e um aprendizado definitivo: o de que a legislao o ponto de partida obrigatrio, porm insuficiente, para nos levar excelncia. Tampouco a presena do Estado, em seu papel necessrio de fiscalizador, assegura que a partir da todos os problemas do trnsito estariam resolvidos. Alguns dos melhores desempenhos ocorreram em pases com culturas incipientes em segurana. O que fez a diferena foi a capacidade que lderes tiveram de motivar, envolver e atuar com esprito de servir; influenciar pelo exemplo, com disciplina e conhecimento; avaliar e reconhecer os bons resultados como conquistas de cada um e de todos.

Da mesma maneira que a preservao da sade responsabilidade indelegvel de cada indivduo, que para tal deve ser educado desde a infncia, a segurana no trnsito depende fundamentalmente do homem que se desloca, consciente e preparado para cuidar de si prprio e zelar pelos que esto no caminho. Conseguimos quebrar vrios tabus, principalmente aquele segundo o qual os riscos inerentes ao trnsito nos impem conviver com acidentes. Com a eliminao dos acidentes, melhoramos os nveis de mobilidade, conquistamos o direito de ir e vir em segurana e conseguimos transformar o mundo do trnsito em ambiente de realizao, no de medo. (Este texto clona artigo de Emlio Odebrecht publicado na Folha de So Paulo e cujo o tema original so os avanos conseguidos na segurana do trabalho mundo afora e no Brasil em particular). O paralelo existente entre o que o autor constata no mundo da segurana do trabalho ao longo da sua atuao como lder empresarial de uma grande corporao brasileira globalizada e os avanos, ainda que numa escala menor, alcanados ao longo das trs dcadas de existncia da Abramet, dedicadas integralmente

2 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||s questes de sade que envolvem a mobilidade humana justificam a burla . Do alto destes trs decnios a Abramet repete uma vez mais o empresrio brasileiro: o que fez a diferena foi a capacidade que lderes tiveram de motivar, envolver e atuar com esprito de servir; influenciar pelo exemplo, com disciplina e conhecimento; avaliar e reconhecer os bons resultados como conquistas de cada um e de todos. A Abramet colocou a epidemiologia mdica na agenda brasileira da segurana viria. A preservao da vida no trnsito e a mitigao dos danos causados sade humana passaram a fazer parte da pauta das aes polticas voltadas para este conflito do mundo contemporneo que mata quatro vezes mais que a soma de todas as guerras em curso. A dimenso do problema faz com que a administrao das questes relacionadas com a mobilidade humana passe pelo aproveitamento dos variados contedos e conceitos das cincias da sade, razo da continuada ateno que recebem da Associao Brasileira de Medicina do Trfego. A multiplicidade de aspectos da complexa homeostasia humana, muitos deles requisitos indispensveis habilidade necessria para administrar com segurana os riscos inerentes ao deslocamento humano, afora as colateralidades decorrentes desta ao, obriga a que mltiplos temas, ligados s mais variadas reas da cincia, e no s da medicina, meream, de modo permanente, o olhar atento da Medicina de Trfego. No casual que a multidisciplinaridade seja um apangio da especialidade. A complexidade das relaes entre o fenmeno trnsito e a sade no permite dispensar contedos prprios de outros aspectos do conhecimento humano, portanto, e to diversos quanto a engenharia, o direito, a educao, a filosofia, a antropologia, a sociologia e a psicologia. O mdico do trfego cada vez mais estar apto a conjugar estes saberes para promover a preveno de acidentes, atuar no atendimento s suas vtimas e proporcionar a sua reabilitao para que o retorno vida social ativa, quando possvel, se faa da maneira mais adequada. Documentos elaborados pela ONU propem que os mdicos envolvidos com a sade e a mobilidade humana assumam atitude pr ativa nas aes a serem colocadas em prtica durante a Dcada de Aes de Segurana no Trnsito programa que ela instituiu e que ora se inicia. A Abramet estar empenhada na proposio e execuo de projetos nesta direo, oportunidade para demonstrarmos o compromisso de cada um de ns com a Dcada de Aes de Segurana no Trnsito. O mdico do trfego dever estar apto para colocar os fatores de risco no trnsito, definidos como prioritrios pela OMS o lcool, a velocidade, o no uso do cinto de segurana, do capacete e dos mecanismos de reteno de crianas -, na mesma perspectiva de outras aes sanitrias que estenderam a expectativa humana de vida saudvel, como o controle dos fatores de risco para o sistema cardio-circulatrio, as neoplasias, a desnutrio e as infeces. Temos muito orgulho do que realizamos nos 30 anos completados em agosto ltimo, mas sabemos que h muito por fazer e os desafios a partir de agora sero ainda mais complexos. Nas palavras do nosso presidente: No nos caber o papel de meros espectadores daquele que o conflito social por excelncia da sociedade moderna: o trnsito. No por acaso, a diretoria que agora assume os destinos da Abramet, tendo frente o Dr. Mauro Augusto Ribeiro, desenha o arcabouo de um novo modelo de atuao para a Medicina de Trfego. Confira nesta edio da Revista Abramet.

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Palavra do presidenteMauro Augusto Ribeiro

trnSito: Servio pblico da dcadaO O transporte terrestre um dos aspectos da mobilidade humana que mais repercute no mbito da sade pblica e no direito individual e constitucional de ir e vir. Muitas vezes nos esquecemos que espaos virios so pblicos, onde deveramos nos comportar com civilidade. Infelizmente, a realidade adversa e os acidentes de trnsito se constituem uma das principais causas mundiais de trauma e morte. A Organizao das Naes Unidas sugere algumas recomendaes para resolver o problema de mortalidade global, causada por acidentes de trnsito. Com esse intuito, foi proclamada a Dcada de Ao para a Segurana Rodoviria 2011/2020. As recomendaes so genricas para todos os pases, no entanto, cada um deve aplic-las de acordo com suas especificidades. Dentre os dez pases que detm metade das mortes mundiais, causadas pelos acidentes de trnsito, est o Brasil. Por ser uma Repblica Federativa de grandes diferenas regionais no tem conscincia da gravidade da situao: o quinto entre os pases com piores indicadores. Estamos no primeiro ano de mandatos eletivos, abrangendo os nveis estaduais e federais, e parece ocorrer neste momento a quebra do pacto de silncio; a imprensa finalmente menciona com destaque a questo da segurana viria que se mantido incluir este tema definitivamente na pauta nacional. necessrio dar segurana viria a devida importncia, elegendo-a como o principal elemento da elaborao de uma poltica pblica de transporte e dotando-a de recursos humanos, financeiros e institucionais, compatveis com a nossa realidade. O Pacto da Dcada abre a possibilidade de reestruturao das instituies do segmento virio e a criao de rgos executivos do primeiro escalo federal, estadual e municipal. preciso dar ao trnsito a importncia que, de fato, tem. No mbito federal, a responsabilidade deve ser a capacitao para estabelecer e coordenar a Poltica Nacional de Trnsito, elaborar e administrar o oramento nacional e demais funes de rgos executivos de trnsito, previstas em lei, com departamentos voltados para pedestres, ciclistas, motociclistas, transporte pblico seguro, crianas, idosos, infra-estrutura, sinalizao, fiscalizao, comunicao, marketing, segurana veicular, sade, epidemiologia e estatstica, gesto, legislao, relaes pblicas, educao, envolvendo socilogos, antroplogos, filsofos, pesquisa e tantos outros. Ao mbito estadual cabe a habilitao do condutor, o registro e licenciamento de veculos, a fiscalizao de ambos, condutores e veculos, e gerir o trnsito nas rodovias prprias alm de coordenar todas as aes de trnsito no mbito do estado e dos municpios. Funes estas que, se bem executadas, j seriam da maior relevncia. Os rgos estaduais faro a coordenao da Poltica Estadual de Trnsito, a elaborao e administrao do oramento estadual de trnsito, criariam o Instituto de Investigao Epidemiolgica de Trnsito e as Escolas Pblicas de Trnsito. Estando mais prximos do municpio que a Unio, alm de harmonizar as aes municipais no trnsito, deve montar assessoria que capacite e/ ou viabilize a municipalizao do trnsito e disponibilizar, aos municpios menores, a possibilidade de convnio de gesto do trnsito atravs dos Escritrios Regionais de Trnsito, viabilizando, desse modo, a universalizao da municipalizao do mesmo. Tudo isto sem esquecer Que os atuais Conselhos Estaduais de Trnsito no tm condies de atender as funes previstas no CTB. Nos municpios, alm das aes hoje realizadas atravs de grupos de trabalho, o rgo executivo desenvolveria solues polticas e tcnicas especficas, em contato direto com os grupos interessados, produzindo a possibilidade da multiplicao de centros de desenvolvimento e pesquisa, geradores de conhecimentos e intervenes preventivas, fato que, combinado com a criatividade brasileira, certamente, em curto prazo, ser motivo de orgulho nacional.

ExPEDIENTE

Sumrio Summary

ABRAMET Associao Brasileira de Medicina de Trfego Filiada Associao Mdica Brasileira Fundada em 19 de agosto de 1980 Rua Dr. Amncio de Carvalho, 507 04012-090 Vila Mariana - So Paulo - SP (11) 2137-2700 www.abramet.org.br [email protected]

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Entrevista

Mauro Augusto RibeiroDepartamento Cientfico

Doenas neurolgicas e conduo veicular Neurological diseases and vehicle drivingArtigo

Sistemas de reteno infantil - Tendncias mundiais das mortes e ferimentos provocados por acidentes de trnsito Child restraint system - World tendencies of the deaths and wounds provoked by accidents of trafficArtigo

Presidente Mauro Augusto Ribeiro 1. Vice-presidente Jos Heverardo da Costa Montal 2. Vice-presidente Ilham Taha 3 Vice-presidente Guilherme Dures Rabelo Diretor Financeiro Armando Albano Diretor Administrativo Abs Luiz Yazbek Diretor de Comunicao Dirceu Rodrigues Alves Junior Diretora Cientfica Rita Cristina Mainieri R. Moura Diretor de Relaes Institucionais Fabio Ford Feris Racy Diretor de tica Moise Edmond Seid Diretor de Qualidade Profissional Bernardo Avelino Aguiar Diretor de Relaes com Federadas Vladnei Ferreira de Lima Departamento de APH Carlos Alberto Guglielmi Eid Departamento de lcool e Drogas Vilma Leyton Jlia Maria D Andra Greve Departamento de Medicina do Viajante Eduardo Nogueira Vinhaes Departamento de Distrbios do Sono Ademir Baptista Silva Departamento de Medicina de Trfego Rodoviria Lambros Katsonis Departamento de Acessibilidade Gildo Magalhes dos Santos Silva Departamento de Medicina Securitria Paulo Cesar Tourinho Departamento de Psicologia de Trfego Raquel Almqvist Departamento de Medicina de Trfego Ocupacional Dirceu Rodrigues Alves Jr. Departamento de Epidemologia e Estatstica Maria Helena de Mello Jorge Maria Sumie Koizumi Departamento de Meio Ambiente Henrique Naoki Shimabukuro Departamento de Relaes Internacionais Moise Edmond Seid Departamento Cultural Toufic Sleiman Departamento de Assuntos MdicosJurdicos Vladnei Ferreira de Lima

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Direo veicular e epilepsia: uma reviso Vehicle driving and epilepsy: a revisionCapa

Trauma crnio-enceflico alguns aspectos epidemiolgicos Traumatic brain injury some epidemiological aspectsDados em destaque

ndices de gravidade do trauma decorrentes de acidentes de trnsito: onde e como acessar? Gravity index of trauma current of traffic accidents: where and how to access?Artigo

Crimes de trnsito: dolosos ou culposos? Crimes of traffic: deceitful or guilty?Navegar preciso

Atendimento pr-hospitalar na cena de um crimeArtigo

Caractersticas das vtimas de acidentes de transporte terrestre atendidas no Pronto Socorro de Taubat SP Characteristics of the accident victims of terrestrial transport assisted in Taubat SPResenha

Epidemiologia clnica: elementos essenciais Clinical epidemiology: essential elements

Revista ABRAMET rgo oficial de divulgao da ABRAMET Volume 28, n. 2, 2011 Diretor eDitorial: Jos Heverardo da Costa Montal Conselho eDitorial: Maria Helena P. de Mello Jorge, Maria Sumie Koizumi e Nancy Schneider Planejamento e CoorDenao: Vanda de Oliveira normatizao: Roberto Tadeu (CRB8-6797) jornalista resPonsvel: Joo Fortunato (MTB 13319) Projeto GrfiCo e DiaGramao: Estdio K

Publicao de periodicidade semestral, com tiragem de 15.000 exemplares para distribuio gratuita e dirigida a especialistas em Medicina de Trfego e outras especialidades mdicas, Psiclogos, Engenheiros, Educadores, Advogados, Legisladores, Administradores e tcnicos da rea de segurana viria, alm de instituies de ensino universitrio do Brasil e do exterior, rgos Pblicos de Segurana e Transporte. As matrias assinadas no representam necessariamente a opinio da ABRAMET. Contedo livremente reprodutvel, se possvel com citao da fonte e do autor.ISSN 1809-8630

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Entrevista Mauro Augusto Ribeiro

a esPeCialiDaDe: meDiCina De trfeGo.No trigsimo ano da sua existncia, a Associao Brasileira de Medicina de Trfego tem como presidente o Dr. Mauro Augusto Ribeiro, nosso entrevistado desta edio da Revista. O Presidente da ABRAMET especialista que vive a medicina de trfego de maneira plena desde a sua formalizao no Brasil e a pratica com denodo desde sua graduao como mdico na Europa. Vive intensamente a especialidade e a ela dedicase integralmente. Dorme e acorda Medicina do Trfego. Projeta uma especialidade estruturada e conectada s necessidades da sociedade, sempre na busca da mobilidade saudvel, alicerada no conhecimento cientfico e na epidemiologia do acidente de trnsito. Visualiza profissionais especialistas em medicina de trfego permanentemente qualificados e de tal modo inseridos na comunidade que desempenhariam o papel de indutores de uma nova conscincia coletiva quanto segurana viria, tal como preconiza a Organizao Mundial de Sade em relatrio recente.

6 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||Muitas das questes transcendentais da segurana viria passam pela constatao da epidemiologia mdica quanto importncia dos eventos inadequadamente denominados de acidentes de trnsito. Como o senhor posicionaria a especialidade mdica Medicina do Trfego, sob esta tica, no tocante ao combate a esta doena da modernidade? Partimos da percepo de que no possvel negligenciar que a MEDICINA DE TRFEGO o ramo da medicina que aborda os desvios de sade relacionados mobilidade mediata. A especialidade lida com todas as questes de sade correlacionadas com os deslocamentos humanos, visando promoo do bem estar fsico, mental e social, e objetiva tambm o atendimento e a preveno das doenas e dos acidentes de trnsito. Busca, portanto, um relacionamento saudvel e confortvel no exerccio do direito mobilidade em segurana, sem ameaas de agravos sade. Para atender a estas multifacetadas exigncias, subprodutos da mobilidade humana, a Medicina de Trfego conta com REAS de atuao como a Clnica Mdica de Trfego, a Percia Mdica de Trfego e o Atendimento Pr Hospitalar APH. Este seria um enfoque inovador para a especialidade. Na prtica, como se efetivaria este novo pensamento em relao Medicina de Trfego? Idealizamos como LOCAIS DE TRABALHO na rea clnica Hospitais com Servios de Medicina de Trfego, os Ambulatrios de Medicina de Trfego (pblicos e privados), os consultrios de medicina de trfego, rgos executivos de trnsito (federal, estadual ou municipal), rgos legislativos de trnsito, institutos de pesquisa voltados para o trnsito e transporte, Nessa esfera estariam tambm as empresas de transporte, entidades de classe de motoristas, de transportadores, seguradoras, os diversos meios de comunicao etc. O procedimento das percias se dar nos servios pblicos e privados especficos de Percia de Medicina de Trfego nos segmentos rodovirio, ferrovirio, aquavirio e aerovirio. Estes servios, sobretudo no segmento rodovirio, quando privatizados, devero ser dimensionados previamente pelo poder pblico e o provimento destes cargos por perodo pr-determinado se dar por licitao tcnica com a realizao de prova de conhecimentos especficos e avaliao curricular. O Atendimento Pr Hospitalar nos servios de resgate publico ou privados como o Corpo de Bombeiro, o Samu, rodovias com gesto privatizada, e outros, alm do Transporte Aeromdico e do Mdico de Bordo. A Comisso Nacional de Residncia Mdica enfatiza sobremaneira a questo das competncias a serem adquiridas pelos residentes durante o aprendizado. Percebe-se um crescente interesse das escolas mdicas em criar residncia mdica na especialidade Medicina de Trfego. Uma questo colocada com frequncia a relativa s questes de mercado para o mdico que completou a Residncia Mdica. Quais as aes para as quais este profissional estaria qualificado, que competncias ele teria adquirido neste curso? Quanto s AES, destacamos, relativamente ao ATENDIMENTO PR HOSPITALAR -APH: proceder regulao de resgate, ao atendimento mdico de urgncia e emergncia (BTLS e ATLS), a triagem da vtima, o transporte aeromdico e o pronto atendimento a bordo. Na PERCIA MDICA DE TRFEGO, a avaliao da aptido fsica e mental de condutores de veculos automotores terrestres (realizao isolada ou em junta); do mesmo modo a habilitao nutica, a avaliao de operadores de locomotivas e da tripulao de aeronaves, a percia para justificar a concesso ou no de benefcios fiscais. Realizar intervenes preventivas pr-ativas durante o ato da realizao da percia conforme determinado em Diretriz Mdica e/ou normas reguladoras do segmento. No exerccio da CLNICA MDICA DE TRFEGO destacamos a busca da aptido fsica e mental adequada para o exerccio de atividades nos segmentos rodovirio, ferrovirio, aquavirio e aerovirio por meio do controle de doenas ou compensao das doenas que afetem as condies para

|||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||| 7o exerccio de cada uma destas atividades; a busca da melhor performance no exerccio destas atividades atravs da adequao ergonmica s reais condies individuais, o controle e preveno das doenas que possam ser agravadas ou que possam ser provocadas por viagens e uso intensivo ou inadequado de veculos, levando em conta os riscos fsicos, qumicos, biolgicos e psicolgicos; a realizao de aconselhamento de viagem e do pronto atendimento mdico ao viajante. Alm de dar assessoria e consultoria em medicina de trfego, pesquisar as relaes do trnsito com agravos sade, conceber intervenes e desenvolver projetos de sade pblica de trnsito, orientar quanto forma de uso correta de equipamento de proteo,compor equipe multiprofissional empenhadas na busca de solues de segurana em casos de necessidades especiais e preservao da sade ambiental. A produo de conhecimento no cessa. Calcula-se que a quantidade de informaes na rea mdica triplique a cada 3 anos. As entidades mdicas responsveis pela nossa atividade profissional, espelhando-se nas coirms dos pases industrializados, criaram um processo de certificao profissional que possibilitasse o acesso do profissioal mdico s informaes na sua rea de atuao e ao mesmo tempo garantisse aos usurios de sade a sua qualificao para o exerccio profissional. Como o senhor v a questo e o que a Abramet pretende fazer na sua gesto para acompanhar esta demanda? Quanto CAPACITAO TCNICA e habilidades especficas destacamos a necessidade de formao slida e treinamento no atendimento de urgncias e emergncias em pronto socorro e ambulatrios de clinica mdica, cirrgica, ortopdica e neurolgica, assim como treinamento em regulao e procedimento de resgate, triagem e remoo de vtimas de acidente de trnsito, conhecimento da fisiologia do vo; conhecimento de diversas reas da medicina que faam interface com a especialidade, domnio das ferramentas de sade pblica, regulamentos sanitrios, das publicaes e orientaes da Organizao Mundial de Sade relativas a rea, das normas da ABNT; das legislaes, portarias e resolues especficas de cada segmento, domnio das tcnicas periciais, da Deontologia Mdica e das Resolues dos Conselhos Mdicos, das Diretrizes pertinentes, de medicina de viagem, de medicina securitria. Conhecimento acerca das solues de engenharia: automotiva, naval, aeroespacial, ferroviria, de gesto de trnsito, de construo de rodovias, de sinalizao, de fiscalizao de trnsito, de sociologia, antropologia, filosofia, pedagogia, direito, psicologia, etc. em um processo de constante atualizao. Hoje temos a Residncia Mdica em Medicina de Trfego se confirmando e transformando em realidade, os concursos pblicos da AMB para a concesso de Titulo de Especialista em Medicina de Trfego tm tido grande procura; cursos lato sensu de Especializao em Medicina de Trfego em nvel de ps-graduao realizados em vrios estados e, presentemente, inauguramos o modelo de treinamento proporcionado e realizado pela Sociedade de Especialidade. Esperamos em breve ter novidades a respeito de titulao acadmica.

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Doenas neurolgicas e conduo veicularNeurological diseases and vehicle drivingFlvio Emir AdurA1

ResumoTrata das consequncias das doenas neurolgicas no ato de direo veicular. Destaca que as doenas neurolgicas podem causar srios acidentes de trnsito. Tais como epilepsia, Parkinson e Alzheimer; sequelas de acidente vascular cerebral, leses neurolgicas, doenas degenerativas progressivas, ataxias, entre outras, que podem interferir no modo de direo do condutor de veculo automotor. Por isso, o mdico perito examinador deve identificar e avaliar as condies dos candidatos portadores de doenas neurolgicas, verificando a possibilidade ou no de conduo de veculos automotores.

Palavras-chave: Doenas do sistema nervoso; Conduo de veculo; Exame para habilitao de motoristas; Acidentes de trnsito.

AbstractIt treats of the consequences of the neurological diseases in the action of vehicle driving. It puts in evidence that the neurological diseases can cause serious accidents of traffic. Such epilepsy, Parkinson and Alzheimer; sequels of cerebral vascular accident, neurological lesions, progressive degenerative diseases, ataxias, among others, that can interfere in the way of the conditions of driving a vehicle. Therefore, the doctor examining expert should identify and to evaluate the candidates having neurological diseases conditions, verifying the possibility or not of driving vehicles.

Keywords: Nervous system diseases; Automobile driving; Automobile driver examination; Traffic accidents. Consultor cientfico da ABRAMET

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1 IntroduoDoenas neurolgicas so importantes causas mdicas de acidentes de trnsito. A conduo de um veculo requer capacidade para executar aes complexas em resposta a um ambiente que est continuamente mudando. Para conduzir um veculo com segurana, o motorista deve ser capaz de realizar, sem hesitao, uma srie contnua de movimentos musculares complexos, com grande preciso, quaisquer que sejam as condies do clima e das vias. Toda doena que altere a percepo, julgamento, vigilncia e a capacidade de realizar as aes necessrias para controlar um veculo, poder prejudicar a aptido de um condutor, tornando a direo veicular insegura. Doenas neurolgicas progressivas constituem maior risco, salvo se esta condio for acompanhada por especialistas em relao capacidade de conduzir um veculo com segurana1. Apresentam-se como candidatos a condutores de veculos automotores pessoas com epilepsia, doena de Parkinson, doena de Alzheimer, sequelas de acidente vascular cerebral, leses neurolgicas, doenas degenerativas progressivas, ataxias, entre outras, e o perito ter que saber identific-las e avaliar o risco para a direo veicular aprovando ou no seus portadores2.

3 Acidente vascular cerebralPessoas acometidas de acidente vascular cerebral podero retomar a conduo de um veculo se apresentarem recuperao completa, sem evidncia de dano neurolgico permanente. Persistindo comprometimento das funes neuromuscular, motora ou sensorial, devero ser encaminhadas para a Junta Mdica Especial dos rgos Executivos de Trnsito, onde sero avaliadas segundo a NBR 14.9703 da Associao Brasileira de Normas Tcnicas (ABNT) e conforme determinao da Resoluo n 2674 do Conselho Nacional de Trnsito (CONTRAN). Poder ser necessria a restrio para a direo de veculo apropriado/adaptado. Sequelas cognitivas, comportamentais, diplopia, hemianopsia homnima e ataxia devero determinar a inaptido definitiva para conduo de veculos automotores de qualquer categoria. Pessoas que sofreram acidentes vasculares cerebrais apresentam risco maior de um segundo episdio, que poder provocar perda da conscincia ou torn-los incapazes de lidar com um veculo automotor. Quando retomarem a conduo de veculos, devero permanecer sob superviso mdica e, no caso de aprovao no exame de aptido fsica e mental, orienta-se a diminuio do prazo de validade do exame5.

2 Doena cerebrovascular 4 Ataque isqumico transitrioEfeitos residuais de uma doena cerebrovascular, como dficits cognitivos ou visuais, so muitas vezes suficientes para tornar uma pessoa incapaz de conduzir veculos automotores e sequelas, como hemiplegia, tornaro necessria a obrigatoriedade de conduo de veculos apropriados (adaptados)3. Ataques isqumicos transitrios (dficits neurolgicos focais de etiologia isqumica com regresso completa em menos de 24 horas) mais frequentes em pessoas idosas, podem causar perda de conscincia, confuso mental, vertigem sbita e dficits motores,

10 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||muitas vezes consequentes a arritmias cardacas, originando dificuldade no controle de um veculo6. A cessao da conduo veicular recomendada por um perodo mnimo de seis meses aps um ataque isqumico transitrio e a retomada desta aps investigao diagnstica, identificao da etiologia, controle e acompanhamento com o especialista7. Quando retomarem a conduo de veculos, devero permanecer sob superviso mdica e, no caso de aprovao no exame de aptido fsica e mental, orienta-se a diminuio do prazo de validade do exame. Doenas neuromusculares afetaro a capacidade do motorista em controlar um veculo com segurana, como resultado da perda de fora, rigidez, movimentos lentos e incoordenao10. A esclerose mltipla tambm poder causar dficits visuais, vertigens e perda sensorial. Os mdicos devero A histria de sncope (perda ou diminuio sbita e transitria da conscincia, acompanhada de perda do tnus postural, com recuperao espontnea) deve ser sempre considerada como risco, uma vez que pessoas que perdem a conscincia na conduo de um veculo, dificilmente podero evitar o acidente. Episdio nico de sncope vasovagal, totalmente explicado e com baixa possibilidade de recorrncia, ou sncopes, com causas diagnosticadas e tratadas, possibilitam a habilitao como motorista. Sncopes inexplicveis ou recorrentes merecero observao cuidadosa e seus portadores no devero conduzir veculos automotores at que a causa tenha sido identificada, controlada e acompanhada pelo especialista8. verificar a fora muscular dos membros, a preciso dos movimentos rpidos dos ps e a propriocepo, alm de estar atentos s alteraes cognitivas que podero coexistir em condies como a doena de Parkinson11. Nos estgios iniciais dessas doenas, muitas vezes possvel conduzir de forma eficaz, mas, haver inevitavelmente um momento em que o mdico ter que determinar a cessao da conduo definitiva. Ser sempre adequado assessorar-se de relatrios mdicos especializados, avaliaes de Juntas Mdicas e provas prticas de direo veicular. A doena de Parkinson caracteriza-se, clinicamente, pela presena de pelo menos dois, entre quatro sinais cardiais, todos eles limitantes para a conduo de veculos: tremor em repouso, rigidez muscular, bradicinesia e alterao dos reflexos posturais. O tremor, que predomina no repouso, pode afetar as mos e as pernas, alm do segmento ceflico. A rigidez muscular do tipo plstico, ou seja, Quando ataques de vertigem so incapacitantes, prejudicando a capacidade de dirigir com segurana, o condutor dever ser aconselhado a no dirigir at que esta condio tenha sido suficientemente tratada e controlada. Vertigens ocorrem por muitas razes, a maioria delas devidas a distrbios da orelha interna. A forma mais comum de vertigem paroxstica relativamente incapacitante a vertigem ocorre durante toda a flexo ou extenso das articulaes testadas. A rigidez pode ser notada tanto na musculatura axial quanto nos membros. A bradicinesia se caracteriza pela dificuldade na execuo dos movimentos, com demora para inici-los. As alteraes dos reflexos posturais geram dificuldade de o paciente se reequilibrar quando desestabilizado12. Considerando-se a sndrome Parkinsoniana esposicional paroxstica benigna, que pode ocorrer com a movimentao da cabea. Deve-se sempre desaconselhar a direo de veculos quando a vertigem for sbita, imprevisvel, e incapacitante, prejudicando a capacidade para dirigir com segurana9.

revista aBraMet Volume 28, n2, 2011

7 Doenas neurolgicas progressivas

5 Sncope

6 Tonturas, vertigens, doena de Mnire, distrbios do labirinto e do tronco cerebral

Doenas neurolgicas e conDuo veicular

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||tabelecida, no possvel considerar-se apta para a direo veicular a pessoa portadora de tremor e rigidez dos membros, movimentos lentos e alteraes do equilbrio. Uma dificuldade adicional, no caso da esclerose mltipla, a ocorrncia de progresso intermitente e varivel, com perodos de remisso, limitando seus portadores em determinados perodos. A forma clnica mais comum, responsvel pela maioria dos casos iniciais de esclerose mltipla, a forma surto-remissiva, que se caracteriza por apresentar episdios agudos de comprometimento neurolgico, com durao de 24 horas ou mais e com intervalo de, no mnimo, trinta dias entre cada surto13. 1. Os pacientes e suas famlias devem ser informados de que pessoas com doena de Alzheimer, com gravidade de 1,0 CDR ou mais erros de desempenho, tm taxa de acidentes aumentada substancialmente e a cessao definitiva de dirigir deve ser fortemente considerada. Pessoas com demncia apresentam combinaes de dficits de memria, anormalidades visuais-espaciais e de funes cognitivas superiores, tais como abstrao e capacidade de resolver problemas, que se constituiro em fatores de risco para a direo veicular segura. Apesar de alguns pacientes poderem continuar a dirigir com segurana por algum tempo, quase todos eventualmente tero que abandonar a direo14. No havendo nenhum marcador nico que ir funcionar como fator determinante de aptido para conduzir um veculo automotor, muitas vezes, poder ser extremamente difcil determinar-se a aptido nas fases iniciais destas condies15. Estudos recentes mostram que at 76% dos pacientes com demncia leve ainda so capazes de serem aprovados na prova prtica de direo veicular16. A diretriz apresentada no 62 Encontro Anual da Academia Americana de Neurologia menos rgida do que as recomendaes prvias, publicadas uma dcada atrs, que tendiam a encorajar os pacientes a deixar de dirigir. As novas diretrizes recomendam a escala de Avaliao Clnica da Demncia (Clinical Dementia 3. Considerando a elevada probabilidade de progresso para uma gravidade de 1,0 CDR, dentro de poucos anos, os mdicos devem reavaliar a gravidade da demncia e adequao de conduo contnua a cada 6 meses. Mais estudos so necessrios para determinar se existem subgrupos de pacientes com doena de Alzheimer, com gravidade de 1,0 CDR, que possam dirigir com segurana, ainda que com restries de categorias e percursos delimitados. tambm necessria maior investigao sobre a segurana de direo veicular para pacientes com demncias vascular, fronto-temporal, com corpisculos de Lewy e subcortical. 2. Os pacientes e suas famlias devem ser informados que pessoas com doena de Alzheimer, com gravidade de 0,5 CDR, representam um problema significativo de segurana de trfego quando comparados a outros motoristas. O encaminhamento do paciente para uma avaliao de desempenho de conduo por um examinador qualificado deve ser considerado. Rating-CDR)17 para identificar pessoas com risco aumentado, considerando que o Mini-Mental State Examination (MMSE) no era clinicamente til. Apesar de pacientes com escores menores de 24 serem tipicamente considerados de risco aumentado e de direo perigosa, os autores da diretriz consideraram que a evidncia era insatisfatria. As evidncias apresentadas no 62 Encontro Anual da Academia Americana de Neurologia para a conduo de pessoas com doena de Alzheimer apoiam as seguintes recomendaes:

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8 Demncia e outras alteraes cognitivas

12 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||9 Traumatismo cranianoMotoristas que tiveram trauma cranioenceflico recente devero ser avaliados quanto mobilidade ativa, passiva e reflexa, coordenao motora, fora muscular, sensibilidade profunda, fala e percepes, para determinar se h alguma evidncia de consequncias que os tornariam inaptos temporariamente para a conduo de veculos automotores. Apesar da possibilidade de um trauma craniano no comprometer a conduo por mais de algumas horas, uma leso mais grave poder resultar em leso cerebral. Os principais fatores que podero impedir a conduo por um perodo prolongado so as perdas cognitivas, convulses ps-traumticas, deficincias visuais e dficits motores 18.

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12 EpilepsiaA princpio, a condio de portador de epilepsia e o fato de usar medicamentos antiepilpticos no incompatibilizaro o candidato direo de veculos, salvo se o quadro no estiver controlado, sujeitando-o a frequentes crises com alterao de conscincia. Pessoas com intervalos curtos entre as crises no devem dirigir e aquelas com longos intervalos entre suas crises podem ser consideradas capazes de dirigir com segurana20. Os ndices de acidentes envolvendo motoristas com epilepsia controlada so discretamente aumentados e similares queles provocados por condutores com outras condies mdicas crnicas menos restritivas legalmente, como o diabetes mellitus21. Acidentes de trnsito fatais atribudos epilepsia representam uma pequena porcentagem se comparada queles atribudos ao lcool22. A morte sbita, presumivelmente de origem cardaca, na direo de um veculo automotor, tambm mais prevalente que o acidente fatal por epilepsia23. Exigir do candidato habilitao, como motorista portador de epilepsia, que demonstre estar em acompanhamento neurolgico e livre de crises epilpticas no mnimo h 12 meses. O intervalo de um ano, livre de convulses, o critrio ou norma mais frequente para julgar a capacidade de dirigir das pessoas portadoras de epilepsia18. Perodos sem crises convulsivas, superiores a 6 e 12 meses, esto associados com reduo significativa do risco de acidentes envolvendo portadores de epilepsia24. Devido ao fato dos motoristas profissionais controlarem veculos grandes, potencialmente mais perigosos, e/ou transportarem passageiros por longos perodos, a habilitao recomendada deve restringir-se permisso para conduzir veculos da categoria B (condutor de veculo motorizado, no abrangido pela categoria A, cujo peso bruto total no exceda a trs mil e quinhentos quilogramas e cuja lotao no exceda a oito lugares, excludo o do motorista)25.

10 Tumores intracranianosPacientes que pretendam retomar a conduo de um veculo aps a remoo de um tumor intracraniano devero ser submetidos a uma avalio da cognio, da coordenao motora, do campo visual, do senso de equilbrio, da fora motora e dos reflexos. O parecer do neurologista e/ou do neurocirurgio que removeu o tumor ser de grande valia 19.

11 Abcesso cerebral, malformaes arteriovenosas, aneurismas intracranianosCondies como abcesso cerebral, malformaes arteriovenosas e aneurismas intracranianos representam riscos para a conduo veicular. Os principais so em relao epilepsia, particularmente no abscesso cerebral, e hemorragia espontnea no caso de malformaes arteriovenosas e aneurismas. Avaliaes neurolgicas e relatrios mdicos especializadas so fundamentais.

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Sistemas de reteno infantil - Tendncias mundiais das mortes e ferimentos provocados por acidentes de trnsitoChild restraint system - World tendencies of the deaths and wounds provoked by accidents of trafficmAuro Augusto ribEiro1

Os ferimentos sofridos nos acidentes de trnsito so um importante problema de Sade Pblica e uma das principais causas de mortes e leses em todo o mundo. A cada ano, em torno de 1,2 milhes de pessoas morrem e mais de 50 milhes ficam feridas ou incapacitadas como resultado de acidentes de trnsito; 95% dessas mortes ocorrem em pases pobres da frica, sia, Amrica Latina, Caribe e do leste da Europa1. As mortes no trnsito reduziram aproximadamente 20% entre os anos de 1980 e 20002, apesar da tendncia mundial de crescimento generalizado nos ltimos 20 ou 30 anos, nos pases ricos da Amrica do Norte, Europa Ocidental e Japo. Em sentido contrrio e durante o mesmo perodo, as cifras de vtimas mortais subiram nos pases pobres e em desenvolvimento entre 50% e 100%. Se essa tendncia for mantida, em 2020, as mortes no trnsito tero aumentado 83%, nos pases pobres e em desenvolvimento, e diminudo 27% nos pases ricos. Em conjunto, estas cifras predizem um incremento mundial de 67% at o ano de 20203. Alm de gerar enormes custos sociais s pessoas, famlias e comunidades, os traumas provenientes de acidentes de trnsito representam uma importante carga para os servios de sade, previdncia e para a economia em geral. Os custos impostos aos pases, muitos dos quais em luta para alcanar o desenvolvimento econmico, podem chegar a alcanar entre 1 e 3% do produto interno Presidente da ABRAMET

medida que se incrementa a motorizao, a preveno dos acidentes de trnsito e dos ferimentos que estes causam tem cada vez maior peso social e econmico, especialmente nos pases em vias de desenvolvimento. Se as tendncias atuais forem mantidas, os ferimentos causados pelos acidentes de trnsito aumentaro espetacularmente na maior parte do mundo ao longo das prximas dcadas, com maior impacto sobre os cidados mais vulnerveis. Portanto, necessrio que se atue urgentemente de forma adequada e especfica. O informe mundial sobre preveno de traumas causados por acidentes de trnsito, publicado pela OMS e pelo Banco Mundial em 2004, demonstrou que ambos os usos, tanto do cinto de segurana quanto o de sistema de reteno de criana, vm demonstrando sua efetividade, repetidamente, e salvando milhares de vidas. A comunidade internacional de especialistas tem assumido a liderana quanto a fomentar as boas prticas da segurana viria culturalmente adequadas5. Os diferentes usurios das vias pblicas se vem atingidos pelos acidentes de trnsito de modo distinto, dependendo do pas a que pertenam. A maior parte das mortes nos pases ricos de ocupantes de veculos. Nos Estados Unidos, 80% de todas as mortes por acidentes de trnsito so de ocupantes de veculos; nos pases asiticos, somente 10% a 20%; nos pases pobres, os ocupantes de veculos no representam a maioria das vtimas, mas a experincia

bruto4.

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||vivida nos pases ricos sugere que, medida que aumenta o nmero de veculos, se incrementaro, tambm, as mortes e ferimentos nestes ocupantes3. Na realidade de pases cuja motorizao cresce rapidamente, confirma-se essa tendncia com o incremento do nmero de acidentes, fatalidades e de leses em ocupantes de veculos. Para proteger os ocupantes de veculos contra ferimentos em caso de acidentes, uma das medidas mais efetivas a incorporao e o uso do sistema de reteno dos ocupantes de veculos. Estes tm demonstrado capacidade de salvar vidas e de reduzir a gravidade dos ferimentos, desse modo, todos os ocupantes de veculos motorizados devem estar adequadamente submetidos reteno. Os equipamentos de reteno dos ocupantes dos veculos so ferramentas de preveno secundria, no reduzem o risco de ocorrncia de acidente. Nem todos os veculos so equipados com sistemas de reteno e nem todos os ocupantes os utilizam quando esto disponveis, sobretudo, nos pases em desenvolvimento, onde o uso do automvel est crescendo rapidamente e o uso de equipamentos de reteno ainda baixo. O uso dos cintos de segurana e dos sistemas de reteno para crianas pode prevenir mortes e ferimentos graves nos ocupantes de veculos de quatro rodas2. Vrios tipos de ferimentos podem lesionar os ocupantes, que no usam equipamento de reteno, quando ocorre um acidente e o veculo para abruptamente. O ocupante do veculo no contido se desloca mesma velocidade a que estava submetido o veculo antes da coliso; quando esta ocorre, ele ser projetado para frente contra as estruturas rgidas internas do veculo, contra o assento dianteiro ou ejetado do mesmo; a expulso do veculo aumenta dramaticamente a probabilidade de sofrer leses muito graves ou de morrer6. Em cada coliso ocorrem, na verdade, trs choques. A primeira envolve o veculo e um obstculo externo, a segunda envolve o ocupante e o interior do mesmo e a terceira coliso se d entre os rgos internos e as estruturas rgidas, como a parede torcica e/ou o crnio dos ocupantes do veculo. A segunda coliso, geralmente, a responsvel pelos ferimentos e pode ser reduzida, significativamente, com o uso do cinto de segurana e do equipamento de reteno de criana. Os ferimentos mais frequentes e mais graves sofridos pelos ocupantes de veculos transportados sem a devida reteno, no caso de impacto frontal, ocorrem na cabea, seguido do trax e abdmen. Os ferimentos mais frequentemente relacionados com consequncias incapacitantes so os de membros inferiores e da regio cervical2. Os sistemas de reteno infantil previnem ou minimizam os ferimentos. O uso do equipamento de reteno evita a ejeo do ocupante para fora do veculo em caso de acidente, sendo o pior evento que pode ocorrer com ele: trs em cada quatro ocupantes de veculo, quando ejetados, acabam falecendo. O uso do sistema de reteno para ocupantes de veculo uma das medidas mais importantes para evitar ferimentos em caso de acidente, ainda que no impea que eles ocorram. Os sistemas de reteno de crianas so dispositivos de segurana secundrios, destinados a prevenir ou minimizar as leses que o ocupante de veculo pode sofrer em caso de acidente, pois reduzem o risco de contato, diminuem a fora de impacto, quando do contato com o interior do veculo, e distribuem as foras do choque por uma rea maior, no caso, as partes mais fortes do corpo. Impedem, ademais, que o ocupante seja ejetado do veculo ou, ainda, lesionando os outros ocupantes, mesmo aqueles que se encontrem devidamente contidos. Esses sistemas reduzem a velocidade do ocupante e do veculo, na mesma medida, de tal forma, que a energia cintica notavelmente reduzida2. O funcionamento do sistema de reteno infantil especificamente concebido para este pblico. As crianas necessitam de um sistema de reteno infantil adequado ao seu tamanho, peso e limitaes fsicas e que possa se adaptar a diferentes fases do desenvolvimento. O cinto de segurana abdominal e diagonal de trs pontos, utilizados nos veculos pelos adultos, no foi projetado para o peso e altura das crianas, nem para as propores relativas dos segmentos corporais infantis. Por exemplo, a parte

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16 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||do abdmen coberta pelo trax e pela plvis, nas crianas menor, as costelas delas so flexveis, dobram no lugar de romper como as dos adultos, pelo que a energia da coliso ser transferida ao corao e aos pulmes. Por consequncia, o cinto de segurana abdominal e diagonal de trs pontos pode causar graves leses torcicas e abdominais s crianas e no ser efetivo de forma tima para prevenir a ejeo e os ferimentos7. O sistema de reteno de crianas adequado projetado especificamente para proteger bebs e crianas contra leses, em caso de coliso ou parada brusca do veculo, mantendo-os afastados da estrutura do mesmo e distribuindo a fora do choque pelas partes mais fortes do corpo, gerando dano mnimo aos tecidos moles. Serve tambm para reduzir leses que possam ocorrer em outras situaes, como uma parada brusca, uma manobra evasiva ou mesmo a abertura inopinada da porta com o veculo em movimento8. O tipo recomendado diversificado, porm o lugar mais seguro para transportar crianas no banco traseiro, devidamente retidas em um assento de segurana infantil homologado. O principal fator a considerar na escolha do sistema de reteno da criana o peso. Quando o peso e a altura dela estiverem acima do limite especificado pelos sistemas de reteno, a criana deve usar o cinto de segurana abdominal e diagonal de trs pontos do veculo2. Grupos de peso para SRC90 Para crianas com at 10 kg e at um ano de idade 0+ Para crianas com at 13 kg e at um ano de idade I II Para crianas com peso de 9 a 18 kg Para crianas com peso de 15 a 25 kg

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fora necessria para ocasionar leso. A caixa torcica tambm muito flexvel e um impacto sobre o peito pode ter como consequncia uma sria compresso da caixa torcica sobre o corao e os pulmes e at de alguns rgos abdominais. A pelve do beb tambm instvel e no pode suportar as foras do sistema de reteno dos adultos. Os bebs necessitam dos seus prprios assentos infantis para aconchego e proteo contra acidentes. Alguns assentos para bebs so conversveis, podendo se transformar numa cadeira de segurana completa para crianas, medida que vo crescendo. Um sistema de reteno de criana, colocado em sentido contrrio marcha, oferece maior proteo para bebs que tenham at um ano de idade e pesem at 13 kg. Para maior proteo, os bebs devem ser mantidos na posio contrria marcha do veculo pelo maior tempo possvel. O lugar mais seguro para transport-los no banco traseiro, em um assento infantil, colocado em sentido contrrio marcha do veculo9. Meninos de 1 a 4 anos de idade (Grupo I)

III Para crianas com peso de 22 a 36 kg

O processo de formao dos ossos no finaliza Ao nascer, a cabea de uma criana corresponde quase quarta parte da sua altura e um tero de seu peso corporal. O crnio do beb muito flexvel, assim, um impacto relativamente pequeno pode ter como resultado uma deformao do crnio e produo de trauma no crebro. Quanto menor a criana, menor a at os 6 ou 7 anos de idade e o crnio da criana continua sendo mais frgil do que o de um adulto durante toda a infncia. Um sistema de reteno tem que limitar o movimento da cabea para frente durante o impacto frontal e oferecer proteo contra intruso no caso de impacto lateral. Por isso, o

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||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||sistema de reteno infantil deve distribuir as foras do impacto sobre uma rea que seja a mais ampla possvel. Cintos e apoios devem adaptar-se corretamente criana e posicionados segundo a recomendao do fabricante. O sistema de reteno tambm deve oferecer proteo contra contato com partes rgidas do interior do veiculo, tanto em impactos frontais como laterais. O melhor tipo de reteno infantil para crianas pequenas o assento de segurana; nele, o apoio integral suporta a criana e reparte as foras do choque sobre uma rea muito ampla. Esse assento pode ser utilizado at que o peso atinja os 18 kg ou que esteja muito grande para a altura do encosto ou das alas ajustveis9. Crianas de 4 a 6 anos (Grupo II) Crianas de 6 a 11 anos de idade (Grupo III) do abdmen, o que pode ocasionar graves leses internas e/ou a criana pode deslizar por baixo do cinto, o que anularia o seu efeito de proteo. O assento de elevao, que dispe de um respaldo de lado, oferece proteo em caso de impacto lateral9.

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Os assentos de elevao sem respaldo foram desenhados para crianas de 22 a 36 kg de peso. Hoje, porm, os fabricantes esto produzindo assentos de elevao com respaldo, que cobrem o grupo completo de 15 a 36 kg. Assentos infantis, com protetor frontal de plstico, oferecem menor proteo e no devem ser utilizados. Os assentos de elevao para crianas de 4 a 7 anos tm demonstrado reduOs assentos de elevao so a melhor opo quando a criana est demasiado grande para o assento infantil. Foram projetados para pesos de 15 a 25 kg. As crianas devem continuar viajando em assentos de elevao at que os cintos abdominais e diagonais se lhes adaptem adequadamente, o que ocorre quando tm altura a partir de 1,45m. Como seu prprio nome indica, os assentos de elevao elevam o assento da criana de forma que os cintos de segurana do veculo se ajustem adequadamente, passando pelo trax e cruzando em diagonal pelo tero mdio do ombro, ajeitando corretamente sobre os ossos da zona plvica. O cinto de adultos grande e passa em cima zir o risco de leses em 59% se comparados com o uso exclusivo do cinto de segurana10. Estudos recentes indicam que as crianas, cujo sistema de reteno esteja colocado no banco traseiro na posio central, sofrem menos leses que aquelas viajando nos assentos laterais. Tambm indicam que as crianas esto mais protegidas se viajam em sistema de reteno infantil adequado sua idade. Se no dispuser deste tipo de sistema, melhor viajar com o cinto de segurana do que sem nenhum tipo de reteno, no banco traseiro do veculo11, 12. Atualmente, a maioria dos sistemas de reteno projetada para ser instalada com a utilizao do

18 ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||cinto de segurana do veculo. Isofix um sistema que utiliza pontos de montagem, especialmente projetados no veculo, para fixar os sistemas de reteno infantil por meio de um mecanismo rgido em lugar do cinto de segurana; vem sendo utilizado cada vez com maior frequncia na Austrlia e na Europa. Sistemas semelhantes tm sido adotados nos Estados Unidos (LATCH) e no Canad (UAS)13. Os pais nunca devem deixar um assento de segurana ocupado por beb ou criana em frente a um airbag ativado; alguns veculos so equipados com um interruptor para ativ-lo e/ou desativ-lo. Em virtude da baixa estatura, as crianas podem ser atingidas pelo airbag. A forma mais segura de garantir que as menores de 12 anos no sejam feridas por um, coloc-las com o equipamento de reteno adequado no banco traseiro11, 12. Do mesmo modo que o cinto de segurana funciona para um adulto, o sistema de reteno infantil nos veculos tem a finalidade de manter a criana firmemente retida no assento, para que, em caso de uma freada inesperada ou uma coliso, ela no seja projetada contra partes rgidas do interior do veculo ou expulsa do mesmo. O sistema de reteno deve absorver a energia cintica criada pelo movimento, durante o impacto, sem causar danos e ser fcil de usar. O risco de sofrer leses em diferentes posies dentro do veculo se diferencia em cada caso6. Sem sistema de reteno, uma criana sentada na parte traseira tem 25% menos risco de ficar ferida em comparao com uma criana no banco da frente. Crianas que utilizam reteno em ambas as posies, o risco na parte traseira ainda 15% menor do que na parte dianteira. A efetividade do sistema de reteno infantil depende do tipo de equipamento utilizado, do local e da direo da colocao6. Uma criana de at 4 anos de idade tem 50% menos risco de sofrer ferimentos no sistema de reteno voltado para frente do veculo e 80% menos em um sistema voltado para trs. A reduo de 32% se ela utiliza o cinto de segurana para adulto. Para crianas entre 5 a 9 anos de idade, o assento de elevao o mais indicado e, usado com o cinUma anlise sistemtica das intervenes para o fomento do uso do assento de elevao entre crianas de 4 a 8 anos demonstrou que a combinao de incentivos econmicos ou a distribuio gratuita de assentos, com a correspondente orientao, teve resultados benficos quanto aquisio e ao uso. Uma anlise de diversos estudos realizados nos Estados Unidos demonstrou que assentos de segurana, corretamente instalados e utilizados para crianas de 0 a 4 anos de idade, reduzem a necessidade de hospitalizao em 69%; e, ainda mais, o risco de mortes para bebs fica reduzido em 70%, sendo que, para crianas de idades de 1 a 4 anos, reduz em 47 a 54%14,15. Em muitos pases ricos, o uso do sistema de reteno infantil habitual, aonde os ndices de utilizao chegam at a 90%, mas, em outros pases, esse uso muito pouco frequente. Porm, mesmo nos pases onde o uso de sistemas de reteno alto, como na Sucia, no Reino Unido e nos Estados Unidos, estes so frequentemente utilizados inadequadamente. Por exemplo, a criana pode estar colocada num sistema mal adaptado para a sua idade e peso. Saber escolher e instalar o sistema de reteno adequado muito importante, os cintos podem no estar presos da forma correta ou simplesmente no estarem coloto de segurana, reduz em 52% o risco de ocorrer ferimentos, enquanto que o uso isolado do cinto de segurana, s o faz em 19% dos casos. Para crianas de 10 a 14 anos de idade, o cinto de segurana reduz o risco de sofrer ferimentos em 46%6.

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sisteMas De reteno infantil - tenDncias MunDiais Das Mortes e feriMentos provocaDos por aciDentes De trnsito

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Referncias1. Global status report on road safety: time for action. Geneva: World Health Organization; 2009 (www.who.int/violence_injury_prevention/ road_safety_status/2009). 2. Cinturones de seguridad y sistemas de retencin infantil: un manual de seguridad vial para decisores y profesionales. London: Foundation for the Automobile and Society; 2009. 3. World report on road traffic injury prevention. Geneva: Organizacion Mundial de la Salud; 2004. 4. Custos de acidentes de trnsito nas rodovias federais: sumrio executivo. Rio de Janeiro: Ministrio dos Transportes; 2004. 5. Informe mundial sobre prevencin de los traumatismos causados por em transito. Organizacion Mundial de la Salud: Ginebra; 2004. 6. Elvik R, Vaa T, editors. The handbook of road safety measures. Amsterdam: Elsevier Science; 2004. 7. McIlvenny S et al. Rear seat belt use as an indicator of safe road behaviour in a rapidly developing country. J R Soc Promot Health. 2004; 124(6):2803. 8. Schopper D, Lormand JD, Waxweiler R, editors. Developing policies to prevent injuries and violence: guidelines for policy-makers and planners. Ginebra: Organizacion Mundial de la Salud; 2006. 9. National Highway Traffic Safety Administration [Internet]. Washington: National Highway Traffic Safety Administration; c2010 [cited 2010 Set 02]. Child Seats; [about 1 screen]. Available from: http:// www.nhtsa.gov/Safety/CPS 10. Durbin DR, Elliott MR, Winston FK. Belt-positioning booster seats and reduction in risk of injury among children in vehicle crashes. JAMA. 2003; 289(14):28352840. 11. Kallan MJ, Durbin DR, Arbogast KB. Seating patterns and corresponding risk of injury among 0- to 3-year-old children in child safety seats. Pediatrics. 2008;121(5):e1342e7. 12. Lund UJ. The effect of seating location on the injury of properly restrained children in child safety seats. Accid Anal Prev. 2005; 37(3):4359. 13. ISOFIX and passenger safety systems in road vehicles. International Organization for Standardization (http://www.iso.org/iso/ support/faqs/faqs_widely_used_standards/widely_used_standards_ other/isofix_and_passenger_safety_systems_in_road_vehicles.htm). 14. Zaza S, Sleet DA, Thompson R. Review of evidence regarding interventions to increase the use of child safety seats. Am J Prev Med. 2001;21(Suppl. 4):314. 15. Traffic safety facts 2002: occupant protection. DOT HS 809 610. National Highway Traffic Safety Administration, 2003 (http://www-nrd. nhtsa.dot.gov/pdf/nrd-30/NCSA/TSF2002/2002occfacts.pdf). 16. Tsoumakas K, Mavridi F, Matziou V, Androulakis I. Parents knowledge and attitudes about preventing injuries in motor vehicle accidents in children in Greece. Traffic Inj Prev. 2008;9(2):12934.

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Direo veicular e epilepsia: uma revisoVehicle driving and epilepsy: a revisionAlEssAndrA CArvAlho1 FAbiolA rEis2

ResumoPessoas com epilepsia sofrem restrio, discriminao ou so impedidas de dirigir veculos automotores devido aos supostos riscos aumentados de acidentes de trfego, quando comparados aos ndices de acidentes devidos a outras patologias. Diante disso, muito comum que pessoas com epilepsia omitam sua doena com o objetivo de serem aprovadas na avaliao mdica pericial para obteno ou renovao da carteira de habilitao para condutores de veculos automotores. Com o avano no diagnstico e tratamento da epilepsia, as crises epilticas passaram a ser mais bem controladas. Assim, essa doena comeou a ser encarada como todas as outras e que, ao ser tratada e controlada - condio obrigatria, deixou de ser obstculo prtica da direo veicular, fato fundamental na incluso social e profissional da pessoa com epilepsia, desde que, com a Resoluo 267/2008, a observao Vedada Atividade Remunerada - foi definitivamente abolida e dessa forma a Lei de Trnsito Brasileira passou a permitir que a pessoa com epilepsia, alm de poder dirigir, possa ter a oportunidade de trabalhar, conduzindo um veculo automotor, desde que dentro das condies da categoria B.

AbstractPeople with epilepsy suffer restraint, discrimination or are prevented from driving motor vehicles because of their potential increased risk of traffic accidents when compared with accident rates due to other diseases. Therefore, it is very common for people with epilepsy omit their disease in order to be approved in evaluating medical expert to obtain or renew drivers license for drivers of motor vehicles. With the advance in diagnosis and treatment of epilepsy, the seizures became better controlled. Thus, this pathology has begun to be seen as all other diseases and to be treated and controlled, mandatory condition is no longer an obstacle to the practice of driving, the fundamental fact in social and professional inclusion of people with epilepsy provided with Resolution 267/2008, observation Sealed Remunerated Activity- was finally abolished and thus the Brazilian Traffic Law now allows a person with epilepsy, in addition to driving, may have the opportunity to work, driving a motor vehicle, provided that within conditions for category B.

Keywords: Epilepsy; Accidents, Traffic;Automobile driver examination.

Palavras-chave: Epilepsia; Acidentes detrnsito; Exame para habilitao de motoristas.

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Cirurgi vascular e especialista em medicina de trfego Especialista em medicina de trfego

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1 Reviso de literatura Definio e epidemiologiaDerivada do grego a palavra epilepsia tem como significado estar possudo, sendo na Antiguidade associada condio demonaca, alm de crendices sobre possesso, magia negra e ciclo lunar, entre outros, revelando como essa condio vem sendo cercada de mitos desde tempos remotos. Atualmente as pessoas com epilepsia ainda sofrem discriminao e isto se deve pela deficincia nas informaes obtidas por parte da sociedade, desconhecendo a possibilidade do controle das crises e dos direitos legais adquiridos por esta populao. Crises epilticas so eventos clnicos que refletem disfuno temporria de um conjunto de neurnios de parte do encfalo (crises focais) ou de rea mais extensa, envolvendo os dois hemisfrios cerebrais (crises generalizadas). caracterizada por uma ampla categoria de sintomas complexos decorrentes de funes cerebrais alteradas, que podem ser secundrias a grande nmero de processos patolgicos, na ausncia de condio txico metablica ou febril1. Para propsitos epidemiolgicos, uma pessoa com epilepsia se define como aquela com mais de uma crise em mais de uma ocasio, seja qual for a causa. As crises devem ser eventos separados no tempo e serem recorrentes. A incidncia varia mundialmente com valores entre 11/100.000 a 134/100.000 habitantes2. Aproximadamente 100 milhes de pessoas tero epilepsia em algum momento de suas vidas e 5% da humanidade ter pelo menos uma crise convulsiva. Estima-se que a prevalncia esteja em torno de 2% nos pases em desenvolvimento1. No Brasil, h poucos estudos epidemiolgicos sobre epilepsia. Em estudo populacional na regio sudeste do Brasil, mostrou que a prevalncia de epilepsia durante a vida foi de 9,2/1000 pessoas, e a prevalncia de epilepsia ativa foi de 5,4/1000 pessoas. A prevalncia era elevada nos indivduos idosos

(8,5/1000). Alm disso, trinta e oito por cento dos indivduos com epilepsia recebiam tratamento inadequado, e nas classes menos favorecidas a prevalncia tambm foi maior (7,5/1000 comparada com 1,6/1000 nas classes mais favorecidas). Os autores puderam concluir que a prevalncia da epilepsia no Brasil similar a outros pases pobres e o tratamento ainda muito falho.

Epilepsia e direo veicularQuando os veculos automotores foram introduzidos na sociedade inglesa no incio do sculo XIX, algumas condies mdicas (entre elas a epilepsia), foram consideradas como de risco, sendo o primeiro acidente de trfego atribudo epilepsia, descrito por Thlwitzer em 1906. Devido a incidentes semelhantes e a partir da introduo da licena obrigatria para dirigir, foi recomendada a proibio da direo veicular para pessoas com epilepsia4. Com o surgimento de drogas antiepilpticas na dcada de 1940 (fenitona), as crises convulsivas puderam ser mais bem controladas, e com isso, pesquisadores comearam a questionar sobre a proibio da licena para dirigir. Symonds em 1948, na Inglaterra, foi o primeiro a defender que as pessoas com epilepsia podiam dirigir sob circunstncias especiais. Nos Estados Unidos, os esforos para permitir que pessoas com epilepsia pudessem dirigir foram feitos pelo neurologista, Edward D Schwade, da cidade de Wisconsin em 1949, permitindo a direo quando as convulses estivessem controladas. Tal condio estimulou outros estados americanos a optarem por tal conduta, e em 1946, dezoito estados j tinham aderido deciso4. As mudanas na legislao iniciadas nos EUA e Inglaterra influenciaram outros pases. Atualmente a tendncia mundial est baseada na reduo do intervalo livre de convulses (ILC). Tal condio permite maior aderncia das pessoas com epilepsia ao cumprimento das leis, uma vez que restries severas estimulam tais indivduos a omitirem a doena

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DiscussoVrios fatores contriburam na promoo das alteraes regulamentares referentes obteno da licena veicular por pessoas com epilepsia, entre eles, o aumento no nmero de motoristas e de veculos, medicaes que proporcionaram melhor controle das convulses, acesso ao mercado de trabalho, necessidade em utilizar o veculo para lazer, educao e outros eventos sociais. Apesar de tais alteraes, as regulamentaes variam mundialmente, isto se deve provavelmente a questes com respostas ainda no confiveis. As concluses cientficas so variadas, com trabalhos

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tores no observaram diferena significativa, porm nos casos onde ocorreram acidentes, havia risco de leses graves em 40% dos casos. No ano de 1981, nos EUA, foi formado um Comit de especialistas em neurologia (Tennessee Department of Safety, Memphis Epilepsy Foundation and Association of Tennessee Neurologists), cuja meta era formular sugestes para mudanas na regulamentao vigente. Foi concludo que os mdicos deveriam realizar consideraes individuais, baseadas em fatores clnicos como o nmero de convulses nos primeiros 3 meses de tratamento (sendo um forte fator prognstico), podendo muitas vezes autorizar a licena antes do tempo permitido, sem afetar a segurana pblica9. O perodo de 3 meses, livre de convulses, um bom fator prognstico a ser considerado. Kuhl10 realizou estudo com uma amostra de 140 pacientes. Oitenta e cinco por cento dos indivduos que permaneciam sem convulses nos primeiros 3 meses de tratamento, seguiam por 1 ano livre de convulses. Somados a este resultado, 25% dos pacientes que tiveram convulses nos 3 primeiros meses de tratamento, permaneciam sem convulses por 1 ano. Os acidentes ocorridos em pessoas com epilepsia (com doena controlada) apresentam ndices discretamente aumentados ou semelhantes, em re-

A reduo dos acidentes nos indivduos com aura deveu-se a possibilidade dos mesmos pararem o veculo antes da crise convulsiva. Os poucos acidentes pregressos no ligados convulso, determinaram indivduos mais prudentes como motoristas. Quanto reduo do risco de acidentes durante as alteraes na dosagem da medicao, acredita-se que foi devido ao segmento regular desses indivduos com o setor de sade, permitindo um controle adequado das crises convulsivas. Em estudo, Taylor8 avaliou 16.958 pessoas com epilepsia, cujo intervalo livre de convulses era de 2 anos ou mais, foram estudadas retrospectivamente (atravs de questionrio) e comparadas a grupo controle (8.888 pessoas sem epilepsia), quanto ao risco relativo de acidentes automobilsticos. Os au-

lao a doenas crnicas e algumas situaes especiais, como por exemplo: idade avanada, pessoas do sexo masculino jovens, doenas cardacas, narcolepsia e diabete melito11. Representantes da American Academy of Neurology, American Epilepsy Society and Epilepsy Foundation of America12 em 31 de maio a 2 junho de 1991, estabeleceram critrios para determinar regulamentaes referentes direo veicular para pessoas com epilepsia. O intervalo livre de convulses (ILC) estabelecido foi de 3 meses, iniciada em relao ao ltimo episdio convulsivo. Nos estados americanos este perodo varia entre 3 meses a 2 anos, sendo o intervalo mais comum de 1 ano. Foram determinados alguns fatores que podem modificar o ILC entre eles:

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||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||gatoriedade da comunicao dos mdicos s autoridades quando h acompanhamento de pessoa com epilepsia. O mdico dever informar ao paciente sobre riscos, obrigaes legais, incluindo o fornecimento de respostas verdicas no questionrio referente epilepsia, preenchidos sob pena de responsabilidade. Caso o paciente se recuse a seguir o tratamento mdico, este dever comunicar o caso s autoridades, no intuito de proteger a segurana pblica. Restries ao direito de dirigir desencorajam o cumprimento das regulamentaes, gerando a ocultao de informaes no intuito de evitar a perda da permisso para dirigir. A ocultao das informaes pode conduzir a consequncias importantes, principalmente no que se refere ao controle das convulses, comprometendo o tratamento mdico e colocando em risco a segurana individual e coletiva5. A reduo do ILC para autorizao do direito de dirigir foi colocada como alternativa na tentativa da reduo dos casos de ocultao de informaes pelas pessoas com epilepsia. Atualmente tal conduta tambm discutida nos casos de aptido para direo comercial. Normas para conduo comercial aps convulses devem ser mais rigorosas que para veculos particulares, pois condutores comerciais em geral, dirigem por mais tempo, alm de conduzir veculos pesados e perigosos. A prtica de vrios pases no conceder a licena a pessoas com histria pregressa de uma ou mais convulses, porm isto deve ser reconsiderado nos indivduos com convulses febris ou epilepsia focal benigna da infncia e naqueles que esto livres de crises por pelo menos 5 anos e sem medicao e os que tiveram convulso em situao excepcional, podem ser considerados para licena comercial11. Nos Estados Unidos, a regulamentao para motoristas de veculos comerciais rigorosa, exigindo ILC longo. Muitos estados tm regulamentao especfica sobre motoristas de nibus escolares ou Legislao brasileira No Brasil, em 1999, houve Consenso composto pela Associao Brasileira de Medicina de Trfego (ABRAMET), Associao Brasileira de Epilepsia (ABE) e Liga Brasileira de Epilepsia (LBE), para realizao da Diretriz Nacional para Direo de Veculos Automotores para Pessoa com Epilepsia, apresentada Cmara Temtica de Sade do Conselho Nacional de Trnsito (CONTRAN), baseada no artigo 147 da Lei n 9.503 de 23 de setembro de 1997 e com alterao da Lei n 9602 de 22 de janeiro de 1998 no seu inciso I e pargrafos 2, 3 e 4, instituindo que para habilitar-se como motorista, o candidato dever submeter-se a exame de aptido fsica e mental. As normas regulamentadoras para o procedimento do exame foram estabelecidas pela Resoluo n 80 (19 de novembro de 1998), no havendo referncia direta epilepsia, mas possibilitando que atravs do exame mdico possa considerar o candidato como apto, apto com restries, inapto temporariamente ou inapto15, 16. Somado aos critrios estabelecidos pelas Diretrizes da Medicina de Trfego, a Resoluo 267 possibilita a ampliao do direito s pessoas com epilepsia. comerciais. A regulamentao federal probe a direo comercial interestadual. Os indivduos com uma convulso causada por condio mdica conhecida, como infeco aguda ou distrbio metablico, recebem a licena apenas quando esto totalmente recuperados e no apresentam complicaes residuais. As pessoas com epilepsia que fazem uso de medicao antiepilptica, no podem dirigir. A direo veicular intra-estadual, geralmente mais liberal que as regulamentaes federais. Tais regulamentaes federais esto sendo reavaliadas e no futuro haver a uniformizao das mesmas para os motoristas comerciais12, 14. Na Inglaterra, as leis probem que qualquer indivduo que apresente crises convulsivas, esteja apto para dirigir veculos pesados ou pblicos.

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A Resoluo 267 de 15 de fevereiro de 2008 dispe sobre o exame de aptido fsica e mental, a avaliao psicolgica e o credenciamento das entidades pblicas e privadas que tratam o artigo 147, inciso I e pargrafos 1 ao 4 e artigo 148 do Cdi-

go de Trnsito Brasileiro. Com a Resoluo, a meno da restrio vedada atividade remunerada foi retirada, propiciando o direito legal atividade profissional enquadrada na Categoria B s pessoas com epilepsia.

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ConclusoA necessidade de discusso quanto s mudanas nas leis que restringem o direito de dirigir s pessoas com epilepsia, intensificou-se com os avanos cientficos, sociais e econmicos das ltimas dcadas. Aps a dcada de 1940, com advento de drogas para controle das convulses, passou-se a estudar qual seria o melhor fator que identificasse a segurana das pessoas com epilepsia na conduo veicular, sendo o intervalo livre de convulso (ILC) o de maior significncia estatstica. Desde ento, estuda-se qual o ILC seguro, variando atualmente em intervalo de 3 a 24 meses, sendo o mais frequentemente utilizado o de 12 meses. H uma tendncia mundial na reduo do ILC, j que o risco relativo de acidentes de trfego similar quando comparados a outros grupos como: idosos, portadores de diabete melito, jovens do sexo masculino e outros. Quanto direo veicular comercial (cargas pesadas, nibus comercial e escolar), as restries so maiores, exigindo ILC longo e a no utilizao de drogas antiepilpticas. No Brasil, com a Resoluo 267 (do Cdigo de Trnsito Brasileiro), retirou-se a meno vedada atividade remunerada, anteriormente declarada, possibilitando que pessoas com epilepsia possam exercer ativida