revisão: a transição vítrea em produtos alimentícios...

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AUTORES AUTHORS PALAVRAS-CHAVE KEY WORDS Braz. J. Food Technol., 5:117-130, 2002 117 Recebido / Received: 02/04/2001. Aprovado / Approved: 25/01/2002. Alimentos; Calorímetro Diferencial de Varredura; Polímeros; Temperatura de transição vítrea; Transição vítrea / Food; Differential Scanning Calorimetry; Polymer; Glass transition temperature; Glass transition. A transição vítrea em alimentos tem importância fundamental, visto que tem sido intimamente relacionada com a preservação de fatores de qualidade destes produtos. Muitos exemplos no domínio da ciência e tecnologia de alimentos têm sido relatados, ilustrando que a transição vítrea pode ser utilizada para interpretar, com maior ou menor sucesso, transformações que ocorrem no processamento e na estocagem de produtos alimentícios e de materiais biológicos de baixa umidade. Este conceito é de interesse, principalmente, para as indústrias alimentícias que utilizam processos de desidratação ou processos a baixas temperaturas. Este trabalho tem o intuito de apresentar uma revisão sobre o fenômeno de transição vítrea de forma simples e compreensível, onde serão abordados os conceitos de metaestabilidade e de estado vítreo e também discutida a influência de diferentes parâmetros, tais como, o material plasticizante, a massa molecular e a composição do produto alimentício, sobre a temperatura de transição vítrea (T g ). Serão também apresentados os principais modelos matemáticos recomendados para definir os limites de atuação do fenômeno de transição vítrea, assim como os diversos métodos que têm sido utilizados para a determinação de T g de produtos alimentícios. Finalizando, a aplicabilidade do conceito de transição vítrea para explicar as mudanças físicas que ocorrem no processamento e na estocagem de alimentos é discutida. Glass transition is particularly important in food products since it is closely related to the preservation of quality factors in these products. Several examples in the domain of food science and technology have been reported, illustrating that the glass transition concept can be used to interpret, with greater or lesser success, changes accurring during the processing and storage of low-moisture foods and biomaterials. This concept is of special interest to food industries making use of drying or low temperature processes. The purpose of this paper is to present a simple and comprehensible review on glass transition, explaining the concepts of metastability and glass state. The influence of different parameters such as the plasticizing material, molecular weight and food composition on the glass transition temperature (T g ), is also discussed. The main mathematical models recommended for the prediction of the glass transition phenomenon as well as various methods that have been used for the determination of T g in food products are presented. In conclusion, the applicability of the glass transition concept to explain physical changes occurring during processing or storage of food materials is shown. RESUMO Revisão: A Transição Vítrea em Produtos Alimentícios Review: Glass Transition in Food Products ) Fernanda Paula COLLARES Theo Guenter KIECKBUSCH DTF/Faculdade de Engenharia Química - UNICAMP Caixa Postal 6066 - Campinas-SP - CEP 13083-970 - Brasil Fone: 00-55- 019-37887840 - Fax: 00-55-019-32394717 e-mail: [email protected] - [email protected] José Roberto Delalibera FINZER Departamento de Engenharia Química - UFU Av. João Naves de Ávila, 2160, Bl. K, Campus Santa Mônica - Uberlândia-MG, CEP 38400-089 - Brasil Fone: 00-55-034-32394189 - Fax: 00-55-034-32394188 e-mail: [email protected] SUMMARY

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AUTORESAUTHORS

PALAVRAS-CHAVEKEY WORDS

Braz. J. Food Technol., 5:117-130, 2002 117 Recebido / Received: 02/04/2001. Aprovado / Approved: 25/01/2002.

Alimentos; Calorímetro Diferencial de Varredura;Polímeros; Temperatura de transição vítrea; Transição

vítrea / Food; Differential Scanning Calorimetry;Polymer; Glass transition temperature; Glass transition.

A transição vítrea em alimentos tem importância fundamental, visto que tem sidointimamente relacionada com a preservação de fatores de qualidade destes produtos. Muitosexemplos no domínio da ciência e tecnologia de alimentos têm sido relatados, ilustrando quea transição vítrea pode ser utilizada para interpretar, com maior ou menor sucesso,transformações que ocorrem no processamento e na estocagem de produtos alimentícios ede materiais biológicos de baixa umidade. Este conceito é de interesse, principalmente, paraas indústrias alimentícias que utilizam processos de desidratação ou processos a baixastemperaturas. Este trabalho tem o intuito de apresentar uma revisão sobre o fenômeno detransição vítrea de forma simples e compreensível, onde serão abordados os conceitos demetaestabilidade e de estado vítreo e também discutida a influência de diferentes parâmetros,tais como, o material plasticizante, a massa molecular e a composição do produto alimentício,sobre a temperatura de transição vítrea (T

g). Serão também apresentados os principais

modelos matemáticos recomendados para definir os limites de atuação do fenômeno detransição vítrea, assim como os diversos métodos que têm sido utilizados para a determinaçãode T

g de produtos alimentícios. Finalizando, a aplicabilidade do conceito de transição vítrea

para explicar as mudanças físicas que ocorrem no processamento e na estocagem de alimentosé discutida.

Glass transition is particularly important in food products since it is closely related tothe preservation of quality factors in these products. Several examples in the domain of foodscience and technology have been reported, illustrating that the glass transition conceptcan be used to interpret, with greater or lesser success, changes accurring during theprocessing and storage of low-moisture foods and biomaterials. This concept is of specialinterest to food industries making use of drying or low temperature processes. The purposeof this paper is to present a simple and comprehensible review on glass transition, explainingthe concepts of metastability and glass state. The influence of different parameters such asthe plasticizing material, molecular weight and food composition on the glass transitiontemperature (T

g), is also discussed. The main mathematical models recommended for the

prediction of the glass transition phenomenon as well as various methods that have beenused for the determination of T

g in food products are presented. In conclusion, the applicability

of the glass transition concept to explain physical changes occurring during processing orstorage of food materials is shown.

RESUMO

Revisão: A Transição Vítrea em ProdutosAlimentícios

Review: Glass Transition in FoodProducts

) Fernanda Paula COLLARESTheo Guenter KIECKBUSCH

DTF/Faculdade de Engenharia Química - UNICAMPCaixa Postal 6066 - Campinas-SP - CEP 13083-970 - Brasil

Fone: 00-55- 019-37887840 - Fax: 00-55-019-32394717e-mail: [email protected] - [email protected]

José Roberto Delalibera FINZERDepartamento de Engenharia Química - UFU

Av. João Naves de Ávila, 2160, Bl. K, Campus SantaMônica - Uberlândia-MG, CEP 38400-089 - Brasil

Fone: 00-55-034-32394189 - Fax: 00-55-034-32394188e-mail: [email protected]

SUMMARY

Braz. J. Food Technol., 5:117-130, 2002 118

F. P. COLLARESet al.

Revisão: A Transição Vítrea emProdutos Alimentícios

1. INTRODUÇÃO

2. CONCEITO DE METAESTABILIDADE

A aplicação e/ou adaptação de conhecimentosdesenvolvidos na área de Ciências dos Polímeros alteroudrasticamente conceitos clássicos da Ciência de Alimentos. Asubstituição ou complementação de fundamentos científicosbaseados no equilíbrio termodinâmico (como o da atividadede água, por exemplo) por conceitos de metaestabilidade é,reconhecidamente, a grande revolução dos anos 90 queampliou as bases científicas para uma moderna e mais coerenteinterpretação das relações propriedades-estruturas emingredientes, produtos e processos alimentícios.

A primeira menção sobre a transição vítrea emalimentos e sistemas biológicos apareceu na literatura nosanos 60. Entretanto, a grande variedade de suas aplicaçõesna ciência e tecnologia de alimentos foi elucidada nos anos80 por LEVINE, SLADE (1986). Como a estabilidade dealimentos é dependente do conteúdo de água e devido aofato da temperatura de transição vítrea (Tg) também seraltamente sensível a este parâmetro, o conceito de transiçãovítrea parece ser uma ferramenta importante para oentendimento dos mecanismos das transformações nosprodutos alimentícios e para o controle da sua vida-de-prateleira (shelf life). De fato, a temperatura de transiçãovítrea é considerada como uma temperatura de referência:abaixo de Tg, é esperado que o alimento seja estável; acimadesta temperatura, a diferença (T-Tg) entre Tg e a temperaturade estocagem T é responsabilizada por controlar a taxa dasmudanças físicas, químicas e biológicas. Foi tambémdemonstrado que a transição vítrea permite a identificaçãodos domínios de conteúdo de umidade e temperatura, ondeum produto pode exibir uma textura crocante e dura ouuma textura mole, gomosa e viscosa. Além disso, oconhecimento das variações de propriedades mecânicas ede transporte na faixa de transição vítrea pode contribuirpara um melhor controle de algumas operações deprocessamento de a l imentos, ta is como secagem,congelamento, l iof i l i zação, extrusão e f loculação(CHAMPION et al., 2000).

O conhecimento atual sobre transição vítrea éessencialmente fenomenológico, muito pouco se sabe sobreos aspectos teóricos, sendo que mais recentemente maioresforço tem sido direcionado para o entendimento da naturezado estado vítreo (HAY, JENKINS, 1999, SILLESCU, 1999, WU,1999, GUTZOW et al., 2000). Estudos mostram que, em váriosmateriais alimentícios e biológicos, os sólidos estão em umestado amorfo metaestável que é muito sensível a mudançasna temperatura e no conteúdo de umidade. Freqüentemente,o estado amorfo é o resultado da remoção de água pordesidratação ou congelamento (WHITE, CAKEBREAD, 1966).A matriz amorfa pode existir como um material vítreo muitoviscoso ou como uma estrutura amorfa “gomosa” ou“borrachuda”.

A mudança do estado vítreo para o estado “gomoso“ocorre na temperatura de transição vítrea (Tg) que é específicapara cada material. Entretanto, plasticizantes como a águadiminuem a temperatura de transição vítrea (ROOS, KAREL,1991c).

Segundo CHAMPION et al. (2000), muitas evoluçõesfísicas em produtos alimentícios a baixos conteúdos de águaou no estado congelado podem ser preditas pelo conceito detransição vítrea que esclarece o efeito do conteúdo de água etemperatura na estabilidade. Entretanto, várias reações físicase químicas podem ainda ocorrer no estado vítreo, sugerindoque Tg não pode ser considerada um limiar absoluto detemperatura para a estabilidade. Relaxações sub-Tg e oenvelhecimento físico são fenômenos que mostram que amobilidade molecular abaixo de Tg não pode ser desprezada.

Publicações mais recentes têm levado a umentendimento mais profundo dos aspectos físicos básicos datransição vítrea, a fim de determinar seu real impacto natecnologia de alimentos. Apesar da natureza da transiçãovítrea estar ainda sob investigação, o conhecimento dofenômeno de relaxação do estado vítreo está começando acontribuir para a explicação de algumas mudanças nosprodutos alimentícios abaixo de Tg.

Este trabalho pretende apresentar de uma maneirasimples e ilustrativa o conceito de transição vítrea e comopode ser usado para entender o comportamento físico deprodutos alimentícios durante o processamento e estocagem.Inicialmente, serão abordados os conceitos demetaestabilidade e de estado vítreo e discutidos os efeitos dediferentes parâmetros, tais como, o material plasticizante, amassa molecular e a composição do produto alimentício, natemperatura de transição vítrea (Tg). Um levantamento dosmodelos matemáticos desenvolvidos até o momento parapredizer o fenômeno de transição vítrea será apresentado,assim como as diversas técnicas que têm sido investigadas eutilizadas para a determinação de Tg de produtos alimentícios.Finalizando, serão discutidos exemplos de processos epropriedades importantes em ciência de alimentos que têmsido afetados ou causados pelo fenômeno de transição vítrea.

Um estado de equilíbrio é estável, quando o sistemaestá no seu nível mínimo de energia l ivre e cujastransformações são espontâneas para ∆G < 0.

Existem estados de equilíbrio que não são estáveis,ou seja, podem ser permanentemente alterados como umresultado de alguma pequena perturbação. Estes sãochamados de metaestáveis (MODELL, REID, 1983).

Um sistema termodinâmico, a uma temperaturaespecífica, está em uma condição ou estado metaestável setoda mudança isotérmica pequena de qualquer de suasvariáveis termodinâmicas resulta em um aumento na suaenergia livre, enquanto alterações isotérmicas grandes nestasvariáveis podem levar a um estado com menor energia livre.Um líquido super-resfriado, por exemplo, que se mantém porum longo período a temperaturas bem abaixo de seu pontode congelamento, sem cristalizar, acredita-se estar em umestado metaestável com relação à sua fase cristalina.

A idéia de metaestabilidade, por definição, requer que,ao longo de todas as possíveis rotas entre os estados

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metaestável e estável de um sistema termodinâmico, hajaestados de maior energia livre que o estado metaestável. Estesestados intermediários representam barreiras de energia livre,impedindo a transformação espontânea do estadometaestável para o estável.

Estado vítreo é operacionalmente definido como oestado amorfo comum ou estado metaestável não-cristalinode um sólido (GOFF, 1992). De fato, o material vítreo é, narealidade, um líquido super-resfriado de alta viscosidade (acimade 1010 - 1014 Pa.s) que existe em um estado metaestável, sendocapaz de suportar seu próprio peso em oposição à deformação,devido à força da gravidade (LEVINE, SLADE, 1992).

O estado vítreo é uma forma da matéria que mantéma estrutura, energia e volume de um líquido, mas, cujasmudanças na energia e no volume com a temperatura sãosimilares, em magnitude, àquelas de um sólido cristalino(KAUZMANN, 1948).

Um material vítreo é formado quando um líquidotípico, com uma estrutura molecular desordenada, é resfriadoabaixo de sua temperatura de fusão do equilíbrio cristalino(Tm ) ou temperatura de congelamento, a uma taxasuficientemente alta, de modo a não permitir a cristalizaçãodo líquido (FERRY, 1980).

A mais importante mudança, característica do estadoamorfo que envolve a transição de um sólido vítreo para umestado borrachudo ou gomoso, ou ao contrário de um estadoborrachudo para um vítreo, ocorre na chamada temperaturade transição vítrea (Tg).

A temperatura de transição vítrea (Tg) não é um pontonitidamente localizado (Figura 1), mas define o centro de umaregião em torno de 20 oC ou superior, na qual a transformaçãoocorre (WHITE, CAKEBREAD, 1966).

Valores de Tg para sistemas alimentícios anidros e paraa água são apresentados na Tabela 1.

A temperatura de transição vítrea é específica para cadamaterial e é afetada por três principais fatores: o materialplasticizante, a massa molecular e a composição.

3.1 Plasticização da água

Baseado em conceitos da ciência dos polímerossintéticos, um plasticizante é definido como um “materialincorporado em um polímero para aumentar sua viabilidade,flexibilidade e extensibilidade” (LEVINE, SLADE, 1992).

A plasticização, a um nível molecular, leva a umaumento do espaço intermolecular ou volume l ivre,diminuindo a viscosidade local e, concomitantemente,aumentando a mobilidade (FERRY, 1980). A plasticizaçãoimplica na íntima compatibilidade de mistura a nível molecular,de modo que um plasticizante é homogeneamente misturadoem um polímero ou um polímero em um plasticizante (SLADEet al., 1993).

FIGURA 1. Faixa de temperatura de transição vítrea parauma solução de 80% sacarose. Temperaturas inicial (Tg

o),

média ( Tgm

) e final ( Tge

) da região de transição vítrea. ∆Cp

indica a mudança do calor específico na região da temperaturade transição vítrea (ROOS, 1995a).

TABELA 1. Valores de temperatura de transição vítrea (Tg)para diferentes compostos anidros e água.

Compostos Tg (oC)

- Frutose - Glicose - Lactose - Maltose - Sacarose - Amido de milho* - Glúten - Maçã liofilizada - Maltodextrina M 040 - Maltodextrina M 100 - Maltodextrina M 250 - Morangos liofilizados - Soro de leite liofilizado - Água

5a; 7b; 10c; 11d;13e 21 f;29g; 30h; 31a,d; 35d

101a,d

43d; 70 j; 87k; 91l; 92c; 95b

52d,f; 57e; 67c,m; 70b

150 a 250n 39,3o

0,1p; 4,5q

188r

160r

121r

35,8r

83,1s

-135t

aROOS, 1995a; bORFORD et al. (1990) citado por SLADE et al., 1993; cROOS citadopor SLADE et al., 1993; dSLADE et al., 1993; eFRANKS (1990) citado por SLADE et al.,1993; fFRANKS (1989); gCHAN et al., 1986; hROOS, KAREL,1991d; iWHITE, CAKEBREAD,1966; jGREEN, ANGELL (1989); kROOS, KAREL citado por SLADE et al., 1993; lORFORDet al. (1989) citado por SLADE et al., 1993; mKAUZMANN, 1948; nSTRAHM, 1998;oNICHOLLS et al., 1995; pSÁ et al., 1999; qWELTI-CHANES et al., 1999; rROOS, 1987;sBURIN et al., 2000; t OHARI et al., 1987. *Valores preditos.

A água é um exemplo de um plasticizante que afeta aTg de polímeros completamente amorfos e ambos, Tg e Tm, depolímeros parcialmente cristalinos (LEVINE, SLADE, 1992). A

3. ESTADO VÍTREO E TRANSIÇÃO VÍTREA

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água age como um plasticizante de materiais alimentíciosamorfos, e o conteúdo de água define a localização de Tg. Aplasticização pela água é típica de carboidratos de baixa massamolecular, oligossacarídeos, polissacarídeos e proteínas(ROOS, 1995a).

O efeito plasticizante da água pode ser analisadoatravés de diagramas de estado. Em tais diagramas, a curvacontínua de transição vítrea de Tg em função da concentraçãode sólidos, demonstra o efeito da água na Tg, especialmente abaixos conteúdos de umidade. BONELLI et al . (1997),estudando o efeito do conteúdo de umidade residual nocolapso estrutural de matrizes de açúcares liofilizados (lactose,maltose, sacarose e trealose), observaram que esta umidaderesidual promove notável mudança na Tg devido à extremasensibilidade ao efeito plasticizante da água na faixa de baixaumidade.

O efeito da água na Tg de vários materiais alimentíciostem sido modelado com a equação de Gordon-Taylor (ROOS,1995c):

Tw T k w T

w k wgg g

=+

+1 1 2 2

1 2

(1)

onde w 1 e w2 são as frações em peso dos compostosconstituintes, Tg1 e Tg2 são as temperaturas absolutas detransição vítrea dos compostos constituintes, e k é umaconstante. O subscrito ‘1’ refere-se ao material sólido e ‘2’ àágua.

Segundo COUCHMAN, KARAZ (1978), o valor de k podeser obtido através da expressão:

kCC

p

p

=∆∆

2

1

(2)

onde ∆Cpi é a variação nas capacidades caloríficas de cadacomponente que constitui o material analisado.

Como os valores exatos de ∆Cpi são difíceis de seobter experimentalmente, ROOS, KAREL (1991a e b) têmusado valores experimentais de Tg obt idos a vár iosconteúdos de água para calcular valores de k paracarboidratos.

A equação de Gordon-Taylor tem sido aplicada napredição da plasticização da água de muitos componentes emateriais alimentícios, incluindo carboidratos e proteínas(ROOS, KAREL, 1991a, c e f; KALICHEVSKY et al., 1993), assimcomo de fármacos (HANCOCK, ZOGRAFI, 1994).

Em aplicações práticas, o efeito da água na Tg podetambém ser expresso em termos da atividade de água (aw). Oefeito da aw na Tg pode ser predito através do gráfico de Tg

contra aw e geralmente se usa uma aproximação por regressãolinear embora a verdadeira relação seja sigmoidal, como mostraa Figura 2 (ROOS, 1995a).

3.2. Efeito da massa molecular na Tg

Na família dos polímeros alimentícios homólogos (istoé, desde o monômero glicose, passando por maltose,maltotrioses, maltodextrinas, até polímeros de alta massamolecular como a amilose e a amilopectina, que são osconstituintes do amido), Tg aumenta com o aumento da massamolecular do composto (LEVINE, SLADE, 1992; MITSUIKI etal., 1999).

FOX, FLORY (1950) observaram que a Tg diminuíalinearmente com o aumento do valor do inverso da massamolecular, de acordo com a Equação (3), que pode ser usadapara predizer o valor de Tg para compostos de alta massamolecular.

1O valor de DE é um índice do grau de hidrólise do amido para a obtenção do composto,onde altos valores de DE correspondem a grandes extensões de hidrólise, isto é,baixa massa média molecular.

FIGURA 2. Temperaturas de transição vítrea demaltodextrinas (Maltrin M040, M100, M200 e M365, comDE1 igual a 5, 10, 20 e 36, respectivamente) em função daatividade de água (aw) (ROOS, 1995a).

( )T T KMg g g= ∞ −1

(3)

onde: M é a massa molecular ; Kg é uma constante; Tg(∞) é oTg limite a alta massa molecular.

Em 1996, BUSIN et al. encontraram uma relação linear,a Equação (4), entre Tg (°C) e a dextrose equivalente (DE) paramaltodextrinas em uma ampla faixa de DE (2 a 100) com umcoeficiente de correlação satisfatório (r=0,98). Eles tambémsugeriram que a medida de Tg poderia ser uma ferramentaútil para determinar o grau de hidrólise do amido.

( ) 5,4494,1 +−= DETg(4)

Embora a correlação geral entre a massa molecular deuma série de carboidratos e Tg tem-se tornado bemestabelecida e amplamente aceita, Tg pode var iar

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substancialmente, até mesmo com uma série de compostosde mesma massa molecular e com diferenças sutis na estruturamolecular (SLADE et al., 1993). Por exemplo, a glicose e afrutose, que são dois monossacarídeos de mesma massamolecular, apresentam valores de Tg bem distintos, o mesmoocorrendo com os dissacarídeos sacarose e maltose.

3.3 Efeito da composição na Tg

Existem duas relações fundamentais usadas paracorrelacionar o efeito da composição na temperatura detransição vítrea, uma origina-se da condição de continuidadeda entropia em Tg e a outra da condição de continuidade dovolume (COUCHMAN, KARAZ,1978).

A primeira relação, para um sistema de doiscomponentes, corresponde à equação de Gordon-Taylor e jáfoi apresentada anteriormente para a avaliação do efeito daplasticização pela água na Tg, através das Equações (1) e (2). AEquação (1) pode ser expandida para descrever sistemas commaior número de componentes, como foi demonstrado porARVANITOYANNIS et al. (1993) para o sistema ternário glicose-frutose-água e por KALICHEVSKY, BLANSHARD (1993) para osistema água-frutose-amilopectina:

Tw C T w C T w C T

w C w C w Cgp g p g p g

p p p

=+ +

+ +1 1 1 2 2 2 3 3 3

1 1 2 2 3 3

∆ ∆ ∆

∆ ∆ ∆(5)

onde os subscritos 1, 2 e 3 referem-se aos três componentesdo sistema ternário.

A expressão para a dependência de Tg em relação àcondição de continuidade do volume é equivalente à Equação(1) (COUCHMAN, KARASZ, 1978):

TT T

g

og

og

o o=++

φ α φ αφ α φ α

1 1 1 2 2 2

1 1 2 2

∆ ∆∆ ∆

(6)

As frações volumétricas φ1o e φ2

o são definidas emtermos dos volumes molares V o

1 e V o

2 aval iados nas

respectivas Tg1 e Tg2. Os incrementos do coeficiente deexpansão volumétrica na transição isobárica, ∆α1 e ∆α2 , sãoderivados da definição ( )α ∂ ∂i i

oi p

V V T= 1 .

A F igura 3 mostra o efe i to da adição demaltodextrinas, com valores de dextrose-equivalente iguaisa 4, 10 e 20, na temperatura de transição vítrea, Tg, dasacarose. O Tg da mistura aumenta com o aumento damassa molecular do aditivo e conseqüentemente com adiminuição da dextrose-equivalente (DE ).

O abaixamento da Tg com o aumento da concentraçãoda sacarose foi observado por TORREGGIANI et al. (1999) emsuco de morangos no qual foram adicionados 20% decarboidratos como maltose, sorbitol e mistura de glucose-frutose-sacarose (2:2:0,5).

FIGURA 3. Efeito da adição de maltodextrina na temperaturade transição vítrea, Tg, da sacarose (ROOS, KAREL, 1991e).

3.4 Determinação da temperatura de transiçãovítrea

Muitas propriedades físicas de um material alimentíciomudam repentinamente, quando a temperatura aumentaacima de Tg, entre elas, as mais importantes são um aumentono volume molecular livre, um aumento na capacidadecalorífica (Cp), um aumento no coeficiente de expansão térmico(α) e coeficiente dielétrico (ε) e mudanças nas propriedadesviscoelásticas. Mudanças aceleradas em uma das propriedadesacima são a base para detecção da temperatura de transiçãovítrea (BHANDARI, HOWES, 1999).

Existem muitas técnicas experimentais que podem serusadas para medir a Tg em sistemas alimentícios, e algumasdelas estão listadas na Tabela 2.

O s v a l o r e s d e T g de compos tos amor fo s emater ia is a l imentíc ios, como por exemplo, abacaxi(TELIS, SOBRAL, 2001) e caqui liofilizados (SOBRAL et al .,2001), são geralmente determinados por calorimetriadiferencial de varredura (DSC). O DSC utiliza um pequenocalorímetro dinâmico, que é usualmente processado comum programa de temperatura-tempo linear (BÜHLER,LIEDY, 1989). É definido como uma técnica na qual adiferença na absorção de energia pela amostra e por ummaterial de referência é medida como uma função datemperatura, enquanto a substância e o material dereferência são sujeitos a um controle programado detemperatura (MA et al ., 1990).

O DSC é usado, portanto, para medir a quantidadede energia necessária para elevar a temperatura de umaamostra. Em essência, o DSC mede a mudança da entalpiacom relação à temperatura (calor especí f ico) . Natemperatura de transição vítrea, uma apreciável mudançano calor específico é observada quando o material étransformado de um estado vítreo imóvel para um estadogomoso de maior mobilidade (STRAHM, 1998).

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TABELA 2. Métodos para a medida da transição vítrea(SCHENZ, 1995).

A variação da capacidade caloríf ica pode serdeterminada pelos valores de mudança no fluxo de calor, ∆Y ,da taxa de aumento da temperatura (scanning rate) e peso daamostra, de acordo com a seguinte equação:

∆∆

CY

m rpm sc

=× (7)

onde : ∆Cp é a capacidade calorífica (J/ g oC ); ∆Y é a variaçãodo fluxo de calor (mW ); mm é a massa de material (g); rsc é ataxa de variação da temperatura (oC /s )

O DSC é insensível a Tg quando a mudança no calorespecífico é pequena. Além disso, complicações existem comsistemas multicomponentes quando os vários constituintessofrem muitas transições térmicas pequenas dentro da mesmafaixa de temperatura. A interpretação dos dados do DSC paraestes sistemas é difícil (BILIADERIS, GALLOWAY, 1989).

Em 1993, READING et al . descreveram a teoriaoperacional do calorímetro diferencial de varredura modulada(MDSCTM) e demonstraram que mudanças térmicas reversíveise irreversíveis podiam ser separadas usando esta técnica. Atransição vítrea, sendo reversível, poderia ser diferenciada dasmudanças irreversíveis, tais como a relaxação endotérmica demateriais amorfos, a gelatinização, a recristalização e adesnaturação protéica.

Segundo BELL, TOUMA (1996), o MDSC diferenciou comsucesso a transição vítrea de outras mudanças térmicasirreversíveis em componentes alimentícios simples. Entretanto,esta técnica não pode determinar a transição vítrea parasistemas alimentícios mais complexos a baixos conteúdos deágua. Para estes últimos, o MDSC não foi mais sensível do queo DSC padrão, enquanto para soluções, o MDSC foi maisadequado. Os valores obtidos de Tg através de MDSC foramreprodutíveis e consistentes tanto em relação aos obtidos peloDSC padrão, como aos dados publicados na literatura.

Como a medida de eventos térmicos é muito menossensível à transição vítrea que a medida de propriedadesmecânicas do sistema, mudanças volumétricas e mudançasreológicas podem também ser analisadas na determinação deTg, utilizando-se métodos como TMA, DMA, respectivamente(SCHENZ, 1995, VODOVOTZ, CHINACHOTI, 1996).

A análise termomecânica (TMA) é definida como umatécnica na qual a deformação de uma substância sob carganão-oscilatória (compressão, tensão, flexão ou torção) émedida como uma função da temperatura, enquanto sujeitaa um programa de temperatura controlada. Já a análisemecânica dinâmica (DMA) é uma técnica para a medida depropriedades mecânicas (módulo, característ icas deamortecimento) de materiais quando eles são deformadospor força periódica. Como a faixa de módulo do DMA émuito alta para vários materiais alimentícios, sua aplicaçãoestá limitada a alguns alimentos congelados (MA et al.,1990).

Uma série de produtos, incluindo queijo, caseína,glúten, isolados de soja, amidos e chocolates, foi testada paraa medida de Tg usando a análise termomecânica dinâmica(DMTA). Em 1989, WETTON, MARSH citado por NIKOLAIDIS,LABUZA (1996) demonstraram o grande potencial da aplicaçãodesta técnica em materiais poliméricos não-sintéticos, taiscomo queijo e chocolate. O DMTA também mostrou ser umatécnica apropriada para a medida de Tg de produtosalimentícios compostos, como para o biscoito crackercomercial (NIKOLAIDIS, LABUZA,1996).

Em 1991, COCERO, KOKINI estudaram as mudançasnas propriedades reológicas devido à transição vítrea daglutenina hidratada (amostras com 4 a 14,4 % de umidade),através do espectrômetro reométrico mecânico (RMS). Astemperaturas de transição vítrea obtidas pelo RMS foramsuperiores àquelas obtidas por DSC, porque o DSC detecta acontribuição do volume livre para a capacidade calorífica,resultando na mobilidade molecular da amostra depois desua transição, enquanto o RMS detecta o amolecimento real.Com a exceção das amostras com umidades extremas, acorrelação entre as temperaturas obtidas pelas duas técnicasse apresentou muito boa.

A ressonância magnética nuclear (NMR) foi utilizadapor RUAN et al. (1998) e RUAN et al. (1999) na determinaçãoda temperatura de transição vítrea (Tg) de polímerosalimentícios, como maltodextrina, pão, bolo e biscoito. A NMRé uma técnica espectroscópica baseada nas propriedadesmagnéticas do núcleo atômico e é freqüentemente usadapara monitorar as propriedades de movimento das moléculaspela detecção das características de relaxação do núcleo ativodo NMR, tal como 1H, 2H, 3H, 13C, 17O, 23Na e 31P. Estespesquisadores encontraram que os tempos de relaxação doNMR experimentaram mudanças dramáticas acima e abaixode certas temperaturas, que são característica do tipo dematerial e conteúdo de água. Os resultados para as amostrasde maltodextrina (DE 15), que foram usadas como modelo,indicam que as temperaturas características determinadaspelo NMR concordaram com os valores de Tg determinadosusando DSC.

A Tg de muitos polímeros alimentícios anidros dealta massa molecular, tais como amido e proteínas, nãopodem ser determinados experimentalmente, pois elescomeçam a se decompor antes de alcançar a Tg. Neste caso,a Tg pode ser predita (BUSIN et al., 1996; ROOS, 1995a)pelo coeficiente angular (Tg∞) em um gráfico de Tg em funçãode 1/M (inverso da massa molecular). Alternativamente,

Análises térmicas Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) Calorimetria Diferencial de Varredura Modulada (MDSC)

Propriedades mecânicas Análise Termomecânica (TMA) Análise Mecânica Dinâmica (DMA) Análise Termomecânica Dinâmica (DMTA) Espectrofotômetro Reométrico Mecânico (RMS)

Propriedades dielétricas Análise Dielétrica Diferencial (DDA)

Espectrofotometria Ressonância Magnética Nuclear (NMR)

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4. A CINÉTICA DA TRANSIÇÃO VÍTREA

uma análise em sistema multicomponente poderia serusada, pela adição de diferentes quantidades de agenteplasticizante, como a água, e novamente determinar aintersecção da reta, quando o conteúdo de água tender azero (BHANDARI, HOWES, 1999).

A transição vítrea em sistemas amorfos é um fenômenocinético de mudança no estado físico que depende datemperatura, do tempo (ou freqüência) e da composição domaterial específico (FERRY, 1980; WUNDERLICH citado porLEVINE & SLADE, 1992; GOFF, 1992).

Em termos termodinâmicos, a transição vítrea édefinida como uma transição de segunda ordem (em contrastecom a fusão de um cristal, que é de primeira ordem), ou seja,as duas fases envolvidas diferem nas segundas derivadas daenergia livre, G, com respeito à temperatura e pressão, masnão nas suas energias livres por si mesmas ou nas suasderivadas primeiras. Portanto, a transição vítrea é caracterizadapor (KAUZMANN, 1948; LEVINE & SLADE, 1992):

(i) Descontinuidade no coeficiente de expansãotérmica:

O volume, V = (∂G/∂P)T, não se altera na transição, maso coeficiente de expansão, α, definido por:

α∂∂

∂∂ ∂

=

=

1 1 2

VVT V

Gp TP

(8)

passa por uma mudança muito rápida.

(ii) Descontinuidade na capacidade calorífica :

Similarmente ao item anterior, a entalpia, H, que édada por:

H G TGT P

= −

∂∂

(9)

não se altera, mas a capacidade calorífica, Cp , que é definidapor:

CHT

TG

TpP P

=

= −

∂∂

∂∂

2

2 (10)

sofre uma mudança brusca durante a transição.

A transição vítrea pode também ser definidaoperacionalmente, baseada nas propriedades mecânicas, emtermos de um processo de relaxação mecânica, tal como aviscosidade (FERRY, 1980).

Os modelos que relacionam a viscosidade àtemperatura são uma ferramenta essencial em qualquer análise

quantitativa do fenômeno de transição vítrea e seu impactonas propriedades físicas do material (PELEG, 1992).

A exata relação das curvas de viscosidade com atemperatura, a qualquer composição, é importante naavaliação da estabilidade devido à importância da regiãoborrachuda ou gomosa para os eventos cinéticos controladospor difusão.

Existem muitas equações desenvolvidas pararelacionar a viscosidade, η, e a temperatura. Uma delas é aequação de Arrhenius (SCHENZ, 1995):

η = −A eB

T (11)

onde o fator pré-exponencial A e o fator exponencial B sãoconstantes para um dado sistema e T é a temperatura absoluta.

A equação de Arrhenius se aplica para valores detemperatura T > Tm ou T < Tg, como pode ser visto pelaFigura 4.

FIGURA 4. Viscosidade como uma função da temperaturareduzida (Tm/T) para vidro e polímeros parcialmente cristalinos(LEVINE, SLADE, 1992).

Quando a temperatura (T) é reduzida abaixo daquelado estado líquido de baixa viscosidade (Tg < T < Tm), umacinética não-linear completamente diferente da cinética deArrhenius, torna-se operante e é caracterizada por umadependência da temperatura extraordinariamente grande(Figura 4) (LEVINE, SLADE, 1992). Esta última é chamada decinética de WLF ou teoria de Williams-Landel-Ferry.

A equação semi-empírica de WLF (Equação 12),derivada da teoria de volume livre, descreve a natureza cinéticada transição vítrea e define a dependência exponencial datemperatura com propriedades viscoelásticas de polímerosamorfos e líquidos formadores de vidro para a faixa detemperatura do estado gomoso ou borrachudo de Tg aTg+100oC (LEVINE, SLADE, 1986, LEVINE, SLADE, 1992).

WILLIAMS et al. (1955) observaram que a diminuiçãoda viscosidade acima de Tg de várias substâncias formadorasde vidro era aproximadamente igual e podia ser expressa pelaseguinte equação:

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log( )( )

ηηS

S

S

C T TC T T

=− −

+ −1

2

(12)

onde TS é a temperatura de referência; C1 e C2 são constantescaracterísticas do sistema e dependem da TS selecionada; η éa viscosidade na temperatura T e ηS é a viscosidade natemperatura de referência TS .

Os valores de C1 e C2 descrevem a dependência datemperatura dos processos de relaxação a temperaturas acimada temperatura de referência. Para um polímero não-diluído,quando Tg é usada como a temperatura de referência, C1 éproporcional ao inverso do volume livre do sistema a Tg ,enquanto C2 é a razão entre o volume livre a Tg e o coeficientede expansão do volume livre. Este último, por sua vez, é aconstante que descreve a dependência linear, em ∆T acima deTg, do aumento no volume livre devido à expansão térmicaacima de Tg (isto é, a diferença entre os volumes dos estadoslíquido gomoso e sólido vítreo) (LEVINE, SLADE, 1992).

Segundo PELEG (1992), o modelo de WLF tem-semostrado válido, principalmente, quando a temperatura dereferência, TS, que pode ser selecionada arbitrariamente, é pelomenos 50oC acima da temperatura de transição vítrea. O usode Tg como a temperatura de referência, com os valores dasconstantes C1 e C2 igual a 17,44 (adimensional) e 51,6 (K),respectivamente (que são os valores das ‘constantesuniversais’, extraídos de dados experimentais de muitospolímeros amorfos sintéticos), pode, muitas vezes, serinapropriado.

Entretanto, a equação de WLF pode ser linearizadapara determinar as constantes C1 e C2 através de dadosexperimentais, como mostrado a seguir (ROOS, 1995b):

( )log log

( )T T C

C CT TS

SS

−−

= − − −η η

2

1 1

1 (13)

O modelo de WLF não é l imitado somente àviscosidade, mas pode também acomodar outras relaxaçõesmecânicas ou classes de parâmetros como a resistência àtração (PELEG, 1992).

A aplicação da equação de WLF para os sistemasalimentícios tem conduzido a um entendimento docomportamento dos alimentos a partir de uma perspectiva daciência de polímeros. Os princípios-chave desta aproximaçãosão:

(i) os sistemas alimentícios podem ser tratados comosistemas poliméricos clássicos;

(ii) Tg é importante no entendimento e predição docomportamento dos sistemas alimentícios;

(iii) a água é um plasticizante onipresente de polímerosalimentícios;

(iv) a cinética de sistemas poliméricos de alimentos naregião gomosa ou borrachuda não segue a expressão deArrhenius, sendo melhor descrita pela equação de WLF;

(v) a cinética é controlada pela difusão e depende dotempo.

Outras equações aplicáveis para a descrição dadependência da viscosidade em relação à temperatura natransição vítrea são a equação de Vogel-Tamman-Fulcher (VTF)(Equação 14) e a expressão da regra da potência (Equação15) (NOEL et al., 1990; ROOS, 1995a):

η =−

A

BT T

exp0

(14)

(15)( )η = −A T Tg

r'

onde: η é a viscosidade; A, A’’, B e r são constantes; T é atemperatura (oC); T0 é a temperatura de referência (oC) e Tg é atemperatura de transição vítrea (oC).

5. DIAGRAMAS DE ESTADO

Um entendimento básico das transições vítreas emsistemas alimentícios começa pela consideração dosdiagramas de estado, que são assim chamados porquerepresentam não somente um diagrama de fases de equilíbrio,mas uma combinação de estado de equilíbrio e eventosmetaestáveis ou cinéticos (SCHENZ, 1995).

Um diagrama de estado representa estados nosquais um sistema pode existir como uma função datemperatura, concentração, tempo e pressão (LEVINE,SLADE, 1986). Diagramas de estados simplificados mostramo estado físico de materiais alimentícios como uma funçãoda concentração e da temperatura, como na Figura 5 (ROOS,KAREL, 1991b).

Na Figura 5, Tm representa a curva de equilíbrio defusão de um sistema alimentício (que pode ser desde umsimples soluto, tal como a sacarose, até um sistemacomplexo, como o leite) e Tg representa a curva de transiçãovítrea do sistema alimentício. Quando uma solução desoluto diluído é resfriada abaixo da temperatura ambiente,gelo cristalizará à Tm e a solução líquida residual seconcentrará. Como o sistema continua a ser resfriado, maise mais gelo será formado até que, na temperatura Tm’, asolução concentrada torna-se tão viscosa que afetará amobilidade da água e nenhum gelo adicional cristalizará.Com um resfriamento adicional, o sistema cruzará a curvade transição em Tg’, que é a temperatura de transição vítreade s is temas a l iment íc ios que at ingiram a máximaconcentração, (Cg’), e pode ser alcançada por congelamento.Cons iderando-se interva los curtos de tempo, oresfriamento posterior deste sistema não mais provocará acristalização de gelo; ele se tornou um sólido mecânicocom viscosidade extraordinariamente alta, isto é, umsistema vítreo (SCHENZ, 1995).

Estudos com matrizes maximamente concentradas porcongelamento têm mostrado que valores de Tg’ geralmenteaumentam com o aumento da massa molecular (LEVINE &SLADE, 1986), mas o Cg’ é igual à aproximadamente 80%para a maioria dos carboidratos (ROOS, KAREL, 1991b).

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Os diagramas de estado podem ser usados paramostrar a formação do estado amorfo no processamento dealimentos e para descrever os vários fenômenos, dependentesda temperatura, umidade e tempo, típicos deste estado (ROOS,1995a).

FIGURA 5. Diagrama de estado simplificado mostrando asmudanças acima da temperatura de transição vítrea (Tg). Atemperatura do começo da fusão do gelo, a temperatura detransição e a concentração das soluções na máximaconcentração por congelamento são indicadas por Tm’, Tg’ eCg’, respectivamente. A linha Tm mostra o ponto de equilíbriode fusão do gelo acima de Tm’ (ROOS, 1995a).

Os carboidratos e as proteínas, nutrientesmacromoleculares encontrados nos produtos alimentícios emquantidades variáveis, podem formar estruturas de não-equilíbrio, amorfas, supersaturadas ou parcialmente amorfas,quando sujeitos a processos nos quais a temperatura érapidamente reduzida abaixo do ponto de fusão dessescomponentes ou, então, a água é removida por evaporaçãoou por formação de gelo (KAUZMANN, 1948, WHITE,CAKEBREAD, 1966, ROOS, 1995a).

Para as indústrias alimentícias, particularmente aquelasque utilizam processos de conservação por desidratação(secagem e liofilização) ou por processos a baixas temperaturas(congelamento), o conhecimento da temperatura de transiçãovítrea e do mecanismo da transformação vítrea são de interesseprimordial (GENIN, RENÉ, 1995).

Os produtos al imentícios em pó, que contémcarboidratos amorfos, podem passar por mudanças físicas,tais como: cristalização, pegajosidade e compactação duranteo processamento, manipulação e estocagem (LEVINE, SLADE,

1986). Estas mudanças físicas em materiais desidratados estãodiretamente relacionadas à temperatura de transição vítrea,Tg (ROOS, KAREL, 1991d).

Tanto a pegajosidade, como a compactação e acristalização estão relacionadas ao fenômeno do colapso. Ocolapso ocorre quando uma matriz não pode suportar, porlongo tempo, seu próprio peso, levando a mudançasestruturais como a diminuição no volume e a aglomeração depós secos, contendo carboidratos amorfos. A compactação éobservada quando ocorre um endurecimento e uma reduçãono escoamento das partículas, que pode levar a uma pobrereidratação e dispersibilidade. Durante o colapso, a umidadeé liberada das regiões cristalizadas para as amorfas, o queleva à redução da viscosidade local, desse modo aumentandoa taxa de cristalização dos carboidratados amorfos presentes.Portanto, todos os três resultados são fenômenos físicosrelacionados ao escoamento de pós secos (TSOUROUFLIS etal., 1976).

O fenômeno da pegajosidade (st ickiness) éfreqüentemente encontrado durante a produção ou naestocagem de pós desidratados. Em secadores poratomização, este fenômeno pode ser um enorme problema,quando as partículas, que foram insuficientemente secas,colidem com outras (coesão) ou com a parede do equipamentode secagem (adesão), aderindo a esta. Isso pode levar a baixosrendimentos de produto, problemas operacionais edificuldade de manipulação do pó. Para produtos sensíveisao calor, este fenômeno pode também levar aosuperaquecimento, resultando em características sensoriaisindesejáveis e/ou degradação do alimento (LAZAR et al., 1956,BRENNAN et al., 1971, DOWNTON et al., 1982, PAPADAKIS,BAHU, 1992, CHUY, LABUZA, 1994).

Os problemas com a pegajosidade de pós durante oprocessamento foram observados durante a secagem poratomização de polpa de tomate (LAZAR et al., 1956) e de sucoconcentrado de laranja (BRENNAN et al., 1971). Estes estudosmostraram que o fenômeno de pegajosidade é conseqüênciado aumento nas condições de temperatura e umidade relativa.

WHITE, CAKEBREAD (1966) foram os primeiros areconhecer que um alimento desidratado é um vidro amorfo,isto é, um líquido metaestável super-resfriado, abaixo de suatemperatura de transição vítrea (Tg.), com viscosidade da ordemde 1012 Pa.s. A temperaturas acima de Tg e umidade alta, oproduto desidratado poderá passar do estado vítreo para oestado gomoso ou borrachudo (com uma viscosidade menor),provocando o fenômeno da pegajosidade (DOWNTON et al.,1982) .

A temperatura na qual ocorre a pegajosidade (pontode stickiness) é governada pela temperatura de transição vítrea(Tg). A viscosidade crítica para esse fenômeno é em torno de107 Pa.s que corresponde à viscosidade do ponto final datransição vítrea, como pode ser visto na Figura 6 (ROOS, KAREL,1991b).

CHUY, LABUZA (1994) mostraram que para fórmulaslácteas infantis em pó e para a maltodextrina DE 10, atemperatura de transição vítrea é inferior às temperaturas doponto de pegajosidade e de colapso (Figura 7). Ambas medem

6. TRANSFORMAÇÕES FÍSICAS EM ALIMEN-TOS RELACIONADAS À TRANSIÇÃOVÍTREA

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o mesmo fenômeno físico relacionado à transição vítrea, massão observações de um grau diferente de colapso. Atemperatura de colapso é uma medida do endurecimentoinicial, enquanto a temperatura de pegajosidade mede umestágio avançado do colapso.

FIGURA 6. Temperatura de transição vítrea (Tg) e ponto depegajosidade de uma mistura amorfa de sacarose e frutose(7:1) mostrando a relação entre Tg e a pegajosidade (ROOS,1995a).

FIGURA 7. Temperaturas de transição vítrea (Tg), do pontode pegajosidade (Tp) e de colapso (Tco) como uma função doconteúdo de umidade para a maltodextrina DE 10 (taxa deaquecimento de 10 oC/min) (CHUY, LABUZA, 1994).

Informações sobre as temperaturas de pegajosidade ecolapso são valiosas no projeto de processos de aglomeração,que usam a coesão controlada para aumentar o tamanho daspartículas dos alimentos em pó e, conseqüentemente, melhorarsua dispersibilidade (ROOS, KAREL, 1991b, ROOS, 1995a).

As temperaturas do ponto de pegajosidade e decolapso diminuem com o aumento do conteúdo de águaconcorrentemente com Tg (devido ao efeito plasticizante daágua na matriz), e a viscosidade crítica se correlaciona com aviscosidade de materiais amorfos a temperaturas 10-20oCacima de Tg (ROOS, KAREL, 1991c).

LEVINE, SLADE (1986) consideraram o colapso demateriais desidratados ser governado pelo fenômeno detransição vítrea. ROOS, KAREL (1991e) observaram que osvalores de Tg de maltodextrinas determinados por DSC(Calorimetria Diferencial de Varredura) foram menores que oscorrespondentes valores de T co apresentados porTSOUROUFLIS et al. (1976), mas mostraram similar decréscimocom o aumento no conteúdo de água.

A Figura 8 mostra que a relação entre Tg e Tco é linearpara as maltodextrinas com valores de dextrose-equivalentesde 10, 15, 20 e 25, e que Tco ocorre ao redor de 40 a 70oCacima de Tg.

A alta correlação entre os valores experimentais de Tge Tco sugere que a determinação de Tco é um método aplicávelpara a determinação de Tg de alimentos amorfos (ROOS,1995b). A diferença de temperatura entre Tg e Tco é uma medidada diferença entre a escala de tempo experimental daobservação de Tg com DSC e os métodos de determinação deTco, incluindo a determinação da temperatura de pegajosidade,como foi também exposto por CHUY, LABUZA (1994).

Assim como Tg e Tco, o ponto de pegajosidade de pósalimentícios também diminui com o decréscimo da massamolecular e os produtos com baixos Tg têm também baixastemperaturas de pegajosidade (ROOS, 1995c).

FIGURA 8. Correlação entre a temperatura de colapso, Tco, ea temperatura de transição vítrea, Tg, para as maltodextrinascom valores de dextrose equivalente de 10 (M100), 15(M150), 20 (M200) e 25 (M250). A Tg foi predita com a equaçãode Gordon e Taylor com os dados de ROOS, KAREL (1991e) eROOS (1993b). (ROOS, 1995b).

A pegajosidade de produtos alimentícios que contémalta quantidade de monossacarídeos, como sucos de frutas,pode ser reduzida e a estabilidade dos produtos aumentadapela adição de compostos com altos valores de Tg .

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Maltodextrinas com relativamente baixa dextrose equivalente(DE ) são freqüentemente usadas como materiais quediminuem o stickiness e melhoram a estabilidade de pósalimentícios (ROOS, KAREL, 1991d).

O resfriamento das paredes do secador a temperaturasinferiores a Tg tem sido empregado para evitar a pegajosidadeem secadores por atomização (LAZAR et al., 1956). Váriosaditivos, geralmente de alta massa molecular, têm sidotambém usados para elevar a temperatura de transição vítreado material a ser desidratado, combatendo a pegajosidadedo produto nas paredes do secador e também a compactaçãodurante a estocagem (BRENNAN et al., 1971).

A influência do fenômeno de transição vítrea noprocesso de secagem de pastas alimentícias sobre a superfíciede materiais sólidos foi avaliada por COLLARES (2001).Segundo este estudo, comprovou-se que o desprendimentode filmes de maltodextrina, melaço de cana-de-açúcar e gomaarábica durante a secagem sobre a superfície de materiaissólidos (placas de vidro comum, aço inoxidável, Nylon eTeflon) é governado pela transição vítrea do materialalimentício. De acordo com COLLARES (2001), para haverdesprendimento natural da película seca de pasta alimentícia,sem auxílio externo, é necessário que a umidade do filmeatinja valores correspondentes aos de transição vítrea, natemperatura de operação. Portanto, a operação de secagemdeve propiciar condições de transição vítrea ao produto, nofinal do processo, ou pela diminuição da temperatura do ar,ou pela formulação da alimentação, utilizando-se aditivos dealta massa molecular.

Em produtos lácteos desidratados, o conteúdo de águaaumenta com o aumento da umidade relativa até que ocorrea cristalização da lactose, resultando em perda de umidade. Acristalização de açúcares em alimentos desidratados em póocorre depois dos fenômenos de pegajosidade e colapso,acima de Tg (ROOS, 1995a).

A influência do fenômeno de transição vítrea tambémtem sido observada na estabilidade de produtos alimentíciosarmazenados por longos períodos em temperaturas típicasde congelamento (-18oC). Segundo LEVINE, SLADE (1989),esta estabilidade está relacionada com a diferença detemperatura entre a temperatura de estocagem e a temperaturade transição vítrea da matriz maximamente concentrada (Tg’ ).Este conceito de crioestabilização assume a estabilidade doalimento abaixo de Tg’ e rápida diminuição da mesma acimade Tg’ de acordo com a cinética de WLF. A temperaturas acimade Tg’, ocorre um aumento na mobilidade dos constituintesdo alimento congelado. No estado vítreo (temperaturas abaixode Tg’), a amostra é estável em relação à recristalização e reaçõesdeteriorativas devido à alta viscosidade. A crioestabilizaçãode produtos congelados pode ser atingida pela elevação daTg’ (fazendo-se a reformulação adequada dos ingredientes)ou pela estocagem a temperaturas inferiores a Tg’.

A temperatura de transição vítrea é, portanto, umimportante parâmetro físico na ciência de alimentos, pois ajudaa explicar o comportamento químico e físico dos sistemasal imentícios. Além do problema de aglomeração ecompactação de pós alimentícios durante o processo dedesidratação e estocagem, a transição vítrea pode também

ser usada para explicar o amolecimento de produtosextrusados (STRAHM, 1998), a cristalização da sacarose emsólidos amorfos, a mudança nas propriedades de textura dopão, a perda de textura de produtos liofilizados (BONELLI etal., 1997) e a gelatinização (VODOVOTZ, CHINACHOTI, 1996)e retrogradação do amido (BAIK et al., 1997). Algumas reaçõesquímicas, controladas por difusão, podem também serinfluenciadas pela transição vítrea, como a influência nas taxasde escurecimento não-enzimático (reação de Maillard)(LIEVONEN et al., 1998, WHITE, BELL, 1999) e na estabilidadetérmica da enzima lisozima (BUERA, KAREL, 1995, BEL,TOUMA,1996).

No entanto, como observado por SHEBOR et al. (1996)e CARDONA et al. (1997), a inativação enzimática de sistemasamorfos desidratados em uma matriz polimérica (oucarboidrato), não pode ser predita com base na teoria datransição vítrea. Isso é particularmente verdade para ainativação térmica (T > 90oC) da invertase em matriz amorfade trealose, para a qual eles verificaram que existe ummecanismo adicional de proteção. A trealose mesmo tendotemperatura de transição vítrea, Tg = 100 oC (ROOS, 1993a),inferior à matriz de maltodextrina DE 10, Tg = 160oC (ROOS,KAREL, 1991e) exerceu maior grau de proteção à enzimainvertase em relação à matriz amorfa de maltodextrina.

Em 1996, SCHMIDT e LAMMERT estudaram ofenômeno de envelhecimento físico de maltose vítrea, queconsiste na alteração das propriedades físicas do materialvítreo em função do tempo, a temperaturas abaixo de sua Tg.Este termo foi usado por STRUIK (1978) para distinguir oenvelhecimento devido às transformações físicas doenvelhecimento devido a reações químicas, degradação oualterações na cristalinidade. O envelhecimento físico afetamuitas propriedades físicas, como densidade, deslizamento,relaxação da resistência, constante dielétrica e perda dielétrica.O conhecimento deste processo de envelhecimento paramateriais poliméricos é importante por causa das mudançasnas suas propriedades físicas com o tempo que afetamgrandemente o uso final e a estabilidade destes materiais; omesmo podendo se dizer para os alimentos e ingredientesalimentares. SCHMIDT, LAMMERT (1996) observaram que hámudança na entalpia das amostras vítreas de maltose a 13oCabaixo do ponto médio da Tg, demonstrando que a mobilidademolecular pode existir abaixo da temperatura de transiçãovítrea.

A transição vítrea, portanto, não pode ser usadasozinha para caracterizar um material em relação às condiçõesde umidade e temperatura prevalecentes durante a estocagem,e também Tg não pode ser considerada como um limiarabsoluto de estabilidade.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os diagramas de estado, onde as relações entre acomposição e o estado físico do material alimentício sãoestabelecidas, fornecem meios para a formulação de produtospara satisfazer requerimentos de processamento e estabilidadena estocagem quando a reformulação é possível. Estes

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diagramas de estados e, conseqüentemente, a temperaturade transição vítrea (Tg) podem também ser usados para odesenvolvimento de processos, equipamentos, embalagensadequadas e condições de estocagem para a máximaestabilidade do produto alimentício (ROOS, 1995a).

A manipulação adequada da transição vítrea, portanto,auxiliará no desenvolvimento de novos produtos alimentíciose levará ao melhor controle de qualidade e melhor utilizaçãodos ingredientes dos alimentos (NOEL et al., 1990). Issoenvolve o conhecimento de todos os parâmetros que podeminfluenciar na temperatura (Tg), onde essa transição vítreaocorre.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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