rev 37 jul dez 2005 · cada tabela deverá ter um rodapé breve. não utilizar linhas horizontais...

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Instruções aos Autores ................................................................................................................................. 6 Artigo Original Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar ................................................. 7 Antonir Nolla , Antonio Severo , Osvandré Lech, Paulo Piluski , Jorge Borges . O Hipotireoidismo Esquecido ................................................................................................................... 13 Aline W. dos Reis, Anderson N. Rocha, Arthur S. Lazaretti, Carla R. Bürkle, Daniela T. Borges, Mateus F. Messinger, Paulo R. Weinert. Perfil do Atendimento na Unidade de AVC do Hospital São Vicente de Paulo .......................................... 16 César Augusto L. Pires, Loane Rottenfusser, Robson Rottenfusser, Eliezer N. Dertelmann, Rui Portes da Silva Filho. Orientações Fisioterapêuticas aos Cuidadores de Crianças Portadoras de Paralisia Cerebral ................. 21 Cristiane dos Santos Paliga, Janaína Cardoso Costa. Relação entre a Goniometria do Arco Medial do Pé e a Pressão Plantar em Baropodometria ................ 25 Cristina Santin Bilibio, Daniela Bertol, Hugo Tourinho F°. Pico de Torque Supra-espinhoso no Teste de Jobe ................................................................................... 30 Adriana Pensin & Cássia Nardon. Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II ............................................... 34 Sílvia Lorenzini & Denise Martelli. Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadril no Hospital São Vicente de Paulo ............................. 40 Fabrício Perin da Rosa & Anderson Cattelan. Artigo de Revisão Modificações no Modelo de Tradução Gênica .......................................................................................... 44 Cristian F. Nunes, Angela Sanderson, Caroline Duarte, João G. Castellano, Tailize Menegazzo, César Augusto L. Pires. Doença do Refluxo Gastroesofágico em Lactentes ................................................................................... 50 Fernanda Luzzatto, Rochele G. Cruz, Viviane Rech. Intervenções Fisioterapêuticas em Fibromialgia ...................................................................................... 56 Adriana F. Dessuy, Lia Mara Wibelinger, Venelise A. Formighieri. Artigo Especial Reflexão Sobre o Cuidado de Enfermagem na Visão da Gestante Hipertensa ........................................ 65 Leila Juliana Antunes, Luciana Blanco, Lenir Maria Baruffi, Nelci Terezinha Zorzi. Relato de Caso Síndrome de Eagle .................................................................................................................................. 72 Roque Miguel Rhoden, Paulo Fogaça, Douglas Voss, Diego Pons, Vinícios Rhoden, Fernando Rhoden. Transtorno Conversivo em Criança ........................................................................................................... 75 Edson R. Dalberto, Luciane Miozzo, Aline J. Romagna, Cláudio J. Wagner. Reabilitação em Transplante Meniscal ....................................................................................................... 77 Daniela Delazeri, Gilnei Lopes Pimentel, César Antônio de Quadros Martins. Ação da Fonoforese Associada à Enzima Hialuronidase no Tratamento de Cicatrizes Inestéticas Tardias Provocadas por Queimaduras de Terceiro Grau ........................................ 82 Emanuele Mesquita, Cristiane Vicenzi, Sílvia Lorenzini. ÍNDICE Revista Médica Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005 Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005 Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005 Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005 Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005

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Page 1: rev 37 jul dez 2005 · Cada tabela deverá ter um rodapé breve. Não utilizar linhas horizontais e/ou verticais dentro das tabelas. ... pacientes com fraturas diafisárias de úmero

Instruções aos Autores .................................................................................................................................6

Artigo Original

Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar ................................................. 7Antonir Nolla , Antonio Severo , Osvandré Lech, Paulo Piluski , Jorge Borges†.

O Hipotireoidismo Esquecido ................................................................................................................... 13Aline W. dos Reis, Anderson N. Rocha, Arthur S. Lazaretti, Carla R. Bürkle,Daniela T. Borges, Mateus F. Messinger, Paulo R. Weinert.

Perfil do Atendimento na Unidade de AVC do Hospital São Vicente de Paulo.......................................... 16César Augusto L. Pires, Loane Rottenfusser, Robson Rottenfusser, Eliezer N. Dertelmann, Rui Portes da Silva Filho.

Orientações Fisioterapêuticas aos Cuidadores de Crianças Portadoras de Paralisia Cerebral ................. 21Cristiane dos Santos Paliga, Janaína Cardoso Costa.

Relação entre a Goniometria do Arco Medial do Pé e a Pressão Plantar em Baropodometria ................ 25Cristina Santin Bilibio, Daniela Bertol, Hugo Tourinho F°.

Pico de Torque Supra-espinhoso no Teste de Jobe ................................................................................... 30Adriana Pensin & Cássia Nardon.

Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II ............................................... 34Sílvia Lorenzini & Denise Martelli.

Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadril no Hospital São Vicente de Paulo ............................. 40Fabrício Perin da Rosa & Anderson Cattelan.

Artigo de Revisão

Modificações no Modelo de Tradução Gênica .......................................................................................... 44Cristian F. Nunes, Angela Sanderson, Caroline Duarte, João G. Castellano, Tailize Menegazzo, César Augusto L. Pires.

Doença do Refluxo Gastroesofágico em Lactentes ................................................................................... 50Fernanda Luzzatto, Rochele G. Cruz, Viviane Rech.

Intervenções Fisioterapêuticas em Fibromialgia ...................................................................................... 56Adriana F. Dessuy, Lia Mara Wibelinger, Venelise A. Formighieri.

Artigo Especial

Reflexão Sobre o Cuidado de Enfermagem na Visão da Gestante Hipertensa ........................................ 65Leila Juliana Antunes, Luciana Blanco, Lenir Maria Baruffi, Nelci Terezinha Zorzi.

Relato de Caso

Síndrome de Eagle .................................................................................................................................. 72Roque Miguel Rhoden, Paulo Fogaça, Douglas Voss, Diego Pons, Vinícios Rhoden, Fernando Rhoden.

Transtorno Conversivo em Criança ........................................................................................................... 75Edson R. Dalberto, Luciane Miozzo, Aline J. Romagna, Cláudio J. Wagner.

Reabilitação em Transplante Meniscal ....................................................................................................... 77Daniela Delazeri, Gilnei Lopes Pimentel, César Antônio de Quadros Martins.

Ação da Fonoforese Associada à Enzima Hialuronidase no Tratamento deCicatrizes Inestéticas Tardias Provocadas por Queimaduras de Terceiro Grau ........................................ 82Emanuele Mesquita, Cristiane Vicenzi, Sílvia Lorenzini.

ÍNDICE

Revista MédicaAno XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005Ano XVII, Nº 37, Julho - Dezembro de 2005

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–6– REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

INSTRUÇÕES AOS AUTORES

6.

A Revista Médica do Hospital São Vicente de Paulopublica artigos enviados espontaneamente ou por solicitação eaprovados pela Editoria Científica que expressam,prioritariamente, a produção científica na área de saúde emnosso meio. Estrutura suas edições com conteúdos de aplicaçãoprática e de utilidade na rotina diária da maioria dos que arecebem, além de conteúdos científicos que sejam relevantes erelacionados. O aceite subentende a publicação exclusiva doartigo neste periódico. As afirmações contidas nos trabalhossão de responsabilidade exclusiva dos autores.

As normas editoriais da Revista Médica seguem as reco-mendações do International Committee of Medical Journal Edi-tors (ICMJE: Uniform requeriments for manuscripts submitted tobiomedical journals. N Engl J Med 1997; 336:309-315).Também, podem ser obtidas na Internet (http://www.acponline.org).

Os trabalhos deverão ser digitados em um editor detextos eletrônico (preferencialmente Word), dispensando-seformatação. Deverá ser enviada cópia impressa e em disquete31/2". Os disquetes não serão devolvidos. Os autores devemmanter cópias de todo material enviado (inclusive fotos e figuras).Os artigos enviados deverão, obrigatoriamente, incluir osseguintes itens:•Página Título: deverá conter título conciso e informativo;primeiro nome e sobrenome principal por extenso, com inicialde sobrenome secundário dos autores; instituição onde se realizouo trabalho (não deve constar a titulação dos autores); nome deum autor com endereço e telefone para correspondência.•Resumo e Summary: o resumo deverá ser apresentado emúnico parágrafo de não mais que 150 palavras, devendo serinformativo, trazendo, nos artigos originais, o objetivo, ametodologia, os resultados e as conclusões, enfatizando aspectosnovos e importantes. O summary deverá ser uma tradução doresumo para a língua inglesa, devendo trazer também o títulodo trabalho e os unitermos em inglês.•Unitermos: fornecer ao final do resumo uma lista de 3 a 10palavras ou frases curtas, que identifiquem os temas revisadoscom vistas à indexação. Procurar utilizar termos listados pelosDescritores em Ciências da Saúde (DeCs), editado anualmentepela BIREME/OPAS/OMS, São Paulo.

Observar a redação e organização dos artigos conformepadrão da revista, como segue:

Artigo Original: organização com Introdução, Material eMétodos, Resultados e Discussão, Referências. Evitar parágrafosmuito curtos (2 ou 3 linhas) e procurar reunir uma linha depensamento em um único parágrafo.Artigo de Revisão: organização com Introdução, Discussão,Conclusões e Referências.Relato de Caso: breve Introdução, Relato do Caso,Comentários e Conclusões e Referências.Referências Bibliográficas: trabalhos publicados citados notexto deverão ser numerados, uma referência para cada número,ordenados conforme ordem de aparecimento no texto.

Os seguintes modelos devem ser adotados:

Referências de Revistas:

Palma L A S, Pilau J, Borges F G, Eickhoff C M. Pneumopatiapor Fármacos. Rev Médica HSVP 1999; 11(24): 65-68.

O nome do periódico deve ser abreviado segundo aedição do List of Journals do Index Medicus (publicadoanualmente na edição de janeiro do Index Medicus) ou segundoo Index Medicus Latino-Americano.

Referências de Resumos:Coleman RJ. Current drug therapy for Parkinson disease -a re-

view (resumo ou "abstract"). Drugs Ag 1992; 2(2):112-24.Quando não publicado em periódico: publicação. Cidade em

que foi publicado: publicadora, ano, página(s).

Referência de Livros:Gilman AG, Rall TW, Nies AS & Taylor P. Pharmacological Basis

of Therapeutics. 8th ed. USA: Pergamon, 1990.

Referências de Capítulos de Livros:

Brow, AC. Pain and Itch. In: Patton HD, Fuchs AF, Hille B, ScheramAM & Steiner R (Eds) - Textbook of Physiology. 21st ed. USA:WB Saunders Company, 1989; 1(16): 346-64.

Quando existir mais de um volume, deverá ser referidoimediatamente antes do número do capítulo, que ficará en-tre parênteses (exemplo acima).

Comunicações pessoais:Só devem ser mencionadas no texto, entre parênteses.

Tabelas: algarismos arábicos deverão ser usados para anumeração das tabelas, na ordem de aparecimento no texto.Cada tabela deverá ter um rodapé breve. Não utilizar linhashorizontais e/ou verticais dentro das tabelas. As tabelas nãodeverão duplicar o material do texto ou das ilustrações.

Ilustrações: deverão ser referidas como Figuras e, para anumeração, deverão ser usados algarismos arábicos na ordemde aparecimento do texto. As figuras deverão ser desenhadasou fotografadas de modo profissional, como aparecerão naRevista. As legendas contendo título e explicações para as Figurasdeverão ser apresentadas em uma folha separada.

Cada figura deverá ser impressa de forma que aimagem fique clara. Atrás das figuras deverá ser escrito a lápisou em etiqueta adesiva o nome do primeiro autor, o títuloreduzido, uma seta indicando a posiçao correta e o número dafigura.

Agradecimentos: indivíduos ou instituições que contribuíramsignificativamente ao preparo do trabalho são identificados nestaseção.

Os trabalhos que não se ajustem a estasdiretrizes não serão aceitos.

OBS.: A Editoria Científica da revista reserva-se o direito deadotar medidas para aprimorar o conteúdo, estrutura eredação dos artigos.

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–7–REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37): 7-12.

Fraturas Diafisárias do Úmero tratadascom Fixador Externo Monopolar

Antonir Nolla , Antonio Severo , Osvandré Lech, Paulo Piluski , Jorge Borges†.Instituto de Ortopedia e Traumatologia, Hospital de Ensino São Vicente de Paulo, Passo Fundo(RS).

Resumo

Existe uma grande diversidade de métodos para o tratamento de fraturas da diáfise doúmero, dentre eles, o método Sarmiento, osteossíntese com placas ou hastes, tração esqueléticae fixadores externos. O objetivo deste trabalho é avaliar casos de fratura da diáfise do úmerotratados pelo método de fixação externa. Foram tratadas 21 fraturas diafisárias de úmero como uso de fixador externo. Os fixadores utilizados foram o Ortofixr e o Tubular AOr. A consolidaçãoradiográfica foi obtida em 90,45% dos casos, com média de 4,15 meses (mínimo de três e máximode sete meses). O seguimento dos pacientes variou de 64 a 112 meses (média de 88 meses). Umpaciente evoluíu para pseudoartrose. A média de idade foi de 32,1 anos. Os resultado clínicose radiográficos tornam o método reproduzível, considerando-se a facilidade do uso com fixaçãominimamente invasiva e mais biológica. Este método, quando corretamente executado, tambémdiminui a quantidade de complicações, como lesão do nervo radial e infecções, além de permitirmobilidade precoce do ombro e cotovelo, evitando a rigidez articular.

Unitermos: Diáfise, úmero, fixador externo.

As fraturas diafisárias de úmero podem ser tratadasde várias maneiras, muitas controversas e conflitantes entresi no que se refere à indicação. Geralmente, opta-se pormétodos conservadores, sendo mais utilizado tratamentos ométodo de Sarmiento1,2. Os métodos cruentos utilizados sãoa osteossíntese com placas3, hastes intramedulares4 efixadores externos5.

Os fixadores externos tem sido utilizados em fraturascomplexas de úmero, fraturas expostas, politraumatizados eem casos de pseudoartroses oligotróficas, com ou seminfecção. Por se tratar de método seguro e reproduzível,pouco invasivo, com técnica cirúrgica fácil e apresentar bonsresultados, têm merecido destaque no tratamento das fraturasdo úmero. A indicação do tratamento com fixador externonão reside apenas no fato de ser a fratura exposta ou fechada,mas sim na magnitude das lesões de partes moles que outrosmétodos podem acarretar.

O objetivo deste trabalho foi avaliar os casos defraturas da diáfise do úmero com o uso de fixador externotratados no Instituo de Ortopedia e Traumatologia de PassoFundo(IOT) e Hospital São Vicente de Paulo(HSVP). Osfixadores utilizados foram o Ortofixr e o Tubular AOr, por seremdisponíveis e oferecidos em nosso local de trabalho.

MATERIAL E MÉTODONo período de maio de 1995 a maio de 1999, 21

pacientes com fraturas diafisárias de úmero foram tratadoscom fixador externo monopolar no serviço de cirurgia domembro superior, sob supervisão de um dos autores. Vintepacientes foram submetidos ao tratamento com fixadorexterno primariamente. Um paciente recebeu tratamentoprimário com fixação interna com placa e parafusos e evoluiupara pseudoartrose, sendo então tratado com fixador externo.Dos 21 pacientes, 13 eram do sexo masculino (62%) e oitoeram do sexo feminino (38%). Nove (42%) eram fraturasexpostas e 12 (58%) eram fraturas fechadas. A causa maisfreqüente do trauma foi o acidente automobilístico com 15casos (75%), seguido de queda de própria altura com quatrocasos (19%) e ferimento por arma de fogo (FAF) com doiscasos (6%). Catorze pacientes (66%) erampolitraumatizados. Todos foram tratados inicialmente naemergência do Hospital de acordo com o protocolo doAdvanced Trauma Life Support (ATLS) e em seguida tiveramsuas fraturas fixadas.

A técnica de inserção dos pinos de Shanz (pinosauto-rosqueantes de 4,5 mm) foi a seguinte:

1- Utiliza-se um trocater com protetor de partes moles

Artigo Original

( †in memoriam)

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–8– REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

que é introduzido através de incisão de aproximadamenteum cm. A incisão deve ser ampla o suficiente para que nãoexista tensão em partes moles contra o pino a ser colocado;

2- Retira-se o trocater e o orifício é utilizado comoguia para a colocação de uma broca de 3,5 mm que deveperfurar as duas corticais.

3- Coloca-se o pino de Schanz manualmente; estedeve ser auto-rosqueante, pois desta forma evita-se o riscode se perder a rosca no canal feito pela broca, o queimplicaria novas perfurações. São utilizados no mínimo doispinos para cada fragmento ( proximal e distal).

4- Coloca-se o conector que liga o pino a haste dofixador, permitindo assim a correção das deformidades. Ocontrole radiográfico da redução é realizado no atooperatório, através do intensificador de imagens.

A seqüência dos passos de colocação do fixadorexterno deve ser seguida sistematicamente para evitardificuldades ou complicações futuras, sendo a mais freqüentea soltura dos pinos após necrose térmica do osso adjacente,que ocorre quando os pinos são colocados com perfuradoreselétricos1.

Durante o acompanhamento, foram realizadosexames radiológicos a cada duas semanas no primeiro mês,a seguir, o controle era feito a cada quatro semanas. Oseguimento variou de 64 a 112 meses, com média de 88meses. Na reavaliação, foram utilizados parâmetros segundoBarbieri et al 6., como a cicatrização de partes moles e óssea,a amplitude dos movimentos ativos e passivos do ombro edo cotovelo e o grau de satisfação do paciente com relaçãoao resultado final do tratamento, classificando-se:

Bom: fratura consolidada, sem complicações oudeformidades; mobilidades ativa e passiva irrestritas;

Regular: fratura consolidada, com pequenadeformidade, sem complicações ou seqüelas neurológicas;mobilidade moderadamente diminuída (até 30% do normal);

Mau: fratura não consolidada, ou consolidada comgrande deformidade, ou com complicação ou seqüelasneurológicas; mobilidade muito diminuída (60% ou mais donormal).

RESULTADOSO tempo de consolidação médio das fraturas foi de

4,1 meses. Não houve complicações neurológicas ou lesãonervosa por ocasião da colocação dos pinos. Um pacienteapresentou lesão do nervo radial (neuropraxia) devido aotrauma, evoluindo satisfatoriamente. Ao longo daconsolidação óssea a maioria iniciou mobilização precocedo braço (os pacientes politraumatizados que estavam emcuidados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) foram

assistidos pela equipe de fisioterapia para mobilidadearticular imediata).

Em quatro pacientes (19%) a extensão do cotoveloficou restrita, com perda de extensão de 25o e perda de flexãode 10o, porém, sem acarretar perda funcional do membro.

O tempo de consolidação das fraturas expostas foidiscretamente superior ao das fraturas fechadas, porém, asfraturas expostas foram as que possuíam cominuição menor.A média em geral foi de 4,1 meses(Figura 1).

Poucos pacientes queixaram-se de dor, que quasena totalidade foi aliviada por analgésicos e antiinflamatóriosassociada a repouso nos primeiros dias após a cirurgia.

Infecção superficial dos pinos ocorreu em 10 pacientes(47%), sendo tratada com limpeza diária e uso de antibióticos.Apesar disto, não houve soltura dos pinos, casos de quebrados mesmos ou refratura após remoção do fixador.

Em quatro pacientes (19%) houve infecção no localde exposição óssea, havendo necessidade dedebridamentos seriados e antibioticoterapia. O fechamentoocorreu por segunda intenção.

Na série, um paciente evoluiu para pseudoartroseoligotrófica, onde o fixador externo foi substituído por placa decompressão mais enxerto ósseo autólogo. (Figura 2). Outropaciente foi inicialmente tratado com placa e parafusos eevoluiu para pseudoartrose tipo hipertrófica, sendo retiradomaterial de síntese e substituido pelo fixador externo(Figura 3). Ambos evoluíram para a consolidação após a trocade método.

Os resultados funcionais obtidos foram de 15 (71%)de bons resultados, cinco (23%) de resultados regulares eum (4,7%) mau resultado. (Tabela 1).

DISCUSSÃOO úmero é um dos ossos em que deformidades

angulares relativamente grandes são aceitáveis, sendo quesegundo Zagorsky5, até 25o de varo pode ser aceitável semcomplicação cosmética; por isso, grande parte das fraturasfechadas ainda são tratadas conservadoramente comórteses5,7. A deformidade em valgo, contudo, causa problemafuncional devido distensão do nervo ulnar. As angulaçõespós-consolidação das fraturas tem sem mostrado melhorescom o uso de fixação interna e externa do que com o uso detratamento conservador, mesmo em casos de fraturascominutivas5. O uso de fixador externo para tratamento defraturas diafisárias do úmero tem aumentadosignificativamente nos últimos anos. Técnica fácil, baixo custo,fixação estável e mobilidade articular precoce são seusprincipais atrativos1. O objetivo primário do uso da fixaçãoexterna é dar estabilidade para a consolidação da fratura,

Figura 1. Fratura cominutiva de úmero tratada com fixador externo. Evolução com consolidação após 4 meses.

Nolla A e cols. Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar.

7-12.

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–9–REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

associado à mobilidade precoce do ombro, cotovelo, punho,mão e, particularmente, aos músculos circundantes no focode fratura. Isto é importante porque sabe-se que a realizaçãode micromovimentos no foco de fratura serve de estímulopara a produção de calo ósseo3. Seu uso pode ser temporáriopara o manejo inicial das fraturas e posteriormente utilizaçãode fixação interna, mas hoje existe a tendência da suautilização como tratamento definitivo, com ótimos resultados8.

Milani et al.8 avaliaram 14 pacientes com fraturasdiafisárias do úmero fechadas tratadas com fixador externomonolateral tipo morsa interpotencial (MIP)R, que é umamodificação do fixador de Hoffmann. Onze eram não

cominutivas e três eram cominutivas. Obtiveramconsolidação em todos os casos, com tempo que variou de44 a 120 dias, com média de 91 dias e sem complicações.Consideram o método de fácil aplicação e com poucascomplicações, sugerindo seu uso como método definitivo, enão apenas temporário, no tratamento das fraturas diafisáriasdo úmero.

Barbieri et al.6 avaliaram seis pacientes submetidos atratamento com fixador externo monolateral para fraturasexpostas da diáfise do úmero. Em dois casos foi utilizadocomo método definitivo de tratamento, obtendo-se aconsolidação em nove e 12 semanas, respectivamente. Emtrês casos foi utilizado por período de oito a 12 semanas eposteriormente, substituído por uma imobilização gessadatipo “pinça de confeiteiro”. Em um paciente foi usado porquatro semanas e substituído por fixação interna com placa.Em dois casos tiveram infecção superficial no trajeto dospinos, noutro, retardo de consolidação e um caso de infecçãoprofunda. Consideram o fixador externo como o método deescolha no tratamento inicial de fraturas expostas e,ocasionalmente, adequado ao tratamento definitivo, noscasos de fratura cominutiva.

Hungria Neto et al.1 utilizaram um fixador AO tubo-tubo simplificado (montagem monolateral) em três pacientespolitraumatizados, dois com fraturas expostas e um comfratura fechada. A consolidação foi obtida nos três casos após

Figura 2-a. Fratura cominutiva de úmero por arma de fogo tratadacom fixador externo com evolução para pseudoartrose.

Figura 3-a. Pseudoartrose hipertrófica pós-fratura do úmero tratadacom placa e parafusos.

Nolla A e cols. Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar.

7-12.

Figura 2-b. Substituição do fixador por placa, parafusos e enxertoósseo com resolução do quadro.

Figura 3-b. Substituição do material de síntese por fixador externocom resolução do quadro.

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–10– REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

10, 12 e 20 semanas, respectivamente. No caso de fixaçãomais prolongada houve restrição da mobilidade do ombro.Consideram o método como sendo de boa indicação nasemergências, desde que sua instalação não agregue lesãotecidual, e a estabilização obtida seja suficiente.

Wisniewski e Radziejowski9 avaliaram 38 pacientescom fraturas diafisárias cominutas, provocadas por arma defogo e tratados com fixador externo dos tipos HoffmannR,OrthofixR e AOR. Obtiveram consolidação em 34 pacientesnum período que variou de 12 a 24 semanas. Em dois casosocorreu retardo de consolidação e em outros doispseudoartrose, sendo então submetidos à fixação internacom placa. Cinco pacientes tiveram infecção superficial notrajeto dos pinos, dois tiveram infecção profunda e um evoluiucom osteomielite. Consideram o método adequado notratamento das fraturas ocasionadas por projéteis de baixavelocidade.

Lenoble et al.10 apresentam os resultados de 39pacientes com fraturas diafisárias tratadas com fixadorexterno tipo HoffmanR. A consolidação óssea foi obtida em38 casos num período médio de 10,5 semanas. Um pacienteevoluiu para pseudoartrose e 14 tiveram consolidação emrotação interna do fragmento distal, com perda funcional daretroversão em média de 19 graus, em média. Seis pacientesnecessitaram reposicionamento do fixador devido a desviosecundário, evoluindo para consolidação. Consideram ométodo como de simples aplicação e alto grau de satisfação.Caso ocorram desvios dos fragmentos durante a evoluçãodo tratamento, estes são de fácil correção através damanipulação, sem necessidade de retirada do fixador.

O tempo de evolução de fraturas tratadas com fixadorexterno observado em nossa casuística foi semelhante aosencontrados por outros autores5,9 e discretamente superiorao tempo das fraturas tratadas com método conservador².

Acreditamos que isso ocorreu porque as fraturas tratadasnesta série em geral foram graves e cominutas.

O ganho de mobilidade se mostrou rápido e de grandevantagem em relação à placa, pois fraturas cominutasestabilizadas com fixador externo foram liberadasprococemente para mobilização.

Apesar da técnica se mostrar simples, deve-se termuita atenção em alguns detalhes de redução e colocaçãodos pinos, pois o úmero é circundado de uma abundânciade tecidos moles e estruturas neuro-vasculares importantes,como a artéria braquial, artéria braquial profunda e nervoradial, entre outras. Lesões nestas estruturas podem levar auma dificuldade técnica cirúrgica. O corredor de segurança(Guia) para inserção dos pinos, descrito por Green14, deveser utilizado. A técnica correta de instalação dos pinos deSchanz é essencial para que se evite a soltura precoce,evitando casos de pseudoartrose e infecção1,3,13.

CONCLUSÃOA consolidação radiológica nas fraturas de úmero onde

se utilizou o método de fixadores externos aconteceu em90% dos casos, tornando a fixação externa um métodoreprodutível, considerando-se a facilidade de uso, fixaçãomenos invasiva e mais biológica. Também houve umadiminuição das complicações e a possibilidade de iniciarmobilidade do ombro e cotovelo precocemente.

A fixação externa pode ser utilizada como tratamentodefinitivo, mas também pode ser utilizada como um métodoalternativo na falha de consolidação de outra modalidadede tratamento, como casos de pseudoartrose hipertrófica oufratura infectada.

O fixador externo é uma boa opção de tratamento tantona emergência bem como método de tratamento definitivopara as fraturas diafisárias do úmero.

Tabela 1. Resultados . Auto = Trânsito - FAF = Ferimentos com arma de fogo.

Nolla A e cols. Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar.

7-12.

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–11–REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

Summary

DIAPHYSEAL FRACTURES OF THE HUMERUS TREATEDWITH MONOPOLAR EXTERNAL FIXATION.

There are many methods for the treatment of Humeral shaft fractures, among them, theSarmiento method (screw and plate fixation, bone traction and external fixation). The purposeof this study is to evaluate the cases of humeral shaft fracture treated by external fixation.Twenty one fractures were treated with external fixation. The fixators used were the OrtofixÔand the Tubular AOÔ. To verify the bone consolidation, a Roentgenogram was performed in90,45% of the cases, average time 4,15 months (minimum 3 and maximum 7 months). Thefollow-up had na average of 88 months ( 64 to 112 months). Two patients got anpseudoartrosis. The mean age was 32,1 years. The clinical and radiologic results make this areproductible method, concerning the easiness of use and a less invasive and more effectivebiological fixation. This method, when used in a correct form, also reduce the complications,like radial nerve lesions and infection. Moreover, this method permits an early mobility ofthe shoulder and elbow, avoiding joint stiffness.

Keywords: Shaft, Humeral, External Fixation.

Nolla A e cols. Fraturas Diafisárias do Úmero tratadas com Fixador Externo Monopolar.

7-12.

Figura 4. Aspecto clínico pós-operatório.

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–12– REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

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Abagge M, Costa K. Uso de fixador externo modularAO simplificado no atendimento de emergência dospolitraumatizados. Rev Bras Ortop 1996;31(8):655-661.

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Artigo Original

O Hipotireoidismo Esquecido

Aline W. dos Reis, Anderson N. Rocha, Arthur S. Lazaretti, Carla R. Bürkle,Daniela T. Borges, Mateus F. Messinger, Paulo R. Weinert.

Ambulatório de Endocrinologia da Faculdade de Medicina, Universidade de Passo Fundo (RS).

Resumo

O hipotireoidismo pode apresentar-se com discreta ou nenhuma manifestação clínica,podendo passar desapercebido pelo médico. Alguns sintomas da doença como fadiga,fraqueza, sonolência, dificuldade de concentração, diminuição da memória e adinamiapodem ser confundidos com quadro unicamente depressivo e o paciente não receberreposição hormonal. Objetivou-se estudar a associação entre hipotireoidismo e os sintomascitados. Estudaram-se dezesseis pacientes consecutivas, encaminhadas ao consultório deendocrinologia com diagnóstico de hipotireoidismo, ainda sem tratamento hormonal. Aspacientes responderam a um questionário; quinze pacientes (94% da amostra) comdiagnóstico laboratorial de hipotireoidismo responderam sim a todos os sintomas em estudo.Os resultados desse estudo sugerem que pacientes com depressão sejam investigados parao diagnóstico de hipotireoidismo.

Unitermos: Depressão, hipotireoidismo, tireóide.

O quadro clínico de deficiência dos hormônios datireóide varia amplamente, podendo apresentar-se desdeuma gama enorme de sinais e sintomas até serassintomático.

Na população de mulheres adultas, especialmente,são comuns as queixas de fadiga, fraqueza, sonolência,dificuldade de concentração, diminuição da memória evontade de não fazer nada. Estas queixas podem serrotuladas como estresse, nervosismo, ansiedade,depressão ou envelhecimento e não serem investigadasadequadamente1. Às vezes, mesmo sem diagnóstico, estaspacientes recebem tratamentos os mais diversos, comoansiolíticos e antidepressivos.

Estas queixas são sugestivas de depressão; porém,o hipotireoidismo pode manifestar-se, unicamente, comessas mesmas manifestações clínicas2,3. Quando odiagnóstico é deficiência de hormônio da tireóide, nãoacompanhado de outra patologia, o tratamento comreposição hormonal é muito gratificante porque reverte,facilmente, os sinais e os sintomas da paciente4.

É provável que muitas mulheres com hipotireoidismoe apenas as manifestações clínicas descritas não recebaminvestigação e este distúrbio possa ser esquecido!

MATERIAL E MÉTODOSEstudaram-se todas as mulheres adultas, não

grávidas, encaminhadas ao ambulatório de endocrinologia,no segundo semestre de 2003, já com diagnósticolaboratorial de hipotireoidismo, ainda sem tratamento comhormônio da tireóide. Os exames laboratoriais haviam sidosolicitados para estas pacientes como rotina médica para oseu médico ginecologista. O critério usado para diagnósticoda doença foi TSH igual ou maior que 10 µUI/ml podendo oT4 livre estar normal ou baixo. A técnica laboratorial para oT4 livre e o TSH foi a quimioluminiscência. Todas pacientessubmeteram-se ao exame físico geral e da glândulatireóide. Aquelas elegíveis para o estudo responderam aum formulário, contendo as perguntas: sente fadiga,fraqueza, sonolência, dif iculdade de concentração,diminuição da memória, vontade de não fazer nada(paraserem respondidas sim ou não). Os resultados foramanalisados em estatística descritiva.

RESULTADOSA amostra ficou constituída de dezesseis mulheres

com idade entre 26 e sessenta anos. Todas tiveram odiagnóstico de hipotireoidismo primário através da dosagem

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laboratorial do TSH e do T4 livre. Os valores encontrados deTSH variaram entre 10,04 e 76,46 µUI/ml e o T4 livre entre0,37 e 0,96 ng/dl. Quanto às manifestações clínicas emestudo, apenas uma paciente (6% da amostra), comdiagnóstico laboratorial de hipotireoidismo, não respondeusim a todas as questões do formulário.

DISCUSSÃOManzoni e colaboladores4 estudaram 14 pacientes

com hipotireoidismo sub-clínico, TSH de 8,8 ±1,5 µUI/ml eum grupo controle com função da tireóide normal, TSH de1,1± 0,4 µUI/ml. Num primeiro momento, as pacientes foramsubmetidas a bateria de testes para avaliar depressão eencontrou-se diferença significativa entre os grupos. Numsegundo momento, as mulheres com TSH elevadoreceberam reposição hormonal com tiroxina para atingiremtaxas normais de hormônio da tireóide. Quando reavaliadas,as diferenças entre os grupos desapareceram, mostrandoque o hipotireoidismo leve seria o responsável pelasmanifestações clínicas de depressão.

Gold e colaboradores3 estudaram 250 pacientes,encaminhados a uma clínica psiquiátrica para tratamento dedepressão ou anergia; oito por cento apresentaram algumgrau de hipotireoidismo.

Neste estudo, encontrou-se forte associação entrehipotireoidismo e as manifestações clínicas. Curiosamente,a única paciente da amostra que não apresentava ossintomas em estudo chegou ao consultório com

hipotireoidismo primário bem estabelecido (TSH=76,46µUI/ml e T4livre=0,37ng/dl).

O hipotireoidismo, na população adulta, podeocorrer com ou sem aumento de volume da glândula5. Apresença de bócio leva o médico a investigar a tireóide,porém as pacientes deste estudo foram cuidadosamenteexaminadas e nenhuma apresentou crescimentoglandular.

As manifestações clínicas em estudo não sãoespecíficas de uma única doença; a literatura cita-as comosintomas de hipotireoidismo e, também, de depressão1,2.Deve-se ressaltar que estas duas doenças ocorremprincipalmente em mulheres, com o mesmo pico deincidência(aos cinqüenta anos de idade) e podem ocorrerjuntas ou de forma isolada6,7.

Existe um potencial viés na associação. Ohipotireoidismo, na população de mulheres adultas, temelevada prevalência e os sintomas em estudo podem ocorrertambém em mulheres sem doença da tireóide. Porém,quando a associação existe, o tratamento com hormônio datireóide auxilia muito na melhora da paciente4.

Na amostra estudada, encontrou-se forte associaçãoentre hipotireoidismo e os sintomas anteriormenteelencados. A quase totalidade das pacientes (94%) comdiagnóstico de hipotireoidismo apresentava asmanifestações clínicas. Sugere-se que, na população demulheres adultas que apresentam esses sintomas, deva serpesquisada a possibilidade de hipotireoidismo.

Idade TSH T4 Fadiga Fraqueza Sonolência Dif. conc. Dim. memória Avolia

52 10,72 0,78 Sim Sim Sim Sim Sim Sim53 13,75 0,77 Sim Sim Sim Sim Sim Sim53 17,84 0,7 Sim Sim Sim Sim Sim Sim50 10,04 0,96 Sim Sim Sim Sim Sim Sim41 33,82 0,65 Sim Sim Sim Sim Sim Sim39 76,46 0,37 Não Não Não Não Não Não57 55,21 0,65 Sim Sim Sim Sim Sim Sim60 14,48 0,92 Sim Sim Sim Sim Sim Sim39 17,81 0,71 Sim Sim Sim Sim Sim Sim42 15,1 0,82 Não Não Não Não Não Não58 32,16 0,66 Sim Sim Sim Sim Sim Sim43 27,62 0,69 Sim Sim Sim Sim Sim Sim26 19,26 0,76 Sim Sim Sim Sim Sim Sim57 14,1 0,81 Sim Sim Sim Sim Sim Sim50 16,4 0,9 Sim Sim Sim Sim Sim Sim46 17,2 0,87 Sim Sim Sim Sim Sim Sim

Reis AW e cols. O Hipotireoidismo Esquecido.

Tabela 1. Idade dos pacientes, níveis de TSH, T4 e sintomas referidos.

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Summary

THE FORGOTTEN HYPOTHYROIDISM

Hypothyroidism can be presented with few or without any clinical manifestations,which can be unrecognized by the physician. Some symptoms of the disease like fatigue,weakness, sleepiness, concentration difficulties, decrease in memory and lack of volition canbe confused with a unique depressive state and the patient not getting hormonal replacement.The objective of this study was to analyze the association between Hypothyroidism and thesymptoms above described. Sixteen consecutive patients who were oriented to consult anEndocrinologist with the diagnosis of Hypothyroidism without treatment were studied. Thepatients answered a questionnaire which asked: do you feel fatigue, weakness, sleepiness,concentration difficulties, decrease in memory and lack of volition to perform activities?Fifteen patients (94% of the sample) with a laboratorial diagnosis of Hypothyroidism answeredyes to all the studied symptoms. In the studied sample, we found an association betweenHypothyroidism and the symptoms inquired. This study suggests that patients who presentdepressive symptoms must be investigated for Hypothyroidism.

Keywords: Depression, Hypothyroidism, Thyroid.

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Reis AW e cols. O Hipotireoidismo Esquecido.

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Artigo Original

Perfil do Atendimento na Unidade de AVCdo Hospital São Vicente de Paulo

César Augusto L. Pires, Loane Rottenfusser, Robson Rottenfusser, Eliezer N. Dertelmann, Rui Portes da Silva Filho.Neurocentro, Hospital de Ensino São Vicente de Paulo, Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

As doenças vasculares cerebrais representam a principal causa não-traumáticade sequelas neurológicas do adulto. No Brasil ultrapassou as doenças cardiovasculares e ocâncer nas taxas de mortalidade. No ano de 2002 morreram 90 mil brasileiros de doençavascular cerebral e cerca de 60 mil de causas cardíacas. Acarreta enormes prejuízos pessoais,familiares e ao conjunto da sociedade. É imprescindível a atuação enérgica na conscientizaçãoda população quanto aos fatores de risco modificáveis. Por outro lado, as instituiçõeshospitalares de referência necessitam estruturarem-se para assistir os pacientes com doençavascular cerebral aguda como emergência médica, de forma coordenada e eficaz,organizando unidades de AVC. O Neurocentro coordenou a implantação da Unidade deAVC do Hospital São Vicente de Paulo(Projeto Neurovascular). Exibe-se a experiência doNeurocentro no atendimento de pacientes com doença vascular cerebral aguda, no períodode agosto de 2004 a julho de 2005. Os resultados mostram-se satisfatórios e semelhantesaos encontrados em centros de referência. São necessárias medidas educativas nacomunidade médica e leiga, especialmente em relação ao encaminhamento precoce para ocentro de referência regional.

Unitermos: Doenças das artérias cerebrais, embolia e trombose cerebral, infartocerebral, hemorragia cerebral, distúrbios cerebrovasculares

As doenças vasculares encefálicas são a terceiracausa de óbito em países desenvolvidos1,2. Conforme aOrganização Mundial da Saúde, cerca de 5 milhões depessoas morrem todos os anos devido a Acidente VascularCerebral(AVC). Morreram 162 mil americanos de AVC agudoem 2002. Existem 5 milhões e meio de americanos vivosque sofreram AVC. Ocorrem 700 mil casos a cada ano, sendoque 200 mil serão recorrentes. Estatísticas recentes mostramque no Brasil é a primeira causa de óbito2. Em 2002 morreram90 mil brasileiros devido ao AVC, enquanto o Infarto Agudodo Miocárdio determinou cerca de 60 mil óbitos. A cada 3mortes por eventos cardiovasculares duas ocorrem por AVCe uma por Infarto Agudo do Miocárdio. Apenas 30% dossobreviventes tem recuperação completa e, pelo menos, 60%dependerão de familiares ou cuidadores. Estima-se que amaioria dos indivíduos acometidos de AVC-agudo demore,em média, 12 horas para chegar a um hospital; ou,ainda,queapenas 30% dos casos sejam levados ao hospital nasprimeiras 6 horas(extrapolando as janelas terapêuticas parapossibilidade de tratamento trombolítico endovenoso-3 horasou intra-arterial-6 horas).

O AVC pode ser classificado quanto a etiologia,sendo de maior incidência os isquêmicos3. O AtaqueIsquêmico Transitório (AIT) difere-se do acidente vascular

cerebral (AVC) por haver melhora da sintomatologia ematé 24h, o que não ocorre no AVC isquêmico ouhemorrágico. O AVC compartilha vários fatores de risco coma doença arterial coronariana3, além de ser mais incidentena população do sexo masculino, com história prévia deAVC, AIT ou IAM e com história familiar de AVC3. Odiagnóstico clínico pode ser feito através dos sinais focaisneurológicos e quadro geral, sendo mais comuns asparesias, queda do nível de consciência, síncope, afasia,disfasia, disartria, disfagia, cefaléia, distúrbios visuais,vert igem, ataxia, vômitos e crise convulsiva,respectivamente1,3.

O AVC é uma emergência médica e deve ser conduzidoprontamente por equipe médica neurovascular. Recomenda-se o desenvolvimento de Unidades de AVC em todos oscentros hospitalares que sejam referência para esta doença1,2.A melhor compreensão dos mecanismos fisiopatológicos dacascata de lesão isquêmica e a determinação temporal daviabilidade da região de penumbra, bem como as evidênciasdo benefício do uso do ativador do plasminogênio tissularrecombinante (rtPA) nas primeiras três horas do infarto cerebralou, mais, recentemente, a trombólise intra-arterial, acarretarama necessidade de nova postura e estruturação para oatendimento aos pacientes com AVC.

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Projeto Neurovascular do Hospital São Vicente de PauloAs doenças cerebrovasculares agudas incluem-se

entre as principais causas de morte e invalidez. No Brasil, oacidente vascular cerebral (AVC) supera o Infarto doMiocárdio e, segundo dados do Datasus de 1997, são aprincipal causa de morte não-violenta entre os brasileiros. Amortalidade do AVC hemorrágico atinge 50% em 30 dias e62% em um ano. O AVC isquêmico determina mortalidadede 12% em 30 dias e cerca de 18% em 6 meses. A taxa deindivíduos mortos ou dependentes após um ano é de 50%no AVC isquêmico e 74% no AVC hemorrágico. Com o intuitode modificar essa realidade, uma série de iniciativas emvários centros nacionais e internacionais tem sidoimplementadas, buscando diminuir os graves efeitosdeletérios desta patologia. O modelo implantado no HospitalSão Vicente de Paulo, coordenado pelo Neurocentro, a partirde 2003, privilegia o paciente no sentido de proporcionar oatendimento de forma rápida e eficaz, utilizando recursoshumanos qualificados e a melhor infra-estrutura disponívelna instituição. O diagnóstico precoce, além de possibilitar aopção por medidas terapêuticas modernas, permite o manejoclínico otimizado na fase aguda, além de proporcionar oatendimento em área específica assistida por equipemultidisciplinar. São 3 equipes médicas distintas que prestamplantões de 24 horas, em escala específica para atendimentode AVC agudo. Seguem-se protocolos escritos e algoritmos,desde a admissão no setor de emergência, até a decisãoterapêutica(baseados nas diretrizes da Sociedade Brasileirade Doenças Cerebrovasculares-Academia Brasileira deNeurologia e da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia).

Unidade de AVCA unidade de AVC possui área física específica,

localizada no subsolo do hospital, junto ao Centro deCuidados Intensivos de Enfermagem (CCIE). Estãodisponíveis para internação 3 leitos. Cada leito dispõe demonitorização cardíaca e oximetria, além de acesso à redede oxigênio e ar comprimido. Os pacientes são assistidospor equipe multidisciplinar formada por médicos, enfermeirose técnicos de enfermagem, nutricionistas, fisioterapeutas e

Sintoma Prevalência (%)Paresia 90Red. Consciência 47,5Afasia 35Cefaléia 27,5Disfasia 25Distúrbios visuais 15Vômitos 15Paralisia facial 12,5Disfagia 12,5Disartria 12,5Síncope 7,5Ataxia 7,5Vertigem 5Convulsão 2,5

Tabela 1. Prevalência da sintomatologia

Fator de Risco Prevalência (%)HAS 82,5Cardiopatias 35Arteriopatias 35Hipercolesterolemia 27,5Diabetes mellitus 25Fibrilação atrial 25Hipertrigliceridemia 22,5Tabagismo 20AVC prévio 20AIT prévio 12,5Uso de álcool 5Distúrbio de coagulação 5IAM prévio 5História familiar 2,5

Tabela 2. Prevalência dos fatores de risco

fonoaudiólogos. São realizados treinamentos e semináriosde ensino aos profissionais envolvidos com a Unidade deAVC, objetivando proporcionar aquisição de conhecimentose motivação. A assistência médica, de enfermagem efisioterapia encontra-se, também, associada aos programasde ensino dos cursos respectivos da Universidade de PassoFundo (UPF).

Na Unidade de AVC estão estabelecidos protocolosespecíficos para o manejo clínico de pacientes com AVCagudo, inclusive com disponibilidade de usar métodosterapêuticos modernos e mais eficazes como a trombóliseendovenosa ou trombólise intra-arterial seletiva porcateterismo percutâneo (Neurointervenção vascular).

Os pacientes internados na Unidade de AVC sãoassistidos por médico neurologista e/ou neurocirurgião.Admitem-se, conforme disponibilidade de leito, pacientescom AVC agudo, isquêmico ou hemorrágico, confirmadospor exames laboratoriais e de neuroimagem, com até 24horas de evolução a partir do início dos sintomasneurológicos, que apresentem indicação de tratamentoconservador. A unidade não está equipada e não objetivaadmitir pacientes com necessidade de monitoração invasivae terapia intensiva como, por exemplo, ventilação mecânica.

São admitidos com alta prioridade pacientes comdiagnóstico confirmado de AVC isquêmico agudo, com atéseis horas de evolução desde o início dos sintomas e que,após avaliação pelo protocolo específico e obtenção deconsentimento informado receberão tratamento comtrombolítico endovenoso ou trombólise intra-arterial.

Em 2003 avaliou-se os primeiros seis meses deimplantação da Unidade de AVC – Projeto Neurovasculardo HSVP. Os resultados relacionados ao tempo de internaçãoe freqüência de complicações foram extremamente positivosquando comparados à literatura. Entre as complicaçõesverificadas, observou-se que as infecções estavam presentesdesde a admissão sendo, portanto, por definição,comunitárias. É importante salientar que o tempo médio deinternação na unidade foi de apenas 5,5 dias e 78,6% dospacientes tiveram alta diretamente para o domicílio,reduzindo-se riscos e custos. O número de pacientes que

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receberam tratamento trombolítico endovenoso foi reduzidoem função do pequeno contingente de pacientes admitidosdentro da janela terapêutica (3 horas), já que não ocorreuatraso intra-hospitalar como causa da não realização detrombólise. Possivelmente, com a melhora do nível deconhecimento da comunidade sobre as manifestaçõesiniciais do AVC e a conscientização quanto a necessidadede imediata procura por um centro especializado dediagnóstico e tratamento, deve aumentar o número debeneficiados por esta opção terapêutica.

O Projeto Neurovascular do Hospital São Vicente dePaulo(HSVP), coordenado pelo Neurocentro, teve o objetivode propor o desenvolvimento de um Centro de Referênciapara o atendimento de Doenças Vasculares Cerebrais, comrecursos humanos, infra-estrutura e organização para tratarpacientes com AVC agudo, rápida e eficientemente. Osobjetivos iniciais foram plenamente atingidos, sendo o HospitalSão Vicente de Paulo o primeiro hospital do interior do estadodo Rio Grande do Sul a contar com estruturação de Unidadede AVC, conforme as exigências técnico - científicaspreconizadas pela Sociedade Brasileira de DoençasCerebrovasculares. A sistematização do atendimento do AVCagudo, desde a admissão no Setor de Emergência até ainternação na Unidade de AVC, foi adequadamente assimiladapelo pessoal médico e equipes multi-profissionais de apoio,ensejando atividade coordenada e eficaz. Os pacientesadmitidos foram adequadamente assistidos, não severificando complicações graves nos poucos tratamentostrombolíticos realizados (as indicações seguiram rigidamenteos protocolos). O advento da Neurointervenção vascularagregou valor inestimável aos recursos diagnósticos e,especialmente, terapêuticos, com a perspectiva de utilizaçãoda trombólise intra-arterial percutânea por cateterismo seletivo(diminuindo os riscos da trombólise endovenosa e ampliandoa janela terapêutica para 6 horas). Também, oportunizatratamento diferenciado de outras patologias vasculares, dealta morbi-mortalidade, como aneurismas ou mal-formaçõesvasculares cerebrais. Os recursos humanos e a infra-estruturaobtida permitem a instituição situar-se na classificação daSociedade Brasileira de Doenças Cérebro - Vasculares comoCentro de Referência nível A, para diagnóstico e tratamentode doenças encéfalo-vasculares.

METODOLOGIAEstudo descrit ivo e retrospectivo que incluiu

pacientes internados na Unidade de AVC do Hospital SãoVicente de Paulo, aos cuidados da Equipe do Neurocentro,no período de agosto de 2004 a julho de 2005. Os critériosde inclusão foram idade entre 18 e 90 anos, AVC agudo,escala NIHSS 4 a 22, indicação de tratamento conservador.Através de busca ativa nos prontuários dos pacientesarrolados, analisaram-se as variáveis: sintomatologia,fatores de risco, comorbidades, tempo de internaçãohospitalar, tempo entre avaliação neurológica e exames deneuroimagem, uso de trombolítico; na formulação doquestionário, valeu-se do Primeiro Consenso Brasileiro doTratamento da Fase Aguda do Acidente Vascular Cerebralde setembro de 2001.

RESULTADOS E DISCUSSÃOAvaliaram-se 40 pacientes, com idade média de 67 ±

13 anos [40;87] com prevalência maior do sexo feminino(62,5%). O tempo de avaliação clínica foi de 14 ± 25h [1;97]e neurológica de 17 ± 23h [1,5;97], pois uma paciente foiatendida com 4 dias de evolução. Cerca de 85% dosdiagnósticos clínicos foram de AVC isquêmico. Quanto aapresentação, 84% tiveram início súbito da sintomatologia e60% apresentaram evolução na chegada ao hospital compersistência de sinais. Conforme observa-se na Tabela 1, aparesia foi o sintoma mais prevalente, em cerca de 90% dospacientes. Entre os fatores de risco, encontrou-se a HAScomo a mais prevalente (acima de 80%). Como achadotomográfico mais comum, encontrou-se hipodensidade noterritório da artéria cerebral média (aproximadamente 25%),seguido de infarto capsulo-ganglionar, doença vascularcerebral difusa, hemorragia subaracnóidea, infarto lacunarantigo, infarto do tronco cerebral e infarto cerebelar. Nãoforam encontrados alterações patológicas significativas em17,9% dos exames de neuroimagem, achado emconformidade com a literatura5,6, já que o AVC pode demoraraté 72h para se traduzir em tomografia computadorizada.Em nenhum dos pacientes da amostra em foco foi realizadatrombólise, sendo que 57,5% dos pacientes ocorreu exclusãopor perda da janela terapêutica e 42,5% por contra-indicaçãoa terapia trombolítica. Verificou-se ocorrência de AIT em12,5% dos casos, corroborando-se com a literatura queaponta ocorrência de até 26%. O risco de AVC após AIT é de8% no primeiro mês, 13% durante o primeiro ano e até 29%em cinco anos. Os pacientes de maior risco são idosos, AIT"crescendo", doença carotídea severa, cardiopatia, fibrilaçãoatrial, fonte cardioembólica definida e AIT hemisférico1,2.

Como complicação clínica mais comum encontrou-sebroncopneumonia(33%), seguido de conversão hemorrágica,sepsis, infecções do trato urinário, bexiga neurogênica e outrasinfecções, respectivamente. O tempo de permanência naUnidade de AVC foi de 5,7±3,9 dias, com taxa de mortalidadede 15%. Cerca de 75% dos pacientes apresentaram melhorasintomática no momento da alta.

O AVC agudo isquêmico(cerca de 85% dos casos) éuma síndrome de múltiplas etiologias e manifestaçõesclínicas variáveis. É possível identificar-se os pacientes comrisco elevado de AVC isquêmico(Figura 1). O principal fatorfisiopatogênico é a aterosclerose de artérias de grande epequeno calibre. A doença aórtica proximal pode estarenvolvida como fonte embolígena aterogênica. Gravesestenoses ou oclusões ateroscleróticas e tromboseassociada ou embolia artério-arterial podem determinarrepercussões isquêmicas ao encéfalo. O microateroma, alipo-hialinose e outras doenças oclusivas das pequenasartérias cerebrais penetrantes determinam infartos lacunaressubcorticais. Cerca de 20% dos AVCs isquêmicos devem-seà embolia cardiogênica, especialmente fibrilação atrial.Ainda, cerca de 30% dos AVCs isquêmicos permanecemsem etiologia definida (criptogênicos), ensejando anecessidade de considerar etiologias menos frequentes ou,ainda, a serem desvendadas7,8,9,10.

O AVC hemorrágico(cerca de 15%) encontra-se

Pires CAL e cols. Perfil do Atendimento na Unidade de AVC do Hospital São Vicente de Paulo.

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relacionado com a doença hipertensiva, na maioria doscasos. Hemorragias em núcleos da base e/ou cápsula internaou lobares são mais comuns. A hemorragia subaracnóideatem uma incidência anual de até 20 casos/100 mil habitantes;15% dos pacientes morrem em nível pré-hospitalar, 10%dentro das primeiras 24h, geralmente em razão deressangramento de aneurisma cerebral(85%). A mortalidadegeral é de até 60% nos primeiros 30 dias e 50% dossobreviventes apresentarão déficit neurológicoincapacitante. Os objetivos terapêuticos principais são aprevenção do ressangramento e do déficit neurológicoisquêmico tardio1,2,3.

Usualmente o AVC agudo tem etiologia conhecida,decorrendo de fatores de risco bem estabelecidos. Diversosestudos internacionais, como o de Framingham,demonstraram o inquestionável papel da doençahipertensiva, tabagismo, dislipidemias, diabetes mellitus eidade como fatores de risco independentes. A hipertensãoarterial sistêmica é o principal fator implicado. Os fatorespredisponentes incluem a obesidade, sedentarismo, históriafamiliar precoce de AVC ou doença cardiovascular, etnia efatores psicossociais. Outro grupo de fatores de riscocondicionais, com papel provável na aterogênese, incluihipertrigliceridemia, lipoproteína, homocisteína, LDLpequena e densa, fibrinogênio e fatores inflamatórios.Possivelmente o climatério possa ser fator de riscoindependente para mulheres3,7,8.

Evidências recentes sugerem que até 15% dosacidentes vasculares cerebrais que ocorrem em indivíduosabaixo dos 45 anos estejam relacionados à migrânea comaura(infartos migranosos). Mulheres jovens com migrâneaque fumam tem um aumento de aproximadamente 10 vezesno risco de AVC e aquelas com migrânea em uso decontraceptivos orais o risco é de quatorze vezes maior queno grupo controle4. Curiosamente, na presente série, os doiscasos de infartos migranosos ocorreram em homens.

Apenas o controle da doença hipertensiva diminuiu oAVC em 42%, o controle do colesterol em cerca de 30% e a

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retirada do fumo em até 70%. Dados americanos indicamque apenas 25% dos portadores de hipertensão arterialapresentam doença controlada3. A situação geral entre osbrasileiros, quanto a estes fatores de risco, devem sersemelhantes. São necessárias ações enérgicas deconscientização da população quanto a relação direta dosfatores de risco e as doenças vasculares cerebrais ecardiovasculares.

CONCLUSÕESA Unidade de AVC do HSVP e o atendimento

emergencial aos pacientes estão funcionando próximo aosparâmetros desejados, podendo haver melhora no tempode avaliação neurológica e no intervalo entre a avaliaçãoinicial médica e o exame de neuroimagem. Há uma grandenecessidade de educação popular quanto aos fatores derisco e sintomatologia do AVC, a fim de que a populaçãoprocure o atendimento competente em tempo de avaliar-sea possibil idade de serem uti l izadas as técnicas detrombólise endovenosa ou intra-arterial com rtPA. Alémdisso, os cuidados e intervenções precoces, em unidadede AVC, asseguram manuseio adequado do AVC agudo.Em relação às políticas de saúde pública, urge o controleda HAS, dislipidemia e cessação do tabagismo, por seremfatores de risco modificáveis e de elevada relevância napatogênese do AVC agudo. Faz-se, também, necessáriaconscientização da comunidade médica quanto asvantagens do manejo e tratamento de AVC-agudo nasunidades de atendimento especial, para que os pacientessejam prontamente encaminhados. Os casos graves de AVCagudo(sinais focais densos, hipertensão intracraniana,comatosos, etc), com elevada morbi-mortalidade per se,costumam ser encaminhados rapidamente. Todavia, oscasos leves e moderados(escala de AVC do NationalInstitute of Health-USA entre 4 e 22), especialmente comAVC agudo isquêmico, seriam os maiores beneficiados, emrazão de diagnóstico e conduta terapêutica em tempo hábilde socorrer o tecido cerebral isquêmico, reduzindo a áreado infarto, prevenindo e solucionando complicaçõesprecocemente e, então, reduzindo sequelas e amortalidade.

Figura 1. Risco anual de AVC ou morte entre pacientes de váriossubgrupos de alto risco. Adaptado de Albers GW et al. ApudWilterdink e Easton.

Risco elevado Risco pequenoFibrilação atrial Prolapso da válvula mitralEstenose mitral Calcificação do anel mitralPróteses valvares mecânicas Forame oval patenteIAM recente Aneurisma do septo atrialTrombo em ventr.esquerdo Estenose aórtica calcificadaMixoma atrial Filamentos da valva mitralEndocardite infecciosaMiocardiopatias dilatadasEndocardite marântica

Tabela 3. Fontes Cardioembólicas(modificado de Albers GW et al.7)

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Summary

PATIENTS PROFILE AND ASSISTENCE IN STROKE UNIT OFSÃO VICENTE DE PAULO HOSPITAL, PASSO FUNDO(RS), BRAZIL.

The cerebral vascular disease represents the principal cause of neurological non-traumatic sequelae in adults. In Brazil overshoted cardiovascular disease and cancer inmortality rates. In 2002, 90.000 brazilians died of stroke and 60.000 of cardiac diseases. Itcause significant personal, familial and society impairment. Is necessary energic actions incomunity, about modificable risk factors. The reference Hospitals needs disposable structureto assistence patients with stroke as a medical emergency and that have a Stroke Unit. Theauthors show the experiences in patients care with stroke, during one year(august 2004-july2005). The results showed satisfactory and similar with others reference centers, for diagnosisand treatment of stroke. Is necessary educationals actions for the community and healthprofessionals, especially for precocious assistence in regional reference center.

Keywords: Cerebral artery diseases, cerebral emboly and trombosis ,cerebral infarction, cerebral haemorragy, cerebrovascular disturbances.

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Pires CAL e cols. Perfil do Atendimento na Unidade de AVC do Hospital São Vicente de Paulo.

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Orientações fisioterapêuticas aos cuidadoresde crianças portadoras de paralisia cerebral

Cristiane dos Santos Paliga & Janaína Cardoso Costa.Curso de Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Objetivou-se verificar e demonstrar a importância das orientaçõesfisioterapêuticas aos cuidadores das crianças portadoras de paralisia cerebral, nomanuseio e como coadjuvante no tratamento e desenvolvimento neuropsicomotor;também observar as dificuldades enfrentadas pelos cuidadores ao manusear acriança portadora de paralisia cerebral. O estudo foi desenvolvido na APAE deErechim, tendo seu início em abril e término em agosto/2005; seis cuidadores foramincluídos na amostra. Os encontros foram realizados três vezes por semana, comduração de uma hora; enquanto a criança estava na sessão de fisioterapia, oscuidadores participaram dos encontros. Realizou-se a avaliação fisioterapêutica eos cuidadores receberam um questionário com questões referentes aos cuidados navida diária da criança, salientando dúvidas e inseguranças em manusear a criançadiariamente. Após, foi elaborado um programa de orientações fisioterapêuticas,utilizando-se um folder, com figuras ilustrativas, com as posições e maneiras corretasde manusear a criança em seu âmbito familiar. Ao término desta pesquisa, pôde-seobservar melhora significativa em relação ao manuseio dos cuidadores para com acriança portadora de paralisia cerebral, além de contribuir positivamente para odesenvolvimento motor de tais crianças.

Unitermos: Paralisia cerebral, orientações, fisioterapia.

Paralisia Cerebral é o termo usado para designar umgrupo de distúrbios motores não-progressivos, porémsujeitos a mudanças, resultante de uma lesão no cérebronos primeiros estágios do seu desenvolvimento1.

É uma desordem do movimento e da postura devidoa um defeito ou lesão no cérebro imaturo. A lesão cerebralnão é progressiva e provoca debilitação variável nacoordenação da ação muscular, com resultante incapacidadeda criança em manter posturas e realizar movimentosnormais. Esta deficiência motora central está freqüentementeassociada a problemas da fala, visão e audição, com váriostipos de distúrbios da percepção, um certo grau de retardomental e/ou epilepsia2,3.

Ter que cuidar de uma criança com paralisia cerebral

é origem de muitos problemas para os pais que exibiamexpectativa e ansiedade pela chegada de uma criançanormal. Uma criança excepcional, do ponto de vista físicoou intelectual, gera muitos transtornos pela necessidade deadaptação a um fato indesejado. É importante que os paisse conscientizem de que rejeitar ou ignorar aexcepcionalidade de uma criança apenas irá aumentar oproblema4.

Sem ajuda especializada, muitos pais angustiadostendem a amenizar sua angústia deturpando a relação coma criança deficiente e com o restante da família. A aceitaçãodo problema e o estabelecimento de relações satisfatóriasentre a criança e a família permitem que sua personalidadese desenvolva em um ambiente mais favorável5.

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MATERIAL E MÉTODOSO estudo foi desenvolvido na APAE de Erechim(RS),

sendo que seis cuidadores foram incluídos na amostra,responsáveis por crianças com idade entre zero e quatroanos(quatro portadoras de quadriplegia espástica, umahemiplegia espástica e outra quadriplegia atetóide). Osencontros foram realizados três vezes por semana, comduração de uma hora, sendo que, enquanto a criança estavana sessão de fisioterapia, os cuidadores participaram dosencontros.

No primeiro contato com os responsáveis pelascrianças, os cuidadores receberam o termo de consentimentolivre e informado, contendo as informações à respeito dapesquisa, seus benefícios, independência para desistir departicipar a qualquer momento, sem qualquer prejuízo oudanos. Posteriormente, realizou-se a avaliaçãofisioterapêutica e os cuidadores receberam um questionáriocom questões referentes aos cuidados na vida diária dacriança, salientando dúvidas e inseguranças dos mesmosem manusear a criança diariamente.

No decorrer dos encontros, os cuidadores foramquestionados quanto à dificuldades encontradas no dia-diapara manusear a criança. Após, foi elaborado um programade orientações fisioterapêuticas, utilizando-se um folder, comfiguras ilustrativas, com as posições e maneiras corretas demanusear a criança em seu âmbito familiar.

De acordo com os dados obtidos no questionário, amaior dificuldade encontrada pelos mesmos em manuseara criança tornou-se evidente ao vestir e no transportar. Nodecorrer dos encontros, de acordo com as dificuldadesapresentadas pelos cuidadores, foi elaborado um programade orientações fisioterapêuticas, utilizando-se um folder,contendo figuras ilustrativas, com as posições e maneirascorretas de manusear a criança portadora de paralisiacerebral diariamente, em seu âmbito familiar.

Após um período de cinco meses, de adaptação doscuidadores às orientações, utilizou-se novamente umquestionário verbal, através de uma entrevista informal, parasaber por parte dos cuidadores sua sincera opinião sobreas orientações fornecidas e se houve alguma contribuiçãopara o desenvolvimento neuropsicomotor da criança, no seuponto de vista, sem que a pergunta influenciasse suaresposta.

RESULTADOS E DISCUSSÃOAo término desta pesquisa, foi possível observar e

comprovar a real contribuição das orientações fisiotera-pêuticas ao desenvolvimento neuropsicomotor da criançaportadora de paralisia cerebral.

Em cinco meses de orientações passadas aoscuidadores e seguidas no ambiente familiar, todas ascrianças obtiveram melhora do seu quadro clínico, variandoconforme o seu grau de comprometimento neurológico.

Os cuidadores obtiveram consciência de que o tempode sessão da fisioterapia é importante, porém insuficientepara obter ganhos ou, pelo menos, fornecer uma qualidadede vida à criança. Compreenderam, também, que o manuseiocorreto da criança em seu ambiente familiar e a fisioterapia

são fatores que devem estar sempre juntos, com o mesmoobjetivo: a qualidade de vida da criança, respeitando suaslimitações.

A intervenção precoce ou essencial é um tipo deprevenção secundária, cujos objetivos são evitar e/ouamenizar distúrbios do desenvolvimento neuropsicomotor,bem como a identificação dos sinais iniciais provocados pelalesão. O tratamento precoce é indicado como uma forma deaumentar a interação do organismo com o ambiente, obtendorespostas motoras próximas ao padrão de normalidade eprevenindo a aprendizagem de padrões anormais demovimento e postura6,7.

O termo “essencial” determina que o início daintervenção ocorra antes do sexto mês de idade, preferen-cialmente no primeiro trimestre, antes que seja estabelecida,por completo, a patologia, especialmente nos casos deParalisia Cerebral9. Portanto, a intervenção deve serrealizada logo que sejam notados os primeiros desvios nodesenvolvimento, de forma a prevenir a adoção decomportamentos sensório- motores não-funcionais,determinados pelas alterações tônicas e sensoriais10. Alémdisto, quanto mais imediata a intervenção, maiores serão asprobabilidades de habilitação da criança com paralisiacerebral devido a este ser o período de maior plasticidadecerebral11,12.

De acordo com os resultados obtidos, pode-seperceber a importância do diagnóstico médico preciso, a fimde detectar precocemente a existência de alterações nodesenvolvimento da criança, para posterior intervençãofisioterapêutica, seja como tratamento e/ou sob orientaçõesaos cuidadores. Se a criança com paralisia cerebral nãoreceber tratamento adequado precocemente, suas fasesmotora, intelectual e psíquica serão estimuladas depois domomento ideal para isto e, inevitavelmente, se desenvolveráabaixo de suas possibilidades5,6.

Contraturas e deformidades também atingirão acriança com maior intensidade e freqüência caso ela nãoseja estimulada pelos terapeutas nos momentos apropriadose num ritmo constante. O amadurecimento do sistema nervosoacontece, principalmente, antes dos sete anos de idade,sendo que os primeiros três anos são os mais importantes7.

O manuseio é um termo aplicável a comportamentosseqüenciais, com objetivos definidos para a obtenção derespostas relacionadas ao ajustamento. No entanto, aeficiência do manuseio em crianças com alteraçõesposturais, de equilíbrio, força e movimento, como ocorre naparalisia cerebral, pressupõe procedimentos definidos eorganizados, para que a resposta não ocorra distorcida8,9.

É de grande ajuda orientar e esclarecer aos pais,quanto à posições do corpo adotadas pela criança durante odia e durante o sono. A maneira correta de manipular acriança, ao carregar, dar banho, trocar, etc.; ao ser aprendidabeneficia a criança e é mais um ponto de auxílio em seudesenvolvimento.A fisioterapia exerce papel fundamental notratamento de crianças portadoras de paralisia cerebral11-12.

O fisioterapeuta ajuda os pais alertando para anecessidade, quando preciso, de uma consulta aoortopedista; é capaz de fornecer orientação quanto à

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conveniência ou não de cadeira de rodas, colchões ou redesque estejam sendo usadas e avaliar se estão ajudando ouprejudicando a criança14.

CONCLUSÃOApós a análise dos resultados e discussões, pode-se

concluir que as orientações fisioterapêuticas desempenhamum fator imprescindível para a melhora no desenvolvimentodas crianças com paralisia cerebral, sendo que quanto maisprecocemente os cuidadores colocarem em prática asorientações, maior será a chance de a criança obter umaqualidade de vida, com suas limitações e incapacidadesreduzidas diariamente14,15.

Com o tratamento adequado e com o devido apoioemocional por parte dos pais, manuseando a criançacorretamente, pode-se evoluir muito no tratamento e na

recuperação da criança com paralisia cerebral.Não épossível afirmar qual a capacidade de evolução de umacriança comprometida, pois não se pode saber com exatidãosuas potencialidades, percepções, sentimentos epensamentos. Entretanto, é possível afirmar com certeza que,após a confusão inicial da descoberta da afecção, é possívelintegrar agradavelmente as crianças portadoras de qualquerquadro ao nosso cotidiano e torná-las felizes17.

Diante da importância atribuída às orientaçõesfisioterapêuticas e à quantidade ínfima de trabalhos depesquisa realizados sobre tal abordagem, torna-serelevante a realização de outros estudos semelhantes,focalizando o tripé terapêutico criança-família-fisioterapia,projetando, desta forma, maior austeridade e eficácia notratamento holístico da criança portadora de paralisiacerebral19.

Summary

PHYSIOTHERAPY ORIENTATION TO THE CARETAKERSOF CHILDREN WITH BRAIN PARALYSIS.

The aim of this study,was to verify and to demonstrate the importance of thephysiotherapeutic orientation for the caretakers of children having brain paralysis, handlingthem and as a helper in the treatment and psychomotor development as well as to observethe difficulties faced by the caretakers to handle children having a brain damage. This studywas developed at APAE in Erechim, beginning in April 2005 and ending in August 2005,where six caretakers were included in the samples. Meetings were performed three times aweek, with the duration of one hour, where, while a child was in a section of physiotherapy,the caretakers attended the meetings. Then, a physiotherapeutic evaluation was carried outand,the caretakers received a questionnaire with questions referring to the daily care ofchildren, pointing out doubts and insecurities that they have, to take care of children. Afterthat, a program of physiotherapeutic orientations was elaborated, using a folder, withillustrative pictures, with the positions and correct manners to handle a child in a homeenvironment. In the end of this research, it was possible to observe a significant improvementreferring to the handling of the children by the caretakers, besides positively contributing tothe motor development of these children.

Uniterms: Brain Paralysis, Orientations, Physiotherapy.

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Relação Goniometria do Arco Medial doPé e Pressão Plantar em Baropodometria

Cristina Santin Bilibio1, Daniela Bertol2, Hugo Tourinho F°3.Serviço de Fisioterapia1, Residência de Fisioterapia, Instituto de Cardiologia, Porto Alegre(RS)2,

Faculdade de Educação Física e Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo(RS)3.

Resumo

O desenvolvimento do arco longitudinal medial (ALM) foi o primeiro passo na evoluçãodo homem para a postura bípede e forneceu aos pés a capacidade de absorver os impactoscausados pela postura ereta. Isto têm feito do ALM objeto de interesse clínico e de pesquisa.Assim, buscou-se verificar a relação entre o teste de goniometria do ALM do pé com o examedas pressões plantares por baropodometria computadorizada. Selecionou-se amostrarandomizada de dez indivíduos adultos, com idades entre 20 e 30 anos e IMC entre 18,5 e30. Mensurou-se goniometricamente o ALM através do ângulo obtuso entre a primeiraarticulação metatarso-falangeana, porção medial do navicular e porção medial do maléolomedial. Para a baropodometria computadorizada utilizou-se o F-Scan versão 4.22 Windows95 Tekscan®, Boston, MA. Pode-se verificar que a goniometria do ALM do pé apresentarelação regular (r = -0,43; p£0,05) quando comparada com meios mais precisos demensuração, como o Modified Arch Index calculado através da baropodometria, de formaque deve ser utilizada com cautela.

Unitermos: Pés, arco medial do pé, goniometria, baropodometria.

Uma das mais importantes características estruturaisdo pé é o arco longitudinal medial e por esse motivo váriastécnicas têm sido propostas para avaliar os tipos de arcosplantares. Sabe-se que a aparência visual do pé não é tãoimportante como suas funções posturais e, neste contexto,cabe ressaltar que estudos têm demonstrado que pés comarcos aumentados ou reduzidos desenvolvemdiferentemente suas funções1. Nesse sentido, o métodoclínico mais usado para avaliar o arco longitudinal medialdo pé é mensurar a distância entre um ponto do navicular oudo tálus e o solo com o indivíduo em postura ereta. Porém,este método apresenta algumas desvantagens, tais como, asubjetividade da palpação e a experiência do avaliador. Abusca de um método que atingisse medidas precisas ereprodutíveis da forma e função do pé foi sempre umaconstante, pois os meios existentes mostravam-se úteis,porém inadequados e obsoletos para uma avaliaçãoseqüencial ou para ser comparada por diferentesobservadores, pois estes, tendo a mesma visão poderiamter diagnósticos diferentes2.

Segundo Williams e McClay3 dentro das experiênciasclínicas utilizadas na classificação dos tipos de pé, a maiscorriqueira é a classificação visual, porém é muitoinconsistente para que todo um tratamento seja baseado na

mesma.Na presente pesquisa comparou-se a goniometria do

arco longitudinal medial do pé, método fácil e bastantedifundido, com o exame de baropodometria computadorizadaque é um método que permite a mensuração das pressõesexercidas em vários pontos anatômicos da superfície plantarcom medidas precisas sendo capaz de realizar umaavaliação objetiva por meio de sensores pressóricos de altasensibilidade2. Por meio da comparação entre ambos osmétodos procurou-se verificar a validade da goniometria namensuração do arco longitudinal medial do pé.

MATERIAIS E MÉTODOSRealizou-se estudo descritivo observacional e

comparativo, considerando-se que, foram analisados dadosobjetivos compostos por duas avaliações específicas: agoniometria do arco longitudinal medial do pé e abaropodometria das pressões plantares por meio do cálculodo Modified Arch Index (MAI).

A amostra foi composta por dez indivíduos adultosjovens, com idades entre 20 e 30 anos, sendo funcionários ealunos da Faculdade de Educação Física e de Fisioterapiada Universidade de Passo Fundo, com índice de massacorporal (IMC) entre 18,5 e 30, sendo quatro do sexo

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masculino e seis do sexo feminino.Após terem assinado o termo de consentimento os

indivíduos foram encaminhados ao Laboratório I deBiomecânica da Faculdade de Educação Física e Fisioterapiada Universidade de Passo Fundo, onde realizaramavaliações em três momentos distintos.

Primeiramente foram submetidos à entrevista e examefísico onde foram aferidos os dados necessários parainclusão do indivíduo na amostra, ou seja, ter idade entre 20e 30 anos, pois nesta idade segundo Palmer e Epler [4] háum platô na ADM, e, ter IMC entre 18,5 e 30, pois acima de30 é considerado obesidade, além de não ter histórico delesões graves em membros inferiores.

Em um segundo momento realizou-se a avaliaçãogoniométrica, por meio de um Goniômetro Universal da marcaTrident® (figura 1). Durante a avaliação goniométrica osindivíduos ficaram descalços, vestindo bermuda e camiseta,permanecendo em bipedestação estática ao nível do solo,com os pés afastados quinze centímetros entre si.

Foi realizada palpação para localização dasestruturas que segundo Hunt, Fahey e Smith5 delimitam oângulo do arco longitudinal medial do pé e a marcação destespontos com lápis dermográfico para facilitar a mensuração(figura 1). Estes autores definem o ângulo do arco medialcomo o ângulo obtuso formado pela porção mais medial domaléolo medial, tuberosidade do navicular e linha articularmédia da cabeça do primeiro metatarso.

Figura 1. Marcações das medidas do ângulo do ALM do pé.

Foram realizadas três mensurações do ângulo doALM do pé e anotadas, e para fins estatísticos foi utilizado ovalor intermediário entre as três medidas. Tais mensuraçõesforam realizadas em ambos os membros para posteriorestudo comparativo.

A partir do exame goniométrico foram obtidos valoresem graus referentes ao ângulo do arco longitudinal medial,que de acordo com Hunt, Fahey e Smith5 classificam-se em:pé plano para valores = que 120o; pé normal para valoresentre 120o e 150o; e pé cavo para valores = 150o.

Após a avaliação goniométrica realizou-se aavaliação baropodométrica, por meio de um sistema debaropodometria computadorizada - F-Scan versão 4.22Windows 95 Tekscan®, utilizando-se palmilhas com sensoresde pressão. Para a avaliação baropodométrica, ainda

descalços, os indivíduos permaneceram em pé sobre aspalmilhas centradas, com quinze centímetros de distânciaentre elas, em uma superfície nivelada[6,7,8,9].Permaneceram nesta posição por dez segundos, temponecessário para o computador registrar os dados.

A partir do exame baropodométrico foi calculado oModified Arch Index (MAI) de cada pé de todos os indivíduos,já que esta é uma das formas mais precisas para classificaro arco plantar e é também a que apresenta maior correlaçãoestatisticamente significativa quando comparado com osoutros parâmetros descritos em literatura[1]. O Modified ArchIndex (MAI) é definido como a proporção da pressão do terçomédio em relação à pressão total, excluindo os dedos[1].Cavanagh e Rodgers[6] definiram os critérios paraclassificação dos tipos embasados nos valores do MAI e AIcomo arco medial aumentado MAI < 0,21, arco medial normal0,21 £ MAI £ 0,26, e arco medial diminuído MAI ³ 0,26.

Qualidade dos DadosPara verificar a fidedignidade e a objetividade da

avaliação goniométrica, foi realizada avaliação goniométricaem uma amostra a parte, a fim de realizar o cálculo do errointra (fidedignidade) e interavaliador (objetividade).

Para tal análise foi selecionada uma amostra de dezindivíduos aleatória e diferente da amostra utilizada noestudo. Foi realizada três vezes a mesma medida utilizadano estudo do ALM em cada pé de todos os indivíduos, sendoutilizado para fins estatísticos o valor intermediário. Cadaavaliadora mediu os dez indivíduos num mesmo dia em horasdistintas, para reduzir as variáveis de temperatura e umidadedo ar que, segundo a literatura, tem grande influência nacorreta marcação dos pontos de referência, logo, no valorfinal encontrado [10].

Os resultados obtidos, na verificação do Erro Técnicoda Medida(ETM) da mensuração goniométrica, conformetabela 1 indicaram um r = 0.96, o que corresponde a um errode para 1,86ú para o pé direito, e, um r = 0.92, o quecorresponde a um erro de 2.19ú para o pé esquerdo (p =0,05). Indicando uma correlação muito forte entre os dadosavaliados por ambas as avaliadoras, após terem sidodevidamente treinadas.

Tabela 1. Tabela do Cálculo do Erro Técnico da Medida (p =0,05).

Pé D Avaliador 1

Pé D Avaliador 2

Pé E Av 1

Pé E Av 2

Av1 X Av2 Pé D

Av1 X Av2 Pé E

PrimeiraAvaliaçãoX = 136,44°

Dp = 8,8°X = 138,66°

Dp = 8,3°X = 141,77°Dp = 8,07°

X = 141,33°Dp = 7,48°

-

-

SegundaAvaliaçãoX = 136,44°Dp = 7,97°X = 137,55°Dp = 7,29°X = 141,44°

Dp = 8,6°X = 141,11°Dp = 8,9°

-

-

r

0,96

0,95

0,97

0,96

0,96

0,92

ETM

1,58°

1,82°

1,37°

1,87°

1,86°

2,19°

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RESULTADOS E DISCUSSÃOA tabela 2 apresenta a média dos valores da

mensuração do arco longitudinal medial (ALM) do pé pelagoniometria, e, valores de Modified Arch Index (MAI)calculado através da baropodometria dos pés, direito eesquerdo, dos dez indivíduos que participaram da amostra.

Amostra Baropometria GoniometriaMAI

Média 0,153 137,95Desvio Padrão 0,09 6,61

Tabela 2. Média dos valores referentes à mensuração do ALM do pépela goniomentria e valores de MAI obtidos com a técnica debaropodometria.

A média obtida na goniometria indica que a maioriados valores se aproxima de 137o, sendo classificadossegundo Hunt5 como pés normais. Enquanto, a média obtidana baropodometria (0,153±0,09) fornece valor que segundoShiang1 , Chu et al.11 e Morag e Cavanagh7 classificam amaioria dos pés avaliados como cavo.

Pela análise dos resultados da goniometria, 100% daamostra foi classificada como pés normais (figura 5);enquanto, a baropodometria apresenta dados queclassificam 70% dos indivíduos apresentando pés cavos,20% pés normais e 10% pés planos (figura 6).

Estudos anteriores sobre a avaliação do arco plantaratravés das pressões plantares apresentam conflitosimportantes em seus resultados. Nesse sentido, Shiang1

dirigiu um estudo comparando as principais formas deavaliação dos tipos de pé através da impressão plantar,apresentando AI, (r = -0,70; p=0.0001), enquanto o MAI, (r =-0,71; p=0.0001), com os dados encontrados em exame deraio-x. Resultados semelhantes foram encontrados porMcCroy et al.12.

Shiang1 apresentou em seu estudo resultadossemelhantes (média de 0,138 ± 0,06), portanto, pela médiados valores encontrados pelo autor também houve umamaior incidência de pés cavos dentro de sua amostra, assimcomo no presente trabalho.

O presente estudo utilizou a medida de Modified ArchIndex (MAI), como parâmetro, para comparação com umadas formas de avaliação mais difundidas entre osfisioterapeutas, a goniometria, e os resultados apresentaramcorrelação estatística regular (r = -0,43)13. A baropodometria

quando comparada a uma das formas mais precisas que é oraio-x, conforme pesquisa realizada por Saltzman14,apresentou uma correlação forte (r = 0.91; p=0.05). Porém, agoniometria do arco longitudinal medial, assim como outrasavaliações clínicas descritas por outros autores, como, porexemplo, a classificação visual, citada por Williams e McClay3,não apresentou correlação significativa, ou quando houvecorrelação, esta foi classificada como regular.

Hunt5 realizou estudo comparando duas medidas degoniometria o Medial Arch Angle (MLA) e o desvio docalcâneo. Foi encontrada uma média de 150,3o± 9,1, com aamostra variando entre 135o e 170o, indicando que a maioriados pés avaliados foram classificados como normal e plano,apresentando grande discrepância com os resultadosencontrados na presente pesquisa. Tal discrepância podeter ocorrido devido a algumas limitações citadas pelaliteratura e que também foram encontradas no decorrer dopresente trabalho. Nesse sentido, Hunt5 descreve que aprincipal limitação encontrada foi quanto à precisão damarcação dos pontos de referência para a mensuração, epequenas diferenças na marcação dos pontos na pele podemalterar em vários graus o resultado final.

Saltzman et al.14 conduziu um estudo comparativoentre as formas de mensuração clínica e radiográfica do arcolongitudinal medial do pé e relatou que há fraca correlaçãoentre estas medidas, porém não foi utilizada a medida domedial arch angle, a qual utiliza os mesmos pontos dereferência na pele que a CA-MT1 angle na radiografia. Paraesta mensuração radiográfica este autor encontrou umamédia de 132o±10o para uma amostra de 100 indivíduos, oque se aproxima bastante dos achados no presente estudo.

Por meio do Coeficiente de Correlação de Pearson(r), no presente trabalho, encontrou-se uma relação regulare inversamente proporcional entre as variáveis analisadas(r = -0,45; p £ 0,05)13.

Ao serem analisadas as mesmas variáveis, porémseparando os sexos, os resultados obtidos com abaropodometria indicaram que entre os homens, foramencontrados 62,5% dos pés cavos, 25% dos pés normais e,12,5% planos, com uma média de 0,168 kg/cm2 ± 0.08.Quando os mesmo sujeitos foram avaliados pela goniometriado arco longitudinal medial (ALM), novamente encontrou-se100% da amostra com pés normais e uma média de 135 ú±5,34.

A análise dos dados do sexo masculino apresentou

Figura 2. Classificação dos tipos de pé encontrados na avaliaçãogoniométrica.

Figura 3. Classificação dos tipos de pé encontrados no examebaropodométrico.

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uma correlação regular r = -0,53 (p £ 0,05)13.Entre as mulheres, pela baropodometria, encontrou-

se 75% de pés cavos, 16,6% pés normais, e, 8,33% pésplanos. Por meio da goniometria encontrou-se uma médiade 0,142 kg/cm2 ± 0.10, enquanto para a goniometriaencontrou-se uma média de 139,91ú ± 6,84ú; portanto,através destes resultados para a baropodometria os valoresindicam que a maioria dos indivíduos classificam-se comotendo pés cavos, enquanto na mensuração através dagoniometria forneceu para os mesmos pés um valor que osclassifica como pés normais.

A análise dos dados coletados nos indivíduos do sexofeminino que compuseram a amostra apresentaram umacorrelação regular r = - 0,40, assim como a análise da amostramasculina r = -0,53 ( p £ 0,05). Porém, na amostra masculinahá uma tendência de relação melhor do que na feminina.Neste sentido, apesar de a goniometria apresentar limitaçãona avaliação dos tipos de pé por meio da mensuração doALM para ambos os sexos, os resultados indicam que háuma relação melhor quando o indivíduo avaliado é do sexomasculino.

No decorrer do estudo foram encontradas algumaslimitações como a dificuldade, mesmo após várias vezesrealizado o mesmo teste, de localizar com precisão os pontosde referência, e, mais ainda de repetir a marcação em mesmolocal para posterior comparação. Saltzman et.al14 coloca quea variação biológica na estrutura óssea e nos tecidos molesapresenta-se como grande dificuldade na precisão daidentificação correta dos pontos de referência. William eMcClay3 também relataram que a dificuldade de palpaçãodos pontos de referência óssea foi descrita como maiordificuldade por 90% dos dez avaliadores que participaramdo estudo. Outra dificuldade na realização da mensuraçãoda goniometria, a qual também foi descrita por William eMcClay3, diz respeito ao tecido mole que recobre a bordamedial do arco. Este é bastante variável e pode mascarar areal arquitetura óssea dos pés.

O calor e a umidade são variáveis que podem alterara performance dos sensores. Esta variabilidade pode serdiminuída se os testes forem realizados com calçadospadronizados e realizados no mesmo dia10. Na tentativa deanular estas variáveis, no presente estudo todas asmensurações foram realizadas no mesmo dia, isto é, com amesma umidade do ar, e, em sala climatizada por arcondicionado o que ofereceu ao ambiente de coleta umatemperatura uniforme de 24oC para todas as coletas.

Woodburn e Helliwell15 avaliaram a performance doF-Scan avaliando o erro de calibragem a eficácia erepetitibilidade das mensurações, e, encontrou que há umerro de calibragem de 4%, sugerindo que o protocolo decalibração do equipamento não é preciso e que isto sugereque seus resultados podem não ser repetidos, tendo umacapacidade limitada de eficácia absoluta. Rabuffeti et al.16

realizou estudo sobre a calibração do F-Scan e encontrouresultados semalhantes. Antes de todas as avaliações foirealizada nova calibração do aparelho para que nãohouvesse alterações nos resultados.

Ainda, Hunt5 afirma que é necessária muita cautelana interpretação clínica das mensurações estáticas dos pés.

Estas medidas têm um embasamento muito pobre para quesejam nelas baseadas prescrições de intervenção, comoórteses ou tratamentos.

Portanto, não existe uma mensuração, do que querque seja, que não tenha limitações. Qualquer uma apresenta-se melhor para alguma variável, porém limitada para outra.Sabendo disso, é importante que os benefícios e limitaçõessejam conhecidos para que possam ter uma aplicação maisconfiável. A partir deste conhecimento deve-se tentarmaximizar os benefícios de dado tipo de mensuração, etrabalhar dentro das limitações oferecidas por esta ou aquelaabordagem17.

Payne18 coloca que o mau alinhamento do pé podeaparecer de diversas formas, tanto na pronação associada aum desabamento do arco longitudinal medial do pé, comopode uma supinação do antepé, associada a uma elevaçãodo mesmo. A aparência visual destes distúrbios noalinhamento não é tão importante quanto à função posturalque este pode causar. Neste estudo o autor afirma não crerque a avaliação visual possa detectar as verdadeirasalterações, mas também afirma que nenhuma das formasutilizadas consegue mensurar precisamente a função, e,portanto, não podem ser consideradas apropriadas. E,ainda, quando se compara a forma de mensuração existentee se fez a mensuração da correlação entre estas e a avaliaçãopor meio de observação visual os resultados não foram bons.

Segundo Williams e McClay3 dentro das experiênciasclínicas utilizadas na classificação dos tipos de pé, a maiscorriqueira é a classificação visual, porém é muitoinconsistente. Os dados obtidos na presente pesquisademonstram que não apenas a classificação visual éinconsistente, mas também a goniometria do arcolongitudinal medial que seria uma opção fácil, acessível ebastante difundida entre os fisioterapeutas também apresentagrandes variações e não reflete o real apoio plantar doindivíduo, por isso, deve ser usada com muita cautela para aclassificação dos tipos de pé, principalmente para indivíduosdo sexo feminino.

CONCLUSÕESCabe aos fisioterapeutas o estudo crítico e o

desenvolvimento de mais pesquisas a respeito dos métodosde avaliação utilizados atualmente para que num futuropróximo possam apresentar dados mais confiáveis eobjetivos na prescrição de tratamentos, bem como naavaliação da progressão dos mesmos. Quando se fala emavaliação dos tipos de pé, pode-se dizer que a goniometria,assim como a avaliação visual, é um método baseado noolho humano e que apresenta um grande número devariáveis o que faz com que seja menos preciso.

O presente trabalho se propôs a tal análiseverificando uma certa fragilidade da goniometria namensuração do ALM do pé e conseqüentemente naavaliação dos tipos de pé. Apesar de não ter sidoestudado na presente pesquisa, acredita-se que oplantígrafo seja uma alternativa acessível na avaliação dostipos de pé, pois também fornece a impressão plantar e temum custo financeiro muitas vezes inferior à baropodometriacomputadorizada.

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Summary

RELATIONSHIP BETWEEN THE GONIOMETRY OF THE MEDIAL ARCH OFTHE FOOT AND THE PRESSURE TO THE PLANT IN BAROPODOMETRY.

The development of the Medial Longitudinal Arch (MLA) was the first step in theman’s evolution to the biped posture and gave to the feet the capacity to absorb the impactscaused by the erect posture. This fact makes MLA object of clinical interest and of research.The goal of this paper was to verify the relationship between the Goniometry of MLA of thefoot and the plantar pressures detected by Computed Baropodometry. For this study, tenadults aged from 20 to 30 years, whose Body Mass Index (BMI) ranged from 18,5 to 30 wererandom selected. For the Computed Baropodometry, the F-Scan version 4.22 Windows 95Tekscan®, Boston, MA was used. The Authors concluded that the Goniometry of MLA of thefoot presents a constant relationship (r = -0,43; p£0,05) when compared with more precisemeasuring methods like the Modified Arch Índex.

Keywords: Feet, Medial Arch of the Foot, Goniometry, Baropodometry.

Bilibio C S e cols. Relação Goniometria do Arco Medial do Pé e Pressão Plantar em Baropodometria.

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Resumo

Objetivou-se analisar o pico de torque do músculo supra-espinhoso quando submetido aoteste de Jobe nos ângulos de 45°, 60° e 75° no aparelho isocinético BIODEX™. A amostra foicomposta de 30 indivíduos sedentários, sendo 19 indivíduos do sexo feminino e 11 do sexomasculino, com idade média de 26,18 ± 5,91 anos para homens e 23,93 ± 1,49 anos paramulheres. Foram observadas diferenças significativas apenas no grupo das mulheres avaliadas,na comparação entre os picos de torque obtidos nos ângulos de 45° - 60°. Comparando com aliteratura, que indica ângulos próximos à 90º para melhor avaliar o músculo supra-espinhoso,os autores sugerem que, para o grupo do sexo feminino avaliado, o ângulo que apresenta omelhor pico de torque do músculo supra-espinhoso ao teste de Jobe no BIODEX™ é o de 45º.

Unitermos: Avaliação isocinética, pico de torque, supra-espinhoso.

O ombro atua de forma coordenada para realizarmovimento amplo e suave do membro superior. Assim,durante o movimento normal, cada articulação com suadeterminada função contribui de maneira coordenada econcomitante para o que é conhecido como ritmo escapulo-umeral. É uma articulação com três graus de liberdade capazde grande amplitude de movimento. Isto é possível graças àanatomia articular e pela contração muscular sincronizadade vários músculos, dentre estes os que compõem omanguito rotador que possibilitam o início da elevação,estabilizando a cabeça do úmero na glenóide, numa açãode pivô. O manguito rotador é a confluência de quatrotendões musculares - redondo menor, subescapular,infraespinhoso e supra-espinhoso - que se inserem nacabeça do úmero.

Em função da grande mobilidade e do envolvimentode toda estrutura anatômica no movimento de elevação doombro, o risco de lesões musculares é eminente e uma dasformas de identificar clinicamente estas lesões é a aplicaçãode testes manuais especiais. Para avaliar a força de umgrupo muscular é comum aos profissionais da saúdeempregar várias posições estáticas enquanto realizam testesmusculares manuais nos seus pacientes. Enquanto essastécnicas, se usadas constantemente, poderiam oferecer umaboa avaliação clínica de um indivíduo, dariam, ao mesmotempo, estimativas incorretas e variadas se aplicadas porprofissionais diferentes. Um dos testes manuais com este

objetivo é o Teste de Jobe, que avalia clinicamente acapacidade funcional do músculo supra-espinhoso. Comoos testes especiais são formas subjetivas de avaliar epossuem grande variação de resultados entre avaliadores,observou-se a necessidade de verificar em qual ânguloarticular há maior precisão nos resultados clínicos do Testede Jobe, formulando-se o seguinte questionamento:

Qual o pico de torque do músculo supra-espinhosoquando submetido ao teste de Jobe em três diferentesângulos articulares?

MATERIAL E MÉTODOSTrata-se de um estudo descritivo constituído de 30

indivíduos do quadro de funcionários e acadêmicos daUniversidade de Passo Fundo - UPF. A idade média foi de26,18 ± 5,91 anos para homens variando entre 21 e 37 anose 23,93 ± 1,49 para mulheres variando entre 19 e 25 anos,sendo 19 indivíduos do sexo feminino e 11 do sexomasculino. Foram excluídos da pesquisa os indivíduos queapresentavam sintomas agudos e subagudos de lesões noombro, indivíduos portadores de hipertensão e cardiopatiaspor ser uma contra-indicação absoluta ao teste isocinéticoem isometria e indivíduos praticantes de atividade físicaregular com mais de quatro horas semanais.

Antes de iniciar qualquer processo da pesquisa osindivíduos assinaram um termo de Consentimento Livre e

Pico de Torque Supra-espinhosono Teste de Jobe

Adriana Pensin & Cássia Nardon.Curso de Fisioterapia, Universidade de Passo Fundo(RS).

Artigo Original

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Esclarecido, no qual consta a descrição dos procedimentosutilizados durante a pesquisa, bem como seus efeitos edesconfortos possíveis. Todos os sujeitos foram submetidosà avaliação física para determinar a aptidão necessária àrealização da pesquisa, isto é, se o indivíduo não estavadentro dos critérios de exclusão e avaliação isocinéticareproduzindo o Teste de Jobe.

Os torques foram analisados através da dinamometriacomputadorizada, pelo dinamômetro da Biodex, Multi-JointSystem 3 pro, por ser o método mais acurado para a avaliaçãoda capacidade muscular isométrica através do pico detorque¹. Segundo Hall² o modo isométrico é o método maisutilizado para a comparação das características funcionaisde diferentes grupos musculares.

O teste de Jobe (TJ) foi reproduzido no dinamômetroisocinético. Foram realizadas duas repetições com cadaseguimento nos três ângulos pré-definidos. Entre cadarepetição teve um intervalo de 10 segundos. Antes darealização dos testes o equipamento foi calibrado de acordocom as orientações do fabricante. Todos os dados foramregistrados pelo software do equipamento, que ao finalofereceu um relatório impresso com o resultado dasavaliações.

Embora existam descrições, na literatura, de que oteste de Jobe é realizado com o paciente em ortostatismo,membros superiores em abdução no plano frontal eanteflexão de 30º, assim alinhando o eixo longitudinal dobraço com o eixo de movimento da articulação glenoumerala reprodução desse, no BIODEX, deu-se com o pacientesentado e com o membro superior a ser testado em abduçãono plano frontal e anteflexões de 45º, 60º e 75º, definidascomo posições de prontidão pelo protocolo de avaliaçãoisocinética. O ângulo de 30º teve que ser desprezado peloaparelho por considerá-lo não funcional para testagem.

Antes do início do teste o indivíduo foi posicionadosentado na cadeira do aparelho, que está rodada a 15º, como membro superior a ser testado posicionado com o ombrona posição anatômica, extensão do cotovelo e pronação doantebraço. Ao iniciar o teste, o aparelho Biodex posicionaautomaticamente o segmento a ser testado no ângulo de 45ºentão ao comando do avaliador o indivíduo tenta realizar aflexão do ombro contra a resistência do aparelho, realizandouma contração isométrica mantida por 5 segundos,relaxando durante 5 segundos e realiza uma segundatentativa também por 5 segundos. Após o aparelho volta àposição inicial na qual ocorre um repouso de 10 segundos.Dando continuidade ao teste o aparelho leva o segmento aoângulo de 60º onde se repete o teste e, logo após o períodode repouso, acontece a verificação no ângulo de 75º e terminao teste. Assim que termina o teste num segmento ele érepetido no segmento contra-lateral da mesma forma.

A análise estatística foi realizada através do programade estatística Statistic for Windows. Foi utilizada a estatísticadescritiva para o cálculo das variáveis numéricas (médias edesvios padrões). Para a realização das comparações entreos grupos foi utilizado o teste estatístico “ANOVA” e “Posthoc”Scheffé para grupos independentes, com um nível mínimode significância p<0,05.

RESULTADOSAs tabelas 1 e 2 referem-se aos resultados dos testes

realizados com os indivíduos do sexo masculino,apresentando valores médios do torque do músculo supra-espinhoso do membro superior direito na tabela 1 e domembro superior esquerdo na tabela 2 quando submetidosa uma avaliação isocinética reproduzindo o teste de Jobe.

X SA45o DH 57,5 10,46A60o DH 53,39 10,50A75o DH 52,3 11,33

Tabela 1. Valores médios do pico torque do músculo supra-espinhosopara o membro superior direito de indivíduos do sexo masculino.

Com a análise estatística os resultados apresentam F= 2,145145 e p = 0,143210; no qual F é a variação entre osgrupos e p a probabilidade, portanto, não foi encontradadiferença significativa entre os ângulos avaliados para omembro superior direito dos indivíduos do sexo masculino.

X SA45o EH 51,92 15,02A60o EH 50,54 11,58A75o EH 49,22 12,12

Tabela 2. Valores médios do pico torque do músculo supra-espinhosopara o membro superior esquerdo de indivíduos do sexo masculino.

Com a análise estatística os resultados apresentam F= 2,103668 e p = 0,148194, portanto, não foi encontradadiferença significativa entre os ângulos avaliados para omembro superior esquerdo dos indivíduos do sexo masculino.

As tabelas 3 e 4 referem-se aos resultados dos testesrealizados com os indivíduos do sexo feminino, apresentandovalores médios do torque do músculo supra-espinhoso domembro superior direito na tabela 3 e do membro superioresquerdo na tabela 4 quando submetidos a uma avaliaçãoisocinética reproduzindo o teste de Jobe.

X SA45o DM 26,92 5,72A60o DM 24,78* 5,10A75o DM 23,93** 4,95

* p=0,003075 entre A45º e A60º ombro direito de indivíduos dosexo feminino.** p=0,000046 entre A45º e A75º ombro direito de indivíduos dosexo feminino.Tabela 3. Valores médios do pico torque do músculo supra-espinhosopara o membro superior direito de indivíduos do sexo feminino.

Pode-se observar diferença significativa quando secompara 45º com 60º (p=0,003075) e 75º (p=0,000046), masnão foi observada diferença entre os ângulos de 60º e 75º(p=0,348327). A variação entre os grupos foi F=14,14327com um nível de significância p=0,000029.

Pensir A & Nardon C. Pico de Torque Supra-espinhoso no Teste de Jobe.

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X SA45o EM 26,20 4,82A60o EM 23,71* 5,52A75o EM 24,13** 6,13

* p=0,014617 entre A45º e A60º ombro direito de indivíduos dosexo feminino.** p=0,048125 entre A45º e A75º ombro direito de indivíduos dosexo feminino.Tabela 4. Valores médios do pico torque do músculo supra-espinhosopara o membro superior esquerdo de indivíduos do sexo feminino.

Na tabela 4, os valores médios do torque do músculosupra-espinhoso nos três ângulos avaliados, em indivíduosdo sexo feminino, no membro superior esquerdo. Observou-se diferença significativa com a comparação entre os ângulos45º e 60º (p=0,014617) e 75º (p=0,048125), mas não foiobservada diferença entre os ângulos de 60º e 75º(p=0,876017). A variação entre os grupos foi F=5,466818com um nível de significância p=0,008448.

DISCUSSÃODesde o estudo de Jobe e cols.³ foi pesquisada a

ativação do manguito rotador utilizando eletromiografiaintramuscular, enquanto os indivíduos realizavam exercíciosespecíficos. Apesar desses autores terem relatado que osupra-espinhoso deve ser isolado e exercitadopreferencialmente com o braço em 90o de abdução, 30o deflexão horizontal e rotação interna plena, Blackburn e cols.4

observaram que o supra-espinhoso sempre participa se obraço é elevado. O isolamento do supra-espinhoso pareceocorrer durante a abdução pura, com rotação neutra do braçona posição ereta. Além disso, foi observado que um aumentosignificativo na função do supra-espinhoso pode serconseguido na posição de decúbito ventral, com o braço naposição de rotação externa máxima e em 100o de abduçãohorizontal5. Blackburn e cols.4 concluíram que nenhumaposição conseguia isolar totalmente o supra-espinhoso. Alémdisso, relataram que a melhor posição-teste para isolarsupra-espinhoso é com o braço em 90o de elevação no planoescapular, com 45o de rotação externa do úmero. Howell ecols.6mediram o torque produzido pelo supra-espinhoso edeltóide nos planos de flexão e elevação; constataram queo deltóide e o supra-espinhoso são igualmente responsáveispela produção de torque ao redor da articulação do ombronos planos funcionais do movimento.Mesmo que estesautores tenham afirmado que o músculo supra-espinhoso éisolado para o teste em amplitudes em torno de 90o deabdução com rotação externa do úmero, o teste de Jobe,que é um teste clínico para testar esse músculo7, é realizadocom os membros superiores em abdução no plano frontal ecom uma anteflexão de 30o, o que caracteriza a elevação noplano escapular. Dessa forma a aplicação do teste isocinéticopara avaliar o torque do supra-espinhoso durante a realizaçãodo teste de Jobe serviu para auxiliar na definição de qual omelhor ângulo de aplicação deste teste.

Após a análise dos dados, foi possível observar quehouve diferença estatisticamente significativa ao compararos diferentes ângulos apenas em mulheres. Observou-se

essa diferença com a comparação entre os ângulos 45º -60º, mas não foi observada diferença entre os ângulos de60º e 75º. Presume-se, portanto, que o teste de Jobe, para ogrupo de mulheres avaliadas, é mais eficaz quando realizadoentre 45o e 60o, o que discorda das afirmações quanto àposição de teste para isolar o músculo supra-espinhoso,porém recebem a confirmação de Rasch8 e Hall2 queobservaram que o braço de alavanca do supra-espinhoso épraticamente constante através de toda amplitude demovimento (ADM) e é maior do que o do deltóide para osprimeiros 60o de abdução.

Com a análise estatística, pode-se observar que osresultados obtidos pelos indivíduos do sexo masculino nãoapresentam diferença significativa tanto para o membrosuperior direito quanto para o esquerdo. Portanto, para ogrupo masculino avaliado, tornou-se indiferente a angulaçãona qual o segmento foi testado. Este fato, aparentemente,está em conformidade com o que a literatura afirma, pois osângulos de teste propostos ficaram abaixo de 90º e o ombroestava em rotação interna e não rotação externa como éindicado pelos autores.

Essa pesquisa tem sua fidedignidade questionávelpelas seguintes razões: amostra com um número deelementos pequeno (n=30), na sua maioria do sexo feminino(mais homogêneo no que tange à idade (coeficiente devariação = 6%), e pelo grupo masculino de indivíduos serheterogêneo (coeficiente de variação = 22%); pela nãoutilização de um equipamento de eletromiografia, o que,segundo Jobe3, Blackburn4 e Davies5, seria a única forma decomprovar a ação exclusiva do músculo supra-espinhoso.Segundo Guaratini9 e Dvir10 há três fontes de erro que podemtornar um teste isocinético não confiável: falhas inerentes àinstrumentação; erros produzidos pelo examinador; falta deconsistência inerente à variável no tipo de sujeito que estásendo examinado. Essa falta de consistência pode estarrelacionada com a presença, ou não, de alguma lesão prévia,dor, que pode variar independente da força muscular e porisso precisa ser melhor investigada tanto a validade quantoa confiabilidade por meio de pesquisas. Segundo Dvir10 umdos grandes problemas na investigação isocinética estárelacionado com o fato de que, até que ponto uma medidapode influenciar as demais medidas numa outra ocasião.

Quanto à dominância dos membros, Cahalan e cols.11

realizaram testes isométricos e isocinéticos para osmovimentos do ombro em 50 voluntários (de ambos os sexos),saudáveis, com a finalidade de encontrar valores denormalidade para o pico de torque nesses movimentos. Emrelação à flexão do ombro, membros dominantes obtiveramvalores significativamente maiores que os membros não-dominantes para as velocidades de 180o/s e 300o/s emvoluntários do sexo masculino. Já para o sexo feminino,diferenças significativas entre os membros para a flexão deombro foram encontradas apenas em teste isométrico, sendoque membros dominantes obtiveram valores mais altos quemembros não-dominantes. A maioria dos estudos com testesisocinéticos indicam não haver diferenças estatisticamentesignificativas entre membros dominantes e não-dominantes.Nos estudos de Ivey12, Chandler13 e Mcmaster14 não foram

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encontradas diferenças estatisticamente significativas entrevalores obtidos em membros dominantes e não-dominantede voluntários saudáveis, quando testados movimentos deombros não treinados. Concordando com os autores acimaos resultados obtidos no presente estudo, pois não houvediferença significativa entre a dominância dos membros, emmulheres ou homens.

CONCLUSÕESPor meio desta pesquisa, verificou-se que há diferença

estatisticamente significativa apenas em mulheres nosângulos de 45o - 60o, constatando que o pico de torque nestas

angulações é maior, indicando que para essa amostra o testeserá melhor aplicado nos ângulos entre 45º - 60º. Não hádiferença no que diz respeito à dominância dos membros nosresultados observados em relação ao pico de torque. Portanto,ao submeter-se o músculo supra-espinhoso ao teste de Jobenum aparelho isocinético é possível obter resultadossatisfatórios; porém são necessários mais estudos envolvendoamostras maiores que utilizem eletroneuromiografia acopladae em sincronia com o isocinético para comprovar a ação damusculatura avaliada, oferecendo maior confiabilidade paravalidar as medidas isocinéticas garantindo, assim, uma maiorcredibilidade para a prática clínica e pesquisa científica.

Summary

PEAK TORQUE OF THE SUPRASPINOUS MUSCLE WHEN SUBMITED IN THE JOBE TEST

In this context, the present research has the objective of to analyze the peak torque of thesupraspinous muscle when submitted to the Jobe test, in the angles of 45°, 60° and 75°, in theBIODEX™ isokinetic device. The sample was composed by thirty (30) sedentary people, nineteen(19) feminine and eleven (11) masculine individuals, whose average age was 26.18 ± 5.91years for men and 23.93 ± 1,49 years for women. Significant differences had been observedonly in the group of evaluated women, in the comparison of the peak torque gotten in theangles of 45° - 60°. Confronting with the previews literature, that indicate angles next to 90ºbetter for evaluate the supraspinous muscle, the authors of this research suggest, for thefeminine group evaluated, the angle that presents the best torque peak of the supraspinousmuscle, to the test of Jobe in the BIODEX™, is the angle of 45º.

Keywords: Isokinetic Evaluation, Peak Torque, Supraspinous Muscle.

Pensir A & Nardon C. Pico de Torque Supra-espinhoso no Teste de Jobe.

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Resposta Cicatricial do Ultra-Som nasÚlceras de Pressão de Graus I e II

Sílvia Lorenzini & Denise Martelli.Serviço de Fisioterapia da Unidade de Terapia Intensiva, Hospital da Cidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Objetivou-se analisar o efeito do ultra-som no processo de cicatrização em úlceras depressão, utilizando como referência a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital daCidade de Passo Fundo, RS. Do total de vinte e sete (27) pacientes avaliados, onze (11)apresentaram úlceras de pressão, avaliando-se as seguintes variáveis: idade, sexo,diagnóstico clínico, nível de consciência, localização e classificação. As úlceras classificadasem graus I e II foram submetidas ao tratamento com Ultra-som terapêutico Sonopulse III(Ibramedâ). Determina-se como parâmetros do equipamento a freqüência de 3 MHz, naforma pulsada a 100 Hz, com relação de pulso em 1:5 e dose de 0,4 W/cm². Foram realizadasduas aplicações semanais com o tempo de um minuto por área efetiva de radiação (ERA),durante trinta dias, pelo período em que os pacientes permanecessem internados na UTI.Antes e após o tratamento foi realizada avaliação das úlceras e registradas com fotografiasdigitais, a fim de possibilitar a comparação macroscópica das áreas tratadas, o que permitiuconstatar uma melhora no aspecto tecidual das lesões.

Unitermos: Úlceras de pressão, cicatrização, fisioterapia, ultra-som.

As úlceras de pressão são complicações comuns empacientes hospitalizados, que atingem principalmente os quese encontram imobilizados, acamados, com restrição damobilidade decorrente de patologias diversas ou seqüelasdestas1.

São definidas como uma área localizada de necrose,que se desenvolve quando o tecido mole é comprimido entreuma proeminência óssea e uma superfície dura, por umperíodo de tempo prolongado2.

A úlcera de pressão, também conhecida como escara,afeta aproximadamente 9% do total de pacienteshospitalizados e 23% daqueles em atendimento domiciliar3.Assim, representam um problema significante e desafiadorpara toda equipe de saúde, atingindo 33% dos pacientesinternados em Unidades de Terapia Intensiva em hospitaisamericanos1.

As úlceras causam preocupação àqueles que cuidamde pacientes acamados por períodos longos, pois esse tipode ferida além de incômoda e ameaçadora à saúde dopaciente, faz com que este permaneça na instituição duranteum tempo maior, retardando o processo terapêutico eaumentando os custos hospitalares4.

Vários recursos terapêuticos estão sendo usados como objetivo de diminuir a incidência de úlcera de pressão nospacientes internados em Unidades de Tratamento Intensivo.Um desses recursos que pode ser util izado peloFisioterapeuta é o Ultra-som; porém, a escassez depesquisas sobre a eficácia do mesmo, reflete a posição geralem Fisioterapia, onde a maioria dos tratamentos é baseadana opinião pessoal e na experiência5.

O Ultra-som terapêutico é uma modalidade clínicausada no tratamento conservador de uma ampla variedadede patologias, em áreas como a dermato-funcional,ortopédica, traumatológica e reumatológica. Em feridas porpressão, foi observada sua efetividade na promoção dacicatrização onde obteve efeitos benéficos6 .

Portanto, esta pesquisa teve como objetivo geral, aanálise do efeito do ultra-som pulsado, com freqüência de3 MHz na cicatrização das úlceras de pressão de graus I eII, e como objetivo específico, a verificação da incidênciadas úlceras de pressão nos pacientes que internaram noperíodo de 01/09/2005 à 01/10/2005 na Unidade deTerapia Intensiva (UTI) do Hospital da Cidade de PassoFundo, RS.

Artigo Original

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MATERIAIS E MÉTODOSO presente estudo foi realizado na Unidade de Terapia

Intensiva do Hospital da Cidade de Passo Fundo - RS, de01/09/2005 à 01/10/2005. Foram avaliados todos ospacientes que internaram neste período, sendo que onze11

sujeitos constituíram amostra para análise da incidência esete7 foram submetidos ao tratamento proposto, ou seja,apenas os que apresentaram úlceras de pressão de graus Ie II.

Após obtermos a permissão do Diretor do Hospital daCidade para a realização do estudo na instituição eautorização da médica responsável pela Unidade de TerapiaIntensiva para a realização da pesquisa em seus pacientes,foi apresentado um Termo de Consentimento aos pacientesque se encontravam em condições e foram esclarecidas asdúvidas verbalmente, aos que estavam impossibilitados, aautorização foi dada pelo familiar responsável que tambémrecebeu um Termo de Consentimento e esclarecimentossobre a pesquisa, os quais poderiam aceitar ou não. Apresente pesquisa obteve também a aprovação do Comitêde Ética da Universidade de Passo Fundo.

Foi util izada uma Ficha de Avaliação, ondeinvestigamos os seguintes dados: idade, sexo, diagnósticoda internação, nível de consciência, localização eclassificação clínica das úlceras de pressão. A análisecomparativa do processo cicatricial das úlceras de pressãofoi feita através da observação física e de fotografias digitais,as quais foram realizadas no dia da avaliação e no diaseguinte à aplicação do ultra-som para observarmos aevolução do tratamento. A interpretação dos dados foirealizada de forma visual comparativa antes e após otratamento e os dados obtidos com a ficha de avaliação paraanálise da incidência durante o mês de investigação, foramanalisados na forma de percentual simples e representadosna forma de gráficos.

O aparelho de Ultra-som utilizado é da marcaIbramedâ, modelo Sonopulse III. Os parâmetros usadosforam: freqüência de 3 MHz, modo pulsado com freqüênciade repetição do pulso de 100 Hz, com tempo de duração(on) e tempo de pausa (off) de 1/5, com intensidade de 0,4 w/cm² e tempo de aplicação de 1 minuto por área efetiva deradiação (ERA).

Lorenzini S & Martinelli D. Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II.

Tabela 1. Incidência por faixa etária. Tabela 2. Incidência por sexo.

Tabela 3. Incidência por diagnóstico clínico. Tabela 4. Incidência por nível de consciência.

Tabela 5. Incidência por localização. Tabela 6. Incidência pela classificação.

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Antes da terapêutica os pacientes foram submetidosà assepsia do local a ser tratado com solução fisiológica0,9%. A aplicação do ultra-som foi feita diretamente sobre aferida, tendo o gel como meio de contato entre o transdutor ea pele do paciente. O transdutor foi movido circularmentedurante toda a sessão, mantendo o cabeçote sempre emcontato direto com a pele para evitar a formação de bolhasde ar. O cabeçote e o transdutor foram limpos com algodãoembebido em álcool 70%, antes e após cada sessão. Aofinal da terapia, os pacientes foram higienizados com algodãona região tratada.

RESULTADOS E DISCUSSÃODurante o período de investigação deste estudo, foram

avaliados vinte e sete pacientes (27), destes, onze (47%)apresentaram úlceras de pressão e dezesseis (53%) nãoapresentaram sinais das mesmas. Logo, encontramos umpercentual alto de sujeitos acometidos, apesar de havermaior percentual de sujeitos que não apresentaram a lesãona Unidade de Terapia Intensiva.

Através da análise da incidência por faixa etária, nãofoi encontrada úlcera de pressão em nenhum paciente abaixodos 50 anos.

Este achado está em concordância com Silva7, quedemonstrou em seu estudo que um dos principais fatores derisco para desenvolvimento de úlceras de pressão é a idade,tendo como característica etária predominante nos pacientesinvestigados, idade maior ou igual a 60 anos, devido àsalterações orgânicas decorrentes do envelhecimento. Aincidência é maior comum entre os idosos, em 75% dos casosacima dos 70 anos, porém pode vir a ocorrer em qualquer

idade devido a outros fatores de risco8. A maioria dospacientes que apresentam úlceras são idosos e doentes,então as tentativas de controle são freqüentementeinterrompidas por morte9.

No gráfico 02, representando a análise da incidênciapor sexo, observamos que dos onze(11) pacientes analisadossete (64%), eram do sexo feminino e quatro do sexomasculino (36%), representando a minoria com dos casos.Maior incidência em mulheresestá em concordância com aliteratura que estudou as úlceras de pressão em um total de52 pacientes, sendo que 63,5% eram mulheres e 36,5%homens7. Porém, outros autores8 discordam, relatando queas úlceras podem se desenvolver em ambos os sexos.

A figura 3 demonstra o diagnóstico da internação naUTI, onde foi verificada a presença de ComprometimentoNeurológico em sete pacientes(Acidente Vascular Cerebral),Parkinson e Hidrocefalia; dois (18%) apresentaramInsuficiência Respiratória devido a Pneumonia, e outros dois(18%) outras patologias como Pancreatite e Fratura de Fêmur.

Este dado está em concordância com os estudos de7,que ao analisar 52 pacientes internados no Centro deTerapia Intensiva (CTI) de um hospital universitário do interiorpaulista, durante 3 meses, encontrou alteraçõesneurológicas como paraplegia, hemiplegia, tetraplegia eacidente vascular cerebral (AVC), como patologias quecontribuiram para o desenvolvimento das úlceras de pressão,pois diminuem a capacidade de movimentação, sendo umdos principais fatores de risco para estas lesões.

Musskopp e cols8 ressaltam a importância de queprofissionais de saúde e familiares de pacientes comdistúrbios neurológicos, paraplégicos e tetraplégicos

Lorenzini S & Martinelli D. Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II.

Figura 7. Sujeito 1. Pré-tratamento. Figura 8. Sujeito 1. Pós-tratamento. Figura 9. Sujeito 2. Pré-tratamento.

Figura 10. Sujeito 2. Pós-tratamento. Figura 11. Sujeito 3. Pré-tratamento. Figura 12. Sujeito 3. Pós-tratamento.

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especificamente, estejam atentos para o desenvolvimentodas úlceras, evitando situações graves que poderão restarpoucas alternativas de cura. Gentz e cols9encontraramcomprometimento neurológico em 86,9% e 96,7% dospacientes com úlceras em graus III e IV, respectivamente,em estudo realizado utilizando a estimulação elétrica.

A figura 4 representa a análise do desenvolvimentoda úlcera de pressão quanto ao nível de consciênciaapresentado pelo paciente, que foi identificado através daEscala de Coma de Glasgow (ECG) descrita por Knobel3.

Segundo Jorge e cols2, o nível de consciência estáassociado direta ou indiretamente à percepção sensorial,mobilidade e atividade por sua vez relacionadas à pressão;quanto maior a diminuição do nível de consciência, maior aprobabilidade de se desenvolver úlceras.

Porém, cabe salientar que em nosso estudo aincidência de úlceras de decúbito foi maior em pacientesconscientes (ECG maior que sete) e talvez isto se deva aofato de que os sujeitos apesar de conscientes apresentavamalgum tipo de seqüela neurológica como hemiplegia, poisencontramos uma incidência maior de lesões em pacientescom acometimento neurológico.

Musskoppe e cols8, encontraram o paciente comúlcera de pressão, lúcido, coerente e com consciência parcialde sua situação geral, o que o deixava deprimido e comsentimento de medo quanto ao futuro, afetando diretamenteo estado emocional do paciente.

A análise está de acordo com Costa10, que em estudorealizado com 20 pacientes, que desenvolveram 59 úlceras,também encontrou a região do calcâneo como predominante(42,4%), seguido da região sacra (30,5%) e diferindo donosso estudo apenas no terceiro dado onde obteve a regiãodos glúteos como mais acometida (11,8%).

A figura 6 representa a análise da incidência dasúlceras de pressão quanto à classificação. Houvepredominância, das úlceras de grau II. Os resultados destaanálise discordam de Costa (2003) em estudo, onde houvepredomínio de úlceras de grau I em 59% de um total de 52pacientes.

Selecionamos três casos em que foi aplicado oaparelho de ultra-som para avaliar a eficácia do mesmo.Através das imagens fotográficas, observamos na figura 7,que o sujeito 1 apresentou úlcera de pressão de grau II,localizada na região do calcâneo esquerdo. Classifica-secomo úlcera de grau II porque a pele encontra-se íntegra,com hiperemia e há presença de bolha com líquido no seuinterior. Após cinco aplicações do Ultra-som, observamosque a bolha não apresentava mais líquido no seu interior,porém a pele apresentava-se com hiperemia (figura 8);observamos melhora da lesão.

O sujeito 2 apresentou úlcera de pressão no calcâneoesquerdo, como podemos observar na figura 9. Classificadacomo de grau II devido às mesmas características das lesõesdos sujeitos 1. Este sujeito foi submetido a três sessões dotratamento devido a óbito. Podemos observar na figura 10que houve uma diminuição do líquido no interior da bolha,sugerindo uma melhora da lesão.

O sujeito 3 apresentou úlcera de pressão grau I, pela

presença de pele íntegra, hiperemia e ausência de bolha(figura 11). Este sujeito foi submetido a apenas duas sessões,pois obteve alta da UTI. Após aplicação do tratamento,observamos diminuição da hiperemia (figura 12).

Através da análise das fotografias das úlceras depressão, no pré e pós-tratamento, podemos observar quehouve uma melhora no aspecto das lesões, ou seja, o ultra-som possui efeito benéfico no processo de cicatrização.Também verificamos que os resultados obtidos sãosatisfatórios com um número reduzido de sessões.

Os resultados positivos estão de acordo com váriosautores, que pesquisaram os efeitos do Ultra-som em lesões.Dyson11 através de um trabalho realizado com animais,utilizando o aparelho de ultra-som, demonstrou aceleraçãona cura das úlceras, assim como Roche e West apud11 queconfirmaram esse estudo em uma amostra de 26 sujeitos.Mostraram que as úlceras obtiveram uma diminuiçãosignificativamente maior em duas semanas com o uso destemétodo. McDiarmid et al. Apud11 com uma amostra de 40pacientes portadores de úlceras, mostraram que todos ospacientes tratados com o ultra-som obtiveram uma cura maisrápida.

Guirro e cols6 observaram a eficácia do ultra-som noalívio da congestão limpando as áreas de necrose epromovendo a cicatrização e recuperação da pele saudável,que apresentou espessura normal e sem aderências, comevolução aproximadamente normal.

Estudos realizados por Kitchen e Partridge apud12 emlesões cutâneas experimentais mostraram que a aplicaçãodo ultra-som exerce um efeito positivo, acelerando o processode reparação.

Com o objetivo de estudar os efeitos da baixa dosedo aparelho na aceleração da cicatrização de feridas, Byl etal. apud13 induziu cirurgicamente lesões na pele de animais,e após 5 dias de tratamento ultra-sônico, a força de tensão,a deposição de colágeno e a redução das dimensões daferida foram significativamente maiores que no grupocontrole.

Estudos feitos em animais por Fyfe e Chahl apud14

mostraram que uma única dose de Ultra-som aplicadadentro de 48 horas após a lesão pode ser suficiente paraproporcionar a cura. Oakley e Patrick apud2, descreveramque a terapia por ultra-som deverá ser iniciada depreferência durante a fase inflamatória inicial do reparodas feridas agudas, pois nesta fase o aparelho respondepositivamente, resultando numa entrada mais rápida na faseproliferativa.

Três estudos separados reportaram, cada um,diminuições de 33 a 35% no tamanho da ferida, durante umperíodo de estudo de quatro semanas com um ultra-somnão térmico pulsado, de 3 MHz em uma intensidade de 0,2 à1,0 W/cm², liberado na periferia da ferida durante 5 à10minutos, de uma a três vezes por semana15. Hogan et al.apud6, relatam que, quando um tecido crônico isquêmico étratado com ultra-som, formam-se novos capilares e acirculação é restabelecida mais rapidamente do que naausência do recurso terapêutico.

Sabemos que há uma predominância das úlceras de

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I e II graus, conforme relata Costa10 (2003) e, apesar de todosos achados positivos quanto ao uso do ultra-som nacicatrização nas úlceras de pressão, a maioria dos autorespesquisados não referem os graus das úlceras tratadas; osestudos encontrados referem-se a úlceras de III e IV grausem estudo realizado utilizando a estimulação elétrica; emestudo de caso8,9.

Pelo presente estudo ter sido realizado em umaUnidade de Terap ia In tens iva , não fo i poss íve lacompanhar os pac ientes durante um per íodoprolongado ou até a cicatrização total da lesão, devidoà alta dos mesmos para o quarto ou óbito. ConformeGentz e cols9, a maioria dos pacientes que apresentamúlceras de pressão são idosos e doentes; logo, astentativas de controle das amostras são freqüentementeinterrompidas por morte.

Constatou-se através do estudo realizado e dasbibliografias consultadas que as teorias envolvendo o ultra-som ainda não foram totalmente elucidadas; portanto, muitoainda é preciso saber a respeito da eficácia do ultra-sompara a cicatrização das úlceras de pressão de graus I e II.Foi observado que são preferíveis intensidades bemreduzidas, porém, há necessidade de trabalhos adicionaispara determinar os melhores parâmetros a seremutilizados15.

CONCLUSÕESA princípio questionava-se o uso do Ultra-som como

um procedimento efetivo na promoção da cicatrização dasúlceras e através da revisão bibliográfica verificamos quehá evidências aceitas quanto à eficácia deste equipamento.Logo, a terapia ultra-sônica vem sendo utilizada parapromover a cicatrização de feridas provocadas por pressão,tendo efeitos benéficos.

O aparelho de ultra-som mostrou ser eficaz nacicatrização das úlceras de pressão de graus I e II, e, atravésda análise da incidência, observamos que apesar de todoavanço da Medicina, as úlceras de pressão ainda fazem parteda realidade dos pacientes hospitalizados, que ficam por umtempo prolongado no leito.

Pelos resultados obtidos neste trabalho, fica bastanteclara a necessidade de continuidade, dirigindo a aplicaçãodo ultra-som em amostras maiores e distintas, na busca deresultados que diminuam o empirismo na área de FisioterapiaDermato-funcional. Também ressaltamos a importância dotrabalho interdisciplinar no tratamento das úlceras de pressão,pois vários profissionais deveriam atuar em conjunto, visandoa saúde e bem estar do indivíduo. Esperamos que num futurobem próximo as técnicas Fisioterapêuticas aplicadas emDermato-funcional possam ser praticadas com segurança,embasadas em resultados científicos.

Lorenzini S & Martinelli D. Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II.

Summary

CICATRICIAL RESPONSE OF ULTRASOUND IN PRESSION ULCERS OF DEGREE I E II

The objective of the present study had to analyze the effect of Ultrasound in the cicatrizationprocess in Pressure Ulcers, using as reference the Intensive Care Unit (ICU) of the Hospital daCidade, Passo Fundo, RS, Brazil. From the total of twenty-seven (27) appraised patients,eleven (11) of them presented Pressure Ulcers, for those which were analyzed the followingaspects: age, sex, clinical diagnosis, level of conscience, location and classification. The ulcersclassified in degrees I and II were submitted to the treatment with the Therapeutic UltrasoundSonopulse III (IBRAMED®), in the frequency of 3 MHz, in the pulsed form to 100 Hz, with pulsein 1:5 and dose of 0,4 W/cm². Two weekly applications were accomplished with 1 minute timein the Effective Radiation Area (ERA), during thirty days, for that period while the patientsstayed interned in the ICU. Before and after the treatment, the evaluation of the Ulcersaccomplished and registered with digital pictures, in order to make possible macroscopiccomparison of the treated areas, so that it allowed to verify an improvement in the tecidualaspect of the lesions.

Keywords: Pressure Ulcers, Cicatrization, Physiotherapy, Ultrasound.

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Lorenzini S & Martinelli D. Resposta Cicatricial do Ultra-Som nas Úlceras de Pressão de Graus I e II.

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Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadrilno Hospital São Vicente de Paulo

Fabrício Perin da Rosa & Anderson Cattelan.Faculdade de Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

A artroplastia total do quadril está indicada em pacientes com articulaçãoartrítica dolorosa e incapacitante na qual não se obteve resultado com o tratamentoconservador. O objetivo deste trabalho foi caracterizar o perfil dos pacientessubmetidos à colocação de prótese total de quadril, internados no Hospital SãoVicente de Paulo em Passo Fundo(RS), quanto aos seguintes aspectos: sexo, idade,raça, lado mais acometido e o motivo mais freqüente para a indicação do uso daprótese. Uma pesquisa com delineamento transversal, quantitativa descritiva, sendoa amostra selecionada através dos prontuários e formada por 68 pacientes quehaviam realizado a cirurgia no período de junho a setembro de 2005. Concluiu-seque o perfil do paciente submetido à prótese é, na maioria das vezes, mulher branca,com idade em torno de 60 anos e com diagnóstico de artrose de quadril direito.

Unitermos: Artroplastia de quadril, artrose, fisioterapia.

A Organização Mundial de Saúde calcula que 75%de todas as fraturas de quadril no mundo vão ocorrer nospaíses em desenvolvimento e o número de ocorrências devetriplicar neste século. Estima-se que 25% da populaçãobrasileira sofram de osteoporose e, segundo a FundaçãoInternacional de Osteoporose, 40% das mulheres em todo omundo correm o risco de ter alguma fratura por conta dadoença. Entre os homens, a porcentagem é de 13%. Aesmagadora maioria desses casos ocorrerá em idosos, porserem predominantemente mais afetados pela doença.

A artrose também é uma das maiores indicações deprótese total de quadril. Ocorre com maior freqüência empessoas idosas e quase todas as formas de lesão ou dedoenças articulares podem iniciar o processo que resultaem artrose. A artrose pode seguir-se a uma agressãomecânica e/ou uma doença articular inflamatória. Contudo,seus fatores de risco são a idade, raça, peso e história familiar.

A cirurgia para colocação da prótese de quadril (Figura 1)é realizada principalmente em pacientes portadores de coxo-artrose grave, quando existe grande limitação dosmovimentos e quando a dor é muito intensa, tornando asatividades diárias muito penosas. Mesmo que se tomem todosos cuidados recomendados durante o ato cirúrgico, poderãoocorrer complicações; a fratura do fêmur nas artroplastiasde quadril pode ocorrer no intra, pós-operatório imediato ou

tardio, às vezes não visível nas radiografias. Entretanto, acirurgia de colocação da prótese total de quadril, tem comoprimeiro objetivo o alívio da dor, obtendo-se este resultadoem 95% dos casos. Além disso, consegue-se restabeleceros movimentos articulares, e a combinação desses doisfatores permite o retorno do paciente as suas atividades devida diária normais.

Figura 1. Radiografia de prótese implantada em lado direito.

Artigo Original

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METODOLOGIAA pesquisa foi desenvolvida tendo um delineamento

transversal, sendo classificada como quantitativa edescritiva. A população caracterizou-se pelos pacientesinternados no Hospital São Vicente de Paulo e a amostraconstituiu-se de 68 pacientes submetidos a artroplastia totalde quadril, no período de junho a setembro de 2005. Osdados para a realização da pesquisa foram obtidos defontes secundárias retiradas dos prontuários dos pacientes(Laudo Médico para a Emissão da AIH), com prévioconsentimento e autorização por parte do Hospital SãoVicente de Paulo.

A coleta de dados foi feita pelo pesquisador querealizou visitas diárias, durante o período entre junho asetembro, a todos os postos de enfermagem e salas derecuperação na busca dos prontuários dos pacientes. Depoisdisso, cruzou-se os dados entre os vetores analisados eobteve-se a comparação por classes da amostra. As variáveisforam submetidas à análise estatísticas através do programaMicrosoft Excel 97.

Todas as variáveis foram catalogadas em tabelas paracada índice e gráficos quantitativo-comparativos entre duasvariantes, relacionando-as entre si. Além disso, obteve-seos resultados da média de idade e desvio padrão, dadoscalculados pela fonte do banco de informações criado pelopresente trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÃOOs resultados foram digitados e processados

obtendo-se média de idade e o desvio padrão dos dadospesquisados. O primeiro tópico que compõe o perfil dospacientes submetidos à cirurgia de artroplastia total dequadril é a faixa etária mais acometida.

Em relação à idade, 58,82% da população encontra-se nas faixas etárias entre 51 e 60 anos e 61 e 70 anos. Aidade da maioria da amostra gira em torno de 60,17 anos(DP=11,12).

As mulheres (52,95%) sofreram maior número deartroplastias totais de quadril em relações aos homens (47,05%).

A maioria dos pacientes que realizaram a artroplastiafoi de cor branca (92,64%). Os pacientes foram classificadossegundo a cor da pele que constava nas fichas de internaçãohospitalar. Para catalogação, utilizou-se como referência aclassificação racial utilizada pelo Ministério da Saúde.Pacientes das raças Amarela e Indígena não foramencontrados na amostra.

A artrose caracterizou-se como o principal motivo daindicação para a realização da cirurgia (57,35% dos casos),segundo o laudo médico. Para classificarmos em “Outros”,foram selecionados as patologias menos freqüentes e, porisso se excluíram as artroses, as fraturas e as solturas quetiveram grande representação, e que mereceramclassificações próprias.

Comparando os lados afetados, nota-se umaprevalência do Direito (55,88%) sobre o Esquerdo(44,12%).

Percebe-se que na relação Idade x Sexo (Figura 2)teve-se uma grande prevalência de mulheres entre 61 e 70anos (38,89% da população de mulheres), já para os homens

a idade mais relevante é entre 51 e 60 anos (50%). Commenos de 30 e mais de 80 anos, observou-se apenasmulheres. Os valores são iguais na faixa etária de 41 a 50anos. Os homens prevalecem somente no espectro entre 51a 60 anos. Nas faixas etárias entre 31 a 40, 61 a 70, 71 a 80há prevalência de mulheres.

Para fatores etiológicos em relação à idade (Figura 3)observamos que 64,10% dos casos de artrose concentram-se nas faixas etárias entre 51 a 60, e 61 a 70 anos. As fraturassó ocorreram a partir dos 61 anos e predominou nospacientes com idade acima de 80 anos. As solturasdistribuem-se pelo espectro amplo de 31 a 80 anos, maisfreqüentes entre 61 a 70 anos. Outros fatores como a artriteséptica, falência biomecânica e necrose avascular são poucofreqüentes, mas aparecem entre 41 e 70 anos.

Na relação lado afetado por faixas etárias (Figura 4),o lado direito prevalece sobre o esquerdo principalmente nafaixa etária entre 61 a 70 anos, onde temos o maior númerode casos (39,47% do total de pacientes acometidos no ladodireito). Para os casos no lado esquerdo, verificamos umamaior distribuição em três faixas, 41 a 50, 51 a 60 e 61 a 70anos.

Na relação Sexo versus Etiologia (Figura 5), temos umequilíbrio entre homens e mulheres com artrose e soltura deprótese, com leve predominância de homens na primeira e demulheres na segunda causa. Já nas fraturas, a predominânciade mulheres é visível, temos uma relação de 11 casos paraapenas 1 homem. Outros fatores também têm pouca diferençaentre homens e mulheres, porém tendendo ao sexo masculino.

Quando comparamos as relações entre ladoacometido e sexo (Figura 6), há um equilíbrio no sexomasculino, dividido igualmente nos dois lados, já as mulherestêm uma maior prevalência de intervenções no lado direito(61,11% das mulheres da amostra).

Quando comparamos os fatores etiológicos (Figura7) que acometem os lados direito e esquerdo da populaçãode amostra desta pesquisa podemos verificar que nasartroses e nas fraturas há pouca discrepância de valoresrepresentativos, porém nas solturas temos uma prevalênciade 69,23% de casos do lado direito em relação ao total desolturas da amostra. Além disso, na população representativados outros fatores, também temos uma maior prevalência decasos no lado direito em relação ao esquerdo.

Quando se relacionou o resultado encontrado compesquisas anteriores observou-se que em relação à idadedos pacientes, estes dados vão ao encontro com fatores comoo envelhecimento populacional brasileiro e mundial, o queressalta a importância de tal pesquisa, visto que cada vez

Rosa F P & Cattelan A. Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadril no Hospital São Vicente de Paulo.

Figura 2. Relação entre faixa etária e sexo.

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mais teremos representantes destas faixas etárias. No ano2000 estimava-se que o Brasil teria uma população de 21,5milhões de pessoas com mais de 60 anos.3

A artrose do quadril é uma doença de alta prevalência,especialmente nas faixas etárias mais avançadas.27 Além disso,outras pesquisas mostraram que as artroses acometem pessoasa partir dos 50 anos, podendo ocorrer antes, relacionada aproblemas ortopédicos e profissionais, constituindo-se na maisfreqüente das doenças reumáticas.3 Em relação ao sexo, osdados concordaram com pesquisas de Eichemberg que dizemque os homens e mulheres são igualmente acometidos pelaartrose de quadril.7 Sobre a raça, os resultados vão ao encontrocom os dados das pesquisas de Moreira, onde se observouque os amarelos e negros têm menor incidência de artrose doque os brancos.21

Em relação às solturas, a maior parte das cirurgiasortopédicas realizadas no Brasil utiliza próteses com articulaçãocabeça/acetábulo tipo metal/polímero, a qual tem demonstradoaltos índices de falhas. Este tipo de articulação pode durar atécerca de dez anos, sendo a soltura da articulação o maiorproblema em longo prazo.13 Não foram encontradas pesquisasrelacionando à soltura com outros fatores.

Os dados encontrados concordam com outraspesquisas. A incidência de fraturas de quadril aumentaexponencialmente com a idade, indo de 9/100.000 entre asidades de 35 e 44 anos para 3.317/100.000 mulheres/ano empacientes com 85 anos ou mais.8

No ano 2000 estimava-se que o Brasil teria quase 2milhões de casos de fratura de colo do fêmur em pessoas commais de 60 anos.3 Além disso, cerca de 85% das fraturas de

quadril ocorrem entre as mulheres.8 Na Figura 8 podemosobservar a relação da idade com o índice de fraturas emmulheres com osteoporose. Nesta pesquisa observou-se onúmero de casos de fraturas de quadril, em relação às fraturasde vértebras e de punho.

Segundo o Ministério da Saúde, assim como as artroses,a artrite séptica distribui-se de maneira semelhante em ambosos sexos.3 Além disso, na artrite séptica o agente etiológicomais comum em adultos é o Staphylococcus aureus, aarticulação mais acometida é a coxofemoral e pode serencontrada em qualquer idade.3

Por fim, não foram encontradas estatísticas relacionadasao lado acometido em pacientes com próteses totais de quadril.Além disso, utilizaram-se os fatores etiológicos para dividir adiscussão devido ao fato de que foram as causas que levarama colocação da prótese total de quadril.

CONCLUSÃOAtravés deste estudo verificou-se o perfil dos pacientes

que realizaram artroplastia total de quadril no Hospital SãoVicente de Paulo, sendo na maioria, pessoas entre 51 e 70anos, do sexo feminino, pertencente à raça branca e comdiagnóstico de coxo-artrose de quadril em lado direito. Dentreas principais causas para a realização da artroplastia total doquadril destacaram-se as artroses seguidas das solturas efraturas. O lado direito foi o mais acometido provavelmentedevido à relação com o alto número de destros na população.

Conhecendo-se o perfil do paciente, políticas deprevenção poderão ser dirigidas mais especificamente a estepúblico, além disso, poderão ser orientados quanto ao fato deserem mais propensos ao uso das próteses. Medidasfisioterápicas preventivas e de reabilitação poderão sertomadas, mais especificamente para o grupo de maiorprevalência da amostra, a fim de que se obtenha uma melhorqualidade de vida dos indivíduos, além da prevenção de futurascomplicações advindas do processo de desgaste da prótese.

Sugerem-se novas pesquisas na elaboração depropostas para protocolos de prevenção e de informaçõesdestinadas ao público alvo desta pesquisa, e também se sugerenovas pesquisas em relação a fatores como o lado dominanteem relação ao lado mais acometido e também ao tipo de próteseque são utilizadas com maior freqüência, ou seja, ascimentadas e as não-cimentadas, e sua relação com as solturasdas próteses.

Rosa F P & Cattelan A. Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadril no Hospital São Vicente de Paulo.

Faixas etárias(em anos

completos)com n = 68

Até 30 1 31 a 40 4 41 a 50 8 51 a 60 18 61 a 70 22 71 a 80 10 + de 80 5

Classificaçãoda amostra

segundo o sexo:(n = 68)

Homens 32Mulheres 36

Classificaçãopor raça(n = 68)

Brancos 63Pardos 3Negros 2Amarelos -Indígenas -

Classificação segundoa etiologia dasartroplastias:

(n = 68)

Artrose 39Solturas 13Fraturas 12Outros 4

Classificação pelolado acometido:

(n = 68)

Lado direito 38Lado esquerdo 30

Figura 8. Incidência de fraturas por osteoporose em mulheres.

Tabela 1.

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REFERÊNCIASObs.: 32 referências à disposição dos leitores.

Summary

EPIDEMIOLOGY OF HIP’S TOTAL ARTHROPLASTY IN PATIENTSOF SÃO VICENTE DE PAULO’S HOSPITAL

The hip’s total arthroplasty is indicated to patients who present a painfularthritis articulation and were incapable to obtain any results with a conservativetreatment. The main goal of this research is to characterize the patients’ profile whowere subdue to total hip’s prosthesis, and were admitted at São Vicente de Paulo’sHospital in Passo Fundo, in the following aspects: gender, age, color of the skin,specifying the people who suffers this illness and the most frequent reasons of theprosthesis use. This characterize happened by transversal delineation, descriptiveand quantitative being the sample selected through 68 patients’ prescriptions whohave done the hip’s total arthroplasty from July to September of 2005. With theconclusion that the patient’s profile submitted to a hip’s arthroplasty is in most ofthe times female, white in the age group of the 60 year-old with a right hip’s arthrosisdiagnosis.

Uniterms: Hip’s prostheses, arthrosis, physiotherapy.

Rosa F P & Cattelan A. Epidemiologia das Artroplastias Totais de Quadril no Hospital São Vicente de Paulo.

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Modificações no Modelo de Tradução GênicaCristian F. Nunes, Angela Sanderson, Caroline Duarte, João G. Castellano, Tailize Menegazzo, César Augusto L. Pires.

Faculdade de Medicina, Universidade de Passo Fundo (RS).

Resumo

Nesta revisão buscamos demonstrar a importância bem como explicitar dois dosmecanismos pelos quais as células se protegem da produção de proteínas anômalas, ononsense-nediated decay e o nonstop decay. Estes processos reconhecem erros nos genes,que determinam o término prematuro, ou a falha no término da tradução, respectivamente.Para tanto, utilizam elementos do processo de tradução tradicional para localizar e eliminarRNAm contento alteração. Então, o correto funcionamento deste complexo pode evitar ouminimizar a ocorrência de patologias genéticas.

Unitermos: Modelos genéticos, genética médica, tradução genética.

Artigo de Revisão

Desde que a idéia da tradução gênica foi concebida,inúmeros estudos vêm sendo realizados a fim de se entendermelhor todo este processo, que em sua complexidade permiteaos mais diversos organismos expressarem os produtos deseu código genético. Após anos de pesquisas chegou-se aum padrão ou modelo para a tradução gênica que,basicamente, resume-se em: (1) RNAm que sofreu splicingé exportado para o citoplasma; (2) os ribossomos se ligam aessa fita de RNAm e começam a ler os códons; (3) ao acharo códon de iniciação (AUG), o ribossomo “atrai” um RNAtcom um anti-códon complementar possuindo um aminoácidoligado a ele, que se liga ao códon na fita de RNAm; (4) esteprocesso se repete com outros códons e vão se formandoligações peptídicas entre os aminoácidos adjacentes; (5) oribossomo continua lendo os códons até achar o códon determinação (UGA, UAG ou UAA ), então se solta da fita deRNAm, deixando como saldo do trabalho uma molécula deproteína. Porém, este modelo não se aplica em todascircunstâncias. Estudos que vêm sendo realizados por muitosanos, têm provado que a célula possui mecanismos de“controle de qualidade”, que buscam por mutações nas fitasde RNAm. Uma vez encontrada uma mutação, esta fita édegradada, a fim de minimizar ou abolir os danos causadospela produção de uma proteína defeituosa. Tal artifício temservido de base para o estudo de diversas patologiasrelacionadas à defeitos ou ausência de determinadasproteínas. Existem basicamente dois mecanismo dedegradação de RNAm com mutação, a nonstop decay (NSD)e a nonsense-mediated decay (NMD), que é o maisimportante e estudado destes mecanismos.

O que é a NMD?A NMD é o processo responsável pela eliminação de

fitas de RNAm contendo mutações nonsense, ou seja,aquelas mutações que se caracterizam pela presença de

um códon de terminação prematuro (CTP) e, que podemlevar a formação de proteínas truncadas. Este mecanismoestá presente em todos os eucariotos estudados até agora1.

Levando-se em conta a definição acima, fica claroque a NMD depende do reconhecimento da posiçãoimprópria de um CTP. Em eucariotos superiores, o códon determinação verdadeiro é encontrado, geralmente, no últimoéxon do RNAm, sendo assim, um códon de terminaçãoanômalo que esteja localizado no último exon de um RNAm,após o códon de terminação verdadeiro, não desencadearáesse processo. Então, para que o mecanismo da NMD sejainiciado é necessário que a alteração seja suficientementeprematura, ou seja, geralmente, 50-55 nucleotídeos (nt) antesda última junção éxon-éxon.

Para tanto, essas junções éxon-éxon precisam estarmarcadas de alguma forma para que sejam reconhecidaspelos ribossomos, esta marcação é feita por determinadasproteínas durante o processo de splicing. Baseando-senesses dados podemos afirmar que a NMD é dependentedo splicing, pois é necessário que este ocorra para que osribossomos reconheçam as junções éxon-éxon ondeanteriormente localizava-se um íntron.

Igualmente, a NMD é dependente do processo detradução. Isso pode parecer um tanto estranho, já que a NMDse trata de um mecanismo que, como dito anteriormente, éuma modificação do processo de tradução. No entanto, talafirmação se torna verdadeira se pensarmos que as mesmaestruturas, como os ribossomos e certas proteínas, que estãoenvolvidas na tradução típica são utilizadas para a realizaçãoda NMD.

Qual a importância da NMD?Uma vez que a perfeição do produto que está

codificado em um gene é essencial, a taxa de erro naexpressão do mesmo deve ser muito baixa. Sendo assim, a

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NMD é de suma importância para o ser humano já que afreqüência estimada de mutações nonsense e frameshift emdesordens genéticas é de cerca de 25%2.

Tem-se o conhecimento de que esse sistema podeagir sob cerca de 200 desordens genéticas que podem sergeradas por um CTP1. Essas alterações podem ser causadaspor transcritos que não sofreram splicing ou sofreram splicingincompleto, produzindo assim proteínas truncadas e semfunção, que podem até ser deletérias ao organismo porcompetir com os produtos funcionais do gene4.

Uma das patologias mais conhecida que pode sercausada por um CTP é a βββββ-talassemia, uma hemoglobinopatia,causada por falha na produção da cadeia βββββ da hemoglobinahumana. Quando há um CTP no RNAm da βββββ-globina, ocorre aforma recessiva da b-talassemia, onde esse transcrito édegradado pela NMD. Já a sua forma dominante, e mais severa,ocorre quando esse RNAm defeituoso não é degradado, porescapar a NMD4.

Outra doença que pode ser causada por um CTP é aDoença de Tay-Sachs, uma desordem neurodegenerativaque é herdada de forma autossômica. Nessa patologia há aformação de um CTP, quando há alteração no gene HEXA. Amais comum dessas alterações é a inserção de 4 pares debases no éxon 11 deste gene, que possui 14 éxons,reduzindo o tamanho do transcrito em 100 códons. A NMDimpede que esses RNAm sejam traduzidos, comodemonstrado em pacientes homozigotos onde os níveis destetranscrito contendo nonsense, nos fibroblastos, sãoindetectáveis5.

Ainda, a NMD tem importância nos linfócitos, ondetanto imunoglobulinas quanto receptores de células T sofremrecombinações somáticas e mutações em busca deversatilidade para o sistema imune. Esse processo, que étão importante para o bom funcionamento da imunidadecorporal, com freqüência leva a formação de transcritos comum CTP, que especialmente no gene βββββ do receptor de célulasT sofre extraordinariamente forte regulação do RNAm pelaNMD6.

Diante destes fatos, evidencia-se que a NMD temimportância fisiológica essencial e pode, a partir doentendimento total desse processo, levar a criação de novascondutas para o tratamento de uma série de desordenscausadas por alterações sujeitas a esse mecanismo.

O splicing como pré-requisito para a NMD:Como mencionado anteriormente, para que seja

possível a realização da NMD é necessário que o RNAmtenha passado pelo processo de splicing. A função principaldo splicing é retirar os íntrons do pré-RNAm que foi transcrito,restando apenas as regiões que devem ser traduzidas. Suaimportância para NMD está no fato de o spliceossomodepositar certas proteínas no RNAm, modificando suacomposição, mas não sua seqüência, e sinalizando aocitoplasma o local onde os íntrons estavam.

O spliceossomo deposita, estavelmente, váriasproteínas, em um complexo com ~335 kDa, em uma posiçãoconstante de 20-24 nt antes das junções éxon-éxon,independentemente da seqüência de bases que ali existir.Este complexo, chamado de “exon-exon junction complex”

(EJC)4, é formado por, no mínimo, 5 proteínas: SRm160, DEK,RNPS1, Y14 e REF/Aly. Ele protege cerca de 8 nt do RNAmda digestão completa pela RNAse e, ainda, estudos mostramque a colocação desse complexo promove uma vantagemseletiva na exportação e tradução dos RNAm que sofreramsplicing4. Este complexo não é uma estrutura estática, e semodifica a medida em que o RNAm evolui do núcleo para ocitoplasma, em direção a tradução7.

Sua localização 20-24 nt antes das junções éxon-éxon serve para “marcar” essa junções para a NMD. Issoexplica o porque códons de terminação, geralmente, nãosão reconhecidos como prematuros a não ser que estejamlocalizados 50-55 nt antes da última junção éxon-éxon nosentido 3’ de um RNAm, determinando a dependência dosplicing para a NMD7. Além disso, o EJC serve como pontode ancoragem para proteínas, como a Upf3, que sãoessenciais para a formação do complexo de vigilância, comoserá discutido mais adiante4.

Três das proteínas desse complexo estão direta ouindiretamente ligadas ao processo de splicing. SRm160, quetem localização na matriz nuclear, é um membro da famíliaSR de fatores de splicing, que ativam o splicing do pra-RNAmpor interagir com outras proteínas. DEK é uma fosfoproteínamultifuncional, que se associa ao RNAm através deinterações mediadas pela proteínas SR e pode modificar adensidade da superhélice do DNA na cromatina e tambémalterar a transcrição de alguns genes8. RNPS1 tem comofunção, geralmente, ativar o splicing, juntamente, com outrasproteínas como a SRm160 e SRm300 e, também, pode servirpara auxiliar no acoplamento da proteína Upf3. Com exceçãoda RNPS18, as duas outras proteínas não passam do núcleopara o citoplasma, elas se soltam do RNAm após o final dosplicing, pois elas somente são necessárias para arealização desse processo.

REF/Aly, juntamente com a Y14, tem função de recrutarfatores de exportação como a proteínas TAP. Esta é umaproteína vai e vem núcleo-citoplasma que não consegueinteragir diretamente com o RNAm e necessita do intermédioda proteína REF/Aly ou também da Y147. Portanto, a principalfunção da REF/Aly é facilitar a exportação do RNAm8, sendoque se solta desse logo após sua passagem para ocitoplasma, descartando assim a hipótese de servir como

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Figura 1. Mecanismo do Splicing.

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um marcador para a NMD.A Y14 é a principal constituinte do EJC para a NMD,

ela é uma proteína vai e vem núcleo-citoplasma, que não sesolta do RNAm após a exportação para o citoplasma.Acredita-se que, no núcleo, como mencionadoanteriormente, juntamente com a REF/Aly, a Y14 teria afunção de recrutar o TAP, além de ser um indicador de que osplicing ocorreu, impedindo que ocorra um outroprocessamento, que seria desnecessário e provavelmenteprejudicial9. No citoplasma, sua função mais importante é“marcar” a localização das junções éxon-éxon, uma vez queestá localizada no RNAm, aproximadamente, ~20 nt antesdelas. Dessa forma, ela pode sinalizar a presença de CTP edisparar a NMD9, pois esses estarão sempre antes de pelomenos uma dessas proteínas. Ainda, a Y14, no núcleo,interage com a proteína Upf3, que é essencial para a NMD.

Recentemente, uma outra proteína tem sido estudada,ela seria um sexto componente do EJC, ela é chamada deMagoh. Esta proteína se liga avidamente e diretamente aY14 e ao TAP e, poderia servir como um adaptador para aligação entre elas10. Ela mostrou acompanhar o RNAm quesofreu splicing no citoplasma1, porém sua função específicaainda não foi definida.

As proteínas Upf e suas funções:As proteínas Upf formam um complexo necessário

para o funcionamento da NMD11, dentre as três, cada umadelas têm estrutura e função própria e entra no processo emum diferente momento.

A Upf3 é uma proteína básica, vai e vem núcleo-citoplasma, com predominância nuclear, que tem 45 kDa12.Ela é a primeira a interagir, indiretamente, com o RNAm6, porse ligar a proteína Y14 do EJC no núcleo e acompanha-lasaté o citoplasma.

As Upf2 têm 127 kDa e são proteínas ácidas, comlocalização perinuclear12. Elas interagem com as proteínasUpf3 logo após a exportação para o citoplasma, criando umabase para a associação das proteínas Upf113.

A Upf1 é uma proteína exclusivamente citoplasmática,com 109 kDa12, que interage com a Upf2 na formação docomplexo de vigilância e também interage com os fatores derelease eRF1 e eRF3. Por meio dessa interação ela pode terpapel de modulação do final da tradução por três maneiras:(1) aumentando a eficiência com que os fatores de releasecompetem com o RNAt pelo sítio A do ribossomo, (2)aumentando a eficiência com que os eRF realizam a hidrólisedo peptídio no sítio P ou (3) aumentando a reciclagem doseRF e, dessa forma, sua disponibilidade para promover ofinal da tradução1. Além disso, as Upf1 parecem interagircom a proteína Dcp1, envolvida na remoção do cap-5’, o quesugere uma estreita relação entre a Upf1 e a remoção docap-5’ 6.

A montagem desse complexo de proteínas Upf, deacordo com as características de cada uma das proteínasintegrantes, ocorre de forma seqüencial. Primeiramente, aUpf3 s liga à Y14 no núcleo e a acompanha até o citoplasma,então a Upf2 se liga a Upf3, na região perinuclear.Finalmente, se a NMD for disparada, a proteína Upf1 se ligaao complexo Upf3-Upf26, através de vários processos que

serão explicitados mais adiante, formando o complexo devigilância maduro.

O mecanismo da NMD:Até o momento, temos a presente noção de que o

RNAm acaba o splicing, de certa forma, marcado, ou seja,as junções éxon-éxon estão sinalizadas por sinais protéicos,os EJC, ou mais especificamente a proteína Y14. Esta, aindano núcleo, se liga a proteína Upf3, que a acompanha atravésdo poro nuclear até o citoplasma7. Com a exportação,algumas das proteínas dos EJC ficam no núcleo, e outras sesoltam do RNAm no citoplasma, logo após a exportação.Para a NMD, o interessante é a interação entre as proteínasY14 e Upf3, que, no citoplasma, servirão de alicerce para oacoplamento das demais proteínas envolvidas no processo.Ainda, existem outras proteínas que se associam com oRNAm, ainda no núcleo, e possuem funções específicas, é ocaso da PABP2 (poli-A binding protein ou proteína de ligaçãode poli-A) que tem a função de ligar caudas de poli-A,estimular sua extensão e controlar o seu comprimento15.Outras dessas proteínas são as CBP (cap binding protein ouproteína de ligação de cap) 80 e 20, as duas juntas formamo complexo nuclear de ligação de cap, um heterodímero,onde a CBP80 interage diretamente com a extremidade 5’do RNAm e a CBP20 indiretamente, via CBP8015.

Concomitantemente ou logo após a exportação, naporção do RNAm que já encontra-se no citoplasma, asproteínas Upf2, que tem localização perinuclear, se ligam àsproteínas Upf3 devidamente ancoradas na remanescentedo EJC, Y14 7. Estas três proteínas juntas, formam o que nósoptamos por chamar de primórdio do complexo de vigilânciaou complexo de vigilância jovem, que evoluirá se houver umCTP.

Durante o primeiro período ou ciclo de tradução,juntamente com o open-reading frame, os ribossomos retiramesse complexo, formado por: Y14, Upf3 e Upf27. Estesribossomos vão traduzindo o RNAm até que encontrem umstop codon, seja ele prematuro ou verdadeiro, e então param.A parada do ribossomo serve como um sinal para orecrutamento dos fatores de release, eRF1 e eRF3, quechegam unidos em um complexo para se ligar com o sítio Ado ribossomo, sendo que juntamente com este complexovem ligada a proteína Upf116.

Se este stop codon for verdadeiro, o ribossomo pelainteração com os fatores de release se soltará do RNAm e atradução continuará a ocorrer com os ribossomos a seguir.No entanto, se este for um CTP, o ribossomo terá falhado emretirar alguns dos complexos que marcam as junções éxon-éxon. Caso este CTP seja suficientemente prematuro, ouseja, distante 50-55 nt antes da junção éxon-éxon, haveráuma série de interações entre as proteínas do complexo devigilância dito jovem e outras que são recrutados, o que levaráa formação do complexo de vigilância maduro.

Primeiramente, após a ligação do complexo formadopor eRF1, eRF3 e Upf1 no sítio A do ribossomo, há a hidróliseda ligação entre o peptídio e o RNAt, e o eRF1 se dissociado ribossomo. Isso permite que a Upf2, momentaneamente,interaja com o eRF3, logo após isso, há um rearranjo nocomplexo e a Upf2 se liga novamente a Upf3, havendo a

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liberação do eRF3. Então, um novo complexo com fatoresde release é recrutado pelo ribossomo, este se liga aoribossomo permitindo a sua liberação completa do RNAm.Finalmente, forma-se o complexo de vigilância maduro,formado basicamente por três proteínas: Upf1, Upf2 e Upf316.

Após formado este complexo, a proteína Upf1 interagecom a proteína Dcp1 (decapping proteing ou proteínaremovedora de cap), esta, tem como função desfazer aligação da proteína CBP80 com o RNAm, removendo assimo cap-5’6. Ela faz isso clivando a ligação entre a proteínaCBP80 e o RNAm, liberando m7GDP e deixando no transcritoum final 5’ fosforilado, que pode ser substrato paraexorribonucleases17. Ainda, existe outra proteína removedorade cap, a Dcp2, mas com importância para a NMD ainda aser comprovada16. A degradação do RNAm é, então,catalisada pela enzima Xrn1, uma exorribonuclese 5’ 3’,que degrada o transcrito nesse sentido sem a necessidadede que a cauda de poli-A tenha sido encurtada12.

O teoria do Pionner Round of Translation:A teoria do Pionner Round of Translation ou ciclo

precursor de tradução foi citado, primeiramente, em 2001, eteoriza que existe um primeiro ciclo traducional, queenvolveria diferentes proteínas, antes que o RNAm fosseexposto a maquinaria da tradução normal, no qual este seriasubmetido a NMD se possuísse uma mutação nonsense15.Este primeiro ciclo seria um tanto quanto lógico, uma vezque, a NMD serve como um controle de qualidade para acélula, e o quanto antes um RNAm contendo mutação fordegradado, menos prejudicial ele será para a célula.

Em células de mamíferos, a NMD se limita a RNAmrecém sintetizados18, o que é consistente com a idéia de queeste ainda não está com todas as proteínas necessárias paraa conformação cíclica do RNAm, durante a tradução regular.Para que o transcrito atinja a composição necessária atradução regular, certas proteínas são trocadas eadicionadas, por exemplo: o complexo CBP80-CBP20 ésubstituído por eIF4E, um proteína de ligação de capcitoplasmática; PABP2 é trocada por PABP1, uma proteínaligadora de caudas de poli-A citoplasmática; eIF4G, um fatoriniciação da tradução, é adicionado15. A observação e estudodestes fatos, levou a conclusão de que o RNAm só é sujeitoa NMD, antes que esteja pronto para a tradução regular, ouseja, antes que essas trocas e adições de proteínas tenhamsido feitas15,18.

Ainda, estes estudos levantaram a hipótese daexistência de três sítios para a NMD: nuclear, citoplasmáticoou outro onde o RNAm seria sujeito a fatores citoplasmáticosmas estaria ainda em contato com o poro nuclear15. A terceiraé a mais aceita, uma vez que satisfazeria fatores como apresença de ribossomos, que se encontram abundantementena membrana nuclear externa3, e a idéia de uma degradaçãorápida, antes que produtos deletérios fossem formados.

Dessa forma, podemos afirmar que, a NMD ocorreem um estágio onde o RNAm ainda não está totalmentepronto para a tradução regular, e isto ocorre no momento emque o transcrito está no citoplasma, mas ainda associadocom o núcleo.

Nunes CF e cols. Modificações no Modelo de Tradução Gênica.

Figura 2. Sequência da NMD.

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Summary

GENIC TRADUCTION MODEL MODIFICATIONS - Review

In this literature review, the Authors intend to demonstrate the importance, as well aselucidate two of the mechanisms by which the cells protect themselves from the synthesis ofanomalous proteins: the Nonsense-mediated decay and the Nonstop decay. These processesrecognize errors in genes, that determine the premature ending, or the failure in the endingof traduction, respectively. To do that, it uses elements of the ordinary traduction to locateand eliminate the RNAm containing alteration. Then, the correct functioning of this complexcan avoid or minimize the occurrence of genetic pathologies.

Keywords: Genetic Patterns, Medical Genetics.

A NSDA non-stop decay (NSD) é um mecanismo responsável

por identificar e degradar os RNAm que não possuem umstop codon, ou seja, que não sinalizam para o ribossomo ofinal da tradução. Tal mutação pode ser criada de diversasformas, como, por exemplo, a perda ou inserção de um oumais nucleotídios.

Exemplos deste tipo de degradação foram encontradosem bactérias e fungos e, especialmente, estudados na espécieSaccharomyces cerevisiae. Em células de mamíferos estemecanismo também já foi detectado, mas ainda foi poucoestudado, por isso, o mecanismo que será descrito aqui seráo observado nos fungos da espécie já citada.

A NSD, assim como a NMD, depende da tradução,pois só acontece se houver um ribossomo lendo o transcrito.Sendo assim, primeiramente, após a exportação para ocitoplasma, um ribossomo vem lendo e traduzindo o RNAm,se este transcrito for normal, ele acha um stop códon, pára e,após recrutar os fatores de release eRF1 e eRF3, se solta dafita de RNAm. No entanto, se não existir um stop codon neste

transcrito, o ribossomo continuará traduzindo sem parar.Após ler e “traduzir” toda a cauda de poli-A, adicionandopoli-lisina no C terminal do produto protéico, o ribossomochega ao final 3’ do transcrito e deixa o seu sítio A livre.Então, a proteína associada ao exossomo Ski7, que écitoplasmática, se liga ao sítio A que estava livre e dessaforma recruta o exossomo para degradar o RNAm no sentido3’ 5’.

Assim, a NSD, como outra modificação no modelo detradução gênica é mais uma das ferramentas que a célulatem para impedir a produção de proteínas afuncionais,evitando assim, danos a estruturas celulares, o que poderialevar a lise celular.

CONCLUSÃOTanto a NMD quanto a NSD tem como objetivo fazer

com que o RNAm passe por um controle de qualidade.Ambos mecanismos, de uma forma ou outra são modificaçõesdo modelo de tradução tradicional, uma vez que envolvemfatores normais da tradução, porém de maneiras diferentese para obterem outros resultados. Enquanto a NMD e a NSDbuscam falhas no RNAm para degradá-lo, a tradução tem oobjetivo de produzir uma proteína a partir do transcrito.

Atualmente, a NMD é alvo de diversos estudos, estes,se tornam cada vez mais freqüentes, visto que tal processopode nos explicar diversas patologias humanas e tambémmecanismos celulares de todos os organismos. Muito já ésabido sobre a NMD e espera-se que, com o melhorentendimento desse mecanismo, ela possa ser útil parajustificamos diversos acontecimentos que, hoje, não podemser explicados.

Do contrário, sabe-se muito pouco ainda sobre a NSD,principalmente, em células de mamíferos. Isso serve deestímulo para que, cada vez, mais pesquisadores busquemestudar este fenômeno celular e entender todas suas funçõese sua execução.

Nunes CF e cols. Modificações no Modelo de Tradução Gênica.

Figura 3. Mecanismo da NSD.

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Nunes CF e cols. Modificações no Modelo de Tradução Gênica.

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Doença do Refluxo Gastroesofágico em Lactentes

Fernanda Luzzatto, Rochele G. Cruz, Viviane Rech.Faculdade de Fisioterapia, Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

O Refluxo Gastroesofágico é uma ocorrência fisiológica, presente em algumgrau em todos os lactentes. Quando ocasiona alterações relacionas à nutrição, aoesôfago, ao sistema respiratório e sintomas otorrinolaringológicos passa ser definidocomo Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) resultando no comprometimentodos órgãos próximos do esôfago, incluindo manifestações respiratórias,otorrinolaringológicas e esofágicas que ocorrem independente da presença desintomas típicos. A pHmetria é o método diagnóstico preferido para a confirmaçãoe para acompanhamento do tratamento farmacológico que utiliza procinéticos einibidores da bomba de prótons. O tratamento cirúrgico é escolhido para pacientesrefratários à terapia farmacológica. A fisioterapia como área da saúde preventivapode oferecer estratégias educacionais para os pais, com objetivo de orientar sobreas posturas e equipamentos anti-refluxo, além da fisioterapia respiratória paramanutenção da higiene brônquica e eficiência das trocas gasosas, evitandocomplicações pulmonares.

Unitermos: Doença do refluxo gastroesofágico, lactentes.

Embora todos os lactentes tenham algum grau deRefluxo Gastroesofágico (RGE) a severidade dos sintomasvaria. Atualmente, a tendência tem sido a de utilizar apenasos termos RGE e DRGE (Doença do RefluxoGastroesofágico)1.

Muitos profissionais, assim como os familiares dospacientes, por muito tempo consideraram o RGE uma doençaincômoda que tinha apenas um pequeno impacto negativoe algumas discretas complicações a longo prazo.Atualmente, aceita-se que a DRGE não tratada reduz aqualidade de vida e está associada a graves complicações,como esofagite, dificuldade de crescimento em crianças,complicações respiratórias e otorrinolaringológicas, etc.2.

Tendo em vista que o RGE é uma das causasfreqüentes de infecções respiratórias de repetição, (fator derisco para o desenvolvimento de doenças pulmonarescrônicas), observa-se a importância do tratamentofisioterapêutico na profilaxia dessa patologia. O tratamentofisioterapêutico, juntamente com os devidos cuidados emrelação à criança, diminui os custos hospitalares, reduz onúmero de internações e de cirurgias desnecessárias. Porémdeve-se lembrar que a eficácia do tratamento depende de

um trabalho multidisciplinar e que o papel do pediatra éimprescindível, já que quanto mais cedo for iniciada afisioterapia, mais precoces serão os resultados3,4.

Além disso, a associação da DRGE com sintomasrespiratórios e otorrinolaringológicos tem sido cada vez maisfreqüentes. Apesar do reconhecimento do refluxo comocausa destas manifestações, existem poucos dados arespeito deste tema e muitas dúvidas quanto ao manejo doRGE oculto na infância5.

DISCUSSÃOEm crianças saudáveis menores de 2 anos de idade,

os episódios de RGE fisiológico apresentam-se na formasintomática, sendo que a presença de regurgitação é maisfreqüente no primeiro ano de vida. Com isso, podemosdiferenciar a regurgitação infantil do RGE patológico, que seassocia à sintomatologia clínica6.

O RGE é trânsito retrógrado e involuntário doconteúdo gástrico para o esôfago, podendo manifestar-secom regurgitação ou vômito de saliva, alimentos e secreçãogástrica. Todas as crianças apresentam algum grau derefluxo durante o crescimento, na maioria das vezes não

Artigo de Revisão

50-55.

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levando a seqüela7,8,9,10,.O RGE fisiológico inicia com sintomas entre 1 a 4

meses, resolvendo-se espontaneamente, até o primeiro anode vida, nos casos mais leves. Após 6 meses de idade, coma introdução de dieta sólida e adoção de postura mais eretapela criança, a freqüência de regurgitações diminui11,12.Portanto, da totalidade destes lactentes, apenas 2%necessitam de cuidados especializados e intervençõesmédicas13.

No entanto, a distinção entre o RGE fisiológico e aDRGE é feita em função da quantidade de refluxosobservados, pois o DRGE caracteriza-se por um aumentona freqüência, intensidade e duração dos episódios de RGE,com danos tanto à mucosa do esôfago quanto, em algunscasos, ao trato respiratório7.

A terminologia DRGE, inclui todos os sintomas eformas de danos teciduais secundários ao refluxo doconteúdo gástrico para o esôfago, ou seja, ocorrem alteraçõesnutricionais esofágicas, respiratórias ou relacionadas aoaparecimento de sintomas neurocomportamentais1,7,14.

Sugere-se que o RGE “silencioso” ou oculto pode seruma causa importante e pouco reconhecida deenfermidades pulmonares. Ocorre quando as manifestaçõessão somente as conseqüências ou complicações, apóslongos períodos assintomáticos, ou seja, na ausência deregurgitação. O RGE “silencioso” pode estar presente em 46a 75% dos pacientes com doença respiratória crônica2,7.

Incidência e PrevalênciaA maioria dos estudos que analisam a epidemiologia

do RGE em crianças e adultos utiliza métodos diferentespara defini-lo, o que resulta em dificuldades para estabelecera verdadeira prevalência desta patologia na população12,13,16.

Um estudo nos EUA de prevalência de sintomas deRGE em crianças, analisou dados de 948 entrevistados compais de crianças menores de 13 meses de idade. Foi relatadoa presença de regurgitação infantil em 50% das crianças commenos de 3 meses, em 67% na faixa etária de 4 a 6 meses eem 5%, entre 10 e 12 meses de vida11.

Contudo, Costa6 et al. (2004), analisando dados de798 crianças menores de 1 ano de idade relataram aprevalência do refluxo gástrico patológico de 11,15%, sendomaior nos dois primeiros trimestres de vida; 14,62% noprimeiro trimestre e 13,76% no segundo trimestre. Portanto,no estudo, predominou os portadores de regurgitação infantilfisiológica.

FisiopatologiaQuando analisa-se o RGE na faixa etária pediátrica,

deve-se lembrar que lactentes não são iguais a criançasmaiores, tendo em vista que no primeiro ano de vida ascaracterísticas do refluxo são relacionadas à imaturidade dealguns mecanismos da barreira anti-RGE17,18).

Os mecanismos que contribuem para a barreira anti-refluxo são: esôfago abdominal, pilar direito do diafragma,ligamento frenoesofágico, ângulo de His, a roseta gástrica eo Esfíncter Esofágico Inferior12,17).

O esôfago abdominal atua como barreira anti-refluxo,pois a pressão intra-abdominal é mais alta que a torácica

sendo que a localização parcial do esôfago no abdomeauxilia o fechamento do EEI com o aumento da pressãoabdominal19).

Já a contração do pilar direito do diafragma, aumentaa pressão intraluminal da junção esofagogástrica atuandocomo uma barreira anti-RGE durante episódios de tosse,inspiração ou esforço físico, comprimindo o esôfago ediminuindo a luz9,10.

O ligamento frenoesofágico impede que a pressãointratorácica negativa atinja o EEI, ou seja, mantém o esôfagofirme e bem posicionado para que haja maiorestabilidade12,19,20.

O ângulo de His é formado pela entrada oblíqua doesôfago no estômago e pela prega mucosa formada por essaentrada, que se projeta dentro da luz. Relata-se que quantomais agudo esse ângulo, mais forte é a barreira anti-refluxo20.Em recém-nascidos esse ângulo é menos agudo que emadultos, favorecendo o RGE em neonatos. Este ângulo deentrada no estômago forma uma válvula que aumenta apressão distal do esôfago com o aumento do volume gástrico,equivalendo em média um ângulo de 21 graus na populaçãogeral10,19.

A principal função do EEI é evitar o refluxo gástricopara o esôfago10, tendo como papel fisiológico, a proteçãodas vias aéreas contra o refluxo gástrico e prevenção daentrada de ar no trato digestivo durante a inspiração21.

Por muitos anos suspeitou-se que anormalidades doEEI fossem às únicas responsáveis pelo RGE da criança,mas isso não foi constatado em estudos que demonstraramo tônus inferior adequado, mesmo em lactentes prematuros.Apenas 20% de todos os episódios de RGE têm relação coma hipotonia do EEI22,23.

Atualmente, o relaxamento transitório do EEI foidefinido como relaxamento do esfíncter independente dadeglutição, não acompanhado de contração peristáltica doesôfago normal e com duração maior que 5 segundos8,sendo um mecanismo de defesa contra a distensão gástrica,permitindo a passagem de ar retrogradamente para oesôfago. Ocorrem principalmente após a alimentação e naposição vertical21.

Crianças apresentam, assim como nos adultos,episódios de refluxo relacionados com o aumento da pressãointra-abdominal, que ocorre quando a pressão do EEI éincapaz de se opor ao aumento da pressão abdominal19,23. Aquantidade de alimento ingerida pelos lactentes geralmentesobrecarrega a capacidade gástrica consequentemente, oRGE pode agir como uma válvula de alivio13.

A mucosa do esôfago é sensível aos efeitos lesivosdas substâncias do material refluído, incluindo ácidoclorídrico, pepsina e ácidos biliares12,20.

Entretanto, a acidez gástrica é baixa ao nascimento,atingindo níveis semelhantes aos dos adultos em torno dostrês meses de idade21. A dieta nos lactentes é essencialmentelíquida, o que pode favorecer mais a regurgitação apesardisso, a alimentação à base de leite dos lactentes se mostrarelativamente benigna no que diz respeito à neutralidade dopH23.

Outros autores ainda ressaltam que o grau deexposição do esôfago ao material ácido é o fator mais

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importante na determinação da DRGE contudo, quando opH esofagiano é superior a 4,0, o material refluído não causalesão na mucosa esofagiana. Embora regurgitações sejauma manifestação freqüente nos lactentes, estudos mostramque menos de 20% do material refluído para o esôfago distalé regurgitado por lactentes com RGE8,12.

Dentre os mecanismos de defesa da mucosa gástricaressaltamos o mecanismo de clareamento esofágico(“clearance esofágico”), que é dependente do peristaltismoesofágico, da secreção salivar e da força de gravidade. Ocorrepor meio das regurgitações e pela ação da motilidadeesofágica (peristaltismo), da gravidade e da saliva. Quandoa saliva é deglutida se torna alcalina, neutralizando a acidezdo material refluído, isso a torna um componente fundamentalna manutenção do pH esofágico, e em prematuros quepossuem uma atividade peristáltica menos freqüente. Muitospacientes portadores da DRGE necessitam de um maiornumero de deglutições para que o pH esofágico retorne osvalores normais1,19,23.

Quadro ClínicoO quadro clínico da DRGE caracteriza-se de modo

geral, pela presença de manifestações clínicas relacionadasàs complicações esofágicas ou extraesofágicas do RGE,como vômitos e a esofagite, as conseqüências pulmonaresa as alterações orais, otorrinolaringológicas ouneurocomportamentais e até a síndrome da morte súbita1.

A principal apresentação do RGE na primeira infânciaé a regurgitação, que na maioria das vezes não resulta emêmese visível. Pode ocorrer também retardo do crescimentopela conseqüente privação calórica secundaria aos vômitosrepetidos. Adicionalmente, os lactentes podem recusar-se acomer, graças a dor experimentada durante a alimentação24.

Em lactentes, episódios de irritabilidade, choronoturno, anemia acompanhada de sangue oculto nas fezespodem indicar esofagite. Além disso, a esofagite podemanifestar-se por distúrbios do sono, agitação e recusa dadieta. Hematêmese, melena e anemia ferropriva podem estarpresentes. O comprometimento pondo-estatural pode resultarde perda de nutrientes determinada pela esofagite, pelopróprio vômito, ou pelo gasto energético aumentado emdecorrência ao broncoespasmo e dificuldades para sealimentar12,25,26.

Manifestações RespiratóriasUm dos aspectos mais difíceis e controvertidos do

RGE é o estabelecimento de uma relação direta e causalentre o refluxo e o desenvolvimento de sintomas respiratóriosna criança, principalmente nos dois primeiros anos de vida.Além disso, em alguns casos, a prevenção do refluxo emcrianças com manifestações respiratórias recorrentes nãodetermina a resolução da patologia respiratória3,9,27.

Em um estudo que pesquisou a utilização da medidada saturação transcutânea de oxigênio concomitantementecom a realização da pHmetria esofágica na tentativa dedemonstrar possíveis associações entre quedas do pHesofágico e episódios de dessaturação. Evidenciou-se umaassociação significativa em lactentes que apresentavamsintomas pulmonares obstrutivos crônicos ou de repetição27.

A tosse crônica persistente pode ser manifestação deRGE, mesmo quando os pacientes não apresentam sintomasdigestivos, sendo que evidências mostram que a tossecrônica pode estar associada a RGE assintomático. Aceita-se que o RGE cause tosse através de um reflexoesofagobrônquico, mediado por estimulo vagal e estimulaçãoácida28.

Contrariamente, a tosse e o esforço respiratórioaumentado promovem um desequilíbrio no sistema deproteção contra o refluxo. Essas particularidades reforçamquestionamento se o RGE é um agente etiológico ousecundário em determinadas doenças pulmonares9.

Sintomas de RGE são comuns em crianças asmáticas,sendo que estudos de pHmetria são na maioria das vezesanormais. Contudo, a maioria dos pacientes inicia ossintomas de sibilância, tosse e dispnéia antes do primeiroano de vida, sem diferença entre os pacientes com e sempHmeria alterada29,30.

O estudo brasileiro de Pastorino et al.31 (1998) avaliouretrospectivamente 237 crianças asmáticas e obteve umaprevalência de apenas 24% de RGE. Este estudo foiespecifico para pacientes asmáticos na faixa etária dos 5aos 18 anos de idade.

Já para Molle21 (2003), a prevalência de pHmetriasconsideradas como alteradas para RGE foi de 47%. Nesteestudo foi realizada a espirometria a fim de avaliar a funçãopulmonar dos pacientes no momento do estudo da pHmetria.Os resultados da espirometria não apresentaram diferençassignificativas entre os pacientes com e sem RGE, assim comnão apresentaram correlação com os resultados dapHmetria.

O RGE tem sido diagnosticado em uma elevadaproporção de lactentes com apnéia e episódios de EARVs(eventos aparentes com risco de vida). Estudos sugeremque a apnéia obstrutiva em lactentes está frequentementeassociado com refluxo e é mais provável que ela ocorraprecedendo um episodio de RGE. Dados da literaturamostraram que de 89 lactentes com história compatível àEARVs, 40 deles apresentavam RGE32.

Da mesma forma, um estudo de Nunes et al.33 (1999)avaliou os eventos aparentemente ameaçadores à vida em56 pacientes, em sua maioria menores de 1 ano de idade, edetectou uma associação de episódios de RGE a 50% doseventos. Porém, para Molle33 (2003) não existem dados quesugiram que o refluxo seja uma das principais etiologiastanto para a síndrome da morte súbita quanto para os eventoscom aparente risco de vida.

A associação entre o RGE e a pneumonia periódicatem sido descrita em grupos heterogêneos de pacientes queinclui crianças normais, com incapacidades neurológicas oucom desordens anatômicas do trato digestivo superior29.

Pneumonias típicas de aspiração em ápice pulmonardireito são manifestações proporcionalmente raras de DRGEe apenas cinco por cento das pneumonias de repetição sãocausadas pela DRGE, em crianças não encefalopatas34.

Das crianças neuropatas, 10 a 15% apresentamepisódios de vômitos sendo que o RGE pode serdocumentado em cerca de 70% desses pacientes. A baixapressão do EEI, a permanência em posição supina por

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períodos prolongados, a espasticidade da musculaturaabdominal, a ocorrência de escoliose, convulsões, o efeitode medicações sobre a coordenação do mecanismo dedeglutição e sobre a pressão do EEI contribuem para a altaprevalência de RGE nesse grupo de crianças9.

ComplicaçõesA esofagite de refluxo instala-se quando ocorre um

desequilíbrio entre os mecanismos de agressão e de defesada mucosa esofágica e o diagnóstico baseia-se nascaracterísticas endoscópica e histológica. É mais comumno esôfago distal e caracteriza-se pela presença de edemade mucosa, erosões e complicações, como úlceras,estenose péptica e o esôfago de Barrett. As alteraçõesencontradas são a hiperplasia na zona basal e das papilassubepiteliais16.

A Estenose Péptica, em seu estágio inicial decorre doedema da mucosa e do espasmo muscular, alteraçõesreversíveis com terapêutica adequada. Se a agressãopersiste, as erosões tornam-se confluentes, mais profundase surgem ulcerações. A principal manifestação clínica é adisfagia (inicialmente para alimentos sólidos eposteriormente para líquidos), engasgo, regurgitações,vômitos e emagrecimento1.

O esôfago de Barrett é uma condição em que oepitélio escamoso normal do esôfago é substituído por umepitélio metaplásico colunar, contendo células globosas ecolunares, envolvendo a parte mais distal do esôfago (najunção gastroesofageana); não provoca sintomasespecíficos35.

O Adenocarcinoma é raro em crianças (apenas 2%),sendo o fator de risco mais importante para essa neoplasiao Esôfago de Barrett. A prevenção da esofagite e do Esôfagode Barrett na infância levaria a uma diminuição doadenocarcinoma em adultos13.

A Hérnia hiatal é a passagem de parte do estômago(ou de todo ele) para o tórax pelo hiato esofágico edependendo do tipo pode causar opressão e sensação dedispnéia, asfixia e disfagia, pelo conceito espacial entre osórgãos torácicos e porção do estômago herniada, quecomprime também o esôfago terminal, podendo ocasionardisfagia e regurgitação36.

Os sinais e sintomas otorrinolaringológicosapresentados pelos pacientes são decorrentes do efeitodireto do conteúdo gastroduodenal sobre a mucosaesofágica, laríngea ou das vias aéreas superiores. Aintensidade e a freqüência dos episódios, assim como a idadedo paciente, ditam a forma clínica apresentada19.

Os problemas otorrinolaringológicos associados aoRGE em crianças abrangem a rouquidão, globus faríngeo, tossecrônica, faringite, sinusite crônica, adenoidite, laringite, disfagiaorofaríngea, amigdalite crônica, otite crônica, granuloma decorda vocal, estenose subglótica, laringomalácea elaringoespasmo. Apesar dos mecanismos prováveis para essascomplicações ainda não estarem totalmente esclarecidos,evidências sugerem a associação, assim como a melhora dossintomas após instituição de tratamento adequado para RGE ealterações da pHmetria e da Impedanciometria esofágicas depacientes acometidos12,16,21.

DiagnósticoA história detalhada e o exame físico completo do

paciente são fundamentais para a avaliação do RGE, pois odiagnóstico pode ser estabelecido nesta etapa13.

Segundo Ribeiro7 et al. (2001), o diagnóstico da DRGEdeve ser confirmado por pelo menos dois métodosdiagnósticos dentre estudo radiológico, cintilográfico ouultrassonográfico. Adota-se este critério quando não épossível realizar a monitoração prolongada do pH esofágico,considerado o melhor método diagnóstico par a DRGE.

A pHmetria documenta a acidificação esofágicadurante períodos prolongados, ao longo das atividadeshabituais dos pacientes. Permite associar acidificaçãoesofágica com outros sintomas, principalmente respiratórios8.

Porém, Rodrigues5 et al. (2005) diz que um testenegativo não exclui o RGE como causa dos sintomasotorrinolaringológicos e respiratórios, uma vez que háresultados falso–negativos em 20 a 50% dos casos.

A deglutição com Bário é um modo sensível dedetecção, porém tem uma taxa muito baixa deespecificidade, porque muitos lactentes que têm pouco ounenhum sintoma clínico do problema manifestam refluxo depequena parte do bário para o esôfago. Não é útil tambémpara a avaliação das taxas de esvaziamento gástrico, porqueo bário é fisiologicamente inerte e não ativa nenhummecanismo receptor que tenda a modular o esvaziamento22.

Já a Cintilografia Gastroesofágica permite aidentificação do RGE mesmo após dieta com pH neutro(habitual em lactentes). Possibilita estudo do esvaziamentogástrico e detecção de aspiração pulmonar. Apresenta baixasensibilidade para estudo de RGE pós-prandial tardio sendoque sua sensibilidade é de 59 a 83% com período deobservação curto1.

A manometria esofageana avalia a mobilidade doesôfago, em pacientes que apresentam sintomas sugestivosde dismotilidade esofágica. Atualmente esta sendo poucoutilizada23.

A avaliação endoscópica está indicada para ospacientes que apresentam quadro clínico característico dascomplicações esofágicas da DRGE, mais comumenteobservado nas crianças maiores e nas portadoras decomorbidades38.

Os achados endoscópicos, embora freqüentes emadultos sintomáticos para RGE estão presentes em 60 a 80%das crianças, sendo a biópsia necessária para a confirmaçãoda esofagite, principalmente nas fases iniciais do processoinflamatório, quando o aspecto endoscópico pode ser quasenormal, servindo para confirmar a esofagite e graduar suaintensidade39.

Tratamento ClínicoO tratamento da DRGE tem sofrido modificações ao

longo do tempo, à medida que se ampliou o conhecimentosobre a etiopatogênese da doença e as novas opçõesterapêuticas13.

Tratamento FarmacológicoO uso de tratamento medicamentoso é recomendado

somente quando fica evidenciada a associação do refluxo

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com outros sintomas, caracterizando-o como DRGE17

Os antiácidos são essenciais para o alívio rápido daazia. Antagonistas dos receptores H2 ou agentes pró-motilidade em pacientes não complicados com freqüenterefluxo, elevam a pressão do EEI e melhoram o esvaziamentoesofageano-gástrico.

Os agentes procinéticos aumentam o tônus do EEI emelhoram o clareamento esofágico e esvaziamento gástrico.Porém, nenhuma destas drogas mostrou-se capaz dediminuir a freqüência dos relaxamentos transitórios do EEI,atualmente considerado o mecanismo fisiopatológico doRGE1.

Efeitos cardiovasculares adversos foram relatadoscom o uso da cisaprida, o que motivou restrições ao seuemprego e, a seguir, a proibição do uso da droga, apesar denão comprovada a relação causal direta entre essasintercorrências e a medicação. A domperidona, agenteantagonista da dopamina, tem sido usada em substituição àcisaprida16.

A terapia de supressão ácida, realizada com o usodos Antagonistas do receptor da Histamina, é recomendadaem casos graves de esofagite, mas não corrige distúrbiosprimários da motilidade. A ranitidina é o melhor e mais popularantagonista do receptor H22.

Os Inibidores da Bomba de Prótons atuam não sóaumentando o pH do conteúdo do tubo digestivo que reflui,mas também diminui o volume da secreção ácida, facilitandoo esvaziamento gástrico. Na criança o tratamento comomeprazol cura esofagite erosiva, por mais grave que estaseja, e a maioria dos sinais e sintomas do RGE41.

Orientações DietéticasSabe-se que medidas dietéticas são muito importantes

no tratamento do RGE, sendo preconizado o espessamentodas dietas lácteas, o aumento da freqüência da alimentaçãoe a diminuição do volume de cada refeição. O espessamentoda dieta pode ser realizado através de fórmulas anti-regurgitação e da adição de hidratos de carbono (amido demilho) ao leite. Soluções de alta osmolaridade diminuem oesvaziamento gástrico e aumentam a freqüência deepisódios de RGE8.

As refeições volumosas e altamente calóricas devemser evitadas. Os alimentos gordurosos não sãorecomendados, pois podem tornar mais lento o esvaziamentogástrico além de diminuírem a pressão do EEI. Alimentoscomo chocolates, refrigerantes, chá e café não sãoaconselháveis1.

Tratamento FisioterapêuticoA avaliação fisioterapêutica deve ser individual, sendo

recomendada especialmente para crianças que possuemanormalidades na pHmetria e que estejam indicadas aremoção do excesso de secreções brônquicas42.

O Fisioterapeuta com experiência nas técnicas demanuseio tem muito a ensinar aos pais dos lactentes comRGE suposto ou comprovado. Diversas ações preventivas,simples e eficazes, são essenciais no tratamento do RGE 4,43. Entretanto, ocorrem muitas versões dos autores quanto

ao melhor posicionamento.Segundo alguns autores o posicionamento eficaz é o

ângulo de 30o em decúbito ventral, o que faz o esvaziamentogástrico acelerar. O posicionamento ereto ou decúbito dorsalnão são tão eficientes para evitar o refluxo. Esseposicionamento é isoladamente capaz de tratar cerca de25% dos lactentes com RGE não complicado15,19,44.

Porém, há várias evidências de que a posição pronapara dormir representa um fator de risco para a morte súbitana infância15.

O decúbito lateral direito tem vantagens teóricas, comoo aumento do esvaziamento gástrico e a separação doconteúdo gástrico da junção esofagogástrica. Para criançasmaiores, a melhor postura após a alimentação é de pé ousentada na posição ereta1.

A posição corporal é uma preocupação constante paraa desobstrução brônquica em lactentes com RGE. Algunsautores contra-indicam a drenagem postural em pacientescom RGE e orientam a elevação da cabeça em um ângulode 30o como parte essencial do tratamento nãomedicamentoso15.

De acordo com Vandenplas15 et al.(1991), afisioterapia aumenta a incidência de RGE, sendo que amanipulação do tórax pode aumentar a aspiração doconteúdo gástrico por efeito da pressão torácica negativa.Chegou-se a esta conclusão após estudo com 63 criançasde 1 a 4 meses com diagnóstico de RGE por pHmetria, sendosubmetidos a trinta minutos de fisioterapia respiratória emjejum. A incidência de episódios do RGE descoberta pelasonda foi significativamente mais alta durante a fisioterapia.Neste estudo que relatou o RGE como uma conseqüênciada drenagem postural, a Fisioterapia descrita não seriaconsiderada ortodoxa desde que também consistiu no usode compressão abdominal, aspiração nasofaríngea e asposições eram planas ou Trendelemburg42.

Já Button46 et al. (2004) reveram estudo feitoanteriormente e concluíram que durante a FisioterapiaModificada (não utilizando postura inclinada) realizada emdecúbito lateral esquerdo com manobras de percussão evibração, ocorreram menos episódios de refluxo. Omecanismo para o aumento dos episódios de refluxo durantea fisioterapia com a posição de Trendelemburg, poderelacionar-se a pressão intra-abdominal aumentada e aocorrência de relaxamento do EEI. Sabe-se que a posturacorporal tem impacto substancial na freqüência dorelaxamento do EEI. Entretanto, Phillips42 et al. (1998)afirmam que na posição inclinada além do aumentar otrabalho do diafragma, aumenta também a competência doEEI.

Além disto, verificou-se que as crianças que receberama Fisioterapia Modificada (sem a cabeça inclinada),mostraram aumento significativo da função pulmonar, sendoque apresentaram menos alterações nos raios-X torácicosdo que outras submetidas a fisioterapia convencional46.

Fischer49 et al (1998) estudando os efeitos dafisioterapia respiratória em 40 pacientes com manifestaçõesrespiratórias crônicas, verificaram que as técnicas deexpiração forçada, vibração, estímulo da tosse, realizadascom decúbito elevado em 30o, não provocavam

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manifestações de RGE. Similarmente, outros autoresconcluíram que Fisioterapia Respiratória incluindo adrenagem postural, percussão e técnicas de AFE emposições diferentes, não induz ou aumenta a incidência deRGE em pacientes com Bronquite Crônica eBronquiectasias50.

A posição de Trendelemburg (cabeça inclinada parabaixo) como tratamento fisioterapêutico é relatado como fatorexacerbador do RGE em crianças45. Porém, em um estudorealizado com 21 crianças (1-27 meses) com desordensrespiratórias que foram avaliadas com pHmetria e submetidasà Fisioterapia Respiratória com drenagem postural e percussão,concluiu-se que a posição de cabeça para baixo para otratamento fisioterapêutico, não induziu nem agravou o RGE42.

As vantagens do tratamento fisioterapêutico são oaumento da força do diafragma, aumento da pressão doesfíncter esofagiano inferior, diminuição do número deregurgitações e vômitos (conseqüentemente diminuindo osriscos de aspiração), melhora do quadro respiratório,diminuição do esforço respiratório e do broncoespasmo,aumento da eficácia da tosse, aumento da ventilaçãopulmonar, melhora do condicionamento físico, diminuiçãode custos hospitalares, diminuição do tempo das internaçõese cirurgias desnecessárias4.

Tratamento CirúrgicoA cirurgia é o último recurso para o tratamento do RGE;

assim, apenas uma pequena parte das crianças portadorasde RGE é encaminhada para o tratamento cirúrgico. Apenas4% das crianças abaixo de um ano de idade com refluxonecessitará de cirurgia contra cerca de 20% das crianças

acima desta idade51.A maioria das técnicas atualmente utilizadas é uma

variante da técnica original descrita por Nissen e Rosseti em1959. O estômago é parcialmente liberado pela secção doligamento gastroesplênico e levado por trás do esôfagoabdominal, envolvendo-o sob a forma de uma gravata,criando o mecanismo valvular9.

CONCLUSÃOA associação da DRGE com sintomas respiratórios,

otorrinolaringológicos e esofágicos tem sido cada vez maismencionada, o que evidencia a importância de umdiagnóstico correto e precoce do profissional, o que evitariao aparecimento de complicações que se não tratadas podemlevar até a morte do paciente.

A Fisioterapia, como área da saúde capaz de atuar demaneira preventiva, tem muito a oferecer a estes pacientes,desenvolvendo estratégias educacionais como reuniões,palestras e divulgação de folders explicativos direcionadosaos pais, com a intenção de orientar quanto à utilização deposturas e equipamentos anti-refluxo, além da fisioterapiarespiratória, com o objetivo de manter a higiene brônquica eeficiência das trocas gasosas evitando o surgimento decomplicações pulmonares.

Contudo, um maior número de pesquisas deve serrealizado para uma melhor definição da patologia,conseqüentemente a terapêutica também evoluirá. Na áreada Fisioterapia, por sua vez, além de mais pesquisas sãoprioritários os estudos experimentais para comprovação efomentação de novos métodos de abordagemfisioterapêutica, quanto à DRGE.

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Summary

GASTROESOPHAGEAL REFLUX DISEASE - Revision of literature.

Gastroesophageal reflux is a physiological occurrence, present in some degree in all thesuckles. When it causes alterations related to nutrition, the esophagus, the respiratory systemand otolaringologic symptoms it is defined as Gastroesophageal Reflux Disease (GERD)resulting in the involvement of the organs next to the esophagus, including respiratory,otolaringologic and esophagic manifestations that occur independent of the presence oftypical symptoms. The pHmetry is the manly diagnostic method for the confirmation andfollow-up of the treatment with medicines that use prokinetic and inhibitors of the protonbomb. Surgical treatment is chosen for refractory patients to the therapy with medicines.Physiotherapy, as na area of preventive health, can offer educational strategies for theparents, with the objective of to guide them about positions and anti-reflux equipment,beyond the respiratory physiotherapy for the maintenance of the bronchial hygiene andefficiency of the gaseous exchanges, preventing pulmonary complications.

Keywords: Gastroesophageal Reflux Disease, Suckles, Revision of the Literature.

REFERÊNCIASObs.: Obs.: Obs.: Obs.: Obs.: 51 referências à disposição dos leitores.

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Intervenções Fisioterapêuticas em Fibromialgia

Adriana F. Dessuy, Lia Mara Wibelinger, Venelise A. Formighieri.Faculdade de Educação Física e Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

A fibromialgia é uma doença crônica, que tem como característica dores difusas no sistemamúsculo-esquelético, rigidez matinal, fadiga muscular, alterações do humor e do sono,existências de pontos dolorosos, entre outras. É uma doença predominantemente do sexofeminino que atinge jovens e adultos, com etiologia ainda pouco conhecida. O tratamentodessa síndrome é muito discutido por ser uma patologia de difícil diagnóstico; acredita-seque o melhor tratamento inclui uma equipe multidisciplinar, envolvendo profissionais comomédicos, psicólogos, fisioterapeutas, entre outros. O presente estudo tem por objetivoapresentar uma revisão de literatura a fim de abordar a síndrome da fibromialgia, assimcomo o tratamento fisioterapêutico para a sintomatologia que acompanha os indivíduosfibromiálgicos. Pode-se afirmar que a fisioterapia tem um papel muito importante no alívioda sintomatologia que envolve esses indivíduos, pois apresenta várias técnicas com eficáciacomprovada.

Unitermos: Fibromialgia, fisioterapia, tratamento.

A fibromialgia é caracterizada pela ocorrência de dormúsculo-esquelética generalizada, crônica, não inflamatóriae sensibilidade exacerbada à palpação de pontos dolorososchamados trigger points1. Freqüentemente estão associadosoutros sintomas, como fadiga, distúrbios do sono, rigidezmatinal e distúrbios psicológicos como ansiedade edepressão. Em 1990, o Colégio Americano de Reumatologiadefiniu critérios diagnósticos a persistência de queixasdolorosas difusas por um período maior que três meses e apresença de pelo menos 11 dos 18 pontos anatomicamentepadronizados2.

Apesar da dificuldade para chegar a uma definiçãoaceitável de dor, a maioria das pessoas concordaria queessa pode ter uma qualidade variável, indo de leve irritação,passando por prurido, queimação e sensação de pontadasaté sensações mais intensas lancinantes e latejantes e,finalmente, até a dor agonizante, intratável, que para algumaspessoas pode ser insuportável3.

Stockman apresentou uma ótima descrição dasíndrome fibromiálgica em 1904, que na ocasião foidenominada como “reumatismo crônico”, um termo que foiutilizado para distinguir essa condição das formas clinicasagudas ou da febre reumática, inclusive com a realizaçãode sete biopsias em nódulos dolorosos encontrados naregião glútea de pacientes com lombalgia, imaginando quetais nódulos fossem a causa dos sintomas, e observaram

presença de processo inflamatório nas bainhas neurais.Apartir destes achados histopatológicos iniciais, o termofibrosite passou a ser aceito na literatura, entre tanto, váriosestudos posteriores não conseguiram reproduzir os achadosinflamatórios4.

Vários termos como miofacite, mialgia tensional,fibromiosite, foram dadas a essa condição. Atualmente, o termofibromialgia (em grego: algos = dor; ia = condição) parece serapropriado e evita alguma implicação (como inflamação) naetiologia, que ainda é desconhecida5.

O objetivo final do tratamento de pacientes comfibromialgia é a melhora da qualidade de vida deles. Opaciente deverá ser informado que embora ainda não seconheça a causa da doença, portanto, nem sua cura, otratamento deve proporcionar maior tolerância aodesconforto, diminuição da dor e menor limitação narealização das atividades funcionais (Masi, apud Marqueset al, 2004) o tratamento atual está voltado, principalmente,para redução dos sintomas.

Segundo Rotés e Querol6(2002) observa umavariação na estratégia médica, quanto ao tratamento dessespacientes com fibromialgia. Visto que não se pode curar ouanular a sensibil ização dolorosa central, então ostratamentos se dirigem para aliviar os transtornos queacompanham a dor fibromiálgica pois, mesmo não curandoa enfermidade, melhoram a qualidade de vida destes

Artigo de Revisão

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enfermos e aliviam o quadro clínico.A fisioterapia tem um importante papel na melhora do

controle da dor e no aumento ou manutenção das habilidadesfuncionais do paciente em casa ou no trabalho,assim comona redução de outros sintomas que lhe causam sofrimento7.

Sabendo que esta doença causa um impactonegativo na vida de pacientes em idade produtiva detrabalho,isto por que além da dor os sintomas associadoscausam prejuízos na função, levando a incapacidade para otrabalho e, conseqüentemente a queda de renda familiar8,este trabalho tem por objetivo realizar uma revisão deliteratura dentro dessa patologia e da atuação da fisioterapiasobre a mesma, verificando qual o tratamento fisioterapêuticomais utilizado para amenizar os sintomas desta síndrome.

DISCUSSÃOA fibromialgia é uma síndrome clinica caracterizada

por dor musculoesquelética difusa associada a dor àpalpação de áreas musculares circunscritas (pontosdolorosos). Freqüentemente se associam a esse quadroclinico sintomas ou síndromes de natureza puramentefuncional, como fadiga, distúrbios do sono, cefaléia,depressão, síndrome do colón irritável, entre outros9. Tambémse fazem presentes, embora menos freqüentes, asparestesias, as cefaléias, a ansiedade, os sintomasreferentes a boca e/ou olhos secos (sintomas sicca) e ofenômeno de Raynaud10.

O exame físico e a investigação patológica nãorevelam evidências de inflamação ou degeneração articular,óssea ou de tecidos moles. A fibromialgia pode ocorrerisolada ou pode ser associada a outras doenças. É, ás vezes,referida como fibromialgia generalizada ou fibrose11.

A fibromialgia é uma síndrome dolorosa queapresenta outras síndromes e sintomas interligados,sobrepostos, daí a complexidade e dificuldades que seutratamento apresenta. Estudos mostram que ela é decorrentede uma disfunção central no processamento da dor12.

Como desencadeantes da fibromialgia se tem descritoo trauma físico, fundamentalmente na coluna cervical, e oestresse psicológico. Nos casos em que os pacientesidentificam um causa desencadeante demandam maiorescuidados de saúde13.

O quadro clínico costuma ser bastante rico eminformações, sendo seus portadores, habitualmente,poliqueixosos. Isso demonstra, a princípio, que a consultatende a ser demorada, exigindo anamnese e exame físicodetalhados14.

Helfenstein e Feldman14, em 2002 estudaram demaneira consecutiva, 200 pacientes, foram analisados osdados demográficos e ocupacionais, história clínica, FIQ,exame físico geral e exames complementares, quandonecessário; foram aplicados critérios diagnósticos parasíndromes disfuncionais e ananmenese dirigida parasintomas específicos, com o objetivo de verificar a variadasintomatologia que acompanha os portadores brasileirosdesta síndrome dolorosa, no sentido de auxiliar a abordagemdesses indivíduos. Concluíram que a síndrome dafibromialgia predomina no sexo feminino. O seu quadroclínico é polimorfo. Esta síndrome pode apresentar múltiplos

sintomas não relacionados ao aparelho locomotor. Taissintomas não são decorrentes de lesões teciduais eprovavelmente fazem parte de um mesmo espectro dedisfunção. Os pacientes sentem a dor como de forteintensidade, sem evidência de doença inflamatória, distróficaou degenerativa. Apesar de sua sintomatologia exuberante,o quadro clinico não é incapacitante. O reconhecimento destaentidade médica permite clarificar diversos estados de dorcrônica, que têm sido erroneamente interpretados comomanifestações de outras moléstias e, conseqüentemente,com abordagens incorretas e procedimentos iatrogênicos.

A síndrome da fibromialgia é uma condição dolorosacrônica bastante comum, na qual um achado clínicoreprodutível, ou seja, a presença dos pontos dolorosos(tender points),está associada com sintomas característicosde dolorimento muscular generalizado, rigidez, fadiga e sononão restaurador15.

Em um estudo qualitativo da percepção das pacientessobre a fibromialgia, realizado por Martinez e colaboradores16

no ano de 2002, chegaram a conclusão de que apesar dopequeno número de pacientes, as informações referidasespontaneamente pelas pacientes motivadas por questõesabertas indicam que, os principais sintomas segundo aspacientes são dor e fadiga; a ansiedade é uma característicaque deve ser valorizada e melhor estruturada na fibromialgia,embora a literatura dê ênfase à depressão; a incerteza quantoao prognóstico e o medo de incapacidade definitiva é umaconstante; a sensação de desamparo é grande e reforçadapela sensação de desconhecimento da síndrome pelosprofissionais da saúde, em especial os médicos.

Incapacidade para o trabalho é relatada por 31% dospacientes17, podendo levar a tentativa de ganhossecundários, como aposentadoria precoce e afastamentodo trabalho. No Brasil não temos estudos dos custos emfibromialgia. Nos EUA, o paciente com fibromialgia custa aosistema de saúde aproximadamente 2 mil dólares ao ano,despesas causadas pelo excesso de visitas médicas, examescomplementares desnecessários, e medicações múltiplas14.

Na avaliação do paciente com fibromialgia, sãoachados constantes: as alterações posturais, caracterizadasprincipalmente pela acentuação das curvas fisiológicas dacoluna, hiperlordose cervical, hipercifose dorsal, hiperlordoselombar com retro pulsão do sacro, além dos pés planos(traduzindo encurtamento da cadeia muscular posterior).Além disso, quando especificamente questionados, a grandemaioria dos pacientes refere falta de ar, que poderia sercaracterizada como “respiração suspirosa”, acompanhadaao exame físico por um aumento da caixa torácica,aparentemente decorrente do encurtamento da cadeiamuscular respiratória18.

Martinez19 (1997) afirma que a dor difusa é sem dúvidao principal sintoma dos pacientes com fibromialgia, sendoque o caráter da dor já recebeu diversas descrições,taiscomo peso, aperto, queimação, dolorimento, etc. Fazemtambém parte da sintomatologia dolorosa a alodínea e asdisestesias. Conceitua-se alodínea a dor resultante deestímulo que não seria normalmente doloroso. Disestesia éa sensação desagradável que varia desde amortecimentoaté agulhadas sentida nas extremidades.

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O principal fator a levar o paciente a procurar cuidadosmédicos é a dor. As queixas dos pacientes em relação aossintomas dolorosos, são expressas com palavras do tipo:pontada, queimação, sensação de peso, entre outras. Alocalização da dor é geralmente relatada de formadesencontrada, em que o paciente apresenta dificuldade nalocalização precisa do processo doloroso. Alguns tem aimpressão de que ela ocorre nos músculos, outros nasarticulações, enquanto uma parte relata a dor como selocalizasse nos osso, ou “nervos”. As localizações mais comunssão: a coluna vertebral, cinturas escapular e pélvica, podendotambém ocorrem em nível de parede anterior do tórax (fatoque com relativa freqüência leva ao paciente aos serviços deurgência cardiológica)4.

Uma grande parcela dos pacientes queixa-se derigidez articular, porém diferentemente da rigidez matinal daartrite reumatóide, é de curta duração, com períodos inferioreshá quinze minutos4.

A fadiga está presente em torno de 90% das pessoascom fibromialgia. Sentem uma fadiga de moderada à severa,com perda de energia, diminuição da resistência aosexercícios, ou um cansaço semelhante àqueles resultantesde uma gripe. Algumas vezes a fadiga é um problema maiordo que a dor20.

O distúrbio do sono está presente em 75% a 80% dospacientes, podendo ser descrito com dificuldade paraconciliar o sono, insônia terminal, vários despertares aomínimo ruído, sono não reparador (paciente acorda pelamanhã mais cansado do que antes de se deitar)17.

Uma série de publicações descreve que a serotoninaseria a “chave” da patogênese da fibromialgia.A serotonina éconhecida como um neurotransmissor com efeito reguladordo sono profundo restaurador e relacionado com ainterpretação do estimulo doloroso,e os baixos níveispoderiam estar diretamente relacionados com esta síndrome4.

Sendo a qualidade do sono um fator preponderante nagênese e na manutenção dos sintomas,o paciente deve adquirir“hábitos de sono saudáveis” como dormir cedo,em um ambientetranqüilo,em horários regulares e evitar o uso de estimulantestais como a cafeína e nicotina,e situações de estresse emocionale físico,quando possível22.

Segundo Kaziyama23 (1998) a fibromialgia pode serclassificada como regional, primária, secundária econcomitante, sendo que a regional é também denominadafibromialgia localizada e síndrome miofascial, isto é, ossintomas dolorosos têm localização regional. Já afibromialgia primária é caracterizada pela presença de dordifusa generalizada e com múltiplos tender points, e afibromialgia secundária seria causada por uma patologia debase que apresenta dor muscular generalizada e múltiplospontos dolorosos.

Masi apud Martinez et.al24 (1998) classificou ospacientes de fibromialgia em três subtipos: fibromialgiaidiopática, fibromialgia concomitante a outra doença crônicae fibromialgia induzida por determinados eventosdesencadeantes, como estresse emocional, infecção viral,traumas mecânicos, etc.

De forma clássica, a fibromialgia está subdividida emtrês grupos, primária, concomitante e secundária, está

classificação é indistinguível em suas características clínicas,portanto está subdivisão pode ser dispensada25.

Perea26 (2003) afirma que o predomínio de fibromialgiaestá no sexo feminino, em relação a idade, ela afirma quevaria entre os 12 e 55 anos. Foi descrita uma tendência àagregação familiar, predominantemente para mulheres deuma mesma família, tendo sido proposto um padrão dehereditariedade autossômica dominante, com prevalênciano sexo feminino.

Trata-se de uma síndrome muito freqüente entremulheres de 30-60 anos (a uma relação de 20 mulherespara cada homem) em que a principal característica é aamplificação dolorosa. A expressão “dói tudo” é umaconstante na anamnese dessas pacientes2. Querol27 (2003)relata que a prevalência de fibromialgia nesta mesmapopulação estima-se em 2% da população geral, sendo quedestes, 88% ou mais, são mulheres.

O diagnóstico dessa doença é eminentemente clínico,não havendo alterações laboratoriais específicas. As provasde atividades inflamatórias são anormais, bem como osexames de imagem2.

De acordo com o Colégio.Americano deReumatologia (ACR.) em 1990, os critérios de classificaçãopara fibromialgia são: história de dor difusa,persistente pormais de três meses, presente tanto do lado direito e esquerdodo corpo, quanto acima e abaixo da cintura. A dor tambémdeve apresentar-se em pelo menos um segmento doesqueleto axial (cervical, torácico ou lombossacro). E àpalpação digital com -4 kg/cm2 em áreas denominadaspontos dolorosos (tender points) em 11 ou mais dos 18 pontosespecíficos (bilateralmente: inserção dos músculossuboccipitais na nuca). Ligamentos dos processostransversos da quinta à sétima vértebra cervical bordo rostraldo trapézio, músculo supra-espinhoso, junção do músculopeitoral com a articulação costo-condral da segunda costela,dois centímetros abaixo do epicôndilo lateral do cotovelo.Quadrante látero-superior da região glútea, inserçõesmusculares no trocanter maior do fêmur e dois centímetrosrostralmente à linha articular do côndilo medial femoral28.

A utilidade dos tender points no diagnóstico defibromialgia foi posteriormente confirmado em vários estudosclínicos, com a adoção de diferentes critérios clínicosbaseados na exclusão de doenças sistêmicas e a presençade certos sintomas e pontos dolorosos. Posteriormente, oACR publicou os resultados de um grande estudosmulticêntrico, definindo os critérios de classificação para asíndrome como a combinação de dor difusa, definida comobilateral, acima e abaixo do tronco, axial, em pelo menos 11dos 18 pontos. Tais critérios levaram a uma sensibilidade de88,4% e uma especificidade de 81,1% e passaram a seraceitos internacionalmente29.

Na pratica clínica é comum observarmos oestabelecimento de diagnósticos errôneos em que seconfunde fibromialgia com diversas condições inflamatóriasou não e articulares ou extra-articulares30, tais como artrose,artrite reumatóide, polimialgia reumática entre outras, sendofreqüente que o paciente faça uma peregrinação porconsultórios médicos antes que se estabeleça o diagnósticocorreto. Segundo Martinez (2002)16, os seguintes

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diagnósticos foram dados previamente à pacientes comfibromialgia, problemas de coluna, doença psiquiátrica,artrite, dores musculares e outros diagnósticos de doençafora do aparelho locomotor.

É importante ressaltar que o tender point presente nafibromialgia se difere do trigger point na síndrome miofascial.Os tender points ocorrem bilateralmente, e como fatoresagravantes, tem-se: frio, umidade, sono não restaurador,fadiga física ou mental, atividade física excessiva, inatividadefísica, ansiedade ou stress31. O trigger point é um localhipersensível dentro de uma faixa muscular tensa, podendomedir de 2 a 5 mm de diâmetro, localizado no tecido muscular,e/ou associado a fascia. Incisão cirúrgica, overuse, traumaspor movimentos repetitivos, contusões, tensão e problemasarticulares podem ser causas do aparecimento de triggerpoint32.

Sande, Parizzoto e Castro (1999)32 após uma revisãosobre síndrome dolorosa miofascial, concluem que, emrelação ao constructo “síndrome miofascial” pode-seperceber que este foi aceito sem um exame crítico. E umforte argumento a este favor é sua definição circular: o pontogatilho miofascial é a causa, o sintoma e o diagnósticopadrão para a patologia, sendo que também a respostaterapêutica das diferentes modalidades não tem sidoapropriadamente validada. Portanto, o exame destasíndrome é difícil e o diagnóstico pode ser dado por qualquerexaminador que queira identificá-la. Da mesma forma, oconstructo não tem evidências biomecânicas, histológicas eelétricas. Sugerem então, uma padronização do diagnósticoe da prática clínica associada a padronização dasmetodologias de estudo.

Martinez et al (1998)24 após realizarem um estudocomparativo com 26 pacientes do sexo feminino comfibromialgia e 18 pacientes com dor miofascial, sendo queambos os grupos são semelhantes em relação a idade eestado civil diferem-se na escolaridade, concluíram que ador miofascial e a fibromialgia são extremos do mesmoespectro de doença. Observaram semelhanças naintensidade da dor e fadiga, presença de fatoresdesencadeantes e freqüência de atividade física, e diferençasem relação à extensão da dor no ínicio da doença, númerode pontos dolorosos e na presença de doenças associadas.Os dados referentes a qualidade de vida, distúrbios do sono,capacidade funcional e depressão, mostraram-se maisintensos no grupo de fibromialgia.

Não podemos esquecer que mesmo os doentes comlesões também padecem de sintomatologia dolorosa crônica,que não melhoram simplesmente com o afastamento dotrabalho e fisioterapia, ou seja, dependem de uma visão maisampla de seu problema. Com isso o diagnóstico da síndromede fibromialgia e miofascial se sobrepõem, acarretando umasérie de complicações pela existência de uma doença crônicapreexistente, não ocupacional. Assim o conhecimento destaspatologias – fibromialgia e miofascial- para a medicinaocupacional torna-se de suma importância, pois está no dia-a-dia do médico do trabalho34.

Em 2005, Costa et al33 realizaram uma pesquisa ondedescrevem que ainda não há uma fisiopatologia bem definidapara fibromialgia, embora ocorram fenômenos

psicossomáticos na maior parte dos pacientes. Além dopossível efeito psicossomático, as áreas de função do sistemanervoso que podem estar representando algum papel napatogênese da síndrome de fibromialgia incluem: alteraçãona sensibilidade dolorosa, alterações autonômicas e desistema neuroendócrinos. Agentes bacterianos e virais podemestar relacionados com a origem dessa síndrome35, havendoalguma associação entre a doença e a infecção pelo vírus dahepatite C.

Segundo Dias et.al31, em sua pesquisa realizada em2003, teve por objetivo verificar as etapas de melhoria naqualidade de vida dos pacientes portadores de fibromialgia,após serem submetidas a um tratamento por intermédio dastécnicas da hidrocinesioterapia. Revisando a atualbibliografia pertinente ao assunto, foi uti l izado umquestionário padronizado, visando avaliar a qualidade devida dos pacientes. No tratamento foi realizado um programade atividades hidroterapêuticas em grupo, consistentes emalongamentos, exercícios de resistência, coordenação erelaxamento globalizado, associado a musicoterapia eexercícios respiratórios, analisando-se um grupo de 10pacientes de ambos os sexos, com idade entre 38 a 69 anos.Observou uma melhora na qualidade de vida dos pacientes,pois além de manter uma atividade física, também estimulouo convívio social. Sendo assim, concluiu que o trabalho dehidrocinesioterapia é um bom recurso para o tratamento dafibromialgia e conseqüentemente ajuda na melhora daqualidade de vida; porém é indispensável um trabalhointerdisciplinar envolvendo médico, fisioterapeuta, psicólogopara trabalhar o paciente como um todo.

A literatura demonstra a repercussão socioeconômicadecorrente da fibromialgia, como pensão mais precoce, limitaçãoda atividade na população, maior perda dos anos de vidaprodutiva e aumento da freqüência nas consultas médicas23,levando a alguns tipos de afastamento ou auxílio para pacientescom vida profissional ativa e, conseqüentemente, à importantequeda da renda familiar, o que pode afetar a qualidade de vidados fibromiálgicos36.

TRATAMENTO FISIOTERAPÊUTICOApós o diagnóstico bem definido, o tratamento deve

respeitar a individualidade de cada paciente sendo ele namaioria dos casos multidisciplinar, envolvendo diferentesáreas da saúde, como a fisioterapia, psicologia além damedicina reumatológica. O paciente deve estar bemesclarecido sobre sua patologia, sabendo seus sintomas,fatores que podem vir a melhorar ou a agravar os sintomas,assim como o tratamento que se faz disponível, podendo sermedicamentoso ou não.

A fisioterapia exerce um papel importante no alíviodos sintomas da fibromialgia através de diferentes recursose técnicas: alongamento muscular, massagem, calorsuperficial, conscientização corporal, condicionamentocardiovascular e acupuntura37.

A hidroterapia é a utilização dos efeitos físicos,fisiológicos e cinesiológicos, advindos da imersão do corpo,ou parte dele, em meio aquático, como recurso auxiliar nareeducação musculoesquelética, visando o restabelecimentoda saúde, sua manutenção ou ainda na prevenção de uma

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alteração funcional orgânica38.O relaxamento muscular promove uma redução da

tensão muscular, ajudando a prevenir restrições amobilidade articular. Interrompido o ciclo da dor, promove-se o relaxamento dos músculos espásticos, o que reduz otensionamento muscular através dos efeitos relaxantes daágua aquecida. O aumento da temperatura corporalsubseqüente à imersão, reduz o tônus muscular anormal eespástico, favorecendo ainda o fluxo sanguíneo e periférico.Facilita-se a movimentação das articulações doloridas,devido a diminuição da compressão possibilitada pelapropriedade de flutuação promovida pela água39.

Após a aplicação de onze sessões dehidrocinesioterapia, três vezes semanais durante cerca deum mês, em quatro mulheres, com idades entre 35-55 anos,com diagnóstico de fibromialgia, observou-se redução, emtodas as pacientes, da sintomatologia dolorosa característicada patologia, pela redução do índice do ponto sensível,verificou-se ainda, redução significativa da fadiga e dosdistúrbios, concluindo-se então, que apesar da amostrapequena, a hidrocinesioterapia é eficaz na redução dasintomatologia dolorosa e melhora a realização dasatividades de vida diárias e profissional40.

Em um estudo realizado em grupo, tendo oitopacientes com diagnóstico de fibromialgia, que foramsubmetidas ao tratamento hidroterápico por dois meses,constataram a evolução das pacientes quanto à melhora daqualidade de vida, isso, pode ser atribuído à melhora doquadro de dor e estado depressivo, possivelmenteinfluenciados pela melhora na realização de suas atividadesde vida diária, bem como melhora da mobilidade e qualidadede movimento corporal e da capacidade física, do quadroálgico41.

A acupuntura vem sendo bastante utilizada notratamento de síndromes dolorosas, levando a diminuiçãoda dor assim como a um aumento do limiar de dor26. Atua viaestimulação de estruturas nervosas discriminativas dérmicas,sub-dérmicas e musculares que ativam o sistema supressorde dor na medula espinal e encéfalo, promovendo analgesiae relaxamento muscular42.

Em um trabalho realizado com 70 pacientesportadores de fibromialgia primária, randonizados para eletroacupuntura e para agulhamento seco (sham acupunture),por seis sessões, num período de três semanas, foidemonstrado que os pacientes do primeiro grupo mostrarammelhora no limiar de dor, uma diminuição na quantidade demedicações utilizadas, melhora na escala visual analógica,na qualidade do sono e na avaliação global43.

Raimundo, Brandão e Lucena (2004)36, aplicaramcorrente interferencial vetorial com freqüências diferentes,sendo elas 150HZ e 20 HZ em dois grupos distintos depacientes com fibromialgia. A corrente foi aplicada somentena região dos músculos do trapézio. Concluíram com issoque, mesmo com ausência de dispositivos precisos deavaliação, foi possível observar a melhora satisfatória da dornos tenders points dos músculos trapézios, aumento datolerância à digito pressão exercida para geração da dor emelhora da qualidade de vida das pacientesindependentemente da freqüência adotada, porém mais

significativa para freqüências de 20 HZ em relação a de 150HZ.Matsutani e Marques (2004)44 realizaram um estudo

envolvendo diferentes técnicas fisioterapêuticas, sendo elasa terapia a laser e o alongamento. Separaram os pacientesem dois grupos de dez cada um, sendo que o grupo A recebeuatendimento de dez sessões com terapia a laser nos tenderspoints e exercícios de alongamento, e o grupo B, realizoudez sessões de alongamento muscular. Concluíram então,que não houve diferença significativa entre os dois gruposde amostra, sendo que ambos os grupos relataram melhorado quadro álgico nos pontos dolorosos, e consequentementeuma melhora na qualidade de vida.

Um estudo realizado, avaliou os efeitos docondicionamento cardiovascular sobre as manifestações dafibromialgia primária. Quarenta e dois pacientes foramrandonizados em um programa com 20 semanas de duraçãoem dois diferentes grupos: condicionamento cardiovascularaeróbico e exercícios de alongamento. Um aumento daperformance cardíaca foi obtido em 83% dos pacientesrandonizados neste grupo. Uma melhora significativa nolimiar de dor sobre os tenders points, bem como a avaliaçãoglobal feita pelo médico e pelo paciente foi verificada nestes,quando comparados aos selecionados somente paraexercícios de alongamento45.

Rosen apud Collado et al (2002)26, afirma queclinicamente os aspectos de priorização terapêutica são ador, a disfunção muscular, e a impotência funcionalsecundária a dor. O tratamento deve ser individualizado eadaptado ao paciente, sendo necessária a participação ativado paciente. Afirma ainda que, se tem comprovado quepacientes submetidos a exercícios de fortalecimento etonificação, realizados em condições aeróbicas, tem umamelhora da dor e a fadiga superior a de pacientes controle,e aqueles que realizam exercícios de alongamento.

A massagem clássica, a massagem das zonasreflexas, a massagem transversa profunda, a do tecidoconjuntivo (Rolfing) e dos pontos clássicos da acupuntura,proporciona relaxamento muscular, alívio da dor, dasíndrome de dor miofascial, do edema e da estase linfática.Pode ser realizada no domicílio pelo próprio doente ouaplicada por seus cuidadores. É eficaz quando associada acinesioterapia, e a mobilização do segmento acometido46.

Em estudo realizado por Albrecht, Rachelli e Peroni47

em 2000 foram avaliados e submetidos cinco pacientes dosexo feminino, com diagnóstico de fibromialgia, onde aabordagem se constituiu de técnicas eletroterápicas,manuais e mobilização geral, a melhora foi referida pelaspacientes quanto à dor, mobilidade articular e qualidade dosono, sugerindo que a abordagem fisioterapêutica utilizadacontribuiu para diminuição dos sintomas físicos e aumentoda tolerância às atividades de vida diárias. O tratamento foirealizado de 12 a 15 sessões, 3 vezes por semana, tendocomo base massoterapia (mobilização passiva da cinturaescapular, tração cervical, e reeducação respiratória), ultrasom (4’,1 w/cm² por área), cinesioterapia (alongamentos,bicicleta ergométrica, mobilização ativa). A melhora referidapelas pacientes quanto a dor, mobilidade articular equalidade do sono, sugere que a abordagem fisioterapêuticautilizada contribuiu para a diminuição dos sintomas físicos e

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aumento da tolerância as atividades de vida diária.Um estudo realizado avaliou os efeitos do

condicionamento cardiovascular sobre as manifestações dafibromialgia primária. Quarenta e dois pacientes foramrandonizados em um programa com 20 semanas de duraçãoem dois diferentes grupos: condicionamento cardiovascularaeróbico e exercícios de alongamento. Um aumento daperformance cardíaca foi obtido em 83% dos pacientesrandonizados neste grupo. Uma melhora significativa nolimiar de dor sobre os tenders points, bem como a avaliaçãoglobal feita pelo médico e pelo paciente foi verificada nestes,quando comparados aos selecionados somente paraexercícios de alongamento45.

Porém, Rivera48 (2004) em uma revisão sobre ascontrovérsias no diagnóstico de fibromialgia, verificou quealguns estudiosos como Hart (1988) e Hazemeijer38 (2003)defendem o ponto de vista da fibromialgia ser uma agrupaçãode sintomas freqüentes na população em geral, e que foicolocado um nome por alguma conveniência, porcomodidade ou por interesse, sendo que na realidade afibromialgia não corresponde como uma entidade clínicadefinida. Todavia, nesta mesma revisão, afirma28 acomprovação de que os sintomas da fibromialgia seguemum padrão específico que se mantém estáveis com o passardos tempos, sugerindo com isso, algum mecanismofisiopatológico comum. Ainda neste mesmo estudo,sugerem49 que as opniões divergentes em relação ao fatoda fibromialgia ser ou não uma entidade clínica deixa umalinha divisória entre o indivíduo saudável e o indivíduo comfibromialgia.

Como fatores desencadeantes da sintomatologia dafibromialgia, encontramos na literatura variações tais como,trauma físico, esforço físico exagerada, atividadeocupacional, variações climáticas bruscas, herançagenética50. Entretanto, Nader et al13 (2002) aborda que alémdo trauma físico o estresse psicológico também faz partedestes fatores. Em estudo realizado por Vaisberg et al30

(2001) após uma avaliação psicológica com atletasportadores de fibromialgia, constatou que os mesmosapresentavam dificuldade no manejo e domínio daansiedade. No mesmo estudo de Martinez50 (2002)eleobservou a piora da dor associada ao estado emocionalalterado, eventos estressantes e variações climáticas.

O sintoma verificado em nossa revisão como o maisimportante e mais referido pelos pacientes fibromiálgicos, éa dor, que faz com que os mesmos procurem cuidadosmédicos. Está dor é descrita de forma diferente pelosportadores de fibromialgia, usando termos como, peso,aperto, queimação, dolorimento, pontada, ardência,incômodo, rigidez, fisgada, latejante, agulhada,formigamento, podendo variar com a hora do dia, tipo deatividade, clima, padrão de sono e estresse. A impressãoque alguns pacientes têm é que ela ocorre nos músculos,outros referem nas articulações, enquanto uma parte relataa dor como se localizasse no osso, ou “nervos”. Aslocalizações mais comumente relatadas são a colunavertebral, cintura escapular e pélvica, podendo tambémocorrer em níveis de parede anterior do tórax (fato que comrelativa freqüência leva ao paciente ao serviço de urgência

cardiológica19.Scotton e Fraga4 (2003) relatam que grande parte das

pacientes queixam-se de rigidez articular, porémdiferentemente da rigidez matinal da artrite reumatóide,sendo esta de curta duração, com períodos inferiores háquinze minutos. A literatura pesquisada é escassa no quediz respeito a rigidez, sendo apenas citada como parte doquadro clínico, e referida como rigidez matinal.

A fadiga está presente em torno de 90% das pessoascom fibromialgia, é relatada espontaneamente pelos pacientesfibromiálgicos, que a descrevem como cansaço, fadiga,desanimo,preguiça, podendo ser referida de moderada asevera, com perda de energia, diminuição da resistência aosexercícios, ou um cansaço semelhante aqueles resultantesde uma gripe. Percebe-se também a dificuldade em sedistinguir fadiga de depressão. Algumas vezes a fadiga é ditacomo um problema maior do que o da dor20.

O distúrbio do sono está presente em 75% a 80% dospacientes, podendo ser descrito como dificuldade paraconciliar o sono, insônia terminal, vários despertares aomínimo ruído e sono não reparador, inclue apnéia, mioclonia,e síndrome da perna cansada. Em estudos demonstraramanormalidades na fase quatro do sono. Uma série depublicações descreve que a serotonina seria a “chave” dapatogênese da fibromialgia. A serotonina é conhecida comoum neurotransmissor com efeito regulador do sono profundorestaurador. Sendo a qualidade do sono um fatorpreponderante na gênese e na manutenção dos sintomas, opaciente deve adquirir “hábitos de sono saudável”, comodormir cedo, em ambientes tranqüilos e evitar o uso deestimulantes tais como, a cafeína e a nicotina. Os estudosmostram que uma noite mal dormida pode acarretar dor erigidez, particularmente em indivíduos acometidos por algumadisfunção músculo esquelética. Apesar de não estar clarauma relação causa-efeito entre as intensidades da dor e osdistúrbios do sono em pacientes com dor crônica efibromialgia, um componente psicogênico parece influenciara qualidade do sono nessas condições. Por outro lado o sonoprecário ocorre em várias condições músculo esqueléticascrônicas17.

Estudos mostram que a fibromialgia é mais prevalenteem mulheres do que em homens em todas as faixas etárias.Ela tem sido descrita desde as formas de infância atéindivíduos com mais de setenta anos, sendo que o pico deincidência etária na ocasião do diagnóstico se situa entrequarenta e cinqüenta anos, onde a média de idade do iniciodos sintomas varia entre vinte e nove e trinta e sete anos28.Para Weldebach28(2002) trata-se de uma síndrome muitofreqüente entre mulheres com 30 a 60 anos. Perea (2003)afirma que o predomínio da síndrome está no sexo feminino,em relação a idade ele afirma que varia entre 12 e 55 anos.No entanto o estudo realizado por Helfenstein e Feldman(2002), onde foram estudados 200 pacientes, sendo que199 eram do sexo feminino, a média de idade entre osindivíduos era de 57,1 anos, variando entre 20 e 77 anos.

Apesar de não ser uma doença grave, tem umaimportância pela alta prevalência (5 a 20% da populaçãoem geral). Porém uma estimativa dos estudos disponíveissugere que a prevalência da fibromialgia na população, com

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definição dos critérios da ACR, deve ser de 2 a 4%. Aindaem outros estudos, afirmam que a prevalência é de 2 a 6%.A prevalência calculada na população Espanhola, utilizandoos critérios de classificação do ACR é de 4,2% do sexofeminino e 0,2% para o masculino25. Querol27 (2003) relataque a prevalência de fibromialgia nesta mesma populaçãoestima-se em 2% da população em geral, sendo que destes,88% ou mais são mulheres. Na literatura descrita hápredominância da raça branca, mas tem sido relatada entreos japoneses e os negros da África do Sul.

Apesar de existir um critério para diagnosticar afibromialgia (Critérios do Colégio Americano deReumatologia), é de difícil diagnóstico. Na prática clínica écomum observarmos o estabelecimento de diagnósticoserrôneos em que se confunde fibromialgia com diversascondições inflamatórias ou não e articulares ou extraarticulares30. Isso pode se dar pelo fato de que algunsmédicos não possuem experiência suficiente para constataros pontos dolorosos, como já observamos no estudo deSilva51 (1997), também pode ser dado pelo fato de suaetiologia, fisiopatologia, idade de começo dos sintomas, nãoser bem conhecida, apesar de já existirem várias pesquisasrealizadas sobre esses aspectos. Uma das poucasconclusões equivalentes nos estudos é o fato de que afibromialgia atinge predominantemente o sexo feminino.

Confundida com síndrome do túnel do carpo e dotarso, compressões cervicais ou lombares4. Ainda sãorelatados outros diagnósticos diferenciais tais como,síndrome de fadiga crônica, artrose, artrite reumatóide,polimialgia reumática, lúpus eritematoso sistêmico, síndromede Sjogren, espondiloartropatias52.

Observamos, através do nosso estudo, que afibromialgia e a fibromialgia juvenil possuem sintomatologiassemelhantes no que diz respeito a dores musculares, fadigaao despertar, sono não restaurador, porém não ficou clara adiferença no diagnóstico entre ambas, já que os estudosnão deixam claro a idade inicial da fibromialgia juvenil e naidade mais adulta. Pereira52 (1998) coloca que a incorporaçãoda fibromialgia no raciocínio clínico diferencial não deveservir como alívio ao médico e, sim, como mais umapossibil idade diagnóstica. Até lá, o diagnóstico defibromialgia juvenil, ou de qualquer outra síndrome álgicaem crianças será (e deve permanecer) extremamente difícil,uma verdadeira obra de arte clínica, cuja as principaisferramentas continuam sendo uma historia detalhada, umexame físico minucioso, e um imprescindível raciocíniodiagnóstico desenvolvido pelo médico.

Martinez (1992) Apud Estefani e Arice (2002)53, afirmaque a fibromialgia se desenvolve de maneira insidiosa,predominantemente em mulheres entre 40 a 55 anos. Travell(1983) apud Estefani e Arice (2002)54, diz que a sindromemiofascial afeta ambos os sexos, em qualquer idade e deforma que o paciente identifica com precisão o ínicio e olocal da dor, geralmente relacionado a sobrecarga mecânica,trauma, movimento rigoroso e repentino, etc. Martinez et al(1998)24, após realizarem um estudo comparativo com 26pacientes do sexo feminino com fibromialgia e 18 pacientescom dor miofascial, sendo que ambos os grupos sãosemelhantes em relação a idade e estado civil diferem na

escolaridade, concluíram que a dor miofascial e a fibromialgiasão extremos do mesmo espectro de doença.

Sabendo das diferenças existentes entre as duassíndromes, diferenças tais como, sensibilidade e localizaçãoda dor, fatores agravantes, patogenia, achadoseletrodiagnósticos, pontos dolorosos, entre outras,verificamos na literatura que ambas as síndromes sãopatologias distintas, apesar de alguns autores afirmarem ooposto. Não se pode afirmar que ambas fazem parte de umamesma síndrome, como já referido possuem característicasdiferentes, características essas “essenciais” para odiagnóstico de fibromialgia segundo os critérios do ColégioAmericanos de reumatologia, como, por exemplo, a presençade pelo menos 11 dos 18 pontos dolorosos, sendo que estespontos devem ser bilaterais, características essas quesegundo a literatura não se fazem presentes na síndromedolorosa miofascial.

Segundo Sabbag55 et.al. (2000) a etiologia e afisiopatologia não são claras, apesar de várias teoriaspatogênicas (hipóteses: central, periférica, imunológica,infecciosa, integrada), a doença pode ocasionar limitaçãodas atividades ocupacionais,redução do tempo de vidaprodutiva e inatividade física. Haun22 et.al (2001) dizem quenão parece haver mais dúvidas de que se trata de umasíndrome causada pela incapacidade de modulaçãodolorosa no sistema nervoso central, mesmo na ausênciade nocicepção aferente aumentada. A maneira como estemecanismo acontece ainda é apenas parcialmenteconhecida.

Acredita-se que o distúrbio primário na fibromialgiaseria uma alteração em algum mecanismo central de controleda dor, o qual poderia resultar de uma disfunção deneurotransmissores. Tal disfunção neuro-hormonal incluiriauma deficiência de neurotransmissores inibitórios em níveisespinhais ou supra-espinhais (serotonina, encefalina,norepinefrina e outros) ou uma hiperatividade deneurotransmissores excitatórios (substância P, glutamato,bradicinina e outros peptídeos), ou ainda ambas as condiçõespodem estar presentes. Essas disfunções poderiam sergeneticamente predeterminadas e talvez desencadeadaspor algum estresse não-específico como, por exemplo, umainfecção viral, estresse mental, ou um trauma físico56.

Dentro da literatura pesquisada, verificou-se que afibromialgia têm forte impacto na qualidade de vida dosportadores desta síndrome, ela pode ser expressa de váriasmaneiras, como por exemplo na qualidade do sono, nacapacidade funcional, e até mesmo na vida profissional, ospacientes acabam por receber pensões precoces, maiorperda dos anos de vida produtiva,e uma queda da rendafamiliar, o que pode causar alterações nervosas epsicológicas no individuo, consequentemente, um aumentoda freqüência médico. Verificou-se também a forte influênciapositiva que a fisioterapia traz na melhora da qualidade devida destes pacientes, principalmente no que diz respeito aterapias em grupo41.

O resultado dos trabalhados utilizados nesta revisãodemonstraram de maneira clara que o tratamentofisioterapêutico com hidrocinesioterapia foi eficaz,independente do número de pacientes, tempo de aplicação,

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e associação com outros métodos, inclusivefarmacológicos31.

A acupuntura vem sendo bastante utilizada notratamento de síndromes dolorosas, atua via estimulação deestruturas nervosas discriminativas dérmicas, sub-dérmicas,e musculares que ativa o sistema supressor de dor na medulaespinhal e encéfalo, promovendo analgesia e relaxamentomuscular46. Porém Pomeranz (1989), apud Lin (2001), afirmaque vários trabalhos sobre acupuntura apresentamproblemas metodológicos, o que torna difícil avaliar sua realeficácia no tratamento da dor crônica. Apesar da poucabibliografia encontrada a respeito da acupuntura empacientes com fibromialgia, Deluze et al apud Antonio57

(2001) realizaram um estudo com 70 pacientes portadoresde fibromialgia primária, e verificaram que tal método é eficazno tratamento da fibromialgia, promovendo melhora do limiarda dor, diminuição da quantidade de medicações utilizadas,melhora na escala visual analógica, na qualidade do sono ena avaliação global.

As técnicas de eletroterapia encontradas em nossoestudo foram, corrente interferencial, estimulação elétricatranscutânea, e terapia a laser, sendo que algumas delasforam associadas a técnica de alongamento muscular. Todosos trabalhos se mostraram eficazes, independente do númerode pacientes, do número de sessões aplicadas, e do tempode tratamento. Porém em alguns estudos, como o deRaimundo, Brandão e Lucena (2004)36, as diferentesfreqüências utilizadas mostraram resultados diferentes, sendouma mais significativa que a outra. Nos estudos realizadoscom técnicas de eletroterapia e alongamento, verificou-se quenão houve diferença significativa entre as duas técnicas,mostrando que ambas são eficazes independentemente deestar sendo usadas em associação uma da outra58.

Os portadores de fibromialgia demonstram umaboa aderência aos exercícios, sendo até mais assíduos epersistentes que indivíduos em tratamento para controle dostress. Apesar da probabilidade das pacientes comfibromialgia apresentar uma menor performance muscular,os exercícios são extremamente benéficos para aptidão física,aspectos psicosocias e sintomatologia59.

Mengshoel et al (1998) apud Marques (2002)42,realizaram um estudo onde os resultados mostraram que ospacientes com fibromialgia apresentam maiores níveis defadiga, esforço e dor induzida pós-exercício comparados aindivíduos saudáveis. Além disso, a intensidade da dorpermaneceu acima do valor prévio ao exercício por mais 24horas, entretanto não constataram diferença significante nacapacidade aeróbica. Porém, Marques et al (2002) afirmaque os exercícios de baixa intensidade, ou aqueles em queo paciente é capaz de identificar o limite do seu esforço edor, parecem ser os mais efetivos. Além disso, a aderênciaaos programas de exercícios é a melhora maneira de seprolongarem os ganhos terapêuticos.

Segundo Perea (2003)26, após realizar uma revisãobibliográfica sobre fibromialgia, constatou que as evidênciassugerem que o condicionamento físico e alongamento sãobenéficos, com uma discreta superioridade do primeiro sobreo segundo, assim como Rosen apud Collado et al (2002)25,afirma que clinicamente os aspectos de priorização

terapêutica são a dor, a disfunção muscular, e a impotênciafuncional secundária a dor. O tratamento deve serindividualizado e adaptado ao paciente, sendo necessária aparticipação ativa do paciente. Afirma ainda que, se temcomprovado que pacientes submetidos a exercícios defortalecimento e tonificação, realizados em condiçõesaeróbicas, tem uma melhora da dor e a fadiga superior a depacientes controle, e aqueles que realizam exercícios dealongamento. Clark (2001) apud Marques et al (2002)42,afirma que embora os exercícios físicos, de forma geral,sejam considerados benéficos para os pacientes comfibromialgia, não são constatadas evidencias que explicamos mecanismos pelos quais os exercícios atuam no sentidode aliviar o sintoma primário dessa síndrome, ou seja, a dor.

A terapia manual pode ser um recurso importante notratamento da fibromialgia, dadas as propriedadesfisiológicas e psicológicas e maior interação entre ofisioterapeuta e o paciente. A massagem clássica, amassagem das zonas reflexas, a massagem transversaprofunda, a do tecido conjuntivo (Rolfing) e das pontosclássicos da acupuntura. É eficaz quando associada acinesioterapia, e a mobilização do segmento acometido. Amassagem pode ajudar na diminuição da dor através damelhora da circulação e oxigenação, remoção de escóriasmusculares e aumento da flexibilidade muscular váriastécnicas de massagem incluem: deslizamento,amassamento e fricção.A liberação miofascial, a terapia dospontos gatilhos, e as terapias crânios sacrais são exemplosde técnicas especializadas para ajudar no alívio da dor emfibromialgia e em outras condições que causam dor. Aassociação da massoterapia com outras técnicas, comoeletroterapia, cinesioterapia, condicionamento aeróbico,também se fizeram eficazes42.

Em estudo realizado com 42 pacientes comfibromialgia primária, divididos em dois grupos diferentes,sendo que um dos grupos participou do condicionamentocardiovascular aeróbico, e o outro de exercícios dealongamento. Um aumento da performance cardíaca foi obtidoem 83% dos pacientes randonizados nesse grupo. Umamelhora significativa no limiar de dor sobre os tender points,bem como a avaliação global feita pelo médico e pelo pacientefoi verificada nestes, quando comparados ao selecionadossomente para exercícios de alongamento57. Outro estudoverificou que apartir do terceiro mês de treinamentocardiovascular supervisionado, as portadoras de fibromialgiaapresentaram maior tolerância a dor muscular e ao esforço,melhora da capacidade funcional e cardiovascular periférica55.

CONCLUSÃOConclui-se que a fibromialgia é uma síndrome de difícil

diagnóstico e tratamento; isso pode ser decorrente dafisiopatologia e causa não serem ainda bem definidas,apesar de existirem vários estudos a respeito dos mesmos.

As pesquisas citadas neste trabalho são escassasem relação ao prognóstico e a rigidez muscular, sugerimosnovos estudos referentes a esses aspectos. Porém, algunsautores verificaram que apesar das diversas terapêuticaspropostas e adotadas aos pacientes, a fibromialgiademonstrou um quadro clinico estável, no entanto os

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pacientes foram acompanhados somente por cinco anos, oque ainda deixa vaga uma afirmação a respeito doprognóstico desta patologia. A eficácia do tratamentofisioterapêuticos dos pacientes com fibromialgia foicomprovada pelos estudos, já que a maior parte destesverificou uma melhora significativa da sintomatologia,principalmente no que diz respeito ao quadro álgico,consequentemente melhora da funcionalidade e qualidadede vida.

Dentre as inúmeras técnicas fisioterapêuticasreferidas, destaca-se a hidrocinesioterapia, que tem comoobjetivo principal aumentar a tolerância do indivíduo aoexercício e o nível de resistência física, melhorando seucondicionamento geral, já que a água aquecida exerceefeitos de relaxamento muscular pela redução da tensão, eredução da sensibilidade à dor. A hidrocinesioterapia sedestacou não só por sua eficácia, mas também por apresentaruma melhor aceitação pelos pacientes, e também por tersido a técnica com maior número de estudos encontradospor nós, no entanto, não podemos deixar de ressaltar agrande importância dos outros métodos fisioterapêuticos

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para reabilitação destes pacientes, como a acupuntura, aeletroterapia, a massoterapia, a terapia manual, acinesioterapia, o condicionamento aeróbico entre outras,porém, estas últimas não se mostraram tão eficazes quantoà hidroterapia, pois esta teve um melhor resultado em maiornúmero de sintomas em relação as outras técnicasestudadas, isto, independente do número de indivíduos,tempo de aplicação, e associação com outros métodos,inclusive farmacológicos realizadas nas pesquisas.

Devemos lembrar que os pacientes com fibromialgiasão pouco compreendidos, e muitas vezes desacreditadospor alguns profissionais da área da saúde que os tratamcom descaso, não confiando em suas queixas, até porque,não existem exames complementares que comprovem aexistência desta patologia. Por esta razão as pacientestornam-se pessoas ainda mais ansiosas, angustiadas edepressivas, o que torna necessário cada vez mais o uso deuma equipe multidisciplinar para o tratamento dos mesmos,pois só a fisioterapia, apesar de eficaz, não é o suficientepara suprir todas as atenções de que esses pacientesprecisam.

Summary

PHYSIOTHERAPEUTIC INTERVENTIONS IN FIBROMIALGIA - Review

Fibromyalgia is a chronic illness, that has as characteristic a diffuse pain in the muscle-skeletal system, morning rigidity, muscular fatigue, alterations of the mood and sleep,existence of painful points, among others, these symptyoms are the most often found in thepatients. This disease is predominant in the feminine sex that reaches young people andadults. Its etiology is still not completely understand. The treatment of this syndrome isdiscussed even being a pathology of difficult diagnosis, is given credit that the best treatmentthat includes a multidisciplinary team, involving professionals as a Rheumatologist,Psychologists and Physiotherapists among others. The present study has the objective ofpresenting a revision of literature in order to approach the syndrome of the Fibromyalgia,as well as the physiotherapeutic treatment for the symptoms that follows the fibromyalgicindividuals, for this reason, was carried through a bibliographical survey in the period of1995 - 2005, by means of the use of articles published in national and international magazinesand/or Internet sites. The Authors concluded that Physiotherapy has a very important role inthe relief of the symptoms that involve these patients, therefore several techniques presentedwith proven effectiveness.

Keywords: Fibromyalgia, Physiotherapy, Treatment.

REFERÊNCIASObs.:Obs.:Obs.:Obs.:Obs.: 59 referências à disposição dos leitores.

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Reflexão Sobre o Cuidado de Enfermagemna Visão da Gestante Hipertensa

Leila Juliana Antunes, Luciana Blanco, Lenir Maria Baruffi, Nelci Terezinha Zorzi.

Curso de Enfermagem da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Objetivou-se onhecer o cuidado de enfermagem prestado às gestantes hipertensas. Foium estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa, realizado na maternidadede um hospital geral do interior do Rio Grande do Sul no período de dezembro de 2002 amarço de 2003. Participaram do estudo oito mulheres hipertensas internadas. A coleta dedados foi realizada através de entrevista semi-estruturada. Utilizou-se a análise temática,tendo emergido seis categorias: a recuperação das árvores, experimentando frutos, buscandoabrigo no ninho, protegendo-se dos perigos, passeio pelo bosque e o cantarolar dos pássaros.O cuidado prestado contempla as necessidades biológicas, mas deixa a humanização emsegundo plano.

Unitermos: Gravidez, hipertensão arterial, cuidado.

A gestação, evento que ocorre naturalmente na vidada mulher, é um processo fisiológico no organismo materno.No entanto, algumas mulheres podem sofrer algum agravonesse período, o que caracteriza uma gestação de alto risco,muitas vezes exigindo de internação hospitalar. A hipertensãoé responsável pela internação de grande parte dessasgestantes. O cuidado prestado pela enfermagem a essasmulheres privilegia a dimensão biológica, enfatizando omodelo assistencial existente, fragmentado e curativo. Agestante hipertensa, ao longo de sua internação, não é vistacomo uma mulher inserida em seu contexto familiar esociocultural.

Segundo dados da Coordenadoria de Informaçõesem Saúde/RS1, a doença hipertensiva é a primeira causade morte em gestantes, com 93 óbitos em 1999, dos quaisvinte foram decorrentes de hipertensão na gravidez.

Ao desenvolver a prática da disciplina de Saúde daMulher, deparou-se com um número considerável degestantes que apresentam hipertensão e permaneceminternadas por longos períodos na maternidade do hospitalde ensino, recebendo um cuidado fragmentado e orientadopara os sinais e sintomas. Diante do exposto, questionamos:de que maneira a gestante hipertensa está sendo cuidadano contexto hospitalar?

Tendo em vista o questionamento que se apresenta,e levando em conta o pressuposto de que o cuidado deenfermagem humanizado contribui para uma melhorqualidade de vida das gestantes hipertensas, este trabalhoteve como objetivo geral conhecer o cuidado de enfermagemprestado às gestantes hipertensas internadas na

maternidade. Os objetivos específicos foram identificaraspectos que influenciam na assistência de enfermagem econstruir uma proposta de cuidado humanizado às gestantesdesse hospital.

Branden2,28 afirma que “a gestação e o nascimento dacriança são eventos psicossociais, que afetamprofundamente as vidas dos pais e das famílias. Nada émais significativo para o autoconceito de alguns homens emulheres do que o desafio de gerar e criar um filho”.

No entanto, um percentual significativo de mulheressofre um desequilíbrio nas funções fisiológicas durante agravidez. Segundo o Ministério da Saúde3, aproximadamente15% das gestações são de alto risco, decorrentes deinúmeras causas. A hipertensão, as infecções e ashemorragias são as principais responsáveis pelas mortesde gestantes, que na sua maioria poderiam ser evitadasmediante uma boa assistência no período gestacional, partoe puerpério. Segundo Cashion4,648,“os distúrbioshipertensivos são as complicações de ocorrência maiscomum na gestação. Eles ocorrem em 5 a 10% dasgestações”.

A hipertensão induzida pela gestação aparece apósas vinte semanas e desaparece nos primeiros dias depuerpério. De acordo com Rezende5,643:

surgindo em geral na segunda metade da prenhez e,mais freqüentemente no seu terceiro trimestre, a doençahipertensiva específica da gravidez caracteriza-se peloaparecimento de hipertensão, edema visível ou oculto(aumento brusco de peso) e, excepcionalmente, por discreta

Artigo Especial

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proteinúria (traços ou menos de 0,5%). Entretanto é aelevação da pressão arterial além de 140 X 90 mmHg ou oaumento dos níveis tensionais em 30 mmHg para a pressãosistólica e de 15 mmHg para a pressão diastólica, o principalelemento para identificação da entidade. Tais aumentosdevem ser comprovados pelo menos duas vezes dentro deseis horas.

A etiologia da doença ainda é desconhecida, maspara o seu aparecimento a presença do vilo corial éfundamental. Explica Rezende5,662:

A doença hipertensiva específica da gravidezcaracteriza-se pela tríade sintomática: hipertensão, edemae proteinúria. O aparecimento dessas manifestações, emgrávida normotensa, ou o agravamento de quadrohipertensivo após as vinte semanas, sugerem,obrigatoriamente, a suspeita de pré-eclâmpsia.

O organismo sofre alterações ocasionadas pelahipertensão induzida na gestação, as quais, geralmenteregridem de forma espontânea após o parto2.

Acredita-se que atender à gestante de alto riscocontemplando suas necessidades físicas e psicológicas éfator determinante para que o cuidado prestado sejarealmente efetivo e completo, pois, além dos distúrbiosbiológicos que estão ocorrendo em seu organismo, inúmerossão os eventos emocionais que ela enfrenta.

A expectativa da vida da mãe e do bebê saudável seconfronta com sentimentos de temor pela prematuridade epelas seqüelas que podem comprometer a saúde de ambos.Diante dessas gestantes, precisa-se, sim, da tecnologia, detodo o aparato medicamentoso e laboratorial, mas necessita-se, acima de tudo, cuidar dela e de sua família. Ao cuidar degestantes tem-se de considerar que a gravidez tem umsignificado em sua vida de acordo com sua história, como éexplicado por Boff6,91:

o cuidado somente surge quando a existência dealguém tem importância para mim. Passo então a dedicar-me a ele; disponho-me a participar de seu destino, de suasbuscas, de seus sofrimentos e de seus sucessos, enfim, desua vida. Cuidado significa então desvelo, solicitude,diligência, zelo, atenção, bom trato. Como dizíamos, estamosdiante de uma atitude fundamental, de um modo de sermediante o qual a pessoa sai de si e centra-se no outro comdesvelo e solicitude.

Cuidar é mais que um ato físico. Para que o processode cuidar aconteça e seja efetivo, o paciente precisaparticipar junto à equipe de saúde no seu processo derecuperação e se esforçar para alcançar novas qualidadesde vida7.

A enfermagem, ao cuidar de gestantes hipertensas,precisa valorizar o momento de fragilidade em que estas seencontram. O cuidado só acontece, na essência, quando

existe a troca entre quem cuida e quem é cuidado. Naafirmação de RandünZ8,15:

Cuidar profissionalmente ou cuidar em enfermagemé olhar enxergando o outro, é ouvir escutando o outro;observar, percebendo o outro, sentir, empatizando, estandodisponível para fazer com ou para o outro aquelesprocedimentos técnicos que ele não aprendeu a executarou não consegue executar, procurando compartilhar o sabercom o cliente e/ou familiares a respeito, sempre que houverinteresse e/ou condições para tal.

A medida que a enfermagem evolui como ciência, énecessário que fundamente suas ações e, entre elas, a suaessência, o cuidado. Enfermagem é cuidar do ser humanobuscando novos caminhos e desenvolvendo potenciais paraque este ser humano desempenhe seus papéis e/ou possarenunciar a eles com dignidade. Dignidade é o respeito quese deve ter ao ser humano, fazendo-o sentir-se estimado erespeitado durante todo o processo de viver8.

Acredita-se ser possível a implementação de novasmaneiras de cuidar, que valorizem a gestante hipertensacomo ser humano, não apenas como um mero objeto decuidado, contemplando-a em suas necessidades.

METODOLOGIATrata-se de um estudo exploratório descritivo com

abordagem qualitativa, realizado na maternidade de umhospital geral de grande porte do interior do Rio Grande doSul. Participaram dez gestantes hipertensas que estiveraminternadas na referida maternidade no período de dezembrode 2002 a fevereiro de 2003 A coleta de dados foi realizadaatravés de entrevista semi-estruturada, que indagava aossujeitos do estudo quanto à sua percepção relativa aoatendimento do serviço de enfermagem, às instalações, àalimentação, às expectativas em relação ao recém-nascido,ao apoio familiar, ao repouso, ao tempo de permanência nohospital, ao autocuidado, às expectativas e às frustraçõesquanto ao atendimento de enfermagem.

As entrevistas foram realizadas na maternidade dohospital em duas etapas; na primeira, o sujeito era convidadoa participar do estudo, apresentando o termo deconsentimento; mediante a aceitação, em outra data erarealizada a segunda etapa, que consistia na entrevista. Asentrevistas foram gravadas em fita k-7, com posteriortranscrição sendo, ao final destruídas.

Os dados foram analisados à luz da análise temáticade Minayo9 , através da leitura e releitura dos dados, daextração das unidades temáticas e da organização dascategorias. O estudo observou as diretrizes da resolução196/96 do Conselho Nacional de Saúde10 do Ministério daSaúde e do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem,e atendeu aos seguintes aspectos éticos: consentimento dainstituição e dos sujeitos, garantia de sigilo e anonimato,direito dos sujeitos de se retirarem do estudo em qualquerfase da sua realização, sem prejuízos ao seu cuidado.

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ANÁLISE E DISCUSSÃOPara a identificação dos sujeitos e nomenclatura das

categorias, foi utilizada a analogia a um bosque. Asparticipantes foram identificadas com nomes de árvores, pelocaráter gerador de frutos e fonte de vida que se considerasemelhante à mulher. Para as categorias, buscou-se mantero mesmo sentido da analogia, procurando-se um títuloadequado e que refletisse as unidades de significadoencontradas. Com a análise das entrevistas, emergiram seiscategorias.

1) A recuperação das árvores:A primeira categoria diz respeito ao cuidado de

enfermagem prestado à gestante no decorrer da suainternação hospitalar, o qual demanda muita sensibilidadee carinho. Boff7,33 destaca que “cuidar é mais que um ato; éuma atitude. Portanto, abrange mais que um momento deatenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude deocupação, preocupação, de responsabilização e deenvolvimento afetivo com o outro.”A fala de Araucária denotaa necessidade de ser bem tratada:

a simpatia das menina também, elas são assim, ah,bem atenciosas, elas são, ãhn, não tem ninguém assim, commau humor, sabe. Isso conta um monte, porque se tu vemprocurar ajuda e tu vê alguém triste, aborrecido, né, tu [...]acaba transmitindo. E não [...] as menina chegam aí todacontente e perguntam como é que tá, e bom dia né, entãoisso tudo faz com que você se sinta bem, né. Elas te transmiteque você tá assim, por mais que você, que ninguém gosta dehospital, por mais que você está num hospital você acaba sesentindo bem, segura né. Elas te transmite aquela confiança,aquela segurança, sabe. Faz com que você se sinta bem,também né, já é um... eu digo sempre que é uma [...] metadeda recuperação, então, é aí, né. Tu consegue, consegue sesentir à vontade daí.

Nesse sentido, Brüggemann11 salienta que énecessário compreender que cada pessoa é única e singular;entendê-la e aceitá-la como ela é, com suas boas ou másqualidades, independentemente do que consideramos bomou mau; compreender seus limites dentro de uma situaçãoque não foi por ela criada ou desejada e, ainda, dar-lhe ascondições necessárias para superar esses limites.

O cuidado só acontece, na essência, quando existe atroca entre quem cuida e quem é cuidado. Na afirmação deRadünz8,15:

cuidar profissionalmente ou cuidar em enfermagem éolhar enxergando o outro, é ouvir escutando o outro;observar, percebendo o outro, sentir, empatizando, estandodisponível para fazer com ou para o outro aquelesprocedimentos técnicos que ele não aprendeu a executarou não consegue executar, procurando compartilhar o sabercom o cliente e/ou familiares a respeito, sempre que houverinteresse e/ou condições para tal.

Carnaúba faz uma fala significativa sobre oatendimento da enfermagem do noturno: “elas acendem(luz)

essa aqui da, essa bem fraquinha, aqui né. Tá dormindoelas acordam bem de levezinho, né, pra gente tomá omedicamento, toma, acaba dormindo de novo, bem [...]”.

De acordo com Gonzales12 e Silva13, outra questãoimportante a ser observada ao cuidar das gestantes é buscarconhecer aspectos de sua cultura, do seu modo de vida, ouseja, o que ela vivencia em seu ambiente natural, criando aalternativa de um cuidado mais coerente com o seu vivercotidiano. Na fala de Angico constatamos que seu horáriohabitual de jantar não é levado em consideração: Ah, o meuhorário de jantá era nove, nove e meia. E aqui é cinco emeia, seis horas tá jantando.

Ao prestar o cuidado à gestante, a equipe deenfermagem precisa estar atenta e fundamentada emconhecimentos científicos. A verificação da pressão arterialé um ato importante no controle da gestante com pré-eclâmpsia e deve ser realizada baseada em critériosrigorosos. Sabemos que, se os critérios básicos não forematendidos, podem ser obtidos falsos resultados.

Segundo Cashion5, para a correta aferição dapressão arterial, devem ser seguidos alguns passos: amulher deve estar sentada ou deitada com a cabeceiraelevada a 30º no seu lado esquerdo; aguardar cinco minutospara que haja relaxamento e usar o braço direito para medira pressão arterial. Durante o estudo, percebemos que essespassos nem sempre foram observados, o que é evidenciadopela fala de Carnaúba quando questionada a respeito deem que braço era verificada sua pressão arterial: é, às vez,no direito e, às vez no esquerdo, né.

Quando perguntamos a Angico em que braço e em queposição era verificada sua pressão, a resposta foi a seguinte:sempre no direito, sempre do lado, deitada do lado esquerdo.

O repouso constitui um elemento de suma importânciana estabilização clínica da gestante com doença hipertensivaespecífica da gestação. De acordo com Branden2, o repousono leito em decúbito lateral esquerdo é recomendado paraaumentar as perfusões uterina e renal, pois o aumento daperfusão renal facilita a diurese. As outras posições podemreduzir os fluxos sangüíneos uterino e renal, em virtude dacompressão da veia cava inferior e da artéria aorta.

A clareza com que são passadas as informações sobreo repouso é decisiva para que a gestante o faça de formacorreta. Percebemos uma dicotomia na forma de orientar orepouso, pois para algumas estava evidente como e por querepousar, mas outras, nem tanto. Plátano disse: Elas pediramsó pra repousar.

Para Carnaúba, havia sido explicado o porquê dorepouso, no entanto não havia sido dito que ela poderiamudar de posição para descansar:Sempre do lado esquerdo,não poderia me virar pro outro lado, do lado esquerdo osangue circula melhor, né, onde tem as artérias e ela falouque era sempre do lado esquerdo.

Cashion5 afirma que o repouso no leito mostra-seeficiente na diminuição da pressão sangüínea e na promoçãoda diurese. Porém, o repouso absoluto pode trazer resultadosfisiológicos adversos, tais como o estresse psicológico, aatrofia muscular, o descondicionamento cardiovascular.Essas alterações iniciam no primeiro dia de repouso no leito

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e prolongam-se à medida que dura a terapia. No relato dePlátano, foi constatado o desconforto provocado pelorepouso absoluto:

é ruim, né, porque só deitada a gente não consegueficar, porque começa a doer a perna, aí tu tem que se virar, edepois dói a barriga também, daí tem que virar pro outrolado, ficar só, só do lado esquerdo é ruim.

Alternativas para minimizar esses efeitos incluematividades recreacionais, visitas de amigos, conversastelefônicas e criação de um ambiente confortável. Além disso,é enfatizada a importância de exercícios suaves, tais como avariação de movimento e o alongamento para manter o tonomuscular, o fluxo sangüíneo, a regularidade da funçãointestinal e proporcionar a sensação de bem-estar5.

Angico sabia que poderia mudar de posição: sim, queeu poderia sentar, no caso, só não fazer muito esforço físico,não caminha muito, passá a maior parte do tempo deitada.

Uma complicação da doença hipertensiva específicada gestação é o descolamento prematuro da placenta. Deacordo com Knuppel & Drukker14,412,“o vasoespasmo reduza perfusão do espaço interviloso, o que parece aumentar orisco de descolamento.” Uma das participantes do estudo,Angico, apresentou este agravo: [...] tava sentada na cama,daí eu levantei pra ir no banheiro e me deu tipo umahemorragia.

Ao analisar as falas dessa gestante, observamos queela deambulava com freqüência ao banheiro. Sabe-se queo esforço relacionado a essa atividade pode desencadear odescolamento prematuro da placenta. Dessa forma, éimportante criar condições de diálogo para conscientizar asgestantes de que devem realizar suas eliminações nacomadre, diminuindo o esforço e evitando esse agravo.

2) Experimentado frutos:Esta categoria reúne aspectos referentes às

necessidades nutricionais das gestantes com doençahipertensiva específica da gestação (DHEG), além davalorização de hábitos alimentares prévios. A alimentaçãoé, sem dúvida, imprescindível na vida do ser humano e éainda mais importante no período da gestação. Sem aingestão adequada de alimentos e seus nutrientes, o fetonão poderá crescer nem se desenvolver adequadamente.

A gestante hipertensa deve ter alguns cuidados paramanter a ingestão adequada de nutrientes, pois a gestaçãorepresenta um desafio fisiológico e metabólico ao organismofeminino. O fígado – principal órgão metabólico – devesuportar em grande parte esse incremento metabólico eaumentar sua capacidade para processar os diversosnutrientes e grande quantidade de metabólitos. A saúde dotecido hepático é básica para a manutenção da demandafuncional durante a gestação, e é do suprimento nutricionaladequado que a integridade do tecido hepático depende15.

Em virtude da fisiopatologia da pré-eclâmpsia, algunsgrupos de alimentos têm importância especial na nutriçãodas gestantes, como as proteínas, minerais e vitaminas.Asgestantes hipertensas apresentam lesão hepática, o que levaà deficiência de albumina. Dessa forma, é importante o

aumento da ingestão de alimentos ricos em albumina.Sobreo exposto:

o fígado é a única fonte da albumina do plasma. Oselementos precursores da albumina e outras proteínasplasmáticas são os aminoácidos, que derivam em grandeparte das proteínas da dieta. Tem-se demonstrado que asproteínas alimentares mais adequadas para fornecer oselementos para a reposição das proteínas plasmáticas são,lacto-albumina (uma proteína do leite), clara de ovo, músculode boi, fígado e caseína.”15,81

Essa informação geralmente não é fornecida asgestantes, cuja alimentação, de muitas, é baseada em frutas.A afirmação de Angico confirma essa informação: [...] nãosentia falta de comida de sal, [...] só de fruta, pra mim comendofruta parece que alimentava mais do que se fosse comercomida de sal.

A ingestão hídrica também parece não estar sendoevidenciada junto às gestantes, porém é muito importante,pois segundo15,81 “[...] as características clínicas nas condiçõesde pré-eclâmpsia e eclâmpsia são hipoalbuminemia ehipovolemia, com uma subseqüente hemoconcentração, quemuitas vezes mascara a anemia e a queda na albuminaplasmática” .

Ao contrário do que se pensa, não se deverestringir o sal :

[...] as gestantes com hipertensão apresentam umvolume mais baixo de plasma do que as normotensas, arestrição de sódio não é necessária. As mulheres necessitamde sal para manter o volume sanguíneo e a perfusãoplacentária. A exceção pode ser a mulher com hipertensãocrônica controlada com sucesso por uma dieta baixa em salantes da gestação. A ingesta adequada de líquido ajuda amanter o volume hídrico ideal, a perfusão e a filtração renal 5

É importante que, além disso, sejam observados oshábitos alimentares e as preferências da gestante, pois essesfatores afetarão diretamente na aceitação dos alimentos. Issoé evidenciado na fala de Carnaúba: [...] eu não sei mas emcasa a gente já tem a comida bem mais fraca de sal, sabe, eeu achei forte, até a sopa eu achei forte [...] eu pedi que não,falei que não queria mais sopa.

Cedro expressou que, durante sua internação, nãoforam oferecidas frutas nem uma vez e que, sua frutapreferida é banana: Eu gosto muito de banana. Era a frutaque eu comia direto em casa.

É de igual importância o respeito aos horários emque as refeições são oferecidas e aos hábitos da paciente. Afala de Cedro confirma essa afirmação: Ah, o meu horário dejanta era nove, nove e meia. E aqui é cinco e meia, seis tájantando. Muitas vezes, os hábitos alimentares não sãovalorizados pela equipe de enfermagem. No entanto, sefossem considerados, proporcionariam maior satisfação àspacientes, contribuindo para o seu bem-estar.

3) Buscando abrigo no ninho:Nesta categoria estão os anseios e preocupações das

gestantes hipertensas e os fatores que lhe proporcionam

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A expectativa da vida da mãe e do bebê saudávelconfronta-se com sentimentos de temor pela prematuridadee pelas seqüelas que podem comprometer a saúde deambos. Nas falas emergiram sentimentos de medo e angústiavivenciados pelas gestantes. A declaração de Canelaconfirma: Eu achava que ia morrer. Tinha medo de morrerque nossa.

Diante dessas gestantes, precisa-se, sim, datecnologia, de todo aparato medicamentoso e laboratorial,mas necessita-se, acima de tudo, cuidar da gestante e dasua família. No entender de Soares7,106:

o cuidado humano surgiu com o começo dahumanidade. Cuidar o ser humano é um ato que requerempatia, sensibil idade e, também, conhecimento.Necessitamos de cuidado antes do nascimento econtinuamos requerendo-o sempre que precisamos do outrojunto de nós. Cuidar é também ouvir, tocar, olhar o outro efazer por ele o que ele próprio não consegue.

Acredita-se que a tecnologia e a humanização podeme devem ser praticadas em conjunto, o que significa utilizaro conhecimento tecnológico da melhor forma possível, desdeque acompanhado de contato, afetividade e compreensão.Faz parte do ato de cuidar considerar a ansiedade e aspreocupações da gestante, pois, se não forem amenizadas,poderão contribuir para a elevação da pressão sanguínea.

Por sua vez, Knuppel & Drukker14 salientam que asprincipais preocupações que envolvem a gestante estãorelacionadas ao bebê, à saúde pessoal e aos filhos queficaram em casa. Em sua fala, Ipê traz essa inquietação:Tava nervosa porque eles (medico) me falaram que tinhaque tirar o nenê, medo que acontecesse alguma coisa coma criança.

Angico reforça a situação:

Eu tava bem nervosa, tava apavorada, né. Primeiro,eu descobri que tinha pressão alta, uma coisa que eu jamaisimaginei. Segundo, eu ía ter que ficar aqui por um tempoindeterminado. Terceiro, eu tinha minha filha pequena emcasa que eu não sabia o que fazer, né.

Em contrapartida, o fato de estar internada e de disporda tecnologia existente na instituição proporciona segurançaàs gestantes, o que é evidenciado na fala de Platano. O queeu precisar tenho tudo aqui, um suporte..

No entanto, a companhia de familiares pode oferecer-lhes segurança e tranqüilidade, contribuindo para o seu bem-estar. A fala de Angico reforça essa afirmação: A família émuito importante nessa hora [...] eu acho que sem eles jamaisconseguiria superar.

O hospital onde o estudo foi realizado permite apermanência de um familiar com a gestante durante as 24horas do dia. À noite, é estimulada a presença de uma pessoado sexo feminino, pois geralmente as gestantes estãointernadas em quarto semiprivativo. Porém, as condiçõesoferecidas a esse familiar são mínimas, não havendo pelomenos cama para descanso, de modo que o acompanhanteque passa a noite com a gestante permanece sentado numa

cadeira. Além disso, o espaço físico é reduzido, dificultandoa presença do acompanhante e, em algumas situações,prejudicando os afazeres da própria enfermagem. Dessaforma, torna-se importante a adequação da área física.

Segundo Silva16, ao enfermeiro cabe permitir que osfamiliares fiquem próximos da paciente, participando domomento de crise em que ela se encontra. O núcleo no quala paciente vive não pode ser negado, e todos precisam deatenção para poder crescer e aprender com a experiência.

Apesar dessas limitações, a presença de um familiaré relevante para diminuir a ansiedade da paciente, mas eledeve estar consciente de que precisa encorajar a gestante aaceitar e enfrentar sua condição. Para isso, o familiar precisasaber e entender o que está acontecendo, essa função deorientá-lo deve ser exercida continuamente pelaenfermagem.

4) Protegendo-se dos perigos:A categoria protegendo-se dos perigos trata da

relação da gestante consigo mesma das atitudesdesempenhadas pela gestante no intuito de zelar por si epela saúde de seu filho. De acordo com Boff6,145

cuidar do nosso corpo implica em cuidar da vida queo anima, cuidar do conjunto das relações com a realidadecircundante, relações essas que passam pela higiene, pelaalimentação, pelo ar que respiramos, pela forma como nosvestimos, pela maneira como organizamos nossa casa enos situamos dentro de um determinado espaço ecológico.

Observa-se que as gestantes tinham presente anecessidade do cuidado de si. É o que demonstra Carnaúbaem sua fala: Porque eu sempre alevanto e fico sentada umpouquinho pra depois caminha. Em casa também eu façoassim, que se eu levantasse e saísse, daí, né, eu tenhotontura, mas se não, não.

Orem citada por George17,84, define o autocuidadocomo “o desempenho ou a prática de atividades que osindivíduos realizam em seu beneficio para manter a vida, asaúde e o bem-estar”.Consiste no cuidado desempenhadopelo próprio indivíduo para si mesmo quando ele atinge umestado de maturidade que o torna capaz de realizar umaação propositada, consistente e eficaz.

A resposta de Araucária quando questionada sobre orepouso no leito foi a seguinte:

É que eu to consciente que quanto menos caminharpara mim é melhor, né, se não daí vai alterar muito a pressão[...] tu tem que ser bem consciente, né, tu tem que fazer detudo para dar tudo certo [...].

Nessa perspectiva, a enfermagem pode e deveauxiliar as gestantes a adotarem práticas que contribuampara a promoção de seu próprio bem-estar.

5) Passeio pelo bosque:No contexto hospitalar a gestante está submetida às

condições do ambiente (espaço físico, temperatura e ruídos),que podem influenciar seu bem-estar. Constata-se que os

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quartos não possuem banheiro, o que é uma queixaevidenciada nas falas das gestantes Plátano e Angico,respectivamente: O banheiro, podia ser dentro do quarto,né. Tem que atravessar e ir lá na frente. Podia ser dentro doquarto. É essencial um banheiro [...] se torna muito longepra gente ir.

Os quartos não possuem arejamento adequado,não permitindo, portanto, que as gestantes se sintam bem. Anecessidade de ventiladores está evidente na maioria dasfalas. Angico revela essa condição: Eu acho que deveria terum ventilador, porque as noites são horríveis aqui.

O hospital não dispõe de ventiladores para todos osquartos, entretanto a enfermagem pode contribuir nessesentido, orientado as gestantes para que o tragam de casa.Observou-se que apenas algumas gestantes recebem essaorientação, o que é evidenciado por Ipê: Trazer de casa,ninguém me falou nada.

As falas de Ipê e Plátano revelam a questão daventilação inadequada: Precisava de uma ventilação melhor,né, [...] pra se senti melhor. (Ipë) Mais arejado, né, é pequeno,abafado. (Platano).

Nightingale18,19, a primeira teorista de enfermagem,já afirmava que se deve “conservar o ar que ele respira tãopuro quanto o ar exterior”, pois, dessa forma, o paciente terámelhores condições para sua recuperação. Um ambientecalmo e silencioso é importante para essas gestantes, pois,quanto menor a estimulação, menor o risco de alteração dapressão arterial. Burroughs19,329 assinala que quando umagestante com DHEG é hospitalizada, o cuidado ideal érepouso em um quarto silencioso. O objetivo da assistênciaé a manutenção do funcionamento dos sistemas orgânicosda mulher, proporcionando-lhe um ambiente tão calmo esem estímulos quanto possível. Esse plano reduz airritabilidade neuromuscular e o risco de convulsão.

A fala de Carnaúba reflete essa necessidade. “[...] eugosto de ficar em silêncio, bem quietinha, parece que ajudaa passá, mas na verdade ele não ajuda, continua com a dorde cabeça, né.” A enfermagem deve proporcionar umambiente o mais adequado e agradável possível; assim, emcaso de longo período de internação, pode sugerir à pacienteque traga objetos do seu lar, como roupa de cama, um abajur,uma foto da família ou algum objeto de interesse.

As gestantes do estudo sugeriram algumasalternativas para tornar o ambiente mais alegre, melhorandoseu aspecto: [...] quadro ficaria legal, como eu vi uns nocorredor ali de bebê, né, tá amamentando. Acho que quadroficaria legal, um tipo de quadro assim. (Carnaúba). é umacor mais alegre, mais pra cima, ajudaria muito [...] mudaria ovisual. (Angico).

No sentido da organização do ambiente do quarto,Noronha20,74, faz uma relação muito interessante:

O quarto hospitalar se transforma, para essas pessoas,em um útero, as medidas médicas, que são sempre cercadasde atenção muito especial, são relacionadas a um seio fartoe carinhoso e a parafernália médica usada nestes casos,

tais como o soro, o equipo transfusional e os cuidadosmedicamentosos, uma verdadeira placenta que através deseu cordão umbilical (equipo transfusional) transmite, parao feto, todo a sua necessidade (medicamentos) de segurança.

Então, por que não dar ao quarto característicasinerentes ao útero materno, proporcionando um ambientesilencioso, penumbro, aquecido? Talvez isso seria o mínimoque a enfermagem poderia oferecer para tornar oatendimento humanizado.

6) O cantarolar dos pássaros:A categoria o cantarolar dos pássaros aborda questões

relativas ao lazer e ao entretenimento das gestantes duranteo período de internação hospitalar. A gestante internadaprecisa realizar atividades agradáveis, que a auxiliem atolerar o tempo de internação. Angico relata: Não, não tinhao que fazer. Eu escrevia, fiz um monte de coisa.

Conforme Nightingale18,71“[...] todo homem e todamulher exercem alguma atividade manual [...] Ninguém podeimaginar o alívio que o trabalho manual oferece e como afalta de atividade manual aumenta a irritabilidade peculiarda qual muitos pacientes sofrem.”

Apenas um dos quartos destinados à internação dasgestantes possui televisão, considerada pelas pacientescomo a única fonte de entretenimento, como refere Imbuia:Assisto, só. Porém, essa atividade torna-se cansativa com opassar dos dias. Carnaúba, em seu relato, confirma: Só aTV tu acaba enjoando, né. Por sua vez, as gestantesinternadas no quarto que não dispõe de TV sugeriram queum aparelho seria importante. Conforme Angico, seria muitointeressante. Daí pelo menos passa o tempo, né.

Outro aspecto relevante apontado pelas gestantes doestudo como fonte de distração seria a disponibilidade dematerial para leitura. Carnaúba apresenta essa necessidade:Mas ler,sabe, ajudaria bastante, a revista passa o tempo, né.

A equipe de enfermagem pode contribuir oferecendoas gestantes revistas, jornais, pois no local do estudo, essasfontes de leitura não estão disponíveis. A presença de familiartambém é importante no auxílio à tolerância ao tempo deinternação. Quando questionada sobre o que faz para passaro tempo, Cedro diz: Só fico deitada, né. Tem sempre alguémjunto comigo, né, sempre tá, sempre temo conversando ecoisa, daí que passa as hora, senão [...].

Angico reforça essa idéia: E aqui, hoje de manhã eranove, dez, eu achei que era meio -dia e pouco, passado já. Agente se perde.

O tempo demora a passar para as pessoashospitalizadas. A garantia de ocupação e divertimento é umdesafio constante para a equipe envolvida no cuidado e paraelas mesmas. É útil que as mulheres compartilhem um quarto,pois desse modo há a ajuda mútua e muitas amizades sedesenvolvem21.

A equipe de enfermagem precisa estar sensível àsnecessidades de lazer das pacientes, pois o lazer temfundamental importância no auxílio à recuperação daspacientes.

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no mundo de cada mulher e ouvir seus relatos, entende-seque o cuidar vai além da execução de técnicas eprocedimentos. O que a gestante mais manifesta é anecessidade de ser vista como pessoa, na sua totalidade,que sua identidade e seu contexto familiar sejam valorizadose façam parte do cuidado.

Constata-se que a construção de uma proposta decuidado humanizado a essas gestantes pode se efetivar comcondutas muito simples a serem adotadas pela equipe. Essasse iniciam por respeitar o leito da paciente como seu espaçoe permitir que ela coloque seus objetos pessoais, tornandoo ambiente o mais próximo possível de sua casa,proporcionando-lhe identidade familiar, já que o tempo depermanência no hospital muitas vezes é prolongado.Envolvem respeitar o corpo da paciente, pedindo licençapara tocá-lo, saber ouvir a paciente para conhecê-la comopessoa. O ato simples de ouvir, no entender de Silva16,36, temuma conotação ímpar: “Ouvir cria um silêncio sagrado. Talvezseja o mais poderoso instrumento de cura, porque, quandoescutamos generosamente as pessoas, elas podem ouvir averdade sobre si mesmas, ainda que pela primeira vez. Nosilêncio de ouvir, você pode conhecer a verdade de todapessoa”. Para cuidar é preciso conhecer a história de vidada pessoa que está sob os cuidados.

Outra maneira de humanizar a assistência édisponibilizar momentos de lazer através de materiais, taiscomo jogos, artigos para trabalhos manuais e fontes de leituracom linguagem acessível. Estas últimas, além de seremutilizadas como distração, podem suprir a carência deconhecimentos das gestantes a respeito de sua patologia edos cuidados necessários consigo mesma e com o bebê .

Destaca-se ainda a importância de a enfermagementender o que está acontecendo com essa gestante, pois aqualidade do cuidado prestado depende do conhecimentoque a equipe possui sobre o mesmo. Dessa forma, faz-senecessária a educação continuada com a equipe deenfermagem, como uma estratégia de capacitação paraprestar o cuidado humanizado à gestante. Para isso, torna-se fundamental a participação de uma equipemultidisciplinar, que pode incluir os profissionais enfermeiro,fisioterapeuta, médico, nutricionista e psicóloga, a fim demelhor contemplar as necessidades das gestantes.

Acredita-se que, compreendendo a gestante hipertensaa partir de seu contexto familiar, considerando seus significadosem relação à gravidez, estarão sendo encontradas novas formasde cuidar. Enfim, este estudo pode contribuir despertando umolhar inovador e diferenciado na implementação de novasmaneiras de cuidar das gestantes hipertensas internadas.

Summary

REFLECTION ON THE NURSING CARE IN THE POIT OF VIEW OFTHE PREGNANT WOMEN WHO SUFFER FROM HIGH BLOOD PRESSURE

The aim of this study was to understand the Nursing Care given to pregnant women whopresented High Blood Pressure. This study was qualitative exploratory descriptive. It washeld in a Maternity of a General Hospital in a town in the State Rio Grande do Sul, Brazil,from December 2002 to March 2003. Eight pregnant women who were hospitalized took partin this experiment. The data were collected through semi-structured interviews. The thematicanalysis was used to examine the results and six categories emerged: the trees recovery,trying fruit, searching for shelter in the nest, protecting from danger, walking in the woodsand the bird singing. The given care contemplates the biological needs, putting humanizationin the second level.

Keywords: Pregnancy, High Blood Pressure, Nursing Care.

REFERÊNCIASObs.: 21 referências à disposição dos leitores.

Antunes LJ e cols. Reflexão Sobre o Cuidado de Enfermagem na Visão da Gestante Hipertensa.

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Síndrome de EagleRoque Miguel Rhoden1, Paulo Fogaça2, Douglas Voss1, Diego Pons1, Vinícios Rhoden1, Fernando Rhoden1.

Centro Integrado de Cirurgia Orto-facial(CICOF)1, Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço2,Hospital São Vicente de Paulo, Passo Fundo(RS).

Resumo

A síndrome de Eagle é determinada pelo alongamento do processo estilóide, comconseqüente ossificação do ligamento estilo-hióideo. De etiologia incerta, causa grande dore desconforto ao paciente na região, podendo freqüentemente ser a causa de dores cervicaise craniofaciais. O diagnóstico é difícil, pois pode ser confundido com uma série de outrasneuralgias faciais e/ou orais, dentais, bem como desordens da articulação temporo-mandibular. Este trabalho ressalta aspectos clínicos (sinais e sintomas), Raios-X pré e pós-operatório, bem como a forma de tratamento proposto para o caso e a técnica cirúrgicaextra-oral no lado direito.

Unitermos: Síndrome de eagle, ligamento estilo-hióideo, processo estilóide.

A síndrome de Eagle manifesta-se como um complexode sintomas, causados por compressão do processo estilóidealongado e/ou calcificação do ligamento estilo-hióideo, sobrevasos sanguíneos ou nervos adjacentes1,2.

É uma ocorrência frequente, sem prevalência deidade, mais comum em mulheres depois dos 30 anos deidade. O desvio lateral parece ser tanto ou mais importantedo que o comprimento do processo estilóide. Os sintomasmais comuns são dor faríngea, dor ao girar a cabeça esensação de corpo estranho na faringe1,2,3.

De etiologia discutível e incerta, fatores como má-oclusão, tonsilectomias e traumas são considerados agentes

desencadeantes5.A sintomatologia não é clara e específica para a

síndrome, porém dependente de exame clínico completo ede achados radiográficos (figuras 1 e 2): RX panorâmico, PAe lateral oblíqua de mandíbula e exames tomográficos,apresentando imagens definidas.

O ligamento estilo-hióideo é um tecido conjuntivo queestá ligado a extremidade do processo estilóide até o ossohióide. A mineralização possui duas classificações: peloprocesso (alongado, pseudoarticular e segmentado) e pelaqualidade de mineralização (homogêneo, externo, nodulare parcial)1,3,6.

Figura 1. Rx de diagnóstico. Figura 2. Rx de diagnóstico.

Relato de Caso

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RELATO DE CASOPaciente feminina, 54 anos, leucoderma, apresenta dor

na face há 9 anos no lado direito, disfunção muscular da ATMdireita, dormência na língua, gânglios palpáveis sub-mandibulares à direita, com 8 a 10 mm de diâmetro, dor naregião cervical direita e do ligamento estilo-hióideo; apresentao ligamento direito totalmente calcificado. Já teve vômitos,febre e mal-estar geral. Apresenta dentadura total (superior einferior). Como tratamento não cirúrgico, foram refeitas novaspróteses com restabelecimento da dimensão vertical oral,fisioterapia, uso de anti-inflamatórios e analgésicos potentes,inclusive tegretol e compressas quentes no local. Os sintomasmais comuns eram cancerofobia (nove anos de tratamentosem melhora com multi-profissionais); quadro de depressão;edema intermitente na região angular da mandíbula; dortemporal, occipital, periauricular, cérvico-lateral, região sub-mandibular, sempre do lado direito e várias vezes apresentoualgias na região malar e infra-orbitária; inúmeras vezes sentiucompressão e latejamento na hemi-face direita, regiãoparotídia e cervical; paciente com roncos noturnos freqüentes(obesa severamente), pescoço curto e grosso; cefaléiasperiódicas; apresentava dor durante a deglutição, dor ao abrire fechar a boca; raros momentos de vertigens; quatro a seiscrises anuais de disfunção de ATM (neuro-muscular); àsvezes, tonturas e nos últimos três meses, náuseas e vômitosao se alimentar, queixando-se várias vezes de dor degarganta; fisgadas em forma de choque cervical, quando emmovimento da cabeça (que confundia com nevralgia dotrigêmio) e, às vezes, no interior da cavidade oral do ladodireito; queimação no lado direito da língua e, muitas vezes,dormência na região cervical e do ombro direito.

Esta paciente, neste período, fez avaliação e tratamentona área da neurologia, oftalmologia, otorrinolaringologia,cirurgia de cabeça e pescoço e ortopedia.

O tratamento proposto após o diagnóstico foi a excisãodo alongamento do processo estilóide do lado direito, atravésda técnica cirúrgica com abordagem extra-oral, o ladoesquerdo, mesmo calcificado, não apresentava os sinais eos sintomas. A cirurgia foi realizada sob anestesia geral, apaciente colocada em decúbito dorsal horizontal e a cabeçarodada para o lado oposto. Uma incisão na pele e dissecçãoaté o ligamento foi realizada pelo cirurgião de cabeça epescoço pelo cirurgião buco-facial com extensão de 50mm,oblíqua de trás para frente e de cima para baixo, logo abaixo

do ápice da apófise mastóidea (figura 3), a partir da metadeanterior da inserção do músculo esternocleidomastóideo,abaixo do ramo mandibular; a aponeurose cervical superioridentificada e aberta, o músculo esternocleidomastóideoretraído posteriormente, o músculo digástrico inferiormentee o ramo ascendente da mandíbula identificadoanteriormente; a apófise estilóide identificada (figura 4 e 5)e, após o deslocamento subperiostal da musculatura e dosligamentos inseridos, removida(figuras 6 e 7), com cuidadosespeciais à artéria carótica e ao nervo facial. Fechandoposteriormente a incisão (figura 8), respeitando o planosmusculares.

Após 15 dias da remoção cirúrgica (figura 9), apaciente apresentava-se bem e sem quaisquersintomatologia dolorosa.

COMENTÁRIOS E CONCLUSÕESO tratamento preponderante, quando a terapia

conservadora não for eficiente, é a remoção do ligamentoestilóide calcificado. Dentro dos tratamentos conservadores,os autores sugerem tratamentos alternativos. Shenoi5 (1972),usou uma a duas infiltrações, ao nível da inserção doligamento estilo-hióideo no osso hióide(metilpredinisolona40 mg.) Rizzatti-Barbosa4 (1999), em um caso de associaçãode disfunção temporomandibular, realizou confecção denovas próteses, o uso de esplinte oclusal, fisioterapia comestimulação elétrica, massagem e exercícios de relaxamentomuscular promoveram total resolução da dor.

Dentre os tratamentos cirúrgicos, a abordagem intra-oral, segundo Glogoff3 (1981), é mais simples, menor tempocirúrgico, ausência cicatricial e risco infeccioso similar a umatonsilectomia de rotina. Em contrapartida, segundo Strauss7

(1983), na abordagem cirúrgica extra-oral, obtém-sevisualização anatômica adequada do processo estilóide eestruturas adjacentes e há um menor risco de contaminaçãobacteriana pelas técnicas de descontaminação cirúrgicaspré-operatórias, além de reconhecerem que a via intra-oralpermite uma visualização pobre, maior risco de infecçãocervical e trauma da artéria carótida externa e do nervo facial.

Pela sua sintomatologia complexa, a síndrome exigeuma cuidadosa interação entre médicos e cirurgiões-dentistas. É possível que a evolução do conhecimentopermita, no futuro, descaracterizar a síndrome de Eagle comoentidade distinta.

Figura 3. Incisão cirúrgica. Figura 4. Processo estilóide. Figura 5. Ligamento estilóide. Figura 6. Remoção do ligamentoestilo-hióideo calcificado.

Rhoden R M e cols. Síndrome de Eagle - Relato de Caso Cirúrgico.

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Summary

EAGLE´S SYNDROME - Case Report

Eagle’s syndrome is determined by the prolongation of the Styloid process with consequentossification of the Stylohyoid ligament. This disease is of uncertain etiology, and cause asevere pain and discomfort, being frequently cause of cervical and craniofacial pain. Itsdiagnosis is difficult, therefore can be confused with a series of other facial and/or oral ordental neuralgies, as well as temporomandibular joint disorders. This paper stands out theclinical findings (signs and symptoms), pre and postoperative X-Ray examinations and, aswell as the form of treatment considered for the case and the extraoral surgical technique inthe Patient’s right side.

Keywords: Eagle’s Syndrome, Styloid process, Stylohyid Ligament.

REFERÊNCIAS1. Eagle WW. Elongment styloid process: report of 2 cases.

Arch Otolaryngol 1937;25:84.2. Faber PA, Bertolini PZ, Oliveira Jr PA de, Kalluf GH, Elneser

NE. Síndrome de Eagle. Relato de caso cirúrgico emmulher adulta. Ver Bras Cir Periodontia 2003;1(3):231-3.

3. Glogoff Mr, Gavan SM, Cheiefetz J. Diagnosis and treatmentof Eagle syndrome. J Oral Surg 1981;39:941-4.

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Figura 7. Ligamento calcificado. Figura 8.

Rhoden R M e cols. Síndrome de Eagle - Relato de Caso Cirúrgico.

Figura 9. Rx pós cirurgia, retirado o ligamento,observa-se apenas 2 mm do processo estilóidejunto a mastóide.

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Transtorno Conversivo em Criança Edson R. Dalberto, Luciane Miozzo, Aline J. Romagna, Cláudio J. Wagner.

Faculdade de Medicina, Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Transtorno conversivo é um tipo de distúrbio somatoforme definido quando ossintomas envolvem queixas neurológicas e não são explicados por outra condiçãomédica. Iniciam na adolescência ou em adultos jovens e apresentação mais comumé constituída por pseudo-crises convulsivas. Condições psicológicas estão envolvidascom a origem e severidade. Relatamos o caso de uma criança de 9 anos queapresentou-se com sintomas de pseudoconvulsões e na qual o distúrbio adquiriucaráter crônico.

Unitermos: Transtorno conversivo, somatização, pseudo-convulsões.

Distúrbios somatoformes apresentam-se comsintomas físicos para os quais não há uma explicação médicaapropriada, causando sofrimento emocional e prejuízo socialao paciente. Há íntima relação com estressores de ordememocional, os quais são determinantes para o início,severidade e duração dos sintomas1.

O transtorno conversivo é um tipo de transtornosomatoforme definido quando os sintomas somáticosenvolvem queixas neurológicas1,2,6,10, destacando-se, nesseaspecto, as pseudo-convulsões e os déficits sensório –motores. O termo conversão foi primeiramente aplicado porFreud10 e significa a expressão das emoções reprimidasatravés de sintomas somáticos. A prevalência de conversãoestá estimada em 40 casos para cada 100.000 habitantes10.

RELATO DE CASO Menina de 9 anos apresentou-se com história de

movimentos estereotipados de musculatura voluntária esíncopes de ocorrência diária (alguns dias com váriosepisódios) e duração de poucos minutos. Durante os eventosnão se observava liberação esfincteriana, mordedura delíngua ou ferimentos. Não havia amnésia para o evento. Osepisódios ocorriam sempre na presença de observadores(na escola, na presença de familiares). O exame físico nãodemonstrava anormalidades.

A criança era previamente hígida. Na históriapsicossocial destacamos mãe depressiva e pai etilista e semlaços afetivos com a criança.

Exames laboratoriais de rotina (hematológicos ebioquímicos), eletroencefalograma e tomografiacomputadorizada de encéfalo eram normais. A paciente foi

submetida a avaliações com equipe multidisciplinar queincluiu pediatra, neurologista, psiquiatra e psicóloga. Em duasocasiões foi internada buscando-se uma melhor observaçãodos eventos. Vários tratamentos medicamentosos foraminiciados (ácido valpróico, carbamazepina, clonazepam,paroxetina, oxcarbamazepina, imipramina) sem melhora dasintomatologia. Por exclusão, estabeleceu-se diagnóstico detranstorno conversivo na forma de pseudocrises convulsivas.Foi iniciada psicoterapia individual e familiar (paciente jáestava com 10 anos) e após alguns meses os eventostornaram-se mais raros. Atualmente a paciente está com 12anos, em uso de oxcarbamazepina e está há mais de 6meses assintomática.

COMENTÁRIOS E CONCLUSÕESTranstorno conversivo consiste de sintomas motores

ou sensoriais involuntários e déficits que não podem serexplicados por uma condição médica geral4,6,10 e requer quecondições psicológicas estejam associados com o início ouexacerbação dos sintomas1,6.

Sugere-se que etiologia esteja ligada à repressão deconflitos intrapsíquicos inconscientes1. Abuso sexual5,7 ,distúrbios alimentares, depressão, ansiedade e transtornosde personalidade estão descritos na literatura associadosaos sintomas conversivos5. Estudo realizado na Turquia,envolvendo adolescentes demonstrou que os pacientesseparados de seus pais por longos períodos, problemas decomunicação e expressão das emoções na família,ansiedade, presença de conversão no meio em que vive emãe apresentando distúrbio conversivo ou outras desordenspsiquiátricas são significativamente associados com essa

Relato de Caso

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11. Behrman RE, Kliegman RM, Jenson HB. Nelson – Tratadode Pediatria. 17ª ed. Elsevier, 2005 .

patologia8.Distúrbios conversivos são mais comuns em

mulheres1,6,10 e podem iniciar-se em qualquer idade1. Noentanto, verifica-se que a época de início é mais comum naadolescência e adultos jovens1,11. No estudo de Kotagal etal8 o mais jovem paciente com diagnóstico de transtornoconversivo foi um menino de 5 anos. O mesmo autor verificouque, inversamente ao relatado pela maioria dos autores, naidade escolar houve maior número de meninos comdiagnóstico de pseudo-convulsões (14 meninos e 8meninas). O inverso ocorreu entre adolescentes, compredomínio de meninas (26 meninas e 14 meninos). Em outroestudo, a média de idade no início dos sintomas conversivosfoi 11 anos, com apenas 2 crianças menores que 9 anos enenhuma com menos de 8 anos6.

Vários estudos referem que a forma mais comum deapresentação do transtorno conversivo é através de pseudo-convulsões (ou PNEs – eventos paroxísticos não epilépticos)6,8

e estas não podem ser facilmente diferenciadas apenas com aobservação clínica de um evento convulsivo verdadeiro1. Algunseventos que costumam ocorrer durante uma convulsão comomorder a língua, incontinência urinária e ferimentos após quedasnão costumam estar presentes nas pseudo-convulsões e sãoúteis para o diagnóstico diferencial1. Pseudo-crises ocorremem todas as faixas etárias e aproximadamente 20% dospacientes atendidos em centros de referência para tratamentode epilepsia foram classificados como tendo convulsões não-epilépticas9. Outras formas de apresentação desse distúrbio

são cegueira, diplopia, distúrbios de marcha e paralisias11. Amaioria dos pacientes tem recuperação rápida e espontânea(dias ou semanas) e até 75% dos pacientes podem nãoapresentar um segundo episódio1. O tratamento, em geral, épsicoterápico e psicoanalítico1.

CONCLUSÕESO diagnóstico de transtorno conversivo é difícil de ser

estabelecido, sendo diagnóstico de exclusão. Muitas vezeso médico precisa recorrer a exames complementares comoo eletroencefalograma, estudos de imagem e vídeo-EEG casoa apresentação do distúrbio siga um padrão de pseudocrisesconvulsivas. Um diagnóstico duvidoso e equivocado acarretatratamentos inadequados e infrutíferos e provoca diferentesatendimentos gerando mais ansiedade e preocupação nosfamiliares e levantando a possibilidade de o pacienteapresentar um problema orgânico mais grave. Somam-se aisso os gastos com consultas médicas, exames e medicações.

Em nossa paciente observamos que o curso da doençaadquiriu um caráter crônico, com duração de mais de 1 ano,com eventos diários, inclusive alguns dias com inúmeras crises.Acreditamos que a cronicidade do distúrbio tenha ocorridodevido a persistência dos agentes estressores de ordempsicogênica. Com o desenrolar da psicoterapia verificamos quehavia uma inversão de papéis no contexto familiar (a criançaassumiu o lugar do pai e, inclusive, dormia na cama com amãe) e que a paciente tinha muitos ganhos secundários comesse comportamento (recebia toda a atenção da família).

Summary

CONVERSION DISORDER IN CHILDREN

Conversion disorder is a kind of somatoform disturbance defined when the symptomsinvolve neurological manifestation that don’t explain other medical conditions. They start inthe youth or young adults and the most common symptom is pseudoseizures. Phychologicalconditions are involved with its origin and severity. The Authors report a case of a nine yearold child who presented pseudoseizures that developed a chronic character.

Keywords: Conversion Disorder, Somatization, Pseudoseizures.

Dalberto E R e cols. Transtorno Conversivo em Criança.

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Relato de Caso

Reabilitação em Transplante Meniscal

Daniela Delazeri, Gilnei Lopes Pimentel, César Antônio de Quadros Martins.Centro de Estudos Ortopédicos, Clínica de Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo e

Laboratório de Biomecânica da Faculdade de Educação Física e Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Este estudo foi proposto com a finalidade de revisar a literatura referente aos principaisfatores que envolvem o transplante meniscal, como funções e lesões meniscais, tratamentosprévios e diretrizes que norteiam a reabilitação neste caso, avaliar a efetividade do protocolode reabilitação neste procedimento, conforme proposto pela Universidade de Pittsburgh.Um estudo de caso é apresentado, baseando-se neste protocolo, cuja avaliação foi realizadadurante a reabilitação, através da goniometria e do teste de força muscular aplicadosprotocolarmente no início do tratamento, no terceiro, sexto, nono e décimo-segundo mês deevolução, e pelo questionário funcional modificado de Noyes, aplicado apenas ao final deum ano. Apesar do caso ter suas particularidades, os resultados obtidos coincidem com osdemais encontrados na bibliografia, com a força muscular e a amplitude de movimentonormalizadas ao sexto mês pós-transplante. A análise do questionário respondido pelopaciente, apontou um escore de 75 pontos, correspondendo a um conceito “bom”, sugerindoa eficácia do protocolo proposto.

Unitermos: Joelho, transplante meniscal, aloenxerto, reabilitação.

Segundo Miller, Cooper e Warner1 (1995), as rupturasmeniscais representam aproximadamente 50% das lesõesde joelho que requerem cirurgia. Com os atuaisconhecimentos disponíveis sobre as reais funções meniscais,é cada vez mais importante a preservação desta estrutura,que outrora chegou a ser considerada desprezível e semfunção. Desta forma, várias modalidades terapêuticas vêmsendo estudadas com o objetivo de manter a integridade dotecido meniscal, seja por meio de tratamento conservadorou cirúrgico. Dentre as técnicas cirúrgicas, destacam-se osprocedimentos via artroscópica, que proporcionam o retornoàs atividades funcionais em um reduzido espaço de tempo.Sempre que possível, os cirurgiões têm lançado mão desterecurso a fim de evitar danos maiores à articulação do joelho,efetuando o reparo do menisco ou a sua retirada parcial.

Nos últimos anos uma nova opção cirúrgica vemsendo estudada, que é a possibilidade do transplantemeniscal. É um procedimento relativamente novo,principalmente no Brasil, com poucas cirurgias já realizadas.Em termos de reabilitação a literatura é ainda mais escassa,com apenas publicações internacionais, porém não foiencontrado nenhum estudo na bibliografia nacionalconsultada.

Desta forma, buscou-se avaliar a eficácia de umprotocolo de reabilitação pós-transplante meniscal, baseadoem um programa proposto pelo Centro de Medicina Esportivae Reabilitação da Universidade de Pittsburgh. O estudoprocurou ainda revisar a literatura atual sobre as funçõesmeniscais, sobre os efeitos deletérios da meniscectomia esobre os conceitos existentes em relação ao transplantemeniscal como opção cirúrgica e sua reabilitação.

Conforme já comentado por Mejias et al.2 (2002)anteriormente, as conseqüências de uma meniscectomiapodem ser um dano à cartilagem articular precoce eirreversível. A meniscectomia lateral acelera o processo maisdo que a medial, pois no compartimento externo o meniscosuporta quase toda a carga de compressão, sendo que nocompartimento interno esta se divide entre o menisco e acartilagem articular. Por todos os possíveis danos posterioresà meniscectomia, existe uma tendência atual para o manejodas lesões meniscais de forma mais conservadora, seja pormeio de uma sutura meniscal, sempre que possível, por meiode meniscectomias mínimas, ou através de transplantesmeniscais. Em sua obra clássica, Fu, Harner e Vince3 (1994)destacam que, em 1916, Lexer foi o primeiro a buscar umsubstituto para o menisco, usando gordura como tecido de

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interposição, sendo que em 1933 Gebhardt relatou a mesmatécnica em um estudo experimental em cães.

Ainda relatam que bem mais tarde, em 1983,Toyonaga et al substituíram o menisco lateral com uma redede teflon. Em seus trabalhos experimentais, no entanto, osautores relataram dificuldades causadas pelas adesões entreo tendão poplíteo, a cápsula articular e o enxerto. Nos anosseguintes foram utilizadas próteses meniscais com siliconee fibras de carbono, porém sem sucesso.

Fu, Harner e Vinci3 (1994) ressaltam que os primeirostransplantes livres de menisco foram executados em 1984,quando Milachowski et al. transplantaram meniscos mediaisem 23 pacientes. A artroscopia posteriormente revelou aincorporação macroscópica do tecido transplantado. Com opassar dos anos, outros autores utilizaram enxertosmeniscais e um número diferente de técnicas passou a serutilizada com sucesso.

Fritz, Irrgang e Harner5 (1996) propõem que areabilitação pós-operatória não está completamentedesenvolvida, podendo evoluir. A maioria das publicaçõesmenciona o uso de órtese no joelho envolvido, 5-6 semanasde sustentação parcial ou não-sustentação de peso sobre aextremidade envolvida, e imediata mobilização da articulaçãodo joelho, seja por meio de exercícios passivos ou atravésdo uso da máquina de movimento passivo contínuo.

Mejías et al.2(2002) preconiza a imobilização dojoelho com uma órtese articulada a 30º de flexão, ecomeçando a exercitar a flexão entre 30º e 60º durante duassemanas. Até a sexta semana se permite um arco demovimento entre 30º e 90º de flexão, e nas seguintes seissemanas, entre 20º e 120º . A carga parcial de sustentação éautorizada entre a sexta e décima semana, e depoiscompleta. Existem tendências mais agressivas que permitema carga que o paciente tolerar desde o início, protegendo ojoelho com uma órtese em extensão ou por uma tala gessada.Outros ainda autorizam a extensão completa de forma ativae passiva sem carga de 0 a 60º ou 0 a 90º, já ao término doprimeiro mês. O autor recomenda começar com treino demarcha com carga com 45 dias de pós-operatório e osexercícios de cadeia cinética fechada com flexão de até 60ºdo joelho, evitando as forças de cisalhamento e cargascompressivas maiores. É de grande importância ofortalecimento muscular do quadríceps, tendo em vista queesse absorve em grande parte as solicitações de apoio.Espera-se a amplitude de movimento máxima e cargacompleta com 6 a 12 meses de pós-operatório.

Os autores preconizam que o treino de marcha sem ouso da órtese em extensão é iniciado 6 semanas após acirurgia. Estudos em animais têm mostrado interação domenisco à cápsula em 4-6 semanas. A restauração daextensão completa imediatamente após a cirurgia éimportante particularmente nos transplantes mediais, quefreqüentemente envolvem a remoção e reinserção doligamento oblíquo posterior e a porção profunda do ligamentocolateral medial. Perda da amplitude de movimento após areconstrução tem sido correlacionada com os reparos dessasestruturas. Afirmam ainda que, com o progresso nareabilitação, atividades em cadeia cinética fechada sãolimitadas de 0º a 60º de flexão porque a carga transmitida aos

meniscos aumenta bastante em angulações próximas à 90º.Os pesquisadores enfatizam treinamento de

propriocepção pois os meniscos possuem mecanorreceptorese importantes funções proprioceptivas.

Swanik et al.4 (1997) fundamentam que os protocolosde reabilitação deveriam incorporar atividades que busquema melhora da condição muscular, encorajando adaptaçõesdos aferentes periféricos, reflexos espinhais e padrõesmotores corticais. Quatro elementos cruciais pararestabelecer o controle neuromuscular e a estabilidadefuncional são: domínio proprioceptivo e cinestésico,estabilidade dinâmica, características muscularespreparatórias e reativas e padrões motores funcionais,conscientes e reflexos.

De acordo com Fritz, Irrgang e Harner5 (1996), estudosem animais e humanos têm mostrado boa cicatrização doenxerto, revascularização, e aparência macroscópica em 6-12 meses após a cirurgia.

MÉTODOS E PROCEDIMENTOSO presente estudo foi desenvolvido nas

dependências da Clínica de Fisioterapia da Faculdade deEducação Física e Fisioterapia, caracterizando-se por serdo tipo experimental, tendo sido aprovado pelo Comitê deÉtica na Pesquisa da UPF. O indivíduo selecionado para otransplante meniscal e participação no estudo, satisfez osseguintes critérios: jovem (até 40 anos de idade), com cirurgiaprévia de meniscectomia, estabilidade na articulação dojoelho e dor. Após a seleção, o mesmo foi convidado aassinar um termo de consentimento informado, concordandoem participar do estudo, bem como permitindo a divulgaçãodos resultados, desde que respeitada sua identidade. Oestudo constou da aplicação do protocolo de reabilitaçãoem transplante meniscal proposto pelo Centro de MedicinaEsportiva e Reabilitação da Universidade de Pittsburgh, PA,Estados Unidos.

Para a avaliação da eficácia do trabalho realizadoforam utilizados os seguintes instrumentos: a goniometria, oteste manual de força muscular de acordo com Kendall, equestionário funcional modificado proposto por Noyes. Asavaliações foram realizadas na consulta inicial, ao términodo 3º, 6º, 9º e 12º mês, à exceção do questionário funcionalaplicado apenas ao final do tratamento.

Protocolo para reabilitação pós-transplantemeniscal (segundo o Centro de Medicina Esportiva e

Reabilitação da Universidade de Pittsburgh)

FASE I – PROTEÇÃO MÁXIMA (0-8 semanas)

Objetivos: Proteger a fixação do enxerto, controlarda inflamação, estender completamente o joelho, prevenirefeitos adversos da imobilização, controlar o quadríceps.

Brace: 0-6 semanas: bloqueado em extensão paradeambular, dormir.

6-8 semanas : descontínuo para dormir,liberado para treino de marcha controlado.

Sustentação de peso: Como tolerado, com 2 muletas.Limite ADM: 0-90º.

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Tratamento: fortalecer quadríceps, estimulaçãoelétrica se necessário, bombeamento dos tornozelos(exercícios metabólicos), progredindo para resistidos comthera-band, elevação do MI (nos 4 planos), mobilizar a patela,hidroterapia (4ª semana).

Critérios para avançar: bom controle do quadríceps,extensão completa, 90º flexão, sem sinais inflamatórios.

FASE II – PROTEÇÃO MODERADA (8 – 12 semanas)

Objetivos: Restaurar marcha normal, evitarsobrecarga sobre o enxerto (transplante), progredir nofortalecimento da extremidade, progredir na flexão (ADM).

Brace: descontínuo.Sustentação de peso: total, sem auxiliares, se a

marcha estiver normalizada.Limites para ADM: não.Tratamento: continuar com exercícios de elevação

do MI estendido, flexibilidade, exercícios aquáticos, bicicletaestacionária, exercícios em CCF – 0-60º flexão; exercíciosem CCA – 45-90º, treino de equilíbrio.

Critérios para evolução: marcha normal semacessórios, extensão completa, pelo menos 100º flexão, semqueixas patelofemorais.

FASE III – PROTEÇÃO MÍNIMA (3-9 meses)

Objetivos: evitar sobrecarga sobre o transplante,iniciar exercícios para isquiotibiais, progredir nofortalecimento, endurance, propriocepção, ADM.

Tratamento: manter o programa de flexibilidade,manter e avançar nas atividades em CCF, bicicletaestacionária, esteira, avançar no treino de equilíbrio, natação,corridas na água.

Critérios para evolução: força satisfatória, ADM,endurance, propriocepção para iniciação de progressãofuncional, sem queixas patelofemorais.

FASE IV – RETORNO ÀS ATIVIDADES (9 meses)

Objetivos: manter a força, endurance, propriocepção,retornar gradualmente às atividades, e modificá-las (senecessário).

Tratamento: fortalecimento, endurance, propriocepção,progressão funcional.

Retorno às atividades : aproximadamente um anopós-cirurgia.

Como Fritz et al.5 enfatizam em seu estudo, se a forçado quadríceps estiver comprometida, maior será o estressetransmitido aos meniscos. Para que seja determinado oprogresso de cinesioterapia, o edema e a dor do joelhoenvolvido devem ser constantemente avaliados, evitandosobrecargas.

RESULTADOS1. Goniometria: como padrão de normalidade,

utilizou-se o membro contralateral, que apresentou 138º deflexão e 0º de extensão.

Avaliação 3º mês 6º mês 9º mês 12º mêsExtensão 12º 2º 0º 0º 0ºFlexão 66º 125º 130º 138º 138º

Tabela 1. Resultados da goniometria.

2. Teste manual de força muscular: o membrocontralateral apresentou graduação 5, na mensuração daextensão e da flexão da perna.

Avaliação 3º mês 6º mês 9º mês 12º mêsm. extensores 3 4 5 5 5m. flexores 4 5 5 5 5

Tabela 2. Resultados do teste manual de força muscular.

3. Questionário funcional de Noyes modificado

1. Com relação à dor16 ( ) Tenho dor ocasional aos esportes vigorosos ou aotrabalho pesado. As limitações são leves e toleráveis.Intensidade: Moderada Freqüência: IntermitenteLocalização: Região anterior da perna (não no joelho)Tipo: Queimação

2. Com relação ao edema (inchaço):8 ( ) Tenho edema (inchaço) ocasional aos esforçosvigorosos ou trabalho pesado.

3. Com relação à estabilidade:20 ( ) Sinto firmeza no meu joelho, não sinto instabilidade

Rigidez: Não Crepitação (barulho): Leve Bloqueio: Não

4. Nível de atividade global:12 ( ) Atividades recreacionais leves são possíveis comraros sintomas. Sou limitado para o trabalho leve.Caminhar: 8 ( ) Problemas levesEscadas: 4 ( ) Problemas levesCorrer: 2 ( ) Problemas severos. Corro apenas poucos passos.

Saltando e girando: 5 ( ) Normal, sem limitações.Se tivesse que dar uma nota de 1 a 100 ao meu joelho,

sendo 100 o melhor, eu daria nota 90.

Como está o seu nível atual de atividade comparadocom antes da sua cirurgia?

e) Eu não me sinto capaz de retornar ao esporte ou trabalho,mas eu não tenho problemas nas atividades de vida diária.

Por que você limitou suas atividades?b) Eu diminuí meu nível de atividades para diminuir o

desgaste do meu joelho.

DISCUSSÃOTendo em vista ser este um estudo pioneiro na

literatura nacional, não foram encontrados dados a seremcomparados em periódicos ou livros clássicos da línguaportuguesa pesquisados pelos autores. A maioria daspesquisas apresentam resultados de transplantes isolados

Delazeri D. e cols. Reabilitação em Transplante Meniscal: Relato de Caso..

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ou associados a cirurgia de reconstrução ligamentar, compoucos dados a respeito da realização concomitante deprocedimentos de realinhamento, como a osteotomia. Veltri etal.6 (1994) indicam o transplante meniscal àqueles pacientesque apresentam dor, associados a alterações condrais precocesna articulação do joelho, idade inferior a 45 anos, joelho estável;havendo uma angulação tibial (varismo ou valgismo), estesautores não recomendam a osteotomia. Já autores comoCameron e Saha7 (1997) e Verdonk et al.8 (1998) recomendama correção mediante osteotomia proximal da tibia. O indivíduoselecionado para o transplante meniscal e participação noestudo, satisfez os seguintes critérios: jovem (até 45 anos deidade), com cirurgia prévia de meniscectomia, estabilidade naarticulação do joelho, dor e presença de lesão condral. O mesmoapresentava tíbia vara, por este motivo foi submetido a umaosteotomia valgizante tibial concomitantemente ao transplantemeniscal.

Quanto à sustentação de peso Fritz, Irrgang e Harner5

(1996), em estudo realizado, citam um tempo de 5-6 semanasde sustentação parcial ou não-sustentação de peso sobre aextremidade envolvida; Mejías et al.2 (2002) discorrem que acarga parcial de sustentação é autorizada entre a sexta e adécima semana, e depois completa. O autor recomendacomeçar com treino de marcha com carga com 45 dias de pós-operatório. Em função de o paciente ter sido submetido a umaosteotomia tibial concomitantemente ao transplante meniscal,o mesmo não foi liberado para a sustentação de peso mesmocom muletas. Isso só ocorreu após a 4ª semana pós-operatória,após comprovação radiológica e liberação médica. Ao términoda 4ª semana, o paciente começou a descarga parcial de pesono lado operado, com atividades realizadas no ambiente dapiscina. Os primeiros movimentos do treino de marcha fora daágua foram realizados com o auxílio de duas muletas eposteriormente nas barras paralelas.

Aproximadamente com 40 dias iniciou-se o treino demarcha com apenas uma muleta e logo a seguir, marcha semmuletas com sustentação de peso. Ainda durante este períodoforam iniciadas atividades mais complexas, como o treino narampa e nas escadas. Apesar de não ser um dos principaisobjetivos deste estudo, pôde-se confirmar, ao sétimo mês depós-operatório, que a morfologia macroscópica ofereceu umaspecto normal, com a integração do menisco à cápsula, quejá foi descrito por Arnoczcky, Warren e McDevitt9 (1990) , porMikic et al.10 (1997) e por Fritz, Irrgang e Harner5 (1996).

Mejías et al.2 (2002) relatam a importância de se ter aamplitude de movimento máxima e carga completa com 6 a 12meses de pós-operatório. Neste caso, já no 3º mês o pacienteapresentava flexão passiva de 125º e extensão 2º, forçamuscular grau 4 para extensores e grau 5 para flexores. No 6ºmês, a amplitude era total e a força máxima. Nesse estudo decaso, os resultados obtidos ao final do tratamento com relaçãoa amplitude de movimento (138º flexão e 0º de extensão) eforça muscular (grau 5 para quadríceps) foram plenamentesatisfatórios, acordando com o que a proposta inicial doprotocolo apresentava, que segundo Fritz, Irrgang e Harner5

(1996) seria de pelo menos 100º de flexão permitindo afuncionalidade. O fato de o sujeito do estudo apresentarpreviamente sinais de lesões condrais e ter sido submetido aoprocedimento de osteotomia, particulariza eventuais alterações

necessárias ao tratamento inicialmente proposto.Como já foi comentado, encontrou-se uma pequena

dificuldade em se conseguir uma extensão completa logo apóso transplante, fato explicado por Fritz, Irrgang e Harner5 (1996),que relatam a importância da restauração da extensãocompleta imediatamente após a cirurgia principalmente emtransplantes mediais, que freqüentemente envolvem a remoçãoe reinserção do ligamento oblíquo posterior e a porção profundado ligamento colateral medial. A perda da amplitude demovimento após a reconstrução tem sido correlacionada comos reparos dessas estruturas.

Mejías et al.2 (2002) preconiza a imobilização do joelhocom uma órtese articulada a 30º de flexão, e nas duas primeirassemanas a exercitar a flexão entre 30º e 60º. Até a sexta semana,30º e 90º de flexão, e nas seguintes seis semanas, entre 20º e120º .

Apesar do paciente ter iniciado o atendimento no 13ºdia de pós-operatório, ao final da 4ª semana a flexão de 90º jáhavia sido obtida, mesmo que de forma passiva, porém aextensão apresentava ainda um déficit de 10º, o que fez comque fossem enfatizadas as atividades de alongamento, para acadeia posterior dos membros inferiores. No terceiro mês deevolução, os objetivos foram parcialmente atingidos, com opaciente apresentando extensão completa, 120º de flexão, semqueixas de dor relacionadas à articulação patelofemural e umamarcha sem acessórios, porém ainda claudicante.

Fritz, Irrgang e Harner5 (1996) comentam que com oprogresso na reabilitação, atividades em cadeia cinéticafechada devem ser limitadas de 0º a 60º de flexão porque acarga transmitida aos meniscos aumenta bastante emangulações próximas à 90º. Neste estudo, no terceiro mês foramenfatizados os exercícios em cadeia cinética fechada até, nomáximo, 60º de flexão, evitando o aumento das forçascompressivas sobre a estrutura meniscal, especialmente sobreo corno posterior.

Os mesmos autores reafirmam que o treinamento depropriocepção deve ser enfatizado, pois os meniscos possuemmecanorreceptores e importantes funções proprioceptivas; asatisfação dos pacientes após cirurgia de joelho, como porexemplo a reconstrução do ligamento cruzado anterior, temsido correlacionado com a melhora de propriocepção.

Swanik et al.4 (1997) fundamentam que os protocolosde reabilitação deveriam incorporar atividades que busquem amelhora da condição muscular, encorajando adaptações dosaferentes periféricos, reflexos espinhais e padrões motorescorticais. A partir do terceiro mês a ênfase na fisioterapia foidada no sentido de melhorar as condições musculares atravésda progressão no fortalecimento em cadeia cinética aberta ena reeducação sensório-motora, com o uso progressivo emgrau de complexidade de materiais como giroplano, pranchasde Freeman e balancin.

Durante a entrevista final, realizada 12 meses apóso transplante, o paciente relatou ausência de dor no joelhooperado, referindo apenas desconforto à palpação profundana região da osteotomia.

A nota final dada pelo paciente em relação ao seujoelho um ano após o transplante é o melhor indicativo que osprocedimentos adotados puderam ser consideradossatisfatórios. Acredita-se que o resultado final pudesse ter sido

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ainda mais positivo, especialmente quanto à funcionalidade econdições de desempenhar as atividades de vida diária deforma mais proveitosa se o paciente tivesse se submetidoregularmente à fase final de reabilitação, conhecida como fasede retorno das atividades.

CONSIDERAÇÕES FINAISPara o desenvolvimento de diretrizes que guiem a

reabilitação pós operatória, fica evidente a necessidade decompreender a ciência básica das estruturas envolvidas. Deve-se, no entanto, individualizar os casos, baseando-seprincipalmente na evolução clínica para progredir no tratamento.

O propósito deste estudo foi o de apresentar, de maneiraabrangente, os princípios que devem nortear um procedimentode transplante meniscal, através da revisão literária sobre otema e apresentação dos resultados obtidos em um dos únicoscasos documentados no país.

Deve-se compreender que, os objetivos a longo prazopara este t ipo de procedimento, devem envolver

mecanismos que propiciem a redução ou minimização doprocesso degenerativo cartilaginoso. Novas cirurgiasprecisam ser realizadas, outros pesquisadores devem inferirsobre o tema, para que se possa traçar diretrizes maiseficazes.

Apesar do caso relatado, ser de difícil resolução,especialmente pela lesão condral prévia e necessidade daosteotomia, conclui-se que o resultado final tenha sidosatisfatório.

Atualmente, não existem soluções ideais para seremoferecidas ao paciente em situação semelhante. Intuitivamente,pode-se ser otimista, pois os resultados experimentais e clínicosa curto e médio prazo permitem esperanças.

Estamos hoje frente ao início de uma nova alternativaterapêutica, e é difícil estabelecer conclusões com os poucosresultados conhecidos. O avanço na pesquisa de biomateriais,na tecnologia e na técnica cirúrgica, e na reabilitação ortopédicarepresentam um futuro com mais possibilidades para casoscomplexos como o deste estudo.

Delazeri D. e cols. Reabilitação em Transplante Meniscal: Relato de Caso..

Summary

REHABILITATION FOLLOWING MENISCAL TRANSPLANTATION

The goal of is study was to revise the medical literature regarding to the main factorsthat involve a Meniscal Transplantation, as meniscal functions and lesions, previous treatmentsand guidelines that lead the rehabilitation in this case, and to evaluate the effectiveness ofthe rehabilitation protocol in this procedure, as proposed by the University of Pittsburg. Acase study is presented, basing on this protocol, whose evaluation was accomplished duringthe rehabilitation, throught the goniometry and the muscular force test applied protocolarlyin the beginning of the treatment, in the third, sixth, ninth and twelveth month of follow-up,and by the modified functional questionnaire of Noyes, just applied at the end of one year.In spite of, the case having its particularities, the obtained results coincide with results foundin the medical literature, with the muscular force and the movement normalized at the sixthmonth post transplant. The analysis of the questionnaire, answered by the patient, aimed ascore of 75 points, corresponding to a good “concept”, checking the effectiveness of theproposed protocol.

Keywords: Knee, Meniscal Transplantation, Allograft, Rehabilitation.

REFERÊNCIAS1. Miller M, Cooper D, Warner J. Review of sports medicine

and artroscopy. Philadelphia:W.B.Saunders Company,1995.

2. Mejias A. et al. Trasplante meniscal com aloinjerto: estadoactual. Revista de Ortopedia y Traumatologia. 2002;46(6):551-560. Disponível em http://db.doyma.es/cgi-bin/wdbcgi.exe/doyma/mrevista. Acesso em 15/10/03.

3. FU FH, Harner CD, Vince KG. Knee Surgery. v.1.Baltimore: Williams & Wilkins, 1994.

4. Swanik CB. et al. Restablishing proprioception andneuromuscular control in the ACL injured athlete.Journal of Sports Rehabilitation 1997;6(2):47.

5. Fritzl JM, Irrgagan JJ, Hrneer CD. Rehabilitation followingallograft meniscal transplantation: a review of theliterature and case study. The Journal of Orthopaedic& Sports Physical Therapy 1996;24(2):98-106.

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Ação da Fonoforese Associada à EnzimaHialuronidase no Tratamento de Cicatrizes

Inestéticas Tardias Provocadas por Queimadurasde Terceiro Grau

Emanuele Mesquita, Cristiane Vicenzi, Sílvia Lorenzini.Curso de Fisioterapia, Universidade de Passo Fundo(RS).

Resumo

Neste estudo observou-se o efeito da fonoforese, com a aplicação transcutânea da enzimahialuronidase em cicatrizes inestéticas tardias provocadas por queimaduras de terceirograu. Esta enzima tem a propriedade de despolimerizar o ácido hialurônico, reduzindo aviscosidade do meio intercelular e aumentar a permeabilidade das membranas celulares evasos sangüíneos. Empregou-se o ultra-som terapêutico da marca KLD®, modelo Avatar III,freqüência de 3MHz, intensidade de 0,8 W/cm² com emissão contínua, 1 minuto por Área deEfetiva Radiação. O agente de acoplamento na forma de gel a base de hialuronidase auma concentração de 10.000 UTR. O total de aplicações somou dez procedimentos. Foramanalisadas macroscopicamente as cicatrizes de um sujeito antes e após a aplicação dotratamento através de imagens fotográficas, medidas da largura e comprimento,paquimetria e estesiometria com monofilamentos de Semmes-Weinstein. Observou-se que ahialuronidase associada ao ultra-som melhorou o aspecto das cicatrizes inestéticas, no quese refere ao tamanho, coloração e sensibilidade das regiões afetadas.

Unitermos: Cicatrizes, queimaduras, fonoforese, hialuronidase.

Um distúrbio Dermato-funcional que causapreocupações a quem as possui são as cicatrizesdecorrentes de queimaduras. A queimadura promovealterações locais e sistêmicas, com grandes variações doprocesso de reparação, as quais dependem da precocidadeda intervenção terapêutica. Sendo que a abordagemfisioterapêutica, com técnicas específicas podem tratar asseqüelas locais, neste caso as cicatrizes inestéticas1.

O conceito de queimadura é bastante amplo, porém aqueimadura é uma lesão dos tecidos orgânicos emdecorrência de traumas de origem térmica. Podendo variardesde uma pequena bolha ou flictema, até formas maisgraves capazes de desencadear respostas sistêmicas1.

A classificação quanto à profundidade da queimaduraé observada em graus (I, II,III, IV). As queimaduras de primeirograu restringem-se a epiderme, são superficiais e nãoapresentam alterações hemodinâmicas ou clínicasimportantes. As de segundo grau atingem a epiderme e parteda derme, apresentam bolhas ou flictemas. As de terceirograu são consideradas graves, pois atingem toda a epiderme,derme, podendo em muitos casos, lesar a tela subcutânea,tecido muscular e ósseo. A cicatrização é demorada e deixa

seqüelas, sendo necessário, muitas vezes enxertia de pele.A queimadura de quarto grau,é a queimadura elétrica, queenvolve a destruição completa de todos os tecidos. Oprognóstico, nesse caso, é incerto, sendo necessária umaextensa excisão cirúrgica ou, até mesmo, amputação1.

As lesões decorrentes de queimaduras muitas vezesresultam em cicatrizes inestéticas como as hipertróficas e osquelóides. Estes constituem um problema estéticosignificativo e são de tratamento problemático. Caracterizam-se por uma síntese de colágeno preponderante, sendo queas fibras colágenas não se orientam como nas cicatrizesnormais, ao longo das linhas da fenda, mas sim em espiralprojetando-se sobre a superfície cutânea1.

Pode-se diferenciar o quelóide como sendo umacicatriz larga e firme que ultrapassa os limites da lesão e acicatriz hipertrófica como sendo de aparência vermelha,saliente e de textura firme, permanecendo dentro dos limitesda ferida original2.

Geralmente pode-se confundir a cicatriz hipertróficacom a formação do quelóide, uma vez que ambasapresentam deposição excessiva de tecido conjuntivo densoem cicatriz cutânea, adquirindo um volume excessivo, assim

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como o similar aspecto microscópico – fibras irregulares decolágeno, feixes distribuídos ao acaso e excesso defibroblastos. A cicatrização hipertrófica difere-se do quelóide,uma vez que este se apresenta como uma proliferaçãofibrosa pós-traumática ou conseqüência de reparação viciosade queimaduras, com hiperplasia regenerativa, além deformar tumorações em área de cicatrização, normalmentenão apresenta regressão. Enquanto que, na cicatrizhipertrófica o quadro tende a ser reversível. Avaliandoaspectos genéticos, observa-se uma maior incidência emindivíduos da raça negra3.

A fonoforese é um termo que descreve a habilidadedo ultra-som em incrementar a penetração de agentesfarmacologicamente ativos através da pele, tratando-se deuma alternativa de transporte de substâncias com princípiosativos através da pele1.

O aquecimento provocado pelo ultra-som aumenta aenergia cinética das moléculas do fármaco e da membranacelular, dilata os pontos de entrada dos folículos pilosos eglândulas sudoríparas e aumenta a circulação da áreairradiada. A cavitação é uma propriedade mecânica que podealterar o transporte de fármacos, através do estressemecânico, elevação da temperatura ou aumento dareatividade química que ocasiona4.

De acordo com Pretince5, a fonoforese é uma técnicaque melhora o fornecimento de medicação específica aostecidos. Talvez a maior vantagem da fonoforese seja fornecermedicamento por meio de uma técnica segura, indolor enão-invasiva. O transporte ativo é fruto de mecanismostérmicos e não térmicos que juntos aumentam apermeabilidade do extrato córneo. Diferente da iontoforese,a fonoforese conduz moléculas inteiras para os tecidos emvez de íons. Conseqüentemente não é propensa a causardano ou queimadura à pele. Do mesmo modo, aprofundidade potencial de penetração com a fonoforese émaior do que com a iontoforese.

Goodman e Gilman6 descrevem a fonoforese comosendo uma técnica que oferece a vantagem de levar agentesfarmacológicos para estruturas profundas, de uma maneirasegura, indolor e minimizando a probabilidade de efeitoscolaterais.

Na dermatologia a fonoforese é util izadaprincipalmente com enzimas de difusão. As enzimas sãoutilizadas como agente terapêutico específico em afecçõescaracterizadas por hiperpolimerização ou como auxiliarterapêutico na forma liofilizada para favorecer a difusão dassubstâncias. Entretanto estudos apontam os efeitosdeletérios da utilização de enzimas associadas ao ultra-som.O medicamento pode causar reações adversas como perdade potássio (em doses elevadas), reações alérgicas e oaparecimento de equimoses1 .

Desde 1929, quando o fator de difusão foi descoberto,as propriedades da hialuronidase têm sido estudadas,Duran7. Segundo Meyer7, foi identificada como enzimamucolítica, que despolimeriza e hidroliza o ácido hialurônico,polissacarídeo essencial do tecido conjuntivo.

A hialuronidase é uma enzima, geralmente extraídade testículo bovino, capaz de modificar o tecido conjuntivomediante a hidrólise do ácido hialurônico. Sua ação diminui

a viscosidade do cimento intercelular e promove a difusãodos líquidos injetados ou dos exudatos e transudatoslocalizados, o qual facilita a absorção. É antigênica, razãopela qual pode levar ao desenvolvimento de anticorpos. Otempo transcorrido até o restabelecimento da permeabilidadeoriginal do tecido é proporcional à quantidade de enzimaadministrada, embora em doses clínicas, geralmente érestabelecida em 48 horas. Esta enzima está contra-indicadaem indivíduos que apresentem hipersensibil idade ahialuronidase, devendo-se realizar um teste de sensibilidadeprévio. Também não deve ser utilizada nas proximidades deuma área infectada, nem perto de tecidos cancerososcomprovados ou suspeitos. Como precaução, por nãoexistirem ensaios comprovados, recomenda-se não utilizarem mulheres grávidas, a menos que o benefício para a mãesupere o risco potencial para o feto. A lactação deve sersuspensa8.

Esta enzima tem a capacidade de disseminar exudatose transudatos, facilitando sua absorção e tornar o tecidomenos viscoso, por desdobrar o ácido hialurônico(componente principal da substância intersticial) produzindoN-acetilglucosamina e ácido glucurônico, substâncias maishidrosolúveis9.

Utilizou-se a hialuronidase, enzima que segundoGuirro e Guirro1, está presente no interstício e estáencarregada de manter o equilíbrio hídrico, com a finalidadede assegurar uma absorção normal da substânciafundamental amorfa através de todo o tecido conjuntivo.Despolimerizando o ácido hialurônico, essa enzima reduz aviscosidade do meio intercelular tornando-o mais permeávele promovendo a reabsorção do excesso de fluídos,mobilizando edemas e infiltrados no tecido conjuntivo.

Dentre as ações da energia ultra-sônica na cicatrizinestética, encontram-se algumas que estão vinculadas aosseus efeitos fisiológicos associados à sua capacidade deveiculação de substâncias através da pele (fonoforese).Dentre outros efeitos, pode-se destacar a neovascularizaçãocom conseqüente aumento da circulação, rearranjo eaumento da extensibilidade das fibras colágenas, e melhoradas propriedades mecânicas do tecido1.

Cornbleet 10 observou que a infi ltração dehialuronidase causava certo amolecimento e diminuição dascicatrizes inestéticas. Nikolowski11 observou resultadosfavoráveis em cicatrizes inestéticas, injetando nelashialuronidase ou corticosteróides. Recomendou ainda airradiação posterior à ressecção, e outras medidasterapêuticas como o ultra-som.

O mesmo autor observou que infiltração com ahialuronidase, na proporção de 20.000 UTR, causava certoamolecimento e diminuição, mesmo em quelóides velhos eduros. A infiltração intralesional com seringa e agulhaapresentava, porém uma série de inconvenientes. Sobretudo,nos quelóides mais velhos, a droga penetrava comdificuldade no tecido denso, a injeção era dolorosa econseguia pouca penetração.

Summer1 postula que o uso do ultra-som para tratarou “amolecer” cicatrizes é uma terapia física clássica habitual.Os trabalhos de Bierman1 sugerem somente a possibilidadede “amolecimento” do tecido cicatricial por meio do ultra-

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som. Entretanto outros autores afirmam que este recurso podeparticipar da mobilização de cicatrizes aderentes.

RELATO DE CASOA amostra foi extraída de uma população constituída

por sujeitos portadores de cicatrizes decorrentes dequeimaduras que se encontravam em tratamento ambulatorialjunto ao Laboratório de Fisioterapia da Universidade dePasso Fundo(RS), durante o período de agosto a setembrode 2005.

O estudo teve como critério de inclusão aapresentação de cicatrizes inestéticas tardias (mais de 2 anosde lesão), decorrentes de queimaduras de 3º grau.

Como critério de exclusão: que tivesse sido submetidoa enxertos, que tivessem reação alérgica à enzima. Apopulação contou com a participação de três indivíduos.

Durante o processo de seleção da amostra, somenteum dos sujeitos atendeu os critérios. Este sujeito era do sexofeminino, cor branca, com 13 anos de idade, portadora decicatrizes inestéticas provocadas por queimadura de terceirograu, causadas por agente térmico, localizadas na regiãoanterior do tórax e subescapular do lado esquerdo. As lesõesocorreram há 8 anos. Os quelóides apresentavam-seconsistentes e, freqüentemente, o sujeito queixava-se deprurido. Não houve enxertia no local e o sujeito nãoapresentou hipersensibilidade a hialuronidase quandosubmetido ao teste prévio de sensibilidade à enzima.

Este trabalho foi submetido à análise pelo Comitê deÉtica da Universidade de Passo Fundo e aprovado semrestrições. O sujeito que participou da pesquisa autorizousua participação no experimento através do termo deconsentimento livre e esclarecido.

O sujeito foi submetido ao teste de sensibilidade coma enzima hialuronidase em forma de gel a fim de garantir oexperimento. O gel foi aplicado na região poplítea da pernaesquerda, dois dias antes de iniciar o tratamento, nãoapresentado reação alérgica à enzima.

O experimento utilizando a fonoforese teve comoobjetivo avaliar a resposta tecidual das cicatrizes inestéticasdecorrentes de queimaduras.

A aplicação da fonoforese com a enzimahialuronidase, foi iniciada após o preenchimento de ficha deavaliação elaborada para o estudo. Nas regiões com ascicatrizes inestéticas utilizou-se aparelho de Ultra-som,modelo Avatar III, marca KLD®, com freqüência 3MHz,intensidade 0,8 W/cm² e emissão contínua, em dez sessões.

A aplicação do Ultra-som foi através da técnica direta,empregando o transdutor com movimentos no sentido circulare longitudinal, em toda a extensão das cicatrizes. Comoagente de acoplamento, foi empregado gel comhialuronidase, 10.000 UTR (Unidades Redutoras deTurbidez). Esta concentração foi determinada porfarmacêutico responsável técnico de uma farmácia demanipulação local. Foi delimitado 1 minuto por Área deEfetiva Radiação (ERA), totalizando 15 minutos de aplicaçãoem cada sessão.

Realizou-se o preenchimento da ficha de avaliação,a qual serviu para coleta de dados como identificação dosujeito, o local da cicatriz, a data da lesão, a fase em que se

encontrava o processo cicatricial, o tipo de cicatriz, acoloração, o tamanho e a avaliação da sensibilidade cutânea.Também, foram realizadas mensurações da largura ecomprimento da cicatriz com fita métrica, espessura compaquímetro, teste de sensibilidade com estesiômetro.

A técnica para mensuração da sensibilidade foireal izada pressionando o monof i lamento de nyloncontra a superfície da cicatriz até atingir força suficientepara curvá-lo. O contato entre o filamento e a cicatriz foifeito lentamente, e mantido durante aproximadamentedois segundos. O teste foi iniciado com o monofilamentomais fino (verde). Evitando que o local do teste fosseobservado pelo sujeito, solicitou-se ao mesmo pararesponder “sim” quando sentisse o toque do filamento.A ausência de resposta significava a insensibilidade aomonofilamento, prosseguindo-se o teste com outro maisespesso e assim sucessivamente até a manifestaçãoda sensibilidade. Os filamentos foram aplicados até trêsvezes em cada local, sendo que uma única respostapositiva foi suficiente para confirmar sensibilidade nonível indicado.

As mensurações foram realizadas com fita métrica,marca Corrente, onde se obteve o comprimento, utilizandocomo parâmetro as extremidades das cicatrizes. Para alargura, utilizou-se como referência a região de maiorextensão. Essas medidas foram realizadas antes da primeirae após o final da décima sessão.

Na análise paquimétrica mediu-se a espessura dacicatriz, tendo como parâmetro o ponto central entre umaextremidade e outra da cicatriz. As mensurações foram feitascom o pinçamento dos pontos delimitados nas cicatrizes,evitando-se causar dor ao sujeito. O paquímetro utilizado foida marca Vonder, confeccionado em plástico, comcapacidade para medir até 15cm de distância.

A análise dos resultados foi feita comparativamenteantes da primeira aplicação do tratamento e após a décima,onde obtivemos a avaliação da sensibilidade, do tamanho eda espessura das cicatrizes. Seguem os quadros quedemonstram a avaliação pré e pós-tratamento.

Quanto à avaliação da sensibilidade com estesiômetro(Tabela 1) observamos que as cicatrizes 1 e 3, no pré-tratamento, apresentavam perda da sensibilidade protetorae incapacidade para discriminar quente e frio. Nestascicatrizes, houve percepção ao monofilamento de cor laranja,o qual equivale a uma pressão de 10,0g. No pós-tratamentohouve percepção ao estímulo com o monofilamento de corvioleta, que equivale a uma pressão menor, ou seja, de 2,0g,esta percepção corresponde à sensibilidade fina.

Já na Cicatriz 2, antes de efetuar o tratamento, amesma apresentava percepção da sensibilidade somente

Pré-tratamento Pós-tratamentoCicatriz 1 10,0g - monofilamento laranja 2,0g monofilamento violeta

Cicatriz 2 2,0g - monofilamento violeta 0,2g monofilamento azul

Cicatriz 3 10,0g - monofilamento laranja 2,0g monofilamento violeta

Tabela 1. Avaliação da sensibilidade das cicatrizes testadas comestesiômetro (monofilamentos de Semmes-Weinstein) no Pré ePós-tratamento.

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com o monofilamento violeta (2,0g) e também dificuldadepara discriminar a forma e temperatura. No pós-tratamento,houve aumento da percepção sensitiva, pois foi referido como monofilamento de cor azul, o qual corresponde a 0,2g,Esta percepção corresponde à sensibilidade fina.

Através da análise dos resultados da sensibilidade,evidenciamos melhora da sensibilidade cutânea nas áreassubmetidas ao tratamento, uma vez que na cicatriz 1 e 3,antes do tratamento, não apresentavam sensibilidadeprotetora, e após a décima sessão passaram a apresentarsomente uma diminuição da sensibilidade. Já na cicatriz 2,antes do tratamento, a sensibilidade protetora apresentava-se diminuída, sendo que após o tratamento, passou a terapenas uma dificuldade na discriminação de texturas(sensibilidade fina).

Conforme relato do sujeito, observamos umaconsiderável diminuição do prurido nas cicatrizes. De acordocom Guirro e Guirro1, os quelóides apresentam alteração desensibilidade e muitas vezes prurido e sensação deferroadas), sendo esta diminuída após as dez sessões detratamento.

A seguir seguem os quadros comparativos dasmensurações realizadas no pré e pós-tratamento.

Consideramos a espessura como processoqueloideano, que segundo Guirro e Guirro1, são cicatrizesespessas e de tratamento problemático. Como não houvediminuição(provavelmente haveria necessidade de aumentara dosagem do Ultra-som bem como o número de sessões).

Os resultados após o uso do Ultra-som associado ahialuronidase demonstraram que houve redução da áreadas cicatrizes provocadas por queimaduras de terceiro grau.Mesmo que esta redução não tenha sido total, pode-seconsiderar como um fator positivo em termos estéticos.

Alguns estudos também demonstraram a eficácia douso da hialuronidase, onde destacamos Cornbleet10 queutilizou injeção local com hialuronidase em quelóidesantigos e duros. Guirro e Guirro1 demonstraram que aiontoforese com hialuronidase causava diminuição daconsistência do quelóide por desagregarem os componentes

da substância fundamental e Nikolowski11 que observouresultados favoráveis em cicatrizes inestéticas, injetandonelas hialuronidase ou corticosteróides sugerindo tambéma terapia com Ultra-som.

Entretanto, alguns estudos contradizem os efeitos doultra-som em cicatrizes. Bierman1 sugere que o ultra-somapenas causa “amolecimento” do tecido cicatricial. Wright1

não observou melhora no aspecto das cicatrizesqueloideanas, quando tratadas com ultra-som. Ainda, Chorilliet al.¹², realizaram estudo histoquímico e análise morfométricae histopatológica de fragmentos de pele de suínos, utilizandoa hialuronidase associada ao gel na proporção de 10.000UTR, com Ultra-som no modo contínuo, de 3MHz eintensidade 0,2 W/cm² onde não constatou-se a permeaçãocutânea da hialuronidase.

Em nossa revisão de literatura não encontramosreferencial teórico-científico que relacionasse a fonoforesecom hialuronidase em quelóides. Existem inúmeras dúvidasquanto à etiologia, o diagnóstico diferencial e o corretomanejo dos quelóides, de acordo com Wolwacz et al.¹³, estefato deve-se a impossibilidade de reproduzir quelóides emanimais, que acometem exclusivamente a raça humana.

À palpação todas as cicatrizes mostraram-se menosconsistentes, e segundo informações do sujeito, o pruridodiminuiu consideravelmente.

Neste estudo, o Ultra-som utilizado foi de freqüência3MHz, e intensidade 0,8 W/cm², com emissão contínua, umavez que, de acordo com Guirro e Guirro1 e Agne14, asfreqüências maiores são preferencialmente utilizadas parao tratamento de tecidos superficiais.

Na fonoforese, os efeitos do Ultra-som são somadosao princípio ativo da droga. Neste estudo a técnica foiutilizada por não causar dano ou queimadura, como foisugerido por Pretince5 e por ser uma maneira segura, indolore que minimiza a possibilidade de efeitos colaterais,conforme descrito por Goodman e Gilman6.

CONCLUSÃOAs cicatrizes hipertróficas e os quelóides constituem

um sério problema estético e funcional e são de tratamentoproblemático. Apesar das várias modalidades, o tratamentonesses casos ainda é um desafio, pois os quelóides somenteocorrem na raça humana impossibilitando sua reprodução etratamento em animais o que permitiria maior controle dosresultados.

Concluímos que este procedimento mostrou-seseguro, eficiente e indolor, na terapêutica dos quelóides, poisobservamos melhora na sensibilidade, diminuição docomprimento e da largura, bem como a atenuação do pruridorelatado inicialmente.

Porém, através da paquimetria, não foi constatadadiminuição da espessura. Os resultados apresentados nosremetem à execução de novos estudos, com modificação dametodologia, como, por exemplo, aumento da dose do Ultra-som e/ou do número de sessões, caso os agentespermaneçam os mesmos.

Assim, desejamos que os achados obtidos eapresentados neste estudo, não sejam únicos, mas quesirvam para novas e mais detalhadas pesquisas.

Pré-tratamento Pós-tratamentoCicatriz 1 7,5 cm 7,5 cm

Cicatriz 2 9,4 cm 9,0 cm

Cicatriz 3 12,5 cm 12,3 cm

Tabela 2. Medida do comprimento das cicatrizes no Pré e Pós-tratamento.

Pré-tratamento Pós-tratamentoCicatriz 1 0,6 cm 0,6 cm

Cicatriz 2 0,2 cm 0,2 cm

Cicatriz 3 0,4 cm 0,4 cm

Quadro 4. Paquimetria realizada no Pré e Pós-tratamento.

Pré-tratamento Pós-tratamentoCicatriz 1 2,1 cm 1,9 cm

Cicatriz 2 1,9 cm 1,5 cm

Cicatriz 3 2,6 cm 2,5 cm

Tabela 3. Medida da largura das cicatrizes no Pré e Pós-tratamento.

Mesquita E & cols. Ação da Fonoforese Associada à Enzima Hialuronidase no Tratamento de Cicatrizes Inestéticas Tarduas...

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–86– REV MÉDICA HSVP 2005; 17(37):

Summary

ACTION OF PHONOPHORESIS ASSOCIATE TO HYALURONIDASE INDELAYED UNESTHETIC SCARS PROVOKED BY THIRD DEGREE BURNS.

In this study, the effect of phonophoresis was observed, with transcutaneous applicationof the enzyme Hyaluronidase in delayed unesthetic scars provoked by third degree burns.This enzyme has the property of unpolymerize the hyaluronic acid, reducing the viscosity ofthe intercellular way and to increase sanguine permeability of the cellular membranes andvessels. The Therapeutical KLD® Ultrasound, model Avatar III was used, in the frequency of3 MHz, intensity of 0,8 W/cm² in continuous emission, 1 minute for Effective Radiating Area.The coupling agent in gel form based of hyaluronidase in a concentration of 10.000 UTR. Thetotal of applications added ten procedures. The scars of an individual had been analyzedmacroscopicaly before and after the application of treatment through photographic images,measures the width and length, paquimetry and sensitometry with monofilaments of Semmes-Weinstein. It was observed that hyaluronidase associated to Ultrasound improved the aspectof the unesthetic scars, as for size, color and sensitivity of the affected regions.

Keywords: Scars, Burnings, Phonophoresis, Hyaluronidase.

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