relaÇÃo das crianÇas urbanas com a...
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Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
Coordenação de Capacitação
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PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DO INPA
RELATÓRIO FINAL
RELAÇÃO DAS CRIANÇAS URBANAS COM A NATUREZA
BOLSISTA: Priscilla Eduarda Cruz de Almeida
ORIENTADORA: Maria Inês Gasparetto Higuchi
COLABORADORA: Damaris Teixeira Paz
Relatório Final apresentado ao Instituto Nacional
de Pesquisas da Amazônia, como requisito para a
conclusão como participante do Programa de
Iniciação Científica do INPA.
Manaus – Amazonas
2020
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Almeida, P.E.C.; Higuchi, M.I.G.; Paz, D.T. Relação das crianças com a natureza. Relatório do
PIBIC/CNPq. INPA: Manaus, 2020.
Resumo: A vida nas cidades tem afastado as pessoas do contato com o mundo natural, afetando com mais
intensidade a nova geração. A infância é um período muito importante para o desenvolvimento da conexão com
a natureza (CN), pois a afetividade construída nessa fase se estende por toda a vida e proporciona bem-estar
psicológico. Além disso, vários estudos comprovam os benefícios de restauração cognitiva e da atenção que a
natureza oferece. A conexão afetiva e cognitiva com a natureza serve ainda de base para as atitudes e
comportamentos pró-ambientais, do mesmo modo que a ausência de natureza na vida das pessoas as torna menos
sensíveis às necessidades de proteção dos ambientes naturais. Por isso, para propor iniciativas que incentivem
o cuidado ambiental pode se iniciar com práticas que possibilitam essa aproximação e conectividade com a
natureza. Muitos estudos foram direcionados ao entendimento desse constructo entre adultos e os resultados
apontaram para o papel vital que as experiências positivas com e na natureza (trilhas, acampamento,
caminhadas, passeios etc.), tiveram durante a infância na orientação e envolvimento em atividades sócio
ambientais. Esta pesquisa objetiva analisar a produção científica sobre as relações de conexão com a natureza
em crianças no Brasil e de maneira mais específica identificar o perfil da produção científica sobre a relação da
criança-natureza, bem como caracterizar a relação das crianças com a natureza. Foi realizada a partir da
abordagem bibliográfica, utilizando como base de dados duas plataformas base Capes e Google Scholar, onde
14 pesquisas atendiam a critérios de inclusão. A partir da análise de conteúdo constatou-se que os textos se
resumiam em dois eixos temáticos: a) estudos que investigam benefícios psicológicos advindos da relação da
criança com a natureza e elementos naturais, e b) estudos que investigam a interação criança-natureza em
contexto escolar. Observou-se que o contato com ambientes naturais no contexto urbano é mais difícil para as
crianças, seja no contexto familiar ou escolar, tendo em vista os poucos espaços acessíveis, as dificuldades de
deslocamento e a violência urbana que impede vivências completas nesses ambientes naturais. Por fim concebe
que integrar a natureza no convívio diário da criança reflete em inúmeros benefícios e na construção de um
maior apresso e afeto pela natureza como maior cuidado com os animais e plantas, assim como aguça a
curiosidade acerca do meio ambiente e suas formas de vida. Entretanto, os benefícios são reconhecidos por seus
cuidadores e órgãos educacionais, que demonstram maior inclinação para práticas voltadas para o convívio da
criança com a natureza, porém a melhor conveniência em vantagens que circundam em retornos em prol do
indivíduo, do que para a própria natureza.
Palavras Chave: Conexão com a natureza; Criança; Revisão Sistemática.
Subárea: Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
Financiamento: CNPq
Data: 28/07/2020
______________________________ ___________________________
Orientadora Bolsista
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INTRODUÇÃO
Conexão com a Natureza (CN) é um termo utilizado pela Psicologia Ambiental como uma
relação construída a partir da afetividade da pessoa com o mundo natural (Schultz 2004). A CN pode
ser compreendida a partir de três dimensões: cognitiva, afetiva e comportamental (Nisbet e Zelenski
2013). Essa forma de vínculo é edificada através da interação e conforme o se envolve emocionalmente
com a natureza. Nesse sentido, CN é definida como a forma que o indivíduo estabelece uma relação
com o mundo natural, criando vínculo que é capaz de interferir de maneira significativa em seu
comportamento ao longo da vida.
Essa interação é vital não apenas para os adultos, mas principalmente para as crianças. Quanto
maior for o nível de interação da criança com a natureza, maior será a possibilidade desse
relacionamento se estender à vida adulta e desenvolver práticas sustentáveis. A CN não acompanha
apenas benefícios em prol do meio ambiente, mas para o próprio indivíduo. Uma criança que possui
interação com a natureza possui melhor bem-estar físico e mental, favorece suas interações sociais,
desenvolve habilidades físicas e motoras, bem como a criatividade e autonomia (Zacarias 2018). As
vantagens dessa interação podem proporcionar inúmeros benefícios e maior bem-estar, e seu
distanciamento também pode ser sentido na mesma proporção.
No processo de construção do mundo globalizado, a maneira de viver nas cidades influencia no
crescente processo de afastamento do ser humano do contato com a natureza. O crescimento
desordenado das cidades diminuiu espaços de interação com a natureza e aumenta problemas como a
ausência de segurança e mobilidade que afastam as crianças da natureza. Sabe-se que experiências
com a natureza geram memórias que impactam de maneira significativa no desenvolvimento da CN.
Crianças criadas em ambiente predominantemente urbano que possuem pouco convívio com a
natureza, com contato restrito a praças e parques, podem vir a nunca desenvolver de maneira integral
uma relação com o meio ambiente (Chawla 2015).
Esse distanciamento tem alterado também a forma com que as crianças compreendem e se
relacionam com a natureza, não se sentindo parte, mas alheios ao meio ambiente. Questiona-se,
portanto, se as crianças que vivem em grandes cidades estão tendo experiências para se beneficiar de
todos os aspectos que a conexão com a natureza oferece. Podemos estar negligenciando tais vivências,
não mais adentrando a natureza e não buscando convívio com ela deixando de apresentá-la às crianças.
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A princípio este estudo foi idealizado como pesquisa de campo de caráter exploratório, para
ser aplicado em escolas da cidade de Manaus-AM, no entanto, dado ao fato da atual pandemia mundial
pelo Covid-19 foi necessário alterar a pesquisa para uma análise bibliográfica e verificar como esse
tema tem sido abordado no Brasil.
OBJETIVOS
Objetivo Geral
Analisar a produção científica sobre as relações de conexão com a natureza em crianças no Brasil.
Objetivos Específicos
Identificar o perfil da produção científica sobre a relação da criança-natureza no Brasil;
Identificar os locais de produção desses estudos.
REFERENCIAL TEÓRICO
Para compreensão dos temas abordados neste estudo será explanado de maneira mais profunda
temas como: O ser da criança, o que define o ser criança, o que se entende por natureza e o que seria
considerado conexão com a natureza, esses aspectos teóricos vêm sendo discutidos por uma vasta
literatura, mas não são consensuais. No entanto, nesse estudo é importante trazer as diferentes
perspectivas para discutir importância da conexão entre criança e natureza, tanto os benefícios que
essa aproximação proporciona quanto os prejuízos do distanciamento.
CRIANÇAS E A NATUREZA
O conceito de criança foi criado na metade do século 20 e essa separação do ser adulto foi de
grande importância para criação de leis que resguardam a criança como indivíduo de direitos. Por se
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tratar de uma notoriedade recente, há de se perceber um tardio valor a criança como sujeito detentor
de ideias e que compreende o mundo ao seu redor atribuindo-lhe sentido e valor. No entanto, há
distinção entre as concepções de infância e criança. Por infância se entende como uma fase de
desenvolvimento da vida e criança como o sujeito social, histórico e cultural (Heywood 2004). É
essencial demarcar essa separação no presente estudo, o qual tratará de comentar a criança como
atuante em seu meio e fruto do seu ambiente. Segundo Rosemberg (2010) há uma nova perspectiva
quanto à compreensão da criança, como sujeito autônomo, embora com moderações de aspectos físicos
e até mesmo cognitivo, é um indivíduo de direitos e potencialmente participante. Pensar na criança
nessa perspectiva é vê-la como indivíduo biopsicossocial e compreendê-la em sua totalidade.
Conforme o estatuto da criança e adolescente (ECA) Art. 4º (Lei n.8.069, de julho de 1990) “É
dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida [...]” são inúmeras as obrigações do Estado e
da família para com a criança para resguardar seu bem-estar e formação, garantindo-lhe educação,
moradia, alimentação, entre outros direitos básicos. Com propósito de formar um cidadão em
desenvolvimento de maneira sadia, pais, escola e sociedade devem somar um meio propício para
auxiliar no crescimento saudável da criança.
Se o meio de convívio da criança é fator crucial na sua formação, e é no período da infância
em que as experiências vivenciadas ditam futuras predileções, introduzi-la a experiências com a
natureza nesta fase é estritamente indispensável. Considera-se que o meio exerce forte influência sobre
a formação da criança (Chawla et al. 2007). A experiência espontânea ou mediada é uma das formas
mais poderosas de aprendizado, além de gerar memórias e um desenvolvimento saudável . Integrar as
crianças à natureza, por sua vez, é um dos primeiros passos para criar adultos com engajamento de
valores ambientais (Christensen 2014). A criança que vive em ambientes que encorajam o convívio
com o mundo natural, está mais propícia a enraizarem esse elo construído na primeira infância,
podendo perdurar até a idade adulta. Essas experiências vivenciadas são um dos fatores cruciais que
desencadeiam engajamento pró-ambiental quando adultos (Christensen 2014).
Não há muitos estudos que falam das atitudes ambientais das crianças, mas há mais trabalhos
sobre a compreensão da criança quanto à natureza (Evans et al. 2007). Porém, sabe-se que as atitudes
ambientais que são formadas pelas crianças são, em grande parte, frutos de suas vivências com a
natureza.
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A CN é com suas bases afetivas, cognitivas e experienciais serve para a formação atitudes e
comportamentos pró-ambientais. Esses comportamentos podem ser definidos como aqueles que não
agridem o meio ambiente e se baseiam na utilização dos recursos de maneira sustentável, como
reciclar, realizar descartes de maneira correta, entre outros comportamentos em prol da
sustentabilidade (Chawla 2006). Contudo, a ausência dessa conexão na vida das pessoas as torna
menos sensíveis às necessidades de proteção dos ambientes e recursos naturais. Muitos estudos foram
direcionados para compreensão da relação dos adultos com a natureza, refletindo que em sua maioria
as pessoas que possuíam uma maior interação com o mundo natural, quando crianças, mantinham
maior envolvimento em atividades socioambientais em sua vida adulta (Chawla 2006; Wells e Evans
2003).
CONEXÃO COM A NATUREZA
Conexão com a Natureza é um constructo psicológico ainda em construção, e por isso há várias
definições. Segundo Schultz (2004), CN) é o vínculo entre pessoa e a natureza, de forma individual e
de aspecto psicológico. Geng et al. (2015), a definem como a ligação que há entre ser humano e o
mundo natural, ligação essa não apenas emocional, mas também de origem cognitiva. É a relação entre
pessoa e meio ambiente, que se constrói a partir da interação com ele, formando uma conexão através
da afetividade, assim como a interação social é de alta valia para o indivíduo, inteirar-se com a natureza
é essencial ao ser humano.
A CN, por ser um constructo singular, varia de pessoa para pessoa, construindo-se conforme
as experiências individuais e na medida em que se relacionam com a natureza essa relação tende a se
desenvolver (Schultz et al. 2004). A maneira como as pessoas se conectam com a natureza está
diretamente relacionadas à construção histórica e social desse indivíduo, as normas sociais influenciam
na maneira como agem e pensam a respeito (Higuchi et al. 2015).
Estudos demonstram que a CN contribui para formação de comportamentos em prol do meio
ambiente, a afetividade construída a partir da CN gera esses atos a favor de questões que se relacionem
a natureza. Com o tempo exprime no sujeito uma identidade ambiental, com comportamentos que
tomam forma de compromisso ideológico, não demonstrando ter variação ao longo do tempo (Mayer,
Frantz 2004). No entanto, outros estudos sugerem que o comportamento pró-ambiental é
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multidimensional entre comportamentos ambientais e pró-ambientais, por exemplo, se voluntariar a
ongs ambientais, deixar de obter um produto por valores ambientais, e em contextos urbanos seria não
jogar lixo na rua, em contexto campista, respeitar áreas preservadas (Talayero, et al 2014).
Frequentemente a CN é definida como um conjunto de crenças, munidas de cargas de afeto,
que se transpõem em comportamento (Schultz, 2004). Neste sentido, indivíduos que detém esse
envolvimento com o mundo natural, podem vir a não distinguir a diferença entre CN e comportamentos
ambientais (Geng et al. 2015). Contudo, medir esse comportamento tem sido um desafio para os
pesquisadores, que utilizam de escalas e questionários e muitas vezes ambiente controlado para
mensurar comportamentos pró-ambientais, tornando mais complicado diferenciar comportamentos
espontâneos de comportamentos intencionais.
Desenvolver essa forma de conexão carrega inúmeros benefícios à saúde e ao bem-estar
(Chawla 2015). Frequentar ambientes naturais pode reduzir níveis de estresse, melhorar o aprendizado
e raciocínio. Entretanto, a humanidade com a urbanização desenfreada, tem impulsionado um grande
declínio dessa forma de interação (Christensen 2014), alterando o contato com o mundo natural, que
antes era espontâneo, passa a ser cada vez mais raro. Essa relação distanciada pode acarretar
consequências ao bem-estar do ser humano. As consequências apontadas pelos estudos é de que a falta
de contato com a natureza pode afetar negativamente o desenvolvimento das crianças.
Por fim, a CN pode ser compreendida como um vínculo de caráter duradouro, que muitas vezes
leva o indivíduo a comportamentos que se interligam em prol da natureza. Se trata de uma forma de
interação munida de benefícios para o bem-estar da humanidade. Dessa forma, a desconexão com a
natureza carrega consequências que também podem ser sentidas em dimensões globais.
IMPORTÂNCIA DA CONEXÃO DA CRIANÇA COM A NATUREZA
A ausência de CN entre crianças é tema do livro de Richard Louv (2005) “Last child in the
Woods” (Última Criança Na Floresta), onde traz à tona o termo “distúrbio de déficit de natureza”. O
autor discute com contundência sobre tal déficit para alertar sobre a redução gradual do contato da
criança urbana com a natureza, que segundo as evidências apresentadas, uma criança privada desse
contato terá consequências sérias. O transtorno do déficit de natureza pode ser compreendido como
consequência da falta dessa interação, como apatia diante do mundo. Segundo Louv (2005), há grande
diferença em habilidades adquiridas por crianças que passam maior parte do tempo em locais fechados,
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a crianças que interagem livremente na natureza, problemas gerados com diminuição dessa interação
podem estar relacionados ao aumento em casos de obesidade, transtornos psicológicos como TDAH
(Louv 2005).
O distanciamento da natureza pode levar uma geração a não desenvolver relação com o meio
ambiente (Grimm et al. 2008). Segundo Christensen et al. (2014), dentre os fatores para a diminuição
dessa interação está o medo dos pais devido ao grande índice de assaltos e homicídios em grandes
cidades que os leva a deixar as crianças presas em casa. A perda da biodiversidade é também fator que
contribui para redução desse convívio com a natureza, as áreas de interação se resumiram a parques e
pequenas faixas verdes entre as cidades, com pouca interatividade. Entretanto, poucos são os estudos
que relacionam a natureza com bem-estar das crianças, extremamente menor que estudos com adultos.
A interação com o meio ambiente é essencial em seu desenvolvimento e a primeira infância
seria um momento crucial para dar início a essa conexão, e desenvolver maior empatia entre natureza
e criança (Chawla, et al. 2007). A CN se torna primordial e contribui na construção de memórias
significativas e experiências multissensoriais. Pesquisas demonstram que simples contato como,
possuir vegetação em torno de casa e no caminho da escola influência de maneira significativa na
saúde da pessoa. São observadas evidências de benefícios no desenvolvimento cognitivo, como
melhora na atenção e redução na desatenção em crianças (Dadvand et al. 2014). O contato com a
natureza explora em diversos níveis a interação sensorial e desenvolvimento de diversas capacidades
como, aumento de atividades físicas e desenvolvimento psicomotor (Chawla 2015). A CN é também
rica fonte de contribuições para tratamento de transtornos e depressão (Sullivam et al. 2014).
A natureza, portanto, contribui de maneira significativa no desenvolvimento de crianças de
áreas urbanas que mantém contato com o mundo natural (Chawla, 2015). Essa contribuição auxilia no
desenvolvimento da autonomia e do olhar para com o próximo. O simples contato cotidiano
desenvolve maior afeto com a natureza e os elementos que a constituem como animais e plantas
promovem e aguçam a curiosidade na criança em compreender melhor o universo natural. O fato de
áreas urbanas com espaços naturais serem públicos, o governo e suas instituições também possuem
responsabilidade de fornecer condições que favoreçam a interatividade da criança com áreas naturais ,
bem como a compreensão dos cuidadores da real importância e benefícios que essa conexão
proporciona ao bem-estar da criança. Resta-nos verificar como isso ocorre no dia-a-dia das crianças
na cidade.
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MATERIAL E MÉTODOS
Esta pesquisa integra o Projeto Guarda-Chuva “Conexão com a natureza com jovens
amazônidas” e caracteriza-se como bibliográfica acompanhada de uma enquete. Foi realizado um
levantamento bibliográfico nas bases de dados Periódicos da Capes e Google scholar. Foram usados
como termos de busca às palavras “natureza” + “criança”, com seleção das publicações feitas entre os
anos de 2010 a 2020, em língua portuguesa no Brasil.
A busca resultou em 63 documentos entre artigos, dissertações e teses, sendo 19 artigos na base
Capes e 45 no Google Scholar, dentre os quais 48 atendiam aos critérios de busca na base, e após
leitura dos resumos para análise inicial apenas 14 foram selecionados. Os critérios de exclusão
consistiram em pesquisas que não atendiam a subárea Ciências Sociais, Humanas e Aplicadas e artigos
ou documentos incompletos.
Os dados foram analisados segundo a análise de conteúdo (Bardin 2004), permitindo a
compreensão dos dados, através do processo de identificação de categorias. O processo de análise parte
de três processos, 1) pré-análise, onde ocorre a leitura e compreensão do material analisado e ideias
preliminares, 2) exploração do material, para descrição analítica, 3) tratamento de resultados e
interpretações, processo o qual cabe a análise reflexiva.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados obtidos foram organizados em dois eixos temáticos: a) estudos que investigam
benefícios psicológicos advindos da relação da criança com a natureza e elementos naturais, e b)
estudos sobre a interação criança-natureza em contexto escolar. Nesses estudos publicados a
metodologia variou de forma que : a) 4 eram pesquisas documentais, b) 4 eram pesquisas-ação, c) 5
eram descritiva exploratória, e d)1 era de descrição analítica. Quanto às fontes das publicações todos
os estudos são pertencentes a instituições acadêmicas, entre as quais: universidades federais (11),
secretaria da educação (1), e congresso nacional de pesquisa e ensino (Conapesc) (1). Esses estudos
foram publicados em quatro regiões (Figura 1).
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[Z1]
Figura 1: Distribuição das publicações por regiões brasileiras
Fonte: Produção da autora
Observa-se que a Região Sul conteve proporcionalmente a maior parte desses estudos (6);
seguida pelas Regiões Centro Oeste e Nordeste com 3, e Norte com 2 pesquisas. Impressionante que
a região Norte, que possui uma maior representatividade da natureza pela sua exuberante floresta,
ocupa penúltimo lugar em pesquisas desse âmbito nas plataformas selecionas.
Benefícios da interação entre criança e natureza
Das pesquisas encontradas 8 estudos investigaram benefícios psicológicos advindos da relação
da criança com a natureza, paisagens ou elementos naturais, em locais como espaços verdes, parques,
praças (Quadro 1). Possuem como tema central compreender como se dá a construção dessa interação,
o papel dos elementos naturais na construção dessa relação, bem como os benefícios advindos desse
relacionamento.
Quadro 1. Artigos científicos sobre benefícios psicológicos advindos da relação da criança com
paisagens ou elementos naturais
Sul Centro oeste nordeste norte
Série1 6 3 3 2
Qu
anti
dad
e p
or
reig
ão
Distribuição das publicações por regiões
brasileiras
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Pesquisas Objetivo de estudo Métodos Local
Machado. Y. S; Peres. S.
M.P; Albuquerque. S.D;
Kuhnen. A. (2016)
Brincadeiras Infantis e
Natureza: Investigação da
Interação Criança-
Natureza em Parques
Verdes Urbanos
Caracterizar o uso que
crianças realizam de
recursos naturais de
espaços verdes urbanos
nas brincadeiras.
Pesquisa descritiva
exploratória,
utilizando do método
de observação e
mapeamento
comportamental
centra da pessoa e
protocolo de
observação
Santa Catarina -
Florianópolis
Lima. B.L. (2015) A
criança e a natureza:
Experiências educativas
nas áreas verdes como
caminhos humanizadores
Investigar significados e
sentidos as crianças
expressam quando
realizam ou participam de
experiências nas áreas
verdes
Pesquisa qualitativa,
método de escuta e
observação.
Bahia – Feira de
Santana
Brito, D.G.S. (2018)
Criança-natureza:
aspectos cognitivos e
afetivos da criança na
relação com a natureza.
Compreender a relação
afetiva com a natureza e
suas implicações para o
comportamento pró-
ambiental
Pesquisa exploratória
descritiva, método
desenho e entrevista
verbal.
Roraima- Boa Vista
Felisberto. D.M.K (2019)
Criança da natureza- uma
experiência de estágio em
educação infantil
Analisar a relação entre
criança e natureza no
processo de construção do
conhecimento e no
desenvolvimento infantil
Pesquisa ação,
qualitativa, método
análise de conteúdo
temática.
Alagoas - Maceió
Doca.P.N. F; Bilibio.
M.A (2018) A
(des)conexão criança e
natureza sob o olhar da
gestalt-terapia e
ecopsicologia.
Compreender sobre a
conexão natural e
espontânea entre a criança
e a natureza.
Pesquisa documental,
método análise de
conteúdo.
Goiás - Goiânia
Peres. P.M.S (2018)
Mediação dos pais na
interação Criança-
natureza.
Investigar as
brincadeiras de crianças
na natureza e a
percepção dos pais
sobre os benefícios do
contato com a natureza
para o desenvolvimento
infantil.
Pesquisa descritiva
exploratória,
quantitativo-
qualitativo, método
Observação
sistemática Direta,
questionário
autoaplicável, escala
atitudinais. Análise de
dados observação
direta e indireta
questionários SPSS
Santa Catarina
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Apoio Financeiro: Realização:
Silva. S.D et al (2019)
Ecopercepções:
representações sociais da
natureza no universo
infantil
Discutir a partir da ótica da
criança, suas percepções e
representações sobre a
Natureza.
Pesquisa qualitativa-
quantitativa métodos
descrição analítica,
desenho, entrevista,
semiestruturada.
Bahia- Santa Maria
Peres. P. M. S (2013)
Percepção da interação
criança-natureza por
cuidadores no parque
municipal da Lagoa do
Peri, em Florianópolis,
santa Catarina.
Conhecer a percepção
de cuidadores sobre a
relação criança-natureza
em um parque urbano
Pesquisa descritiva
exploratória,
quantitativa, Métodos
classificação
analógica por critério
léxico-entrevista
estruturada.
Santa Catarina -
Florianópolis
Os benefícios mais apontados pelos estudos são de caráter cognitivo, social e físico. O mundo
natural oportuniza à criança desenvolver habilidades motoras como equilíbrio, domínio espacial,
promove estímulos sensoriais, propiciando maior gasto de energia diminuindo a hiperatividade, bem
como impulsionando a autoconfiança e as capacidades cognitivas da criança. Outras vantagens
apontadas como habilidades sociais, auxiliam no desenvolvimento da capacidade de conviver com o
outro e respeitar ao próximo, acrescendo a prática da empatia. A criatividade também foi apontada
como um dos benefícios, livre acesso a áreas verdes aflora a imaginação, onde árvore vira casa,
gravetos utensílios, areia se tornam castelos. Desenvolver afinidade, cuidado e respeito com natureza
à torna local de proximidade de pertencimento, contribuindo para desenvolvimento de atitudes a favor
do meio ambiente.
Segundo Lima (2015) a natureza é compreendida como um espaço de construção histórica
desde uma compreensão espiritual, como mãe natureza que supre a terra até uma ideia de natureza
utilitarista. Concebendo natureza como experiência educativa que possibilita o movimento amplo e
sem amaras, em que a criança pode maximizar e potencializar seu aprendizado de maneira instantânea
saciando seus desejos e curiosidades. No estudo, os benefícios dessa interação revelam que o convívio
com espaços verdes é propício para a imaginação, bem como a interação e experiências com animais
e o cuidado com eles, bem como maior contato com elementos da natureza, são primordiais desde a
primeira infância. Estas experiências influenciam na construção de posturas éticas frente à vida, as
crianças expostas a áreas verdes trazem consigo benefícios que podem se refletir no futuro.
No estudo de Felisberto (2019) revelam benefícios desse convívio que compreende a interação
com o mundo natural. Nessa convivência que aprendem a respeitar a natureza, explorando o ambiente,
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conhecendo os elementos que os cercam e interagindo com eles, o contato com a natureza levou as
crianças à curiosidade, questionamentos, proporcionando novas descobertas. Quanto maior o nível de
interação maior a sensação de pertencimento de uma natureza “logo ali” e não algo distante e intocável,
mas grande e majestosa, do qual a criança se sinta integrante.
A importância da interação com elementos também foi citada como benefício conforme Silva
et al. (2019), cada elemento da natureza pode ser compreendido pelas crianças de maneiras diferentes
e para as mesmas tais elementos compõem um todo chamado natureza. Quando estão em interação
com esses elementos as crianças se expressam através dos mesmos, apresentando seus pensamentos .
Conhecer a natureza e o que a integra as torna mais propensas a expressar cuidado e respeito
“concebendo a Natureza como o princípio de tudo, inclusive dos seres humanos” (Silva, 2019, p.16).
As vantagens dessa maior convivência com o mundo natural e a elementos ligados a ela promovem as
crianças oportunidades para pensar sobre si e o mundo.
Para Machado et al. (2016), o convívio com a natureza também influencia e estimula a
criatividade da criança, a investigar e conhecer mais daquilo que está sendo apresentado a ela,
promovendo uma diversidade de brincadeiras. Os autores concluem que quanto maior acessibilidade
a criança possui à natureza e aos elementos do mundo natural, mais a criança o implementa nas suas
brincadeiras.
As formas de construção para que ocorra essa conexão entre criança e natureza também foram
citadas por artigos como construções graduais como no estudo de Brito (2018). O autor sugere que
crianças que possuem experiências cotidianas em espaços naturais, desenvolvem maior afetividade
pelo mundo natural. Concebendo a afetividade como uma ponte nessa relação criança-natureza que é
edificada de maneira gradativa ao longo da vida, procurar integrar a natureza no dia a dia da criança é
fator crucial como forma de construção dessa conexão. Essa afetividade foi citado por Doca et al.
(2018), como o encantamento da criança com a natureza se constrói de maneira progressiva no
cotidiano e seus benefícios podem ser observados em forma de entusiasmo quando a criança entra em
interação com a natureza.
Ademais conforme Doca et al. (2018), o estudo aborda dentro deste contexto de benefício, uma
compreensão da criança como parte da natureza, resultando em uma interação de sensibilidade e
encantamento, que com passar do tempo foi sendo modificada para uma interação, não apenas
utilitarista, mas que toma uma postura de EU-ISSO. Nessa forma de relação há uma desconexão, a
falta de interação também pode ser passada de geração para geração. Esses aspectos foram encontrados
quanto à postura dos cuidadores apontada no estudo de Peres (2013), a compreensão dos mesmos em
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crer nos benefícios da interação da criança com a natureza atua como fator principal na escolha dos
cuidadores ao optarem por espaços como áreas verdes, parques, praças, que ofereçam opção de
recreação natural. A percepção dos mesmos gira em torno de um espaço que propicia um retorno, seja
ele físico ou cognitivo, deixando de lado a visão biocêntrica que tem por foco a importância da natureza
apenas pela a sua existência, mas tomando a visão antropocêntrica que retrata uma predileção pela
natureza de maneira mais utilitária, optando por ela apenas pelo fato de possuir um retorno, um
benefício.
Nesse sentido, compreendendo a relação da criança com a natureza e todos os benefícios
advindos desse vínculo, proporcionar essa interação e maior proximidade com o meio natural, pode
ser uma poderosa ferramenta de aprendizagem e auxílio aos métodos pedagógicos. A escola é sem
dúvida um local possível se alcançar toda uma geração, crianças que talvez não dispusessem de tal
interação, poderiam desfrutar das vantagens provenientes dessa relação.
Interação criança-natureza em contexto escolar
A partir dos eixos estabelecidos, 6 estudos apresentam como abordagem a importância da
interação da criança com a natureza em contextos escolares/educação infantil. Nesse sentido,
demonstram resultados dessa interação dentro desses ambientes, assim como as concepções de órgãos
vinculados a educação infantil e suas práticas quanto a promover tal interação, dado a notoriedade de
seus benefícios para o bem-estar infantil.
Quadro II- Estudos sobre a importância da interação da criança-natureza em contexto
escolar
Artigos científicos Objetivo de estudo Método Local
Ferreira. M.A.B; Santos.
B.C.L.S (2018) As relações
de criança, educação
ambiental e natureza no
discurso proposto da BNCC
Apontar a relevância da
natureza e da EA na
mediação de vivências
que promovam
experiências
significativas para
formação da criança
Pesquisa
documental, técnica
de documentação
direta.
Rio Grande
do Sul
Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
Coordenação de Capacitação
Divisão Apoio Técnico
Apoio Financeiro: Realização:
Monte. L.C (2018) Sentir,
conhecer e experimentar,
criança na natureza, já.
Observar e explorar a
natureza e os ambientes
com atitude de
curiosidade, percebendo-
se como integrante
dependente e agente
transformador do meio
ambiente, valorizando
atitudes que contribuem
para sua preservação.
Pesquisa de relato
de experiência,
pesquisa ação. De
caráter qualitativo,
método observação
e analise de
desenho.
Distrito
Federal-
Paranoá
Freitas. R. V (2018) Relação
criança e natureza:
representações sociais
presentes nas políticas
públicas para a educação
infantil
Compreender, bem como
analisar quais são as
representações sobre a
relação criança e natureza
presentes nas políticas
públicas para a Educação
Infantil.
Pesquisa
bibliográfica
exploratória,
qualitativa. Método
análise documental.
Goiânia
Santos. Z.C.W (2016)
Criança e a experiência
afetiva com a natureza as
concepções nos documentos
oficiais que orientam e
regulam a educação infantil
no Brasil
Identificar nos
documentos oficiais
brasileiros que regulam e
orientam a educação
infantil as concepções
sobre a relação da criança
com a natureza.
Pesquisa
documental,
documentação
indireta.
Santa
Catarina-
Itajaí
Moura. S.M (2016) Crianças
no quintal: A relação da
criança com a natureza.
Contribuir com os
planejamentos na
Educação Infantil sobre
as relações da criança
com o meio natural em
que vivem
Pesquisa
explicativa, estudo
de campo, de
caráter qualitativo,
método observação.
Rio Grande
do Sul.
Souza.R.M;Vasconcelos.N.B;
Rodrigues.A.C; Melo. E.R;
Costa. M.G. (2016) “A
criança e a interação com a
natureza: a construção de um
“espaço verde” em uma
escola no município de
Manaus/AM”
Realizar práticas
pedagógicas que pudessem
oportunizar a interação das
crianças com elementos
naturais e despertasse nelas
uma consciência ambiental.
Pesquisa qualitativa
exploratória, estudo
de campo, método
observação.
Manaus
Em suma, os estudos compreendem a escola como um espaço de grande importância na vida
da criança, e em sua formação como cidadão, local de construir conhecimento, valores, senso crítico,
ética e saberes. Deste modo, incluir neste terreno tão rico de significados, meios em que a criança
possa se relacionar com a natureza é de grande importância. Sabendo que as crianças dependem de
seus cuidadores, se estes não possuírem meios ou não proporcionarem atividades que incluam a
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natureza ao dia a dia da criança, por inúmeros motivos ou razões pelos quais pode não ser possível
viabilizar tal interação, como não possuir locais com áreas verdes na proximidade de sua casa, não
possuir condição financeira para tal deslocamento, entre outros, a escola seria um intermediador para
estreitar este distanciamento. Alguns estudos também objetivaram compreender, em análise de
documentos oficiais, quais as concepções desses documentos frente à interação da criança com a
natureza em ambiente escolar e nos currículos escolares.
Em virtude da relevância da interação criança-natureza segundo o estudo de Ferreira et al.
(2018), incluir educação ambiental na educação de ensino fundamental é proporcionar experiências
relevantes com o mundo natural e contribui na formação da criança. Trazendo um levantamento de
dados na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) o presente estudo buscou examinar se há
propostas pedagógicas que se direcionam a este fim, dado o valor da contribuição no desenvolvimento
infantil. Para os autores a BNCC possui certa frequência do tema, “natureza” no currículo escolar,
seguindo dois panoramas, primeiro como experiência sensorial e o segundo enfoque natureza de
maneira utilitarista. Segundo o autor compreendendo que “A BNCC atingirá todas as crianças das
instituições infantis através de um discurso que não é neutro, e uma vez, apresenta a Natureza na
perspectiva mercadológica se relaciona nas tessituras dos feixes discursivos de modo utilitarista na
formação humana, e isso, em todos os currículos de Educação Infantil do Brasil” (Ferreira, 2018, p.11).
Por fim concebe certa limitação nas práticas educativas, não condizendo com a real importância e
ganho da interação, concluindo que a BNCC possui uma abrangência significativa nas instituições
infantis, frisa a importância de um currículo que permita uma interação mais profunda entre criança e
Natureza.
De igual forma, o autor Freitas (2018), explana o grande impacto de políticas públicas ou a
falta delas, que favoreçam o contato da criança com a natureza, impactando de maneira significativa
no processo de vida escolar. Os documentos analisados deste estudo também fazem parte da BNCC, o
autor destaca que parâmetros da educação infantil atual visam formar a criança como sujeitos
autônomos, e possuem maior preocupação com o saber cognitivo das crianças deixando de lado saberes
que encorajam trabalhos fora da escola, mesmo compreendendo tamanha importância e ganhos do
convívio entre criança-natureza. Inúmeros são os motivos para tais questões não possuírem uma
prioridade, sendo necessários mais estudos para uma melhor compreensão. No entanto, segundo Santos
(2016), ao analisar os documentos que regulam a Educação infantil, verificou que mesmo com certa
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defasagem, há uma busca pelos órgãos competentes em adequar a educação infantil a um convívio
mais próximo entre criança e natureza.
O espaço escolar também foi compreendido como local de expansão para os saberes lá
disseminados dentro da perspectiva de dois estudos (Souza et al. 2016; Monte 2018). Para Monte
(2018) que analisou documentos que formam as diretrizes para a educação infantil, como as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e Projeto Político Pedagógico da Unidade Escolar,
concluiu que tais documentos mencionam a importância da interação criança-natureza. Utilizando-se
desse entendimento, dos benefícios dessa relação, houve a formulação do projeto implantado na escola
em questão, que possibilitava o contato das crianças de educação infantil com elementos da natureza,
criação de hortas, ações relacionadas a consumo sustentável, aprendizagem sobre benefícios da
natureza. Cresceu o fascínio e mais afeição a escola entre as crianças. O espaço escolar ao decorrer do
processo compreendeu que os ganhos da interação atingiram não apenas as crianças, mas também as
suas famílias. O espaço escolar ganhou inúmeros significados, antes onde era visto apenas salas de
aula, hoje é um espaço de interação fluida de imensas possibilidades, que alcança os alunos e suas
famílias.
Torna-se perceptível que a inserção da interação com a natureza em ambiente escolar
acompanha mudanças significativas na forma com que as crianças passam a ver o meio ambiente .
Segundo Souza et al. (2016) observou-se que conforme as interações progrediam, as falas das crianças
foram enriquecidas, o contato direto com a natureza propiciou uma melhor visão sobre o que antes
poderia ter sido visto apenas em forma teórica, e trouxe maior preocupação com o cuidado com os
animais e a floresta, essa proximidade conduziu a experiências que favorecia uma melhor concepção,
não apenas sobre o que se constituí a natureza, mas maior sensibilização dos motivos pelo qual se faz
necessário sua preservação. A escola como ambiente mediador desta proximidade, promove
surgimento de uma consciência ambiental não apenas nas crianças, mas de toda a comunidade escolar
envolvida.
Neste sentido a escola adota um papel que oportuniza a criança descobrir, adquirir boas
práticas, novos saberes, não apenas saberes cognitivos, mas práticas do cotidiano para comportamentos
mais sustentáveis. Por fim, Moura (2016) concebe que integrar a natureza de forma lúdica ao contexto
da criança traz benefícios como a espontaneidade e criatividade, levando a natureza até a escola
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possibilita a criança perceber a grandiosidade natural a qual ela pertence, desenvolvendo maior
afetividade não apenas pela natureza, mas também para com a escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse estudo procuramos revisar a produção científica acerca da relação da criança urbana com
a natureza no Brasil. Os resultados apontaram a abrangência dos benefícios dessa interação e a
importância de propiciar às crianças caminhos que promovam contato com a natureza e seus
elementos. Para a criança o convívio com o mundo natural influência de maneira nítida no
desenvolvimento de sua aprendizagem, a natureza se torna recurso educativo. Autonomia, criatividade,
habilidades motoras estão entre alguns dos benefícios mais citados, assim como o cuidado com a
natureza. A construção dessa relação se mostrou benéfica em trazer à tona atitudes como maior
preocupação em não maltratar animais, cuidar das plantas e florestas, criando memórias de uma relação
empática entre criança e natureza, por mais simples que possa parecer tais comportamentos, podem
enraizar e perdurar até a vida adulta para comportamentos em prol do meio ambiente.
Em função desses benefícios foi encontrada inclusive a concepção dos cuidadores a respeito
da promoção dessa relação, que optam por espaços com áreas verdes por acreditarem em grandes
retornos como aprendizagens múltiplas, benefícios cognitivos e físicos para as crianças, não sendo
mencionada a construção do comportamento pró-ambiental como um dos quesitos de interesse dos
cuidadores, porém não se sabe por qual motivo, se por falta de informação ou por não ser um dos
benefícios de apresso dos cuidadores, sendo necessário mais estudo para tal questão.
Observou-se, que proporcionar essa relação em locais como a escola, pode-se atingir não
apenas as crianças, mas suas famílias, e até mesmo a comunidade. A escola se revelou local de
importante intermediação na construção dessa relação. Trouxe ganhos na construção da visão da
criança não apenas quanto à natureza, mas proporcionou maior afeição por estar na escola. Ademais,
estudos que pesquisaram essa questão em documentos de órgãos do governo e políticas públicas,
trouxeram questões como os ganhos da interação entre criança e natureza e que tais benefícios são
reconhecidos por órgãos educativos, entretanto há certa defasagem em tornar prática tais evidências.
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Há poucos trabalhos que abordaram o contexto urbano como adversidade na construção dessa
conexão. Quanto à concepção da criança a respeito da natureza, há poucos estudos com análise na fala
das crianças, há mais estudos com métodos observacionais, ou análise de desenho. Acredita-se este ser
um campo ainda pouco explorado, possibilitando que mais estudos sejam realizados nessa área, dado
o fato da importância de compreender a criança como ser que atribui sentido ao mundo ao seu redor.
Por fim, a literatura a respeito da conexão entre criança e natureza salienta acerca do convívio,
no período da infância ser o melhor momento e que tal relação é construída a partir do afeto, mesmo
não podendo se afirmar que essa conexão será prolongada até a fase adulta, inúmeras são as evidências
dessa relação. Trazer a criança para mais próximo da natureza, promover meios para a mesma se
envolver a ponto de se sentir parte integrante do meio ambiente e não alheia é essencial na construção
de adultos e cidadãos melhores.
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