relações entre cria x recia + engorda

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AS RELAÇÕES ENTRE OS SEGMENTOS DE CRIA E ENGORDA NA ERA DO REAL Prof. Dr. Rubens Nunes Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de Sªo Paulo (USP) Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4177 e-mail: [email protected] Ivan Borba Formigoni Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de Sªo Paulo (USP) Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4105 e-mail: [email protected] Ricardo Carneiro Brumatti Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de Sªo Paulo (USP) Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4105 e-mail: [email protected] Abstract The activity of suckling until recently was considered the cattle branch less income- producing of beef cattle, compared with the performance of the branchs of regrowth and fattening. However, the calf constitutes the main component of cost of the productive phases and values more raided for the replacement happens minus in the trade relations, reflecting that less animal they can be restituted with the sale of each unit of ox fat. The article considers, on the basis of a model that describes the behavior of the prices and the herd, that deteriorate of the trade terms does not mean necessarily that the agro-industrial system comes losing competitiveness, a time that profits of efficiency in the level of the firm, of the system and macroeconomic they tend to surmount the effect of the redistribution between branchs of the system. The valuation of the calf front to the ox fat signals for the sector of suckling the fetching of genetic improvement of arrays and reproducers, being able to constitute element that strengthens the competitiveness of the agro- industrial system of the bovine meat in Brazil. The transactions between agents of the branchs of calves and regrowth/fattening presents particular attributes, especially the possibility of vertical integration for front on the part of the sector of suckling and the fact of that innovations in the technology of calves implies in calf whose economic efficiency compensates the high prices. Key words: productivity, beef cattle, Real Plan

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Relações entre Cria x Recia + Engorda

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Page 1: Relações entre Cria x Recia + Engorda

AS RELAÇÕES ENTRE OS SEGMENTOS DE CRIA E ENGORDANA ERA DO REAL

Prof. Dr. Rubens NunesFaculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de São Paulo (USP)Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4177 e-mail: [email protected]

Ivan Borba FormigoniFaculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de São Paulo (USP)

Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4105 e-mail: [email protected]

Ricardo Carneiro BrumattiFaculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) - Universidade de São Paulo (USP)

Cx. Postal 23 CEP 13630-970 Pirassununga SP Fone: (19) 3565 4105 e-mail: [email protected]

AbstractThe activity of suckling until recently was considered the cattle branch less income-producing of beef cattle, compared with the performance of the branchs of regrowthand fattening. However, the calf constitutes the main component of cost of theproductive phases and values more raided for the replacement happens minus in thetrade relations, reflecting that less animal they can be restituted with the sale of eachunit of ox fat. The article considers, on the basis of a model that describes thebehavior of the prices and the herd, that �deteriorate of the trade terms� does notmean necessarily that the agro-industrial system comes losing competitiveness, atime that profits of efficiency in the level of the firm, of the system andmacroeconomic they tend to surmount the effect of the redistribution betweenbranchs of the system. The valuation of the calf front to the ox fat signals for thesector of suckling the fetching of genetic improvement of arrays and reproducers,being able to constitute element that strengthens the competitiveness of the agro-industrial system of the bovine meat in Brazil. The transactions between agents ofthe branchs of calves and regrowth/fattening presents particular attributes, especiallythe possibility of vertical integration for front on the part of the sector of suckling andthe fact of that innovations in the technology of calves implies in calf whose economicefficiency compensates the high prices.

Key words: productivity, beef cattle, Real Plan

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AS RELAÇÕES ENTRE OS SEGMENTOS DE CRIA E ENGORDANA ERA DO REAL

ResumoA atividade de cria até recentemente era considerada o segmento menos rentável dapecuária de corte, comparado ao desempenho dos segmentos de recria e engorda.Entretanto, o bezerro constitui o principal componente de custo das demais fasesprodutivas e, valores mais elevados para a reposição incidem negativamente nasrelações de troca, refletindo que menos animais podem ser repostos com a vendade cada unidade de boi gordo. O artigo propõe, com base em um modelo quedescreve o comportamento dos preços e do rebanho, que a �deterioração dostermos de troca� não significa necessariamente que o sistema agroindustrial vemperdendo competitividade, uma vez que ganhos de eficiência no nível da firma, dosistema e macroeconômico tendem a sobrepujar os efeitos da redistribuição entresegmentos do sistema. A valorização do bezerro frente ao boi gordo sinaliza para osetor de cria a busca de melhoramento genético de matrizes e reprodutores,podendo constituir elemento que reforça a competitividade do sistema agroindustrialda carne bovina no Brasil. As transações entre agentes dos segmentos de cria erecria/engorda apresentam atributos particulares, notadamente a possibilidade deintegração vertical para frente por parte do setor de cria e o fato de que inovaçõesna tecnologia da cria implicam em bezerros cuja eficiência econômica compensa ospreços elevados.

Palavras chave: produtividade, pecuária de corte, Plano Real

1. IntroduçãoA atividade de cria até recentemente era considerada o segmento menos

rentável da pecuária de corte, comparado ao desempenho dos segmentos de recriae engorda. Os baixos índices de produtividade do segmento de cria foramapontados como um dos responsáveis pelos modestos indicadores da bovinoculturade corte nacional (CARRER, 2001 e IEL, 2000).

Diante das circunstâncias muitas vezes desfavoráveis para os criadores, ossistemas de cria foram tradicionalmente direcionados a áreas marginais e de solosmenos férteis, onde os custos de aquisição do pasto eram menores e possibilitavamque o retorno financeiro com a atividade fosse mais facilmente alcançado, comoconstata ZENITH et al. (2000). Entretanto, o bezerro constitui o principalcomponente de custo das demais fases produtivas e, valores mais elevados para areposição incidem negativamente nas relações de troca, refletindo que menosanimais podem ser repostos com a venda de cada unidade de boi gordo.

Tal fato poderia representar um cenário atual favorável para os criadores edesfavorável para os que produzem animais para o abate. Este artigo se propõe adiscutir as relações de preços entre o mercado físico e de reposição na segundametade da década de 90, contexto marcado pela estabilização das taxas de inflação(decorrente da implantação do Plano Real em julho de 1994) e por intervenções napolítica cambial que procuravam o equilíbrio do setor externo da economia brasileira,como a mudança de regime cambial e desvalorização em janeiro de 1999. Asalterações do ambiente macroeconômico contribuíram para estabelecer profundasmudanças estruturais no setor de bovinos de corte. Este texto trata das relaçõesentre os segmentos de cria e recria/engorda.

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Além desta introdução, o artigo contém uma descrição do comportamento dospreços e do rebanho após a deflagração do Plano Real; a seguir, na terceira seção,se apresenta um modelo para analisar a dinâmica de preços e estoques da pecuáriade corte após choques como a queda da taxa de inflação, ganhos de produtividade,choques da demanda e outros choques. A quarta seção discute, a partir dosresultados da seção anterior, o comportamento dos termos de troca entre osegmento de recria e engorda e o segmento de cria.

2. Evolução da pecuária de corte na era do real

Desde os primeiros meses após a deflagração do Plano Real, observou-seque comportamento dos preços dos alimentos para o consumidor (que crescerammenos que a média dos demais preços da economia) contribuiu para aestabilização, pois permitiu a elevação dos salários reais sem que houvesseelevações dos salários nominais acima dos ganhos de produtividade. Para ossistemas agroindustriais em geral a queda da taxa de inflação pôs em cheque aprática de recompor margens quase automaticamente, deixando a corrosão dopoder de compra da moeda resolver o problema da distribuição das rendas dentrode cada sistema agroindustrial.

A oferta agro-alimentar (produção mais importações) teve papel importante naestabilização. Ao transferir renda para os setores urbanos intensivos em mão-de-obra, pelo mecanismo de preços domésticos fortemente alinhados com os preçosinternacionais e câmbio valorizado, o setor agropecuário tenderia a se descapitalizare reduzir a área e a produção. Esse mecanismo, conhecido à época como �âncoraverde� não seria sustentável no longo prazo. Entretanto, o que se viu na segundametade da década de 90 não foi a desarticulação da agropecuária brasileira, masum salto para a frente. Ganhos de produtividade em todos os segmentos da cadeiaprodutiva permitiram conviver com o estreitamento de margens (provocada por umaexposição sem precedentes à concorrência internacional, pelo câmbio valorizado epor uma política monetária apertada). Tais adversidades foram compensadasentretanto por fatores que, como lembrou HOMEM DE MELO (1999), poderiamatenuar ou mesmo evitar a queda da rentabilidade do setor agropecuário: (i)elevações dos preços internacionais das commodities agrícolas no período 1994 a1997 (café, soja, milho, algodão e suco de laranja); (ii) diminuições reais dos preçosdos insumos; (iii) ganhos de produtividade; (iv) menor tributação.

As margens de lucro proporcionadas pela pecuária de corte reduziram-sesensivelmente e, os ganhos financeiros e especulativos, antes comuns à rotina dosproprietários de terra, deixaram de existir. Além disso, o contexto da estabilizaçãopromoveu alguma redistribuição de margens no interior da cadeia produtiva, o quese evidencia, por exemplo, nas relações de troca entre os segmentos de cria eengorda.

Nota-se, assim, ser crescente a preocupação com a lucratividade dabovinocultura de corte, o que inclui a busca pelo aperfeiçoamento técnico daprodução animal e, da aplicação de conceitos gerenciais mais apurados,principalmente dos relativos ao controle dos custos de produção. Dentre os fatorescompensatórios apontados por HOMEM DE MELO (1999), a pecuária de cortebrasileira parece ter se beneficiado particularmente dos ajustes intra-firma e daexpansão da demanda ensejada pela elevação dos salários reais, apontados porDIAS E AMARAL (2000).

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Esses processos culminaram com uma realidade de perdas para do setoragropecuário frente aos demais segmentos da economia, como pode ser ilustradona Figura 1. Para a pecuária, ao contrário do que aconteceu com a agricultura, àexceção talvez das lavouras de exportação, a evolução dos preços os insumos nãocompensou as reduções dos preços do boi gordo.

Figura 1. Índices de preços de insumos da atividade pecuária e do boi gordo de1994 a 2001. (agosto de 1994 = 100)

80

120

160

200

240

280

320

ago/94 mai/95 fev/96 nov/96 ago/97 mai/98 fev/99 nov/99 ago/00 mai/01

PREÇ

OS

sais e rações

combustíveis

fertilizantesboi gordo

Fonte: FGV (IPA-OG), 2001

A adaptação dos segmentos de recria e engorda à queda de preços eelevação relativa do custo dos insumos esteve centrada na intensificação dosganhos de produtividade. Conforme relatam BITTENCOURT (2001) e CARRER(2001), a implementação tecnológica ocorrida nos últimos anos, em especial para afase de cria, dentre as quais pode-se citar os programas de melhoramento animal eos processos de cruzamento industrial, tem contribuído para elevar a produtividadedesta atividade, bem como dos elos seguintes da cadeia produtiva, como observadona Figura 2.

Por outro lado, há de se mencionar que o processo de capacitação produtivanão ocorre de forma homogênea, havendo marcantes disparidades intra e interregionais para os sistemas produtivos que, são agravados frente às dimensõescontinentais do território brasileiro e a diversidade de ambientes produtivos, culturaise econômicos que caracterizam o país.

Figura 2. Taxa de abate (abates por rebanho bovino) no Brasil, de 1961 a2001

8,0

10,0

12,0

14,0

16,0

18,0

20,0

22,0

1961 1965 1969 1973 1977 1981 1985 1989 1993 1997 2001

TAXA

DE

ABAT

E (%

Fonte: elaborado a partir de dados do USDA, 2001

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Em consonância com a maior produtividade dos rebanhos conseguida nosúltimos anos, observa-se uma crescente queda dos plantéis em número de animais,não refletida em uma menor oferta de carne (TORRES JÚNIOR, 2001 e ZIMMER etal. 1999).

A evolução quantitativa do rebanho bovino brasileiro é expressa na Figura 3.

Figura 3. Rebanho bovino brasileiro de 1991 a 2000

155,26

153,85

152,13152,84

153,43

150,97151,56

153,59

156,99 157,51

150,0

152,0

154,0

156,0

158,0

1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

MIL

ES D

E AN

IMAI

S

Fonte: ANUALPEC, 2000

O movimento descendente do efetivo de animais no decorrer dos últimos 10anos tem seu comportamento sensivelmente alterado a partir de 1999, quando oestoque de animais passa a ser de alta.

No entanto, a despeito do crescimento recente do rebanho, a preocupaçãocom a produtividade torna-se crescente, como destacado por MARTA JÚNIOR et al.(2001) que, mencionam ser a área para abertura de novas fronteiras agrícolas nopaís inferior a 20% para as próximas duas décadas. Assim, embora pesquisas naprodução animal para aspectos relacionados à qualidade final do produto final(carne) sejam imprescindíveis no mercado de hoje, não se pode esquecer deigualmente direcionar esforços para melhoria dos atuais índices de produtividade,principalmente dos que se dedicam à atividade pecuária de corte na fase de cria.

Tabela 1. Valores médios anuais do bezerro nelore 12 meses e da arroba doboi gordo (R$ deflacionado pelo IGP-DI) e respectiva desvalorização acumulada emSão Paulo de 1994, ano base, a 2001

Bezerro 12M Boi gordoAno R$/un. R$/@1994 375,71 100,0 55,63 100,01995 276,88 73,7 41,78 75,11996 241,96 64,4 36,02 64,71997 296,18 78,8 38,52 69,21998 323,47 86,1 39,32 70,71999 331,52 88,2 42,63 76,62000 341,94 91,0 44,68 80,32001 352,23 93,8 42,39 76,2

Fonte: SCOT CONSULTORIA, 2001

Os anos de retrocesso do rebanho brasileiro de bovinos foram também depreços cadentes, como mostra a tabela 1. Nos dois últimos anos da série,

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coincidindo com a mudança de regime cambial e desvalorização do real, há umcrescimento do rebanho que, se não chega a ser vigoroso, contrasta de formaexpressiva com o quadro anterior. O crescimento do rebanho foi acompanhado dediscreta recuperação dos preços do bezerro. Os preços do boi gordo tambémcresceram em termos reais, mas a taxas inferiores aos dos preços do bezerro e aevolução desses preços foi menos estável.

3. A dinâmica do rebanho e dos preços da pecuária de corte

Esta seção apresenta um modelo que explicita a relação entre preços do boigordo e estoques (rebanho), bem como o comportamento dessas variáveis notempo, servindo para discutir os efeitos de choques como os que ocorreram naeconomia brasileira após o Plano Real.

Admite-se que os ajustes dos estoques a flutuações da demanda não sãoinstantâneos, pois o crescimento do rebanho é limitado pelo número de matrizes epor parâmetros biológicos.

Adota-se, no que se segue, a notação:Re � taxa esperada de retorno da pecuária de engordaR � taxa de retorno da pecuária de engordap ou pg � preço do boi gordopc � preço do bezerroi � taxa de jurosπ – taxa de inflaçãoπe – taxa esperada de inflaçãog � taxa de valorização do rebanhoc � custo de engorda, como percentual do valor do rebanhoδ � taxa de desfrute do rebanhoB � estoque de boisBZ � novos bezerros (reposição e crescimento de B)ω – taxa de ganho de peso do rebanhoθ - prêmio de risco da atividade

A taxa de retorno da atividade de engorda (Re) é composta por um elementoligado à produção de carne (g e c) e por um componente �especulativo� que consistena valorização dos estoques em processo de engorda.

Re = ge – ce + pºe/p – πe + θ (1)

Na equação (1), pº = dp/dt, isto é, pº representa a variação do preço nominal do boigordo no tempo. Os termos pºe/p � πe representam, juntos, a variação real dopreço do boi gordo. O último termo, θ, corresponde a um prêmio de risco daatividade, referente a possíveis problemas técnicos (g e c reais diferentes dosesperados), mas sobretudo à perdas de capital no carregamento do estoque deanimais. Supõe-se que esse parâmetro seja uma função crescente da taxa deinflação. De (1) se extrai uma expressão para o movimento dos preços no tempo(1�) e uma condição de preços estáveis (2), em que a taxa de retorno real é igual àtaxa de valorização do rebanho menos os custos e a inflação

pºe = p . (Re – g + c + πe – θ) (1’)

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pºe = 0 ⇒ Re = g – c – πe + θ (2)

A taxa de valorização do rebanho depende de um parâmetro físico querepresenta o ganho de peso por unidade de tempo e da variação do preço do boigordo.

g = ω . (1 + pº ) ∂g/∂ω > 0 (3)

Como o equilíbrio pressupõe preços estáveis, a condição (2) pode serrescrita, pois sabe-se que pº = 0 e g = ω.

pº = 0 ⇒ R = ω – c – π + θ (2’)

A variação do rebanho é dada pelo balanço líquido entre o desfrute dorebanho e a incorporação de novos bezerros. A produção de novos bezerros (cria) éfunção do preço do bezerro, que por sua vez depende do preço do boi gordo, e doscustos da cria.

Bº = BZ(pc; pg ; cc) – δB (4)

Admite-se que os agentes não cometem erros sistemáticos de previsão, demodo que E(πe) = π e E(Re) = R, onde E(.) é o operador esperança matemática. Aindaque o erro esperado de previsão seja nulo (ε = π − πe ; Ε(ε) =0), a variância do erro,Var(ε), cresce com a inflação. Assim, os sobrescritos .e podem ser removidos dasequações (1) a (3).

Figura 4 � Dinâmica do rebanho bovino

A dinâmica do estoque e dos preços será considerada no plano p x B, isto é,de preços e níveis de estoque de bovinos. O locus das combinações de preços eestoques tais que os preços são estáveis (pº = 0) é negativamente inclinado porquecom estoques baixos, os preços se estabilizam a níveis elevados (supondoconstante a demanda por carne bovina), declinando à medida que o rebanho (e aprodução de carne) cresce. A linha que contém os pares de preços e estoquescompatíveis com estoques estáveis (isto é Bº = 0) é positivamente inclinada, porqueestoques maiores implicam em maior necessidade de reposição e maiores preços

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para induzir a criação de novos bezerros em quantidade suficiente para equilibrar odesfrute do rebanho.

Para pontos à direita da linha de estoques estáveis, os preços não sãosuficientes para induzir a reposição do rebanho e o estoque cai. Para pontos àesquerda dessa linha, o rebanho cresce ao longo do tempo.

Para preços acima da linha de preços estáveis, a sustentação da taxa deretorno da atividade (supostamente R = i + θ) requer ganhos esperados de capital.Preços �altos� para um dado nível de estoque só se justificam porque os agentesesperam novas altas.

Figura 5 � Dinâmica dos preços do boi gordo

Há um ponto de equilíbrio (E) que satisfaz simultaneamente a estabilidade depreços e de estoques. Trata-se de um ponto de sela, para o qual converge um ramoestável (SS). A linha SS é negativamente inclinada, pois para um dado nível dademanda, estoques baixos levam a preços elevados no mercado de produto (carne)e à conseqüente valorização dos estoques existentes. Todas as demais trajetóriaslevam os preços a zero ou infinito.

Figura 6 � Dinâmica dos preços do boi gordo e do rebanho bovino

A hipótese de expectativas racionais (πe = π) tem como conseqüência o fatode a economia estar sempre sobre o ramo estável SS do plano p x B.

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A redução da taxa de inflação provoca um deslocamento da linha dp/dt = 0para baixo e para a esquerda porque a taxa de retorno requerida cai, por força daredução do prêmio de risco θ. A redução da taxa de retorno implica em redução dospreços estáveis para todos os níveis de estoque (rebanho). Dito de outra forma,após a estabilização, os preços estão muito elevados para o nível corrente dosestoques. Os preços caem instantaneamente e se recuperam lentamente, à medidaque os estoques diminuem. Nesse intervalo, o desfrute é maior que a reposição dorebanho e os preços dos bezerros tendem a cair mais do que o preço do boi gordo.

Figura 7 � Efeito da queda das taxas de inflação

O crescimento da produtividade física, representada no modelo por ω, provocaum deslocamento da curva dB/dt=0 para a direita e para baixo. A taxa de retorno daatividade cresce, atraindo investimentos para o setor, de forma que o rebanho Bcresce. Para um dado preço, quanto maior ω, maior o estoque estável. Uma sériecontínua de inovações, bem como sua difusão, provoca uma queda contínua dospreços, acompanhada do crescimento do rebanho. No equilíbrio final, os preçosserão mais baixos que os do equilíbrio inicial, com a transferência dos ganhos deprodutividade para o consumidor (intermediário ou final).

Uma melhora da distribuição de renda tem por conseqüência a expansão dademanda por proteínas animais, produtos com elevada elasticidade-renda. A curvadp/dt=0 se desloca para a direita e para cima. O preço sobe instantaneamente,vindo a cair lentamente à medida que o rebanho cresce.

A desvalorização do câmbio tem impactos sobre c, o custo da engorda, tantopelo efeito direto do câmbio sobre insumos com conteúdo importado. Há impactotambém sobre a inflação esperada e sobre o prêmio de risco da atividade, πe e θ,respectivamente. A desvalorização torna as exportações brasileiras de carne maiscompetitivas, sendo razoável supor o crescimento da demanda por exportaçõesbrasileiras (exacerbada pelo pânico com relação à epidemia de encefaliteespongiforme bovina na União Européia). Assim, se espera também o crescimentodos preços da carne e do boi gordo (poe > 0). Por esses motivos, para cada nível deestoque, o preço estável era mais elevado do que antes da desvalorização: a curvadp/dt=o se desloca para cima e para a direita. O novo equilíbrio estável serácompatível com preços e estoques mais elevados.

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4. Evolução dos termos de troca cria-engorda

A Figura 8 ilustra as relações de troca entre bezerros nelore 12 meses por boigordo de 16,5@ em São Paulo.

Figura 8. Relações de troca: bezerro nelore 12 meses por boi gordo de 16,5@ emSão Paulo entre agosto de 1994 a maio de 2001

1,80

2,00

2,20

2,40

2,60

2,80

3,00

ago/94 mai/95 fev/96 nov/96 ago/97

BEZE

RR

OS/

BOI G

OR

DO

Fonte: Scot Consultoria, 2001

A estabilização da moeda é acompanhaque tende a reduzir os preços do bezerro etendência pode, no entanto, ser atenuadapecuaristas de cria e engorda. A dependênimediatamente a jusante é menor do que aengorda em relação ao de cria. A razão desa integração vertical das etapas posterioresseria mais custosa, além de não ser acessív

A elevação da produtividade, por meio dsegmento de cria quanto no de recria e engodas relações de troca da recria/engorda como repasse para adiante dos ganhos de proparadigma de desenvolvimento tecnológicmelhoramento genético produz um bezerro m

Ceteris paribus, a expansão da demagordo e crescimento do rebanho. Para o remais elevado para os bezerros. Como o criae a engorda, os preços do bezerro devem gordo em ascenção. A relação de troca engcair muito pouco, limitada pelos custos da intcriador.

A desvalorização do câmbio faz com questoque efetivamente existente. A pressão estoques estão crescendo, piora as relaçpecuarista de recria/engorda.

Média: 2,24 bezerros/boi gordo

mai/98 fev/99 nov/99 ago/00 mai/01

da de um excesso relativo de bovinos, om relação ao preço do boi gordo. Essa por uma assimetria na relação entrecia do criador em relação ao segmento dependência do segmento de recria esa assimetria é que o criador pode fazer, ao passo que a integração para trás

el a muitos produtores.a difusão de novas tecnologias tanto norda, tende a induzir uma piora aparente o segmento de cria. Uma das razões édutividade. Outra razão se prende aoo no segmento de cria, em que oais rentável, mas não mais barato.

nda induz elevação dos preços do boibanho crescer, é necessário um preçodor pode integrar verticalmente a recriaacompanhar de perto os preços do boiorda-cria tende a permanecer estável ouegração vertical para frente por parte do

e o rebanho desejado seja maior que osobre o mercado de reposição, pois osões de troca, do ponto de vista do

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Quadro 1. Efeitos de choques sobre preços, rebanho e relações de trocaChoque Preço

(real)Rebanho Relação de

trocaBezerro / Boi

Período demanifestação

Queda da inflação ↓ ↓ ↑ 94 a 96Elevação daprodutividade

↓ ↑ ↓ contínuo

Expansão da demanda ↑ ↑ ←→ 95 a 97Desvalorização docâmbio

↑ ↑ ↓ 99 a 01

Por meio da comparação do quadro acima com a Figura 5, vê-se que omodelo proposto na seção 3 gera uma descrição verossímil do comportamento dospreços do bezerro e do boi gordo.

5. Considerações finais

Os valores praticados atualmente no mercado de reposição sugerem ser acria uma atividade atrativa. Porém, não se deve esquecer que qualquerinvestimento, especialmente na bovinocultura de corte, tem de ser acompanhado deum planejamento estratégico apurado, pois, os cenários de preços podem serafetados por choques internos ao sistema agroindustrial da carne bovina comotambém por choques em variáveis macroeconômicas.

As transações entre agentes dos segmentos de cria e recria/engordaapresentam atributos particulares, notadamente a possibilidade de integraçãovertical para frente por parte do setor de cria e o fato de que inovações na tecnologiada cria implicam em bezerros mais produtivos, mas não necessariamente maisbaratos. Essas particularidades condicionam, ao lado das expectativas quanto avariáveis macroeconômicas e setoriais, a dinâmica dos preços desses doissegmentos.

A deterioração dos termos de troca, do ponto de vista do segmento derecria/engorda, não significa necessariamente que o sistema agroindustrial vemperdendo competitividade, uma vez que ganhos de eficiência no nível da firma, dosistema e macroeconômico tendem a sobrepujar os efeitos da redistribuição entresegmentos do sistema. A valorização do bezerro frente ao boi gordo sinaliza para osetor de cria a busca de melhoramento genético de matrizes e reprodutores,podendo constituir elemento que reforça a competitividade do sistema agroindustrialda carne bovina no Brasil.

6. Referências bibliográficas

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