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ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 1 XVIII Exposição de Experiências Municipais em Saneamento De 4 a 9 de maio de 2014 - Uberlândia - MG Samuel Alves Barbi Costa (1) Economista, Mestre em Saúde Pública com ênfase em Gestão e Regulação dos Serviços de Saneamento Básico na FIOCRUZ. Gerente de Fiscalização Econômico-Financeira na Agência Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais ARSAE-MG. Laura Mendes Serrano Economista, Master of Arts in Economics pela Concordia University e Pós-graduada em Controladoria e Finanças pela UFMG. Gerente de Regulação Econômico-Financeira na Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais ARSAE-MG. Tiago Silveira Gontijo Economista, Mestre em Engenharia de Produção com ênfase em Métodos Estocásticos e Simulação pela UFMG. Analista de Regulação Tarifária na Agência Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais Arsae-MG. Bruno Aguiar Carrara de Melo Economista e Físico pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Coordenador de Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira da Arsae-MG. Trabalhou no setor elétrico de 1994 a 2010 no desenvolvimento de estudos de caracterização da carga, custos marginais, estrutura tarifária, revisão tarifária e previsão de demanda em empresas como AES Sul, AES Eletropaulo, Celpa, Celpe, Cemat, Cemig, Ceron, CPFL, Eletroacre, RGE, dentre outras. Endereço (1) : Cidade Administrativa - Rodovia Prefeito Américo Gianetti, s/nº Serra Verde Edifício Gerais / 12º andar Cep.: 31630-901 Telefone: +55 (31) 3915-8060 - email: [email protected] Regulação por Incentivos: Redução de Perdas e Eficiência Energética

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ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 1

XVIII Exposição de Experiências Municipais em Saneamento

De 4 a 9 de maio de 2014 - Uberlândia - MG

Samuel Alves Barbi Costa(1)

Economista, Mestre em Saúde Pública com ênfase em Gestão e Regulação dos Serviços de

Saneamento Básico na FIOCRUZ. Gerente de Fiscalização Econômico-Financeira na Agência

Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de

Minas Gerais – ARSAE-MG.

Laura Mendes Serrano

Economista, Master of Arts in Economics pela Concordia University e Pós-graduada em

Controladoria e Finanças pela UFMG. Gerente de Regulação Econômico-Financeira na Agência

Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de

Minas Gerais – ARSAE-MG.

Tiago Silveira Gontijo

Economista, Mestre em Engenharia de Produção com ênfase em Métodos Estocásticos e

Simulação pela UFMG. Analista de Regulação Tarifária na Agência Reguladora dos Serviços de

Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais – Arsae-MG.

Bruno Aguiar Carrara de Melo

Economista e Físico pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Coordenador de

Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira da Arsae-MG. Trabalhou no setor elétrico de

1994 a 2010 no desenvolvimento de estudos de caracterização da carga, custos marginais,

estrutura tarifária, revisão tarifária e previsão de demanda em empresas como AES Sul, AES

Eletropaulo, Celpa, Celpe, Cemat, Cemig, Ceron, CPFL, Eletroacre, RGE, dentre outras.

Endereço(1): Cidade Administrativa - Rodovia Prefeito Américo Gianetti, s/nº – Serra Verde –

Edifício Gerais / 12º andar – Cep.: 31630-901 – Telefone: +55 (31) 3915-8060 - email:

[email protected]

Regulação por Incentivos:

Redução de Perdas e Eficiência Energética

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XVIII Exposição de Experiências Municipais em Saneamento

De 4 a 9 de maio de 2014 - Uberlândia - MG

RESUMO

A gestão de perdas e a eficiência energética são fatores de extrema relevância para os sistemas

de abastecimento de água e de esgotamento sanitário em todo o mundo. Além de serem

importantes para atingir redução de custos, maior produtividade e melhor desempenho, também

estão relacionadas a questões fundamentais de preservação ambiental. É importante que os

entes reguladores estejam atentos a estes quesitos durante a formulação de seus procedimentos

de revisão e reajustes tarifários. Neste artigo, são propostos mecanismos de estímulo à redução

de perdas de água para prestadores locais, que incorporam elementos de modelos de regulação

tarifária pertencentes ao arcabouço da Regulação por Incentivos. São apresentados os casos dos

municípios mineiros, Passos e Itabira, para os quais foram aplicados redutores de custos de

energia elétrica e de materiais de tratamento pela agência reguladora, Arsae-MG.

Palavras-chave: redução de perdas, eficiência energética, regulação por incentivos, mecanismos

tarifários.

INTRODUÇÃO

A gestão de perdas de água e a eficiência energética são fatores de extrema relevância para os

sistemas de abastecimento de água e de esgotamento sanitário em todo o mundo. É fundamental

que os entes reguladores estejam atentos a estes quesitos durante a formulação de seus

procedimentos de revisão e reajustes tarifários, estabelecendo os incentivos corretos para que os

prestadores de serviços procurem reduzir os desperdícios em seus processos produtivos.

Os Serviços Autônomos de Água e Esgoto (Saae’s) são prestadores de abrangência local sem

fins lucrativos. As metodologias de regulação mais discutidas atualmente são desenvolvidas a fim

de impor limites aos lucros de monopólios naturais, usando a dinâmica de mercado para estimular

ganhos de produtividade. Isto é, a redução de custos operacionais para além da meta

estabelecida pelo ente regulador seria apropriada em forma de lucro pelas empresas, criando

instrumentos de incentivo à eficiência. Ao final do ciclo tarifário, tal excedente deve ser então

compartilhado com os usuários através da modicidade tarifária. No entanto, uma vez que o lucro

não é um objetivo a ser perseguido pelos Saae’s, é necessário estabelecer um ambiente

institucional que desenvolva estímulos diferenciados para essas autarquias.

Alguns dos principais problemas enfrentados pelos prestadores de serviços de água e de esgoto

em países em desenvolvimento consistem na redução de perdas de água e na necessidade de

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otimizar o uso de energia elétrica. Este trabalho tem como objetivo propor mecanismos tarifários

de incentivo à redução de perdas de água e de elevação de eficiência energética que podem ser

adotados para prestadores de abrangência local, a partir de experiências já adotadas nos

municípios de Passos e de Itabira no Estado de Minas Gerais.

No Brasil, os prestadores de serviços de saneamento se classificam em três categorias diferentes:

regionais, microrregionais e locais. Os prestadores de abrangência regional, conhecidos como

Companhias Estaduais de Saneamento Básico (Cesb’s), estão organizados como empresas

públicas ou sociedades de economia mista, atuando em vários municípios de um mesmo estado

da federação. Os prestadores microrregionais atendem dois ou mais municípios limítrofes no

mesmo estado. Finalmente, os prestadores de abrangência local, habitualmente estruturados

como autarquias ou departamentos municipais, atuam somente em um município.

É importante compreender que os prestadores locais, em sua grande maioria, são autarquias ou

departamentos públicos e não apresentam finalidade lucrativa. As metodologias de regulação

mais discutidas atualmente são desenvolvidas a fim de impor limites aos lucros de monopólios

naturais, usando a dinâmica de mercado para estimular ganhos de produtividade. É isso o que a

legislação brasileira tem buscado promover, no entanto, sem observar as especificidades dos

prestadores locais.

A Lei Federal 11.445, de 5 de janeiro de 2007, conformou as diretrizes nacionais para o

saneamento básico no Brasil. A denominada Lei Nacional do Saneamento (LNS) estabeleceu que

as agências reguladoras, entidades dotadas de autonomia e independência para regulamentar e

fiscalizar a prestação de serviços do setor, devem agir de forma a equilibrar os interesses dos

usuários, dos prestadores e dos municípios.

A LNS estimulou a introdução de mecanismos de incentivo à eficiência e a apropriação social dos

ganhos de produtividade (Lei 11.445/2007, art. 22, incisos III e IV). Para que sejam garantidos o

equilíbrio econômico-financeiro da prestação dos serviços e a modicidade das tarifas, é

necessário que a agência reguladora realize a revisão tarifária do prestador. Na revisão tarifária, a

entidade reguladora define a tarifa média a ser aplicada durante o ciclo tarifário, geralmente de 4 a

5 anos, e os mecanismos de incentivo à eficiência a serem adotados nos reajustes dos anos

subsequentes, até a próxima revisão. De maneira clara, a LNS estimula a adoção das

metodologias de Regulação por Incentivos.

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A Regulação por Incentivos dissocia as tarifas dos custos incorridos efetivamente pela

concessionária, estimulando o prestador a aumentar sua rentabilidade através da redução de

custos, por meio do aumento da produtividade (CARRARA E TUROLLA, 2013). Questão central é

que a maioria dos prestadores locais no Brasil não tem seu foco em rentabilidade, sendo

insensíveis aos estímulos de mercado. Portanto, faz-se necessário desenvolver metodologias

alternativas que sejam capazes de incentivar os prestadores locais a melhorar seu desempenho.

Como aponta Berg (2000), o regulador não prescreve ações específicas de conduta para o

prestador, permitindo que o mesmo decida como promover a melhoria contínua de desempenho.

Nesse contexto, o regulador não age através do comando e controle, mas pela introdução de

mecanismos de incentivo, principalmente tarifários, que estimulem o prestador regulado a adotar

as medidas consideradas necessárias para um melhor desempenho na prestação dos serviços.

Na prática, são definidas metas de eficiência e de qualidade associadas ao nível de receita de

equilíbrio econômico-financeiro. O prestador tem liberdade de gerenciamento para estabelecer as

estratégias e procedimentos necessários para atingir metas, sem que haja interferência do órgão

regulador na forma de alcançá-las ou mesmo superá-las.

METODOLOGIA

Ao contrário de prestadores com fins lucrativos, em que a revisão tarifária deve determinar o nível

de receita que cubra os custos operacionais eficientes e remunerem adequadamente o capital

investido, o conceito de lucro não é pertinente para prestadores organizados em forma de

departamento ou autarquias municipais. Portanto, quando da revisão tarifária destes prestadores,

o regulador deve calcular a tarifa que proporcione a cobertura de custos operacionais,

preferencialmente com estímulos à eficiência, e proporcionar recursos para investimentos no

próximo ciclo tarifário.

Para proporcionar estímulos à eficiência operacional, uma revisão tarifária poderia ser realizada

nos moldes da regulação por incentivos, sem observar os custos do prestador de serviços, e

focando-se em comparação com outros prestadores ou na formulação de uma empresa de

referência por parte do ente regulador. No entanto, as bases de dados nacionais não estão

maduras o suficiente para que seja realizada a primeira opção, que elevaria substancialmente os

riscos de desequilíbrio econômico do prestador. A segunda opção, de comparação com uma

empresa de referência, é bastante complexa e demanda um alto grau de discricionariedade do

regulador. (ACENDE BRASIL, 2007).

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Dessa maneira, uma boa alternativa é empregar uma metodologia híbrida de regulação para as

entidades sem fins lucrativos. Isto é, a fim de assegurar o equilíbrio econômico-financeiro, pode-se

realizar a revisão tarifária com base na análise e avaliação dos custos do próprio prestador de

serviços, utilizando um método que se aproxima da regulação pelo custo de serviço, mas que

considere mecanismos tarifários de incentivo à eficiência.

Sabe-se que, caso tais mecanismos não sejam adotados, a regulação pelo custo de serviço tende

a promover um inchaço nos custos operacionais ao longo do tempo, já que o prestador sempre

terá seus custos cobertos pela tarifa, independemente do esforço empregado para a melhoria do

desempenho da prestação de serviços. Portanto, a introdução de incentivos em conjunto com a

avaliação dos custos do prestador sem fins lucrativos é fundamental para promover uma melhoria

contínua e factível da eficiência operacional.

Os incentivos, no entanto, não seriam associados à possibilidade de elevar a rentabilidade desses

prestadores, já que os mesmos não possuem fins lucrativos. Porém, quando o regulador atrela a

receita autorizada na revisão tarifária de um prestador sem fins lucrativos a metas de

desempenho, é necessário que o ente regulado atinja as metas propostas para arrecadar a receita

de equilíbrio calculada na revisão, aquela capaz de cobrir custos operacionais eficientes e

financiar o plano de investimentos previsto para o ciclo tarifário.

Deve-se destacar ainda que, para que as metas de desempenho definidas pelo regulador para os

prestadores sem fins lucrativos sejam eficazes, é importante que as mesmas contemplem

necessariamente: objetivo, valor e prazo. Ademais, as metas S.M.A.R.T, conforme definidas por

Drucker (1954), tendem a gerar resultados ainda mais expressivos ao apresentarem as seguintes

características: específicas (specific), mensuráveis (measurable), atingíveis (attainable),

relevantes (relevant) e temporais (time-based).

Técnicas de benchmarking entre grupos de prestadores comparáveis são uma alteranativa para a

determinação de metas apropriadas. Nesse caso, é possível utilizar métodos paramétricos, como

análise de regressões múltiplas, ou métodos não paramétricos, como é o caso da análise

envoltória de dados (CARRARA E TUROLLA, 2013).

Os mecanismos de incentivo à redução de perdas de água e à eficiência energética para os

prestadores locais sem fins lucrativos apresentados neste artigo incorporam elementos de dois

tipos de modelos de regulação tarifária pertencentes ao arcabouço da Regulação por Incentivos,

são eles: Regulação por Preço Teto (Price Cap Regulation) e Regulação por Comparação

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(Yardstick Competition). É importante mencionar, ainda, que tais modelos compõem a

metodologia híbrida proposta na medida em que são articulados com a Regulação pelo Custo

através da introdução dos mecanismos tarifários de incentivo a um melhor desempenho.

Na Regulação por Preço Teto, as tarifas são mantidas constantes por um período pré-

determinado, chamado de ciclo tarifário, a não ser pela existência de reajustes anuais que

consideram o reflexo da inflação nos custos da concessionária e um fator de ajuste relacionado à

produtividade, o Fator X (KING, 1998). Durante o ciclo tarifário, o prestador tem incentivo para

reduzir custos e atingir as metas de qualidade e eficiência estabelecidas, a fim de manter a

arrecadação do nível de receita de equilíbrio definido na revisão. No início do próximo ciclo é

realizada nova revisão tarifária e, nesse momento, o regulador permite novamente a apropriação

social dos ganhos de produtividade ao convertê-los em modicidade tarifária para os usuários.

Ao se manter as tarifas constantes por um período, são dados incentivos aos prestadores para o

aumento de eficiência, dado que o aumento de produtividade acima do esperado pode ser retido

pelo prestador e destinado a melhorias ou mesmo prêmios de produtividade aos funcionários.

Portanto, a Regulação por Preço Teto é um importante estímulo à eficiência energética, através

de troca de moto-bombas por outras mais eficientes ou mais bem dimensionadas, instalação de

inversores de frequência, setorização de redes, utilização de válvulas redutoras de pressão,

construção de reservatórios que permitam o deslocamento de consumo para posto horário fora de

ponta, dentre outras iniciativas.

A Regulação por Comparação ou Yardstick Competition, como o próprio nome indica, define o

nível de tarifas na Revisão Tarifária através da comparação entre concessionárias, controlando

pelas diferenças entre as áreas de concessão dos prestadores de serviços (SHLEIFER, 1985). A

associação da Regulação pelo Preço Teto com a Regulação por Comparação, mesmo que

estruturada sobre um modelo híbrido de Regulação pelo Custo, mostra-se capaz de proporcionar

incentivos duradouros para a melhoria da eficiência operacional. Isso ocorre inclusive para

prestadores sem fins lucrativos quando são introduzidas as metas de desempenho vinculadas a

mecanismos tarifários de incentivo à eficiência.

Um dos principais problemas enfrentados pelas operadoras de água em países em

desenvolvimento consiste na redução dessas perdas. A média brasileira de perdas de água é de

aproximadamente 40%. O volume de água disponibilizado no sistema de distribuição pelas

operadoras de água é, em boa parte, desperdiçado durante o processo de distribuição (perda de

água física). Outras vezes, o serviço não é cobrado adequadamente tanto por problemas técnicos

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relacionados à medição quanto por fraudes realizadas por alguns usuários, as chamadas perdas

comerciais (KINGDOM et al, 2006). Na literatura internacional o conjunto de perdas físicas e

comercias é chamado de “Água Não Faturada” -“Non-Revenue Water” (GO ASSOCIADOS, 2013).

O combate a perdas de água tem como consequência maior eficiência no uso de energia elétrica,

um dos principais insumos para a prestação de serviços de água e de esgotamento sanitário,

além de reduzir os riscos de escassez de água.

Tendo em vista as considerações realizadas acima, entende-se que as metodologias de regulação

devem instituir mecanismos para incentivar a redução de perdas de água e a eficiência

energética, mesmo para os prestadores que não apresentam fins lucrativos.

O método de revisão tarifária empregado pela Arsae-MG (2011 e 2012) tenta aliar essas

considerações por meio da aplicação de um Redutor de Perdas (Rp) sobre os custos de energia

elétrica e de material de tratamento.

O cálculo das perdas totais mensura a relação entre o volume de água produzido (macromedição)

na estação de tratamento de água (ETA) e o volume medido (micromedição) para faturamento,

podendo ser expresso pela seguinte equação:

onde: = Perdas;

= Volume Produzido (macromedição);

= Volume Medido (micromedição).

O Redutor de Perdas (Rp) é determinado pela razão entre o volume produzido que seria

necessário caso a perda regulatória fosse atingida (VPREG) e o volume produzido verificado no

Período de Referência (VPPR). Pela definição de perdas apresentada, pode-se escrever o volume

medido (VM) por:

A constatação de que o mesmo volume medido (VM) é alcançado a partir do volume produzido no

período de referência (VPPR) com as perdas de então (PPR) ou a partir de um volume produzido

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menor (VPREG), caso as perdas regulatórias (PREG) sejam atingidas, permite a obtenção do

Redutor de Perdas (Rp):

A ideia do referido Rp é, então, que a agência reguladora defina a meta de perdas desejável para

os prestadores regulados, de forma a reconhecer apenas os custos de energia e material de

tratamento que sejam eficientes e, portanto, compatíveis com a meta estabelecida. Assim, caso os

prestadores não se esforcem para reduzir seus indicadores de perdas, enfrentarão dificuldades

para cobrir seus custos operacionais.

RESULTADOS

A metodologia em questão já tem sido aplicada para Saae’s de dois municípios de Minas Gerais,

Passos e Itabira, demonstrando interessantes resultados. A Revisão Tarifária realizada no ano de

2011 para o Saae de Passos estabeleceu redutores de custos sobre energia elétrica e material de

tratamento, relacionados aos níveis de perdas de água. O pressuposto utilizado para instituição

destes redutores era que maiores perdas significariam desperdícios relativos ao bombeamento e

tratamento da água, que poderiam ser evitados com um melhor controle por parte do prestador.

Portanto, a fim de incentivar a redução do nível de perdas, os custos de energia elétrica e de

material de tratamento não seriam integralmente considerados para conformação das tarifas.

(ARSAE, 2011). A Figura 1 apresenta os índices de perdas de Passos, desde 2002 e a definição

da perda regulatória.

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Figura 1 - Perdas do Saae de Passos e Perda Regulatória

Fonte: ARSAE (2011).

As perdas do Saae de Passos foram comparadas com as de outros municípios de porte similar do

estado de Minas Gerais, entre 50 mil e 150 mil habitantes, por meio de dados obtidos no Sistema

Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis). Foram enquadrados nessas características 46

municípios, classificados em ordem crescente em relação ao nível de perdas e divididos em

quatro grupos de tamanho semelhante. Aos municípios de menores níveis de perdas, grupo 1, foi

estabelecida uma meta de redução de perdas de 0,25% ao ano. As metas para os demais grupos

(2, 3 e 4) foram de 0,5%, 0,75% e 1% ao ano. O Saae de Passos enquadrou-se no Grupo 2,

resultando em uma meta de redução de perdas para o fim do Ciclo de Revisão Tarifária de 2% em

4 anos. (ARSAE, 2011).

O redutor de perdas foi aplicado de modo semelhante para o Saae de Itabira, na Revisão Tarifária

realizada em 2012. No entanto, o regulador foi mais rígido, elevando as metas de redução de

perdas para os grupos 3 e 4 para 1% e 2%, respectivamente. O município de Itabira enquadrou-se

no grupo 3, tendo como meta a redução de 4% nos 4 anos de seu Ciclo de Revisão Tarifária.

(ARSAE, 2012). A Figura 2 apresenta os índices de perdas de Itabira, desde 2002, assim como a

perda regulatória.

23,7%24,7%

26,2%

27,9%29,0%

32,0%

25,9%

25,8%

27,7% 26,5%

20%

22%

24%

26%

28%

30%

32%

34%

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20

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10

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perdas Perda Regulatória trajetória

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Figura 2 - Perdas do Saae de Itabira e Perda Regulatória

Fonte: ARSAE (2012).

As perdas do Saae de Itabira, por terem sido consideradas muito elevadas, têm sido

acompanhadas progressivamente por Relatórios de Fiscalização anuais. Como consequência do

estabelecimento de perdas regulatórias, o Saae de Itabira está desenvolvendo um estudo com a

UFMG para avaliar os efeitos da substituição, em uma área controlada, de hidrômetros de classe

B por outros de classe C, mais sensíveis a menores vazões. Esses esforços parecem estar

gerando resultados muito positivos, uma vez que as perdas do Saae estão se aproximando da

meta regulatória estabelecida. No entanto, como as perdas desde e a Revisão até o último

Relatório foram superiores à meta média, o Saae deve permanecer a combatê-las de forma a

manter a trajetória de queda e fazer com que a média no período de quatro anos atinja a meta

regulatória. (ARSAE, 2013).

DISCUSSÃO

Os resultados apresentados na seção anterior ratificam a tese de que redutores de perdas podem

induzir os Saae’s, prestadores sem fins lucrativos, a elevarem seu desempenho na prestação dos

serviços através da redução de perdas. Por meio da observação empírica e analisando dados

realizados do indicador de perdas do Saae de Itabira, que apresentou resultados mais

expressivos, verifica-se o sucesso dos mecanismos de incentivo tarifário empregados.

É importante mencionar, no entanto, que o estabelecimento de metas desafiadoras por parte do

regulador deve ser realizado de forma bastante criteriosa. Caso as metas definidas sejam

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inatingíveis ou mal desenhadas, poderá ocorrer comprometimento significativo do equilíbrio

econômico-financeiro do prestador regulado. Em outras palavras, caso o prestador não se esforce

para atingir as metas determinadas, seu equilíbrio econômico-financeiro poderia não ser atingido,

colocando em risco sua sustentabilidade. Esse é um trabalho bastante complexo e que deve ser

realizado com ampla discussão na sociedade, por meio de consultas e audiências públicas e deve

ser bem compreendido pelo prestador.

Além disso, é imprescindível que haja um monitoramento da evolução da qualidade, eficiência e

situação econômico-financeira da prestação dos serviços. Esse objetivo pode ser alcançado

através da fiscalização efetiva pelo órgão regulador sobre o desenvolvimento das ações

empreendidas pelo regulado na direção da melhoria da eficiência operacional e em parceria com o

Ministério Público.

Também é desejável que a entidade reguladora apoie o prestador regulado no processo de

melhoria do desempenho operacional e de controles internos. Em geral, prestadores sem fins

lucrativos e de abrangência local são menos estruturados e encontram grandes dificuldades para

empreender mudanças voltadas para a melhoria da eficiência. No entanto, sem um apoio

institucional amplo, mesmo um órgão regulador tecnicamente competente encontrar-se-á

marginalizado por poderes políticos que são muito mais fortes (BERG, 2013). Dessa forma,

fatores de risco, como a ingerência política do poder público municipal, devem ser mapeados e

mitigados.

CONCLUSÃO

Este trabalho apresenta os casos dos municípios mineiros, Passos e Itabira, como exemplos de

aplicação de mecanismos de incentivo tarifário associados ao modelo híbrido que incorpora

elementos de Regulação por Incentivos e Regulação pelo Custo. A aplicação dos redutores de

custos de energia elétrica e de materiais de tratamento, aliados à introdução do Fator X, institui

incentivos à redução dos níveis de perdas e à melhoria da eficiência energética aos prestadores

de abrangência local.

A redução de perdas de água e a melhoria da eficiência energética dos prestadores municipais de

abastecimento de água e de esgotamento sanitário, além de serem importantes para atingir

redução de custos, maior produtividade e melhor desempenho, também estão relacionadas a

questões fundamentais de preservação ambiental. Dessa forma, dada a relevância do tema,

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novos estudos e iniciativas nesse sentido devem ser colocadas em prática, a fim de que o

desenho de mecanismos tarifários de incentivo à redução de perdas e melhoria da eficiência

energética seja, continuamente, aprimorado.

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