reflexão sobre smith, peter - o brincar e os usos do brincar
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Breve reflexão sobre a leitura do texto de Peter Smith.TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE ESTUDOS BÁSICOS
EDU01018 – PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO: O JOGO II
PROFESSORA: TÂNIA RAMOS FORTUNA
ALUNO: ERIAM ROBERTO SCHOENARDIE
RESUMO E COMENTÁRIOS DA LEITURA
Inicialmente, no texto O brincar e os usos do brincar, de Peter K. Smith, o
brincar é dissecado como que em uma metafórica anatomia do boneco, em que recorre-
se a Jean Piaget e a sua teorias sobre os três tipos de brincar: o brincar prático, o
brincar simbólico e o jogo com regras. Esclarecendo-se que cada fase é característica de
uma faixa etária, ainda inclui-se a teoria de Sara Smilansky que vem ampliar as
tipologias piagetianas, apontando também o brincar construtivo. Desde cedo fica clara a
posição do texto em defender que para além dos benefícios intelectuais ligados ao
exercício e ampliação da criatividade e da imaginação, o brincar é também um meio de
sociabilização daqueles que jogam. Essa coordenação de atividades entre duas ou mais
pessoas se dá não só entre criança-criança, mas também entre criança-adulto, quando há
a intervenção do último no jogo.
Ao mostrar uma perspectiva histórica da “vida e morte do brincar”, o texto vem
mostrar as origens da associação do brincar com a educação, considerando que as
atividades lúdicas podem atender grande parte das noções de conhecimento social,
intelectual, criativo e físico. Ao que parece, o brincar espontâneo passou a ser
reconhecido como componente natural e eficaz para desenvolvimento das crianças a
partir década de 1930. Quando ele invade os muros da escola, é fundador de uma
pedagogia diferenciada, fazendo com que o brincar livre passe a ser estudado e
desenvolvido como método de ensino nas próximas décadas, entrando em declínio
somente nos anos 1980 pela inexistência de muitas evidências sólidas que
comprovassem o sucesso do brincar espontâneo em ambiente escolar. Introduz-se,
então, a figura do adulto como intermediador entre criança e jogo, capaz de enriquecer o
brincar e fazê-lo ganhar maior profundidade didática.
Recorrendo novamente às teorias de Smilansky, o texto traça os tipos de
tutoramento do brincar que a pedagoga classifica como intervenções de 1. modelagem
(quando o adulto também participa da brincadeira, inevitavelmente servindo como
exemplo), 2. orientação verbal, 3. treinamento de fantasia temática ou 4. aprendizagem
do brincar imaginativo. Smilansky afirma que, quando feita de maneira adequada, a
intervenção do adulto realmente aumenta a complexidade e a qualidade do brincar,
principalmente no que concerne ao brincar de faz-de-conta e ao brincar sociodramático.
Estando em pé de igualdade com a criança por também participar do jogo, o adulto
aprende a entrar no mundo da brincadeira e edificá-lo de dentro para fora, ampliando as
possibilidades de ensino-aprendizagem e de diálogo com a criança. Contudo, uma
objeção é feita: a de que o adulto primeiramente observe as atividades daquele que
brinca e que só em um segundo momento intervenha pedagogicamente, atendendo aos
estímulos lúdicos provindos da própria criança e não organizados por si como agente
exterior.
Chega-se ainda a mencionar a metodologia de trabalho do High/Scope
Curriculum desenvolvido nos Estados Unidos, calcado a tríplice dialética do “planejar-
fazer-revisar”, que vem contribuir com sua ideia de um adulto que não pode ser
excessivamente invasivo no brincar e nem deve cercar a criança de cuidados ou
instruções. Em contrapartida a essa corrente que deixa aquele que brinca completamente
em liberdade, estariam as atividades estruturadas por adultos que se baseiam
rigidamente em regras e/ou modelos impostos. Essa pedagogia pela repetição não é
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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE ESTUDOS BÁSICOS
EDU01018 – PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO: O JOGO II
PROFESSORA: TÂNIA RAMOS FORTUNA
ALUNO: ERIAM ROBERTO SCHOENARDIE comumente adotada no ocidente, mas Smith nos informa que trata-se de um método
bastante presente em países orientais e que não se mostra ineficaz, se considerados os
altos índices de realizações acadêmicas que muitos desses países apresentam.
Mas então qual caminho a se seguir? Haverá uma zona intermediária entre o
brincar livre e o brincar rigidamente estruturado? Qual o papel do adulto no brincar? Na
tentativa de esclarecer essas questões finais, o autor recorre as teorias de dois
importantes educadores do século XX: Lev Vygotsky e Jerome Bruner. Do teórico russo
o autor pega emprestado o conceito de zona de desenvolvimento proximal, que nada
mais é do que a diferença entre o nível de desenvolvimento real (quando a criança
brinca independente e sem interferência) e o nível de desenvolvimento potencial
(quando ajudada pelo adulto a refinar o nível de “dificuldade” de sua ação). Esse degrau
a mais que a criança sobe seria a área de desenvolvimento que Vigotsky conceitua e que
entra em metafórica ligação com o andaime (scaffolding) de Bruner. O psicólogo
americano trabalha com a ideia de que a criança deve ser vista como uma edificação e
que a ação do adulto sobre ela exerce a mesma característica de um andaime que vai se
elevando de acordo com a altura que o edifício vai atingindo. Ambas as teorias parecem
se retro-alimentar na busca por um mesmo ideial: um adulto que saiba reconhecer no
brincar da criança o nível de conhecimento e compreensão da mesma, medindo assim a
sua intervenção e fazendo-se presente de maneira mais oportuna e consciente.
O primeiro ponto que achei muito interessante no texto foi uma precisa definição do
conceito de brincar sociodramático. Ao atribuir essa característica do jogo, o autor
chamou bastante a minha atenção para a ação social que se dá na coordenação de
atividades entre duas ou mais pessoas. Isso faz com que o professor em sala de aula
tenha que ter noção da dimensão sociodramática que compõe o
jogo/brincadeira/dramatização e que é influenciada também pelo seu contato com o
aluno.
Uma das variações do tutoramento do brincar me chamou a atenção em especial: o
treinamento da fantasia temática. A começar pelo nome desse conceito, de uma
preciosidade já poética. Mas além disso, apesar de se dizer um “procedimento mais
estruturado do que os anteriores [a modelagem e a orientação verbal]”, vejo muito
potencial nessa exploração de uma fantasia temática compartilhada por crianças e
adultos. Na verdade, acredito que essa seria uma boa forma de definir um processo de
criação e de encenação de um espetáculo na escola. Um eco de meu TCC, que acabei
ligando a essa tipologia de tutoramento de Smilansky.
Uma observação talvez não muito valiosa, mas no mínimo interessante, me ocorre ao ler
as proposições da teoria de Burner, as quais postulam que o adulto deveria ajudar a
criança a reconhecer os aspectos relevantes da situação, dividindo-a em uma sequência
de tarefas menores que devem ir sendo solucionadas em passos. É curioso como
professores, psicólogos, médicos, teóricos americanos tem essa tendência estruturalista
de organizar as coisas em esquemas, listas, gráficos, tipologias... enfim, qualquer coisa
que dê um sentido de ordem e cronologia às ideias. Embora às vezes um pouco pedante
e segregatista, o hábito me parece bastante funcional como método que contribui para o
entendimento dos mais variados estudos que possam ser propostos.