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REENCANTAR A EDUCAÇÃO: LIMITES E POSSIBILIDADES NA EDUCAÇÃO BÁSICA SOUZA, Ana Paula – SECJLLE [email protected] BRAZ, Clariliz Fátima de – SECJLLE [email protected] Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O presente estudo procura apontar possibilidades para a prática interdisciplinar no ensino de Ciências Naturais, Língua Portuguesa e Matemática nos anos finais da educação básica, tendo a Arte como eixo integrador. À medida que as exigências do mundo contemporâneo repercutem de maneira imediata no perfil da escola que se tem, e especificamente das práticas pedagógicas que nesse espaço vem sendo desenvolvidas. Pois, se na contemporaneidade, a criatividade, a autonomia e a cidadania, são cada vez mais competências necessárias, o processo de ensino e aprendizagem nos espaços escolares, não pode continuar a privilegiar, a repetição, a memorização e a linearidade. A prática pedagógica aqui relatada foi desenvolvida em turmas dos anos finais da Escola Municipal Professora Ada Sant’Anna da Silveira, localizada na cidade de Joinville (SC). Para o desenvolvimento das ações pedagógicas foi utilizado como principal referencial teórico, as obras de Rubem Alves, dado o profundo potencial de sensibilização, reflexão e resgate do humano e encantamento para a vida, que essas proporcionam, tanto para alunos quanto para professores. Todavia, articulado a literatura, para a transposição didática dos conteúdos das áreas específicas, utilizamos o origami como técnica. O qual possibilitou que os resultados alcançados fossem além do imaginado, pois, a dedicação e o comprometimento dos alunos permitiram a percepção, de que efetivamente ensinar é cheio de limites e possibilidades. E que cada vez mais, torna-se urgente que as práticas pedagógicas, rompam com o paradigma da fragmentação em detrimento do paradigma da complexidade. Pois, diferentemente do comportamento adotado por Sísifo, representante da mitologia grega, aprender “não é repetir”. Mas sim, mobilizar competências e habilidades na construção do conhecimento, esse que é para a vida, e não simplesmente para responder a demandas escolares, como provas e exercícios. Palavras-chave: Educação Básica. Interdisciplinaridade. Ensino e aprendizagem. Introdução

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REENCANTAR A EDUCAÇÃO: LIMITES E POSSIBILIDADES NA

EDUCAÇÃO BÁSICA

SOUZA, Ana Paula – SECJLLE

[email protected]

BRAZ, Clariliz Fátima de – SECJLLE [email protected]

Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas

Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O presente estudo procura apontar possibilidades para a prática interdisciplinar no ensino de Ciências Naturais, Língua Portuguesa e Matemática nos anos finais da educação básica, tendo a Arte como eixo integrador. À medida que as exigências do mundo contemporâneo repercutem de maneira imediata no perfil da escola que se tem, e especificamente das práticas pedagógicas que nesse espaço vem sendo desenvolvidas. Pois, se na contemporaneidade, a criatividade, a autonomia e a cidadania, são cada vez mais competências necessárias, o processo de ensino e aprendizagem nos espaços escolares, não pode continuar a privilegiar, a repetição, a memorização e a linearidade. A prática pedagógica aqui relatada foi desenvolvida em turmas dos anos finais da Escola Municipal Professora Ada Sant’Anna da Silveira, localizada na cidade de Joinville (SC). Para o desenvolvimento das ações pedagógicas foi utilizado como principal referencial teórico, as obras de Rubem Alves, dado o profundo potencial de sensibilização, reflexão e resgate do humano e encantamento para a vida, que essas proporcionam, tanto para alunos quanto para professores. Todavia, articulado a literatura, para a transposição didática dos conteúdos das áreas específicas, utilizamos o origami como técnica. O qual possibilitou que os resultados alcançados fossem além do imaginado, pois, a dedicação e o comprometimento dos alunos permitiram a percepção, de que efetivamente ensinar é cheio de limites e possibilidades. E que cada vez mais, torna-se urgente que as práticas pedagógicas, rompam com o paradigma da fragmentação em detrimento do paradigma da complexidade. Pois, diferentemente do comportamento adotado por Sísifo, representante da mitologia grega, aprender “não é repetir”. Mas sim, mobilizar competências e habilidades na construção do conhecimento, esse que é para a vida, e não simplesmente para responder a demandas escolares, como provas e exercícios. Palavras-chave: Educação Básica. Interdisciplinaridade. Ensino e aprendizagem. Introdução

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O presente texto visa provocar e compartilhar com o leitor a reflexão que nos motivou

para o desenvolvimento, da prática pedagógica, que será relatada a seguir: Qual é a escola

necessária para as nossas crianças, adolescentes e jovens brasileiros?

Na tentativa de realizar alguns apontamentos para essa questão torna-se necessária a

discussão e a compreensão do contexto da escola moderna e, do perfil dos sujeitos que

freqüentam essa escola.

Afinal, as profundas mudanças pelas quais o mundo tem passado, seja nas dimensões

econômicas, tecnológicas ou cientificas, têm implicado profundamente no contexto escolar. E

assim, a educação continua sendo complexa, dado o seu alto potencial emancipatório.

Uma aprendizagem que seja emancipatória necessita também ser significativa. O que

requer, portanto, do professor, a capacidade de inovar e criar em suas práticas pedagógicas,

para facilitar o desenvolvimento de todas as potencialidades humanas.

Ensinar é cheio de limites, porém repleto de possibilidades. Que esse relato seja um

ponto de partida para novos diálogos na constituição daqueles, que enquanto professores,

desejam avidamente atender às demandas do mundo e da educação atual, principalmente no

que diz respeito a construir conhecimentos, que sejam para a vida.

O mito de Sísifo como paradigma educacional A narrativa de Sísifo pode ser comparada a de muitas das práticas pedagógicas

atualmente desenvolvidas nas escolas de educação básica.

Sísifo, um dos representantes da mitologia grega, foi castigado a rolar uma enorme

pedra até o alto de um morro. Porém, quando a pedra já estava quase no mais alto do morro,

era impelida por uma força repentina, e rolava novamente. Sísifo insistia, a empurrava morro

acima, mas era em vão, a pedra voltava a rolar morro abaixo.

O mito de Sísifo é a representação fiel de muitas práticas pedagógicas, nas quais, para

o professor o aprendizado se dá pela repetição. E, portanto, ao aluno cabe memorizar os

conteúdos, copiar inúmeros exercícios, decorar expressões que não fazem nenhum sentido.

Nesse contexto portanto, as inúmeras dimensões do ser humano são negadas pois, para Morin

(2007) o ser humano é, “a um só tempo, biológico, físico, psíquico, social, cultural e

histórico”.

Todavia, como na escola os conhecimentos são propostos e trabalhados nas disciplinas

de maneira fragmentada, torna-se difícil para os alunos perceberem as conexões entre o ser

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humano e “os componentes biológicos e físico-químicos do mundo em que vivemos”

(MORAES, 2004, p. 01).

Construindo novas narrativas educacionais A sociedade atual tem sido marcada por constantes transformações. E para Moraes

(2007, p.04) “a educação constitui um instrumento determinante na relação recursiva entre a

organização humana e as visões de mundo mediante a sua ação na construção e reprodução de

crenças e valores”.

Porém, o professor ao ensinar de forma rotineira, ao invés de contribuir para a

construção de novas visões de mundo, apenas instiga a reprodução dos valores já dominantes.

Behrens (2006, p.15) argumenta, que os alunos tem dificuldade para “perceber o sentido de

ser humano, pois estudam os conteúdos para fazer provas e não para aprender a viver”.

Como uma alternativa a essa fragmentação torna-se necessário o desenvolvimento de

práticas pedagógicas integradoras, as quais sejam capazes de estimular a experimentação, a

pesquisa e a descoberta, em vez da rotina e da memorização. Para que então a aprendizagem,

seja significativa.

Imbuídos do desejo de uma aprendizagem significativa, para nossos alunos e de inovar

em nossas práticas pedagógicas, desenvolvemos uma prática educativa integradora entre

Ciências Naturais, Língua Portuguesa e Matemática, tendo a Arte como a sincronia desse

processo, na Escola Municipal Professora Ada Sant’Anna da Silveira, com os alunos das

séries finais do ensino fundamental, na Rede Pública de Ensino de Joinville, Santa Catarina.

Construir o conhecimento usando as sensações, as emoções e a razão foi o desafio

proposto aos alunos, através das atividades do projeto Biodiversidade.

A proposição das atividades deu-se de forma relacional, à medida que a partir da

técnica do origami e kirigami, tanto os conceitos de Ciências (ecossistema, cadeia alimentar,

relações ecológicas, desequilíbrio ambiental, extinção de espécies e poluição) quanto os de

Língua Portuguesa (figuras de linguagem e gêneros textuais) e os de Matemática (noções de

ângulos, semelhança entre figuras, cálculo de área e perímetros, aplicação do teorema de

Tales e Pitágoras, interpretação de gráficos e sistema de medidas) puderam ser construídos.

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Figura 1: Ecossistema produzido pelos alunos utilizando como técnica o origami.

Fonte: As autoras

Todavia, a construção desses conhecimentos necessitava ser percebida pelos alunos,

quanto ao sentido e ao significado que esses conhecimentos fariam em sua vida. Um dos

imperativos da pós modernidade tem sido a necessidade de discussão e ação frente às

problemáticas socioambientais atuais. Dado a emergência dessas problemáticas, abordar as

questões socioambientais possibilitou, que os conteúdos vistos em sala de aula, pudessem ser

utilizados na resolução de problemas do cotidiano.

A abordagem dessa temática foi realizada juntamente com os alunos utilizando-se da

obra literária A menina e o pássaro encantando de Rubem Alves. A partir da leitura e

apreciação dessa obra, os alunos reescreveram a história, utilizando os conhecimentos

construídos para construir o enredo.

A seguir, apresentamos um dos trechos da obra original, a qual é repleta de poéticas,

que serviram então, de tema gerador ao trabalho desenvolvido:

As suas penas também eram diferentes. Mudavam de cor. Eram sempre pintadas pelas cores dos lugares estranhos e longínquos por onde voava. Certa vez voltou com o corpo coberto por penas coloridas, com a cauda e as asas refletindo imagens da floresta (ALVES, 1999, p. 08)

Na reescrita da história, realizada pelos alunos, o enredo foi construído de forma que

pudessem ser discutidas as problemáticas socioambientais que vivemos para propor atitudes,

que pudessem minimizá-las. Nesse sentido, o enredo reescrito, sempre contemplava as

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características ecológicas do ecossistema apresentado, e as problemáticas que vem

enfrentando, devido às ações antrópicas.

No texto original Rubem Alves, usando do personagem do pássaro encantado,

descreveu uma das paisagens visitadas, da seguinte maneira:

[...] menina, eu venho de montanhas frias e cobertas de neve, tudo maravilhosamente branco e puro, brilhando sob a luz da lua, nada se ouvindo a não ser o barulho do vento que faz estalar o gelo que cobre os galhos das árvores. Trouxe, nas minhas penas, um pouco do encanto que eu vi, como presente para você (ALVES, 1999, p.13)

E, na reescrita realizada pelos alunos, houve então a identificação da paisagem, quanto

as suas características ecológicas. Possibilitando assim a caracterização do ecossistema e as

alterações que tem sofrido. A seguir, apresentamos um trecho do enredo construído pelos

alunos: “Menina, venho de um lugar de belezas extraordinárias, onde a mãe natureza mostra

o seu explendor, refletindo seu infinito amor no verde das árvores, na transparência das

águas, na maciez da terra e no colorido dos animais. Nesta terra de tantas maravilhas há

também a destruição, ficando o colorido das matas ofuscado pelas queimadas e invasões

daqueles que dizem ser seus amigos. E, assim, ele começava a cantar as canções e as

histórias daquele mundo que a menina nunca vira. Até que ela adormecia, e sonhava que

voava nas asas do pássaro.

Figura 2: Livro produzido pelos alunos utilizando o origami com a reescrita da história.

Fonte: As autoras

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Nesse contexto, percebe-se que os alunos puderam educar-se pela via do sensível. E,

que para Pillotto (2007, p. 14) é necessário e repleto de possibilidades, educar pela via do

sensível, à medida que:

Educar pelo e para o sensível pode ser um caminho possível para a educação que se propõe. Mediar conhecimentos, é compreender o ser humano, comprometer-se com a ética, com a estética, com o conhecimento também sensível, com a vida e com tudo o mais que faz sentido e gera mudanças em produções de sentidos.

A reescrita da obra de Rubem Alves proporcionou aos alunos então que manifestassem

a sua via do sensível e vivenciassem o “saber cuidar” na suas mais variadas dimensões.

Entretanto, para os alunos, apenas a reescrita da história, não era o suficiente. Estavam

ávidos por outras atividades, nas quais pudessem manifestar suas sensibilidades. E como outra

ação do projeto, realizaram a encenação da história, uma atividade bastante envolvente à

medida que necessitaram produzir os cenários, escolher os personagens, ensaiarem o teatro.

Tal atividade possibilitou que diferentes habilidades e competências inerentes ao seres

humanos fossem desenvolvidas.

E, acreditamos que tais possibilidades precisam ser constantes no espaço escolar. Pois,

“a educação deve ser considerada pelo seu papel fundamental no processo de construção de

novos estilos de desenvolvimento para as sociedades humanas que levem ao enfrentamento

efetivo das suas principais questões” (PEREIRA, 2003, p.05).

A prática docente na perspectiva interdisciplinar

Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas. Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado. (Alves, 2001, p.01)

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O mundo contemporâneo vem passando por uma profunda e acelerada reestruturação

que afeta a vida política, econômica, social e cultural. E essa reestruturação afeta o planeta

como um todo. Esse cenário, que é complexo e inédito, exige da humanidade, um novo jeito

de ser, ver, pensar e agir, para que se alcance a mudança necessária.

Nesse contexto, uma fala recorrente é a de que a educação está em crise. Todavia, de

acordo com Cortella (2008, p.09) “não é privilégio da educação, essa crise, todos os setores

sociais vivem sucessivas e contínuas crises”. Entretanto, a crise aqui não é entendida como o

colapso, mas sim como o caminho, a possibilidade, para que alternativas sejam construídas e

o processo modificado.

E no campo da educação essa mudança, é possível a largos passos, mesmo que em

tempos específicos, afinal todas e todos que atuamos na educação, lidamos com formação e

informação, trabalhamos com o conhecimento. E o conhecimento preconiza um processo de

construção. Para Cortella ainda (2008, p. 32) “enquanto educadores que somos, somos antes

da mais nada, construtores de sentido, porque fundamentalmente somos construtores de nós

mesmos, a partir de uma evolução natural”.

E, portanto, torna-se necessário re (introduzir) no espaço escolar o princípio de que

toda a morfogênese do conhecimento tem algo a ver com a experiência do prazer, do

“saborear”, da sabedoria, pois a experiência da aprendizagem implica, além da informação, a

(re) invenção e construção personalizada do conhecimento (PEREIRA, 2010, p.01). E, nisso o

prazer do “sabor” representa uma dimensão chave. “Saborear” com o “entendimento” do que

é “pensar certo”, constituem novo exercício docente quando se pensa em ações educativas.

Se, educar é fazer emergir vivência do processo de conhecimento, a “arte suprema do

mestre consiste em despertar o gozo da expressão criativa e do conhecimento” (Albert

Einstein) é preciso substituir a pedagogia das certezas por uma pedagogia da pergunta, do

melhoramento da pergunta. Uma pedagogia da complexidade, que saiba trabalhar com

conceitos integrados e abertos para o imprevisto, pois, para Pereira (2010, p.02):

Entender o processo de “pensar certo” e de que o “saber precisa ter sabor” parece nos inserir numa lógica desafiadora, instigadora de curiosidade e de prazer da atividade educativa. Este saber/sabor na tarefa de educar, tem tudo a ver com sedução, tão defendida por Rubem Alves. Segundo ele, o(a) educador(a) é quem consegue desfazer resistências ao prazer do conhecimento. Seduzir para o quê? Para um saber / sabor. Um conhecimento com fruição. E, para quem? Para o encantamento do sujeito do conhecimento (professor e aluno).

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Pensar um professor numa perspectiva de educação para o conhecimento/

entendimento saboreado é atentar para um outro paradigma educacional: o da efetivação de

uma prática investigativa, integradora, dialógica e refletida.

Pois, educar é provocar perguntas. São elas que desafiam a inteligência. Afinal:

O sujeito da educação é o corpo porque é nele que está a vida. É o corpo que quer aprender para poder viver. É ele que dá as ordens. A inteligência é um instrumento do corpo cuja função é ajudá-lo a viver. Nietzsche dizia que ela, a inteligência, era "ferramenta" e "brinquedo" do corpo. Nisso se resume o programa educacional do corpo: aprender "ferramentas", aprender "brinquedos". "Ferramentas" são conhecimentos que nos permitem resolver os problemas vitais do dia a dia. "Brinquedos" são todas aquelas coisas que, não tendo nenhuma utilidade como ferramentas, dão prazer e alegria à alma. No momento em que escrevo estou ouvindo o coral da 9ª sinfonia. Não é ferramenta. Não serve para nada. Mas enche a minha alma de felicidade. Nessas duas palavras, ferramentas e brinquedos, estão o resumo de educação. Ferramentas e brinquedos não são gaiolas. São asas. Ferramentas me permitem voar pelos caminhos do mundo. Brinquedos me permitem voar pelos caminhos da alma. Quem está aprendendo ferramentas e brinquedos está aprendendo liberdade, não fica violento. Fica alegre, vendo as asas crescer... Assim todo professor, ao ensinar, teria que perguntar: "Isso que vou ensinar, é ferramenta? É brinquedo?" Se não for é melhor deixar de lado. Alves (2001, p. 02)

E com o objetivo de que o conhecimento construído produzido em nossa escola possa

dar “asas” aos nossos alunos, entendemos que uma nova concepção de ação educativa precisa

permear o nosso espaço escolar. E tal concepção, pressupõe a complexidade, ou seja, a

construção de um processo que considere não apenas as partes, mas também o todo.

Ser professor é ter um papel social privilegiado, afinal estamos inseridos em um dos

processos mais vitais e fundamentais da humanização do homem: o dele apropriar-se do

conhecimento e fazer dele um instrumento de desenvolvimento de potencialidades.

Portanto, praticar a interdisciplinaridade nas aulas não significa negar a especificidade

das áreas do conhecimento, mas, sim, romper com a concepção fragmentada e praticar a re

(ligação) dos saberes. A re (ligação) dos saberes representa a compreensão da dimensão do

ser e do saber. Delors (1999) aponta que o processo de ensino e aprendizagem deve

desenvolver-se pautado sobre quatro pilares que se articulam e que devem ensinar o educando

a: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.

Esses pilares são interligados e, portanto, complementam-se à medida que contemplam

os diferentes níveis do processo de ensinar e aprender: conceitual, procedimental e atitudinal.

Portanto, uma ação pedagógica relacional, que conduza a um conhecimento da integração só e

possível a partir de um pensamento complexo. Pensamento complexo que une o que está

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dissociado, que concebe a educação como um processo ativo e dinâmico, que é capaz de

integrar as mais diferentes áreas do saber, a partir de um único objetivo: uma aprendizagem

significativa.

Praticar a interdisciplinaridade nas aulas não significa negar a especificidade das áreas

de conhecimento, mas sim romper com a concepção fragmentada, e praticar a re (ligação) dos

saberes. Praticar a re (ligação) dos saberes é praticar uma educação dialógica, à medida que se

pode aprender a rejuntar a parte e o todo, o texto e o contexto, o global e o local, a cultura das

humanidades e a cultura científica.

Sínteses Provisórias

Os conhecimentos cognitivos e sensíveis, que a arte possibilitou construir com os

alunos ao longo dessas atividades, traduziram-se em uma aprendizagem significativa. À

medida que se percebeu que para os alunos, os saberes construídos passaram a ter um sabor.

Este saber/sabor na tarefa de educar tem tudo a ver com sedução, que para Rubem Alves é o

educador (a) quem a consegue despertar.

E porque motivo é necessária essa sedução? Simplesmente, para que o saber, passe a

ter sabor ao fazer sentido, para a vida. Todavia, essa sedução, parte do princípio de um

encantamento, tanto para os alunos quanto para os professores.

A identidade docente se constitui em um caminho que é repleto de limites e

possibilidades. E, a construção desse caminho pressupõe ao professor, encantar-se, para

superar o paradigma educacional vigente. Nesse paradigma, a linearidade é quem rege os

processos educativos, e, portanto, a complexidade não encontra possibilidade, para ser

compreendida e praticada.

Muitas são as inquietações que permeiam o cotidiano docente, na busca, de uma

aprendizagem que seja para a vida. E, se de acordo com Alves (2008, p.44) “a tarefa do

professor é mostrar a frutinha, comê-la diante dos olhos dos alunos, erotizar os olhos.

Provocar a fome. Fazê-los babar de desejos. Acordar a inteligência adormecida. Aí a cabeça

fica grávida: prenhe de idéias”. Acreditamos que a educação pela via do sensível, mobilizando

diferentes habilidades e competências, seja a possibilidade para construirmos o mundo que

desejamos, tendo na educação o principal instrumento.

Afinal, como nos motiva Freire (2005) “não há outro caminho para quem quer ser

sujeito transformador da história pessoal e coletiva. Processo árduo e demorado, de poucos

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corajosos e de todos os oprimidos, mas gratificante pelo fato de nos fazer gente melhor. Gente

mais gente”.

Enfim, o futuro? É possibilidade... É encantamento ... E portanto, torna-se necessário

que ao contrário de Sísifo possamos em nossas práticas pedagógicas superar o caminho da

linearidade, em detrimento do caminho das relações. Pois, aprender “não é repetir”.

REFERÊNCIAS

ALVES, R. A menina e o pássaro encantado. 16 ed. São Paulo, Loyola, 1999. ________. Cenas da Vida. São Paulo, Papirus, 2008. ________. Gaiolas ou asas. Folha de São Paulo, São Paulo, 05 dez de 2001. Tendências e debates. Disponível em <http://www.rubemalves.com.br/gaiolaseasas.html>. Acesso em 28 ago de 2011. BEHRENS, M.A. Paradigma da complexidade: metodologia de projetos, contratos didáticos e portfólios. Petrópilis, Vozes, 2006 CAMUS, A. O mito de Sísifo. Tradução de Ari Roitman e Paulina Watch. 6 ed. Rio de Janeiro: Record, 2008. CORTELLA, M.S. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. 12 ed. São Paulo, Cortez, 2008. DELORS, J. Educação. Um tesouro a descobrir. 2. ed. São Paulo: Cortez, Brasília: MEC:UNESCO, 1999. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Saberes necessários à prática educativa. 39 ed. São Paulo, Paz e Terra, 2005. MORAES, E.C. de. Abordagem Relacional: Uma estratégia pedagógica para a educação científica na construção de um conhecimento integrado. In: Atas do IV Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, 2004, Anais ... Porto Alegre: ENPEC, 2004. ________. Ações pedagógicas relacionais. Florianópolis, 2007, Texto. MORIN, E. Os sete saberes necessários a educação do futuro. 12. ed. São Paulo, Cortez, 2007. PEREIRA, Y.C.C. Problemática ambiental: novos cenários educacionais - a compreensão do "ser em sua inteireza" e o conhecimento da integração. Revista de Educação Pública, Mato Grosso, v. 12, n. 21, p. 127-147, 2003.

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PILLOTTO, S.S.D. Educação pelo sensível. Linguagens – Revista de Letras, Artes e Comunicação. Blumenau. v. 1, n.2., p. 113-127, mai/ago, 2007.