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Saúde em Debate ISSN: 0103-1104 [email protected] Centro Brasileiro de Estudos de Saúde Brasil Keusen, Alexandre; da Luz Carvalho, Andréa A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro Saúde em Debate, vol. 32, núm. 78-79-80, enero-diciembre, 2008, pp. 161-171 Centro Brasileiro de Estudos de Saúde Rio de Janeiro, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=406341773016 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Saúde em Debate

ISSN: 0103-1104

[email protected]

Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

Brasil

Keusen, Alexandre; da Luz Carvalho, Andréa

A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio

de Janeiro

Saúde em Debate, vol. 32, núm. 78-79-80, enero-diciembre, 2008, pp. 161-171

Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

Rio de Janeiro, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=406341773016

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ARTIGO ORIGINAL I ORIGINALARTICLE

A construção de um serviço de base territorial: a experiência

do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro

The construction o[a territorial base service: the experience o[the CentroPsiquiátrico Rio de Janeiro

Alexandre Keusen 1

Andréa da Luz Carvalho 2

161

I Médico psiquiatra; douror em

Psiquiatria pelo lnsrituto de Psiquiatria

da Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ); dircco( do Cemro

Psiquiátrico do Rio de Janeiro (CPRJ) de

1998 a 2006; arualmenre fi.mcionário do

setor de Terapia de Família do Insriruro

de Psiquiatria da UFRj.

[email protected]

2 Psicóloga sanitarista; mestre em Saúde

Coleriva pelo Instituto de Medicina

Social da Universidade Estadual do

Rio de Janeiro (IMS/UERJ); analista

de Gestão em Saúde da Direroria de

Planejamemo Estratégico da Fundação

Oswaldo Cruz. (FIOCRUZ).

an dreadal [email protected]

RESUMO O artigo relata a trajetória do Centro Psiquidtrico Rio de Janeiro

(CPRJ), centro de atenção à saúde mentalpertencente à Secretaria Estadual de

Saúde do Rio de Janeiro, no atual contexto da Reforma Psiquidtrica no Brasil

A partir das políticas estaduais e municipais de Saúde Mental que orientam a

substituição de hospitais psiquidtricos por uma rede de serviços de saúde mental

de base comunitdria, o CPRJ vem se transformando em um serviço territorial

cada vez mais voltado a atender às necessidades da clientela do seu território de

forma complexa, incluindo o desafio de acompanhar clinicamente pacientes com

tramtornos mentais graves e moradores de rua.

PALAVRAS-CHAVE: Psiquiatria Comunitdria; Reforma Psiquidtrica; Saúde

Mental; Política de Saúde; Serviços de Saúde Mental; Reforma dos Serviços

de Saúde.

ABSTRACT The article states the trajectory ofthe Centro Psiquidtrico Rio de

Janeiro, a center ofattention to mental health belonging to the State Clerkship

ofHealth ofRio de Janeiro in the current context ofthe Brazilian Psychiatric

Reform. Starting fiom the state and municipal politics ofMental Health, that

gives orientation to a replacement ofpsychiatric hospitais for a net ofservices of

Mental Health ofcommunity base, Centro Psiquidtrico Rio deJaneiro have been

transformed throughoutyears into a territorialservice ofcomplex assistanceflcused

on the needs ofthepatients, including the challenge offollowing-up patients with

serious mental disorders and homeless people.

KEYWORDS: Community Psychiatric; Psychiatric Reflrm; Mental Health;

Health Policy; Mental Health Services; Reformulation ofHealth Services.

Sll1,dum D~bau, Rio de Janeiro, v. 32, 11. 78/79/80, p. 161-171, jan.ldt.oz. 2008

Anotacao
Título do Artigo: A CONSTRUÇÃO DE UM SERVIÇO DE BASE TERRITORIAL: A EXPERIÊNCIA DO CENTRO PSIQUIÁTRICO RIO DE JANEIRO Autor(es): Alexandre Keusen, Andréa da Luz Carvalho a_Alexandre_Keusen a_Andréa_da_Luz_Carvalho
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162 KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A consrrução de um serviço de base territorial; a experiência do Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro

INTRODUÇÃO

A parrir do final da década de 1970, um movimenro

político que questionou o tratamento hospiralocêntrico

de doentes mentais (AMARANTE, 1995) e criou as bases

das políticas e técnicas na área da Saúde Mental do

final da década de 1980 e da década de 1990, ajudou a

fundar O conceito de Reforma Psiquiátrica atualmente

já absorvido no dia-a-dia de gestores, profissionais da

Saúde Mental e usuários.

A Reforma Psiquiátrical consiste em um conjunto

teórico e prático de transformações nas áreas da política

de saúde, da clínica e da cultura, que tem como pres­

suposto e critério ético a inclusão do doente mental

na sociedade, bem como O seu tratamento em serviços

de base comunitária e a sua inscrição social como um

cidadão de direitos'-

A redução dos leitos psiquiátricos e a expansão

de uma rede de serviços comunitários têm sido uma

das esrrarégias implantadas pelo Minisrério da Saúde a

parrir da década de 1990, que visa à inclusão social do

doente mental e o seu rraramenro priorirário em servi­

ços aberros como, por exemplo, os Cenrros de Arenção

Psicossociais (CAPS).

Esre arrigo prerende relarar a hisrória da rransforma­

ção de um hospiral psiquiárrico em um Cenrro Inregrado

de Saúde Menral. Hoje, considerando-se a polírica que

privilegia a implantação de uma rede comunirária, é de ex­

rrema imporrânciase pensar no que pode ser feito com os

equipamentos hospiralares psiquiárricos públicos. É nesse

sentido que o arrigo prerende acrescenrar algo: relarando

a experiência das modificações ocorridas na assisrência

de um hospital psiquiátrico que procurou aproximá-lo

cada vez mais dos modelos comunitários atualmente

preconizados pela política de Saúde Mental.

BREVE HISTÓRICO DO CENTRO

PSIQUIÁTRICO RIO DE JANEIRO

o Centro Psiquiátrico Rio De Janeiro (CPRj) é

um centro de atenção inregrado de Saúde Mental sob a

administração da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de

Janeiro (SES/R]). Criado em agosto de 1998, a partir da

transferência do Posto de Atendimento Médico (PAM)

Psiquiátrico localizado na Avenida Venezuela (antigaft • • ','emergenCla pSlqUlatrlca que, nos anos 1970, cenaalizava

todas as inrernações dos pacienres segurados do Insrituto

Nacional de Previdência Social, INPS), caracreriza-se• ft" " •por um serviço com emergenCla pSlqUlarnca que conra

com uma Enfermaria, dispõe de 18 leiros psiquiárricos

(oito femininos, sete masculinos e três extras), um am­

bularório e um hospiral-dia.

A missão do CPRJ rem sido desenvolver projeros e

ações volrados à c1ienrela com transrornos menrais, em

especial àqueles com quadros mais graves e dificuldades

nas relações sociais. De 1998 a 2006, foi concebido

em adequação às Políricas Públicas volradas para a

Reforma Psiquiárrica desenvolvidas pelo Minisrério

da Saúde (MS), SES/RJ e pela Secreraria Municipal de

Saúde do Rio de Janeiro (SMS/R]). Aruando de forma

inregrada, os serviços do CPRJ buscavam arender essa

c1ienrela em situações de crise e de acordo com suas

demandas coridianas.

~ O ~onceiro de reforma psiquiátrica no Brasil sofreu a inAuência dos movimentos de reforma psiquiátrica na Europa e EUA, mas principalmeme teve comomsplração o modelo de reforma italiano (ver DESVIAT. 2001 e ROTELLI; LEONARDIS; MAVRI, 1990).

2_A lei 1.0.21612001 (BRASIL, 2004A) regulamenta os direiros dos doentes mentais e os tipos de internação. M repercussões clínicas e políricas desra legislaçãosao analisadas por Delgado (2001).

Stltid~ ~m Debau, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80, p. 161-171, jan.ldcz. 2008

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KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro 163

No início, em 1998, era como um hospital psi­

quiátrico; possuía 15 leitos para curta permanência nos

quais era feita a avaliação da internação psiquiátrica e,

quando necessário, o encaminhamento de pacientes

para clínicas privadas contratadas do SUS. Possuía,

também, um ambulatório predominantemente de

psiquiatras e um hospital-dia incipiente. Seu papel era

ser mais um hospital psiquiátrico que concentrasse os

recursos e a clientela de todo o município e estado do

Rio de Janeiro. Com o avanço das Políticas Públicas

voltadas à abertura de serviços territoriais que dessem

conta das demandas da clientela em seu entorno, como

os Centros de Atenção Psicossociais (CAPs), a política de

controle e regulação dos leitos psiquiátricos' bem como

o início das discussões entre os serviços do entorno do

hospital através do Fórum de Saúde Mental da Área

Programática LO' (a partir do segundo semestre de

2006), o CPR] realizou transformações em seu projeto

rerapêutico institucional no sentido de caminhar para

o perfil de uma unidade assistencial em Saúde Mental

mais engajada em responder às necessidades e demandas

da população adscrita ao hospital.

É preciso ressaltar que, na área de Saúde Mental, a

oferta de recursos mais próximos do local de moradia dos

pacientes e o sentido de responsabilização das equipes

pelo seu acompanhamento é o modelo que traz melhores

resulrados em relação à diminuição na necessidade de se

utilizar a internação, que geralmente é um recurso que

onera o sistema de saúde e não deve ser utilizado como

único recurso terapêutico. Outro ponto importante a

ser desracado, é que os contextos do paciente e da sua

família devem ser considerados relevantes para o trata­

mento dos transtornos mentais.

É nesse sentido que a sua clientela alvo, prioritária

para acompanhamento no ambulatório e hospital-dia,

é a residente na área do centro do município do Rio de

Janeiro e adjacências (área programática 1.0). No entan­

to, ele ainda permanece como um dos quatro pólos de

emergência psiquiátrica da cidade do Rio de Janeiro5,

oferecendo atendimento 24 horas e sendo responsável

pela avaliação da necessidade de internação. Seus leitos

são regulados desde maio de 2003 pela Central de Re­

gulação da SMS/RJ.

É importante destacar, ainda, os projetas voltados

a especificidades de determinadas clientelas. O aten­

dimento à população de rua com transtornos mentais

realizado no hospital-dia, em parceria com O Instituto

de Psiquiatria/UFRJ, e o projeto PATER, desenvolvido

no ambulatório e voltado para a população idosa tam­

bém portadora de transtornos mentais, são exemplos

desses projetos.

Ressalta-se que o projeto terapêutico da insti­

tuição é oferecer serviços (internação, atendimento

mutiprofissional na emergência e consultas em diversas

especialidades tais quais: psiquiatria, psicologia, assis­

tência social, enfermagem, terapia ocupacional, oficinas

terapêuticas, atendimento à família, grupos terapêuticos

e atividades artísricas) para a clientela com transtornos

mentais, levando-se em consideração o quadro clínico

e a situação social dos pacientes. O desafio do CPRJ é

criar projetos que respondam às diversas necessidades

de sua clientela.

J A partir de maio de 2003, a SMS Rio de Janeiro passou a regular rodos os leiros psiquiárricos públicos e privados contrarados da Cidade do Rio de Janeiro.O CPRJ, junto com os ourros rrês pólos de emergência psiquiátrica (Hospital Municipal Jurandyr Manfredini (HMJM), Insrirura Municipal Philippe Pinel(IMPP) e Insriruco Municipal Nise da Silveira), passou a integrar esse processo de regulação, configurando-se como avaliadores da imernação psiquiárrica dacidade (solicirantes e execuranres de internação psiquiárrica). Seus !eiras eram prefereneialmenre reservados à sua cliemela.

• O CPRJ esrá localizado na Praça da Harmonia, no bairro Saúde, na área programárica 1.0. Essa área possui uma projeção da população para 2007 de 228.549habiranres, segundo dados do insrjruro Pereira Passos (Prefeirnra da Cidade do Rio de Janeiro). Os bairros oficiais que compõem esra AP são: Cenrro, Saúde.Gamboa, Rio Comprido, São Crisróvão, Sanra Tereza, Mangueira, Paquerá, Sanro Crisro, Cidade Nova e Caju.

sOs otlrros rrês pólos psiquiárricos são o HMJM. o PAM Rodolpho Rocco e o IMPr, sendo que o HMJM e o IMPr são também hospirais psiquiárricos.

Sll1,dum D~bau, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80. p. 161-171, jan.ld(."Z. 2008

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164 KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial; a experiência do Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro

Na época da mudança do antigo PAM Venezuela,

o centro se encontrava em clara decadência, sendo des­

crito como uma 'pocilga' pelo coordenador de saúde

do Ministério da Saúde em 1987. Já o seu processo de

transformação foi avaliado duas vezes pelo Programa

Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar (PNASH)

(BRASIL, 2004A) como a melhor unidade do Estado do

Rio de Janeiro.

Neste texto relataremos a evolução desta experi­

ência, avaliando o ano de 2006 em comparação com

o período de 2000 a 2005 6, através da compilação

de indicadores da assistência e outros relatos sobre as

mudanças dos serviços que objetivavam construir um

serviço de Saúde Mental de base territorial.

o FLUXO DE PACIENTES NO CPRJ

Como já diro anteriormente, o CPRJ se configura

como um dos quatro Pólos de Emergência Psiquiátrica

no Município do Rio de Janeiro, responsável pela ava­

liação da necessidade de internação. A porra de entrada

para os seus diversos serviços como enfermaria, ambu­

latório e hospital-dia é a emergência que funciona 24

horas, sete dias por semana.

Caso haja necessidade do paciente permanecer in­

ternado, ele é encaminhado à enfermaria, onde a equipe

realiza uma avaliação sobre a sua permanência ou solicita

à Central de Regulação um leito para asua transferência.

Essa decisão é feita com base em diversas variáveis como

o local de moradia do paciente, acompanhamenro do

paciente por algum serviço do CPRJ e, sobretudo, sua

situação clínica.

O ambulatório é aberro preferencialmente aos

pacientes que residem na área programática 1.0 do

município do Rio de Janeiro, mas mantém assistência

a todos os pacientes de outras regiões do município e

Estado do Rio de Janeiro que já se encontravam em

acompanhamento na Unidade.

O hospital-dia acompanha preferencialmente

novos pacientes, moradores da área programática 1.0

do município do Rio de Janeiro, e pacientes antigos de

outras regiões do município e Estado do Rio de Janeiro.

Esse é um dos poucos serviços no Estado que possuem

um projeto terapêutico para o acompanhamento de

população de rua.

As equipes realizam reuniões semanais internas

para discussão dos casos e dos problemas dos serviços;

seus coordenadores reúnem-se semanalmente com a

Direção para que haja maior integração entre os vários

serviços. As equipes também fazem reuniões entre si

para discutir casos.

INDICADORES DA ASSISTÊNCIA

Emergência e enfermaria

Houve um aumenro nos atendimentos feiros na

emergência e no ambulatório no período de 2000 a

2005, sendo que registrou-se uma diminuição no nú­

mero de atendimenros na emergência nos anos 2000

e 2001, enquanto no ambulatório manteve-se um

aumento em todo o período. Em 1999, o ambulatório

realizava 14.996 atendimentos; em 2005 esse número

6 O CPRJ começou a desenvolver um sistema próprio de registro de informações desde a sua inauguração, em 1998. Todos os pacientes que entram na emergênciasão registrados nesse sistema. No decorrer desses oiro anos, foram feiras discussões com as equipes dos diversos serviços nas reuniões semanais de Direção visandointegrar suas informações, ou seja, que o regisuo do pacieme poderia ser visualizado em todas os departamemos de ações terapêuticas no hospital. Tal sistemapermiriu também a realiz.ação de esrudos sobre a reimernação dos paciemes para uma melhor formuJação dos projeros terapêuticos das equipes. A partir do ano2000, o sistema passou a ser alimentado com informações mais contínuas.

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cresceu em 95% (29.257 atendimentos). Já no ano

2006, houve uma diminuição de 12% nos atendimentos

de emergência em relação a 2005 (Gráfico 1).

Dentre os fatores para a diferença no desempenho

da emergência e do ambulatório, destacam-se: a análise

da demanda que chega ao CPRJ e que, em grande parte,

reflere a oferra ainda insuficiente de serviços de saúde

mental na Cidade do Rio de Janeiro; as dificuldades de

articulação entre os diversos serviços em uma cidade

de aproximadamente seis milhões de habitantes e com

uma história marcada pela presença maciça de hospitais

psiquiátricos na resolução dos problemas de quem sofre

de alguma desordem psíquica.

O desafio da implantação da Reforma Psiquiátrica

na Cidade do Rio de Janeiro está não só no aumento

de serviços extra-hospitalares que se responsabilizam

pelo acompanhamento de determinada clientela, mas

rambém na elaboração de processos de rrabalho que

estejam mais direcionados à necessidade da clientela

de ser considerada em sua integralidade e no faro de o

recurso da internação ser utilizado com critério técnico

definido por uma equipe multidisciplinar.

De 2004 a 2005, houve um aumento significativo

dos atendimentos feitos pela emergência do CPR] em

relação aos números anteriores, que variavam entre

10.000 e 12.500 atendimentos anuais. Em 2004, houve

16.059 atendimentos e em 2005 esse número subiu

para 17.125. Destacamos que no segundo semestre de

2005, houve a transferência de uma das Emergências

Psiquiátricas do Instituto Municipal Nise da Silveira para

o PAM Rodolpho Rocco. Esse acontecimento causou

alguns transtornos para a clientela, já acostumada ao

atendimento feito pelo Instituto Médico Nise da Silveira

já que foi feita uma distribuição desta clientela entre os

outros rrês pólos de emergência.

A diminuição no número de atendimentos em

2006 pode estar relacionada a alguns fatores internos

e externos ao funcionamento do CPRJ. Os fatores ex­

ternos dizem respeito a uma tendência, que se iniciou

em 2003 e acelerou durante esse ano, dos serviços a se

responsabilizarem preferencialmente por suas clientelas

mais adscritas, visando o seguimenro desses pacientes

inclusive com ações em seu território de moradia; ou­

tro faror imporrante foi a ação da Assessoria de Saúde

Mental da SES/R] no auxílio aos municípios do Estado

do Rio de Janeiro para organizar suas porras de entrada.

Já os farores internos dizem respeiro à rigorosa avaliação

dos pacientes no CPRJ pela equipe que, neste período

GRÁFICO I - Distribuição de atendimentos na emergência e no ambulatório no CPRJ de 1999 a 2006

60000.,-------------------,

50000 +--------------------j

40000 +-------------i

30000 +----

20000 +--

10000

o fJ-'-1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro - SES/R]. Censo Hospitalar J999-2006

o Emergência

OAmbulatório

.Total

Sll1,dum Debate, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80. p. 161-171, jan.ldt.oz. 2008

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166 KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial; a experiência do Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro

de oito anos, tornou-se multidisciplinar, inibindo cada

vez mais a distribuição de receitas (prática usual nas

emergências em geral) fazendo com que, dessa forma, O

•• •pacIente se engajasse em um tratamenro contInuo.

Um dos indicadores que ajuda a acompanhar o

desempenho das equipes de emergência é o percentual de

atendimenros na emergência que se rornam internações.

Como já foi diro anteriormente, esse indicador reflete

o esforço do CPRJ em tornar mais complexo o atendi­

mento em sua porta de entrada, de forma que a decisão

acerca da internação seja um critério técnico consentido

pelo médico juntamente com O psicólogo e o assistente

social. Os dados apresentados no Quadro 1 mostram a

relação entre o número de atendimenros na Emergência

Psiquiátrica do CPRJ e o número de internações.

Nesse período, a média percentual de internações

girou em torno de 16%. A partir de 2002, houve uma

tendência de queda mais expressiva com estabilização

entre 2004 e 2005 e nova queda em 2006. Analisando-se

os números absoluros de atendimenros na emergência e

o número de internações, percebemos, no entanro, que

houve uma queda significariva das internações em com­

paração aos anos de 1999 e 2006 (com uma diferença

de 943 internações, ou seja, queda de 41 %).

Chama-se atenção para o faro de o CPRJ ter uma

enfermaria dispondo de leiros de curta permanência.

Como já constatado, esses leitos foram inseridos na

Central de Regulação da SMS/RJ em maio de 2003,

quando os leitos psiquiátricos começaram a ser regu­

lados na cidade do Rio de Janeiro. O CPRJ é uma das

quatro portas de entrada que avaliam a necessidade de

internações psiquiátricas sendo que os 18 leitos da Enfer­

maria de Curta Permanência são disponibilizados para o

próprio CPRJ; quando há necessidade de transferência,

O hospital solicita um leiro à Central de Regulação.

Segundo dados do DATAsus/MS, o faturamento das

internações em um período de seis anos (2000 a 2005)

têm sido em média R$ 95.638,83, o que representa uma

média de 836 Autorizações de Internações Hospitalares

(AIH) por ano. Chamamos a atenção para o faro de que

o faturamento da AIH corresponde ao pagamenro das

internações de 24 horas e que muitas vezes o paciente

tem alta em menor período.

Na enfermaria, há um esforço da parte da equipe em

tornar essa internação o mais breve possível com a finali­

dade de inserir o paciente em serviços extra-hospitalares.

A enfermaria conta com uma equipe multidisciplinar

formada por médicos psiquiatras, enfermeiros, técnicos

em enfermagem, auxiliares de enfermagem, terapeutas

ocupacionais e assistentes sociais. A estada do paciente

no CPRJ não se limita à permanência no leiro e à ad­

ministração de medicamenros; a equipe multidisciplinar

QUADRO I - Percentual de atendimentos da emergência psiquiátrica do CPRJ que se rornaram internações de 1999

a 2006

Anos Número de atendimentos Número de internações %

1999 12.050 2.295 19,05

2000 10.130 2.205 21,77

2001 10.572 2.114 20,00

2002 11.956 2.051 17,15

2003 12.679 1.881 14,84

2004 16.059 1.967 12,25

2005 17.125 2.106 12,30

2006 11.882 1.352 11,38

Fonte: Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro - SES/RJ. Censo Hospitalar J999-2006

Stltid~~m Debau, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80, p. 161-171, jan./dcz. 2008

Page 8: Redalyc.A construção de um serviço de base territorial: a ... · Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal ... The construction o[a territorial

KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro 167

deve qualificar a assistência, oferecendo atividades no

pátio interno da enfermaria, e realizar grupos diários

com as famílias dos pacientes internados. Dessa forma,

acredita-se que o que faz diminuir O tempo de interna­

ção é a interlocução da equipe multidisciplinar com os

recursos apresentados para cada paciente visando, em

muitos casos, a sua intensificação e articulação.

O caminho para O setor é assumir integralmente

toda a clientela de seu território, tendo-se inclusive

ampliado o número de leitos voltados ao atendimen­

to, e não à transferência dos pacientes do território, e

procurar encaminhar os pacientes de outras localidades

para os outros pólos. Durante O ano de 2006, a equipe

da enfermaria começou a dar prioridade ao atendi­

mento a essa clientela, não mais transferindo aqueles

que morassem na região, fortalecendo os laços com

o hospital-dia e com ambulatório. Uma dificuldade

evidente, em função da limitação de recursos para se

lidar com os pacientes de outras regiões, ocorria espe­

cialmente em relação à clientela feminina que possuía

poucas alternativas de leitos disponíveis na cidade do

Rio de Janeiro.

Em 2005, iniciamos um processo de discussão no

CPR] que resultou em uma nova organização denomi­

nada de Setor de Atividades. O hospital-dia foi dividido

em um setor de atividade e um setor terapêutico, com

o objetivo de se organizar a demanda dos projetos tera­

pêuticos da clientela. Na enfermaria a equipe do 'pátio',

desde 2003, iniciara atividades no ambulatório com a

clientela da sala de espera e com atendimentos progra­

mados. Em 2006, com a fusão de todas as equipes envol-

vidas em projetos de atividades, houve a possibilidade de

oferecer a toda a clientela do CPR], independentemente

do local do atendimento, a possibilidade de envolvê-la

com programas de atenção específica, seja em termos

de terapia ocupacional, musico terapia, arte-terapia,

projetos vocacionais, entre outros. Isso, juntamente

com as transformações pelas quais a enfermaria passava,

apontava para O encaminhamento do projeto do CPR]

como uma unidade de atenção territorial no campo da

Saúde Mental.

De acordo com os dados apresentados no Quadro 2,

as médias dos indicadores hospitalares (taxa de ocupação

e tempo médio de permanência) aumentaram no

período de 2000 a 2005. Esses valores (principalmente

O tempo médio de permanência) expressam, em parte,

resultados do incremento das atividades na enfermaria

nesse período.

O Quadro 2 mostra, também, uma diferença

de 23 pontos entre as médias na taxa de ocupação de

2000 e 2006. Esse aumento pode estar relacionado às

dificuldades de obtenção de leitos femininos na cidade

do Rio de Janeiro. Principalmente em 2005, houve uma

drástica combinação de suspensão e redução de leitos

devido aos vários processos de auditoria e interdições

em hospitais psiquiátricos privados contratados pelo

SUS realizados pela Vigilância Sanitária da SES/RJ e

SMS/RJ. Em 2006, houve a suspensão de internações

na Clínica Valência, que oferecia 200 leitos ao sistema.

Essa medida resultou na modificação dos leitos psiqui­

átricos públicos que passaram a atender mais mulheres

do que homens, já que há uma oferta maior de leitos

QUADRO 2 - Taxa de ocupação e tempo médio de permanência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro no período

de 2000 a 2006 - médias

Indicadores hospitalares 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Taxa de ocupação 71% 79% 82% 80% 89% 85% 94%

Tempo médio de permanência (dias) 2 2 2 2 3 2,3 3,9

Fonte: Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro - SES/R]. Censo Hospitalar 2000-2006

Sll1,dum Debate, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80. p. 161-171, jan.ldt.oz. 2008

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168 KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A consrrução de um serviço de base territorial; a experiência do Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro

masculinos nas clínicas privadas contratadas pelo SUS

na cidade do Rio de Janeiro.

Em 2006, O CPRJ registrou em cinco meses (ja­

neiro, março, abril, maio e setembro) taxas de ocupação

maiores que 100%. Os rempos médios de permanência

nos leitos femininos (6,6 dias) sempre foram, em média,

maiores do que os masculinos (1,6 dias).

No entanto, ao analisar as altas dadas no período

(com exceção daquelas devido a óbito, transferência e

evasões), percebe-se que este indicador vem aumentando

gradativamente, podendo estar relacionado, mais uma

vez, ao trabalho da equipe da enfermaria. O Quadro 3 de­

monstra que a média percentual de altas dadas pela equipe

da enfermaria em relação à média do total de internações

no período aumentou significarivamente, havendo uma

diferença de 15 pontos entre 2005 e 2006.

Houve apenas 11 óbitos no período de 2000 a

2006: dois no ano de 2000, um em 2001, um em

2002, dois em 2003, dois em 2004, rrês em 2005 e um

em 2006. Segundo porraria do Minisrério da Saúde n°

251/2002 do Programa Nacional de Avaliação do Sisre­

ma Hospiralar (PNASH) (BRASIL, 2004B) que orienra a

estrurura e funcionamento dos hospitais psiquiátricos,

o CPRJ deve ter uma estrutura de pouca complexida­

de atender às ocorrências clínicas. Observa-se que a

maior parre das causas de morre esteve relacionada à

dificuldade de ral pacienre ser inserido e acompanhan­

do clinicamente pela rede de saúde em geral e não à

desordem psiquiátrica.

Ambulatório e hospital-dia

O ambulatório do CPRJ oferece atendimento indi­

vidual e em grupo por médicos psiquiatras, psicólogos e

assistentes sociais, para pessoas maiores de 18 anos. Nos

úlrimos quarro anos, definiu-se que a clienrela de primeira

vez deveria ser moradora dos bairros localizados na área

programática 1.0 do Município do Rio de Janeiro, mas

há ainda pacientes de outras áreas programáticas do mu­

nicípio e da Baixada Fluminense que são acompanhados.

Essa escolha se deu devido a um grande número de falras

às consulras marcadas de pacienres de áreas mais disranres

e, rambém, para que o serviço pudesse utilizar melhor

toda sua capacidade. De acordo com o Quadro 4, houve

QUADRO 3 - Inrernação e alra hospiraJar no Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro no período de 2000 a 2006 - médias

Indicador hospitalar 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Internação 187 176 176 158 159 175 113

Altas hospitalares 36 36 43 42 43 39 42

% 19% 20% 24% 27% 27% 22% 37%

Fome: Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro - SES/R]. Censo Hospitalar 2000-2006

QUADRO 4 - Atendimentos de primeira vez e subseqüenres no Ambulatório do Cenrro Psiquiátrico Rio de Janeiro

- período 2000 a 2006

Tipo de atendimento 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Inicial 1.651 1.565 2.545 1.839 1.782 1.300 1.012*

Subseqüente 18.901 19.705 22.768 28.577 28.832 30.523 27.736*

Total 20.552 21.270 25.313 30.416 30.614 31.823 28.748*

... Não está comabilizado o mês de janeiro

Fonte: Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro - SES/R]. Boletim de Atendimento Ambulatoria12000-2006

Smide em Debate, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80, p. 161-171, jan./dcz. 2008

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KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro 169

um aumento de 55% nos atendimentos do ambulatório

no período de 2000 a 2005.

O ambulatório do CPRJ desenvolve um projeto

especial voltado para a população idosa (projeto Pater),

que realiza avaliação neuropsicológica de pacientes com

suspeitas de demência e Mal de Alzheimer; dessa forma,

projetos terapêuticos específicos para estas clientelas

podem ser elaborados.

Outro projeto desenvolvido no ambulatório foi a

formação do núcleo de Psicanálise, com reuniões dos

técnicos de vários setores semanalmente. Essa equipe

ampliou de forma significativa o atendimento psico­

terápico na Unidade e, com sua discussão, influenciou

projetas na emergência e no hospital-dia.

O hospital-dia do CPRJ é voltado ao atendimento de• ••

paCientes com transtornos mentais graves e petSlstentes

cujos laços sociais encontram-se esmaecidos. É também

composto por uma equipe multidisciplinar: psicólogo,

médico psiquiatra, terapeuta ocupacional, assistente

social, auxiliares de enfermagem e oficineiros. Além das

tradicionais consultas realizadas por profissionais de nível

superior, o hospital-dia oferece atividades que visam à

reinserção psicossocial de pacientes como oficinas de

arte, marcenaria e culinária. Esse serviço oferece

alimentação para pacientes que freqüentam o serviço

em regime integral. O hospital-dia do CPR] possui,

também, uma associação de familiares, a Associação dos

Familiares, Usuários, Amigos e Funcionários do Centro

Psiquiátrico do Rio de Janeiro (AFAUCEP), que apóia as

famílias e pacientes do hospital-dia. O Quadro 5 mostra

o aumento de 22% nos atendimentos feitos no hospital­

dia do CPRJ, comparando-se os anos 2000 e 2006.

Segundo dados do DATAsus/MS apontados no Quadro 6

houve também um crescimento no faturamento do

hospital-dia no período 2000 a 2005.

O hospital-dia ainda realiza parcerias com as áreas

sociais da SES/R], da SMS/R] e com O Instituto de Psi­

quiatria da UFR] para o cuidado e acompanhamento de• ••

paCientes com transtornos mentais graves e petSlstentes

em situação de moradores de rua, em especial aqueles

que moram no centro da cidade e adjacências. Essas

parcerias implicam no abrigamento desses pacientes em

albergues e hotéis; a contrapartida dada pelo CPRJ é o

tratamento destes pacientes. Esse projeto foi incluído

entre as dez experiências bem sucedidas na III Confe­

rencia Nacional de Saúde Mental.

QUADRO 5 - Número de atendimentos de pacientes e familiares no hospital-dia do Centro Psiquiátrico Rio de

Janeiro - período de 2000 a 2006

Clientela atendida 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Pacientes 8.626 10.523 10.006 11.135 12.656 11.852 11.799

Familiares 1.227 849 698 592 420 270 271

Total 9.853 11.372 10.704 11.727 13.076 12.122 12.070

Fonte: Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro - SES/R]. Boletim de Atendimento Hospital-dia 2000-2006

QUADRO 6 - Valores totais anuais, em reais, de faturamento do hospital-dia do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro

- Período 2000 a 2005

Unidade 2000 2001 2002 2003 2004 2005

CPRJ 180.421,7 205.837,4 222.553,6 172.012,8 210.219,4 195.396,5

Fome: DATASUS/Minisrério da Saúde. Sistema de InjOnnações Hospitalares 2000-2005

Sll1,dum Debate, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80. p. 161-171, jan.ldt."Z. 2008

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170 KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base rerrimrial; a experiência do Cenrro Psiquiárrico Rio de Janeiro

CONSIDERAÇÕES FINAIS: UM SERVIÇO DE

SAÚDE MENTAL TERRITORIAL NO MEIO

DOCAMINH07

Destacamos que, ao final desses quase dez anos,

o CPRJ têm ampliado sua produção em todos os seus

serviços, procurando qualificar a assistência em Saúde

Mental de acordo com os princípios da Reforma Psi­

quiátrica, ou seja, garantir os direiros dos pacientes e

um tratamento humanizado, inserindo-o no social para•

romper preconceItos.

A arte adquiriu um papel especial como instru­

mento terapêutico e elemento de enfrentamento do

processo de exclusão e da luta contra o estigma dessa

clientela. Destacamos o projeto, chamado Convivendo

com a Música, que gerou o grupo musical Harmonia

Enlouquece composto pela clientela e técnicos da

Unidade, que já lançou dois CDs e vem se apresen­

tando em eventos públicos de importância social e

Casas de Espetáculos no projeto Loucos por Música e

outros, no Rio de Janeiro, Salvador, Santos, Brasília e

Porto Alegre. No projeto Convivendo com a Música,

semanalmente, a clientela se reúne para ouvir e tocar

música; pelo menos uma vez por mês eles recebem um

músico convidado: já foram recebidos um violinista da

Sinfónica de Snugart, uma banda punk de meninas

do Rio de Janeiro, uma banda de forró entre ourras

participações. Além da música as artes plásricas, poesia,

teatro e outras expressões artísticas foram vivenciadas

durante este período no CPR].

Em 2006, o hospi tal começou a desenvolver pro­

jetos de visitas domiciliares sistemáticas para pacientes

que residem da área do entorno do hospital, mas que

não conseguem aderir a nenhum dos seus serviços e,

também, serviços terapêuricos para moradores de rua

com transtornos mentaIs graves e persIstentes e que

não têm onde morar.

Analisando-se o modelo assistencial desenvolvido

pelo CPRJ de 1998 até o momento, pode-se dizer que

esse modelo está em processo de transição, ou seja,

ao longo deste período o hospital foi agregando à sua

função de avaliação da internação psiquiátrica ourros

serviços como ambulatório e hospital-dia, serviços que

se responsabilizam pelo acompanhamento de clientelas

e tornam o CPRJ uma instituição mais complexa vol­

tada ao seguimento da população residente nas áreas

próximas ao hospital.

Esta apresentação de uma experiência vivenciada

no CPRJ destaca que seu atual modelo assistencial se

aproxima mais das funções de um CAPS tipo III' (BRA­

SIL, 2004C), ou seja, uma unidade de Saúde Mental

voltada à população com transrornos mentais graves e

persistentes e que tenham dificuldade em estabelecer

laços sociais. A grande diferença é o fato de que o CPRJ

ainda possui uma emergência psiquiátrica e ainda cum­

pre a função de avaliação da internação psiquiátrica

para a cidade do Rio de Janeiro.

Isso nos permite demarcar a possibilidade de haver,

nas grandes cidades, um desenvolvimento de serviços

que possam atuar de forma integral e ser integrado à

rede, atendendo de forma territorial a clientela, seja

na crise, em sua demanda cotidiana ou no processo

de reabilitação.

Por fim, ressalta-se que as modificações realizadas

em seu modelo assistencial relacionam-se às necessi-

dades e negociações junro às Secretarias Estadual e

Municipal de Saúde do Rio de Janeiro com o intuito

de se implantar a polírica da Reforma Psiquiátrica.

7 Este título se deve ao falO de que o CPRJ, apesar de todas as modificações apresentadas o aproximarem de um serviço territorial, sua posição no CadastroNacional de Estabelecimentos de Saúde ainda é de hospital psiquiátrico.

8 Um CAI'S tipo II I se constirui como um serviço de atenção psicossocial de base territOrial que funciona 24 horas e possui no máximo cinco lei lOS para inrernaçãopsiquiátrica exclusiva de seus pacientes em acompanhamento.

Stltid~ ~m Debau, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80, p. 161-171, jan./dez. 2008

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KEUSEN, A.; CARVALHO, A.L. • A construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro 171

Ao mesmo tempo, todo o processo de construção da

diversidade de atividades só foi possível por causa do

engajamento de técnicos, usuários e seus familiares que,

através de debates públicos, assembléias e reuniões de

equipe, procuraram encontrar soluções para a melhoria

da assistência dada pelo CPRJ.

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reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: SDEIENSP, 1995.

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____o Ministério da Saúde. Portaria CM/MS n.

251, de 31 de janeiro de 2002. ln: Legislação em SaúdeMental: 1990-2004. 5. edição ampliada. Brasília, DF,

2004B. p. 118-124.

___o Ministério da Saúde. Portaria CM/MS n.

336, de 19 de fevereiro de 2002. ln: Legislação em SaúdeMental: 1990-2004. 5. edição ampliada. Brasília, DF,

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DELGADO, P,C.C. No litoral do vasto mundo: lei 10.216

e a amplitude da reforma psiquiátrica. ln: CAVALCANTI,M.T.; VENÂNCIO, ATA. (Org.). Saúde mental: campo,

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CUCA, 2001. p. 283-290

DESVIAT, M. A Reforma Psiquiátrica. Rio de Janeiro:

FIOCRUZ, 200 I.

ROTELLI, E; LEONARDIS, O.; MAuR!, D. Desinstitueiona­

lização, uma outra via: a Reforma Psiquiátrica italiana

no contexto da Europa e dos 'países avançados'. ln:

NICACIO, E Desinstitucionalização. São Paulo: Hucitec,

1990. p. 17-59.

Recebido: abr.l2008

Aprovado: ago.l200S

Sll1,dum D~bau, Rio de Janeiro, v. 32. n. 78/79/80. p. 161-171, jan.ldt.oz. 2008