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memóriamemóriamemóriamemóriamemória

A menina dos olhos do Radis

Estamos homenageando a revista mais lida do Radis: aSúmula. Criada em julho de 1882, nossa ‘menina dos

olhos’ trazia um resumo crítico das principais notíciassobre saúde publicadas nos jornais do país. Sua essênciacontinuou a mesma, mas sua diagramação sofreu suces-sivas mudanças, tornando a leitura visualmente mais agra-dável. A primeira edição apresentava somente textos.Em 1983, ainda sem ilustração, o nome ‘Súmula’ recebeidentidade visual própria. Em 1986, além da novalogomarca, a Súmula ganhouilustrações. Quase dezanos depois, com novalogomarca e mais ilustra-ções, ela ficou mais areja-da. Em 2002, a Súmula tor-nou-se mais ousada, comedições temáticas. Com aRevista Radis, a Súmulavirou Súmula da Impren-sa. De revista à seção,ela sempre manteve o seucharme original.

... e continua na página 5

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Memória 2! A menina dos olhos do Radis

Editorial 3! Sentimento globalizado

Caco 3

Cartas 4

Homenagem 4

Súmula da Imprensa 5

XII Conferência Nacional de Saúde 7! Governo chama sociedade paradiscutir os rumos da saúde

Programa Saúde da Família 8! Centros urbanos recebem apoiodo Ministério para ampliar PSF

Entrevista: 9Luiz Odorico Monteiro de Andrade

! Secretário de saúde do municípiode Sobral fala sobre redes municipaisde solidariedade

VI Congresso Cosem-SP 12! Secretários municipais de São Paulodiscutem descentralizaçãoe regionalização

Olimpíada da Saúde 14! Olimpíada científica mostraque é preciso mudar a educaçãoambiental no Brasil

Fome 15! A imprensa e o Fome Zero

Pneumonia Asiática 16! Um perigo que vem do ExtremoOriente

Água 17! Fórum Mundial alerta: vai faltarágua potável em 2025

Serviços 18

Pós-Tudo 19! O homem mais feliz do mundo

Ora, Pílulas... 19

Nº 9 — Maio de 2003

cacocacocacocacocaco

editorialeditorialeditorialeditorialeditorial

Sentimento globalizadoOmundo teme a guerra, o mundo

teme respirar os ares asiáticos, omundo teme a falta de água. O mundofinalmente unificado em torno de umsentimento comum, o medo globalizado.De avião, o agente da superpneumoniaatravessa fronteiras geográficas, políti-cas e ideológicas — como o vírus da Aidsjá o havia feito com eficácia — e peloscanais de comunicação sua fama o pre-cede. As assassinas e injustificáveis bom-bas de Bush, o Filho, explodem em to-das as casas do mundo onde haja umacaixa colorida, um rádio de pilha, umaplaca de fax-modem ou uma página dejornal. Ali, e pelos mesmos meios, espa-lha-se igualmente o terror do ditadoriraquiano e o estrondoso e vergonhososilêncio das organizações internacionaisa respeito de tantos outros regimesopressores e interesses alheios ao bem-estar das populações, durante todo essefuturo-do-pretérito chamado século XX.

Petróleo e água vão faltar, o pretoe o branco da simbiose energética yin-yang. Em alguns lugares, tal previsão jáé realidade cotidiana, doença e morte;em outros, desperdício, ostentação,gula, mera abstração. Questão de tem-po para esta tornar-se aquela. Em bre-ve, mais uma atração globalizada: a es-cassez, ampla, geral, irrestrita. Comodizia Aristóteles, não exatamente com

essas palavras, “a natureza tem limites,a ambição humana não”. Por aqui, emnosso Brasil, tenta-se globalizar a espe-rança (página 7) e a solidariedade (pági-na 9) de um jeito bem nosso, o quereveste de seriedade a carioquíssima fra-se do filósofo-pop Jorge Mautner: “Ouo mundo se brasilifica, ou vira nazista”.

O Programa Radis busca tramar re-des de informação e malhas de conheci-mento à velocidade da prensa, do som,da luz. Tramas bem urdidas, visando ao‘deslocamento de poderes’. Nesta edi-ção do Radis, inauguramos mais um com-promisso com os leitores, expresso nacapa da revista, concretização da res-ponsabilidade assumida diante do pró-prio ministro Humberto Costa: devemosatuar como a principal voz impressa dasquestões implicadas na já convocada XIIConferência Nacional de Saúde. Nos pró-ximos meses, a revista Radis apresenta-rá um histórico das mais importantes Con-ferências ocorridas, as teses principaisdesta nova Conferência, as expectativase perspectivas do ‘povo da saúde’ e dasociedade civil organizada em relação aela, e também coberturas pontuais e com-pleta das Conferências estaduais, muni-cipais e nacional, até o momento de suarepercussão nos organismos de governoe sociais do país. A XII Conferência Naci-onal de Saúde começa agora.

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Capa: Aristides Dutra

Imagem da capa: Monumento ao pequenojornaleiro (1933), de autoria do carica-turista Fritz, localizada na esquina da RuaSete de Setembro com a Av. Rio Branco,no Rio de Janeiro.

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RADIS 9 ! MAI/2003

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REPRODUÇÃO DE MATERIAL DA REVISTARADIS

Meu nome é Luciano Fuzér e soueditor da revista BioNotícias do

Conselho Regional de Biologia 2ª Re-gião (RJ/ES). Parabéns para toda aequipe pela excelente matéria so-bre pós-graduação publicada na re-vista Radis de março de 2003. Tendoem vista a importância que o con-teúdo do quadro Tudo que você sem-pre quis saber sobre a pós-graduaçãoe nunca teve coragem de perguntar(página 14) tem para os biólogos doRio de Janeiro e Espírito Santo, gos-taria de solicitar autorização para re-produzir esse quadro em nosso in-formativo mensal. Devo informar queestaremos citando a fonte, bemcomo o nome das colegas envolvidasna matéria.

Luciano Fuzér (por e-mail)

! Luciano, a reprodução de materialpublicado na revista Radis é semprepermitida, desde que citada a fontee dados os créditos de autoria.

expedienteexpedienteexpedienteexpedienteexpediente

RADIS é uma publicação da FundaçãoOswaldo Cruz, editada pelo ProgramaRadis (Reunião, Análise e Difusão de In-formação sobre Saúde), da Escola Nacio-nal de Saúde Pública (Ensp).

Periodicidade: MensalTiragem: 42 mil exemplaresAssinatura: GrátisPresidente da Fiocruz: Paulo BussDiretor da Ensp: Jorge Bermudez

PROGRAMA RADISCoordenador: Rogério Lannes RochaEditor: Caco Xavier

Subeditora: Ana Beatriz de NoronhaSubeditor Gráfico: Aristides DutraRedação: Katia MachadoAdministração: Luis Otávio e Vanessa

SantosEstudos, Pesquisas e Projetos: Justa

Helena Franco (gerência de pro-jetos), Jorge Ricardo Pereira eLaïs Tavares

EndereçoAv. Brasil, 4036, sala 515Manguinhos, Rio de Janeiro / RJCEP 21040-361Telefone: (21) 3882-9118Fax: (21) 3882-9119

E-Mail: [email protected]: www.ensp.fiocruz.br/publi/radis/

prgradis.htmImpressão e FotolitoEdiouro Gráfica e Editora SA

AULA DE CIDADANIA

Gostaria de parabenizar a revistaRadis pela reportagem Os direi-

tos do paciente com câncer, publicadana edição de novembro de 2002, por-que é disto que o cidadão brasileiroprecisa: conhecer seus direitos,principalmente em momentos tão di-fíceis. Parabéns por mais esta aulade cidadania!

Helio Francisco Kammers (por e-mail)São José — SC

FONTE DE PESQUISA

Sou mestranda em Saúde Públicapela Universidade Nacional de

Rosário (Argentina), em convêniocom a Universidade da Região daCampanha (Urcamp) e fui contem-plada com o excelente conteúdodas matérias da série especial For-mação profissional em saúde. Es-tou na fase da pesquisa bibliográ-fica para a minha dissertação —cujo tema é justamente ‘formaçãoprofissional em saúde’ — e, graçasà contribuição da revista, desco-bri várias novas fontes de pesqui-sa. Obrigada por disponibilizaremesse material de tamanha qualida-de e atualização.

Súsi Barcelos e Lima (por e-mail)

Câmara Municipal deSão José dos Camposhomenageia o Radis

Por sugestão do vereador OsmarFerreira (PSDB), a edição de ja-

neiro/fevereiro da revista Radis foiobjeto de uma homenagem presta-da pela Câmara Municipal de SãoJosé dos Campos em 28 de fevereirodeste ano.

Durante a sessão, o vereadorjustificou seu pedido ao presiden-te da Câmara, destacando a impor-tância do trabalho realizado peloRadis na área da comunicação emsaúde. Em seu discurso, OsmarFerreira lembrou que “a comunica-ção é, sem dúvida, uma fonte ines-gotável de conhecimentos e que oconhecimento nos proporcionacondições de questionar tudo oque acontece na sociedade em quevivemos, dando-nos oportunidadede refletir e lutar pelos nossos di-reitos”. Além disso, ele também re-forçou o papel da educação e dainformação:

— É notório que a pesquisa e oestudo são fundamentais para ocrescimento e aperfeiçoamento deum povo; que a qualidade de vida éresultado de conhecimento; que oprogresso é conseqüência do tra-balho de profissionais sérios e deanálises e pesquisas que geram so-luções práticas e criativas para pro-blemas que circundam o mundo; eque a informação é sempre neces-sária para qualquer classe social oude trabalhadores, sendo imprescin-dível na vida da humanidade — disseo vereador.

O pedido para a homenagem foiaprovado por unanimidade. Mais umavez, o Radis agradece!

homenagemhomenagemhomenagemhomenagemhomenagem

Henfil esquecido?

Imperdoável esque-cimento, esse do

Radis. Na matériaFotografia da Fome,publicada na Radis 8,omitimos o nome docartunista Henfil no elenco dehumoristas cujos cartuns ilustra-ram a reportagem. Não chore,Graúna, a correção está feita.

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SÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSA

SAFRA DE SOJA TRANSGÊNICA É LIBERADAPARA COMERCIALIZAÇÃO

Opresidente Lula da Silva pôs fim àpolêmica acerca da safra de soja

transgênica produzida ilegalmente nopaís. Por meio de uma Medida Provi-sória, e depois de ouvir a comissãode nove ministros encarregada dediscutir a situação, Lula liberou acomercialização da safra para o mer-cado interno, além de permitir a ex-portação. A ministra do Meio Ambien-te, Marina Silva, foi voto vencido emquase todas as discussões, e disse quealguns setores “apostaram na políti-ca do fato consumado”, para conse-guir a liberação total dos transgênicosno país. De acordo com a Medida Pro-visória, a soja deverá ser identificadacomo transgênica, para o mercadointerno, e os produtores terão até31 de janeiro de 2004 para vendertoda a colheita. A soja poderá servendida para qualquer finalidade,exceto como sementes para plantiofuturo. Lula justificou a assinatura damedida dizendo que “o mais fácil se-ria proibir a venda, mas falar é fácil,fazer é difícil”.

OLHOS ABERTOS PARA A EPIDEMIA DECONJUNTIVE

OBrasil foi, literalmente, testemu-nha ocular de um violento surto

de conjuntive aguda que, segundo aFundação Nacional da Saúde (Funasa),atingiu seis estados e contaminoumais de cem mil pessoas em duas se-manas. A doença traduz-se pela in-flamação da membrana que recobrea parte externa do olho e é geral-mente benigna, mas pode causargrande desconforto. Ainda não foi

identificado o agente dessa epide-mia—que tipo de vírus ou bactéria -,mas o estado de Santa Catarina, queapresentou maior número de casos(cerca de 50 mil), já solicitou análi-se ao Instituto Adolfo Lutz, de SãoPaulo. Os estados atingidos foram,segundo a Funasa: Santa Catarina,São Paulo, Paraná, Rio Grande doSul, Mato Grosso do Sul e Ceará. Atransmissão da conjuntivite se dá ge-ralmente pelo contato direto pes-soa a pessoa, e a doença se mani-festa 24h após o contágio. Os casossão quase sempre auto-limitados,isto é, curam-se sozinhos em no má-ximo duas semanas. Segundo a Se-cretaria Estadual de Saúde de SãoPaulo, a diminuição da temperaturano Sul do país tem freado a propa-gação da epidemia, que deve ser ra-pidamente controlada.

MINISTÉRIO DA SAÚDE APONTA PARANOVO ALVO: O ALCOOLISMO

Em meados de março, durante aposse de Jamil Haddad como di-

retor geral do Instituto Nacional doCâncer (Inca), o ministro da SaúdeHumberto Costa anunciou que o pró-ximo alvo do Ministério é o proble-ma do alcoolismo no Brasil. Afirman-do enfaticamente que o lobby dasempresas produtoras de bebidas nãopode ser mais forte do que a saúdeda população, o ministro disse quevai apresentar ao presidente da Re-pública sugestões para alterar a le-gislação e estabelecer regras para acomercialização de bebidas alcoóli-cas. Humberto Costa adiantou quepensa num programa abrangente enacional, nos mesmos moldes do Pro-grama Nacional de Combate ao Fumo.“É preciso avançar no combate aoalcoolismo tanto quanto se avançouna luta contra o tabaco”, disse. Noentanto, o ministro sofreu seu pri-meiro revés nessa batalha, ao permi-tir a propaganda de companhias decigarros e bebida alcoólica durantea realização do GP Brasil de Fórmula1, em Interlagos, no início de abril.Essa ‘briga’ não prevê nenhuma faci-lidade para o Ministério. Basta terem mente que a Ambev, maior pro-dutora de cerveja no Brasil, investesozinha cerca de R$ 350 milhões porano em marketing.

CÂNCER DE CÓLON PODE SER DETECTADOPOR MEIO DA GENÉTICA

Cientistas norte-americanos da Uni-versidade Johns Hopkins, de

Baltimore, publicaram na revistaScience (www.sciencemag.org) estu-do que analisou amostras de sanguede 172 pacientes submetidos acolonoscopia, e concluíram que o ris-co de desenvolver câncer de cólonpode ser identificado preventivamen-te por um simples exame de sangue,que determina certas tendências ge-néticas. Os pesquisadores buscaramuma alteração genética específica,chamada ‘perda de estampagem’,detectada anteriormente em tumo-res de cólon e reto, e descobriramque as possibilidades de se encon-trar essa característica são cincovezes maiores em pessoas com his-tórico familiar nesse tipo de câncer.O câncer de cólon e reto é a segun-da maior causa de morte por câncernos Estados Unidos. No Brasil, a do-ença vitimou 9.170 homens e 9.800mulheres em 2002. Nesse ano, 3.535homens e 4.095 mulheres morreram.O câncer de cólon é a quinta mor-talidade entre todos os tipos de cân-cer no país.

ME D I C A M E N TO S G E N É R I C O S E S T Ã OCOM AS VENDAS ESTAGNADAS NO PAÍS

Há três anos, os genéricos chega-ram ao mercado brasileiro cus-

tando, em média, 40% menos que osprodutos de marca e tornando-se umaopção segura para a população brasi-leira que não possuía acesso a medi-camentos. No entanto, segundo da-dos da Associação Pró-Genéricos, que

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SÚMULA DA IMPRENSA é produzida a par-tir da leitura crítica dos principais jor-nais diários e revistas semanais do país.

reúne os 20 laboratórios responsá-veis por 98% da produção de gené-ricos no país, as vendas estão prati-camente estagnadas desde agostodo ano passado. Depois de registrarcrescimento médio entre 5% e 10%ao mês, as vendas caíram 9,7% emagosto e não voltaram mais a subir.Para o presidente da Pró-Genéricos,Jairo Yamamoto, tal redução acon-teceu porque o governo deixou deinvestir em campanhas de promoçãodos genéricos no mercado brasilei-ro. Segundo ele, as pessoas sentemfalta de informação sobre o assun-to, principalmente a população maispobre. “Curiosamente, são as pes-soas com maior poder aquisitivo quemais têm buscado os genéricos”, dizYamamoto, atribuindo esse fato aomaior acesso que essa faixa da po-pulação tem às informações. O mi-nistro da Saúde, Humberto Costa,admitiu que alguns concorrentes dosgenéricos têm feito campanhas parapôr em dúvida a qualidade dos pro-dutos, mas assegurou que o Ministé-rio está estudando a retomada decampanhas informativas sobre os me-dicamentos genéricos.

PLANOS DE SAÚDE: CLIENTES CONTENTESOU DESCONTENTES?

Dança dos números na medicinade grupo. Enquanto pesquisa en-

comendada pela Agência Nacional deSaúde Suplementar (ANS) constatouque 84% dos 35 milhões de clientesde planos de saúde estão satisfeitoscom os serviços, levantamento doProcon identifica os planos de saú-de como responsáveis pelo maiornúmero de queixas dos consumido-res. Esses dados são confirmadospor um teste realizado por técni-cos do Instituto Brasileiro de Defe-sa do Consumidor (Idec), que durouquatro meses e constatou ilegalida-des nas oito maiores operadoras deplanos de saúde: Amil, Blue Life,Bradesco Saúde, Golden Cross,Interclínicas, Medial Saúde, Sul Amé-rica e Unimed Paulistana. Essas em-

presas, segundo o levantamento,descumpriam em média 38% dos di-reitos garantidos. Já a pesquisa daANS, realizada pela Ipsos OpinionBrasil, feita em 2.700 domicílios de51 cidades com mais de 50 mil habi-tantes, concluiu que os associadostêm bons conhecimentos dos 15principais direitos a eles assegura-dos pela Lei dos Planos de Saúde. Adiferença entre as pesquisas pro-vocou nova discussão, na Presidên-cia da República e em alguns minis-térios ligados à área, sobre o papelda agência reguladora.

O consumidor que tiver proble-mas com planos de saúde tem umaopção para fazer suas queixas: aCentral de Atendimento Nacionalao Consumidor de Planos de Saú-de, o Disque-ANS. Até agora,a cen-tral já realizou mais de 75 mil aten-dimentos. A Central funciona aindacomo tira-dúvidas. De cada cemcontatos telefônicos, 88 referem-se a consultas e dúvidas. As recla-mações são encaminhadas para aná-lise dos técnicos da Diretoria deFiscalização da agência e, casojulgada procedente, pode acarre-tar multa de até R$ 50 mil para aoperadora denunciada.Disque-ANS: 0800-7019656

OMS ALERTA PARA O RESSURGIMENTODA TUBERCULOSE

Orecrudescimento da tuberculosecausado por um supervírus

mutante, resultado de uma combi-nação devastadora com o vírus daAids na África subsaariana e nos pa-íses que integravam a extinta UniãoSoviética, preocupa a OrganizaçãoMundial da Saúde (OMS), que fez umalerta mundial no final de março,advertindo as autoridades em saú-de pública que os índices da tuber-culose quadruplicaram em algunspaíses africanos fortemente atingi-dos pela Aids. Essa evolução contras-ta, por outro lado, com uma dimi-nuição geral da incidência datuberculose no mundo, que já cres-ce ao lento ritmo anual de 0,4%. Emapenas três anos, observou-se umaredução na morbidade e na morta-lidade decorrentes da tuberculosenos 22 países em que são oficialmen-te registrados 80% dos casos. A Or-ganização informa que, desde 1995,10 milhões de pessoas que contra-íram a doença foram diagnosticadase tratadas de acordo com as estra-tégias internacionais de controleprescritas, adotadas por 155 dos

192 países que fazem parte da OMS.O Brasil ainda tem pouco o que co-memorar. Está entre aqueles 22 pa-íses com maior número de casos ab-solutos da doença, em 15o lugar.Oito milhões de pessoas têm tuber-culose a cada ano, em todo o mun-do, sendo que, destas, dois milhõeschegam à morte. Os países com mai-or incidência são a China e a Índia,que, juntos, são responsáveis por40% dos casos. O Brasil apresentou,em 2001, 71.319 casos, com 5.381óbitos.

INAUGURADO O DISQUE-SAÚDE DAMULHER

Asecretária especial de Políticas paraas Mulheres, Emília Fernandes,

inaugurou, em parceria com o minis-tro da Saúde, Humberto Costa, umnovo serviço de comunicação paraampliar o acesso da população a in-formações sobre saúde feminina. Oserviço, denominado Disque-Saúde daMulher, é um desdobramento do Dis-que-Saúde e já está funcionando. Adecisão de inaugurar tal serviço de-veu-se à constatação de que 54% dasligações do Disque-Saúde são fei-tas por mulheres, e que 44% dostelefonemas de dúvidas sobre DST/Aids procedem do público femini-no. Um conjunto de 60 temas foiselecionado pelo Ministério da Saú-de a partir das dúvidas mais fre-qüentes levantadas no Disque-Saú-de, entre eles planejamentofamil iar, doenças sexualmentetransmissíveis e prevenção do cân-cer de mama e de colo do útero.Além disso, o Disque-Saúde da Mu-lher atuará na orientação de víti-mas de violência sexual. O novo ca-nal de comunicação funcionarágratuitamente e diariamente, das 8hàs 18h, e é capaz de receber 2,5 milchamadas por dia.Disque-Saúde da MulherTel.: 0800-644-0803

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12ª conferência nacional de saúde12ª conferência nacional de saúde12ª conferência nacional de saúde12ª conferência nacional de saúde12ª conferência nacional de saúde

Ana Beatriz de Noronha

No dia 12 de março, na 128ªReunião Ordinária do Con-selho Nacional de Saúde,foi aprovada a realização

da 12ª Conferência Nacional de Saú-de (CNS), cujo tema é ‘Um novo ciclopara o desenvolvimento do SUS’.

A proposta de antecipação daConferência, inicialmente marcadapara 2004, foi feita pelo ministro daSaúde, Humberto Costa, e pelo se-cretário de Gestão Participativa, Sér-gio Arouca, cuja secretaria está àfrente da organização do evento, pre-visto para ocorrer em Brasília, de 27a 30 de novembro.

Segundo Sérgio Arouca, ao con-vocar a 12ª CNS o governo reafirmasua intenção de discutir com a soci-edade tanto os avanços do SUS quan-to os desafios que se apresentam parasua plena realização.

— O SUS progrediu muito em al-guns aspectos e já é reconhecido in-ternacionalmente como excelente mo-delo de sistema de saúde, além de estarservindo de inspiração para a criaçãodo Sistema Nacional de Segurança Pú-blica. Existem, no entanto, alguns gra-ves problemas a serem eqüacionados,principalmente na área de recursoshumanos e na qualidade dos serviços.Eu diria que a Conferência representauma parada para a correção de rumos— explica o secretário.

A IMPORTÂNCIADA CONFERÊNCIA

As conferências nacionais desaúde representam um espaço privi-legiado para o debate entre todosos segmentos da sociedade sobre asquestões de saúde e reúnem gestores,prestadores de serviços, formadoresde recursos humanos, representantesde organizações de empresários, pro-fissionais do setor e representantesdos usuários. Na conferência deste ano,o objetivo é definir orientações para oPlano Plurianual de Saúde do governoe as principais diretrizes a serem in-corporadas ao SUS na busca da eqüi-dade, da qualidade e da humanizaçãona atenção à saúde.

O encontro será realizado em trêsetapas. Nas Conferências Municipais, aserem realizadas até 30 de setembro, eEstaduais, que devem ocorrer até 31 deoutubro, começam a ser debatidos ostemas propostos e consolidadas as pro-posições a serem feitas na etapa nacio-nal. Além disso, eventos importantes naárea da Saúde, entre eles, o 5º Con-gresso Nacional da Rede Unida, o 7º Con-gresso Brasileiro de Saúde Coletiva e o41º Congresso Brasileiro de EducaçãoMédica terão o papel de pré-Conferên-cias. A única conferência temática pre-vista é a 1ª Conferência Nacional de Me-dicamentos e Assistência Farmacêutica,convocada em 2001.

Apesar de estar sendo concebi-da dentro de um espírito bastantesimilar ao que animou a histórica 8a

Conferência, ocorrida em 1986 e quefuncionou com uma pré-constituintede Saúde, o encontro deste ano temalgumas especificidades, como escla-rece Sérgio Arouca:

— As outras Conferências forammais abrangentes. Na 12ª, as discussõesestarão concentradas em temas queformam o eixo central do SUS, ou seja,o direito de cidadania e as demais dire-trizes constitucionais da universalidade,da eqüidade, da integralidade, a afirma-ção dos valores da solidariedade social

Governo chama sociedade paradiscutir os rumos da saúde

e da responsabilidade de todos níveisde gestão no processo de redefiniçãodo modelo de Atenção à Saúde, a ques-tão dos recursos humanos e as estraté-gias de controle social.

Sobre as expectativas do gover-no, o secretário garante que elas sãoas melhores possíveis.

— Nós estamos pensando emampliar a participação popular a par-tir da incorporação de representan-tes dos movimentos sociais, que an-tes participavam apenas comousuários. É preciso fortalecer o SUSe isso só pode ser feito com o apoiomaciço da sociedade.

A1ª Conferência Nacional deMedicamentos e Assistência

Farmacêutica, que será realizadade 7 a 10 de julho, em Brasília, é amaterialização de uma antiga rei-vindicação dos segmentos quecompõem os conselhos de saúde.

A partir do tema ‘Efetivando oacesso, a qualidade e a humani-zação na assistência farmacêuticacom controle social’, foram esta-belecidos três eixos temáticospara os debates: acesso à assis-tência farmacêutica – a relação dossetores público e privado de aten-ção à saúde; pesquisa e desenvol-vimento tecnológico para a pro-dução nacional de medicamentos;e qualidade na assistência farma-cêutica, formação e capacitaçãode recursos humanos.

Em todas as etapas da 1ª Con-ferência Nacional de Política deMedicamentos e Assistência Far-macêutica estarão representa-dos de forma paritária usuários,prestadores de serviços, profissi-onais de saúde e governo. Duran-te a etapa nacional, para garantira participação popular e fortale-cer o controle social, está previs-ta uma exposição para divulgar asexperiências institucionais relaci-onadas ao tema central. Trabalhospara a exposição podem ser envi-ados até o dia 06 de maio, para:CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE/MSA/C — Comissão Organizadora/Medi-camentosEsplanada dos Ministérios, Bloco G,Ed. Anexo, Ala B - salas 136 a 145,Brasília / DF — CEP: 70058-900

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RADIS 9 ! MAI/2003

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Programa Saúde da FamíliaPrograma Saúde da FamíliaPrograma Saúde da FamíliaPrograma Saúde da FamíliaPrograma Saúde da Família

Ana Beatriz de Noronha

Para tentar fortalecer a AtençãoBásica à Saúde, o Ministério daSaúde criou o Projeto de Ex-pansão e Consolidação do Saú-

de da Família (Proesf), cujo objetivo écontribuir para a implantação e con-solidação da estratégia de Saúde da Fa-mília em municípios de grande porte,nos quais a maior disponibilidade deoferta de serviços de saúde, particu-larmente os de média e alta complexi-dade, não se reflete na qualidade e nacapacidade de respostas de serviços.

O Proesf propõe mudanças nadinâmica do PSF, disponibilizando re-cursos para a estruturação de novasequipes e unidades, buscando inte-grar procedimentos de outros níveisde complexidade do Sistema Único deSaúde (SUS) e aperfeiçoando meca-nismos de gestão e de monitoramento.O Projeto foi estruturado após umacriteriosa avaliação da implementaçãodo Saúde da Família em dez grandescentros urbanos: Aracaju (SE), Cama-ragibe (PE), Vitória (ES), Vitória da Con-quista (BA), Palmas (TO), Manaus (AM),Goiânia (GO), Brasília (DF), São Gonça-lo (RJ) e Campinas (SP).

Para os sete anos de vigência doProesf — de 2002 a 2009 — estão previs-tos recursos de US$ 550 milhões, sen-do 50% financiados pelo Bird e 50% comocontrapartida do governo brasileiro.

O PROGRAMA QUEVIROU ESTRATÉGIA

O Programa Saúde da Família foicriado em 1993 e em dezembro de 1998já estava implantado em mais de 1200municípios, com cerca de 3100 equi-pes constituídas. Apesar do grandenúmero de municípios com o progra-ma, a cobertura ainda era pequena,ou seja, grande parte da populaçãoainda não recebia os benefícios do PSFe os indicadores municipais não sofri-am maiores impactos. O governo rea-justou os valores de repasse e crioumecanismos que remuneravam melhoros municípios com maior coberturapopulacional. Um ano depois, cercade 10,5 mil equipes funcionavam em

mais de 3 mil municípios e cobriamaproximadamente 22% da populaçãobrasileira. Aos poucos, o Programase transformou na principal estra-tégia do Ministério da Saúde paraa reestruturação do modelo deatenção à saúde. Atualmente, opercentual de municípios com PSFjá é superior a 90%, mas a cobertu-ra populacional não consegue ultra-passar os 35%, devido principalmen-te às dificuldades de implantação doPSF nas cidades com mais de 100 milhabitantes.

Os problemas são muitos, comoexplica Luciana Borges, coordenado-ra de Saúde Comunitária do municípiodo Rio de Janeiro, onde 23 equipesdistribuídas em dez localidades aten-dem cerca de 101 mil pessoas, o quesignifica uma cobertura de menos de2% da população.

— Nós enfrentamos uma gran-de dificuldade para encontrar pro-fissionais de saúde com perfil ade-quado ao trabalho e tem ainda aquestão da violência nas comuni-dades controladas pelo tráfico dedrogas. A expectativa é que o in-centivo do governo federal permi-ta a criação de 150 novas equipesde PSF, fazendo com que a cober-tura alcance 1,4 milhão de habi-tantes, o que representa 18% dapopulação. Para que seja atingidaa cobertura de 30% que o Proesfexige para os municípios com maisde 5 milhões de habitantes, no en-tanto, será preciso muita vontadepolítica. Só assim vai ser possíveldirigir tanto investimento para umasó área — diz Luciana.Mais informações:www.saude.gov.br/proesf

Centros urbanos recebem apoiodo Ministério para ampliar PSF

Governo federal convoca municípiospara participarem do Proesf

OMinistério da Saúde, por meioda Portaria nº 347, de 27 de mar-

ço de 2003, aprovou a ConvocatóriaPública para que municípios e Dis-trito Federal apresentem projetosmunicipais de expansão do Saúde daFamília, segundo diretrizes do Pro-jeto de Expansão e Consolidação doSaúde da Família (Proesf). A Portariatambém determinou os critérios deelegibilidade dos projetos, prazos econdições de financiamento, medi-ante transferências fundo a fundo.De acordo com a Portaria, caberáao Ministério da Saúde a análise dosProjetos. A aprovação da habilitaçãodos municípios classificados será atri-buição da Comissão IntergestoresTripartite (CIT).

Para participar do processo declassificação é necessário que o mu-nicípio tenha população acima de 100mil habitantes; tenha aderido ao Pac-to de Indicadores da Atenção Bási-ca, no ano base de 2001, e ao CartãoNacional de Saúde (Cartão SUS), noano base de 2002; tenha alimentado

o Sistema de Informações sobre Or-çamentos Públicos de Saúde (SIOPS),ano base de 2001; e se comprometaa implantar ou ampliar o Programa deSaúde da Família para alcançarpercentuais de cobertura pré-fixa-dos. Os municípios que cumpriremesses requisitos serão submetidos ain-da a uma análise de seu desempenhoem diversos indicadores sociais e desaúde. Os cem primeiros classifica-dos poderão apresentar seu projetode expansão do Saúde da Família, le-vando em conta a modernizaçãoinstitucional, a adequação da redede serviços, o fortalecimento dos sis-temas de avaliação e informação e odesenvolvimento de recursos huma-nos. O município cujo projeto sejaaprovado estará habilitado a partici-par do Proesf, beneficiando-se dastransferências de recursos para fi-nanciamento das ações propostasanteriormente.Mais informações: Diário Oficial daUnião (DOU) de 28 de março de 2003(www.in.gov.br)

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rrrrradadadadadiiiiis entres entres entres entres entrevivivivivistststststaaaaa

Por Katia Machado

Atual titular da Secretaria deDesenvolvimento Social e daSaúde de Sobral, no Ceará,Luiz Odorico Monteiro de

Andrade tem uma longa história de atu-ação na área da Saúde. Ainda estudan-te de Medicina pela Universidade Fe-deral do Ceará (UFC), pela qual concluiusua graduação, participou do movimen-to pela Reforma Sanitária. Concluiu suapós-graduação como sanitarista na áreade Medicina Preventiva e Social e omestrado em Saúde Pública. Sua traje-tória como gestor publico inclui a Se-cretaria de Saúde do município deIcapuí, na qual foi secretário em 1989,1991 e 1992, e a Secretária de Saúdedo município de Quixadá, de 1993 a1996. Exerceu ainda o cargo de Presi-dente do Conselho Estadual de Secre-tários Municipais de Saúde do Ceará,entre 1993 e 1995, e de Secretário deRelações Internacionais do ConselhoNacional de Secretários Municipais deSaúde (Conasems), de 1997 a 2001.

Como foi sua trajetória na área daSaúde?

Minha relação com o SUS começana Reforma Sanitária, quando ainda fa-zia parte do movimento estudantil comoestudante de Medicina. Integrante domovimento, presidi, em 1986, o XVII En-contro dos Estudantes de Medicina eparticipei, como delegado da União Na-cional de Estudantes (UNE), da VIII Con-ferência Nacional de Saúde. Esse foium dos momento mais importantes paraa história da saúde brasileira. Nessa épo-ca tive condições de conviver no mes-mo espaço com importantes personali-dades da Reforma Sanitária, como SérgioArouca (atual secretário da recém-cri-ada Secretaria de Gestão Participativado Ministério da Saúde), Hésio Cordei-ro (ex-reitor da Universidade Estadual

Luiz Odorico Monteiro de Andrade

Rede de solidariedade:município ajudando município

do Rio de janeiro — Uerj), que na épo-ca estava à frente do extinto Inamps,entre outros. Isso foi muito empolgan-te pra mim.

Em agosto de 1986, fui para Icapuí,uma cidade que fica a 200 km de Forta-leza e que, na época, tinha cerca de15 mil habitantes. Lá, começo a fazerminha transição do movimento estudan-til — ainda cursando o quinto ano deMedicina — para o movimento

institucional. Esse é um momento inte-ressante, pois eu tenho a oportunida-de de confrontar as discussões refe-rentes à Reforma Sanitária com arealidade do cotidiano das pessoas.Nesse ano, falávamos sobre ações in-tegradas de Saúde. Em 1987, participodas discussões sobre a proposta de cri-ação do Suds (Sistema Unificado e Des-centralizado de Saúde). Nesse mesmoano, é implantado o trabalho de

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‘Agentes de Saúde’ no Ceará, que maistarde vai servir de modelo para o Pro-grama de governo ‘Agentes Comuni-tários de Saúde (Pacs).

Eu terminei minha faculdade em1988, entrando na residência de Medi-cina Preventiva. Nesse ano vem a Cons-tituição Federal, que cria o SUS e, em89, eu assumo a Secretaria Municipalde Saúde de Icapuí, ainda como resi-dente. Na cidade, com o apoio do pre-feito, implantamos um modelo de saúdepelo qual conseguíamos materializar osprincípios norteadores da Reforma Sa-nitária. Fiquei seis meses licenciado,vivenciando a experiência da adminis-tração da Erundina, em São Paulo. A par-tir de 1990, damos continuidade ao sis-tema de saúde no município e, em 91,Icapuí recebe da Unicef o prêmio ‘Saú-de, Educação e Paz’, pelo trabalho de-senvolvido sobretudo na área da Edu-cação e da Saúde. Icapuí já começava agarantir universalidade e resolutividadena atenção à saúde, criando um víncu-lo do cidadão com o sistema.

Antes de Sobral, sua única experiên-cia como gestor havia sido em Icapuí?

Não, porque em 1992 fui convi-dado a assumir a Secretaria de Saú-de de Quixadá, um município na épo-ca com cerca de 60 mil habitantes.Eu costumo dizer que, em Icapuí, nóstínhamos um carro parado trocandopneu e, em Quixadá, nós trocávamospneu com o carro andando. Você ti-nha um sistema de saúde antigo, frutodo modelo brasileiro centrado no hos-pital, na lógica do Inamps. Nós tínha-mos que superar um sistema falido ecolocar em prática as bases da Refor-ma Sanitária. Para superar tais dificul-dades, fiz uma revisão literária sobreos modelos de medicina de família deCuba, da Inglaterra e do Canadá, apro-veitando a experiência dos agentes desaúde do Ceará e a interiorização daenfermagem dada nesse processo. Nósconseguimos mostrar que o modeloproposto em Quixadá não era o demédico da família, mas de saúde da fa-mília. Implantamos o Saúde da Famíliaem Quixadá, que serviu de modelo paraoutros municípios, como Camaragibe eCampina Grande, e também para cida-de oriundas do Paraná, de São Paulo eda Bahia. Discutimos ainda a propostadiretamente com o Ministério da Saú-de. Essa foi a grande contribuição domunicípio de Quixadá para o SUS.

E aí, sim, chega a Sobral...Assumi a Secretaria de Saúde de

Sobral em 1997, e encontrei uma ci-dade ainda enraizada no antigo mode-lo biomédico, com ausência total do

município no sistema de saúde e comuma estrutura hospitalar forte. Sobral,que é um dos maiores municípios doCeará, naquela época não tinha feitoainda nenhum tipo de municipalização.Eu teria que mudar um sistema de saú-de que, por pior que fosse, não pode-ria simplesmente parar de funcionar. Euprecisava superar esse modelo centradonos hospitais. Com o apoio do novo pre-feito Cid Gomes (hoje em sua segundagestão), elaboramos um primeiro planomunicipal de saúde e demos entrada naNOB 96 (que só foi posta em práticacomo gestão plena do sistema de saúdeem abril de 1998 depois de um ano dediscussões). Nós fomos um dos primei-ros municípios do Brasil a se credenciarna NOB 96. Com essa ação, a Secretariade Saúde de Sobral que, em 1997,gerenciava 20 mil reais recebidos do SUS,passou a administrar 2 milhões de reais.Hoje, ela gerencia em torno de 3 mi-lhões por mês.

A residência em Saúde da Família éuma experiência recente no Brasil.Como ela funciona em Sobral?

A proposta desse trabalho é detransformar todos os integrantes doSaúde na Família em residentes. Primei-ro, implantamos a residência e, em se-guida, construímos a Escola de Forma-ção em Saúde da Família ViscondeSabóia, que hoje coordena as ativida-des da residência. A escola foi uma ini-ciativa do município, construída comrecursos do Banco Mundial e do esta-do do Ceará. A escola traduz o espaçofísico de sistematização e aprimoramen-to do trabalho em saúde da família.

O trabalho se dá segundo o con-ceito da tenda invertida. Isso quer di-zer que o trabalho visa à superação doconceito tradicional da especialidademédica, que é oriundo do conceitomedieval do mestre e do aprendiz deofício, em que um aprendiz que queraprender um ofício vai para a tenda domestre, para depois montar sua pró-pria tenda. Um médico formado, se queraprender cirurgia, vai para a tenda docirurgião, aprende o ofício e depoisvai montar sua própria tenda. No Saú-de da Família, onde se dá o aprendi-zado da equipe? É no território doSaúde da Família. Em vez de o apren-diz ir para a tenda do mestre, é o mes-tre que vai para a tenda do aprendiz.Nesse sentido, você promove uma for-mação em escala. Na residência, ope-ramos também com o conceito de pre-ceptor de especialidade, que é aqueleque passa determinado conhecimentopara o médico de família. Entre os pre-ceptores de especialidades estão mé-dicos cardiologistas, pediatras, obste-tras e muitos outros, fazendo com queo médico e enfermeiro de saúde da fa-mília possam dominar vários campos deconhecimentos e construir novas prá-ticas e novos saberes a partir da vivênciano território do Saúde da Família. Que-remos com isso formar um profissional,por assim dizer, multiprofissional, que te-nha conhecimentos de epi-demiologia,antropologia, sociologia, educação po-pular em saúde, abordagem sistêmicada família, promoção de saúde e siste-mas de saúde.

Hoje, são 70 residentes distribu-ídos em 10 categorias atuando no Pro-grama de Saúde da Família. Esse tra-balho foi ampliado depois que a Escolarecebeu do Ministério da Saúde 25bolsas de estudos. Eu penso que todoprofissional que vai trabalhar na áreada Saúde deve passar pela residênciaem Saúde da Família. Essa tem queser a porta de entrada do profissional.Depois da residência, ele vai fazerum mestrado, seja acadêmico ou

Nossa prioridade era organizara atenção básica, por meio da qualestava a estratégia de saúde da fa-mília. A partir dessa proposta, bus-camos uma resposta para a educa-ção permanente, capacitação dosrecursos humanos e integração daatenção básica com a atenção se-cundária e terciária, ou seja, cons-truir acesso universal, resolutividadedo sistema e a participação popularnesse sistema. Nesse sentido, con-seguimos criar toda a estrutura deeducação, capacitação e informaçãoque culminou na residência em Saú-de da Família e na construção daEscola de Formação em Saúde daFamília Visconde de Sabóia.

O Conasemsdeve cumpriro papel

de articuladorde uma rede

de solidariedade,para que um município

que tenha resolvidobem um problema

possaajudar

a outros.

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profissionalizante, ou outro curso deespecialização na atenção secundáriaou terciária. Dessa forma, conseguimosarticular a estratégia Saúde da Famíliacom a atenção secundária e terciária.

Levando em consideração a sua expe-riência como secretário de RelaçõesInternacionais do Conasems, qual foi,segundo sua avaliação, a grande con-tribuição do Conselho para o SUS?

Os 30 anos de processo de dis-cussão da Reforma Sanitária Brasileirapodem ser divididos em três décadas:70, 80 e 90. Pensando em três vetores— político/normativo, discursivo eparadigmático —, na década de 70predominou o vetor discursivo, poisaqui foi produzido o discurso da Re-forma Sanitária brasileira; na décadade 80, tivemos a presença maior dovetor político/normati vo, pois essefoi o momento em que conseguimoscolocar o SUS no campo das normas;na década de 90, tivemos o tensiona-mento do vetor paradigmático e, ain-da com forte influência do vetornormativo, tivemos o processo demunicipalização. Nesse momento, oConasems passou a ser o principalator da interlocução do processode municipalização. Outro momen-to, no qual o Conselho tem granderelevância, é a concepção tripartitedo sistema de saúde, representadapela Comissão de IntergestoresTripartite (CIT). Por meio da CIT, foiconstruído no SUS um espaço depactuação entre as esferas federal,estadual e municipal.

Hoje, nesse momento de consolida-ção do Sistema Único, como oConasems pode contribuir para o SUS?

Didaticamente, penso que oConasems pode atuar em três linhas:política, técnica e administrativa. Apolítica acaba por orientar todas asoutras. Mas, sistematizando, no campode vista da política, O Conasems podecontribuir para o fortalecimento doSUS incentivando o processo dedescentralização e a consolidação dasaúde em uma perspectiva intersetorial.Nesse contexto, uma discussão de-veria ser levantada pelo Conselho:a regulamentação do sistema de saú-de, pois algumas coisas ainda nãoestão regulamentadas na Constitui-ção brasileira, como as competên-cias federais, estaduais e municipais.Do ponto de vista político, o Cona-sems precisa também ampliar a rela-ção com os prefeitos.

Pensando na linha técnica, OConasems pode construir em tornodele grupos temáticos ou uma rede

Na linha administrativa, pode eleaproveitar a capacidade operativacom os Conselhos de SecretáriosMunicipais espalhados pelo Brasil paraviabilizar essa rede. Penso até na pos-sibilidade de o Conasems ter um ins-tituto de capacitação e treinamentode gestores para que as experiênci-as circulem entre os municípios.

Por falar em redes de solidarieda-de, percebe-se que, hoje em dia,as discussões sobre Cidades Saudá-veis estão quase que esquecidas. Éainda possível falar sobre esse as-sunto? As Cidades Saudáveis aindasão uma boa idéia?

Cidade Saudável nasce com aproposta de promoção da saúde, umprocesso que, diferentemente doque muitos pensam, não nasce noséculo XX. A discussão da promoçãoda saúde nasce na Europa, no sécu-lo XIX, na luta pela medicina socialem contraposição à lógica da medi-cina biológica. Essa luta atravessa oséculo 20 como contraposição aomodelo hegemônico da biomedicinaamericana, que quer resumir a ques-tão da saúde a uma perspectiva me-ramente mercadológica. Ela vemdescolar a saúde do conceito res-trito de ausência de doença e am-pliar isso para o conceito das polí-ticas públicas de forma multisetorial.Nesse sentido, nasce na Conferên-cia de Otawa, Canadá, em 1986, essaidéia de promoção da saúde e deCidade Saudável.

Por um lado, a idéia de CidadeSaudável é uma proposta forte. Poroutro, algo pretensiosa. Se levar-mos em consideração esse modelode Saúde da Família que defende-mos como política pública no país,se olharmos para a saúde como qua-lidade de vida, a idéia de CidadeSaudável se aproxima muito do SUS.No Brasil, nosso grande desafio éconstruir uma grande aliança com osprefeitos para trabalhar essa idéia queresulte na melhoria da qualidade devida da população e, conseqüente-mente, a melhoria da saúde.

horizontal de secretários municipaisde saúde para que ele possa ter subsí-dios na discussão de pactuação daTripartite. Sabemos que, na CIT, o Mi-nistério da Saúde é sempre mais forte,pois ele tem os melhores técnicos. Osestados, por sua vez, já têm mais cla-ras as agendas de suas prioridades enecessidades. Isso é o que falta aoConasems. Fortalecendo a área téc-nica, estaremos garantindo uma ex-celente intervenção dos municípiosna CIT. Nesse sentido, eu penso emuma rede de solidariedade, por meioda qual município ajuda município. Nopaís, temos aproximadamente 5.600municípios. Desse total, grande par-te é de pequeno porte. Apenas 250municípios têm mais de cem mil habi-tantes. Com tantos municípios, oConasems deve cumprir o papel dearticulador de uma rede de solidarie-dade para que, por exemplo, um mu-nicípio que tenha resolvido bem umproblema em vigilância sanitária ouepidemiológica ou que tenha experi-ência em gestão de controle e avalia-ção possa ajudar a outros.

Luiz Odorico: “Todo profissional que vaitrabalhar na área da saúde deve passarpela residência em Saúde da Família”.

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O RADIS ADVERTE:

O trabalho isolado do municí-pio pode causar impotência doSUS. A criação de uma redede solidariedade faz bem nãosó à Saúde como também aospróprios municípios.

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VI Congresso cosem-SPVI Congresso cosem-SPVI Congresso cosem-SPVI Congresso cosem-SPVI Congresso cosem-SP

Katia Machado

Com o tema ‘Descentralizaçãoe Regionalização: um pactopelo SUS’, o VI Congresso deSecretários Municipais de

Saúde do Estado de São Paulo (Co-sem-SP), ocorrido em março desseano, reuniu secretários municipais deSão Paulo, representantes do estadoe do governo federal para trocar idéi-as, falar sobre os problemas e apre-sentar propostas para a consolidaçãodo Sistema Único de Saúde (SUS).Para José Ênio Servilha Duarte, secre-tário municipal de Marilia e presidentedo Cosem-SP, o tema vem priorizar oterritório onde os profissionais devamatuar, ou seja, o local determinadopela estratégia de Saúde da Família.Pensando na prática do princípio daregionalização, ele chamou atençãopara a necessidade de elaboração deum plano diretor regional, amplia-ção dos serviços da Atenção Bási-ca, qualificação das micro-regiõesna assistência à saúde, organizaçãodos serviços de média e alta com-plexidade e construção de um pla-no diretor de investimento.

Se o momento é de mudar algu-mas velhas práticas e implantar no-vas idéias para o bom funcionamen-to do SUS, Gastão Wagner, secretário

executivo do Ministério da Saúde,que esteve presente na mesa-re-donda ‘o SUS em construção: umcaminho a percorrer’, consideroucomo ações prioritárias a ampliaçãoe reorganização do financiamentoe a racionalização do SUS. “São doiscaminhos que se encontram comose fossem uma avenida de mão du-pla e não tem como sairmos destepercurso”, comparou.

Visando melhorar a lógica do fi-nanciamento, o primeiro passo, deacordo com o secretário do MS, écolocar em prática a Emenda Cons-titucional 29, que assegura os re-cursos mínimos para a prática dasações e serviços públicos de saú-de. “Apesar da sua existência, nãoestá devidamente definido o quesignifica o não cumprimento da lei,nem tampouco quem irá fiscalizá-la”,alertou, aproveitando para informarque fortalecer a lei é uma das prin-cipais propostas do governo queprevê, para esse fim, um gasto su-perior a R$ 1 bilhão.

No que diz respeito à racionali-zação do SUS, torna-se necessário areorganização do sistema de saúdetanto na atenção básica quanto nosserviços de média e alta complexida-de. “No Brasil, nos últimos anos, nósdiscutimos a reorganização do mode-lo de saúde voltada para a atenção

básica. Estamos, porém, engatinhandona área da saúde coletiva e das açõesrelativas às vigilâncias. Não nos auto-rizamos sequer a pensar na reorgani-zação do atendimento hospitalar e ou-tros serviços de média e altacomplexidade”, explicou Gastão.

Racionalizar o sistema significapensar nas diferenças territoriais,populacionais, familiares e individu-ais. É pensar em um serviço segundoa necessidade de cada cidade oucada grupo.

Seguindo os caminhos traçadospelo secretário executivo do MS, osecretário de Saúde do estado de SãoPaulo, Luiz Roberto Barradas, citou al-gumas dificuldades que o SUS aindaenfrenta. “Acostumada com a idéia deque a oferta determina o sistema desaúde, a sociedade acredita que umacidade deve ter todos os serviços desaúde. Não há necessidade de ter umtomógrafo para cada município, se nemtodos usam esse serviço”, ressaltou.Nesse sentido, para José Ênio, quan-to maior racionalidade na alocação derecursos, maior eqüidade no acessoda população às ações de saúde emtodos os níveis de atenção. Como ex-plicou Barradas, o SUS ainda não con-seguiu fazer valer os princípios da uni-versalidade, integralidade e eqüidadeisimultaneamente. “Caímos na armadi-lha de um SUS com integralidade mas

Secretários municipais de São Paulodiscutem descentralização e regionalização

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sem universalidade e eqüidade ou comuniversalidade e sem integralidade”,completou.

Cada um desses três princípios doSUS, segundo Barradas e OswaldoYoshimi Tanaka, secretário adjunto deSaúde do estado de São Paulo, deveestar direcionado para cada um dostrês níveis de governo — federal, es-tadual e municipal. “Cabe mais efeti-vamente aos municípios garantir a uni-versalidade dos serviços de saúde. Aosestados, induzir a integralidade. En-quanto que ao Ministério da Saúde,devido à sua capacidade de proporações e resolver problemas, cabe ga-rantir a eqüidade”, explicou Barradas.

UM PACTO PELO SUSDefinir responsabilidades entre

os níveis de governo e, conseqüen-temente, estabelecer um pacto peloSUS têm sido os maiores problemassobretudo para os municípios. Deacordo com Aparecida Linhares Pi-menta, secretária de saúde do muni-cípio de Amparo, foi praticamenteimpossível trabalhar o princípio da uni-versalidade de acesso tendo que ana-lisar e entender um grande númerode normas e portarias publicadas nosúltimos dois anos. “Tivemos que con-viver com uma avalanche normativa,muitas delas em contradição com aConstituição e com a Lei Orgânica daSaúde 8080, que regulamenta o SUS”,informou. Outro grande problema vi-vido em São Paulo, de acordo com asecretária, foi a falta de apoio finan-ceiro e técnico do estado aos muni-cípios. Segundo ela, o município sóconsegue cumprir com o seu papel sereceber a devida atenção do estado.Afinal, ressaltou, “ser municipalistanão quer dizer que o município vairesolver tudo sozinho”.

Como proposta, a secretária deAmparo espera que, por um lado, oMinistério da Saúde consiga superaresse impulso normativo, ampliar o fi-nanciamento e coordenar a avalia-ção técnica do SUS em todo o Bra-sil. Por outro, espera que o estadoassuma o papel de coordenar a ela-boração dos planos regionais de saú-de, a implantação efetiva de uma redehierarquizada de serviços de saúde eapoiar técnica e financeiramente osmunicípios na implantação de seus pla-nos municipais de saúde, para que pos-sam assumir a gestão local de saúdeconforme estabelece a Emenda Cons-titucional 29, capacitando seusgestores para o desafio de coordenare implantar o SUS e garantir a cons-trução de uma política pública volta-da para a defesa da vida.

AS PRINCIPAIS PROPOSTASDO MINISTÉRIO DA SAÚDE

Repensar as estratégias de finan-ciamento, investir no Programa de Saú-de da Família, criar políticas de re-cursos humanos e incentivar aparticipação popular. Essas são algu-mas das prioridades do Ministério daSaúde (MS). Segundo Gastão Wagner,o primeiro passo é atuar junto aosestados e municípios, oferecendoapoio técnico e financeiro na formade projetos. Para ele, cabe ao Minis-tério da Saúde acompanhar, avaliar econtrolar estados e municípios naconsolidação do sistema de saúde.“Não no sentido tradicional — aque-le de auditoria, pelo qual se pune ounão se faz nada —, mas por meio deum sistema de avaliação e acompa-nhamento, ajudando municípios aresolverem seus problemas”, expli-cou. Segundo ele, não interessa aoMS punir os municípios e sim identi-ficar problemas e articular projetospara resolver tudo o que ainda im-pede o bom funcionamento do SUS.Para acelerar esse processo, o Mi-nistério da Saúde espera contar comuma central de regulação. “Não po-demos aumentar os tetos financei-ros dos municípios sem avaliação econtrole”, explicou.

Visando à Atenção Básica, o MSpropõe maior investimento na estra-tégia de saúde da família e na reor-ganização do financiamento. Paratanto, pensa em agregar outros pro-fissionais ao Programa Saúde da Famí-lia (PSF) e modificar o padrão de aten-dimento centrado no médico, emcirurgias e exames, mudando para umavisão terapêutica. “Nós estamos comrecursos para formar, ainda neste ano,mais 4 mil equipes de PSF e 120 milagentes de saúde. Além disso, estamosplanejando um maior investimento nascidades com mais de cem mil habitan-tes”, informou o secretário executi-vo do MS. Segundo ele, a proposta édesenvolver a estratégia de saúde dafamília em 200 municípios com mais de100 mil habitantes em dois anos.

A Atenção Básica, porém, não éa única prioridade do atual governo.O MS tem como principal propostainvestir nos serviços de média e altacomplexidade. De acordo com GastãoWagner, a idéia é que o Ministério pos-sa co-financiar equipamentos e pes-soal e acabar com a lógica hospitalarcorporativista. “Nós temos evidênci-as de que uma série de problemas desaúde tem que ser enfrentada deoutra forma. Se substituímos hospi-tais psiquiátricos pelos Centros deAtendimentos Psicossocial (Caps) não

é exclusivamente devido ao tema daliberdade e da cidadania, mas porqueele é mais eficaz, gasta menos recur-sos e aumenta a sociabilidade dos pa-cientes”, ressaltou, lembrando quea internação de pacientes deve serdestinada cada vez mais para casosgraves. Segundo ele, uma boa formade trabalhar essa questão é segundoa lógica dos centros de referência deCâncer, de Saúde Mental (Caps) e deDoenças Sexualmente Transmissíveis(DST/Aids), que aglutinam equipes etecnologias. “Não podemos permitirque uma paciente ao chegar, porexemplo, na traumatologia com sus-peita de câncer, seja atendida da-qui a um ou dois meses ou que fi-que peregrinando pelos hospitais,pois isso é desumano e encarece oSUS”, alertou.

RECURSOS HUMANOSE PARTICIPAÇÃO POPULAR

Entre as ações de reorganizaçãodo sistema de saúde, o MS pretendeinvestir na área de recursos humanose na participação popular. Se hoje oSUS consegue fazer muita coisa, comodisse Gastão, “é porque o trabalha-dor da saúde é explorado”. Segundoele, os salários baixos e a falta de vín-culo empregatício são alguns dos pro-blemas enfrentados pelo setor de re-cursos humanos. “Cerca de 70% dosprofissionais do Saúde da Família es-tão com contrato ilegal, não é nemCLT, nem servidor público”, informou.O Ministério propõe ampliar os qua-dros técnicos e investir em educaçãocontinuada e na capacitação dos pro-fissionais da Saúde, priorizando o pes-soal que atua na Atenção Básica, naurgência e emergência, na Saúde Co-letiva e na gestão. Nessa ação, o MSbusca estabelecer parcerias com uni-versidades, estados e municípios.

No que diz respeito à participa-ção popular, o MS já vem tomandoalgumas medidas. Uma delas, como ci-tou Gastão, é a valorização da Comis-são Intergestores Tripartite (CIT), en-volvendo sociedade, representantesde estados e municípios. De acordocom Sérgio Arouca, titular da Secre-taria de Gestão Participativa do MS,investir no controle social é essenci-al ao fortalecimento do SUS. Nessesentido, o MS tem como prioridade aXII Conferência Nacional da Saúde,por meio da qual, segundo ele, “que-remos tirar um documento que sirvade plano para os próximos anos”.“Esse é nosso desafio, essas são nos-sas diretrizes, que gradativamenteestão se transformando em projetos”,concluiu Gastão Wagner.

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olimpíada da saúdeolimpíada da saúdeolimpíada da saúdeolimpíada da saúdeolimpíada da saúde

Olimpíada científica mostra que é precisomudar a educação ambiental no Brasil

Competição educativa, realizadapela Casa de Oswaldo Cruz

(COC/Fiocruz) e pela AssociaçãoBrasileira de Pós-Graduação emSaúde Coletiva (Abrasco) e desti-nada aos alunos dos Ensinos Fun-damental (7ª e 8ª séries) e Médiode escolas públicas e privadas. Or-ganizada em duas etapas — umaregional, finalizada em novembrode 2002, e outra nacional, cujoresultado será divulgado em junhodeste ano —, visa, entre outrascoisas, incentivar a capacidade dereflexão crítica e a criatividade dosalunos, difundindo o conhecimen-to científico e tecnológico, e valo-rizar o trabalho de professores quedesenvolvem atividades inovadorasem sala de aula. Os participantesconcorrem nas modalidades Arte eCiência, Produção Literária e Pro-jeto de Ciências. Representantesdos trabalhos selecionados na faseregional ganharão uma viagem ao Riode Janeiro para conhecer a Fiocruze participar da cerimônia depremiação nacional.Mais informações:www.olimpiada.fiocruz.br

Ana Beatriz de Noronha

Na Grécia Antiga, os JogosOlímpicos serviam para in-tegrar as diversas cidades-estado e para difundir

novas idéias entre as diversas comu-nidades gregas. De certa forma, aOlimpíada da Saúde e do Meio Ambi-ente, ao promover a relação entre asciências e as manifestações culturaisdas diferentes regiões do país e difun-dir o conceito de promoção da saúde,no qual estão diretamente envolvidasas questões relativas ao meio ambien-te, acabou por resgatar o significadodas olimpíadas originais. Segundo a vice-coordenadora do projeto, DanielleGrynszpan, o propósito não foi avaliaro conhecimento específico de umadisciplina, mas sim a aplicação criativade conhecimentos interdisciplinares

a questões presentes na realidade dosalunos, valorizando o trabalho autorale cooperativo de equipes escolares:

— A realização de um concursonacional periódico é importante paraa construção tanto do conhecimen-to compartilhado sobre temas cen-trais da vida contemporânea quantoda cidadania plena.

SUPERANDO AS EXPECTATIVASA primeira Olimpíada Brasileira de

Saúde e Meio Ambiente mobilizoucerca de 800 alunos de 571 escolasde praticamente todo o Brasil. Osestados de São Paulo, Rio de Janeiroe Pernambuco foram os que tiverammaior número absoluto de escolasparticipantes, respectivamente 77, 73e 56. O Acre foi o único estado quenão teve nenhuma escola inscrita.

Foram enviados 742 trabalhos, sen-do 338 na modalidade Arte e Ciência,201 em Produção Literária e 203 em Pro-jeto de Ciências. A maior participaçãofoi do Ensino Fundamental, responsá-vel por cerca de 60% dos trabalhos. Deforma inédita entre as iniciativas deolimpíada científica, as cidades do in-terior dos estados superaram as capi-tais, enviando 66% dos trabalhos. ParaDanielle, esse dado não pode ser cre-ditado somente ao fato de a competi-ção não exigir o deslocamento para arealização das ‘provas’:

— A forma de divulgação do even-to pode ter influído nesse resultado.Nos estados que utilizaram as estru-turas escolares ou os programas deatualização de professores, o interiorfoi mais atingido. Onde a divulgaçãofoi feita prioritariamente pelos meiosde comunicação, a participação ficoumais concentrada nas capitais.

O MEIO AMBIENTE E A SAÚDEApós analisar os trabalhos ven-

cedores da fase regional, Danielle

Grynszpan percebeu que, naspráticas de ensino, ainda

prevalecem duas concep-ções principais de meio am-biente: a ‘naturalista’, que

restringe o assunto às ciênciasbiológicas, separando o homem danatureza e tendo como meta oconservacionismo; e a ‘românticaingênua’, que fala de preservacionismoe considera o ser humano como umdestruidor malévolo de uma naturezasagrada. Alguns trabalhos ainda trata-vam o meio ambiente de forma‘tecnicista’, transformando questõessociais e políticas em questões simples-mente de ordem técnica. Poucos sebasearam no conceito de ‘educaçãoambiental crítica’, tratando a criseecológica como resultado de uma cri-se maior, ligada à modernidade e aomodelo desenvolvimentista, unindo adefesa do meio ambiente a um projetode emancipação humana e propondoque questões ambientais sejam vistasdentro de perspectivas históricas, cul-turais, sociais e de produção.

Nas concepções sobre a saúde,uma triste constatação: apesar de oconceito de promoção à saúde vigo-rar desde 1986, 30% dos trabalhos ain-da apresentam uma abordagem clíni-ca e curativa que atribui uma causaúnica às doenças e acaba disseminan-do a idéia de que a erradicação dedeterminadas espécies pode resolvero problema. “Isso mostra que existeum paradoxo entre a educaçãoambiental e a educação em saúde”,afirma Danielle, destacando, no en-tanto, que em alguns trabalhos esta-va clara a percepção da interrelaçãoentre a saúde e o meio ambiente.

Para Nísia Trindade Lima, diretorada COC e coordenadora da Olimpíada,ainda há muito que aprender e aperfei-çoar para as futuras edições da compe-tição, mas foi possível provar a viabilida-de da iniciativa:

— Os trabalhos apresentados ti-veram excelente nível, o que demons-trou existirem propostas pedagógicasbastante consistentes e estimula-doras em relação à criatividade dosestudantes.

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fomefomefomefomefome

Ana Beatriz de Noronha

No lançamento do Programa Fome Zero, em 30 dejaneiro, o presidente Lulada Silva além de destacar

a complexidade do Programa e expli-car, em linhas gerais, como ele funcio-na, afirmou também que é imprescin-dível a participação de toda a sociedadeno combate à miséria e à fome.

— O Fome Zero reúne um con-junto de ações simultâneas e é com-posto por medidas emergenciais e pormedidas estruturais que vão resolverem definitivo o problema da fome nopaís. Ele envolve praticamente todosos ministérios, os governos estaduais,as prefeituras municipais, as entida-des da sociedade organizada, as em-presas e a população — disse o presi-dente, completando enfático: “Todosterão um papel a desempenhar nessehistórico desafio”.

Por sua vez, Chico Menezes, queé diretor do Instituto Brasileiro de Aná-lise Social e Econômica (Ibase) e mem-bro do Conselho Nacional de Seguran-ça Alimentar (Consea), garante que a‘falta de acesso’ é a principal causapara a insegurança alimentar no Brasil.

— Todos sabemos que muitospassam fome por não poder compraralimentos, mas não é só isso — diz ele.Na área rural, existe a falta de aces-so aos bens de produção, principal-mente para aqueles que não têm ter-ra. Há também aqueles que não tem

A Imprensa e o Fome Zeroacesso aos serviços públicos de água,esgoto, educação e saúde. Mas exis-te uma outra dimensão muito impor-tante, que é a da falta de acesso àinformação, um instrumento básicopara aqueles mais vulneráveis à fomee à desnutrição.

No momento em que a informa-ção se torna um instrumento indis-pensável no combate à fome e aoexercício da cidadania, e que o pre-sidente convoca todos os seguimen-tos da sociedade a assumirem seupapel, fica uma pergunta: “Qual opapel da imprensa nessa batalha?”.

INFORMAÇÃO X FOFOCAAo final do segundo dos três de-

bates realizados pelo Canal Saúde(Fiocruz) e transmitidos pela TVE nosdias 14, 21 e 28 de março, sobre asquestões agrícola e agrária no país, aprodução e distribuição de alimentose o Programa Fome Zero, o mediadorRenato Farias revelou sua preocupa-ção em relação à falta de divulgaçãoque diversos temas discutidos nos pro-gramas enfrentam:

— A mídia só divulga o agronegócioe as maravilhas da tecnologia, quandoa gente pôde ver que as discussõesapontam por um outro caminho, o daagricultura familiar, por exemplo, quedemanda menos investimento, geramais renda e mais empregos e é me-nos agressiva ao meio ambiente.

Para Guilherme Delgado, pesqui-sador do Instituto de Pesquisa Eco-nômica Aplicada (Ipea) e membro doConsea, a preocupação de Renatonão é à toa, pois a grande mídia ba-

naliza demais o Programa FomeZero, que acaba sendo visto

apenas pelo seu ladoassistencialista.

— As propos-tas que mexemcom os direitos,

com as questõesrelacionadas à pro-dução, à estruturaagrária e até mesmo

com a educação parao consumo são pouco

realçadas. Eu pensoque alguns meios de co-

municação, principal-mente as TVs educativas,

podem cumprir esse papel com com-petência, uma vez que a grande mídianão cumpre — diz ele.

O destaque ao aspecto assisten-cialista do Fome Zero acaba servin-do de vitrine para empresas e per-sonalidades dispostas a aparecer,como destacou uma matéria deEvandro Spinelli na Folha de São Pauloon-line de 26 de janeiro, antes mes-mo do lançamento oficial do Progra-ma do governo. “Os doadores volun-tários vão usando o Programa paratentar conseguir algum tipo de fa-vor do governo ou espaço na mídia,na onda do apoio popular ao FomeZero e ao novo governo”, escreveuo jornalista.

Na opinião de Chico Menezes, amídia só se preocupa com as fofocasde bastidores e um exemplo clarodisso foi o que aconteceu depois daprimeira reunião do Consea:

— Em vez de divulgar e discutiras determinações do Consea sobre aduplicação de recursos para a agri-cultura familiar e o Plano Safra, a gran-de imprensa preferiu desperdiçarpáginas e mais páginas para falar dadoação que Vera Loyola fez para oPrograma, de uma coleira de ouroque pertencia à sua cadelinha deestimação. A imprensa precisa seconscientizar que só o debate leva asociedade a participar, intervindo epropondo mudanças.

De acordo com o editorial da edi-ção 321 do jornal Correio da Cidada-nia, dirigido por Plínio Arruda Sampaio,os grandes jornais, em sua “inesgotávelcapacidade de desinformar”, acabaramdesviando a atenção do Programa FomeZero para uma discussão secundária queé a forma de entregar o subsídio à famí-lia carente. ”Não é isto o que mereceum grande debate público, mas sim asrelações entre o Programa e as refor-mas estruturais necessárias para que afome seja erradicada dentro de algunsanos”, diz o autor do texto, lembrandoainda que, se os instrumentos necessá-rios para erradicar a fome forem sabo-tados, o Fome Zero terá o mesmo des-tino do Plano Real que, à custa de umgrande sacrifício da população brasilei-ra, conseguiu estabilizar a economia poralgum tempo sem, no entanto, resolveros problemas definitivamente.

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pppppneuneuneuneuneummmmmooooonia Asnia Asnia Asnia Asnia Asiáiáiáiáiátititititicccccaaaaa

Caco Xavier

Nas últimas semanas, o mundoreagiu com preocupação àsimagens de rostos asiáticospercorrendo as ruas da China,

Malásia, Cingapura e Vietnã portando más-caras cirúrgicas descartáveis. Esta é, lite-ralmente, a face da misteriosa pneumoniacujo surto originou-se no sudeste da Ásia eque já infectou 2.723 pessoas em 16 países(dados de 11 abril, data de fechamento des-ta edição), matando 103 pessoas. A Organi-zação Mundial da Saúde (OMS), ao mesmotempo em que apontava para poucas possi-bilidades de que a infecção se tornasse umaepidemia mundial, emitia comunicado classi-ficando a chamada síndrome respiratóriaaguda severa (SARS, sigla da expressão eminglês) como “uma ameaça global à saúde”,convocando 11 laboratórios de dez paísespara tentar descobrir o causador dasíndrome e tratar os doentes.

Epidemiologistas do Departamentode Saúde de Hong-Kong, na China, cidadede onde a atípica pneumonia se alastroupara o resto do mundo, descobriram que,entre meados de fevereiro e início de mar-ço, as sete primeiras vítimas da doençaestavam hospedadas ou visitaram o 9o an-dar de um hotel quatro-estrelas situadono distrito de Kowloon. A vítima número umteria sido um professor de medicina de 64anos. Para os especialistas da OMS, a SARSestá diretamente relacionada a uma ou-tra epidemia que começou em novembrodo ano passado na província chinesa deGuangdong, vizinha de Hong-Kong. Em trêsmeses, 300 pessoas adoeceram e cincomorreram com sintomas muito semelhan-tes aos da síndrome de agora. “As autori-dades chinesas agiram com descaso”, di-zem os especialistas, assegurando que, seas notificações tivessem sido feitas, a bus-ca para decifrar o agente infeccioso po-

deria estar bem mais avançada.Segundo a OMS, a maior proporção

de casos tem ocorrido em adultos previa-mente sadios. Os casos secundários con-centram-se em profissionais de saúde efamiliares que tiveram contato direto comos pacientes.

SINTOMAS, CAUSASE TRATAMENTO

As primeiras manifestações da doençaincluem súbita febre alta (38oC ou mais),calafrios, dores musculares e tosse seca.Em três ou quatro dias, os infectados sen-tem dificuldade de respiração. Em 80 a 90%dos casos, há melhora dos sintomas a partirdo sexto dia. Em 10 ou 20% dos casos, osdoentes evoluem para um quadro mais gra-ve, com insuficiência respiratória aguda. AOMS considera ‘caso suspeito’ um pacienteque apresente: febre elevada acompanhadade tosse, fadiga, dificuldade de respirar econtato íntimo com pacientes com SARS (den-tro de dez dias do início dos sintomas) ouviagem recente para áreas afetadas.

Até o momento, ainda não há resul-tados conclusivos sobre qual é o agentecausador da síndrome. Pesquisas em pa-cientes com SARS acusaram a presençade vírus das famílias Paramyxociridae eCoronaviridae,que podem estar atuandoem ação conjunta. Já foram descartadosos vírus freqüentemente associados às in-

fecções respiratórias agudas, como o sa-rampo. Está sendo considerada, ainda, apossibilidade de ser algum vírus que causeinfecção em animais e que tenha ‘saltado abarreira das espécies’ para infectar huma-nos. Cientistas da OMS supõem que o vírusteria começado a atacar seres humanosdepois de ter sofrido uma mutação. Segun-do eles, a infecção pode ter ocorrido peloconsumo de carne de frango mal passadaou pelo ar, o que é possível devido ao exces-so de proximidade física que existe entrehomens e animais no sul da Ásia, onde famí-lias muitas vezes vivem em contato comfrangos, patos e porcos em casa. Em rela-ção ao tratamento, diversas terapias comantibióticos têm sido tentadas, com poucoefeito. Atualmente, a terapia mais apropri-ada são as medidas de suporte geral do pa-ciente, assegurando a hidratação e o tra-tamento de infecções subseqüentes.

O BRASIL SE PREPARAA Fiocruz preparou-se para atuar

como referência nacional para o diagnós-tico laboratorial e agir contra possíveiscasos que venham a acontecer no Brasil,realizando análises e atendimento clíni-co. O recebimento de amostras funcio-nará 24 horas por dias, sete dias por se-mana, permitindo sua pronta análise.

A Fundação Nacional de Saúde(Funasa) mantém uma equipe de pronti-dão em Brasília, pronta para agir casosurjam casos da Síndrome no país. JarbasBarbosa, diretor do Centro Nacional deEpidemiologia da Funasa, garante que opaís está preparado para lidar com a si-tuação. “Estamos seguindo todas as ori-entações da OMS”, diz ele.

O primeiro caso suspeito já surgiu.A jornalista inglesa Sally Blower, que este-ve na Malásia nos dias 22 e 23 de março echegou ao Brasil para a cobertura do GPBrasil de Fórmula 1, passou duas semanasem isolamento no hospital Albert Einstein,em São Paulo. Outros casos tidos comosuspeitos foram avaliados, mas a hipóte-se de se tratar da pneumonia asiática foidescartada. “É bom que, nesse momen-to, apareçam várias suspeitas”, disseJarbas Barbosa, lembrando que isso mos-tra que as pessoas estão alertas. “A vigi-lância está funcionando”, diz.Mais informações: FunasaSite: www.funasa.gov.brTel: (61) 226-4036/223-6798

Apneumonia infecciosa clássica fazcom que apareçam sinais carac-

terísticos na radiografia e o médicopode imediatamente identificar o tipode bactéria ou vírus responsável eprescrever o tratamento adequado.Na pneumonia atípica, as radiografi-as pulmonares não comprovam as di-ficuldades respiratórias.

Uma nota triste na história dessaepidemia foi a morte, em 29 de

março, do médico italiano Carlo Urbani,especialista em enfermidades infeccio-sas e que foi o primeiro a identificar apneumonia asiática. Urbani morreu aos46 anos de idade, na Tailândia, vítimada própria doença que identificou.

Um perigo que vem do Extremo Oriente

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áááááguguguguguaaaaa

Caco Xavier

Metade da população do plane-ta estará sentindo os efeitosda falta de água potável em2025, segundo estimativa do

Conselho Mundial da Água. Atualmente, aescassez de água limpa já atinge 30% dapopulação mundial, cerca de 1,4 bilhão depessoas. Além disso, até lá a agriculturairrigada terá que produzir 70% dos ali-mentos do mundo, para alimentar dois bi-lhões de pessoas a mais do que hoje.

Foram essas as principais preocupa-ções que nortearam os debates do Tercei-ro Fórum Mundial da Água que aconteceuem Kyoto, Japão, de 14 a 23 de março, reu-nindo 10 mil delegados de 169 países. OFórum discutiu, em 350 sessões, mais de 40temas relacionados à água, entre eles asmudanças climáticas, a água como fator deconflitos, a água e a pobreza, as novastecnologias de extração e tratamento e ofinanciamento de infra-estrutura básica.

Segundo o Presidente do Conselho Mun-dial da Água, Mahmud Abu-Zeid, dos encon-tros anteriores — Marrocos (1997) e Holanda(2000) — para cá, aprofundou-se a chamada‘crise global da água’, complexa combina-ção de poluição dos mananciais, desperdíciona distribuição e uso final e privatização.

No entanto, o Terceiro Fórum co-meçou sob divergências. De um lado,agências multilaterais de financiamentopropuseram o estímulo de investimentosprivados para atender ao bilhão de pes-soas sem água potável e 2,4 bilhões semsaneamento em todo o mundo; de outro,organizações não governamentais defen-diam o acesso a uma cota mínima de 50litros de água por dia como um direito de

Fórum Mundial alerta: vaifaltar água potável em 2025

todos os seres humanos. Para estes, ofato de o acesso à água ser declarado umdireito, e não uma necessidade,modifica completamente a óticasobre o assunto. “Necessidades podemser supridas por empresas privadas quecobram caro pela prestação do serviço”,diz Maude Barlow, da ONG canadense Con-selho de Cidadãos, “enquanto direitos sãoinegociáveis e precisam ser respeitados”.O Brasil defendeu, no Fórum, uma tercei-ra posição, segundo o secretário de Re-cursos Hídricos do Ministério do Meio Am-biente, João Bosco Senra. Para ele, a águaé um ‘bem social’, sobre o qual as naçõesdevem exercer sua soberania.

Segundo a Federação Internacionalde Sociedades da Cruz Vermelha e do Cres-cente Vermelho, a escassez de água potá-vel é responsável pela morte de 2 milhõesde crianças por ano. “Somente duranteesses poucos dias em que nos reunimosneste Fórum”, disse o diretor da Federa-ção, Didier Cherpitel, “48 mil crianças te-rão morrido por falta de água, saneamen-to inadequado e higiene precária”.

O Fórum apresentou, no último dia,uma Declaração Global sobre Águas. O pró-ximo Fórum Mundial está previsto para 2006,e o Brasil já se candidatou para sediá-lo.

NO BRASIL, PATRIMÔNIOE PROBLEMA

O Brasil apresenta o maior fluxo in-terno de água do mundo, com 5,4 milhõesde metros cúbicos. Por outro lado, a re-gião do semi-árido nordestino, que abri-ga 28% da população brasileira, conta comapenas 5% dos recursos hídricos do país.Segundo Vinod Thomas, diretor do BancoMundial para o Brasil, em artigo no jornalO Globo, a água limpa também é escassanas regiões úmidas e industrializadas doSul e do Sudeste, onde vivem 60% da popu-lação. Para ele, essa escassez deve-se,

Exemplo recente: no final de março,o despejo de substâncias tóxicas

da indústria de papéis Cataguases,lançadas no rio Pomba, em Cata-guases, MG, foi responsável por umdesastre ambiental que tomou contado rio Paraíba do Sul, que abastececerca de 11 milhões de pessoas noestado do Rio de Janeiro. O despejogerou uma mancha negra com resí-duos químicos que se alastrou pormais de 50 quilômetros ao longo dorio, provocando o colapso no abas-tecimento de água em oito cidadesda região e a suspensão da pescapelos próximos 90 dias. A indústriade papel é apenas uma das inúmerasfontes poluidoras do local.

AONU (Organização das NaçõesUnidas) avalia que 50 litros de

água é o mínimo necessário para aten-der às necessidades diárias de cadaser humano: 5 litros para ingestão,20 para higiene e saneamento, 15para banho e 10 para preparaçãode alimentos. A organização preten-de reduzir pela metade, até 2015,o percentual da população mundialque não tem acesso sequer a essevolume diário.

entre outras coisas, aos elevados índicesde poluição dos rios da região o que, porsua vez, aumenta o custo de tratamentoda água. “No Brasil, a água é ao mesmotempo um patrimônio e um problema”, dizThomas, lembrando que a falta de águapara irrigação também prejudica imen-samente a agricultura, já que força o paísa utilizar apenas 15% de seu potencial deirrigação.

— A gestão dos recursos hídricos noBrasil tem sido dificultada pela aborda-gem institucional fragmentada, pela aten-ção excessiva a novos investimentos emdetrimento da operação e manutençãoda infra-estrutura existente e por nãointegrar considerações ambientais—ava-lia Vinod Thomas.Mais informações: II Fórum Mundial da ÁguaSite: www.world.water-forum3.com

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FESTIVAL

IV MOSTRA NACIONAL DE VÍDEOS SOBRESAÚDE (VIDEOSAÚDE)

Estimular a produção de vídeos sobresaúde, identificar e reunir as novas

realizações que enriqueçam o acer-vo de títulos relacionados ao tema eampliar os espaços de difusão para osaudiovisuais sobre saúde. Esses são osprincipais objetivos da IV VídeoSaúde,organizado pela VideoSaúde Distribui-dora, do Departamento de Comunica-ção e Saúde, do Centro de Informa-ção Científica e Tecnológica da Fiocruz(DCS/CICT/Fiocruz). Os interessadosem participar da mostra deverão ins-crever seus trabalhos até o dia 31 demaio. Podem participar: instituiçõespúblicas e privadas, empresas produ-toras, organizações não-governamen-tais, outras entidades da sociedade civile produtores independentes. Osvídeos selecionados serão exibidos noVII Congresso Brasileiro de Saúde Cole-tiva (Abrasco), que acontece emBrasília, entre os dias 29 de julho e 02de agosto. Os três melhores vídeos re-ceberão prêmios em dinheiro, além demenções honrosas, e um prêmio espe-cial será entregue ao melhor vídeo so-bre a fome, como apoio ao ProgramaFome Zero, do Governo Federal.

As inscrições deverão ser feitas noDCS, localizado na avenida Brasil, 4036,sala 516, Manguinhos—Rio de Janeiro-RJ—CEP 21240-361, entre 9 h e 17h, oupelo correio (via sedex) com data depostagem até o dia 31 de maio.Mais informações:E-mail: [email protected].: (21) 3882-9109 / 9110 / 9111 / 9147Telefax: (21) 2290-4745

EVENTOS

! V CONGRESSO NACIONAL DA REDE UNIDA! I FÓRUM NACIONAL DE REDES EM SAÚDE! II MOSTRA PARANAENSE DE PRODUÇÃOEM SAÚDE DA FAMÍLIA

Acontecerá em Londrina/PR, de 24a 27 de maio de 2003. As inscrições

poderão ser feitas diretamente pelo site

ssssserererererviçviçviçviçviçososososos

www.redeunida.org.br/inscvcong.asp,ou pelo correio, enviando a fichade inscrição preenchida para aRede Unida, no endereço: Rua SouzaNaves, nº 9/ sala 110, Londrina/PR,CEP 86010-921.Mais informações:Site: www.redeunida.org.brTel.: (43) 324-2340

I I I SEMINÁR IO DO PROJETO INTE-GRALIDADE SABERES E PRÁTICAS NASINSTITUIÇÕES DE SAÚDE

Oseminário será dividido em quatromesas-redondas, nas quais estarão

presentes Jorge Solla, Alcindo Ferla,Gastão Wagner, Ricardo Ceccim e outros.Local: Instituto de Medicina Socialda Universidade Estadual do Rio deJaneiro (IMS/Uerj)Rua São Francisco Xavier, 524, pavilhãoJoão Lyra Filho, 7º andar, bloco DMaracanã — Rio de Janeiro /RJData: 04 e 05 de junho de 2003Horário: 09 às 17hMais informações:E-mail: [email protected]

CURSOS NA ENSP

ATUALIZAÇÃO EM EPIDEMIOLOGIA PARASERVIÇOS DE SAÚDE

Fornecer a profissionais de saúde con-ceitos e técnicas sobre a Epidemio-

logia que contribuam para a análi-se de dados nos serviços de saúdeé o objetivo do curso que vai de 04de agosto a 22 de setembro. Os in-teressados deverão se inscrever atéo dia 13 de junho na Secretaria Aca-dêmica da Escola Nacional de Saú-de Pública (Ensp), apresentandocarta de intenções e comprovaçãode exercício de atividade em servi-ço de saúde.

ATUALIZAÇÃO NA LEITURA EM VIOLÊNCIAE SAÚDE

Oobjetivo do curso é refletir eaprofundar o conhecimento

acerca da violência no campo da saú-de pública, discutindo os aspectossocioepidemiológicos, políticos ecomunicacionais. As inscrições termi-nam no dia 31 de julho. Os interessa-dos deverão procurar a SecretariaAcadêmica da Ensp, levando uma cartade intenções, destacando a importân-cia do curso para as suas atividades

profissionais, que servirá para seleçãodos candidatos.Mais informações: Secretaria Acadê-mica da ENSPRua Leopoldo Bulhões, 1480/Sala 317Manguinhos—Rio de Janeiro—RJCEP: 21041-210Tel.: (21) 2598-2557 / 25580800-230085 — Fax: (21) 2598-2727E-mail: [email protected]

LANÇAMENTOS

EDITORA FIOCRUZ

A Medicalização do CorpoFeminino, de ElisabethMeloni Vieira, é um livroque relata o movimento deresistência de algumas mu-lheres e a dificuldade quemuitas tiveram em assegurar o contro-le desejado sobre a sexualidade, apre-senta a virada histórica da medicinada mulher e deixa em aberto uma aná-lise sobre as transformações da iden-tidade feminina e sobre o reconheci-mento de sua sexualidade como ‘útil’à sociedade.

Saúde e Ambiente Sus-tentável: estreitandonós, organizado por Ma-ria Cecília de SouzaMinayo e Ary Carvalho deMiranda, é um livro queapresenta conceitos sobre a relaçãoentre saúde e meio ambiente no Bra-sil com base nos dez anos da Confe-rência das Nações Unidas sobre MeioAmbiente e Desenvolvimento.

Mais informações: Editora FiocruzAvenida Brasil, 4036 / sala 112Manguinhos — Rio de Janeiro / RJCEP 21040-361Tel: (21) 3882-9041 / Fax: (21) 3882-9006

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE (CNS)

O Desenvolvimento do Sis-tema Único de Saúde: avan-ços, desafios e reafirmaçãodos seus princípios e dire-trizes é uma publicaçãodo CNS, no qual é apre-sentado um balanço dos 12 anos deimplementação do SUS no Brasil em bus-ca de uma avaliação mais aprofundadae permanente do desenvolvimento domodelo de atenção à saúde do país.O texto está disponível no site do CNS:http://conselho.saude.gov.br

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O homem mais feliz do mundo

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PÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDO

Ana Beatriz de Noronha

Muitos devem se lembrar que, nasemana que antecedeu o Car-

naval deste ano, a violência no Riode Janeiro atingiu uma proporçãoque deixou os cariocas ‘do bem’ ame-drontados, revoltados e cabisbaixos.Comigo, não foi diferente. De certaforma, fiquei triste com o que via aomeu redor.

Tristeza à parte, era preciso tra-balhar, pois o Radis não pára. No dia27 de fevereiro, resolvi pegar um táxina Tijuca com destino ao centro dacidade, onde faria uma entrevista.Por fora, o carro era exatamenteigual a todos os outros táxis da ci-dade, mas algo mudou quando euabri a porta do carro. Ao volante,um homem de cabelos e barba lon-gos e brancos, no tradicional estilo‘papai noel’; no rádio, música clássi-ca... e uma pergunta do motorista:“A música lhe incomoda?”.

— De jeito algum — respondi.Acho que foi a senha para o de-

senrolar de um longo papo sobre ascoisas da vida, o que costuma ser co-mum quando se está num táxi. O quefazia realmente diferença era a figuraserena do senhor Renato Pires, o mo-torista, que me garantiu: “Sou o ho-mem mais feliz do mundo!”.

As justificativas para tal afirmaçãoeram muitas:

— Sou casado há 40 anos com amulher que eu amo e que enfrentoua família para se casar comigo, naépoca um simples motorista de ôni-bus, alegando que eu era o homemmais honesto e trabalhador que ela,professora formada, já conhecera.Hoje, apesar de aposentado, eu saiopara trabalhar todo dia, pois não que-ro que ela pense que se enganou.Gosto do que faço e, graças ao meutrabalho, posso ajudar algumas pes-soas que passam dificuldades. Amo amúsica clássica e acredito que pormeio dela podemos mudar o mundo.

A conversa se tornou mais longaporque seu Renato se recusava a pas-sar dos 40 km. Se no início eu me pre-ocupei em perder a hora, depois rela-xei e me deixei levar pelo papo.Trocamos idéias sobre medicina natu-ral, dinheiro e necessidade de ajudaro próximo. Vi seu Renato chorar, aome contar de uma palestra que ouviusobre a importância da solidariedade,mas a maior surpresa veio na hora depagar os R$ 12,00 da corrida. Ele sim-plesmente se recusou a receber, a des-peito da minha insistência.

— Use esse dinheiro com as pes-soas que a senhora ajuda — disse ele.

— Tudo bem, comprarei três nú-meros de rifa no seu nome e lhe en-trego o prêmio se o senhor ganhar —propus.

— Se eu ganhar, rife o prêmio denovo — concluiu, seu Renato, arran-cando com o carro e me deixando nacalçada da Av. Rio Branco, atônita, comos olhos brilhando e um sorriso meioabobalhado nos lábios.

Sem se dar conta, aquele moto-rista havia me feito trocar o desâni-mo e a descrença que estavam co-meçando a me contagiar, devido àinsegurança da cidade, ‘por esperan-ça e otimismo. Obrigada, senhor Re-nato Pires. O senhor é certamenteaquilo que afirma ser: o homem maisfeliz do mundo.