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FACULDADES INTEGRADAS DE SÃO PEDRO – FAESA II FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAUDE E MEIO AMBIENTE CURSO DE PSICOLOGIA BEATRIZ FERREIRA DIAS SPERANDIO SOLANGE APARECIDA DA SILVA PRÁTICAS PSICOSSOCIAIS EM SAÚDE COM CUIDADORES DE IDOSOS: UMA POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO ENGAJADA JUNTO AO SUS. VITÓRIA 2006

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FACULDADES INTEGRADAS DE SÃO PEDRO – FAESA II FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAUDE E MEIO AMBIENTE

CURSO DE PSICOLOGIA

BEATRIZ FERREIRA DIAS SPERANDIO

SOLANGE APARECIDA DA SILVA

PRÁTICAS PSICOSSOCIAIS EM SAÚDE COM CUIDADORES DE IDOSOS: UMA POSSIBILIDADE DE

INTERVENÇÃO ENGAJADA JUNTO AO SUS.

VITÓRIA

2006

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BEATRIZ FERREIRA DIAS SPERANDIO SOLANGE APARECIDA DA SILVA

PRÁTICAS PSICOSSOCIAIS EM SAÚDE COM CUIDADORES DE IDOSOS: UMA POSSIBILIDADE DE

INTERVENÇÃO ENGAJADA JUNTO AO SUS.

Trabalho de Conclusão de Curso de

Graduação em Psicologia

apresentado à Faculdade de Saúde

e Meio Ambiente, como requisito

parcial para obtenção do título de

Bacharelando em Psicologia , sob

orientação da prof. Márcia Roxana

Cruces Cuevas.

VITÓRIA

2006

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BEATRIZ FERREIRA DIAS SPERANDIO SOLANGE APARECIDA DA SILVA

PRÁTICAS PSICOSSOCIAIS EM SAÚDE COM CUIDADORES DE IDOSOS: UMA POSSIBILIDADE DE

INTERVENÇÃO ENGAJADA JUNTO AO SUS.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________

Orientadora: Márcia Roxana Cruces

Cuevas

______________________________________ Edinete Maria Rosa

______________________________________

Maria Inês Badaró

Trabalho de Conclusão de Curso

aprovado em ____ / ____/ ____.

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“Construímos o mundo a partir de laços afetivos. Esses laços

tornam as pessoas e as situações preciosas, portadoras de valor.

Preocupamo-nos com elas. Tomamos tempo para dedicarmos a

elas. Sentimos responsabilidade pelo laço que cresceu entre nós e

os outros. A categoria cuidado recolhe todo esse modo de ser.

Mostra como funcionamos enquanto seres humanos.”

(Leonardo Boff)

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RESUMO SPERANDIO, Beatriz Ferreira Dias; SILVA, Solange Aparecida da; CRUCES CUEVAS, Marcia Roxana. Práticas psicossociais em saúde com cuidadores de idosos: uma possibilidade de intervenção junto ao sus.

Este trabalho de intervenção que apresenta leitura baseada na Psicologia Sócio-Histórica foi realizado com cuidadores de idosos do bairro Romão, no município de Vitória/ES, a partir de uma parceria estabelecida com a Unidade Básica de Saúde do Forte São João e teve como objetivo conhecer e compreender o cotidiano dessa clientela para construir junto a eles novas significações do ato de cuidar, resultando daí, uma experiência de fortalecimento no enfrentamento das dificuldades vividas. Para um maior entendimento de suas experiências e necessidades foi adotado como estratégia o acompanhamento domiciliar, onde buscou-se vivenciar o cotidiano destes cuidadores, utilizando a escuta das demandas bem como os encaminhamentos necessários. Num período de 4 meses foram acompanhados 2 cuidadores informais de idosos, que cuidam de suas mães . Esses encontros tiveram por média 3 horas semanais. Como método de pesquisa foi utilizado o qualitativo com delineamento na pesquisa-ação, pois assim os pesquisadores puderam se implicar e estar lado a lado durante todo o processo. Para a análise dos dados, utilizou-se, ainda, o método de análise de conteúdo temático que possibilitou entender que o cuidar não é uma tarefa fácil, que não se dá a partir de uma escolha e apresenta vários embates como o isolamento e desqualificação social. É caracterizado por constantes conflitos demonstrando que o cuidar exige tarefas delicadas e muitas vezes sofridas, já que enfrenta constantes desafios, perdas, limitações, deixando, em muitas das vezes, sua vida em segundo plano. Esta intervenção possibilitou aos pesquisadores participar da construção de uma articulação e comunicação concreta entre os vários setores que atendem a comunidade, contribuindo na implementação de políticas de saúde, entendendo o necessidade de uma formação profissional mais ampliada para melhor intervir junto ao Sistema Único de Saúde.

Palavras-chave: Saúde -Cuidar- Sistema Único de Saúde-cuidador.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................. 07

2 REFERÊNCIAL TEÓRICO............................................................................. 10 2.1 PSICOLOGIA NO BRASIL.......................................................................... 11

2.2 PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA: UMA PRÁTICA POSSÍVEL

JUNTO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE..................................................

16

2.3 TRABALHO JUNTO A CUIDADORES DE IDOSOS COMO

POSSIBILIDADE DE PRÁTICA PSICOLÓGICA ENGAJADA.....................

23

3 METODOLOGIA............................................................................................ 28 3.1 NATUREZA E TIPO DA PESQUISA .......................................................... 28

3.2 DESCRIÇÃO DO CONTEXTO PESQUISADO ......................................... 29

3.3 SUJEITOS DA PESQUISA ........................................................................ 30

3.4 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS ............................................................. 31

3.5 ANÁLISE DOS DADOS............................................................................... 32

4 ANÁLISE E DISUCSSÃO DOS RESULTADOS........................................... 33 4.1 CONSTRUÇÃO DA PARCERIA COM A UNIDADE BÁSICA DE SÁÚDE:

ENCONTROS E DESENCONTROS...........................................................

33

4.2 O ENCONTRO COM OS SUJEITOS......................................................... 40

4.3 CUIDAR: A EXPERIÊNCIA DOS CUIDADORES...................................... 43

4.4 EFEITOS DO TRABALHO REALIZADO..................................................... 50

4.5 SUPERVISÕES-O PORTO SEGURO........................................................ 53

5. CONCLUSÃO ............................................................................................. 56

6 REFERÊNCIAS ............................................................................................ 59

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1 INTRODUÇÃO

O ato de cuidar nos remetia, em muitas das vezes, à compaixão, carinho,

atenção, a algo prazeroso. Foram poucas as ocasiões em que paramos para

realmente analisar esse fazer com um olhar mais relacionado, à

responsabilidade, às dificuldades que esta prática também apresenta.

Ao desenvolver intervenção junto a cuidadores de idosos ampliamos nossa

visão e além de observar os desafios que esta prática proporciona,

percebemos também, que o cuidar faz parte de todas as nossas relações.

Através do cuidado encontramos o ethos fundamental do humano. Isto é, no

cuidado identificamos os princípios, os valores e as atitudes que baseiam

nossos comportamentos. Boff (1999, p.35), afirma que a essência humana é

cuidar. “O ser humano é um ser de cuidado, mais ainda, sua essência se

encontra no cuidado. Colocar cuidado em tudo o que projeta e faz, eis a

característica singular do ser humano”.

Ao desenvolvermos esta intervenção em saúde, percebemos o quanto esta

dimensão do cuidar encontra-se presente nas Políticas Públicas. Ao zelar pela

prevenção e promoção da saúde dos usuários exerce-se função de cuidados.

O presente trabalho objetivou conhecer e compreender o cotidiano de dois

cuidadores informais1 de idosos acamados do Morro do Romão, para fornecer

escuta, orientação e atenção psicossocial bem como, construir junto aos

cuidadores momentos de re-significação da experiência de cuidar. Buscou

responder as seguintes questões: Como os cuidadores informais significam o

ato de cuidar? Quais são as estratégias de enfrentamento das dificuldades

encontradas nesse trabalho/ativividade? Quais os embates perpassados pelos

cuidadores ao cuidar?

1 Os cuidadores informais de idosos, segundo literaturas gerontológicas, são aqueles que fazem parte da família do idoso dependente.

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Apresenta, também, importantes reflexões sobre o papel do psicólogo que atua

em políticas públicas de saúde, bem como a experiência de estabelecimento

de parceria com uma Unidade Básica de Saúde, tendo como alicerce a leitura

de mundo e de homem da Psicologia Sócio - Histórica.

Proporciona contribuições para vários âmbitos: No pessoal, consolidou uma

formação diferenciada, pautada no compromisso ético-político a partir de uma

visão ampliada em saúde-cuidado e SUS. No científico, contribui para ampliar o

debate sobre esta temática tão pouco enfocada pelos profissionais psi. No

social auxiliou na melhoria da qualidade de vida e na construção de alternativas

de atenção à saúde do cuidador, bem como, do idoso dependente, pois os

mesmos estão intimamente ligados, se afetam e são afetados constantemente.

Desenvolver esta intervenção com os cuidadores de idosos, portanto, muito

nos sensibilizou. Descrever com exatidão o verdadeiro motor que nos

impulsionou a essa escolha não é uma tarefa muito simples.

O respeito com a comunidade no sentido de não só colher dados, fazer um

retrato da situação, mas com o desafio de contribuir com qualidade de vida,

visando assim o bem estar do sujeito e da comunidade, atuando “de forma a

promover ações para que [...] possa se tornar um lugar de crescimento dos

indivíduos, mantendo uma posição crítica que garanta o desenvolvimento da

instituição e da sociedade” (CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA, 2000,

p.12) auxiliaram no atraso de escolha da proposta a ser efetivada, pois não

conseguíamos encontrar uma efetiva demanda da comunidade.

Porém, ao participar de reuniões na Unidade de Saúde do Forte São João,

onde foi exposto pelas profissionais daquela Unidade um trabalho iniciado com

os cuidadores de idosos acamados, despertou-nos a possibilidade de

desenvolver este trabalho por ser um tema novo e pouco pesquisado no meio

científico.

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Hoje, temos consciência de não ter sido apenas este o motivo desta escolha,

acreditamos que outras forças contribuíram para a implicação deste fenômeno,

forças essas que são muito subjetivas, pois dizem respeito a nossa história de

vida. O importante é que a partir de então, despertou em nós o desejo de poder

contribuir para a melhoria da qualidade de vida destes cuidadores e para a

efetivação de práticas ampliadas em Saúde, pois entendemos a necessidade

desta visão no contexto atual em que vivemos.

Esta intervenção faz parte do projeto de Estágio Supervisionado Básico I e II

que teve como intuito desenvolver Práticas Psicossocias em Saúde, do curso

de Psicologia das Faculdades de Ciências da Saúde e Meio Ambiente –

FAESA, desenvolvido no período de 2004/02 a 2005/01, que propôs construir,

junto à comunidade, análises e ações no sentido de prevenção de doenças e

promoção de saúde.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

A visão de homem que norteia este trabalho é a de um ser social, ativo e

histórico. Entende-se assim, seu caráter multideterminado: constituído em suas

relações sociais, sendo então produtor e produto de sua história pessoal e da

história da sociedade, portanto um sujeito que reflete seu pensar, suas ações,

seu estar no mundo. O homem, “é um processo, precisamente processo de

seus atos [...] é sempre um devir” (GRAMSCI apud SILVA, 2004 p. 17).

Essa leitura tem base na Psicologia Sócio-Histórica, que propõe uma maneira

de ver a psicologia e de entender o fenômeno psicológico. Assim, falar da

subjetividade

é obrigatoriamente falar da sociedade. Falar da subjetividade humana é falar da objetividade em que vivem os homens. A compreensão do “mundo interno” exige a compreensão do “mundo externo”, pois são dois aspectos de um mesmo movimento, de um processo no qual o homem atua e constrói/modifica o mundo e este, por sua vez, propicia os elementos para a constituição psicológica do homem (BOCK, 2001, p. 22).

Enfatiza-se, portanto, o caráter social da constituição do ser humano e tem

como eixo básico a historicidade. Segundo Gonçalves (2003, p.279) “a

compreensão da historicidade de todos os processos humanos e sociais é o

recurso teórico e metodológico que permite aliar a ciência à luta pela

transformação social”. E é realmente este o papel dos profissionais que

desempenham intervenções vinculadas a esta leitura e ao qual procuraremos

pautar nossas reflexões e práticas.

O papel do trabalhador social, neste sentido, se dá no processo da estrutura

social, que se caracteriza como mutável e estável, dinâmica e estática. O

trabalhador deve ter sempre em mente que suas ações precisam promover a

aceitação das diferenças, a reflexão da realidade – problematizando-a e

desmitificando-a, e claro, precisa ser pautada na importância da população ser

sujeito e não apenas objeto de transformação (FREIRE, 1994).

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A intervenção do psicólogo, então “deve estar comprometida com a

transformação social não só enquanto intenção e propósito, mas como

possibilidade teórica e científica” (GONÇALVES, 2003, p. 279).

Esse modo de pensar a psicologia pode ser utilizado por diversas abordagens

do fazer psicológico, basta que os profissionais que o utilizem tenham

consciência do papel do trabalhador social, do objetivo desta vertente que é o

de transformação da realidade, buscando “uma sociedade justa e igualitária,

[...] onde todos vivam com dignidade sua humanidade naquilo que ela tem de

mais desenvolvido” (GONÇALVES, 2003, p. 277) e da necessidade do mesmo

se implicar politicamente na realidade social imposta. Dessa forma, “a

intervenção profissional é sempre posicionada e deve ser objeto de reflexão

constante, a fim de que este posicionamento fique claro” (Ibidem, p. 278).

Portanto, a Psicologia Sócio-Histórica propõe uma atuação engajada que

pensa, reflete as condições materiais e históricas de vida, uma ação

profissional política. Por ter esta leitura rompe com as tendências dominantes

dos Estados Unidos, ou seja, com o pragmatismo e o positivismo cujo objetivo

era medir o comportamento dos indivíduos, estando mais voltada para o que se

pode ser visivelmente comprovado.

2.1 PSICOLOGIA NO BRASIL

No Brasil a Psicologia Sócio-Histórica ganhou espaços dentro dos principais

centros de formação profissional e no decorrer destes 44 anos de profissão tem

construído uma prática junto às camadas mais pobres do país.

De acordo com Bock (1999, p. 75) na década de 60, quando surgiu a psicologia

enquanto profissão no Brasil, as práticas foram destinadas, quase que

exclusivamente, para a área clínica, com o desenvolvimento de atendimentos

individuais. Este modelo de clínica caracterizava-se por representações a-

históricas, abstratas e “não-sociais” voltadas para o modelo médico,

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individualista, reducionista, que pensava o sujeito como um objeto acabado e

não em construção.

Atualmente a Psicologia entende a clínica de forma ampliada, ou seja, um

campo de práticas de produção de conhecimento, de modos de estar no

mundo que traz uma ética2 (ação e reflexão) e que, segundo Figueiredo citado

por Coimbra (19_ _, p.48).

trata-se de um acolhimento ao excluído, não apenas como vias de expressão , mas como sustentação da processualidade, das tensões e conflitos que impelem para o movimento, para as trans-form-ções” Assim a clínica pode se situar não como uma área ou especificifidade, mas como uma ética.

Na década de 60 o Brasil passava por inúmeros confrontos políticos e sociais,

visto que o contexto era caracterizado pela imposição do golpe militar. Vários

movimentos sociais estavam acontecendo, a repressão militar causando terror

em meio à população, o que ocasionava uma grande desordem em toda a

sociedade. Como de costume, as classes menos favorecidas foram as mais

prejudicadas em toda crise.

No fim da década de 60 e início da década de 70, a psicologia no Brasil, ao

contrário das tendências européias, que apontavam e até mesmo já

desenvolviam intervenções coletivas, continuou a estabelecer práticas

individuais, considerando a terapia de grupo ineficaz (FREITAS, 1996).

Em meio a toda crise social e ao caráter individual e elitista, enfocado pela

psicologia na época, alguns psicólogos, principalmente os mais engajados nos movimentos

sociais começaram a se preocupar com a construção de uma prática psicológica mais voltada

para a realidade de nossa sociedade como um todo, dando ênfase às classes menos

favorecidas, tendo em vista que a psicologia até então estava comprometida com os grupos

dominantes.

Nesse sentido, como aponta Freitas (1996 p. 64) alguns profissionais

2 A palavra ética, aqui empregada, possui o mesmo sentido da expressão ‘práxis’, muito utilizada por Paulo Freire, denotando assim, uma ação que é constantemente refletida.

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começaram a marcar novos espaços através de práticas diferentes [...] indo para os bairros populares, para as favelas, para as associações de bairros, para as comunidades eclesiais de base. Os trabalhadores passaram a advogar não só o caráter da deselitização da psicologia como também um claro envolvimento e participação política, junto aos movimentos populares.

Começou então, a surgir no Brasil, paralelamente com vários movimentos na

América Latina, uma psicologia denominada social que rompeu com o

positivismo da psicologia social norte-americana, tomando rumo bem diferente,

bem particular, e vem sendo construída gradativamente a partir de importantes

intervenções.

Assim, os determinantes históricos e sociais começavam a ter relevância no desenvolvimento

da atividade científica, dos educadores e profissionais da área os quais percebiam a

necessidade de uma psicologia que contribuísse com a superação das injustiças sociais. Esta

se tornou a característica de uma Psicologia Social latino-americana quando, na década de 70,

tornou-se necessária uma reflexão crítica e uma ação comprometida socialmente, a fim de que

ela se tornasse efetivamente uma práxis científica a serviço de transformações sociais

urgentes (LANE, 2000, p.58-69).

Os psicólogos sociais passaram então a se deslocar para as comunidades menos favorecidas

buscando desenvolver trabalhos que levassem a mobilizações políticas e transformações

sociais. Neste contexto, começou-se a utilizar o nome comunidade para caracterizar esta

prática em psicologia social.

Inicialmente denominada de psicologia na comunidade as práticas, que eram de caráter

voluntário, tinham o objetivo de deselitizar a profissão e voltava-se mais para os problemas

referentes às condições de vida da população. “Para isso, ela necessitava deixar de ser

realizada nos consultórios e nas escolas, por exemplo, e passar a ser desenvolvida na

comunidade” (FREITAS, 1996, p. 72). Entretanto, foi percebido que a mudança acontecida

estava caracterizada apenas pela alteração do local. As práticas desenvolvidas continuavam a

ter o caráter das intervenções clínicas individuais.

A década de 80 foi caracterizada como de grande avanço para esta prática comunitária, visto

que, como aponta Freitas (1996, p.59), após inúmeras reflexões, que ocorreram principalmente

no estado de São Paulo, o governo estadual e o Conselho Regional de Psicologia (CRP-06/SP)

criaram “a possibilidade concreta para que o profissional de psicologia passasse a trabalhar em

postos/unidades de saúde, tendo uma atuação institucionalmente reconhecida”. Iniciou-se,

então, a realização de concursos públicos com vagas para a psicologia.

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No início da década de 90, surgiu a terminologia psicologia da comunidade, referindo-se a

práticas ligadas às questões de saúde, bem como ingresso em movimentos comunitários

levando a discussões políticas. Percebe-se, portanto, profundas reflexões quanto às suas

intervenções. Neste contexto, começou a ganhar força uma forte discussão sobre a

necessidade da psicologia colaborar “para a formação da consciência crítica e para a

construção de uma identidade social e individual orientadas por preceitos eticamente

humanos”(FREITAS, 1996, p. 73) privilegiando o trabalho em grupo em detrimento dos

atendimentos individuais e descontextualizados, que então caracterizavam a prática

profissional destinada às classes dominantes. Essa nova maneira de pensar e fazer psicologia

recebeu a intitulação de psicologia social comunitária.

Um evento importantíssimo que veio romper com esta concepção de sujeito segregado de seu

contexto sócio-histórico, aconteceu no Estado São Paulo no ano de 2002, na primeira amostra

nacional em práticas em psicologia, organizado pelos CRP de todo o Brasil.

O congresso contou com 4.500 expositores, perfazendo um total de 1.600 trabalhos como, por

exemplo, o programa de rádio surgido em um hospital psiquiátrico com profissionais de saúde

mental; trabalho desenvolvido com catadores de material reciclado, com crianças abordadas

nas ruas com história de violência, dentre outros.

Este encontro teve como eixo central o compromisso social de todos os profissionais que não

queriam mais ter uma relação caracterizada por um serviço de controle, de discriminação,

modo como esta profissão foi constituída durante todos estes anos, mas sim, construir uma

relação que respondesse as demandas sociais, saindo daquela posição de profissão de elite,

rompendo também com a imagem de que o psicólogo é um profissional que lida apenas com

os doentes mentais, com os desequilibrados.

O evento veio, portanto, dar visibilidade a construção desta nova psicologia, preocupada em

contribuir para que o sujeito se fortaleça para o enfrentamento das dificuldades do cotidiano,

colocando-se, pois como uma psicologia protagonista de uma nova história, como protagonista

de uma sociedade mais justa e mais solidária (FURTADO, 2000).

2.2 PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA: UMA PRÁTICA POSSÍVEL JUNTO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE.

A psicologia social comunitária, como citado, surgiu da necessidade de

repensar, de analisar, de problematizar as práticas psicológicas existentes na

época. Tem leitura vinculada à Psicologia Sócio Histórica, entendendo o

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homem como um ser ativo, histórico e social, que vive em constantes

transformações a partir de suas interações com o meio em que vive.

A prática em Psicologia Social Comunitária procura desenvolver a consciência

crítica, práticas cooperativas, o diálogo, a partilha de saberes, garantindo a

autonomia e a autogestão das comunidades (GUARESCHI, 1996, p. 99).

Para refletir sobre as práticas da psicologia social comunitária dentro do

Sistema Único de Saúde (SUS), se apresenta como necessário contextualizar

essa proposta que surgiu de um grande movimento protagonizado pelos

próprios trabalhares da saúde que se mostravam insatisfeitos com as

propostas anteriores. Essa reforma ganhou forças a partir da década de 80,

período em que constantes transformações ocorriam no âmbito político, com o

fim da ditadura militar.

O SUS foi regulamentado a partir da constituição de 1988, precedido por um

processo elitizado de saúde, onde o acesso à mesma era disponibilizado

apenas a empresários e funcionários de grandes empresas.

No período de sua regulamentação já havia um consenso entre os constituintes

e a sociedade quanto à inadequação do sistema anterior visto que, como

aponta (CHIORO e SCAFF, 199_, p. 19) o mesmo apresentava, dentre outros,

os seguintes aspectos:

•Irracionalidade e desintegração do Sistema de Saúde, com sobre oferta de serviços em alguns lugares e ausência em outros; •Excessiva centralização, levando a decisões muitas vezes equivocadas; •Recursos financeiros insuficientes em relação às necessidades de atendimento e em comparação com outros países; •Desperdício de recursos alocados para a saúde, estimado nacionalmente em pelo menos 30%; •Baixa cobertura assistencial da população, com segmentos populacionais excluídos do atendimento, especialmente os mais pobres e nas regiões mais carentes; •Falta de definição clara das competências entre os órgãos e as instâncias político administrativas do sistema; •Desempenho descoordenado dos órgãos públicos e privados; •Insatisfação dos profissionais da área da saúde, principalmente devido a baixos salários e falta de política de recursos humanos justa e coerente;

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•Baixa qualidade dos serviços oferecidos em termos de equipamentos e serviços profissionais; •Ausência de critérios e de transparência dos gastos públicos; •Falta de participação da população na formulação e na gestão das políticas de saúde; •Falta de mecanismos de acompanhamento, controle e avaliação dos serviços; Imensa insatisfação e preocupação da população com o atendimento à sua saúde.

Nota-se, portanto o caos em que se encontrava o sistema de saúde nacional

caracterizado pela desorganização quanto ao controle dos serviços, ao repasse

das verbas, pela centralização das decisões no âmbito federal o que

ocasionava desintegração e intervenções equivocadas, visto que, os estados e

municípios não participavam destes processos.

O SUS foi então definido em 19 de setembro de 1990 pela lei nº 8.080 como “o

conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições

públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e

das fundações mantidas pelo Poder Público, incluídas as instituições públicas

federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção

de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de

equipamentos para saúde" (CHIORO e SCAFF, 199_, p. 20).

Vê-se então, que o SUS tem como um de seus princípios a descentralização,

prevendo repasse de responsabilidades no que tange a saúde, aos estados e

municípios garantindo maior autonomia e melhor encaminhamento das ações,

uma vez que são essas instâncias que melhor podem levantar e responder suas próprias demandas. Essa proposta, de responsabilizar não só a

federação, mas também os estados e municípios, recebeu o nome de tripartite.

Os demais princípios que regem a organização do SUS são a regionalização e

hierarquização, a resolutividade, a participação dos cidadãos e a

complementariedade do setor privado.

A regionalização e hierarquização permitem como aponta Chioro e Scaff (199_,

p. 24) “conhecimento maior dos problemas de saúde da população de uma

área delimitada, favorecendo ações de vigilância epidemiológica e sanitárias,

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controle de vetores, educação em saúde, além das ações de atenção

ambulatorial e hospitalar em todos os níveis de complexidade”.

Com a hierarquização, as ações do SUS junto à população, são divididas por

níveis de atenção: nível primário, secundário e terciário. “O acesso da

população à rede deve se dar através dos serviços de nível primário de

atenção que devem estar qualificados para atender e resolver os principais

problemas que demandam serviços de saúde. Os que não forem resolvidos

neste nível deverão ser referenciados para os serviços de maior complexidade

tecnológica” (CHIORO e SCAFF, 199_, p. 24).

O nível secundário é caracterizado por unidades policlínicas que possuem

especialidades médicas disponíveis para o atendimento da população após

terem passado pelo nível primário. Já o nível terciário é composto por hospitais

gerais.

A resolutividade garante que os problemas de saúde apresentados pela

população sejam resolvidos “dentro do limite da sua complexidade e

capacidade tecnológica” em cada nível de assistência adequado (CHIORO e

SCAFF, 199_ p. 24).

A participação dos cidadãos prevê inserção da população no que se refere ao

planejamento e execução das ações em saúde levando a integração das

políticas públicas com a sociedade. Este se apresenta como um campo onde a

psicologia, também, pode se inserir, auxiliando na articulação entre os usuários

e o Sistema de Saúde.

A complementariedade do setor privado se apresenta como uma necessidade

deste sistema devido a insuficiência do setor público de atender as demandas

populacionais, levando a contratação de serviços privados.

Todos os citados princípios são fundamentados pelas doutrinas básicas do

Sistema Único de Saúde que, de acordo com os preceitos Constitucionais e segundo

Chioro e Scaff (199_) são:

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• A universalidade que garante o direito de saúde a todas as pessoas independente de

suas diferenças étnicas, religiosas e sócio-econômicas. Vê-se então “a saúde como

direito de cidadania e dever dos Governos Municipal, Estadual e Federal” (p.21).

• A equidade permite que essas diferenças sejam respeitadas garantindo a igualdade

perante o Sistema Único de Saúde.

• A integralidade prevê articulação entre a prevenção, promoção, cura e reabilitação.

Corroborando com a idéia essencial que rege este sistema que entende saúde não

apenas como ausência de doenças, mas, assim como afirma o Ministério de Saúde

(199_, p.2), como qualidade de vida e, portanto, deve estar vinculada com os direitos

humanos, ao direito ao trabalho, à moradia, educação, alimentação e lazer”.

Reconhecendo o ser humano como um ser social, histórico, ativo e multideterminado.

No primeiro nível de atenção básica foram criados modelos de atenção à saúde para que os

princípios do SUS fossem colocados em prática, garantindo principalmente uma maior

interação com a sociedade efetivando a articulação entre prevenção, cura e reabilitação de

doenças e promoção de saúde.

O primeiro modelo de atenção à saúde foi criado em 1991 e recebeu o nome de Programa de

Agente Comunitário de Saúde (PACS),

no qual moradores das próprias comunidades são selecionados e treinados para, através de visitas domiciliares, levantar dados sobre condições de vida da população da área onde atuam e orientar sobre questões relacionadas à saúde (Súmula, 2001).

Nesse programa os agentes comunitários são selecionados pelos municípios e

ficam vinculados a Unidades de determinados bairros que possuem este

modelo de assistência. O papel dos agentes é, portanto, o de mapear a região

de abrangência da Unidade, levantando as demandas no que tange as

questões de saúde e orientando a comunidade, no que for possível. Em

seguida dão retorno à Unidade quanto ao trabalho realizado, bem como as

questões que precisam ser encaminhadas por outros profissionais.

Em 1997, surgiu uma nova estratégia de atenção à saúde denominada

Programa Saúde da Família (PSF). Este programa permite que a equipe de

profissionais da Unidade de Saúde conheça mais claramente a realidade da

população e acompanhe com mais proximidade as demandas, visto que além

do atendimento na Unidade, o profissional também realiza visitas nas casas

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dos pacientes, o que possibilita um trabalho bem mais especializado no que diz

respeito à prevenção de saúde (SILVESTRE e NETO, 2003).

Vale ressaltar que o PSF veio complementar o PACS uma vez que o mesmo,

além de possuir agentes comunitários, atua também com outros profissionais

da área da saúde, os quais formam uma equipe básica com, médico, assistente

social, enfermeiro, dentista.

Como pôde ser observado o psicólogo não se encontra inserido nas equipes

básicas destes programas3, entretanto já se vê a necessidade de sua inserção,

e atualmente, já existem projetos para que esta proposta seja realmente

implementada.

Enquanto esta inserção não é regulamentada, o profissional da área de

psicologia trabalha como sendo da equipe da Unidade de Saúde,

estabelecendo, normalmente, práticas dentro destas instituições. Destaca-se,

entretanto, que o profissional que possui leitura vinculada à psicologia social

comunitária já consegue desenvolver intervenções muito bem relacionadas aos

trabalhos dos programas de saúde. Realizando práticas não individualizadas,

mas sim abarcando vários usuários do serviço e o meio social em que vivem,

possibilitando a promoção de saúde e prevenção de doenças de boa parte da

população.

Sabe-se, porém, que grande parte dos profissionais de psicologia não se

encontram preparados para atuar na área da saúde coletiva, visto que

possuem uma visão individualizante do fenômeno psicológico não enfatizando

seu contexto sócio-político para compreender a produção de subjetividade.

Isto se deve ao fato da formação acadêmica tradicional dos psicólogos cujas práticas clínicas

são voltadas para o modelo médico tradicional de atendimento (BOCK, 1999, p. 76).

Outras dificuldades encontradas referem-se aos baixos salários, desigualdades entre as

3 Apesar da inserção não estar regulamentada, em algumas regiões do Brasil já pode ser constatada esta inserção como,por exemplo,em algumas equipes de Belo Horizonte.

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diversas categorias, a má utilização dos recursos, a ocupação de cargos por profissionais que

não conhecem o contexto da saúde pública, psicologizando assim, os problemas sociais,

dentre tantos outros. Dessa forma, realizam atendimentos individuais, focados nos

problemas, abarcando uma quantidade mínima de usuários em seus serviços e

não possibilitando melhoria de vida para a população, mas sim para poucos

usuários.

Daí a necessidade de práticas diferenciadas e não um modelo limitado de atuação,

descontextualizado. A necessidade de ampliar a visão para outras realidades repensando o

papel do psicólogo no campo da assistência pública à saúde. A expansão deste olhar não se

constitui em uma tarefa fácil, pois se esbarra em muitos conceitos pré-determinados e

construídos ao longo de toda uma história (DIMENSTEIN, 1988, p.58 e 62).

Diante desta perspectiva, no panorama atual da saúde coletiva, o compromisso profissional

não é uma questão burocrática, mas, especialmente, o desenvolvimento de ações/reflexões

cuja intencionalidade prática e política é produzir cidadania ativa, sociabilidade e novas

subjetividades. Essa visão nos desafia a pensar em como materializar essa postura

profissional, de que maneira fomentar esse ideário em nossos cursos, em nossas pesquisas e

nossas produções acadêmicas (Ibdem p.62).

Segundo Dimenstein (1988, p.57) trata-se, não só, da mudança no perfil

profissional das categorias envolvidas com o trabalho da saúde, mas

principalmente da transformação de tais profissionais em agentes de mudança

a partir de um compromisso social perante o ideário do Sistema de Saúde e

seus usuários.

A partir desta atual tendência em refletir a importância da psicologia

desenvolver trabalhos em saúde coletiva, começou-se a perceber um

investimento dessa categoria profissional nessa área de saúde pública. Assim,

o último Congresso Regional da ABRAPSO, realizado em Vitória-ES no ano

2005, teve como tema ‘Psicologia e Saúde – Desafios às Políticas Públicas no Brasil’

e foi todo voltado para essa discussão, contando com a apresentação de 166

trabalhos que foram realizados dentro do contexto do Sistema Único de Saúde.

(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA SOCIAL, 2005).

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Confirma-se, portanto a atual preocupação e reflexões na prevenção de

doenças e promoção de saúde, bem como a recente tendência em desenvolver

intervenções coletivas, abarcando assim, mais usuários.

2.3 TRABALHO JUNTO A CUIDADORES DE IDOSOS COMO

POSSIBILIDADE DE PRÁTICA PSICOLÓGICA ENGAJADA.

As relações que estabelecemos diariamente, com o mundo, com os outros e

com nosso próprio eu perpassam a todo o instante pelo ato de cuidar.

Cuidamos ao nos preocupar, nos inquietar. Cuidamos ao estar atento ao outro,

às suas atitudes, falas, emoções. Cuidamos ao amar. A partir dos encontros,

do estar com. Do viver. O cuidado faz parte da vida do homem.

Segundo Luft (1984, p.155) a palavra cuidar possui várias definições

cuidar v.t. 1. imaginar; cogitar; meditar. 2. Pensar; julgar; supor. 3. Ter desvelo ou zelo por. 4. Tomar conta de; tratar. P. 5. Prevenir-se; acautelar-se. 6. Ter cuidado consigo mesmo (saúde, aparência, apresentação).

Tomar conta, ter zelo, tratar, são definições cabíveis à presente intervenção,

entretanto é pertinente admitir que todas as outras também estão relacionadas,

visto que o imaginar, o cogitar, o pensar são atitudes cotidianas de todos os

sujeitos, inclusive dos que se encontram ocupados cuidando de outrem.

Quanto à última definição, a mesma também se encontra relacionada com o

fenômeno cuidar, até pelo fato de que para cuidar de alguém, precisamos

antes de tudo cuidar de nós mesmos. “Ter cuidado consigo mesmo”, com a

apresentação, a aparência, a saúde.

A Organização Mundial de Saúde entende a saúde como “um estado de bem –

estar total, corporal, espiritual e social e não apenas inexistência de doença e

fraqueza”. Percebe-se, entretanto, que alcançar essa totalidade, esse

equilíbrio, encontra-se bem distante de nossa realidade.

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Essa compreensão não é realista, pois parte de uma suposição falsa, de que é possível uma existência sem dor e sem morte. É também inumana porque não recolhe a concretitude da vida que é mortal. Não descobre dentro de si a morte e seus acompanhantes, os achaques, as fraquezas, as enfermidades, a agonia e a despedida final (BOFF, 1999, p.144).

O autor acrescenta que saúde “não é um estado, mas um processo

permanente de busca de equilíbrio dinâmico de todos os fatores que compõem

a vida humana” (p. 144). Tem a ver, então, com o modo como enfrentamos a

realidade, com todos os seus desafios, que nos cerca. Saúde é ação, é

implicação. Saúde é cuidado.

Cuidar da vida que o anima, cuidar do conjunto das relações com a realidade circundante, relações essas que passam pela higiene, pela alimentação, pelo ar que respiramos, pela forma como nos vestimos, pela maneira como organizamos nossa casa e nos situamos dentro de um determinado espaço ecológico. Esse cuidado reforça nossa identidade como seres-nós-de-relações para todos os lados (Ibdem, p.145).

Seres que, assim como afirma a Psicologia Sócio-Histórica, produzem e são

produzidos nas relações.

O cuidar

é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro (BOFF, 1999, p.33).

De acordo com Mendes e Morrone (1995, p. 28) “cuidar não é uma tarefa fácil,

exige uma mudança radical na vida de quem cuida e também demanda a

execução de tarefas complexas, delicadas e sofridas. O cuidador sem suporte

pode ser o futuro paciente”.

Neri e Carvalho (2002, p. 780) acrescentam que “a literatura sobre o estresse

do cuidador fala em problemas físicos e mentais, isolamento social, estresse,

sobrecarga e depressão”. Portanto, estar preparado psicologicamente além de

interferir na qualidade do cuidado, muito pode prevenir e preservar a saúde do

cuidador.

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No caso específico do qual trata esta intervenção, onde o cuidado é destinado

a idosos dependentes, fica fácil perceber os desafios e a complexidade do

cuidar, quer seja pelo fato desses idosos, em alguns casos, serem conscientes

da situação, quer seja pelo lado do cuidador que pode, muitas vezes, fazer

ligações sobre o seu próprio processo de envelhecer, dentre outros casos.

A dependência “se traduz por uma ajuda indispensável para a realização dos

atos elementares da vida. Não é apenas a incapacidade que cria a

dependência, mas sim o somatório da incapacidade com a necessidade”

(CALDAS, 2003, p. 775). A dependência então, diz respeito à necessidade de

ajuda para o desenvolver de tarefas, até mesmo, básicas, do cotidiano,

precisando então de ser cuidado por outros.

De acordo com as literaturas gerontológicas destinadas a cuidadores, existe

uma distinção entre o cuidado formal e o cuidado informal. Ainda segundo Neri

e Carvalho (2002, p. 779) “cuidado formal é aquele oferecido por profissionais e

o informal por não-profissionais”. Os informais geralmente são constituídos por

pessoas que fazem parte da família.

Apesar de termos consciência de que os desafios desse fazer estão

relacionados a qualquer tipo de cuidado, seja ele formal ou informal, até porque

o cuidar constante possibilita a criação de vínculos entre cuidando e cuidador,

parece-nos mais fácil pensar nos obstáculos, na complexidade pela qual

perpassam o fazer dos cuidadores informais. Imaginar o que é lidar diariamente

com a perda de uma pessoa querida nos suscita tristeza. Entendemos que,

principalmente, os cuidadores informais demandam de suporte, até porque,

como já afirmamos, em muitos casos os cuidadores deixam de lado o seu

processo de viver e passam a cuidar exclusivamente do outro. Neri e Carvalho

(2002, p.781 e 782) apontam:

É importante ressalvar que embora os mecanismos sejam os mesmos, é diferente a natureza [...] do contexto familiar e do contexto profissional. Na situação de cuidar do cônjuge ou dos pais, entram em cena questões afetivas profundamente arraigadas no relacionamento anterior do cuidador com o idoso e de ambos com o

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restante da família, além de questões práticas e financeiras que se misturam a motivações afetivas. Na situação de cuidar profissionalmente existem motivações de ordem afetiva, mas elas nem de longe se comparam ao envolvimento que há nas relações familiares.

Sendo assim, fica ainda mais evidente a necessidade de suporte emocional

para os cuidadores informais.

São importantes o suporte emocional, uma rede de cuidados que ligue a família aos serviços de apoio e meios que garantam a qualidade de vida dos cuidadores principais. [...] A sobrecarga física, emocional e sócio-econômica do cuidador de um familiar é imensa (CALDAS, 2003, p. 777).

São poucas as literaturas que dizem respeito a intervenções destinadas ao

bem-estar do cuidador, seja ele formal ou informal. Normalmente afirma-se

esta necessidade, mas trabalhos desenvolvidos e a falta de pesquisas

aplicadas nesse âmbito são, realmente, escassos.

Nos congressos regionais da ABRAPSO-ES, realizados nos anos de 2003, e

2005, em Vitória, apenas três trabalhos foram apresentados enfocando a saúde

do cuidador. Desta forma, a realização deste trabalho objetivou ampliar e

contribuir para o enriquecimento do debate nesta área a partir da leitura da

Psicologia Sócio-Histórica.

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3 METODOLOGIA O presente trabalho realizado junto à cuidadores de idosos acamados,

objetivou conhecer a realidade dos cuidadores, suas angústias, seus anseios

tudo o que perpassa o ato de cuidar, inclusive os sentimentos e assim fornecer

escuta, momentos de reflexões e, até mesmo, possibilidades de resignificações

do fenômeno cuidar.

Entendemos, assim, que o papel do pesquisador não consiste somente em

descrever a realidade. Parafraseando Bock (2001, p. 134) “não buscamos,

portanto, o dado puro, não nos orientamos pelo verificacionismo, não

entendemos que as falas dos sujeitos são simplesmente respostas,

acreditamos que as falas dos sujeitos são construções.”

3.1 NATUREZA E TIPO DE PESQUISA Para isso, escolheu-se o método qualitativo de pesquisa que de acordo com

González-Rey (2002 p.177) “tem como objetivo principal o conhecimento da

produção e organização dos sentidos subjetivos nos sujeitos estudados e nos

diferentes espaços sociais que constituem a subjetividade social”.

Demo (1994) pontua que

A avaliação qualitativa deve levar em conta principalmente à qualidade de vida atingida e o envolvimento: na qualidade não vale o maior, mas o melhor; não o extenso, mas o intenso; não o violento, mas o envolvente; não a pressão, mas a impregnação [...] levando-se em conta principalmente à qualidade de vida atingida e o envolvimento, valorizando os critérios de representatividade, de legitimidade, de convivência, de identidade ideológica, de consciência política, de solidariedade comunitária, de capacidade crítica e autocrítica, de autogestão. Ademais a qualidade não se capta observando-a, mas vivenciando-a.

Nos momentos de intervenção houve uma grande preocupação por parte dos

pesquisadores de se colocarem junto com os sujeitos, primando não apenas

pelos resultados, mas sim por toda a construção do processo uma vez que as

possibilidades de avanço encontram-se no diálogo, na relação em si.

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González-Rey (2002, p. 177) acrescenta que

“a pesquisa qualitativa remete à intimidade do sujeito e o envolve em situações que são muito sensíveis para ele/ela, mas que, por sua vez, lhes oferece possibilidades de se colocarem de forma diferente diante da vida, permitindo-lhes novas opções através das situações produzidas pela pesquisa”.

Dentre os tipos de pesquisa qualitativa, o trabalho foi caracterizado pela

pesquisa-ação, pois assim a intervenção pôde ser realizada lado-a-lado aos

sujeitos de pesquisa, onde nos implicamos e nos afetamos juntamente ao

processo.

Levou-se em conta as relações que se estabelecem sócio-culturalmente,

visando “o conhecimento através da pesquisa, e a transformação através da

ação”. De acordo com este autor, a pesquisa ação “se define essencialmente

pelo elo entre o saber e o fazer” e “a implicação é elemento fundamental” em

todo o processo (NASCIUTI, 1996 p. 111-113).

3.2 DESCRISÃO DO CONTEXTO PESQUISADO A intervenção foi realizada no Bairro do Romão, localizado no município de

Vitória, entre os bairros do Cruzamento, Forte São João e Fradinhos.

O bairro foi constituído a partir de ocupações populares no local, onde na

época, era composto por uma Chácara, pertencente à família Aguiar. Segundo

Ferreira (2002, p. 19) o processo de ocupação foi tumultuado e desorganizado.

As famílias desmatavam e construíam seus barracos indiscriminadamente. Buscavam naquele morro a “terra prometida” o “sagrado direito de morar”, por mais precário que fossem queriam ser donos de seu próprio teto, mesmo que fosse este em uma barraca de lona.

Quanto à procedência do nome do bairro, Monjardim (1995, p. 57) aponta que

o mesmo surgiu da ”Fazenda Rumão" que era vizinha à Fazenda Jucutuquara,

no século XIX.

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Atualmente, residem 3205 pessoas no bairro, que contam com várias

instituições como: Escola Municipal de 1º grau, Centro Municipal de Educação

Infantil, várias igrejas, Projeto Sarça, Unidade de Pronto Atendimento. 4

A intervenção foi realizada a partir de uma parceria desenvolvida com a

Unidade de Saúde do Forte São João a qual trabalha com o programa PACS

(Programa de Agente Comunitário de Saúde) já descrito anteriormente.

Esta Unidade era há pouco tempo um Centro de Especialidades, onde os

casos que necessitavam de atendimento especializado eram encaminhados

pelas respectivas Unidades de Saúde de toda a cidade. Atualmente, porém, foi

transformada em Unidade de Saúde da Família. Conta com atendimento

médico, de enfermagem, psicológico, social e odontológico, presta os serviços

de coleta de exames, vacinas, dispensação de medicamentos, grupos de

atendimento e diversos programas e encaminhamentos para os Centros de

Referência.

3.3 SUJEITOS DA PESQUISA Os sujeitos dessa intervenção foram dois cuidadores informais, sendo um

deles o cuidador P.S, sexo masculino, de 30 anos que cuida de sua mãe, a

senhora A, de 68 anos; e o outro, a cuidadora K, sexo feminino, de 27 anos

que cuida de sua mãe, a senhora M, de 65 anos.

Vale ressaltar que com o intuito de garantir o sigilo da identidade desses

sujeitos de pesquisa foram utilizadas apenas as iniciais de seus nomes.

3.4 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS Todo o trabalho iniciou-se em agosto de 2004, onde passamos um semestre

conhecendo a comunidade, as instituições que a compõem e conversando com

alguns moradores com o intuito de criar vínculos, conhecer a realidade para

4 www.vitoria.es.gov.br

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assim definirmos a partir das demandas da comunidade, o que, quando e como

desenvolveríamos a intervenção.

Inicialmente tivemos contato com as psicólogas do CRAI, onde conhecemos a

realidade dos idosos que se encontravam com um estado de saúde mais

deteriorado. Em seguida, em uma reunião na Unidade de Saúde do Forte São

João conhecemos o Projeto ‘Cuidando de quem cuida’ e após várias reflexões

decidimos então, realizar a intervenção com os cuidadores de idosos do bairro

do Romão.

O trabalho com os cuidadores foi realizado uma vez por semana a partir de

conversas individuais na casa do cuidador. Estes encontros tinham 3 horas de

interação e foram realizadas sete visitas, cada estagiária acompanhou um

cuidador.

Na Unidade de Saúde foram realizadas quatro reuniões, agendadas a partir de

demandas encontradas no decorrer do trabalho, tanto do nosso grupo como da

equipe da USFSJ. Além dessas reuniões, previamente agendadas, alguns

encontros foram rapidamente realizados antes de visitarmos os cuidadores.

3.5 ANÁLISE DOS DADOS Para a análise dos dados foi utilizado o método de análise de conteúdo que

segundo Triviños (1987, p. 160) “é um meio para estudar as “comunicações”

entre os homens, colocando ênfase no conteúdo “das mensagens”.

Assim como afirma Bardin (apud Triviños 1987, p. 159) este método “se presta

para o estudo das motivações, atitudes, valores, crenças, tendências”. A

análise é realizada a partir do conteúdo das conversas entre os pesquisadores

e os sujeitos de intervenção. Dessa forma, foi utilizada para a análise de todo o

processo de intervenção pelo qual passou este trabalho, desde às relações

com os cuidadores e com a UBS, até aos momentos de supervisão. Esses

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vários encontros foram carregados de todas estas características e,

principalmente, de variados sentimentos advindos das várias práticas e

reflexões perpassadas.

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4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Analisar os dados da presente intervenção possibilita-nos relembrar os

inúmeros sentimentos que foram vivenciados durante todo o processo. Apesar

de estarmos em outro momento e, de já termos superado, problematizado

várias sensações, ao nos deparar com as situações experienciadas

conseguimos claramente recordar o que sentimos nos momentos em que a

ação se deu. É evidente admitir que todo o processo foi caracterizado por um

misto de afetos que possibilitaram o trabalho.

O compromisso ético-político foi o norteador de todas as nossas ações, em

tudo o que íamos realizar questionávamos se estava eticamente pautado.

Todas as atividades realizadas foram refletidas previamente a partir dos

princípios éticos e universais que orientam o fazer do psicólogo. A implicação

com o fazer sempre foi evidente.Nos entregamos ao processo entregamos ao

processo (CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA, 2005).

Para a análise dos dados dividimos a intervenção em cinco categorias

descritas e problematizadas a seguir.

4.1 CONSTRUÇÃO DA PARCERIA COM A UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE:

ENCONTROS E DESENCONTROS

Esta categoria visa abarcar todo o processo vivenciado entre os pesquisadores

e a Unidade Básica de Saúde do Forte São João (UBSFSJ).

A UBSFSJ encontra-se no primeiro nível de atenção do Sistema Único de

Saúde. Este nível, como apontado anteriormente, deve ser visto como primeira

alternativa de atendimento aos usuários. A seguir, dependendo das

especificidades de suas demandas, serão encaminhados para os outros níveis:

secundário e/ou terciário (CHIORO E SCAFF, 199_).

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Sendo do nível primário, esta Unidade trabalha com o Programa de Agentes

Comunitários de Saúde (PACS) que possui participação dos próprios

moradores da comunidade que são treinados para atuarem no nível de

prevenção e promoção de saúde.

Como esta Unidade deixou de ser Centro de Especialidades recentemente, os

diversos programas, tais como, a saúde do idoso, do hipertenso, de prevenção

às doenças sexualmente transmissíveis, entre outros, encontravam-se

embrionariamente organizados. Em relação ao trabalho com a clientela que

esta intervenção focou, encontramos iniciativas ou delineamentos de uma

possível ação, mas não havia uma sistemática planejada e nem executada.

Desta forma, esta intervenção surgiu a partir do projeto ‘Cuidando de quem

cuida’ existente na UBSFSJ, que já tinha identificado os cuidadores de idosos

através de um perfil traçado pelas agentes comunitárias de saúde (ACS).

Os primeiros contatos com a Unidade tiveram como principal objetivo construir

a parceria com a mesma. Já nesses primeiros momentos percebemos algumas

divergências em relação ao que pretendíamos realizar e o que a Unidade

esperava.

Inicialmente, ficamos um pouco perplexas com o fato proposto na Unidade de

ter que trabalhar com os três bairros que a Unidade atende (Cruzamento, Forte

São João e Romão). Não conseguíamos enxergar como aqueles profissionais

imaginavam ser possível realizar um trabalho de qualidade em uma área tão

grande, com o tempo muito escasso e por um mínimo número de estagiárias.

NASCIUTTI (1996, p. 101) afirma que ”quando ingressamos a uma instituição

qualquer, temos que nos conformar às regras, cumprir exigências,

desempenharmos um papel que já nos é prescrito de antemão”. Não foi

preciso, até porque não daríamos conta, de cumprir e aceitar essas exigências,

já que através do diálogo, foram discutidas e a equipe conseguiu entender a

inviabilidade de execução da proposta e a importância de, já termos

anteriormente, criado vínculo com o Bairro Romão, o que não havia acontecido

com os outros bairros. Para a Psicologia Sócio Histórica o diálogo é uma

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importante ferramenta, sendo inclusive característica que uma intervenção

pode proporcionar a dada realidade.

O diálogo é a única forma de legitimar a singularidade dos sujeitos envolvidos em vínculos institucionais, porque por meio dele as pessoas manifestam, de forma diferenciada e ativa, suas considerações sobre um determinado tópico, aparecendo, assim, diferentes alternativas a partir da troca de idéias, da força das fundamentações implicadas, da lógica dos argumentos apresentados e do clima promovido pelo diálogo, o que é decisivo para a formulação das alternativas diante da situação que gerou a discussão (González-Rey, 2004, p. 46).

Para a realização das intervenções com os cuidadores foi de grande

importância a participação das Agentes Comunitárias de Saúde, que além de

nos conduzir até às casas dos cuidadores, nos apresentou a eles e se

colocaram disponíveis para qualquer necessidade que se fizesse presente.

Com o tempo, percebemos outra contradição entre nosso fazer e a Unidade.

Enquanto a mesma tinha o intuito de coletar dados, traçar um perfil dos

cuidadores e, através deles, dar suporte médico e ambulatorial aos idosos

cuidados, o nosso trabalho foi de caráter qualitativo, enfocando o próprio

cuidador, tendo como objetivo prevenir doenças e promover saúde através das

problematizações do seu fazer, a partir da escuta e da análise conjunta de

suas questões. Paulilo (2005) afirma que

a investigação qualitativa trabalha com valores, crenças, hábitos, atitudes, representações, opiniões e adequa-se a aprofundar a complexidade de fatos e processos particulares e específicos a indivíduos e grupos. A abordagem qualitativa é empregada, portanto, para a compreensão de fenômenos caracterizados por um alto grau de complexidade interna.

É então, uma forma de intervir que vai muito mais além do que apenas

mensurar informações, como o caso do objetivo do projeto da Unidade. Nossa

intenção era de realmente estar lado-a-lado com o cuidador, vivenciando suas

questões e proporcionando um espaço acolhedor, que o possibilitasse

repensar o seu processo enquanto sujeito. Mas, no decorrer das atividades

sentimos que, alguns profissionais da Unidade, não entendiam nosso fazer e

isso era fortalecido quando não compareciam as reuniões previamente

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agendadas. Esta situação contribuiu para que nos afastássemos da Unidade,

passando a desenvolver o trabalho separadamente da equipe de profissionais.

Posteriormente, com as supervisões, voltamos nosso olhar para estes

momentos de contradição, buscamos compreender melhor o processo que

havia acontecido. Percebemos a precipitação de nossa decisão e começamos

a entender a postura dos profissionais daquela Unidade.

Essa contradição qualitativa X quantitativa deve ser vista de maneira ampliada

e contextualizada com os próprios desafios que surgem ao implementar as

Políticas Públicas de Saúde. Esses desafios, longe de estarem já resolvidos,

nos apontam para a necessidade de uma reflexão a cerca dos próprios

objetivos do SUS. Entre outras questões, essa contradição nos levou a

questionar se é possível suscitar o trabalho do psicólogo caracterizado

qualitativamente num contexto em que índices, levantamento de perfis são

considerados prioritários para a construção de Políticas Públicas. Entretanto,

nos interrogamos se é plausível implementar estratégias de promoção de

saúde sem considerar o levantamento epidemiológico da população. Essas

questões se apresentam com caráter dialético e a superação desta

incongruência ainda não foi alcançada.

O caminho da superação está no enfrentamento das barreiras erigidas nos encontros com os diferentes. Nas palavras de Mautmer “o caminho está na compreensão do contato e suas vicissitudes, só aí está a possibilidade de interpretação” [...]. Compreensão que exige de nós todos uma abertura para a escuta do desejo, dos medos, da insegurança que o diferente suscita em nós mesmos (SPINK, 2003, p. 60).

Então, será a partir das problematizações, dos debates entre os diferentes que

esta superação será construída. Este processo demanda uma visão mais

ampla, no sentindo de entender e intervir a partir da leitura de que tanto o

trabalho quantitativo quanto o qualitativo são essenciais para efetivação de

Políticas Públicas em Saúde.

Paralelamente a estes momentos de reflexões, houve a contratação de uma

psicóloga para a UBSFJ, esta se mostrou, desde o início, como grande aliada

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neste processo de articulação com a Unidade, estando ainda inteiramente

interessada em ouvir as questões e em conhecer o projeto. Apontou-nos que a

prática psicológica é bem diferente das demais atividades desenvolvidas na

Unidade e que por isso, devemos entender o papel dos profissionais dentro da

lógica da integralidade das ações.

O fato de termos sido realmente acolhidas, ouvidas, nos proporcionou uma

maior segurança quanto ao nosso fazer e suscitou ainda a vontade de investir

na possibilidade da parceria com a Unidade dar certo.

Quando sou ouvido torno-me capaz de rever meu mundo e continuar. É incrível como alguns aspectos que antes pareciam insolúveis tornam-se passíveis de solução quando alguém nos ouve. É incrível quando as confusões que pareciam irremediáveis transformam-se em correntes que fluem com relativa facilidade quando somos ouvidos (ROGERS, 1983, p.8).

E esse acolhimento foi sendo vivenciado durante o decorrer das atividades. A

psicóloga realmente investiu na nossa articulação, conseguindo até, em alguns

momentos, possibilitar encontros com os estagiários e a equipe da Unidade.

Essas reuniões foram muito proveitosas e contribuíram para iniciar a parceria e

o trabalho em equipe. Discutimos várias questões, entendemos melhor como

se dava o funcionamento da Unidade, como é a função de cada profissional, o

trabalho das agentes comunitárias de saúde, que devem acompanhar, auxiliar

e informar os moradores da comunidade, dentre outras coisas. Essas

informações foram repassadas aos cuidadores que compreenderam melhor o

funcionamento da UBSFSJ.

Eles também nos conheceram melhor, pois, novamente, pontuamos os

objetivos e os avanços que a nossa práxis estava proporcionando.

Ficou esclarecido ainda, para os profissionais da Unidade, que o nosso

trabalho estava pautado em uma área da psicologia denominada Psicologia

Social Comunitária, que surgiu a partir de meados da década de 60, [..] com o objetivo de somar esforços e de colaborar para tornar a psicologia mais próxima à população, em geral, e mais comprometida com a vida dos setores

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menos privilegiados; buscando com isso uma deselitização da profissão, e as práticas vão ganhando uma significação política de mobilização e de transformação social (BOCK, 1992, p.60).

O resultado destas reuniões foi bastante positivo e todos compreenderam a

necessidade da parceria, da articulação das ações e a psicóloga reafirmou que

as práticas iniciam-se como um dispositivo, mas depois vão se reorganizando

através da reflexão constante, sendo essencial a articulação dos profissionais

que compõem o trabalho.

A partir desses momentos, passamos a manter constantes contatos com a

Unidade, principalmente com a psicóloga. Nesses encontros apresentávamos o

andamento de nossas intervenções, tirávamos nossas dúvidas e discutíamos

os encaminhamentos que se faziam necessários. Entretanto, todo este vínculo

só foi estabelecido na fase final do processo. Apesar da falta da articulação ter

dificultado um pouco o início de nossas atividades, acreditamos que isso muito

nos fez crescer, pois possibilitou que enxergássemos nossas dificuldades,

nossas limitações proporcionando importantes momentos de reflexões.

Entendemos ainda, que os próximos grupos de estagiários provavelmente

terão maior facilidade para o desenvolvimento de suas atividades, visto que a

parceria foi estabelecida.

Destacamos que o fato da psicóloga ter uma leitura mais abrangente do que é

trabalhar com psicologia em um contexto de políticas públicas, muito beneficiou

este encaminhamento favorável do processo. Anteriormente à sua contratação,

havia na Unidade apenas uma psicóloga, que trabalhava no período vespertino

e que realizava suas ações através do método clínico, atendendo

individualmente, sem fazer conexões com os outros profissionais da Unidade e

com a comunidade de um modo geral.

Mostra-se como essencial ao contexto atual que vivenciamos, que os

profissionais entendam a necessidade de conhecer a fundo a realidade em que

estão intervindo, visto que é a partir dela que o ser humano se constitui. Assim,

é importante colocar em prática a visão do SUS que enfoca a inter-relação dos

profissionais com a comunidade. CARLETTI e REJANI (2002, p.419) apontam

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que quando se trata de um caso específico, como o de idosos acamados, é

necessário que se amplie os modos de assistir para a

atenção domiciliária, definindo-a como um serviço em que as ações de saúde são desenvolvidas no domicílio do paciente por equipe multi- e interprofissional a partir do diagnóstico da realidade em que o mesmo está inserido, assim como de seus potenciais e limitações. Visa a promoção, manutenção e/ou restauração da saúde e o desenvolvimento e adaptação de funções, favorecendo maior autonomia e independência.

Acreditamos que esta proposta seria melhor viabilizada se a Unidade tivesse o

perfil de PSF, pois esta estratégia possibilita que os profissionais dirijam-se aos

domicílios dos moradores para realizarem os atendimentos necessários.

4.2 O ENCONTRO COM OS SUJEITOS Esta categoria destina-se a apresentar de modo mais detalhado quem são os

sujeitos desta intervenção e sua história de vida. Estes dados não foram

colhidos em apenas um encontro. As informações que se seguem foram sendo

gradativamente colocadas, de forma bem informal, a partir dos inúmeros

contatos que tivemos com os cuidadores.

Esses contatos foram realizados em seus domicílios semanalmente, o que nos

possibilitou um contato mais direto, uma visão mais ampla ao considerarmos

diversos fatores tais como condições ambientais, familiares, socioeconômicas,

e assim promover a saúde.

À medida que fomos conhecendo melhor os sujeitos, criando um maior vínculo,

estabelecendo uma relação de confiança, mais fomos entrando no universo

deles e assim suas histórias eram relatadas de forma prazerosa, onde a cada

encontro ansiávamos em saber mais e mais sobre eles.

Segundo Pitta (2001, p.180)

É essencial conhecer para cuidar. Conhecer aquele que se quer assistir, é estando com ele que se poderá almejar construir alguma coisa e porque só ele poderá nos dizer ou mostrar o que significa

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também conhecer os modos de agir e as concepções que lhes dão sustentação.

Destacamos que a intenção do Estágio Supervisionado Básico I e II era a de

desenvolver práticas psicossociais em saúde a partir de grupos. Entretanto, a

partir dos primeiros contatos com a UBSFSJ constatamos que os cuidadores

não tinham condições de participar de um grupo, pois não podiam deixar os

idosos que cuidam sozinhos. Assim, pensamos em desenvolver atendimentos

individuais, nos domicílios onde os cuidadores atuam e, a partir destas

intervenções estimular os mesmos a participarem de dois encontros que

pretendíamos realizar com todos os cuidadores. A intenção era que eles

interagissem entre si, trocando experiências e fazendo daquele espaço

potencializador de reflexões. Entendemos, que assim como afirma Neri e

Carvalho (2002, p.788) freqüentemente,

o grupo de apoio proporciona alívio emocional, diminuindo a angústia, a ansiedade e o estresse dos participantes. Ademais estimula o auto-cuidado e ressalta a importância da consciência do cuidador no que se refere ao diagnóstico de suas necessidades e de seus limites. O grupo de apoio pode também estimular o cuidador a perceber seu trabalho com idosos como uma prática gratificante e recompensadora, pois propicia o bem estar objetivo e subjetivo e contribui para a qualidade de vida dos indivíduos. [...] O grupo motiva o cuidador a desenvolver uma conduta assertiva que pode ser entendida como expressão objetiva, afirmativa, direta, honesta e apropriada de sentimentos, pensamentos, desejos e necessidades.

Apesar de termos consciência da relevância deste grupo, a partir dos

encontros, percebemos, realmente, a inviabilidade desta proposta, pelos

motivos já apontados. Nos sentimos um tanto decepcionadas ao perceber que

essa proposta, tão almejada por nós, não seria viabilizada. Entretanto, como

aponta Gil (1991, p. 126).

O planejamento da pesquisa-ação difere significativamente dos outros tipos de pesquisa já considerados. Não apenas em virtude de sua flexibilidade, mas, sobretudo, porque, além dos aspectos referentes à pesquisa propriamente dita, envolve também a ação dos pesquisadores e dos grupos interessados, o que ocorre nos mais diversos momentos da pesquisa. Daí por que se torna difícil apresentar seu planejamento a partir de fases ordenadas temporalmente.

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Visto que os projetos vão sendo modificados e construídos a partir das

demandas encontradas no campo pesquisado, compreendemos assim, a

mudança da nossa proposta.

Como afirmamos anteriormente os dois cuidadores que fizeram parte deste

trabalho são cuidadores informais, assim denominados, pois não foram

contratados para realizarem esta atividade, na verdade são filhos dos idosos

que cuidam.

O cuidador P.S, sexo masculino, nasceu no dia 3 de setembro de 1975, tendo

portanto 30 anos. É natural do Estado do Espírito Santo, solteiro. Cuida de sua

mãe a senhora A. de 68 anos, que apresenta um quadro de diabetes. O pai é

falecido. Possui ainda 8 irmãos, todos casados. P.S é o caçula da família. Sua

infância foi muito boa, vivenciada no bairro do Romão. Seus pais eram muito

atenciosos e os irmãos unidos.

Estudou em escola pública terminando o primeiro grau. Tentou dar

continuidade aos estudos, não conseguindo devido à doença de sua mãe.

Antes da doença da mãe exercia a profissão de pintor de casa, mas atualmente

seu tempo é todo dedicado aos cuidados com a mãe, que por sofrer de

diabetes apresenta um quadro de hipertensão, dificuldade de locomoção e está

perdendo a visão.

Vive com a aposentadoria do pai e, os irmãos, quando podem, ajudam

financeiramente.

A cuidadora K., sexo feminino, nascido em Vitória no dia 02 de janeiro de 1979,

tendo então 27 anos, também é solteira. Cuida de sua mãe, a senhora M. que

tem 64 anos de idade e se encontra acamada por ter sofrido um Acidente

Vacular Cerebral (AVC).

A cuidadora apontou que sempre morou no bairro e que estudou nas escolas

da região até o 2º ano do ensino médio.

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Mora com sua mãe, pai e 2 irmãos solteiros. Tem ainda mais 6 irmãos que já

são casados. Segundo K. seus irmãos de vez em quando visitam sua mãe,

porém ninguém quer cuidar dela.

Antes de exercer esta atividade, a cuidadora era secretária de um consultório

odontológico, entretanto com a doença da mãe teve que sair do emprego.

Ao nos deparar com a história dos cuidadores, já se percebe como o cuidar

altera a vida desses sujeitos. Neri e Carvalho (2002, p. 779) afirmam que

ao proporcionar cuidados a idosos frágeis e dependentes os familiares atendem a motivos culturais, familiares e pessoais em complexa interação. Sua vida pode ser completamente modificada por este evento, que é comumente vivido como inesperado.

Vê-se até então o fato deles terem parado de trabalhar, entretanto a partir das

análises que se seguem será melhor entendido como esse fazer modificou de

forma mais ampla o viver dos cuidadores.

O próximo ítem refere-se às muitas questões presentes nos diálogos que

travamos com estes cuidadores durante todo o processo de intervenção.

4.3 CUIDAR: A EXPERIÊNCIA DOS CUIDADORES Esta categoria visa analisar os aspectos que permeiam o ato de cuidar,

apontados pelos próprios cuidadores. Chega o momento de lidar mais

profundamente com suas emoções, sensações e anseios. Relembrar essas

vivências nos remete também aos nossos sentimentos. Inúmeras vezes nos

experienciamos impotentes.

A inexperiência nos levava, em várias ocasiões, a discutir entre nós

pesquisadoras o que falar, como agir. Recordamo-nos das ocasiões em que

nos dirigíamos à casa dos cuidadores, e enquanto subíamos as escadarias do

bairro, íamos conversando sobre a nossa impotência, sobre a nossa

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inexperiência em lidar com sentimentos tão fortes, tão verdadeiros e tão

presentes até mesmo nas expressões corporais dos cuidadores. Freitas (1999,

p.105) aponta em suas reflexões sobre a prática psicológica comunitária, que

este refletir, que esta inexperiência é uma ação que perpassava a atuação de

vários profissionais desta área:

De repente dá-se conta do primeiro “susto”: o que falar? O que perguntar? Utilizar algum roteiro? Usar alguma medida de avaliação psicológica? Como se apresentar? Como psicólogo? Como pesquisador? Como...?! [...] As incertezas vão crescendo e talvez os medos e receios, embora desconcertantes e desorganizadores, também tem o poder de levar ao desafio e à criatividade.

Com o tempo aprendemos que, em muitas vezes, o silêncio, o gesto acolhedor,

representa mais do que muitas palavras assim, o estar junto, realmente

envolvido com a dor do outro é imensamente significativo.

As análises que se seguem foram então construídas a partir de diálogos que,

em muitos momentos foram caracterizados por desabafos e, principalmente, a

partir de uma relação que foi tão produtiva para o cuidador, quanto para o

pesquisador. Aprendemos muito com essas pessoas! Foram inúmeros os

momentos em que paramos para analisar nossas vidas, a partir dos encontros,

das conversas com os cuidadores.

Durante os diálogos procuramos saber os motivos que os levaram a cuidar,

entretanto foi só a partir do decorrer dos encontros que realmente fomos

entendendo como se deu esse processo.

O cuidador P. S relatou que assumiu a responsabilidade de cuidar há 4 anos,

quando sua mãe teve a primeira crise e precisou ir ao hospital, pois estava

muito inchada. “Os médicos acharam que era responsabilidade minha, por não

ter a levado há mais tempo. Me advertiu dizendo que está no Código Penal do

Estatuto do Idoso que é crime negar socorro”.Essas foram as primeiras

palavras ditas pelo cuidador ao explicar como se deu o início do seu fazer.

Apontou que como é o único filho solteiro que reside com a mãe teve que

assumir o papel de cuidar. Dado que difere do que apontam as literaturas sobre

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cuidadores: “Os filhos ou genros geralmente dão ajuda material, participam das

atividades externas, como cuidar dos interesses econômicos dos idosos, e

colaboram em tarefas de ajuda instrumental que implicam deslocá-los”(NERI E

CARVALHO, 2002, p. 779). A diferença está no fato de que o cuidado é,

normalmente realizado por mulheres.

A cuidora K. começou a cuidar de sua mãe há 5 anos, desde quando ela teve

um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Disse que teve que assumir a

responsabilidade porque ninguém assumiu. Segundo K. não foi por opção, não

foi uma escolha, na verdade ela acredita que se não cuidar ninguém cuidará.

Bleizner e Hamon (apud PAVARINI, 2003, p.2) apontam que “os filhos [...]

costumam assumir o papel de cuidadores, por terem vínculo afetivo e uma

responsabilidade culturalmente definida, conhecida como obrigação filial”. O

cuidador informal, portanto, não escolhe realizar este papel e esta situação

causa impactos relevantes em sua vida tais como o estresse, o isolamento

social, dentre outros.

O isolamento social é também uma característica dos dois cuidadores, ambos

apontam como vem perdendo o vínculo com a sociedade. Não saem, possuem

poucos amigos, pois vivem quase que, integralmente, em função do cuidar. A

cuidadora K., ao contrário do cuidador P. S, às vezes, sai para jogar bola e

também para se divertir com algumas poucas amigas, entretanto ela aponta

que é muito difícil isso acontecer, pois quando sai quem fica com a mãe é o pai

que não gosta de cuidar e quase nunca tem tempo.

Destacamos que os dois cuidadores, além de exercer a responsabilidade de

cuidar administrando medicamentos, dando banho, alimentação e atenção,

ainda desenvolvem sozinhos todas as atividades domésticas. Neri e Carvalho

(2002, p. 788) apontam que

os cuidadores que se encontram em ambientes carentes de apoio

social informal ou formal tendem a desenvolver mais problemas de

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saúde física e psíquica, em comparação com aqueles que se sentem

queridos, respeitados, apoiados.

A cuidadora K. relata, inclusive, que seus irmãos além de não ajudar em nada,

ainda não reconhecem o trabalho que ela faz. “A atividade de cuidar

geralmente é um trabalho exercido por um membro da família, sem ajuda ou

reconhecimento dos outros integrantes” (Ibidem, p.781).

Foi bastante nítido, perceber na fala dos cuidadores o quanto o seu fazer os

afetava, um exemplo disso está nas respostas diante das perguntas sobre

quais as dificuldades que encontravam ao cuidar: “Me sinto muito mal por ver

minha mãe nesse estado” (cuidadora K.) Uma afirmação, que mais parece um

desabafo.

P. S aponta que “é um compromisso muito grande porque somos responsáveis

por tudo”.

A emoção, sempre foi facilmente percebida nos encontros com os cuidadores

segundo Sawaia (1996, p.100),

Heller, Espinosa e Vigotsky [...] concebem a emoção positivamente,

como constitutiva do pensamento e da ação, coletivos ou individuais,

bons ou ruins, e como processo imanente que se constitui e se

atualiza com os ingredientes fornecidos pelas diferentes

manifestações históricas. Portanto, um fenômeno objetivo e

subjetivo, que constitui a matéria-prima básica à condição humana.

Ao falarem do fato de não estarem em atividade profissional percebeu-se

grande frustração em suas falas. Esta, carregada de emoção, demonstrou

certa impotência diante de todo o sistema excludente.

A cuidadora K. afirmou: “não tenho projeto de vida”, “não posso ficar parada no

meu mundinho”. P.S disse que sempre teve vontade de crescer

profissionalmente e que gostaria de ter seguido a carreira da marinha ou do

exército. Ao dizer isso, demonstravam preocupação com o fato de não

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trabalharem com remuneração, estando fora do mercado de trabalho.

Assinalavam ainda, para a dificuldade de retornar a ele, já que não terminaram

o ensino médio e nunca fizeram cursos de especialização. O que aponta para

a desqualificação social, caracterizada por Paugam (2002, p. 68) como “um

movimento de expulsão gradativa, para fora do mercado de trabalho, de

camadas cada vez mais numerosas da população”.

Ao se falar dessa exclusão, decorrente do meio neo-liberalista, Sawaia (1999,

p. 98) afirma que fala-se de desejo, temporalidade, de afetividade, ao mesmo tempo em que de poder, de economia e de angústia [...]. Estudar a exclusão pelas emoções dos que a vivem é refletir sobre o “cuidado” que o estado tem com seus cidadãos. Eles são indicadores do (des) compromisso com o sofrimento do homem. (SAWAIA, 1999, p. 99).

Como aponta Guareschi (1999, p.146) “a competitividade exige a exclusão”. É

fato, que a sociedade em que vivemos super valoriza uma adequada

qualificação profissional. O processo de globalização, muito influencia as

relações de trabalho. Este, segundo Dejours (apud Marangoni, 200_), “além de

garantir a sobrevivência do indivíduo, garante as especificidades que o

identificam e o distinguem de outros indivíduos”.

O trabalho então, aparece como um aspecto importante na formação da

identidade humana. E identidade, é “identificação em curso, é encontro da

igualdade e diferença, [...] é conceito político ligado ao processo de inserção

social em sociedades complexas, hierarquizadas e excludentes” (SAWAIA,

1999, p. 123 e 124).

Analisando esse contexto, fica mais fácil entender o sofrimento percebido nos

cuidadores. Sofrimento este denominado por Sawaia (1999, p. 104) como

“ético-político”, pois, “retrata a vivência cotidiana das questões sociais

dominadas em cada época histórica”.

O sofrimento pôde ser percebido a partir de várias falas. A cuidadora K.

destaca: “Não tenho projeto de vida”. “Me sinto presa”. Relatou que bebia para

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esquecer seus problemas, porém agora “nem adianta afogar as mágoas. Elas

aprenderam a nadar”.

Já P. S. culpabiliza o governo, apontando que deveria existir uma lei para

beneficiar os cuidadores, uma certa ajuda de custo para que possam realizar

cursos profissionalizantes e retornar ao mercado de trabalho, uma vez que,

ficam anos exercendo só o trabalho de cuidar. Deixou transparecer em sua

fala, estar extremamente preocupado quanto ao seu fazer no futuro e uma

certa decepção e descrédito em relação aos governantes e de toda a

sociedade quanto ao não comprometimento com aqueles que ainda sofrem em

nosso país de contradições e desigualdades sociais gritantes.

É um misto de afetos, que muitas vezes levam à inação e que assim, trazem

sofrimento.

Nos encontros com os cuidadores estes assuntos foram bastante enfocados,

pois temos consciência de que isso tem grande importância para eles. O fato

de compreenderem o que está acontecendo, de perceberem suas emoções,

sentimentos, já é um importante passo para, até mesmo, uma mudança. “A

avaliação subjetiva do cuidador sobre o contexto em que está inserido é

elemento central para o seu bem-estar físico e psicológico”. (NERI E

CARVALHO, 2002, p. 782). Por isso, nas conversas, tentamos muitas vezes

problematizar essas emoções, esse sofrimento, procurando entender mais

intimamente todo o processo para que assim fosse possível uma re-

significação. Segundo Jodelet (1999, p. 54) “a psicologia social [...] tenta

compreender de que maneira as pessoas ou os grupos que são objetos de

distinção são construídos como uma categoria à parte”.

Algumas literaturas psicológicas já apontaram para uma importante afetação

em torno de um cuidador familiar de idoso. Caldas (2003, p.779) afirma que “a

dependência de um familiar idoso gera impacto na dinâmica, na economia

familiar e na saúde dos membros da família que se ocupam dos cuidados”.

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Apesar de todo este impacto o apoio que os cuidadores recebem da Unidade

de Saúde é mínimo. Segundo relatos havia um médico que acompanhava os

idosos em seus domicílios, mas há muito não aparecia. As agentes

comunitárias passam em suas casas de vez em quando, mas não têm muito

que fazer. A cuidadora k. aponta que quando precisa de medicamentos pede à

agente de saúde que atende sua região, entretanto, às vezes precisa recorrer

à ajuda de sua cunhada, que também é agente de saúde, mas que não atende

as redondezas de sua casa.

P. S afirma que passa por inúmeras dificuldades. Sua mãe, diabética,

necessita mensurar a glicose constantemente, entretanto devido à falta de

recursos para levá-la à Unidade de Saúde, já que ela tem dificuldades de

locomoção e precisa ser carregada escadaria abaixo, o mesmo recorre à

enfermeira da UBSFSJ para realizar os procedimentos necessários. Porém a

profissional só realiza o acompanhamento uma vez ao mês. Vale ressaltar que,

no que se refere às consultas médicas, o cuidador as faz por sua mãe, onde o

médico lhe passa as instruções necessárias ao cuidado.

Percebe-se a dificuldade que o cuidador enfrenta mediante as tentativas de

fazer o melhor possível por sua mãe. Ele ainda aponta que nos casos críticos

de crise diabética ele tem que a carregar em cadeiras comuns, por não

encontrar ambulâncias disponíveis e nem possuir recursos financeiros para o

pagamento de um táxi.

A Unidade por sua vez assinala uma certa dependência dos cuidadores.

Afirmando em alguns casos que os mesmos são “acomodados”. Dizem ainda,

que eles não conhecem, nem procuram conhecer a dinâmica de

funcionamento desta instituição.

É notório perceber como esta Unidade carece de profissionais capacitados

para o desenvolver de políticas públicas em saúde a partir da visão do SUS,

visto que, assim como afirma os princípios deste sistema é de suma

importância a participação dos usuários até mesmo no planejamento das

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ações. Há a necessidade dos profissionais ampliarem a leitura que baseia o

seu fazer, sendo capazes de reconstruir a história de vida dos usuários para além do diagnóstico e do sintoma, trabalhadores ativos no processo de reelaboração do sofrimento e reinvenção da vida. O “operador” nessa perspectiva volta-se para a qualidade do cuidado, a qual pressupõe acolhida e responsabilidade pela atenção integral da saúde coletiva e individual, e para a criação de estratégias de modificação da realidade dos usuários. Esses sujeitos são capazes de investir na produção de modos heterogêneos de cuidado, bem como na singularização da atenção, respeitando a diversidade cultural e subjetiva dos usuários, criando vínculos e responsabilidade para com saúde do público. Trata-se, pois, de um profissional não escravizado pela técnica, pelo saber totalizante dos experts por rituais profissionais, mas norteado por modelos de explicação ampliados para a cerca do complexo “promoção-saúde-doença-cuidado.” (PAIM & ALMEIDA apud DIMEINSTEIN, 2000, p.75)

Para assim, efetuarem uma prática mais ampliada enfocando o compromisso

ético-político.

4.4 EFEITOS DO TRABALHO REALIZADO Pôde ser percebido que as intervenções levaram os dois cuidadores a uma

reflexão de todo o processo que envolve o cuidar, bem como a forma como

vivenciam os embates que este processo causa no viver. Esses momentos em

que eles puderam parar para analisar o fazer, bem como a implicação que

dispõem para com essa atividade muito os fizeram crescer e, até mesmo, se

compreenderem melhor.

Foi muito bom saber que os encontros também fizeram parte dos motivos que

levaram a cuidadora K. a pensar em procurar um emprego. Ela afirmou que

chegou à conclusão que ninguém cuida de sua mãe porque ela já exerce essa

função. Disse que tem que pensar mais nela, em sua vida, que “está toda para

ainda ser conquistada”. Essa tomada de decisão, mesmo que ainda não

concretizada já aponta para uma maior reflexão, por parte da cuidadora, de

sua própria vida.

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Os encontros proporcionaram a autonomia para esta cuidadora que se

entende como também sujeito que precisa viver as suas próprias

necessidades.

Guareschi (2002, p. 99) aponta que o trabalho do psicólogo social precisa

acima de tudo, gerar a autonomia e autogestão dos sujeitos envolvidos na

realidade em que se dispõem a intervir.

O cuidador P. S. além de ter aberto outras perspectivas de trabalho quanto ao

seu futuro, podendo também realizar trabalhos manuais, além de pintor,

levantou o desejo de criar um grupo com os cuidadores informais interessados

numa ajuda de custo do governo. Para a interação dos cuidadores foi sugerido

pelos pesquisadores que procurassem as agentes comunitária de saúde, bem

como os movimentos comunitários do bairro para tentarem viabilizar a

proposta. É necessário refletir: Que parcela então, cabe à família? E qual

parcela cabe ao e Estado? Segundo Caldas (2003, p. 779).

Embora a Constituição Federal (Brasil, 1988), a Política Nacional do Idoso (Brasil, 1994) e a Política Nacional de Saúde do Idoso (Brasil, 1999) apontam a família como responsável pelo atendimento às necessidades do idoso até agora o delineamento de um sistema de apoio às famílias e a definição das responsabilidades das instâncias de cuidados formais e informais, na prática, não aconteceram.

No fim de todo o processo com os cuidadores que participaram desta

intervenção, pensávamos na grande responsabilidade e no compromisso com

estes sujeitos, da necessidade de compreender e valorizar suas histórias,

perceber seus sentimentos para que o relacionamento se tornasse promissor.

Temos consciência que apesar da inexperiência, da insegurança o

compromisso social foi eixo orientador e acreditamos que todo este processo

foi realmente potencializador de crescimento. Acima de tudo e, em todos, os

momentos confiamos na capacidade dos sujeitos de se auto-avaliar, de

transformar a realidade inquietante abrindo novos caminhos de se colocar e

estar sendo no mundo, a partir da interação com outros sujeitos onde ambos

se afetaram mutuamente.

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Na medida em que o indivíduo é mais saudável e ativo, ele expressará uma maior tendência a envolver-se nas diferentes atividades e relacionamentos dos quais participa. Tal participação é ilimitada e criativa, já que ela responde á sua própria autodeterminação, a finalidades próprias que ele estabeleceu em seus sistemas de atividades e de comunicação. Neste sentido, qualquer vivência negativa que possa aparecer no desenvolvimento de suas atividades, qualquer inconformidade ou contradição na obtenção destas, o indivíduo as enfrentará diretamente, realizando um esforço volitivo tanto para identificar como para superar as causas de tais problemas (González-Rey, 2004, p.22).

Acreditamos também, no papel do trabalhador social, que segundo Freire

(1994, p. 44) implica no ato de olhar/ad-mirar:

O ato de olhar implica noutro: o de ad-mirar. Ad-mirarmos e, ao penetrarmos no que foi admirado, o olhamos de dentro e daí de dentro aquilo que nos faz ver. Na ingenuidade, que é uma forma “desarmada” de enfrentamento da realidade, apenas olhamos e, porque não ad-miramos não podemos adentrar o que é olhado. Por isso, é necessário que admiremos a frase proposta para, olhando-a de dentro, reconhecê-la como algo que jamais poderá ser reduzido ou rebaixado a um simples clichê.

4.5 SUPERVISÕES – O PORTO SEGURO Durante todo o percurso de intervenções, sempre tivemos uma preocupação

muito grande com o nosso fazer. A inexperiência nos fazia sentir bastante

inseguras. Insegurança que advém da consciência do papel psicológico em sua

práxis. Como aponta Liebesny e Mortara (2003, p.242).

em sua prática profissional, o psicólogo transforma e é transformado,

num processo dialético e historicamente determinado: transforma ao

intervir sobre o conhecimento dos processos psicológicos dos

indivíduos em suas relações; é transformado porque sua intervenção

é refletida para a constituição de novas ações.

Uma grande preocupação do que nós, na relação, estaríamos permitindo

construir, transformar. Também nestes momentos de incertezas as

supervisões foram de extrema importância.

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O momento de supervisão acontecia uma vez semana, após as intervenções.

Juntamente com nossa supervisora, trocávamos nossas experiências e

discutíamos os assuntos que surgiram no decorrer dos trabalhos.

Nesse momento, muito enriquecedor, se faziam presentes nossos inúmeros

sentimentos, medos, angústias, anseios, nossas dúvidas, que muito bem foram

encaminhados, problematizados e refletidos com imenso respeito e carinho da

parte de nossa supervisora que deixava transparecer a todo o momento o

empenho, a paixão pelo fazer, apontando-nos a direção de novos caminhos. E

este caminho apontado, era como a nos dizer: “Renda-se como eu me rendi.

Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em

entender. Viver ultrapassa todo o entendimento” ( LISPECTOR, 1992, p.329)

É bem verdade que muitas vezes o cansaço nos trazia um certo desânimo, já

que a supervisão era realizada na faculdade, na primeira aula após a ida ao

bairro. É fato que muitas vezes saíamos de lá carregadas de angústia, mas é

inegável e por isso confessamos que estes momentos foram essenciais para o

nosso aprendizado tanto acadêmico como e, principalmente, pessoal.

Atualmente, podemos definir, sem hesitar, que estes encontros foram como um

porto seguro, onde refazíamos nossas forças, percebíamos nossas falhas e em

conjunto construíamos uma melhor base para continuarmos.

É importante dizer, que o tempo de supervisão deveria ser maior. O período

era muito curto e, muitas vezes, não dava para conversarmos sobre tudo ou

dar mais ênfase em alguns assuntos porque sempre tínhamos muita coisa para

ser discutida.

Muitos foram os ensinamentos repassados pela supervisora, como as questões

do medo, afetividade, o papel do trabalhador social, leitura de homem, o

desafio da construção, da transformação, dentre muitos outros. Porém, o mais

relevante para nós foi discutir sobre o compromisso e o comprometimento

ético-político onde a supervisora pontuava constantemente a importância do

mesmo, não somente através da palavra, mas principalmente através de sua

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postura, de sua vivência, do seu exemplo o que muito nos sensibilizou e que

foram internalizados e conseqüentemente vivenciados em todo o nosso fazer

enquanto profissional e enquanto ser humano.

O compromisso social segundo Liebesny e Mortara (2003, p. 259-261) refere-

se a

uma direção específica proposta para os projetos da psicologia [...]

exige do profissional uma competência técnico-política; isto é,

capacidade teórico-prática, reflexão sobre as opções de ação,

construção de projetos visando a compreensão e transformação da

realidade social, inserção na categoria profissional que o constitui.

[...] Na perspectiva sócio-histórica, o psicólogo comprometido

reconhece, a si e ao sujeito de sua ação profissional, como sujeitos

ativos e transformadores do mundo como seres que transformam e

são transformados, determinados e determinantes da realidade.

É este diferencial da implicação com o trabalho e com os sujeitos envolvidos

mostrou que a transformação é possível na vida concreta das pessoas.

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5 CONCLUSÃO Todo o caminho percorrido foi caracterizado por constantes momentos de

análises, de reflexões do fazer e do saber. Problematizar, tentar compreender

toda essa dinâmica serviu como um grande aprendizado e conseqüentemente

esclareceram muitos processos pelos quais passamos o que facilitou a

finalização dos procedimentos de intervenção.

Ao chegar ao final do trabalho, chega também o momento de analisar o que

pôde ser proporcionado com as intervenções e o que, mesmo tendo sido

planejado não pôde ser viabilizado.

A não concretização do trabalho em grupo nos fez pensar se, realmente, o que

fizemos foi um trabalho pautado na Psicologia Social Comunitária.

Entendíamos que não havia cumprido o nosso papel, parecia que tínhamos

deixado a desejar. Após a finalização de todo este processo e, em meio à

análise de nossa intervenção chegamos à conclusão de que esta práxis foi sim

uma prática em Psicologia Social Comunitária. O grupo não pode ser

viabilizado devido à demanda dos cuidadores, mas o nosso fazer teve uma

leitura Sócio-Histórica da realidade, pois compreendemos o contexto social em

que eles se inserem, conhecemos suas histórias e, mais do que isso,

vivenciamos o dia-a-dia, acompanhamos lado-a-lado o seu fazer, suas

implicações, suas angústias, seus anseios. Procuramos ainda, proporcionar um

maior vínculo entre os cuidadores e a Unidade de Saúde e, acima de tudo,

possibilitar maior autonomia em suas vivências, percebendo-se como reais

sujeitos de sua própria história.

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Foi bastante desafiador participar deste estágio. A falta de experiência, a

vontade de não “errar”, o desejo de que tudo desse certo e de que o trabalho

fosse gratificante também para os sujeitos envolvidos fizeram com que nossa

ansiedade aumentasse e que andasse lado a lado durante todo o percurso.

Temos consciência de que um dos principais objetivos propostos inicialmente

foi atingido: As intervenções, realizadas com os cuidadores de idosos que

acompanhamos, os levaram a refletir sobre o seu fazer. Acreditamos que

estes momentos foram muito importantes para eles. Parar para pensar dentre

outras coisas, sobre os motivos que os fizeram virar cuidadores, sobre o que os

mantém nessa atividade, sobre os prós e contras desse fazer, sobre a relação

que estabelecem com o idoso e com eles mesmos, foi essencial. Na verdade,

foi proporcionado uma espécie de auto-conhecimento, que felizmente, foi

percebido pelos cuidadores.

Constatamos que, ao contrário do que imaginávamos, o cuidado para estes

sujeitos não se deu a partir de uma escolha, mas a partir de um processo

caracterizado primeiramente, pelo fato de serem filhos solteiros e no caso da

cuidadora K., também, por ser mulher. Percebemos que o cuidado implica em

dedicação exclusiva, dificultando que os cuidadores constituem relações

sociais fora do ambiente familiar, levando-os a um certo isolamento social.

Essa negação das relações sociais fora do contexto diário inaugura outros tipos

de relações, que neste caso, fortaleceu outras redes sociais: vizinhos e

Unidade Básica de Saúde.

Foi muito gratificante perceber durante os encontros e, principalmente, na

finalização dos trabalhos que o carinho que sentíamos pelos cuidadores era

recíproco. Havia um cuidado por parte dos cuidadores conosco, como contatos

telefônicos nas semanas em que não foi possível realizar os atendimentos,

preocupação com a nossa saúde, com a nossa segurança e mostravam-se

preocupados quando atrasávamos um pouco para os encontros. Na finalização

do processo os cuidadores demonstraram a vontade de continuar mantendo

contato. Tudo isso serviu como um estímulo para todo o fazer!

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Quanto à relação que estabelecemos com a Unidade de Saúde, temos a

sensação de que a intervenção foi de extrema importância para nós, no

princípio houve uma certa dificuldade no estabelecimento da proposta, porém,

no decorrer do processo, conseguiu-se viabilizar a parceria. Enfim nos

articulamos enquanto grupo. Todo esse processo, um pouco dificultoso, de

parceria, muito nos fez aprender. Foi uma ótima experiência!

Nesse momento em que todo o caminho percorrido pode ser visualizado,

podemos concluir que toda esta intervenção além de ter nos proporcionado um

amadurecimento profissional nos fez crescer principalmente enquanto pessoa.

Conhecer e entender a dinâmica daquela comunidade, interagir com os

moradores, participar de suas vidas, muito contribuiu para até mesmo entender

e nos descobrir melhor. Muitas foram as vezes, em que a partir dessas nossas

interações com o bairro e com os sujeitos envolvidos no processo, paramos

para pensar em nossa vida e no nosso modo de estar no mundo. E é devido a

isso que afirmamos que muito mais que um trabalho acadêmico, esta

experiência serviu como um meio de crescimento, pois a medida que fomos

sendo tocadas pelo outro, pela vida, pela sensações, sentimentos,

pensamentos, fomos refletindo, re-avaliando, nossos valores e modos de vida.

O desenvolvimento desta intervenção se apresentou para nós como fonte de

muitas emoções, de grandes afetações, uma imensa possibilidade de troca do

saber, do compreender e do sentir. Nos permitiu, além de utilizar a teoria do

mundo acadêmico, fazer uso do saber popular que “entra pelas mãos, entra

pelo fazer, pelo sentir, pela intuição, pela estética” (PEREIRA, 2004, p. 72).

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