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Universidade de Brasília ÁLVARO ACCO KOSLOWSKI PROGRAMA SEGUNDO TEMPO NAVEGAR: UM ACESSO AO ESPORTE DE ALTO RENDIMENTO Caxias do Sul 2007

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Universidade de Brasília

ÁLVARO ACCO KOSLOWSKI

PROGRAMA SEGUNDO TEMPO NAVEGAR: UM ACESSO AO ESPORTE DE ALTO RENDIMENTO

Caxias do Sul

2007

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ÁLVARO ACCO KOSLOWSKI

PROGRAMA SEGUNDO TEMPO NAVEGAR: UM ACESSO AO ESPORTE DE ALTO RENDIMENTO

Caxias do Sul – RS 2007

ALVARO ACCO KOSLOWSKI

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PROGRAMA SEGUNDO TEMPO NAVEGAR: UM ACESSO AO ESPORTE DE ALTO RENDIMENTO.

Monografia realizada como requisito parcial

para obtenção do título de Especialista em

Esporte Escolar, pelo Centro de Educação a

Distância, da Universidade de Brasília.

Orientador: Prof. Ms. Carlos Gabriel Gallina

Bonone

Caxias do Sul – RS

2007

Álvaro Acco Koslowski

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PROGRAMA SEGUNDO TEMPO NAVEGAR: UM ACESSO AO ESPORTE DE

ALTO RENDIMENTO.

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do título de Especialista

em Esporte Escolar, pelo Centro de Ensino a Distância, da Universidade de Brasília, pela

Comissão formada pelos professores:

Presidente: Professor Carlos Gabriel Gallina Bonone

Universidade de Brasília

Membro: Professora Doutora Siomara Aparecida da Silva

Universidade de Brasília

Brasília (DF), Agosto de 2007.

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Dedico este trabalho a minha família, às atletas de Seleção Brasileira de Canoagem

Feminina e todas as pessoas envolvidas com o Programa Segundo Tempo Navegar de

Caxias do Sul.

Agradeço a todas as pessoas que de uma forma ou de outra estiveram envolvidos com este

trabalho me ensinando, me incentivando, dentre eles gostaria de mencionar principalmente

as e os atletas os quais entrevistei. Agradeço a Deus pelo dom da vida e poder fazer parte

desta odisséia maravilhosa.

“Se pude enxergar tão longe foi porque estive apoiado em ombros de gigantes”...

Albert Heisten

SUMÁRIO

ÁLVARO ACCO KOSLOWSKI............................................................................................. 10

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INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 10 1. O ESPORTE......................................................................................................................... 12 1.1. O esporte no plural e na horizontal.................................................................................... 12 1.2. O esporte de excelência na infância e adolescência .......................................................... 15 1.3. Educação, desporto e competição...................................................................................... 17 2. O CRESCIMENTO E O DESENVOLVIMENTO HUMANO ATRAVÉS DO ESPORTE21 2.1. Crescimento humano ......................................................................................................... 21 2.2. Desenvolvimento moral e intelectual ................................................................................ 25 3. A CANOAGEM CHEGANDO A CAXIAS DO SUL......................................................... 28 3.1. A canoagem no mundo...................................................................................................... 28 3.2. A canoagem no Brasil ....................................................................................................... 30 3.2.1 principais datas na canoagem brasileira .......................................................................... 31 3.3. A canoagem em Caxias do Sul .......................................................................................... 32 3.4. Programa Segundo Tempo Navegar.................................................................................. 34 4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ........................................................................ 38 4.1 Pauta das entrevistas........................................................................................................... 40 4.1.1 Para os alunos/atletas:...................................................................................................... 40 4.1.2 Para os professores: ......................................................................................................... 41 4.1.3 Para os pais: ..................................................................................................................... 42 5. ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES ...................................................................................... 43 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 47 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 49

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RESUMO

Ao afirmar-se que o esporte é um fenômeno social de grande relevância nos

tempos modernos, com certeza não se está somente expressando uma novidade,

mas sim, revelando um mundo que necessita sempre ser estudado e aprimorado. O

universo esportivo, pela magnitude que assumiu atualmente, alicerçado por várias

bases, sejam elas, econômicas, sócio-antropológicas ou psicológicas não pode ser

olvidado ou relegado a segundo plano.

No decorrer do Curso de Especialização em Esporte Escolar realizado pelo

Ministério do Esporte através do Centro de Educação a Distância da Universidade

de Brasília, percebi nos inúmeros módulos desenvolvidos uma tendência anti-

esporte de alto rendimento e neste sentido decidi desenvolver meu trabalho de

conclusão deste curso justamente com esta vertente esportiva no sentido de estudá-

la e entendê-la segundo suas influências, transformações sociais e intervenções nos

alunos do Programa Segundo Tempo Navegar do Núcleo de Caxias do Sul.

O estudo teve como objetivo apresentar possibilidades do esporte, afirmando

ser este uma reunião social com diferentes papéis e expressões, em diferentes

locais e para diferentes populações. Devemos destacar também que o esporte pode

ser praticado por diferentes pessoas, com diferentes idades, tendo diferentes

objetivos com a sua prática, sejam eles competitivos nos diferentes níveis, de lazer,

ou de aprendizagem escolar.

Cabe aos professores de Educação Física, as instituições de ensino, aos

governos e a sociedade de uma forma geral, criar atitudes, movimentos, ações,

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ambientes que façam desta expressão uma importante e indispensável via de seu

desenvolvimento.

O Programa Segundo Tempo Navegar, núcleo Caxias do Sul, foi estudado

perante o desempenho de alguns ex-alunos e ex-alunas que optaram pela

continuidade esportiva no alto rendimento. Assim entrevistei estes ex-atletas do

Programa Segundo Tempo Navegar que hoje integram as Equipes Nacionais

Permanentes de Canoagem Masculinas e Femininas, bem como seus pais e ex-

professores, no sentido de verificar algumas evidências em torno da contribuição

deste importante Programa Social para com o esporte alto rendimento.

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INTRODUÇÃO

O universo do esporte compreende espetáculo, profissão, ciência, arte,

política, lazer (ativo e passivo), prática, técnica, educação, investigação entre outras.

O esporte é sumamente importante para a criança e para o jovem (GONÇALVES,

1995). Para a criança, porque vai desenvolvendo e aprimorando seu crescimento,

além de começar a proporcionar-lhe uma vida muito mais saudável. O mesmo se

aplica aos jovens, que têm sua resistência, reflexos e desenvolvimento físico

aperfeiçoados, fazendo com que se aprimorem fisicamente, além de lhes possibilitar

avançar no desenvolvimento de uma ou mais modalidades específicas que mais lhe

agradem.

É importante salientar que o esporte não serve para as sociedades exaltarem

um modelo de corpo, um modelo de beleza, um modelo de verdade, um modelo

moral e um modelo de ética, e sim revela conseqüências que são o acúmulo sócio-

histórico-cultural dessa sociedade e de suas vivências.

As crianças e adolescentes, neste âmago de “vir-a-ser”, infelizmente são

considerados como um investimento no futuro, como um lucro a longo prazo, enfim,

consumidores em potencial e não seres que sentem prazer, felicidade, tristeza,

desejos, inclusive de recriar e viver numa sociedade mais feliz, justa e humana. Este

é o desafio para nós professores quanto a perspectiva do esporte: mudar esta

realidade!

Quando delineamos diferentes modelos de práticas desportivas e seus

resultados, temos então argumentos para afirmar que, enfim, o desporto plural e na

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horizontal, nas suas concepções, conteúdos e formas, procura corresponder à

ampla diversidade de estados de condição, de motivação, de emoção e cognição,

sendo convite ao desenvolvimento e aperfeiçoamento de modelos paralelos

diferenciados e autônomos com estruturas próprias e distintas de valores princípios

e finalidades. Assim o Programa Segundo Tempo Navegar configura-se como uma

nova proposta de educação. O educar pela consciência, pelo entendimento de um

ser incompleto, deficiente e carente do saber, esta é a premissa que o norteia.

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1. O ESPORTE

1.1. O esporte no plural e na horizontal

Pensar o esporte no plural e na horizontal é praticar aperfeiçoamento dos

modelos diferenciados, com novos valores, princípios e finalidades constantes.

Ressaltando o que diz Gaya (2004, p. 57) considerando que o esporte

representa um componente cultural de significativa importância na vida de todos os

povos, tornando-se indiscutivelmente, um fenômeno global, justifica-se a relevância

de estudos que possam auxiliar na interpretação alargada do esporte enquanto

fenômeno social e passível de tratamento pedagógico.

Gaya (2007, p. 62) reafirma que ao assumirmos a interpretação do esporte

como um fenômeno polimorfo e polissêmico, se torna viável a conjectura de que

grande parte das divergências que permeiam os debates sobre o esporte na

comunidade acadêmica decorre do fato do esporte ser conjugado no singular.

Tantas vezes, percebe-se, descreve-se e discute-se o esporte pela via única de sua

expressão de alto rendimento. Tudo se resume ao alto rendimento. E ainda mais,

principalmente quando interesses ideológicos permeiam os debates, se interpreta o

esporte exclusivamente pelos desvios morais e por um quadro de referências éticas

que em nada o dignificam. Associa-se o esporte em geral e as práticas esportivas ao

doping, aos problemas oriundos de overtraining, aos excessos da mercantilização do

espetáculo esportivo, etc. Realizam-se essas associações como se tais fatos fossem

inerentes à estrutura essencial do esporte em toda sua diversidade de sentidos

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(BENTO, 1995 p. 98). Tal perspectiva claramente não faz justiça à grandeza e à

relevância social do esporte como expressão da cultura. Ainda sofre o esporte

severas críticas de teóricos que desconhecem as possibilidades tecnológicas do

treinamento, que de fato podem resguardar a integridade física, psíquica, moral e

espiritual de qualquer atleta. Estas críticas infundadas representam a

irresponsabilidade através do desconhecimento de “como” podemos desenvolver o

esporte de alto rendimento valorizando, respeitando e principalmente desenvolvendo

as capacidades dos seres envolvidos e dotando suas vidas de sentido e

perspectivas.

Por outro lado, é preciso perceber, com adequada clareza, que o esporte de

alto rendimento ou de excelência, o esporte de lazer, o esporte escolar e o esporte

para pessoas portadoras de necessidades especiais não são, necessariamente,

expressões contraditórias; não são práticas que devam lutar incessantemente para

excluírem-se umas às outras. Pensar assim é pensar o esporte no singular.

É importante que se reconheça, por exemplo, que as práticas do esporte de

excelência são restritas a uma minoria, mas os critérios e regras que o selecionam

precisam ser inclusivos e embasados no rendimento/técnico/científico e não nos

arranjos políticos do apadrinhamento.

O esporte de excelência exige talento, e é regido pela valorização da

maximização de desempenho, é meritocrático, portanto atende um extrato muito

pequeno de participantes, que, todavia, não merecem serem discriminados. O

esporte de lazer é direito de todos indiferentemente dos níveis de performance ou da

exigência, de maior ou menor rendimento e contribui para com o acesso ao esporte

de alto nível. O esporte de lazer visa principalmente a participação, a inclusão. No

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entanto, esse rendimento, diferentemente do esporte de excelência, é auto-

referenciado. O esporte de lazer não dispensa a competição como critério de

avaliação, nem a vontade de vencer como objetivo de sua prática, mas a competição

não é normatizada por uma referência externa (o recorde, por exemplo), tão pouco o

vencer assume finalidade única.

Por outro lado, o esporte na escola é para que crianças e jovens,

independentemente de suas potencialidades físicas, motoras e esportivas,

aprendam a praticá-lo, tenham acesso à cultura esportiva e ao quadro axiológico

decorrente. É orientado por uma pedagogia de ensino-aprendizagem, mas, da

mesma forma, não dispensa preocupações com os valores relacionados ao

rendimento, às regras institucionais e à competição. Sendo assim, não faz sentido

armarmos tantas trincheiras e andarmos a combater uns aos outros: os amantes

aficcionados do esporte de rendimento versus os defensores do esporte de lazer e

os professores de educação física escolar pretendendo inventar um novo esporte

para inseri-lo nos currículos. Vamos perceber que os distintos sentidos,

manifestações e motivações intrínsecas às diversas práticas esportivas oportunizam

à todos, independentemente das motivações que os movem e de seu grau de

performance, encontrar na prática esportiva espaço de auto-aprendizagem e auto-

realização.

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1.2. O esporte de excelência na infância e adolescência

A falta de consenso quando se define o chamado esporte de rendimento tem

motivado interpretações muito diversas, o que acaba por proporcionar um debate

entre estudiosos que usam as mesmas palavras, todavia com significados distintos.

Gaya (2004, p. 68-69). O esporte de excelência não deixa de proporcionar a seus

praticantes mais jovens aspectos de lato sentido formativo e educacional. Mas,

infelizmente, em nosso meio acadêmico ainda persiste o olhar quase sempre

sectário de uma teoria crítica que maximiza os excessos e, simplesmente, deixa de

reconhecer aspectos positivos que essa prática pode oferecer, tais como valores,

cooperação, integração, entre outras.

Para Gaya (2004, p. 72) o esporte constitui-se como uma das partes de uma

área específica da cultura que podemos denominar como cultura corporal do

movimento humano. Todavia, sua dimensão antropológica exige diferenciáveis

matrizes de interpretação que se concretizam a partir das exigências, motivações e

perspectivas de seus praticantes. Embora o esporte apresente expressões

diferenciadas quanto ás motivações e sentidos de seus praticantes, há uma

estrutura que, adstrita a um conjunto de categorias, atribuem ao esporte uma

unidade conceitual que o diferencia de outras expressões da cultura corporal do

movimento humano. Entre essas categorias estão presentes o pressuposto ético da

procura pelo rendimento esportivo mediado através dos regulamentos

institucionalizados que, por sua vez normatizam as competições esportivas que

representam formas de avaliação e auto-avaliação das potencialidades e

aprendizagem esportivas.

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As diferentes expressões inerentes às práticas esportivas não são

excludentes ou contraditórias. É necessário que se perceba que suas configurações

possibilitam práticas com objetivos claramente diferenciados de forma não

antagonistas e muito menos contraditórias. O esporte de excelência é uma prática

que, ao exigir performances avançadas, é restrito a um conjunto de sujeitos

diferenciados, os talentos esportivos, mas que não deve ser limitado pelo físico ou

por aspectos financeiros ou políticos, mas sim alavancados pela vontade de

superação.

Portando, não há contradição possível entre aqueles que buscam no esporte

formas de lazer onde o objetivo é a participação e a inclusão. Tão pouco há

contradição com o esporte na escola na ótica do ensino e aprendizagem e na ótica

do esporte de reabilitação e reeducação com suas preocupações no âmbito da

promoção da saúde. Enfim, antes de serem excludentes, as diversas manifestações

das práticas esportivas são complementares no quadro de sentidos e motivações de

seus praticantes.

O esporte é considerado como um elemento da cultura corporal do

movimento humano, que constrói histórias e transforma a sociedade e como tal deve

ser repassado a gerações futuras. Possibilitar o acesso a essas práticas corporais, a

crianças e jovens deve constituir-se como um dos principais papéis da educação

física escolar, entretanto, para que se possa cumprir esse papel é necessário não

descaracterizar as modalidades esportivas a ponto de não mais identificá-las como

tal. Manter as preocupações com o desempenho técnico, com as regras normativas

e com a adequada postura moral frente à competição faz parte desse aprendizado.

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O esporte na escola enquanto componente do currículo complementar não se

confunde com a educação física e tampouco com o esporte de rendimento. Sua

finalidade é oportunizar as crianças e jovens um aprofundamento das práticas

esportivas. Pressupõe processos de inclusão e participação e deve ser desenvolvido

através de princípios de formação e educação das crianças e jovens nas diferentes

modalidades esportivas. Sendo assim, o esporte de rendimento para crianças e

jovens constitui-se num espaço amplo de formação e educação. Embora se

constitua numa prática seletiva sob o ponto de vista do talento esportivo, não se

pode negar sua potencialidade em propiciar oportunidades diversas para o

desenvolvimento social e moral de seus praticantes, tão pouco como direito

democrático.

1.3. Educação, desporto e competição

Gaya (2004, p. 75-77) afirma que muitos pedagogos têm oposto uma séria

resistência á adoção do desporto como um modelo de educação e de formação dos

jovens. Na origem desta atitude estaria a competição, que se constituiria como o

aspecto mais perverso do desporto. O fundamento da rejeição residiria no fato de o

desporto, pelas suas características agônicas, promover na formação da juventude

valores exacerbados de concorrência e de individualismo, em prejuízo dos valores

da igualdade e da solidariedade. Este viés pedagogicista pode, aliás, perceber-se

numa orientação mais geral de certa escola que visa anular toda e qualquer

iniciativa pedagógica sustentada na valorização do esforço e do mérito. Como se a

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promoção das condições de equidade, de solidariedade e de igualdade de

oportunidades se fizesse nivelando por baixo. Como se todos tivessem o mesmo

valor, mesmas capacidades, mesmas ambições e mesmos pontos de vista.

Não se trata de fomentar uma cultura da concorrência que promova a

acentuação das manifestações de exclusão que existem na sociedade. O que se

objetiva é que o desporto seja um instrumento de aproximação de cooperação e de

diálogo entre todos. E, por isso, parece não apenas importante apoiar a formação da

criança com competências adequadas para a sua prática, mas também dotá-la de

uma correta visão sobre o desporto, sem o sacralizar, já que sendo uma criação do

homem não é por isso perfeito.

A linguagem do corpo é o instrumento de comunicação privilegiado pela

criança. Todos os que viveram a infância, sem limites, sem constrangimentos, o

compreendem. O desporto é uma das manifestações mais interessantes e

representativas da cultura do corpo. Por isso tem um grande significado e um

interesse particular para os mais jovens, daí a necessidade de expormos esta pré-

disposição natural. Que sentido teria o desporto para a criança sem competição?

Será possível pensar o desporto à margem da competição, isto é, imaginar um

desporto sem atividade competitiva? Que se entenda o competir, não como única e

exclusivamente com o foco em derrotar os adversários, mas principalmente em

superar seus limites.

O sentido primordial do desporto para a criança é assim, o jogo. É a

possibilidade que este lhe ofereça a expectativa de avaliar as suas próprias

capacidades, comparando-as com as dos outros e principalmente consigo próprio.

Demonstrar aos outros e a si mesmo aquilo de que é capaz, de obter sucesso, de se

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superar de criar junto aos amigos, dos pares, e terceiros uma boa imagem social, de

adquirir e desenvolver valores para a sua vida em sociedade respeitando e

entendendo as regras, as diferenças, as imperfeições e principalmente que só se

constitui o aprendizado a partir da sua falta e assim temos que ensinar a partir da

possibilidade do erro, da imperfeição.

O treino, o exercício, enquanto tempo e atividade de preparação da

participação competitiva, só mais tarde começa a ganhar significado para o jovem.

Assim a Educação Física Escolar e o esporte de iniciação tomam conotação

destacada, pois será estes que darão prazer a prática e principalmente farão com

que o jovem experimente e forme um vocabulário motor amplo e dotado de

pluralidade de experiências corporais. Não faz sentido pensar o desporto da criança

excluindo esta da competição. E ainda que o fizesse estaríamos aleijando e

limitando a mediocridade suas reais capacidades. A competição é a essência do

desporto, sem a qual este próprio deixa de o ser, de existir (GAYA, 2001). Não se

trata, por isso, de suprimir a competição no desporto, de criar um desporto sem

competição, como alguns têm pretendido na limitação do sentido substantivo desta

atividade humana, mas de pensá-la mais à medida dos interesses, expectativas e

necessidades da criança. De construir uma competição que não apenas

corresponda à sua vontade de manifestar as suas capacidades, mas seja também

compatível com as suas aptidões, competências e expectativas psicológicas,

biológico-físicas e cognitivas.

Portanto nem o desporto, nem a competição que lhe é iminente se constituem

em si mesmos como determinantes na perspectiva da educação da criança. O

desporto e a competição são apenas instrumentos, que nos são passíveis de uso,

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sobretudo os princípios e valores associados à competição, a forma como esta é

utilizada e as experiências vividas durante a atividade que conferem o seu valor

educativo. Estes valores e princípios podem, indiscutivelmente, ser associados às

atividades competitivas.

Portanto competição não é nova na vida do homem. Não apareceu com a

criação do desporto moderno, nem tão pouco com a revolução industrial ou na sua

relação com a natureza, na relação consigo próprio. Sempre o homem percebeu a

competição como um fator de humanização e de progresso, ainda que nem sempre

o tenha conseguido.

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2. O CRESCIMENTO E O DESENVOLVIMENTO HUMANO ATRAVÉS DO

ESPORTE

2.1. Crescimento humano

Para Gaya (2004, p. 204-205) o crescimento e desenvolvimento humano,

assim como as características pessoais de um indivíduo, resultam da interação

biológica, psicológica e social no contexto da família, da sociedade e do ambiente

sociocultural. O crescimento ou desenvolvimento físico é um componente que

corresponde ao tamanho dos órgãos e, consequentemente, do organismo como um

todo. Decorrente da multiplicação (hiperplasia) e do aumento do tamanho

(hipertrofia) das células, o desenvolvimento físico é um processo finito, pois, embora

essas modificações celulares sejam bastante evidentes até os 20 anos de idade,

elas persistem durante toda a vida, mas com uma função de reparação ou de

reposição do desgaste natural dos órgãos (DANTAS, 1998 p. 131).

O desenvolvimento é um processo que não cessa ao atingir a maturidade da

idade adulta, mantendo-se ao longo de toda a existência do indivíduo. Tanto o

crescimento quanto o desenvolvimento são processos simultâneos, inter-

relacionados e interdependentes. Por ser um processo duradouro e extremamente

longo, é de grande importância o acompanhamento de todos, pais, família,

educadores e da comunidade em geral.

As crianças em idade pré-escolar balanceiam as atividades energéticas como

atividades físicas, tais como: correr, pular, jogar, brincar etc, com alguma atividade

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passiva e sedentária. Algumas crianças, no entanto, precisam de encorajamento

freqüente para exercícios mais vigorosos, ao passo que outras necessitam de

restrições dos professores para evitar a exaustão. Estes cuidados são cruciais,

principalmente se tratando de crianças e adolescentes.

No geral elas precisam de suficientes possibilidades de movimento que

estimulem de forma fantasiosa e variável correr, saltar, saltitar, trepar, remar, velejar,

subir, balançar, pendurar, oscilar, puxar, empurrar, carregar, lançar e apanhar, assim

como outras formas de movimentos fundamentais. A atividade físico-esportiva

deveria enfim, ser exclusivamente calcada na vontade e na diversão. Histórias

motoras, de todo tipo, devem ir de encontro ao entusiasmo das crianças, como

também solução de tarefas que contribuam para ampliar o repertório de movimentos

e estímulos da criatividade motora e a própria experiência física.

Na idade escolar (até os 10 anos) as condições são extremamente favoráveis

para a aquisição de habilidades motoras e para a ampliação de repertório motor.

Portanto é importante que nessa faixa de idade haja uma formação generalizada,

poli esportiva, no sentido de aprender um grande número de técnicas básicas, para

que depois elas sejam aperfeiçoadas. Deve-se aproveitar o entusiasmo que as

crianças têm pelo movimento, oferecendo-lhes atividades motoras motivadoras e

acompanhadas de muitas experiências bem-sucedidas, para desenvolver hábitos e

atitudes sadios para a prática durante toda a vida.

A partir da idade de 9-10 anos, o desenvolvimento de meninos e meninas é

diferente. Enquanto que as meninas têm cerca de um a dois anos para entrar na

primeira fase puberal (pubescência) os meninos têm de 2dois anos e meio a três

anos e meio. Correspondentemente, a puberdade para as meninas chega mais cedo

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do que para os meninos. Com o alcance da maturidade sexual, as características

sexuais secundárias são completamente desenvolvidas, a estatura final é quase

atingida e há uma diferente situação orgânica.

A adolescência, que se caracteriza por um intenso crescimento e

desenvolvimento, manifestado por inúmeras transformações anatômicas,

fisiológicas, emocionais e sociais, tem, em sua primeira fase, chamada primeira

puberal, um grande aumento de estatura e peso, que a maioria das vezes leva a

uma acentuada diminuição das proporções peso-força e causa geralmente uma

diminuição das capacidades coordenativas. Durante a primeira fase puberal a

capacidade de aprendizagem motora é reduzida ou mesmo perturbada. (GAYA,

2004, p. 207)

O crescimento inicial em estatura, as proporções corporais alteradas, assim

como a instabilidade emocional, levam a problemas de coordenação, que podem ser

tão pronunciados que alguns jovens, temporariamente, têm dificuldades para

executar habilidades motoras de que antes já tinham domínio. A precisão no

controle dos movimentos deixa a desejar e movimentos exagerados são típicos

dessa faixa etária.

Por outro lado, essa fase representa a época de grande treinabilidade das

capacidades condicionais (força, velocidade, resistência). A intelectualidade

aumentada possibilita novas formas de aprendizagem motora, mas deve-se levar em

consideração a motivação altamente oscilante dos adolescentes. Essa é a época em

que a participação em atividades físico-esportivas é de essencial importância. Aqui

podem se aperfeiçoar as técnicas específicas se uma modalidade esportiva já é

praticada.

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A segunda fase puberal é extremamente importante, porque esse é o período

de maior adaptabilidade do organismo.

O treinamento para jovens dessa idade deve ser elaborado em concordância

com o desenvolvimento biológico natural dos órgãos e sistemas funcionais, e ser

orientado ao desenvolvimento harmônico do organismo e melhora do estado de

saúde.

Essas características têm grande importância e efeito nas futuras adaptações

do organismo. Se a idéia de que o treinamento deve ir passo a passo com o

desenvolvimento biológico é verdadeira, entre as idades de 12 a 17 anos o conteúdo

do treinamento deve ser diferente para os meninos e as meninas. Nem sempre isso

é possível, devido a problemas operacionais (MARQUES e OLIVEIRA, 2002). As

meninas devem ser aptas a conseguir rendimentos mais elevados por volta das

idades de 18 a 19 anos. Isso quase não é possível para a maioria dos meninos.

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2.2. Desenvolvimento moral e intelectual

Molina (1993, p. 38-39) afirma que tanto para o aluno como para a sociedade,

o esporte na escola é importante, no que tange ao desenvolvimento moral e

intelectual.

Efetivamente, o desenvolvimento moral e o intelectual do aluno têm estreita

relação com o processo de socialização, na medida em que é através da relação e

interação com os mais velhos que a criança aprende os valores sociais.

A questão moral, ética e sua conseqüente reflexão posicionam-se na

discussão do desenvolvimento filosófico.

A moral e a ética têm profunda relação com os fatores econômicos, políticos e

ideológicos e com as relações sociais de uma determinada sociedade em um

determinado momento histórico. Pressupõem valores internalizados pelos hábitos de

determinadas classes e segmentos sociais, pela forma como organizam a produção

e o consumo que, nas relações de poder com as outras, tendem a ser hegemônicas.

Pode-se supor que, ao longo da história, as práticas esportivas tiveram íntima

influência nas formas de pensamento e nos valores morais vigentes, em

determinados momentos históricos.

As relações sociais e tudo mais que ela envolve, são originários da relação do

homem com a realidade, sua história social, que está estreitamente ligada ao

trabalho e á linguagem (MARQUES e OLIVEIRA, 2002).

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É pela linguagem que transmitimos um sistema de códigos e signos morais e

esta relação se dá no relacionamento entre velhos e jovens. É observável que

paralelamente ao desenvolvimento da criança (cognitivo, afetivo e psicomotor) se dá

a inculcação dos valores sociais presentes naquele grupo, naquele determinado

momento histórico. Esses valores são transmitidos através da palavra que junto com

o gesto motor são as bases desta linguagem.

Quando se diz que o esporte na escola é importante porque o aluno que o

pratica aprende a competir, supõe-se que em nosso pensamento tenhamos atitudes

favoráveis á competição como conceito de prática esportiva, que aceitamos e que

somos favoráveis à apuração do melhor entre seus pares; ou se dizemos que o

esporte na escola é importante para a socialização do aluno, pressupõe-se atitudes

favoráveis para que o aluno divida tarefas e resultados entre seus pares, significa

admitir a igualdade entre todos, sem diferenças, significa promover relações sociais

fraternas.

A interpretação dos conceitos abstratos da linguagem-motora, das atitudes

sociais é que nos permite a tomada de consciência em relação ao mundo. Se a

linguagem se manifesta através da palavra e do gesto motor, logo é de supor-se

que, embora exista a inteligência antes do gesto motor, não existe pensamento sem

antes o gesto motor. Talvez aí esteja a essência da ligação entre a motricidade e a

cognição. Esse pensamento vale tanto para a alfabetização, como para a iniciação

esportiva, pois não é por acaso que devemos, antes do ensino de determinado

esporte, proceder a uma série de jogos estimulantes e motivadores, enfim,

atividades de estimulação motora e pré-desportiva.

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Como variáveis intervenientes no desenvolvimento do pensamento, a partir

das ações motoras, Piaget leva em consideração: a maturação biológica do

indivíduo, a ação social e o tempo no desenvolvimento do indivíduo. Tais variáveis

são importantes porque demonstram o cuidado que se deve ter ao ministrar o

esporte na escola, pois é de suma importância também atentar para as

características individuais. Se utilizarmos uma metodologia rasa, como os do esporte

de alta performance estarão afastando o aluno, ao invés de contribuirmos para um

desenvolvimento cognitivo, afetivo e psicomotor eficaz. Cito oportunamente o

esporte na escola, no intuito de estreitar as relações que o Programa Segundo

Tempo Navegar possui com as Escolas e por assim dizer a convergência que

ambos acabam tendo no verdadeiro sentido que esta forma de esporte deveria ter.

O método resultante desse pensamento, aplicado ao esporte na escola,

deverá dar condição para que o egresso da escola tenha informações suficientes

para praticar esportes de forma autônoma e consciente.

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3. A CANOAGEM CHEGANDO A CAXIAS DO SUL

3.1. A canoagem no mundo

Não existe uma data e muito menos uma população específica a qual

podemos definir como origem da modalidade de Canoagem. No início distintos

povos utilizavam embarcações aquáticas como meio de subsistência e

sobrevivência e pelas quais os auxiliavam em tarefas do dia-a-dia.

Existem relatos sócio-históricos citando os índios Canadenses como sendo os

precursores da modalidade de Canoa e já o Caiaque aos povos da Groenlândia

(Alasca e Labrador). É importante levar em consideração que em ambas as

populações as embarcações sofreram diversas influências: clima, relevo, população,

necessidades, etc.

A quem dos anteriores existe indícios mais antigos encontrados entre os

povos da Antiguidade, que sugerem o uso de embarcações utilizando remos como

forma de propulsão entre os povos do Egito e Astecas, isto já no início do século III a

IX antes de Cristo.

Os Egípcios navegaram pelo Rio Nilo através de embarcações estreitas

construídas com juncos atados com cordas e utilizando remos livres como forma de

propulsão. É importante destacar oportunamente a diferença entre remos fixos e

remos livres, pois o primeiro caracteriza a modalidade de Remo, que além de

possuir o remo preso á embarcação desloca-se de costas; esta entre outras

características distingue a Canoagem do Remo.

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No princípio do século XIX tendo como inspiração os povos anteriormente

citados, os Ingleses começaram a utilizar embarcações denominadas

‘’Gronelandais’’, que com o passar do tempo se difundiu por toda a Europa.

Como registro oficial, consta o advogado Escocês Jhon Mc Gregor, como

sendo a primeira pessoa a utilizar um caiaque com finalidades de Lazer\Esporte. O

escocês desenhou sua própria embarcação a utilizando posteriormente em

expedições em rios e lagos pela Europa. Os relatos das aventuras do pioneiro

escocês John Mc Gregor, constam em suas memórias imortalizadas em seu livro ‘’

Um millier de miles dans lê canoe Rob Roy’’. O primeiro caiaque foi batizado como o

nome de ‘’Rob Roy’’ e é citado constantemente nas aventuras descritas em seu livro.

Mais tarde, em 1886 Jhon Mc Gregor funda o ‘’Royal Canoe Club’’.

A primeira competição oficial documentada é data em 1877, que ocorrerá na

Bélgica e assim temos os seguintes acontecimentos e fatos históricos da Canoagem

Mundial:

1880 - Fundação da American Canoe Association

1887 - Fundação da English Canoe Federation

1890 - Fundação da Canadian Canoe Federation Association

1904 - Fundação da Canoé Club de France

1924 - Fundação da International Canoe Federation.

1936 - A modalidade de Canoagem passa a ser olímpica.

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A palavra canoa tem origem nos Índios Canadenses e é utilizada para definir

a embarcação na qual o canoísta a utiliza para mover-se em meio aquático e é

composto por um remo de uma só pá e uma embarcação na qual o canoísta se

posiciona com um dos joelhos apoiado no fundo da canoa e o outro fica semi-

flexionado na parte posterior da canoa. Já o caiaque (Kayak) que significa ‘’bote de

homem esquimó’’, na qual o canoísta fica sentado na embarcação utilizando um

remo de pá dupla remando bi-lateralmente e deslocando-se para a frente.

3.2. A canoagem no Brasil

Inspirado pela infância vivida na Alemanha e no Kanu Club, o Sr. José

Wingen, construiu em 1943 na cidade gaúcha de Estrela o 1º caiaque que passou a

se chamar de ‘’Regatas’’, o qual despertou relevante interesse na comunidade local

e por assim dizer acabou influenciando o País.

Posteriormente, segundo o próprio Sr. José Wingen, a canoagem sofreu com

a falta de infra-estrutura, desestimulando os praticantes, mas acabou tendo o seu

mais duro golpe com a construção da represa de Bom Retiro, levando a canoagem

nacional a um momento de estagnação e descontinuidade (IMBRIACO, 2001).

Somente em meados da década de 70 / 80, a canoagem nacional foi

retomada com a chegada dos primeiros caiaques em fibra de vidro trazidos da

Europa e da Argentina. Tais embarcações serviram como molde para a construção

dos primeiros caiaques nacionais em resina de poliéster reforçada com fibra de vidro

(IMBRIACO, 2001; ROBBA, 2001).

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A Confederação Brasileira de Canoagem, atualmente com sede na cidade de

Curitiba, Estado do Paraná, foi fundada em 1988 com apenas quatro associações

filiadas; apesar de sua pouca idade já está conseguindo resultados expressivos a

nível internacional tornando-se conhecida por grande parte da população canoística

mundial. Este grande desenvolvimento deve-se ao trabalho estruturado e organizado

realizado pela CBCa e ao esforço dos atletas orientados e supervisionados por

excelentes treinadores (IMBRIACO, 2001).

Nos 19 anos de histórias da Canoagem Brasileira já foram conquistadas

importantes títulos internacionais, mas mais do que isso mobiliza desde a iniciação

ao alto rendimento um elevado número de adeptos contribuindo pela ampliação da

policultura esportiva nacional.

3.2.1 principais datas na canoagem brasileira

1943 – José Wingen constrói o 1º caiaque denominado ‘’Regatas’’.

1980 – Fundação da ACC - Associação Carioca de Canoagem, 1a. entidade oficial

da canoagem brasileira, presidida por Uwe Peter Kohnen.

1982 - I Encontro Nacional de Canoagem - Visconde de Mauá, RJ.

1984 - I Prova Oficial de Canoagem - Rio Preto, Visconde de Mauá. RJ.

1984 - I Prova Oficial de Velocidade, Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro, RJ.

1985 - Fundação da Associação Brasileira de Canoagem.

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1989 – Fundação da Confederação Brasileira de Canoagem – CBCa.

1997 – Realização do Campeonato Mundial de Canoagem Slalon em Três Coroas –

RS.

2001 – Realização do Campeonato Mundial de Canoagem Velocidade Júnior em

Curitiba – PR.

2001 – A modalidade de Canoagem passou a fazer parte do Projeto Navegar.

3.3. A canoagem em Caxias do Sul

A canoagem em Caxias do Sul iniciou em 2000, mediante a assinatura de um

termo de convênio entre o Sistema Autônomo Municipal de Água e Esgoto – SAMAE

e a Federação de Canoagem do Estado do Rio Grande do Sul – FECERGS, o qual

possibilitou a utilização das Represas do Complexo Dal Bó (São Pedro, São Paulo e

São Miguel) e Represa Maestra, para a prática de esportes Náuticos. Mediante este

importante passo a Canoagem e os esportes Náuticos passaram a usufruir de

importantes e belos cenários das paisagens caxienses. Mais do que isso, os

esportes náuticos passaram a ter um espaço específico, organizado e acima de tudo

estruturado para estes fins.

Ainda em 2000, Caxias do Sul passou a ser sede da concentração

permanente da Seleção Gaúcha de Canoagem, fator determinante da instalação, no

ano de 2001, do núcleo do Projeto Navegar, e mais do que isso da divulgação dos

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esportes Náuticos na cidade e desta forma o despertar para uma nova possibilidade

esportiva na comunidade que até então era desconhecia.

Em dezembro de 2001 foi instalado na cidade um núcleo do Projeto Navegar,

o qual trouxe uma nova possibilidade para os jovens caxienses, no qual puderam

praticar uma modalidade esportiva até então inexistente. O Projeto Navegar no ano

de 2003 passou a se chamar Programa Segundo Tempo Navegar, integrando um

programa de atividades esportivas com cunho educacional mais amplo e aberto a

um número mais amplo de modalidades esportivas.

Em dezembro de 2002 um grupo de praticantes, admiradores e atletas de

Vela, Remo e Canoagem, reunidos na sede do então Projeto Navegar, fundaram a

Associação Caxiense de Esportes Náuticos – ACEN, a qual tem como principal

finalidade o fomento e desenvolvimento dos esportes náuticos na cidade de Caxias

do Sul.

No ano de 2004 a cidade de Caxias do Sul foi escolhida pela Confederação

Brasileira de Canoagem, para sediar de forma permanente a Concentração da

Equipe Feminina de Canoagem, a qual ampliou a divulgação da Canoagem e desta

forma a procura por crianças e adolescentes. A partir desta data a Equipe Feminina

conquistou inéditos títulos na Canoagem Mundial que contou com o importante

apoio logístico e científico da Universidade de Caxias do Sul.

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3.4. Programa Segundo Tempo Navegar

Entender o esporte como um fenômeno só, com características diferentes que

representam à identidade motora do praticante e desta forma passa a realizá-lo com

prazer, auxiliando na melhora da qualidade de vida e estabelecendo relações

sociais, cognitivas, afetivas resguardando a individualidade e estimulando a

criatividade e as relações motoras. É nesta perspectiva que o Programa Segundo

Tempo Navegar propiciou a alunos da rede pública de ensino da cidade de Caxias

do Sul, ingressarem no mundo esportivo através das modalidades de Canoagem,

Vela e Remo, e que por conseqüência passaram integrar as Equipes Nacionais

Permanentes de Canoagem Velocidade Feminina e Masculina do Brasil.

O Programa Segundo Tempo Navegar foi instalado no município de Caxias

do Sul, graças a uma parceria entre o Governo Federal (Ministério dos Esportes), a

Prefeitura Municipal de Caxias do Sul (Secretaria Municipal de Esportes e Lazer) e a

Associação Caxiense de Esportes Náuticos já no ano de 2001, nesta época

denominado unicamente Projeto Navegar e que possibilita o acesso democrático e

gratuito a prática esportiva das modalidades náuticas de Vela, Remo e Canoagem a

todos os cidadãos caxienses que tenham idade entre 10 e 18 anos.

O Programa Segundo Tempo Navegar, é uma excelente possibilidade de

acesso ao esporte de alto rendimento as quais constitui uma das alterações que

podem ser geradas na vida destas pessoas. Desta forma foram escolhidas 5 jovens

(02 meninas e 03 meninos) que iniciaram suas atividades desportivas no Programa

Segundo Tempo Navegar de Caxias do Sul e paulatinamente evoluíram e hoje

integram a elite da Canoagem Brasileira.

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Com o Programa Segundo Tempo Navegar os jovens iniciaram nas

modalidades náuticas e se identificaram com a modalidade de Canoagem

mostrando interesse em realizar atividades extras. Desta forma estes jovens foram

encaminhados e ingressaram na Escola de Canoagem da Associação Caxiense de

Esportes Náuticos e tiveram a oportunidade de aprimorar suas capacidades com a

realização de atividades diárias no contra-turno escolar; realizando assim

treinamentos em escala moderada de esforço físico, dentro de um controle de carga

específico determinado segundo suas capacidades e limites fisiológicos e respeitado

os sete princípios básicos do treinamento esportivo (DANTAS, 1991 p. 142)

Principio da Individualidade Biológica

Principio da Adaptação

Principio da Sobrecarga

Principio da Continuidade

Principio da Interdependência Volume-Intensidade

Principio Especificidade

O processo descrito acima culminou com a ampliação e aprimoramento dos

treinamentos e assim a participação dos atletas nas Seletivas Nacionais das

Equipes Permanentes Femininas e Masculinas. Assim, os seguintes atletas

passaram a integrar a Equipe Permanente Nacional Feminina: Mayara Cardoso

Alves Pereira (em novembro de 2005), Luana de Santi Rech (em novembro de

2006). Já Na Equipe Permanente Nacional Masculina os convocados foram: Michel

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Ferreira De Carli, Johnatan Willian de Souza e Jeison Costa (todos em novembro de

2006).

Todos os jovens descritos acima, residem nos bairros arredores da Represa

São Miguel, pertencente ao Complexo Dal Bó, em Caxias do Sul - RS, a qual serve

de palco às aulas do Programa Segundo Tempo Navegar desde sua fundação na

serra gaúcha. Este cenário é sem dúvida nenhuma, a proposta de uma prática

esportiva jamais vista na cidade, foi um convite irrecusável, mas mais do que isso

esta possibilidade configurou-se como um diferencial nas possibilidades destes

jovens, que a abraçaram e se identificaram com a proposta. Neste sentido entendo

que não podemos segmentar o esporte em iniciação e alto rendimento, construindo

uma muralha intransponível entre estas fases, tão pouco dizer que o alto rendimento

é mais importante que a iniciação ou vice-versa. O esporte é um só fenômeno e em

cada fase deve ser desenvolvido de acordo com a necessidade da criança ou do

atleta e não da vontade mercadológica da família, do clube ou da sociedade.

Quando oferecemos as crianças e adolescentes à oportunidade de praticar uma

determinada modalidade esportiva, devemos prever a possibilidade de que estas

não o queira realizar simplesmente pelo lazer ou pela diversão, mas talvez queiram

ir além, buscando a superação de seus limites e lutando assim pela excelência do

rendimento esportivo e a construção de uma identidade motora muito mais ampla e

abrangente que possa constar em livros e palavras.

Cabe a iniciação esportiva ampliar ao máximo as experiências motoras de

crianças e adolescentes, no sentido de que estes amadureçam biologicamente, mas

principalmente que o esporte proporcione que sejam estabelecidas as devidas

relações em prol da formação completa deste ser. Porém, se ao promovermos a

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iniciação esportiva ou o alto rendimento com o uso de processos e métodos

equivocados, corremos o risco de legar seqüelas permanentes nas vidas de

crianças, jovens e adultos. Assim os métodos pedagógicos, as técnicas, as formas

que podemos usar para desenvolver o gosto e o aprimoramento esportivo serão

determinantes na continuidade e no futuro das atividades físicas e da vida destas

pessoas.

A inserção da modalidade de Canoagem nas atividades do Programa

Segundo Tempo Navegar, teve por objetivo possibilitar a crianças e adolescentes a

prática de uma modalidade esportiva pouco conhecida no Brasil. Neste sentido,

passamos a fazer um pequeno levantamento sócio-histórico desta modalidade no

sentido de localizá-la e entendê-la.

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4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Buscando verificar como a Canoagem promovida pelo Programa Segundo

Tempo Navegar – Núcleo Caxias do Sul, interferiu no processo de formação

sócio/esportiva de alunas e alunos do esporte de iniciação até o alto rendimento,

passamos a observar alguns indicativos qualitativos específicos de possíveis

transformações dos seguintes aspectos:

- Pessoais

- Materiais

- Sociais

- Comportamentais

Desta forma realizamos uma pesquisa de corte qualitativo, no sentido de

verificar os aspectos acima mencionados junto aos alunos, pais e professores, com

o intuito de identificar como ocorrem as intervenções causadas na trajetória

esportiva destes indivíduos.

Portanto, nos deparamos com o seguinte problema de investigação:

“Como a canoagem promovida pelo Projeto Segundo Tempo Navegar –

Núcleo de Caxias do Sul interferiu no processo de formação sócio/esportiva de

alunos e alunas do esporte de iniciação que chegaram ao alto rendimento?”

Para isto, inicialmente verifiquei junto a Coordenação do Programa Segundo

Tempo Navegar de Caxias do Sul, quais os alunos que realmente haviam

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participado do Programa e que dali teriam efetivamente ascendido para as Equipes

Nacionais Permanentes Masculinas e Femininas (de acordo com critérios de seleção

da Confederação Brasileira de Canoagem – CBCa explícita em seu site.

(www.cbca.org.br).

A partir daí entrei em contato com atletas, pais/responsáveis e professores

que se enquadraram nos critérios de seleção.

Na Equipe Permanente Nacional Feminina, foram entrevistadas as seguintes

alunas: Mayara Pereira e Luana Rech, ambas residentes no Bairro Nossa Senhora

de Fátima, (situado nos arredores da Represa São Miguel do Complexo Dal Bó,

local de funcionamento do referido Programa) as quais freqüentavam a Escola

Municipal de Ensino Fundamental Mal. Castelo Branco, local no qual tomaram

conhecimento do funcionamento do Programa e assim foram convidadas a

participar. Mayara, hoje com 15 anos, ingressou no Programa Segundo Tempo

Navegar – Caxias do Sul em novembro de 2003. Já Luana ingressou no mesmo

Núcleo em fevereiro de 2004 e hoje tem 16 anos de idade.

Na Equipe Nacional Permanente Masculina os atletas entrevistados foram:

Michel De Carli (18 anos), Jonatan Souza (18 anos) e Jeison Costa (18 anos),

também residentes no Bairro Nossa Senhora de Fátima e que da mesma forma que

as meninas tiveram conhecimento do Programa em uma visita dos Professores a

Escola Municipal de Ensino Fundamental Mal. Castelo Branco. Os atletas acima

mencionados ingressaram no Programa em março de 2002. Tanto os atletas, quanto

os pais e ex-professores concordaram e contribuíram sobremaneira para o referido

trabalho, fato que a torna ainda mais relevante a qualidade de informações.

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As entrevistas foram semi-estruturadas, através da metodologia qualitativa, a

qual permitiu uma análise mais profunda, precisa e individualizada de cada um dos

entrevistados.

4.1 Pauta das entrevistas 4.1.1 Para os alunos/atletas:

Quando você iniciou suas atividades no Programa Segundo Tempo Navegar?

O que o motivou a iniciar suas atividades no Programa Segundo Tempo

Navegar?

Como foi seu início nas aulas (dificuldades e motivações)?

Como você foi informado da existência do Programa Segundo Tempo

Navegar?

Quais os aspectos positivos em ter participado do Programa Segundo Tempo

Navegar?

Aspectos negativos em ter participado do Programa Segundo Tempo

Navegar?

Houve alguma modificação na sua vida nos seguintes pontos de vista?

• Pessoais

• Materiais

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• Sociais

• Comportamentais

4.1.2 Para os professores:

Como a Escola ficou sabendo das atividades no Programa Segundo Tempo

Navegar?

Houve melhorias no rendimento escolar dos alunos? Quais as disciplinas?

O que o motivou a indicar as atividades no Programa Segundo Tempo

Navegar para os alunos?

Quais os aspectos positivos em ter indicado o Programa Segundo Tempo

Navegar para os alunos no contra-turno Escolar?

Aspectos negativos em ter indicado o Programa Segundo Tempo Navegar

para os alunos no contra-turno Escolar?

Houve alguma modificação na vida dos alunos nos seguintes pontos de vista?

• Pessoais

• Materiais

• Sociais

• Comportamentais

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4.1.3 Para os pais:

Quando você avaliou o ingresso de seu filho no Programa Segundo Tempo

Navegar?

O que o motivou a permitir que seu filho iniciasse suas atividades no

Programa Segundo Tempo Navegar?

Como foi o início de seus filhos nas aulas (dificuldades e motivações)?

Como você foi informado da existência do Programa Segundo Tempo

Navegar?

Quais os aspectos positivos de seu filho ter participado do Programa Segundo

Tempo Navegar?

Aspectos negativos de seu filho ter participado do Programa Segundo Tempo

Navegar?.

Houve alguma modificação na vida do seu filho nos seguintes pontos de

vista?

• pessoais

• materiais

• sociais

• comportamentais

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5. ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES

Com o intuito de responder a principal questão exposta neste trabalho e após

realizar entrevistas com cinco ex-integrantes do Programa Segundo Tempo Navegar

– Núcleo Caxias do Sul, que hoje freqüentam as Equipes Nacionais Permanentes da

modalidade de Canoagem Velocidade, seus familiares e professores e com o

objetivo de verificar transformações ocorridas no comportamento, aspectos materiais

e rendimento escolar, fica evidente o reconhecimento dos entrevistados sobre a

importância do acesso inicial através do Programa Segundo Tempo. Inclusive, todos

mantiveram a continuidade no relacionamento com os ex-professores e ex-colegas

do Programa fator que legou mais informações as entrevistas.

Ao questionar sobre os aspectos negativos de ter participado do Programa

Segundo Tempo Navegar, houve unanimidade em dizer que não existiram e que

mesmo ocorrendo dificuldades estas contribuíram para o aprendizado e hoje eles se

consideram felizes em os ter superado (um deles era o receio da água). Questionei

se houve algum tipo de problema de saúde que talvez pudesse se configurar como

um aspecto negativo, mas todos formam taxativos em dizer que sobre este aspecto

talvez tenha sido o mais positivo, pois depois de iniciar as práticas esportivas no

Programa foram feitas as seguintes citações: “...há três anos não fico mais gripada e

inclusive falto muito menos as aulas...”.

Em se tratando aos aspectos positivos quanto à participação do Programa

Segundo Tempo Navegar, a unanimidade foi quanto a melhora nas relações. Todos

os entrevistados citaram passagens específicas que ilustraram este contentamento e

satisfação: “Eu era muito tímido e tinha dificuldade de dizer o que eu pensava e até

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o que eu queria; posso dizer que o esporte, a canoagem e meus colegas de aula e

treinamento me ajudaram muito neste sentido.” Ainda se tratando das relações são

citadas as amizades que são feitas no Programa e a atenção com a Natureza que

passou a ocorrer a partir das palestras de cuidados com o meio ambiente. Também

como aspecto positivo o auxílio financeiro que recebem da Confederação Brasileira

de Canoagem é citado: “... hoje pago meus estudos e ainda sobra algum dinheiro

para o meu lazer.”, comentam. “Depois que iniciei no Programa Segundo Tempo,

tive que assumir algumas responsabilidades e que me ajudaram a melhorar meus

relacionamentos e ter mais responsabilidade”.

Outra atleta comenta: “No Programa Segundo Tempo Navegar as aulas eram

tranqüilas e aprendíamos a trabalhar os fundamentos de Canoagem, Vela e Remo,

mas como eu gostei mais da Canoagem, pedi ao Professores que me dessem uma

oportunidade de fazer parte da Equipe de Competição da Associação Caxiense de

Esportes Náuticos – ACEN, e aí comecei a fazer meus primeiros treinamentos

utilizando o que eu tinha aprendido no Programa Segundo Tempo Navegar e me

especializei na Canoagem” comenta. “Eu e as minha colega (referindo-se a outra

atleta que teve trajetória semelhante a ela) iniciamos no Programa Segundo Tempo

Navegar, competimos pela ACEN e na Seletiva Nacional conquistamos a vaga para

fazer parte da Equipe Nacional Permanente de Canoagem Feminina, isso foi uma

das coisas mais legais que aconteceu na minha vida”, finaliza.

Fazendo referência aos comentários dos professores, também não houve

pontos negativos, pois em todas as entrevistas os alunos em questão sempre foram

exemplos de organização e disciplina. Os principais aspectos positivos citados pelos

professores foram:

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- Melhora do rendimento escolar;

- Assiduidade;

- Eles se tornaram mais responsáveis;

- Participação;

- Relação com seus colegas;

- Participação nas aulas.

Os professores entrevistados fizeram questão em frisar o interesse destacado

dos atletas em questão. “... eles não eram os melhores da turma, mas os mais

interessados e preocupados em melhorar e estavam sempre buscando e se fazendo

presentes”, comenta.

Os Professores citam o entusiasmo dos alunos: “... os cinco adolescentes aos

quais estamos falando sempre estiveram presentes e entusiasmados em participar,

podemos dizer que eles eram muito voluntariosos”, também relatam o

acompanhamento do rendimento escolar que o Programa Segundo Tempo

realizava: “alguns alunos não demonstraram melhora no rendimento escolar, mas

também não houve piora; a maioria obteve uma relativa melhora no desempenho

escolar, inclusive em disciplinas que vinham apresentando dificuldades”, relata.

Os pais/responsáveis dos alunos ao responder suas perguntas citaram

aspectos negativos: “o meu neto depois que iniciou na Canoagem (referindo-se ao

Programa Segundo Tempo Navegar, a Equipe da Associação Caxiense de Esportes

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Náuticos e atualmente a Equipe Nacional Permanente de Canoagem Masculina em

São Bernardo) fica pouco em casa e está sempre com bastantes coisas para fazer

entre os estudos e as coisas da Canoagem, mas ele está mais responsável e

também conversa mais em casa”, conclui.

“Meu filho era bem magro comia pouco e não gostava muito de praticar

esportes; a Canoagem foi uma possibilidade diferente, ele gostou e nós procuramos

incentivá-lo, mas sempre cobrando responsabilidades. Talvez ele não seja um

campeão, mas incentivamos nas empreitadas da Canoagem, mas em hipótese

alguma ele pode deixar de estudar; isso não tem negociação” relata outro pai.

“Minha filha, era muito tímida e hoje ela é mais comunicativa e alegre. Ela cresceu

em tamanho e como pessoa, mas na escola o interesse aumentou, já que além de

nós o treinador também cobra o rendimento escolar” relata uma das mães.

Enfim, em todos os relatos colhidos com os alunos/atletas, pais e professores,

percebesse uma melhora nítida em todos os aspectos foco das entrevistas inclusive

se refletindo na família e na sociedade, pois estes adolescentes passaram a ser um

exemplo para os jovens caxienses e que consolidam o pensamento que esporte

pode ser uma forma eficaz de estimular o educar, e que este fenômeno-

possibilidade vai desde a iniciação esportiva até a conquista de uma medalha

olímpica, sendo que o fator crucial em todas as etapas serão a satisfação e

voluntariedade na realização das atividades. O Programa Segundo Tempo Navegar,

de forma isolada não resolve as dificuldades do esporte e muito menos da

Educação, mas se a sociedade se organizar e participar ativamente de todas as

manifestações sociais, poderá ter no futuro menos desigualdade, menos violência e

mais entendimento social.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A contextualização das atividades esportivas requer competência motora,

capacidade de decisão tática, competência moral e social de relacionamento com os

outros e com os acontecimentos, competência de organização e regulação das

atividades práticas, capacidade de se envolver, de entender e de participar na

cultura do movimento e suas relações sociais. Ajudar os alunos a construir estas

aprendizagens requer competências culturais, conhecimento substantivo, técnico e

pedagógico dos conteúdos das práticas, das formas mais adequadas de apresentar

aos alunos, sem adulterar o seu sentido; das formas mais produtivas de envolvê-los

ativamente e os apoiar no planejamento, na ação, na decisão e na avaliação das

tarefas de aprendizagem; das formas mais sugestivas de configurar a idéia dos

propósitos da prática que liga e dá coerência ao que se faz nas aulas de educação

física.

Adquirir e desenvolver estes conhecimentos, competências e

capacidades é um grande desafio aos professores, às instituições de formação, aos

governos e para toda a sociedade em geral. Esta transformação pedagógica e

didática e à produção de uma nova proposta de educação requer novas

possibilidades de como educar e para que fins.

Assim relato o breve acompanhamento que realizei junto aos jovens que

iniciaram suas atividades esportivas junto ao Programa Segundo Tempo Navegar

Núcleo de Caxias do Sul – RS e através deste construíram uma nova perspectiva de

vida, não de serem maiores e superiores do que os outros, mas sim buscam

incessantemente o melhor contribuindo e interagindo ativamente na sociedade. Nos

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relatos colhidos percebesse evidências que destacam inúmeras contribuições

qualitativas:

- Melhora do nível de relacionamento familiar e social;

- Melhora do rendimento escolar;

- Melhora da participação nas aulas e sua efetividade;

- Aumento das perspectivas de desenvolvimento social;

- Melhor funcionamento biológico do organismo (sono, alimentação e

hábitos de higiene).

Finalizo dizendo que o Programa Segundo Tempo Navegar é sem dúvida

nenhuma uma estratégia pedagógica vitoriosa, pois conseguiu possibilitar inúmeras

melhoras no âmbito humano, ambiental e material do seu universo, ampliando

perspectivas, criando oportunidades e legando ao esporte outras possibilidades

além do vencer, perder, do lazer ou da simples ocupação do tempo ocioso através

do esporte.

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7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DANTAS, Estélio. A prática da preparação física. Rio de Janeiro - RJ: Shape, 1998.

GAYA, Adroaldo, Desporto para crianças e jovens: razões e finalidades. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004.

GONÇALVES, C. O espírito desportivo na formação dos jovens praticantes. In: Seminário Internacional Treino de Jovens: comunicações apresentadas.Lisboa: Centro de Estudos e Formação Desportiva, Secretaria de Estado do desporto, 1999.

MARQUES, A. T.; OLIVEIRA, J. O treino e a competição dos mais jovens: rendimento versus saúde. In: ESPORTE e atividade física: interação entre rendimento e qualidade de vida. São Paulo: Manole, 2002.

MOLINA, Neto, Vicente. A prática do esporte nas escolas de 1º e 2º graus. Porto Alegre: Ed Universidade /UFRGS,1993.

MOREIRA, Wagner Wey (org.) Educação Física: intervenção e conhecimento científico: Editora UNIMEP, 2004.

SANTOS, dos Santos Edmilsom (org). Educação física escolar por uma cultura desportiva. Porto Alegre: Sulina: Novo Hamburgo : FEEVALE.1998. WEINECK, Jougle. Biologia do Esporte. São Paulo - SP: Manole, 2000.