processos urgentes

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Diário da República, 1ª série – N.º193 – 2 de outubro de 2015 8588-(59) TÍTULO II Pretensões dedutíveis segundo formas de processo urgentes Artigo 40.º Âmbito e noção 1-A tutela judicial efectiva exige não uma tutela cautelar suficientemente abrangente, como também providências urgentes que daquela se distinguem na medida em que só podem ser proferidas num processo de fundo, claramente dirigido a proporcionar uma tutela final, que se debruce sobre a relação jurídico-administrativa, e com carácter de urgência, dada a celeridade com que, no caso, se impõe alcançar a justa composição dos interesses, públicos e privados, envolvidos (Mário Aroso de Almeida). 2-A ideia de processos principais urgentes, caracterizados pela sua celeridade ou prioridade, radica na convicção de que determinadas questões ou tipos de questões, em função de determinadas circunstâncias próprias devem ou têm de obter, quanto ao respectivo mérito, uma solução definitiva pela via judicial num tempo curto. Em suma, são processos que visam a pronúncia de mérito, onde a cognição seja tendencialmente plena, mas com uma tramitação acelerada ou simplificada, tendo em consideração a natureza dos direitos ou dos bens jurídicos protegidos. Nessa linha, o CPTA autonomizou como processos principais urentes as acções relativas a eleições administrativas, a procedimentos massivos e à formação de contratos, bem como as intimações para prestação de informações e, em determinadas condições, as intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias. 3-Nesta medida, o Título IV do CPTA (Arts. 97º e ss. – cfr. também, o Art. 36º) estabelece o regime dos principais processos (principais) urgentes do contencioso administrativo, de entre os quais merece destaque, pelo seu carácter inovador, o novo processo de intimação para protecção de Direitos, Liberdades e Garantias, que vem precisamente concretizar a imposição constitucional do Art. 20º n.º5 CRP. 4-Deve salientar-se que a possibilidade de “antecipação” da decisão de fundo através da convolação do processo cautelar em processo principal (art.121 e 132/5 CPTA) constitui uma abertura do sistema à criação had oc de novos processos urgentes, sempre que tal seja necessário e possível – afasta o estabelecimento de um numerus clausus pelo art.36. SUBSECÇÃO I Acção Administrativa Urgente Artigo 41.º Contencioso pré-contratual Arts. 100º-103º CPTA 1-Este processo urgente destina-se à impugnação contenciosa de AA praticados no âmbito do procedimento de formação de certos e determinados tipos de contratos (abrangidos por duas directivas comunitárias que apontam neste sentido), e apenas desses, como se depreende dos Arts. 46º n.º3 e 100º n.º1 CPTA: de empreitada de obras públicas, de concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens. Os AA praticados no âmbito do procedimento de formação destes específicos contratos, portanto, estão submetidos a um processo de impugnação urgente distinto do normal modelo de tramitação dos processos impugnatórios, em ordem a serem submetidos a um modelo de tramitação especial que se pretende mais célere, e à aplicação do regime dos processos urgentes. 2-Ratio da criação da figura: surge da necessidade de assegurar

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Contencioso Administrativo e tributário

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Diário da República, 1ª série – N.º193 – 2 de outubro de 2015 8588-(59)

TÍTULO II Pretensões dedutíveis segundo formas de processo

urgentes

Artigo 40.ºÂmbito e noção

1-A tutela judicial efectiva exige não só uma tutela cautelar suficientemente abrangente, como também providências urgentes que daquela se distinguem na medida em que só podem ser proferidas num processo de fundo, claramente dirigido a proporcionar uma tutela final, que se debruce sobre a relação jurídico-administrativa, e com carácter de urgência, dada a celeridade com que, no caso, se impõe alcançar a justa composição dos interesses, públicos e privados, envolvidos (Mário Aroso de Almeida).2-A ideia de processos principais urgentes, caracterizados pela sua celeridade ou prioridade, radica na convicção de que determinadas questões ou tipos de questões, em função de determinadas circunstâncias próprias devem ou têm de obter, quanto ao respectivo mérito, uma solução definitiva pela via judicial num tempo curto. Em suma, são processos que visam a pronúncia de mérito, onde a cognição seja tendencialmente plena, mas com uma tramitação acelerada ou simplificada, tendo em consideração a natureza dos direitos ou dos bens jurídicos protegidos. Nessa linha, o CPTA autonomizou como processos principais urentes as acções relativas a eleições administrativas, a procedimentos massivos e à formação de contratos, bem como as intimações para prestação de informações e, em determinadas condições, as intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias.3-Nesta medida, o Título IV do CPTA (Arts. 97º e ss. – cfr. também, o Art. 36º) estabelece o regime dos principais processos (principais) urgentes do contencioso administrativo, de entre os quais merece destaque, pelo seu carácter inovador, o novo processo de intimação para protecção de Direitos, Liberdades e Garantias, que vem precisamente concretizar a imposição constitucional do Art. 20º n.º5 CRP.4-Deve salientar-se que a possibilidade de “antecipação” da decisão de fundo através da convolação do processo cautelar em processo principal (art.121 e 132/5 CPTA) constitui uma abertura do sistema à criação had oc de novos processos urgentes, sempre que tal seja necessário e possível – afasta o estabelecimento de um numerus clausus pelo art.36.

SUBSECÇÃO IAcção Administrativa Urgente

Artigo 41.ºContencioso pré-contratual

Arts. 100º-103º CPTA

1-Este processo urgente destina-se à impugnação contenciosa de AA praticados no âmbito do procedimento de formação de certos e determinados tipos de contratos (abrangidos por duas directivas comunitárias que apontam neste sentido), e apenas

desses, como se depreende dos Arts. 46º n.º3 e 100º n.º1 CPTA: de empreitada de obras públicas, de concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens. Os AA praticados no âmbito do procedimento de formação destes específicos contratos, portanto, estão submetidos a um processo de impugnação urgente distinto do normal modelo de tramitação dos processos impugnatórios, em ordem a serem submetidos a um modelo de tramitação especial que se pretende mais célere, e à aplicação do regime dos processos urgentes.2-Ratio da criação da figura: surge da necessidade de assegurar simultaneamente duas ordens de interesses, públicos e privados. Por um lado, promover neste domínio a transparência e a concorrência através de uma adequada protecção e em tempo útil aos interesses dos candidatos à celebração dos contratos com entidades públicas; por outro lado, garantir o início rápido da execução dos contratos administrativos e a respectiva estabilidade depois de celebrados, dando protecção adequada aos interesses públicos substanciais em causa e aos interesses dos contratantes.3-Por outro lado, o Art. 100º CPTA estende o âmbito de aplicação deste regime a actos jurídicos que não são AA pré-contratuais, mas que o CPTA equipara, para estes efeitos, a esses actos – cfr. os n.ºs 2 e 3. Quanto ao n.º3, está-se a pensar primacialmente nos casos das pessoas colectivas de direito privado obrigadas por lei a adoptar, ou que optem por o fazer, procedimentos pré-contratuais previstos e regulados por normas de direito público – caso do DL n.º197/99

Artigo 42.ºPrazos

É de 1 mês o prazo de impugnação do contencioso pré-contratual, nos termos do Art. 101º CPTA. Note-se, porém, que por remissão expressa do n.º1 do Art. 100º, pode ser aplicado neste domínio o Art. 58º n.º4, quando a situação concreta o justifique.

Artigo 43.ºTramitação

Especialidades do Art. 102º, que limita a possibilidade da apresentação de alegações (n.º2) e reduz os prazos a observar ao longo do processo (n.º3). Por outro lado, o autor pode proceder ao alargamento do respectivo objecto do processo à impugnação do próprio contrato, na hipótese de este vir a ser celebrado na pendência do processo de impugnação (Arts. 102º n.º4 e 63º CPTA).

Artigo 44.ºObjecto

1-A acção deve ser utilizada quando esteja em causa a ilegalidade quaisquer decisões administrativas relativas à formação de contratos comunitários (Directiva Recursos), desde que se trate da violação de normas que possam pôr em causa a validade do acto de adjudicação. Assim, através deste meio pode ser realizada a impugnação de quaisquer aa relativos à formação dos referidos contratos, sendo certo que são considerados actos administrativos, para este efeito, todos os actos praticados por quaisquer entidades

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adjudicantes (ainda que privadas) ao abrigo de regras de contratação pública, art.100/2.2-É o meio adequado, também, para a impugnação directa de docs conformadores do procedimento, que incluem programas do concurso, cadernos de encargos ou qualquer outro doc conformador do procedimento pré-contratual. Artigo 103/1.3-Caso tenha sido celebrado o contrato, o objecto do processo pode ser ampliado à impugnação do próprio contrato, embora apenas quanto às invalidades deste que derivem de invalidades do procedimento pré-contratual.4-Neste processo urgente, também pode ser pedida a condenação à prática de actos pré-contratuais devidos, art.100/1. A condenação pode ser pedida isoladamente ou em cumulação com pedidos de impugnação.

Artigo 45.ºEfeito suspensivo automático e medidas provisóriasA propositura da acção tem efeito suspensivo: a impugnação do acto adjudicado (só deste) faz suspender automaticamente os efeitos do acto impugnado (proibindo, designadamente, a celebração de contratos) ou a própria execução do contrato, se este já tiver sido celebrado (art.103-A/1)

Artigo 46.ºContencioso pré-eleitoral

1-O CPTA autonomizou esta acção administrativa urgente nos arts.97º/1 a) e 98º. Entende-se que a resolução de questões eleitorais não poderá ter a demora normal dos restantes processos. Como refere o professor VIEIRA DE ANDRADE: “as sentenças de provimento não teriam a sua utilidade normal, pois que, em virtude da impossibilidade prática de reconstituição da situação hipotética, raramente seriam susceptíveis de execução específica”. Isto quer “pela brevidade e urgência do processo eleitoral, quer ainda pela duração limitada dos mandatos”. “A autonomização desta acção sempre se impôs para assegurar a utilidade das sentenças e a protecção eficaz dos interessados”. Os problemas suscitados por actos eleitorais carecem de resolução acelerada, pelo que devem ser proferidas sentenças em tempo útil para a protecção eficaz dos interessados, podendo assim garantir-se o respeito pela tutela jurisdicional efectiva dos administrados, nos termos do art.2.º/1 CPTA e arts. 20.º e 268.º/4 CRP.2-Para que haja uma protecção dos direitos de eleger e de ser eleito deve haver uma jurisdição plena. É este o sentido do art.98º/1 CPTA. Ou seja, o contencioso eleitoral visa pronúncias definitivas do mérito da causa, não ficando apenas pela anulação ou declaração de nulidade de actos, mas englobando, ainda, a possibilidade de condenar as autoridades administrativas.3-As eleições a que se referem são as que respeitam organizações administrativas, aquelas através das quais se designam os titulares de órgãos administrativos electivos de pessoas colectivas públicas.

Artigo 47.ºCompetência no contencioso pré-eleitoral

1-Como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha “A alínea m) do artigo 4º do ETAF efectua uma delimitação por via positiva e por via negativa.” Nos termos do art.4º/1 m) ETAF, compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto questões relativas “a contencioso eleitoral relativo a órgãos de pessoas colectivas de direito público para que não seja competente outro tribunal”. Ficam assim excluídas, do âmbito de jurisdição, quaisquer pessoas colectivas privadas. Assim, VIEIRA DE ANDRADE parece defender que os actos eleitorais de pessoas colectivas privadas mas de interesse público não se encontram abrangidos pelo âmbito da jurisdição administrativa. PEDRO GONÇALVES, pelo contrário, sustenta que integram a jurisdição administrativa, os actos eleitorais das pessoas colectivas privadas que vejam o seu processo eleitoral ser alvo de regulação especial de direito administrativo . Para justificar o seu entendimento dá o exemplo das federações desportivas.2-Faz parte da competência dos tribunais administrativos, por exemplo, a impugnação da eleição para vogais da junta de freguesia e para presidente e secretários da mesa da assembleia de freguesia, assim como a eleição para presidente e secretários da mesa da assembleia municipal. Seguem ainda o regime estabelecido no CPTA, relativamente ao contencioso eleitoral, as eleições para órgãos de universidades, escolas, hospitais.3-Fora desta jurisdição ficam por exemplo, as eleições para a Assembleia da República e para as Assembleias Legislativas Regionais cuja competência está atribuída à jurisdição constitucional dado o artigo 8º da Lei do Tribunal Constitucional; ou mesmo eleições como a do Conselho Superior de Magistratura cuja competência está atribuída ao Supremo Tribunal de Justiça segundo o art. 145º da Lei 21/85.4-A delimitação do conceito de “actos de administração eleitoral” tem que ter em atenção as razões subjacentes à atribuição desta competência ao Tribunal e o regime processual previsto para a assegurar. Por esta razão ficam excluídos do contencioso eleitoral as eleições para os órgãos das autarquias locais. 

Artigo 48.ºAplicação

1-A revisão de 2015 estabeleceu que a ausência de reacção contra a exclusão, inclusão ou omissão de eleitores ou elegíveis nos cadernos eleitorais impede o interessado de reagir contra as decisões subsequentes com fundamento nas ilegalidades de que padeçam os actos. Se assim não fosse, não se conseguiria proceder à realização, de forma tempestiva, dos actos eleitorais, tornando-se difícil prevenir o resultado perverso de repetições sistemáticas de actos eleitorais.2-Os litígios que este processo urgente tenta resolver abrangem tanto os relativos ao acto eleitoral como as questões do seu procedimento. A justificação para esta opção de se englobar tanto o acto como o

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procedimento é dada pela natureza urgente do processo.3-O Acórdão do Tribunal Constitucional n°09/86, de 18 de Janeiro esclarece a noção de contencioso eleitoral, na medida em que determina que este constitui uma possibilidade de controlo tanto do acto eleitoral como de todos os procedimentos que ocorrem ao longo do processo eleitoral. Parece que o juiz não se limita a anular ou declarar nulo o acto em questão. Pode também condenar a Administração ao cumprimento de prestação em falta.4- Verifica-se um desvio ao regime geral do art.55º CPTA, na medida em que circunscreve a legitimidade aos eleitores e elegíveis, incluindo, nos casos de omissão nos cadernos ou nas listas, as pessoas cuja inscrição foi omitida. A este respeito tem especialmente relevância o facto de não se prever a possibilidade de acção pública, de acção popular ou de acção colectiva, o que nas palavra de VIEIRA DE ANDRADE “continua a não se prever, parece que intencionalmente .5-Parece aceitável que, quando uma pessoa colectiva ou órgão administrativo puderem estar representados no órgão electivo, nos termos do regulamento eleitoral, possam invocar a sua legitimidade para a impugnação dos actos relativos ao processo eleitoral. Também ao Ministério Público deve ser reconhecida a titularidade do direito processual de impugnação em defesa da legalidade, apesar de não ser expressamente reconhecido.  Não estando estabelecida nenhuma regra de legitimidade passiva relativamente a este processo é de aplicar a regra do art.10º/2 CPTA. 

Artigo 48.ºPrazos

1-Perante um processo urgente compreende-se que os prazos sejam mais curtos (sete dias a contar do conhecimento do acto ou da omissão, nos termos do art.98º/2 CPTA e na falta de disposição especial) e que até corram em férias (conforme o disposto no art.36º/2 CPTA).    2-O tribunal pode intimar a entidade competente para proceder à reformulação do processo eleitoral, repetir as eleições e pode até fixar o próprio resultado eleitoral. Assim, o juiz resolve a questão em termos plenos.Parece que pode aqui ser invocado o que VASCO PEREIRA DA SILVA vem reforçando várias vezes: só com esta consagração os tribunais ultrapassam os “velhos traumas” da “infância difícil” e passam a ser verdadeiros e próprios tribunais. Encontramos uma grande diferença de regimes no art.98º/3 CPTA.Anteriormente previa-se que só podiam ser objecto de impugnação os actos anteriores ao acto eleitoral que digam respeito à omissão nos cadernos eleitorais ou das pessoas elegíveis.Relativamente ao anterior 98º/3, o Acórdão de 08-02-2007, processo n.º 00834/06.2BEBRG dispõe que “O artigo 98º nº 3 do CPTA consagra o princípio da impugnação unitária do acto eleitoral, de que resulta não ser permitida a impugnação dos actos anteriores à

eleição, a não ser os relativos à exclusão ou omissão de eleitores ou elegíveis nos cadernos ou listas eleitorais”.Já o Acórdão de 14-12-2006, processo n.º 00142/06.9BECBR estabelece que:“I - os procedimentos eleitorais plurais e sucessivos caracterizam-se pela existência de uma multiplicidade de actos eleitorais e pelo princípio da aquisição progressiva dos actos, segundo o qual o acto eleitoral posterior só pode ter lugar depois de completado o anterior, funcionando o primeiro acto eleitoral como uma pré-decisão, que encerra uma fase do processo eleitoral global.II- O princípio da aquisição progressiva dos actos visa assegurar a estabilidade dos actos eleitorais, evitando a sua repetição, ao exigir que só se passe à fase seguinte do procedimento depois de consolidada a fase anterior.III- O princípio da impugnação unitária do acto eleitoral não permite a impugnação autónoma de actos anteriores à eleição, salvo os relativos à exclusão ou omissão de eleitores ou elegíveis nos cadernos ou listas eleitorais.”VIEIRA DE ANDRADE refere, a este propósito, boas razões a favor do princípio da aquisição progressiva, como evitar a realização de actos eleitorais que sejam à partida anuláveis por vícios de procedimento já verificados. Actualmente, encontra-se previsto que “a ausência de reacção contra os actos relativos à exclusão, inclusão ou omissão de eleitores ou elegíveis nos cadernos eleitorais, e demais actos com eficácia externa anteriores ao acto eleitoral, assim como cada acto eleitoral adoptado no âmbito de procedimento encadeados impedem o interessado de reagir contra as decisões subsequentes com fundamento em ilegalidades de que enfermem os actos anteriormente praticados”. É possível, deste modo, uma estabilização eleitoral.Durante a tramitação, são igualmente curtos os prazos. Será de cinco dias para a contestação (art.98º/4 a) CPTA), cinco dias para a decisão ou para a submissão do processo a julgamento (art.98º/4 b) CPTA) e de três dias para outros actos (art.98º/4 c) CPTA).O contencioso eleitoral segue a tramitação da acção administrativa, como refere o art.97º/1, assim remetendo para os arts. 50º a 96º CPTA. Contudo, revela algumas especificidades, tais como os prazos, como já foi referido, que serão encurtados.

Artigo 49.ºTramitação

No que toca à tramitação deixamos de ter um artigo (99º), e passa a haver apenas dois números (nº4 e nº5) do artigo 98º. Não houve alterações a nível de prazos do art.98º/4. Importa fazer referência, para efeitos de delimitação, ao “contencioso constitucional com a estrutura de um contencioso administrativo” . A Lei nº85/89, de 7 de Setembro, aditou ao art.8º da LTC (com a epígrafe: “Competência relativa a processos eleitorais”) uma alínea f), competindo assim ao Tribunal Constitucional "julgar os recursos contenciosos interpostos de actos

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administrativos definitivos e executórios praticados pela Comissão Nacional de Eleições ou por outros órgãos da administração eleitoral”.Esta lei passou ainda a estipular um processo específico para a impugnação destes actos, regulado nos termos do art.102º-B da LTC, onde se prevêem recursos de deliberações da Comissão Nacional de Eleições (n.ºs 1 a 6) e recursos de decisões de outros órgãos da administração eleitoral (n.º 7).ESPERANÇA MEALHA refere, a este propósito, que este “recurso contencioso” apresenta particularidades uma vez que o Tribunal Constitucional actua como tribunal administrativo, julgando actos administrativos. O recurso disposto no art.102º-B da LTC “tem por objecto os actos de administração eleitoral da CNE e, residualmente, os actos de outros órgãos de administração eleitoral cuja impugnação judicial não esteja contemplada em recurso especificamente regulado nos diversos regimes eleitorais” . A diferença entre este recurso e os restantes assenta numa base legal distinta.MANUEL FREIRE BARROS defende que o recurso dos “actos de administração eleitoral” corresponde ao contencioso eleitoral atípico, que terá por objecto actos que não integram o núcleo essencial do Direito eleitoral… e que, tendencialmente, se localizam na fase procedimental pré-eleitoral” (MANUEL FREIRE BARROS, Conceito e Natureza Jurídica do Recurso Contencioso Eleitoral, Almedina, 1998, p.64 e 102). Pelo contrário, ESPERANÇA MEALHA considera que, assim sendo, o recurso do art.102º-B da LTC teria uma natureza residual e por isso distante dos litígios decorrentes do procedimento eleitoral (ESPERANÇA MEALHA, ob. cit, p.349). No Acórdão n.º 472/98 é possível ler-se: “(…) a intervenção do Tribunal Constitucional no processo eleitoral visa, fundamentalmente, assegurar a genuinidade da expressão da vontade política dos eleitores no acto eleitoral (…) Obtida essa expressão, ou seja, apurado o resultado final da votação, não subsistem razões para persistir a intervenção do Tribunal Constitucional no processo eleitoral, tudo se reconduzindo aos parâmetros normais do contencioso administrativo.”Parece assim que o que se tem em vista é garantir que o acto eleitoral produza os efeitos que a vontade popular determinou. Assim sendo, fora dos períodos da campanha eleitoral, “a litigiosidade atinente à propaganda política integra o contencioso administrativo e está atribuída à competência dos tribunais dessa ordem de jurisdição “ (Acórdão nº209/2009). O Acórdão nº88/94 tende também a considerar que os actos subsequentes ao apuramento eleitoral são tratados no Contencioso Administrativo: “É para este tipo de eleição que a intervenção do Tribunal Constitucional se justifica, na medida em que se torna necessário assegurar a genuinidade da expressão da vontade política do eleitor. Obtida essa expressão - o mesmo é

dizer apurado o resultado final da votação, eventualmente sindicado pelo Tribunal Constitucional - não subsistem razões de intervenção a este nível, tudo se reconduzindo aos parâmetros normais do contencioso administrativo. “ O art.8º/1 f) da LTC expressa que os actos de administração eleitoral judicialmente impugnáveis são actos “definitivos e executórios”. A LTC parece assim não estar conforme ao disposto no art.51º CPTA, já que para este último não é necessário definitividade horizontal. “De forma simplista pode dizer-se que, no contencioso administrativo, a impugnabilidade dos actos administrativos está ligada à sua “eficácia externa”, de que é mero exemplo o seu carácter lesivo…”; “… perante a evolução registada no contencioso administrativo, não parece haver dúvida quanto à necessidade de uma interpretação actualista da alínea f) do artigo 8º da Lei do Tribunal Constitucional, no sentido de deixar cair o critério do “acto definitivo e executório”. (ESPERANÇA MEALHA, ob. cit p.364 e 365).Verifica-se no Acórdão 208/2009 que o Tribunal Constitucional tem feito uma interpretação correctiva da expressão “definitivo e executório”, no sentido de considerar como “susceptibilidade de causar lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos” [É possível ler-se no referido acórdão: “susceptível de causar lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos (assim deve ser lida hoje em dia a expressão “definitivos e executórios” do artigo 8º, alínea f), da LTC”)]. Ainda assim mostra-se evidente a pouca ou nenhuma adequação do recurso dos actos de administração eleitoral relativamente ao actual processo administrativo. Constitui exemplo disto a questão de, no contencioso administrativo ter-se introduzido o poder de condenar a Administração à prática de actos administrativos, e de no contencioso de natureza constitucional haver uma limitação do objecto do processo. Considero ainda pertinente referir o Acórdão 00784/11.0BECBR do TCA Norte que se refere a um litígio quanto à eleição dos órgãos directivos do Agrupamento de Escolas de Miranda do Corvo. O problema surge por o Autor ter invocado que nem todos os pais e encarregados de educação foram convocados para a eleição, sendo assim o processo de nomeação dos representantes dos pais viciado, por não terem tido a oportunidade de nele participar todos os que tinham esse direito e ter sido concedida a oportunidade de participar a quem não tinha direito. Este vício, da ilegal eleição dos representantes dos Pais para o Conselho Geral Transitório, contaminou a eleição do Director. O recorrente invoca ainda que “o contencioso eleitoral administrativo abrange não só os actos relativos à votação (ou acto eleitoral em sentido estrito), como também todos os actos conexos, nomeadamente os pré-eleitorais.” (MANUEL FREIRE BARROS, Um problema de legitimidade activa no

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contencioso eleitoral administrativo, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 18, p. 22.) Demonstra-se assim a importância destes processos que visam, sobretudo, defender situações que não ficariam acauteladas se seguissem uma tramitação normal.

Artigo 50.ºIntimações

Ao passo que os processos de impugnação urgente são processos especiais de impugnação de AA, os processos de intimação são processos urgentes de imposição, isto é, dirigem-se à emissão de uma imposição, ou seja, à obtenção, com carácter de urgência, e por isso no âmbito de um processo célere, de uma pronúncia de condenação. Ao lado dos processos de intimação previstos no CPTA, outros pode haver que, consagrados em legislação especial, se destinem igualmente a intimar a Administração a um determinado comportamento, como é o exemplo da intimação judicial para a prática de acto legalmente devido (um destes processos existe actualmente em matéria urbanística, consagrado no Art. 112º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação).

Artigo 51.ºProcesso de intimação para a prestação de

informações, consulta de processos ou passagem de certidões

Arts. 104º-108º CPTA

1-Este processo passou de meio processual acessório (pressupondo e destinando-se a permitir o uso de meios administrativos e contenciosos, tal como previa o n.º1 do Art. 82º LPTA) a processo principal de âmbito mais alargado, não só por acção do legislador da Reforma, mas também por influência da jurisprudência do STA. 2-Desta forma se vem dar cumprimento quer à lei substantiva (Arts. 61º e ss. CPA), quer à própria lei constitucional (Art. 268º n.º2 CRP), qualquer deles promotor da transparência dos arquivos e registos administrativos perante os cidadãos em geral.Como meio principal que é, este processo compreende não só a tutela do direito à informação procedimental (Arts. 61º-64º CPA) como também do direito à informação extra-procedimental (Art. 268º, n.º2 CRP e Lei 65/93).3-Actualmente, trata-se desta forma de um processo de âmbito alargado que tanto funcionar como um meio acessório como pode funcionar como um meio autónomo, por meio do qual podem ser exercidos o direito à informação procedimental e o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos:

a) Trata-se de um processo principal urgente e célere, desde logo em virtude da simplicidade do modelo de tramitação adoptado no Art. 107º (cfr. também os Arts. 36º n.º2 e 147º CPTA);b) Pode funcionar como um meio acessório, com vista a obter elementos destinados a instruir pretensões a deduzir pela via administrativa ou pela via contenciosa, suspendendo nesse caso os eventuais prazos de

impugnação que estejam em curso (cfr. Arts.104º n.ºs 1 e 2 e 106º CPTA). Vide também o Art. 108º, cujo prazo é fixado precisamente dada a simplicidade da operação em causa.4-Semelhança entre o Art. 105º e o Art. 67º - são ambos processos dirigidos à imposição de deveres à Administração, quer quando esta tenha permanecido omissa, quer quando ela tenha respondido à pretensão do interessado, mas no primeiro caso pretende-se a obtenção de uma simples prestação (informação, certidão, documento), de um acto interno ou operação material, ao passo que no segundo está em causa a prática de um AA que traduza o exercício de poderes de autoridade da Administração. Daí que este processo urgente seja desde logo tramitado segundo a forma da Acção administrativa comum (está em causa a adopção de simples actuações ou actos reais e não a prática de AA), o que não acontece com a intimação para protecção de D,L,G ou outras que o legislador preveja expressamente.

Artigo 52.ºLegitimidade activa e passiva

1- Legitimidade activa: No que toca ao acesso a informações pessoais, a legitimidade para propor acção de intimação é conferida pela lei substantiva em conformidade com o 9º (quando o autor alega que é parte na relação material controvertida) e 104º CPTA (quando ao interessado lhe foi negado o direito de acesso a arquivos e registos administrativos). Igualmente o Ministério Público (104º nº2), no âmbito da acção pública pode recorrer a este meio processual, tal como poder-se-á recorrer a este meio nos casos do 60º nº2 (notificação ou publicação de acto administrativo deficiente), nos termos do 104º nº2 CPTA.2- Legitimidade passiva: A intimação proposta perante os tribunais administrativos só pode contemplar situações em que a Administração figure como parte ou que esteja em jogo uma operação materialmente administrativa (4º ETAF e 2º nº2 al.a) CPTA), nomeadamente, contra a pessoa colectiva ou o ministério a que pertence o órgão que está em falta para com o particular (10º CPTA, regra geral). Alguma jurisprudência tem entendido que quanto à legitimidade passiva, estamos perante um desvio à regra geral (Ac. do TCA-N de 03/06/2004 e Ac. do TCA-S de 20/01/2005). O entendimento de que se deve atender à regra geral parece ser o mais adequado, apesar da letra do 107º nº1 CPTA poder induzir em sentido contrário, ou seja, de que a legitimidade passiva aqui caberia ao órgão (enquanto “autoridade”), no entanto nada no regime nos leva a abrir aqui uma excepção à regra geral do 10º

Artigo 53.ºPedido prévio e prazo

 O recurso a este meio processual pressupõe o não cumprimento pela entidade administrativa em causa do dever de informar ou de notificar, sendo assim exigido um pedido anterior do particular interessado. Ou seja, terá que haver uma negação por parte da administração

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em prestar as informações requeridas, sendo que “será a negação ou a inércia da Administração que criará o interesse processual (interesse em agir) para a intimação” O prazo para propor a intimação ao tribunal é estabelecido no 105º CPTA: prazo de 20 dias que se inicia com a verificação da não satisfação do pedido, a partir da omissão da Administração, do indeferimento expresso ou do deferimento parcial (als. a), b) e c) do 105º CPTA).           

Artigo 52.ºTramitação e decisão

 A tramitação é simples e célere, sendo que o juiz despachará mandando a autoridade responder em 10 dias ao pedido de informações (107º nº1). Em caso de provimento, a decisão é condenatória, o juiz mandará a que a autoridade cumpra em 10 dias a intimação, sob pena de aplicação de sanções pecuniárias compulsórias (se não houver justificação aceitável), nos termos do 169º, e de apuramento de responsabilidade civil, disciplinar e criminal se for caso disso (108º nº2 CPTA).

Artigo 53.ºProcesso de intimação para protecção de direitos,

liberdades e garantiasArts. 109º-111º CPTA e 20º n.º5 CRP

1-Ex.: obtenção da autorização para a realização de uma manifestação, por ocasião da deslocação a Portugal, em data próxima, de uma personalidade estrangeira – se a realização da manifestação fosse autorizada a título cautelar, isso faria com que, uma vez realizada a manifestação, o processo principal se tornasse automaticamente inútil. O que se pretende é, pois, obter em tempo útil e com carácter de urgência, uma decisão definitiva sobre a questão de fundo, sob pena de haver denegação de justiça.2-Pode este processo ser movido contra a Administração (Art. 109º n.º1) ou contra particulares (Art. 109º n.º2). No primeiro caso, o processo tanto pode dirigir-se à adopção ou abstenção de operações materiais como à emissão ou não emissão de AA, nos termos do n.º3 do Art. 109º CPTA. É, por isso, um instrumento que se define pelo conteúdo impositivo, condenatório, da tutela jurisdicional a que se dirige, cobrindo de modo transversal todo o universo das relações jurídicas administrativas. Pode assim, nomeadamente, sobrepor-se, quer à acção administrativa comum, quando a tutela do direito fundamental passe pela adopção ou abstenção de uma conduta ou prestação (que não envolva a prática de um AA), quer à acção administrativa especial, quando a tutela do direito fundamental envolva a prática de um AA ilegalmente recusado ou omitido.

Artigo 54.ºTramitação

1-Quanto à sua tramitação, dir-se-á que se trata de um modelo polivalente, seguindo a tramitação adequada na opinião do juiz depois de dosear o grau de intensidade da urgência:

1º - Nas situações de urgência normal, previstas no Art. 109º, segue-se a tramitação prevista no Art. 110º, que pode ser, “quando a complexidade da matéria o justifique”, a da acção administrativa especial, ainda que com os prazos reduzidos a metade (Art. 110º n.º3);2º - Nas situações de especial urgência, seguir-se-á o disposto no Art. 111º.2-Do ponto de vista da tramitação a seguir, pode, assim, dizer-se que o modelo comporta 4 possibilidades:1ª - Modelo normal ⇒ Art. 110º n.ºs 1 e 2 CPTA2ª - Modelo mais lento que o normal ⇒ Arts. 110º n.º3 e 78º e ss. (embora com os prazos reduzidos a metade)3ª - Modelo mais rápido que o normal ⇒ Art. 110º n.ºs 1 e 2, embora com redução do prazo previsto no n.º1 (Art. 111º n.º1)4ª - Modelo ultra-rápido – para situações de extrema urgência, seguem-se termos informais muito simplificados, que podem resumir-se a uma audiência oral (Art. 111º n.º1, in fine) ou passar pela audição do requerido por qualquer meio de comunicação adequado, que inclui o telefone (Art. 111º n.º2).

Artigo 55.ºConteúdo da decisão

Quanto ao conteúdo da decisão, há que distinguir 2 situações;a) situação prevista no Art. 110º n.ºs 4 e 5 CPTAb) no caso previsto no n.º3 do Art. 109º, o tribunal tem o poder de proceder à execução específica do dever de praticar o AA, emitindo sentença constitutiva, destinada a produzir os mesmos efeitos do acto devido e, portanto, a substituir o acto ilegalmente recusado ou omitido. Esta é uma situação excepcional, determinada pela urgência, pois em situações normais, como veremos, a execução judicial específica do dever de a Administração praticar um acto estritamente vinculado só pode ser obtida no âmbito de um processo executivo.

Artigo 56.ºCaracterização sumária dos direitos, liberdades e

garantiasRemetendo para Peter Haberle, o Professor Vasco Pereira da Silva sustenta a existência de uma interdependência entre o Direito do Contencioso Administrativo e o Direito Constitucional, pois, por um lado, a justiça administrativa concretiza as opções constitucionais, e, por outro, a realização do Direito Constitucional depende da justiça administrativa. Se há domínio em que tal dependência é indubitável é precisamente o da defesa dos direitos fundamentais. Estes consubstanciam-se em regras substantivas, procedimentais e processuais, pelo que a sua concretização não é possível sem que existam meios contenciosos apropriados à sua tutela plena e efectiva.Proclama-se nos artigos 1º e 2º da Constituição que a República Portuguesa é um Estado de Direito Democrático, baseado na dignidade da pessoa humana, no respeito e na garantia da efectivação dos direitos e liberdades fundamentais. Os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira afirmam que a Constituição

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estabelece um regime particularmente exigente para os direitos, liberdades e garantias, rodeando-os de especiais cautelas contra o Estado e contra o próprio poder de revisão constitucional, e atribuindo-lhes um alcance que vai para além das relações Estado-cidadão, alargando-o mesmo às relações entre os próprios cidadãos. Ora, o regime dos direitos, liberdades e garantias caracteriza-se pela sua aplicabilidade directa e eficácia irradiante, visto que estes direitos vinculam entidades públicas e privadas e não carecem de mediação, desenvolvimento ou concretização legal para serem aplicáveis (nº 1 do artigo 18º da Constituição). A par de reclamarem de todos um dever geral de respeito, estes direitos impõem às entidades públicas e aos particulares que exerçam poderes de autoridade a obrigação de conformação material e formal de toda a sua conduta com obediência e no sentido da promoção, efectivação e protecção dos direitos, liberdades e garantias. Daqui se extrai que a Administração deve agir abstendo-se de provocar qualquer lesão aos direitos, liberdades e garantias dos particulares e respeitando o dever mínimo de protecção, ou o dever de proibição de insuficiência, destes direitos face a terceiros que os possam lesar, v.g., através de medidas de polícia. Neste sentido, versam os artigos 22º e 266º da Constituição. 2- A protecção de direitos fundamentais, maxime de direitos, liberdades e garantias, é passível de revestir duas formas: uma jurisdicional e uma não jurisdicional. A primeira pode destrinçar-se entre meios de âmbito geral – v.g., queixa ao Provedor de Justiça -, e meios de âmbito específico – v.g., meios de resolução extrajudicial de conflitos de consumo, a que alude o Decreto-Lei 149/99, de 4 de Maio. A segunda pode subdividir-se, por sua vez, entre meios institucionalizados - como o direito de petição, a queixa ao Provedor de Justiça e meios de impugnação administrativa – e meios não institucionalizados – por exemplo, o direito de resistência, patenteado no artigo 21º da Constituição.

Artigo 57.ºPressupostos processuais

1-O primeiro pressuposto que deve ser analisado é a subsidiariedade da intimação. A natureza subsidiária acarreta que, primeiramente, se deverá equacionar a possibilidade de intentar uma acção administrativa comum ou uma acção administrativa especial, associada à dedução de um pedido de decretamento de providências cautelares. Tal significa que o particular não pode socorrer-se, sem mais, deste meio de tutela urgente, como via normal de reacção. Ele só poderá recorrer à intimação se, por motivos concernentes às limitações do factor temporal, o decretamento provisório não seja possível – a impossibilidade poderá decorrer da circunstância de o juiz, para se pronunciar, ter de ir ao fundo da questão, o que lhe está vedado no âmbito dos procedimentos cautelares - ou suficiente – a insuficiência diz respeito à incapacidade de uma decisão provisória satisfazer as necessidades de tutela do particular - para tutelar eficazmente os seus direitos.

A prova da impossibilidade e/ou insuficiência recai sobre o requerente. A razão de ser deste pressuposto está intimamente ligada à preocupação de não se transformar os processos urgentes em processos principais, preocupação essa que, por seu turno, se justifica pela necessidade de evitar a inundação de processos nos tribunais, bem como pelo facto de a índole urgente implicar uma diminuição de dados trâmites processuais. A subsidiariedade verifica-se quer em relação às providências cautelares de cariz genérico, reguladas no artigo 131º do CPTA, quer em relação às providências específicas de protecção sumária de direitos, liberdades e garantias, designadamente a intimação para a prestação de informação, ou a consulta de processos ou passagem de certidões. Note-se que a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias constitui um processo principal, e não um processo cautelar: a intimação permite decisões definitivas, formando caso julgado material, ao passo que uma medida cautelar assume natureza provisória, instrumental e acessória relativamente ao processo principal.2-O segundo pressuposto a ter em conta é a indispensabilidade da intimação para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade e garantia. De acordo com a Exposição de Motivos do CPTA, a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias é “um instrumento que se procurou desenhar com uma grande elasticidade, que o juiz deverá dosear em função da intensidade da urgência”. Este pressuposto é apreciado pelo juiz casuística e discricionariamente, pelo que incumbe ao requerente demonstrar que a intimação visa salvaguardar o exercício do seu direito em tempo justo, o que envolverá, naturalmente, uma ponderação entre interesses e valores públicos e privados. Exemplo paradigmático da indispensabilidade da instituição da intimação é o caso da negação da necessária autorização administrativa para a realização de uma manifestação, em data muito próxima, por ocasião da deslocação de certa personalidade a Portugal (artigo 45º da Constituição Portuguesa). Em tal caso, a plena tutela do direito de manifestação reclama uma medida urgente, não cautelar, mas definitiva.3-Questão controvertida na doutrina portuguesa é a de saber qual a atitude que deverá ser adoptada pelo juiz no caso de não preenchimento dos pressupostos elencados. Para alguns autores, mormente para os Professores Mário Aroso de Almeida, Carla Amado Gomes e Sofia David, o tribunal deverá optar pela convolação oficiosa do processo de intimação num processo cautelar, em ordem a proceder, o mais rápido possível, ao decretamento provisório. Para outros, ao tribunal caberá absolver a instância.

Artigo 58.ºObjecto da intimidação

1-No que concerne à amplitude do objecto da intimação para protecção de “direitos, liberdades e garantias”, são cinco as principais posições que podem ser sustentadas:

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1. Estão apenas em causa os direitos, liberdades e garantias pessoais, situados na Parte I, Título II, Capítulo I, o que corresponde aos artigos 24º a 47º da Constituição.

2. Estão em causa os direitos, liberdades e garantias acima referidos, bem como os direitos fundamentais de natureza análoga.

3. Estão em causa todos os direitos, liberdades e garantias consagrados na Parte I, Título II, o que equivale aos artigos 24º a 57º da Lei Fundamental.

4. Estão em causa todos os direitos, liberdades e garantias patentes na Parte I, Título II, a par dos direitos fundamentais de natureza análoga.

5. Estão em causa todos os direitos fundamentais, regulados na Parte I, Títulos II e III, quer se trate de direitos, liberdades e garantias ou direitos análogos a estes, quer se trate de direitos económicos, sociais e culturais.

As duas primeiras posições têm a seu favor a letra da Constituição, nomeadamente o nº 5 do artigo 20º, que encoraja o legislador a criar mecanismos céleres para a protecção de direitos, liberdades e garantias pessoais, visto que estes assumem, em princípio, uma mais estreita conexão com o princípio da dignidade da pessoa humana. Apesar disso, a primeira posição peca por ignorar o artigo 17º da Constituição, do qual decorre a exigência de aplicação do regime dos direitos, liberdades e garantias aos direitos fundamentais de natureza análoga, sendo irrelevante a sua localização – isto é, se são direitos fundamentais intra-constitucionais ou extra-constitucionais. A desconsideração do artigo 17º da Constituição é igualmente imputável à terceira posição, motivo pelo qual esta deve ser afastada. A quarta posição é aquela que tem adquirido maior acolhimento na jurisprudência e na doutrina, sendo de salientar nomes como Jorge Miranda, Vieira de Andrade, Maria Fernanda Maçãs, Mário Aroso de Almeida, Carlos A. Fernandes Cadilha e Rui Medeiros. Por último, a quinta posição, sufragada pelo Professor Vasco Pereira da Silva, é a que estende o âmbito de protecção do artigo 109º do CPTA aos chamados direitos de solidariedade, como o direito ao ambiente. Não obstante ter o mérito de potenciar ao máximo a utilização deste mecanismo de tutela urgente, esta tese é criticada por forçar demasiado a esfera de competência que o legislador administrativo quis reconhecer à jurisdição administrativa, e por ser responsável pelo entupimento dos tribunais. 

Artigo 59.ºRegime jurídico

1-Os números 1 e 2 do artigo 109º do CPTA ditam que a intimação incide sobre a conduta, positiva ou negativa, da Administração ou de particulares, designadamente de outras entidades que exercem poderes de autoridade, como os concessionários, que põe em causa o exercício de um direito, liberdade e

garantia. De fora ficam, portanto, os actos legislativos e as decisões judiciais. A conduta lesiva pode já se ter verificado ou ser meramente potencial.2-Com esta intimação, pede-se ao juiz que tome uma decisão de mérito e imponha à Administração ou a particulares a adopção de uma conduta, positiva ou negativa, indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade e garantia. Quando dirigida contra a Administração, a conduta a adoptar tanto pode configurar um acto administrativo como uma simples operação material. À luz do nº 3 do artigo 109º e do nº 3 do artigo 3º do CPTA, quando se requeira a emissão de um acto administrativo estritamente vinculado, o tribunal pode emitir uma sentença que produza os efeitos de acto devido. Na óptica do Professor Vieira de Andrade, quando dirigidas contra os particulares, as intimações serão utilizadas, a título principal, para suprir a omissão administrativa das providências adequadas à prevenção ou repressão das condutas atentatórias de direitos de outrem. Salvo especial urgência, deve exigir-se uma solicitação prévia ao órgão administrativo competente, da medida administrativa omitida, identicamente ao que sucede nos demais processos de intimação e de condenação primária, a não ser que a atitude omissiva já tenha sido assumida pela autoridade competente.3-O pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é instaurado no Tribunal Administrativo de Círculo (doravante, designado de TAC) da área onde devam ter lugar o comportamento ou a omissão impostos, por força do nº 5 do artigo 20º do CPTA e do nº 1 do artigo 44º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (doravante, apelidado de ETAF). A improcedência do pedido propicia recurso de apelação para o Tribunal Central Administrativo (TCA), Secção de Contencioso Administrativo, nos termos da alínea a) do nº 3 do artigo 142º do CPTA e da alínea a) do artigo 37º do ETAF. No entanto, das decisões de procedência do pedido a possibilidade de recurso está dependente do valor da causa, que terá de exceder a alçada do tribunal do qual se recorre. Em regra, terá de exceder o valor do TAC, havendo recurso para o TCA, Secção de Contencioso Administrativo (artigos 32º a 34º e 142º do CPTA). O recurso tem efeito devolutivo, à semelhança do que ocorre em sede de recurso de concessão de providências cautelares (nº 2 do artigo 143º do CPTA). 

Artigo 60.ºLegitimidade

1-Quanto à legitimidade activa, o pedido pode ser formulado por quem alegue e prove sumariamente ter necessidade de garantir o exercício de direitos, liberdades e garantias, sendo parte na relação material controvertida ou pelo Ministério Público, no exercício da acção popular. A base legal são os artigos 9º,109º e 131º do CPTA, 219º da Constituição e 26º do Código de Processo Civil (doravante, apelidado de CPC), aplicado subsidiariamente ao CPTA pelo artigo 1º deste. A intimação pode ser requerida singularmente ou

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em coligação (alínea a) do nº 1 do artigo 12º do CPTA).2-Já em relação à legitimidade passiva, o pedido pode ser formulado contra a pessoa colectiva pública ou o Ministério onde o órgão a quem se imputa a conduta lesiva está integrado, ou contra particulares, ao abrigo dos artigos 10º, 109º e 131º do CPTA. Tratando-se de relações jurídico-administrativas complexas ou multipolares, tem aplicação o nº 1 do artigo 10º do CPTA, o qual dispõe que a intimação deve ser proposta contra a pessoa colectiva ou Ministério em que o órgão autor da conduta lesiva está inscrito, bem como contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor, ou seja, contra os contra-interessados. A Professora Carla Amado Gomes defende que a citação e audição destes últimos far-se-á com base no artigo 83º do CPTA. Sendo a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias um processo urgente, a mesma corre em férias, com dispensa de vistos prévios, e os actos de secretaria são praticados no próprio dia, com precedência sobre quaisquer outros, segundo o nº 2 do artigo 36º do CPTA. Ademais, a apresentação do pedido não está submetida a qualquer prazo. 

Artigo 61.ºTramitação

1-Do ponto de vista da tramitação a seguir, o modelo polivalente ou de geometria variável– terminologia utilizada pelo Professor Mário Aroso de Almeida - comporta quatro possibilidades distintas: o modelo normal, o modelo mais lento do que o normal, o modelo mais rápido do que o normal, e o modelo ultra-rápido. O  modelo normal, a que se referem os números 1 e 2 do artigo 110º do CPTA, corresponde aos processos desencadeados em situações de urgência normal e que apresentam uma complexidade normal de apreciação. O modelo mais lento do que o normalreporta-se aos processos desencadeados em situações de urgência normal, mas cuja apreciação se reveste de uma complexidade fora do normal. Por remissão do nº 3 do artigo 110º do CPTA, este é o da acção administrativa especial, previsto nos artigos 78º e ss. do CPTA, sendo caracterizado pela existência de prazos reduzidos a metade. O modelo mais rápido do que o normal concerne a processos intentados em situações de especial urgência. Por remissão do nº 1 do artigo 111º do CPTA, é regulado nos números 1 e 2 do artigo 110º do CPTA, com redução do prazo. Omodelo ultra-rápido é observado nos processos intentados em situações de extrema urgência e segue termos informais bastante simplificados, que podem resumir-se à realização, em 48 horas, de uma audiência oral, no termo da qual o juiz decide de imediato, nos termos do nº 1 do artigo 111º do CPTA, ou passar pela audição do requerido por qualquer meio de comunicação, incluindo o próprio telefone, ao abrigo do nº 2 do artigo 111º do CPTA. 

Artigo 61.ºEfeitos

Os efeitos de uma decisão que ponha termo a um processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias são, comummente, de tipo declarativo condenatório: o tribunal dirige uma injunção ao requerido para que adopte uma determinada conduta. Ainda assim, o Professor Rui Machete crê que o legislador abriu também a porta a decisões de tipo executivo (substitutivo), quando se trate da injunção para a prática de acto administrativo estritamente vinculado, com fundamento no nº 3 do artigo 109º do CPTA. 

Artigo 62.ºIncumprimento da intimação

O incumprimento da intimação sujeita o titular do órgão ou o particular ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, a fixar pelo juiz na decisão de intimação ou em despacho ulterior (artigo 169º do CPTA). Isto sem prejuízo do apuramento da responsabilidade civil, disciplinar e criminal a que haja lugar (artigo 159º do CPTA). O Professor Vieira de Andrade alerta para o facto de o regime aplicável a tais sanções ser porventura o do Código Civil (CC), uma vez que as respectivas execuções se regem pela lei do processo civil (nº 2 do artigo 157º do CPTA). 

Artigo 63.ºConsiderações finais

1-A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias aparece como uma via autónoma e particularmente célere de defesa de posições jusfundamentais ante entidades, encarregues do desempenho de tarefas materialmente administrativas.2-A intimação é plenamente compatível com o incidente de inconstitucionalidade, que pode ser nela enxertado, ocupando um espaço próprio, o de defesa contra condutas, activas ou omissivas, do Executivo, independentemente da verificação de uma situação de inconstitucionalidade normativa.3-Esta modalidade de processo urgente possui ainda a virtualidade de obviar à inundação do Tribunal Constitucional por acções de amparo.4-Pessoalmente, concordo com o entendimento perfilhado pela maior parte da doutrina de que a abertura efectuada pelo legislador, ao afastar a limitação da natureza pessoal do direito, é louvável, pois reflecte a preocupação com a tutela de certos direitos que, pela sua natureza, espelham de maneira sensível a relação do cidadão com o Estado, sendo que essa natureza se comunica a outras posições jurídicas fora do catálogo. Para além disso, evidencia a situação estratégica desta categoria de direitos no contexto do direito ao livre desenvolvimento da personalidade, plasmado no artigo 26º da Constituição, para o qual contribuem também os direitos de natureza análoga. Resta saber, de todo o modo, se de um alargamento abusivo do conceito de direitos, liberdades e garantias, tolerado pela jurisprudência, não poderá resultar um eventual uso excessivo deste meio contencioso.

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 Sem embargo de constituir uma espécie de última carta na manga dos particulares para situações em que nenhum outro remédio é possível e/ou suficiente, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias acaba por se revelar como um instrumento fulcral para o reforço do princípio da tutela jurisdicional efectiva.

TÍTULO IIIOs processos cautelares

Artigo 64.ºAnálise geral do 112º

O artigo 112º CPTA pretende dar seguimento ao artigo 268º/4 da CRP pois garante aos administrados, a tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo assim, a impugnação de quaisquer atos administrativos que os lesem, e estes nunca podem violar o interesse público.Tal como refere no artigo 112º CPTA, o processo administrativo regula providências conservatórias e antecipatórias, incluindo nestas as providências de regulação provisória de situações. (“No caso das providências cautelares conservatórias, o interessado pretende manter ou conservar o direito em perigo, sendo a suspensão da eficácia do acto administrativo (112º/2 a)) o exemplo paradigmático desta espécie de providência. Nas providências cautelares antecipatórias, o interessado pretende obter uma prestação, envolvendo ou não a prática de actos administrativos. Pode haver lugar à adopção de regulações provisórias conservatórias ou antecipatórias.

Artigo 65.ºO processo cautelar

O processo cautelar caracteriza-se por ter uma finalidade própria: pretende assegurar a utilidade de um processo que é usualmente demorado pois implica uma cognição plena. Os processos cautelares têm que garantir que é alcançada justiça num certo tempo necessário. (Em virtude dessa função própria de prevenção contra a demora, as providências têm características típicas: a instrumentalidade(dependência na função e não apenas na estrutura de uma acção principal, cuja utilidade visa assegurar); a provisoriedade(pois que nao esta em causa a resolução definitiva de um litígio), e a sumariedade(que se manifesta uma cognição sumaria da situação de facto e de direito, própria de um processo provisório e urgente.

Artigo 66.ºProcessos cautelares e processo urgentes

1-Os processos cautelares (112º ss) distinguem-se por isso dos processos urgentes autónomos (36º CPTA e 97ºss) que são processos principais. Estes segundos visam a produção de decisões de mérito: assim acontece no âmbito do CPTA, tanto com as impugnações urgentes eleitorais ou de atos pré-contratuais, como com as intimações para cumprimento do direito à formação ou para a proteção

de direitos, liberdades e garantias. Ambos os processos visam concretizar o Princípio da Tutela Jurisdicional Efectiva, expressamente consagrado no art. 238.º n.º4 da CRP.2-O que distingue os processos urgentes das providências cautelares, é o facto de estarmos perante uma antecipação quantitativa ou qualitativa do direito do particular, assim respectivamente.Nos processos urgentes autónomos, a antecipação manifesta-se principalmente como quantitativa. Estamos assim, perante uma técnica que desempenha um papel determinante na realização do direito ao processo efectivo e temporalmente justo, uma vez que, mercê dos seus efeitos, a decisão antecipatória assegura, ainda que de diferentes modos, a protecção judicial das pretensões de urgência antes do tempo processual devido.No que concerne às providencias cautelares, a antecipação considera-se qualitativa porque esta permite apenas a emissão de uma decisão judicial de urgência antecipatória e provisória.

Artigo 67.ºProvisoriedade

1-A tutela cautelar caracteriza-se à partida por ser uma regulação provisória de interesses, e por essa razão, outro aspecto fundamental das providências respectivas é o carácter de provisoriedade e de temporalidade, quer da duração da decisão, quer do seu conteúdo.2-A decisão cautelar, mesmo quando é antecipatória, sempre será provisória relativamente à decisão principal, pois em nenhuma situação pode substituir a decisão principal. Até porque quando se executa a decisão cautelar, a providência caduca.3-É muito importante ter em conta que decisão de concessão e a própria determinação do conteúdo da providencia cautelar dirigem-se ao caso concreto, de modo que tem de ter em conta a situação de facto e de direitos existente no momento da decisão e não podem deixar de ser sensíveis à alteração das circunstâncias. “Isto significa que perante uma alteração das circunstâncias, pode haver uma revisão de uma decisão de recusa, admitindo-se a concessão de uma providência anteriormente rejeitada, com base em factos supervenientes Inversamente, o tribunal também pode determinar a revogação, a alteração ou a substituição da providência adoptada ou de outros aspectos da decisão”

Artigo 68.ºRegime do decretamento provisório da providênciaO decretamento provisório de uma providência cautelar, vem previsto no artigo 131º CPTA e é uma situação especial de urgência em que o juiz decreta de imediato a providência requerida, antes mesmo da providência ser decidida. A providência pode ser (provisoriamente) decretada logo após a apresentação do requerimento e por isso a provisoriedade é um dos traços fundamentais caracterizadores das providências cautelares. “Nos termos do artigo 131º CPTA, nada parece justificar, à luz do principio da tutela jurisdicional efetiva, que o decretamento provisório

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tenha de ser pedido logo no próprio requerimento mediante o qual é intentado o processo cautelar.” Mas há que considerar que a evolução das circunstâncias ao longo do tempo da pendência do processo cautelar podem vir a exigir um decretamento provisório que não se justificava de início(no momento em que o processo cautelar foi intentado). O decretamento é provisório, mas imediato, para evitar o esgotamento do interesse da própria pretensão inicial. O tribunal pode decretar provisoriamente a providência, atendendo à gravidade da situação e à possibilidade de lesão irreversível de um direito, liberdade ou garantia (131º/3 CPTA).Não há lugar a uma decisão antecipada e definitiva sobre o fundo da causa, mas fica garantido o direito alegado no processo principal enquanto não findo o processo cautelar.“O decretamento provisório da providência cautelar (131º CPTA) é considerado como um incidente do processo cautelar, e assim, torna necessária a prática de atos e termos não compreendidos na estrutura própria do processo cautelar.” ANDRADE, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa (Lições), Almedina, Lisboa, 2015, 14º edição)É um incidente de providência cautelar, pois é como se tivesse uma providência cautelar inserida noutra providência (constitui um aspecto suplementar do regime cautelar). O momento processual regulado no artigo 131º CPTA, é “apenas um incidente cautelar dentro do processo cautelar, cujo objectivo, é evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar

Artigo 69.ºDespacho incidental

O despacho incidental presente no 131/6 2ª parte CPTA, pretende apurar se há motivos, após o contraditório ocorrido, para levantar, manter ou alterar o despacho imediato provisório. É necessário apurar se o contraditório trouxe ou não ao incidente matéria factual que infirme o juízo feito no despacho liminar que decretou imediatamente a providência. Este juízo está relacionado com a possibilidade de ocorrer durante o processo cautelar uma lesão iminente e irreversível de um direito, liberdade e garantia, ou direito análogo a este, ou então que haja um risco de lesão grave e irreversível de uma situação muito urgente relativa a outro direito subjectivo ou interesse legitimo do requerente(periculum in mora).“Este instituto funciona como uma espécie de tutela cautelar de segundo grau, destinada a evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar, prevenindo os danos que, para o requerente, possam resultar da demora deste processo”. Sendo uma decisão cautelar provisória, permite-se que possa ser decretada sem contraditório e sem necessidade de aplicação dos critérios estabelecidos no 120º CPTA. É suficiente, para o decretamento provisório, para além do interesse em agir, a verificação de especial perigosidade para direitos, liberdades e garantias, ou para outros bens jurídicos em situação de especial urgência. 

Artigo 70.ºCritérios de decisão para o decretamento provisório1-Para o professor Aroso de Almeida, há 2 critérios, sendo o 1º, o facto da “petição permitir reconhecer a possibilidade de lesão iminente e irreversível do direito, liberdade ou garantia invocado ou outra situação de especial urgência”(131/1 CPTA).2-Mas é necessário densificar-se a expressão “outra situação de especial urgência”. Segundo esta doutrina, está aqui presente um de dois requisitos que, faz depender, a concessão de providências cautelares: o periculum in mora. Este concretiza-se no perigo de uma lesão irreversível – “fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação”,3-“No âmbito do decretamento provisório, o periculum in mora tem de ser qualificado, na medida em que se reporta, à morosidade do próprio processo cautelar: está em causa o perigo da constituição de uma situação irreversível se nada for feito de imediato, antes ainda do momento em que vira a ser decidido, o próprio processo cautelar”.4-Por essa razão, o artigo 131º prevê o decretamento provisório de qualquer medida cautelar, relativa a direitos, liberdades e garantias ou não, desde que haja especial urgência.5-Já o 2º critério, (131/6), resulta do juiz de decretamento provisório, dever atender, aos critérios que lhe cumpre aplicar na própria decisão do processo cautelar. Mas o juiz pode não dispor de todos os elementos. 

Artigo 71.ºDecretamento provisório está sujeito a

requerimento, ou pode ser decidido oficiosamente pelo juiz?

1-É pertinente colocarmos a questão de saber se o decretamento provisório tem de ser requerido ou pode ser decidido oficiosamente pelo juiz, quando o juiz no despacho liminar, reconheça a existência de uma situação de especial urgência, designadamente pela possibilidade da lesão iminente e irreversível de um direito, liberdade ou garantia.2-Segundo a opinião do Professor Aroso Almeida, o artigo 131/1 CPTA, tem-se entendido que o juíz, pode decretar, provisoriamente a providencia requerida, atendendo ao princípio da tutela judicial efetiva.Analisando outra perspectiva, e lendo o artigo 131/1 CPTA noutro sentido, mesmo que o interessado se limite a requerer a adoção de uma providência cautelar, nos termos do 114º CPTA, sem deduzir o pedido autónomo do seu decretamento provisório, o tribunal deve avançar para o decretamento provisório quanto reconheça, conforme a gravidade da situação. Segundo este entendimento esta é a única solução apta a assegurar a tutela jurisdicional efetiva do requerente. “Esta parece ser também a interpretação mais consentânea com o principio da tutela jurisdicional efetiva, num domínio particularmente sensível, em que pode existir o risco de lesão iminente e irreversível de direitos fundamentais.”

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Artigo 72.ºDuas fases de tramitação

O artigo 131º CPTA apresenta duas fases sucessivas de tramitação: numa primeira fase regulada no nº 1, o tribunal, em 48 horas, decreta a providência provisória(com base nos critérios previstos) e numa segunda fase(nº6), é dada ao juiz a possibilidade de rever a decisão tomada(objectivo primordial de assegurar o contraditório). “É dado às partes o prazo de 5 dias para se pronunciarem sobre a possibilidade do levantamento, manutenção ou alteração da providencia, sendo, em seguida a processo concluso por 5 dias, ao juiz ou relator, para proferir decisão confirmando ou alterando o decidido”. 

Artigo 73.ºDiferença entre o regime do decretamento

provisório disposto no artigo 131º e 128º CPTA1-No 131º CPTA, o juiz decreta provisoriamente a providência, antes da própria decisão de providência ser tomada. Mas a suspensão da eficácia do ato depende da decretação do juiz, ou seja, não é imediata.Esta decisão é mutável, pois vai alterando conforme as circunstâncias do caso. Esta visa evitar o periculum in mora do processo cautelar, prevenindo os danos que, para o requerente, possam surgir desta demora do processo, através da introdução de um regime que se destina a valer durante a pendência do processo cautelar, até ao momento em que este venha a ser decidido.2-No caso do 128º CPTA, o efeito suspensivo é automático, o réu fica proibido de executar o ato e não há papel do juiz na proibição da execução do ato. Aplica-se o 128º CPTA sempre que se aplicar o artigo 112 a) CPTA). Esta resolução tem que estar fundamentada (128/1 CPTA) e caso esta fundamentação falte, é considerada como indevida(128/3 CPTA). O tribunal pode julgar improcedentes as razões presentes na fundamentação, mas só no caso desta declaração de ineficácia dos atos de execução lhe ser requerida.3-Na opinião de Aroso de Almeida, é duvidosa a qualificação como um incidente do processo cautelar, pois “o regime do 128º CPTA pressupõe a instauração de um processo cautelar, mas a disciplina que introduzir parece ser inteiramente extrajudicial, só prevendo que ele possa ser jurisdicionalizado, quando, no caso previsto no nº 4, o requerente cautelar venha pedir ao juiz cautelar a declaração de ineficácia de eventuais atos de execução indevida.” 4-A urgência referida no artigo 131º CPTA é diferente da do artigo 109º CPTA, mas é uma situação própria da factualidade em causa. Esta factualidade deve distanciar-se das circunstâncias constantes do artigo 128º CPTA. O campo de aplicação do artigo 128º CPTA afasta-se do artigo 131º CPTA, mas tal como é sublinhado no Acórdão Do Supremo Tribunal Administrativo, “este pressupõe uma especial gravidade, não tem automaticidade, abarca um elenco mais vasto de situações possíveis e não está sujeito a decisões externas ao processo. Pelo que a

aplicabilidade do artigo 128º CPTA não afasta a do artigo 131º CPTA.”

Artigo 74.ºConfrontando o próprio CPTA com o artigo 109º entre o decretamento provisório de providências

cautelares e o processo declarativo urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e

garantias.1-O artigo 131º CPTA regula situações que requeiram a imediata concessão de uma providência cautelar, sem afetar a decisão definitiva. Estamos perante situações em que a célere emissão de uma decisão sobre o mérito da causa não é necessária para proteger o direito, liberdade ou garantia, na medida em que o que é indispensável é o decretamento de uma providencia cautelar, desde que assegure que a providência é decretada com a maior urgência, logo após o momento em que seja solicitada. A situação de intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias corresponde à situação de proibição da realização de uma manifestação em data muito próxima, que não pode ser alterada: a questão tem de ser decidida de imediato e não compadece com uma providência cautelar.2-Aplicando o artigo 110-A CPTA, quando não se verificam circunstâncias que não justificam o decretamento de uma intimação, o juiz requer a adoção de uma providencia cautelar. Mas se, se reconhecer que existe uma situação de especial urgência que o justifique, o juiz deve decretar provisoriamente a providência cautelar que julgue adequada, sendo assim aplicável o disposto no artigo 131º CPTA.3-Quando se tratam de situações em que há um critério de reversibilidade, em que se necessita de uma decisão de mérito e que se trata de um direito, liberdade e garantia, aplica-se o artigo 109º CPTA, intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias.4-Seguindo o principio da tutela judicial efetiva, o juiz, pelo menos quando esteja em causa a lesão iminente e irreversível de direitos, liberdades e garantias, deve poder decretar provisoriamente a providência requerida ou outra que julgue mais adequada, mesmo que o decretamento provisório não tenha sido pedido. Tendo sempre em conta, que isto se passa nos casos em que não é possível ser pedida a intimação do 109º.5-A intervenção do decretamento de uma providência cautelar, para efeitos do 131º é a decisão que imponha, por exemplo, a expulsão iminente de um estrangeiro do território nacional. Como é evidente, a questão não tem de ser decidida de imediato e compadece-se perfeitamente com uma definição cautelar. Com efeito, se o tribunal emitir, com a maior urgência e mesmo a titulo provisório, nos termos do 131º, uma providência cautelar para que o interessado permaneça em território nacional, ele não esta desse modo, a dar em definitivo o que só uma decisão sobre mérito da causa pode proporcionar. Pelo contrário, o estrangeiro pode permanecer em território nacional, durante o tempo em que esteja pendente o processo principal e vir a ser expulso se esse processo vier ser julgado improcedente, por este motivo, não se justifica a utilização do

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processo declarativo urgente de intimação, do artigo 109º CPTA. 6-Nestas situações, o periculum in mora reporta-se ao retardamento do próprio processo cautelar: visa-se evitar a lesão iminente e irreversível do direito fundamental ou outra situação de especial urgência e a decisão pode ser tomada no prazo de 48horas.7-A decisão implica o reconhecimento da lesão iminente e irreversível de um direito e deve realizar uma ponderação – deverá ter em consideração o perigo de lesão de direitos de contrainteressados, além do limite representado pelo excecional prejuízo para o interesse publico.8-Um grande critério diferenciador entre o decretamento provisório e o processo urgente de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias assenta na necessidade ou não de uma decisão de mérito para assegurar o direito. No art.131º CPTA, a providência cautelar é concedida, sem prejuízo da decisão definitiva, não sendo a decisão de mérito indispensável porque o decretamento provisório revela-se suficiente. Tendo uma natureza provisória, a decisão de mérito irá consistir na decisão definitiva. A intimação para proteção de direitos, liberdade e garantias prevista no artigo 109º, não é mais do que um processo urgente e principal, caracterizado por uma tramitação sumária e dirigido à produção de uma sentença de mérito, e portanto, definitiva.8-“A intimação para proteção de direitos, liberdade e garantias é utilizado “quando for indispensável para assegurar, em tempo útil, o exercício de um direito, liberdade ou garantia e não seja possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar”. A intimação acaba por ser uma forma de suprir insuficiências ou irregularidades inerentes a um processo cautelar, pelo facto de este ser cautelar e provisório. Logo, quando o particular não tiver possibilidade de aguardar que o juiz se pronuncie acerca uma eventual causa principal, no qual tenha como consequência a lesão dos seus direitos fundamentais, então deverá requerer a um processo de intimação urgente. Conclui-se então que artigo 109º é subsidiariamente aplicável às providencias cautelares, máxime ao decretamento provisório(112 e 131º). 

Artigo 76.ºConvolação do processo cautelar em processo

principal 121º1-O que acontece numa situação em que o juiz consta que a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não é o meio processual mais adequado para uma determinada causa. Os professores Mario Aroso de Almeida e Carlos Esteves Cadilha têm entendido que o pedido formulado deve ser reavaliado, e assim, o juiz convola oficiosamente o processo de intimação em processo cautelar e até, em certos casos, tornado em decretamento provisório. Trata-se de uma consagração da tutela jurisdicional efetiva, novamente assegurando uma decisão em tempo útil,  não se trata de permitir uma verdadeira decisão de fundo definitiva, mas de admitir uma decisão provisória que produza os efeitos da decisão de fundo. Tem de haver (1) um processo

principal já intentado, (2) todos os elementos necessários para o efeito e (3) a simplicidade ou urgência na resolução definitiva o justifique, pode-se antecipar o juízo da causa principal e proferir uma decisão que constituirá a decisão final desse processo. Aqui não chega a haver decretamento de providência cautelar, problemas que suscitavam quanto ao tipo de recurso foram agora clarificados com o 143º/2 al.c, é meramente devolutivo.2-Acrescento ainda que o legislador previu sanções para a utilização abusiva de providências cautelares de forma a evitar o recurso desnecessário à tutela cautelar, responsabilizando o requerente por danos causados ao requerido em caso de dolo ou negligência grosseira. 126º/1 e 2.3-O instituto dos processos cautelares nesta reforma de 2015 sofreu algumas alterações no sentido de tornar mais simples a sua aplicação, com a clarificação de alguns aspetos fundamentais como nos critérios de decisão e ainda no decretamento provisório de providências cautelares.4-Serve de exemplo o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 07919/11 06-10-2011 CRISTINA DOS SANTOS, em que os autores manifestam preferência através do pedido principal, de recorrer ao meio adjetivo principal da intimação urgente definitiva do artigo 109º CPTA, e assim há uma quebra desta primazia em recorrer convolação daquele meio adjectivo intimação urgente provisório do artigo 131º CPTA. Exige-se uma fundamentação quanto ao despacho de convolação, em que o pedido concretamente deduzido de intimação urgente e definitiva para a proteção de direitos, liberdades e garantias não preencha os pressupostos do artigo 109º CPTA.5-“Os pressupostos de admissibilidade do processo de intimação urgente definitiva do artigo 109º CPTA assentam na indispensabilidade de formulação de uma decisão de mérito, em razão das circunstâncias de caso concreto confluírem no sentido da impossibilidade ou insuficiência de uma qualquer medida cautelar provisória, seja ela a medida cautelar urgentíssima ou outra(normal) cautelar, para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia.” Este procedimento enquadra-se no âmbito do principio da tutela judicial efectiva e do imperativo constitucional relativo á efectividade dos direitos, liberdades e garantias. Segundo o professor Vieira de Andrade, o juiz faz uma antecipação processual do juízo de fundo, caso haja manifesta urgência na resolução definitiva do caso. Na convolação há substituição do juízo cautelar por um juízo de mérito. Mas neste caso há que ter em conta os interesses envolvidos(pois tem que ser de grande relevo) e tem que ser certo e seguro quanto à posse de todos os elementos de facto relevantes para a decisão.

Artigo 77.ºGarantia das providências cautelares

Art. 126º CPTA

Trata-se de um regime que visa proteger a Administração e os contra-interessados contra os danos

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resultantes do abuso da tutela cautelar por parte de quem, com dolo ou negligência grosseira, tenha feito valer pretensões infundadas. Saliente-se ainda o regime do Art. 127º, que exprime um especial cuidado na promoção da efectividade das pronúncias que concedam providências cautelares.

Disposições particulares relativamente às providências cautelares

Arts. 128º e ss.

Artigo 78.ºDa Suspensão da eficácia de AA em particular

Arts. 112º n.º2 a), 128º e 129º CPTA

1-Encontra-se prevista no Arts. 112º n.º2 a), 128º e 129º CPTA, e é uma providência cautelar destinada desde logo a impedir a execução de AA de conteúdo positivo. É o que decorre, desde logo, dos Arts. 153º CPA e 414º CPC.2-O Art. 128º regula a situação em que fica colocada a Administração entre o momento em que recebe o duplicado do pedido de suspensão e aquele em que o tribunal se pronuncia sobre o pedido, determinando que, durante esse período de tempo, a Administração não pode iniciar ou prosseguir a execução do acto e que os actos de execução indevida que pratique poderão ser declarados ineficazes pelo tribunal. O preceito impõe assim a suspensão da adopção de medidas dirigidas à execução do AA, isto é, a proibição de início ou prossecução da execução de AA durante a pendência do processo de suspensão, até ao trânsito em julgado da respectiva decisão. Esta proibição, segundo Aroso de Almeida, cessará apenas se for proferida decisão, no processo cautelar, que indefira o pedido de suspensão de eficácia, decisão esta que produzirá imediatamente os seus efeitos a partir do momento em que seja proferida, por força do disposto no Art. 143º n.º2 CPTA. Por conseguinte, a decisão que, em primeira instância, indefira um pedido de suspensão da eficácia tem o alcance de fazer cessar a proibição de executar o AA imposta pelo Art. 128º.3-O Art. 129º, por seu turno, refere-se à possibilidade de suspensão da eficácia dos AA já executados, justificada pelo facto de a pronúncia de suspensão produzir efeitos retroactivos, podendo assim constituir a Administração no dever de adoptar as medidas necessárias (incluindo restituições) para que se reconstitua (provisoriamente) a situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado e executado. Este preceito não prescinde do preenchimento dos pressupostos do Art. 120º, nomeadamente da ponderação dos interesses a que alude o seu n.º2. Um outro pressuposto deste mecanismo é a utilidade que da suspensão advirá para o requerente ou para os interesses que ele preconiza: assim, a suspensão do acto já executado não se justificará, por falta de interesse processual do requerente, se todos os seus efeitos nocivos já se tiverem consumado e as consequências da execução realizada forem materialmente irreversíveis. Com efeito, a pronúncia judicial nem terá, nesse caso, a utilidade de impedir a

produção futura de efeitos nocivos, nem a de impedir a manutenção da situação lesiva.

Artigo 79.ºDa Suspensão da eficácia de normas

administrativasArts. 112º n.º2 a) e 130º CPTA

Pode ser requerida, nos termos do Art. 130º CPTA, em dois tipos de situações:

a) na Declaração de ilegalidade da norma sem força obrigatória geral pedida pelos respectivos legitimados (Art. 73º n.º2) – n.º1: a solução de circunscrever os efeitos da suspensão da eficácia da norma directamente lesiva justifica-se pelo facto estarem em causa neste domínio valores constitucionalmente relevantes, como o da segurança e estabilidade jurídicas e o da prossecução do interesse público. O Art. 117º n.ºs 3 e 4 procura, entretanto, obviar às dificuldades que possam advir da indeterminabilidade ou do elevado n.º de contra-interessados.

b) na Declaração de ilegalidade da norma com força obrigatória geral – n.º2 e Art. 73º n.º1 CPTA.

Artigo 80.ºProvidências relativas a procedimentos de

formação de contratosArt. 132º

1-Está em causa um regime inspirado em duas directivas comunitárias transpostas anteriormente para um diploma legal, mas de cujas normas se afasta desde logo pelo facto de não abranger apenas os contratos referidos no n.º1 do Art. 100º, a propósito do processo principal urgente de impugnação de actos pré-contratuais (cfr. Arts. 100º-103º CPTA).2-Admite-se, desde logo, que o tribunal determine, no próprio processo cautelar, a providência destinada à correcção de ilegalidades patentes, como será, por exemplo, o caso do programa de concurso que vede o acesso a candidatos de origem comunitária. Deste modo se admite que o tribunal decida desde logo a causa principal (cfr. Art. 132º n.ºs 1 e 7), no que constitui um afloramento do regime do Art. 121º CPTA.3-Por outro lado, o n.º2 do Art. 132º retoma solução correspondente à do n.º3 do Art. 100º.4-Por último, nos termos do n.º6 do Art. 132º, estas providências serão concedidas após ter sido feita a ponderação do n.º2 do Art. 120º.

Artigo 81.ºRegulação provisória do pagamento de quantias

Art. 133º CPTA

Trata-se de um importante exemplo de providência cautelar nominada de natureza antecipatória que o CPTA vem introduzir na nossa ordem jurídica.

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Artigo 82.ºMomento e legitimidade para requerer as

providências1-As providências cautelares tanto podem ser requeridas antes, como simultaneamente, como mesmo depois da propositura da acção principal (Art. 114º n.º1), tanto se podendo pedir apenas uma providência cautelar como várias, por forma a obter, da conjugação dos efeitos de cada uma, o resultado pretendido (Art. 112º n.º1). O tribunal, por outro lado, pode optar pela adopção de uma ou várias providências e até, ouvidas as partes, pela adopção de outra ou de outras, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tinham sido concretamente requeridas, nos casos previstos no n.º3 do Art. 120º.2-Do teor do Art. 112º n.º1 resulta que a legitimidade para requerer a adopção de providências cautelares não pertence apenas aos particulares mas também ao MP (como aliás é referido no n.º1 do Art. 124º) e a quem quer que actue no exercício da acção popular ou impugne um AA com fundamento num interesse directo e pessoal, no óbvio pressuposto de que a todos deve ser reconhecida a possibilidade de verem acautelada a utilidade do processo principal que estão legitimados a intentar. Daí que possam estar aqui em causa interesses privados e públicos, que há que ponderar (cfr. Art. 120º n.ºs 2 e 3) de modo a alcançar uma decisão judicial justa.

Artigo 83.ºCritérios gerais de que depende a atribuição das

providências1-Ressalvada a situação da Suspensão da eficácia e a Regulação provisória do pagamento de quantias, que são objecto de regulação específica e de um regime próprio quanto aos pressupostos de que depende o seu decretamento (cfr. Art. 112º n.º2 a) e e) e Arts. 132º n.º6 e 133º n.º2, respectivamente), as demais providências cautelares são concedidas de acordo com o critério do Art. 120º CPTA: desde logo, veja-se que as suas alíneas b) e c) do seu n.º1, estabelecem critérios diferenciados, consoante se trate de conceder providências conservatórias ou antecipatórias.2-São 3 os planos em que se situam as importantes inovações que o CPTA introduz neste domínio, no que diz respeito à concessão das providências cautelares:

a) Critério de ponderação inovador do n.º2 do art.º 120º CPTA: impõe-se ao tribunal a ponderação equilibrada dos interesses, contrabalançando os eventuais riscos que a concessão da providência envolveria para o interesse público (e para interesses privados contrapostos) com a magnitude dos danos que a sua recusa com toda a probabilidade poderia trazer ao requerente

b) Critério do fumus boni iuris ou da aparência de bom direito: o tribunal deve atender ao grau de probabilidade de êxito do processo principal, devendo para tal proceder à apreciação perfunctória e provisória da consistência e, portanto, da credibilidade da pretensão do requerente e, em sentido oposto, analisar o comportamento judicial e extrajudicial que entretanto a Administração tenha assumido (se fornece

ou não indícios da adopção, por sua parte, de uma atitude de desrespeito pela legalidade). Este critério é assim, um óbvio factor de racionalidade e uma elementar exigência de justiça que se impõe no interesse de todos os envolvidos no processo. Saliente-se, porém, que este critério é objecto na nova lei de uma diferenciação ou graduação, devendo ser de indagação mais exigente quando esteja em causa a adopção de uma providência cautelar antecipatória do que na adopção de uma providência meramente conservatória (como é o caso da Suspensão da eficácia de AA).

c) Reformulação dos termos em que é concedido o periculum in mora: para além das situações em que, anteriormente, se poderia admitir o risco da “produção de prejuízos de difícil reparação”, as providências cautelares passam a poder ser também concedidas quando exista o “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado” (cfr. Art. 120º n.º1 b) e c) CPTA).

Artigo 84.ºRegime de atribuição das providências

1-Art. 120º n.º1 a) – é de salientar o carácter meramente exemplificativo das situações elencadas, todas exclusivamente referidas a processos impugnatórios de AA, mas que traduzem as situações paradigmáticas neste âmbito. Se o tribunal considerar preenchida a previsão deste preceito, ele concederá a providência sem mais indagações – não intervém o n.º2 do preceito nem se atende ao critério do periculum in mora, a que fazem apelo as alíneas b) e c). Estamos diante da situação de máxima intensidade do fumus boni iuris, que, em situações de manifesta procedência da pretensão material do requerente, vale por si só.2-Art. 120º n.º1 b) e c) – a concessão da providência depende da demonstração do periculum in mora, que o Código articula com o critério do fumus boni iuris:a) A providência deverá ser concedida desde que os factos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio (periculum in mora) de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível – “facto consumado” – ou difícil – “de difícil reparação” –, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. Desde que, portanto, se preencham os demais pressupostos do Art. 120º, a providência deverá ser concedida tendo em conta a maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar.

Artigo 85.ºDo fumus boni iuris em especial

No que diz respeito ao critério do fumus boni iuris, há que distinguir 2 situações:

a) Providência conservatória: nestes casos, nos quais se visa manter o statu quo, não permitindo que ele se altere, o critério intervém numa formulação negativa: uma vez demonstrado o periculum in mora, a providência cautelar será deferida desde que não existam elementos que tornem evidente a

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improcedência ou inviabilidade da pretensão material principal (desde que “não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo [principal] ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito”).

b) Providência antecipatória: destinam-se a alterar o statu quo, razão pela qual se atribui maior relevo a este critério, aqui formulado num sentido positivo (critério do fumus boni iuris qualificado): se o requerente pretende, ainda que a título provisório, que as coisas mudem a seu favor, sobre ele impende o encargo de fazer prova perfunctória do bem fundado da pretensão deduzida no processo principal (critério semelhante ao seguido em processo civil), isto porque a providência só será concedida quando seja de admitir “que a pretensão formulada ou a formular [no processo principal] pode vir a ser julgada procedente”.

Artigo 86.ºAntecipação do juízo sobre o mérito da causa

Art. 121º CPTA

Estamos aqui perante a previsão de um fenómeno de convolação da tutela cautelar em tutela final urgente, que se concretiza na antecipação, no processo cautelar, da decisão sobre o mérito da causa. Isto desde que se preencham 2 requisitos fundamentais:

a) Requisito material – que exista uma “manifesta urgência na resolução definitiva do caso”, com o que “não se compadece” a mera adopção de uma providência cautelar;

b) Requisito processual – que o tribunal se sinta em condições de decidir a questão de fundo, por dispor de “todos os elementos necessários para o efeito”, isto é, que ele esteja em condições processuais que lhe permitam dar resposta à situação substantiva de urgência. Quando faltem essas condições, mas quando se comprove a urgência, nada obsta a que se imprima um ritmo mais acelerado ao andamento do processo principal, tal como actualmente se consagra no Direito Italiano.