processos de aprendizagem na agricultura

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGROECOSSISTEMAS REFLEXÕES SOBRE PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA AGRICULTURA DANIEL JORGE LIMA MELLO MATTOS HABIB Florianópolis, março de 2007

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Trata de processos de aprendizagem por agricultores, técnicos e pesquisadores na transição da agricultura convencional para a agroecologia. Utiliza abordagens metodológicas empírica, qualitativa, participativa, prospectiva e situacional. Recomenda que projetos, programas e políticas públicas sejam construídos com a participação ativa e direta das pessoas e comunidades envolvidas.

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Page 1: Processos de Aprendizagem na Agricultura

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGROECOSSISTEMAS

REFLEXÕES SOBRE PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA AGRICULTURA

DANIEL JORGE LIMA MELLO MATTOS HABIB

Florianópolis, março de 2007

Page 2: Processos de Aprendizagem na Agricultura

DANIEL JORGE LIMA MELLO MATTOS HABIB

REFLEXÕES SOBRE PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA AGRICULTURA

Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Agroecossistemas, Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas, Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal de Santa Catarina.

Orientador: Prof. Dr. Sergio Leite Guimarães Pinheiro Co-orientador: Paulo Emilio Lovato

FLORIANÓPOLIS 2007

Page 3: Processos de Aprendizagem na Agricultura

FICHA CATALOGRÁFICA Habib, Daniel Jorge Lima Mello Mattos Habib Reflexões sobre processos de aprendizagem na agricultura / Daniel Jorge Lima Mello Mattos Habib. – Florianópolis, 2007. xx, 123 f. :il., tabs. Orientador: Sergio Leite Guimarães Pinheiro Dissertação (Mestrado em Agroecossistemas) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Agrárias. Bibliografia: f.119-123 1. Educação no campo - Teses. 2. Apropriação de tecnologias - Teses. 3. Aprendizagem na agricultura- Teses. 4. Plantio direto - Teses. I. Título.

Page 4: Processos de Aprendizagem na Agricultura

TERMO DE APROVAÇÃO

DANIEL JORGE LIMA MELLO MATTOS HABIB

REFLEXÕES SOBRE PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA AGRICULTURA

Dissertação aprovada em 19/03/2007, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas, Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal de Santa Catarina, pela seguinte banca examinadora

__________________________ _________________ Sergio Leite Guimarães Pinheiro Paulo Emilio Lovato Orientador Co-orientador BANCA EXAMINADORA: __________________________ _________________ Jucinei José Comin (CCA/UFSC) João Carlos Canuto (EMBRAPA)

__________________________ _________________ Luis Renato D´Agostini (CCA/UFSC) Sergio Roberto Martins (CTC/UFSC) __________________________ Luis Carlos Pinheiro Machado Filho Coordenador do PGA

Florianópolis, 19 de março de 2007.

Page 5: Processos de Aprendizagem na Agricultura

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus e a todas as pessoas que direta ou indiretamente

contribuíram para trazer esperanças e dúvidas sobre a realização desta pesquisa, e

também problemas e soluções, dificuldades e belezas, desafios que criaram e

fortaleceram a motivação para realizar este trabalho que você está lendo agora.

Page 6: Processos de Aprendizagem na Agricultura

“Cada um dá o que tem.”

Ditado popular

Page 7: Processos de Aprendizagem na Agricultura

Sumário Resumo ......................................................................................................................... 1 Abstract......................................................................................................................... 2 Capítulo 1 – Introdução, objetivos e justificativas da pesquisa ....................................... 3

1.1- Introdução .......................................................................................................... 3

1.2- Situação Problema .............................................................................................. 9

1.3- Objetivos .......................................................................................................... 10

1.4- Justificativas ..................................................................................................... 10

1.4.1- Diferenças entre difusão, adoção e continuidade do uso de tecnologias ...... 10 1.4.2- Histórico da difusão de tecnologias de plantio direto.................................. 12 1.4.3- Importância do plantio direto como tema de discussão ............................... 15

Capítulo 2 - Perfil e metodologia de pesquisa .............................................................. 19

2.1- Apresentação e justificativas do tipo de pesquisa adotado ................................. 19

2.1.1- Abordagens metodológicas utilizadas nesta pesquisa ................................. 22 2.1.2- Justificativas dos tipos de pesquisa utilizados ............................................ 29

2.2- Etapas da pesquisa ............................................................................................ 31

Capítulo 3 – Processos de aprendizagem e apropriação de tecnologias ........................ 41

3.1- Prática de pesquisa e avaliação da aprendizagem .............................................. 41

3.1.1- Entrevistas semi-estruturadas ..................................................................... 41 3.1.2- Mapas ........................................................................................................ 47 3.1.3- Diagramas ................................................................................................. 50 3.1.4- Históricos .................................................................................................. 53

3.2- Comunicação e aprendizagem .......................................................................... 56

3.2.1- Formas de compartilhamento e aquisição de conhecimentos ...................... 63 3.2.2- História do ambiente e aprendizagem coletiva ........................................... 65

3.3- O processo de investigação temática ................................................................. 70

3.3.1- O tema como foco na pesquisa ................................................................... 70 3.3.2- Percepção e consciência das modificações ambientais ............................... 74 3.3.3- Reflexões sobre a consciência da técnica ................................................... 76

Capítulo 4 - Contextualização do ambiente agrícola nos locais de estudo .................... 79

4.1- Princípios do plantio direto ............................................................................... 79

4.2- Contexto ecológico e sócio-ambiental do manejo agrícola em plantio direto ..... 79

4.2.1- Contexto ecológico .................................................................................... 82 4.2.2- Contexto técnico-pedagógico ..................................................................... 88 4.2.3- Contexto sócio-econômico e político ......................................................... 91

Conclusões .................................................................................................................. 95 Referências Bibliográficas ......................................................................................... 104

Page 8: Processos de Aprendizagem na Agricultura

Índice de Quadros e Figuras Figura 1 – Esquema explicativo da questão-chave da pesquisa ...................................... 5 Figura 2 –Esquema de percepção de causas e conseqüências das ações no ambiente .... 17 Figura 3 – Mapa Ilustrativo do estado de Santa Catarina com os municípios visitados na pesquisa de campo. Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2005. .......... 34 Quadro 1 – Municípios visitados, regiões, dias e meses de visita. ................................ 34 Quadro 2 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região Oeste ..................... 36 Quadro 3 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região do Alto Vale do Itajaí .................................................................................................................................... 37 Quadro 4 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na região das Encostas da Serra Geral ........................................................................................................................... 38 Quadro 5 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região da Grande Florianópolis ............................................................................................................... 38 Quadro 6 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região do Planalto Serrano38 Figura 4 – Roteiro básico de realização das entrevistas individuais e grupais ............... 43 Figura 5 – Reunião com grupo de agricultores e educadores, na discussão sobre práticas de conservação do solo, eleito um dos temas geradores a serem trabalhados no Núcleo Escolar da Região Norte do município de Palmitos...................................................... 46 Figura 6 – Mapa da propriedade do Sr. Alzemiro Peitel – Comunidade Diamantina – Palmitos-SC ................................................................................................................ 49 Figura 7 – Diagrama de interesses e influências da Comunidade Rio Novo – Águas Mornas – SC ............................................................................................................... 52 Figura 8 – Diagrama de fluxos da propriedade do Sr. Jorge da Silva – Comunidade Rio da Prata – Anitápolis – SC ........................................................................................... 53 Figura 9 –Esquema do processo simplificado de produção e difusão de tecnologias .... 57 Figura 10 –Esquema de percepção de causas e conseqüências das ações no ambiente .. 58 Figura 11 – O agricultor Jorge da Silva dá ao grupo explicações causais sobre o a direção do escoamento da água, no manejo para a proteção e a organização dos canteiros de morangos, sua principal renda. Município de Anitápolis - SC .................. 60 Figura 12 –O agricultor Ari Dutel (primeiro plano) explica ao grupo a dinâmica de sucessão de plantas no sistema agroflorestal observado, e a permanente proteção e realimentação do solo. Atrás, experiência de plantio direto em consórcio de milho, mandioca e abóbora em palhada de trigo sem acamar, em sua propriedade. Município de Palmitos - SC .............................................................................................................. 62 Figura 13 – Discussão entre pesquisadores, técnicos e agricultores sobre o local e os sistemas de manejo para a implantação de um experimento em plantio direto de milho crioulo orgânico. Anchieta-SC .................................................................................... 68 Figura 14 – Definição de prioridades por agricultores, técnicos e pesquisadores, para constituição da rede temática, em atividade durante o módulo do curso de manejo local da agrobiodiversidade, no município de Anitápolis - SC. ............................................. 72 Figura 15 – Entrevista com agricultor e a presença de técnico, em diálogo sobre o manejo do experimento de 13 variedades de arroz crioulo orgânico em plantio direto realizado na propriedade deste agricultor. Município de Guaraciaba – SC. ................. 74 Figura 16 – Princípios do Plantio Direto ...................................................................... 79 Figura 17 – Aspecto de lavoura de milho em plantio direto em diferentes períodos de plantio, ao lado de área em recuperação secundária. Município de Guaraciaba-SC ...... 82

Page 9: Processos de Aprendizagem na Agricultura

Figura 18 – Aspecto da palhada cortada pela semeadora no plantio de milho. Município de Guaraciaba-SC ....................................................................................................... 84 Figura 19 – Aspecto de canteiros de hortaliças com inserção de composto orgânico, cobertos com serrapilheira coletada de área de vegetação primária. Município de Anitápolis-SC .............................................................................................................. 85 Figura 20 – Aspecto de um consórcio entre milho, mandioca, abóbora, melancia e feijão, plantados em períodos diferentes. Propriedade do Sr. Ari Dutel – Comunidade Diamantina – Município de Palmitos-SC ..................................................................... 86 Figura 21 – Esquema simplificado dos resultados ecológicos da prática do plantio direto .................................................................................................................................... 87 Figura 22 – Esquema simplificado de dinâmicas de relação com o ambiente externo à propriedade na prática do plantio direto ....................................................................... 93 Figura 23 – Esquema explicativo do resultado principal da pesquisa ........................... 99

Page 10: Processos de Aprendizagem na Agricultura

1

Resumo

A presente pesquisa sobre processos de aprendizagem na agricultura procura

compreender, a partir do acompanhamento em campo de experiências com plantio

direto, como se dão estes processos de aprendizagem, discutindo o significado e a

relevância da apropriação e da adaptação de tecnologias no ambiente da agricultura, e

identificar elementos que possam contribuir para melhorar as condições de comunicação

entre as pessoas neste ambiente, no caso, agricultores, técnicos e pesquisadores. Foram

realizadas viagens a campo em dezessete municípios do estado de Santa Catarina, onde

foram feitas reuniões e discussões sobre os objetivos acima mencionados. Além da

revisão de literatura, o estudo foi feito utilizando como abordagens metodológicas as

pesquisas empírica, qualitativa, participativa, prospectiva e situacional, acompanhadas

de ferramentas de investigação utilizadas nestas abordagens, onde o envolvimento das

pessoas no processo da pesquisa é fundamental. A partir das informações obtidas em

campo e na revisão de literatura, são feitas considerações sobre os processos de

aprendizagem na agricultura nas experiências acompanhadas, enfatizando os modos de

apropriação e adaptação de tecnologias pelas pessoas com quem houve envolvimento.

Estas considerações contém os principais resultados do trabalho.

Page 11: Processos de Aprendizagem na Agricultura

2

Abstract

The present research about learning agricultural processes aims to

comprehend, through direct seeding field experiences, how these learning processes

happen, discussing the meaning and relevancy of appropriation and adaptation of

technologies in the agricultural environment, and identify elements that may contribute

to improve the conditions of communication between people in this environment,

farmers, technicians and researchers. Field trips were made in 17 cities of Santa

Catarina's state, where meetings and discussions were held about the objectives

mentioned above. Besides the literature review, the study was made using as

methodological approach the empirical, qualitative, participative, prospective and

situational researches, together with investigation tools used in these approaches, where

the involvement of the persons in the research process is fundamental. From the

information obtained in the field and literature review, considerations are made about

the learning processes in agriculture, with focus on the appropriation and adaptation of

technologies by the persons involved. These considerations contain the main results of

the work.

Page 12: Processos de Aprendizagem na Agricultura

3

Capítulo 1 – Introdução, objetivos e justificativas da pesquisa

1.1- Introdução

Esta pesquisa procura estudar condições e características de

aprendizagem entre as pessoas, nos locais onde estas pessoas vivem. Condições e

características expressas, narradas, avaliadas e interpretadas por essas mesmas

pessoas. Trata-se de uma pesquisa sobre processos de aprendizagem, cujo foco se

deu em condições onde há agricultura, mais especificamente na procura por

aprendizagem de tecnologias de plantio direto. Portanto, os conteúdos que se

procurou com mais ênfase na presente pesquisa são referentes aos processos de

aprendizagem das pessoas, e não às características de cultivo dos solos,

equipamentos e insumos utilizados, animais criados ou épocas de plantio e colheita

de lavouras. Estes temas estiveram presentes nos diálogos durante as pesquisas de

campo, e estes diálogos aconteceram como meios para alcançar os objetivos

principais da pesquisa.

O tema “processos de aprendizagem na agricultura” pertence

simultaneamente a mais de uma área do conhecimento. Em uma primeira

avaliação, podemos identificar sua pertinência tanto às ciências agrárias quanto às

ciências da educação. Esta necessidade de fusão nos coloca o problema de

sombreamento entre os conhecimentos técnicos do manejo agronômico e os

conhecimentos técnicos da educação. O próprio conceito de “processo” já nos

serve de ponto de partida para a questão enunciada anteriormente: indica a idéia de

movimento. Os termos: processo, aprendizagem e agricultura, podem indicar essa

idéia de movimento no entendimento da sua prática. A aprendizagem como a

dinâmica de adaptação a novos contextos; a agricultura como o manejo baseado em

conhecimentos de ciclos ecológicos entre seres vivos num ambiente. Estes três

Page 13: Processos de Aprendizagem na Agricultura

4

termos: movimento, adaptação e ciclos, nos remetem à idéia de mudança

permanente, e, portanto, de contínua adaptação e readaptação dos ciclos, e por fim,

de novo à idéia básica de movimento. Daí a origem da questão: como se dão

processos de aprendizagem na agricultura?

Na agricultura, além do clima, os elementos que relacionam o solo e a

biota nele e sobre ele, em especial a presença e a disponibilidade de matéria

orgânica, e também a rotação de culturas, ciclos de nutrientes, estrutura do solo,

entre outros, referem-se a algumas condições essenciais para conservação de

condições de cultivo. A conservação dessas condições1 essenciais de cultivo pode

ser entendida preliminarmente como “sustentabilidade de sistemas2 de produção”,

se a noção de “sustentabilidade” puder ser entendida como “continuidade de

condições de existência de algo”.

Compreendido este conceito dessa maneira, parece importante fazer-se a

pergunta: quais são as características dos nossos sistemas de produção agrícola, ou

seja, o que caracteriza a sua existência?

Em diversos sistemas de produção, como em qualquer outro sistema,

poderemos encontrar elementos que os caracterizam, e a partir destas

características torna-se possível identificar funções, relações, atribuir valores de

importância e interesse, e propósitos de trabalho. Assim, verificando quais são

essas características nos sistemas de produção agrícola, caberá a pergunta: quais

são as condições necessárias para que esse sistema de produção tenha essas

características?

1 O termo condições é utilizado nesta passagem como um conjunto de fatores que determina causalmente a existência funcional de algo. Note-se que a ‘continuidade da existência’ de algo é distinta da ‘continuidade de condições de existência’, ao que chamamos aqui sustentabilidade. 2 O termo sistema é utilizado aqui como um conjunto de elementos relacionados entre si e identificado como tal por alguém, um observador e interagente, possuindo organização e interdependência das partes que o compõe, e interações com o contexto em que se encontra, características de sua estrutura funcional.

Page 14: Processos de Aprendizagem na Agricultura

5

Uma vez compreendidas as condições que afetam os sistemas de

produção, chegamos à questão: como manter as características dos nossos

sistemas de produção?

Entretanto, devido às constantes transformações ocorridas no clima, no

solo, na biota que interage com as culturas agrícolas, parece mais provável que

diariamente tenhamos de novo a mesma conclusão: não é possível manter este

sistema de produção; temos que produzir de outra maneira para termos os melhores

resultados. Voltamos então à questão do parágrafo anterior. Mas já que não

podemos manter as características dos sistemas produtivos, a questão deixa de ser

“como manter as características”, e se torna: como encontrar sistemas de produção

que possam ter suas características mantidas ao longo do tempo?

Figura 1 – Esquema explicativo da questão-chave da pesquisa

Page 15: Processos de Aprendizagem na Agricultura

6

Dito desta maneira, o problema deixa de ser a construção de um sistema

com certas características que se sustentem no tempo, e passa a ser a própria

procura por sistemas sustentáveis que cumpram com estas características, ou seja,

a questão se recoloca para como aprendemos a nos relacionar com o ambiente

natural na procura por sistemas sustentáveis, ao invés da sustentação de um

método fixo de controle sobre um sistema de produção. Eis a questão-chave para

esta pesquisa em processos de aprendizagem na agricultura. Em outras palavras, a

prioridade deixa de ser o uso do conhecimento para o controle do ambiente e passa

a ser o desenvolvimento da capacidade de aprender e se adaptar.

Inseridos nesse contexto, a percepção do ambiente e o entendimento das

suas relações internas a partir das vivências e percepções se sobressaem como

condições que propiciam que, dado um conjunto de conhecimentos de manejo

agronômico, este seja apropriado pelas pessoas (no caso, agricultores, técnicos3,

pesquisadores4, ou outros).

Uma vez que o a intervenção humana modifica o ambiente, naturalmente

ocorrem mudanças de readaptação ecológica deste ambiente, ou seja, o ambiente já

não é o mesmo que antes da intervenção5 ser realizada. Portanto, as técnicas6 que

foram anteriormente utilizadas com certas finalidades, já não terão o mesmo

resultado se utilizadas novamente; necessitam revisões, para se adaptarem a esse

novo ambiente, agora transformado pelo trabalho humano. E os processos de

3 O termo “técnicos” se refere aqui a profissionais da área da agricultura, com formação técnica, graduação ou pós-graduação, e também autodidatas que tenham reconhecimento local das pessoas para atuação como técnicos da área. 4 O termo “pesquisadores” se refere aqui a profissionais da pesquisa agropecuária pública ou privada, locados em empresas, universidades, institutos de pesquisa, ou outras instituições, e também a investigadores autônomos, que não estejam vinculados a instituições como essas. 5 O conceito de intervenção é aqui entendido como sinônimo do conceito de trabalho, onde ‘trabalho’ significa ações humanas propositais que produzem transformações no ambiente. Estas ações são mediadas por técnicas, cujo conceito se refere ao uso de conhecimentos para tal transformação. 6 O conceito de técnica é aqui entendido como o uso de conhecimentos para transformação do ambiente natural mediante propósitos, conforme a nota 3 acima.

Page 16: Processos de Aprendizagem na Agricultura

7

aprendizagem na agricultura aqui estudados são justamente estas revisões nas

técnicas que fazem parte das interações entre as pessoas e o ambiente agrícola.

A pesquisa sobre conservação ambiental é, portanto, uma busca que

pretende como resultado uma baixa modificação do ambiente pelo trabalho

humano, e deste modo, uma menor necessidade de revisão de técnicas de manejo.

Em outras palavras, aprender tecnologias de conservação ambiental propicia maior

duração e estabilidade dos conhecimentos em uso, e maior facilidade na sua

adaptação. Por isso é fundamental que essas técnicas sejam adequadamente

apropriadas pelas pessoas que as utilizam, para que estas adaptações tenham maior

eficiência quanto aos resultados esperados, e que proporcionem melhor

conservação do ambiente manejado.

Nesse contexto é que se insere o plantio direto, como tema gerador para

abordar os três objetivos básicos desta pesquisa: a) a compreensão de como se dão

processos de aprendizagem na agricultura em experiências de plantio direto, e b) a

discussão do significado e da importância dos processos de apropriação de

tecnologias na relação entre ambiente e sociedade, que c) permitem identificar

elementos que contribuam para melhor qualificar o entendimento e a comunicação

na pesquisa agronômica e no uso dessas tecnologias.

Neste primeiro capítulo, apresentam-se esta introdução, seguida da

caracterização da situação-problema estudada, onde são sintetizados a importância

e os motivos pelos quais se optou em realizar esta pesquisa. A seguir, são

apresentados os objetivos e as justificativas da pesquisa, onde se identificam

preliminarmente os temas fundamentais discutidos no trabalho: as diferenças entre

a difusão, adoção e continuidade do uso de tecnologias, seguidas por um histórico

Page 17: Processos de Aprendizagem na Agricultura

8

da difusão de tecnologias de plantio direto e da importância do plantio direto como

tema de discussão em processos de aprendizagem na agricultura.

No segundo capítulo apresentam-se o perfil e a metodologia de

pesquisa, onde se referenciam teoricamente e epistemologicamente os tipos de

pesquisa utilizados neste estudo, com a respectiva apresentação das abordagens e

justificativas para escolha destas metodologias, seguindo-se na apresentação das

etapas da pesquisa e uma descrição da sua realização.

No capítulo três, denominado processos de aprendizagem e apropriação

de tecnologias, são apresentados os elementos de desenvolvimento da pesquisa e

discutidas as questões centrais deste estudo, a partir dos referenciais teóricos e

epistemológicos apresentados no capítulo dois. Traz também considerações e

reflexões sobre os resultados referentes às dinâmicas dos processos de apropriação

de tecnologias, onde são identificados elementos relativos à comunicação e

aprendizagem. A primeira seção apresenta e discute as ferramentas de pesquisa

utilizadas em campo, com reflexões sobre seu uso e os resultados obtidos segundo

os objetivos do trabalho. Na segunda seção, constam discussões e reflexões sobre

os temas de maior relevância na pesquisa, a comunicação e a aprendizagem,

através da discussão de formas de compartilhamento e aquisição de

conhecimentos, baseados nas informações e experiências obtidas durante a

pesquisa de campo sobre a história do ambiente e aprendizagem coletiva. Na

terceira seção, apresenta-se o processo de investigação temática, um componente

fundamental na pesquisa, onde se estabelecem discussão com a literatura sobre tal

concepção de educação, tratando do tema como foco na pesquisa, tendo como

objetivo discutir a percepção e a consciência das modificações ambientais por

Page 18: Processos de Aprendizagem na Agricultura

9

parte das pessoas envolvidas, no caso, agricultores, técnicos e pesquisadores,

resultando em reflexões sobre a consciência da técnica.

O capítulo quatro apresenta uma contextualização do plantio direto nos

locais de estudo, onde são apresentados os princípios do plantio direto, e seus

contextos ecológico, técnico-pedagógico, sócio-econômico e político, abordando

os temas da pesquisa nesses contextos com base nos resultados apresentados no

capítulo três e suas conseqüentes reflexões.

Finalmente são apresentadas as conclusões, onde se faz uma reflexão

sobre processos de aprendizagem de tecnologias e comunicação no ambiente da

agricultura, que problematiza as condições de comunicação entre técnicos,

pesquisadores e agricultores. São então apresentados comentários e reflexões sobre

a realização deste estudo, e as considerações finais.

1.2- Situação Problema

As mudanças ambientais provocadas pela intervenção humana através

da agricultura exigem processos de adaptação nas tecnologias para a conservação

deste ambiente, de modo que as condições de produção possam ser mantidas ao

longo do tempo. A apropriação de tecnologias de conservação ambiental na

agricultura possibilita a continuidade e a melhoria das condições de produção,

minimizando as condições de degradação do ambiente provocadas pela atividade

agrícola. O plantio direto é estudado como uma forma de manejo agrícola em que o

trabalho é orientado à conservação do ambiente onde se mantém as finalidades

produtivas. Contudo, pesquisas realizadas por diversas instituições mostram que

atualmente existe descontinuidade, má adaptação, ou ainda não adesão no uso

dessas tecnologias, situações que indicam problemas de comunicação entre quem

desenvolve, quem difunde e quem utiliza as tecnologias de plantio direto. Essas

Page 19: Processos de Aprendizagem na Agricultura

10

pesquisas refletem o grande nível de adesão a práticas de plantio direto por um

certo período, mas que foram novamente substituídas pelo manejo convencional do

solo. Nesse contexto, se torna relevante investigar como se dão os processos de

aprendizagem na agricultura, particularmente em experiências de plantio direto,

para que sejam melhor compreendidas as dinâmicas de comunicação e

aprendizagem entre as pessoas que utilizam, difundem e desenvolvem tecnologias

para agricultura.

1.3- Objetivos

Objetivo Geral:

Compreender processos de aprendizagem na agricultura através do acompanhamento de experiências com o uso de técnicas de plantio direto

Objetivos Específicos:

Discutir o significado e a importância dos processos de apropriação de tecnologias na relação entre ambiente e sociedade

Identificar elementos que contribuam para melhor qualificar o entendimento e a comunicação na pesquisa agronômica e no uso dessas tecnologias na agricultura

1.4- Justificativas

1.4.1- Diferenças entre difusão, adoção e continuidade do uso de tecnologias

A importância da pesquisa sobre a apropriação de tecnologias de

conservação ambiental para agricultura se deve a vários motivos. Mas além (e

antes) de discutir os motivos do uso de tecnologias conservacionistas para a

agricultura, é pertinente também discutir fatores que possibilitam o uso dessas

tecnologias, como a sua apropriação7 pelas pessoas.

7 O conceito de apropriação está sendo utilizado como sinônimo de incorporação, onde o conteúdo de conhecimentos não é articulado apenas no discurso das pessoas, mas também nas suas práticas de

Page 20: Processos de Aprendizagem na Agricultura

11

Antes que seja utilizado um conteúdo tecnológico (ou uma proposta de

uso de tecnologias), ou seja, um corpo de conhecimentos que serve para a

modificação de um ambiente com determinados propósitos, este conteúdo precisa

ser apropriado pelas pessoas que se utilizarão dele, seus usuários. No caso de

tecnologias para agricultura, os critérios de uso e de continuidade deste uso

dependem diretamente dos resultados obtidos com aquelas formas de manejo

utilizadas. Porém, a própria forma de manejo agronômico já constitui o uso das

tecnologias. O problema normalmente encontrado é uma diferença existente entre

o que é difundido e o que é praticado.

Muitas vezes encontram-se situações em que o discurso dos

profissionais da assistência técnica não corresponde exatamente àquilo que é

realizado pelos agricultores (CPPP, sem data). Em um caso como este, percebemos

que há uma diferença entre a difusão e a adoção, mas que não se trata de não

adoção. Apenas que a tecnologia adotada não segue os mesmos critérios,

parâmetros, métodos, que aqueles ditos pelo profissional da assistência técnica.

Tanto o caso de não adoção quanto o caso de adoção diferenciada evidenciam

diferenças de entendimento dos conteúdos técnicos, onde estas diferenças são

devidas a questões relacionadas ao processo comunicativo. Neste processo

comunicativo, são considerados não somente os conteúdos da comunicação, sejam

tecnologias, diálogos, conceitos, palavras, mas também as pessoas que dialogam,

com suas formas de entendimento, visões de mundo, histórias de vida, contextos

sociais, enfim, seus diferentes cotidianos de existência. Estas diferenças são

significativas para o entendimento comum entre duas ou mais pessoas num

processo comunicativo.

trabalho. Em alguns casos ao longo do texto, também se discutirá a apropriação como parcial ou inexistente, casos em que se ocorre a apreensão do discurso sem sua apropriação técnica.

Page 21: Processos de Aprendizagem na Agricultura

12

Com base nisso, o problema da difusão e não adoção ou adoção

diferenciada não é simplesmente o do mau entendimento das tecnologias por parte

de agricultores. Muitas vezes, ocorre a adaptação de tecnologias feita por

agricultores, uma vez que estes conhecem seu contexto de produção, e reconhecem

os critérios a utilizar para adaptação da tecnologia. Nestes casos, pode-se julgar

que o conhecimento tecnológico não é simplesmente transferido do técnico para o

agricultor. Além de uma transferência da tecnologia, há uma avaliação de

elementos, que culmina com a sua adaptação para o uso. Em qualquer caso, tanto

no de resultados satisfatórios quanto insatisfatórios, a tecnologia utilizada pode ser

então reavaliada e melhor adaptada em um momento próximo por quem a utiliza.

Para além do entendimento simplificado de difusão-adoção de

tecnologias, há portanto um complexo8 de relações encadeadas no processo

comunicativo, que fundem cultura, estruturas cognitivas, criatividade, ideologia,

vontade e expectativa de resultados satisfatórios. Reconhecer e compreender estes

elementos, e lidar com eles de modo coeso contribui para a obtenção de melhores

resultados no uso apropriado de tecnologias, e na sua melhoria contínua.

1.4.2- Histórico da difusão de tecnologias de plantio direto

O plantio direto como tecnologia, que tem como princípios básicos o

não revolvimento do solo, sua cobertura, e a rotação de culturas,9 vem a surgir

apenas após a percepção da perda de condições de fertilidade do solo, suscitando

medidas de mitigação desta perda. Este processo pode ser enunciado como

motivador do início das pesquisas sobre plantio direto. A partir da literatura

8 Conforme a etimologia da palavra ‘complexo’: tecido junto, cujo significado nos remete à idéia de ‘rede’, ‘trama’, ‘teia’, onde as relações se entrecruzam em diferentes pontos, se tornando por sua vez interdependentes. 9 Os princípios e fundamentos do plantio direto serão apresentados no capítulo quatro, bem como a discussão do seu contexto.

Page 22: Processos de Aprendizagem na Agricultura

13

consultada, as informações sistematizadas mostram que as primeiras pesquisas

iniciaram na década de 1920, em uma estação experimental na Inglaterra.

Entretanto, experimentos sistemáticos apenas vieram a ser realizados a partir da

década de 1950, no período posterior à Segunda Guerra Mundial, com o uso de

herbicidas considerados adequados a esta função (SCHULTZ, 1987). A partir daí,

a prática do plantio direto teve grande crescimento, com o desenvolvimento de

outros herbicidas e máquinas para semeadura adaptadas para o plantio direto.

No Brasil, em 1971 foram realizados os primeiros experimentos em

Londrina, Paraná, em uma estação experimental do Ministério da Agricultura.

Logo após, em 1973, em Cruz Alta, e em Passo Fundo, em 1975, ambos no estado

do Rio Grande do Sul, também foram realizados experimentos, que fomentaram a

realização de estudos de longa duração na sede do Instituto de Pesquisa

Agronômica do Paraná, em Londrina, em 1976. Após estas ações, que se somaram

ao desenvolvimento de semeadoras com tecnologia nacional, houve o início de um

processo de institucionalização do plantio direto no Brasil (DERPSCH, 1983).

Aspectos considerados como importantes no processo de

institucionalização das tecnologias de plantio direto foram a freqüência e a

publicidade geradas a partir sucesso alcançado em alguns experimentos realizados

por centros de pesquisa oficiais. Entretanto, a despeito da publicidade, agricultores

conseguiram se manter na prática de manejo de plantio direto devido à adaptação

contínua de tecnologias desenvolvidas em centros de pesquisa, o que envolveu

muitas vezes altos custos com insumos, máquinas e equipamentos e prejuízos de

perda de produção e de fertilidade dos solos, assumidos por estes mesmos

agricultores (RUEDELL, 1995). Ainda sobre esta questão, cabe mencionar que foi

devido à contribuição direta de alguns agricultores no desenvolvimento próprio de

Page 23: Processos de Aprendizagem na Agricultura

14

experiências nas suas propriedades é que muitas das adaptações realizadas em

máquinas e em técnicas de manejo foram incorporadas pelas fabricantes de

máquinas e equipamentos. Em paralelo, devido à publicidade dos bons resultados

obtidos, estes agricultores tiveram suas propriedades visitadas por milhares de

técnicos e outros agricultores ao longo de anos, e estes conhecimentos já

sistematizados forneceram base empírica para o desenvolvimento de experimentos

em centros de pesquisa oficiais (MONEGAT, 1996).

Devido a essas condições, o crescimento da área manejada em plantio

direto no Brasil entre 1972 e 1984 foi de cerca de 4.000 vezes (DERPSCH, 1983),

e entre 1984 e 1995, de cerca de 1.000 vezes (MONEGAT, 1996). Supõe-se que o

os elementos motivadores para este grande crescimento do uso da tecnologia seja

devido à propagação de narrativas de sucesso por agricultores, técnicos e

pesquisadores. Mas o que teria criado condições para que a difusão e a

transferência de tecnologias de plantio direto tivessem tanta publicidade de êxito?

Percebe-se que ao lado dos principais eventos de divulgação das tecnologias de

plantio direto, sempre estiveram as indústrias fabricantes de herbicidas, onde estas

realizaram patrocínios e convênios com institutos de pesquisa do Estado

(LAMARCA, 1994). Do mesmo modo, percebe-se que as experiências de plantio

direto sem o uso de herbicidas não estiveram na pauta de publicidade dos institutos

oficiais de pesquisa, tampouco nos eventos patrocinados pelas empresas

fabricantes destes insumos.

Destacados entre os principais benefícios, o controle da erosão, o

aumento da produtividade e da renda dos agricultores, entram certamente os lucros

destinados às empresas químicas. Contudo, dificilmente foram mencionados em

eventos científicos ou outros meios de divulgação de tecnologias agronômicas as

Page 24: Processos de Aprendizagem na Agricultura

15

histórias de prejuízo e fracasso, de intoxicações, de contaminações ambientais, de

abandono da tecnologia, entre outros problemas gerados em locais em que vem

havendo a prática do plantio direto nos últimos 50 anos (MONEGAT, 1996). Mas

se por um lado houve escassez de divulgação de informações sobre conseqüências

negativas do plantio direto, por outro houve um grande avanço na difusão das

tecnologias, mesmo sendo carentes de adaptação aos diferentes contextos agrícolas

existentes. Contrapondo estas duas questões: a publicidade do sucesso e a

desinformação sobre os problemas, compreende-se por que o plantio direto obteve

tão grande expansão como tecnologia junto a centros de pesquisa e organizações

de agricultores. Da mesma forma, devido à escassez de informações sobre as

dificuldades técnicas e problemas inerentes ao uso da tecnologia conforme vinha

sendo difundida, torna-se compreensível por que grande parte dos incentivos à

adoção do plantio direto não foram suficientes para que muitos agricultores

abandonassem uso da tecnologia após algum tempo de adesão e experiência.

No percurso do processo de aprendizagem e apropriação de tecnologias

por agricultores, técnicos e pesquisadores, talvez não bastassem apenas histórias de

sucesso de alguns agricultores, e poucos experimentos bem sucedidos na

apropriação e adaptação de tecnologias por institutos oficiais de pesquisa. Em

paralelo a estas ações, a presença permanente das indústrias químicas incentivou,

fortaleceu e financiou a publicidade e a difusão do desenvolvimento do plantio

direto baseado no uso de equipamentos e insumos químicos (MONEGAT, 1996).

1.4.3- Importância do plantio direto como tema de discussão

O uso de tecnologias de agricultura que objetivem a conservação

ambiental necessita que, para que ocorra um processo de apropriação de

tecnologias, além de considerar as condições de aprendizagem, deve-se também

Page 25: Processos de Aprendizagem na Agricultura

16

notar a exigência de um contexto onde as tecnologias se realizem. Essas exigências

no campo de investigação das apropriações de tecnologias consideram o contexto

da agricultura, onde as pessoas estão inseridas como usuários das tecnologias, cujo

propósito é a conservação e melhoria das condições de produção (REINTJES,

1999). A base para a construção e a adaptação de tecnologias na agricultura, se

deve à compreensão de ciclos ecológicos e suas relações internas, pois constitui

reconhecer relações cíclicas em um espaço e em um tempo. Isto exige das pessoas

seu envolvimento neste espaço e tempo, de modo que a apropriação dessas

tecnologias é a própria condição fundamental para que as adaptações possam ser

realizadas a partir da compreensão do ambiente em que se situam.

O plantio direto entra neste contexto por mobilizar múltiplos elementos

que constituem o ambiente da agricultura, e por propiciar que seja direcionada a

atenção para comparações entre distintas formas de manejo. Seguindo os princípios

norteadores das tecnologias de plantio direto, temos um ambiente trabalhado que

contém rotação de culturas, cobertura e não revolvimento do solo (PAULETTI,

1999). Estes três elementos, tanto isoladamente quanto em conjunto, propiciam a

compreensão de variadas relações ecológicas existentes no ambiente do solo, se

comparadas a solos em que não se utilizam estas práticas culturais. Potencializam,

portanto, a percepção de diferentes processos, como a erosão, com perda de solo,

matéria orgânica e de nutrientes, formação de raízes, estrutura do solo, umidade,

temperatura, presença de minhocas, insetos e outros animais, e o aparecimento de

plantas espontâneas. A percepção destes elementos e a compreensão das relações

que eles têm entre si fomentam a formulação de questões que procurem explicar as

causas de processos que ocorrem nos cultivos, como os citados acima

(MONEGAT, 1998). Formuladas e apropriadas estas questões pelos próprios

Page 26: Processos de Aprendizagem na Agricultura

17

usuários das tecnologias, sejam agricultores, técnicos ou pesquisadores, tornam-se

mais consistentes os entendimentos necessários à adaptação de tecnologias, assim

como ganham explicações melhor contextualizadas as avaliações dos desempenhos

obtidos no uso dessas tecnologias.

O reflexo direto da percepção das condições edáficas e biológicas de

cultivo é a busca por explicações causais sobre as mudanças verificadas entre

sistemas de plantio direto e outros sistemas que não utilizem estas práticas. Uma

vez encontradas estas explicações para as relações causais percebidas, ou seja, a

apropriação dessas explicações, se torna possível a adaptação conseqüente das

tecnologias (JANTSCH, 1997).

Sinteticamente, é preciso a) perceber a existência de transformações no

ambiente, para b) formular perguntas sobre as causas, e então c) responder a estas

perguntas, encontrando as causas, para finalmente d) propor soluções baseadas no

conhecimento que se passou a ter sobre o ambiente.

Figura 2 –Esquema de percepção de causas e conseqüências das ações no ambiente

Considerando que condições ecológicas dependem de múltiplos fatores,

normalmente diferentes uns dos outros em diferentes lugares, épocas do ano, e

também de um ano a outro (ou seja, o contexto da agricultura é um contexto de

Page 27: Processos de Aprendizagem na Agricultura

18

permanente mudança), estas condições ecológicas exigem que o aprendizado sobre

elas seja contínuo (ou seja, que é contínuo o processo de apropriação de

tecnologias para agricultura). Deste modo, os princípios e práticas de plantio direto

reúnem condições básicas de verificação, avaliação e proposição de soluções para

as permanentes mudanças percebidas nos ambientes de cultivo, servindo como

tema de discussão para processos de aprendizagem na agricultura.

Page 28: Processos de Aprendizagem na Agricultura

19

Capítulo 2 - Perfil e metodologia de pesquisa

2.1- Apresentação e justificativas do tipo de pesquisa adotado

Uma questão fundamental desta pesquisa é considerar as relações entre

os elementos envolvidos. Dessa questão se segue que além dos objetivos da

pesquisa e de sua metodologia, há também que se considerar como elementos

desse conjunto de relações, os objetos de pesquisa, e a figura do pesquisador.

Relacionados, pesquisador, metodologia de pesquisa, objetivos e objetos são a

reunião das condições de pesquisa necessárias ao seu desenvolvimento (BOGDAN,

1994). Assim, as tendências que se expressam a partir das vontades, perspectivas,

intenções, enfim, que são os motivadores que emergem da história do pesquisador.

Essas expressões são, antes de tudo, fundamentais na constituição e nas

possibilidades da pesquisa, porque sem elas não haveriam condições de pesquisa,

nem conhecimentos do pesquisador, e porque são elas que determinam sua visão

de mundo e as potenciais mudanças de visão de mundo que a própria pesquisa

proporciona (BITTENCOURT, 1994). Em outras palavras, os conhecimentos

prévios da figura do pesquisador determinam sua visão de mundo, e portanto, as

escolhas pela metodologia de pesquisa a ser utilizada, e também os objetivos, e a

forma de perceber os objetos a pesquisar.

Nessa perspectiva, pesquisador e objetos da pesquisa estão

completamente relacionados, uma vez que os próprios objetos são vistos pelo olhar

de alguém que possui uma história e uma visão de mundo, um modo de vê-los.

Nesse contexto, o que se investiga são as relações que têm entre si, pesquisador e

objetos, que são organizadas em forma de conhecimentos, e estes são

sistematizados com o uso de metodologias de investigação (GROSSI, 1991). Em

síntese, o que se procura não são objetos puros na natureza, e nem subjetividades

Page 29: Processos de Aprendizagem na Agricultura

20

desconectadas do ambiente de investigação. Pelo contrário, o que se procura é

reconhecer que os contextos de investigação não existem na neutralidade de um

pesquisador que se pretende fora do mundo que observa, um observador que

conheceria os objetos conforme eles são, como se seu olhar não fosse

condicionante do que está sendo visto e transformado em conhecimento. O que se

procura é reconhecer que os objetos de investigação só podem ser investigados por

um sujeito pesquisador, e isso envolve sua história, e a história do ambiente onde a

pesquisa se empreende (CARDOSO, 1997).

Além das abordagens metodológicas utilizadas, cumpre ressaltar que as

opções epistemológicas feitas na constituição desta pesquisa estão inseridas na

perspectiva histórica, onde a busca não deve ser encarada como um primado da

existência natural dos objetos, nem tampouco da perspectiva imperativa dos

sujeitos. É da interação entre sujeitos e objetos, devidamente reconhecidos como

condições de possibilidade de conhecimentos, é que emergem as interpretações

metodológicas utilizadas na pesquisa (ARAÚJO, 1993).

Não se trata simplesmente da transposição de um paradigma positivista

para um construtivista. Reconhece-se que o positivismo e o construtivismo são

epistemologias que se aplicam a ciências, e que portanto servem ambas como

condição de possibilidade de produção de conhecimentos científicos. A discussão

epistemológica que se empreende aqui reconhece diferenças básicas entre

metodologias alinhadas às duas epistemologias citadas acima, onde no positivismo,

as metodologias se pautam por uma postura na pesquisa em que existe a crença de

que a realidade é uma e única, e que a ciência tem o ideal de ser o espelho da

natureza (RORTY, 2004), e no construtivismo, os conceitos de realidade e de

objetos são derivados da postura de pessoas, sujeitos, que compreendem que este

Page 30: Processos de Aprendizagem na Agricultura

21

conceito é articulado e produzido por alguém, observador, investigador, pessoa,

que devido à sua história e memória, vê o mundo a partir de suas próprias

condições (PINHEIRO, 2000).

A leitura e a reflexão sobre as diferenças acima pode tanto impulsionar

para a dicotomia entre uma postura objetivista e outra subjetivista, quanto pode

fazer clara a distinção de que, positivistas, construtivistas, ou quaisquer outras

abordagens epistemológicas são reflexos de pessoas, seus modos de articulação e

organização do conhecimento. Desta forma, tais pessoas partilham tanto de

pensamentos, comportamentos, atitudes ou propósitos objetivos quanto subjetivos,

e é na construção da história de cada pessoa, dia após dia, é que estes

comportamentos, atitudes, propósitos e pensamentos vão sendo vividos, utilizados,

experienciados.

Em outras palavras, além da acepção da historicidade na teoria do

conhecimento, a concepção epistemológica utilizada nesta pesquisa possui relação

direta com um caráter ontológico sobre a noção de história. Esta concepção discute

as condições de viabilidade de certezas sobre a existência real de objetos ou

sujeitos (KANT, 1977), que perpassam os problemas filosóficos da atomicidade e

do contínuo, e também da sucessão e da duração (LEIBNIZ, 1977). Pela expressão

derivada da lógica, denominada indecidibilidade (MORTARI, 2001), presente nos

problemas do contínuo e da duração, deriva também a duplicidade ontológica da

existência de sujeitos e objetos. Dessa indecidibilidade lógica formalizada pelos

problemas do contínuo e da duração, emergem igualmente os problemas

fenomenológicos da distinção entre sentido e significado, forma e conteúdo da

apreensão, e suas representações (HUSSERL, 1994). Daí resulta a distinção

semiológica, discursiva, entre sujeitos e objetos (FOUCAULT, 1995), mas não a

Page 31: Processos de Aprendizagem na Agricultura

22

sua distinção existencial, que teria caráter ôntico, não compatível com a acepção

epistemológica aqui utilizada.

Por estas questões, que não serão aprofundadas neste texto por fugirem

aos limites propostos pelos objetivos, opta-se pela presente perspectiva

epistemológica, comumente denominada de complexidade, onde se assume que

abordagens duras ou macias são igualmente válidas, sendo as possíveis distinções

de valor epistemológico realizadas por quem as utiliza. Cabe destacar que dentre

muitas possibilidades de definição do conceito de complexidade, as duas escolas

com as quais há convergência epistemológica são as articuladas pelas

contribuições de Edgar Morin, fundamentadas em seu trabalho chamado “O

Método” (MORIN, 1996), e aquelas produzidas por diferentes pesquisadores,

vinculados ao Instituto Santa Fé (GUELL-MANN, 1991). Mesmo distintas uma da

outra por orientações a objetos diferenciados, estas duas escolas trabalham com

conceituações convergentes sobre as implicações da atividade de investigação

científica, a cujo resultado denominam “ciências de complexidade”, em atividade

transdisciplinar. Ao adotar tal perspectiva epistemológica, não incorre

compulsoriamente a necessidade do uso exclusivo das mesmas metodologias

utilizadas por estas escolas, uma vez que o que varia são as formas de

interpretação destas metodologias, e não necessariamente elas próprias.

2.1.1- Abordagens metodológicas utilizadas nesta pesquisa

São utilizadas nesta pesquisa algumas abordagens complementares umas

às outras, que partilham muitas vezes pressupostos comuns, onde cada uma tem

peculiaridades com relação às outras. Essas abordagens metodológicas poderiam

Page 32: Processos de Aprendizagem na Agricultura

23

ser expressas também por seus duplos10, ou seja, serem expressas por aquilo que

elas procuram complementar através da crítica que fazem à metodologia que lhe é

diretamente oposta. Além disso, por serem abordagens utilizadas em diferentes

áreas do conhecimento há longo tempo em cada uma delas, tomaram conceituações

diferenciadas em função dos tipos de contextos aos quais se destinam os conceitos

articulados, e muitas vezes, o entendimento de um mesmo conceito (concernente a

uma abordagem) em uma área do conhecimento pode ser entendido de outra forma

por outras pessoas em outra área do conhecimento. Ressalte-se que a opção por

estas abordagens não implica na não aceitação de outras abordagens, mas apenas

que, dentre muitas possibilidades metodológicas, optou-se por algumas. Abaixo

uma apresentação das abordagens utilizadas, empírica, qualitativa, participativa,

prospectiva e situacional, com seus respectivos duplos que acima foram

mencionados como possíveis opostos.

A abordagem empírica, predominante entre as ciências humanas, é

caracterizada basicamente pela idéia de que o conhecimento possível sobre os

objetos se dá através da percepção continuada, em um sistema de aprendizagem

onde a verificação e o reforço das impressões apreendidas são feitos mediante a

experiência do observador (SILVA, 1991), sem a necessidade, e muitas vezes sem

a possibilidade, de um controle quantitativo dos resultados das observações. As

ciências de base empírica são, portanto, dotadas de caráter explicativo que depende

de um domínio discursivo baseado na linguagem textual, onde o rigor

metodológico se concentra na verificabilidade dos resultados obtidos por outras

observações (SCHRADER, 1978). São ciências de base empírica aquelas voltadas

especialmente a fenômenos dotados de múltiplas causas não mensuráveis formal e 10 O conceito de ‘duplo’ é uma referência ao modo como Michel Foucault, no seu livro “As Palavras e as Coisas”, já citado, menciona a duplicidade de entendimentos que conceitos e discursos podem ter, sem que tais conceitos sejam necessariamente opostos ou contraditórios entre si.

Page 33: Processos de Aprendizagem na Agricultura

24

analiticamente, como a publicidade, o jornalismo, as relações públicas, a

sociologia, a antropologia, a política, a psicologia, a pedagogia; e também algumas

formas de interpretação de fatores vinculados a outras ciências, como a geografia,

a economia, entre outras. A diferença básica entre estas ciências e as ciências de

base experimental, é que os objetos das ciências empíricas não podem ser isolados

do seu meio para observação em laboratório, com variáveis controladas de

observação (GEERTZ, 2001). Em casos como estes, a perda de relações

contextuais produz transformações no comportamento dos objetos, resultando em

mudanças no perfil de resultados de observação, a partir do que se torna inviável a

verificação experimental nestas ciências (RODRIGUES, 1996). Exemplos úteis

podem ser obtidos a partir de comparações entre metodologias de verificação de

hipóteses para a física e a sociologia, ou para a química e a publicidade. Em

química ou em física pode-se isolar com grande margem de acerto os objetos em

condições de verificação de fenômenos reativos, para que não haja perturbações

externas durante os experimentos. No entanto, em sociologia ou em publicidade, o

isolamento dos objetos, no caso, as pessoas, de seu convívio sócio-ambiental retira

as próprias condições de observação das reações, já que estas reações são

provenientes de relações de convivência não isolada, e sim contextual.

A pesquisa qualitativa, também predominante entre as ciências

humanas, tem um caráter muito semelhante ao da pesquisa empírica, uma vez que,

o que se observa são as qualidades dos objetos, e não suas quantidades

(HAGETTE, 1997). Em outras palavras, ao invés de mensuração analítica, as

observações e conclusões sobre os objetos são obtidas a partir da verificação de

características nas qualidades, e não nas quantidades que estes objetos apresentam

(SCHRADER, 1978). Isso pode ser melhor explicado se pretendemos comparar,

Page 34: Processos de Aprendizagem na Agricultura

25

por exemplo, os fatores de crescimento de dois aspectos distintos em populações

humanas. No primeiro caso, analisamos quais os fatores de crescimento do

percentual de casos de mortalidade infantil em uma população. No segundo caso,

analisamos quais os fatores de crescimento do percentual de casos de violência

familiar na mesma população. No primeiro caso, os parâmetros de identificação

utilizarão como base, entre outros fatores, as qualidades e quantidades de ingestão

diária de nutrientes pelas pessoas, bem como a incidência de doenças relacionadas

à desnutrição. No segundo caso, a pesquisa não terá como se basear em fatores

numéricos como a quantidade de alimento A ou B, nem na de incidência de

doenças C ou D. Diferentemente, os fatores avaliados não estão isolados de um

contexto sócio-ambiental maior, e qualquer mudança em uma condição implica em

mudanças em diversas outras condições. Sinteticamente, a pesquisa qualitativa se

baseia em informações onde a avaliação não se dá exclusivamente em mensuração

experimental ou quantitativa, mas em observação e avaliação empíricas, onde

possíveis conclusões são devidas à consideração simultânea de múltiplas causas e

efeitos.

As abordagens participativas na pesquisa se fundam, entre outros

elementos, sobre a percepção de que grande parte dos conteúdos apreendidos em

investigações são oriundos de conceitos já existentes antes da pesquisa. Com base

nesta premissa, decorre que muitas das vezes, em pesquisas de base empírica, as

observações e conclusões obtidas pelo pesquisador são antes uma forma de ver o

mundo, forma tal que já era preexistente com relação à própria pesquisa (PIAGET,

1977). Em outras palavras, porque estamos condicionados a ver as coisas de uma

certa perspectiva, com um conjunto estruturado de explicações sobre o mundo, ao

nos depararmos com relações novas, imediatamente procuramos adequar estas

Page 35: Processos de Aprendizagem na Agricultura

26

novas relações em nossas maneiras de explicá-las. Ocorre que com o

desconhecimento de relações contextuais locais, ou de comportamentos sociais e

culturais, entre outros, nossa percepção do mundo carece de rigor e de parâmetros

de verificação (SILVA, 1991). Para este envolvimento, é fundamental

compreender as lógicas próprias de funcionamento daqueles comportamentos

sociais, culturais, de domínios discursivos, enfim, é fundamental que os

interagentes na pesquisa participem ativamente de todas as etapas da pesquisa, pois

são o termo-médio de referência para uma pesquisa que procura compreender os

contextos que tenta explicar (BRANDÃO, 1988). Algumas das distinções básicas

entre pesquisas participativas e pesquisas que prescindem da participação dos

interagentes são que na pesquisa participativa, o pesquisador parte do pressuposto

que a pessoa interagente possui conhecimentos que ele próprio, pesquisador, não

possui, e que estes conhecimentos só são acessíveis se o interagente se envolve na

pesquisa. Além disso, um outro pressuposto da pesquisa participativa é que ambos,

pesquisador e interagente, não possuem o conhecimento almejado, mas que este

pode se tornar acessível a ambos a partir da reunião dos conhecimentos deles, e da

interação entre eles. Estas duas distinções são de caráter metodológico, e

correspondem a diferenças de resultados na obtenção de informações e produção

de conhecimentos. Uma terceira diferença entre a pesquisa participativa e outros

tipos de pesquisa que não envolvem a participação é a de que na participação, os

parâmetros, metodologias e resultados de pesquisa não são impostos pelo

pesquisador ou por um método científico analítico-reducionista, que prescinde de

conhecimentos locais, mas são construídos em conjunto com os interagentes, sejam

estes pesquisadores ou usuários da pesquisa (DEMO, 2001). Esta distinção é de

Page 36: Processos de Aprendizagem na Agricultura

27

caráter ético e político, e não por isso deixa de ter função na produção de

conhecimento científico.

A pesquisa prospectiva se caracteriza pela indeterminabilidade dos

resultados, que são apresentados como possibilidades resultantes de múltiplos

fatores variáveis e não controlados. A idéia central da abordagem prospectiva na

pesquisa é com relação aos resultados, onde a noção de previsibilidade cede lugar

à noção de possibilidade. Assim, a prospecção de resultados apresenta a construção

de cenários com múltiplos elementos relacionados, ao invés de previsões baseadas

em princípios simples (GEERTZ, 2001). Exemplos básicos de resultados

prospectivos podem ser obtidos em cenários macroeconômicos para horizontes de

tempo de médio e longo prazo, ou para dinâmicas climatológicas, ou ainda para

previsões de safra. O nível de precisão destes cenários, por maior que possa ser

obtido, será invariavelmente inferior ao nível de acerto em previsões de eclipses,

ou da trajetória de cometas, ou do comportamento químico na reação controlada de

duas substâncias. Da mesma forma, cenários podem ser construídos para sistemas

sociais, tanto quanto para outros sistemas ambientais (VIEIRA, 1993). Nestes

casos de construção de cenários, ocorre que nem todas as variáveis numéricas

inseridas possuem relações fixas, previsíveis, estáveis e/ou conhecidas, razões

pelas quais essas variáveis ou as relações que têm entre si podem receber

tratamento como informações qualitativas (FRANCELIN, 2003), e não

quantitativas, resultando na indeterminação formal quanto aos resultados das

prospecções (OLIVEIRA, 1998, LANGTON, 1990). A diferença básica entre a

pesquisa prospectiva e a pesquisa preditiva é que as prospecções não podem

oferecer garantias absolutas quanto aos resultados, ao contrário do que se espera

das predições. Justamente por isso, a abordagem prospectiva produz resultados

Page 37: Processos de Aprendizagem na Agricultura

28

mais satisfatórios em contextos de complexidade, onde as relações entre variáveis

não possuem comportamento perfeitamente previsível.

A pesquisa situacional se caracteriza por se inserir no contexto de

pesquisa definido, ou seja, conceber a própria pesquisa inserida no contexto a ser

pesquisado. Este tipo de pesquisa é utilizado quando as questões de investigação

não podem ser apropriadamente formuladas à distância, como por exemplo em

pesquisas etnográficas, aonde a própria lógica de formulação das perguntas já

pertence a uma certa cultura, a um certo padrão de pensamento, interpretação e

explicação do mundo (MACHADO, 1994). Nestes casos, estar situado significa

participar da própria lógica de entendimento que caracterizará os resultados da

pesquisa. O caso contrário, em que a postura do pesquisador é distante do contexto

a ser pesquisado, as condições de formulação de metodologias de pesquisa são

abstratas, desvinculadas das lógicas próprias que regem o contexto de pesquisa.

Nesta abordagem, entende-se que os objetos não se comportam de maneira

uniforme em todos os contextos de investigação, apresentando, pelo contrário,

comportamentos diferentes conforme a existência de diferentes conjuntos de

relações entre os componentes daquele contexto (MALINOWSKI, 1990), ou seja,

porque mudam os contextos, mudam as condições de investigação. Situações de

aplicação de uma pesquisa de abordagem situacional são encontradas em diversos

contextos, como por exemplo a agricultura, a comercialização de produtos ou a

aviação (OLIVEIRA, 1998). Em qualquer um destes exemplos, os componentes

locais, situados no lugar em que se dá a investigação, é que determinam os

resultados da pesquisa. Conhecer os atributos do solo e as interações ecológicas da

biota edáfica; conhecer os hábitos de compra dos consumidores e o perfil da

concorrência; conhecer as dinâmicas existentes de nuvens e ventos; todos estes

Page 38: Processos de Aprendizagem na Agricultura

29

elementos condicionam as interações entre os objetos pesquisados e o contexto em

que estes objetos se inserem. A diferença básica entre a abordagem situacional e

uma abordagem não abstrata11, é que para conhecer uma situação, é necessário

haver condições de acesso às informações que ela dispõe (OLIVEIRA, 1998). Em

uma pesquisa onde as hipóteses são elaboradas à distância, ou seja, de maneira

abstrata, o desconhecimento das condições locais das variáveis traz grande

incerteza quanto aos resultados da pesquisa, razão pela qual deve-se conhecer

localmente a situação a ser pesquisada.

2.1.2- Justificativas dos tipos de pesquisa utilizados

Pela própria característica geral da pesquisa não possuir uma

objetividade fechada quanto aos resultados, uma vez que o que se busca é conhecer

o que há de novidade feito pelas pessoas, ou seja, sua criatividade, a participação

do pesquisador na pesquisa se faz essencial, não somente como observador

(ESPOSITO, 1994), mas como interagente. Em uma pesquisa como essa, é

fundamental considerar que a própria postura do pesquisador condiciona os

resultados da pesquisa (OLIVEIRA, 1998b). Se assumo como ponto de partida que

vou conhecer as coisas como elas são, como se a realidade estivesse dada, o que

teria a fazer numa pesquisa de campo seria apenas observar, registrar, catalogar,

escrever, e depois publicar (MERQUIOR, 1985). Mas o que se procura aqui é uma

construção conjunta da teoria, baseada na prática já existente (MALINOWSKI,

1990, p. 40). Nesta abordagem, o pesquisador não é um fotógrafo da realidade,

mas um agente, que tem como função conviver para conhecer. Compreender os

contextos locais significa diretamente reconhecer características do próprio local;

11 O conceito de abstração é aqui utilizado como referência a algo que é imaginado como condição padrão, sem verificação local sobre a funcionalidade dos resultados deste padrão, como em pesquisas realizadas em laboratórios, com o isolamento de variáveis consideradas não significativas.

Page 39: Processos de Aprendizagem na Agricultura

30

características que podem ser vistas por diferentes olhares, por diferentes

disciplinas (PIAGET, 1977). Um agrônomo provavelmente verá coisas diferentes

do que verá um psicólogo, ou um físico, ou um sapateiro. Reconhecer perspectivas

implica que, “assim como a navegação, a jardinagem e a poesia, o direito e a

etnografia também são artesanatos locais: funcionam à luz de um saber local. (...)

No entanto, essa sensibilidade pelo caso individual pode tanto dividir como unir”

(GEERTZ, 2001, p. 249). Reconhecer normas locais em contextos sociais

específicos é uma ação favorecida por um olhar participante, moldável, quase

mimético. Para isso, “existem algumas qualidades essenciais que o pesquisador

deve possuir para ter sucesso em suas entrevistas: interesse real e respeito pelos

seus pesquisados, flexibilidade e criatividade para explorar novos problemas.”

(GOLDENBERG, 2000, pp. 56-57). Estabelecer problemas de pesquisa à distância,

portanto, não é sempre funcional, não é sempre concreto (CICOUREL, 1990,

p.87). Em outras palavras, nem sempre conduz a respostas efetivas, como as que

esperamos obter quando aplicamos um questionário que segue nossa própria lógica

de formulação das perguntas. “Nada pode ser imposto, por mais que, na prática, em

toda comunicação apareçam componentes estratégicos inerentes. (...) Sem impor, a

análise pode sugerir contextos de reflexão crítica e autocrítica, pela qual é viável

fomentar estratégias emancipatórias e dinâmicas de mudança social orientadas pelo

bem comum.”(DEMO, 2001, pp. 74-75)

Assim, entende-se aqui como parâmetro fundamental que a perspectiva

subjetiva é determinante da percepção do pesquisador, de modo que o acesso

objetivo às condições de pesquisa não prescinde do sujeito pesquisador. Além

disso, se prioriza abordar as questões de investigação considerando sua

complexidade (LEWIN, 1994), sem simplificações arbitrárias para condições

Page 40: Processos de Aprendizagem na Agricultura

31

controladas de observação por parte do pesquisador, e também, que nestas

condições, o que se busca não é um conhecimento objetivo e simplificado, um

retrato da realidade, mas um contexto complexo, eminentemente não previsível,

não controlável, não quantificável (SILVA, 1991, pp. 43-121; VELHO, 1999).

Ressalte-se que o enfoque e a abordagem participativa, assim como a qualitativa,

são associados e complementares a outras formas de pesquisa (ARAUJO, 1993),

uma vez que os critérios para escolha de uma ou outra metodologia levam em

conta a sua adequação ao que vai ser pesquisado. Em síntese, o que se prioriza aqui

não é uma metodologia como “melhor” ou “pior” que a outra, mas que suas

diferenças se enunciam na escolha do tipo de conhecimento que buscamos

produzir, e do tipo de investigação que pretendemos realizar (PIAGET, 1977).

2.2- Etapas da pesquisa

Elaboração do Projeto de Pesquisa

O projeto de pesquisa orienta todo o percurso da investigação. Ao serem

traçados objetivos e metodologia, boa parte da própria pesquisa já estava

condicionada à forma de obtenção de informações. Por esta razão o projeto de

pesquisa procurou ser escrito de modo aberto e flexível, propiciando que as

questões-chave de orientação da investigação fossem inclusive melhor

compreendidas durante as etapas de pesquisa que se seguiram.

Da mesma forma, o cronograma proposto na primeira versão do projeto

foi reformulado, em função de diferentes contingências relacionadas às condições

de pesquisa, tanto do pesquisador para idas a campo e dedicação ao trabalho de

investigação, quanto situações externas, como a disponibilidade de entrevistados e

eventos nas comunidades, entre outros fatores.

Page 41: Processos de Aprendizagem na Agricultura

32

Assim, o projeto de pesquisa não teve em nenhum momento a função de

servir como fonte exclusiva de questões que deveriam ser respondidas. Pelo

contrário, serviu como roteiro a partir do qual todo o percurso da investigação

procurou caminhar, e por isso mesmo este projeto foi repetidamente alterado em

detalhes, cronograma, e algumas vezes até em reorientação de objetivos, uma vez

que as informações obtidas em campo muitas vezes tornavam claro que as questões

formuladas precisavam de ajustes para que fossem melhor trabalhadas.

Revisão de Literatura

A revisão de literatura teve a função básica de trazer informações sobre

conhecimentos de outros pesquisadores e grupos de pesquisa sobre os assuntos

tratados, servindo como fonte de referência para a discussão e para a formulação

das questões, para a metodologia de trabalho, e para os resultados obtidos.

Como esta pesquisa trata de áreas de fronteira entre a agronomia, a

ecologia, a pedagogia e a sociologia, entre outras, a revisão de literatura não pode

se concentrar exclusivamente em uma delas, e pelo mesmo motivo as formas de

acesso e tratamento de informações muitas vezes tiveram diferenças entre si, a

partir dos modos normalmente utilizados em cada uma destas áreas do

conhecimento. Por esta razão as metodologias utilizadas priorizam a prudência em

não excluir outras formas de conhecimento, e a revisão de literatura procurou

seguir o mesmo princípio.

Dentre os livros, artigos e outras fontes consultadas, destacaram-se

aqueles relacionados às metodologias de pesquisa social e em educação, e também

aqueles relacionados às práticas de plantio direto. Outras fontes de referência

foram utilizadas no intuito de encontrar elementos em áreas convergentes, como

em economia, ecologia básica e filosofia da ciência, pois não haviam sido

Page 42: Processos de Aprendizagem na Agricultura

33

encontradas diretamente nas bibliografias consultadas como principais. Por

exemplo, em muitos casos, no acompanhamento de visitas de campo, as consultas

às bibliografias que tratam especificamente de plantio direto concentram-se em

manejo do solo, de plantas espontâneas. Mas essas bibliografias não abordam

questões relativas à interação social ou a pressupostos teóricos de comunicação, e

alguns diálogos com agricultores, técnicos ou pesquisadores exigiam justamente

conhecimentos que fornecessem consistência teórica aos processos comunicativos

em curso, razão pela qual, mesmo acompanhando experiências de plantio direto, a

pesquisa em outras áreas além do plantio direto foi radicalmente necessária.

Pesquisa de Campo

A pesquisa de campo teve a função básica de comparar os resultados

obtidos junto às literaturas disponíveis, e avaliar eventuais novas questões e

resultados sobre o tema da pesquisa.

Baseada na utilização de ferramentas que priorizam a participação das

pessoas na pesquisa, as visitas de campo foram realizadas com o intuito de

conhecer pessoas e instituições nos seus contextos de vida e trabalho.

No total, durante o período da pesquisa, entre os meses de Junho de

2005 e Novembro de 2006, foram visitados, 17 municípios, totalizando 107 dias

em que foram realizadas pesquisas de campo, através de entrevistas e/ou reuniões

com agricultores, técnicos e pesquisadores.

Page 43: Processos de Aprendizagem na Agricultura

34

Figura 3 – Mapa Ilustrativo do estado de Santa Catarina com os municípios visitados na pesquisa

de campo. Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2005.

No quadro abaixo encontram-se os locais visitados na pesquisa, onde

houve a organização ou inserção em reuniões e oficinas, o acompanhando de

projetos em andamento, visitas a instituições, experimentos e a residências de

agricultores.

Região Municípios Dias Set 05

Out 05

Nov 05

Dez 05

Jan-Mar 06

Abr 06

Mai 06

Jun-Ago 06

Set 06

Out-Nov 06

Oeste

Anchieta 2 x x

Chapecó 6 x x Dionísio Cerqueira

2 x x

Guaraciaba 2 x x

Novo Horizonte 3 x Palmitos 12 x x x

São Lourenço do Oeste

1 x

São Miguel do Oeste

5 x x

Alto Vale do Itajaí

Alfredo Wagner 2 x x

Ituporanga 26 x x x x

Grande Florianópolis

Águas Mornas 32 x x x x x x

Santo Amaro da Imperatriz

3 x

Planalto Serrano

Bom Jardim da Serra

2 x x

São Joaquim 4 x x

Urubici 2 x x

Encostas da Serra Geral

Anitápolis 1 x Santa Rosa de Lima

2 x

Total 107

Quadro 1 – Municípios visitados, regiões, dias e meses de visita.

Page 44: Processos de Aprendizagem na Agricultura

35

Durante as visitas, as ferramentas de pesquisa utilizadas procuraram

compreender aspectos locais da história de manejo da agrobiodiversidade para a

conservação do solo, antes e agora; o papel e a inserção do plantio direto e

tecnologias associadas; processos de aprendizagem e apropriação das tecnologias

de conservação do solo e o impacto territorial do uso destas tecnologias. Com base

nestas questões e no uso das ferramentas de pesquisa, foram buscadas informações

que contribuíssem na discussão e consecução dos objetivos propostos nesta

pesquisa.

As ferramentas de pesquisa utilizadas em campo foram entrevistas semi-

estruturadas, individuais ou grupais; mapa das propriedades e das comunidades;

história das propriedades e das comunidades; diagramas orientados a interesses e

influências, diagramas de fluxos orientados à relação entre manejo da propriedade

e fluxo de capital. A descrição e detalhamento do uso dessas ferramentas

utilizadas em campo é feita na seção 3.1.

Na Região Oeste foram realizadas visitas nos meses de Setembro e

Outubro de 2005, Julho, Outubro e Novembro de 2006, totalizando 33 dias de

campo, onde foram realizados diálogos com atores sociais, visitas a 62 residências

de famílias de agricultores, acompanhamento de projetos em andamento, e visitas a

experimentos.

Page 45: Processos de Aprendizagem na Agricultura

36

Diálogos com atores sociais Poder Público

EPAGRI – escritórios locais: Chapecó, São Miguel do Oeste, Palmitos, Guaraciaba, Anchieta, Novo Horizonte, Dionísio Cerqueira Prefeituras Municipais de Palmitos, Mondai, Chapecó, Abelardo Luz, São Lourenço do Oeste, Novo Horizonte, Anchieta, Guaraciaba Núcleo de Estudos em Agrobiodiversidade – Centro de Ciências Agrárias - Universidade Federal de Santa Catarina – NEABio/CCA/UFSC

Sociedade Civil Associações de Agricultores Cooperativas de Agricultores Cooperativas de Técnicos Movimento de Mulheres Agricultoras Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Movimento de Pequenos Agricultores Sindicatos de Trabalhadores Rurais Sindicatos de Trabalhadores na Agricultura Familiar Centro de Estudos do Desenvolvimento Territorial – CEADES Instituto Porerekan

Quadro 2 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região Oeste

As ferramentas de pesquisa utilizadas foram entrevistas semi-

estruturadas; mapas das propriedades, diagramas de fluxos (orientados à relação

entre manejo da propriedade e fluxo de capital), diagramas de venn (orientado a

interesses e a influências); história das propriedades, história das comunidades e

história da região.

Além da aplicação destas ferramentas de pesquisa, houve também a

participação em outras atividades já planejadas pelas organizações locais, onde

foram possíveis a inserção em reuniões de trabalho, visitas a propriedades, e

discussões sobre intercâmbio e trocas de experiências. Além disso, foram também

realizadas visitas a experimentos no Centro de Treinamento em Conservação do

Solo da EPAGRI, em Chapecó, orientada pelo pesquisador responsável: Claudino

Monegat, e no Centro de Treinamento de São Miguel do Oeste. Outros

experimentos foram visitados em propriedades de agricultores nos municípios de

Palmitos, Guaraciaba, Anchieta, Novo Horizonte e Dionísio Cerqueira,

Page 46: Processos de Aprendizagem na Agricultura

37

acompanhados por pesquisadores e estudantes do Núcleo de Pesquisas em

Agrobiodiversidade da Universidade Federal de Santa Catarina.

Na Região do Alto Vale do Itajaí, mais especificamente no município de

Ituporanga, na comunidade Ribeirão Klauberg, foram realizadas visitas nos meses

de Outubro, Novembro e Dezembro de 2005, e Maio de 2006, totalizando 28 dias

de campo, onde houve diálogos com atores sociais, visitas a 22 residências de

famílias de agricultores.

Diálogos com atores sociais Poder Público

EPAGRI, escritórios locais: Ituporanga, Rancho Queimado, Rodeio, Aurora, Alfredo Wagner, Rio do Sul

Sociedade Civi Associações de Agricultores Cooperativas de Agricultores

Quadro 3 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região do Alto Vale do Itajaí

Nessas visitas foram utilizadas como ferramentas entrevistas semi-

estruturadas, história das propriedades e da comunidade, diagramas de fluxos

(orientado à relação entre manejo da propriedade e fluxo de capital) e visitas a

experimentos na Estação Experimental da EPAGRI, em Ituporanga, orientada pelo

pesquisador responsável, Jamil Fayad.

Na região das Encostas da Serra Geral foram realizadas visitas nos mês

de Julho de 2006, totalizando 3 dias de campo. Essas visitas foram feitas durante a

realização de um dos módulos do curso de Manejo Local da Agrobiodiversidade,

no mês de Julho, promovido pelo Núcleo de Estudos em Agrobiodiversidade,

sediado no Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Santa

Catarina. Foram realizados diálogos com atores sociais, visitas a residências de

famílias de agricultores, e acompanhamento de projetos em andamento.

Page 47: Processos de Aprendizagem na Agricultura

38

Diálogos com atores sociais Poder Público

EPAGRI – escritórios locais: Anitápolis, Grão Pará, Santa Rosa de Lima, São Bonifácio e Lauro Müller Prefeituras Municipais de Anitápolis, Santa Rosa de Lima e Grão Pará

Sociedade Civil Associações de Agricultores Cooperativas de Agricultores Condomínios de Agroindústrias Movimento de Mulheres Agricultoras Sindicatos de Trabalhadores Rurais Acolhida na Colônia

Quadro 4 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na região das Encostas da Serra Geral

Na região da Grande Florianópolis foram realizadas visitas nos meses de

Outubro, Novembro e Dezembro de 2005, Janeiro, Fevereiro, Abril, Maio, Junho,

Agosto, Setembro e Novembro de 2006, totalizando 35 dias de campo.

Diálogos com atores sociais Poder Público

EPAGRI – escritórios locais: Águas Mornas e São Bonifácio.

Sociedade Civil Associações de Agricultores Cooperativas de Agricultores Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo - CEPAGRO

Quadro 5 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região da Grande Florianópolis

Foram realizados nesses municípios diálogos com atores sociais, visitas

a residências de famílias de agricultores, acompanhamento de projetos em

andamento, e visitas a experimentos.

Na região do Planalto Serrano foram realizadas visitas nos meses de

Abril e Novembro de 2006, totalizando 8 dias de campo.

Diálogos com atores sociais Poder Público

EPAGRI – Estação Experimental de São Joaquim. Sociedade Civil

Associações de Agricultores Cooperativas de Agricultores

Quadro 6 – Atores Sociais com os quais houve diálogo na Região do Planalto Serrano

Page 48: Processos de Aprendizagem na Agricultura

39

Foram realizados nesses municípios diálogos com atores sociais, visitas

a residências de famílias de agricultores, e acompanhamento de projetos em

andamento, em especial no município de Águas Mornas, onde várias vezes as

mesmas famílias foram visitadas, possibilitando o uso mais extensivo das

ferramentas de pesquisa, e um aprofundamento maior das discussões sobre os

temas.

Análise e Avaliação das Informações de Campo

Após cada uma das diferentes fases da pesquisa de campo, as

informações obtidas nas visitas foram sistematizadas em função dos materiais

coletados em forma de anotações, textos e ilustrações obtidas pelas ferramentas de

pesquisa: entrevistas, mapas, diagramas e históricos.

A análise destes materiais procura encontrar detalhes não percebidos

durante a visita de campo, que são organizados na forma de perguntas ou questões,

que podem eventualmente ser melhor elucidados em uma nova visita para a

pesquisa. Além de compreender melhor as questões formuladas para a investigação

de campo, a análise e avaliação das informações obtidas nas visitas demonstram as

respostas e resultados que permitem compreender as questões-chave formuladas e

utilizadas como roteiro da investigação.

Com base nos objetivos propostos para esta pesquisa, a análise das

informações procurou compreender como se dão processos de aprendizagem na

agricultura em experiências de conservação ambiental, discutindo o significado e a

importância da apropriação de tecnologias nas relações entre ambiente e sociedade,

buscando identificar elementos que contribuam para o entendimento e a comunicação

entre a prática da pesquisa agronômica e o uso dessas tecnologias de conservação

ambiental na agricultura. Para isso, e a análise e interpretação das informações das

Page 49: Processos de Aprendizagem na Agricultura

40

pesquisas de campo e das literaturas consultadas buscaram compreender a percepção e a

consciência das mudanças que a ação humana produz no ambiente, a partir da

reconstrução da história do ambiente, na qual a narrativa foi cruzada com as

interpretações das informações através dos diálogos com as pessoas, com os

componentes históricos e com as informações disponíveis na literatura. O percurso de

análise das informações da investigação é melhor explicado e aprofundado nos capítulos

3 e 4, onde são discutidos os detalhes do uso de cada uma das ferramentas e como

foram utilizadas, e os resultados das análises e avaliações das pesquisas de campo.

Discussão com a Literatura Disponível

Uma vez analisados e avaliados os resultados das pesquisas de campo,

retornou-se a função de revisão de literatura, desta vez para discussão sobre

concordâncias, discordâncias e novidades quanto às questões trabalhadas na

pesquisa. Em casos de áreas de fronteira de conhecimentos, como esta pesquisa,

muitas vezes as literaturas disponíveis concentram-se em áreas específicas,

carecendo de relações entre diferentes partes de outras áreas. Neste caso, muitos

dos resultados obtidos podem aparecer incompletos ou simplesmente não

trabalhados na literatura, uma vez que tais resultados partilham de diferentes

perspectivas de conhecimentos, por se tratarem de fontes de áreas distintas. Ainda

assim, a discussão permanece pertinente, já que a complexidade das abordagens

utilizadas em áreas de fronteira de conhecimentos torna clara a necessidade de

múltiplas perspectivas, que podem ser obtidas a partir da discussão com as

literaturas das diferentes áreas.

Page 50: Processos de Aprendizagem na Agricultura

41

Capítulo 3 – Processos de aprendizagem e apropriação de tecnologias

3.1- Prática de pesquisa e avaliação da aprendizagem

Para realizar a pesquisa de campo, as visitas foram feitas utilizando

alguns meios de registro e documentação, a saber: entrevistas semi-estruturadas,

individuais ou grupais, mapa das propriedades e das comunidades, história das

propriedades e das comunidades, diagramas orientados a interesses e influências,

diagramas de fluxos orientados à relação entre manejo da propriedade e fluxo de

capital. Estas ferramentas de pesquisa priorizam a participação direta do

interagente pesquisado, no caso, agricultores, técnicos, pesquisadores ou outras

pessoas, onde podem intervir livremente na formulação das regras e na elaboração

das perguntas e respostas, com o acompanhamento do pesquisador, que é quem

conduz a utilização das ferramentas. As metodologias aqui citadas estão descritas

em BOYCE (2002); ESPOSITO (1994); FLICK (2002); GEILFUS, (1997);

GALSKELL (2002); HAGETTE (1997); MACHADO (1994); OLIVEIRA (1998a);

PENN (2002); ROSE, (2002); e SCHRADER, (1978).

3.1.1- Entrevistas semi-estruturadas

As entrevistas semi-estruturadas seguem como princípio que nem

sempre as perguntas que pretendemos formular são as mais adequadas a serem

feitas durante a entrevista, razão pela qual se elabora um roteiro de investigação,

que contém um conjunto de questões-chave, que se espera que sejam respondidas.

Em geral, durante a realização de uma entrevista, a utilização deste

roteiro permite que tanto o entrevistador quanto o entrevistado sigam uma

conversa de maneira livre e espontânea. Contudo, dependendo do perfil de

interação entre ambos, as questões-chave podem deixar de servir como roteiro,

Page 51: Processos de Aprendizagem na Agricultura

42

passando a funcionarem durante a entrevista como enquadramento, o que dificulta

a fluidez da comunicação entre ambos, e pode trazer dificuldades na análise e

avaliação das informações depois.

A questão fundamental que norteia a realização de uma entrevista semi-

estruturada é que todos as informações podem ser interpretados como qualitativos,

pois não há uma quantificação que seja anterior à entrevista. Em outras palavras,

pela condição de que as perguntas não estão pré-formuladas, as respostas da pessoa

entrevistada não seguem necessariamente uma ordem, nem têm um formato único e

exclusivo, como no caso de perguntas fechadas em um questionário.

Muitas vezes ocorreram retornos de entrevistas, realizados em casos

onde a mesma pessoa, família ou comunidade foi visitada mais de uma vez. Nesses

retornos, algumas das questões inseridas no roteiro foram reavaliadas, melhor

compreendidas, ou até somadas, a partir dos conteúdos obtidos através da

entrevista anterior, e também das informações oriundas de outras ferramentas de

pesquisa utilizadas, como os mapas, diagramas e históricos.

Entrevistas semi-estruturadas individuais

Dentre todas as ferramentas de pesquisa utilizadas, foram as entrevistas

individuais aquelas que mais vezes aconteceram, em todos os municípios e

comunidades visitados, de modo que o maior volume de informações obtido

através das pesquisas de campo vieram dessas entrevistas.

A forma de utilização das entrevistas seguiu uma orientação básica:

onde havia agricultores, haveria informações sobre sua agricultura, e neste caso, se

haviam ou não práticas de plantio direto em lavouras. Havendo ou não essas

práticas, o passo seguinte na entrevista era perguntar o porquê do manejo utilizado,

os resultados obtidos com este manejo, se e quanto a pessoa conhecia práticas de

Page 52: Processos de Aprendizagem na Agricultura

43

cobertura de solo, o não revolvimento e a rotação de culturas, e se existiam

vizinhos que utilizavam práticas de plantio direto. Com estas questões básicas, que

funcionavam como filtro para a entrevista, foi possível obter informações

preliminares sobre o uso e o não-uso de tecnologias de plantio direto.

Figura 4 – Roteiro básico de realização das entrevistas individuais e grupais

A partir de então o diálogo se seguia em questões sobre como o uso

dessas tecnologias foi iniciado na propriedade, se haviam sido feitas modificações

ao longo do tempo em uma ou várias partes das tecnologias, bem como sobre o uso

integral dos princípios básicos do plantio direto.

Com as respostas obtidas a essas questões, seguindo o fluxo do diálogo,

eram feitas perguntas que procuravam explorar outros conhecimentos sobre o

manejo das lavouras, onde se propunham relações de comparação com os sistemas

de produção adotados pela pessoa entrevistada.

Por exemplo, no caso de diferentes coberturas de solo, ou diferentes

épocas de plantio e colheita, uso de adubação, espaçamento entre plantas, entre

outras. Nessas questões exploratórias de comparação, também eram feitas

perguntas sobre condições físicas e biológicas dos solos nas lavouras, como por

Page 53: Processos de Aprendizagem na Agricultura

44

exemplo, erosão e escoamento de água de chuvas, níveis de compactação, umidade

e presença de matéria orgânica nos solos, aparecimento de pequenos animais.

“Na primeira lavoura de plantio direto que a gente fez, foram três mil

pés de tomate, com aveia rolada. Estava cheia de lagarta debaixo da

aveia, e desses três mil pés, só trinta e seis a lagarta comeu.”12

Essas perguntas eram colocadas aos agricultores buscando possíveis

explicações de relações de causa e efeito, a partir de diferentes práticas de manejo.

Um outro exemplo se refere a técnicos e pesquisadores, os quais mantém suas

relações de comunicação tecnológica através de palestras, boletins informativos,

cursos, livros, diálogos, entre outros.

“Os agricultores não adotam consorciação e rotação de culturas por

praticidade. Herbicida é mais fácil. O uso de outras tecnologias exige

manejo e observação. (...) Isso é muito mais complexo que a

monocultura”13

Nestes casos, o roteiro de entrevista procurava igualmente propor

questões que enunciassem explicações de relações de causa e efeito nas

tecnologias, procurando identificar também através de comparações entre situações

distintas, quais os possíveis resultados do uso de técnicas diferenciadas.

Da mesma forma que anteriormente, a função principal dessas

entrevistas era obter informações do conhecimento da pessoa sobre tecnologias de

plantio direto, suas características e seus efeitos, e explicações causais para

diferenças de resultados entre essas tecnologias e outras que não partilhassem dos

mesmos princípios do plantio direto.

12 Fala de Nego e Zita Hoffman, agricultores na comunidade Ribeirão Klauberg, município de Ituporanga, em resposta à pergunta sobre os principais motivos da adesão à tecnologia de plantio direto. 13 Fala de Claudino Monegat, pesquisador do Centro de Treinamento em Conservação do Solo da EPAGRI (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina), em Chapecó, em resposta à pergunta: “se vocês diz que está provado que funciona tanto assim, porque todos os agricultores não fazem consórcios?”.

Page 54: Processos de Aprendizagem na Agricultura

45

Ressalte-se que, como não havia questionários fechados, apesar de todas

as entrevistas utilizaram este roteiro de investigação, nem sempre a ordem das

perguntas e respostas foi a mesma para diferentes pessoas entrevistadas, já que os

momentos do diálogo mantinham seu próprio fluxo, que indicava quais questões

propor na entrevista, a partir do que havia sido comentado antes pela pessoa

entrevistada.

Entrevistas semi-estruturadas grupais

Da mesma forma que as entrevistas semi-estruturadas individuais, as

feitas com grupos seguem um roteiro, com a diferença de que as pessoas

entrevistadas não têm relação direta unicamente com o entrevistador, pois passam

a interagir como grupo, onde há permanente complementação, discordâncias sobre

respostas, discussões, são elementos que podem enriquecer a entrevista, por

demonstrar de modo um pouco mais claro certas sutilezas no conteúdo das

informações que não seriam obtidas com uma entrevista individual.

A principal dificuldade de realizar entrevistas com grupos é a de que

todas as pessoas que compõe o grupo estejam dispostas e disponíveis durante

tempo necessário à entrevista.

Além disso, uma outra condição que pode trazer dificuldades ao

andamento da entrevista é a existência de conflitos pessoais ou outros entre

pessoas que compõe o grupo de entrevistados. Estes conflitos podem obscurecer

falas e depoimentos de situações difíceis, caso não apareçam durante a entrevista,

ou podem gerar desconfortos ou acirramentos das dificuldades já existentes entre

estas pessoas.

Em ambos os casos, cabe ao entrevistador mediar a situação para que o

andamento da entrevista não se distancie muito do roteiro. Uma alternativa útil

Page 55: Processos de Aprendizagem na Agricultura

46

para facilitar as relações entre os participantes é compartilhar o roteiro antes do

início da entrevista, para que todos tenham conhecimento e consentimento do

conteúdo a ser abordado.

A maior parte das entrevistas realizadas com grupos foi feita a partir de

reuniões anteriormente agendadas com esta finalidade, nas quais foi utilizado o

mesmo roteiro de entrevista que aquele das entrevistas individuais. Diferentemente

das entrevistas individuais, onde as informações eram unicamente obtidas da

pessoa entrevistada, nos grupos, praticamente todas as questões levantadas

geravam alguma discussão entre os participantes, enriquecendo o conteúdo das

respostas, e dando origem a novas perguntas, muitas vezes provenientes de

questões levantadas pelos próprios entrevistados.

Figura 5 – Reunião com grupo de agricultores e educadores, na discussão sobre práticas de

conservação do solo, eleito um dos temas geradores a serem trabalhados no Núcleo Escolar da Região Norte do município de Palmitos.

No percurso de busca por explicações causais, o processo de avaliação

da aprendizagem realizado pelas próprias pessoas foi igualmente diferente daquele

obtido nas entrevistas individuais, já que comumente algum elemento técnico

Page 56: Processos de Aprendizagem na Agricultura

47

pertinente às formas de manejo indicado como causa por alguém nem sempre era

de concordância de todos, gerando discussões no grupo sobre detalhes, que teriam

passado despercebidos em uma entrevista individual.

“Mas você está dizendo que não funciona e nunca fez. Eu fiz e sei que

se não passar o secante antes de semear dá menos inço. Esse ano eu

tive que capinar só duas vezes, porque a terra estava mais forte, porque

não passei o herbicida.”14

Das relações de grupo, que promoveram discussões sobre assuntos

técnicos, emergiram situações de dúvidas e questionamentos sobre técnicas de

manejo agrícola, desestabelecendo certezas de algumas das pessoas presentes no

grupo, a partir do que algumas disseram e foram confirmadas por outras.

Nesse processo de apresentação de questões, respostas e discussão sobre

as respostas, surgiram elementos que contribuíram enormemente para confirmar a

compreensão de que a aprendizagem compartilhada tende a ser mais rigorosa que

aquela individual, não discutida nem problematizada.

3.1.2- Mapas

Utilizados como ferramentas de pesquisa onde o envolvimento das

pessoas é fundamental, os mapas se constituem como importante instrumento de

identificação entre as pessoas e o contexto em que vivem. Tanto em mapas de

comunidades quanto em mapas de propriedades, o desenho esquemático não

substitui uma fotografia aérea, um mapa digitalizado utilizando recursos de

georreferenciamento, nem outros mapas de utilização geográfica, arquitetônica

e/ou agronômica. As funções principais dos mapas feitos pelas pessoas são,

portanto, o envolvimento que elas têm com o território, por que ao se envolverem

14 Fala de agricultor na reunião de avaliação das lavouras de plantio direto na comunidade Ribeirão Klauberg, Ituporanga, durante a discussão e depoimentos sobre a necessidade do uso de herbicidas nas lavouras.

Page 57: Processos de Aprendizagem na Agricultura

48

no desenho do mapa, estão desenhando não apenas uma área qualquer, mas sim o

lugar onde vivem. Os elementos relacionados pelas pessoas que desenham mapas

de propriedades e de comunidades, são elementos de suas próprias vidas, de modo

que as narrativas obtidas junto aos mapas contam suas histórias, a história do lugar

onde essas próprias pessoas estão situadas, que inclui suas casas, áreas de trabalho,

as de vizinhos, amigos, parentes, espaços comunitários e de uso comum. Em outras

palavras, um mapa desenhado pelas pessoas não constitui apenas uma ferramenta

de interpretação geográfica para o pesquisador, porque as pessoas não desenham

apenas uma representação do território. Constitui também para ambos, pesquisador

e entrevistados, uma fonte de informação social, cultural, econômica, ecológica,

porque as pessoas desenham suas histórias, os contextos onde vivem, de modo que

estes mapas são utilizados também por elas como documentos de codificação e

interpretação de sua realidade.

Mapas das propriedades

Os mapas das propriedades são ferramentas em que as próprias pessoas

indicam, desenham, ilustram a propriedade onde vivem, por conhecê-la certamente

melhor que alguém que lhe seja externo.

Nos mapas de propriedades realizados, foram indicados aspectos

relacionados a quais culturas agrícolas estão em uso, como se dão rotações de

culturas, áreas, produções, uso de espécies e variedades cultivadas, fluxos de

trabalho, distâncias entre as áreas de trabalho e a casa, dificuldades relacionadas ao

manejo, nível de importância de cada área e cultura. Eventualmente, estes mapas

foram associados a um histórico da área, contendo os perfis de ocupação no

passado e no presente, com as respectivas expectativas de futuro.

Page 58: Processos de Aprendizagem na Agricultura

49

Ao pedir que as próprias pessoas que vivem na área desenhem a

propriedade, além de ganhar rigor quanto à distribuição espacial das distintas áreas

de uso, ocorreu invariavelmente o envolvimento de outros membros da família,

que se lembraram de detalhes que usualmente a pessoa que faz o mapa não inseriu

no desenho.

Devido ao forte envolvimento da família na elaboração do mapa, foram

deixadas cópias deste mesmo mapa feito por eles na residência da família, para que

possam visualizar e fazer reavaliações do desenho a partir do território. Estas

reavaliações serviriam também para um melhor entendimento dos processos

internos à propriedade, que contribuiriam tanto para a família, na gestão e no

manejo da área trabalhada, quanto para outras visitas que eventualmente ocorreram

à mesma propriedade.

Figura 6 – Mapa da propriedade do Sr. Alzemiro Peitel – Comunidade Diamantina – Palmitos-SC

Mapas das comunidades

O mapa de uma comunidade é uma ferramenta utilizada para promover o

envolvimento das pessoas que vivem nesta comunidade, e suas respectivas

Page 59: Processos de Aprendizagem na Agricultura

50

percepções sobre ela, trazendo informações visuais sobre a distribuição espacial de

diferentes áreas ocupadas por propriedades, construções, áreas e recursos naturais

de uso comum, acidentes geográficos, estradas e acessos.

Nas comunidades visitadas, o mapa serviu como ferramenta preliminar

para a visualização de diversas outras atividades, como diagramas e históricos de

ocupação e uso. Por haverem sido feitos seguindo os mesmos princípios dos mapas

de propriedades, houve a participação e o envolvimento das pessoas que compõe o

grupo onde o mapa está sendo feito. Pela forma de elaboração e de uso deste mapa,

ele se constitui uma excelente ferramenta de planejamento das áreas pela

comunidade, tanto no momento presente, quando para possíveis planejamentos

futuros, pois propicia a visualização do território, que no cotidiano parecem

ocultas, mal utilizadas ou subutilizadas.

3.1.3- Diagramas

Neste estudo, os diagramas foram usados como ferramentas para

relacionar referências a componentes que fazem parte de um contexto descrito

pelas pessoas inseridas nele. Durante as visitas em que os diagramas foram

utilizados, sempre mais de uma pessoa participou da definição do diagrama,

seguindo um roteiro para a inserção das suas partes componentes, para que

detalhes não fossem esquecidos, havendo suficiente diálogo sobre o nível de

importância entre as diferentes partes que compunham os diagramas. Foram

utilizados diagramas durante a realização de entrevistas, e algumas vezes

associados também a outras ferramentas, como os mapas e os históricos.

Diagramas orientados a interesses e influências

A orientação de um diagrama a interesses e influências segue o princípio

de que em qualquer contexto sócio-ambiental, as partes que o compõe têm

Page 60: Processos de Aprendizagem na Agricultura

51

interações entre si, e que por sua vez exercem influência umas sobre as outras.

Devido a estas influências, torna-se possível identificar os tipos de interesse que

estas partes apresentam. Diagramas orientados a interesses e influências são muitas

vezes utilizados em contextos sociais onde se planejam mudanças de atitude de

pessoas e/ou grupos sociais, uma vez que esta ferramenta possibilita avaliar

qualitativamente o nível de importância que as diferentes partes possuem, bem

como eventuais possibilidades e dificuldades de ação neste contexto. A utilização

dos diagramas orientados a interesses e influências foi utilizada na pesquisa com a

finalidade de verificar as relações de importância percebidas pelas práticas de

plantio direto nas propriedades em que foi realizado. Alguns diagramas foram

analisados com o auxílio de um mapa da propriedade, ou da comunidade, onde os

aspectos indicados tiveram sua consideração de importância também no nível

espacial. As informações obtidas com tais diagramas se referiram a relações de

dependência de insumos produtivos internos e externos, condições de trabalho e de

culturas agrícolas, uso de equipamentos, e relações com vizinhos, com instituições

e relações de comercialização. Com base na indicação destes tipos de relações,

indicavam-se os níveis de importância de cada um dos elementos com relação aos

outros, quais as influências sofriam e exerciam, e os interesses que cada um dos

elementos relacionados poderia apresentar.

Page 61: Processos de Aprendizagem na Agricultura

52

Figura 7 – Diagrama de interesses e influências da Comunidade Rio Novo – Águas Mornas – SC

Diagramas de fluxos orientados à relação entre manejo da propriedade e fluxo de capital

Diagramas de fluxos se referem a caminhos percorridos num contexto

por bens, matérias, ações, serviços, pessoas. Diagramas de fluxos de capital e

manejo da propriedade são utilizados para verificar os caminhos que o trabalho e

os resultados do manejo da propriedade proporcionam em termos de capital. É uma

ferramenta útil para planejamento de propriedades, uma vez que possibilita avaliar

o mapa da propriedade a partir da relação entre trabalho e renda, que normalmente

são norteadores das atividades e dos motivos de uso da terra. O uso destes

diagramas nas visitas às propriedades possibilitou às famílias visualizar as

quantidades de insumos, de dificuldades de trabalho, de horas de trabalho diárias,

sazonais e anuais, de capital necessário a cada cultura ou criação em particular.

Permitiram também que as famílias avaliassem o nível de importância de alguns

trabalhos com relação a outros, uma vez que qualificam de modo mais claro as

diferentes áreas de manejo, tornando mais nítidos trabalhos que resultem em lucros

Page 62: Processos de Aprendizagem na Agricultura

53

e prejuízos, sendo portanto possível inclusive quantificar os lucros e prejuízos em

cada atividade, área manejada, cultura ou criação. Os diagramas de fluxos

orientados à relação entre manejo da propriedade e fluxo de capital foram

utilizados em conjunto com mapas da propriedade e diagramas de influências e

interesses, servindo como ferramenta de grande importância para avaliação dos

históricos da propriedade e da comunidade.

Figura 8 – Diagrama de fluxos da propriedade do Sr. Jorge da Silva – Comunidade Rio da Prata –

Anitápolis – SC

3.1.4- Históricos

Os históricos são ferramentas que se baseiam nas informações obtidas

pelas pessoas que vivem em um certo lugar, que partilharam momentos num

mesmo período, em família, em comunidade, ou em outros contextos regionais, e

que tem como princípio fundamental que, quem conhece melhor a história a ser

contada são as próprias pessoas que viveram nela. Narrada pelas pessoas, a história

ganha informações que num primeiro momento podem parecer desimportantes ao

observador externo, mas que ao longo da narrativa adquirem sentidos e

Page 63: Processos de Aprendizagem na Agricultura

54

significados, já que outras relações se enunciam durante o discurso. A história

pode ser contada a partir de diferentes pontos de vista, abordagens, focos, pois

cada pessoa que faz a narrativa verá a mesma história de seu próprio lugar, com as

suas próprias memórias, de modo que não há acesso a uma história objetiva, mas a

múltiplas e encadeadas histórias subjetivas. Para orientar as informações que

podem ser mais relevantes para a história a ser contada, o uso dos históricos como

ferramentas foi realizado com um roteiro, que foi apresentado às família antes do

início do diálogo, para que fosse sempre relembrado por todos durante o percurso

da narrativa.

História das propriedades

Utilizada como ferramenta de busca de relações entre momentos

anteriores e atuais da ocupação e do uso da propriedade, a sua história pode utilizar

diferentes ferramentas auxiliares, como mapas e diagramas, que revelam

informações mais específicas sobre o contexto sócio-ambiental em que a família e

a propriedade estão inseridas. Ao estabelecer a narrativa como possibilidade de

acesso às características culturais de uma família e de sua relação com o local onde

vive, a interpretação do histórico da propriedade precisa ter em consideração que

os elementos citados pelas pessoas, as relações estabelecidas, os motivos de cada

acontecimento, são todos particulares, podendo ser confirmados ou não por outras

pessoas na família. Os elementos principais que foram levantados nos históricos

das propriedades foram os períodos de inserção de novas tecnologias, o tempo

necessário à família para adaptação, e os motivos para adesão àquelas tecnologias,

na época em que houve essa adesão. Além disso, em todas as visitas onde foi

levantado um histórico das propriedades, foram feitas perguntas sobre as origens

de ocupação da área pela família, sobre a relação dos primeiros colonos com outras

Page 64: Processos de Aprendizagem na Agricultura

55

populações anteriores, os períodos e justificativas para mudanças na cobertura

vegetal originária, os motivos para os desflorestamentos, a relação com a floresta

remanescente e os usos posteriores do solo.

História das comunidades

A história da comunidade é uma ferramenta semelhante à história da

propriedade, por ser também baseada na narrativa das pessoas inseridas naquele

contexto sócio-ambiental, e por ser também orientada por um roteiro

compartilhado com estas pessoas. No percurso das narrativas foi possível

compreender relações atuais e anteriores, que explicitam e/ou explicam situações

econômicas, culturais, de sociabilidade, de uso da terra e outros recursos naturais,

de manejo da agrobiodiversidade, de relações com vizinhos, parentes, instituições,

poder público. Alguns dos detalhes percebidos nas narrativas constituem sutilezas

de relações entre as pessoas, entre pessoas e instituições, que reconstroem

situações ocorridas tanto num tempo próximo quanto num passado distante. Estas

informações foram utilizadas como elementos que se somam a um contexto

explicativo maior, no caso, as comunidades visitadas, constituída por propriedades,

famílias, pessoas. O uso dessas informações procurou explorar diferentes aspectos,

como um padrão local e/ou regional de uso e manejo de animais e plantas;

situações sócio-econômicas, que auxiliam a identificar fatores marcantes de

aprendizagem comunitária, já que o cruzamento de diferentes narrativas muitas

vezes foi fator de dissenso entre pessoas nos grupos entrevistados, por partilharem

perspectivas diferentes sobre os mesmos acontecimentos, e portanto, por traçarem

em suas narrativas, histórias diferentes. Assim, mais que buscar uma única história

verdadeira, a interpretação das narrativas procurou, com a participação das

próprias pessoas no grupo, identificar os elementos comuns às diferentes histórias,

Page 65: Processos de Aprendizagem na Agricultura

56

como no caso de histórias que divergem sobre os períodos e motivos da inserção

de novos equipamentos, de implantação de atividades extrativas de madeira, ou da

adesão ao uso de sementes e insumos químicos comprados, de difusão de

tecnologias de plantio direto, de redução da diversidade de atividades

agropecuárias, de adesão de atividades integradas a agroindústrias como a

fumicultura, as criações de suínos e aves, ou a bovinocultura de leite. Os históricos

das comunidades constituem, portanto, ferramentas que não somente

complementam outras informações obtidas, mas que facilitam o envolvimento da

comunidade para processos de comunicação e aprendizagem sobre os temas que se

objetiva investigar, promovendo situações de diálogo e reunião de múltiplas

perspectivas, conhecimentos e interesses sobre um mesmo conjunto de temas.

3.2- Comunicação e aprendizagem

Distinções entre discurso e prática

Para abordar possíveis distinções entre discurso e prática, é importante

discutir conjuntamente as idéias de apropriação e adaptação. Quando há um

conjunto suficientemente estruturado de conceitos, que têm algum propósito ou

finalidade, ou que servem como referencial explicativo para algum contexto, isto

constitui um discurso15. Ocorre que nem sempre estes conceitos que servem para

explicar ou atuar em um certo contexto se concretizam de modo efetivo. Nos casos

em que sua prática é verificável, dizemos que é um discurso válido. No caso

inverso, normalmente apresenta problemas em suas hipóteses, nas relações

funcionais entre suas partes componentes, ou ainda, o discurso pode servir a outros

contextos, mas não se aplicar àquele contexto a ser verificado.

15 O conceito de discurso aqui articulado refere-se à apresentação mencionada, tendo portanto características particulares com relação à da acepção comumente utilizada da palavra, que se refere a uma fala, oratório, leitura de um texto etc.

Page 66: Processos de Aprendizagem na Agricultura

57

Em qualquer destes casos, percebemos que há uma distância entre o que

se diz de um contexto, e o que se verifica nele. Dito de outra forma, constrói-se um

discurso que serve para interpretar um conjunto de relações, mas a interpretação

não condiz com o que ocorre na verificação. Aqui, será então necessário investigar

onde há problemas na relação entre discurso e prática. A partir disto discute-se que

quando um discurso tem uma finalidade ou um propósito, como no caso do

conjunto de explicações de uma tecnologia como o plantio direto, e então, se

percebe que nem sempre as explicações se verificam da mesma forma em todos os

casos. Ao contrário, normalmente são necessárias muitas adaptações a cada

contexto, devido às diferenças de partes que os compõe, e também devido às

diferentes relações que acontecem entre cada parte no contexto. Contudo, para que

haja uma adaptação possível, é preciso que tenha havido uma apropriação do

discurso da tecnologia, sua explicação técnica. E para que essa apropriação possa

ter ocorrido, este discurso precisa ter sido levado por alguém, e produzido por

alguém, e assim por diante. Por exemplo: num caso de transferência de tecnologia

de plantio direto, pesquisadores desenvolvem um conjunto de técnicas, formulam

uma explicação coerente para estas técnicas, e capacitam técnicos de campo, que a

difundirão entre agricultores, e estes agricultores por sua vez irão por em prática

esta tecnologia.

Figura 9 –Esquema do processo simplificado de produção e difusão de tecnologias

Entretanto, tal visão simplificada do processo de produção, difusão e

adoção de tecnologias muitas vezes traz diferenças de interpretação por diferentes

Page 67: Processos de Aprendizagem na Agricultura

58

pessoas. Para melhor explicar como a apropriação e a adaptação se inserem

permanentemente nas relações entre discurso e prática, de modo a melhor orientar

a compreensão da necessidade permanente de apropriação e adaptação dos

conhecimentos, vamos dividir em três partes este processo: 1) produção, 2) difusão

e 3) adoção.

Figura 10 –Esquema de percepção de causas e conseqüências das ações no ambiente

A produção de tecnologias depende diretamente de uma a) série b)

sistemática de c) observações de d) relações e) causais entre f) partes de um g)

contexto.

Relações entre partes de contextos ocorrem a qualquer momento, em

qualquer lugar, mas isso não constituiria por si só uma explicação causal. Seria

preciso que alguém observasse um fenômeno16, e observar que logo após este

fenômeno, ocorreram modificações no objeto observado, por exemplo, depois de

chuvas fortes, acontecem no solo compactação e erosão.

“Aquela chuva de setembro (de 2005)... choveu 120 milímetros em duas

horas. Onde não tinha palhada lavou a terra toda, e o que ficou, ficou

tão socado que morreu tudo. Tiveram que semear de novo.”17

Uma série contínua de observações semelhantes permite ao observador

inferir que aquele fenômeno causou aquelas modificações, por reconhecer um

padrão de relação entre os fenômenos e as modificações nos objetos. Uma série 16 O conceito de fenômeno é aqui entendido como sinônimo de acontecimento. Da mesma forma, um acontecimento pode ser assim considerado a partir de que haja alguém que o observe, de modo que envolve, portanto, mudanças em algo que está sendo observado. 17 Fala de Áureo Hang, agricultor, na comunidade Ribeirão Klauberg, Ituporanga-SC repetida por vários agricultores no mesmo período de entrevistas, ocorrido em Outubro de 2005, referindo-se às lavouras dos vizinhos não praticantes do plantio direto.

Page 68: Processos de Aprendizagem na Agricultura

59

sistemática de observações como essa não é apenas um evento espontâneo e

aleatório, mas um conjunto de ações com propósito, realizadas por algum

observador.

“A gente repara que essa época de chuva (setembro-outubro de 2005),

se a gente passou a grade a terra fica mais dura do que se não passar e

deixar a terra sem virar.”18

Apenas depois de verificar que há regularidade entre as modificações

provenientes do mesmo fenômeno é que se diz que aquelas modificações

ocorreram por causa daquele fenômeno. E para que tenham havido as observações

sistemáticas, todas mediante propósito, e com sua conseqüente explicação causal, é

imprescindível que tenha havido um observador para formular estas explicações,

correspondentes ao seu propósito de observar sistematicamente aquele fenômeno.

Em todos os momentos desde as observações até as explicações, é o

próprio observador quem as formula e referencia, ou seja, tanto aquilo que foi

observado quanto aquilo que foi explicado causalmente são conteúdos apropriados

pelo observador.

18 Fala de agricultora na comunidade Diamantina, município de Palmitos, durante a realização da oficina de planejamento de manejo das lavouras, da qual se tomou parte durante a realização da pesquisa de campo.

Page 69: Processos de Aprendizagem na Agricultura

60

Figura 11 – O agricultor Jorge da Silva dá ao grupo explicações causais sobre o a direção do

escoamento da água, no manejo para a proteção e a organização dos canteiros de morangos, sua principal renda. Município de Anitápolis - SC

Foi então necessária a apropriação destes conteúdos observados para

uma possível explicação. Da mesma forma, as observações que não encontram

imediatamente explicações, ou seja, quando há explicações já existentes para um

observador, mas que não se aplicam a novas observações feitas em algum

fenômeno, estas explicações precisam ser adaptadas, para que sejam válidas como

conteúdo explicativo daquele fenômeno. Assim, tanto a adaptação quanto a

apropriação constituem diretamente a produção de conhecimentos de qualquer

natureza, sem as quais não haveria explicações válidas ou possíveis de qualquer

fenômeno observável.

Da mesma forma que a produção de conhecimentos, a difusão também

depende de apropriação e adaptação, uma vez que os domínios discursivos

apreendidos através de observações empíricas ou experimentais, ou através de

livros, artigos, comunicações orais e visuais –todas estas formas possíveis de

Page 70: Processos de Aprendizagem na Agricultura

61

apreensão de domínios discursivos sobre um conteúdo, seja ou não tecnológico–

são partes fundamentais da apropriação deste discurso.

Uma das origens da diferença entre discurso e prática, é a apreensão de

um conteúdo discursivo sem reflexão, que condiciona sua difusão sem crítica, e

portanto sem condições de adaptação, ou seja, o discurso é apenas reproduzido, e

sem a devida adaptação ao contexto em que se aplicaria, se faz insuficiente ou

equivocado. Portanto, apesar da apreensão de um discurso fazer parte da sua

dinâmica de apropriação, essa apreensão por si só não constitui a apropriação desse

discurso, porque não propicia a produção de uma explicação coerente com a

prática em que se verificaria. Deste modo, a difusão muitas vezes serve mais como

reprodução de um discurso inadequado ao contexto a que se aplicaria a tecnologia,

do que como componente estratégico para a adoção de tecnologias. Em outras

palavras, a simples reprodução de um discurso técnico apenas informa e instrui,

mas não qualifica para as necessidades práticas da adoção, que exigem adaptação e

apropriação dessas tecnologias.

Na continuidade da lógica de transferência de tecnologias, após a

produção de conhecimentos e de sua difusão, ocorreria a adoção dessas

tecnologias. Aqui, mais uma vez, tanto a apropriação quanto a adaptação se tornam

requeridas, pelos mesmos motivos mencionados acima: apropriação e adaptação

orientam os critérios de verificabilidade da tecnologia, ou seja, propiciam que as

expectativas geradas pelo discurso sobre a tecnologia possam ser

convenientemente adequadas ao contexto em que serão utilizadas, adequadas pelas

pessoas que as utilizarão.

Page 71: Processos de Aprendizagem na Agricultura

62

Figura 12 –O agricultor Ari Dutel (primeiro plano) explica ao grupo a dinâmica de sucessão de plantas no sistema agroflorestal observado, e a permanente proteção e realimentação do solo.

Atrás, experiência de plantio direto em consórcio de milho, mandioca e abóbora em palhada de trigo sem acamar, em sua propriedade. Município de Palmitos - SC

Nos três casos, seja na produção, na difusão ou na adoção de

tecnologias, a observação atenta e a interpretação rigorosa das relações causais

condicionam a qualidade da adaptação do conteúdo discursivo à sua verificação

prática. Em outras palavras, quanto mais atentamente observam-se os fenômenos,

mais consistentes as condições de interpretação das causas e efeitos nos

fenômenos, de modo que as explicações podem ser reformuladas, adaptadas, a

partir das novas interpretações, nos novos contextos. Com essas adaptações nas

explicações, mudam os discursos, que se tornam igualmente adaptados aos

contextos que procuram explicar, onde essas mudanças são reflexo para a sua

verificação.

Assim, observações e interpretações de fenômenos que não produzem

explicações que possam ser verificadas derivam de insuficiente apropriação. Isso

origina em pesquisadores, técnicos e agricultores as dificuldades na adaptação do

Page 72: Processos de Aprendizagem na Agricultura

63

conteúdo discursivo da tecnologia à sua execução prática, ou seja, contribui para

aumentar a distância entre o discurso e a prática. Dentre os fatores observados

nesta pesquisa, essa distância é um dos principais que motivam a não adoção de

tecnologias, que é devida a uma difusão inadequada, realizada a partir de discursos

tecnológicos que não se verificam em campo nos contextos em que se aplicariam,

provenientes de uma má apropriação dessas tecnologias.

3.2.1- Formas de compartilhamento e aquisição de conhecimentos

Um processo educativo que envolve conhecimentos sobre o mundo,

sejam ou não conhecimentos científicos, pode ser planejada através de situações

significativas relativas ao ambiente, à ciência e à tecnologia, identificadas a partir

das localidades em que vivem as pessoas que utilizarão estes conhecimentos,

inseridas no processo educativo. O tratamento problematizado e dialógico destes

temas no processo didático permite que se obtenham e problematizem as visões

das pessoas sobre o ambiente em que vivem. Também se trata de identificar tanto o

que já conhecem quanto as lacunas sobre os temas que discutem. Parte-se do

pressuposto que a visão das pessoas influencia a forma como se relacionam com o

ambiente natural e antropizado.

No contexto da agricultura, particularmente no caso de pessoas com

formação agronômica, sejam técnicos ou profissionais de nível superior, suas

compreensões sobre as interações entre ciência, tecnologia e sociedade podem

dificultar o processo educacional, conforme também indicado por Solbes e Vilches

(1992); Almeida (2001). Neste sentido, o diálogo aberto entre agricultores,

técnicos e pesquisadores é uma necessidade no processo educativo na agricultura,

já que pode ajudar na superação do nível de consciência dessas pessoas.

Page 73: Processos de Aprendizagem na Agricultura

64

Entretanto, em diversos contextos observados na pesquisa, percebeu-se

que em espaços de diálogo puderam ser identificadas pessoas em três distintos

níveis de envolvimento quanto à proposta discutida em grupo sobre plantio direto.

Estas três tendências podem ser denominadas como aliados, indiferentes ou

opositores. É importante ressaltar que estas denominações não são fechadas ou

imóveis; apenas representam didaticamente os perfis de envolvimento de diferentes

pessoas quanto a aspectos abordados, nos processos de diálogo sobre tecnologias

de plantio direto realizados durante a pesquisa.

Cada uma dessas tendências têm pessoas com diferentes interesses,

intenções, motivações, histórias de vida e de profissão, cujo resultado final é o

distinto nível de envolvimento com o tema discutido (FREIRE, 1975). As

sinalizações para identificar este envolvimento vêm de manifestações e do nível de

adesão às discussões ou do compromisso em realizar experiências, e também do

efetivo envolvimento na realização de experiências em tecnologias discutidas pelo

grupo (DELIZOICOV, 2006).

Pessoas da tendência indiferente, normalmente em maioria, raramente se

manifestam, e dificilmente se comprometem ou realizam atividades discutidas pelo

grupo. Em geral, estas pessoas não voltam a participar de reuniões para tratar dos

mesmos assuntos, a menos que tenham seu comportamento alterado por algum

motivo, de origem própria ou externa. Dentre as ocorrências de vindas e retornos

de pessoas que não haviam participado de nenhuma reunião, ou que haviam

deixado as reuniões de grupo, uma parcela significativa simplesmente não havia

recebido as comunicações, ou não entendeu o que estava sendo discutido, e esses

fatores geraram o desinteresse.

Page 74: Processos de Aprendizagem na Agricultura

65

Na participação das pessoas de tendência alinhada, o trabalho coletivo

possibilita compartilhar e potencializar os conhecimentos e experiências dos

participantes, onde se notam significativos avanços na discussão. As pessoas

identificadas nesta tendência também se tornam cooperadores nos processos de

coordenação, sistematização e investigação que se implantam, já que assumem

liderança frente aos demais participantes do mesmo processo. Por outro lado, é

preciso compreender que as pessoas da tendência opositora, apesar de ter como

característica essencial não se envolver na continuidade do processo, têm distintos

motivos para se manterem distantes. Por exemplo, encontram-se pessoas que já

obtém bons resultados com as técnicas que utilizam em suas lavouras, e que

portanto, teriam bons argumentos para não fazer modificações no manejo das

lavouras.

3.2.2- História do ambiente e aprendizagem coletiva

No decurso da aprendizagem no ambiente da agricultura, as distintas

visões sobre um mesmo tema de discussão, seja de agricultores, técnicos ou

pesquisadores, são todas válidas para os pontos de vista de onde se originam. Mas

em grupo, a aprendizagem agronômica, baseada nas narrativas das pessoas sobre o

ambiente em que vivem, pode ser problematizada, reavaliada, discutida,

propiciando através da comunicação entre as pessoas, a apropriação de novos

critérios e conceitos, que têm o potencial de contribuir na apropriação e adaptação

das tecnologias em uso.

Independente do tamanho dos grupos, os pontos de vista expressos pelas

pessoas, sejam agricultores, técnicos ou pesquisadores, são referentes às suas

condições particulares de leitura do mundo, que em última análise, se relacionam

aos conhecimentos que são narrados e discutidos no grupo. Esses pontos de vista

Page 75: Processos de Aprendizagem na Agricultura

66

são apresentados, problematizados e melhor compreendidos no processo de

discussão. Esta dimensão dialógica e problematizadora pode se fazer efetiva

através do que Freire (1975) denomina codificação-problematização-

descodificação, que tem como finalidade promover a superação do nível de

consciência de cada um dos presentes em um processo de discussão, aprendizagem

ou comunicação. Em grupo, este processo ocorre através da reunião crítica das

narrativas das pessoas, e de conhecimentos científicos.

Na medida em que outras perspectivas e conhecimentos são

confrontadas no processo dialógico, ocorre a problematização e a busca comum de

soluções e entendimentos compartilhados. Devido a esse processo, os

conhecimentos problematizados no processo dialógico em torno dos temas

geradores são instrumentos de compreensão e atuação com a perspectiva de

transformar situações que são significativas para as pessoas que estão relacionadas

aos temas. Freire (1975) argumenta que os temas geradores identificados durante a

investigação temática contêm as contradições, e são manifestação destas

contradições que precisam ser superadas, tendo como finalidade a emancipação

dos seres humanos.

Assim, parte-se do pressuposto que a educação deve contribuir para a

atuação transformadora e crítica do ambiente, nas múltiplas relações entre as

sociedades humanas e o ambiente natural, a partir do que surge a necessidade de

uma conscientização, já que há “uma limitação na possibilidade de perceber mais

além” (FREIRE, 1975) das pessoas imersas nas contradições contidas no ambiente

em que vivem.

O processo de codificação-problematização-descodificação estrutura a

dinâmica de interação em ambientes de aprendizagem onde o diálogo é o

Page 76: Processos de Aprendizagem na Agricultura

67

instrumento de compartilhamento de conhecimentos. Baseando-se em um código

que representa as situações relacionadas aos temas, este processo deve ser

planejado de modo que de um lado sejam obtidas e problematizadas as

compreensões das pessoas sobre suas situações vividas, e de outro, permita a

inserção sistemática dos conhecimentos técnico-científicos com os quais se

analisam estas situações. No caso, em grupos onde sejam presentes agricultores,

técnicos e/ou pesquisadores, o processo de diálogo sobre os manejos agrícolas não

é controlado por nenhum destes, mas compartilhado por todos, já que todas as

bases de referência de conhecimentos utilizadas são válidas para aqueles que as

utilizam, e se tornam objetos de análise para os demais.

A interpretação de Freire (1975) é que os pronunciamentos das pessoas

presentes nesses grupos de discussão, relativos aos temas que discutem, refletem

sua consciência real efetiva da sua situação na codificação. Essa consciência real

efetiva é uma categoria de análise que se emprega para analisar e interpretar que há

intervenções de algumas pessoas, que não se referem somente a pontos de vista

unicamente particulares e pessoais, mas que são representativos do meio

sociocultural com que estas pessoas mais freqüentemente mantém relações. Seria,

portanto, uma situação significativa que é vivida e apreendida segundo seus

padrões de interação, tanto com o ambiente natural e antropizado, quanto com os

ambientes socioculturais. “A consciência real efetiva resulta de múltiplos

obstáculos e desvios que os fatores da realidade empírica impõe e infligem à

realização da consciência possível” (FREIRE, 1975). A superação dessa

consciência real efetiva, então, ocorreria através de rupturas que o processo de

codificação-problematização-descodificação precisa se ocupar.

Page 77: Processos de Aprendizagem na Agricultura

68

O problema a ser enfrentado nos grupos de discussão de temas tem,

portanto, duas características fundamentais: a apreensão por parte das pessoas

presentes, do significado que as demais atribuem às situações narradas por elas,

como uma interpretação oriunda da imersão em suas relações cotidianas, para que

possa ser problematizado sistematicamente; e a apreensão pelas pessoas, através da

problematização, de uma interpretação oriunda de conhecimentos científicos, que

será introduzida por aqueles que tenham domínio destes conhecimentos.

Neste processo de diálogo, é então preciso organizar os grupos de

discussão de forma que explicitamente se considerem rupturas que é necessário

que ocorram, para que os presentes se apropriem da análise das narrativas, tanto

sob pontos de vista científicos quanto de experiências de vida, cujas conclusões

são empiricamente verificadas e validadas.

Figura 13 – Discussão entre pesquisadores, técnicos e agricultores sobre o local e os sistemas de

manejo para a implantação de um experimento em plantio direto de milho crioulo orgânico. Anchieta-SC

Com estas apropriações, se torna possível reinterpretar as situações

contidas nos temas discutidos. Esta dinâmica didático-pedagógica estruturada em

Page 78: Processos de Aprendizagem na Agricultura

69

três momentos organizou as discussões nos grupos acompanhados durante a

pesquisa de campo, em um processo articulado com a formação contínua das

pessoas presentes nos grupos, e no uso crítico destes momentos de discussão sobre

técnicas agrícolas, onde houve contribuições relevantes para a construção desta

dinâmica, cujo eixo estrutural é a problematização de conhecimentos, tanto

científicos quanto de saber popular, visando sua apropriação pelas pessoas

envolvidas.

“Eu deixei as mudinhas uns 8 ou 10 dias sem água na bandeja, até as

folhas ficarem bem amarelinhas, depois é que eu dei água e

transplantei no mesmo dia. As mudas na terra cresceram tão rápido

que em 3 semanas já estavam do tamanho das outras que eu tinha

plantado quase 1 mês antes.”19

“Mas no tomate não funciona deixar a muda sofrer sem água antes de

plantar. É mais exigente com água que o fumo. Eu tentei 3 anos

seguidos e me quebrei todos, perdi foi bandeja de mudinha de tomate

fazendo elas sofrerem sem água.20”

“Qual a opinião de vocês? Será que o cobre não afeta o

desenvolvimento das raízes de um jeito diferente para o tomate e para o

fumo, e talvez por isso uma planta responda melhor à falta de água do

que a outra?”21

São problematizados, por um lado, as narrativas das pessoas sobre ações

e seus efeitos: técnicas agrícolas e seus resultados; por outro lado, se identificam e

reformulam adequadamente no grupo, os problemas que conduzem à consciência

da necessidade de introduzir, abordar e apropriar conhecimentos científicos, de

modo que é possível e desejável “introduzir uma forte dimensão histórica

19 Fala de Marcioney Petry, agricultor, em referência à avaliação dos cuidados no manejo das mudas na plantio de fumo. Ituporanga-SC. 20 Fala de Nego Hoffman, agricultor, em referência à avaliação dos cuidados no manejo das mudas no plantio de tomate. Ituporanga-SC. 21 Fala de Jamil Fayad, pesquisador da Estação Experimental de Ituporanga, da EPAGRI em referência à avaliação dos cuidados no manejo das mudas no uso de cobre. Ituporanga-SC.

Page 79: Processos de Aprendizagem na Agricultura

70

explicativa. Assim, a história permite estabelecer diagnósticos em que se

reconstrua a memória histórica coletiva de uma comunidade, onde se encontram as

experiências e os saberes locais” (GUZMÁN, 2006), com o que se relacionam os

conhecimentos científicos e demais saberes.

3.3- O processo de investigação temática

A dimensão problematizadora da concepção educacional aqui

apresentada e discutida se caracteriza pela necessidade de identificar os temas de

discussão através de uma investigação realizada nos grupos, pelos próprios grupos,

denominada investigação temática (FREIRE, 1975). Este processo de investigação

se refere portanto à identificação dos temas e também ao planejamento e

apropriação dos próprios conteúdos que serão discutidos.

3.3.1- O tema como foco na pesquisa

A partir das situações localmente vividas pelas pessoas e contidas nos

temas geradores, se buscam relações estruturais para compreendê-las melhor. Essas

relações, que têm origem na detecção e compreensão dos temas pelas pessoas

envolvidas, são representadas em redes temáticas, que sintetizam a visão geral do

tema em discussão construída na busca das relações parte-todo, particular-geral.

A necessidade de perceber aspectos mais gerais e globais a partir de

suas manifestações locais requer atenção e discussão das diversas pessoas

presentes, onde o cruzamento de narrativas de várias pessoas pode conduzir à

percepção de uma generalidade sobre algum tema específico, como os resultados

da erosão com e sem cobertura de palha, ou sobre o período de amadurecimento de

sementes de gramíneas, ou a incidência de insetos, estrutura do solo, todos

Page 80: Processos de Aprendizagem na Agricultura

71

elementos discutidos e analisados nos grupos, a partir das narrativas das pessoas

sobre as lavouras.

Assim, a rede temática se trata de uma síntese estruturada por

parâmetros universais, cujas relações de generalidade e particularidade são

discutidas e compartilhadas pelo grupo.

As informações sobre a localidade obtidas e sempre alimentados pela

investigação temática constituem também referências, além daquelas contidas na

rede temática, que dão significado universal às informações locais. Tais

informações são problematizadas através de didáticas dialógicas, realizadas nas

reuniões dos grupos, onde foram utilizadas as ferramentas de pesquisa em grupo,

caracterizadas na seção 3.1.

Um dos desafios na elaboração de programas tecnológicos que

priorizem a apropriação e adaptação local destas tecnologias é o compartilhamento

de visões técnico-científicas, partilhada por pesquisadores e técnicos, com visões

oriundas de agricultores, que de modo geral são baseadas em ações empiricamente

validadas por observações feitas por eles próprios.

Page 81: Processos de Aprendizagem na Agricultura

72

Figura 14 – Definição de prioridades por agricultores, técnicos e pesquisadores, para constituição da rede temática, em atividade durante o módulo do curso de manejo local da agrobiodiversidade,

no município de Anitápolis - SC.

A rede temática contribui para identificar os temas gerais de interesse

das pessoas, e a partir dela as múltiplas perspectivas podem ser discutidas e

problematizadas, com base nas narrativas de cada uma das pessoas do grupo.

Este processo tem como principal interesse possibilitar a apropriação

dos conteúdos apresentados e discutidos pelas diferentes pessoas, na busca de

conceitos unificadores. Estes conceitos unificadores possuem quatro características

fundamentais: 1- são poucos, densos e determinados, tanto pelo tipo de

conhecimento articulado em ciência e tecnologia, como também por ser

compartilhado pelas diferentes pessoas no grupo de discussão, uma vez que foram

adequadamente discutidos, problematizados e apropriados no grupo; 2- dirigem a

busca de generalidades e totalidades da rede temática, sem descaracterizar as

Page 82: Processos de Aprendizagem na Agricultura

73

particularidades de cada tema e de cada narrativa; 3- são unificadores porque,

aplicados em grande escala nos diferentes âmbitos das ciências naturais, constroem

conexões para os conhecimentos das ciências sociais; 4- são complementares aos

temas geradores e conduzem ao processo de aprendizagem os aspectos mais

compartilhados pelas comunidades de ciência e tecnologia, expressos pelos

técnicos e pesquisadores presentes nos grupos (ANGOTTI, 1991).

Deve ser ressaltado que o uso do processo de investigação temática,

somado à codificação-problematização-descodificação, não podem ser

compreendidos como um modelo didático-pedagógico que venha a concretizar

efetivas rupturas nas certezas das pessoas, uma vez que estas rupturas não

dependem somente das metodologias e abordagens didáticas nos grupos de

discussão. Apesar disso, a dinâmica de interações que pode ser planejada propicia

a inclusão de elementos que podem potencializar desequilíbrios nas certezas de

agricultores, técnicos e pesquisadores, desestabilização de modelos explicativos, e

consciência de lacunas ou de necessidades de conhecimentos de outras áreas para

compreensão de alguns contextos.

Assim, deve-se evitar o uso mecânico destes momentos didáticos como

se fossem um “método de ensino” para organizar grupos, de modo que a discussão

e as narrativas sejam um simples pretexto para impor a conceituação científica e

tecnológica, que vem sendo um dos principais problemas que requerem empenho

efetivo e os cuidados permanentes dos profissionais que se propõem a trabalhar

com estas metodologias.

É fundamental a presença constante e sistematizada das informações

obtidos na investigação temática para que, a partir destas informações, sejam

sistemáticas as problematizações das falas das pessoas presentes, uma vez que

Page 83: Processos de Aprendizagem na Agricultura

74

neste processo de aprendizagem, o tema não prioriza um conhecimento como

correto ou verdadeiro, mas sim, buscam-se conhecimentos compartilhados entre as

pessoas, e os critérios de verdade de todos, agricultores, técnicos, e pesquisadores,

são submetidos à prova e à confrontação com outras perspectivas.

3.3.2- Percepção e consciência das modificações ambientais

No processo de aprendizagem de tecnologias, ao discutirmos as relações

que possam existir entre o discurso e a prática, faz-se importante discutir os

conceitos de técnica, e o de comunicação; já que comunicação é requerida para que

os conhecimentos sejam compartilhados no nível discursivo, e ulteriormente

possam ser utilizados em prática; e técnica é aqui entendida como a ação humana

movida e articulada por propósitos, que realiza modificações no ambiente.

Figura 15 – Entrevista com agricultor e a presença de técnico, em diálogo sobre o manejo do

experimento de 13 variedades de arroz crioulo orgânico em plantio direto realizado na propriedade deste agricultor. Município de Guaraciaba – SC.

O uso da comunicação cujo conteúdo é técnico implica, na existência de

pessoas, linguagem, propósitos e técnicas. A comunicação destas técnicas utiliza a

Page 84: Processos de Aprendizagem na Agricultura

75

linguagem para alcançar os propósitos junto às pessoas envolvidas. Entretanto, ao

mencionarmos genericamente os termos “comunicação”, “linguagem” e “pessoas”,

para discutir o uso de técnicas, apenas citamos os elementos componentes, sem

procurar aborda-los em suas complexidades.

Quando diz-se que a comunicação entre pessoas é caracterizada pela

existência de pessoas e linguagem para que possa existir, se deixa oculto que

eventualmente os propósitos das pessoas possam ser diferentes uns dos outros, e

também que a linguagem utilizada pode não ser compartilhada, por diferenças de

vocabulário, de construção sintática, de interesse e atenção ao conteúdo, mesmo

quando utilizem o mesmo idioma.

Essas diferenças de linguagem e de propósitos atuam no processo

comunicativo fazendo com que as pessoas tenham dificuldades de entendimento

comum. Contudo, para transpor essas diferenças na comunicação tecnológica, onde

o discurso sobre a técnica é comunicado, cumpre ter em mente que tanto a

linguagem quanto os propósitos de transformação do ambiente são fundamentais.

Assim, a apropriação de tecnologias, ao exigir a comunicação entre as pessoas,

exigem também que os conteúdos tecnológicos sejam compartilhados. Contudo, o

simples uso de tecnologias não implica sua apropriação, mas sua adoção.

A apropriação de uma tecnologia envolve a consciência sobre as causas

das mudanças no ambiente, e também a capacidade de agir nestas causas,

produzindo diferenças nos resultados do uso da tecnologia. Uma vez que haja

consciência sobre as causas das mudanças ambientais, e portanto, consciência das

conseqüências do uso das tecnologias, pode-se dizer que a consciência se estende

também para a responsabilidade sobre estas mudanças. Desta forma, a percepção e

a consciência das ações humanas permitem uma reconstrução da história do

Page 85: Processos de Aprendizagem na Agricultura

76

ambiente, que resulta na responsabilidade consciente sobre as ações no passado, no

presente, e no futuro.

3.3.3- Reflexões sobre a consciência da técnica

No contexto individual, podemos supor que as pessoas têm tanta

consciência quanto podem ter sobre suas ações, afinal, já nos diz Descartes (1977)

“o bom senso é a coisa no mundo melhor compartilhada, pois todos pensam

possuí-lo mais que qualquer outro, e ninguém crê que pudesse tê-lo mais do que já

o tem”. Entretanto, quando consideramos as pessoas em sua coletividade, muitas

vezes percebem-se discrepâncias nos entendimentos e nas ações sobre uma mesma

situação. Apesar disso, nem sempre a existência dessas diferenças implica que

alguns estejam certos e outros errados, pois ocorre freqüentemente que opiniões

divergentes sejam devidas às diferentes características de cada pessoa com sua

história, seu olhar, seus conhecimentos, onde opiniões divergentes possam estar,

para cada um, adequadas ao contexto a que se direcionam, e as divergências são

das perspectivas das pessoas que opinam.

Nossas capacidades humanas de produzir modificações no ambiente,

nossas técnicas, são o foco da discussão neste trabalho, e a consciência sobre o uso

dessas técnicas é o ponto principal das discussões. Mas como considera-se aqui

como de fundamental interesse a consciência sobre a técnica, cumpre discutir os

elementos que se relacionam a ela, como sua origem, seu uso e suas

conseqüências. Discutir estes pontos aponta para uma discussão ética do uso de

tecnologias.

Rigorosamente, assume-se aqui que não é possível determinar em todos

os detalhes quais as origens dos entendimentos causais de alguma ação e

transformações que causa. Devido a múltiplos fatores e condições incertas de

Page 86: Processos de Aprendizagem na Agricultura

77

verificação, as condições de aprendizagem de cada pessoa são únicas, por isso para

cada pessoa os elementos que contribuem para a apropriação de alguma tecnologia

são, igualmente, particulares. Mas apesar das características das pessoas serem

distintas, as semelhanças são muitas, e possibilitam nossa comunicação, nosso

convívio social, nossa história, nossa vida comum. E é a partir destas semelhanças

que se observam possíveis origens da consciência sobre a técnica. De modo

simplificado, reduz-se aqui o processo de conscientização como tendo origem

própria e origem externa.

A origem própria se refere ao resultado de pensamentos e

entendimentos, baseados em observações de causas e efeitos pela pessoa quanto a

ações que produzem transformações no ambiente, mas sem a interação direta com

outras pessoas neste entendimento. Em outras palavras, diz-se aqui que a origem

própria envolve comunicação com outras pessoas num passado e num possível

futuro com relação ao momento de entendimento das causas e efeitos do uso das

técnicas, o momento presente do entendimento. Neste momento, com base nos seus

conhecimentos, observações e pensamentos, a própria pessoa entendeu

causalmente a tecnologia em questão. A reflexão é aqui a condição para a

conscientização da técnica.

A origem externa se refere ao resultado de pensamentos e

entendimentos, também baseados em observações de causas e efeitos de

tecnologias, mas com interação direta com outras pessoas. Aqui, a comunicação é

requerida para diálogo entre ambas as pessoas, onde as causas e efeitos são

observados, discutidos e suas relações são compreendidas. Neste caso, ocorre

muitas vezes a preexistência do conhecimento técnico por pessoas, mas uma delas

ou ambas, não compreendem as relações causais. O diálogo entre essas pessoas

Page 87: Processos de Aprendizagem na Agricultura

78

propicia perceber as modificações no ambiente, produzidas a partir de propósitos, e

perceber que as mudanças ocorridas têm causas e o resultado são seus efeitos. O

diálogo aqui é a condição para a conscientização sobre a técnica.

Independente da origem da consciência sobre a técnica, seja externa ou

interna, cumpre sempre lembrar que os conhecimentos articulados são

preexistentes, e estão sendo utilizados no momento da conscientização, através da

atividade intelectual da pessoa, em nível individual. Assim, tanto a origem própria

quanto a origem externa exigem a ação reflexiva sobre os conhecimentos,

experiências e observações que já possuam.

Page 88: Processos de Aprendizagem na Agricultura

79

Capítulo 4 - Contextualização do ambiente agrícola nos locais de estudo

4.1- Princípios do plantio direto

Entende-se neste estudo que plantio direto é um sistema que procura

reunir três condições fundamentais: não-revolvimento do solo, a sua cobertura, e a

rotação de culturas. Estas três condições se reúnem em graus diferenciados, pois na

própria consideração de autores, pesquisadores, técnicos e agricultores, os sistemas

de plantio direto não têm uma definição restrita, final. Ao contrário, parece haver

um gradiente de possibilidades de uso e adoção de cada um dos três princípios

mencionados acima.

Figura 16 – Princípios do Plantio Direto

Em outras palavras, a definição final de que o plantio direto é um

sistema onde o solo não é revolvido, a rotação de culturas é funcionalmente

planejada e o solo é permanentemente coberto, não é uma definição

exclusivamente baseada na prática, mas um ideal a ser buscado como referncia de

produção.

4.2- Contexto ecológico e sócio-ambiental do manejo agrícola em plantio direto

Quando nos referimos a sistemas de conservação do solo, lembramos

rapidamente da matéria orgânica ao avaliarmos os aspectos mais importantes do

desenvolvimento de plantas, em especial quando temos no seu cultivo interesses

Page 89: Processos de Aprendizagem na Agricultura

80

nossos, tais como a exploração para alimentação humana ou animal, fibras, óleos,

ou mesmo para formação de condições de produção no solo. Podemos considerar

em uma avaliação preliminar que o solo é uma estrutura onde seus diversos

componentes interagem para manutenção do meio em que estão.

Dito de outra forma, as partes químicas, físicas e biológicas do solo, que

podemos chamar de ambiente edáfico, interagem não só entre si, mas também em

tudo o que está além do solo. É difícil, senão impossível precisar o limite da zona

de abrangência e interferência dos solos em qualquer ambiente no planeta. Em

locais não inundados, onde há terra, argila, areia ou rocha, as condições do solo

caracterizam diretamente fluxos de matéria orgânica, regulando a biota nele e

sobre ele, tais como plantas e animais. Estas plantas e animais, junto com as

próprias características físicas e químicas do solo, regulam igualmente fluxos de

água e outras substâncias químicas, com parâmetros físicos, como a temperatura e

a reflexão de luz. Juntos, temperatura, luminosidade, umidade e substâncias

químicas essenciais caracterizam diretamente a possibilidade e a manutenção da

biota sobre qualquer superfície, seja dentro ou sobre o solo, e mesmo dentro

d´água.

Quando consideramos, portanto, o solo como uma estrutura, devemos

levar em conta que suas relações não são exclusivas, e que a interferência que

sofre e exerce no ambiente em que se situa relaciona organismos e sistemas

terrestres, como o clima, fluxos hídricos, erosão e sedimentação; fatores direta e

indiretamente relacionados em qualquer escala de observação, microscópica ou

global. Assim, o solo pode ser entendido como uma estrutura, da qual não cabe

prescindir da avaliação de outros elementos que a compõe. Apesar disso,

encontramos fartamente ilustrados exemplos em que o ambiente edáfico é

Page 90: Processos de Aprendizagem na Agricultura

81

caracterizado como uma estrutura, só que entendida como um suporte para manejo

de plantas e/ou animais; uma espécie de recipiente que contém as condições para

as plantas e os animais serem cultivados ou criados. Esse recipiente pode ser

mexido, alterado, recondicionado conforme o interesse de quem o maneja, os seus

donos, para que as culturas e criações respondam segundo o objetivo que têm.

Ocorre com freqüência que o solo não é exatamente moldável, se ajustando

perfeitamente ao desejo e à intervenção do proprietário. Pelo contrário, parece que

os solos têm sua dinâmica, própria, e por ela se regulam.

Os estudos preditivos sobre as características funcionais dos solos

certamente esbarram na constatação de que há fatores demais para considerar ao

mesmo tempo, e que faltam ferramentas analíticas que lidem com tamanha

diversidade e quantidade de fatores, já que não se conhecem suficientemente os

mecanismos de causa e efeito que têm entre si. Por essa razão estes estudos

estabelecem recortes, para que a abordagem utilizada possa apreender um número

menor de elementos de consideração, rejeitando aqueles que parecem menos

significativos ao observador. Essa mesma condição epistemológica conduz à noção

de que os solos são apenas um suporte para manejo de organismos de interesse.

É lastimável que haja escassez de estudos, e portanto de ferramentas de

avaliação de complexidade ecológica e sócio-ambiental. O recorte abaixo, mesmo

buscando relacionar uma pequena diversidade de fatores, carece de

aprofundamento nas relações entre eles. A revisão bibliográfica que se segue é

apenas uma tentativa de relacionar elementos dentro deste recorte: características

de condições de solos em manejo de plantio direto no Sul do Brasil.

Page 91: Processos de Aprendizagem na Agricultura

82

4.2.1- Contexto ecológico

No Sul do Brasil, a maior parte das áreas onde hoje há prática da

agricultura eram anteriormente ocupadas pela Floresta Atlântica. Com o início da

ocupação colonizatória, os estoques de carbono orgânico e nitrogênio total

diminuíram após a mudança de Floresta Atlântica para agricultura baseada em

lavouras de plantas anuais (LEITE, 2003). O cultivo do solo sob sistema

convencional22, durante as últimas décadas resultou numa diminuição em

aproximadamente 50% no estoque original de matéria orgânica do solo (BAYER,

2003), o que reduz a estabilidade de agregados de solo, quando comparado aos

valores anteriores ao desmatamento (WENDLING, 2005).

Figura 17 – Aspecto de lavoura de milho em plantio direto em diferentes períodos de plantio, ao

lado de área em recuperação secundária. Município de Guaraciaba-SC

22 A definição de sistema convencional aqui utilizada prevê o revolvimento do solo, o uso de agrotóxicos e adubação química altamente solúvel.

Page 92: Processos de Aprendizagem na Agricultura

83

Avaliando algumas das características básicas deste quadro,

compreende-se que, dependendo da magnitude do fluxo de carbono propiciado

pelo subsistema vegetal, haverá maior ou menor atividade biológica, produção de

compostos orgânicos secundários, e aparecimento de outras propriedades

emergentes do sistema solo. De modo geral, as propriedades emergentes do ciclo

do carbono no solo: teor de matéria orgânica, agregação, porosidade, infiltração de

água, retenção de água, aeração, capacidade de troca de cátions, balanço de

nitrogênio, dentre outras; melhoram a qualidade do solo (LOVATO et al, 2004).

A recuperação dos estoques de matéria orgânica do solo reflete

positivamente na capacidade de troca de cátions do solo (BAYER, 2003), pois os

maiores teores de matéria orgânica e cátions divalentes (Ca e Mg), associados à

maior atividade microbiana, atuam na conservação do solo, já que a menor

dispersão de argila e maior estabilidade de agregados são fundamentais à maior

qualidade física do solo, especificamente no que se refere à infiltração de água e,

portanto, para minimizar os riscos de erosão em solos tropicais e subtropicais

(COSTA, 2004).

Em estudos realizados em lavouras de milho, uma das principais

culturas praticadas no sul do Brasil, onde se compararam diversos sistemas de

produção com e sem o revolvimento do solo, incluindo rotação de culturas e

cobertura vegetal, houve recuperação dos estoques de carbono orgânico e de

nitrogênio total apenas no solo em plantio direto, o que indica que a eliminação do

revolvimento do solo é uma prática fundamental, quando se tem por objetivo a

recuperação de solos degradados na região subtropical do sul do Brasil (LOVATO

et al, 2004).

Page 93: Processos de Aprendizagem na Agricultura

84

Figura 18 – Aspecto da palhada cortada pela semeadora no plantio de milho. Município de

Guaraciaba-SC

Sob plantio direto, a rotação de culturas é benéfica tanto para as culturas

de inverno como para as de verão (SANTOS, 2004), pois aumenta o retorno

econômico da lavoura, pelo aumento e estabilidade do rendimento de grãos,

oferecendo alternativas de diversificação de culturas e conseqüentemente

diminuindo o risco de insucesso do agricultor (SANTOS, 2000).

Na adubação, uma prática correntemente utilizada na agricultura em

praticamente qualquer cultivo, além dos aspectos relacionados ao custo, tempo e

esforço do trabalho, cabe considerar que há outros elementos na avaliação da

adubação como prática agrícola, em especial a eficiência do tipo de adubação

utilizada. Com relação à eficiência, a presença de adubação orgânica aumentou os

estoques de carbono orgânico e nitrogênio total, em relação aos sistemas de

produção com adubação mineral e sem adubação. Os estoques do carbono da

fração leve e do carbono lábil foram reduzidos mais intensamente do que o

carbono orgânico total, especialmente nos sistemas de produção sem adubação

Page 94: Processos de Aprendizagem na Agricultura

85

orgânica, razão por que podem ser considerados indicadores mais sensíveis das

mudanças no estado da matéria orgânica do solo. Os sistemas de produção com a

presença da adubação orgânica não apresentaram potencial para seqüestro e

emitiram as maiores quantidades de C-CO2 para atmosfera. No entanto, a

aplicação do composto orgânico constituiu uma efetiva forma de reciclagem de

nutrientes e retorno de carbono ao solo, o que a posiciona como uma estratégia de

manejo importante à conservação da qualidade do solo (LEITE, 2003).

Figura 19 – Aspecto de canteiros de hortaliças com inserção de composto orgânico, cobertos com

serrapilheira coletada de área de vegetação primária. Município de Anitápolis-SC

A inclusão de plantas de cobertura também contribui para a recuperação

dos estoques de carbono orgânico e nitrogênio total no solo sob preparo reduzido

(BAYER, 2003), pois constituem um importante componente em sistemas

agrícolas, protegendo o solo da erosão, facilitando a ciclagem de nutrientes,

Page 95: Processos de Aprendizagem na Agricultura

86

adicionando nitrogênio ao solo pelo uso de leguminosas, e mantendo a umidade do

solo após seu manejo. O desempenho de plantas de cobertura, quando

consorciadas, é um aspecto ainda pouco estudado no Brasil, restringindo-se a

poucos consórcios como entre aveia e ervilhaca. É necessário ampliar o número de

espécies, selecionando-se aquelas que melhor se adaptem ao cultivo consorciado

para diferentes tipos de solo, bem como estabelecer a proporção ideal de cada

espécie no consórcio, visando maximizar a produção de matéria seca, a adição de

carbono ao solo e o acúmulo de nutrientes, principalmente de nitrogênio, fósforo e

potássio. (GIACOMINI, 2003).

Figura 20 – Aspecto de um consórcio entre milho, mandioca, abóbora, melancia e feijão, plantados em períodos diferentes. Propriedade do Sr. Ari Dutel – Comunidade Diamantina – Município de

Palmitos-SC

Além disso, a inclusão de leguminosas em sistemas de cultivo

contribuiu para a maior adição anual de carbono e de nitrogênio ao solo, a qual foi

diretamente relacionada com as alterações dos estoques destes elementos no solo e

com a produtividade do milho (LOVATO et al, 2004). A prática do plantio direto

aumenta também os índices de agregação do solo em relação ao preparo

Page 96: Processos de Aprendizagem na Agricultura

87

convencional, mas não recupera completamente estes índices em relação à

vegetação originária (WENDLING, 2005).

A introdução de leguminosas como plantas de cobertura de solo,

destacando-se a mucuna e o feijão de porco em sistemas de rotação de culturas, é

uma prática que tem aumentado o fornecimento de nitrogênio e o rendimento

vegetal. Adicionalmente aos aspectos relacionados ao rendimento das culturas,

essas espécies têm aumentado os estoques de matéria orgânica e proporcionado

melhorias em várias propriedades químicas, físicas e biológicas do solo,

principalmente quando associadas a sistemas de preparo sem revolvimento, ou com

mínima mobilização do solo (BAYER, 2003).

Figura 21 – Esquema simplificado dos resultados ecológicos da prática do plantio direto

Page 97: Processos de Aprendizagem na Agricultura

88

Outra prática cultural de significativa importância para recuperação de

solos é o consórcio entre plantas. O consórcio de aveia preta e ervilhaca

proporcionou produção de matéria seca equivalente àquela da aveia isolada e

superior à da ervilhaca isolada; agregou igual quantidade de nitrogênio às plantas

se comparada à leguminosa isolada, mas foi superior à da gramínea. Apesar de

haverem comparativamente poucos estudos sobre aumento da diversidade e

redundância funcional com outras famílias além de leguminosas e gramíneas em

consórcios para recuperação de solos, os cultivos consorciados de aveia +

ervilhaca e aveia + nabo proporcionaram relação carbono/nitrogênio da fitomassa

intermediária à das culturas isoladas. A aveia preta, a ervilhaca e o nabo forrageiro

proporcionaram maior produção de matéria seca e acumularam mais nitrogênio,

fósforo e potássio na fitomassa do que a vegetação espontânea do sistema pousio

invernal (GIACOMINI, 2003).

4.2.2- Contexto técnico-pedagógico

Além dos conteúdos técnicos discutidos, o diálogo com as pessoas

durante as pesquisas de campo propiciou também a percepção geral de que o

plantio direto, institucionalizado ou não pelas Organizações da Sociedade Civil ou

pelo Estado, constitui importante tema gerador para discussões e elaboração de

projetos de conservação do solo, elemento fundamental para manutenção e

melhoria da qualidade de condições de vida das populações que dependem de

lavouras para subsistência e/ou comercialização. Ressalte-se que a Região Oeste é

altamente concentrada em esquemas de integração para o abastecimento de

indústrias de alimentos baseados em aves, frango e leite, havendo também a

presença forte do fumo e de grãos, a Região do Alto Vale do Itajaí possui maior

concentração em esquemas de abastecimento da indústria fumageira. A produção

Page 98: Processos de Aprendizagem na Agricultura

89

de leite, por constituir-se uma renda mensal, muitas vezes consiste na última

alternativa sócio-ambiental para manutenção das famílias agrícolas no campo,

razão pela qual instrumentos de conservação de solos para lavouras e/ou pastagens

se mostrou imprescindível a partir dos diálogos realizados naquela região. Nas

outras regiões estudadas, assim como nas Regiões Oeste e do Alto Vale do Itajaí,

um dos principais aspectos levantados foi com relação à sucessão familiar, que

relaciona diretamente a prática da agricultura, vista pela maioria dos adolescentes

como demasiadamente penosa e de baixos rendimentos. O grande êxodo de regiões

rurais para cidades de médio e grande portes foi um aspecto levantado como de

grande preocupação, sendo percebido através das menções feitas a exigências de

melhores condições de vida e de conhecimentos para o manejo das propriedades.

Foram observadas experiências em que a não inserção da família em sistemas de

integração, devido a práticas mais consistentes de plantio direto e/ou agricultura

ecológica produz condições em que os adolescentes presentes na família não

tencionam deixar a atividade agrícola ao concluírem seu ensino médio,

permanecendo na propriedade.

Paralelamente a estes temas, foi discutida também a existência de muitas

experiências em andamento nas propriedades visitadas, com rotação de culturas,

consórcios, manejo e conservação de sementes, integração lavoura-pecuária,

planejamento das propriedades, e envolvimento comunitário, que resultaram em

grande enriquecimento das informações qualitativos que possuem interface com os

sistemas de plantio direto discutidos durante a pesquisa.

Nas visitas às famílias, dentre os elementos citados, a expressão mais

significativa foi com relação ao processo de adoção em comparação aos vizinhos

que não manejam da mesma forma. Devido aos intensos períodos de chuva

Page 99: Processos de Aprendizagem na Agricultura

90

ocorridos nos meses de setembro e outubro de 2005, que resultaram em erosão

muito significativa, os agricultores visitados invariavelmente comparavam suas

terras cobertas com palha com as terras nuas dos vizinhos, quando procuravam

explicar tecnicamente os processos erosivos, e a conseqüente perda de fertilidade

do solo, compactação, favorecimento de plantas espontâneas, e por fim, o uso de

herbicidas e equipamentos para descompactação e preparo do solo. Nessas

comparações, ressaltavam sobretudo a minimização da mão de obra e dos custos de

manejo das lavouras em sistemas de plantio direto, razões pelas quais a percepção

destes elementos favoreceu o entendimento do sistema de plantio direto,

aumentando as justificativas para sua adesão.

As visitas aos experimentos, tanto aqueles conduzidos por

pesquisadores, como no caso do Centro de Treinamento de Chapecó, quanto na

Estação Experimental de Ituporanga, propiciaram uma percepção analítica das

questões, principalmente aquelas relacionadas à nutrição das plantas,

características físicas dos solos, e controle de variáveis, como por exemplo o

manejo de plantas espontâneas, pragas e doenças, condução, poda e colheita.

Estas visitas tornaram mais clara a distinção já anteriormente percebida,

que foi utilizada como premissa para a pesquisa, de que há diferenças

significativas entre o que diz a pesquisa e assistência técnica para o plantio direto,

e o que é efetivamente praticado por agricultores. Em especial, a dicotomia parece

resultar das situações controladas nos experimentos, levando em conta aspectos

específicos e descartando variáveis de análise que resultariam imprescindíveis.

Para citar algumas: ecologia de plantas espontâneas, insetos, fungos e bactérias

que têm interações positivas e/ou negativas com as plantas; aspectos sócio-

culturais relativos à estética das lavouras; possibilidades de usos multifuncionais

Page 100: Processos de Aprendizagem na Agricultura

91

das plantas de lavoura e as espontâneas, que agregaria valor econômico e não

econômico aos cultivos; etc. Essa dicotomia contribui enormemente para aumentar

as dificuldades de comunicação entre pesquisadores, técnicos e agricultores,

devido ao não reconhecimento dos resultados que cada um tem com relação aos

trabalhos dos demais.

Com relação aos aspectos técnicos de manejo, cabe considerar que em

todas as famílias visitadas o papel do planejamento da produção foi característica

essencial na percepção dos próprios agricultores, já que invariavelmente resultou

em capacidade de previsão e preparação dos períodos de tempo dedicados ao

trabalho, acesso a maquinários, insumos produtivos, mão-de-obra, entre outros.

Esta capacidade de previsão facilitou a comparação posterior entre o que foi

previsto e o que efetivamente aconteceu, como no caso das semeaduras e

acamamento de plantas de cobertura, nos períodos de plantio e transplante de

mudas, de colheita, e de comercialização. Outra comparação que se tornou possível

foi aquela referente aos resultados dos tipos de consórcios de plantas de cobertura,

com relação à de quantidade de palha, ciclos produtivos destas coberturas, e os

resultados referentes à produção e à manuntenção da estrutura do solo em períodos

de chuvas fortes e estiagem.

4.2.3- Contexto sócio-econômico e político

Segundo as informações obtidas através das visitas de campo, a quase

totalidade dos agricultores nos municípios visitados praticam agricultura

convencional. Este sistema de produção tem como base o revolvimento e o uso

intensivo do solo, água, agrotóxicos e adubação altamente solúvel, práticas que

tem ocasionado a degradação do solo, contaminação das pessoas e de fluxos

Page 101: Processos de Aprendizagem na Agricultura

92

hídricos, aumento dos custos de produção, e crescente inviabilização da atividade

agrícola (MONEGAT, 1998; REINTJES, 1999; PROCISUR, 2001).

Os impactos ambientais e sociais que a agricultura tem provocado nas

últimas décadas têm sido discutidos intensamente. A evolução do conjunto de

práticas preconizadas no sistema convencional de produção se orienta pela busca

de produtividade e lucratividade, visão compartilhada por agricultores, técnicos,

pesquisadores e instituições (ALMEIDA et al, 2001); que tem levado à perda de

condições de produção e subsistência, à contaminação de pessoas que produzem e

consomem estes alimentos, ao aumento dos custos de produção, e à crescente

dependência de insumos produtivos externos.

A partir das críticas ao modelo convencional de produção, o plantio

direto situa-se como uma forma de reunião de conhecimentos tecnológicos que

viabiliza possíveis transições, já que as rupturas propostas com relação ao sistema

convencional podem ser lentas e graduais. A transição tecnológica apropriada

pelos agricultores é de fundamental importância, já que muitas vezes as propostas

de agricultura sustentável são incompatíveis com as condições culturais, técnicas e

econômicas de agricultores, mesmo quando acompanhadas de perto por técnicos

e/ou pesquisadores, pois normalmente consideram insuficientemente estratégias

para viabilizar a transição tecnológica necessária junto aos agricultores envolvidos.

Assim, quando considerado como um recurso tecnológico aberto e flexível a partir

de seus princípios, o plantio direto pode ser experimentado e avaliado em algumas

áreas das propriedades, com a inserção de cobertura vegetal, a diminuição

crescente da prática de revolvimento do solo, o acompanhamento de resultados de

rotação de culturas, a diminuição do uso de agrotóxicos e insumos químicos, a

verificação dos resultados de produção, tanto em produtividade quanto em

Page 102: Processos de Aprendizagem na Agricultura

93

qualidade dos produtos colhidos. Os resultados dessas avaliações propiciam, a

partir das informações obtidas em campo nas entrevistas, nas reuniões em grupo,

nos mapas e diagramas, a organização das áreas de cultivo e o planejamento da

produção entre a família; os encontros entre agricultores para compartilhar

conhecimentos e discutir técnicas e resultados, através da construção coletiva

embasada nas condições e experiência dos agricultores; a redução da dependência

externa de insumos, pela potencialização do uso dos recursos naturais obtida com a

conservação do solo, da biota e da água; a redução e até a eliminação dos

agrotóxicos e adubos altamente solúveis.

Com base nestes resultados, já obtidos por agricultores visitados, e

compartilhados nas reuniões ocorridas durante a pesquisa de campo, ocorre

também a expectativa de outros agricultores e técnicos que participaram destas

reuniões e/ou foram visitados em outros momentos. Estas expectativas são devidas

ao uso diferenciado de certas técnicas, como por exemplo em diferenças de épocas

de plantio, de espaçamento de plantas, de consórcios de cobertura vegetal etc.

Figura 22 – Esquema simplificado de dinâmicas de relação com o ambiente externo à propriedade

na prática do plantio direto

Page 103: Processos de Aprendizagem na Agricultura

94

Essas expectativas movem agricultores e técnicos a reavaliarem as

técnicas utilizadas em suas lavouras, assumindo a possibilidade de experimentar

mudanças tecnológicas em partes da propriedade, ou até na propriedade inteira.

Desta forma, os processos de discussão de resultados econômicos e técnicos,

fomentam o aumento da compreensão de que o ambiente de cultivo reage segundo

as condições bióticas e abióticas que lhe são colocadas, e os resultados dependem

do manejo destas condições. O aumento dessa compreensão resulta justamente dos

processos de aprendizagem, motivados por fatores econômicos e produtivos neste

contexto. A partir destes resultados obtidos pelas pessoas que praticam a

tecnologia, o contexto econômico e político se mobiliza na percepção da

importância das reuniões e do compartilhamento de conhecimentos e técnicas, de

modo que o uso do plantio direto como recurso tecnológico não se resume a uma

finalidade, mas a um tema gerador, que dá origem a processos de socialização de

conhecimentos, de organização social e política, e de educação coletiva.

Page 104: Processos de Aprendizagem na Agricultura

95

Conclusões

Processos de apropriação de tecnologias em Plantio Direto: Pesquisa–Extensão / Comunicação–Adoção

Considerando os objetivos desta pesquisa, que são compreender

processos de aprendizagem na agricultura através do acompanhamento de

experiências com o uso de técnicas de plantio direto, discutir o significado e a

importância dos processos de apropriação de tecnologias na relação entre ambiente

e sociedade, e identificar elementos que contribuam para melhor qualificar o

entendimento e a comunicação na pesquisa agronômica e no uso dessas tecnologias

na agricultura, e avaliando os resultados obtidos pelos estudos citados na seção

4.2.1, fica evidente que consideramos com muita facilidade aspectos técnicos,

relacionados à eficiência dos sistemas de produção que nos interessam. Entretanto,

nem sempre temos a mesma facilidade em avaliar conseqüências de adoção de

tecnologias de produção. Uma das negligências mais comuns no desenvolvimento

tecnológico é a forma de apropriação das tecnologias desenvolvidas.

As consultas à bibliografia expostas na revisão, apresentada e discutida

nas partes anteriores permitem elencar alguns aspectos sobre possíveis novidades

desta pesquisa com relação ao disponível na literatura. Para melhor compreender

os elementos aqui apresentados como novidades é preciso considerar que, pelo

próprio caráter desta pesquisa possuir uma raiz epistemológica que se orienta pela

junção de diversidades aparentemente desconexas, procuram-se estruturas

integradas de interpretação, sem que tais interpretações resultem únicas ou

superiores a outras possíveis. Das junções aqui apresentadas como novidades,

surgem temas largamente abordados pelos longos anos de pesquisas em extensão

rural, principalmente no que se refere aos processos de aprendizagem na

Page 105: Processos de Aprendizagem na Agricultura

96

agricultura. São participantes destes processos de aprendizagem não só

agricultores, mas também técnicos, agrônomos, pesquisadores, professores, e até

consumidores ou turistas.

Nas atividades de ensino é que são testados os conhecimentos práticos

das pessoas; se têm validade extensiva ou exclusivamente individual. É em

processos de aprendizagem onde se encontram a observação atenta, a medição,

mensuração, comparação, avaliação analógica, análise, síntese, crítica. Todos estes

elementos são fundamentais para a consolidação de um processo educativo sobre

novos conhecimentos para qualquer pessoa. Assim, tanto a pessoa que ensina

quanto a que aprende são educadores e educandos mutuamente, já que aquele que

recebe o conhecimento ensina ao outro como deve se dar a instrução, e aquele que

transmite o conhecimento aprende com o outro como deve transmiti-lo.

Paralelamente, os conhecimentos são continuamente reformulados, baseados em

diferentes perspectivas, histórias de aprendizagens, contextos biopsicológicos; e

também em diferentes contextos ambientais sociais, que incluem tradições,

culturas, condições econômicas, hábitos de consumo; e contextos ambientais

naturais, que incluem características climatológicas, edáficas, de biodiversidade,

de regime hídrico etc.

Por este conjunto extenso de fatores, não é possível estabelecer formas

fixas de extensão de conhecimentos técnico-científicos, e portanto, os processos de

aprendizagem na agricultura, já que contém todos estes fatores, são permeados e

inexoravelmente mediados por eles. O nível de preparação da pessoa responsável

pela capacitação ou treinamento, ou seja, o envolvimento intelectual e prático do

educador com os fatores contextuais, é o determinante mais forte dentre os

relacionados ao tema dos processos de aprendizagem. Por essa razão, identifica-se

Page 106: Processos de Aprendizagem na Agricultura

97

nesta pesquisa que os projetos para a agricultura que não são planejados e

executados com o envolvimento das pessoas que o utilizarão, são projetos carentes

de rigor teórico e empírico, não apenas no contexto técnico agronômico, mas

também sociológico, antropológico, educacional e econômico. Deste modo,

políticas públicas ou programas privados para a agricultura que são formulados

sem as pessoas que os executam e/ou utilizam, são políticas e programas com forte

tendência de baixa adesão e baixa continuidade, resultados claros de fracasso

metodológico.

Experiência, técnicas e reflexões sobre a pesquisa realizada

O tema do desenvolvimento, largamente trabalhado pela sociologia,

toma em conta a importância e o valor sócio-histórico das tecnologias, quando

propõe suas análises sócio-técnicas. Apropriação de tecnologia é um conceito

vasto, de entendimento difuso. Técnica, que por definição seria a transformação da

natureza mediante propósito, impõe adaptação mútua: do agente e do objeto que

recebe a ação.

Neste caso específico, o objeto, a natureza, não é um objeto isolado

como o solo, mas uma profusão de fatores e elementos profundamente

relacionados, em geral de modo pouco ou nada previsível. Essa incerteza da

estrutura funcional da natureza impõe à análise técnica a primeira dificuldade:

como avaliar condições de funcionamento que não se pode conhecer

suficientemente? Ora, a base epistemológica que propõe os recortes analíticos não

permite mensurar nem qualificar as relações em sua completude. Isola elementos e

os condiciona ao olhar do observador. Eis o primeiro tema da dificuldade em

desenvolver tecnologias apropriadas: identificar fatores e parâmetros em

causalidade múltipla. Este tema, de caráter objetivo, diz respeito mais aos objetos

Page 107: Processos de Aprendizagem na Agricultura

98

que serão transformados. Esta condição caracteriza a formulação dos objetivos da

pesquisa, em compreender, discutir e identificar processos de aprendizagem.

O segundo tema/dificuldade refere-se ao processo de aprendizagem

propriamente dito. Como as pessoas poderão utilizar técnicas para obter

resultados que atendam aos seus propósitos? O simples desenvolvimento de

métodos analíticos, seguidos de publicação, não garante a difusão, e menos ainda a

apropriação de tecnologias. Pelo contrário, contribui para o entendimento de que: a

teoria é diferente da prática, e que é na prática que se resolvem as coisas, e na

teoria elas são apenas discutidas. Com esta questão, enuncia-se a forma como os

objetivos foram trabalhados durante as pesquisas de campo, a revisão

bibliográfica, e a análise e avaliação das informações obtidas. Aqui os objetivos

são problematizados

Processos de aprendizagem que considerem como fundamentais a

linguagem utilizada por ambas as partes: quem desenvolve e quem utiliza a

tecnologia, são processos que propiciam a aprendizagem, propiciando por extensão

a adoção e utilização de tecnologias. Assim, tendo como base as condições de

formulação dos objetivos da pesquisa e as formas de trabalho destes objetivos de

investigação, se deram as presentes discussões e reflexões dos processos de

aprendizagem na agricultura a partir de experiências de plantio direto.

Page 108: Processos de Aprendizagem na Agricultura

99

Figura 23 – Esquema explicativo do resultado principal da pesquisa

Aqui reside uma das condições de possibilidade da sustentabilidade dos

sistemas de produção. Se o que se busca é a ‘continuidade das condições de

existência dos sistemas de produção’, para que sistemas produtivos apropriados

continuem, é preciso que sejam adequadamente utilizados pelas pessoas,

agricultores, incorporados ao seu conjunto de práticas de trabalho; é necessário que

aprendamos como adaptar aos contextos locais, com todas suas relações existentes,

as tecnologias desenvolvidas em contextos diferentes.

Assim, o plantio direto, relacionado à consorciação e à rotação de

culturas interferem tecnicamente na estrutura que o solo compõe: processos físicos,

Page 109: Processos de Aprendizagem na Agricultura

100

químicos e biológicos, e os resultados, as conseqüências dessa prática, como o

aumento da matéria orgânica, da atividade microbiana, da regulação dos fluxos

hídricos, estabilidade dos agregados, manutenção de temperatura, bem como

outros diversos fatores externos ao solo, são atributos desejáveis a práticas

agrícolas que visem manter a continuidade de sistemas de produção.

Contudo, para que esta continuidade seja mantida, as informações

técnicas presentes nos textos, artigos, discussões, deve ser incorporada

tecnicamente na agricultura, ou seja, a técnica como transformação da natureza,

não prescinde da sua aprendizagem e adaptação; cada contexto local é diferente,

características climáticas, edáficas, bióticas, sociais, econômicas são diferentes, e a

cada momento, mês, ano, continuam a se modificar. Em cada elemento, toda a

estrutura muda.

A adaptação de tecnologias é um elemento da apropriação de

tecnologias, onde a comunicação, as vontades humanas e a transformação da

natureza estão reunidas. Se o caminho adotado é sustentável, só a passagem do

tempo pode dizer.

Considerações finais

A realização desta pesquisa procura atender a um conjunto de

expectativas, do Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas, do próprio

pesquisador, das centenas de pessoas junto às quais a pesquisa se realizou, e de

certa forma, do próprio contexto da agricultura. Ao discutir os processos de

aprendizagem na agricultura, na procura por compreender como se dão estes

processos na aprendizagem e o uso de tecnologias, agricultores, técnicos e

pesquisadores estão envolvidos na busca pelos mesmos tipos de resultados: atender

Page 110: Processos de Aprendizagem na Agricultura

101

às expectativas de quem, em última instância, são os principais beneficiados pela

atividade agrícola: usuários-consumidores.

Torna-se então claro que a melhoria de condições básicas de vida desses

usuários-consumidores é que está em questão, pois a produção de alimentos,

oriunda da atividade agrícola, é quem supre as principais necessidades humanas.

Outras necessidades, como a água, a habitação, o vestuário, transportes, saúde ou a

educação, são também fundamentais, é claro. E mais uma vez as atividades

agrícolas são condicionantes destes elementos, pois recursos hídricos, madeiras

para construção, fios para tecelagem, e eventualmente biocombustíveis, são em

geral provenientes de regiões onde se pratica agricultura, e independente de tal

condição, as pessoas que trabalham nos transportes, saúde e educação, ou seja

onde for, todas elas dependem de alimentos. Daí parece resultar todas as apologias

à importância da atividade agrícola. Mas a despeito disso, pesquisas realizadas no

meio agronômico prescindem do elemento humano ao prescindir da pesquisa sobre

qualidade da comunicação entre as pessoas que trabalham na agricultura.

É como se todas, ou quase todas as publicações técnico-científicas

fossem direcionadas a pessoas com plena capacidade de entendimento, e acesso ao

que há de melhor na solução dos problemas humanos, principalmente problemas

relacionados à alimentação e aos inúmeros desastres sócio-ambientais provocados

pela atividade da agricultura. Mas infelizmente, parece que essas publicações não

estão direcionadas a tais pessoas, talvez porque que tais pessoas simplesmente não

existam. Assim, quando investigações técnico-científicas não tomam em

consideração as pessoas como partes integrantes da pesquisa e do uso das ciências

e das tecnologias, omitem a responsabilidade de pesquisadores pelos resultados do

uso dessas técnicas, e isolam a atividade de pesquisa científica do ambiente onde

Page 111: Processos de Aprendizagem na Agricultura

102

tais técnicas serão utilizadas. Em outras palavras, referem-se à natureza e aos

usuários como meios para obtenção de resultados técnica e cientificamente

referenciados, sem participarem da responsabilidade sobre as conseqüências.

O reflexo direto dessas considerações finais é sobre a atividade humana

de pesquisar, no contexto da aprendizagem sobre tecnologias em agricultura, que

como já vimos, é considerado um tema importante.

O presente estudo não pretende ser um conjunto de soluções facilmente

aplicáveis, nem tampouco uma crítica sem direção, porque parece que na vida não

se têm soluções facilmente aplicáveis a problemas complexos, e igualmente,

porque que há direção aqui: aos processos de aprendizagem. Como não se pretende

ser um manual técnico, com recomendações de procedimentos e comportamentos

para as pessoas, este trabalho não procura oferecer receitas milagrosas de

eficiência na comunicação, ou novas verdades emblemáticas para a agricultura.

Pelo contrário, justamente por ser apenas um estudo, mesmo tendo sido realizado

em conjunto com muitas pessoas, depende de envolvimento e discussão, e

problematização, e reflexão sobre qualquer tentativa de uso, para avaliar as

condições de apropriação e adaptação dos conhecimentos aqui articulados e

discutidos. Em outras palavras, esta dissertação recomenda, é claro, a realização de

outros estudos, que se baseiem na investigação das condições locais de

aprendizagem das pessoas sobre os contextos em que vivem, para que as atividades

de pesquisa científica possam contar não apenas com a objetividade do

conhecimento das ciências naturais, também mas com a participação e o

envolvimento das pessoas nesses conhecimentos. Afinal, se o conhecimento, seja

ele científico ou não, é produzido pelas pessoas para o seu uso, por que não nos

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103

envolveríamos nele? Este é a principal intenção por detrás de toda a pesquisa

realizada.

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