a dinâmica dos processos de aprendizagem em uma atividade de
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A DINÂMICA DOS PROCESSOS DE APRENDIZAGEM EM UMA
ATIVIDADE DE INVESTIGAÇÃO
Ronaldo Abrão Pimentel – Puc Minas, Fea Fumec - [email protected]
Maria José de Paula – Rede Municipal de BH, Puc Minas [email protected]
Grupo de Pesquisas Investigativas em Educação Matemática – PINEM, do
Departamento de Matemática e Estatística da Puc Minas.
Introdução
Este trabalho aborda a investigação Matemática sob o ponto de vista da
dinâmica dos processos de aprendizagem desenvolvidos pelos alunos durante uma
atividade de investigação. Pretendemos analisar uma experiência de atividade
investigativa em sala de aula que acreditamos, tenha se aproximado da idéia de “fazer
Matemática”, na perspectiva de D’Ambrosio (1993), Abrantes (1999), Skovsmose
(2000), Ponte (2003).
Segundo Abrantes (1999) a idéia de que aprender matemática é “fazer
matemática” está cada vez mais difundida entre os educadores desta área do
conhecimento. Pressupõe-se uma identificação entre aprender matemática e
compreender a sua natureza, idéia que se traduz nas perspectivas atuais de que aprender
é sempre produto de uma ação, de um fazer. Uma tentativa de ruptura com o paradigma
da transmissão do conhecimento.
Nosso interesse na abordagem das investigações Matemáticas visa traduzir para
o ensino, a discussão e a análise da matemática como uma área de pesquisa e
investigação. Beatriz D’Ambrosio já advertia, no princípio dos anos noventa, que assim
como, no processo de construção da matemática como disciplina, a essência é a
pesquisa, na construção do conhecimento, a essência também deveria ser a pesquisa.
Nossos estudos sobre o como criar um ambiente para se “fazer Matemática” em
sala de aula, como proporcionar aos estudantes legítimas experiências matemáticas,
conduziram-nos a pensar em uma atividade que proporcionasse ações como:
experimentar, interpretar, visualizar, inferir, conjecturar, abstrair, generalizar e enfim
demonstrar. Colocá-los para agir, diferentemente de seu papel passivo, frente a
apresentação formal do conhecimento.
A experiência tenta expressar essa possibilidade. Tentamos criar uma atividade
que desafiasse a capacidade cognitiva dos estudantes, possibilitando-lhes tornarem
autores de descobertas que dão sentido ao conhecimento matemático. Levá-los a
experimentar um caminho parecido ao do matemático profissional, onde o
conhecimento é construído a partir de investigação e exploração, e a formalização é
simplesmente o coroamento desse trabalho.
A tarefa consistia na exploração de uma tabela de números e de um kit com
figuras geométricas. Os alunos deveriam observar relações entre os números dessa
tabela através das figuras geométricas, descobrir padrões levantar conjecturas e
sistematizar suas observações.
Optamos por elaborar uma tarefa investigativa que inicialmente era mais
dirigida - mais estruturadas, numa tentativa de permitir que o aluno não acostumado a
uma postura mais ativa em sala de aula iniciasse sua atividade enquanto se ambientava.
Aos poucos, a tarefa tornou-se mais livre -menos estruturada, uma vez que o aluno já se
sentia mais seguro para conduzir o trabalho de forma mais autônoma.
Trabalhamos com categorias de análise que nos permitiram evidenciar os
processos de descobertas e criações desenvolvidos pelos alunos enquanto exploravam os
padrões na tabela de números.
As explorações propostas, livres ou guiadas, levavam os alunos a tecerem
intuições, inferências e conjecturas que ao serem sistematizadas produziam novas
inferências e conjecturas em outro nível de elaboração, que necessitavam de novas
sistematizações mais sofisticadas que, por sua vez, levavam a novas inferências...., num
processo recorrente. Uma multiplicidade de situações, criações e aprendizagem
emergiram desse processo.
A importância das investigações matemáticas
No final do séc. XIX e início do séc. XX o formalismo, movimento dos
matemáticos que teve em Hilbert seu maior expoente, concebe e refina a Matemática
como a ciência das deduções formais e rigorosas procurando afastá-la de qualquer
conotação intuitiva, coroando a ênfase iniciada mesmo antes de Euclides, da lógica
dedutiva.
2
A influência desse refinamento científico é, na maioria das vezes, levada de
forma equivocada para a Matemática escolar1 que passa a ser vista como uma
“disciplina de resultados precisos e procedimentos infalíveis, cujos elementos
fundamentais são as operações aritméticas, procedimentos algébricos, definições e
teoremas geométricos” (D’AMBROSIO , 1993, p.35). Esta forma de enxergar a
Matemática torna a sua prática pedagógica, na maioria das vezes, reduzida ao
treinamento baseado na repetição e memorização, e conseqüentemente, à crença de que
para aprendê-la basta resolver muitos exercícios, baseando-se na lógica da transmissão
do conhecimento.
Acreditamos que ao proporcionar aos estudantes vivências com atividades de
investigação, possamos aos poucos mudar a visão sobre esta área de conhecimento e,
revelar para os estudantes uma Matemática que evoluiu junto com o “processo humano
e criativo de geração de idéias e subseqüente processo social de negociação de
significados, simbolização, refutação e formalização. Na sua gênese, o conhecimento
matemático evolui da resolução de problemas vindo da realidade ou da própria
construção matemática” (D’AMBROSIO, 1993, p.35).
Não pretendemos que os alunos se transformem em matemáticos profissionais,
mas acreditamos que pensar matematicamente passa pela socialização de processos e
formas de raciocínio características da atividade própria dos matemáticos. Trata-se de
um trabalho que envolve um percurso de tentativa e erro, de formulação e testagem de
conjecturas, de análise, de analogias, de reflexão, de crítica e de sistematização.
O que é uma atividade de investigação?
Uma atividade investigação consiste em, a partir de uma tarefa de investigação,
criar condições para que o aluno arrisque descobrir relações entre elementos
matemáticos e identifique propriedades que permeiam estes elementos e suas relações.
Ponte e outros (1998) propõem que uma investigação matemática comece com
uma situação que precisa ser compreendida ou um conjunto de dados que precisam ser
organizados e explicados em termos matemáticos. Observar as informações que se tem,
colocar questões pertinentes, arriscar-se a formular conjecturas, testá-las, usar
1Moreira e Soares (2005, p.15), fazem uma diferenciação entre o conjunto de significados que a comunidade científica dos matemáticos identifica com o nome de Matemática, e o conjunto de saberes especificamente associados à educação matemática escolar.
3
argumentos plausíveis e provas formais para confirmar ou rejeitar essas conjecturas
constitui a essência da atividade de investigação .
Propor uma tarefa que possibilita aos estudantes socializar os processos e formas
de raciocínio, falar sobre a seqüência das ações desenvolvidas, comunicar as idéias que
vão surgindo, usar diferentes canais de comunicação – a fala, um desenho, um
diagrama, um gesto, propicia o envolvimento dos mesmos, estimulando as discussões. E
o “pensamento relacional/conceitual que na concepção de Skemp (1976) e Hiebert e
Lefèvre (1986) ”é desejável para que aconteça uma aprendizagem significativa. Além
de tudo isso, é um momento importante para que os alunos percebam a importância de
saber justificar suas afirmações para que possam ser entendidos e aceitos (ou não) por
seus pares.
Ao interagirem com colegas e professores, confrontando conjecturas e
justificativas diversas, estabelece-se no grupo um arquétipo de uma mini comunidade
científica onde o conhecimento matemático se desenvolve como um empreendimento
comum, Ponte e outros (1998).
Ernest (1996) também, defende a investigação matemática como método de
ensino. Segundo ele, as investigações têm como paradigma2 “o indivíduo como criador
ativo do conhecimento e na natureza temporária de suas criações”(p.31). Isto é, criam-se
condições para a compreensão da Matemática como uma ciência que evolui com o
passar do tempo e que também é passível de falhas, como qualquer criação humana. O
autor ressalta que [...] a investigação está relacionada com um processo de inquirição
matemática, [...] a investigação matemática tem uma forma especial, com
suas próprias componentes características de abstração, representação,
modelação, generalização, demonstração e simbolismo.” (ERNEST, 1996,
p.31).
Skovsmose (2000) amplia a discussão apontando que atividades investigativas
podem, não somente contribuir para o desenvolvimento da aprendizagem matemática,
mas também favorecer o desenvolvimento crítico do educando para que ele atue na
sociedade criando relações calcadas na valorização do ser humano e da vida. A prática
educativa centrada no “Paradigma do Exercício”, se alterada para um trabalho com
situações provocativas de práticas de investigação e de reflexões dos educandos,
transforma a sala de aula num “Cenário de Investigação”. 2 Por paradigmas entendemos que não são teorias: são antes maneiras de pensar ou pautas para a investigação que, quando se aplicam, podem conduzir ao desenvolvimento da teoria.
4
A proposta de trabalho nos cenários de investigação não só questiona algumas
referências explícitas no paradigma do exercício mas também as complementa. O
educador sai do centro e se filia ao grupo dos educandos construindo assim a
dialeticidade entre aprender e ensinar. Quebra-se a lógica da transmissão e da
reprodução e ressalta-se a idéia de construção e produção de seu próprio conhecimento,
tentando garantir a formação do educando na sua íntegra, e não somente a informação
de determinado conteúdo.
A Atividade de Investigação
O presente trabalho foi gestado e desenvolvido a partir de estudos e discussões
feitas no Grupo de Pesquisas Investigativas em Educação Matemática – PINEM, do
Departamento de Matemática e Estatística da PUC-Minas.
A tarefa de investigação aqui abordada foi elaborada a partir da leitura do artigo
de nome Cenários para Investigação, do pesquisador dinamarquês Ole Skovsmose
(2000) e desenvolvida com estudantes de um curso de especialização em Educação
Matemática. O tempo gasto com a realização da atividade foi de quatro aulas de
cinqüenta minutos. Estavam presentes na sala vinte e três estudantes, todos licenciados
em Matemática e já atuando como professores dessa disciplina.
Faz-se necessário esclarecer que era uma aula acadêmica normal, ministrada por
um dos pesquisadores, que foi utilizada para pesquisa sobre uma a investigativa. A aula
foi iniciada fazendo-se a apresentação da pesquisa e justificando, com isso, a presença
de uma professora pesquisadora na sala. Ela iria fazer registros e observações sobre a
atividade que seria desenvolvida naquela manhã. Os estudantes foram orientados para
formarem grupos com quatro componentes e, passou-se a apresentar a proposta de
trabalho. Formaram-se cinco grupos – que chamaremos de G1, G2, G3, G4 e G5 - e
cada aluno recebeu o roteiro da atividade a ser desenvolvida.
Segundo Ponte e outros (2003) as investigações matemáticas envolvem
habitualmente (a) a introdução da tarefa, em que o professor faz a proposta à turma,
oralmente e por escrito; (b) a realização da tarefa, durante a qual o professor interage
com os alunos individualmente ou em pequenos grupos; e (c) a apresentação e discussão
dos resultados dos alunos, incluindo a análise das estratégias usadas e seus resultados e,
eventualmente, questões para futura investigação. Esta foi a estrutura básica da aula.
5
Foi pedido que cada grupo fizesse um relatório, dos raciocínios matemáticos
surgidos, das descobertas de regularidades, das conjecturas feitas e testadas ou não e,
das generalizações.
Foram distribuídos:
1) Um roteiro de atividades no qual introduzíamos o assunto a ser tratado,
sugestões para investigação e uma tabela de números como a que vem a seguir:
2) Um kit com uma calculadora e várias figuras geométricas feitas de acetato
transparente para serem sobrepostas – uma de cada vez - aos quadrados numerados da
tabela.
Por exemplo:
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30
31 32 33 34 35 36 37
38 39 40
41 42 43 44 45 46 47 48 49 50
51 52 53 54 55 56 57 58 59 60
61 62 63 64 65 66 67 68 69 70
71 72 73 74 75 76 77 78 79 80
81 82 83 84 85 86 87 88 89 90
91 92 93 94 95 96 97 98 99 100
6
ba
cd
1
Retângulo – chamado de retângulo 1 – que se sobrepõe a seis quadrados da tabela distribuídos em duas linhas e três colunas. Os quadrados internos situados nos vértices dos retângulos foram nomeados de a, b, c e d, sempre na ordem em que aparecem na figura, ou seja, a situa-se no vértice inferior esquerdo, b no vértice inferior direito, c no vértice superior direito e d no vértice superior esquerdo. Chamaremos, portanto, de número a ao número que estiver situado no vértice inferior esquerdo do retângulo quando este se sobrepuser à tabela. .
O retângulo 2 tinha esse desenho.
Havia também várias outras peças com vistas a explorações mais livres, como as
mostradas abaixo:
Descobertas e estratégias de raciocínio desenvolvidas pelos alunos
Pretendíamos com a atividade observar a dinâmica de funcionamento dos grupos
durante a realização das investigações, analisar se aconteciam, e como aconteciam
descobertas de padrões e regularidades, como seriam feitas as sistematizações das
informações obtidas, e se a partir dessas sistematizações havia criação de novos
padrões, ou a descoberta de novas relações. Aprender Matemática não é simplesmente compreender a Matemática já feita,
mas ser capaz de fazer investigação de natureza matemática (ao nível adequado
a cada grau de ensino). Só assim se pode verdadeiramente perceber o que é a
Matemática e a sua utilidade na compreensão do mundo e na intervenção sobre
o mundo. Só assim se pode realmente dominar os conhecimentos adquiridos.
[...] Aprender Matemática sem forte intervenção da sua faceta investigativa é
como tentar aprender a andar de bicicleta vendo os outros andar e recebendo
informação sobre como o conseguem (BRAUMANN, 2002, citado em PONTE
e outros, 2003)
Tínhamos também um olhar para a perspectiva cognitiva do estudante. As
informações obtidas através das primeiras leituras dos dados da pesquisa nos levaram a
perceber que havia um movimento de vai-e-vem entre descobertas feitas e as
7
d
a
c
b
2
sistematizações dessas descobertas. Ao fazer a sistematização, novas descobertas
emergiam, exigindo por sua vez, novas sistematizações, num movimento contínuo e
profícuo.
Trabalhamos com as categorias de análise listadas abaixo estabelecidas por
Frota e Pimentel no artigo “Investigações na sala de aula de Matemática: Ampliando
possibilidades de análise” - 2007 – (no prelo):
1) intuições, inferências e conjecturas que decorrem das explorações livres e
guiadas;
2) sistematização de resultados decorrentes das inferências e conjecturas
levantadas;
3) novas explorações decorrentes da sistematização de resultados que, por sua vez,
geram novas intuições, inferências e conjecturas
Esses movimentos se dão em caráter recorrente, num “moto contínuo” que se
auto-alimenta. Esperamos que, descritas dessa forma, as categorias possam esclarecer
ao leitor qual foi o nosso olhar ao realizar esse trabalho.
Atividades exploratórias livres e atividades exploratórias guiadas
A atividade constava de tarefas exploratórias que classificamos de duas formas,
dependendo do seu grau de estruturação: Tarefas exploratórias guiadas quando o
elemento desencadeador da exploração era mais dirigido; e tarefas exploratórias livres
quando o aluno era instigado a investigar de forma mais autônoma. Baseamos-nos, ao
elaborar as tarefas dessa forma, em classificações desenvolvidas por Ernest(1996) e
Ponte (2003).
Eis aqui alguns exemplos de atividades guiadas.
Foram indicadas algumas operações que os alunos deveriam fazer com os
números a, b, c e d do retângulo 1, que chamaremos de funções, tais como:
1) . O resultado de é sempre igual a zero, qualquer que seja o
retângulo usado e em qualquer lugar que seja sobreposto à tabela, apesar desta
informação não ter sido dada aos alunos.
2) . O valor de é constante para um mesmo retângulo, qualquer que
seja a posição que ele ocupe na tabela. Mas se altera quando muda o retângulo. Esta
informação também não era passada aos alunos.
8
Nesses dois casos pedia-se aos alunos que calculassem o valor da função para o
retângulo 1 em uma posição específica e depois tentassem em outras posições e com
outros retângulos. Sugeria-se então que comparassem os resultados de cada uma das
funções e tentassem encontrar padrões e similaridades e que os registrassem. Vale
observar que os alunos não tinham que, necessariamente, chegar aos resultados
pretendidos por nós e nem eram obrigados a trabalhar com essas funções. Como se pode
perceber, as orientações eram estruturadas e podemos caracterizá-las como atividades
exploratórias guiadas.
Gradativamente as tarefas iam se alternando entre explorações guiadas e livres,
como por exemplo: perguntava-se de que maneira o valor de dependia das dimensões
de cada retângulo, ou então, na tentativa de levá-los a tecerem conjecturas - apesar do
tempo escasso - os alunos eram solicitados a explicarem o que acontecia e por que
acontecia determinado padrão observado. Esse tipo de tarefa já era menos estruturada, o
que deixava os alunos mais livres para tomarem seus próprios rumos.
Enquanto os grupos desenvolviam as tarefas, os dois professores-pesquisadores
acompanhavam os trabalhos, ora incentivando as inquirições, ora respondendo às
perguntas com outras perguntas. As observações feitas pelos professores durante o
desenrolar das tarefas eram anotadas em um caderno de campo. Os alunos, por sua vez,
anotavam todos os seus passos nos relatórios a serem entregues ao final da aula, e que
serviram de documentos para análises posteriores.
Faltando cinqüenta minutos para o final da aula foi proposta a socialização, onde
cada grupo expôs suas principais descobertas e inquirições. Trocaram idéias enquanto
os professores orientavam as discussões e anotavam as questões mais importantes.
Várias descobertas dos alunos aconteceram durante esse momento da aula, após
ouvirem as falas dos colegas.
Confirmando Ponte(2003), pode-se sempre programar o modo de começar uma
investigação, mas nunca se sabe como ela irá acabar. A variedade de percursos que os
alunos seguiram nos surpreenderam, ocorreram avanços, recuos e divergências. Erros
conceituais emergiram, numa rica multiplicidade de situações.
9
Descobertas comuns
Nas duas atividades exploratórias guiadas todos os grupos chegaram às mesmas
conclusões já explicitadas por nós pesquisadores.
Observaram que a função era sempre igual a zero para qualquer
retângulo e em qualquer posição. Veja um exemplo, quando se trabalha com o retângulo
1:
Todos os grupos observaram que a função se mantinha constante para
um mesmo retângulo, qualquer que fosse a posição que ele ocupava na tabela. Veja um
exemplo com o Retângulo 2:
Mudando a posição do Retângulo 2, o valor de não se altera:
10
ba
cd
132 33 34
42 43 44
d
a
c
b
244 45 46 47
54 55 56 57
a d
cb
59 60
69 70
79 80
89 90
2
Caso houvesse mudança nas dimensões do retângulo, haveria mudança no valor de .
Basta verificar com o Retângulo 1
O G4 chegou a uma generalização digna de nota, a de que todos os polígonos para
os quais as funções e não se alteram tem uma propriedade geométrica em comum:
são paralelogramos. Testou com polígonos que não eram paralelogramos e confirmou a
conjectura. Não desenvolveu, e nem havia tempo para tal, uma justificativa para a
conjectura.
Essa foi a primeira experiência com explorações guiadas, na qual os alunos foram
mais devagar, desconfiados e alguns até mesmo reticentes. Após as primeiras
explorações os estudantes sentiram-se confiantes e começaram a fazer explorações
livres que os levaram a criar outras funções, numa profusão de fórmulas, tais como:
e
e
Dois fatos merecem atenção em relação a essas fórmulas encontradas pelos
alunos: o primeiro é que essa atividade foi realizada em um contexto específico de aulas
de geometria, com o professor que aplicou a atividade de investigação. Temos indícios
para crer que alguns alunos, na tentativa de responderem àquilo que acreditavam ser
uma demanda do professor, tentaram “geometrizar” várias das fórmulas encontradas.
Desenvolveram conceitos equivocados quando chamaram as fórmulas
e , por exemplo, de área e de perímetro respectivamente ou as
fórmulas e respectivamente de base e altura do Retângulo usado.
O outro fato é que nem todos os grupos usaram os módulos como aparecem
aqui, mas os resultados usados por eles eram modulares e resolvemos então colocar as
funções de acordo com a forma com que foram usadas, ou seja, em módulo.
Como nosso foco de investigação não estava nessas questões, achamos por bem
não nos atermos a elas e dedicarmos nossa atenção às questões ligadas aos processos
matemáticos desenvolvidos.
11
O importante, no nosso ponto de vista, foi a profusão de novas funções que
apareceram, sem que isso tivesse sido solicitado aos alunos. A partir de experimentos
mais dirigidos eles adquiriram autoconfiança suficiente para prosseguirem de forma
mais autônoma.
A dinâmica dos processos evidenciada durante a investigação
O G1, ao trabalhar com a função , calculou-a para vários retângulos,
e percebeu que o valor de estava relacionado, não apenas com a forma ou com as
dimensões do retângulo, mas também com o número de quadrados da tabela aos quais
ele sobrepunha a figura de acetato do kit. Ocorre aqui a descoberta de um padrão que
vai além daquilo sugerido na atividade. Uma criação do grupo advinda da exploração
guiada mas que começa a tomar rumos próprios. O grupo usou, inclusive, outros
retângulos que não constavam do kit. Podemos perceber aqui de forma clara a passagem
de uma exploração guiada para uma exploração livre.
Numa primeira tentativa de sistematização o grupo resolveu fazer uma tabela
onde relacionava o número de quadrados do retângulo com o valor de :
O processo de elaboração da tabela trouxe consigo novas observações e análises,
que acabaram por levar o grupo a descobrir uma nova função que lhe dará sempre o
valor igual ao de , que o grupo descreve como , onde é o número de
quadrados do retângulo.
Aqui podemos perceber a recorrência do movimento “inferências, conjecturas
sistematização novas inferências e conjecturas. O movimento feito pelo grupo, ou
seja, o processo desenvolvido por ele é o que caracterizaríamos como o “realizar uma
experiência matemática”. Enquanto explora uma situação, descobre padrões, organiza-
os e, nesse movimento de exploração, organização, inquirições e análises, acaba
descobrindo novos padrões que vão levantar novas inquirições, inferências e
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Número de quadrados do retângulo
Valor de
4 106 208 3010 4012 5014 60
conjecturas, requerer novas sistematizações que, por sua vez, levarão a novas
descobertas.
O G3, o G4 e o G5 fizeram uma conjectura que merece atenção. Após as
explorações guiadas com a função , os três grupos, na idéia de “geometrização” da
exploração, criaram a função que chamaram, inapropriadamente, de
área de um retângulo. Independentemente do nome dado à função, o interessante é
observar que, no movimento de experimentar o valor de para vários retângulos e de
sistematizar os resultados obtidos, verificaram que esse valor era sempre o mesmo de
. E essa coincidência foi encontrada de forma diferente, através de caminhos distintos,
pelos grupos. Tentaram ainda tecer conjecturas a respeito do assunto, mas não
conseguiram devido à exigüidade do tempo.
Também nessas situações percebemos a passagem dos alunos das descobertas
guiadas para as explorações livres, mais autônomas, e que acabam por provocar novas
descobertas que, por sua vez levam a novas conjecturas, inferências, novas
sistematizações....
Conclusão
Essa atividade nos traz a percepção da importância da experimentação do fazer
matemático por parte do aluno. Concordamos com Abrantes quando diz que “É através
de atividades matemáticas intencionais, das experiências que vive, que um indivíduo
consolida, descobre ou inventa conhecimento” (ABRANTES, 1999. p.3) .
Os processos de aprendizagem e de criação pelos quais o estudante passa quando
está investigando são de uma riqueza que merecem ser mais explorados por professores
e pesquisadores quando da preparação de uma investigação aplicada na escola. É muito
rica essa dinâmica de descoberta-sistematização-nova descoberta. Acreditamos ser essa
uma experiência vivida pelos matemáticos quando do seu processo de criação, como
destaca D’Ambrósio (1993), e que presenciamos o aluno vivenciar.
Por fim, a gradação na estruturação das tarefas a serem propostas ao estudante –
de experiências guiadas para experiências livres – podem ser um auxílio na construção e
constituição de sua autoconfiança.
Quando partimos de um sistema educacional que em geral não privilegia o
estudante como sujeito e sim como “objeto de aprendizagem” em sua passividade, e o
13
conduzimos para um ensino que o coloca no centro do processo, como elemento atuante
e criador, temos que lhe dar condições para isso.
A passagem da atividade guiada para a atividade livre seria a ponte que tornaria
possível ao aluno a passagem da heteronomia para a autonomia.
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