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PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NO ENSINO SUPERIOR: O EXAME
COMPARATIVO DAS PERCEPÇÕES DE ESTUDANTES E DOCENTES DE
CURSOS DE ENGENHARIA, EDUCAÇÃO FÍSICA E PEDAGOGIA
Renata Marcílio Cândido (UNIFESP)
Katiene Nogueira da Silva (FEUSP)
Dislane Zerbinatti Moraes (FEUSP)
Resumo
Na comunicação apresenta-se o estudo comparativo acerca das percepções de estudantes
e docentes sobre as práticas de avaliação nos cursos de Engenharia, Educação Física e
Pedagogia da Universidade de São Paulo. O projeto integra-se à investigação,
“Avaliação, Ensino e Aprendizagens no Ensino Superior em Portugal e no Brasil:
Realidades e Perspectivas” (2011-2014), coordenada pelo Prof. Dr. Domingos
Fernandes, da Universidade de Lisboa, na qual participam quatro universidades
portuguesas e três brasileiras. Pretende-se compreender as práticas de ensino e de
avaliação e processos de participação dos estudantes no desenvolvimento de suas
aprendizagens no ensino superior, em contextos reais de sala de aula, espaço de análise
pouco investigado no campo dos estudos sobre avaliação. Foram sistematizados os
dados de questionários, entrevistas com professores e estudantes e observações de aulas.
Pela análise efetuada pudemos observar uma variedade de perspectivas de avaliação nos
cursos analisados, compreendendo desde práticas de avaliação com sentido formativo,
objetivando envolver os estudantes em decisões sobre atividades de avaliação, oferta e
aproveitamento de feedback , como no caso dos cursos de Pedagogia integralmente e na
Educação Física, parcialmente, em disciplinas voltadas para a Licenciatura e a
persistência de modos de avaliar classificatórios, assim identificados pelos estudantes
do curso de Engenharia e no Bacharelado em Educação Física. Compreende-se como
observado no contexto da pesquisa em Portugal e Brasil, a necessidade de aprofundar as
investigações, pois o conjunto de dados qualitativos assinalam várias iniciativas
individuais de professores, objetivando produzir situações de avaliação que articulam o
ensino e a aprendizagem e a expressiva manifestação de docentes e estudantes quanto à
relevância da participação dos últimos nos processos de avaliação, produzindo melhores
performances de aprendizagem.
Palavras-chave: Avaliação das aprendizagens; Ensino Superior; Percepções de
estudantes e professores.
A comunicação apresenta os resultados de pesquisa acerca das percepções de
estudantes e docentes sobre as práticas de avaliação e suas relações com o ensino e
aprendizagem nos cursos de Engenharia, Educação Física e Pedagogia da Universidade
de São Paulo. O projeto integra-se à investigação “Avaliação, Ensino e Aprendizagens
no Ensino Superior em Portugal e no Brasil: Realidades e Perspectivas” (2011-2014),
coordenado pelo Prof. Dr. Domingos Fernandes, da Universidade de Lisboa, na qual
participam quatro universidades portuguesas (Universidade de Lisboa, Universidade de
Coimbra, Universidade do Minho e Universidade de Évora) e três brasileiras
(Universidade de São Paulo - USP, Universidade do Estado do Pará – UEPA,
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Universidade da Amazônia – UNAMA). O principal objetivo do projeto é conhecer e
compreender as práticas de ensino e de avaliação e processos de participação dos
estudantes no desenvolvimento de suas aprendizagens no ensino superior, em contextos
reais de sala de aula, espaço de análise pouco investigado no campo dos estudos sobre
avaliação. Além da identificação da bibliografia especializada, os pesquisadores
envolvidos realizaram coleta de dados, sendo esses compostos por aplicação de
questionários, entrevistas com professores e estudantes e observações de aulas em
diferentes cursos do Ensino Superior compreendendo os domínios científicos das
Ciências Sociais, Artes e Humanidades, Engenharia e Tecnologias e Ciências da Saúde.
Os dados qualitativos seguiram a matriz de observação de aulas e de entrevistas
estabelecida no projeto, na qual estão realçados aspectos do ensino, aprendizagem,
avaliação e ambiente de sala de aula, sintetizados nos itens: Planificação/organização e
desenvolvimento do ensino; Recursos e materiais utilizados; Tarefas e natureza das
tarefas; Gestão do tempo e estruturação das aulas; Práticas/participação dos estudantes;
Natureza, frequência e distribuição do feedback; Instrumentos, funções e tipos de
avaliação; Momentos em que ocorre a avaliação; Relação/interação entre docentes e
estudantes; clima da sala de aula. A exposição detalhada da metodologia e referencial
teórico da pesquisa pode ser conhecida no trabalho exposto nesse painel de autoria do
coordenador do projeto, Domingos Fernandes (2014).
Práticas de avaliação das aprendizagens no Curso de Engenharia
Apresenta-se, a partir deste momento, a sistematização dos dados coletados por
meio de aplicação de questionários a estudantes e professores do Curso de Engenharia
da Universidade de São Paulo. No âmbito da discussão das questões relacionadas à
aprendizagem e avaliação da mesma, os estudantes afirmam em suas entrevistas e
questionários que o aprendizado dos conteúdos constantes nos programas acontece no
estudo para os testes e/ou exames finais, mas discordam que estudar para os testes e/ou
exames finais seja suficiente para que aprendam o que está previsto nos programas.
Concordam plenamente com as questões que assinalam que a maioria dos estudantes
aprende melhor quando os professores lhes propõem, regularmente, tarefas para serem
realizadas ao longo do semestre e quando os professores e alunos estabelecem relações
que facilitam a entreajuda no processo de aprendizagem. O processo de aprendizagem
também é facilitado quando, na opinião dos estudantes, os professores utilizam
dinâmicas de trabalho diversificadas em sala de aula (trabalho em grande grupo,
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trabalho em pequenos grupos, trabalho em pares, trabalho individual) e quando utilizam
recursos variados para ensinar (materiais bibliográficos, transparências, power point,
plataforma on line, sites da internet, modelos físicos e programas informáticos). Na
disciplina escolhida, as tarefas relacionadas ao aprendizado dos conteúdos
relacionaram-se a realização dos fichamentos, um para cada texto, no desenvolvimento
de um projeto de pesquisa (em grupos) e duas avaliações, uma realizada em meados do
semestre letivo e outra no final. Os estudantes que participaram da entrevista acreditam
que essa organização é boa, exceto pela “extenuante quantidade de fichamentos a serem
realizados” (entrevista com os alunos).
A maioria dos estudantes concorda que seus professores orientam e apoiam a
aprendizado autônomo e para além das aulas, mas que este acompanhamento poderia
ser mais sistemático e acontecer ao longo do processo de aprendizagem. Para eles há um
consenso no significado da aprendizagem como possibilidade de alcançar os objetivos
previstos nos programas de cada disciplina, mas discordam da afirmação de que os
estudantes, em geral, envolvem-se ativamente nas tarefas de aprendizagem que lhes são
propostas pelos professores. Isto é, em algumas situações, como a descrita pelos alunos
entrevistados, os estudantes criam uma relação bastante pragmática e utilitarista com as
tarefas, sem envolverem-se muito com as mesmas:
A gente tinha a sensação muitas vezes de que ela nem lia os
textos que produzíamos, as notas eram muito aleatórias;
percebíamos que estudantes que muitas vezes não tinham feito o
trabalho, tinham só copiado, recebiam notas iguais ou superiores
àqueles que tinham realmente preparado o fichamento. Isso foi
desanimando (Entrevista com o grupo de alunos do Curso de
Engenharia da Produção).
Com relação à avaliação, os alunos discordam da afirmação de que o uso
sistemático dos resultados das avaliações das aprendizagens dos estudantes pelos
professores para alterar as suas metodologias de ensino, entretanto, concordam que a
organização da maiora das aulas favorece o desenvolvimento das aprendizagens
previstas nos programas. Concordam que o aprendizado é melhor nas
disciplinas/unidades curriculares nas quais a avaliação é um processo que se desenvolve
de forma contínua ao longo do semestre e que buscam utilizar as informações
decorrentes das avaliações para a melhoria das aprendizagens. Tal percepção pode ser
observada no acompanhamento das aulas pela pesquisadora, especialmente no
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desenvolvimento dos projetos e nas suas reformulações a partir dos comentários do
professor e dos colegas, bem como na elaboração e entrega dos fichamentos aula a aula.
Nas questões relacionadas à avaliação, os estudantes discordam da afirmação
que diz que na maioria das disciplinas/unidades curriculares cursadas, a avaliação
desenvolve-se de maneira contínua ao longo do semestre, exceto pela disciplina
analisada, que pela sua característica mais humanística, na visão dos alunos e professor,
permite a elaboração de esquemas de avaliação diversificados e distribuídos ao longo do
semestre. Para os estudantes também não é permitido debates acerca da organização e
desenvolvimento do processo de avaliação, “não fomos chamados a participar da
elaboração da avaliação; em nenhum momento demos a nossa opinião” (fala de um dos
estudantes entrevistados). Os critérios de avaliação são conhecidos pela maioria dos
estudantes, que podem discordar de alguns. Na percepção dos estudantes acerca do
processo de avaliação na disciplina em questão: “Acreditamos que foi adequado,
diversificado, foram várias formas de avaliação – prova, trabalho, fichamento – e em
diferentes momentos do curso”. Quanto às provas, “duas foram suficientes, tem
disciplinas aqui (na grade curricular do Curso de Engenharia) que só tem uma prova no
final do semestre”.
Quanto ao uso das avaliações pelos professores e estudantes, a análise dos dados
dos questionários aplicados indicam que na maioria das disciplinas a avaliação é
utilizada sobretudo para atribuir notas e classificar os estudantes, sendo pouco utilizada
para orientarem os estudantes a aprenderem melhor. Conforme fala do professor
responsável pela disciplina, a principal função da avaliação é “estimular os alunos a
estudarem, nota o cara acaba tendo mesmo” (entrevista com o professor). Já para os
estudantes, a função das avaliações é atribuir notas e ver o quê e como estão
aprendendo.
Mas a prova é difícil, às vezes não mostra tudo que você
aprendeu, de repente naquele dia você não tá bem. Às vezes
acumula, uma semana toda de provas, o pessoal fica acabado,
você vê na cara dos seus colegas, que estão cansados, não vai ter
um rendimento bom, pelo acúmulo de provas todas juntas. Isso
também poderia ser organizado pelos professores das disciplinas
no semestre, não deixar acumular tudo junto (Entrevista com o
grupo de alunos do Curso de Engenharia da Produção).
Os estudantes discordam da proposição que afirma o uso sistemático pelos
professores dos resultados da avaliação para que os mesmos se conscientizem das suas
dificuldades e/ou dos seus progressos na aprendizagem e discordam de que em regra e
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de modo geral, as avaliações realizadas são consistentes com o ensino e a
aprendizagem. Para eles, os resultados das avaliações são pouco utilizados pelos
estudantes para orientarem e/ou reorientarem suas formas de estudar, constituindo-se,
essencialmente, em um instrumento do processo de administração de testes destinado a
atribuir classificações. Além disso, poucas oportunidades são criadas nas disciplinas do
curso para que os alunos questionem os juízos formulados acerca das suas
aprendizagens. Com relação aos resultados parciais das avaliações feitas acerca do
projeto desenvolvido na disciplina, o professor analisa:
Então, os resultados das avaliações nos exercícios são para ver
ah isso aqui não deu certo, a melhor maneira de resolver isso
não é assim, acho que é isso só. E nos trabalhos, que tem uma
avaliação, mas tem um, é uma avaliação sem nota, eles
apresentam o relatório, a gente comenta e tal, então que é para
enquadrar, isso não é assim. Ai eles acabam, o trabalho demora
mais e as orientações são mais pontuais (Entrevista com
professor).
Na análise dos questionários, a grande maiora dos estudantes não percebe a
criação de situações em que tem que avaliar o seu próprio trabalho e o dos seus colegas,
o que pode ser questionado pela observação das aulas dedicadas as apresentações dos
projetos com posteriores apreciações do professor e demais colegas, nas aulas
observadas, os estudantes foram chamados a participarem comentando os projetos
apresentados, apesar de poucos participarem.
Nos dados analisados acerca das percepções dos estudantes e professores sobre o
ensino, o aprendizado e a avalição no Curso de Engenharia depreende-se que existe um
consenso, entre discentes e docente, sobre a importância da avaliação como instrumento
de acompanhamento do desenvolvimento escolar dos alunos, sem que para isso, estes
sejam chamados a participar da escolha e elaboração desses instrumentos; os estudantes
compreendem a necessidade da avaliação como momento importante para averiguar o
que foi ou não aprendido, mas percebem que estudar para a prova/avaliação não
significa um real aprendizado e deixam implícito em suas falas o quanto isso pode
indicar uma relação utilitarista com o saber. Para os estudantes, as avaliações poderiam
ser consideradas instrumentos importantes para a revisão das metodologias utilizadas
pelos professores e de acompanhamento mais sistemático do ensino e aprendizado no
curso.
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No curso de Educação Física quanto ao planejamento e organização das
atividades de ensino, a maioria dos estudantes, nos questionários, concorda com as
afirmações de que, em geral, os programas das disciplinas são claros e favoráveis ao
desenvolvimento das aprendizagens. Os professores utilizam frequentemente uma
diversidade de recursos para apoiarem o desenvolvimento das aulas e diferentes
dinâmicas de aulas. Há uma divisão significativa nas respostas dos estudantes quanto às
possibilidades de participação no planejamento e dinamização das aulas, sendo que
metade dos alunos discorda dessa afirmação. Identificou-se também que a maioria
discorda da afirmativa de que os estudantes são adequadamente acompanhados e
orientados pelos professores ao longo do processo de aprendizagem.
Em relação ao processo de aprendizagem, os respondentes manifestaram
concordância com a afirmação de que a maioria dos estudantes aprende os conteúdos
constantes nos programas porque tem que estudar para os testes e/ou exames finais, mas
que essa não é forma mais adequada de aprender o que está previsto na programação
curricular. Os questionários demonstraram também que a maioria das estudantes
concorda com afirmações que ressaltam a colaboração entre alunos e professores como
fator de melhoria das aprendizagens. Quanto à avaliação a maioria das respostas é de
concordância à afirmação: “os estudantes aprendem melhor nas disciplinas em que a
avaliação é um processo que se desenvolve na forma contínua ao longo do semestre”. O
retrato que desenham sobre as práticas de avaliação, no entanto, é o de que na maioria
das disciplinas, a avaliação é utilizada para atribuir notas/classificações aos estudantes,
e os professores não debatem com os alunos a organização e desenvolvimento do
processo de avaliação. Para os respondentes não é visível a experiência do feedback e
afirmam que os professores em geral não criam oportunidades para que os estudantes
clarifiquem e/ou questionem os juízos formulados acerca das suas aprendizagens e a
avaliação não é utilizada com frequência para orientar os estudantes a aprenderem
melhor.
Os professores entrevistados consideram que há dificuldades para a elaboração
de avaliações de sentido formativo, devido a pouca adesão dos alunos às tarefas
propostas e pelo fato de serem desatentos ao feedback. Levantam outros obstáculos
relacionados aos hábitos de estudos adquiridos na escola básica e às expectativas de
modelo de formação, voltado aos conhecimentos práticos e fórmulas simplificadas para
o exercício da profissão. Nas observações de aulas constatou-se que os docentes
utilizavam estratégias variadas, objetivando principalmente o desenvolvimento da
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competência de leitura e análise crítica de textos e de situações concretas. O ensino e
avaliação visavam promover relações plurais e aprofundadas com o conhecimento, tais
como: escrita de diários de aulas; resenhas de artigos científicos; leituras orientadas;
pesquisas individuais; jogo de apostas; painéis de discussão; estudo de caso;
observações de experiências em laboratório; análise de filmes, documentários e obras
literárias e apresentação de trabalhos (por exemplo, sequências didáticas para o ensino
de Educação Física, atividades práticas desenvolvidas na quadra poliesportiva e estudos
de caso clínico nas disciplinas relacionadas às ciências biológicas). De maneira geral os
professores aplicam avaliações com sentido formativo, procurando resolver dúvidas,
orientar para novas leituras, melhorar o desempenho e oferecer informações aos alunos
sobre as suas aprendizagens.
A avaliação deveria estar a serviço do ensino....e no fundo
isso sempre acontece. Essa avaliação geral como fenômeno de
olhar para você e perceber o que você não entendeu, perceber se
você quer saber mais, e eu me ajustar frente a isso; isso ocorre o
tempo todo na minha aula, uma vez que considero como função
minha formar pessoas. A avaliação está sempre comigo, mas do
ponto de vista formal, classificatório, da universidade, eu tenho
dificuldade. Fazer provas, devolver sem comentar, não faz muito
sentido. Faço avaliação contínua, na forma de comentários
escritos, coletivamente, oralmente ou pela internet, na lista de e-
mails, através dos textos que me enviam. Mas é irreprodutível,
para cada um escrevo uma coisa, para um exijo menos do que
para outros, dependendo das possibilidades de entendimento
deles. (entrevista com docente em Disciplina de Licenciatura)
[A avaliação] é algo que eu tenho muita dificuldade. O que
eu gostaria? Eu gostaria que os alunos fizessem mais resenhas
de artigos, que eles fizessem os trabalhos que a gente propõe em
classe, em grupos ou individuais. Porque com isso eu acho que o
aprendizado é muito mais significativo e [o aluno] vai se
apropriar muito mais dos conceitos, do conhecimento, do que
simplesmente fazendo um teste. Mas o que acontece?
Infelizmente, a adesão às estratégias ainda não é a melhor
possível (...). Então eu faço as estratégias valendo nota para que
eles tenham uma adesão maior, senão eles não fazem. E faço a
prova [final]. Mas como é que eu tento fazer a prova? Eu tento
fazer minha prova trazendo casos. (entrevista com docente em
disciplina de Ciências Biológicas)
Os dois professores participantes da pesquisa realizaram o Curso de Pedagogia
Universitária, promovido pela Universidade de São Paulo e o citam como referência e
inspiração para a elucidação e retificação constante de concepções sobre o que é
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aprender e ensinar. Em suas percepções há um forte investimento reflexivo em busca
de compreensões mais diversificadas dos modos de aprendizagem dos estudantes e
incorporação do princípio de inventividade didática (MEIRIEU, 1998).
Os estudantes entrevistados trazem pontos de vista diferentes em relação às
práticas de ensino e avaliação em comparação com os expressos pelas docentes. Talvez
pela visão de conjunto que possuem e pelos obstáculos que enfrentam no processo de
aprendizagem no âmbito das disciplinas da área de ciências biológicas, cerca de 70% do
currículo, retratam particularidades das práticas de avaliação presentes no curso de
Bacharelado, voltado para a formação em Educação Física e Esportes e na Licenciatura
que habilita para o ensino em instituições escolares. Pelas afirmativas dos estudantes os
estilos dos professores são diversos, traduzindo práticas de avaliação distintas:
No bacharelado a maioria das aulas é expositiva e a
participação dos alunos é mais reduzida, voltada para o
conteúdo. Então, já tem provas específicas e conteúdos
determinados. O cronograma já é estipulado. Há pouca
comunicação entre os alunos e pouquíssima intervenção dos
alunos. Na licenciatura o professor solicita a leitura de um texto
e para o aluno trazer uma opinião sobre o tema (....) ocorrem
debates... Os professores na Licenciatura são mais flexíveis.
Eles pedem para que os alunos intervenham e ajudem a construir
tanto a avaliação como o cronograma das aulas. Eu acho bem
legal porque tem uma preocupação com a bagagem do aluno, o
que o aluno vai aprender. Eles não focam tanto na avaliação do
produto e sim do processo. (entrevista com estudante)
Pelos elementos analisados conclui-se que no Curso de Educação Física há duas
percepções sobre práticas de avaliação, cada qual predominante em uma das
modalidades de formação: Bacharelado exercitando um ensino mais tradicional e a
Licenciatura realizando atividades de aula em colaboração visando à autonomia
intelectual do estudante. Obtiveram-se também indícios de um intenso debate sobre
como encaminhar mudanças visando à participação integrada de alunos e professores no
processo de organização, planejamento, ensino, aprendizagem e avaliação.
Práticas de avaliação das aprendizagens no Curso de Pedagogia
Mediante a pesquisa realizada no Curso de Pedagogia foi possível observar que
a organização das aulas, em geral, obedeceu a seguinte estrutura: revisão da matéria
dada na aula anterior, diálogo entre o docente e os alunos diante de questões expostas,
exposição dos conteúdos programados para o dia e realização de pequenas tarefas, como
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leituras de textos curtos e produção escrita. As aulas, organizadas em tópicos, são em
sua maioria expositivas, mas há um diálogo constante entre o professor e os alunos,
além de debates no âmbito dos temas apresentados. No início do curso, logo na primeira
aula, o professor entregou impresso e apresentou o programa da unidade curricular,
explicando aos alunos como as aulas seriam realizadas, quais os objetivos da disciplina
e também como seria realizado o processo de avaliação e quais critérios seriam
utilizados.
No âmbito das aulas expositivas, o professor ocupa um lugar de destaque na
classe, mas seu protagonismo é divido com os alunos, que têm liberdade para pedir a
palavra, exprimir suas ponderações e questões a qualquer momento. O ambiente é
bastante amistoso e o professor é bastante solícito e disponível para conversar com os
alunos. As práticas observadas evidenciam a ideia na qual a aprendizagem se daria
mediante as leituras sugeridas antes e durante as aulas, as aulas expositivas, os debates
realizados em classe e a produção escrita dos estudantes. Era esperado que a
participação dos alunos nas atividades das aulas contribuísse para que eles aprendessem
melhor. Os estudantes eram sempre encorajados a participar e a tirar dúvidas. Havia um
incentivo constante para que os alunos tivessem autonomia e dialogassem com o
professor acerca dos conteúdos apresentados. As aulas eram expositivas e interativas.
Os estudantes aderiam às tarefas propostas e eram bastante receptivos. Diferentemente
do curso de Engenharia, no curso de Pedagogia, ao explicar como seria realizado o
processo de avaliação, o professor convidou os alunos a sugerirem outras práticas de
avaliação ou mesmo uma contraproposta, caso não concordassem com o exposto, mas
ninguém se manifestou contrário à proposta apresentada.
Assim como no curso de Educação Física, há uma variedade de atividades de
aprendizagem, fato que também é confirmado pelas respostas dos estudantes ao
questionário. Com relação à seguinte questão, por exemplo: “A maioria dos professores
proporciona oportunidades para que, nas aulas, os estudantes participem numa
variedade de atividades de aprendizagem (e.g. discussões, análise de textos, resolução
de problemas, redação de comentários)”, a maior parte dos estudantes concordou com a
afirmação. Os debates têm entre seus objetivos introduzir nos trabalhos dos alunos a
necessidade da criação de argumentos e a prática da pesquisa acerca do tema abordado.
Quanto mais elementos os estudantes tiverem para argumentar e animar o debate, mais
produtiva será a atividade. Segundo o docente, as dificuldades apresentadas para os
alunos aprenderem nesta disciplina, em geral, se devem às faltas às aulas, a não terem
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realizado as leituras recomendadas e os trabalhos exigidos. As percepções destes
universitários confirmam o estereótipo com relação ao estilo de formação praticado nos
cursos da área das Ciências Sociais, neste caso representado por Pedagogia. Ao primeiro
olhar poderíamos dizer ainda que o estilo de ensino praticado reflete, segundo a
percepção dos estudantes, a natureza não exclusiva de tais ciências: a complexidade, a
criatividade e abstração das humanas.
No decorrer do curso existiam momentos de avaliação, nos quais os alunos
recebiam feedback do professor acerca das atividades realizadas. O ensino, a avaliação e
as aprendizagens estão relacionados, correspondendo a avaliação ao julgamento que é
realizado para verificar as aprendizagens, se ocorreram ou não, quais as dificuldades
apresentadas pelos alunos, mas também para repensar o curso ministrado. Quanto à
reformulação das aulas diante do desempenho discente e à afirmação “Os professores
utilizam, sistematicamente, os resultados da avaliação das aprendizagens dos estudantes
para alterar as metodologias de ensino” evidenciou-se que a maior parte dos futuros
pedagogos concorda com a ideia. Para os alunos, o processo de avaliação tem entre as
suas principais funções ser um referencial para acerca do seu desempenho, eles devem
tiram lições a partir da avaliação, ter consciência do que já aprenderam, das dificuldades
apresentadas e do que ainda precisam aprender. As questões da prova final, que consiste
numa nova versão da sondagem inicial realizada ao longo do curso, são baseadas nos
tópicos que foram trabalhados ao longo da unidade curricular. Há sempre uma forte
relação entre as questões e os domínios do curso, de modo que seja possível identificar
as lacunas ocorridas no processo de aprendizagem por meio da prova escrita. No caso
dos alunos que porventura fiquem insatisfeitos com o seu desempenho na prova, é
possível que eles voltem a estudar os conteúdos que não aprenderam e refaçam a prova.
O valor formativo dos estudos para a realização das avaliações foi aspecto
frequentemente mencionado nos relatos dos estudantes e constitui elemento a ser
integrado à discussão sobre os procedimentos e práticas de ensino e aprendizagem, em
nível superior. A avaliação é contínua e proporciona ao professor o acompanhamento
constante nas atividades dos alunos. A avaliação é concebida no curso como um
processo que auxilia os estudantes a aprender e o professor a ensinar. É através das
práticas de avaliação empregadas que se torna possível conhecer o que os alunos
aprenderam, quais as suas dificuldades e qual a melhor maneira de auxiliá-los. Na
opinião dos alunos, a principal função do processo de avaliação é obter um feedback
acerca das atividades realizadas. No caso da produção escrita, por exemplo, que é muito
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valorizada nesta instituição, os alunos manifestam a expectativa de saber se a maneira
como constroem os argumentos faz sentido no âmbito das unidades curriculares.
Diante das variedades de práticas de avaliação das aprendizagens às quais são
submetidos na instituição, os universitários afirmam: “A liberdade na FEUSP é
assustadora!” Talvez a expressão se deva às diferenças entre o processo de avaliação
empregado no ensino médio em que, em geral, o momento das provas e dos exames
muitas vezes é sublimado no processo de ensino e aprendizagem, e este experimentado
agora no ensino superior. Em alguns momentos os estudantes chegam a fazer a seguinte
afirmação: “Às vezes temos a impressão que os professores não querem avaliar”. Diante
da afirmação: “na maioria das disciplinas, a avaliação é, sobretudo, utilizada para
atribuir as notas/classificações aos estudantes”, a maior parte dos estudantes disse
concordar, o que é contraditório ao mencionado nas entrevistas. No caso da realização
de práticas de avaliação formativa foi possível perceber, através do ponto de vista dos
estudantes, que elas têm ocorrido pouco na instituição de um modo geral, no âmbito de
todas as disciplinas cursadas, ou ao menos é assim que têm sido notadas pelo corpo
discente, pois a minoria dos alunos considera que a avaliação é utilizada, com
frequência, para orientar os estudantes a aprenderem melhor. Posição semelhante foi
apresentada com relação aos exames finais, pois a maior parte dos alunos concordou
com a seguinte afirmação: “Na maioria das disciplinas/unidades curriculares, os
resultados obtidos pelos estudantes nos testes e/ou exames finais são os elementos mais
determinantes para a atribuição das suas classificações.” Ao considerarem que a
avaliação é pouco utilizada para ajudá-los a aprender e presta-se, sobretudo, a classificá-
los, percebemos que para estes alunos tais práticas têm na nota ou no conceito o seu
produto final e não no processo de ensino e aprendizagem.
Considerações Finais
Mediante o estudo realizado é possível perceber uma diferença entre a ideia de
autonomia que existe como uma espécie de espectro em torno do estudante universitário
e as práticas de ensino, de aprendizagem e de avaliação às quais em geral estão
submetidos, mais próximas de um sistema diretivo e tradicional. Pode-se, assim,
constatar que as percepções estudantis acerca de práticas formadoras, avaliativas e de
aprendizagem, realçam o caráter conservador das mesmas. Através desta pesquisa fica
evidenciada a concepção na qual a aprendizagem no ensino superior se dá pelo ensino
ministrado nas aulas e pelo estudo realizado pelos alunos. Nesta perspectiva, quanto
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maior for o investimento que os alunos dispensarem na sua própria formação, contando
com o trabalho e o apoio dos docentes, maiores são as chances de ocorrer a
aprendizagem.
Procurando tecer uma primeira abordagem comparativa, podemos observar uma
variedade de perspectivas de avaliação nos cursos analisados, compreendendo desde
práticas de avaliação com sentido formativo, objetivando envolver os estudantes em
decisões sobre atividades de avaliação, oferta e aproveitamento de feedback , como no
caso dos cursos de Pedagogia integralmente e na Educação Física, parcialmente, em
disciplinas voltadas para a Licenciatura e a persistência de modos de avaliar
classificatórios, assim identificados pelos estudantes do curso de Engenharia. O
feedback é um elemento particularmente importante no âmbito da avaliação formativa,
sendo “determinante para ativar os processos cognitivos e metacognitivos dos alunos,
que, por sua vez, regulam e controlam os processos de aprendizagem, assim como para
melhorar a sua motivação e autoestima” (FERNANDES, 2009, p. 60).
Os docentes nos cursos de Educação Física e Engenharia centralizam as decisões
sobre as modalidades e sentidos da avaliação. Foi identificado também o desencontro
entre percepções de estudantes sobre as práticas de avaliação e as intenções de docentes.
Em entrevistas com professores do curso de Educação Física, o núcleo de preocupações
dos docentes está em justamente buscar formas de orientar os estudantes para que eles
de fato usufruam das avaliações de aprendizagem proporcionadas pelo sistema de
provas e feedback. Compreende-se ainda, como observado no contexto da pesquisa em
Portugal e Brasil, a necessidade de aprofundar as pesquisas e o conhecimento sobre as
práticas reais de avaliação, pois o conjunto de dados qualitativos assinala várias
iniciativas individuais de professores, objetivando produzir situações de avaliação que
articulem o ensino e a aprendizagem e a expressiva manifestação de docentes e
estudantes quanto à relevância da participação dos últimos nos processos de elaboração
de avaliação, produzindo melhores performances de aprendizagem.
Referências
FERNANDES, Domingos. Práticas de avaliação de docentes de artes e
humanidades em quatro universidade portuguesas. Fortaleza/Sergipe: ENDIPE,
2014.
FERNANDES, Domingos. Avaliar para Aprender. Fundamentos, práticas e
políticas. São Paulo: Ed. Unesp, 2009.
MEIRIEU, Philippe. Aprender...sim, mas como? Porto Alegre: Artmed, 1998.
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