pirÂmides & obeliscos nº 3

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PORTUGAL NUMA POSIÇÃO ESTRATÉGICA número 3 A INTERNACIONALIZAÇÃO É UM FACTOR DE SUCESSO DAS PME No limiar da segunda década do século XXI parece impensável qual- quer modelo de desenvolvimento assente na ideia do proteccio- nismo extremado e na decorrente opção pelo isolamento autárcico. Tudo leva a crer que nem mesmo as maiores e mais poderosas econo- mias do mundo podem dispensar uma ligação forte e serena, quero dizer pacífica, ao resto do mundo. Não apenas por razões económicas na busca de mercados e de fontes de matérias primas mas também porque a sociedade do conhecimento exige uma troca continuada de experiência, de trabalho de equipas cada vez mais amplas, pluri- disciplinares, plurinacionais, na busca de explicações para o que se não conhece e por isso mesmo se configura como ameaça. Se este aproximação é verdadeira ou seja, se é suficientemente veri- ficável, então parece poder afirmar-se que o processo de criação das empresas do nosso tempo, sejam elas de pequena ou de média dimensão, tem de incluir com destaque, o objectivo, a intenção clara de se integrar numa ou em várias redes internacionais a que possam prestar o serviço das suas competências e colher os benefícios resul- tantes da aprendizagem que as novas relações lhes proporcionem. Neste número da P&O, nas páginas seguintes, dão-se alguns exem- plos, algumas pistas.

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Revista integrada no Estudo – MATERIAIS DE CONTRUÇÃO – Conhecer as Necessidades de Qualificação dos Recursos Humanos, para Melhorar o Desempenho das Empresas – fase 2.

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Page 1: PIRÂMIDES & OBELISCOS  Nº 3

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A INTERNACIONALIZAÇÃO É UM FACTOR DE SUCESSO DAS PME

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No limiar da segunda década do século XXI parece impensável qual-quer modelo de desenvolvimento assente na ideia do proteccio-nismo extremado e na decorrente opção pelo isolamento autárcico. Tudo leva a crer que nem mesmo as maiores e mais poderosas econo-mias do mundo podem dispensar uma ligação forte e serena, quero dizer pacífica, ao resto do mundo. Não apenas por razões económicas na busca de mercados e de fontes de matérias primas mas também porque a sociedade do conhecimento exige uma troca continuada de experiência, de trabalho de equipas cada vez mais amplas, pluri-disciplinares, plurinacionais, na busca de explicações para o que se não conhece e por isso mesmo se configura como ameaça.

Se este aproximação é verdadeira ou seja, se é suficientemente veri-ficável, então parece poder afirmar-se que o processo de criação das empresas do nosso tempo, sejam elas de pequena ou de média dimensão, tem de incluir com destaque, o objectivo, a intenção clara de se integrar numa ou em várias redes internacionais a que possam prestar o serviço das suas competências e colher os benefícios resul-tantes da aprendizagem que as novas relações lhes proporcionem. Neste número da P&O, nas páginas seguintes, dão-se alguns exem-plos, algumas pistas.

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Dá-se neste nº 3 da P&O um realce especial à necessidade de inter-nacionalização das PME por me parecer, por estar seguro, desde há muito, que o contacto com realidades diferentes e às vezes contras-tando mesmo com o nosso quotidiano, nos abre novas perspectivas, novos horizontes, novos campos de reflexão. A internacionalização das PME oferece-lhes um manancial de oportu-nidades para romper com as rotinas aceites desde há anos porque sempre assim foi, para fazer contactos e apontar negócios possíveis.Por outro lado, o interesse da internacionalização não se esgota nas motivações de natureza económica, na busca de mercados, de equipa-mentos ou matérias primas mas, porque a sociedade do conhecimento exige uma troca continuada de experiência, de trabalho de equipas cada vez mais amplas, pluridisciplinares e plurinacionais, na busca de explicações para o que se não conhece e, por isso mesmo, se configura como uma ameaça.A criação de empresas no nosso tempo, sejam elas de pequena ou de média dimensão, tem de assumir o objectivo, a intenção clara, de se integrar numa ou em várias redes internacionais para participar como parte inteira do processo de aprendizagem da acção colectiva. Hoje, ninguém faz nada sozinho. A cooperação é uma palavra-chave para todo o progresso imaginável.

Por fimDevo dizer, para terminar por hoje, que sempre me causou admiração verificar que todos os povos de além Pirenéus viviam muito melhor do que os portugueses E vi que esta diferença se acentuava, tornando-se cada vez mais nítida, à medida que caminhava para Norte.Mas isto não foi sempre assim como se sabe e o Prof. Carlos Fiolhais assinala.

Aqui está um tema que se propõe para reflexão: Que explicação encon-trar para esta chocante diferença? Pense1! Escreva-nos sem exceder as duas páginas A4 a dois espaços, corpo 12. Levaremos a sua opinião a muitos milhares de pessoas se não houver nenhum motivo de força maior que o impeça.

Director

1 Não se conhecem contra indicações nem casos de uso excessivo. Pelo contrário, parece estar cientificamente comprovado que tem uma acção retardadora do envelhecimento.

 

O n.º 2 da PIRÂMIDES&OBELISCOS foi disponibili-zado na Internet – www.cct.org.pt – e distribuído pelas associações que colaboram na realização do estudo MATERIAIS DE CONS-TRUÇÃO: Conhecer as Necessidades de Qualificação dos Recursos Humanos para Melhorar o Desempenho das Empresas – Fase 2.Recebido com geral agrado foram sublinhados com particular interesse a entrevista concedida pelo Eng. António Corte Real, administrador da Construcer, de Avelãs de Caminho pelo carácter exemplar da sua atitude, pelo ensinamento que transmite e os dois desafios que a revista deixa aos seus leitores. O primeiro, a propósito das três histórias essen-cialmente verdadeiras em que se exemplificam situações de cooperação entre empresas e o segundo em que se pede um comentário ao modo como um imigrante lituano, lúcido e desinibido, recorreu aos saberes que tinha adquirido na escola para conquistar um emprego em Portugal.A propósito do artigo do Prof. Carlos Fiolhais transcrito do “Le Monde Diplomatique”, ed. Portuguesa, recebemos por e-mail um comentário de felicitações por “termos tido a lembrança de recuperar este texto, porque pouca gente sabe que Portugal era, há 180 anos, o quinto país mais rico do mundo, tendo à sua frente apenas o Canadá, a França, a Grã-Bretanha e os Países Baixos…. De certo que a riqueza de Portugal era ouro trazido do Brasil e restos da pimenta das Índias, portanto riqueza proveniente da conquista e não do trabalho ou do saber. … Mas no princípio do século XX passámos rapidamente da cabeça para a cauda da lista das nações mais ricas de tal modo que em 1913 éramos os penúltimos da mesma lista de 17 países”. O Prof. Carlos Fiolhais pergunta: “Qual é agora, no início do novo século, o maior problema em Portugal? Embora num nível bem dife-rente de há cem anos, o maior problema continua a ser o défice de educação, concretizado hoje na falta de uma educação científica de alcance e qualidade”. E termina: “A escola qualificada (que só pode resultar de um processo sério de avaliação) garante a diferença entre o passado e o futuro. Só com o enraizamento de uma boa escola o nosso atraso desaparecerá para sempre.”De 2001, ano em que o Prof. Carlos Fiolhais escreveu o artigo, até ao presente, não melhorou a nossa posição no ranking mundial mas deve reconhecer-se que um enorme esforço de consciencialização desta realidade e algumas importantes medidas visando a sua superação tem sido desenvolvidas. Sobretudo, parece ficar cada vez mais claro que não haverá de novo “cravo, canela, marfim” nem “florete de espadachim” que nos valham. Só o saber e o trabalho duro para o adquirir e aplicar poderá fazer de todos nós gente. Gente de corpo inteiro. E tenha-se como certo que não há limite de idade para aprender com o passado, com as lições do presente e, sobretudo, com o futuro que tivermos como desejável de entre os que parece desenharem-se como possíveis. É à luz desse futuro que construiremos o presente.

editorial

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PROJECTO SMARTGRIDS: REPENSAR AS REDES ELÉCTRICAS

FALEMOS DE INTERNACIONALIZAÇÃO A PROPÓSITO DE PME COMERCIAIS

34 Perpendicularidades, paralelismos e outras forças celestes do caos comunicacional

ÍNDICE DE CONTEÚDOS

Propriedade: Conservatório de Ciências e Tecnologias-Associação para a Divulgação das Novas Tecnologias e Avanços da Ciência | Praça da República, 13 - 6º, 4050-495 Porto Telefone 222 083 208 · Fax 222 081 031 | [email protected] * www.cct.pt

Director: Almor Viegas | Edição e Coordenação: F+G – FORMAÇÃO E GESTÃO, SA |Relações Institucionais: António F. Lopes | Textos de: Célio de Melo Costa, Fernando Ferreira, Almor Viegas, Manuel Lourenço, Ernesto Matos, A. da Silveira, António F. Lopes (Trd.) | Fotografia: Ernesto Matos; Fotolia; sxc.hu.

Delegada no Centro: Ana Maria Mota ([email protected]) | Delegada em Lisboa: Fernanda Ramalho ([email protected])| Coordenação gráfica e redactorial: F+G

Distribuição gratuita pelos Associados da APCMC, APICER, APIMM, ASSIMAGRA, AIMM | Base de Dados do CCT.

Tiragem de 5000 exemplares.

Publicação integrada no Estudo MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO – – Conhecer as Necessidades de Qualificação dos Recursos Humanos para Melhorar o Desempenho das Empresas – Fase 2

Número 3 – Maio de 2009

Edição on-line em www.cct.pt

PIRÂMIDES&OBELISCOS

04 Materiais de Construção: Conhecer as necessidades de Qualificação dos Recursos Humanos para Melhorar o Desempenho das Empresas – Fase 2

07 DE QUANTAS MANEIRAS SE PODE SER ANALFABETO?

12 EMPREENDER EM PORTUGAL PELA VIA DA RETOMA DE UMA PME

19 Maria Fernanda CarmoResponde a um feixe de questões formuladas pela Direcção da PIRÂMIDES & OBELISCOS

24 EUROPA: As substâncias perigosas provocam dez vezes mais mortes do que os acidentes de trabalho

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O SEGREDO PODE ESTAR NA ESCOLA

FERNANDO PESSOA Não só um dos maiores poetas da língua portuguesa mas também um profissional empenhado nomeadamente nas áreas comercial e da Gestão Estratégica

A CIÊNCIA AO ALCANCE DA MÃO Uma exposição contagiosa

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Terminou o trabalho de campo do projecto Materiais de Constru-ção: Conhecer as Necessidades de Qualificação dos Recursos

Humanos para Melhorar o Desempenho das Empresas, promovido pelo CCT – Conserva-tório de Ciências e Tecnologias. Os resulta-dos dos dados colhidos serão oportunamente divulgados, assim como a metodologia apli-cada. Deixarei aqui algumas notas acerca da metodologia. Referirei igualmente algumas ideias que começam a ganhar forma e que apontam pistas para uma necessária e eficaz intervenção no sector.

NOTAS METODOLÓGICAS

Sendo o objecto de estudo os Recursos Huma-nos das empresas de produção e comércio de materiais de construção, constituiu-se uma amostra quotizada pelas diversas fileiras e pro-porcional ao universo. As fileiras abrangidas pelo estudo foram: Comércio de Materiais de Construção, Madeiras, Metalurgia e Metalo-mecânica, Cerâmica e Rochas Ornamentais.Para a obtenção de informações relevantes acerca das características das empresas que constituem cada uma das fileiras contámos com a preciosa colaboração das associações mais representativa de cada uma das fileiras e

Manuel LourençoSociólogo, Coordenador do Estudo

[email protected]

MATERiAiS DE CONSTRuçãO:CONHECER AS NECESSiDADES DE QuALiFiCAçãO

DOS RECuRSOS HuMANOS PARA MELHORAR

O DESEMPENHO DAS EMPRESAS – FASE 2

com as quais foram celebrados protocolos de cooperação institucional. As referidas associa-ções funcionaram também como um valioso intermediário entre o CCT – Conservatório de Ciências e Tecnologias e as empresas, facili-tando assim os necessários contactos. Foram ouvidos em entrevista cerca de 200 empresários/decisores de PME por entrevis-tadores qualificados e devidamente prepara-dos. Agradecemos desde já a todos os que, de uma forma ou de outra, colaboraram neste desafiante projecto, nomeadamente aos empresários que acederam a fornecer dados e informações, assim como a tecer opiniões acerca da temática objecto deste projecto.

PISTAS DE OBSERVAÇÃO E GUIAS DE ANÁLISE

A atenção na análise de dados será dada aos objectivos do projecto a que nos propuse-mos, nomeadamente à caracterização das empresas, dos dirigentes/decisores e dos Recursos Humanos; detecção de problemas de qualificação e necessidades de formação; averiguação das práticas das empresas, ao nível da gestão, para fazer face às dificulda-des actuais, num contexto de contracção da procura, e para se modernizarem e reforçarem a capacidade competitiva com enfoque na

inovação, na cooperação interempresas e na internacionalização.Como já foi registado no número anterior da P&O, olhando para as características das empre-sas, constatámos que a sua principal riqueza é a diversidade: fileiras distintas, lógicas sectoriais diferenciadas, contextos competitivos dife-rentes, modelos de gestão diferentes, culturas empresariais diferenciadas, empresários com características sócio-profissionais diferentes. Cada binómio empresa/empresário é único.

RH e Formação Profissional

Como é sabido, este sector específico da cons-trução detém as mesmas características que assolam o país e que condicionam o seu desen-volvimento: deficit de qualificação da popula-ção activa e baixos índices de produtividade. Esta foi uma evidência cujos resultados serão posteriormente analisados e apresentados com detalhe. Referimo-nos especificamente à esco-laridade dos Recursos Humanos e dos gesto-res. Esta limitação é condicionadora de uma intervenção assertiva pois condiciona os meios de actuação da organização, e o próprio pro-jecto individual de cada trabalhador. Notamos também que a baixa escolaridade é ainda predominante nas faixas etárias mais elevadas. É de louvar o esforço do Programa

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Operacional Potencial Humano (POPH) no sentido de dar resposta a estes problemas atri-buindo uma verba substancial do Programa aos eixos de Qualificação inicial e de Aprendi-zagem ao Longo da Vida, de forma a cumprir as metas da iniciativa Novas Oportunidades.Falar em Formação Profissional ou falar de baixas qualificações da população activa, só faz sentido se se tomar em consideração que os trabalhadores operam em empresas concretas e que a formação por si só não é suficiente se não for vista como um todo. O

problema da falta de qualificações está a par, sob o ponto de vista dos constrangimentos que causa, do modelo de gestão tradicional em Portugal, marcado acima de tudo pela utilização de Mão de Obra intensiva, pouca ou nenhuma diferenciação pelo produto, bai-xos salários, fraca produtividade, resistência à cooperação e dificuldades em processos de internacionalização.

Configura-se assim como prioritária uma intervenção formativa numa dupla pers-pectiva, isto é, formação dos trabalhadores e empresários, por um lado e, por outro, modernização do modelo empresarial. São duas faces da mesma moeda. Não basta mudar uma delas sob pena de os avultados investimentos exigidos por uma intervenção deste tipo se tornarem ineficazes.Verificámos que os empresários e decisores das empresas abordadas começam a estar atentos às questões da Formação Profissional,

pese embora o termos detectado ainda um grande desconhecimento acerca dos mecanis-mos práticos e legais que envolvem a Forma-ção Profissional. No que diz respeito à oferta formativa exis-tente, e generalizando, parece evidente que esta, se em quantidade é suficiente, não parece ser ajustada às necessidades das empresas. Muitas vezes não segue referenciais

de formação certificada e muitas vezes tam-bém aborda temáticas desajustadas. Persiste, assim, um deficit de articulação entre as res-postas formativas e as reais necessidades do tecido produtivo. uma das apostas deste pro-jecto é a criação de um plano de formação adequado às reais necessidades das empre-sas. Seguramente que o plano de formação que iremos propor contemplará esta dupla perspectiva: diagnóstico de necessidades de formação dos trabalhadores e empresários e diagnóstico de necessidades de modernização

da empresa. Propor formação avulsa, sem conhecer as realidades concretas das empresas seria improdutivo e inconsequente.

Modelo de discrepância

Para a averiguação das necessidades de for-mação utilizámos o modelo de discrepância,

O problema da falta de qualificações está a par, sob o ponto de vista dos constrangimentos que causa, do modelo de gestão

tradicional em Portugal…

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acareando os níveis de qualificação exigidas para o desempenho de uma determinada fun-ção com as qualificações disponíveis. É interessante e relevante destacar que os empresários identificaram com bastante fre-quência as áreas de Estratégia e Gestão como áreas onde a necessidade de progressão é supe-rior. Como áreas de Estratégia e Gestão inclu-ímos, nos instrumentos de recolha e registo de dados, três pilares: inovação, Cooperação e internacionalização.

ESTRATÉGIA E GESTÃO

Quando falámos em inovação falámos em inovação não só de produtos mas também em

inovação de processos de fabrico, inovação a nível comercial, inovação a nível financeiro e contabilístico, inovação na estrutura organi-zacional, etc. Falámos acima de tudo de uma actualização permanente que reforce a capa-cidade competitiva e a eficácia organizativa.Apesar de a inovação não ser ainda prática cor-rente, a generalidade das empresas abordadas reconhecem a sua importância, como ficou demonstrado no estudo. uma empresa, para sobreviver no actual contexto, está condenada a inovar. Esta inovação não passa apenas por definir um novo produto num gabinete ou num laboratório. Passa pela intervenção siste-mática e continuada de todos os intervenien-tes na organização. No entanto, constata-se que poucas empresas referem medidas em concreto que fossem tomadas nesse sentido.

igualmente verificámos que as empresas não têm, em geral, estruturas funcionais específi-cas para a vertente inovação nem verificámos a existência de culturas organizacionais vol-tadas para a inovação.As resistências militantes dos empresários por-tugueses em cooperar foram já diagnostica-das. Portugal é o país da união Europeia com taxas mais baixas de cooperação empresarial. Pensamos que é nas PME que cada vez mais é necessário uma abertura dos empresários a processos de cooperação, com projectos perce-bidos como vantajosos para todos.A internacionalização não é apenas uma opção mas um objectivo estratégico para todas as empresas, mesmo as mais pequenas. A inter-nacionalização não pode ser vista apenas como fluxos de importações/exportações de bens e serviços ou de deslocalizações de unidades produtivas. internacionalizar uma empresa, em sentido lato, é operar na economia glo-bal, procurar vantagens competitivas onde elas estão. O sucesso das empresas depende da capacidade dos decisores para compreenderem estas mudanças e agirem de acordo.

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Há muitas e diferentes maneiras de ser anal-fabeto e, portanto, de correr o risco de ser socialmente excluído. Exclusão de diferentes graus, diga-se. Mas, em todo o caso, exclusão.uma dessas maneiras será ter feito todos os exames e passado em todos os testes da esco-laridade obrigatória e continuar a ter dificul-dade em saber ler o horário dos comboios. Ou, às dez horas da manhã de um dia de sol, não saber para onde fica o Norte (ou o Sul). Ou pensar (e dizer) que o primeiro rei de Por-tugal foi Afonso Costa ou que Salazar tenha sido o primeiro Presidente da República.Decidir deixar de estudar porque se arranjou um emprego e a escola não vale a pena porque há muitos doutores desempregados, temos ouvido com espanto e demasiada frequência. É um alibi que não vai impedir a condenação.Para não ser maçador, só mais dois modos de alguém se auto excluir: terminar a licenciatura

e pensar que já não é preciso estudar. Estudar era na Escola. Agora, o que é preciso é traba-lhar, ganhar dinheiro...eRecusar-se a aprender o essencial das novas tecnologias da informação e da comunicação com o pretexto de já não ter idade para isso, por conservadorismo assumido, por preguiça ou por mero diletantismo. Ou aprender as novas tecnologias e esquecer-se de que a trans-versalidade cultural é um catalisador essencial de todos os processos de aprendizagem. Se o leitor sentiu que este texto lhe disse alguma coisa, já agora, pare um instante para reflectir e interrogue-se: Estarei a fazer tudo o que posso para evitar a minha própria exclu-são? Pode ser que se surpreenda e, nesse caso, permita-me um conselho: Descubra den-tro de si o pedaço de ignorância que mais o incomoda, mais o constrange, mais o diminui

PONTO DE ViSTA (i)

DE QuANTAS MANEiRAS SE PODE SER ANALFABETO?

perante si próprio. É tempo de acabar com isso: prepare um plano e … mãos à obra, por-que nunca é tarde! Estamos disponíveis para lhe servir umas dicas. A custo zero!

[email protected]

No presente n.º 3 do P&O

Conclui-se a publicação do importante trabalho do Arquitecto Célio de Melo Costa. Se a informação que contém for colhida e integrada à luz das actuais preocupações suscitadas pela desen-freada agressão do ambiente que diz respeito a todos nós, reconhecer-se-á facilmente o seu alcance.

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EMPREENDER EM PORTuGAL PELA ViA DA RETOMA

DE uMA PME

Fernando FerreiraEconomista e Consultor de Empresas

[email protected]

PARTE IVA análise dos

recursos humanos.

Considere a análise dos recursos humanos como uma etapa incontornável para a defini-ção do seu interesse na retoma de uma PME.

Em grande medida, o sucesso futuro do pro-jecto repousará nas suas competências, apti-dões e qualidades pessoais e, sobretudo, nas dos seus colaboradores.

Normalmente, um retomador entra em activi-dade com uma equipa de colaboradores que, na maior parte, não escolheu e não conhece.

Procure conhecer e analisar previamente a equipa de colaboradores de que dispõe a PME a retomar.

Em momento oportuno, terá que decidir se a equipa e a organização interna tal como existem se adequam ao plano de negócios

• Se pensa poder vir a tomar

uma posição dominante numa

PME já existente, reserve

algum do seu tempo para

ler este artigo e os que se

lhe seguem sobre o mesmo

tema, em próximas edições.

• Recordamos que este tema

foi iniciado no número 1

da P&O com a publicação

da Parte I “As PME e o

empreendedorismo”.

• “No número 2, foram

publicadas a Parte II

“Assegure-se que o seu perfil

pessoal se coaduna com

o de um empreendedor e

verifique a sua coerência com

o projecto de retoma e as

exigências que ele coloca “e a

Parte III “Analisar a empresa

a retomar”.

• É agora publicada na presente

edição a Parte IV.

• Números anteriores da

P&O estão disponíveis para

consulta on-line em www.cct.

pt ou, se assim o pretender,

poderá solicitar em geral@

cct.org o seu envio pelo

correio.

e ao modelo de gestão que pretende imple-mentar ou se, para o efeito, são necessários ajustamentos.

Neste sentido, dirija especialmente a sua aten-ção para os colaboradores-chave1 da empresa.

Com a colaboração do cedente, identifique esses colaboradores e obtenha, relativamente a cada um deles, informação sobre:

• Funções e responsabilidades actuais• Competências e aptidões• Experiência profissional• Percurso profissional realizado dentro da

actual empresa• Formação profissional adquirida• Condições actuais de remuneração • Nível de desempenho• Traços de personalidade e, • Características pessoais.

Com a aprovação do cedente, procure escutar individualmente os colaboradores-chave.

Tente compreender a forma como cada um deles vê o negócio da empresa, a área em que especifi-camente intervém e o projecto de retoma.

Terá aqui uma boa oportunidade para testar a receptividade que estes colaboradores poderão vir a dispensar ao seu projecto, formar uma primeira opinião2 sobre a sua valia individual e conjunta, detectar insuficiências e equacio-nar os primeiros ajustamentos necessários.

Recolha e sujeite à sua análise documentação e/ou informação sobre os seguintes assuntos:

• Organigrama vigente na empresa• Regulamentos internos• Relação nominativa de todos os colabora-

dores do quadro de pessoal com indicação dos respectivos vencimentos e categorias profissionais

• Contratos de trabalho a prazo• Acordos colectivos de trabalho• Absentismo• Entradas e saídas pessoal já previstas pelo

cedente

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• Acidentes de trabalho• Pessoal em “baixa” por motivos de saúde• Litígios em Tribunal relativos a pessoal• Conflitos internos entre colaboradores e,• Familiares do actual dirigente que integram

o quadro de pessoal3.

Tenha presente que, numa perspectiva do reforço do seu interesse em prosseguir com o projecto de retoma, deverá com o seu trabalho de análise poder vir a concluir que:• De uma forma geral, os recursos humanos

ao serviço da empresa mostram qualidade e potencial bastantes para virem a integrar o seu projecto

• Muito provavelmente, os colaboradores-chave acompanhá-lo-ão

• A saída do cedente não afectará a condução e o desenvolvimento futuro do negócio

• Não se vislumbram internamente quaisquer situações4 conducentes a um eventual travão psicológico ao projecto ou à rejeição da nova equipa de gestão

• A transição poderá vir a ocorrer sem sobres-saltos e de uma forma harmoniosa.

Caso as suas conclusões venham em sentido diferente, deverá considerar que a retoma poderá vir a estar, de algum modo, comprometida. Rea-nalise então, no contexto global, o seu interesse em prosseguir na análise do projecto.

uma palavra final sobre a motivação dos recur-sos humanos.

Esta deverá ser considerada uma questão com grande relevância e especial oportunidade logo que o negócio da transmissão de proprie-dade da empresa se concretiza.

O sucesso de uma retoma depende também, em grande parte, do grau de motivação dos colaboradores que nela participam.

A experiência mostra que os colaboradores satisfeitos e motivados são os mais produtivos e os que maior qualidade mostram no traba-lho realizado. Por outro lado, tais colabora-dores dão um forte contributo à melhoria do ambiente interno de trabalho e fortificam o desenvolvimento do negócio.

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1 Considere como colaboradores-chave não só os que desempenham cargos de direcção na empresa mas também os que não os desempe-nhando asseguram todavia “capital intelectual” e/ou relacionamentos fundamentais para o desenvolvimento do negócio.

2 Frequentemente, a primeira opinião está muito próxima da final.

3 No caso afirmativo, deverá acordar com o cedente as funções que a eles serão reservadas no futuro.

4 Nomeadamente, uma hipótese ainda em discussão com o cedente para o controle do capital da empresa por parte de um grupo de colaboradores.

Dedique-se à motivação e à satisfação dos colaboradores que recebeu com a retoma.

Nesse sentido:

• Tente melhorar o ambiente de trabalho• Proporcione aos seus colaboradores instru-

mentos, equipamentos, materiais e ferra-mentas de trabalho mais eficientes

• Elimine obstáculos que impeçam os colabo-radores de desenvolver trabalho com mais qualidade

• Comprometa verbas para formação profissional• Faça os colaboradores participar na fixação

dos seus próprios objectivos pessoais de trabalho.

• Distribua-lhes tarefas criativas e desafiantes • Implemente um sistema de avaliação do

desempenho e relacione-o com um sistema de prémios.

• Mantenha os seus colaboradores informados acerca dos assuntos relevantes da empresa e estabeleça canais regulares de comunicação com eles

• Atribua remunerações adequadas ao tipo de trabalho realizado e comparativamente jus-tas, no contexto da distribuição salarial da empresa

• Seja auto-confiante e confiável • Procure o contacto pessoal regular com todos,

sem excepção.

Pouco haverá de mais positivo para um negó-cio e congratulante para o seu dirigente que a disponibilidade de uma equipa de colabora-dores satisfeitos e motivados.

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Arquitecturas de TerraAdobe e Taipa

(continuação do artigo editado no número 1)

Este anseio na transmissão de conhecimentos adquiridos ao longo de séculos é referido logo nas primeiras linhas de “Arquitectura de Terra” (Origem Wikipédia, a enciclopédia livre; 18 de Julho de 2008), ainda que não seja exclusivo de

portugueses:

“influenciados directamente pelos conhecimentos acumulados nes-ses continentes, os colonizadores europeus fizeram uso dessas técnicas não apenas na construção de muitas de suas cidades, como também nos territórios de suas conquistas a partir do século XV.”

Neste sentido, ainda segundo a mesma página de “Arquitectura de Terra”:

“A utilização da terra crua como elemento construtivo chegou ao Brasil de várias formas, com o processo de colonização foram introdu-zidas as técnicas do adobe e também a taipa e pilão, porém, acredita-mos que o fenómeno dos arquétipos evidenciou que os nativos locais, os índios brasileiros, e os nativos africanos que aqui chegaram como escravos, já dominavam as técnicas do pau-a-pique ou taipa.

Tais técnicas propiciam um alto índice de isolamento e quanto mais largas as paredes, maior o resultado térmico e ambiental.

Por se tratar de matéria prima de certa forma abundante, podemos afirmar que nas primeiras ocupações no período colonial a utilização dessas técnicas predominavam, vale dizer que em algumas regiões prin-cipalmente as localizadas e próximas do litoral a pedra foi largamente utilizada, como fundação e também como parede.”

E isto, depois de, na mesma página, já ter emitido a referência:

“O século XiX introduziu processos industriais, que contribuíam para o desenvolvimento de diversos segmentos relacionados à transformação de matérias primas em manufacturados, que resultaram no surgimento de materiais hoje largamente utilizados. O uso de tecnologia na cons-trução civil fez com que os processos artesanais em pauta até então, aos poucos, fossem desaparecendo, sendo substituídos por materiais e pro-cedimentos que em pouco tempo se transformaram em “unanimidade”. Como esse processo de modernização se iniciou nos chamados países desenvolvidos, nem sempre tais produtos, frutos dessa “revolução”, se adaptavam às realidades do terceiro mundo, sobretudo as de aspecto cli-máticas, culturais e sociais, factos esses raramente debatidos na profundi-dade necessária, tampouco estudados cientificamente.”

Célio Melo da CostaArquitecto | [email protected]

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Na página ADOBE (Origem Wikipédia, a enciclopédia livre; 19 de Agosto de 2008), no capítulo HISTÓRIA, diz-se sobre a constru-ção em “terra crua”:

“um dos mais antigos materiais de cons-trução, foi amplamente utilizado nas civiliza-ções do crescente fértil, em especial no Antigo Egipto e Mesopotânia. Construído com barro e palha (tal como nos é descrito na Biblia, no livro do Êxodo), os tijolos de adobe eram muito utilizados pelas técnicas quotidianas de construção, ainda que grandes monumentos destas civilizações a ele recorressem. Efecti-vamente, os zigurates (na Mesopotânia) e as mastabas (no Egipto) foram feitas essencial-mente com tijolo de adobe, utilizando basi-camente as mesmas técnicas de construção utilizadas em edifícios “menos nobres”.

A antiga cidade de Arg-é Bam, em Bam, cidade da província Kerman no sudeste do irão é a maior construção em adobe do mundo construída em 500 A.C. e habitada até 1850. É considerada Património Mundial pela unesco. A cidade sofreu um terramoto em 2003, que a destruiu quase inteiramente. Actualmente está sendo reconstruída.

O adobe foi utilizado em diversas partes do mundo, especialmente nas regiões quentes e secas. Com o advento da industrialização no século XiX, as técnicas em arquitectura de terra foram, aos poucos, sendo abandonadas. Restando às pessoas de poucos recurso o uso dessas técnicas, além do adobe, o pau-a-pique e também a taipa de pilão, razão principal do preconceito que, de certa forma, se mantém até os dias de hoje. Porém, podemos afirmar que estamos vivenciando momentos de rom-pimento desse paradigma (preconceito), com um novo olhar sobre a arquitectura vernacu-lar, uma vez que esta se mostra ecológica e sustentável, por não acarretar desmatamento e emissão de gás carbónico na atmosfera como os tijolos cozidos.”

Apontando-se-lhe, ainda, características espe-cíficas como a de que:

“A construção feita com este tijolo torna-se muito resistente, e o interior das casas muito fresco, suportando muito bem as altas tempe-raturas. Em regiões de clima quente e seco é comum o calor intenso durante o dia e sensí-veis quedas de temperatura à noite, a inércia térmica garantida pelo adobe minimiza esta variação térmica no interior da construção.”

Recomendando, entretanto, que:

“As construções de adobe devem ser execu-tadas sobre fundações de pedra comum, xisto normalmente, cerca de 60 cm acima do solo, para evitar o contacto com a humidade ascen-dente (infiltração) que degradaria o adobe. Da mesma forma é importante a construção de coberturas com beirais a fim de proteger as paredes das águas da chuva.”

E dizendo, em conclusão, que “NO BRASIL”:

“Apesar da redução no uso do adobe, este ainda é usado em várias regiões do Brasil, principalmente a Norte e Nordeste. Também em Minas Gerais Goiás é possível encontrar muitas casas em adobe. infelizmente muitas casas populares de adobe são construídas sem os cuidados necessários (especificados acima) gerando rápida degradação do material e conferindo a impressão de ser o adobe um material ineficiente. No entanto a História já o comprovou um material de grande durabili-dade, inclusive nas cidades históricas brasilei-ras, como Ouro Preto e Pirenópolis, que ainda possui muitas casas de tijolo de adobe.

A partir da preocupação com a con-servação do património a nível mundial, percebeu-se a necessidade de estabelecer conceitos e critérios para tal, que resulta-ram em recomendações. uma delas trata do respeito pelos materiais originais, contidos

nas construções e monumentos históricos ou seja, no momento das intervenções para que fossem mantidas as técnicas tradicionais encontradas. Essa recomendação suscitou outro questionamento: Como conservar ou restaurar técnicas cujo manejo se perdeu? Em função dessa situação algumas institui-ções como o ICCROM, o CRATERRE o Getty institute e a própria unesco, investiram na formação de mão de obra especializada visando o resgate desses conhecimentos. um dos programas com mais resultados positivos foi o Projecto Arquitectura de Terra – PAT, que durante anos capacitou e formou técni-cos de vários lugares do planeta. O resultado desse movimento propiciou que profissionais capacitados, pudessem estar ao serviço não apenas da protecção do património arquitec-tónico, grande parte construído nessas téc-nicas, sobretudo nos países ibero-americanos e África, mas também para a utilização das mesmas, em novas construções sobretudo as de interesse social. Como consequência, surgiram instituições que agregam os profis-sionais que acreditam e defendem o uso da arquitectura de terra. O Proyecto de inves-tigación PROTERRA, hoje Rede PROTERRA vinculado ao Sub-Programa HABYTED, que por sua vez remete ao CYTED, desde o ano de 2001 vem divulgando e fomentando o uso da arquitectura de terra através da organiza-ção de seminários internacionais e oficinas de transferência de tecnologia, reunindo pro-fissionais de países ibero-americanos.”

Na página (Origem Wikipédia, a enciclo-pédia livre; 6 de Julho de 2008) referente a Grande Mesquita de Djenné que é ilustrada com uma fotografia do monumento, refere-se:

“A Grande Mesquita de Djenné é o maior edifício em adobe do mundo, e é considerada por muitos arquitectos como a maior reali-zação do estilo Sudano-Saheliano, embora tenha muitas influências islâmicas. Locali-zada na cidade de Djenné, no Mali, a qual

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foi declarada como Património Mundial pela unesco em 1988.”

O Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa, reconhecendo embora a larga difusão de construção em “terra crua” (consi-derado material pobre) nas regiões Centro e Sul do País, não conseguiu nelas seleccionar qual-quer edificação com dignidade suficiente para figurar como expressão da arquitectura popu-lar em Portugal; no entanto, não será demais insistir, houve aqui vontade suficiente para ter levado para o Brasil os conhecimentos da arte (e já algum engenho) da aplicação de materiais locais, ecologicamente válidos por simples-mente cozidos ao sol, na concretização, em várias das suas regiões de um variado leque de construções – modestas e, até, senhoriais – que deram origem a um tipo distinto de edi-ficações que, até hoje, vem sendo conhecido como arquitectura colonial.

Essa influência significativa na arquitectura da época colonial tem merecido, intelectual-mente, particulares atenções, designadamente em Ouro Preto e no Estado de S. Paulo, onde existem variados exemplos devidamente cata-logados, recuperados e tombados (classifi-cados). Para este esforço da sua recuperação, como património cultural imóvel, muito deve ter contribuído a acção do Arquitecto Kneese de Mello, ao tempo presidente do IAB (Instituto dos Arquitectos Brasileiros). Foi numa visita à casa do Arquitecto Kneese de Mello que foi dada oportunidade de conhecer uma riquíssima colecção de slides, elucidativa da presença de importantes elementos em taipa (também) no Castelo de Alcácer do Sal; documentação que é fruto de uma aturada pesquisa que efectuou em Portugal, para poder aferir, com rigor, a genuinidade dos vestígios e o significado da boa recepção do conhecimento português no aparecimento, e no evoluir, da Arquitectura Colonial no Brasil, este era o trabalho inte-lectual de fundo a que, então, se dedicava com todo o interesse.

Segundo a página TAIPA (material) – (Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre, 26 de Julho de 2008), “A Técnica da taipa de pilão foi trazida para o Brasil pelos portugueses e largamente utilizada no período colonial, sobretudo na região Sudeste onde grande parte das igrejas e construções de dois ou mais pavimentos foram edificadas com técnica de taipa – de pilão”, reproduzindo, como um dos exemplos bem concretizado, fotografia da Igreja Matriz de Pirenópolis – edificação em taipa de pilão.

São exemplos notáveis de construções em taipa, no Estado de S. Paulo (a casa rural bandeirista): Casa do Bandeirante, Casa do Sertanista, Casa do Sítio de Tatuape (tom-bamento em 1951), Casa do Sítio da Ressaca (tombamento em 1972), Casa do Grito (tomba-mento em 1975), Casa da Marquesa de Santos (tombamento em 1979), Casa Bandeirista do Itaim (tombamento em 1982), Casa do Regente Feijó (tombamento em 1987), Museu Barão de Maná (tombamento em 1983), entre outros.

Já, na década final da primeira metade do Século XX, na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira – VOL. XXX pág. 562 – indica-se exemplar de elevado valor patrimonial de construção em terra crua, extraindo, de Gil-berto Freire, Casa–Grande e Senzala (pág. 167), que “A unidade económica formava ‑a o solar – a mansão senhorial de taipa ou barro amassado, avó da casa‑grande do engenho brasileiro”; no entanto, de Lins do Rego, Pedra Bonita (pág. 159), não lhe atri-buindo qualquer valor patrimonial, é dito que: “Aquelas terras vinham dos antigos da família. A casa pobre de taipa, o curral de pedra, o cercado de pau a pique diziam bem a idade de tudo”. Ainda na mesma página 562, diz-se transcrevendo Diogo Couto, Década, II, livro 2, cap. 8, p. 49, “Vendo Runecão aquele dano mandou fabricar dous bestiães naquele parte muito grossas, e fortes taipas, em que assentaram dous

leões...” E, citando Rocha Pita, em História da América Portuguesa, aponta-se que “...para defender dos gentios aos novos moradores, mandou cercá‑la (à cidade) de muros de taipa...”.

Depois da publicação, em 1992 (embora de divulgação pública muito restrita) de ARQUI-TECTURAS DE TERRA – TRUNFOS E POTENCIALIDADES; MATERIAIS E TECNOLOGIA; LÓGICA DO RESTAURO; ACTUALIDADE E FUTURO” – edição conjunta de “Comissão de Coordenação da Região Centro. Alliance Française de Coim-bra. Museu Monográfico de Conimbriga”, espera-se também – e para além do conveniente tratamento da arquitectura monumental em terra crua – que crie um novo olhar para toda a arquitectura vernácula existente em Portugal; objectivo que, em boa parte, já tinha sido ten-tado, através do Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa, com a publicação, em 1961, da ARQUITECTURA POPULAR EM PORTUGAL.

No Seminário de que resultou a publica-ção de ARQUITECTURAS DE TERRA (1992), Helena CATARiNO, em FORTIFI-CAÇÕES DO PERÍODO ALMÓADA NO SUL DE PORTUGAL que subdivide em “A - Fortificações fortificadas almóadas em taipa. Os exemplos de Salir e Paderne” e “B - Os Caste-los de Salir e Paderne”, diz – referindo-se à sua recuperação - que (...) só muito recentemente surgiram projectos específicos para castelos de taipa (...); António Feitas TAVARES, em CONSTRUÇÕES EM TERRA NA REGIÃO CENTRO, sem indicar qualquer exemplar construído, refere:

“(...) o adobe foi um método praticado intensamente para Norte do Mondego. Com o adobe chegaram-se a erguer povoações intei-ras, desde as casas mais humildes até às mais ricas, incluindo estabelecimentos comerciais e industriais, casas de espectáculos, fornos para

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cal, muros de propriedades e até revestimen-tos de poços de água.”

A participação de Fernando Rocha Pinto, no mesmo Seminário, sobre o tema ARQUI-TECTURA TRADICIONAL DE TERRA NO ATENTEJO – apontando nela ser “necessário um estudo mais profundo e sis‑temático da Arquitectura de terra no nosso país” e salientando que “A recolha feita em 1961, no excelente livro «Arquitectura Popular em Portugal», abriu pistas de aná‑lise que alguns trilharam em meritório esforço, quantas vezes isolado” – começa por referir, no ponto 1 da sua dissertação:

“1.Longa é a história das construções em terra: Babilónios e Assírios, Fenícios e Chine-ses já as utilizavam há milénios.

Hoje, na Ásia ou em África, na América ou na Europa, assim se continua a construir.

A história e a tecnologia – ou tecnologias – da Arquitectura de Terra estão intimamente ligadas à história das civilizações e à sua expansão no Mundo.

Portugal, através da colonização árabe e muçulmana, assiste à difusão da taipa no Sul do território. É possível, contudo, que a tec-nologia do adobe que ainda hoje se encontra na região da Bairrada da provenha da forte colonização fenícia, em época anterior. De facto, e embora seja possível encontrar adobe na região Sul, a dominante aqui, é sem dúvida a taipa.

Foram estas técnicas construtivas que a Expansão Portuguesa difundiu em África, na Ásia e na América. (Explicar-se-ia assim que, por exemplo no Sri-Lanka, taipa se chame “tappa” e fundações se diga “Kabok”).

E que técnicas terão evoluído também por cá, mercê destes intercâmbios? Difícil se

torna hoje distinguí-lo. Só uma investigação apurada, do ponto de vista arquitectónico, histórico e até talvez linguístico, poderia fazer luz sobre isto. É que, por outro lado, sendo a Arquitectura de Terra fortemente condi-cionada pelo material do local onde é execu-tada, ele é fundamentalmente produto desses mesmo local. De facto, não há duas compo-sições de terra iguais, logo, não poderá haver dois adobes – ou taipas – iguais. A variedade de tipos de construção em terra, por todo o Mundo, é disso prova evidente.”

E, no ponto 2 da mesma participação, aponta:

“Exemplos notáveis são a Fortaleza de Juro-menha, os Castelo de Silves, Tavira e Paderne, bem como ermidas e igrejas, dispersas um pouco por toda a parte. Detectáveis são, mais facilmente, as construções militares, uma vez que construções religiosas e civis, sendo nor-malmente caiadas, se confundem frequente-mente com alvenaria tradicional.

Em construções degradadas, caídas em desuso, revela-se muitas vezes a taipa, como em Vale dos Mortos, nos arredores de Serpa ou em Entradas, junto a Castro Verde.”

A.A. MENDES DE MAGALHãES e J.M. Gaspar NERO, em CONSTRUÇÕES EM TERRA – UMA ESCOLHA ATENTA, na sua participação no Seminário, informando que “O espólio, ainda que não muito abun‑dante, é no entanto significativo e importa preservá‑lo” apresentam conselhos a que acres-centam acções já conseguidas para que a “solu‑ções arquitectónicas ligadas à construção em terra” tivessem passado “a fazer parte do currículo das cadeiras de Materiais de Construção”.

“Numa sociedade que pugne pela valoriza-ção do seu património histórico-cultural, ini-ciativas que suscitem uma maior compreensão

das soluções arquitectónicas ligadas à cons-trução em terra, são de incentivar, sobre-tudo se tiverem o propósito da revitalização de técnicas tradicionais ou da divulgação de metodologias inovatórias, sejam elas a nível da conservação, da reabilitação ou até da nova construção.

Pensamos que este Seminário visa aquele objectivo e como tal propomo-nos apresentar, em síntese, a forma como foram sensibilizadas algumas gerações de Engenheiros Civis que frequentaram o instituto Superior Técnico desde 1983.

Desde aquela data, um programa adequado sobre a matéria passou a fazer parte do cur-rículo das cadeiras de Materiais de Constru-ção. Em paralelo, integrou-se na actividade do Centro de Materiais de Construção do Departamento de Engenharia Civil daquele instituto, especialmente criado para dar res-posta técnico-cientifica às temáticas desenvol-vidas no âmbito daquelas cadeiras.”

Hugo HOuBEN e Sébastien d’ORNANO, em participação sobre INDÚSTRIA E TEC-NOLOGIA DA CONSTRUÇÃO DE TERRA, começam por recomendar:

“Para que a terra continue a ser utilizada como material de construção na Europa, nos países industrializados e nas zonas urbanas dos países em desenvolvimento, é necessário obter simultaneamente:

. uma transformação acrescentada dos materiais

. uma redução da parte de mão de obra na produção.”

Terminando com uma informação impor-tante de banco de dados para a prossecução conveniente da construção em terra:

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“CRATerre-EAG, o Centro internacional da Construção em Terra da Escola de Arqui-tectura de Grenoble, inscreve a sua acção res-peitante ao desenvolvimento industrial numa perspectiva de cooperação internacional. Esta acção é conduzida no quadro do programa BASiN (Building Advisory Service informa-tion Network) com mais três organizações europeias – CTZ/GATE (Alemanha), SKAT (Suiça), iTDG (Reino unido); e gerida por CRATerre-EAG a partir da célula (Earch Building Materials Advisory Service) que se dedica ao estudo das condições necessárias e dos meios a empregar para que se assegure a perdurabilidade e o desenvolvimento da terra crua como materiais de construção em con-textos onde a máquina da construção civil já está estruturada e ao apoio dos esforços de quantos seguem nesta direcção.”

Na vertente da LÓGICA DO RESTAURO DOS MONUMENTOS EM TERRA, Cláu-dio Torres, na sua comunicação “A TAIPA: EXPERIÊNCIA EM CURSO PELO CAMPO ARQUEOLÓGICO DE MÉRTOLA”, começa por informar, no seu ponto 1:

“1. Foi o contacto com os métodos da arqueologia medieval que nos permi-tiu uma aproximação às técnicas cons-trutivas tradicionais e concretamente à arquitectura de terra crua. A escavação tradicional das sólidas e bem argamas-sadas estruturas romanas não autorizou muitas vezes reparar que já nessa altura, e certamente muito antes, eram utiliza-das no Ocidente Mediterrânico técnicas de terra crua como o adobe e a taipa.

Nas obras de maior prestígio de época romana em que as alvenarias de pedra e tijolo subiam a maior altura, ou serviam de suporte a arcos abóbadas ou placa-gens decorativas, a taipa desempenhava apenas funções complementares. Já nos bairros ou nas casas camponesas, a terra

crua cumpria certamente um papel de maior relevo.”

E, depois de no ponto 2, referir a organiza-ção interior das construções estudadas, con-clui, no seu ponto 3:

“3. Mantendo as tradições construtivas da terra crua, a taipa, com as suas variações regionais, ainda era larga‑mente utilizada em todo o Alentejo até há mais de 30 anos. Não foi difí‑cil encontrar mestres que, retomando a sua actividade, transmitissem os seus conhecimentos. Combinando motivações didácticas e sociais com os métodos da arqueologia experimental e com o estudo de viabilidade dessas técnicas na recuperação de imóveis degradados e mesmo na construção de novos edifícios, levantaram‑se velhas paredes de alvenaria, lançaram‑se arcos e abóbadas sem cofragem e, principalmente, ergueram‑se vários edifícios em taipa para comprovar as suas qualidade económicas, portantes e térmicas.

É fácil constatar as suas excepcionais quali-dades de isolador térmico indispensáveis aos climas continentais do interior alentejano. As dificuldades surgem na sua divulgação como técnica alternativa.

A construção em terra, além de uma injusta acusação de muito cara devido à mão de obra, contém ainda carga socialmente negativa. O símbolo de mudança e ascensão social está precisamente na afirmação visível do êxito e passa ainda hoje pela imitação da casa urbana ou suburbana, com voluntária exposição de todos os seus atributos.

A construção em terra foi sempre, tradi-cionalmente, obra comunitária em que as operações de preparar, transportar e apisoar a

terra eram assumidas como um acto de ritual colectivo.

um esforço de dignificação das culturas regionais, que passe por um levantamento e revitalização dos seus mecanismos individuais e colectivos, pode reatar ou cimentar velhos laços de solidariedade, só eles capazes de evitar uma rápida e degradante aculturação.”

Como seu ANEXO 1, é apresentado em ARQUITECTURAS DE TERRA, um traba-lho do Groupe CRATerre, traduzido e adap-tado de “Arquitecturas de Terra – ou l´avenir d’une tradition millernaire.Europe, Tiers-Monde, États-Unit”, Édition du Centre Geor-ges Pompidou, Paris, 1968, sobre o tema “A CONSTRuçãO E A ARQuiTECTuRA DE TERRA em que, sob o título “A diver-sidade dos modos de utilização”, apresenta a reflexão:

“O registo das possibilidades técnicas, construtivas e arquitecturais da terra é muito grande. O estudo das tradições populares e dos conhecimentos no mundo conduziu-nos à identificação de uma dúzia de utilizações dife-rentes da mesma terra associada a uma grande variedade de géneros e usos. Tão grande possi-bilidade de construção permitiu erguer desde abrigos modestos e casas de aldeia, a imóveis urbanos, edifícios religiosos e mesmo palácios. Esta diversidade da arquitectura de terra não tem nada a invejar àquela que a utilização de outros materiais tradicionais permite, pois a terra é, sem dúvida, um dos materiais tradi-cionais que oferece possibilidade de utilização raramente igualadas. Existem com efeito nada menos que dezoito possibilidades.”

Passando a “referir os doze principais modos de utilização associada a três grandes famílias de soluções construtivas em que a terra ou está associada à realização prévia de uma armação estruturante ou de suporte, ou é utilizada sob a forma de construção monolítica e maciça,

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ou, finalmente, sob a forma de alvenaria, em pequenos elementos.”

Modos de utilização estes, tais como: terra escavada, terra‑cobertura, terra enchi‑mento, terra talhada, terra comprimida, terra modelada, e terra empilhada, terra moldada, terra obtida por extrusão, terra vazada, e terra‑palha e terra em guarnição; referindo que este “conjunto dos modos de utilização do material terra (...) dá lugar a numerosas aplicações segundo uma grande variedade de técnicas de produção e de cons‑trução” das quais, as “mais praticadas são conhecidas pela designação de adobe, taipa, terra-palha, barro amassado com palha, argamassa e blocos comprimidos”; três des-tas seis aplicações são consideradas as “técnicas maiores”, das quais, para além das regiões onde mais se utilizam e dos efeitos nelas produzidos, é fornecida a composição técnica de cada uma:

“i.O adobe

De natureza bastante argilosa (até 30% de fracções finas) mas muito arenosa, a terra vai-se misturando com água até obter uma massa semi-consistente (15 a 30% de água) depois modela-se à mão num molde de modos a pro-duzir pequenos elementos de alvenaria (blo-cos, tijolos).

(...)

ii. A taipa

De natureza muito arenosa e rica em casca-lho e pedras muito pouco argilosa (10 a 20%) arejada e triturada depois de ter sido extraída, a terra é conservada a maior parte das vezes no seu estado de humidade natural (conteúdo de água modificada no caso de ser excessiva-mente seca ou húmida), deitada em seguida numa cofragem e compactada com a ajuda de um pilão manual até constituir um betão pobre, de terra que endurece ao secar.

(...)

iii. Blocos de terra comprimida

Esta versão moderna do bloco de terra crua moldada, ou adobe, utiliza terra com carac-terísticas muito próximas das da taipa, mas pode ser mais argilosa (até 25% e expurgada dos seus elementos maiores (diâmetro > 20 mm). A fracção arenosa (areias grossa) deve ser dominante e a parte gravelosa (pequenas gravilhas) pode ser menor. O material assim composto, com uma granulometria bastante uniforme, (...)

Entre nós, não sendo ainda conhecidos, como já foi referido, quaisquer exemplares notáveis (entendidos como dignos de notação) de arquitectura popular de terra crua, poderá ser através de intervenções no edificado – como é o caso que deu oportunidade, para esta refle-xão – que se irá dando conta da sua existên-cia; quando for caso disso, a sua preservação, como pré-existência de qualidade não poderá vir a entender-se esta preocupação intelectual como sendo manifestação de um vulgar novo snobismo da miséria; no entanto, será necessá-rio que, no local, quem executa obras conheça as técnicas de construção em terra crua e, por isso e para isso, deverão ser de grande utili-dade os possíveis efeitos da notícia dada ao Semanário de 1990 pelos professores A.A. MENDES de MAGALHãES e J.M. GAS-PAR NERO, na sua participação “CONS-TRUÇÕES EM TERRA – UMA ESCOLHA ATENTA” – sobre a sua integração “na acti‑vidade do Centro de Materiais de Constru‑ção do Departamento de Engenharia Civil” do instituto Superior Técnico.

Aliás, como se refere em EL PASO SOLAR ENERGY ASSOCIATION POBOX 26384 El Poso, Texas 79926 – ADOBO:

“Embora o adobo ainda possa ser visto por muitos como sendo a casa dos pobres, muitos

outros acreditam que só os ricos podem cus-tear uma casa de adobos. Em certas áreas como Santa Fé, New Mexico, uma casa de adobo corrente pode ser vendida por mais de 1 milhão de dólares. O facto é que as casas de adobo podem ser construídas para todas as bolsas. No New Mexico, a maioria dos tijolos de adobo são produzidos por “Adobo Yards”, mas os seus compradores parecem estar distri-buídos em partes iguais entre “proprietários/construtores” e Empreiteiros de Adobo.”

Depois de ter introduzido a ideia de que:

“As mais antigas estruturas existentes no sudoeste são construídas com blocos de adobo, nas quais se incluem habitações e missões. A razão pela qual os antigos colonos construíram com terra foi porque esta era o único material abundante. Não existiam florestas nem grandes quantidades de pedra disponíveis, pelo que eles construíram com aquilo que tinham à mão. isto ensina-nos que devia ser assim que os materiais deveriam ser escolhidos para a maior parte das construções. Seja qual for o material localmente existente, ele é provavelmente o mais adequado para o clima/ambiente.

Com o advento do caminho-de-ferro e a possibilidade de se transportarem materiais de construção até grandes distâncias, o sudoeste sofreu uma grande alteração, quer nos mate-riais de construção, que nos estilos arquitec-tónicos. Apesar de a maioria das habitações construídas pelos próprios donos serem em adobo, este não era o material de eleição, mas sim o de necessidade. O adobo tornou-se a casa do “homem pobre”. Toda a família participava na amassadura da lama, com os pés, em valas, e depois despejava essa lama em moldes de madeira. Eles eram capazes de fabricar o seu material de construção no seu próprio quintal. Em 1990, muita gente do sudoeste continuava a construir com adobo e, apesar de para muitos deles isso ainda ser uma

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necessidade, para muitos outros o adobo era um material de eleição.”

A seguir, tendo como tema a interrogação “O que é um adobe?”, é dada informação téc-nica que não é muito consonante com a que foi apresentada por GROUP CRATERRE, no ANEXO 1 de ARQUITECTURA DE TERRA (Conimbriga 1992):

“O adobo é um tijolo feito com lama. O bloco de adobo tradicional mede 10” X14” e tem 4” de espessura. A composição ideal de materiais é de, aproximadamente, 20% de argila e 80% de areia. Estes materiais são amassados com água e a lama é depois des-pejada em formas de madeira. A forma é reti-rada logo que o bloco mantenha a sua confi-guração, sendo deixado a secar ao sol. Depois de alguns dias, o bloco é virado de lado para acelerar o seu tempo de secagem e, dentro de mais alguns dias, ele está pronto para ser reti-rado e empilhado. O tijolo atinge a sua resis-tência total (curado) após 30 dias, o mesmo tempo que o betão.”

Especificando:

A palha era frequentemente encarada como sendo um componente integral do bloco de adobo, mas ela só é usada, hoje em dia, por aqueles que estão agarrados à tradição, ou quando a relação areia/argila é radicalmente alterada. Os construtores primitivos de adobo acrescentavam palha à sua mistura porque se desenvolviam grandes fissuras nos tijolos de adobo durante a secagem. Acreditava-se que a palha proporcionava resistência e que, com a adição de palha, os adobos não se partiam. isso explica que as fracturas eram provoca-das por excesso da argila usada na mistura. Quando se usa a quantidade de argila certa, não há a necessidade de se adicionar palha. O uso da palha deve ser mesmo evitado, uma vez que é uma fonte de alimentação para os insectos.”

Termina a informação com resposta à inter-rogação que formula:

“Porquê o adobo?

Existem muitas vantagens/benefícios na decisão de se construir com adobo. Para o “proprietário/construtor”, o adobo é pro-vavelmente o material com que é mais fácil construir-se. uma vez que é feito com lama, ele é fácil de cortar e de modelar. A argamassa usada para se ligarem os tijolos também é de lama. E não temos, todos nós, alguma experi-ência com a lama?

Embora possamos fabricar os nossos pró-prios adobos, o valor de compra de ado-bos suficientes para se construir uma casa da ordem dos 200 m2, pode variar entre os 2000 e os 3000 dólares. As variáveis deste custo dependem da localização, mas tam-bém do tipo de adobo usado, tradicional ou estabilizado.

No processo de fabrico, a quantidade de energia usada e a quantidade de poluição criada variam de acordo com o material. Comparado com um bloco de betão, que consome perto de 3000 BTu’s, o adobo precisa de menos de 2000 BTu’s por bloco. Também é necessário menos energia para o transporte, uma vez que o adobo é um material de construção “local”. E uma vez que é local, a fabricação de adobos contribui para a economia local, quando com-parada com materiais importados.

Para os entusiastas da energia solar, o adobo é um material ideal, graças às sua proprieda-des de inércia térmica. No sudoeste, as pala-vras solar e adobo têm andado ligadas tão frequentemente que se fundiram numa só palavra – “solaradobe”.”

Parece hoje ser consensual poder dizer-se que, entre nós, começou, nos anos setenta, a preocupação de se privilegiar o estudo das

tecnologias de construção, com recurso ao uso de materiais ecológicos, no entanto, entre nós, muitas resistências terão de ser vencidas, para além da necessária preparação dos quadros superiores que, pela comunicação dos profes-sores A.A.MENDES DE MAGALHÃES e J.M. Gaspar NERO no Seminário de Conimbriga de 1990, parece que – depois da devida sensibi-lização, para o efeito, em 1993 – passaram a ter estudo de materiais ecológicos no currículo da cadeiras de Materiais de Construção, no Departamento de Engenharia Civil do Instituto Superior Técnico. É gratificante que os autores desta comunicação – ambos ligados à docência no Instituto Superior Técnico – a tenham termi-nado com fundada esperança:

“Não termos dúvidas de que estes procedi-mentos atingiram os seus objectivos, tal qual o Seminário, no sentido do transmitir “esta mensagem na área da arte de construir”.

Com esta “abertura” pudemos desenvolver a nossa acção pedagógica junto dos alunos, razão de ser da Escola, para através deles e do que lhes ensinamos, se garantir que o tema – construção em terra-no nosso País, não se esvazie por abandono ou esquecimento, dado o garante de que pelo menos alguns de entre mais de um milhar de Engenheiros Civis dos nossos cursos, teriam ficado sensibilizados.

Estes são os nossos “trunfos”, ou seja, atra-vés do ensino cuidarmos melhor do nosso precioso património. Há que articular este esforço com o das entidades que de alguma forma têm interesse na temática, não apenas pela disponibilização de meios como também pela troca de experiência.”

É verdade que, como diz Cláudio Torres – ao terminar a sua comunicação ao Seminá-rio sobre ARQUITECTURAS DE TERRA – “A construção em terra foi sempre, tra‑dicionalmente, obra comunitária em que as operações se realizavam como acto de

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Leia ainda neste número da P&O

• Falemos de Internacionalização.

• Uma história de negócios contada por Fernando Pessoa.

• Uma entrevista com Maria Fernanda Carmo, Secretária-Geral da AIMMP.

ritual colectivo” e que “Um esforço de dig‑nificação das culturas regionais, que passe por um levantamento e revitalização dos seus mecanismos individuais e colectivos, pode reatar ou cimentar velhos laços de solidariedade, só eles capazes de evitar uma rápida e degradante aculturação”, mas é mesmo necessário, através da transmissão dos conhecimentos indispensáveis à utiliza-ção, em obra, dos materiais ecológicos que (já) faziam parte dos sistemas construtivos vernáculos, com vista à implementação da “moderna construção sustentável” a que se refere Márcio Augusto Araújo, consultor do “iDHEA – instituto para o Desenvolvimento da Habitação, no seu Artigo originalmente publicado no site: www.idhea.com.br”, onde, em 2008/05/26, defendendo uma “Edifica‑ção saudável” e indicando os critérios para a “escolha dos produtos e materiais para uma obra sustentável”, aconselha o recurso a tipos de construção que privilegiem a “construção natural”.

Jean DETHiER – “Arquitecto-Conselheiro do Centro de Criação Industrial do Centro George Pompidou” – explicita e ilustra o ponto 8 das vantagens que referiu, na parte inicial da sua comunicação sobre VANTAGENS CON-CRETAS DA CONSTRUÇÃO EM TERRA CRUA (Seminário “Arquitecturas de Terra”; Coimbra, Julho de 1990), dizendo:

“8. Finalmente, a nível prático e técnico: a França equipou-se já, desde 1943, com meios que lhe permitiram realizar no seu território, metropolitano e ultra-marino, e no Terceiro Mundo, opera-ções piloto que demonstram de modo concreto a exemplar fiabilidade destas novas técnicas de construção em terra e a veracidade dos argumentos aqui aduzidos.

Por todas estas razões, torna-se neces-sário e urgente dispor no terreno, de

modo mais permanente e estruturado, dos meios materiais e humanos neces-sários à prossecução destes trabalhos e permitir que a França – em estreita colaboração com os seus parceiros da Europa e do terceiro Mundo – asse-gure o domínio desta prometedora tecnologia.”

Entre nós, ainda que não tenham sido divulgados, convenientemente, os resultados positivos dessas “operações piloto”, nem os “meios materiais e humanos” que já se julgou necessários à prossecução dos objectivos dese-jados, começa a haver notícias de empresas de construção civil direccionadas, principal-mente, para o fabrico de produtos em terra crua a que se segue a sua colocação em obra de que assumem a supervisão; mas será neces-sário fomentar a preparação de “mestres de obra” e de “operários”, uns e os outros, sen-sibilizados para o uso de materiais em terra crua na construção civil como meio integrado nos processos construtivos industrializados da Construção Civil.

Destinado especificamente a “todos os agentes individuais, colectivos, públicos e privados que intervêm directa ou indi‑rectamente em imóveis que apresentam materiais e tecnologias tradicionais”, “No âmbito do Programa RESTAUROnet, a Direcção‑Geral dos Edifícios e Monumen‑tos Nacionais, em parceria com a École d’Avignon e a Câmara Municipal de Beja, organizou uma formação teórica/prática destinada a profissionais da área da inter‑venção em património construído” em que – para além de técnicos (6) dos Serviços Regionais da DGEMN e de técnicos (4) da CM de Beja – “participaram 3 representantes de cons‑trução civil da reabilitação”.

Desta acção, com o “Objectivo: Promo‑ver o conhecimento sobre técnicas tradicio‑nais relativas a rebocos e pinturas de cal,

visando a sua utilização correcta e sistemá‑tica”, que decorreram de 13 a 16 de Setembro de 2005, foi organizada, com data de Julho de 2006, uma publicação – edição e propriedade da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumen-tos Nacionais – sobre “Materiais e Técnicas tradicionais: rebocos e tintas a cal; tipos e utilização – alguns casos de estudo” que teve uma tiragem de 2000 exemplares.

Nesta publicação – para além dos conteúdos relativos à importância do uso das argamassas e tinta de cal, onde se situa a cal dentro dos ligantes, tipos de argamassas de cal, tipos de tin-tas de cal, sobre a produção e distribuição e um exaustivo glossário de termos – é apresentado um conjunto de fichas técnicas (6) relativas a “Argamassa TIPO A com cal hidráulica natural”, “Argamassa TIPO B com cal hidráulica natural” Argamassa TIPO C com cal aérea em pasta”, “Tinta TIPO I com cal hidráulica”, “tinta TIPO II com cal em pasta” e, ainda, “Outras aplicações: esgrafitos “.

Contudo, talvez porque entretanto a Direcção-geral dos Monumentos Nacionais, foi extinta, não se procedeu à sua conveniente divulgação.

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SECRETÁRiA-GERAL DA AiMMP

MARiA FERNANDA CARMO

Responde a um feixe de questões formuladas pela Direcção da

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P&O – A competitividade das empre-sas depende essencialmente dos Custos e da Diferenciação dos produtos e serviços que, em geral, os acompanham.Que margem sobra às empresas do sector para intervir naqueles dois planos: Produzir a cus-tos mais baixos e, simultaneamente, acrescen-tar valor aos produtos para que os clientes o reconheçam e valorizem?

MFC – Para fazer face a um mercado interno em retracção e a uma concorrência cada vez mais feroz, efectivamente, o futuro exige às empresas que sejam competitivas, ou, por outras palavras, que saibam inovar. Por isso mesmo, a aimmp tem desenvolvido vários projectos e iniciativas que se focalizam na implementação integrada de factores de competitividade que assegurem o desenvol-vimento sustentado das indústrias da Fileira de Madeira e Mobiliário. isto inclui, natural-mente, a disseminação e implementação no sector de estratégias que viabilizam a produ-ção a custos mais baixos e, simultaneamente, acrescentam valor aos produtos.

Os caminhos viáveis estão traçados, preci-samente, no prodimmp – Programa para o Desenvolvimento das indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal: um projecto da aimmp a cinco anos, que assenta em quatro grandes eixos que são o interwood (interna-cionalização), o Cooperwood (cooperação empresarial), o Consultwood (consultadoria) e o Formwood (formação).

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Neste contexto, são vários os desafios que se colocam às empresas: fugir dos mercados ditos tradicionais e avançar para as economias emergentes, como são exemplo os países afri-canos; recorrer a parcerias empresariais que melhorem a eficácia das estratégias comerciais e de marketing; o desenvolvimento de novos produtos; a redução do impacto ambiental dos materiais; o investimento em novas tecno-logias; a aposta no marketing e comunicação; a reorganização da estrutura empresarial; e a qualificação dos recursos humanos.

P&O – Renasce com alguma insistência a ideia de que as empresas podem/devem agrupar-se em clusters de complementari-dades para ganharem na cooperação a força que lhes falece ao insistirem numa política de orgulhosamente sós.

Na área da manutenção preventiva dos equipamentos, por exemplo, não podem as

empresas encarar, com coragem, acções de cooperação que reduzam os custos e evitem as paragens não programadas?

No domínio da comercialização, para empre-sas com programas complementares dirigidos aos mesmos mercados, não são viáveis novos instrumentos que permitam vender mais gas-tando menos? Ou seja, ganhar no mercado o poder que não têm nas fábricas?

Na exploração racional dos equipamentos pro-dutivos e dos meios de transporte, tanto no que diz respeito aos aprovisionamentos como à distribuição, por exemplo, não são identificá-veis interessantes formas de cooperação de que resultem a eliminação dos tempos mortos dos activos imobilizados e uma significativa con-tracção dos custos operacionais?

MFC – A cooperação empresarial é, efectiva-mente, um factor estratégico para as empresas. A

aimmp acredita, aliás, que o recurso a parce-rias e à concentração empresarial é fundamen-tal para a sobrevivência do sector à escala global.

Numa altura em que as exportações são apon-tadas como o futuro das empresas, a coope-ração empresarial é aquilo que vai permitir melhorar a eficácia das estratégias comerciais e de marketing; reduzir custos; aumentar a pro-dutividade e “massa crítica”; em suma, obter economias de escala e dimensão para chegar à distribuição e canais de comercialização.

Estamos, pois, totalmente de acordo com o que já Michael Porter dizia no seu estudo sobre as vantagens competitivas da economia portuguesa, realizado em 1994. O especialista norte-americano aconselhava a concentração em determinadas zonas geográficas como forma de partilhar infra-estruturas, mercados de trabalho e serviços.

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Estamos, também, convictos de que a con-centração é uma forma de evitar a perda de controlo do sector para investidores estrangei-ros ou o simples desaparecimento de grande parte da indústria nacional por falta de escala e competitividade.

Por isso é que a aimmp, no âmbito do prodimmp, desenvolveu o Cooperwood. Este projecto tem como principal objectivo, como o próprio nome sugere, promover a cooperação empresa-rial. No âmbito do mesmo uma das iniciativas que lançamos recentemente foi a criação e pro-moção da marca Associative Design.

Esta marca ambiciona contrariar a prática cor-rente de exportar móveis de forma isolada, para passar a exportar conceitos integrados de deco-ração, promovendo a inovação, a qualidade e o design dos produtos portugueses ao mais alto nível, através da organização de espaços e ambientes de alta decoração, por designers de

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interiores especializados, nos mais importantes e prestigiados eventos internacionais. A marca fomenta, ainda, de forma notável, a coopera-ção de um significativo número de empresas e produtos portugueses da fileira casa desde o mobiliário até aos têxteis, à iluminação, à cute-laria, à cerâmica decorativa e aos produtos de madeira para a construção.

E, na verdade, por onde a Associative Design já passou - Interiores Birmingham, no Reino unido; Salão Internacional do Móvel e Zona

Tortona Design, em Milão; e International Contemporary Furniture Fair, em Nova ior-que -, fez sucesso. As empresas participantes reconhecem que, cooperando, obtêm massa crítica, capacidade de actuação no mercado global e notoriedade.

P&O – Estas são, entre muitas outras, áreas em que a aimmp, agindo directamente ou por entrepostas pessoas, junto de pequenos núcleos seleccionados, poderia desempenhar um papel modificador de relevante importância?

MFC – Além do Cooperwood, muitas têm sido as iniciativas da aimmp em prol da coo-peração no seio do sector da madeira e do mobiliário. Exemplo disso é a nossa participa-ção na Associação para o Pólo de Excelência e inovação das Empresas do Mobiliário de Por-tugal (peimp).Constituída em Outubro de 2008, esta Asso-ciação, da qual a aimmp faz parte em conjunto com outras organizações sectoriais e regionais, tem como principal objectivo agregar os prin-cipais actores das indústrias do mobiliário,

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entidades do sistema científico e tecnológico nacional, entidades de formação, e outras relacionadas com a indústria de mobiliário, em torno de projectos e iniciativas que con-tribuam para que as empresas melhorem a sua competitividade na economia global, através da difusão da prática da inovação, do design, da qualidade e da promoção da cooperação empresarial

A aimmp é, também, parte integrante da Asso-ciação para a Competitividade da indústria

da Fileira Florestal (aiff ), que congrega quase todos os intervenientes de maior representati-vidade nos sectores da madeira e mobiliário, da cortiça, da pasta e do papel. Através desta Associação foi criado o Pólo de Competitivi-dade e Tecnologia da Fileira Florestal que tem por missão contribuir para que Portugal se torne mais competitivo na investigação, con-cepção e desenvolvimento, fabrico e comer-cialização de produtos e serviços associados a essa fileira.

Este Pólo propõe-se, igualmente, promover o desenvolvimento sustentável das fontes de matéria-prima, em quantidade e melhorada em qualidade. Propõe-se, ainda, oferecer às actividades económicas do cluster novos argu-mentos na competição global, com realce para os que advêm da intensificação tecnológica e da conformidade com os princípios da susten-tabilidade ambiental.

P&O – Para finalizar, a sua opinião sobre a P&O?

MFC – O projecto “Materiais de Construção – Conhecer as Necessidades de Qualificação dos

Recursos Humanos para Melhorar o desempe-nho das Empresas” constitui sem dúvida um iniciativa do máximo interesse, permitindo efectuar um diagnóstico rigoroso às necessida-des do sector, constituindo um instrumento essencial para a definição e implementação de futuros projectos na área da qualificação e for-mação para as pme.

Para o sucesso desta iniciativa muito con-tribuiu a participação e empenho das várias empresas dos diferentes sectores e o envol-vimento na promoção, divulgação e comu-nicação do projecto da revista “Pirâmides & Obeliscos”, que apresenta conteúdos de indu-bitável interesse no âmbito da qualificação dos recursos humanos.

A P&O – agradece a disponibilidade da Secretária-Geral da aimmp, Maria Fernanda Carmo e oferece-lhe os seus préstimos para participar de uma acção concreta que leve à identificação e selecção de jovens qualificados que se interessem pela criação de empresas empenhadas em projectos assentes na coope-ração entre empresas.

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um relatório elaborado por especialistas da Agência Europeia para a Saúde e Segu-rança no Trabalho, em Bilbau, põe em evidência que as substâncias químicas e perigosas fazem correr riscos novos e crescentes aos trabalhadores europeus. Este relatório de 195 páginas, intitulado “Expert Forecast on Emerging Chemical

Risks” (Previsões de especialistas sobre os riscos químicos emergentes), identifica os principais grupos de substâncias julgadas como sendo as mais perigosas para a saúde dos trabalhadores da união Europeia.

Atenção às Nanopartículas1

Na sua conclusão, os 49 especialistas reunidos pela Agência europeia (Osha) põem o acento

1 Nanopartícula: partícula microscópica em que, pelo menos uma das suas dimensões é menor do que 1/10 do Nano (10-9)

Saúde no Trabalho

de efeitos nefastos que estes produtos podem ter sobre a saúde, variando de resto de indi-víduo para indivíduo”. Enfim, é impossível elencar todas as consequências sobre a saúde resultantes de exposições a produtos quími-cos, mas tem-se a certeza que elas existem e são cada vez mais importantes e complexas porque as vias e as fontes de exposição são múltiplas.Os investigadores europeus empenharam-se a fundo em reportar, segundo eles, os tipos de substâncias de maior risco. Colocam à cabeça da lista dos riscos emergentes as nanopartícu-las. Estas nanopartículas e nanotecnologias são já muito utilizadas em diferentes sectores da indústria – aeronáutica ou informática e também nos produtos de cosmética. Como principais cancerígenos, apontam as poeiras e, em particular, as provenientes do trabalho

EuROPA: AS SuBSTâNCiAS PERiGOSAS PROVOCAM DEZ

VEZES MAiS MORTES DO QuE OS ACiDENTES DE TRABALHO

tónico na multiplicidade de substâncias peri-gosas utilizadas hoje na indústria, “a variedade das suas aplicações e as diferentes naturezas dos postos de trabalho em que elas são utili-zadas; a multiplicidade das suas combinações que, em numerosos casos, se adicionam a outros tipos de exposições, como por exem-plo o ruído; o leque de vias de penetração no corpo pelos produtos químicos e a panóplia

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Já que falámos de acidentes de trabalho

A taxa de incidência dos acidentes mortais nas empresas de menos de 50 trabalhadores é cerca do dobro da que se regista nas grandes empresas. uma boa gestão deste problema permitiria prevenir um grande número de riscos. Não será por falta de legislação nacional e comunitária que esta situação se verifica. Há muitas causas, desde a falta de empenhamento dos quadros intermédios à inadequa-ção dos meios de protecção pela incomodidade e desconforto que produzem. Se pensarmos em paralelo nos acidentes rodoviários, propendemos a acreditar que há uma causa comum, anterior a todas: FALTA DE FORMAÇÃO MOBILIZADORA, capaz de despertar a consciência cívica de cada um de nós. Em cada ano, cerca de 5 milhões de pessoas da EU são vítimas de um acidente de trabalho implicando a sua paragem por mais de três dias. São 146 milhões de dias de trabalho perdidos, o que é significativo. Mas será esta abordagem, verdadeiramente, a mais importante? Claro que não. Será útil que pensemos nos mortos, nos incapacitados, no sofrimento que o acidente arrasta. Pensemos nos custos pessoais

da madeira, as emanações gasosas dos motores diesel, a sílica e as fibras de amianto. Preconi-zam a vigilância apertada das fibras minerais utilizadas em substituição do amianto, “a sua evolução constante com novas composições, podem criar inesperadamente, novos riscos para a saúde e tornar difíceis as conclusões dos estudos epidemiológicos”.

74 000 Mortes por ano devidas a substâncias perigosas

As substâncias químicas e fibras perigosas provocam, estimam os especialistas europeus, 74 000 mortes por ano ligadas directamente às exposições durante o trabalho. Ou seja, dez vezes mais que os acidentes de trabalho. Em conclusão, M. Jukka Takala, director da Agência Europeia para a Saúde e Segurança no Trabalho, assinala “que numerosas empresas não dão suficiente importância à eliminação ou à substituição das substâncias perigosas”.

“A gestão dos riscos químicos, acrescenta M. Jukka Takala, é particularmente insuficiente nas PME e nas empresas sub-contratadas”.

ViVA, Maio de 2009http://osha.europa.euTradução de A. da Silveira.

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Não se compra uma viatura para toda a vida. Ela aguentará dez anos ou mais, de acordo com o uso, a frequência de utilização e a regu-laridade da sua manutenção. Seja como for, um dia o motor entrega a alma ao criador e a viatura terá de ser substituída. A uma escala maior a rede eléctrica é similar. E mesmo no caso da rede que a Europa possui e mantém em funcionamento, o aumento da procura, combinado com os ambiciosos objectivos da união em matéria de competitividade, inte-gração de energias renováveis e segurança dos aprovisionamentos energéticos, tornam a modernização do sistema inevitável.

É precisamente para estabelecer uma visão coerente das redes energéticas europeias para

além do horizonte de 2020 que a SmartGrids foi lançada em 2005. Mas a sua ambição mais prometedora é de pôr esta visão em prática.

Definido de forma rudimentar, uma “rede inteligente” (“smart grid” em inglês), apoia--se sobre tecnologias numéricas para fornecer electricidade de forma mais rentável e mais eficaz, oferecendo em simultâneo um fluxo energético com dois sentidos para poder ter em conta as energias renováveis.

As redes clássicas, concebidas para integrar um fluxo eléctrico de sentido único, estão assim incapacitadas de incluir em larga escala a produção descentralizada de energia. Elas são essencialmente adaptadas ao transporte de energia a partir das grandes centrais nucleares, hidráulicas, a carvão ou a gás, que permitem genericamente fazer economias de escala. Mas

se uma rede local secundária produzir mais energia do que a que consome, o fluxo de retorno pode criar problemas de segurança e de fiabilidade. Estes problemas de interdepen-dência foram postos a nu em 2006, quando 10 milhões de europeus mergulharam na escuridão na sequência de uma vasta avaria da rede eléctrica abrangendo 8 países (Áustria, Bélgica, Alemanha, Espanha, França, Hun-gria, itália e Holanda). uma rede “smartgrid” estaria muito mais apta a gerir este tipo de rupturas eléctricas em cascata.

A fiabilidade e eficácia de uma solução deste tipo permitirão igualmente aos consumidores fazer economias e contribuir para a redução das emissões de CO2. Painéis fotovoltaicos, eóli-cos e micro centrais hídricas ligadas a edifícios poderão ser conectadas à rede. Outra vantagem deste conceito é a de oferecer às famílias a pos-sibilidade de reduzir o seu consumo energético no decurso das horas de ponta, pela adaptação automática e de acordo com as suas próprias necessidades de consumo de energia eléctrica.

PROJECTO SMARTGRiDS: REPENSAR AS REDES

ELÉCTRiCAS“Em equipa que ganha não se mexe”. Adágio popular que podia ser atirado para as calendas gregas, pelo menos no que concerne à Europa e à sua rede de distribuição eléctrica. Dum ponto de vista prático, a rede eléctrica da união funciona, mas o crescimento da procura e a necessidade de integrar as energias verdes vão obrigar à modernização do sistema. A Plataforma Tecnologia Europeia (PTE) SmartGrids

estuda a melhor maneira de encarar este desafio.

As redes do futuro serão alimentadas ao

mesmo tempo por centrais e geradores dife-

rentemente localizados.

A agregação destes últimos em micro-redes

cosntituirá o equivalente a uma central

virtual de que a produção será simultanea-

mente integrada física e comercialmente.

Produção combinada de

calor e electricidade

Pilhas de combústivel

Eólicas

Indústrias

Habitações

Escritórios

Micro turbinas

Armazenamento

Central eléctrica

Centrais virtuais

Fonte: European Technology Platform SmartGrids

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O referencial de trabalho de SmartGrids com-preende quatro grupos. O objectivo é criar uma comunidade de peritos representativos dos diferentes actores do sector de distribuição de energia eléctrica e encorajar a partilha de experiência entre investigadores, empresas de distribuição e indústrias envolvidas no desen-volvimento de tecnologias de ponta. Maher Chebbo, presidente do grupo de trabalho “Demande et estimation” da plataforma pre-fere considerar a visão SmartGrids como um estudo de mercado, nomeadamente quando se trata do retorno do investimento potencial: “É duplo”, explica ele.“Por um lado, estão as economias quantifi-cáveis relativamente ao custo da poluição, o consumo de energia global os custos de uma potencial penúria de electricidade. Por outro lado, existem vantagens quantitativas como o aumento da competitividade global da Europa, a segurança dos aprovisionamentos energé-ticos, a muito maior fiabilidade da rede e a protecção do ambiente graças à utilização das energias renováveis.”

Serão os consumidores capazes de tomar a dianteira?

Transformar os consumidores em “prosumi-dores”1 capazes não somente de utilizar a ener-gia mas também de a produzir, isto será natu-ralmente o grande choque que as redes eléctricas do futuro trarão consigo. Tradicional-mente os consumidores têm uma relação, pas-siva com a electricidade. Mas a chegada das SmartGrids permitir-lhes-á de interagir com a rede do mesmo modo que hoje interagem no mercado das telecomunicações. O cliente poderá assim acompanhar com muito maior precisão a evolução dos seus consumos ou mesmo obter um contrato específico adaptado às suas necessidades.

1. Pode definir-se “Prosumidor” como alguém que toma parte na produção do produto que vai consumir. A abordagem é completamente diferente do consumidor passivo que faz apenas a escolha de um produto entre os que lhe são propostos. O prosumidor é muito exigente em matéria do que consome. Reclama um produto por medida, adaptado à sua individualidade. Não gosta do que se lhe impõe. Geralmente, é um criativo que gosta de fazer as coisas por ele mesmo.

uma das vantagens concretas das redes do futuro será o aparecimento dos “contadores inteligentes”, pequenos módulos que permi-tem decifrar meticulosamente os consumos domésticos e fazer sobressair assim os consu-midores desejosos de consumir fora das horas de ponta. Os prosumidores poderão igual-mente utilizar a internet para analisar o seu consumo hora a hora e enviar esses dados ao seu fornecedor seja pela via de um portal da Web seja através do seu contador. Segundo as preferências individuais, será também pos-sível utilizar exclusivamente a electricidade gerada por energias renováveis, necessidade que a maioria das redes actuais não permite satisfazer. Maher Chebbo prevê o surgimento de resultados concretos daqui até 2015, época em que se estima que 50% dos Euro-peus estejam equipados com um contador inteligente.

Modificar a infra-estrutura actual está longe de ser uma operação de baixo custo. Segundo Maher Chebbo, substituir, por exemplo, 30 milhões de contadores de electricidade deverá demorar 8 anos e custar 4 mil milhões de Euros em termos de equipamento, de explora-ção e de serviços. Os fornecedores de diferen-tes países, como a itália, a Bélgica, a Holanda

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e a inglaterra instalaram já contadores inte-ligentes em habitações domésticas tendo em vista incitar ao consumo durante as noites ou fins de semana, períodos durante os quais o consumo global é menor. Durante estas horas ditas “em vazio” o preço é reduzido de forma significativa o que estimula os consumidores a gerir melhor os seus consumos de energia.

Renovar as redes de transporte e distribuição de energia é particularmente complexo face ao número de actores oriundos das diferentes indústrias implicadas na realização desta ope-ração. As redes de linhas de alta tensão estão desactualizadas e, presentemente, as empre-sas responsáveis não são, de qualquer modo, encorajadas a investir na sua modernização. Com o apoio da Comissão Europeia e dos governos nacionais, SmartGrids propõe-se reunir os actores industriais tendo em vista a concretização dos financiamentos e das condi-ções necessárias para esta transição.

SmartGrids congrega vários projectos que oferecem à união Europeia capacidade de avaliação no domínio da renovação das redes eléctricas. O projecto ADDRESS – Active dis-tribution networks with full integration of demand and distributed energy resources – é um deles. Juntando 25 parceiros oriundos de 11 países, este projecto escrutina o conjunto da cadeia de aprovisionamento de energia eléctrica a fim de determinar com precisão o enquadramento comercial e técnico de implantação da “procura activa” no seio do projecto SmartGrids.

A “procura activa” refere-se à participação pro-activa das famílias e dos pequenos comércios no mercado da energia e no fornecimento de serviços aos participantes do sistema energé-tico. ADDRESS trabalha essencialmente sobre a maneira de conduzir com sucesso a reformu-lação do enquadramento técnico e comercial.

“Esperamos fazer avançar o conceito SmartGrids demonstrando que as redes de distribuição activa devem assentar num desenvolvimento de regulação inteligente e distribuída” explica Paola Petroni, coordenadora do projecto ADDRESS.

Para permitir a emergência da procura activa, os parceiros do projecto ADDRESS procuram soluções técnicas tanto ao nível das habitações e escritórios como ao nível do sistema energético global determinando os potenciais travões ao desenvolvimento do conceito. Tentam igual-mente identificar as vantagens da procura activa para cada um dos actores do sistema energético tendo em vista definir mecanismos do mercado e contratos adequados para a exploração des-ses benefícios. Actualmente, o projecto analisa as medidas de acompanhamento destinadas a gerir os aspectos sociais, culturais e comporta-mentais associados ao conceito.

“Este trabalho está longe de se limitar à teo-ria”, precisa Paola Petroni. “As soluções pro-postas serão validadas no seio de três sites experimentais e complementares possuido-res de diferentes características geográficas, demográficas e estruturais. Os resultados obti-dos a partir destes testes implicarão centenas de pessoas e serão úteis para avaliação da qua-lidade do trabalho realizado pelo ADDRESS”

Amy Shifflette em research*eu n.º 60 – Junho de 2009

Tradução de António F. Lopes.

A procura activa exprimiu as necessidades de energia eléctrica futuras

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Internacionalizar no sentido de ir con-quistar novos mercados é sobretudo aplicável às entidades produtoras. Mas não será despropositado trazer

aqui algumas ideias que podem servir de motivos inspiradores para algumas das muitas centenas de PME comerciais que operam na área dos materiais de construção.

É claro que, academicamente, são referenci-áveis casos de empresas comerciais de todos os ramos que podem, por exemplo, obter uma representação exclusiva de um produtor estrangeiro para o seu país e, conjuntamente, para outros. Trata-se de um fenómeno rela-tivamente frequente quando a língua falada nos países envolvidos é a mesma. O inglês, o Português, o Espanhol e o Francês são falados em amplos territórios, por muitos milhões de pessoas e não custa admitir que um pro-dutor americano, alemão ou japonês confie a sua representação exclusiva para Portugal e para os PALOP a uma empresa portuguesa ou a uma empresa espanhola para Espanha e para a América que fala o Castelhano. Para lá da língua, não será despiciendo o suposto conhecimento dos contextos particulares, culturais, económicos, sociais que é, como se sabe, condição de base para assegurar uma presença frutuosa num mercado estrangeiro.

A presença colonial, sobretudo a portuguesa, assegura efectivamente esse conhecimento1. inclusivamente, pode um produtor portu-guês de qualquer ramo confiar a comerciali-zação do que faz, no estrangeiro ou em certos países, a uma entidade portuguesa, às vezes muito pequena mas dispondo de um núcleo estimável de competências.As PME comerciais podem internacionalizar--se de muitos modos diferentes, exigindo cada um deles forte empenho e competência espe-cífica. Afinal estas exigências nem são nada originais.Parece-me útil e oportuno deixar aqui alguns singelíssimos exemplos de internacionaliza-ção de PME que, com as devidas adaptações, podem ser reproduzidas em todos os ramos.

Caso 1uma empresa portuguesa pode encontrar numa feira ou mesmo na internet, um pro-dutor estrangeiro de um vedante para juntas,

1 Em geral, os produtores portugueses de materiais de construção, em qualquer das fileiras de que o sector se compõe – metalomecânica ligeira, madeiras nas suas diferentes expressões, cerâmica, rochas ornamentais, cal hidráulica e cimento, etc., têm um conhecimento suficiente das condições em que podem operar nos mercados externos ou seja, dos imperativos que têm de respeitar, dos constrangimentos concorrenciais com que se defrontam, das vantagens que podem oferecer para serem preferidos.

com a marca REALPROOF, similar ao PLASTEX ou ao HERMETIQUE e iniciar contactos para se tornar seu representante em Portugal ou para se associar na criação de uma nova empresa local, digamos a REALPROOF PORTUGAL, SA com uma estratégia inovadora para a abor-dagem do mercado Ex. criar um serviço de apoio especializado pós-venda e/ou cursos permanentes de aplicadores (Lembram-se da SINGER que dominou o mercado mundial das máquinas de costura domésticas? Estratégia comercial quando ainda ninguém falava de Marketing: Cursos de costura em todas as freguesias todos anos. Depois, também de bordados).

Caso 2um fabricante alemão de folhas de serra para cortar metais verificou que toda a concorrên-cia fazia folhas de serra em três execuções dife-rentes: com 18, 24 e 32 dentes por polegada. Analisando o comportamento destas folhas verificou que, para tirar partido das diferentes dimensões do denteado era necessário mudar de folha de serra: começar por usar 32 den-tes para iniciar o corte, 24 para prosseguir e, depois da folha completamente embebida, 18 dentes, o mais rápido. Experimentou então fazer folhas de serra com as três dimensões de dentes na mesma lâmina: 22% com 32 dentes,

FALEMOS DE iNTERNACiONALiZAçãO

A PROPÓSiTO DE PME COMERCiAiS

Almor ViegasEconomista e Consultor de Empresas [email protected]

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à entrada, para pegar melhor no material a serrar, 58% com 24 e 20% com 18. um comerciante português encontrou o fabricante alemão numa feira em Hanover, experimentou as folhas de serra em chapas, tubos, perfis e barras e constatou a verdade da promessa do fabricante. Propôs-se passar uma encomenda de 1000 caixas (6000 dúzias) com a condição de ser o único importador em Por-tugal e de as folhas de serra serem identificadas com uma marca sua que indicaria na semana seguinte. Ajustou-se o preço, condições de pagamento, prazos de entrega e o industrial entregou uma promessa de contrato. A marca

escolhida em Portugal foi WOLFRAM® dente progressivo. Foi e presumo que continua a ser, um sucesso. A palavra WOLFRAM resultava do facto de o aço de que se produziam aquelas folhas de serra ter Volfrâmio na composição. isso era um elemento valorizador da quali-dade que, deste modo, a marca explicitava. Mais um exemplo:

Caso 3Nos anos sessenta, chegaram a Portugal as rebarbadoras eléctricas, operadoras manuais com um motor monofásico que trabalhava a uma velocidade de 8500 rotações por minuto

e utilizavam como ferramenta de rebarbagem ou corte de metais, pedra ou produtos cerâmi-cos, um disco abrasivo adequado aos materiais a trabalhar (Óxido de alumínio para o aço e carboneto de silício para a pedra, fundição de ferro e produtos cerâmicos), de 178 mm de diâmetro e 8 mm de espessura, reforça-dos com uma tela de Nylon (Outra aplica-ção do Nylon) para evitar o estilhaçamento. Em Portugal havia e ainda há, ao que julgo saber, uma fábrica de abrasivos que explorava uma parceria com uma entidade estrangeira. Entretanto, um dos maiores importadores por-tugueses de rebarbadoras manuais, porventura

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o mais agressivo no mercado, trabalhava com uma marca alemã muito prestigiada e atreveu--se a propor à fábrica portuguesa de abrasivos a produção de um disco para trabalhar com as rebarbadoras manuais, idêntico ao que já pro-duzia mas com uma marca nova, em exclu-sivo. Essa marca, a NORDWIND®, foi exportada para muitos países, incluindo a própria Ale-manha e assumiu um papel importante no mercado português.Não resisto a referir mais um exemplo, o último por agora

Caso 4um comerciante português, o mesmo que vimos referindo, assistiu no Rand Show, em Joanesburgo, à desmontagem de uma caixa de velocidades de uma máquina ferramenta que estava exposta. Renitentemente, um dos parafusos que fixava a tampa recusava-se a deixar que o técnico o desapertasse. Os expedientes tentados começaram a danificar a caixa do parafuso (umbrako) e um dos seus assistentes propôs-se ir à oficina da empresa buscar uma ferramenta que, em sua opinião, não permitiria ao parafuso renitente manter a

sua teimosia. Trouxe uma chave com ponteiras substituíveis em conformidade com a cabeça do parafuso, um corpo de 30 ou 35 mm de diâme-tro, recartilhado para não escorregar. Aplicou a ponteira sextavada adequada à caixa da cabeça do parafuso, aplicou a chave, rodou-a com a mão esquerda, apoiada no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio, para desapertar e, com a mão direita deu uma forte pancada com um martelo com cabeças de plástico no corpo superior da chave. O parafuso rendeu-se.Alguns meses depois o comerciante portu-guês apresentava numa feira em Charleroi, na

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AS PME INDUSTRIAIS FACE À NECESSIDADE DE INTERNACIONALIZAÇÃO

Pontos fortesConservar e / ou reforçar

Pontos fracosConsertar estratégias

1. Flexibilidade na resposta ao cliente 1. Falta de notoriedade da empresa ou da marca

2. Focalização no cliente 2. Dificuldade de acesso aos mercados

3. Focalização no produto tendo em conta todas as suas vertentes

3. incapacidade para desenvolver estratégias de pull

4. Abertura para a cooperação com empresas complementares 4. Falta de peso próprio na oferta

5. Facilidade e gosto pela comunicação interpessoal 5. Falta de poder negocial

6. Domínio de línguas. inglês essencial 6. Precaridade da relação

7. Experiência no uso das ferramentas informáticas7. Frequente e excessiva dependência de um reduzido número

de clientes

8. Disponibilidade para viajar 8. Risco de centrifugação

9. Formação que lhe possibilite compreender novas culturas e contextos

9. Sistemática posição de price taker

Bélgica, a impaCT SCREW DRiVER, versão por-tuguesa da chave vista em Joanesburgo mas com um perfil oitavado, mais fácil de agarrar, ponteiras feitas em aço cromo-vanádio, emba-lada num estojo em chapa com instruções para uso não apenas para desapertar parafusos renitentes ou calcinados mas também para produzir apertos de segurança.um técnico genial, do Porto, chamado Gas-par Pinto de Sá, um dos sócios fundadores de Irmãos Sás, Lda., descodificou a descrição que lhe foi feita e criou um excêntrico, alojado no interior do corpo da chave para alavancar a força produzida pela pancada do martelo. O tratamento térmico de todos os componentes da chave de impacto constituía o ponto crí-tico da qualidade da ferramenta. A normaliza-ção de todas peças por forma a tornar possível a reposição das que se percam ou deteriorem

era uma exigência incontornável para se pen-sar em exportar.Recorde-se também o nome do primeiro cliente estrangeiro que contactou o stand de apresentação da chave em Charleroi e aí fixou a primeira encomenda de 50 unidades: ALPO KINUNEN, de Helsínquia.

Internacionalizar pode ter uma multidão de significados como se deixa ver. O que está em causa é o relacionamento com pessoas, empre-sas, instituições do estrangeiro, para ver o que se faz, como se faz, com que meios se faz, como se vende, como se utiliza, que aplicações têm os produtos que não sejam usuais em Por-tugal. O que aí fica dito não são senão suges-tões para pensar e aplicar recorrentemente a fórmula “… e se?”.

Há um capital de

conhecimentos

e de experiência

que pode ser

aproveitado em

operações de

piggyback

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TRANSVERSALiDADES

“...QUEM SÓ SABE DE MEDICINA, NEM DE MEDICINA SABE”

Prof. Abel Salazar

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Ernesto MatosLicenciado em Design Gráfico e autor de extensa

bibliografia sobre o tema “calçada portuguesa”

A pedra é pedra tal como o ferro é ferro porque algo com muita, muita inércia os gerou. Tudo assenta sobre essa força, essa força gravítica que

vem do céu e que as pedras, o ferro e eu tão bem conhecemos. Esta energia que também sai de mim e das pedras e do ferro, mesmo ilusória que seja, ajuda-nos a continuarmos a ser o que somos.

Depois de criar os utensílios, o homem da pré-história alicerçou as bases das suas neces-sidades num profundo e contínuo desenvol-vimento dos mesmos, para salvaguardar uma existência pacífica perante o seu habitat natu-ral que se mantinha selvagem e, em grande parte, incompreendido. Posteriormente, já num equilíbrio emocional acrescentou aos utensílios algumas formas e relevos que atra-vés de lamas e pigmentos conseguiam trans-mitir algo que as suas emoções viam diária e constantemente transbordando. Acções de uma humanização em curso que serviriam para ultrapassar o já adquirido dom da fala que ia, também ela, extravasando para o dom do canto, do simples traço cuneiforme que

PERPENDiCuLARiDADES, PARALELiSMOS E OuTRAS

FORçAS CELESTES DO CAOS COMuNiCACiONAL

evolui para um elaborado desenho com uma carga intencional que descarrega e alivia senti-mentos bem mais profundos do que a simples necessidade de sobrevivência. Comunicar tor-nou-se humanizar, saber comunicar cria nas

sociedades elos cada vez mais fortes para uma saudável coexistência em comunidade.

Hoje, a comunicação continua a ser um dos fundamentais pilares desta mútua coexistên-cia. O grafismo, surgido embrionário, e já hoje com uma forte carga fractal aplicada a for-mulas de equações matemáticas, tem sido elo de uma subsistência racional a expressar uma identidade possuidora de uma génese com características de querer ultrapassar as barreiras de uma razão concisa e com uma dimensão já avassaladora que consegue transpor as barreira do próprio sistema solar. Ela, tem sido o tes-temunho da gloriosa capacidade de mutação das grandes energias que um dia se libertaram também, para dialogar perante esta imensidão intemporal de algo sedento de se revelar.

Sabemos que o ser humano foi, também ele, esculpido por utensílios que em pulsões de enigmáticos corações são capazes de repro-duzir outros utensílios para se reproduzirem a si próprios em contínua comunicação, em contínuas pulsões.

“A esta hora, raios ou ondas provenientes de meios mais subtis estão sem dúvida a abater-se sobre nós por todo o vasto mundo, sem serem reconhecidos, cheios de men-sagens e de inteligência do invisível.” (…)

Pensamento de Richard Jefferies, Os Livros da Minha Vida, Henry Miller

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Que entropia é esta, em que riscos e rabiscos, traços transversais, longitudinais ou círculos concêntricos, em factores interpostos geome-tricamente conseguem comunicar connosco num diálogo aberto? Que finalidade têm estas esculturas da ilha da Páscoa, as do Miguel ângelo e Botero? E o das pinturas de Leo-nardo da Vinci ou Mondriam? Com que propósito estes simples desenhos de calçada se expandem aqui, mesmo debaixo dos nossos pés? Serão tudo afinal sombras e reflexos de um ancestral e interior espelho de nós mesmos? Será este um útil utensílio que

nos entra pela janela e que desperdiçamos a cada instante?

Onde procurar respostas, senão perguntar a mim próprio, já que sou uma testemunha e felizardo observador de um presente em cons-tante movimento que se desfaz num incógnito factor tempo? Então, aproveito uma viagem no intercidades das 17h30 para me abstrair de uma realidade demasiadamente viciada e embrenhar-me numa outra viagem em que o caos, um outro caos, me leva à descoberta da comunicação, na qual, das janelas de um

comboio possa tirar todo o proveito de algo que vem de muito, muito longe e mesmo assim me faz ver, analisar, reflectir… existir.Vou à janela, mesmo ao lado da caótica luz que não me larga um só instante, vinda de uma estrela, que chegada aqui a este lado me traz uma paisagem real, como se essas pai-sagens, agora fugidias, fossem a origem da própria luz e não estivessem do lado de lá, do vidro e desta carruagem climatizada. Afi-nal, o que vejo senão celestes raios que pin-tam as telas das janelas envidraçadas, que em fracções de segundos pintam e decoram uma outra janela, a minha janela interior. Esta mais duradoura, versátil e interpretadora de matizes polarizados a fragmentos de invisíveis e controversas partículas de tintas incandes-centes, que só no escuro e silêncio das nos-sas almas as podemos admirar, tal as cartas de amor. uma luz, uma paisagem, reflexos passageiros ou o reflexo de uma luz embebida na embriaguês adquirida das coisas impares que a paisagem e a janela deixaram consumir? O que me importa afinal? interrogo-me no entanto sobre essa poderosa e magnânima existência: a luz e a paisagem. Para que me serve em mim este alimento?...

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… A paisagem continua trémula, enquanto as cores que à partida eram vivas, vão-se tor-nando plenas de aguarelas e fazem da janela do meu lado uma tela de naturezas e cidades emparceladas a pastel, tendencialmente esver-deadas e de amarelos ocres. Dali, retiro e cons-truo fragmentos para meu alimento racional. Capto as linhas calmas do horizonte onde o mar implanta reflexos instantâneos e que as encostas das serras adornam. Absorvo a vege-tação de uma verticalidade arborizada onde as

matizes me dão sensações de uma frescura no início de uma estação primaveril, enquanto a luz, a luz do sol me vai abandonando neste envelhecimento contínuo a que sou constan-temente exposto perante as coisas que dis-tingo e absorvo nesta consciência, afinal vinda lá de fora.

Que mais posso desejar, depois da CP me aca-bar de oferecer, além de arte pura, sem sequer ser necessário deslocar-me a um museu, deu-me também o tempo passageiro de uma refle-xão em movimento perante janelas dentro de janelas?

Eu faço, afinal, a arte em mim próprio!

Por algumas horas vou levitando num anoi-tecer sereno, mas amanhã, e no outro ama-nhã, depois de amanhã, restar-me-á o chão, a pedra, a pedra sobre pedra e as pedras da calçada para voltar a caminhar o restante per-curso neste vai-e-vem de intercidades, coberto de interlocutores meus companheiros, cir-cundantes neste mesmo tempo de incertezas.

Amanhã, então, partirei de rua em rua onde as pedras que hoje me alicerçam o destino de amanhã estarão bem espalhadas por aí. Já não terei a mesma virtual janela de hoje, nem as paisagens fugidias, mas as pedras que me esperam, silenciosamente, no chão, mas que, com certeza, dar-me-ão forças para que, erguido, recorde de novo o paladar da coe-xistência humana nas percepções do conhe-cimento actual dentro dessas intermináveis janelas. Enquanto as janelas ornamentadas das nossas aleatórias cidades, as ruas de cal-çada e as paisagens não forem substituídas por placas de betão, poderei desfrutar, pois sim, dos desenhos das pedras, das paredes e jane-las caiadas, para a fértil terra quente, e fazer com que todos eles germinem sementes para a organização das simples coisas, fazendo da luz a visão que extrai o sentido de dar sentido às coisas do caos. Organizar um caos já orga-nizado em caos e assim retirar o usufruto da harmonia e das necessidades diárias de poesia, construindo ainda mais luxuriantes telas para a minha sedenta imaginação.

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Da nossa visão, processo transformador do caos em sonhos, fazemos uma das mais-valias para a transmissão das fórmulas celestes que compõem os materiais dos testemunhos que nos passam diariamente à frente, e de que logo também nos libertamos ao transmitir pelos códigos da fala e da escrita.

um resumo misterioso feito da luz a que o próprio ser humano pretende também passar de mão em mão, pensamento em pensamento, em aprendizagens contínuas, a mensagem do segredo da nascente do grande rio, que vai desaguando nestas ondas electromagnéticas que persistem em não se intimidar perante o frio da dimensão de um oceano caótico, a comunicação é a base dos genes de uma humanização saudável.

Hoje, as aulas e os seus mentores, os pais e as mães, mais do que têm direito de passar o veredicto de uma análise actual, porque em parte, grande parte, já houve um importante processo que o fez, sábia e inteligentemente, ao longo de milénios e milénios passados.

Abandonar os valores da comunicação é que-rer apagar o futuro das revoluções dos astros, do sentido das cores, da rota dos salmões selvagens, do bater das asas de um colibri… apagar esta comunicação, forjada na pedra, nascida num embrionário caos das forças gra-víticas é parar as ondas do mar onde ulisses e Vasco da Gama navegaram, é quebrar os raios do sol que se libertam reflectindo-se na pedra para se embrenharem nesta constante embria-guês de visões poéticas que só almas com asas de condor se apercebem da dimensão gigan-tesca a que todos nós pertencemos.

Então a pedra deixará de fazer sentido, tudo o mais deixará de fazer sentido, no sentido da visão bombardeada pelos neutrões directa-mente nascidos no grande astro. Mataremos também o sol!

Restar-nos-á, depois, depois os visores de plas-mas que serão a visão do mundo aos olhares de nós espectadores infortunados por esta má sorte. E o sol? E o sol? Ver-se-á, sim! Sobre os filtros escuros e jamais brilhará, livremente reflectido directamente dos calcários, dos azu-lejos, das fachadas de ocres rendilhados, das árvores que bebem à beira do rios, absorvi-das e emolduradas da janela de um qualquer intercidades, num radiante dia, com partida às 17h30.

Ernesto Matos

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1. Do espírito inovador e da dinâmica da sua direcção, expresso em medidas con-cretas que visem empenhar os docentes num trabalho que está muito para além do mero exercício de uma profissão e que deverá, ele próprio, a sua natureza e objec-tivos, ser gratificante para quem o realiza. Também à direcção da escola compete mantê-la em concordância com o futuro mesmo quando seja preciso lutar e abrir novas pistas e percursos para fazer face às

dificuldades emergentes, venham elas do contexto socioeconómico ou do desajuste possível entre o imediatismo perseguido pelos beneficiários e a teleologia mais ampla do projecto sonhado.

2. Do prestígio de que goza o seu corpo docente, efeito directo da qualificação científica e pedagógica dos professores e da sua adesão militante ao projecto de que participam.

3. Do modo como respeita o compromisso essencial face aos seus alunos e diploma-dos porque a escola, a minha escola como desejavelmente muitos dirão pela vida fora, constitui um referencial de relevante importância na história de cada um. Mas também porque lhe compete apoiar activa-mente a inserção na vida activa dos jovens que ajudou a formar. Sobretudo na fase de lançamento dos recém-diplomados e ainda também, para lá do último exame,

O SEGREDO PODE ESTAR NA ESCOLA

É de gente que aqui falamos, gente que cresce e precisa de ser apoiada para medrar consistentemente, responsavelmente. São os estudantes de Portugal. Muitos, filhos ou netos de pessoas ligadas à fileira dos materiais de construção.

A ACEITAÇÃO DE UMA ESCOLA

PELA COMUNIDADE DE QUE

FAZ PARTE E A IMPORTÂNCIA

DO PAPEL SOCIAL QUE

AÍ DESEMPENHA, TUDO

ISSO DEPENDE DE VÁRIOS

FACTORES

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escancarar as portas e abrir os braços aos que queiram ali actualizar ou aprofundar os seus conhecimentos ganhando novas com-petências. Ou, quando menos, queiram ouvir uma opinião ou consultar um livro. Porque se sabe que respirar o ar da escola retarda o envelhecimento.

Será então pertinente fazer uma sugestão e um apelo aos professores das faculdades e das es-colas dos institutos politécnicos no sentido de que se empenhem, para além do muito que já lhes compete e é de sua responsabilidade di-recta e mais imediata, em colaborar na criação de condições que facilitem as saídas e aplica-ções dos seus diplomados.

Os professores em geral e os do ensino supe-rior, universitário ou politécnico em especial, beneficiam de uma situação verdadeiramente privilegiada para, observando interessada-mente o comportamento dos seus alunos ao longo do ano, porventura ao longo de todo o curso, poderem referenciar aqueles que se

destaquem pelas suas qualidades de liderança, desejo de autonomia, pela persistência e ener-gia desenvolvida na execução das tarefas e se revelem como melhores comunicadores, mais dinâmicos e criativos.

É que, em princípio, estas são características diferenciadoras dos jovens com perfil para poderem vir a optar pelo empresariado como forma de realização pessoal, num país como o nosso, em que o deficit de novos empreen-dedores qualificados constitui um dos mais sérios entraves à potenciação do tecido em-presarial.

Se for possível sistematizar a recolha de da-dos desta natureza e se se disponibilizar, re-gular e pacientemente, para este segmento de estudantes, uma informação simples e es-clarecedora sobre a dignidade da actividade empresarial, a importância que nela assume a ética, os riscos e desafios que comporta, as recompensas que proporciona e a possibilida-de de participação activa no processo de de-

senvolvimento colectivo em que temos de nos empenhar, estaríamos provavelmente todos a criar os fundamentos de uma nova cultura de aplicação das competências, a estimular a auto confiança e o sentido da responsabilidade dos jovens diplomados, levando estes a intervir ac-tivamente na tarefa de rasgar novos horizontes e contornar a ameaça da frustração que ine-vitavelmente resultará de concluir um curso sem dispor de projecto para o aplicar.

Acrescentaríamos para terminar que a escola assim empenhada como factor de valorização e de mudança, para ser objecto do interesse vivo da comunidade, para ser socialmente reconhecida, terá vantagem em se abrir aos outros, em criar e manter um sistema de co-municação com o exterior que funcione nos dois sentidos. Ser convivente com o mundo para poder mudá-lo para melhor como queria Mário Sacramento.

Almor Viegas

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Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, em 1888, 21 anos antes de Peter Drucker e quarenta e três anos antes de Philipe Kotler, o universalmente conhecido autor dos Princípios de Marketing e de Marketing Management. Em 1927, depois de uma intensa e diversificada actividade como correspondente internacional ao serviço de várias empresas, quatro anos antes de Philipe Kotler nascer, na Revista de Contabilidade e Comércio, por si criada, o poeta

escreveu uma história singela para afirmar alguns princípios fundamentais da disciplina que, entre nós, ganhou as insígnias universitárias nos anos sessenta.Com a certeza da sua actualidade e interesse, aqui se transcreve para uso e gozo de quem sabe que o Marketing não se con-funde com a publicidade nem com a acção promocional da venda nem com esta em si mesma, para que os estudantes de Marketing e, afinal, os de todas as matérias acreditem, sem esforço nem coacção legal, que Portugal não é um país pobre, essencialmente agrícola e tradicionalmente católico como nos quiseram fazer crer. Durante dezenas de anos. É muito mais do que isso. Condição: que o queiramos com determinação suficiente.

Almor Viegas

A ESSÊNCIA DO COMÉRCIOAqui há uns anos, antes da Guerra (1914-1918), correu os meios ingleses, como exem-plo demonstrativo da insinuação comercial alemã, a notícia do caso curioso das “taças para ovos” (egg-cups) que se vendiam na Índia.O inglês costuma comer os “ovos” a que nós chamamos “quentes”, não em copos e parti-dos, mas em pequenas taças de louça, do fei-tio de meio ovo, e em que o ovo, portanto,

entra até metade; partem a extremidade livre do ovo, e comem-no assim, com uma colher de chá, depois de lhe ter deitado sal e pimenta. Na Índia, colónia britânica, assim se comiam, e naturalmente ainda se comem os ovos “quentes”. Como é de supor, eram casas inglesas as que, por tradição aparentemente inquebrantável, exportavam para a Índia as taças para este fim.Sucedeu, porém, que, alguns anos antes da Guerra, as firmas inglesas exportadoras deste artigo notaram que a procura dele na Índia

decrescera quase até zero. Estranharam o facto, buscaram saber a causa, e não tardou que descobrissem que estavam a ser batidas por casas exportadoras alemãs que vendiam idêntico artigo ao mesmo preço.Se as casas exportadoras alemãs tivessem entrado no mercado índio com o artigo a preços mais baixos, sem dúvida que os agentes dos expor-tadores ingleses teriam advertido estes sem demora. Mas, como o preço era igual e a qua-lidade também, não era necessário o aviso; nem houve receio senão quando se verificou

FERNANDO PESSOA NãO SÓ uM DOS MAiORES POETAS DA LÍNGuA PORTuGuESA

MAS TAMBÉM uM PROFiSSiONAL EMPENHADO NOMEADAMENTE

NAS ÁREAS COMERCiAL E DA GESTãO ESTRATÉGiCA

No dia 13 de Junho deste ano de 2009, passa o 121.º aniversário do seu nascimento em Lisboa.

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“Uma carta áspera ou violenta é sempre injustificada, porque é sempre inútil. Indispõe, e não dá resultado. Quem não paga porque não quer, não passa a pagar

por lhe dizerem que não paga porque não quer. Isso já ele sabe. E quem não paga porque não pode, não fica contente que se lhe diga ou se lhe insinue

que não paga porque não quer.”

que havia razões para mais que receio, isto é, quando se verificou que nestas condições de duvidosa vantagem para um novo concor-rente, o artigo alemão vencera por completo.Feita a averiguação ansiosa da causa deste mis-tério, não tardou que se descobrisse. Os ovos das galinhas indianas eram – e naturalmente ainda são – ligeiramente maiores que os das galinhas da Europa, ou, pelo menos, das da Grã-Bretanha. Os fabricantes ingleses expor-tavam e as taças de tipo único que fabricavam para o consumo doméstico. Essas taças, evi-dente-mente, serviam de um modo imperfeito aos ovos das galinhas da Índia. Os alemães notaram isto, e fizeram taças ligeiramente

maiores, próprias para receber esses ovos. Não tinham que alterar a qualidade (podiam até baixá-la), nem diminuir o preço; tinham certa a vitória por o que em linguagem científica se chama a adaptação ao meio. Tinham resol-vido, na Índia e para si, o problema de comer o ovo de Colombo.Esta história, em aparência tão simples, encerra um ensinamento que todo o comerciante, que o não seja por simplesmente brincar às vendas, devia tomar a peito, compreender na sua essência. um comerciante, qualquer que seja, não é mais que um servidor do público, ou de um público; e recebe uma paga, a que se chama o seu “lucro”, pela prestação desse serviço. Ora toda a gente que serve deve, parece-nos, buscar agradar a quem serve. Para isso é preciso estudar a quem se serve – mas estudá-lo sem preconceitos nem antecipações; partindo do princípio de que os outros pen-sam como nós ou devem pensar como nós – porque em geral não pensam como nós -, mas do princípio de que se queremos servir os outros (para lucrar com isso ou não), nós é que devemos pensar como eles.O que temos que ver é como é que eles efecti-vamente pensam, e não como é que nos seria agradável ou conveniente que eles pensassem. Nada revela mais uma incapacidade funda-mental para o exercício do comércio que o hábito de concluir o que os outros querem

Fernando Pessoa – O Comércio e

a Publicidade

Organização, Introdução e Notas

de António Mega Ferreira.

CINEVOZ / LUSOMÉDIA, 1986

A aguardar uma reedição muito

muito aumentada

sem estudar os outros, fechando-nos no gabi-nete da nossa própria cabeça, e esquecendo que os olhos e ouvidos – os sentidos, enfim – é que fornecem os elementos que o nosso cérebro há-de elaborar, para essa elaboração formar a nossa experiência.

Este texto foi publicado na Revista de Contabilidade

e Comércio, N.º 2, de Fevereiro de 1926.

RECOMENDAMOS VIVAMENTE

(N.º 1 da Revista de Contabilidade e Comércio, de Janeiro de 1926).

Fernando Pessoa

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A CiÊNCiA AO AL

“A epidemia é o homem”, resume Anne Ste-phan, comissária da exposição Epidemie da “Cité des Sciences et de l’industrie”, em Paris. Para saber mais sobre este fenómeno inquie-tante, o visitante é convidado, de início, a mergulhar em filmes (imagens de arquivo, testemunhos) que permitem compreender o desenvolvimento e o vivenciado de um fenó-meno epidémico na sua dimensão social.

Cinco quadros sucedem-se uns aos outros: as grandes roturas na história das epidemias (da pré-história ao princípio do século XX); a organização da luta; as epidemias e o racismo; o fim do optimismo (1940-1990); a possibili-dade de uma “quarta rotura” provocada pelas tempestades microbianas com que a mundia-lização nos ameaça, os modos de vida, o rea-quecimento climático, etc.

Pode escapar-se a esta rotura que nos ameaça e espia? Tudo depende … em primeiro lugar da política sanitária, mas igualmente dos comportamentos individuais e colectivos. A segunda etapa da exposição é consagrada a uma espécie de teste inédito através de um jogo interactivo gigantesco (até 100 partici-pantes): ataque bioterrorista de peste pulmo-nar no metro de Nova iorque, epidemia de chikungunya em Nice, gripe pandémica em Singapura, SiDA em Paris-Rio-Moscovo, paludismo em Bamako … uma composição visual e sonora mostra no ecrã a evolução dos cenários. Ao mesmo tempo, cada jogador é seguido pela sua aura – um círculo luminoso no solo que o acompanha nas suas deslocações e mede, em tempo real, a situação sanitária. Segundo os seus percursos e os seus encontros, será infectado ou não, descobrirá tratamentos

Uma exposição contagiosa

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CANCE DA MãO*

OS LEITORES DA PIRÂMIDES & OBELISCOS QUE SE QUEIRAM MANTER ACTUALIZADOS RELATIVAMENTE AO QUE SE PASSA NO ESPAÇO EUROPEU DA INVESTIGAÇÃO PODEM SOLICITAR O ENVIO MENSAL DA REVISTA research eu. Gratuita.

Querendo, indique-nos o seu nome, organização, endereço e a língua que prefere (Francês, Inglês, Alemão, Espanhol). Nós encarregamo--nos de registar a sua assinatura em Bruxelas. SEM ENCARGOS. E-mail: [email protected]

AgendaPara estar ao corrente dos acontecimentos relacionados com a Investigação e Desenvolvimento use:

http://ec.europa.eu/research/headlines/archives_diary_en.cfm

e sistemas de prevenção, estabelecerá relações com outros (tendo a capacidade de os conta-minar), fará boas ou más escolhas. Para “salvar a vida” (dispõe de três…), deverá manipular os objectos virtuais ad hoc (uma máscara, um medicamento…) informar-se, encontrar tera-pias eficazes, etc.

Mas este jogo de vídeo não podia ficar por aí. Os resultados de cada “partida” são registados durante 11 meses. Para Anne Stephan, “ pode imaginar-se que estes dados sejam utilizados

por epidemiologistas ou outros investigadores à maneira das sondagens ou de estatísticas, e que assim se possa ter uma ideia mais precisa dos comportamentos possíveis no caso de uma epidemia real”.

*Paris, Cité des Sciences et de l’industrie, até 16/08/09

www.cite-sciences.fr

Colhido de research eu – magazine do espaço europeu

da investigação, nº 59 de Março de 2009.

Tradução de AV

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