período pós-industrial: tempo de...
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VOL. 4 – Nº 1 – MARÇO/2014 – ISSN 2236-3734 .
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Período pós-industrial: tempo de ócio
Ed da Silva Moraes1
Resumo: Enfoca a sociedade pós-industrial, compreendendo o período histórico a partir do final da Segunda Guerra Mundial até aos nossos dias, enfatizando alguns aspectos gerais relevantes, fazendo-se um apanhado retrospectivo sobre os principais acontecimentos ocorridos na década de 1989 a 1999, quando para alguns, passamos a presenciar “uma nova ordem mundial”, identificando-se alguns problemas, sob o ponto de vista das relações de trabalho, decorrentes do processo de globalização e integração regional e ao final tecendo-se algumas considerações sobre as perspectivas. Palavras–chave: pós-industrial – trabalho – globalização – integração - tempo livre - ócio criativo.
Abstract: Focuses on the post-industrial society, comprising the historical period from the end of World War II to the present day, emphasizing some important general aspects, making a retrospective overview about the main events in the decade 1989-1999, when for some, we are witnessing a "new world order", identifying some problems from the point of view of labor relations, arising out of globalization and regional integration and end-weaving process some considerations about the prospects. Keywords: post-industrial – work – globalization – integration - free time - creative leisure.
Revolução Industrial: generalidades
Se o tempo é de todos os bens o mais precioso, a perda de tempo tem de ser o maior dos desperdícios. Como o tempo perdido jamais é reencontrado, aquilo que chamamos ‘tempo suficiente’ sempre demonstra ser ‘tempo insuficiente’. Vamos então tomar uma atitude e ter um objetivo para que, com perseverança, cuidemos em fazer mais com menos confusão
2 (FRANKLIN apud COVEY, 2004, p.58).
Segundo Alvin Toffler (1998, p. 35), “[...] ouviu-se uma explosão que enviou ondas
de concussão em cadeia através da Terra, demolindo sociedades antigas e criando
uma civilização inteiramente nova. Essa explosão foi, naturalmente, a revolução
industrial”. Continuando nesta linha de raciocínio, ele afirma que “[...] a força da
maré gigante que ela desencadeou no mundo – a Segunda Onda – colidiu com
todas as instituições do passado e modificou o modo de vida de milhões”.
Até então, conforme Toffler (1998, p. 35), “a civilização da Primeira Onda reinou
suprema, [...]. Os chamados povos primitivos, vivendo em pequenos bandos e tribos
1Professor do curso de bacharelado em Direito – FACOS/CNEC.
2Encontrado em: COVEY, Stephen R. Princípios essenciais das pessoas altamente eficazes. Trad.
Iva Sofia Gonçalves Lima. Rio de Janeiro: Sextante, 2004, p. 58.
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e subsistindo de coleta, pesca e caça, foram ultrapassados pela revolução agrícola”.
Com o advento da máquina a vapor, deu-se início ao período, que historicamente
ficou conhecido como a Revolução Industrial ou Segunda Onda, para Toffler (1998).
Tal transformação no processo produtivo iniciou pela Inglaterra, em 1850,
alastrando-se mais tarde pela Europa Ocidental e Estados Unidos da América. Para
fins didáticos, alguns estudiosos costumam dividir este fenômeno histórico em duas
fases: a primeira que vai do final do século XVIII até a I Guerra Mundial e a segunda,
após a II Guerra Mundial até ao início da década de 1950.
O prenúncio de uma nova fase para a humanidade: passos para a transição da sociedade industrial para uma sociedade pós-industrial
É difícil precisar o exato momento em que uma transformação histórica possa ter
ocorrido. Somente após uma sucessão de acontecimentos e desdobramentos, torna-
se possível classificar os diferentes períodos históricos.
No que se refere aos aspectos laborais e econômicos, a humanidade civilizada
percebeu a transição da sociedade rural para a industrial, entre o final do século
XVIII e no início do século XX. Para De Masi (2000, p. 50), “a sociedade pós-
industrial nasce em 1950”. Segundo ele, muito embora não tendo ainda contornos e
elementos constitutivos precisos, tal sociedade pode ser definida como ‘pós-
industrial’(DE MASI, 1999, p. 48).
Segundo De Masi (1999, p. 18), na fase mais madura da sociedade industrial,
emergem três fenômenos novos quase prenunciando sua já próxima superação. O
primeiro consiste em uma convergência progressiva entre os países industriais –
sobretudo EUA e URSS – independentemente de seu regime político. O segundo
fenômeno consiste no crescimento das classes médias no âmbito da sociedade e da
tecno-estrutura da empresa. Finalmente, o terceiro fenômeno, é constituído pela
difusão do consumo de massa e da sociedade de massa.
No entender de De Masi (1999), enquanto que na sociedade industrial, os recursos
principais são os meios de produção, matérias-primas, patentes e produtividade, na
sociedade pós-industrial tais recursos são a inteligência, o conhecimento, a
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criatividade, as informações, os laboratórios científicos e culturais. No tocante à
estrutura funcional, na primeira estariam os operários, os engenheiros, os
empresários, os funcionários de escritório, enquanto que na segunda estariam os
profissionais liberais, os técnicos, os cientistas, a indústria do lazer e a tecno-
estrutura. Já no que se refere aos atores sociais centrais, na sociedade industrial
seriam os empresários, os trabalhadores e os sindicatos, sendo que na sociedade
pós-industrial estariam os técnos, as mulheres, os cientistas, os administradores da
informação e os intelectuais.
Um autor que não considera adequado o uso do termo “pós-industrial” para o atual
momento é Toffler (1998), preferindo dividir os diferentes períodos históricos em
“ondas”, em que a primeira começou por volta de 8000 a.C. e que dominou a terra
sem qualquer desafio até 1650 e 1750 d.C. A partir deste momento, a Primeira Onda
perdeu ímpeto, enquanto a Segunda Onda ganhava força. A civilização industrial,
produto desta Segunda Onda, dominou o planeta por sua vez, até atingir a altura
máxima. Este último ponto máximo histórico ocorreu nos Estados Unidos, durante a
década iniciada por volta de 1955 – década que viu os trabalhadores de colarinho
branco e de serviços gerais excederem em número os trabalhadores de macacão.
Ainda segundo Toffler (1998, p. 23), essa foi a mesma década “que viu a introdução
generalizada do computador, o jato comercial, a pílula anticoncepcional e muitas
outras inovações de alto impacto”.
[...] a transição para uma sociedade sem trabalhadores, a sociedade da informação, é o terceiro e derradeiro estágio de uma grande mudança nos paradigmas econômicos, marcados pela transição de recursos energéticos renováveis para os não renováveis e de fontes de energia biológicas para as mecânicas (RIFKIN, Jeremy 1995, p. 63).
Para este autor americano, a Primeira Revolução Industrial teve início na Inglaterra,
logo após o final da Era Medieval, com a união do carvão e das máquinas para
produzir “vapor”. Posteriormente ocorreu a Segunda Revolução Industrial entre 1860
e a I Guerra Mundial, mencionando que “o petróleo passou a competir com o carvão
e a eletricidade foi efetivamente utilizada pela primeira vez, criando uma fonte de
energia para operar motores, iluminar cidades e proporcionar comunicação
instantânea entre as pessoas”. Já a Terceira Revolução Industrial surgiu
imediatamente após a II Guerra Mundial e somente agora está começando a ter um
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impacto significativo no modo como a sociedade organiza sua atividade econômica
(RIFKIN, 1995, p. 63 e 64).
No entanto, outro autor americano, Daniel Bell, em seu livro “O advento da
Sociedade Pós-industrial”, garante que “a formulação original de conceito de
sociedade pós-industrial foi apresentada (por ele) durante um debate público sobre
tecnologia e mudança social, realizado em Boston, em 1962”. (1977, p. 11).
Segundo o mesmo, o conceito de sociedade pós-industrial é uma generalização
muito ampla. Visando ser mais facilmente compreendido, ele especifica cinco
dimensões ou componentes do termo:
Setor econômico: a mudança de uma economia de produção de bens para uma de serviços;
Distribuição ocupacional: a preeminência da classe profissional e técnica;
Princípio axial: a centralidade do conhecimento teórico como fonte de inovação e de formulação política para a sociedade;
Orientação futura: o controle da tecnologia e a distribuição tecnológica;
Tomada de decisões: a criação de uma nova “tecnologia intelectual”(1977, p. 27 e 28).
Na busca de uma definição de “sociedade pós-industrial”, encontramos no francês
Touraine (2002, p. 389) a seguinte consideração: “[...] eu defini a sociedade pós-
industrial como aquela onde a produção dos bens materiais cedia o lugar central à
produção de bens culturais e onde o conflito principal opunha a defesa do Sujeito à
Lógica do sistema de produção, de consumo e de comunicação”. Continua
Touraine: “Hoje eu defino a modernidade tanto pela subjetivação como pela
racionalização”.
Evoluindo para uma nova denominação de “sociedade pós-industrial”, novamente
Touraine (2002, p. 258) traz outra contribuição, chamando-a de “sociedade
programada” – expressão mais precisa que a de sociedade pós-industrial, que só é
definida por aquilo a que ela sucede – aquela em que a produção e a difusão maciça
dos bens culturais ocupam o lugar central que fora o dos bens materiais na
sociedade industrial. O lugar pontuado pela metalurgia, a indústria têxtil, a química,
assim como as indústrias elétricas e eletrônicas na sociedade industrial, segue a
produção e a difusão dos conhecimentos, dos cuidados médicos e das informações,
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portanto a educação, a saúde e os meios de comunicação na sociedade
programada.
Mas por que “sociedade programada”? Segundo Touraine (2002, p. 259), “porque o
poder de gestão consiste, nessa sociedade, em prever e modificar opiniões,
atitudes, comportamentos, em modelar a personalidade e a cultura, portanto em
entrar diretamente no mundo dos ‘valores’ em vez de se limitar ao campo da
utilidade”.
Considerando a proximidade histórica do período que começou a sacudir a chamada
“era industrial”, - segundo os diversos autores em estudo, - ficaremos com um fato
histórico que afetou o mundo tragicamente e que, sem dúvida alguma serviu de
alerta para o futuro da humanidade: a 2ª Guerra Mundial. Mais precisamente, a partir
do fim deste enfrentamento bélico.
Final da II Guerra Mundial: consequências
Mais uma vez o mundo foi sacudido por uma grande guerra. No período entre 1939
até a explosão da segunda bomba atômica sobre o Japão, no dia 06 de agosto de
1945, muitas vidas humanas foram sacrificadas, primeiro sob um condenável
pseudo-objetivo de purificação da raça ariana, associada a outros interesses de
regimes nacionalistas, depois para rechaçar tal iniciativa.
Tanto de um lado como do outro se formaram grandes eixos. Liderados pela
Alemanha, formou-se o eixo Berlim – Roma – Tóquio, enquanto que a reação iniciou
com a Inglaterra, que recebeu a ajuda indispensável dos Estados Unidos da América
e da Rússia, que ao final saíram-se vitoriosos.
O custo social e econômico da II Guerra Mundial foi elevadíssimo e, embora
razoavelmente quantificado, é bastante difícil qualificá-lo. Além da destruição
propriamente dita, foram gastos um trilhão e meio de dólares – ao valor de 1939 –
durante o conflito que envolveu diretamente 72 países e mobilizou 110 milhões de
soldados. Houve 55 milhões de mortos, 35 milhões de mutilados e 3 milhões de
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desaparecidos. A maioria das vítimas era constituída de civis. A nação com maior
número de vítimas foi a URSS, com 25 milhões, enquanto os EUA tiveram apenas
350 mil mortes3.
Como era de se esperar, os vencidos sofreram as consequências, através de
punição aos seus altos dirigentes, restrições econômicas, além de ficarem com uma
dívida enorme. Aos vencedores, especialmente os Estados Unidos e a Rússia,
secundados pela Inglaterra e França, coube a tarefa de financiar a reconstrução da
Europa e passarem à condição de guardiões da paz mundial, uma vez que com a
criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948, tais países passaram a
fazer parte do Conselho de Segurança da ONU, juntamente com o concurso da
China.
Grandes descobertas e invenções
Com o propósito de ilustração, menciona-se as principais invenções ou descobertas
do século XX4, adiantando que cabe um filtro no rol apresentado, sobretudo se
quisermos delimitar as grandes invenções e descobertas, para àquelas que
realmente trouxeram influência significativa para a humanidade.
Neste sentido, mesmo considerando todo o século XX e não apenas o período a
partir do qual, alguns autores passaram a denominá-lo de “pós-industrial”, - que para
este estudo foi convencionado como sendo após o término da II Guerra Mundial, -
entendo que merece destaque algumas descobertas e invenções. Começando por
aquelas que trouxeram contribuição para a preservação da vida humana, no campo
da saúde, temos o eletrocardiograma, a quimioterapia, a penicilina, o microscópio
eletrônico, a vacina contra a febre amarela, o fator Rh do sangue, a máquina de
diálise, James Watson e Francis Crick decifram a estrutura do DNA, a primeira
vacina eficiente contra a pólio, o primeiro transplante de rins, o coração e o marca-
passo artificial implantável, o primeiro transplante cardíaco bem-sucedido, o
3Dados extraídos do artigo “60 anos do fim da Segunda Guerra Mundial”, disponível em
http://educaterra.terra.com.br/vizentini/artigos/2005/05/18/000.htm> Acesso em 20Junho2006. 4O Anexo I do presente trabalho apresenta um rol exemplificativo, jamais taxativo, das invenções e
descobertas do Século XX, o qual foi extraído de : http://www.felipex.com.br/invenções01.htm.
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desenvolvimento da tomografia computadorizada, o aparelho de ultrassom, o
primeiro bebê de proveta, uma bactéria que produz insulina para diabéticos, dentre
outras; já no sentido inverso da vida, no campo da tecnologia voltada para a
destruição, podemos citar: o tanque de guerra e a primeira explosão de uma bomba
atômica.
Afastando-se destes dois campos opostos, verificam-se algumas invenções e
descobertas, que em campos diversificados, geraram grandes transformações, tais
como: a teoria da relatividade, a invenção do avião, - apesar de algumas opiniões
contrárias, - Henry Ford cria a primeira linha de montagem industrial, a divisão
artificial de um átomo, o primeiro vôo de um avião a jato, a criação do helicóptero, o
primeiro computador eletrônico, o transistor, a tecnologia de TV a cabo, a fibra ótica,
o primeiro satélite artificial, o Sputnik, a fotocópia, o primeiro circuito integrado, o raio
laser, o modem que liga o computador ao telefone, a chegada do homem à Lua, a
Internet, o computador pessoal (PC), o primeiro ônibus espacial a Microsoft lança o
Windows, sistema operacional que passa a ser adotado na maioria dos
computadores do mundo, dentre outras.
Um destaque especial para a descoberta da estrutura do DNA: Há 53 anos, no dia 7
de março de 1953, no laboratório Cavendish, na Inglaterra, Francis Crick e James
Watson concluíram que a molécula do DNA tem a estrutura de uma dupla hélice,
uma descoberta que daria novos rumos à ciência. A partir de então, a biologia
molecular tornou-se, de fato, uma ciência que hoje, com meio século de avanços,
traz à cena a transgênese, a genômica e a possibilidade da clonagem reprodutiva5.
Guerra fria e a divisão do mundo em dois grandes blocos
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, as potências Aliadas entregaram parte do
território alemão à Polônia e à URSS. O restante, que hoje corresponde à nova
Alemanha, foi dividido em quatro zonas de ocupação temporária (americana,
inglesa, francesa e soviética), o mesmo ocorrendo com Berlim, que ficava encravada
5Extraído da reportagem: A descoberta da estrutura do DNA.. Disponível em http://www.comciencia.br
, acesso em 15/05/06.
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no centro da zona soviética - que representava a sede do regime nazista, - foi
loteada em quatro partes, sendo que a maior, do lado oriental passou a ser
administrada pela URSS, enquanto que França, Inglaterra e Estados Unidos
passaram a administrar o lado ocidental.
Em 1949 as três zonas ocidentais fundiram-se, dando origem à República Federal
da Alemanha (RFA, capitalista, 60 milhões de habitantes), enquanto no leste era
criada a República Democrática Alemã (RDA ou DDR, socialista, 17 milhões de
habitantes). As tropas de ocupação aliadas permaneceram, sendo que Berlim
ocidental ficava encravada na RDA, com suas fronteiras abertas, bastando
atravessar a rua.
Muitas pessoas moravam na zona oriental de Berlim e trabalhavam na ocidental. O
governo socialista sempre desejou fechar a fronteira, sendo que em 1961 após uma
série de negociações entre Kennedy e Krushov que não lograram êxito, a RDA foi
autorizada a construir um muro, isolando a parte ocidental da cidade, que somente
teria acesso por três corredores rodos-ferroviários e aéreos com a RFA.
O muro - de 3,5 m de altura, por uma extensão de 145 km, - selou a divisão do
mundo em dois grandes blocos: o capitalismo e o comunismo. Tal obra de
engenharia deteve a sangria demográfica da RDA, cuja economia avançou
rapidamente nos anos 1960 e 1970, atingindo o padrão sócio-econômico mais alto
de todos os países socialistas.
Iniciava-se então uma fase denominada de “guerra-fria”, onde as duas potências
mundiais passaram a investir altas cifras em busca das melhores tecnologias,
especialmente aquelas voltadas para aumentar seus respectivos poderios bélicos.
No final da década de 1980, depois de tais potências terem protagonizado algumas
guerras contra outras nações, mas nunca entre ambas, tais como a Guerra do
Afeganistão com a participação da Rússia e a guerra do Vietnã, com a participação
desastrosa dos Estados Unidos da América, só para citar uma de cada, os líderes
da época, - Ronald Reegan, sucedido por George Bush de um lado e Mikhail
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Gorbachoev do outro, - iniciaram conversações com vistas a diminuir a corrida
armamentista.
O despertar para uma nova ordem mundial
A queda do Muro de Berlim e o fim da guerra fria
Até chegar-se no dia 09 de novembro de 1989, muitos fatores contribuíram para
viabilizar aquele ato simbólico, ou seja, o momento em que o mundo assistiu uma
das maiores e mais aguardadas manifestações de repúdio ao símbolo da separação
de um povo, por motivação ideológica: a queda do muro de Berlim.
Sem dúvida alguma, que independentemente das contribuições que as lideranças
que simbolizam os dois regimes da época: capitalismo e comunismo, mais
especificamente os dirigentes dos EUA e da URSS, não se pode olvidar da
fundamental participação do Papa João Paulo II, que muitos o intitulam como o
“Papa peregrino da paz”.
Sua origem polonesa facilitou os primeiros movimentos de apoio para que o
sindicato Solidariedade chegasse ao poder na Polônia. É claro que motivos de
ordem econômica também contribuíram, talvez de forma concomitante com a
participação de João Paulo II, para que fosse desencadeado um processo de
rompimento com o então regime que reinava na Europa Oriental e URSS.
Mas tudo começou com a queda do muro. Bastou a população de Berlim Oriental,
escutar uma notícia que dava conta da possibilidade de permissão gradativa de
passagem para o lado ocidental, para que milhares de “alemães orientais”
avançassem contra as cancelas localizadas no famoso portão de Brandemburgo. Os
guardas soviéticos, atônitos, não esboçaram reação e o início da queda do muro de
Berlim foi comemorado por grande parte do mundo livre ocidental.
Terminava assim a guerra fria e, vários analistas viram neste conjunto de
acontecimentos a vitória dos Estados Unidos da América, introduzindo a
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unipolaridade, com a queda das ditaduras, a abertura das economias e a
inauguração de uma nova era marcada pela paz, democracia e prosperidade, que o
Presidente George Bush denominou de “Nova Ordem Mundial”, durante o encontro
de Malta com Gorbatchov em dezembro de 19896.
Retrospectiva histórica – 1989 a 1999
Uma significativa parcela de estudiosos, considerada o período pós 1989 como o
marco de uma nova era. Uma nova ordem mundial passou a estabelecer-se.
Fazendo-se uma retrospectiva do período compreendido entre 1989 a 19997, alguns
acontecimentos merecem destaque, tanto pelo significado histórico como pelo efeito
gerado, onde uns tiveram abrangência regional, enquanto que outros ganharam
alcance e importância mundial.
Começa-se pelo final dos anos 80, mais especificamente o ano de 1989, quando de
início, o republicano George Bush assume a presidência dos Estados Unidos, Carlos
Menem é eleito presidente da Argentina, o Solidariedade vence eleições na Polônia,
formando o primeiro governo não comunista, a Hungria estabelece eleições livres e
reforma da Constituição, dentre outros, mas talvez o mais simbólico e ao mesmo
tempo significativo ato foi a derrubada do muro de Berlim, em novembro de 1989, já
mencionado anteriormente. Foi em última análise, o rompimento e o repúdio ao
modelo comunista. A partir deste ato, desencadeou-se uma série de outras
iniciativas que tinham por objetivo, além da mudança do regime, a opção por formas
democráticas de governo, banindo-se uma série de ditaduras até então existentes.
No Brasil, foi eleito presidente Fernando Collor, constituindo-se no primeiro
mandatário eleito democraticamente após o regime militar.
6 VIZENTINI, Paulo Fagundes. A nova ordem global. Relações internacionais do século XX.
Disponível em http://educaterra.terra.com.br/vizentini/livro/index.htm. Acesso em 22Maio2006. 7 O Anexo II do presente trabalho apresenta o destaque dos principais acontecimentos ocorridos no
período de 1989 até 1999, que para muitos se encaixa como o marco de uma nova ordem mundial, o qual foi adaptado do livro de VIZENTINI, Paulo Fagundes. Disponível em http://educaterra.terra.com.br/vizentini/livro/livro_05.htm. Acesso em 30Mai2006.
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Nos anos subseqüentes o mundo acompanhou atentamente uma série de fatos
importantes, os quais estão listados no Anexo II do presente trabalho, no entanto
cabe referenciar alguns, pela sua importância histórica.
Em 1990, houve a reunificação da Alemanha e teve início a Guerra do Golfo; em
1991, houve a criação oficial do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) e a Criação
da Comunidade de Estados Independentes com 12 ex-Repúblicas Soviéticas, pondo
fim a URSS; em 1992, o Acordo de Maastricht transforma a CE em União Européia
(UE) e o democrata Bill Clinton é eleito presidente dos Estados Unidos; em 1993, foi
criada a Organização Mundial de Comércio (OMC); em 1994, Entrada em vigor do
Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), eleição de Nelson
Mandela na África do Sul e de Fernando Henrique no Brasil; em 1995, eleição de
Jacques Chirac na França e assinatura do Acordo de Cooperação Inter-regional UE-
MERCOSUL; em 1996, Boris Ieltsin é reeleito presidente da Rússia e os Talibãs
afegãos conquistam Kabul e implantam regime fundamentalista; em 1997, eleição do
trabalhista Blair põe fim à era conservadora na Grã-Bretanha e países latino-
americanos rejeitam criação da ALCA tal como proposta pelos EUA; em 1998, o
Papa João Paulo II, em sua cruzada pela resolução dos problemas da humanidade,
visita Cuba e condena o bloqueio imposto pelos EUA e em 1999, ocorreu a entrada
em vigor da moeda única europeia, o Euro, enquanto que no Brasil houve crise
financeira e maxidesvalorização do Real.
Verifica-se também neste período, que países que até então suportavam uma
coexistência de diversos interesses em nome de um suposto ideal, optaram pela
volta ao antigo status quo, como por exemplo o que ocorreu com a URSS e com a
Iugoslávia, sendo que a última dividiu-se em diversas nações, - não sem passar por
período de intensa beligerância – onde recentemente, uma dessas nações que
ainda mantinha a união de povos diferentes, Sérvia e Montenegro, o lado
montenegrino decidiu tornar-se independente, gerando uma situação ao menos
inusitada, pois em plena Copa do Mundo de Futebol, têm-se uma equipe
representando dois países.
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Os grandes blocos econômicos
A partir da segunda metade do século XX, surgiram novas modalidades de
parcerias, especialmente no campo econômico, as quais logo foram denominadas
de “blocos econômicos”.
A título ilustrativo, reproduz-se o Mapa-múndi8 com a abrangência dos blocos:
O Ministério da Fazenda apresenta em seu site, importantes informações sobre os
Blocos Econômicos da atualidade, o que possibilita uma melhor compreensão da
divisão do mundo com base nos interesses regionais.9
8 Mapa disponível em http://www.esaf.fazenda.gov.br/parcerias/ue/cedoc-ue/bloco-economico.html.
9 ALADI (Associação Latino-Americana de Integração) Criada em 12 de agosto de 1980 pelo Tratado
de Montevidéu. São Países-Membros da ALADI: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) Uma idéia lançada pelos Estados Unidos, surge em 1994, durante a realização da Cúpula das Américas. ANZCERTA - Criado em 1983, tornou-se o principal instrumento de administração das relações econômicas entre Austrália e Nova Zelândia. APEC - Organismo intergovernamental para consulta e cooperação econômica, na verdade constitui-se em um bloco econômico para promover a abertura de mercados entre vinte países, com Hong Kong representando a China. São Países-Membros da APEC: Austrália, Brunei, Darussalam, Canadá, Indonésia, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Filipinas, Cingapura, Coréia do Sul, Tailândia e Estados Unidos da América, desde 1989; China, Hong Kong (China), Taiwan, desde 1991; México, Papua Nova Guiné, desde 1993; Chile, a partir de 1994; e Peru, Rússia e Vietnã, a partir 1998. ASEAN - Surgiu em 1967, liderada pela Tailândia, com o objetivo de assegurar a estabilidade política e de acelerar o processo de desenvolvimento da região. São Países-Membros da ASEAN: Indonésia, Malásia, Filipinas, Cingapura e Tailândia, desde 1967; Brunei, a partir de 1984; Vietnã desde 1985; Mianmar e Laos a partir de 1997 e Camboja desde 1999. CARICOM - É um bloco de cooperação econômica e política, criado em 1973, formado por quatorze países e quatro territórios da região caribenha. São Países-Membros do CARICOM: Antigüa e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Haiti, Jamaica, Montserrat, Santa Lúcia, São Cristóvão e Neves, São Vicente e Granadinas, Suriname e Trinidad e Tobago.
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Cabe ressaltar que a velocidade com que as mudanças acontecem na atualidade
afeta até mesmo as informações contidas num singelo trabalho que ora está sendo
desenvolvido, pois com relação aos Blocos Econômicos, pelo menos duas
informações devem ser acrescentadas aos dados acima elencados. A primeira se
refere ao Mercosul, uma vez que desde o dia 24 de maio de 2006, a Venezuela
passou a fazer parte deste bloco, como o mais novo Estado-Membro. Já a segunda
se refere ao recente desfazimento de uma novel união, pois a Sérvia e Montenegro,
que se tornaram independente ao desmembrarem-se da antiga Iugoslávia no início
dos anos noventa, resolveram, por iniciativa dos montenegrinos, mais uma vez
separarem-se, aumentando assim mais um país que passará a fazer parte da União
Européia e da nova geografia mundial.
CEI – No dia 08 de dezembro de 91, os presidentes das repúblicas da Rússia, Ucrânia e Bielo-Rússia, reunidos na cidade de Brest, criaram a Comunidade de Estados Independentes (CEI), decretando o fim da União Soviética. Na seqüência, no dia 21 de dezembro, os líderes de 11 das 15 repúblicas soviéticas reuniram-se em Alma-Ata, capital do Cazaquistão, para referendar a decisão da Rússia, Ucrânia e Bielo-Rússia e oficializar a criação da Comunidade de Estados Independentes e o fim da União Soviética. COMUNIDADE ANDINA (CAN) é uma organização sub-regional com personalidade jurídica internacional composta por: Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. EFTA - Foi constituída pela Convenção de Estocolmo, assinada em 04 de janeiro de 1960, tendo como primeiros parceiros Áustria, Dinamarca, Noruega, Portugal, Suécia, Suíça e Reino Unido (Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte). MCCA Surgiu em 1960 na tentativa de promover a paz na região, afetada por graves conflitos bélicos. Em 4 de junho de 1961 foi assinado o Tratado de Integração Centro-Americana com o objetivo de criar um mercado comum nessa região. São Países-Membros do MCCA: Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua. MERCOSUL O Tratado de Assunção (26/03/1991) e o Protocolo de Ouro Preto (17/12/1994) criaram o Mercado Comum do Sul ou MERCOSUL, uma organização internacional formada por quatro países membros, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai e dois Associados, Bolívia (Tratado assinado em 28/02/1997) e Chile (Tratado assinado em 25/06/1996), na região denominada Cone Sul do Continente Americano. NAFTA - Constitui-se em um instrumento de integração das economias dos EUA, do Canadá e do México. O NAFTA (North America Free Trade Agreement) foi iniciado em 1988. SADC - Foi criada em 1992, para incentivar as relações comerciais entre seus 14 países membros. São Países-Membros da SADC: África do Sul, Angola, Botsuana, Lesoto, Malavi, Maurício, Moçambique, Namíbia, República Democrática do Congo, Seicheles, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue. UNIÃO EUROPÉIA A União Européia representa o estágio mais avançado do processo de formação de blocos econômicos no contexto da globalização. Originada da Comunidade Econômica Européia (CEE), fundada em 1957, pelo Tratado de Roma, a União Européia (UE) é o segundo maior bloco econômico do mundo em termos de PIB: 8 trilhões de dólares. Formado por 15 países da Europa Ocidental, sua população é estimada em 374 milhões de habitantes. No momento, cuida-se da incorporação de mais 11 países do Leste Europeu à União Européia. (Disponível em http://www.esaf.fazenda.gov.br/parcerias/ue/cedoc-ue/bloco-economico.html. Acesso em 15Maio2006.)
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Principais características da sociedade pós-industrial10
A Globalização
O italiano De Masi11 oferece um rol de palavras-chaves para caracterizar a
sociedade pós-industrial. Começa pela globalização. Para ele, o efeito da
globalização, assemelha-se ao resultado do impacto de uma pedra num lago,
quando se obtém uma série de ondas concêntricas que se propagam, de forma
contínua, por toda a superfície aquática. Graças ao progresso tecnológico, o nosso
planeta tornou-se hoje como um pequeno lago, onde cada onda atinge e envolve
rapidamente até os cantos mais remotos (DE MASI, 2000, p. 140).
A miniaturização dos componentes e a melhora dos transportes incrementam uma
troca permanente, pela qual cada objeto, contém partes que provêm de vários
continentes. Como exemplo pode-se mencionar que um carro da Fiat contém pelo
menos 12 mil peças, das quais só duas mil são produzidas pela Fiat. Outras duas
mil são compradas na Itália e as oito mil peças restantes são compradas em outros
países da Europa e fora dela. (DE MASI, 2000, p. 141).
Mas globalização não é um fenômeno recente. Nessa linha de ideias, Arion Sayão
Romita apresenta as seguintes considerações:
A primeira globalização foi a do Império Romano, que findou a feudalização política e comercial. A segunda globalização coincide com as grandes descobertas dos séculos XIV e XV, que propiciaram grande surto do comércio internacional, freqüentemente interrompido pelas guerras religiosas e pelas lutas dinásticas das monarquias européias. A terceira globalização aparece no século XIX, após as guerras napoleônicas e determina a supremacia do liberalismo sobre o mercantilismo, quando coincidentemente começa a prosperar a democracia política. A quarta globalização, na qual nos encontramos atualmente, surge depois da Segunda Guerra Mundial, mas só atinge o apogeu com o colapso do regime socialista, ocorrido em 1989/1991”. (apud CHIARELLI, 2004, p. 75 e 76)
10
Conforme sugestão oferecida por DE MASI, Domenico. O ócio criativo. Tradução de Lea Manzi. 4. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2000, p. 140-169. 11
Os parágrafos seguintes, que tratam das características da sociedade pós-industrial, decorrem de sugestão extraída do estudo da obra: DE MASI, Domenico. O ócio criativo. Tradução de Lea Manzi. 4. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
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Já Voltaire Shilling (2003), divide os períodos de globalização em três, conforme
quadro abaixo, no entanto, deixa de considerar a expansão do Império Romano,
como mencionado anteriormente.
Períodos da Globalização
Data Período Caracterização
1450-1850 Primeira fase Expansionismo mercantilista
1850-1950 Segunda fase Industrial-imperialista-colonialista
Pós-1989 Globalização recente Cibernética-tecnológica-associativa
No entanto, o processo de globalização atual, não abrange todo o mundo. Chiarelli
(2004, p. 90 e 91) sintetiza o seu pensamento sobre o que chama de “repartição
geo-econômica desigual, de inquietantes e inequívocas conseqüências sócio-
políticas no mapa-múndi” da seguinte forma:
a) Países que já são ricos e, com aceleração continuada do processo de globalização, o serão muito mais, como os Estados Unidos, o Canadá, o Japão, e, especialmente, a elite econômico-tecnológica da União Européia. E são poucos; b) Países (ou, quem sabe, sociedades) que não são ricas mas aspiram sê-lo, seguindo os padrões – com suas limitações – e tratando de ajustar-se à modelagem que a Globalização e o Primeiro mundo propõem (mesmo com focos internos de reação, desajustes e exacerbadas críticas de mutável incidência: ora mais fortes, ora mais débeis), como o Brasil, a Índia, a nova Rússia, os “tigres” asiáticos (particularmente, Coréia do Sul, Malásia etc.). E são alguns;
c) Países (ou sociedades), tidos na linguagem de seus críticos como radicais (xiitas, bárbaros ou primitivos), e qualificados como anacrônicos, no enfoque da civilização judaico-cristã-ocidental; não privilegiam meros ou valiosos avanços tecnológicos e ou aberturas externas de relacionamento (processos de intercâmbio e ou integração), não admitindo mudanças no seu status quo cultural, religioso, político, ideológico e mesmo econômico, como o Afeganistão dos talibãs, Sudão, Mianmar, Irã e, em certos aspectos, Iraque, Líbia, Coréia do Norte etc. E são raros; d) Países (ou sociedades) que, dado a sua mui desfavorável colocação no ranking da informação, dramático pauperismo, absoluto atraso tecnológico, total inabilitação técnica, primitivismo comportamental da sociedade – ainda o oscilando entre o clã e a tribo – vivem tempos remotos, num estágio de ruralização primeva: são coletividades incapazes de se quer querer, porque desconhecem. A ignorância coletiva não lhes enseja a perspectiva de ambicionar. Em síntese, não querem, porque não sabem. E são muitos. Infelizmente, a maioria;
e) País (ou sociedade) em mutação acelerada, representando 20% da população mundial. Emergiu de milenares transformações históricas, esparramando-se por interminável território. Vindo de revolução sangrenta, criou estratificada estrutura sóciopolítico-econômica, fechada e estatizante,
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passando, agora, por mudança, que altera, acelerando, sua genética econômica (com reflexos mundiais) e lentíssimo – quase imperceptível – câmbio político, deixando, em todos, sérias interrogações sobre os futuros eixos universais do poder. Fala-se da China E é única.
Neste contexto, o nosso Brasil encontra-se no que poderia se chamar de Segundo
Escalão, pois apesar das gritantes diferenças sociais e econômicas verificadas nas
diferentes regiões do país, temos um enorme potencial, principalmente em recursos
naturais, expansão agrícola, além de possuirmos um amplo mercado interno, o que
leva a crer numa possível inserção entre os países mais desenvolvidos, ao menos
numa expectativa de longo prazo.
O tempo livre
O tempo sem trabalho ocupa um espaço cada vez mais central na vida humana. É
preciso, então, reprojetar a família, a escola, a vida, em função não só do trabalho,
mas também do tempo livre, de modo que ele não degenere em dissipação e
agressividade, mas se resolva em convivência pacífica e ócio criativo (DE MASI,
2003, p. 25).
Intelectualização
Cada vez mais difundida está a consciência de que as atividades cerebrais
predominam em relação às manuais. Por isso investe-se na formação dos filhos, no
estudo de várias línguas, em viagens ao exterior, por exemplo (p. 149). Entre as
atividades intelectuais a mais apreciada é a criatividade, que é um outro elemento
distintivo, um outro valor central da sociedade pós-industrial. (p. 149)
Criatividade e Estética
No entender de De Masi (p. 280), “à medida em que as empresas crescem tendem a
se burocratizar”, sendo assim “a luta entre criativos e burocráticos se tornará mais
acirrada”. Tal conflito também acontecerá no interior de cada um de nós, pois no
plano psicológico, existe a parte criativa e burocrática.
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De um lado, os burocratas têm medo da inovação, do outro, os criativos têm medo
do imobilismo, sugerindo que tais posições sejam inconciliáveis. Mas no final,
“vencerão os criativos, porque a sociedade pós-industrial se alimenta de invenções,
não tem outra saída, premia a iniciativa e joga fora do mercado o imobilismo”(p.
280).
No que se refere à estética, segundo De Masi (2000), ela será o diferencial para a
escolha dos objetos, pois estes se apresentam tecnologicamente mais avançados,
mais potentes, mais rápidos e mais precisos do que é o necessário para o usuário
comum. Da mesma forma os serviços serão escolhidos de acordo com o
refinamento e a cortesia que oferecem.
Sendo assim, “quem se dedicar a profissões ligadas à estética (design, arte,
cenografia, moda, arquitetura de exteriores e de interiores, computação gráfica, etc)
talvez será mais apreciado e gratificado do que quem se dedicar a atividades ligadas
à política, à administração ou à ciência”(p. 283).
Subjetividade
Ao contrário da sociedade industrial, que fundou seu sistema em grandes
organizações coletivas: fábrica, partidos, sindicatos e instituições, a sociedade pós-
industrial reivindica, decisivamente, o papel fundamental do sujeito e leva ao fim dos
modismos, a uma desmassificação. Desta forma, a motivação individual e o
consenso das massas se tornará bem mais útil do que o controle tanto de uns como
dos outros (p. 283).
A possibilidade de escolher entre produtos infinitamente variados alimenta o desejo,
que é muito humano, de se sentir diferente dos outros, em vez de igual. Na
sociedade industrial usavam-se sapatos de uma determinada marca para se sentir
iguais aos colegas, enquanto que na sociedade pós-industrial, usa-se tamancos
justamente para se diferenciar (DE MASI, 2000).
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Emotividade
A sociedade industrial fundava-se na razão, enquanto que a sociedade pós-industrial
aparecem dois valores emergentes que são a emotividade e a feminilidade. Hoje o
racional está conquistado e então se pode voltar a valorizar também a esfera
emotiva. Emoção, fantasia, racionalidade e concretude são os ingredientes da
criatividade. Para ser criativo é essencial o cruzamento entre racionalidade e
emotividade (feminilidade). O resultado é uma sociedade de tipo andrógino. (p. 152)
Androginia
No entender de De Masi, os homens continuam exercendo a grande maioria dos
papéis dirigentes. Os homens em seu espaço “reservado” ficam de manhã à noite
inclusive em horas extras, mesmo sem que essas sejam necessárias e sem que
sejam remuneradas por elas, para não terem que voltar para casa e se rebaixarem
fazendo serviços domésticos ou cuidar dos filhos. É o que o feminismo chamou de
“separatismo machista”: seja no estádio ou no trabalho, os homens se concebem
como uma comunidade “pura e superior”.
Fazendo um paralelo com a antiguidade e o momento atual, De Masi (p. 154) afirma
que “na Atenas de Péricles, o separatismo elitista dos homens desembocava
frequentemente em relações homossexuais”. Hoje isto continua acontecendo, mas
uma outra forma de homossexualismo, existe uma preferência, generalizada entre
os executivos, de trabalhar só com homens.
O autor ainda diz que as mulheres são cúmplices desta segregação homossexual e
cita uma frase de uma estudiosa americana para justificar sua posição: “O machismo
é como a hemofilia: quem padece da doença são os homens, mas quem transmite
são as mulheres”(p. 155).
O sonho de uma sociedade andrógina não marcada por papéis hierárquicos e
rígidos para homens e mulheres, já está se realizando segundo o autor, citando ao
menos dois motivos: o primeiro é que a mulher pode ter filho sem ter um marido,
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enquanto que o contrário ainda não ocorre; o segundo, é que as tarefas cansativas e
repetitivas, hoje, são feitas por máquinas, e aos humanos ficam as atividades
flexíveis, intuitivas e estéticas. Atividades estas para as quais as mulheres são mais
bem preparadas pois os homens foram educados para agirem de forma racional,
rígida e programada (p. 156).
Ressalta o autor que num primeiro momento a androginia pode ser confundida com
a homossexualidade, mas não é disso que se trata. De Masi, utiliza deste termo para
classificar a sociedade atual, mas no sentido de dizer que os homens estão
começando a adotar muitas características femininas, como cuidar do corpo,
demonstrar maior ternura, usar alegremente cores vistosas no modo de vestir, cuidar
mais da casa, por exemplo, enquanto que a mulher, por sua vez, começa a adquirir
desenvoltura na vida pública, consciência de que têm direito ao acesso às poltronas
do poder e à justa pretensão de que também os homens participem no cuidado dos
filhos. (p. 157)
A desestruturação do tempo e do espaço
Na sociedade industrial, o tempo era uma mania, uma neurose. O espaço também
em grande parte obrigatório. Todas as ações do homem, até mesmo os
pensamentos, possuíam tempos e lugares específicos: o amor, de noite em casa; o
trabalho, de manhã no escritório; as compras, num determinado bairro; a diversão,
noutro e assim por diante. Com o avanço tecnológico, por exemplo, com o advento
do fax, do celular, correio eletrônico, Internet, a secretária eletrônica, “nós podemos
fazer tudo em todo e qualquer lugar”. (p. 159)
Qualidade de Vida
Trata-se de outro valor fundamental na sociedade pós-industrial, a qual era tratada
como uma espécie de ‘pecado’. À visão do mundo do sacrifício contrapõe-se a do
bem-viver, até porque, segundo Luciano De Crescenço ‘se vive uma vez só’, sendo
assim todos querem viver mais e melhor. (p. 160)
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Nomadismo
Por um lado a tecnologia permite que se trabalhe de roupão, usando telefone, faz e
correio eletrônico, por outro as exigências de estudos especializados, de trabalho,
de cultura e de lazer impõem cada vez mais frequentemente a mudança de cidade,
de país, de um continente a outro.
A sociedade pós-industrial é fundada no deslocamento e na reunião de pessoas,
mercadorias e informações provenientes dos lugares mais disparatados. “Até no
frango que comemos há mais informática do que carne”. (p. 166) Portanto,
“superada a secular vida sedentária dos nossos antepassados, só nos resta
aproveitar e dar sentido ao nosso destino de nômades pós-industriais, que à viagem
física soubemos ainda acrescentar a viagem virtual na Internet”. (p. 168)
Criatividade
Mas o que é a criatividade? Segundo De Masi (2000, p. 300), “consiste em um
processo mental e prático, ainda bastante misterioso, graças ao qual uma só pessoa
ou um grupo, depois de ter pensado algumas ideias novas e fantasiosas, consegue
também realizá-las concretamente”. Para este autor, não basta ter idéias, mas
saber realizá-las: é unir fantasia e concretude. É possível aprender-se a ser
criativo? Na visão do autor, isto poderá ocorrer da seguinte forma:
Educar um jovem para a criatividade significa ajudá-lo a identificar sua vocação autêntica, ensiná-lo a escolher os parceiros adequados, a encontrar ou criar um contexto mais propício à criatividade, a descobrir formas de explorar os vários aspectos do problema que o preocupa, de fazer com que sua mente fique relaxada e de como estimulá-la até que ela dê à luz uma idéia justa. (p. 304)
Sobretudo, continua o autor, significa educá-lo para não temer o fluir incessante das
inovações: “É na mudança que as coisas repousam” (HERÁCLITO, apud DE MASI,
2000, p. 304)
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O Trabalho na sociedade pós-industrial
O trabalho, que já teve um viés de sacrifício, quando era uma espécie de sentença
condenatória em razão do trabalho escravo, paulatinamente foi ganhando maior
importância, sendo considerado pelos liberais como elemento na disputa mercantil,
ao passo que para a teoria marxista era o elemento indispensável para a revolução
(CHIARELLI, 2006). Evoluindo-se até a sociedade industrial, o sentido do trabalho,
na visão de De Masi (2000, p. 51), pode ser colocado nos seguintes termos:
Para os católicos, o trabalho é uma sentença condenatória, como reafirmará a Rerum Novarum, em 1891. Para os liberais, é uma disputa mercantil. Para Marx, é a única possibilidade de redenção junto com a revolução, e por isso é um direito a ser conquistado. Somente Taylor, no plano prático, e Lafargue, no plano teórico, consideram o trabalho um mal que deve ser reduzido ao mínimo, ou evitado.
Já para Marx (1975, p. 150), o trabalho tem um significado maior na vida humana,
que não se limita a ser meio de prover a subsistência. O trabalho é ação objetiva que
transforma o mundo, como possibilidade de hominização.
[...] Quando o trabalhador chega ao mercado para vender sua força de trabalho, é imensa a distância histórica que medeia entre sua condição e a do homem primitivo com sua forma ainda instintiva de trabalho. Pressupomos o trabalho sob forma exclusivamente humana. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador.
Sobre o trabalho na sociedade pós-industrial, De Masi (2000) utiliza a teoria de
Zsuzsa Hegedus sobre a distribuição internacional do trabalho. Segundo esta teoria,
o ciclo econômico teria quatro fases: a ideação, onde os grandes laboratórios fariam
pesquisa; a decisão, onde se determinaria em quais invenções investir; a produção
propriamente dita; e o consumo, compreendendo a distribuição e o uso.
De Masi (2000, p. 126) salienta a diferença na fase de produção "que era a mais
importante na fase industrial e que agora vem sendo, progressivamente, deslocada
para o terceiro mundo". E o consumo, segundo o autor, passaria pela colonização do
mercado.
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Prosseguindo na exploração do pensamento de De Masi (1999), verifica-se que
enquanto na sociedade industrial, os recursos principais são os meios de produção,
matérias-primas, patentes e produtividade, na sociedade pós-industrial tais recursos
são a inteligência, o conhecimento, a criatividade, as informações, os laboratórios
científicos e culturais. No tocante à estrutura funcional, na primeira estariam os
operários, os engenheiros, os empresários, os funcionários de escritório, enquanto
que na segunda estariam os profissionais liberais, os técnicos, os cientistas, a
indústria do lazer e a tecno-estrutura. Já no que se refere aos atores sociais
centrais, na sociedade industrial seriam os empresários, os trabalhadores e os
sindicatos, sendo que na sociedade pós-industrial estariam os tecnos, as mulheres,
os cientistas, os administradores da informação e os intelectuais.
A ideia de trabalho na sociedade pós-industrial não é a mesma da industrial. Cresce
a preocupação e busca da realização pessoal no trabalho, de saúde, do equilíbrio
entre tempo dedicado ao trabalho e à família e uma valorização das relações sociais
entendendo que o tempo livre também é produtivo, porque nele se pode criar. Os
valores emergentes se reportam à intelectualização da atividade humana pela
evolução tecnológica, confiança e ética devido ao crescimento do setor de serviços
que requerem precisão, qualidade e confiabilidade e atendimento diferenciado.
Para Gifford e Elizabeth Pinchot (1994), o trabalho está sofrendo e sofrerá
mudanças significativas, que ilustrativamente são colocadas no quadro abaixo:
As Mudanças no Trabalho:
Atual Futuro
De trabalho com conhecimentos técnicos. Tarefas repetitivas e sem sentido.
Para a inovação e assistência.
De trabalho individual e baseado na função.
Para trabalho em equipes e baseado em projetos.
De qualificação única. Para multiqualificação. Do poder dos chefes e da coordenação de cima para baixo.
Para o poder dos clientes e a coordenação entre os colegas.
Fonte: adaptado de PINCHOT, Gifford; PINCHOT, Elizabeth. O Poder das pessoas: como utilizar o poder de todos dentro da empresa para conquista de mercado. Rio de Janeiro: Campus, 1994.
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Estas mudanças no trabalho, em princípio, criarão uma zona de desconforto, como
toda mudança. Passarão a exigir das pessoas mudanças em seus perfis
profissionais, como maior grau de escolaridade e desenvolvimento de novas
habilidades, podendo vir a contribuir para a qualidade de vida no trabalho, uma vez
que pessoas com maior grau de escolaridade, em tese, são mais exigentes com
relação a este assunto.
No que se refere à organização do trabalho, em princípio, primava pela busca da
eficiência, pelo lucro e custos baixos, sem considerar prioritariamente as
necessidades físicas ou até mesmo psicológicas do homem. O modelo de
produtividade do começo do século e que perdura de certa forma até hoje, privilegia
o capital em desfavor dos seres humanos.
Algumas organizações, no entanto, conseguiram romper com este modelo,
invertendo a situação e adaptando as máquinas e processos de trabalho ao homem.
A preocupação com as condições de trabalho como ruído, iluminação, condições
sanitárias e embelezamento do espaço da fábrica, cresceu fazendo com que o poder
público fiscalizasse as indústrias.
As linhas de montagem tornaram os ciclos de trabalho muito curto, e faziam com
que o operário repetisse várias vezes às mesmas tarefas. É claro, que a exaustiva
repetição causou alguns transtornos como a fadiga, monotonia, lesões por esforços
repetitivos e estresse, dentre outros.
Com relação ao emprego na sociedade pós-industrial, cabe parafrasear Rifkin
(1995), ao mesmo tempo concordando com a idéia, de que o emprego de execução
diminui em progressão geométrica, enquanto que a criação cresce em progressão
aritmética.
Pode-se afirmar que a moeda do futuro será o conhecimento, quando a criatividade
e o exercício de atividade mental será muito mais utilizado do que o repetitivo e
exaustivo trabalho braçal, cuja tendência é cada vez maior em ser desempenhado
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por máquinas. Acredito que essa tendência dá sentido a uma famosa frase de Albert
Einstein: "a imaginação é mais importante que o conhecimento".
Perspectivas das Organizações
No que se refere à atividade comercial, chega-se ao momento em que o cliente é o
objetivo mais importante a ser alcançado. Este cliente ou consumidor estará cada
vez mais diante de um número infinito de opções, sendo que o diferencial será o
atendimento que lhe será oferecido. Daí o que se vê na atualidade, onde as grandes
empresas investem largamente em treinamento de vendas e pós-vendas, visando
preparar seus integrantes para cativar o cliente.
Nesta linha de raciocínio constata-se que a clássica estrutura piramidal das
empresas, que se assemelhava à estrutura militar, tende a ser invertida.12 Temos no
topo o dono da empresa ou o presidente, na parte intermediária os gerentes, sendo
que os empregados formam a base. Os empregados olham mais para cima do que
para o cliente, pois estão mais preocupados em cumprir as ordens superiores do
que agradar aquele, que na comparação com a estrutura militar está colocado junto
com o inimigo (fig. 1).
A tendência atual indica que o empregado é, em última análise, o cartão de visitas
da empresa, levando-se em conta que é ele quem se depara com o cliente, – cada
vez mais exigente – com vistas a vender o produto, garantindo que suas verdadeiras
necessidades estejam sendo satisfeitas. O supervisor da linha de frente, por sua
vez, terá que ver os empregados como clientes e se dedicar a identificar e preencher
suas necessidades. E assim por diante, pela pirâmide abaixo. Isso iria requerer que
cada gerente adotasse uma nova atitude, um novo paradigma, reconhecendo que o
papel do líder não é impor regras e dar ordens à camada seguinte. Em vez disso, o
papel do líder é servir. (fig. 2)
12
Ideia extraída de HUNTER, James C. O Monge e o Executivo. Trad. De Maria da Conceição Fornos de Magalhães. 17. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004, p. 47-50.
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Antigo Paradigma Novo Paradigma
Cliente
Cliente Inimigo Fig. 1 Fig. 2 ________________________________________________________________________ Fonte: HUNTER, James C. O Monge e o Executivo. Trad. De Maria da Conceição Fornos de Magalhães. 17. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.
Recorrendo-se mais uma vez a De Masi (2000, p. 304), temos que “na empresa pós-
industrial, onde a maioria é composta de trabalhadores intelectuais, a ênfase se
desloca do processo executivo ao ideativo, da substância à forma, do duradouro ao
efêmero, da prática à estética. Ou seja, da aproximação, do pré-científico ao pós-
científico”.
Seguindo nesta linha, ele explica melhor: “significa substituição de uma cultura
(moderna) do sacrifício e da especialização, cuja finalidade era o consumismo, por
uma outra (pós-moderna) do bem-estar e da interdisciplinaridade, cuja finalidade é o
crescimento da subjetividade, da afetividade e da qualidade de trabalho e de vida”.
(DE MASI, 2000, p. 305)
Enfim, a empresa deste período pós-industrial deverá estar preparada para
concepções mais flexíveis, ao invés da rigidez, onde a criatividade substitua a pura e
simples execução, sob pena de sucumbir. (DE MASI, 2000)
Empregados (Associados)
Supervisores
Gerentes Intermediários
Vice-presidente
Presidente
Presidente General
Vice-presidente Coronéis
Gerentes Intermediários Capitães e Tenentes
Supervisores Sargentos
Empregados (Associados) Soldados (tropas)
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E o tempo do ócio?
A obra13 de Domenico De Masi, sugere a possibilidade de uma sociedade vivendo
sob a égide do ócio. Apesar da qualidade do autor e de seu profundo senso de
previsão futurística, cabe ressalvar os excessos de generalidade, e até mesmo
alguns exemplos inapropriados para alguns ambientes, em que o ócio seria
adequado, como por exemplo, o Carnaval brasileiro.
Se considerarmos apenas determinadas pessoas, que em razão da atividade que
executam, tais como, compositores, escritores, pintores e outros ramos ligados à
arte, bem como atividades que requeiram uma significativa parcela de criatividade
para a concretização de seus trabalhos, como àquelas que o próprio De Masi (2000,
p.283) sugere, como por exemplo, design, arte, cenografia, moda, arquitetura de
exteriores e de interiores e computação gráfica, aí sim poder-se-ia falar de um
“tempo de ócio”. Isso é claro, se a referência for com relação ao ócio criativo, pois do
contrário, teríamos apenas o ócio, ou seja, o descanso, a folga, o lazer, dentre
outros sinônimos, e neste caso, o resultado poderia ser danoso, se exagerado,
senão vejamos o pensamento de Leonardo da Vinci14: “O ferro enferruja pela falta de
uso, a água estagnada perde a sua pureza e no frio fica congelada – do mesmo
modo, a ociosidade exaure a vitalidade da mente”.
Mas qual seria então o destino desta sociedade pós-industrial? No meu entender,
apesar da velocidade com que as transformações vêm ocorrendo, o mundo ainda
está longe de ser atingido por completo, por esta nova fase do avanço tecnológico.
Concordo inteiramente com o professor Chiarelli (2004), quando se refere aos
mundo do mundo, pois enquanto alguns países do chamado “primeiro mundo” já
estão experimentando o período pós-industrial, ou pelo menos possuem “manchas
virtuosas [...] com algumas características desta nova fase”, outros ainda nem
conheceram a fase industrial.
13
DE MASI, Domênico. O ócio criativo. Tradução de Lea Manzi. 4. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. 14
Encontrado em: COVEY, Stephen R. Princípios essenciais das pessoas altamente eficazes. Trad. Iva Sofia Gonçalves Lima. Rio de Janeiro: Sextante, 2004, p. 114.
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De qualquer maneira, o trabalho terá que receber maior atenção, tanto por parte do
empregado como do empregador. O primeiro deverá demonstrar maior
comprometimento para com a empresa, visualizando ela como uma espécie de time,
onde a participação individual deverá estar voltada para atingir os objetivos
estabelecidos. De outra banda, deverá igualmente o empregador, incentivar o
empregado, através do reconhecimento, do estímulo à co-gestão, de uma justa
participação nos lucros e, acima de tudo, facilitando para que seja criado melhores
condições no ambiente do trabalho.
Mesmo aqui no nosso Brasil, - que ainda está longe de ser classificado
genericamente como um país industrial, - verificam-se algumas ilhas de
prosperidade, onde já afloram algumas características desta fase da humanidade.
Algumas empresas, já estão investindo significativas quantias com o fito de propiciar
encontros de funcionários, acompanhados de seus respectivos familiares, para
aproximar um pouco mais a família do trabalho e o resultado apresenta-se muito
animador.
Enfim com um novo enfoque nas relações laborais, acredito que será possível criar
melhores condições para que as pessoas, de uma maneira geral, possam aumentar
a auto-estima, buscar maior realização pessoal no trabalho, valorizar as relações
sociais e, sobretudo, distribuir melhor o tempo, inclusive o destinado ao trabalho,
pois o tempo livre também pode se constituir num grande aliado, se utilizado
igualmente de forma livre e descompromissado com resultados imediatos em que o
lucro esteja no primeiro plano.
Conclusão
A guisa de oferecer algumas considerações para a conclusão deste trabalho
associa-se mais uma vez ao pensamento do autor italiano De Masi (2003), para
dizer que dos dois grandes modelos que se defrontaram no século XX, o comunismo
demonstrou saber distribuir a riqueza, mas não saber produzi-la; o capitalismo
demonstrou saber produzi-la mas não saber distribuí-la – nem distribuir
eqüitativamente o trabalho, o poder e o saber. Neste sentido, recolhe-se uma frase
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emblemática, proferida pelo então Presidente da Tchecoslováquia: o comunismo
perdeu, mas o capitalismo não venceu15.
O atual processo de globalização, que a nosso ver afeta muito mais a economia de
mercado do que qualquer outro aspecto, acelera a mudança de paradigmas,
fazendo com que os investimentos sejam apenas virtuais, onde cifras vultuosas são
negociadas, sem no entanto aparecer dinheiro algum. Vale dizer também, que se
trata de um processo inevitável, fazendo com que as nações venham a repensar
valores, como fronteira, soberania, dentre outros.
Já no que se refere aos movimentos de integração, em especial o Mercosul, ao qual
estamos diretamente envolvidos, pode-se afirmar que já gerou algum progresso,
principalmente no campo econômico e até mesmo, facilitou algumas relações
laborais, em especial àquelas que ocorrem nas zonas de fronteiras, envolvendo
trabalhadores de ambos os países, que hoje já podem adentrar por até vinte
quilômetros de um lado para o outro, protegidos pela assinatura de um protocolo
entre os países membros, desde de 2004.
Verifica-se que o nosso mundo está saindo da era unipolar para se tornar um mundo
multipolar. As alianças estabelecidas, os blocos de interesses constituídos e a
própria balança de poder estão sofrendo alterações significantes. É nessa nova
ordem mundial, que o governo brasileiro busca criar uma posição de liderança para
o Brasil, ao estabelecer por exemplo a Aliança Estratégica e Comercial com o
Gigante da Ásia: a China (TANG16, 2005).
A importância dessa aliança reside no fato de que os chineses têm o que a empresa
brasileira necessita, ou seja: 1) capital de custo baixo e de longo prazo em
abundância;
15
Frase proferida pelo então Presidente da Tchecoslováquia, Vaclav Havel, num debate radiofônico com o autor italiano Domenico De Masi, pouco tempo depois da queda do Muro de Berlim. Encontrado in DE MASI, Domenico. O futuro do trabalho. Tradução de Yadyr A. Figueiredo. 7.ed.Rio de Janeiro: José Olímpio, 2003, p. 15. 16
Charles Tang é Presidente binacional da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China e membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.
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2) máquinas de boa qualidade e de custo muito competitivo; 3) experiência de
comércio internacional, que inundou as prateleiras do mundo com o "Made in China".
No que diz respeito ao trabalho, concorda-se com Rifkin (1995, p.313), pois
realmente “estamos entrando em um novo período da História em que as máquinas,
cada vez mais, substituirão o trabalho humano na produção de bens e serviços”,
implicando em um número cada vez mais crescente de pessoas desempregadas,
contribuindo assim para aumentar o já elevado número de pessoas que dependem
diretamente das chamadas “políticas públicas” para terem um mínimo de condições
de subsistência. É claro que nem tudo está perdido, pois a esperança possui
longevidade que só acaba com o ocaso da própria vida, mas acreditar-se que as
novas tecnologias, produtos e serviços que estão surgindo numa velocidade
assustadora, possam abrir oportunidades para atender a demanda da grande massa
de desempregados, requer um exercício no mínimo paradoxal: se cada vez mais a
máquina continuar substituindo o homem, gerando mais desemprego e por
conseqüência, diminuindo o poder aquisitivo, quem vai consumir aquilo que vier a
ser produzido? O certo é que alguma fórmula haverá de ser colocada em prática
para, pelo menos, manter-se um equilíbrio mínimo necessário, com vistas à própria
preservação da nossa civilização.
Quanto ao tipo de organização que está surgindo, não mais alicerçada somente na
volúpia desenfreada do lucro, talvez o pensamento de De Masi possa sugerir
alguma perspectiva positiva, quando afirma que:
o novo desafio que marcará o século XXI é como inventar e difundir uma nova organização, capaz de elevar a qualidade de vida e do trabalho,
fazendo alavanca sobre a força silenciosa do desejo de felicidade(DE MASI 2003, p. 330).
Finalmente, resta outra indagação: que modelo e que tamanho deverá ter o Estado
para enfrentar esta nova era? Arriscando alguns palpites, diria que
independentemente do modelo de Estado ou regime que esteja sendo adotado, o
mínimo deverá continuar sendo oferecido para a população, principalmente para
atender suas necessidades essenciais, como saúde, educação e segurança,
priorizando programas que contemplem a preservação ambiental, buscando-se o tão
decantado “desenvolvimento sustentado” e acima de tudo, estimulando atividades
que possam contribuir para um melhor desempenho criativo, em especial, investindo
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nos primeiros anos de vida das crianças, pois elas terão a dura missão de enfrentar
uma nova realidade, daí a necessidade de ao menos, estarem melhor preparadas
para tal. Uma coisa porém é certa: o trabalho não será substituído por outra coisa
senão pelo próprio trabalho, talvez com outras formas, como o teletrabalho, por
exemplo.
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