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Os trabalhadores na arte brasileira

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Os trabalhadores na arte brasileira

Alteridade – Direito – Dignidade - Liberdade

Os traços que nosdiferenciam dosoutros• Formação de vida• Valores• Linguagem• Crenças• Cultura

Constituição • Respeito• Reconhecimento• Condições de vida

ExpressãoReligiosaCulturalEstado de espírito

Tarsila do Amaral, Operários, 1933.

Trabalhadores urbanos

A minha carne, o sangue, é indefesa, como a Terra; maseu, a minha áurea não é indefesa não. Se queimar osespaço todinho, e eu tô no meio, pode queimar, eu tô nomeio, invisível. Se queimar meu sentimento, minha carne,meu sangue, se for pra o bem, se for pra verdade, pra obem, pela lucidez de todos os seres, pra mim pode seragora, nesse segundo, e eu agradeço ainda.

A incivilização que é feio.Eu sou perturbada, mas eu distingo a perturbação.

Minha mãe, coitada, não distinguia. Mas também, pudera,eu sou Estamira! Se eu não distinguisse a perturbação eunão sou Estamira, eu não seria, eu não era.

A coisa que eu mais adoro é trabalhar.Eu nunca tive sorte. A unica sorte que eu tive foi de

conhecer o Sr. Jardim Gramacho, o lixão, O Sr. Cisco-Monturo.... Eu amo, eu adoro!... Como eu quero o bem dosmeus filhos... Como eu quero o bem dos amigos... Eu nuncative. Aquela coisa que eu sou: sorte boa.

Documentário Estamira, de marcos Prado e José Padilha, 2005.

Luciano decúbito ventral sobre o colchãoolhos cravados no teto de gesso rebaixado atelevisão ligada desenho animado daqui aalguns anos o apartamento precisará de umanova pintura as vigas terão de ser reforçadas aágua que se infiltra no teto do banheiro e quejá provocou o rejunte dos ladrilhos se imiscuiráentre as colunas os fios de eletricidadeendurecerão provocando curtos-circuitos e oprédio condenado arruinado será tomado porsem-teto mendigos drogados malucostraficantes disputarão o ponto e tudo findaráporque tudo acaba.

RUFFATO, Luiz. Eles era muitos cavalos. Boitempo: São Paulo, 2001.

Mas ainda não expliquei bem Olímpico. Vinha do sertãoda Paraíba e tinha uma resistência que provinha da paixão porsua terra braba e rachada pela seca. Trouxera consigo,comprada no mercado da Paraíba, uma lata de vaselinaperfumada e um pente, como posse sua e exclusiva. Besuntavao cabelo preto até encharcá-lo. Não desconfiava que ascariocas tinham nojo daquela meladeira gordurosa. Nasceracrestado e duro que nem galho seco de árvore ou pedra ao sol.Era mais passível de salvação que Macabéa pois não fora à toaque matara um homem, desafeto seu, nos cafundós do sertão,o canivete comprido entrando mole-mole no fígado macio dosertanejo. Guardava disso segredo absoluto, o que lhe dava aforça que um segredo dá. Olímpico era macho de briga. Masfraquejava em relação a enterros: às vezes ia, três vezes porsemana a enterro de desconhecidos, cujos anúncios saíam nosjornais e sobretudo no O dia: e seus olhos ficavam cheios delágrimas. Era uma fraqueza, mas quem não tem a sua. Semanaem que não havia enterro, era semana vazia desse homemque, se era doido, sabia muito bem o que queria.

De modo que não era doido coisa alguma.LISPECTOR, Clarice. A hora da Estrela. Rocco: são Paulo, 1998.

Olímpico de Jesus trabalhava de operárionuma metalúrgica e ela nem notou que ele nãose chamava de “operário” e sim de“metalúrgico”. Macabéa ficava contente com aposição social dele porque também tinhaorgulho de ser datilógrafa, embora ganhassemenos que o salário mínimo. Mas ela e Olímpicoeram alguém no mundo. “Metalúrgico edatilógrafa” formavam um casal de classe. Atarefa de Olímpico tinha o gosto que se sentequando se fuma um cigarro acendendo-o dolado errado, na ponta da cortiça. O trabalhoconsistia em pegar barras de metal que vinhamdeslizando de cima da máquina para colocá-lasembaixo, sobre uma placa deslizante. Nunca seperguntara por que colocava a barra embaixo. Avida não lhe era má e ele até economizava umpouco de dinheiro: dormia de graça numaguarita em obras de demolição porcamaradagem do vigia.

Poema tirado de uma notícia de jornalManuel Bandeira

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem númeroUma noite ele chegou no bar Vinte de NovembroBebeuCantouDançouDepois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

TrabalhadorSeu Jorge

Está na luta, no corre-corre, no dia-a-diaMarmita é fria mas se precisa ir trabalharEssa rotina em toda firma começa às sete da manhãPatrão reclama e manda embora quem atrasar

TrabalhadorTrabalhador brasileiroDentista, frentista, polícia, bombeiroTrabalhador brasileiroTem gari por aí que é formado engenheiroTrabalhador brasileiroTrabalhador

E sem dinheiro vai dar um jeitoVai pro serviçoÉ compromisso, vai ter problema se ele faltarSalário é pouco, não dá pra nadaDesempregado também não dáE desse jeito a vida segue sem melhorar

TrabalhadorTrabalhador brasileiroGarçom, garçonete, jurista, pedreiroTrabalhador brasileiroTrabalha igual burro e não ganha dinheiroTrabalhador brasileiroTrabalhador

Trabalhadores rurais

A Caneta e a Enxada

"Certa vez uma caneta foi passear lá no sertãoEncontrou-se com uma enxada, fazendo uma plantação.A enxada muito humilde, foi lhe fazer saudação,Mas a caneta soberba não quis pegar na sua mão.E ainda por desaforo lhe passou uma repreensão."

Disse a caneta pra enxada não vem perto de mim, nãoVocê está suja de terra, de terra suja do chãoSabe com quem está falando, veja sua posiçãoE não se esqueça a distância da nossa separação.

Eu sou a caneta dourada que escreve nos tabeliãoEu escrevo pros governos a lei da constituiçãoEscrevi em papel de linho, pros ricaços e pros barãoSó ando na mão dos mestres, dos homens de posição.

A enxada respondeu: de fato eu vivo no chão,Pra poder dar o que comer e vestir o seu patrãoEu vim no mundo primeiro, quase no tempo de AdãoSe não fosse o meu sustento ninguém tinha instrução.

Vai-te caneta orgulhosa, vergonha da geraçãoA tua alta nobreza não passa de pretensãoVocê diz que escreve tudo, tem uma coisa que nãoÉ a palavra bonita que se chama educação!ZICO E ZECA. Disponível em: www.letras.mus.br/zico-e-zeca. Acesso em 26 de abril de 2016.

Jeca Tatu é um piraquara do Paraíba, maravilhoso epitome decarne onde se resumem todas as características da espécie.Ei-lo que vem falar ao patrão. Entrou, saudou. Seu primeiromovimento após prender entre os lábios a palha de milho, sacaro rolete de fumo e disparar a cusparada d'esguicho, é sentar-sejeitosamente sobre os calcanhares. Só então destrava a língua ea inteligência.- "Não vê que...De pé ou sentado as ideias se lhe entramam, a língua emperra enão há de dizer coisa com coisa.De noite, na choça de palha, acocora-se em frente ao fogo para"aquentá-lo", imitado da mulher e da prole.Para comer, negociar uma barganha, ingerir um café, tostar umcabo de foice, fazê-lo noutra posição será desastre infalível. Háde ser de cócoras.Nos mercados, para onde leva a quitanda domingueira, é decócoras, como um faquir do Bramaputra, que vigia os cachinhosde brejaúva ou o feixe de três palmitos.Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio narealidade!Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...

LOBATO, Monteiro. Urupês. São Paulo: Brasiliense, 1994.

Catar feijão1.Catar feijão se limita com escrever:joga-se os grãos na água do alguidare as palavras na folha de papel;e depois, joga-se fora o que boiar.Certo, toda palavra boiará no papel,água congelada, por chumbo seu verbo:pois para catar esse feijão, soprar nele,e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

2.Ora, nesse catar feijão entra um risco:o de que entre os grãos pesados entreum grão qualquer, pedra ou indigesto,um grão imastigável, de quebrar dente.Certo não, quando ao catar palavras:a pedra dá à frase seu grão mais vivo:obstrui a leitura fluviante, flutual,açula a atenção, isca-a como o risco.

NETO, João Cabral de Melo. Educação pela pedra. Rio de Janeiro: ALFAGUARA, 2008.

De março de 1931 a fevereiro de 1940, foram decretadas mais de 150 leis novas deproteção social e de regulamentação do trabalho em todos os seus setores. Todas elastêm sido simplesmente uma dádiva do governo. Desde aí, o trabalhador brasileiroencontra nos quadros gerais do regime o seu verdadeiro lugar.

(DANTAS, M. A força nacionalizadora do Estado Novo. Rio de Janeiro: DIP, 1942. Apud BERCITO, S. R. Nos Tempos de Getúlio: da revolução de 30 ao fim do Estado Novo . São Paulo: Atual, 1990)

A adoção de novas políticas públicas e as mudanças jurídico-institucionais ocorridas noBrasil, com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, evidenciam o papel histórico decertas lideranças e a importância das lutas sociais na conquista da cidadania. Desseprocesso resultou a

a) criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, que garantiu ao operariadoautonomia para o exercício de atividades sindicais.

b) legislação previdenciária, que proibiu migrantes de ocuparem cargos de direção nossindicatos.

c) criação da Justiça do Trabalho, para coibir ideologias consideradas perturbadoras da“harmonia social”.

d) legislação trabalhista que atendeu reivindicações dos operários, garantido-lhesvários direitos e formas de proteção.

e) decretação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que impediu o controleestatal sobre as atividades políticas da classe operária.

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